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<strong>Boletim</strong> Biopesb<br />
Ciência, meio ambiente e cidadania em suas mãos<br />
A preocupação com<br />
o meio ambiente e a utilização<br />
dos recursos naturais<br />
de maneira sustentável<br />
tem levado órgãos<br />
internacionais a criarem<br />
acordos que visam a preservação<br />
da natureza. Um<br />
destes acordos é o Protocolo<br />
de Nagoya, criado<br />
em outubro de 2010 na cidade<br />
de Nagoya, Japão.<br />
O objetivo deste Protocolo<br />
é a regulamentação<br />
do acesso a recursos<br />
genéticos e a repartição<br />
justa e igualitária dos benefícios<br />
proporcionados<br />
por produtos desenvolvidos<br />
a partir destes bens.<br />
Isto quer dizer que cada<br />
nação teria soberania sobre<br />
seus recursos naturais<br />
e o acesso às espécies e<br />
ao patrimônio genético do<br />
país só poderia acontecer<br />
diante de sua autorização.<br />
Um dos benefícios do<br />
Protocolo de Nagoya é a<br />
segurança e a transparência<br />
legal para fornecedores<br />
e usuários de recursos<br />
genéticos da biodiversidade.<br />
Desta forma, evita-se<br />
a biopirataria e cria-se incentivos<br />
para que estes recursos<br />
sejam conservados,<br />
além de estimular seu uso<br />
ISSN - 2316-6649 - Ano 3 - Nº 08 - <strong>2013</strong><br />
Tratado internacional busca normatizar acesso ao<br />
conhecimento tradicional da biodiversidade<br />
sustentável. Nesta edição,<br />
você poderá conhecer um<br />
pouco mais sobre este Tratado<br />
e suas implicações.<br />
Etnoornitologia: Ciência utiliza conhecimentos populares<br />
para desenvolver pesquisas sobre aves<br />
As etnociências são<br />
campos do conhecimento<br />
que se dedicam ao estudo<br />
de áreas em que o elemento<br />
humano está inserido.<br />
Entre estas áreas, está<br />
a etnoornitologia, ciência<br />
que estuda a relação<br />
dos seres humanos com as<br />
aves.<br />
Diversas pesquisas demonstram<br />
que pessoas<br />
que se relacionam com determinados<br />
elementos do<br />
meio ambiente acabam<br />
desenvolvendo conhecimentos<br />
sobre eles. Desta<br />
forma, entende-se que o<br />
envolvimento de seres humanos<br />
com os pássaros,<br />
sejam eles de estimação<br />
ou selvagens, gera conhecimentos<br />
populares que<br />
podem - e devem - ser<br />
Protocolo regulamenta acesso a recursos genéticos<br />
considerados em estudos<br />
científicos.<br />
Nesta edição, o Bio-<br />
PESB traz informações<br />
sobre esta ciência e<br />
apresenta uma pesquisa<br />
desenvolvida na Comunidade<br />
do Boné, situada no<br />
entorno do PESB, que buscou<br />
catalogar informações<br />
sobre pássaros da região.<br />
Pág 3<br />
Araponga, ave típica da região<br />
do PESB<br />
Pág 4<br />
Entrevista<br />
Pesquisa<br />
Pesquisa da UFV traça o<br />
perfil de professores que<br />
ensinam em escolas do<br />
entorno do PESB<br />
Serra do Brigadeiro<br />
Novo Conselho Consultivo<br />
do PESB será escolhido<br />
este ano. Eleições acontecem<br />
a cada dois anos.<br />
Página 6<br />
Página 7 Página 8
MeioAmbiente<br />
Manejo florestal tem nova regulamentação em MG<br />
para espécies arbóreas nativas da Mata Atlântica<br />
O manejo florestal se<br />
refere ao uso racional das<br />
florestas aliado ao desenvolvimento<br />
sustentável,<br />
sendo definido no Decreto<br />
n°1182/94 como a “administração<br />
da floresta para<br />
a obtenção de benefícios<br />
econômicos e sociais, respeitando-se<br />
os mecanismos<br />
de sustentação do ecossistema<br />
objeto do manejo”.<br />
Este tipo de manejo<br />
pode ser interessante para<br />
o produtor rural, pois envolve<br />
atividades como a<br />
colheita de produtos madeireiros<br />
e não madeireiros<br />
por tempo indeterminado,<br />
garantindo assim a manutenção<br />
da diversidade vegetal<br />
original e minimizando<br />
os impactos ambientais.<br />
Em fevereiro de <strong>2013</strong><br />
foi publicada a Resolução<br />
Conjunta da Secretaria de<br />
Estado de Meio Ambiente<br />
e Desenvolvimento Sustentável<br />
(Semad) e do Instituto<br />
Estadual de Florestas (IEF)<br />
nº 1804, que traz nova regulamentação<br />
para o manejo<br />
florestal de espécies<br />
arbóreas nativas em Minas<br />
Gerais. Entre as espécies<br />
liberadas para o cadastro<br />
de plantios está a Candeia,<br />
muito utilizada como<br />
postes de cerca.<br />
Redação: Alunos do PET- Bioquímica da UFV (Alisson<br />
Andrade, Amanda Santos, Bárbara Dias, Bruno Paes,<br />
Carolina Brás, Isaac Konig, Laís Muniz, Lethícia Ribeiro,<br />
Lucas Passos, Patrícia Pereira, Priscilla Almeida,<br />
Raquel Santos).<br />
Projeto Gráfico : Thamara Pereira<br />
Diagramação: Erika Vieira<br />
Revisão: Lethícia Ribeiro<br />
www.biopesb.ufv.br<br />
A candeia pode ser plantada em solos pouco férteis, por isso<br />
esta árvore é utilizada com sucesso em reflorestamentos<br />
<strong>Boletim</strong> Biopesb<br />
A Candeia é uma espécie<br />
da Mata Atlântica<br />
que pode ter outra utilidade<br />
além da produção de<br />
madeira, pois desta árvore<br />
pode se extrair o óleo<br />
alfa-bisabolol, produto<br />
florestal não madeireiro<br />
bastante valorizado na indústria<br />
de cosméticos.<br />
Segundo a resolução,<br />
o produtor tem que provar<br />
que plantou a espécie<br />
nativa para que possa<br />
explorá-la no futuro. Essa<br />
comprovação se dá por<br />
meio de um cadastro junto<br />
a Sisema.<br />
Para o manejo da Candeia,<br />
é necessário que o<br />
corte da madeira seja feito<br />
por meio da apresentação<br />
de um Plano de Manejo<br />
Florestal Sustentado,<br />
que especifique detalhes<br />
da retirada da madeira.<br />
A exploração será autorizada<br />
apenas nas áreas em<br />
que a Candeia perfaça no<br />
mínimo 70% (setenta por<br />
cento) das espécies arbóreas.<br />
Além disso, só é permitida<br />
a colheita de árvores<br />
com diâmetro igual ou<br />
superior a 10 centímetros,<br />
mantendo-se no mínimo<br />
100 árvores por hectare<br />
explorado.<br />
Aqueles que não cumprirem<br />
as determinações<br />
descritas no novo regulamento<br />
serão denunciados<br />
ao Ministério Público, para<br />
que as sanções legais sejam<br />
cumpridas.<br />
Patrícia Fontes e Alisson Almeida<br />
Editor-Chefe: João Paulo Viana Leite<br />
Telefone: (31) 3899-3044<br />
E-mail: biopesbufv@gmail.com<br />
Endereço: Departamento de Bioquímica e Biologia<br />
Molecular - UFV<br />
CEP 36570-000, Viçosa - MG - Brasil<br />
Tiragem: 1.000 exemplares<br />
Apoio: Pró-Reitoria de Ensino e Cultura (PIBEX)-UFV<br />
Apoio: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em<br />
Interações Planta-Praga<br />
Reprodução<br />
Ano 3, n°8 - Pág 2<br />
Editorial<br />
De acordo com a Organização<br />
das Nações<br />
Unidas (ONU), o planeta<br />
Terra é habitado atualmente<br />
por 7 bilhões de<br />
seres humanos, podendo<br />
chegar a 10 bilhões até<br />
o final do século. Daí surge<br />
um grande desafio,<br />
como conciliar qualidade<br />
de vida para tanta gente<br />
respeitando os limites<br />
do planeta? Observamos<br />
cada vez mais nações em<br />
guerra, na disputa, sobretudo,<br />
de territórios e recursos<br />
naturais. Dentro de<br />
nossa pátria mãe, vemos<br />
o Brasil como campeão<br />
mundial de água doce,<br />
biodiversidade e de florestas<br />
tropicais úmidas.<br />
Este cenário nos obriga a<br />
sermos vigilantes e cuidadores<br />
de nossas riquezas<br />
naturais. Vigilantes no que<br />
tange aos tratados internacionais,<br />
aos pactos estabelecidos<br />
entre países<br />
com diferentes interesses<br />
quando se discute o acesso<br />
a diversidade biológica,<br />
como também dentro<br />
da esfera local; e cuidadores<br />
na conservação do<br />
nosso ambiente. Nesta<br />
edição, o <strong>Boletim</strong> <strong>BioPESB</strong><br />
traz matérias que abordam<br />
acordos internacionais<br />
e de legislação ambiental<br />
do nosso estado<br />
que nos remete a atuar<br />
localmente, mas não deixando<br />
de conhecer também<br />
a discussão global.<br />
Estes temas precisam ser<br />
debatidos principalmente<br />
em regiões de grande diversidade<br />
biológica, como<br />
no nosso território da Serra<br />
do Brigadeiro.<br />
João Paulo Viana Leite<br />
Editor chefe
MeioAmbiente Ano 3, n°8 - Pág 3<br />
Protocolo de Nagoya: novas regras para a proteção<br />
da biodiversidade<br />
Reprodução<br />
Reprodução<br />
Legenda<br />
Legenda<br />
Durante a 10ª Conferência<br />
das Partes da Convenção<br />
sobre Diversidade<br />
Biológica (COP 10), organizada<br />
pela ONU em<br />
outubro de 2010 na cidade<br />
de Nagoya, Japão,<br />
os 193 países participantes<br />
do encontro firmaram<br />
o Protocolo de Nagoya,<br />
também conhecido como<br />
protocolo ABS (Protocolo<br />
de Acesso e Repartição<br />
de Benefícios da Biodiversidade)<br />
considerado<br />
o maior pacto ambiental<br />
desde Kyoto.<br />
O objetivo deste acordo<br />
é proteger a biodiversidade<br />
de cada país,<br />
garantindo que cada nação<br />
tenha soberania sobre<br />
seus recursos naturais,<br />
com o intuito de evitar a<br />
biopirataria. O acordo<br />
prevê que o acesso à determinada<br />
espécie e ao<br />
patrimônio genético de<br />
um país só poderá ser<br />
feito mediante ao consentimento<br />
dessa nação, de<br />
acordo com a sua legislação<br />
nacional. Caso um<br />
produto seja elaborado<br />
a partir de pesquisas com<br />
essa espécie, os lucros deverão<br />
ser obrigatoriamente<br />
compartilhados com o<br />
país de origem. O mesmo<br />
vale para os conhecimentos<br />
tradicionais associados<br />
ao patrimônio cultural. Por<br />
exemplo: algumas tribos<br />
indígenas brasileiras por<br />
séculos fazem uso de plantas<br />
medicinais para fins<br />
terapêuticos. Se alguma<br />
empresa estrangeira decidir<br />
pesquisar tais plantas,<br />
além da autorização<br />
do governo brasileiro, os<br />
lucros dos produtos gerados<br />
deverão ser partilhados<br />
com a tribo. Não é o<br />
protocolo que vai decidir<br />
a quantia a ser paga, e o<br />
pagamento pode ser feito<br />
por meios monetários ou<br />
não monetários, contando<br />
que seja justo e equitativo<br />
firmado previamente entre<br />
as partes envolvidas.<br />
O prazo para os países<br />
ratificarem o documento<br />
vai até junho de 2014,<br />
sendo que os cinquenta<br />
primeiros garantem assento<br />
à mesa de negociações.<br />
O protocolo passa a será<br />
validado 90 dias após o<br />
quinquagésimo instrumento<br />
de ratificação e deverá<br />
ser cumprido por todos<br />
os países que o assinaram.<br />
Até o momento dezenove<br />
países já assinaram e vários<br />
outros estão em fase final<br />
de análise, como os 27<br />
países da União Europeia.<br />
O Brasil ainda não possui<br />
esse documento ratificado,<br />
e caso fique de fora<br />
dos cinquentas primeiros<br />
que aderiram ao protocolo,<br />
terá que se submeter<br />
às regras estabelecidas<br />
por esses países nas transações<br />
futuras, o que não<br />
seria interessante ao nosso<br />
país, dado sua enorme<br />
biodiversidade – o Brasil<br />
abriga aproximadamente<br />
13% de todas as espécies<br />
existentes no planeta, sendo<br />
primeiro da lista dos 17<br />
países considerados megadiversos,<br />
apresentando<br />
um elevado grau de endemismo<br />
de suas espécies.<br />
Segundo Roberto Cavalcanti,<br />
secretário de<br />
Biodiversidade e Florestas<br />
do Ministério do Meio<br />
Ambiente, o acordo é de<br />
interesse do Governo Federal<br />
e de algumas instituições<br />
brasileiras, mas<br />
nenhuma medida será tomada<br />
enquanto todos os<br />
setores da sociedade não<br />
compreenderem as vantagens<br />
e superarem alguns<br />
medos. Os setores agrícolas<br />
temem o aumento<br />
do preço das sementes ou<br />
que dificultem o acesso às<br />
espécies de outros países<br />
para melhorarem suas atividades,<br />
enquanto as empresas<br />
farmacêuticas e de<br />
cosméticos receiam perder<br />
o controle sobre conhecimentos<br />
e recursos genéticos<br />
que há anos dominam,<br />
acarretando prejuízos.<br />
Apesar das pressões internacionais,<br />
dirigentes do<br />
governo garantem que estas<br />
não vão surtir efeito na<br />
decisão do país aderir ao<br />
Protocolo de Nagoya.<br />
Uma das preocupações<br />
da comunidade científica<br />
é que se repita o que<br />
ocorreu com o Protocolo<br />
de Kyoto, que foi assinado<br />
em 1998, mas só entrou<br />
em vigor depois da ratificação<br />
da Rússia, em 2005<br />
- os Estados Unidos nunca<br />
o ratificaram, assim como<br />
também estão resistindo a<br />
assinarem o de Nagoya.<br />
Raquel Santos e Laís Muniz
Reprodução<br />
Ciência Ano 3, n°8 - Pág 4<br />
Etnoornitologia combina saberes populares e ciência<br />
Alguma vez você já<br />
reparou no cantar das<br />
aves? Seriam capazes as<br />
aves de sinalizar algum<br />
fenômeno natural? Já associou<br />
o canto do Sabiá<br />
com a chegada de chuva?<br />
Já diziam os sertanejos:<br />
“... ele dá muito sinal da<br />
chuva. Ele cantou de manhã<br />
pode saber que vai<br />
chover.” Qual seria o grau<br />
de influência das aves nos<br />
costumes de determinadas<br />
populações? Corujas<br />
e outras aves noturnas recebem<br />
fama de agourentas:<br />
o Corujão-de-orelha,<br />
por exemplo, desperta<br />
certo temor nos casais<br />
“O dia que ocê for casar<br />
você olha se tem corujão-<br />
-de-orelha lá, porque diz<br />
que dá azar no seu casamento!”<br />
Os dizeres populares<br />
que associam as aves a<br />
fatos que permeiam o cotidiano<br />
são chamados de<br />
Etnodescrição. O prefixo<br />
“etno” indica que o elemento<br />
humano está obrigatoriamente<br />
presente. Esses<br />
saberes constituem a base<br />
dos estudos da Etnoornitologia.<br />
Essa ciência busca<br />
compreender as relações<br />
comportamentais entre os<br />
seres humanos e as aves,<br />
por meio de lendas, poesias<br />
e rituais. Sendo assim,<br />
estudos etnoornitológicos<br />
podem servir como ferramenta<br />
de diagnóstico de<br />
mudanças ambientais em<br />
larga escala, bem como<br />
auxiliar na implementação<br />
de estratégias de manejo<br />
e conservação E mais,<br />
podem destacar aspectos<br />
ainda não contemplados<br />
pelas pesquisas acadêmicas,<br />
podendo gerar novas<br />
hipóteses.<br />
A Etnoornitologia firmou-se<br />
como ciência em<br />
1969. Entretanto, desde<br />
o século XIX publicações<br />
sobre o tema já eram<br />
lançadas. Em 1880, por<br />
exemplo, o ornitólogo londrino<br />
Alexander Forbes<br />
realizou observações das<br />
aves do sertão e da Zona<br />
da Mata pernambucanos.<br />
Em seu artigo, ele citou a<br />
abundância da Lavandeira<br />
(Fluvicola nengeta) e a<br />
correlacionou com a história<br />
popular, que dizia<br />
que a ave havia feito um<br />
favor a Virgem Maria e,<br />
portanto, ganhado “imunidade”.<br />
Quanto a outras aves,<br />
como a fura-barreira<br />
(Nystalus maculantus),<br />
associa-se a chegada de<br />
chuva. Essa observação<br />
também é atribuída ao<br />
canto do Sabiá e ao piar<br />
da Seriema e da Saracura.<br />
No interior da Paraíba,<br />
cerca de 30 espécies<br />
para as quais os sertanejos<br />
relacionam com índice<br />
pluviométrico foram listadas,<br />
sendo esse conhecimento<br />
transmitido de geração<br />
em geração.<br />
Pesquisador cataloga informações sobre pássaros da Serra do Brigadeiro<br />
Araponga, etnoespécie destacada pela pesquisa realizada<br />
no Pico do Boné (Serra do Brigadeiro).<br />
Um trabalho bastante<br />
interessante sobre Etnoornitologia<br />
foi realizado na<br />
Comunidade do Boné, no<br />
entorno do Parque Estadual<br />
da Serra do Brigadeiro.<br />
O pesquisador Fernando<br />
Augusto Valério, ex-aluno<br />
da PUC-Minas (Belo Horizonte),<br />
realizou entrevistas<br />
Lavandeira (Fluvicola nengeta), ave abundante no sertão<br />
da Paraíba.<br />
com a população local e<br />
participou de trilhas guiadas<br />
a fragmentos da Mata<br />
Atlântica. Como parte de<br />
seus resultados, 66 etnoespécies<br />
foram catalogadas,<br />
destacando-se a Araponga<br />
(Procnias nudcollis), ave<br />
ameaçada de extinção em<br />
Minas Gerais.<br />
Em contexto científico<br />
mais amplo, a Etnoornitologia<br />
está inserida no<br />
ramo da Etnobiologia, ciência<br />
na qual são sumarizadas<br />
as relações entre<br />
um grupo social e a natureza,<br />
que representa espaço<br />
de observação, experimentação<br />
e aquisição<br />
de saberes.<br />
Ainda se faz necessário<br />
ampliar os conhecimentos<br />
sobre a avifauna<br />
brasileira. Metodologias<br />
de trabalho podem ser<br />
obtidas a parir da convivência<br />
com as populações<br />
que se relacionam com as<br />
aves, permitindo um delineamento<br />
do saber popular<br />
e o uso do conhecimento<br />
extraído.<br />
Bruno Paes e Amanda Santos<br />
Reprodução
Ciência Ano 3, n°8 - Pág 5<br />
Unidades de conservação são objetos de pesquisa sobre predação de<br />
espécies nativas por cães domésticos<br />
Pesquisadora Ana Maria de Oliveira Paschoal, membro da<br />
equipe do projeto, opera armadilhas fotográficas em campo.<br />
Uma pesquisa coordenada<br />
pelo professor Dr.<br />
Adriano Chiarello, durante<br />
sua docência no Programa<br />
de Pós-Graduação em Zoologia<br />
de Vertebrados da<br />
PUC Minas, buscou descobrir<br />
se a presença do cão<br />
doméstico (Canis lupus familiaris)<br />
é uma ameaça às<br />
espécies nativas da Mata<br />
Atlântica. A área de estudo<br />
envolveu seis unidades de<br />
conservação, localizadas<br />
na Zona da Mata mineira.<br />
Destas, três são Reservas<br />
Particulares do Patrimônio<br />
Natural (RPPNs) - Feliciano<br />
Miguel Abdala, Mata do<br />
Sossego e Fazenda Macedônia;<br />
e três Parques Estaduais<br />
- Sete Salões, Serra<br />
do Brigadeiro e Rio Doce.<br />
A ideia do projeto surgiu<br />
a partir de um estudo<br />
realizado na reserva<br />
Feliciano Miguel Abdala,<br />
em Caratinga/MG, onde<br />
existia uma preocupação<br />
ocasionada pela redução<br />
da população de macacos<br />
muriquis. Acreditava-<br />
-se que esta diminuição<br />
se devia à presença de<br />
gatos silvestres (predadores<br />
naturais dos muriquis),<br />
mas o estudo constatou<br />
que a população destes<br />
era pequena ou normal.<br />
Encontraram, contudo, 33<br />
cães, população dez vezes<br />
superior à de gatos<br />
silvestres. A partir destes<br />
resultados, foi criado um<br />
projeto maior, para verificar<br />
se o que acontecia em<br />
Caratinga era também a<br />
realidade de outras áreas<br />
de conservação.<br />
Os dados foram coletados<br />
a partir de armadilhas<br />
fotográficas, entrevistas<br />
com moradores e análise<br />
parasitológica de cães. O<br />
esforço amostral envolveu<br />
800 armadilhas/dia, utilizadas<br />
durante dois ciclos<br />
de 80 dias: um na estação<br />
seca, outro na chuvosa, espalhadas<br />
por toda a área<br />
estudada. Nas entrevistas,<br />
os moradores foram questionados<br />
sobre os cuidados<br />
que os cães recebem,<br />
se já observaram algum<br />
animal sendo predado<br />
por um cão, se vivem soltos<br />
ou presos, entre outros.<br />
Sangue e fezes dos cães<br />
também foram coletados<br />
para análise de parasitas<br />
e potenciais zoonoses.<br />
Foto: Projeto cães como espécies invasoras na<br />
Mata Atlântica<br />
Foto: Projeto cães como espécies<br />
invasoras na Mata Atlântica<br />
Pesquisa na Serra do Brigadeiro<br />
No Parque Estadual<br />
Serra do Brigadeiro, o<br />
cachorro foi a terceira espécie<br />
mais registrada. Em<br />
termos de densidade populacional,<br />
estipulam um<br />
cachorro a cada 7 km²,<br />
número que já alerta para<br />
os possíveis problemas que<br />
os cães domésticos podem<br />
gerar nas unidades de<br />
conservação.<br />
As armadilhas fotográficas<br />
registraram a presença de<br />
cães domésticos no PESB<br />
Os principais problemas<br />
acarretados pela<br />
presença destes animais<br />
nas áreas de conservação<br />
estão relacionados aos<br />
animais silvestres. “A média<br />
é de quase dois cães<br />
por residência, a grande<br />
maioria não recebe cuidados<br />
veterinários frequentes<br />
e a imensa maioria deles<br />
é mantida solta 24 horas<br />
por dia. Um total de 19<br />
espécies de mamíferos<br />
silvestres já foram observados<br />
sendo molestados,<br />
perseguidos ou predados<br />
por cachorros.”, afirma o<br />
coordenador da pesquisa,<br />
Adriano Chiarelli. Além da<br />
predação, o cão doméstico<br />
pode ser portador de doenças<br />
que afetam também<br />
outras espécies, como é o<br />
caso da Leishmaniose e da<br />
própria raiva. A primeira<br />
foi encontrada em 9% dos<br />
cães amostrados durante<br />
o estudo, valor suficiente<br />
para considerar toda a<br />
área endêmica.<br />
A presença de cães<br />
domésticos nas áreas de<br />
conservação, segundo as<br />
análises do estudo, está diretamente<br />
relacionada ao<br />
crescimento dos núcleos urbanos<br />
próximos ao espaço<br />
amostral, como vilas e pequenas<br />
cidades. Secundariamente<br />
estão as áreas<br />
de agricultura.<br />
A solução para o problema<br />
não é simples, exigindo<br />
um trabalho de conscientização<br />
dos moradores<br />
e responsáveis pelas unidades<br />
de conservação. “O<br />
Brasil, estados, municípios<br />
precisam começar a rever<br />
essa estratégia de controle<br />
e de fato começar a tomar<br />
medidas pra mitigar esse<br />
problema. O cachorro doméstico<br />
é útil, o ser humano<br />
tem uma relação afetiva,<br />
de afinidade com o cão.<br />
Não dá pra simplesmente<br />
retirar o cão do proprietário.<br />
As medidas de mitigação<br />
envolvem várias<br />
etapas, começando pela<br />
conscientização da população<br />
do entorno para que<br />
seja mais responsável, tenha<br />
mais cuidados com o<br />
cão.” – destaca o professor.<br />
Erika Vieira
SerradoBrigadeiro<br />
Ano 3, n°8 - Pág 7<br />
Pesquisa da UFV traça o perfil de professores que<br />
ensinam em escolas do entorno do PESB<br />
A escola, juntamente<br />
com os seus professores,<br />
desempenha papel importante<br />
para a formação<br />
das futuras gerações.<br />
No contexto da Serra do<br />
Brigadeiro, sobretudo, os<br />
saberes dos professores<br />
e alunos sobre preservação<br />
ambiental ultrapassam<br />
as barreiras das salas<br />
de aula e se difundem<br />
por toda comunidade.<br />
Além das escolas, outros<br />
órgãos e instituições devem<br />
se mobilizar para<br />
questões relacionadas ao<br />
meio ambiente: o governo<br />
com a implementação<br />
de políticas públicas para<br />
a região; a universidade<br />
como fonte geradora do<br />
conhecimento e os próprios<br />
indivíduos com seus<br />
movimentos sociais de reivindicação.<br />
Atualmente, muito se<br />
fala sobre as questões<br />
ambientais e é consenso<br />
que as crianças e os jovens<br />
precisam estar bem informados<br />
sobre a importância<br />
da sustentabilidade no<br />
meio ambiente. Pensando<br />
nestas questões é que recentemente<br />
a doutoranda<br />
Angela Maria de Carvalho<br />
Maffia , da UFV, defendeu<br />
a tese “Região<br />
do Parque Estadual Serra<br />
do Brigadeiro: Saberes<br />
de professores quanto às<br />
questões ambientais”, do<br />
Programa de Pós-Graduação<br />
em Ciência Florestal,<br />
discutindo a formação e<br />
Atividades de Educação Ambiental (EA) nas escolas<br />
o conhecimento dos professores<br />
que trabalham<br />
na região de entorno do<br />
PESB. O estudo foi realizado<br />
com 37 professores<br />
do ensino fundamental<br />
que atuam em escolas<br />
dos municípios Muriaé,<br />
Fervedouro, Miradouro e<br />
Rosário da Limeira, todos<br />
pertencentes ao território<br />
rural Serra do Brigadeiro.<br />
O principal interesse<br />
da pesquisa foi sobre a<br />
formação e os saberes<br />
apresentados pelos professores,<br />
principalmente<br />
quanto às questões de<br />
educação ambiental (EA).<br />
Dos dados analisados, o<br />
grupo de professores que<br />
participou da pesquisa<br />
apresentou perfil bastante<br />
heterogêneo, tendo o<br />
número de professoras<br />
predominado. Esses professores<br />
ministram diferentes<br />
disciplinas e todos<br />
possuem licenciatura, sendo<br />
que alguns têm especialização<br />
e apenas um<br />
professor possui mestrado.<br />
Reprodução Reprodução<br />
Reprodução<br />
Os professores apoiam<br />
suas práticas em diversas<br />
formas de saberes. Dentre<br />
eles, destacam-se os<br />
saberes locais, próprios<br />
de sua cultura de origem.<br />
Os professores mostraram<br />
conhecimento acerca dos<br />
problemas sociais e ambientais<br />
da região, apontando,<br />
por exemplo, possíveis<br />
impactos ambientais<br />
que a mineração de bauxita<br />
pode trazer.<br />
Sobre o desenvolvimento<br />
de projetos em educação<br />
ambiental pelas escolas<br />
nos últimos anos, a maioria<br />
dos professores (78%) informou<br />
a realização desta<br />
atividade em suas escolas,<br />
porém somente a metade<br />
declarou participar efetivamente<br />
destes projetos,<br />
como a Coleta seletiva e<br />
reciclagem de lixo, aulas<br />
de campo na sede do<br />
PESB, distribuição de mudas<br />
e plantio de árvores,<br />
educação no campo, etc.<br />
A maioria dos professores<br />
(54,1%) também<br />
afirmou desenvolver atividades<br />
em EA em sala de<br />
aula nos seguintes conteúdos:<br />
preservação ambiental,<br />
poluição, degradação,<br />
impactos ambientais,<br />
lixo; porém conteúdos<br />
importantes como o desmatamento,<br />
queimadas<br />
e agricultura sustentável<br />
não foram mencionados.<br />
Os docentes investigados<br />
recorrem a diferentes fontes<br />
para desenvolverem<br />
as suas atividades em EA,<br />
destacando-se a internet<br />
(23,1%), revistas, livros e<br />
jornais (23,1%) e programas<br />
de televisão (15,4%).<br />
Vários projetos sobre a<br />
EA são desenvolvidos nas<br />
escolas da região pela<br />
UFV e pelas Secretarias<br />
Municipais de Educação,<br />
porém uma porcentagem<br />
muito pequena desses<br />
professores já participou<br />
desses projetos. A maioria<br />
deles (78%) nunca participou.<br />
O estudo mostra que<br />
embora os professores tenham<br />
consciência sobre<br />
a importância da EA, os<br />
mesmos ainda têm tímida<br />
participação na elaboração<br />
de projetos ambientais<br />
nas escolas. Este fenómeno<br />
pode ser explicado em<br />
parte na própria formação<br />
dos docentes, uma vez<br />
que a maioria relatou a<br />
falta desse conteúdo durante<br />
o curso de graduação.<br />
Outro ponto relevante<br />
mostra que 78,4 % dos<br />
professores entrevistados<br />
nunca participaram de<br />
cursos ou programas de<br />
formação continuada, embora<br />
89,2% destes tenham<br />
manifestado interesse em<br />
participar de programas<br />
de formação contínua na<br />
área ambiental.<br />
Alisson Almeida e Isaac Konig
SerradoBrigadeiro Ano 3, n°8 - Pág 8<br />
Eleição para Conselho Consultivo do PESB acontece este ano<br />
Os Parques Estaduais<br />
são criados com o objetivo<br />
de manter preservados<br />
ecossistemas de grande<br />
relevância biológica.<br />
Para lidar com questões<br />
ambientais e apoio à<br />
gestão dos parques, eles<br />
contam com Conselhos<br />
Consultivos, que são espaços<br />
para discussão de<br />
problemas e demandas<br />
ambientais das unidades<br />
de conservação.<br />
O Parque Estadual<br />
Serra do Brigadeiro<br />
(PESB) conta com um Conselho<br />
Consultivo desde<br />
sua criação, em 1996.<br />
O grupo de conselheiros<br />
tem papel importante<br />
na gestão e manejo do<br />
parque, integração com<br />
a população de seu entorno,<br />
conciliação dos interesses<br />
do PESB e das<br />
comunidades que estão<br />
relacionadas a ele, e<br />
também na interação do<br />
PESB com o desenvolvimento<br />
socioeconômico regional.<br />
Os conselheiros do<br />
PESB são eleitos através<br />
de votação, que ocorre a<br />
cada dois anos, e <strong>2013</strong><br />
é ano de eleição. O grupo<br />
possui representantes<br />
da sociedade civil e poder<br />
público, em números<br />
iguais, respeitando as<br />
peculiaridades da unidade<br />
de conservação. O<br />
conselho é composto por<br />
representantes efetivos<br />
e suplentes, que são escolhidos<br />
através de votação,<br />
onde os próprios<br />
candidatos a conselheiros<br />
se reúnem, em local determinado<br />
pela Comissão<br />
de seleção, e decidem<br />
entre si quem ocupará<br />
as vagas de efetivos e<br />
suplentes. Em caso de<br />
empates ou indecisão a<br />
Comissão organizadora<br />
procede a um sorteio.<br />
Bárbara Dias<br />
Visita do PET-Bioquímica ao Instituto Inhotim<br />
Recentemente, o grupo<br />
PET-Bioquímica, produtor<br />
do <strong>Boletim</strong> <strong>BioPESB</strong>, teve<br />
o prazer de visitar um dos<br />
parques ecológicos mais<br />
renomados de Minas Gerais:<br />
O Inhotim, localizado<br />
no município de Brumadinho,<br />
MG.<br />
Considerado uma instituição<br />
sem fins lucrativos,<br />
o Instituto atualmente se<br />
destina à conservação, exposição<br />
e produção de trabalhos<br />
contemporâneos de<br />
arte, sendo referência também<br />
no aspecto ambiental,<br />
possuindo um rico acervo<br />
botânico, criado através<br />
da introdução de coleções<br />
de plantas nativas de diferentes<br />
partes do Brasil.<br />
Ao longo dos anos, sua<br />
estrutura foi desenvolvida,<br />
de modo que, em 2006, o<br />
instituto deixou de ser uma<br />
opção apenas de visitação<br />
pré-agendada de escolas<br />
de Brumadinho e região,<br />
para se tornar aberto a<br />
Alunos e tutor do PET-Bioquímica<br />
visitam o Inhotim, Brumadinho – MG<br />
Foto: Lucas Passos<br />
toda população. A partir<br />
de então, o número de visitantes<br />
cresceu. Em 2009<br />
o instituto recebeu mais de<br />
160 mil pessoas, de diversas<br />
partes do país e do<br />
mundo.<br />
Outro aspecto que motivou<br />
a visitação do grupo<br />
PET foi conhecer alguns<br />
projetos desenvolvidos<br />
pela Diretoria de Inclusão e<br />
Cidadania do próprio instituto,<br />
que visam incentivar e<br />
Sede administrativa do PESB<br />
Instituto Inhotim<br />
tornar acessível o conhecimento<br />
cultural e ambiental<br />
do parque.<br />
Durante o dia da visita,<br />
o grupo pôde conferir a<br />
V Mostra cultural de Música,<br />
Arte e Cultura no Vale,<br />
onde as bandas das cidades<br />
de Brumadinho, Bonfim<br />
e Moeda e os corais Inhotim<br />
Encanto e a Escola de<br />
Cordas apresentaram seus<br />
trabalhos musicais.<br />
Foto: Laurielen Gurgel Pacheco<br />
Reprodução<br />
Carolina Brás