mortas_da_perestroika_v2-0
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Se você já leu As Mortas <strong>da</strong> Perestroika 1.0, boas notícias: esta aqui<br />
é uma edição revisa<strong>da</strong>. Demos um tapinha ali, outro aqui. E ain<strong>da</strong><br />
temos uma sequência de conselhos inéditos. Está tudo no Capítulo 9.<br />
Se quiser ganhar tempo, pule direto para lá.<br />
A sessão posts também sofreu drásticas mu<strong>da</strong>nças, principalmente<br />
com novos posts, que foram escritos no intervalo entre a primeira e a segun<strong>da</strong><br />
edição. Para você, que já leu o Mortas 1.0, vale <strong>da</strong>r uma olha<strong>da</strong>.<br />
A terceira novi<strong>da</strong>de é a própria revisão em si. Que me forçou a cortar<br />
muita coisa. Principalmente, as contribuições de profissionais do mercado.<br />
Agradeço muito e adoraria mantê-las. Mas percebi uma coisa:<br />
se a minha visão sobre comunicação mudou nesse meio tempo, a<br />
deles também poderia ter mu<strong>da</strong>do.<br />
Aqueles conselhos faziam parte de um contexto específico. E eu devia<br />
respeitá-lo.<br />
A solução seria consultar um a um. Como perdi contato <strong>da</strong> maioria<br />
dos profissionais, fiquei meio sem saí<strong>da</strong>. Se deixasse só algumas colaborações,<br />
<strong>da</strong>ria margem para confusão. Se deixasse todos, certamente<br />
ouviria alguma reclamação.<br />
Para não correr riscos, fiz o mais seguro: cortei todos dessa edição e<br />
os mantive na versão anterior, dentro do cenário apropriado. Achei o<br />
mais justo. Com eles, colaboradores. E com você, leitor.<br />
Novamente: agradeço a colaboração de todos os profissionais que dividiram<br />
sua experiência com os nossos leitores. E recomendo a você,<br />
que não leu, a procurá-los.<br />
tg
Olá,<br />
meu nome é Tiago.<br />
Durante mais de uma déca<strong>da</strong>, fui re<strong>da</strong>tor publicitário. Trabalhava no<br />
departamento de criação de agências de propagan<strong>da</strong>, fazendo campanhas<br />
para clientes nacionais. (Se você não troca de canal na hora do<br />
intervalo, é bem possível que tenha visto algum comercial que eu fiz).<br />
Hoje, dirijo – ao lado do meu sócio, Felipe Anghinoni – uma escola<br />
chama<strong>da</strong> Perestroika. Se você já ouviu falar <strong>da</strong> gente, legal. Se você<br />
nunca ouviu falar, não tem problema.<br />
Para seguir a leitura, a única coisa que você tem que saber sobre a<br />
Perestroika é que nós somos uma escola de criativi<strong>da</strong>de. Na ver<strong>da</strong>de,<br />
uma escola de ativi<strong>da</strong>des criativas. Temos, obviamente, projetos<br />
ligados à publici<strong>da</strong>de. Mas também em empreendedorismo, literatura,<br />
design, mo<strong>da</strong>, futebol como negócio, internet, comportamento do<br />
consumidor, arquitetura efêmera, poker profissional. E mais um monte<br />
de coisas que você não encontra em nenhum outro lugar.<br />
Mas vamos ao que interessa:<br />
No meu tempo de re<strong>da</strong>tor, um dos hábitos que eu tinha era receber<br />
candi<strong>da</strong>tos a estágio. As telefonistas <strong>da</strong>s agências até já sabiam: se<br />
alguém ligava querendo mostrar a pasta, passavam direto para o<br />
meu ramal.<br />
Fazia isso por vários motivos. O primeiro é que eu me sentia em dívi<strong>da</strong><br />
com o mercado. Muita gente me ajudou no início <strong>da</strong> carreira, sem<br />
nem me conhecer direito. Na<strong>da</strong> mais justo do que manter a Corrente<br />
do Bem.
Em segundo, porque eu sempre gostei de ser um caça-talentos. Então,<br />
quanto mais pastas eu via, maior era a chance de eu encontrar<br />
um Pelé no início de carreira. Esse meu costume se tornou tão comum<br />
que meu caderninho virou um departamento de RH informal. Quando<br />
a nossa equipe precisava de alguém, sempre me consultavam. E até<br />
quando amigos de outras agências estavam em busca de estagiário,<br />
meu telefone tocava.<br />
Por fim, essa era uma maneira de aprender também. Quando você<br />
se força a <strong>da</strong>r opinião técnica sobre um assunto, você precisa buscar<br />
no seu banco de <strong>da</strong>dos motivos para criticar ou elogiar determina<strong>da</strong><br />
peça. Esse exercício aguçava o meu critério e melhorava o meu próprio<br />
trabalho.<br />
E aí aconteceu um negócio engraçado. De tanto avaliar pastas, os<br />
candi<strong>da</strong>tos a estágio começaram a me ver como uma pessoa acessível<br />
dentro do mercado <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>. Um foi indicando outro,<br />
que foi indicando um terceiro, que falou para outro amigo. E quando<br />
eu vi, essa rotina de ver portfolios virou uma ver<strong>da</strong>deira rotina<br />
para mim.<br />
Mesmo saindo de agência (desde 2008 estou fulltime na Perestroika),<br />
ain<strong>da</strong> mantenho com alguns jovens publicitários – alguns nos nossos<br />
cursos, alguns pela amizade, alguns ain<strong>da</strong> do período de agência. E é<br />
interessante perceber que as dúvi<strong>da</strong>s e os dilemas prossionais continuam<br />
existindo – e continuam seguindo um certo padrão.<br />
Esse foi o grande motivo de escrever esse material. A ideia é reunir<br />
aqui as principais dúvi<strong>da</strong>s dos novatos <strong>da</strong> profissão que me procuraram<br />
nos últimos anos. Sejam dúvi<strong>da</strong>s sobre o mercado, sejam escolhas<br />
profissionais, sejam conselhos do ponto de vista técnico.<br />
Tudo o que está aqui, neste livro, saiu <strong>da</strong> minha cabeça. Mas muita<br />
coisa que está na minha cabeça veio de outras fontes. Por isso, na<strong>da</strong><br />
mais justo do que listar todo mundo que faz parte <strong>da</strong> ficha técnica.<br />
Certamente, a grande inspiração para começar a organizar esses conselhos<br />
foi o Manual do Estagiário, do Eugenio Mohallem. Um clássico<br />
<strong>da</strong> categoria. Mas além dele, também absorvi várias dicas do Criação<br />
Sem Pistolão, do Carlos Domingos. E muita coisa dos três livros do<br />
Paul Arden: It’s not how good you are, It’s how good you want to be /<br />
Whatever you think, think the opposite / God explained in a taxi cab.<br />
Os cinco são leituras praticamente obrigatórias para quem está começando.<br />
Também extraí bastante coisa <strong>da</strong>s conversas que tenho feito por força<br />
<strong>da</strong> Perestroika. Para citar apenas alguns nomes que dividiram seu a<br />
perspectiva de vanguar<strong>da</strong> do Roberto Martini (Cubo.cc), a visão de<br />
Riqueza Social do Lucas Mello (Livead), o olhar multidisciplinar do<br />
Eduardo Camargo (Mutato), as referências incansáveis do Carlos Merigo<br />
(Brainstorm9), a visão inovadora de clientes como Google (Félix<br />
Ximenes), Coca-cola (Gian Martinez) e Red Bull (Cássio Côrtes). As visões<br />
sobre criativi<strong>da</strong>de e inovação de gente como Fred Gelli, Ronaldo<br />
Fraga, Claude Troigos, Gringo Cardia, Emici<strong>da</strong>, Sebastián Borensztein,<br />
Lobão, Jum Nakao, Oskar Metsavaht, Federico Pistono, Lala Deheinzelin,<br />
MV Bill. Enfim, muita gente legal.<br />
Também respingam aqui as entrevistas que fiz num passado remoto<br />
(2007, 2008 e 2009), quando ain<strong>da</strong> era professor do curso de publici<strong>da</strong>de.<br />
Naquele momento, elas foram importantes para trazer os pontos<br />
de vista de profissionais relevantes do mercado offline. O próprio<br />
Eugenio Mohallem (na época, Diretor <strong>da</strong> Mohallem/Artplan), Ícaro Dória<br />
(na época, Diretor de Criação <strong>da</strong> Saa- tchi&Saatchi / Nova York),<br />
Marco Loco Bezerra (na época, Diretor de Criação <strong>da</strong> TBWA Berlim),<br />
Beto Baibich (na época, Diretor de arte na Crispin, Porter + Bogusky),<br />
Fernando Perottoni (na época, Diretor de arte <strong>da</strong> TBWA/Londres), Emiliano<br />
Trierveiller (na época, Diretor de Criação <strong>da</strong> TBWA/ Berlim), entre<br />
outros.<br />
Mas veja bem: não quero comprometer nenhum desses profissionais.<br />
Depois de ouvi-los, tirei minhas próprias conclusões. Nunca vou usar<br />
7
aspas, e raramente vou citá-los. Sem falar que todos poder ter mu<strong>da</strong>do<br />
de opinião nesse meio tempo. O que está escrito aqui é resultado<br />
do meu filtro.<br />
Falando em filtro: talvez este seja o grande valor deste material. A<br />
possibili<strong>da</strong>de de reunir to<strong>da</strong>s essas dicas em apenas um documento,<br />
de forma (mais ou menos) organiza<strong>da</strong>.<br />
Outra coisa boa é que ele foi a<strong>da</strong>ptado às mu<strong>da</strong>nças que a nossa<br />
propagan<strong>da</strong> sofreu nos últimos anos. (O Manual do Estagiário, por<br />
exemplo, foi escrito em 1997. De lá para cá, muita coisa mudou.<br />
Além disso, ele sempre esteve muito focado em São Paulo. Determina<strong>da</strong>s<br />
situações simplesmente não fazem sentido no dia-a-dia de<br />
outros mercados.) Apesar disso, a veloci<strong>da</strong>de de comunicação é tão<br />
rápi<strong>da</strong> que este manual, mesmo reeditado e revisado, corre o sério<br />
risco de estar com algumas informações defasa<strong>da</strong>s.<br />
Importante: não se esqueça de considerar a seguinte equação. Por<br />
um lado, estou fora do mercado, e realmente não estou vivendo o<br />
dia-a-dia <strong>da</strong>s empresas de comunicação. Por outro, convivemos nos<br />
nossos cursos com gente que está na vanguar<strong>da</strong> <strong>da</strong> comunicação do<br />
Brasil (em alguns casos, do mundo).<br />
Para fechar, enten<strong>da</strong> que a Perestroika é uma empresa um pouco<br />
diferente nesse sentido. Ela faz sua própria comunicação. Somos médico<br />
e monstro <strong>da</strong>s nossas próprias teses.<br />
Portanto, ao ler este manual, já treine uma <strong>da</strong>s principais quali<strong>da</strong>des que<br />
um profissional de comunicação deve ter: leia tudo com muito critério.<br />
Na<strong>da</strong> aqui é definitivo. São apenas opiniões, basea<strong>da</strong>s na minha experiência<br />
pessoal e na forma como alguns profissionais com quem<br />
conversei encaram o negócio <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>.<br />
Isso aqui não é um livro de auto-aju<strong>da</strong>. É um livro somente de<br />
aju<strong>da</strong>. Muitas dessas dicas funcionaram comigo e talvez ain<strong>da</strong><br />
funcionem para outras pessoas.<br />
Espero que seja o seu caso.
P.S.:<br />
Esse livro é uma obra que respeita o conceito Freemium, com distribuição<br />
gratuita através do site <strong>da</strong> Perestroika: www.<strong>perestroika</strong>.com.br<br />
(Caso o livro tenha repercussão positiva, e caso exista interesse por<br />
uma versão impressa, faremos uma leva de poucas uni<strong>da</strong>des – to<strong>da</strong>s<br />
elas cobra<strong>da</strong>s. Entretanto, mesmo que isso aconteça, a versão gratuita<br />
continuará disponível para download no nosso site.)<br />
Se alguém quiser vendê-lo para você, não compre. É picareta na certa.<br />
O que fizemos, para satisfazer aqueles que insistiram muito, foi abrir<br />
uma conta especificamente para receber contribuições espontâneas.<br />
Então, se você achar o livro uma porcaria, não deposite na<strong>da</strong>. Nós já<br />
fizemos você perder o seu tempo.<br />
Se você achar bom, mas estiver com preguiça, não deposite na<strong>da</strong><br />
também. Não queremos que você passe trabalho.<br />
Se você achar muito bom, mas estiver sem grana, a gente entende.<br />
Fica para a próxima.<br />
Agora, se você achar o livro bacana, e quiser contribuir, legal. Deposite<br />
o quanto achar justo. Não existe valor sugerido. Você é quem man<strong>da</strong>.<br />
Entre em contato pelo email tiago@<strong>perestroika</strong>.com.br que a gente<br />
explica como fazer o depósito.<br />
Parte do valor será revertido em outras ações Freemium <strong>da</strong> Perestroika.<br />
11
P.S. 2:<br />
Este livro, como bom filhote <strong>da</strong> internet, é Beta. E sempre será. Estará<br />
em constante atualização e, de tempos em tempos, sofrerá as mu<strong>da</strong>nças<br />
necessárias. To<strong>da</strong>s as novas versões estarão disponíveis para<br />
download gratuitamente nosso site: www.<strong>perestroika</strong>.com.br<br />
Lançar um Work in progress foi uma decisão difícil. Não queria que ele<br />
viesse ao mundo prematuro. Não queria que ele nascesse com cara<br />
de joelho.<br />
Mas também não <strong>da</strong>va para esperar mais. Especialmente depois<br />
que eu me dei conta que esse job estava há exatos nove meses na<br />
minha pauta.<br />
Se você tem sugestões, reclamações, dúvi<strong>da</strong>s, pode escrever para<br />
tiago@<strong>perestroika</strong>.com.br. Vou adorar ouvir o que você achou. E vou<br />
considerar tudo o que você disser para a próxima versão.<br />
Por fim, é legal saber que, por ser de graça, decidimos não contratar<br />
um revisor oficial. Estamos contando com a sua boa vontade: se você<br />
encontrar qualquer errinho, nos perdoe. E nos avise.<br />
13
P.S. 3:<br />
A ilustração <strong>da</strong> capa e todo projeto gráfico <strong>da</strong> edição 2.0 é de Vinícius<br />
Souza. Um trabalho incrível em “tempo recorde”. Muito obrigado.<br />
Se você também gostou, entre em contato com ele e agradeça a dedicação:<br />
facebook/vinicius.nrs. O cara merece.<br />
15
Índice<br />
Capítulo 1<br />
Manual Express • 18<br />
Capítulo 2<br />
Montando o portfólio • 40<br />
Capítulo 3<br />
Dentro <strong>da</strong> agência • 74<br />
Capítulo 4<br />
Trocando de emprego • 96<br />
Capítulo 5<br />
Primeiros dilemas profissionais • 110<br />
Capítulo 6<br />
Melhorando seu trabalho • 138<br />
Capítulo 7<br />
O novo criador • 156<br />
Capítulo 8<br />
O que aconteceu comigo • 170<br />
Capítulo 9<br />
As novas <strong>mortas</strong> • 224<br />
Capítulo 10<br />
Posts • 212
capÍtulo 1
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
Se você está sem saco de ler todo esse livro, pelo menos preste<br />
atenção nesses toques.<br />
São pílulas. E pílulas do dia seguinte: você lê e, amanhã mesmo,<br />
pode colocar em prática.<br />
Bem vindo ao nosso drive thru de conselhos profissionais.<br />
21
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
Vai lá e faz.<br />
To<strong>da</strong>s as pessoas do mundo têm boas ideias. Inclusive você. A grande<br />
diferença é que algumas conseguem executá-las. Portanto, não<br />
deixe seus planos mofando. Ideia na gaveta é a mesma coisa que<br />
ideia inexistente.<br />
a Vi<strong>da</strong> é a melhor<br />
referência.<br />
Você só consegue criar coisas legais se você for um cara legal. Isso<br />
significa viver situações inusita<strong>da</strong>s. Sair <strong>da</strong> zona de conforto. Sair do<br />
lugar comum. Lembre-se: o seu trabalho está intimamente ligado às<br />
experiências que você passou. Se você for uma pessoa com vivências<br />
únicas, o seu trabalho será único. E aí, ninguém vai conseguir copiá-lo.<br />
23
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
a quanti<strong>da</strong>de<br />
faz a quali<strong>da</strong>de.<br />
Você conhece a teoria <strong>da</strong> toalha molha<strong>da</strong>? Ela é bem simples: você<br />
pega uma toalha molha<strong>da</strong> e torce até sair to<strong>da</strong> água. Daí, você torce<br />
de novo, e vai ver que sai mais um pouco de água. E se você torcer<br />
uma terceira vez, vai sair mais um pouquinho. E mais um pouquinho.<br />
E mais um pouquinho. Insistir faz parte. As primeiras soluções são as<br />
mais fáceis, mas as mais óbvias. Não surpreendem e, pior: provavelmente<br />
alguém já teve antes de você.<br />
“mais ou menos” é menos.<br />
Se quando você acha que o seu trabalho está bom, muitas vezes ele<br />
é reprovado, imagine quando você acha que ele está médio. Não se<br />
acostume com a mediocri<strong>da</strong>de. Estresse a sua criação até chegar no<br />
seu limite.<br />
25
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
trabalhar com criação<br />
é diVertido, mas é trabalho.<br />
e trabalho às Vezes<br />
é um saco.<br />
Quando você vai no cinema, paga o ingresso. Quando você viaja, paga<br />
o avião. Quando você trabalha em propagan<strong>da</strong>, eles é que pagam<br />
você. E não pense que é porque você é um cara legal. Não: trabalho<br />
é trabalho. Por mais apaixonado que você seja por publici<strong>da</strong>de, há<br />
momentos em que até um monge budista perde a paciência.<br />
o melhor jeito de ser<br />
puxa-saco é com um<br />
bom trabalho<br />
Quem decide segurar o seu emprego apenas com bajulações normalmente<br />
se dá mal. Nem a Monica Lewinsky, que era uma estagiária<br />
extremamente dedica<strong>da</strong> ao patrão, conseguiu se manter no cargo.<br />
27
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
na maioria <strong>da</strong>s Vezes,<br />
a montanha não Vem<br />
a maomé.<br />
Por mais desistimulante que isso seja para alguém que está iniciando,<br />
é importante dizer: chegar lá vai <strong>da</strong>r trabalho.<br />
Você aprende sozinho.<br />
Para sobreviver numa empresa de comunicação é preciso ter um pouquinho<br />
de Chuck Norris no DNA. Ninguém tem tempo de pegar você<br />
pela mão e ensiná-lo a fazer as coisas. Seja observador, veja como os<br />
outros fazem, descubra o que eles gostam. E vá à luta.<br />
29
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
não encha o saco.<br />
Você tem todo direito de fazer quantas perguntas quiser. Mas por favor:<br />
existe uma linha tênue que separa o cara curioso do mala sem<br />
alça. Todo mundo adora um estagiário interessado. E todo mundo<br />
abomina um estagiário chato.<br />
quem se apega demais às<br />
ideias é porque tem poucas.<br />
Se você teve uma ideia bacana, e acredita nela, defen<strong>da</strong> até um certo<br />
limite. Se não aprovarem, parta para outra.<br />
31
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
apren<strong>da</strong> a li<strong>da</strong>r com<br />
a frustração:<br />
ela é a maioria<br />
do nosso trabalho.<br />
Você já se deu conta que praticamente tudo o que criamos vai para o<br />
lixo? No final <strong>da</strong>s contas, se tudo der certo, por mais que você tenha<br />
muitas ideias legais para um job, só uma vai sobreviver e veicular.<br />
ideias para publicitários<br />
só atingem um público:<br />
os publicitários.<br />
Faz cinco anos que saí <strong>da</strong> publici<strong>da</strong>de e, todos os anos, pós-Festival<br />
de Cannes, é sempre a mesma discussão. “Temos que parar de fazer<br />
fantasmas”. A questão é: só os publicitários podem mu<strong>da</strong>r isso. É<br />
uma decisão particular de ca<strong>da</strong> um. Recomendo que você não entre<br />
nessa. Nem experimente, fantasma porque é como crack: parece inofensivo,<br />
mas vicia de primeira. Sempre prefira investir sua energia em<br />
campanhas que caem no gosto do grande público, que viram parte <strong>da</strong><br />
cultura popular, que entram para a história <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>. Elas são<br />
muito diferentes <strong>da</strong>quelas ideias assépticas, comuns em festivais.<br />
33
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
é melhor ser co-autor de<br />
algo brilhante a ser autor<br />
solitário de algo comum.<br />
Acho que a frase diz tudo.<br />
a maioria dos gênios <strong>da</strong><br />
propagan<strong>da</strong> acor<strong>da</strong> cedo<br />
e dorme tarde.<br />
Os melhores profissionais que eu conheci na publici<strong>da</strong>de eram pessoas<br />
bastante dedica<strong>da</strong>s. A fantasia do gênio que senta na cadeira e<br />
tem uma ideia brilhante, assim, num lampejo, só existe na cabeça de<br />
dois tipos de profissionais. Os iniciantes, ain<strong>da</strong> muito ingênuos e deslumbrados.<br />
E a galera old school, que confunde propagan<strong>da</strong> com arte.<br />
35
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
propagan<strong>da</strong> é a sua<br />
carreira, não a sua Vi<strong>da</strong>.<br />
É normal que um criador de publici<strong>da</strong>de goste de criar publici<strong>da</strong>de.<br />
Mas é bem possível que ele se divirta mais fazendo outras coisas,<br />
como ver futebol na TV, comer churrasco com os amigos ou viajar ao<br />
redor do mundo. Acredite: isso é completamente sadio.<br />
uma ideia só é original<br />
até outra pessoal pensar<br />
a mesma coisa – e fazer<br />
antes de Você.<br />
Hoje em dia, um criador em Nova York e um na Sibéria têm acesso às<br />
mesmas referências. Então, não fique procrastinando. Ou você corre o<br />
sério risco de ver a sua lin<strong>da</strong> ideia estampa<strong>da</strong> na marca concorrente.<br />
37
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />
câncer é um problema<br />
graVe. propagan<strong>da</strong> é só<br />
propagan<strong>da</strong>.<br />
Sempre que você se deparar com uma situação em que parece que o<br />
fim do mundo está próximo, lembre-se: isso é só propagan<strong>da</strong>.<br />
Ninguém vai morrer.<br />
39
capÍtulo 2
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
o que é um portfólio?<br />
O mercado está cheio de bons profissionais, com trabalhos fantásticos<br />
e campanhas memoráveis. Mas também está cheio de enroladores,<br />
que só têm pose e nunca fizeram na<strong>da</strong> de relevante.<br />
Na hora de contratar alguém, como saber se o candi<strong>da</strong>to faz parte do<br />
primeiro ou do segundo grupo?<br />
Para acabar com essa dúvi<strong>da</strong>, inventaram um negócio chamado portfólio.<br />
O nome é chique. Mas não passa de um compilado, que reúne todo<br />
o seu histórico de trabalhos.<br />
O objetivo do portfólio é desmascararar os metidos e provar que o seu<br />
passado justifica uma contratação.<br />
o portfólio analógico<br />
já era.<br />
No meu tempo, o portfólio era uma pasta, com os anúncios impressos<br />
em papel fotográfico. Hoje, a grande maioria dos profissionais avalia<br />
as peças em formato digital. Porque, convenhamos: é mais fácil para<br />
ambos os lados.<br />
Diria mais: se a pessoa que está contratando você exige um portfólio<br />
físico, preste atenção. Isso já indica alguma coisa.<br />
Como será apresentado? Bom, aí é com você. Pode ser um portfólio<br />
on-line. Constantemente atualizado. Mas é bom ter também JPGs <strong>da</strong>s<br />
suas peças. Nem muito pesados, para não atolar a caixa do cara. Nem<br />
muito leves, para a resolução não ficar baixa demais.<br />
O ideal é ter três tipos de arquivos. Bem pesado, com a máxima resolução,<br />
preservando os detalhes <strong>da</strong>s suas imagens. Um Tamanho intermediário,<br />
que preserve a quali<strong>da</strong>de, mas não atole o email de ninguém.<br />
E bem levinho, em caso de emergências.<br />
Não existe um padrão para o portfólio on-line. Acredito que o jeito<br />
mais fácil seja fazer um blog, Flickr, Tumblr. Ou se registrar num site<br />
como Behance ou Carbonmade, as centrais de portfólios mais populares<br />
<strong>da</strong> internet.<br />
E só para não deixar passar: na edição anterior, eu disse que a pasta<br />
impressa era importante. “Talvez, <strong>da</strong>qui uns anos, ela caia em desuso.<br />
Mas hoje ain<strong>da</strong> vale ter uma.” Pois nesse meio tempo, acho que ela<br />
morreu e está enterra<strong>da</strong> a sete palmos.<br />
43
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
portfólio sempre<br />
atualizado.<br />
Nunca me ligaram e disseram: Ouvi falar bem do seu trabalho. Que tal<br />
falarmos <strong>da</strong>qui um mês?<br />
Em agência de propagan<strong>da</strong>, na<strong>da</strong> tem prazo. Nem entrevista. Quando<br />
estão procurando gente, é sempre para ontem.<br />
Montar um portfólio na correria é uma dupla insani<strong>da</strong>de. Primeiro, porque<br />
é bastante estressante correr atrás dos arquivos com pouco prazo.<br />
Segundo, porque é um suicídio profissional. Já pensou, perder aquela<br />
vaga preciosa porque você deixou o portfólio defasado?<br />
Sempre tenha a pasta impecável. Tem gente que faz atualizações<br />
mensais. Tem gente que faz atualizações semanais. Nesse sentido,<br />
eu sempre fui bem CDF: fazia atualizações instantâneas. Se saía um<br />
anúncio legal, já separava o arquivo para mim.<br />
Para não ficar empurrando com a barriga, o jeito mais fácil é já deixar<br />
no seu desktop um folder Portfólio. Fez coisa bacana? Arrasta para lá.<br />
Se você for re<strong>da</strong>tor, encha o saco do seu dupla. É fun<strong>da</strong>mental estar<br />
com as peças ao seu alcance.<br />
como selecionar<br />
as peças <strong>da</strong> sua pasta.<br />
A regra básica é: o que joga a sua pasta para baixo, sai. O que joga a<br />
sua pasta para cima, fica.<br />
O problema é que, se você mostrar a sua pasta para dez criadores<br />
diferentes, ca<strong>da</strong> um vai dizer uma coisa. A única pista que você vai<br />
ter é sobre o que é muito ruim e o que é muito bom. Nisso, os caras<br />
experientes costumam concor<strong>da</strong>r.<br />
Em geral, os critérios são muito subjetivos. Por isso, não existe certo<br />
e errado. Existe o certo e errado para ca<strong>da</strong> situação.<br />
Não adianta chegar com um monte de ideias bundonas numa agência<br />
que faz só faz anúncios fora <strong>da</strong> casinha. E vice-versa.<br />
Você tem que se adequar ao seu público-alvo. Até na hora <strong>da</strong> entrevista.<br />
45
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
na matemática <strong>da</strong> pasta,<br />
1 + 1 = 1.<br />
Antes de sair <strong>da</strong> minha última agência, vivi uma situação inusita<strong>da</strong>. Um<br />
candi<strong>da</strong>to a estágio me ligou pedindo para mostrar a sua pasta, que<br />
tinha três anúncios. Sugeri que ele me procurasse novamente quando<br />
tivesse, no mínimo, dez peças.<br />
No dia seguinte ele me ligou. Fiquei um pouco intrigado. Mas marquei<br />
a entrevista mesmo assim.<br />
Como combinado, ele chegou com as dez peças. Mas elas faziam<br />
parte <strong>da</strong> mesma campanha. Dez anúncios, todos bem parecidos, com<br />
pequenas alterações de cor entre um e outro.<br />
Não sabia nem por onde começar.<br />
Esse episódio me ajudou a criar a Matemática <strong>da</strong> Pasta. Ela é simples<br />
e evita que você pague esse tipo de mico.<br />
Ca<strong>da</strong> peça vale um. Um anúncio, um outdoor, uma embalagem, um<br />
logo, um jingle, uma ação. Tudo isso vale um.<br />
Até aí, fácil.<br />
Se você tem uma campanha com três anúncios, e ca<strong>da</strong> um deles tem<br />
uma ideia diferente, contam três peças. Agora, se você tem uma campanha<br />
com três anúncios, e os três anúncios são razoavelmente parecidos,<br />
conta apenas um.<br />
Para complicar ain<strong>da</strong> mais: se essa campanha de três anúncios diferentes<br />
tiver um desdobramento (por exemplo, um outdoor), ele conta<br />
como uma nova peça. A não ser que ele seja apenas uma reprodução<br />
de um dos anúncios. Aí não vale na<strong>da</strong>.<br />
Só por favor: não leve ao pé <strong>da</strong> letra. A Matemática <strong>da</strong> Pasta é bem flexível<br />
e pode sofrer a<strong>da</strong>ptações caso a caso. O objetivo principal é ser um<br />
guia para não deixar o seu portfólio nem muito curto, nem longo demais.<br />
47
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
ordem.<br />
O Manual do Estagiário consagrou uma maneira de montar as pastas<br />
que funciona muito bem. Você pega as suas dez peças e coloca em<br />
ordem. Começando pela pior até a melhor.<br />
10 (a pior), 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1 (a melhor).<br />
Aí, você joga a melhor lá para o início:<br />
1 (a melhor), 10 (a pior), 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2 (a segun<strong>da</strong> melhor).<br />
Assim, você começa <strong>da</strong>ndo um chute no saco. E termina a pasta sem<br />
fazer feio, deixando uma boa impressão.<br />
Eu sou um defensor desse sistema. Mas para falar a ver<strong>da</strong>de, nunca<br />
segui esse método fielmente. Sempre usei como ponto de parti<strong>da</strong>.<br />
Depois, mu<strong>da</strong>va a partir de outras variáveis que considero igualmente<br />
importantes.<br />
Nunca contei esse meu método para ninguém. Me sentia meio herege<br />
de contrariar as dicas do Mohallem. Só fiquei mais tranquilo no<br />
dia em que tive a oportuni<strong>da</strong>de de entrevistar o próprio Eugenio. Ele<br />
comentou que ficava chocado ao ver algumas pessoas seguindo a<br />
ordem cegamente.<br />
Aí eu relaxei.<br />
Então, aí vai a minha sugestão: faça o 1, 10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2.<br />
Em segui<strong>da</strong>, avalie a relação de títulos vs. ideias visuais. Você não<br />
pode ter os cinco primeiros anúncios de um grupo e os cinco últimos<br />
de outro. Fica muito previsível. Seu objetivo é justamente surpreender<br />
quem está vendo a pasta, não é?<br />
O mesmo vale para design gráfico vs. design 3D ou propagan<strong>da</strong> offline<br />
vs. on-line. Monte de um jeito que fique interessante.<br />
Outra coisa importante é a relação de clientes. Se você tem no seu<br />
portfólio um total de nove campanhas, sendo três para ca<strong>da</strong> cliente,<br />
não deixe elas juntinhas.<br />
Cliente 1, Cliente 1, Cliente 1, Cliente 2, Cliente 2, Cliente 2, Cliente 3,<br />
Cliente 3, Cliente 3.<br />
Misture. Não pode parecer uma pasta com três blocos. Deve parecer<br />
uma pasta com nove campanhas.<br />
Cliente 1, Cliente 2, Cliente 3, Cliente 2, Cliente 1, Cliente 2, Cliente 3,<br />
Cliente 3, Cliente 1.<br />
E por último: cuide <strong>da</strong>s cores <strong>da</strong>s suas peças. Umas são mais avermelha<strong>da</strong>s.<br />
Outras têm fundo branco. Outras são escuras. Não deixe ela<br />
monótona. Crie estímulos visuais para quem estiver vendo.<br />
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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
re<strong>da</strong>tor Vs. diretor de<br />
arte, offline Vs. online.<br />
Por mais que muitas agências já tenham migrado para um modelo híbrido,<br />
em que não há mais divisão de papeis, a ver<strong>da</strong>de é que a grande maioria<br />
do mercado ain<strong>da</strong> funciona de forma segmenta<strong>da</strong>.<br />
Re<strong>da</strong>tor é re<strong>da</strong>tor, DA é DA. Existe um departamento para off e um<br />
para on.<br />
Na teoria, sabemos que não deveria ser assim. Mas, ver<strong>da</strong>de seja dita:<br />
é bem complicado fazer essa migração.<br />
Enquanto ela não acontece, algumas sugestão para você.<br />
pequeno cui<strong>da</strong>do para se<br />
ter com os exercÍcios de<br />
fora <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>.<br />
Se o portfólio publicitário não estiver agra<strong>da</strong>ndo, não ultrapasse o limite<br />
do bom senso. Os exercícios fora <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> devem ser o tiro<br />
de misericórdia, não um tiro no próprio pé.<br />
Vamos supor que a sua pasta seja fraca. Alguém teve paciência para<br />
criticar vários títulos, textos e conceitos. Ficou lá, explicando por A+B<br />
porque você deveria refazer seus anúncios.<br />
Aí, no final <strong>da</strong> entrevista, você insiste para que ele leia algumas crônicas<br />
que você imprimiu do seu blog. Parece um pouco Joselito, não?<br />
Além disso, saiba que se o portfólio em si não estiver lá essas coisas,<br />
dificilmente uma parede que você grafitou ou uma letra <strong>da</strong> sua ban<strong>da</strong><br />
vai salvar a sua pasta. (Minha sincera opinião? Isso deveria contar<br />
mais do que os próprios anúncios. Mas não é o que o mercado costuma<br />
achar.)<br />
Os exercícios fora <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> costumam ser a cerejinha. Por isso,<br />
capriche no bolo.<br />
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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
modernices.<br />
O perfil do portfólio mu<strong>da</strong> na mesma veloci<strong>da</strong>de que a propagan<strong>da</strong>.<br />
Então, ter ideias mais contemporâneas podem chamar a atenção. Algumas<br />
possibili<strong>da</strong>des:<br />
1. Um vídeo “viral” (muito cui<strong>da</strong>do com esse termo)<br />
2. Um prédio como solução de ambient media<br />
3. Estratégias de relacionamento on-line<br />
4. Um aplicativo para Iphone<br />
5. Um jogo de videogame<br />
Só não esqueça que esse tipo de solução criativa está em fase experimental<br />
nas maioria <strong>da</strong>s agências. Não é o job do dia-a-dia. Portanto,<br />
serve mais para mostrar o seu potencial criativo do que para demonstrar<br />
uma expertise que será aplica<strong>da</strong> na agência.<br />
Pelo menos, que será aplica<strong>da</strong> por você, que, no início, pegará só craca.<br />
por melhor que seja<br />
o seu currÍculo, ele só<br />
Vai atrapalhar Você.<br />
Durante a entrevista, vão perguntar se você está estu<strong>da</strong>ndo, onde você<br />
trabalhou, que programas domina, e tudo mais que julgarem necessário.<br />
Em outras palavras: não existe muita necessi<strong>da</strong>de de um currículo impresso.<br />
Para falar a ver<strong>da</strong>de, até pega mal. É até uma pia<strong>da</strong> entre os criadores:<br />
Veio um estagiário só com currículo querendo emprego, pode?<br />
Gaste tempo na sua pasta que vale mais a pena.<br />
Só não esqueça de deixar o seu contato. Pode ser um cartão de visitas<br />
ou seu nome e e-mail/celular na capa.<br />
Perder a vaga com um portfólio ruim, vá lá. Agora, perder a vaga por<br />
sumiço, aí já é demais.<br />
Se você quer que dê namoro, tem que deixar pelo menos o telefone, né?<br />
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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
o melhor jeito de fazer<br />
uma pasta é trabalhando<br />
numa agência. mas para<br />
entrar numa agência,<br />
Você precisa de uma<br />
pasta. e aÍ?<br />
Aí você senta na frente do computador, pensa num briefing que ren<strong>da</strong><br />
uma boa campanha e começa a trabalhar.<br />
Mas eu nunca trabalhei, como vou saber o que é um bom briefing?<br />
Ora, um bom briefing é aquele que você gostaria de ter em mãos. Normalmente,<br />
são assuntos nos quais você já se interessa. Quem gosta<br />
de futebol provavelmente vai curtir criar para a Nike. Quem é viciado<br />
em videogame vai adorar pensar em ideias para Playstation.<br />
Só não perca muito tempo nessa parte do processo. Pensar num<br />
briefing é infinitamente mais fácil do que pensar num anúncio para<br />
esse briefing.<br />
Outra boa maneira de iniciar a pasta é acionar o seu Banco de ideias.<br />
Todo criador tem um arquivo de Word chamado Banco_de_ideias.doc.<br />
Alguns preferem um caderninho de anotações (especialmente os diretores<br />
de arte) porque dá para rabiscar.<br />
Se você ain<strong>da</strong> não tem nenhum dos dois, comece hoje mesmo.<br />
Agora, se na<strong>da</strong> disso fez você se mexer, ain<strong>da</strong> existe uma última esperança.<br />
O Criação Sem Pistolão sugere o Método <strong>da</strong> Revista Veja. Você<br />
abre a revista em qualquer página que tenha pelo menos um anúncio.<br />
Aí, você identifica o briefing e tenta criar uma ideia melhor para o mesmo<br />
problema do anúncio.<br />
É difícil. Mas se você conseguir fazer anúncios melhores que os <strong>da</strong><br />
Veja, eu tenho certeza que você consegue uma vaga.<br />
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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
seja o seu próprio<br />
atendimento.<br />
É legal você se colocar um prazo. Ou vai ficar empurrando com a<br />
barriga eternamente. O anúncio de amanhã sempre pode ficar para<br />
depois de amanhã.<br />
Então, caso você esteja com tempo livre, sugiro que você coloque a<br />
seguinte meta: produzir uma pasta com dez peças em um mês.<br />
É bem razoável. Você terá 2,5 dias para criar e executar ca<strong>da</strong> anúncio.<br />
O que, numa agência de ver<strong>da</strong>de, é um luxo. E ain<strong>da</strong> terá todos os<br />
finais de semana livres para não pensar em propagan<strong>da</strong>.<br />
Se você já tem uma pasta, mas quer trocar algumas peças que foram<br />
critica<strong>da</strong>s, dá para manter a média de 2,5 dias por peça.<br />
Eu mesmo já utilizei esse sistema. E como garoto-propagan<strong>da</strong> <strong>da</strong> minha<br />
própria ideia, afirmo com um sorriso no rosto: funciona!<br />
a hora <strong>da</strong> Ver<strong>da</strong>de:<br />
quando a pasta está boa<br />
para fazer uma entreVista?<br />
Assim como o surfista, que morre em busca <strong>da</strong> on<strong>da</strong> perfeita, você vai<br />
morrer e não vai ter o portfólio ideal.<br />
A moral <strong>da</strong> pasta é justamente essa: estar sempre melhorando o seu<br />
conjunto de peças. Então, não adianta ficar pe<strong>da</strong>lando a entrevista.<br />
Uma hora você tem que cair no mar.<br />
Para ser um pouco mais prático: pense num mínimo de dez peças.<br />
Menos que isso é per<strong>da</strong> de tempo. Para você, que terá pouca coisa<br />
para ser avalia<strong>da</strong>. E para quem entrevista, que vai criar um buraco na<br />
agen<strong>da</strong> para analisar o seu trabalho.<br />
Acima de vinte peças também não precisa. Sinal de que você filtrou<br />
mal. Corre o sério risco de aborrecer o cara. E aborrecer também esposa<br />
do cara, que odeia jantar sozinha.<br />
Entre quinze e dezoito peças está na medi<strong>da</strong>.<br />
Outra coisa importante: assim que você tiver um portfólio, não enrole.<br />
Marque logo as entrevistas, mesmo que dê um medo. Imagine que o<br />
objetivo <strong>da</strong> conversa não é ser contratado. É ouvir críticas e melhorar<br />
a sua pasta. Para, numa próxima vez, aí sim disputar a vaga.<br />
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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
não precisa existir<br />
Vaga para marcar uma<br />
entreVista.<br />
Você está em casa e de repente toca o telefone. Fiquei sabendo que<br />
você gostaria de estagiar aqui na nossa agência. Estamos com uma<br />
vaga. Quer vir mostrar a pasta?<br />
Parece bizarro, mas é assim que alguns estu<strong>da</strong>ntes agem. Ficam esperando<br />
a oportuni<strong>da</strong>de, em vez de criá-la.<br />
O jeito mais fácil de conseguir uma entrevista é usando os seus contatos.<br />
Se você tem algum conhecido que trabalha em agência, peça<br />
para ele ver o seu trabalho. Dificilmente vão recusar.<br />
Se esse seu amigo for muito novato, peça para ele agilizar com outra<br />
pessoa mais experiente. Quase sempre dá certo. Ou simplesmente<br />
pegue o telefone e ligue para as agências. Pergunte se tem vaga para<br />
estágio. Se não houver, pergunte se alguém <strong>da</strong> Criação pode ver a<br />
sua pasta.<br />
O pior que pode acontecer é dizerem não. E você ficar na mesma.<br />
Não caia no truque do Fale conosco. Você provavelmente será ignorado.<br />
Por sinal, e-mail é uma ótima ferramenta para ignorar candi<strong>da</strong>tos<br />
a estágio. Ligar sempre é mais garantido.<br />
lugares legais para<br />
trabalhar. lugares ruins<br />
para trabalhar.<br />
To<strong>da</strong> empresa tem a cara do dono. E como ca<strong>da</strong> dono pensa de um<br />
jeito, as personali<strong>da</strong>des <strong>da</strong>s empresas também são muito diferentes.<br />
Não é difícil descobrir o estilo de ca<strong>da</strong> agência. Umas trabalham mais,<br />
outras trabalham menos. Umas pagam melhor, outras pagam pior.<br />
Umas têm mais benefícios, outras têm menos. Umas fazem mais festas,<br />
outras menos.<br />
É importante lembrar, também, que não é só o dono que faz o perfil <strong>da</strong><br />
empresa. Existem fatores externos e internos que influenciam. Como<br />
um novo Diretor de Criação ou uma mu<strong>da</strong>nça no cenário econômico.<br />
Pense na crise que tivemos há alguns anos (aquela que o Lula chamou<br />
de “marolinha”). Algumas empresas mais soltinhas ficaram assusta<strong>da</strong>s<br />
puxaram o freio de mão. E vice-versa.<br />
No meu tempo de estagiário, a F/Nazca era a agência com as ideias<br />
mais ousa<strong>da</strong>s. A DM9 era a agência mais sintoniza<strong>da</strong> com o novo<br />
padrão internacional. A Almap tinha a direção de arte e os títulos<br />
mais inteligentes.<br />
Evidente que, de lá para cá, houve mu<strong>da</strong>nças. Analise o que as agências<br />
estão fazendo, se informe com profissionais experientes. Vai ficar<br />
mais fácil para você entender a personali<strong>da</strong>de atual dessas agências.<br />
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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
entretanto.<br />
Não existe empresa perfeita. E como a grama do vizinho é sempre<br />
mais verde, você costuma perceber apenas os defeitos do lugar onde<br />
você trabalha. E não valorizar o que ele tem de legal.<br />
Olhe a metade cheia do copo.<br />
por fim.<br />
Vem o mais importante: você quer trabalhar nesse lugar?<br />
Sim, porque se convi<strong>da</strong>rem você, mas você não estiver a fim, ou achar<br />
que o lugar não contribui para o seu crescimento, não vá.<br />
Não conheço nenhum departamento de RH que pren<strong>da</strong> as pessoas<br />
na agência. (Apesar de imaginar que muitos adorariam.) Você é livre<br />
para ir e vir.<br />
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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
pasta para quem quer ser<br />
um criatiVo. mas não no<br />
departamento de criação.<br />
Muita gente me procura porque quer trabalhar com criação, mas não<br />
<strong>da</strong> forma tradicional. Uns se identificam mais com a área de Planejamento.<br />
Outros querem ter boas ideias para cliente, dentro do marketing<br />
<strong>da</strong> empresa.<br />
Fico bem feliz em ver estu<strong>da</strong>ntes pensando assim. Acredito até que<br />
a filosofia <strong>da</strong> Perestroika (Você sempre pode ser criativo, em qualquer<br />
área, em qualquer profissão) tenha uma importante participação<br />
nesse processo.<br />
Não conheço nenhum modelo de portfólio para Planejamento ou<br />
Marketing. Eu, se estivesse concorrendo a uma vaga nessas áreas,<br />
pensaria em projetos criativos. Apenas para mostrar meu potencial.<br />
Vamos pegar Nike como exemplo.<br />
Se eu quisesse trabalhar no Planejamento <strong>da</strong> agência que atende essa<br />
conta, ou no próprio cliente, eu faria o seguinte. Criaria várias ações<br />
envolvendo a marca. Novos produtos, eventos, hotsites, sugestões de<br />
crossmedia, ideias basea<strong>da</strong>s em tendências que ain<strong>da</strong> não se popularizaram.<br />
E por aí vai.<br />
É claro que só boas ideias não bastam. Esses três departamentos exigem<br />
de você outras quali<strong>da</strong>des bem específicas e diferentes <strong>da</strong> Criação.<br />
Mas mostrar que você tem ambições além do Excel também não<br />
atrapalha.<br />
63
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
pasta para quem quer<br />
trabalhar no lado<br />
mais business ou no<br />
operacional.<br />
Existem outras três áreas fun<strong>da</strong>mentais dentro de uma agência, que<br />
também exigem criativi<strong>da</strong>de, mas de uma forma diferente: o Atendimento,<br />
a Produção e a Mídia.<br />
São áreas em que o dia-a-dia exige respostas mais rápi<strong>da</strong>s. Então, a<br />
rotina é comprometi<strong>da</strong> muito pelo lado operacional.<br />
O currículo nessas áreas ain<strong>da</strong> pesa. Mas o que realmente pesa é a<br />
sua capaci<strong>da</strong>de de convencer o entrevistador. E até faz sentido. Se<br />
você não for bom em se vender, como vai negociar com clientes, fornecedores<br />
e veículos?<br />
Acho que aqui, mais do que qualquer outro lugar, vale demonstrar<br />
vontade pela vaga. Não tenha medo de dizer: Eu sei pouco, mas quero<br />
aprender e não arrepio.<br />
pasta para quem quer<br />
trabalhar no lado<br />
mais business ou no<br />
operacional, e já é um<br />
pouquinho mais ro<strong>da</strong>do.<br />
Se você está buscando vaga na Produção, pode montar tranquilamente<br />
um portfólio com seus melhores trabalhos. É legal, de alguma<br />
forma, explicar que interferência a Produção teve no processo de execução.<br />
Esse é o motivo pelo qual estão contratando você.<br />
Já na Mídia e no Atendimento, talvez você consiga reunir alguns cases<br />
onde sua participação foi fun<strong>da</strong>mental.<br />
E quando eu digo fun<strong>da</strong>mental, não é Eu fui lá e aprovei a campanha,<br />
ou Eu que fiz o plano de mídia.<br />
É: Eu percebi uma oportuni<strong>da</strong>de de negócio entre o meu cliente e uma<br />
outra marca. Fizemos uma promoção conjunta e vendemos que nem<br />
água. Ou: Eu sugeri um novo formato de anúncio. Mas ele fez tanto<br />
sucesso que entrou na grade de formatos-padrão do jornal X.<br />
65
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
engula o choro.<br />
Se você quer elogios, não vá mostrar a pasta. Ninguém está lá para<br />
bajular você. As pessoas vão dizer o que pensam, goste você ou não.<br />
A ver<strong>da</strong>de é que as chances de você ser duramente criticado<br />
são altíssimas.<br />
Lembre-se: você não é nem estagiário. É aspirante a estagiário. Na<strong>da</strong><br />
mais normal do que você ter uma pasta com erros de principiante.<br />
ca<strong>da</strong> cabeça, uma sentença.<br />
mas nunca uma sentença<br />
de morte.<br />
Sinto que muitos estagiários vão para a entrevista esperando uma opinião<br />
definitiva. Um oito ou oitenta. Se ele gostar, é porque eu nasci<br />
para a coisa. Se ele não gostar, é sinal de que sou um fracassado.<br />
O cara que vê a sua pasta não é um Imperador Romano, que levanta<br />
ou baixa o polegar e decide a sua vi<strong>da</strong>. Ele está ali apenas para julgar<br />
o trabalho que você quiser mostrar, e que reflete aquele momento específico<br />
<strong>da</strong> sua carreira. Só.<br />
Agora, se o entrevistador tiver um ataque de megalomania e resolver<br />
encerrar a sua carreira ali mesmo (dizendo algo como Troque de profissão,<br />
você não serve para a coisa), agradeça a oportuni<strong>da</strong>de educa<strong>da</strong>mente.<br />
E depois delete a entrevista do seu banco de <strong>da</strong>dos.<br />
Primeiro, porque ninguém tem poder para adivinhar o futuro. Segundo,<br />
porque quem faz isso é muito idiota. E você não tem por que ouvir<br />
conselhos de um idiota.<br />
Não são poucas as histórias folclóricas de profissionais de sucesso<br />
que ouviram esse tipo de conselho (Largue a propagan<strong>da</strong>!). E hoje são<br />
chefes dos idiotas.<br />
67
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
cui<strong>da</strong>do: tem<br />
entreVistador que<br />
só quer se liVrar de Você.<br />
A primeira coisa que eu sempre disse, mesmo antes de abrir a pasta,<br />
é: Vou ser brutalmente honesto. Quer continuar?<br />
Tome cui<strong>da</strong>do com quem vê a sua pasta. É muito mais fácil para o<br />
entrevistador passar os olhos rapidinho, dizer Legal, qualquer coisa eu<br />
mando um e-mail e chegar cedo em casa, do que dizer A sua pasta<br />
está muito ruim, eu sugiro que você mude isso, isso, isso, isso, isso,<br />
isso, isso, isso por causa disso, disso, disso, disso, disso, disso.<br />
Quando se é mais crítico, a entrevista costuma durar no mínimo meia<br />
hora. E o cara vai se incomo<strong>da</strong>r com a patroa, que vai jantar mais uma<br />
vez sozinha.<br />
Eu sempre prefiri o caminho mais difícil: ver a pasta de ver<strong>da</strong>de. Ou<br />
fazia assim ou nem marcava. Comentava peça a peça, entrava nos detalhes<br />
e fazia várias críticas. To<strong>da</strong>s, é claro, pensando em contribuir.<br />
E a janta eu aquecia no microon<strong>da</strong>s.<br />
(Obs: hoje eu não vejo mais portfolios. Não me sinto à vontade por<br />
estar há um tempo fora do mercado. Se essa era a sua ideia, por favor:<br />
não insista. Se ain<strong>da</strong> assim estiver tentado, releia a página 30.)<br />
portfólio Visto.<br />
No início <strong>da</strong> carreira, são pequenas as chances de qualquer entrevista<br />
se transformar em vaga. Aí, é natural ficar aquela impressão de que o<br />
esforço não valeu a pena.<br />
Mas valeu. Na pior <strong>da</strong>s hipóteses, você vai ter ouvido várias dicas<br />
para melhorar a pasta. Vai ter feito contato com pessoas importantes.<br />
Vai ter aguçado o seu critério, entendendo o que os mais experientes<br />
julgam ser bom e ser ruim.<br />
E se for a sua primeira entrevista, vai ter o que eu considero o mais<br />
importante: um choque de reali<strong>da</strong>de. No mundo profissional, não há<br />
lugar para paternalismos.<br />
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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
tic-tac-tic-tac.<br />
o tempo passa<br />
e ninguém responde.<br />
Particularmente, eu acho legal se você man<strong>da</strong>r um e-mail depois <strong>da</strong><br />
entrevista sinalizando que está a fim <strong>da</strong> vaga. Outros podem achar<br />
meio malice. E não duvido que alguns considerem forçação <strong>da</strong> sua<br />
parte e o eliminem <strong>da</strong> disputa.<br />
Então, use o feeling para saber até onde dá para ir.<br />
O tempo <strong>da</strong> resposta é muito variável. Geralmente a contratação é<br />
rápi<strong>da</strong>. Mas em alguns casos, o processo pode demorar semanas.<br />
Fique sempre atento para saber se a vaga já foi preenchi<strong>da</strong> ou se você<br />
ain<strong>da</strong> está no páreo.<br />
na traaaaaaaaaaaVe.<br />
Se no final <strong>da</strong>s contas você não conseguir na<strong>da</strong>, não faz mal. Ouça com<br />
atenção tudo o que disseram e refaça a sua pasta. Uma nova entrevista<br />
só se justifica se você tiver mais <strong>da</strong> metade do portfólio remodelado.<br />
71
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />
tá no filó.<br />
Mais cedo ou mais tarde, você vai conseguir um estágio. Talvez, não<br />
seja a vaga dos seus sonhos. Mas não dá na<strong>da</strong>: o importante é que<br />
você mudou de status. Antes, você era candi<strong>da</strong>to a estagiário. Agora,<br />
você já é um estagiário. E está apto a ler o próximo capítulo.<br />
73
capÍtulo 3
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
round one: fight.<br />
O primeiro dia de um estagiário costuma ser parecido. O pessoal faz<br />
um tour rápido e apresenta você para o resto <strong>da</strong> agência. Depois, os<br />
caras <strong>da</strong> TI dão um jeito no seu computador, para que você tenha email<br />
e apren<strong>da</strong> a salvar na rede.<br />
A partir <strong>da</strong>í, você ganha um tapinha nas costas e um monte de pepinos<br />
para descascar.<br />
dois pontos.<br />
Para se <strong>da</strong>r bem dentro de uma agência, você precisa ser competente<br />
em duas frentes:<br />
1. A questão técnica, do trabalho propriamente dito.<br />
2. As regras de convivência, a etiqueta profissional, o seu comportamento<br />
no dia-a-dia.<br />
Em geral, os profissionais orientam você no que diz respeito ao ponto<br />
um. Mas não dão praticamente nenhuma aju<strong>da</strong> no ponto dois.<br />
Portanto, se você quer uma mãozinha, leia com atenção as próximas<br />
páginas. São dicas que aprendi quando ain<strong>da</strong> era estagiário. Fruto<br />
de muita observação, muito jogo de cintura e algumas cabeça<strong>da</strong>s na<br />
parede.<br />
77
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
malandro não é malandro.<br />
é mané.<br />
Estagiários são jovens. Aproveitam a vi<strong>da</strong> como jovens. Saem, enchem<br />
a cara, dormem duas horas e chegam na agência transpirando<br />
Whisky com Redbull.<br />
Eu entendo perfeitamente isso. E acho justo. O Early 20’s é a melhor<br />
época para fazer to<strong>da</strong>s as coisas irresponsáveis que se espera de<br />
um moleque.<br />
A única coisa que você não pode esquecer é que a sua pauta social<br />
não pode comprometer a sua pauta no trabalho. Administrar isso é<br />
problema seu. Só seu.<br />
Se você bebeu mais do que devia, se dormiu mais do que devia, não<br />
faça o que não deve. Não minta.<br />
O seu chefe já teve a sua i<strong>da</strong>de. Já passou pela mesma situação. E<br />
sabe exatamente o que passa pela cabeça numa hora dessas. Invento<br />
uma desculpa e tento sair limpo? Ou falo a ver<strong>da</strong>de e corro o risco de<br />
me queimar?<br />
Assuma o seu vacilo. Ouça o xixi com o rabo entre as pernas. Sente a<br />
bun<strong>da</strong> na cadeira. E trabalhe, trabalhe muito.<br />
Pior do que o estagiário que chega de ressaca é o estagiário não rende<br />
por causa <strong>da</strong> ressaca.<br />
cui<strong>da</strong>do com o efeito<br />
soneca do celular.<br />
Brasileiro nunca respeita horário. Você marca 9h30, o cara chega 9h45.<br />
Você marca 9h45, o cara chega às 10h. Você marca às 10h, o cara liga<br />
10h15 para dizer que está chegando.<br />
Eu acredito que estagiário tem que chegar na hora. Se a agência começa<br />
a funcionar 9h, acho que todo estagiário deveria estar lá, às 9h,<br />
de prontidão. Por um simples motivo: estagiário é o sol<strong>da</strong>do preparado<br />
para resolver qualquer problema. E problema não tem hora para<br />
aparecer.<br />
Como dizia o Ron Seichrist, Reitor <strong>da</strong> Miami Ad School: If you’re on<br />
time, you’re already late.<br />
79
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
dress code.<br />
Dentro dos ambientes criativos, é comum ver muita gente com o estilo<br />
moderninho. O primeiro conselho que eu dou a você é: não se intimide.<br />
Se você é emo, mauricinho ou surfista, não precisa trocar todo o<br />
guar<strong>da</strong>-roupa só para fazer parte <strong>da</strong> turma.<br />
Agora, não dá para patifar também. Não dá para chegar de Havaianas,<br />
calção do Inter e camiseta de regata fura<strong>da</strong>.<br />
Para não errar, é só fazer o óbvio. Os homens devem usar o clássico<br />
jeans com tênis e uma camiseta arrumadinha. Já as meninas só devem<br />
evitar as roupas minúsculas. Apesar de fazer sucesso nos corredores,<br />
os trajes micro viram assunto também na reunião de diretoria.<br />
missão <strong>da</strong><strong>da</strong><br />
é missão cumpri<strong>da</strong>.<br />
Não tem na<strong>da</strong> mais chato que o estagiário que não resolve problemas.<br />
Aquele cara que conjuga todos os verbos no gerúndio.<br />
— Já montou as peças que eu pedi há duas horas?<br />
— Estou só resolvendo uma coisa aqui e já vou pegar.<br />
— Você corrigiu aquele título que pediram para trocar?<br />
— Estou só vendo uma coisa e já faço.<br />
Se derem uma tarefa para você fazer, ou você diz alguma coisa na<br />
hora, ou a batata quente acabou de passar para a sua mão. É melhor<br />
não ficar cozinhando em banho-maria. Resolva rápido o que passarem,<br />
ou a chapa esquenta para o seu lado.<br />
Então, se você está cheio de trabalho, e não vai <strong>da</strong>r conta do recado,<br />
avise. Mas não avise quando o prazo estiver estourando. Lembre-se:<br />
estourando também está no gerúndio.<br />
Um estagiário é medido por produtivi<strong>da</strong>de: pela criativi<strong>da</strong>de nos jobs,<br />
não pela criativi<strong>da</strong>de nas desculpas.<br />
81
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
não deu tempo.<br />
Não deu tempo é uma frase que não existe. Ou melhor, existe, mas em<br />
outro tempo verbal: Gente, não vai <strong>da</strong>r tempo.<br />
De novo: se você se deu conta que o prazo está apertado demais, não<br />
deixe para avisar em cima <strong>da</strong> hora. Ou na<strong>da</strong> poderá ser feito.<br />
Assim que você receber o job, grite. Ou quem vai ouvir no final é você.<br />
inteligência emocional.<br />
Os EUA não ganharam a Segun<strong>da</strong> Guerra sozinhos. Formaram um<br />
bloco com os chamados Países Aliados e, aí sim: destruíram com<br />
Hitler e companhia.<br />
Pense comigo: se até a maior superpotência do planeta precisa de<br />
aju<strong>da</strong>, não vai ser você que vai resolver tudo sozinho, né?<br />
O dia-a-dia de uma agência é uma guerra. Vem bomba <strong>da</strong>qui, raja<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong>li, grana<strong>da</strong> pelo alto. Se você não tiver amigos, morre antes mesmo<br />
de desembarcar na Normandia.<br />
Então, já de cara, exercite a fina arte <strong>da</strong> diplomacia. Depois, com o<br />
tempo, evolua e comece a formar o seu grupo de parceiros estratégicos.<br />
E aí vá expandindo seus territórios. Igualzinho ao War.<br />
Na hora que você precisar – e, acredite, um dia você vai precisar – é<br />
para essas pessoas que você vai ter que pedir água.<br />
83
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
aprofun<strong>da</strong>ndo o assunto:<br />
conta corrente subjetiVa.<br />
Sabe quando dizem Depois dessa, fico devendo uma? Essa Uma é a<br />
moe<strong>da</strong> <strong>da</strong> Conta Corrente Subjetiva.<br />
No momento em que você quebra um galho para alguém, você ganha<br />
pontos. Quando você pede auxílio, é justamente o contrário: entra no<br />
vermelho. Quanto maior o favor, maior o valor.<br />
A grande maneira de ser respeitado dentro do ambiente de trabalho<br />
é estar sempre no positivo. Com todo mundo. Assim, ninguém pode<br />
falar na<strong>da</strong> de você. E quando você precisar de uma mão, não vão<br />
poder recusar.<br />
Então, siga o conselho dos religiosos: dê sem esperar na<strong>da</strong> em troca.<br />
Ou, se preferir, siga a filosofia de Dom Corleone, o personagem célebre<br />
de O Poderoso Chefão, que dizia para quem vinha lhe pedir favores.<br />
Eu não quero o seu dinheiro. Quero a sua amizade.<br />
Capisce?<br />
pergunte.<br />
insista uma Vez.<br />
e era isso.<br />
Você está autorizado a perguntar. Inclusive, o porquê costuma ser o<br />
melhor amigo <strong>da</strong>s pessoas inteligentes.<br />
Mas se você é realmente inteligente, vai saber a hora em que a curiosi<strong>da</strong>de<br />
vira pentelhação. Em que a contestação vira desrespeito à hierarquia.<br />
E aí, mesmo não concor<strong>da</strong>ndo com a justificativa que deram a<br />
você, o jeito é sentar na frente do computador e fazer mais.<br />
85
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
facebook, twitter, Youtube<br />
e e-mail. não fique com<br />
a fama de Vagal.<br />
Em to<strong>da</strong>s as agências, sempre tem um estagiário que fica com o estigma<br />
do cara que passa o dia na internet. Fuja desse rótulo. Ou sua vi<strong>da</strong><br />
dentro <strong>da</strong> empresa vai durar menos que 140 caracteres.<br />
Minha sugestão é que você aproveite os horários extra-pauta (antes<br />
<strong>da</strong>s 9h, depois <strong>da</strong>s 19h e o intervalo para o almoço) para fazer o seu<br />
tour virtual.<br />
De novo: essa não é a minha opinião. Mas é o que percebo<br />
do mercado.<br />
Imagine a seguinte situação. O seu chefe está estressado, precisando<br />
que você termine um layout até as 16h. Faltando duas horas para a<br />
apresentação, ele passa pelo seu monitor e vê, abertas no seu e-mail,<br />
as últimas fotos <strong>da</strong> Carolina Dieckmann. Chega no final do trabalho, a<br />
montagem não fica como ele esperava.<br />
Vai sobrar para você. E para a Carol também.<br />
Sempre que você estiver man<strong>da</strong>ndo fotinhos de putaria, ou <strong>da</strong>ndo<br />
um like no post do Alemão, ou visitando o Twitter do Neymar, você<br />
está correndo o risco de que alguém chegue e pergunte: E aí, já<br />
limpou a pauta?<br />
Lembre-se: até conquistar o seu espaço, você não é o que você é.<br />
Você é o que os outros perceberem o que você é.<br />
Obs.: se o seu monitor estiver estrategicamente virado para a entra<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong> Criação, onde todo mundo passa e vê o que está na tela<br />
(esses monitores sempre caem para os estagiários), o cui<strong>da</strong>do deve<br />
ser redobrado.<br />
87
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
ei, eu posso estar no<br />
Youtube Vendo referências<br />
para um trabalho.<br />
eu posso estar no facebook<br />
pesquisando um grupo<br />
de consumidores.<br />
Claro, ca<strong>da</strong> caso é um caso. Inclusive, racionalmente, todo mundo entende<br />
que essas coisas (o Neymar, a Carolina Dieckmann e o Alemão)<br />
são referências <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e que fazem de você um criador melhor.<br />
Ao mesmo tempo, o seu chefe tem uma pauta represa<strong>da</strong>, esperando<br />
que você diga Acabei! para passar o próximo job.<br />
E outra: não pense que o seu chefe não nota. Ele sabe exatamente<br />
a diferença entre um trabalho sério e alguém que está matando. Até<br />
porque, ele também tem um chefe, e também dá uma matadinha de<br />
vez em quando.<br />
estágio de seis horas.<br />
Há pouco tempo, entrou em vigor uma lei que determina que os estagiários<br />
não trabalhem mais que seis horas.<br />
Acho, sinceramente, a típica lei onde todo mundo sai perdendo. Principalmente<br />
o estagiário.<br />
Você está lá, cercado de um monte de gente melhor do que você.<br />
Profissionais que estão <strong>da</strong>ndo dicas, conselhos e oportuni<strong>da</strong>des para<br />
você mostrar o seu trabalho. Ca<strong>da</strong> hora, ca<strong>da</strong> minuto, ca<strong>da</strong> segundo<br />
num ambiente assim é valioso.<br />
Por que ficar apenas seis horas? Onde você aprende mais: dentro de<br />
uma agência ou em casa, coçando o saco?<br />
Se você for contratado para trabalhar seis horas, já se coloque à disposição<br />
para trabalhar mais, bem mais. No final <strong>da</strong>s contas, é bom<br />
para você.<br />
89
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
bem mais é beeeeeeem mais.<br />
Quando você decide trabalhar com publici<strong>da</strong>de, tenha em mente o<br />
seguinte: a sua jorna<strong>da</strong> de trabalho vai longe. Muitas vezes, entra final<br />
de semana e só termina quando o Tadeu Schimidt está mostrando os<br />
gols do Fantástico.<br />
Não fui eu que inventei isso. É a forma como o mercado <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong><br />
se organizou (ou se desorganizou).<br />
Essa é a regra do jogo. Se você não concor<strong>da</strong>, beleza. Não precisa<br />
entrar em campo. Mas se entrar em campo, não pode reclamar de<br />
carrinho no tornozelo.<br />
Moral <strong>da</strong> história: não seja um desses estagiários chatos que reclama<br />
dos horários malucos. Isso é um absurdo, é desumano. Não está satisfeito?<br />
Peça demissão. Ou você acha que uma empresa inteira vai se<br />
adequar ao seus horários?<br />
Conheço um monte de agência pequena que termina o expediente<br />
diariamente às 18h30. Mas só faz trabalhos de menor visibili<strong>da</strong>de. É o<br />
que você quer? Então vá lá.<br />
Aí, você pode dizer que tem gente que ganha bem, só faz trabalhos<br />
grandiosos e trabalha pouco.<br />
Claro, esses empregos existem, sim. Mas são pouquíssimos. E disputados<br />
pelo melhores dos melhores. Você, que recém começou, ain<strong>da</strong><br />
está muito longe dessa cadeira.<br />
dica de sobreViVência<br />
na selVa: não coloque tudo<br />
a perder nas bala<strong>da</strong>s<br />
<strong>da</strong> empresa.<br />
Existem agências e agências. Mas to<strong>da</strong>s elas fazem algum tipo de<br />
comemoração. Ou quando conquistam uma conta nova, ou quando<br />
ganham um grande prêmio, ou – se o ano for magro – a festa de<br />
final de ano.<br />
De novo: existem agências e agências. Em algumas, ninguém se importa<br />
se você tomar um porre, vomitar no meio <strong>da</strong> pista e chegar solando<br />
na mulher do VP. Em outras, todo mundo vai ficar de olho quando<br />
você pedir o segundo whisky.<br />
Já pensou? Você demora anos para construir uma reputação e duas<br />
tequilas colocam tudo a perder?<br />
Em geral, chega uma hora na festa em que o álcool pega. Quem não<br />
quer incomo<strong>da</strong>ção, vai embora. Quem está para a mal<strong>da</strong>de fica.<br />
A partir <strong>da</strong>í, está liberado.<br />
91
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
antes de chegar<br />
nos finalmentes:<br />
três coisas que todo<br />
mundo acha que tem.<br />
Propagan<strong>da</strong> é um meio extremamente subjetivo. Isso dá margem para<br />
muita discussão e opiniões controversas.<br />
No início <strong>da</strong> carreira, é legal fugir do fogo cruzado. Então, já ligue o<br />
seu ra<strong>da</strong>r para os três pontos a seguir:<br />
1. Bom senso<br />
Você já ouviu alguém dizer Eu não tenho bom senso?<br />
Eu nunca vi. Mas já vi muita reunião discutindo se fulano teve bom<br />
senso ou não. Quando isso acontecia, era um saco. Nunca se chegava<br />
a uma conclusão.<br />
2. Critério<br />
Certa vez, uma menina, que estava quase se formando, foi pedir estágio.<br />
Quando perguntaram se ela queria Re<strong>da</strong>ção ou Direção de Arte,<br />
a garota disse Direção de Criação. Eu não sou muito boa fazendo propagan<strong>da</strong>,<br />
mas sou ótima avaliando peças.<br />
Essa história é real e aju<strong>da</strong> a reforçar um ponto de vista que tenho:<br />
qualquer um se acha um bom avaliador de propagan<strong>da</strong>.<br />
Pense comigo: ca<strong>da</strong> pessoa tem um critério diferente. E como não<br />
existe uma Lei Universal, que determine o que é certo e o que é errado<br />
na publici<strong>da</strong>de, to<strong>da</strong> a pessoa tem a sensação de que o seu critério é<br />
melhor que o dos outros.<br />
Por isso que, se você não cui<strong>da</strong>r, sua peça vai receber pitaco de todo<br />
mundo. Até <strong>da</strong> tia do café.<br />
3. Caráter<br />
Você tem um amigo que é apaixonado por uma mulher gostosíssima.<br />
Mas ela não quer na<strong>da</strong> com o cara, e sim com você. Dar em cima <strong>da</strong><br />
gatinha é sacanagem?<br />
Uns vão dizer que sim, outros vão dizer que não. Depende do grau de<br />
amizade, <strong>da</strong> gostosa, e principalmente: dos conceitos que vocês têm<br />
sobre o assunto.<br />
Eu já vi muito filho <strong>da</strong> puta fazer filha<strong>da</strong>putice. E na maioria <strong>da</strong>s vezes,<br />
eles não se achavam filhos <strong>da</strong> puta por isso. Sempre tinham uma justificativa<br />
– que para mim não fazia sentido, mas para os caras era mais<br />
do que suficiente.<br />
De novo: é tudo uma questão de bom senso e critério.<br />
Por isso, sempre que você fizer alguma coisa, e o pessoal olhar torto,<br />
avalie a situação. De repente, na sua cabeça, está tudo bem. Mas os<br />
outros podem estar tirando você para mau caráter.<br />
93
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />
e finalmente: aproVeite.<br />
O estágio teria tudo para ser uma etapa de mer<strong>da</strong> na sua carreira.<br />
Você trabalha um monte. Pega só craqueira. E sempre que alguma<br />
coisa dá errado, sobra para você.<br />
Mas o estágio é uma <strong>da</strong>s épocas mais legais <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> profissional. E<br />
a última dica desse capítulo é justamente essa: aproveite. Curta. Tem<br />
um lado muito legal de ser estagiário.<br />
P.S.: Apesar de ser uma fase legal, eu não vou enrolar você. Uma hora,<br />
a coisa perde o encanto. E aí, quando o leite começa a aze<strong>da</strong>r, é hora<br />
de pular para o capítulo quatro.<br />
95
capÍtulo 4
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />
antes de qualquer coisa:<br />
planeje a sua carreira.<br />
É fácil planejar o seu dia. Hoje eu vou acor<strong>da</strong>r, trabalhar durante a manhã,<br />
ao meio-dia vou na academia, volto para agência, depois vou para<br />
a aula e quando voltar, durmo na minha namora<strong>da</strong>.<br />
Também não é difícil planejar o seu mês. Até o dia 15 eu vou economizar,<br />
no terceiro final de semana eu vou para a praia, perto do dia 30 eu<br />
faço uma puta bala<strong>da</strong> com a grana que sobrar.<br />
Agora, você consegue planejar os próximos seis meses? Os próximos<br />
dois anos? Os próximos cinco anos?<br />
Infelizmente, é um mal necessário. Porque você só vai saber se<br />
uma decisão na sua carreira é certa ou erra<strong>da</strong> se souber qual é o<br />
final <strong>da</strong> história.<br />
E saiba que todo plano foi feito para ser mu<strong>da</strong>do. O plano é um guia,<br />
não um cão-guia. Você não precisa seguir cegamente.<br />
mu<strong>da</strong>r é importante<br />
para a sua formação.<br />
Se você trabalhar durante anos em apenas uma agência, com um<br />
mesmo time de criadores, você vai aprender tudo o que eles têm de<br />
bom. Mas também vai aprender tudo o que eles têm de ruim.<br />
Ou você acha que os grandes profissionais não têm defeitos?<br />
Têm sim. E depois de consagrados, aí sim é que eles não mu<strong>da</strong>m mais.<br />
O complicado de trabalhar num lugar só é que você fica com uma<br />
visão vicia<strong>da</strong> e limita<strong>da</strong>. Dois defeitos que um criador não pode ter.<br />
E, não por acaso, a melhor época para trocar de agência é quando<br />
você é estagiário. Os compromissos são menores. As consequências<br />
são menores. Até o interesse em segurar você vai ser menor.<br />
99
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />
para saber se é hora<br />
de mu<strong>da</strong>r, preste atenção<br />
nessas duas coisas.<br />
1. a pasta estagna<strong>da</strong>.<br />
Não é regra, mas um bom indicativo para saber se o seu atual emprego<br />
está legal é analisar a sua pasta. Se faz horas que você não coloca<br />
nenhuma peça nova no portfólio, <strong>da</strong>s duas, uma:<br />
Ou você só está pegando trabalhos que não estão contribuindo para<br />
o seu crescimento. Craqueiras que não ensinam na<strong>da</strong>. E que também<br />
não dão oportuni<strong>da</strong>de de você mostrar o seu potencial;<br />
Ou você está desmotivado e não está rendendo o melhor que pode. O<br />
que também é um sinal de que talvez seja a hora de sair.<br />
2. o Copo enCheu.<br />
Existem também aqueles momentos em que você simplesmente enche<br />
o saco. Por mais que esteja crescendo, por mais que a sua pasta<br />
ganhe uma peça nova por semana.<br />
Via de regra, todo emprego tem um prazo de vali<strong>da</strong>de.<br />
Os criadores são pessoas que gostam de mu<strong>da</strong>nça, do novo. A rotina,<br />
para esse tipo de gente, é um vilão ain<strong>da</strong> mais malvado.<br />
mu<strong>da</strong>r é importante<br />
para a sua formação.<br />
e sua formação<br />
é importante para<br />
to<strong>da</strong> a sua carreira.<br />
Um jogador de futebol, enquanto está nas categorias de base, recebe<br />
constante orientação. Tem sempre alguém por perto ensinando os<br />
fun<strong>da</strong>mentos básicos, como o cabeceio, o passe e o chute. Tolerando<br />
os erros e indicando os atalhos do campo.<br />
O período de formação é muito importante e não pode ser atropelado.<br />
Quando o jogador sobe para os profissionais, ele precisa estar pronto.<br />
Porque nos profissionais, ninguém vai pegar o jogador pela mão e<br />
dizer Não, filho, é assim que se chuta.<br />
Se você não der resultado, vai para o banco. Ou pode até ser dispensado.<br />
Craques como o Ronaldinho Gaúcho ou o Alexandre Pato poderiam<br />
subir para os profissionais antes do tempo. Eles eram tão bons que,<br />
já com 15 anos, teriam condições de disputar de igual para igual<br />
com os gran<strong>da</strong>lhões.<br />
O problema é que esse período é precioso na formação. E se for tirado<br />
do jogador, nunca mais será recuperado.<br />
101
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />
O mesmo acontece com o estagiário de publici<strong>da</strong>de. Porque depois<br />
que você é contratado, a exigência mu<strong>da</strong>. Antes você tinha alguém<br />
para orientá-lo, agora você vai ter alguém para cobrá-lo.<br />
Se você não aprender o que precisa aprender na hora certa, não aprende<br />
mais. Então, por favor: não atalhe a sua formação. Não se deixe seduzir<br />
por uma proposta de contratação antes que você esteja pronto.<br />
Essa é a maior burrice que você pode fazer com a sua carreira.<br />
Conheço vários caras que queriam o cargo de Re<strong>da</strong>tor ou de Diretor<br />
de Arte. Queriam deixar o posto de estagiário a qualquer custo. Queriam<br />
subir para os profissionais antes <strong>da</strong> hora. Mas ain<strong>da</strong> não sabiam<br />
chutar nem cabecear.<br />
Resultado? Hoje estão jogando no Bragantino.<br />
Você não precisa<br />
crescer rápido.<br />
precisa crescer sempre.<br />
Um re<strong>da</strong>tor demora no mínimo três anos para se formar. Dois como estagiário<br />
e mais um como Re<strong>da</strong>tor Júnior (que é um estagiário com grife).<br />
Isso quer dizer que, se você conseguir um estágio no primeiro semestre<br />
<strong>da</strong> facul<strong>da</strong>de, e fizer tudo certo, só vai conseguir um contrato<br />
pouco antes de se formar.<br />
No início, você vai fazer bons títulos, boas ideias visuais e bons textos.<br />
Esse é o mínimo que se exige de alguém que queira trabalhar<br />
com Re<strong>da</strong>ção.<br />
Depois, você tem que ser capaz de criar campanhas. Conceitos fortes<br />
que se desdobrem em várias mídias.<br />
Em segui<strong>da</strong>, você tem que criar boas peças de rádio e, talvez, comerciais<br />
baratos de TV. Tem que saber brifar um produtora. Mais: você tem que<br />
conseguir analisar a produção e dizer se ela está boa ou não. Você tem<br />
que detectar os problemas e pedir alterações, até que ela fique boa.<br />
Achou muito?<br />
Pois um diretor de arte demora o dobro. Se você for assistente de<br />
alguém bom, você precisa de no mínimo dois anos de estágio. Se for<br />
você um cara mais ou menos, o ideal é ficar três anos.<br />
103
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />
Isso para aprender só o básico, como diagramação, combinação de<br />
cor, escolha de fonte e montagens fotográficas.<br />
Depois do estágio, você precisa de mais dois anos como Diretor de<br />
Arte Júnior. Só então você vai aprender os processos mais complexos,<br />
como produção de foto e ilustração.<br />
O que já dá uma dica.<br />
se for preciso,<br />
pe<strong>da</strong>le a facul<strong>da</strong>de.<br />
Fique esperto com a relação Estágio vs. Formatura. Se você não estiver<br />
com perspectivas de contratação, não adianta se formar. Muitas<br />
vezes, vale a pena prorrogar alguns semestres para não sair <strong>da</strong> facul<strong>da</strong>de<br />
com uma mão na frente e outra atrás.<br />
Alguns pais incomo<strong>da</strong>m, porque querem que os filhos se formem nos<br />
quatro anos. Mas o mais importante é o seu bem. Então, se for necessário,<br />
e se for possível fazer esse esforço financeiro (todo novo semestre<br />
existem taxas de matrícula), converse com eles e tome a decisão<br />
que for melhor para a sua carreira.<br />
Se aju<strong>da</strong>r, mostre esse capítulo para os seus pais e diga que a culpa<br />
é minha.<br />
105
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />
Voltando ao ponto<br />
principal deste capÍtulo:<br />
Você chegou à conclusão que é hora de trocar de agência. Então, prepare-se<br />
para o seu tour.<br />
Agende entrevistas nos principais lugares. Se você é estagiário, provavelmente<br />
ninguém conhece você e o seu trabalho. É hora de se<br />
apresentar para o mercado.<br />
Faça isso de forma discreta. É chato quando descobrem que você<br />
está mostrando pasta por aí. Até porque, quando a entrevista é durante<br />
o expediente, você vai ter que inventar uma desculpa (Vou ao<br />
médico). E to<strong>da</strong> vez que você sai, deixa a pauta pendura<strong>da</strong> para<br />
outro resolver.<br />
Lembre-se também que a chance de rolar alguma coisa imediatamente<br />
é baixa. Então, assim que você sentir que é hora de mu<strong>da</strong>r, faça o<br />
tour o quanto antes.<br />
Você pode contratar<br />
o seu noVo chefe.<br />
Pintou uma oportuni<strong>da</strong>de em outra agência. Será que vale a pena?<br />
A melhor maneira de saber quem é quem no mercado são os Anuários.<br />
Lá está a ficha corri<strong>da</strong> de todo mundo. Inclusive <strong>da</strong>quele cara que<br />
chamou você para uma entrevista.<br />
Não esqueça: antes de saber se ele quer contratar você, você deve<br />
saber se quer ser contratado por ele. Isso vai determinar o tom <strong>da</strong><br />
entrevista, as suas respostas e a sua postura.<br />
107
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />
abrindo parênteses:<br />
o que é um anuário.<br />
A maioria dos festivais de propagan<strong>da</strong> geram, ao final do evento, um<br />
livro/DVD que reúne as peças vencedoras e suas respectivas fichas<br />
técnicas. Assim, você sabem quem fez o que.<br />
Em outras palavras: é um registro do que de melhor foi feito naquele ano.<br />
O CCSP (Clube de Criação de São Paulo) é o mais famoso do Brasil,<br />
com trabalhos <strong>da</strong>s principais agências do país. Visite www.ccsp.com.<br />
br e encomende o seu.<br />
Existem também os Anuários gringos, como o AD&D, o Art Directors<br />
e o The One Show.<br />
Uma maneira barata é encomen<strong>da</strong>r pela Amazon. Demora mais que<br />
via os revendedores locais, e é chatinho de achar. Mas sai mais em<br />
conta e compromete menos o seu salário.<br />
Especialmente se o seu salário ain<strong>da</strong> é uma bolsa-estágio.<br />
a partir <strong>da</strong>Í,<br />
Vão surgir coisas.<br />
E você começa a viver os seus primeiros dilemas profissionais.<br />
109
capÍtulo 5
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
quando chamam Você<br />
para uma entreVista.<br />
Durante a entrevista, você tem que saber o seu objetivo. Você quer<br />
trabalhar com essa pessoa? Você quer trabalhar nessa agência? Você<br />
quer trabalhar com essas contas?<br />
Essas são algumas perguntas básicas que você tem que considerar antes<br />
<strong>da</strong> conversa, e não durante a conversa. Porque aí, você será capaz<br />
de tirar as informações que você precisa para tomar a sua decisão.<br />
Acho esse um erro bem comum cometido pelos estagiários. Eles dizem:<br />
Vou lá só ouvir. E levam isso ao pé <strong>da</strong> letra. Vão lá só para ouvir<br />
mesmo. Em vez de aproveitarem a oportuni<strong>da</strong>de para perguntar.<br />
Já dizia Guillaume D’Orange: Não há vento favorável para quem não a<br />
que porto se dirige.<br />
Só depois de pensar bastante sobre os pontos positivos e negativos<br />
de trocar de emprego você vai estar preparado para a entrevista.<br />
primeira parte <strong>da</strong><br />
entreVista: Você Vai ouVir<br />
exatamente o que quer.<br />
por isso, ouça com atenção.<br />
Primeiro ouça. Se o entrevistador for um cara esperto, ele vai dizer<br />
exatamente o que você quer ouvir. Lave bem os ouvidos. Mas sempre<br />
deixe uma pulga atrás <strong>da</strong> orelha.<br />
Tenha em mente que o entrevistador não mente. Mas sempre conta<br />
uma versão conveniente <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de.<br />
Conveniente para ele, não para você.<br />
A pessoa que estiver entrevistando você vai falar só maravilhas. Como<br />
a agência é interessante, <strong>da</strong>s oportuni<strong>da</strong>des que você vai ter, as pessoas<br />
legais que vai conhecer. Sempre com aquele leve exagero, natural<br />
<strong>da</strong>s tentativas de persuasão.<br />
Da mesma forma, sempre vai usar eufemismos para as coisas ruins.<br />
Em vez de dizer que o seu dupla é vagabundo, por exemplo, ele vai<br />
dizer que o seu dupla é um cara mais low profile.<br />
Fique atento a esses detalhezinhos.<br />
113
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
use o feitiço<br />
contra o feiticeiro.<br />
A primeira coisa importante é não se expor. Não entre em terrenos<br />
perigosos. Evite polêmicas. Evite opiniões muito fortes. Dê respostas<br />
convenientes.<br />
Eles não estão procurando um Prêmio Nobel. Estão procurando<br />
um estagiário.<br />
Evite falar dos seus defeitos. Se por acaso você tiver que abrir o jogo,<br />
use eufemismos também. E sempre que houver oportuni<strong>da</strong>de, valorize<br />
os seus pontos fortes. Mas de forma natural.<br />
faça o tema de casa.<br />
Entre no site <strong>da</strong> agência. Veja os trabalhos que foram feitos. Enten<strong>da</strong><br />
a filosofia <strong>da</strong> empresa. Tente identificar a visão de propagan<strong>da</strong> que<br />
essa pessoa tem.<br />
E fale exatamente o que ele quer ouvir. Se você fizer isso, e fizer bem<br />
feito, estará ali, ali para chegar lá.<br />
115
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
bom humor é mais<br />
do que bom.<br />
Pessoas contratam pessoas. Se você é um cara legal e interessante, aja<br />
naturalmente. Se você não é, tente ser. Pelo menos durante a entrevista.<br />
Bom humor é uma coisa que pega muito bem na entrevista. Rir na<br />
medi<strong>da</strong> certa e fazer rir na medi<strong>da</strong> certa é uma grande dica.<br />
Às vezes, para descontrair o clima, o entrevistador faz uma ou outra<br />
piadinha. Não veja isso como um sinal verde para você lançar o seu<br />
arsenal de tira<strong>da</strong>s geniais. Vá com calma.<br />
Conheço um estagiário que passou por to<strong>da</strong>s as etapas <strong>da</strong> triagem de<br />
uma grande agência. Então, foi falar com o Diretor de Criação, que começou<br />
a entrevista com uma pia<strong>da</strong> de gaúcho. O estagiário devolveu,<br />
fazendo uma pia<strong>da</strong> de catarinense.<br />
Ele só esqueceu de um detalhe: o Diretor de Criação era de Santa Catarina.<br />
segun<strong>da</strong> parte <strong>da</strong><br />
entreVista: as perguntas<br />
certas são mais<br />
importantes que<br />
as respostas certas.<br />
A partir <strong>da</strong>í, vão aparecer oportuni<strong>da</strong>des para você questionar. Pergunte,<br />
dentro do limite do bom senso, tudo o que você deseja saber.<br />
Fique atento aos sinais corporais. Se você perguntar alguma coisa, e<br />
o entrevistador cruzar os braços, ou se encostar para trás, é sinal de<br />
uma postura defensiva. Você deve ter tocado num ponto delicado.<br />
Também atente para os atos falhos. Por mais experiente que seja o<br />
entrevistador, ele pode muito bem cometer um deslize.<br />
E nunca esqueça desses dois pontos.<br />
117
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
ponto um: Você sempre<br />
está satisfeito com o seu<br />
atual emprego. mesmo que<br />
Você não esteja.<br />
Quando perguntarem se você está feliz, não titubeie. Diga que você<br />
está feliz, sim. É uma questão de sobrevivência.<br />
1. Detonar o seu atual emprego soa, no mínimo, arrogante. Já pensou<br />
se ele é amigo do seu chefe? É queimação na hora. O mercado<br />
é muito pequeno e todo mundo se conhece.<br />
2. Se você demonstrar desinteresse pelo atual emprego, talvez<br />
passe uma certa desmotivação. E tudo o que ele não quer é um<br />
estagiário sem energia.<br />
3. E o mais importante: abrindo totalmente o jogo (Aceito qualquer<br />
proposta!), você parece meio desesperado e se desvaloriza.<br />
Então, lembre-se: você está feliz no seu emprego, no matter what.<br />
Mas não assuste o entrevistado ao ponto dele pensar Pô, esse cara<br />
está tão feliz que eu nunca vou conseguir contratá-lo.<br />
É fun<strong>da</strong>mental verbalizar uma possível troca de ares. Se você fizer<br />
muitas juras de amor ao seu atual emprego, talvez ele nem faça<br />
uma proposta.<br />
É como no jogo de sedução. Você não pode sair disparando logo de<br />
cara (Vamos para um motel?). Por outro lado, tem que <strong>da</strong>r alguma dica.<br />
Então, quer uma carona?<br />
O melhor a dizer é algo assim: Feliz eu estou, mas também sempre<br />
penso em crescer. Um novo desafio pode ser bom a minha carreira.<br />
Por que não?<br />
Mais um detalhe: tome cui<strong>da</strong>do ao afirmar que adora trabalhar com<br />
Fulano, que Fulano sabe muito, que Fulano é muito bom. Não supervalorize<br />
o seu atual chefe – ain<strong>da</strong> mais, se você estiver vindo de uma<br />
agência menor.<br />
Talvez ele não seja tão bom assim e você já demonstre uma falta de<br />
critério.<br />
119
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
ponto dois: Você sempre<br />
deVe demonstrar<br />
interesse. mesmo se não<br />
tiVer interesse nenhum.<br />
Vai chegar um momento <strong>da</strong> entrevista que vão perguntar: E aí, você<br />
está a fim?<br />
Você sempre deve demonstrar interesse. Mesmo que você já saiba<br />
que vá recusar a proposta.<br />
Por quê? Bom, analise bem a situação sob o ponto de vista do cara<br />
que quer contratar você:<br />
Alguém, que é mais experiente que você, está fazendo um convite.<br />
Dizer não, assim, na lata, pode soar ofensivo. Por mais convincentes<br />
que sejam os seus motivos. Ninguém gosta de ser renegado. Especialmente<br />
por um estagiário. Ora, quem esse moleque pensa que é<br />
para recusar minha oferta?<br />
Sou partidário de sempre acenar positivamente, mas sem se comprometer.<br />
Algo como: Olha, achei a proposta bem legal, bem interessante,<br />
mas eu preciso falar com o pessoal lá <strong>da</strong> agência para ver direitinho<br />
como ficam as coisas. Posso <strong>da</strong>r uma resposta definitiva até 19h?<br />
É hora de ganhar tempo. É hora de ganhar o máximo que a situação permitir.<br />
Uma proposta na mão é a única e principal arma de um estagiário.<br />
cenários.<br />
Com a proposta na mão, você tem vários cenários. Escolha o que melhor<br />
combina com o seu momento e tente sair no lucro. Agora, na<strong>da</strong> de<br />
ser malandrinho e nem de ficar se achando. Todo cui<strong>da</strong>do é pouco.<br />
121
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
primeiro cenário: Você<br />
não quer trocar de<br />
agência. quer deixar tudo<br />
exatamente como está.<br />
Essa é a mais fácil de to<strong>da</strong>s. Basta ligar, ou man<strong>da</strong>r um e-mail (dependendo<br />
do que ficar combinado):<br />
Conversei com o pessoal aqui e eles me prometeram algumas mu<strong>da</strong>nças<br />
que vão ser bem legais para mim. Fiquei muito balançado,<br />
porque as duas propostas são ótimas. Mas dicidi ficar. Muito obrigado<br />
pelo convite, fiquei muito feliz pelo interesse. Espero ain<strong>da</strong><br />
trabalhar com vocês um dia.<br />
Se existem realmente mu<strong>da</strong>nças, se houve realmente uma conversa,<br />
isso é irrelevante. O importante é você demonstrar que realmente considerou<br />
a proposta. E que só não aceitou porque a situação que pro-<br />
puseram na sua atual agência foi realmente muito boa.<br />
O cara não pode pensar: Que estagiário FDP, se queimou comigo! Tem<br />
que pensar: Puxa, que pena. Quase deu. Fica para a próxima.<br />
Ah: não deixe de falar para o seu atual chefe que você recebeu a proposta.<br />
Ele precisa saber que você está sendo son<strong>da</strong>do.<br />
segundo cenário: Você não<br />
quer trocar de agência.<br />
mas quer aproVeitar<br />
a oportuni<strong>da</strong>de para<br />
tentar alguma Valorização.<br />
A resposta continua a mesma. O que mu<strong>da</strong> é a conversa entre você e<br />
o seu chefe. Nesse caso, você tem que convocar o bate-papo o quanto<br />
antes. E colocar a situação, sempre com muita humil<strong>da</strong>de:<br />
Recebi uma proposta para trabalhar na agência Tal. Eu gosto muito<br />
<strong>da</strong>qui, não quero sair, mas eles sinalizaram algumas coisas bem<br />
interessantes, oportuni<strong>da</strong>des que eu não tenho hoje. Eu estou bem<br />
dividido. Então, queria saber se existe alguma possibili<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s<br />
coisas mu<strong>da</strong>rem aqui na agência. Se existe a chance de eu receber<br />
um aumento ou ser contratado. Isso certamente me faria ficar. Eu<br />
quero muito continuar aqui, mas estou bem na dúvi<strong>da</strong>.<br />
Assim, você mete uma pressão de leve, sem botar o seu chefe na parede.<br />
E não cria um clima ruim para depois dizer: É, realmente, pensei<br />
bem e decidi ficar.<br />
Seja porque foi contratado. Seja porque recebeu um aumento. Ou não.<br />
123
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
terceiro cenário: Você<br />
nem quer ouVir uma<br />
contra-proposta. quer<br />
sair de qualquer jeito.<br />
Teoricamente, essa aqui também é barba<strong>da</strong>. É só comunicar a sua<br />
saí<strong>da</strong>. Se ninguém oferecer resistência, está resolvido.<br />
O problema é que, às vezes, o pessoal <strong>da</strong> sua atual agência se ofende<br />
com a decisão. Ou discor<strong>da</strong> <strong>da</strong> sua posição. E fica enchendo o saco.<br />
Para evitar qualquer constrangimento, para se esquivar de qualquer<br />
tipo de contra-proposta supostamente irrecusável, o jeito é arranjar<br />
um argumento que o seu futuro empregador possa oferecer, e o seu<br />
atual não. Só assim você sai ileso.<br />
Entendeu? Você tem que dizer que, na nova agência, vai receber uma<br />
coisa que o seu atual chefe não possa oferecer.<br />
Certa vez, eu recebi uma oferta muito boa. Por outro lado, eu sabia<br />
que meu Diretor de Criação faria todo e qualquer esforço financeiro<br />
para me manter. Como eu queria ir de qualquer jeito, já comecei a<br />
conversa sem <strong>da</strong>r muita chance:<br />
As nossas principais contas são de Indústria e Varejo. Adoro<br />
atender esses clientes. Mas eu não serei um Re<strong>da</strong>tor completo<br />
se eu não aprender a criar para Mo<strong>da</strong>. Eu ain<strong>da</strong> não tive oportu-<br />
ni<strong>da</strong>de de trabalhar nesse ramo. E lá, eu vou cui<strong>da</strong>r de uma <strong>da</strong>s<br />
maiores contas de Mo<strong>da</strong> do Brasil. Não tem dinheiro que pague<br />
essa experiência.<br />
Ele ficou mudo por alguns instantes, deu um sorriso meio amarelo e<br />
fez aquela cara de Bom, o que eu vou fazer? Depois emendou: Quando<br />
é o seu ultimo dia?<br />
O papo não durou nem cinco minutos.<br />
125
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
quarto cenário: Você<br />
está inclinado a sair. mas<br />
dependendo <strong>da</strong> contraproposta,<br />
até pode mu<strong>da</strong>r<br />
de ideia e ficar.<br />
Esse é uma mistura do segundo com o terceiro cenário. A diferença<br />
é que, aqui, a pressão é maior. Você já tem que chegar mais decidido.<br />
Mas sempre na humil<strong>da</strong>de:<br />
Recebi uma proposta para trabalhar na agência Tal. Eu gosto muito<br />
<strong>da</strong>qui, não quero sair, mas eles sinalizaram algumas coisas bem interessantes,<br />
oportuni<strong>da</strong>des que eu não tenho hoje. Então, botando<br />
a minha situação atual na balança, decidi ir. Ain<strong>da</strong> não respondi para<br />
os caras. Preferi falar primeiro com vocês, até para saber se existe<br />
alguma possibili<strong>da</strong>de de mu<strong>da</strong>nça na minha posição. Se existe, por<br />
exemplo, alguma chance de eu receber um aumento ou ser contratado.<br />
Isso poderia tranquilamente me fazer trocar de ideia.<br />
Quando perguntarem os motivos que fizeram você ir, arranje sempre<br />
argumentos que não possam ser oferecidos pela sua agência atual.<br />
Como no cenário três.<br />
Aí, é ver como as coisas se desenrolam.<br />
quinto cenário: Você está<br />
completamente indeciso.<br />
Antes de qualquer outra dica duvidosa, eu tenho uma dica infalível.<br />
Quando você está passando por um dilema (no caso, um dilema profissional),<br />
preste muita atenção e avalie muito bem os seus conselheiros.<br />
A coisa mais importante que eu aprendi fazendo terapia foi que, em<br />
geral, as pessoas dão opiniões completamente irresponsáveis. Normalmente,<br />
elas não conseguem se colocar na sua pele. Julgam a situação<br />
a partir do próprio ponto de vista, sem considerar o que você<br />
está sentido, os seus valores e os seus interesses.<br />
Cansei de ver vários profissionais experientes <strong>da</strong>ndo dicas muito ruins.<br />
Cansei de ouvir vários conselhos muito ruins. Inclusive de amigos bem<br />
próximos. Pessoas inteligentes, mas com dificul<strong>da</strong>de de se colocar na<br />
minha posição.<br />
Então, aí vai um conselho: cui<strong>da</strong>do com os conselhos. Especialmente<br />
quando você estiver totalmente dividido.<br />
(Como você pode notar, esse tópico coloca em xeque todos os meus<br />
conselhos anteriores. Por isso eu não coloquei lá no início do livro.<br />
Agora é tarde.)<br />
127
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
sexto cenário: Você<br />
consultou as pessoas<br />
certas. mas continua<br />
indeciso.<br />
Eu ain<strong>da</strong> não li o Blink: A Decisão Num Piscar de Olhos. Mas, assim<br />
como o Silvio Santos, recomendo.<br />
Na ver<strong>da</strong>de, achei tão interessante o assunto do livro que tratei de<br />
procurar resenhas e críticas na Internet, além de me informar com<br />
pessoas que já leram.<br />
O livro fala, entre outras coisas, <strong>da</strong> importância <strong>da</strong> intuição. Ele explica<br />
que uma parte do nosso cérebro, chama<strong>da</strong> de inconsciente a<strong>da</strong>ptável,<br />
é capaz de realizar associações em frações de segundo. Assim, ele<br />
chega a conclusões antes que a gente racionalize, antes que se tome<br />
consciência do que está acontecendo.<br />
Eu sempre acreditei no meu feeling. E até hoje continuo ouvindo com<br />
atenção o anjinho e o diabinho que ficam do lado <strong>da</strong> minha cabeça.<br />
Bom, tudo isso para dizer que: quando você está vivendo um dilema,<br />
você provavelmente já tomou a decisão. E tomou no exato instante<br />
que comparou A com B.<br />
Depois, você fica ali, enrolando, tentando encontrar argumentos racionais<br />
para justificar a sua escolha. Mas ela, lá dentro <strong>da</strong> sua cabeça,<br />
já está feita.<br />
como colocar em prática<br />
o método blink.<br />
Respon<strong>da</strong> de bate-pronto: você quer A ou B? Não pense, simplesmente<br />
respon<strong>da</strong>.<br />
Talvez o seu lado racional não consiga explicar o porquê. Mas é, sem<br />
dúvi<strong>da</strong>, um bom jeito de chegar a uma decisão. Especialmente se o<br />
jogo continua empatado depois do tempo normal, <strong>da</strong> prorrogação e<br />
dos pênaltis.<br />
Outro jeito simples é fazer um cara ou coroa. Quando você jogar a<br />
moe<strong>da</strong> para o alto, vai naturalmente torcer para uma <strong>da</strong>s alternativas.<br />
Só não abuse. Eu confio no meu feeling. Mas não usaria, por exemplo,<br />
o Método Blink na pergunta final do Show do Milhão.<br />
129
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
sétimo cenário: para quem<br />
não confia no método<br />
blink, o método tabelinha.<br />
Outro método consagrado é a Tabelinha.<br />
Você faz quatro colunas. Nas duas primeiras, coloca os prós e os contras<br />
do seu atual emprego. Nas outras, coloca as vantagens e desvantagens<br />
do novo. Depois compara tudo e tenta tirar alguma conclusão.<br />
Para muita gente, funciona. Mas para mim, ele parece muito racional<br />
e só complica.<br />
não se acaba namoro<br />
por sms.<br />
Você é um comunicador. Use o meio certo para man<strong>da</strong>r a sua mensagem.<br />
Se você vai recusar uma proposta de emprego, pense bem. Algumas<br />
coisas você pode man<strong>da</strong>r por e-mail. Outras, justificam uma ligação. E<br />
quando o papo é mais delicado, a conversa tem que ser olho no olho.<br />
131
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
nunca feche portas.<br />
A maioria <strong>da</strong>s portas de agência são giratórias: ela leva você para dentro.<br />
Mas rapidinho, pode estar levando você para fora.<br />
Seja lá qual for a sua decisão, nunca se queime com ninguém. Mesmo<br />
que seja uma agência pequena ou um profissional que você não admire.<br />
Trate todo mundo com o mesmo respeito que você teria com o<br />
Diretor de Criação <strong>da</strong> sua agência favorita.<br />
Se não for por amor ao próximo (é legal tratar todo mundo bem, você<br />
não acha?), pelo menos por amor próprio.<br />
eu preciso <strong>da</strong> grana.<br />
Se você depende do dinheiro que ganha, a sua situação é um pouco<br />
mais complica<strong>da</strong>. E exige um planejamento muito maior, já que você<br />
precisa encontrar uma oportuni<strong>da</strong>de que seja mais interessante para<br />
você. Seja ganhando mais. Seja ganhando o mesmo, mas num lugar<br />
mais legal. Seja ganhando mais – e num lugar mais legal.<br />
O único conselho que eu dou para você é tomar cui<strong>da</strong>do com a estagnação.<br />
Quem depende do dinheiro geralmente corre menos riscos.<br />
Esse tipo de gente costuma tomar decisões seguras demais para um<br />
criador. E, muitas vezes, esse conservadorismo é justamente uma boa<br />
causa para <strong>da</strong>rem um belo pé na sua bun<strong>da</strong>.<br />
A melhor maneira de não virar um refém dessa situação é o Fundo<br />
Fo<strong>da</strong>-se.<br />
133
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
fundo fo<strong>da</strong>-se<br />
Eu acredito que todo profissional, de todo e qualquer nível, deveria ter<br />
um fundo, onde estejam acumulados seis salários.<br />
Isso é uma garantia dupla. Primeiro, porque se você for demitido, não<br />
precisa se sujeitar a qualquer proposta.<br />
A segun<strong>da</strong> é que, assim, você pode ter a liber<strong>da</strong>de de trabalhar nas<br />
condições ideais. Pode <strong>da</strong>r opiniões sinceras, sem medos de retaliações.<br />
Pode criar sem um peso desnecessário nas costas.<br />
Em suma: assim, você não precisa vira nem um puxa-saco, nem<br />
um burocrata.<br />
o dilema mais comum:<br />
Viagem ou trampo?<br />
A pergunta que a maioria dos estagiários que me procurava era: eu<br />
tenho muita vontade de viajar, fazer um intercâmbio. Será que devo?<br />
Claro que deve. Não conheço ninguém, absolutamente ninguém, que<br />
se arrependeu de passar um tempo fora.<br />
Eu garanto que uma viagem vai ensinar muito mais do que você pode<br />
aprender dentro de uma empresa. E, na maioria dos casos, você ain<strong>da</strong><br />
volta falando uma outra língua, que é um puta diferencial competitivo.<br />
Um amigo meu sempre dizia que comer e viajar são as quatro melhores<br />
coisas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. Não sei se são. O que eu sei é que, quando se é<br />
novo, e dependendo do roteiro, uma viagem dá bastante oportuni<strong>da</strong>de<br />
para fazer as outras três.<br />
135
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />
a pergunta de<br />
um milhão de dólares.<br />
Às vezes, a gente pede conselhos. Mas são perguntas que apenas<br />
nós mesmos podemos responder.<br />
Você já deve ter se deparado com a famosa pergunta de um milhão de<br />
dólares. O que eu quero para a minha vi<strong>da</strong>?<br />
Se você tiver dificul<strong>da</strong>de para respondê-la, simplifique. O que eu quero<br />
para a minha vi<strong>da</strong> AGORA?<br />
Quero ficar na minha ci<strong>da</strong>de ou viajar? Quero investir no meu atual<br />
emprego ou <strong>da</strong>r uma espaireci<strong>da</strong>? Quero trocar de profissão ou continuar<br />
na mesma?<br />
Se você pensar num período de dez anos, vai ver que essa pergunta<br />
ganha um peso desproporcional. Às vezes, tudo o que a gente precisa<br />
saber é o que vai fazer pelos próximos três meses.<br />
tudo termina bem.<br />
Você pode simplesmente ignorar para to<strong>da</strong>s as sugestões que eu dei<br />
aqui. E ain<strong>da</strong> assim, eu tenho certeza que tudo vai <strong>da</strong>r certo para você.<br />
As coisas sempre terminam bem. Sempre.<br />
O único erro que eu tenho certeza que você não pode cometer é o <strong>da</strong><br />
enrolação. Não fique esperando as coisas acontecerem. Não fique aí<br />
parado. O mundo está lá fora esperando por você.<br />
Vai lá e faz.<br />
137
capÍtulo 6
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />
a nossa maior matériaprima:<br />
informação.<br />
Um pedreiro precisa de tijolos para levantar a sua parede. Um marceneiro<br />
precisa de madeira para desenvolver suas peças.<br />
E um criador publicitário, o que precisa?<br />
Antes de tudo, de conhecimento, informação, referências, bagagem.<br />
O motivo é muito simples. Uma peça publicitária na<strong>da</strong> mais é do que<br />
a reorganização de informações que já existem. O papel do criador é<br />
tornar essa informação mais interessante – com humor, emoção ou<br />
racionali<strong>da</strong>de.<br />
Um exemplo.<br />
Se você me pedir para definir a Dercy Gonçalves, eu poderia tirar <strong>da</strong><br />
Wikipedia: Dolores Gonçalves Costa, conheci<strong>da</strong> pelo nome artístico<br />
Dercy Gonçalves, foi uma atriz brasileira, oriun<strong>da</strong> do teatro de revista,<br />
notória por suas participações na produção cinematográfica brasileira<br />
<strong>da</strong>s déca<strong>da</strong>s de 1950 e 1960.<br />
Tudo é ver<strong>da</strong>de. Mas se pegarmos o segundo parágrafo, ela parece<br />
muito mais interessante.<br />
Celebra<strong>da</strong> por suas entrevistas irreverentes, bom humor e emprego<br />
constante de palavras de baixo calão, foi uma <strong>da</strong>s maiores expoentes<br />
do teatro de improviso no Brasil.<br />
Fica mais legal. Mas não <strong>da</strong>ria para dizer isso de uma forma ain<strong>da</strong><br />
mais bacana?<br />
A Dercy não morria nunca porque, to<strong>da</strong> vez que a morte chegava para<br />
levá-la, a veia man<strong>da</strong>va ela tomar no cu.<br />
Viu?<br />
E por que foi possível evoluir <strong>da</strong> primeira para a segun<strong>da</strong> forma? Porque<br />
tivemos mais informação, e com mais informação, pudemos escolher<br />
aquilo que torna a Dercy mais simpática para quem está lendo.<br />
Em segui<strong>da</strong>, fizemos um trabalho de processamento <strong>da</strong> informação:<br />
pegamos parte do primeiro parágrafo e parte do segundo e demos<br />
uma forma.<br />
141
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />
conclusão óbVia.<br />
Quanto mais informação você tem, maior a sua capaci<strong>da</strong>de de encontrar<br />
o lado mais simpático do produto/marca que você quer vender.<br />
informação: faça uma<br />
suruba na sua cabeça.<br />
Quando um homem e uma mulher se conhecem na noite, ninguém quer<br />
se comprometer muito. Ninguém quer queimar o filme logo de cara. Então<br />
os dois ficam se estu<strong>da</strong>ndo, com perguntas clichê e respostas evasivas.<br />
Por exemplo: quando um pergunta sobre o gosto musical do outro,<br />
vem a resposta. Eu sou bem eclético, curto de tudo.<br />
Ser eclético não é só bom em papo de bala<strong>da</strong>. Ser eclético é fun<strong>da</strong>mental<br />
para quem quer ser um bom publicitário. Inclusive dizem que<br />
Na propagan<strong>da</strong>, você tem que ler tudo, ver tudo, ouvir tudo.<br />
Apesar de ser meio batido, é mais ou menos por aí mesmo. Porque<br />
quando o cara tem uma formação muito popular, acaba não conseguindo<br />
sofisticar de termina<strong>da</strong>s peças que precisam de um polimento especial.<br />
Ao mesmo tempo, quando o cara é muito erudito, não sabe quem<br />
é o personagem central <strong>da</strong> novela <strong>da</strong>s oito. Também não funciona.<br />
O legal é quando você realmente gosta de tudo. Quando você consegue<br />
transitar com tranquili<strong>da</strong>de por esses mundos.<br />
Se você é fã de BBB, mas também fica amarradão com os documentários<br />
do History Channel, tem tudo para se <strong>da</strong>r bem.<br />
E quem não curte?<br />
Bom, quem não curte se ferrou. Vai ter que ser na marra. Cultura geral<br />
é ferramenta de trabalho.<br />
143
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />
crÍtica também é matériaprima.<br />
e uma <strong>da</strong>s melhores.<br />
A maioria <strong>da</strong>s pessoas, quando mostra o trabalho para os colegas<br />
de agência, pedindo uma opinião, mostra para ouvir elogio. Se você<br />
critica, sugere uma mu<strong>da</strong>nça, coloca um ponto de vista diferente, normalmente<br />
ouve uma resposta defensiva.<br />
É, mas isso aí veio no briefing.<br />
É, mas isso aí foi um pedido do cliente.<br />
É, mas isso aí foi ordem do meu Diretor de Criação.<br />
A crítica não pode ser leva<strong>da</strong> como uma coisa ruim. Pelo contrário:<br />
crítica é uma coisa maravilhosa.<br />
Se crítica também é informação, crítica também é matéria-prima. Enxergue<br />
ela como mais um <strong>da</strong>do que você pode usar a seu favor para<br />
deixar o trabalho melhor.<br />
as ideias mais simples são<br />
as que dão mais trabalho.<br />
O Marcello Serpa diz, no livro As 22 Consagra<strong>da</strong>s Leis <strong>da</strong> Propagan<strong>da</strong><br />
e Marketing, uma coisa que eu levei para o resto <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>:<br />
O simples só é sofisticado, só é valorizado quando é descoberto<br />
antes de se tornar óbvio. (...) Foi preciso que alguém pensasse<br />
primeiro, que descobrisse a idéia, para que outro alguém pudesse<br />
então dizer ‘uau, por que não pensei nisso antes?’ E, apenas<br />
depois desta frase, repeti<strong>da</strong> por muitos, é que uma idéia simples<br />
transforma-se no óbvio.<br />
Quando você vir uma ideia muito simples (não confun<strong>da</strong> ideias simples<br />
com ideia simplória), não pense que ela foi concebi<strong>da</strong> rapi<strong>da</strong>mente.<br />
Ao que tudo indica, foi fruto de muito trabalho.<br />
Observe as ideias simples e tente encontrar o que existe de genial por<br />
trás do seu raciocínio. To<strong>da</strong> ideia simples é uma aula de propagan<strong>da</strong>.<br />
145
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />
Você não é um gênio<br />
incompreendido.<br />
Aqui na Perestroika, eu tive oportuni<strong>da</strong>de de ter contato muitos caras<br />
bons. Em alguns casos, com os melhores dos melhores, nas mais<br />
diversas áreas. E engraçado: todos os caras realmente geniais que eu<br />
conheci não se achavam gênios. Se consideravam pessoas comuns,<br />
com algum talento e muita sorte.<br />
Imagine você, no início <strong>da</strong> carreira, já se achando o fodão. Você acha<br />
que isso vai ajudá-lo? Provavelmente não, né?<br />
Com o nariz empinado, você não vê direito o que tem pela frente. A<br />
chance de você tomar um tomar um tombo mais cedo ou mais tarde<br />
é grande.<br />
Então, seja humilde. Por mais que você olhe para os profissionais<br />
mais experientes e veja mediocri<strong>da</strong>de, você nunca pode pensar que é<br />
melhor que os caras do topo <strong>da</strong> pirâmide.<br />
Nessa etapa <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, você provavelmente não é.<br />
talento é algo discutÍVel.<br />
Quando você olha uma pessoa fazendo um desenho à mão, pode<br />
pensar: Nossa, esse cara tem muito talento.<br />
Mas e se esse cara treina, desde os cinco anos, doze horas por dia?<br />
Isso é talento? O que é talento? É facili<strong>da</strong>de em desenvolver determina<strong>da</strong><br />
tarefa? É uma habili<strong>da</strong>de natural? É treino? É ser eficiente<br />
numa função?<br />
Eu não gosto de entrar muito nesse terreno, porque acho ele quase<br />
irrelevante. Para mim, se um cara com talento e um sem talento chegam<br />
no mesmo lugar, eles são igualmente bons.<br />
Acredito que o importante não é o meio. O importante é atingir a meta.<br />
Se foi graças a um dom divino, horas de suor, macumba ou um pedido<br />
para o gênio <strong>da</strong> lâmpa<strong>da</strong>, que diferença faz?<br />
No final, é melhor quem tem um resultado melhor. Simples assim.<br />
147
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />
quando pedirem, faça.<br />
quando não pedirem,<br />
surpreen<strong>da</strong>.<br />
A expectativa é a mãe <strong>da</strong> mer<strong>da</strong>. Portanto, quando pedirem para que<br />
você faça algo bem feito, faça no mínimo bem feito. Ou vão achar<br />
uma porcaria.<br />
Agora, quando você propõe alguma coisa, você pega todo mundo<br />
pelo contrapé. Mesmo uma ideia não muito brilhante ganha outra dimensão.<br />
E você ain<strong>da</strong> faz o filme por demonstrar proativi<strong>da</strong>de.<br />
aos 45 do segundo tempo.<br />
Nas última semana, acompanhei uma aula <strong>da</strong> Keka Morelle cheia de<br />
dicas bacanas. O livro já estava selado, lacrado, dependendo apenas<br />
<strong>da</strong> revisão. Teoricamente, essas manhas deveriam entrar só na versão<br />
2.0. Mas eu achei elas tão úteis que resolvi fazer um puxadinho<br />
no capítulo.<br />
Fale tudo antes<br />
A hora de discutir tudo, absolutamente tudo, é antes do trabalho começar.<br />
Tirar dúvi<strong>da</strong>s sobre como vai ser realizado o trabalho, entender<br />
bem o briefing, brifar bem o fornecedor. Depois que o processo começou,<br />
tudo fica muito mais difícil.<br />
saiBa dizer não<br />
Não fique constrangido. Se o fornecedor não fez como você queria,<br />
diga não. Pior é dizer sim e ter que dizer não logo ali na frente. O não<br />
é um bom amigo do trabalho de excelência.<br />
resigniFique as reFerênCias<br />
Referência, como o próprio nome diz, é uma referência. Não é uma<br />
solução. O papel do criador é entender a referência, mas acrescentar<br />
em cima dela. Se é para simplesmente reproduzir algo que já foi feito<br />
por outra pessoa, a agência não precisa de você.<br />
149
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />
\tenha sua própria voz<br />
Você não é um artista, que cria tudo de um jeito e enfia goela abaixo<br />
dos outros. Mas você pode ter um estilo, uma personali<strong>da</strong>de, um<br />
jeito de trabalhar que ninguém mais tem. E é essa voz que você<br />
deve buscar.<br />
mantenha o entusiasmo<br />
O trabalho brilhante é aquele em que a gente consegue manter o entusiasmo<br />
do início ao fim. Quando os problemas nos fazem perder o<br />
tesão, isso naturalmente se reflete na peça. Não são raras as campanhas<br />
que começam lin<strong>da</strong>s e vão murchando, murchando, até ficarem<br />
mornas e sem graça.<br />
dicas bem práticas.<br />
1. a Folha em BranCo é sua inimiga.<br />
aCaBe Com ela o mais rápido possível.<br />
Costuma funcionar comigo. Logo que eu começo um brain, trato de<br />
escrever a primeira ideia que me vem à cabeça. Normalmente, esse<br />
é um gatilho para que o meu cérebro enten<strong>da</strong>: OK, agora entramos<br />
no trabalho.<br />
2. FiCar Conversando numa salinha não é Brain.<br />
Brainstorming é um processo de solução de problemas de insight. Por<br />
ser o mais popular dentro <strong>da</strong>s agências de propagan<strong>da</strong>, parece ser o<br />
único. Mas não é: existem outros, como o Seis Chapéus, o Release<br />
Thinking, o Matrix Game (criado pela Cubo.cc), entre muito outros.<br />
Brainstorming não é passar o dia numa salinha, conversando sobre a<br />
vi<strong>da</strong>. Brainstorm não é ficar só falando coisas sem sentido. Brainstorm<br />
ingdá trabalho.<br />
Por mais contraditório que pareça, Brainstorming exige uma certa disciplina.<br />
Quer ter bons brains? Estude o processo.<br />
3. na hora de Criar, ligue o Fo<strong>da</strong>-se. na hora de eXeCutar,<br />
nunCa ligue o Fo<strong>da</strong>-se.<br />
Uma coisa é certa: no brain, o seu filtro deve ser muito permissivo.<br />
Na<strong>da</strong> de criticar o seu dupla. Na<strong>da</strong> de fazer avaliações instantâneas.<br />
Sua mente tem que estar relaxa<strong>da</strong>.<br />
151
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />
Portanto, durante o brain, ligue o fo<strong>da</strong>-se.<br />
Agora, na hora de executar a ideia, e encontrar a melhor forma para<br />
concretizá-la, não relaxe. Leve o acabamento ao limite. Se você estiver<br />
cansado, louco para ir para casa, mas ain<strong>da</strong> não está totalmente<br />
satisfeito com o resultado, pegue um café e volte ao computador.<br />
Durante a execução, nunca ligue o fo<strong>da</strong>-se.<br />
4. registre as ideias.<br />
Primeiro, porque se você não anotar, pode esquecer.<br />
Segundo, porque verbalizar/desenhar/rafear/documentar a sua ideia<br />
é a senha para que o seu cérebro pense: Beleza, posso partir para a<br />
próxima.<br />
5. leia muito soBre o assunto antes<br />
de Começar a Criar: inCuBação.<br />
Eu tenho um monte de ideias tomando banho. Eu tenho um monte de<br />
ideias dirigindo.<br />
Ou, melhor: Eu sou aquela pessoa que está pensando na vi<strong>da</strong> e, de<br />
repente, dá um estalo.<br />
Vou contar um segredo para você: todo mundo tem ideias tomando<br />
banho, dirigindo. Todo mundo tem estalos. Esse é um processo natural<br />
na resolução dos problemas de insight (se eu não falei até agora,<br />
anotem: peças publicitárias normalmente são problemas de insight).<br />
Uma etapa natural, que vem antes do estalo, é a incubação. Quanto<br />
mais informação você tiver, maiores as chances de você encontrar um<br />
evento precipitador que cruze A com B – e resulte na sua ideia genial.<br />
6. não insista demais em determinado tema.<br />
Não quero parecer chato com esse papinho de problemas de insight,<br />
mas a maioria deles se resolve através desse estalo. É uma coisa meio<br />
assim: pá-pum.<br />
Então, quando você insiste demais em determinado tema (Acho que<br />
tem alguma coisa com dinossauro...Tô com um cutuco que dinossauro<br />
rende alguma coisa... Desculpa insistir, mas e se fosse um lance com<br />
dinossauro?), você está reduzindo drasticamente a sua chance de ter<br />
uma boa ideia.<br />
153
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />
por fim, a dica mais<br />
importante de to<strong>da</strong>s:<br />
trabalhe com gente boa.<br />
Isso sim faz diferença na sua vi<strong>da</strong>. Se aproxime dos bons, ouça o que<br />
eles dizem e, por um tempo, siga os conselhos dos caras. Normalmente<br />
dá certo.<br />
155
capÍtulo 7
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />
pequena introdução.<br />
Um bom criador, há quinze anos, não precisava nem ter e-mail. Hoje<br />
em dia, a maioria <strong>da</strong>s entrevistas para trabalhar numa agência são<br />
marca<strong>da</strong>s por e-mail.<br />
Talvez você, que é de outra geração, não enten<strong>da</strong> bem isso. Mas a<br />
propagan<strong>da</strong> está se reinventando nesses últimos anos. E você é quem<br />
vai fazer essa mu<strong>da</strong>nça.<br />
tenha uma Vi<strong>da</strong> digital atiVa.<br />
Nativo ou imigrante, você tem que ter que se relacionar bem com as<br />
mídias sociais. E aí, não importa se você não gosta muito de fuçar no<br />
Facebook, de trocar DM no Twitter ou de ficar stalkeando o Google+<br />
<strong>da</strong>quela gostosa.<br />
Não tem jeito: é trabalho.<br />
E não adianta você usar uma, duas vezes e achar que Já entendi como<br />
funciona. É um pouco mais complicado que isso. Internet é relacionamento,<br />
e isso significa entender os códigos, a conduta e o comportamento<br />
do usuário nessas plataformas. Porque ca<strong>da</strong> uma tem uma<br />
lógica, uma estética e as suas consequentes pia<strong>da</strong>s internas.<br />
Além disso, tudo mu<strong>da</strong> muito rápido. O que é novo hoje, fica velho<br />
amanhã, e pode voltar a ser novo na semana seguinte.<br />
159
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />
use o seu trabalho<br />
autoral como laboratório.<br />
Um bom jeito de se familiarizar com as novas mídias é desenvolver<br />
um trabalho autoral, em paralelo ao seu trabalho do dia-a-dia. Dessa<br />
maneira, você tem menos responsabili<strong>da</strong>des. Se der errado, ninguém<br />
vai ser demitido.<br />
E se der certo, bom: aí você tem um grande case no portfólio.<br />
Em 2007, o Felipe anghinoni criou junto com outros amigos o Bronze<br />
Brasil, Blog que sacaneava o desempenho dos atletas brasileiros<br />
no Pan.<br />
Essa brincadeira já seria uma ótima maneira de aprender a administrar<br />
um Blog com vários colaboradores e diversas postagens diárias. Mas<br />
o Bronze Brasil estourou, saiu na grande mídia e virou um webhit.<br />
No meu caso, já experimentei várias ideias para Youtube. Pelo menos<br />
quatro tiveram algum potencial viral, ultrapassando os 50 mil views. O<br />
último, lançado há quinze dias, bateu hoje nos 45 mil.<br />
E o keko? É que, na hora de levarmos isso para nossos conteúdos de<br />
marca, os aprendizados dos vídeos aju<strong>da</strong>ram muito. O nosso primeiro<br />
movimento no Youtube ultrapassou os 190 mil views. No segundo<br />
(uma série de seis episódios), pelo menos três ultrapassaram 100 mil<br />
views.<br />
Claro: esses números estão longe de um Pôneis Malditos. E, fazendo<br />
uma análise crítica, a gente acha que poderia melhorar muita coisa.<br />
Mas também não dá para dizer que não houve algum tipo de mérito.<br />
manje um mÍnimo<br />
de tecnologia.<br />
Você não precisa ser um geek. Você não precisa saber a última novi<strong>da</strong>de<br />
do blog mais espertinho <strong>da</strong>s coisas mais tecnológicas do mundo.<br />
Agora, você também não pode ser o último a saber <strong>da</strong>s novi<strong>da</strong>des.<br />
O motivo é bem lógico: sempre que surge uma nova tecnologia, o<br />
simples fato de colocar essa tecnologia numa ideia publicitária já tem<br />
impacto suficiente para chamar a atenção.<br />
Se a tecnologia vinga e começa a se popularizar, é natural que outras<br />
marcas também comecem a criar ideias para essa plataforma. E é aí<br />
que complica: se aumenta concorrência, não basta mais ter uma ideiazinha<br />
qualquer. Você vai ter que caprichar para chamar a atenção.<br />
Veja o exemplo do comercial <strong>da</strong> Toshiba. Eles apresentaram, pela primeira<br />
vez num filme de televisão, a tecnologia Timesculpture (algo parecido<br />
com o efeito bullet time do Matrix, procure no Youtube).<br />
Tem ideia? Tem. Mas ela é um pouco diferente <strong>da</strong>s ideias publicitárias<br />
tradicionais. Ela impressiona mais pelo visual, pela apresentação<br />
<strong>da</strong> tecnologia em si, do que por um raciocínio conceitual, com início,<br />
meio e fim.<br />
Moral <strong>da</strong> história: quando a tecnologia ain<strong>da</strong> é incipiente, você nem<br />
precisa ter uma grande ideia. A tecnologia já é a ideia.<br />
161
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />
fique esperto no que<br />
está bombando.<br />
De alguma forma, você tem que sacar o que está sendo comentado<br />
na internet. E aí, não estamos falando necessariamente de tecnologias.<br />
Mas <strong>da</strong>s novas celebri<strong>da</strong>des, <strong>da</strong>s pia<strong>da</strong>s internas, dos últimos webhits.<br />
Lembra quando começaram a aparecer os primeiros Literal Videos (videoclipes<br />
que literalizavam as imagens nas suas letras)? A linguagem<br />
era um prato cheio para qualquer marca, de qualquer segmento, de<br />
qualquer parte do mundo. Quem estivesse ligado, poderia se apropriar<br />
dessa estética e sugar todo o recall que ela tinha na web.<br />
apren<strong>da</strong> coisas que<br />
pouca gente sabe.<br />
Muitos criadores <strong>da</strong> velha geração falam, de forma até um pouco desinforma<strong>da</strong>,<br />
que é impossível planejar um “viral”.<br />
Evidente que existe técnica por trás de um “viral”, que aumenta consideravelmente<br />
a sua margem de sucesso. Agora, um profissional<br />
consagrado, com uma penca de prêmios de propagan<strong>da</strong> offline, talvez<br />
não tenha paciência para sentar, ouvir e aprender. Se reciclar não<br />
é fácil.<br />
É aí, é nessas brechas que você pode criar boas oportuni<strong>da</strong>des.<br />
E se tornar uma figura importante dentro <strong>da</strong> agência.<br />
Assim como o “viral”, existem muitas outras estratégias de comunicação<br />
e relacionamento digital que ain<strong>da</strong> estão engatinhando no Brasil.<br />
Você pode sair na frente.<br />
E só para explicar as aspas: “viral” é um adjetivo, não um substantivo.<br />
Portanto, não existe “crie um viral”. É como dizer: “crie um<br />
jingle chiclete”.<br />
163
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />
multidisciplinari<strong>da</strong>de.<br />
Na agência de propagan<strong>da</strong> antigas, os profissionais tinha que ser<br />
grandes especialistas nas suas áreas. O re<strong>da</strong>tor tinha que escrever<br />
muito bem, e só. O Layoutman tinha que fazer uma bela arte, e só. E<br />
tanto é ver<strong>da</strong>de que os dois nem sentavam juntos: ca<strong>da</strong> um ficava<br />
numa sala diferente.<br />
Não existia troca, não existiam vasos comunicantes. Era ca<strong>da</strong> um<br />
por si.<br />
Esse perfil foi sendo transformado, mas a herança do especialista ain<strong>da</strong><br />
existe em algumas agências mais old school.<br />
Acho que o perfil do profissional multidisciplinar vai, aos pouquinhos,<br />
substituir o especialista-mega-especializado.<br />
Se você também pensa assim, tem tudo para se <strong>da</strong>r bem.<br />
na dúVi<strong>da</strong>, siga a bússola.<br />
Se antigamente quem ditava a propagan<strong>da</strong> mundial era o Grand Prix<br />
de Film e de Press & Poster, ultimamente se criaram novas categorias<br />
que são muito mais ba<strong>da</strong>la<strong>da</strong>s.<br />
Exemplo? o Titanium Lions.<br />
O Titanium nasceu a partir do BMW Films, série com vários curtas metragens,<br />
dirigidos por nomes consagrados de Hollywood. Um projeto<br />
que chacoalhou e rediscutiu to<strong>da</strong> indústria <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>. O prêmio<br />
era só uma formali<strong>da</strong>de.<br />
O único problema é que ele não se encaixava em nenhuma <strong>da</strong>s categorias<br />
vigentes no Festival de Cannes. Tiveram que criar uma só para isso.<br />
Aí nasceu o Titanium.<br />
Logo depois do Titanium, nasceram muitas categorias. Algumas, na<br />
minha opinião, até um pouco contraditórias.<br />
O importante não é se ligar nos detalhes, mas no espectro geral. Para<br />
os caras de Cannes, só vale a pena lançar uma categoria quando já há<br />
trabalho relevante na categoria.<br />
Portanto, fique atento. Se amanhã surgir a categoria “Google Glass<br />
Ad”, é porque já tem bastante gente anunciando nessa plataforma.<br />
165
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />
big idea.<br />
Os novos formatos de Cannes valorizam a chama<strong>da</strong> Big Ideia: um<br />
conceito que se desdobre para várias mídias. A Crispin+Porter, Bogusky<br />
é uma agência famosa por criar dentro desse formato. Você<br />
pode procurar na internet os cases do Whopper Freakout, por exemplo.<br />
Nessa ação, um restaurante <strong>da</strong> rede Burger King simplesmente<br />
tirou de circulação o seu sanduíche mais famoso, o Whopper. Quando<br />
os clientes chegavam, recebiam a notícia de que o clássico havia<br />
sido descontinuado.<br />
Bizarro, né?<br />
Pois foi justamente essa estranheza que gerou um grande bafafá,<br />
valorizou o produto e se transformou num grande case <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong><br />
moderna.<br />
Outro case interessantíssimo é Tap Project desenvolvido pela Droga5.<br />
É legal justamente pela simplici<strong>da</strong>de e pelos resultados contundentes.<br />
Os dois são ótimas referências. Não só do que é bom, mas do que é<br />
considerado o norte <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> mundial.<br />
jj + pk + st.<br />
Esses dias, o Carlos Merigo (que é mais conhecido pelo seu blog,<br />
o #Brainstorm9) veio falar com a gente e apresentou um raciocínio<br />
muito bacana.<br />
Ele acredita que o criador do futuro é uma mistura de J.J. Abrams,<br />
Philip Kotler e Star Trek. Ou seja: temos que fundir, ca<strong>da</strong> vez mais, o<br />
lado entretenimento, com o marketing, com a tecnologia.<br />
Eu adorei essa visão. Acho que é bem por aí: a propagan<strong>da</strong> vai ter<br />
ca<strong>da</strong> vez menos cara de propagan<strong>da</strong>, mas isso não significa que ela<br />
vai deixar de ser propagan<strong>da</strong>. No final <strong>da</strong>s contas, tem que vender.<br />
O conhecimento tecnológico, como já falei há algumas páginas atrás,<br />
vai ser uma expertise Sine Qua Non para a boa criação. No momento<br />
em que o consumidor está (por exemplo) procurando restaurante via<br />
um aplicativo de Iphone, como que a gente faz? Se mete no meio,<br />
como fazia antigamente? Ou tenta ser tão útil, interativo e divertido?<br />
O cara esperto tem que estar muito esperto para essas as novas<br />
espertices.<br />
167
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />
para fechar, um boa<br />
notÍcia: Você está ViVendo<br />
o momento mais legal <strong>da</strong><br />
história <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>.<br />
Esse é um raciocínio que o Vinícius Malinoski apresentou numa aula<br />
<strong>da</strong> Perestroika – e eu concordo totalmente.<br />
As possibili<strong>da</strong>des hoje são praticamente infinitas, e só vão ficar ain<strong>da</strong><br />
mais diverti<strong>da</strong>s <strong>da</strong>qui para frente.<br />
Pense comigo: o celular, os games, a TV digital, o cinema 3D, o GPS,<br />
a reali<strong>da</strong>de aumenta<strong>da</strong>. Tudo isso ain<strong>da</strong> vai evoluir e impactar diretamente<br />
no trabalho dos publicitários.<br />
o portfólio do<br />
noVo criador.<br />
Como falamos antes: agora, o novo padrão do mercado são as chama<strong>da</strong>s<br />
Big Ideas.<br />
Na ver<strong>da</strong>de, esse é um conceito antigo – muitas grandes campanhas<br />
do passado eram Big Ideas, só não tinham esse nome – que foi reciclado<br />
e agora é o objetivo de todo criador de agência de propagan<strong>da</strong>.<br />
Pois bem: um portfólio de Big Ideas é difícil de se conceber. A melhor<br />
maneira de apresentar isso é através de cases. Então, se você quer<br />
montar uma pasta mais moderninha, leve pelo menos um case de<br />
uma Big Idea.<br />
Você pode apresentar através de um vídeo, com uma lâmina que explique<br />
to<strong>da</strong>s as ações ou simplesmente inventar um jeito novo. Não existe<br />
padrão. E se a ideia for boa, isso se torna menos relevante ain<strong>da</strong>.<br />
169
capÍtulo 8
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
existe um ditado que diz.<br />
Pessoas espertas aprendem com os próprios erros. Pessoas muito espertas<br />
aprendem com os erros dos outros.<br />
Por isso, resolvi contar com mais de detalhes o meu início de carreira.<br />
Não serve para seguir à risca. Serve muito mais para você evitar (e rir)<br />
<strong>da</strong>s caga<strong>da</strong>s que eu fiz.<br />
o plano.<br />
Sempre quis ser re<strong>da</strong>tor, desde o primeiro dia de propagan<strong>da</strong>. E tentando<br />
alcançar esse objetivo, tive uma estratégia diferente <strong>da</strong> maioria<br />
dos meus contemporâneos.<br />
Não tentei uma vaga como assistente de Re<strong>da</strong>ção logo de cara. Achei<br />
que o melhor seria aprender outras coisas liga<strong>da</strong>s à criação.<br />
Áreas afins, que me fariam um re<strong>da</strong>tor melhor no futuro.<br />
173
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
o primeiro estágio.<br />
Meu primeiro emprego foi aos 17 anos, num jornal-piloto. Eu escrevia<br />
matérias, participava <strong>da</strong> diagramação e criava os anúncios que iam<br />
nos ro<strong>da</strong>pés <strong>da</strong>s páginas.<br />
Aí, você vai me perguntar: Como que um estagiário de publici<strong>da</strong>de<br />
escrevia matérias para um jornal? Isso não é proibido?<br />
Pois é: eu demorei um mês para me <strong>da</strong>r conta desse pequeno detalhe.<br />
Estava tão empolgado com o primeiro estágio que nem perguntei muita<br />
coisa. Já saí escrevendo.<br />
O jornal era picaretagem pura. O dono não dizia na<strong>da</strong> com na<strong>da</strong> e só<br />
man<strong>da</strong>va eu escrever. Quando eu comecei a desconfiar, ele veio com<br />
um papo de me transferir para a Europa com salário de US$ 3.000,00.<br />
Aproveitei que a história estava ficando nebulosa e desapareci no meio<br />
<strong>da</strong> fumaça. Nunca vi essa grana. Por sinal, nunca vi grana nenhuma.<br />
Mas eles também nunca mais ouviram falar de mim.<br />
rompendo o hÍmen.<br />
Sou <strong>da</strong> teoria que, se você ain<strong>da</strong> não trabalha, deve aceitar qualquer<br />
proposta de emprego. O primeiro trampo é apenas uma boa forma de<br />
perder a virgin<strong>da</strong>de profissional. Você começa a entender como o mundo<br />
real é. E percebe que ele é bem diferente <strong>da</strong>s relações que você tem<br />
com seus pais, com seus amigos, com seus colegas e professores.<br />
Arranje logo um primeiro emprego. Você não quer ser um virgem de<br />
40 anos, quer?<br />
Por sinal, não crie muitas expectativas sobre o seu primeiro emprego.<br />
É mais ou menos como imaginar que a sua primeira vez vai ser a melhor<br />
transa <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>.<br />
Se o seu primeiro emprego for ruim, ain<strong>da</strong> assim será ótimo.<br />
175
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
o segundo estágio.<br />
Antes mesmo do meu primeiro estágio, eu descobri que um amigo do<br />
meu pai era sócio de uma gráfica. Pedi um estágio na cara-dura. Deu<br />
a coincidência dos caras me chamarem em janeiro, alguns dias depois<br />
de eu desistir do jornal.<br />
Meu contrato era de apenas dois meses. As aulas começavam em<br />
março e, como o trabalho era em turno integral, e eu estu<strong>da</strong>va de<br />
manhã, não tinha escolha.<br />
Naquela época, não me <strong>da</strong>va conta que estu<strong>da</strong>r de manhã era um<br />
atraso profissional. (Se você estu<strong>da</strong> de manhã, peça transferência o<br />
quanto antes. Você está diminuindo em mais de 50% as suas chances<br />
de conseguir uma vaga num lugar legal.)<br />
Imaginei que, passando um tempo numa gráfica, eu poderia aprender<br />
mais sobre o processo de impressão. Só que a gráfica não fazia muitos<br />
trabalhos publicitários. Ela imprimia, basicamente, livros. Sempre<br />
com o mesmo papel, sempre PB, sempre nos mesmos formatos.<br />
Meu objetivo foi para o beleléu. Mas, sem querer querendo, aprendi<br />
naqueles dois meses uma coisa ain<strong>da</strong> mais interessante.<br />
um estudo antropológico.<br />
Ao contrário do que você pode imaginar, eu não ia para a parte administrativa<br />
<strong>da</strong> gráfica. Eu não ficava num escritório, com ar-condicionado,<br />
aju<strong>da</strong>ndo em tarefas burocráticas.<br />
Eu fui para o chão <strong>da</strong> fábrica.<br />
Só que as tarefas eram absolutamente mecânicas e fáceis de resolver,<br />
mesmo para uma pessoa recém chega<strong>da</strong>. Com isso, tive bastante<br />
tempo livre para conhecer melhor meus colegas de setor.<br />
Depois de algumas semanas, eu já estava bem entrosado com a galera.<br />
Cumprimentava todo mundo pelo nome, trocava uma ideia na hora<br />
do almoço. Até jogar bola com os caras eu joguei.<br />
Mas não foi sempre assim.<br />
No início, eu senti na pele o preconceito racial. Eu era um dos poucos<br />
funcionários brancos. E certamente o único de classe média (mesmo<br />
usando uniforme, <strong>da</strong>va para perceber que eu era filhinho de papai).<br />
Um alvo fácil para pia<strong>da</strong>s, sacanagens e apelidos semitas.<br />
Nos primeiros dias, eu me senti tão mal que estacionava o carro bem<br />
longe, para ninguém ver que eu tinha um Gol zero.<br />
Foi bom ver o outro lado <strong>da</strong> moe<strong>da</strong>. Me ensinou a ser mais humilde e<br />
mais humano. Um choque de reali<strong>da</strong>de que estourou a bolha onde eu<br />
vivi durante anos e anos.<br />
177
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
Mas o mais legal foi conhecer os gostos, os interesses, os valores de<br />
um grupo de pessoas com o qual eu nunca conviveria se não tivesse<br />
trabalhado lá.<br />
Só para citar um dos milhares de exemplos marcantes: logo que fui<br />
apresentado, um dos funcionários me perguntou.<br />
— Colorado ou gremista?<br />
— Colorado.<br />
— Imperadores ou Bambas?<br />
Carnaval para mim era apenas um feriado onde eu viajava, enchia<br />
a cara e tentava marcar muitos pontos. Imperadores, Bambas, Salgueiro<br />
ou Viradouro, isso não tinha a menor importância. Carnaval<br />
era gan<strong>da</strong>ia.<br />
Para eles, Carnaval era coisa séria.<br />
entretanto.<br />
A minha família tinha programado uma puta viagem para o Exterior<br />
para a mesma época. Daquelas grandes e inesquecíveis.<br />
Eu, obviamente, estava convi<strong>da</strong>do. Mas na época, eu era um legítimo<br />
Abobadinho <strong>da</strong> Propagan<strong>da</strong>. Tão abobadinho que não podia perder a<br />
chance de conhecer mais sobre o processo gráfico.<br />
Por mais legal e recompensador que essa experiência profissional tenha<br />
sido para a minha vi<strong>da</strong> e para a minha carreira, a viagem com a<br />
minha família era algo especial.<br />
Abrir mão disso foi uma burrice sem tamanho. E também me ensinou<br />
uma lição.<br />
179
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
lição.<br />
Nunca deixe de fazer algo que vai ficar marcado pelo resto <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong><br />
por causa de trabalho.<br />
Não deixe de acompanhar o nascimento do seu filho. Não falte ao casamento<br />
do seu melhor amigo. Não perca a formatura do seu irmão.<br />
Nenhum emprego, nenhuma agência, ninguém paga tão bem para<br />
que você abra mão <strong>da</strong>s coisas que não têm preço.<br />
o terceiro estágio.<br />
No jornal-picareta-piloto, fiz amizade com uma estu<strong>da</strong>nte de RP. Ela<br />
trabalhava numa agência minúscula, que era dividi<strong>da</strong> em duas áreas.<br />
De um lado, o departamento de Relações Públicas, onde ela assistia<br />
à RP Sênior, sócia do negócio. Do outro lado, era o departamento de<br />
propagan<strong>da</strong>. Onde ficava o outro sócio e um estagiário.<br />
Eu.<br />
Me interessei pela vaga justamente porque era uma legítima Eugência.<br />
Eu fazia tudo. Ia no banco. Atendia o telefone. Preparava o cafezinho.<br />
Man<strong>da</strong>va fax com os comprovantes de veiculação. Criava os títulos,<br />
os textos, layoutava e finalizava os anúncios.<br />
Neste caso específico, o que mais me interessava era aprender a<br />
mexer nos programas de Direção de Arte. Sempre acreditei que um<br />
criador só seria completo se ele fosse capaz de criar e executar as<br />
suas ideias.<br />
E aí vai a primeira dica do terceiro estágio.<br />
181
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
primeira dica do<br />
terceiro estágio.<br />
Se você é re<strong>da</strong>tor, você não pode depender do seu diretor de arte.<br />
Esse é um vício muito comum. Tem re<strong>da</strong>tor que não sabe as funções<br />
básicas do Photoshop. Tem re<strong>da</strong>tor que nem sabe abrir o Photoshop.<br />
Dominar as ferramentas de manipulação e diagramação fazem com<br />
que você crie melhor. Só praticando direção de arte é que você entende<br />
conceitos importantes de alinhamento, agrupamento e hierarquia.<br />
Em suma, você só consegue criticar com mais autori<strong>da</strong>de o layout do<br />
seu dupla se tiver futricado, pelo menos um pouquinho, nos programas.<br />
Do ponto de vista prático, tem mais uma vantagem. Você não precisa<br />
ficar mendigando para que o seu diretor de arte faça JPGs <strong>da</strong>s<br />
suas peças, ou grave um DVD com o seu portfólio. Se você dominar<br />
o básico do Photoshop e do Illustrator (ou um similar), vai ser um<br />
criador independente.<br />
Para finalizar, eu acredito que um criador tem que ser capaz de colocar<br />
em prática as suas ideias.<br />
Durante o período que estive na Miami Ad School (chegaremos lá), não<br />
foram poucas vezes que eu sentei no computador e criei tudo sozinho.<br />
É evidente que você não precisa se sofisticar ao ponto de virar um<br />
Diretor de Arte de ver<strong>da</strong>de. Eu, por exemplo, investi apenas dois anos<br />
<strong>da</strong> minha carreira, e decidi parar quando atingi o meu objetivo.<br />
O inverso também é ver<strong>da</strong>deiro. Diretor de Arte que não sabe escrever,<br />
que não sabe fazer título, que não sabe roteirizar um spot, fica totalmente<br />
dependente do dupla.<br />
O Rafa Bohrer, meu dupla por muitos anos, é um bom exemplo do<br />
criador completo. Além de ser um fenômeno como Diretor de Arte, ele<br />
sempre escreveu títulos e conceitos tão bons quanto qualquer re<strong>da</strong>tor<br />
experiente. Já vi ele criar textos invejáveis. Mais de uma vez.<br />
A moral é que você tem que ser um especialista, mas também tem que<br />
ser um generalista. Por mais contraditório que isso possa parecer.<br />
183
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
segun<strong>da</strong> dica do<br />
terceiro estágio.<br />
Construir uma network sóli<strong>da</strong> é um talento. E usar esses contatos com<br />
sabedoria é um talento ain<strong>da</strong> maior.<br />
A maioria absoluta dos estagiários entra na agência a partir de uma<br />
indicação. Os profissionais mais experientes, com poder de contratação,<br />
não têm contato com os estu<strong>da</strong>ntes dos primeiros semestres.<br />
Alguém precisa fazer esse meio campo.<br />
Boa parte <strong>da</strong>s vezes, as indicações são feitas diretamente para a pessoa<br />
que está contratando. Tenho um amigo que se interessa pela vaga.<br />
Vou pedir para ele man<strong>da</strong>r a pasta.<br />
Mas existe também uma rede de indicações muito mais poderosa,<br />
que circula por listas de e-mail, invade os Twitters, vira postagem<br />
no Facebook.<br />
Fulano me contou que Ciclano ouviu falar que estão procurando alguém<br />
na agência Tal.<br />
Nesse caso, nem sempre vence o mais forte. Às vezes, vence o<br />
mais rápido.<br />
Dependendo do caso, a agência precisa de um estagiário para ontem.<br />
Se você tiver uma ótima pasta, mas só ficar sabendo <strong>da</strong> oportuni<strong>da</strong>de<br />
depois de amanhã, pode ser tarde.<br />
o quarto estágio.<br />
A vantagem de uma Eugência é que você aprende a ser meio Homemban<strong>da</strong>:<br />
faz de tudo um pouco. Participa de to<strong>da</strong>s áreas e descobre<br />
qual é a sua preferi<strong>da</strong>. Você suja as mãos, perde eventuais frescuras<br />
e endurece o couro.<br />
A desvantagem de uma Eugência é que você faz tudo. E chega uma<br />
hora que enche o saco.<br />
Outra coisa ruim <strong>da</strong> Eugência é que, normalmente, os criadores não<br />
são lá caras muito competentes. São uns faça-você-mesmo, que<br />
aprenderam aos trancos e barrancos. Cheios de vícios e com olhares<br />
pouco profissionais do negócio.<br />
No início, você até aprende a fazer propagan<strong>da</strong>. Mas depois de um<br />
tempo, você aprende a como não fazer propagan<strong>da</strong>.<br />
Passados alguns meses, pedi demissão. Eu não tinha na<strong>da</strong> em vista.<br />
Só achei que o meu prazo de vali<strong>da</strong>de tinha expirado.<br />
E hoje, passados muitos anos, eu diria que existe um tática infalível<br />
para pedir demissão, desde que você tenha envergadura para enfrentar<br />
a situação.<br />
185
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
transparência absoluta.<br />
Passados alguns meses, pedi demissão. Eu não tinha na<strong>da</strong> em vista.<br />
Só achei que o meu prazo de vali<strong>da</strong>de tinha expirado. Pedi para conversar<br />
com o meu chefe.<br />
Recebi uma proposta de uma agência chama<strong>da</strong> ACS. É uma agência<br />
nova, pequena, que vai ser lança<strong>da</strong> por uns amigos do meu pai até o<br />
final do mês. Acho que vai ser uma boa para mim.<br />
Se você procurar na internet, não vai encontrar uma agência chama<strong>da</strong><br />
ACS. Ela não existe. Ela nunca existiu. Ela só existiu durante aquela<br />
rápi<strong>da</strong> conversa.<br />
Eu precisava dê um motivo para não haver resistência por parte do<br />
meu chefe. Do outro lado, ele precisava de um motivo para não se<br />
sentir rejeitado. No final, todos saíram felizes.<br />
Não sinto muito orgulho dessa minha atitude. Não me sinto bem fazendo<br />
essa recomen<strong>da</strong>ção. Mas também não posso ignorar: funcionou.<br />
Portanto, se você quer uma dica <strong>da</strong> Propagan<strong>da</strong> <strong>da</strong>s ruas de “como<br />
pedir demissão, sem ter nenhuma proposta, e não se queimar”, essa<br />
é uma boa estratégia<br />
***<br />
Há pouco tempo, eu tive uma estagiária que pediu as contas.<br />
Estou abrindo um negócio com umas amigas. A coisa está ficando<br />
séria e eu preciso dedicar mais tempo. Infelizmente, ain<strong>da</strong> não posso<br />
revelar o que é. Por mim, eu até falava, mas as minhas sócias pediram<br />
sigilo. Assim que a gente lançar, eu conto.<br />
A primeira coisa que eu pensei foi: Eu conheço esse golpe.<br />
Quando você quiser sair de um lugar, para ficar coçando em casa, a<br />
grande malandragem é criar uma historinha. Capriche no roteiro. Você<br />
tem que criar um cenário onde exista alguma informação que o seu<br />
chefe não possa ter acesso.<br />
No meu caso, eu tinha como trunfo o fato de ser uma empresa dos<br />
amigos do meu pai. Se ele pesquisasse sobre o assunto, nunca acharia<br />
na<strong>da</strong>.<br />
No caso <strong>da</strong> estagiária, ela tinha que manter o sigilo profissional do<br />
próprio negócio.<br />
Ambas histórias são duvidosas. Mas fazem sentido. E se você for um<br />
estagiário sério, com credibili<strong>da</strong>de, e não gaguejar na hora de pedir<br />
demissão, ninguém vai fazer uma sabatina para saber os detalhes.<br />
Mesmo que alguém desconfie, sua saí<strong>da</strong> vai ser aceita. E aceita<br />
com tranquili<strong>da</strong>de.<br />
É como a clássica cena do marido chegando em casa de madruga<strong>da</strong>.<br />
Ele diz que estava numa reunião extraordinária e põe a credibili<strong>da</strong>de à<br />
prova. Se o cara for um bom moço, não estiver com bafo de cerveja,<br />
perfume de mulher ou batom na gola, por que não acreditar?<br />
Você pode usar sua imaginação de criador.<br />
Agora, sinceramente, eu olho hoje para essa minha atitude e não acho<br />
legal. Diria mais: sinto vergonha. A minha recomen<strong>da</strong>ção é justamente<br />
o contrário.<br />
187
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
Se você realmente tiver tranquili<strong>da</strong>de e envergadura para enfrentar o<br />
seu chefe, e ele for um cara legal, a melhor maneira de sair é sendo<br />
transparente.<br />
Como diz o Felipe: a ver<strong>da</strong>de liberta.<br />
O grande problema é que as pessoas não estão prepara<strong>da</strong>s para a<br />
transparência. E que a maioria dos chefes são autoritários e egocêntricos.<br />
Aí, você tem que enfrentar o sistema. E talvez uma “ver<strong>da</strong>de com<br />
açúcar” não seja tão questionável.<br />
Mas não há na<strong>da</strong> melhor do que simplesmente dizer a ver<strong>da</strong>de, botar<br />
a cabeça no travesseiro e dormir tranquilo.<br />
o quinto estágio.<br />
Fiquei alguns dias parado, descansando, mas me entediei rapidinho.<br />
Queria um novo estágio, e não sabia como.<br />
Então, peguei o guia telefônico (naquela época, a internet estava engatinhando,<br />
não existia nenhum tipo de ca<strong>da</strong>stro de agências) e comecei<br />
a ligar uma a uma.<br />
Fui por ordem alfabética. Alô? Eu gostaria de saber: vocês estão procurando<br />
estagiário na área de re<strong>da</strong>ção?<br />
Já na primeira tentativa eu dei pé quente. Os caras queriam justamente<br />
um estagiário para criação. No mesmo dia, fui lá, mostrei alguns<br />
trabalhos, fiz uma espécie de teste vocacional (completamente sem<br />
sentido, diga-se de passagem) e fui selecionado.<br />
Era uma típica agência familiar, onde trabalhavam pai (atendimento),<br />
mãe (espécie de faz-tudo) e os dois filhos (um atendimento e outro<br />
diretor de criação).<br />
Apesar de também ser pequena – devia ter uma dez pessoas –, era<br />
uma evolução para mim. Lá, comecei a entender um pouco <strong>da</strong> dinâmica<br />
de departamentos.<br />
Eles tinham vários estagiários, todos fazendo um misto de direção<br />
de arte e produção. Por causa disso, o nível do trabalho era muito<br />
baixo. Também tinha uma re<strong>da</strong>tora contrata<strong>da</strong>. Mas ela não elevava<br />
muito o padrão: era desinteressa<strong>da</strong>, acomo<strong>da</strong><strong>da</strong> e não fazia quase<br />
na<strong>da</strong> legal.<br />
189
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
Como vocês devem ter notado, a minha vaga era muito mais de Direção<br />
de Arte do que de Re<strong>da</strong>ção. Passava o dia layoutando cartões,<br />
folhetos, tags, placas de esquina e anúncios ro<strong>da</strong>pé. Mas como eu<br />
não me satisfazia muito com os títulos <strong>da</strong> re<strong>da</strong>tora, comecei a sugerir<br />
opções em paralelo. Queria mostrar para eles que eu era capaz de<br />
fazer as duas coisas.<br />
E aí, eu naturalmente comecei a me destacar no meio dos outros estagiários.<br />
Enquanto todo mundo só fazia o que era pedido, eu ia além.<br />
Layoutava o que me man<strong>da</strong>vam – sempre muitas e muitas opções – e<br />
depois ficava lá, sugerindo títulos e outras ideias.<br />
Virei o queridinho do diretor de criação – o que não chegava a ser uma<br />
grande façanha, já que o resto do pessoal fazia um trabalho muito<br />
burocrático. Mas antes mesmo de colher os frutos desse reconhecimento,<br />
pedi as contas e fui embora.<br />
O lugar tinha um vibe estranha. A matrona tratava os estagiário como<br />
filhos, mas pelo lado ruim. Estava sempre xingando alguém, e sempre<br />
além do limite profissional. O atendimento tinha um jeito meio estranho.<br />
E o diretor de criação, segundo boatos, tinha um rolo que eu<br />
prefiro nem relatar aqui.<br />
Foram apenas três meses. Mas foram bem proveitosos. Como eu passava<br />
o dia layoutando, aprendi na marra a mexer nas ferramentas de<br />
layout. Posso até dizer que foi ali que eu aprendi a layoutar.<br />
A layoutar mal, mas aprendi.<br />
mãe dinah.<br />
Quando avisei que estava indo embora, falei para a publicitária-mãe.<br />
Estou indo trabalhar na Zeppelin. O que acabou sendo uma previsão<br />
de fazer inveja a qualquer jogador de búzios.<br />
Pouco tempo depois, eu realmente consegui um estágio na Zeppelin.<br />
Não por coincidência: eu tinha muitos amigos <strong>da</strong> facul<strong>da</strong>de por lá.<br />
Amigo indica amigo, que indica amigo, que me indicou.<br />
Como a tarefa que eu iria realizar não tinha nenhum pré-requisito, além<br />
de um teleencéfalo minimamente desenvolvido e de um polegar opositor,<br />
minha pasta não serviu para na<strong>da</strong>.<br />
Repare: o que me colocou lá dentro foi apenas o network, já falado<br />
neste guia.<br />
Este foi – disparado – o melhor estágio que eu poderia desejar para<br />
a minha formação como criador. E tudo o que eu precisei foi só um<br />
pouco de sorte, alguns bons contatos e perceber uma grande oportuni<strong>da</strong>de<br />
onde pouca gente percebeu.<br />
191
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
o sexto estágio.<br />
A Zeppelin é uma <strong>da</strong>s maiores produtoras de comerciais do Brasil. Na<br />
época, ela já era respeita<strong>da</strong> no mercado local, e estava começando a<br />
trabalhar de maneira mais constante com agências de São Paulo.<br />
Como to<strong>da</strong> produtora que se preze, ela tinha um arquivo, onde ficavam<br />
to<strong>da</strong>s as fitas VHS e Betas. Esse departamento era gerenciado<br />
por uma menina chama<strong>da</strong> Gabriela, que sabia de cor onde estavam<br />
todos os filmes.<br />
– Gabi, onde está o comercial Bola<strong>da</strong> Pepsi? – Naquela beta grande,<br />
que fica na última prateleira, atrás de uma pilha de fitas virgens.<br />
Só que um dia a Gabriela pediu as contas, e todo o arquivo <strong>da</strong> produtora<br />
teve que ser catalogado. Alguém teria que ver fita a fita, filme a<br />
filme, ca<strong>da</strong>strar um a um, com a secun<strong>da</strong>gem exata e breve descrição<br />
do comercial.<br />
E esse alguém era eu.<br />
Em outras palavras: eu tive oportuni<strong>da</strong>de de ver todo o acervo <strong>da</strong><br />
produtora. Desde os comerciais mais antigos aos mais modernos. Vi<br />
as fitas brutas, com as imagens não monta<strong>da</strong>s. Vi as matrizes, com<br />
os comerciais editados. Vi uma coleção inteira de Shots e Latin Spots,<br />
com comerciais estrangeiros premiados no mundo inteiro. Vi animações.<br />
Vi curtas metragens. Vi longas. Vi a história <strong>da</strong> Zeppelin. Vi a<br />
história <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> gaúcha.<br />
Tive acesso a referências que nenhum estagiário na minha i<strong>da</strong>de poderia<br />
ter. Eu estava no lugar certo, na hora certa.<br />
Além de catalogar as fitas, também tinha que fazer to<strong>da</strong>s as cópias <strong>da</strong><br />
produtora. Era meio chato, especialmente porque eu tinha que pedir<br />
licença para o pessoal <strong>da</strong> finalização (a dupla <strong>da</strong> época nunca me<br />
tratou com, digamos, muita consideração).<br />
Mas eu não estava nem aí. Fazer as cópias e aturar o mau humor<br />
alheio era um preço pequeno para tudo o que eu estava absorvendo.<br />
Pude perceber a evolução <strong>da</strong> fotografia, do tratamento <strong>da</strong> imagem,<br />
<strong>da</strong> montagem. Lá nos primórdios <strong>da</strong> Zeppelin, era tudo muito simples.<br />
Mas à medi<strong>da</strong> que a produtora ia crescendo, a sofisticação e o acabamento<br />
dos filmes iam ficando absolutamente nítidos.<br />
Eu era um bom estagiário. Apesar de alguns erros crassos – como enviar<br />
para a Globo um comercial errado, que felizmente foi trocado a tempo –,<br />
eu era um bom estagiário. Era voluntarioso e não afrouxava nunca.<br />
Por exemplo: uma vez, precisaram de alguém para <strong>da</strong>r uma força na<br />
produção de um comercial de cerveja. Não tinham quem convocar, e<br />
lá fui eu. Virei duas noites segui<strong>da</strong>s (isso não é figura de linguagem)<br />
mesmo não sendo minha função. E no outro dia, eu estava de pé, na<br />
produtora, fazendo as cópias e catalogando os comerciais. Por essas<br />
e outras, foram soltando a cor<strong>da</strong>. Comecei a digitalizar alguns materiais<br />
para montagem. Comecei a ser melhor recebido pelo pessoal <strong>da</strong> finalização.<br />
Começaram a pintar oportuni<strong>da</strong>des para que eu crescesse por lá.<br />
Mas você devem lembrar:<br />
Meu objetivo era ser re<strong>da</strong>tor. Então, nenhuma dessas possibili<strong>da</strong>des<br />
me comoveu muito. Pelo contrário: antes de assumir um compromisso<br />
lá dentro, saltei fora. Eu tinha um outro compromisso, comigo mesmo.<br />
Começava a última etapa do meu plano.<br />
193
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
perÍodo de reclusão.<br />
Sabe quando o vilão perde para o mocinho, desaparece por um tempo<br />
e, depois, ele volta muito mais poderoso? Aqueles trailers que dizem:<br />
He’s back!<br />
Pois eu queria fazer meio isso. Sair de circuito por um tempo e fortalecer<br />
a minha pasta. Para, quando voltasse a apresentá-la nas agências,<br />
tivesse um material mais maduro.<br />
Sentei a bun<strong>da</strong> na cadeira e, ao longo de dois meses, montei a melhor<br />
pasta que eu poderia produzir dentro <strong>da</strong>s minhas limitações. Eu<br />
praticamente <strong>da</strong>va expediente, só que em casa. Trabalhava to<strong>da</strong>s as<br />
tardes religiosamente. (À noite, eu saía com meus amigos. De manhã,<br />
curava a ressaca. Ninguém é de ferro.)<br />
Foi um dos períodos mais produtivos, talvez o mais produtivo, do meu<br />
início de vi<strong>da</strong> profissional. Eu era uma máquina. Ou melhor: uma maquininha,<br />
já que tinha um critério muito ingênuo na época.<br />
Produzia anúncios em série, praticamente um por dia. Fazia tudo. A<br />
direção de arte, a re<strong>da</strong>ção. Se tinha que tirar fotos, eu mesmo tirava.<br />
Se tinha que tratar imagem, lá ia eu. Viram por que é tão importante<br />
saber se virar sozinho?<br />
Em determinado momento, achei que estava bem servido. Eu tinha<br />
algo como 30 peças. Gravei tudo num Zip Drive – se você não sabe o<br />
que é isso, não se preocupe: você nunca vai precisar saber – e mandei<br />
imprimir na facul<strong>da</strong>de.<br />
Mas eu olhei para a minha pasta e achei que estava meio careta. Então,<br />
juntei todo o meu material autoral e coloquei junto. Crônicas, poesias,<br />
letras de música, ilustrações, charges. Na época, não sabia se ia<br />
<strong>da</strong>r certo. Hoje eu sei que pesou bastante a meu favor.<br />
Para aju<strong>da</strong>r, tive sucesso em três premiações universitárias, que confirmaram<br />
que o trabalho produzido nesse período de reclusão tinha algum<br />
valor. Numa delas, ganhei uma viagem para Porto Seguro. O que<br />
só facilitou as coisas: eu ia para a Bahia, tirava umas pequenas férias<br />
dentro <strong>da</strong>s minhas férias e, na volta, procurava um emprego.<br />
195
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
o primeiro estágio<br />
como re<strong>da</strong>tor.<br />
Uma <strong>da</strong>s agências mais tradicionais do mercado do RS tinha um programa<br />
de contratações muito legal, chamado Estagiário do Futuro.<br />
Funcionava assim: você man<strong>da</strong>va o seu portfólio e indicava se queria<br />
vaga para Direção de Arte ou Re<strong>da</strong>ção. Também havia vagas para os<br />
outros departamentos, mas a Criação era infinitamente mais concorri<strong>da</strong>.<br />
Muitas pastas entravam na disputa (não lembro exatamente, mas<br />
chutaria umas 100). Eles selecionavam três duplas. A melhor, trabalharia<br />
de janeiro a abril. A segun<strong>da</strong> melhor ficava de maio a agosto. E a<br />
terceira ia de outubro até o final do ano.<br />
Achei que essa era uma boa oportuni<strong>da</strong>de para testar o meu trabalho.<br />
E pelo visto, foi mesmo: minha pasta acabou sendo seleciona<strong>da</strong> como<br />
a melhor de Re<strong>da</strong>ção.<br />
Só isso bastaria para me deixar feliz por muitos e muitos dias. Mas<br />
tinha mais.<br />
Chegando na entrevista, a primeira coisa que perguntaram foi sobre o<br />
meu dupla. Estavam curiosos para saber quem tinha feito os layouts<br />
dos meus anúncios.<br />
Quando descobriram que era eu, veio a segun<strong>da</strong> grande notícia: eles<br />
haviam me selecionado também como melhor portfólio de Direção de<br />
Arte. Eu literalmente podia escolher com qual <strong>da</strong>s vagas ficar.<br />
Falando hoje, parece pouco. Mas para um estagiário cheio de dúvi<strong>da</strong>s,<br />
foi um suspiro de alívio. Lembrem-se: eu tinha um plano de carreira<br />
na<strong>da</strong> comum. Enquanto eu estava lá, escrevendo no jornal piloto,<br />
layoutando cartões de visita, catalogando comerciais, meus colegas<br />
de facul<strong>da</strong>de re<strong>da</strong>tores já estavam em agências legais.<br />
Eu sempre me perguntava se estava fazendo a coisa certa. Nesse dia,<br />
eu tive certeza que sim.<br />
197
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
o último estágio<br />
como re<strong>da</strong>tor.<br />
Logo na minha chega<strong>da</strong>, percebi que aquele era um ótimo ambiente<br />
para eu me firmar.<br />
A Re<strong>da</strong>tora do Ano estava lá e poderia me <strong>da</strong>r boas dicas. Por sinal,<br />
a agência tinha uma cultura de re<strong>da</strong>ção, especialmente nos trabalhos<br />
de rádio.<br />
A criação tinha apenas duas duplas, além dos estagiários. Numa estrutura<br />
assim, os brains coletivos são mais comuns. Para mim, era<br />
uma grande chance para conferir de perto o processo criativo dos<br />
caras mais experientes.<br />
A pauta era organiza<strong>da</strong> e os prazos bem razoáveis. Para um iniciante,<br />
um sonho.<br />
Mas apesar de trabalhar quase na CNTP, o que realmente acelerou<br />
minha carreira foi (mais) um festival universitário. Para minha sorte, o<br />
júri era forma do só por profissionais do mercado. Entre eles, estavam<br />
a Keka Morelle e o Gustavo Diehl (duas pessoas especiais que já nos<br />
prestigiaram com aulas na Perestroika).<br />
A minha campanha era totalmente all type, diferente dos outros caras,<br />
que fizeram ideias visuais rebuscadíssimas. Por sinal, vale a pena<br />
contextualizar: na época, as ideias visuais eram uma febre nas competições<br />
de propagan<strong>da</strong>.<br />
O Guga e a Keka gostaram do meu trabalho, pediram para a comissão<br />
organizadora o meu e-mail e marcamos uma entrevista. O papo foi bacana<br />
e me indicaram para o Diretor de Criação. O cara também gostou<br />
e, ao final <strong>da</strong> conversa, fez uma quase-proposta. Só pediu para eu esperar<br />
uma nova ligação, pois ele precisava resolver mínimos detalhes.<br />
Estava a um passo de trabalhar numa agência incrível. O sonho de<br />
consumo de todo estagiário <strong>da</strong> época. Tinha um perfil bastante criativo<br />
e recém havia criado uma <strong>da</strong>s campanhas mais criativas <strong>da</strong> história<br />
<strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> brasileira.<br />
A agência que eu estava era muito legal. Mas uma possível proposta<br />
seria irrecusável.<br />
Mesmo sem a confirmação, eu tinha motivos de sobra para acreditar<br />
que a vaga era minha. O principal deles foi uma extrema empolgação<br />
que virou afobação. Nunca se conta com o ovo no cu <strong>da</strong> galinha.<br />
Voltei para a agência, chamei os meus superiores e já fui avisando que<br />
estava de saí<strong>da</strong>. Isso causou um corre-corre. E por um bom motivo<br />
(pelo menos, bom para mim): os caras não queriam me perder de jeito<br />
nenhum. Então, me fizeram um pedido.<br />
Espere até amanhã para <strong>da</strong>r a resposta. Vamos fazer uma proposta<br />
para te contratar.<br />
Justo.<br />
Mas vejam só como é a vi<strong>da</strong>. No dia seguinte, antes mesmo de receber<br />
a proposta <strong>da</strong> agência que estava, recebi uma ligação do Gustavo.<br />
Achei que era apenas para confirmar a vaga. Só que era justamente<br />
o contrário: ele me contou que os planos tinham mu<strong>da</strong>do. Um atendimento<br />
<strong>da</strong> agência iria receber uma oportuni<strong>da</strong>de na criação. A vaga<br />
tinha se fechado para mim. (Curiosi<strong>da</strong>de: tempos depois, descobri<br />
que o cara em questão era o Felipe Anghinoni, hoje meu sócio.)<br />
199
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />
No final <strong>da</strong>s contas, a proposta para me segurar na agência veio. Mesmo<br />
sem confirmação <strong>da</strong> concorrente. Mesmo com apenas quatro meses<br />
de agência. Fui efetivado, ganhei carteira assina<strong>da</strong>, ticket, valerefeição<br />
e um belo aumento.<br />
E aí, deixei de ser estagiário.<br />
apêndice: miami ad school.<br />
Muita gente pergunta sobre a minha experiência na Miami Ad School.<br />
Então, acho que valem algumas palavrinhas.<br />
Na época em que eu fui, os Portfolio Programs só existiam no exterior.<br />
Por isso, rolava uma curiosi<strong>da</strong>de maior.<br />
Hoje em dia, com a proliferação desse modelo no país (só para citar<br />
algumas: Cuca, Lemon School, Escola de Criação <strong>da</strong> ESPM, além <strong>da</strong><br />
própria Miami Ad School de SP), essa curiosi<strong>da</strong>de diminuiu. Por isso,<br />
não vou gastar o seu tempo explicando tintim por tintim.<br />
Confesso para vocês que eu me frustei um pouco. Claro que aprendi<br />
muito. Claro que tive ótimos professores. Mas o modelo, na minha<br />
opinião, era previsível. E ser previsível é tudo o que eu não espero de<br />
uma escola de criação.<br />
A MAS ensinava pela tentativa e erro, e não pela instrumentalização. É<br />
um método válido, mas que não me satisfazia.<br />
Eu pensava: Se essa é considera<strong>da</strong> a melhor escola de criação do<br />
mundo, tem alguma coisa erra<strong>da</strong>.<br />
Que fique claro: não estou colocando to<strong>da</strong>s as portfolio school no<br />
mesmo saco. Acredito que muitas <strong>da</strong>s cita<strong>da</strong>s acima sejam excelentes.<br />
A questão não era a quali<strong>da</strong>de do ensino, mas a diferente entre<br />
a minha expectativa e o que eles tinham para me oferecer. Sonhava<br />
com uma escola com aulas realmente diferentes. Que conseguissem<br />
ser subversivas, técnicas e inspiradoras ao mesmo tempo.<br />
Esse foi um dos embriões fun<strong>da</strong>mentais para o nascimento <strong>da</strong> Perestroika.<br />
201
capÍtulo 9
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
se Você chegou até aqui.<br />
Parabéns. Ou resistiu bravamente aos oito capítulos anteriores. Ou<br />
você é leitor de segun<strong>da</strong> viagem, e veio só conferir o que há de novo.<br />
Seja qual for o seu caso, muito obrigado. Fico, sinceramente, agradecido<br />
com o prestígio.<br />
E pretendo retribuir à altura. Estou neste momento na Singularity, fazendo<br />
meu programa de Futurismo. Um nome cheio de pompa para<br />
“leitura de cenários”.<br />
Então, separei aqui o que julgo ser uma visão um pouco mais futurista<br />
<strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>. Talvez, para você, iniciante, algumas <strong>da</strong>s coisas nem<br />
façam muito sentido. Para você, que é desconfiado, talvez pareça ficção<br />
científica.<br />
Mas, a ver<strong>da</strong>de é que eu realmente acredito nisso.<br />
Peço desculpas se alguns dos meus pensamentos aqui parecerem<br />
contraditórios com o que foi dito antes. Corro esse risco. O conhecimento<br />
exponencial nos prega peças.<br />
Também não quero bancar o sabe-tudo. São apenas tentativas de desenhos<br />
de cenários futuros. O objetivo não é acertar. Mas tentar pensar<br />
qual é o próximo passo.<br />
Um futurista trabalha no mesmo terreno dos criativos: a imaginação.<br />
Então, como você bem sabe, as coisas não são fáceis.<br />
Estamos no mesmo lado.<br />
qual é o futuro<br />
<strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>?<br />
Obviamente, ninguém sabe. Nem o maior futurista do mundo é capaz<br />
de prever, com 100% de certeza, o que vem pela frente.<br />
Mas algumas tendências parecem nos aju<strong>da</strong>r a entender qual são os<br />
desafios <strong>da</strong> nova comunicação.<br />
A primeira delas é a compreensão dos avanços tecnológicos. Hoje, a<br />
inteligência artificial e o processamento de grandes capaci<strong>da</strong>des de<br />
<strong>da</strong>dos é muito diferente de dez anos atrás.<br />
As máquinas do presente são capazes de reproduzir (leia-se: copiar<br />
por conta própria, a partir de uma programação prévia), com muita facili<strong>da</strong>de,<br />
qualquer peça de design gráfico. São, inclusive, capazes de<br />
produzir arte. Nem mesmo os críticos profissionais são capazes de diferenciar<br />
o que é realizado por humanos e o que é feito por máquinas.<br />
A mesma coisa para texto. Bots coletam informações de um evento<br />
esportivo e escrevem um artigo sobre a parti<strong>da</strong>. Com pia<strong>da</strong>s, sarcasmo<br />
e referências externas. Impossível dizer que foi feito por um monte<br />
de silício. Só a Forbes, no ano passado, publicou milhares de artigos<br />
usando esse tipo de recurso. E quase ninguém notou.<br />
É fácil encontrar na internet artigos falando de computadores que<br />
criam música ou que editam vídeos sozinhos. Já existem algorítmos<br />
que identificam, com uma precisão de cerca de 60%, se uma música<br />
vai para as para<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Billboard ou não.<br />
205
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
Obviamente, já existem robôs produzindo propagan<strong>da</strong>. você preenche<br />
algumas informações (como clientes, o principal diferencial competitivo<br />
e qual é o objetivo <strong>da</strong> comunicação) e ele entrega, prontinho:<br />
uma foto (retira<strong>da</strong> de um banco de <strong>da</strong>dos), um conceito (criado pela<br />
máquina) e a assinatura. Está muito longe de ser bom. Mas não é difícil<br />
imaginar uma drástica evolução nos próximos anos.<br />
Esses exemplos não são futuro. São presente. Ou melhor: são passado,<br />
porque já existem há algum tempo.<br />
Quando percebemos isso, nos <strong>da</strong>mos conta de uma ver<strong>da</strong>de cruel: as<br />
máquinas serão – se já não são – criativas.<br />
Essa é uma ver<strong>da</strong>de dura. Porque nós, do ramo criativo, sempre imaginamos<br />
que não seríamos substituídos por esse monte de parafusos.<br />
Achávamos que nós, criativos, estaríamos ilesos aos avanços tecnológicos.<br />
Essa preocupação que deveria ter aquele cara que aperta parafuso<br />
na fábrica de carros e que, claramente, seria vencido por um<br />
braço mecânico. Muito mais preciso, muito mais rápido, muito mais<br />
barato, e que trabalha 24h por dia, sem férias e décimo terceiro.<br />
Minha impressão? Não dá para ter certeza quando isso acontecerá.<br />
Mas, provavelemnte, vai sobrar para os criativos publicitários também.<br />
peraÍ que agora fiquei<br />
nerVoso: como assim?<br />
Calma, calma. Vale lembrar que os grandes avanços tecnológicos demoram<br />
a chegar no mercado. Às vezes trinta anos. Ultimamente, tem<br />
sido mais rápido. Mas não será amanhã que você chegará na agência<br />
e encontrará um computador trabalhando sozinho.<br />
O mais importante, na minha opinião, é você entender o contexto.<br />
207
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
ok, essa é a má notÍcia.<br />
e qual é a boa?<br />
Na ver<strong>da</strong>de, essa é a boa notícia. A outra grande mu<strong>da</strong>nça que a<br />
comunicação enfrentará em breve é isso associado aos serviços de<br />
geolocalização.<br />
Imagine o seguinte: você está perto de um restaurante. O dono vendeu<br />
apenas dez pratos do dia, quando previu vinte. Se ficar encalhado<br />
com dez, terá um belo prejuízo. Melhor oferecer uma promoção<br />
de última hora e garantir um lucro, mesmo que seja menor do que<br />
o esperado.<br />
Legal. Mas como se faz isso?<br />
Simples: o nosso celular terá um imenso banco de <strong>da</strong>dos <strong>da</strong>s duas<br />
compras. Terá o nosso perfil, os nossos gostos, o nosso ticket médio,<br />
o nosso prato predileto.<br />
Do outro lado, a rede do restaurante emite uma mensagem para todos<br />
os mobiles num raio de 5 km. E, vejo só: capta você, baseado nas<br />
suas informações.<br />
“Só hoje: prato do dia com 50% de desconto”.<br />
Você gosta <strong>da</strong> ideia, vai lá, enche a pança e economiza uns trocados.<br />
Na<strong>da</strong>, ou muito pouco disso, será feito por humanos. A informação<br />
que o restaurante está encalhado será gera<strong>da</strong> automaticamente por<br />
um sistema de inteligência artificial, que criará o anúncio sozinho<br />
(como faz com os artigos jornalístico hoje em dia) e enviará por wireless.<br />
O seu celular cruza esse <strong>da</strong>do com o seu perfil automaticamente<br />
e, ao perceber que pode ser interessante, pula na tela um anúncio.<br />
Não entro no mérito se isso é criativo ou não. Mas acredito que esse<br />
formato é bastante viável, efetivo e não está muito longe de acontecer.<br />
Portanto, fica aí a minha dica.<br />
209
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
por outro lado.<br />
Por outro lado, você pode dizer. É, mas em vez de ter o anúncio do<br />
Weather Channel, pode ter um <strong>da</strong> Coca-cola. Aproveite que hoje está<br />
calor.<br />
Ver<strong>da</strong>de. Até que o Google mude o seu modelo de negócio (em breve).<br />
dica.<br />
Muita gente fala que o futuro <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> é o mobile. E quando se<br />
fala em mobile, normalmente se pensa em celular.<br />
Mobile, se formos analisar de forma literal, significa “móvel”.<br />
Você já deve ter visto o Google Glass. As informações que aparecem<br />
ali não vêm do seu celular, mas de um aparelho móvel.<br />
E aí está o grande pulo do gato.<br />
Pense que, quando você olhar para o céu, enxergará a temperatura,<br />
sem ter que entrar no Weather Channel para conferir se fará sol ou se<br />
vai cair um toró.<br />
A lógica interruptiva <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>, que vê tudo como mídia, seria:<br />
“já sei, vamos botar um anúncio do Weather Channel ao lado <strong>da</strong> previsão<br />
do tempo. Assim, quando ele olhar para o céu, teremos nossa<br />
marca associa<strong>da</strong> ao serviço prestado”.<br />
A questão não é essa. A questão é: se ele já tem a informação <strong>da</strong><br />
temperatura (ofereci<strong>da</strong> por sensores, não pelo site), por que a gente<br />
precisa do Weather Channel?<br />
E se a gente não precisa do Weather Channel, qual é o sentido do<br />
Weather Channel existir?<br />
E se ele não existir, como vai anunciar?<br />
211
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
nem tudo está perdido.<br />
A ver<strong>da</strong>deiro boa notícia é que muitas <strong>da</strong>s empresas líderes no ramo<br />
de tecnologia ain<strong>da</strong> baseiam seu modelo de negócio em anúncios.<br />
Google e Facebook, só para citar dois, ain<strong>da</strong> não encontraram um<br />
modelo sustentável sem depender disso.<br />
Portanto: talvez o Google realmente precise botar algum tipo de anúncio<br />
para pagar as contas do sensor que informará você <strong>da</strong> temperatura.<br />
Se pensarmos assim, certamente por um bom tempo, ain<strong>da</strong> haverá<br />
espaço para a publici<strong>da</strong>de.<br />
O que você deve ter em mente é que o futuro nos reserva mu<strong>da</strong>nças.<br />
Seja qual for o sistema, provavelmente a informação será gera<strong>da</strong> automaticamente,<br />
com pouca (ou nenhuma) interferência humana.<br />
Será puro processamento de <strong>da</strong>dos.<br />
mu<strong>da</strong>nça na remuneração<br />
O próprio Google pode estar migrando para um modelo de remuneração<br />
através dos devices (o Google Glass não é grátis, certo?). Veja o<br />
tablet recém lançado. Ou o Google Car. Isso pode ser, tranquilamente,<br />
um indicativo de que propagan<strong>da</strong> não é quem paga a conta.<br />
Será que o Google não está mu<strong>da</strong>ndo o seu sistema de remuneração?<br />
E se o business model do Google mu<strong>da</strong>r, será que a indústria inteira<br />
não mu<strong>da</strong> junto?<br />
213
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
mas isso Vai<br />
acontecer quando?<br />
Não faço a menor ideia. Se você quer um chute, assim, sem responsabili<strong>da</strong>de?<br />
Diria que em cinco anos estará no mercado. O que não<br />
significa que estará em TODO o mercado. Como comentei antes: as<br />
tecnologias, depois de desenvolvi<strong>da</strong>s, demoram um bom tempo até<br />
se popularizarem.<br />
E se pensarmos no Brasil, um país que está crescendo, mas que ain<strong>da</strong><br />
tem muito a evoluir, pode ser que ser que demore muito mais. E se<br />
pensarmos que todo o nosso mercado ain<strong>da</strong> se remunera dentro de<br />
uma comissão de mídia, talvez seja ain<strong>da</strong> mais complicado.<br />
Entretanto, acho que você entendeu meu recado.<br />
Se não entendeu, eu peço aju<strong>da</strong> de um robozinho para escrever<br />
pra mim.<br />
importante:<br />
a propagan<strong>da</strong> está mu<strong>da</strong>ndo<br />
exponencialmente.<br />
Nós, seres humanos, temos uma mania de pensar de forma linear. Não<br />
nos <strong>da</strong>mos conta que o avanço tecnológico acontece de forma exponencial.<br />
Pense no caminho que as mídias percorreram. O jornal existia<br />
há muito tempo, quando chegou o rádio. Algum tempo depois, veio a<br />
TV. Algum tempo, começaram a pipocar novas mídias. Até que surgiu<br />
a internet e acelerou o processo de forma muito intensa.<br />
Para os mais desatentos, pode parecer que a internet é a grande responsável<br />
pela mu<strong>da</strong>nça. Quando, ao analisar o cenário de mídia como<br />
um todo, não é difícil perceber a curva que está subindo abruptamente.<br />
E a internet é só mais um ator dessa peça.<br />
Portanto, fique atento. As mídias serão substituí<strong>da</strong>s numa veloci<strong>da</strong>de<br />
muito diferente do que estamos acostumados a pensar.<br />
Pense nisso.<br />
215
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
reflexão.<br />
Se você entrou na publici<strong>da</strong>de para fazer a publici<strong>da</strong>de que você conhece<br />
hoje, eu tenho um conselho. Pense bem.<br />
É provável que os modelos sejam revistos nos próximos anos, e que<br />
tenhamos uma transformação muito maior do que a que está aconteceu<br />
pela internet.<br />
Esteja preparado para a mu<strong>da</strong>nça, porque ela vai acontecer.<br />
depois de tantos<br />
conselhos, só me faça um<br />
faVor: pense com carinho.<br />
Sei que você não disse na<strong>da</strong> aí do outro lado. Mas se você me pedisse<br />
um único conselho, eu diria, <strong>da</strong> maneira mais carinhosa possível:<br />
pense com carinho.<br />
Pense com carinho se você realmente quer trabalhar com propagan<strong>da</strong>.<br />
E quando disso isso, peço que você não interprete meu comentário<br />
como uma desaprovação. Quem sou eu para ir contra a sua vocação.<br />
Se você gosta de publici<strong>da</strong>de, e está decidido, me coloco justamente<br />
do outro lado. Dou o maior apoio.<br />
Também não estou dizendo que a propagan<strong>da</strong> vai morrer. Se você fez<br />
essa interpretação, peço que volte até a primeira casa, e revise todo o<br />
texto. Você vai ver que não é por aí.<br />
Meu ponto é: lembre-se que ninguém é OBRIGADO a trabalhar<br />
com propagan<strong>da</strong>.<br />
Digo isso porque, na minha época, as pessoas que queriam expressar<br />
a sua criativi<strong>da</strong>de não tinham muito para onde ir. Hoje, existem<br />
muitas alternativas. Na internet, elas são quase infinitas. Não é legal<br />
ver um monte de gente produzindo suas próprias séries no Youtube e<br />
ganhando dinheiro com isso?<br />
217
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
Eu acho o máximo.<br />
Antigamente, esses talentos seriam obrigado a trabalhar numa agência.<br />
Uma <strong>da</strong>s poucas alternativas viáveis para se envolver com criativi<strong>da</strong>de<br />
e pagar as contas no final do mês.<br />
Portanto, só pense com carinho.<br />
Repito: enten<strong>da</strong> bem o que estou dizendo. Não estou falando que a<br />
solução é largar a facul<strong>da</strong>de para produzir vídeos engraçadinhos no<br />
Youtube. Essa é só UMA <strong>da</strong>s alternativas.<br />
Também vale lembrar que fugir do tradicional é um caminho duro. Para<br />
ca<strong>da</strong> Porta dos Fundos que emplaca, temos milhares de anônimos<br />
que não chegam nem aos 100 views.<br />
O que estou fazendo é provocando você. Se você é realmente criativo,<br />
você deve, antes de qualquer movimento, sair <strong>da</strong> caixinha. Existem<br />
possibili<strong>da</strong>des incríveis fora do sistema tradicional. Especialmente<br />
para, nós, brasileiros, que demos o maior pé quente. O país decidiu<br />
crescer justamente quando a internet ofereceu oportuni<strong>da</strong>des nunca<br />
existentes em termos de criativi<strong>da</strong>de.<br />
Empreender (no caso, uma empresa liga<strong>da</strong> à criativi<strong>da</strong>de, que não<br />
trabalhe necessariamente com propagan<strong>da</strong>) não é fácil. Mas pode ser<br />
muito mais recompensador.<br />
Vi centenas de amigos optarem pela carreira publicitária por falta de<br />
opções. Não é o seu caso.<br />
Portanto, pense com carinho.<br />
O mundo é tão grande quanto a sua criativi<strong>da</strong>de.<br />
o noVo publicitário<br />
é um comunicador.<br />
Uma vez, twittei: “O maior erro <strong>da</strong> publici<strong>da</strong>de é tentar ser publici<strong>da</strong>de<br />
antes de ser comunicação”.<br />
Por isso, antes de virar um publicitário, que fala publicitês, apren<strong>da</strong><br />
outra língua. A língua mãe de todos os seres humanos. Que está na<br />
essência <strong>da</strong>s relações humanas.<br />
Na medi<strong>da</strong> que a comunicação um-para-muitos perde espaço para a<br />
um-para-um, que trabalhamos com plataforma, que emergem conceitos<br />
como Riqueza Social, fica claro: temos que ser mais RPs do PPs.<br />
Vou repetir: temos que ser mais RPs do que PPs. Se você me perguntar<br />
qual é o futuro <strong>da</strong> profissão, antes de falar em robôs criativos, eu<br />
certamente apostaria por aí.<br />
Isso não significa fazer um curso de RP, mas pensar que engajamento<br />
acontece muito mais pela profundi<strong>da</strong>de com poucos do que pela superficiali<strong>da</strong>de<br />
com muitos.<br />
219
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
último recado.<br />
Na Perestroika, temos alguns cursos de comunicação contemporânea.<br />
A tese que apresentamos é que, hoje, em termos contemporâneos,<br />
Fazer é maior Dizer.<br />
Ou, para ficar mais icônico: Fazer > Dizer.<br />
Muita gente confunde. Muita gente acha que estamos reforçando o<br />
conceito Vai lá e faz. “Ah, entendi: Fazer > Dizer é para a gente não<br />
ficar esperando muito e botar logo a mão na massa, né?”.<br />
Apesar do conselho acima também ser válido, não é bem isso.<br />
Fazer > Dizer significa que temos que procurar movimentos de comunição<br />
baseados menos no discurso e mais na ação. Uma propagan<strong>da</strong><br />
realizacional. Um evento. Uma coisa que aconteça.<br />
Para comunicar essa coisa, usamos as mídias tradicionais - que passam,<br />
dessa forma, a ser periféricas.<br />
Essa ação deve criar relacionamento com a sua audiência, criando Riqueza<br />
Social. Uma moe<strong>da</strong> invisível - mas que, ali na frente, vira dinheiro.<br />
De preferência, deve ter utili<strong>da</strong>de (Ad Utility, termo que ouvi pela primeira<br />
vez pela Livead), e ser um serviço para a socie<strong>da</strong>de.<br />
Deve deixar um legado, e fazer com que esse serviço se perpetue<br />
para muito além <strong>da</strong> ação de comunicação.<br />
E, para ser completa, deve ser auto-sustentável. É uma start-up comm:<br />
ela gera receita e se paga. Talvez, até dê lucro.<br />
O novo comunicador é um empreendedor.<br />
Realização, prestação de serviço, legado, riqueza social e lucro. Essas<br />
coisas não são excludentes. Já é presente. E será, na minha opinião, o<br />
futuro próximo de to<strong>da</strong> a comunicação.<br />
Minha dica final é essa: antes de ser publicitário, seja uma mistura de<br />
RP e empreendedor.<br />
221
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />
último recado. juro.<br />
Quando convidei outros criadores para que contribuíssem com seus<br />
conselhos, percebi que não era uma situação muito confortável.<br />
Na ver<strong>da</strong>de, era um puta injustiça.<br />
Eu tinha escrito páginas e páginas com o que eu julgava ser interessante.<br />
Não tive a difícil missão de filtrar, entre to<strong>da</strong>s as dicas que dei,<br />
a mais importante.<br />
Já com eles foi bem diferente. Pedi para que dessem um único conselho.<br />
Um conselho.<br />
O conselho.<br />
E ain<strong>da</strong> dei um briefing cheio de polices. Limite de linhas, prazo apertado<br />
e um foco não muito camara<strong>da</strong>.<br />
Por isso, para fechar, resolvi me colocar na mesma panela de<br />
pressão, para ver se eu conseguia me virar tão bem quanto eles<br />
se saíram.<br />
Pois a minha dica é: tenha um projeto que lhe dê orgulho.<br />
O seu projeto pode ser autoral, como está sendo este livro. Pode ser<br />
empresarial, como foi a Perestroika para mim. Pode ser filantrópico,<br />
como foi o Clube dos Jovens Criativos, do qual eu fiz parte desde a<br />
primeira reunião.<br />
O seu projeto pode ser o roteiro de um longa metragem. Pode ser a<br />
sua festa de casamento. Pode ser uma viagem de barco ao redor do<br />
mundo.<br />
Pode ser uma coisa despretensiosa. Pode ser uma busca espiritual.<br />
Pode ser o projeto <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>.<br />
Não importa. Tenha um projeto.<br />
Não viva no piloto automático. Tenha um projeto que lhe dê orgulho.<br />
Saiba o que você está fazendo e por que está fazendo.<br />
E quando você acabar, encontre um novo. E comece tudo de novo. E<br />
de novo. E de novo.<br />
Essa é a melhor forma de se sentir vivo.<br />
223
capÍtulo 10
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
introdução.<br />
A Perestroika tem um blog (<strong>perestroika</strong>.com.br) com atualizações<br />
diárias. Ou quase diárias. Lá, a gente discute tudo o que acha interessante.<br />
E um dos temas mais requisitados por quem nos lê são os<br />
conselhos profissionais.<br />
Pensei em colocar aqui todos os posts legais. Mas quando fiz o meu<br />
primeiro short-list, percebi que teria um grande problema. Gostava<br />
de muitos.<br />
Então, tive que tomar uma decisão drástica. Primeiro, fiz um filtro com<br />
50. Sim: o Top 50 do Blog <strong>da</strong> Perestroika.<br />
Reuni aqueles que, na minha opinião, valem a pena ser lidos por alguém<br />
que está procurando aju<strong>da</strong> no início <strong>da</strong> carreira.<br />
Depois, fiz um novo corte, só com os posts que foram escritos por<br />
mim e pelo Felipe, para preservar as opiniões de quem ain<strong>da</strong> continua<br />
na empresa. Achei educado.<br />
Então, fiz um corte radical. Escolhi os top 15 que mais fazem para o<br />
público leitor desse manual.<br />
Foi quando lembrei que, <strong>da</strong> primeira edição para cá, rolaram posts<br />
legais. Fiz um novo filtro e fiquei com 20. E pronto.<br />
Vale lembrar algumas coisas:<br />
Eles não estão organizados por ordem cronológica ou de preferência.<br />
Foi absolutamente randômico.<br />
Alguns posts sofreram pequenos ajustes em virtude <strong>da</strong>s imagens e<br />
vídeos que não puderam ser reproduzidos aqui.<br />
Sempre tente imaginar o post dentro do seu contexto. Vários são antigos<br />
e, hoje, talvez sejam menos impactantes do que na época em que<br />
foram escritos.<br />
Muitos posts foram escritos antes <strong>da</strong> reforma ortográfica.<br />
Não são necessariametne os melhores posts, na minha opinião. São<br />
os mais apropriados para este manual.<br />
227
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
1. foi lá e fez.<br />
Eu tenho a impressão que quanto mais tempo a gente leva pensando,<br />
menos tempo a gente se envolve fazendo. Claro, pensar e planejar é<br />
importante, nem vou entrar muito nesse mérito. O que diferencia o ser<br />
humano de todos os outros animais é justamente a capaci<strong>da</strong>de de raciocinar.<br />
Mas, talvez, o que diferencie uma pessoa de todos os outros<br />
seres humanos seja a capaci<strong>da</strong>de de realizar.<br />
Já vi muito departamento de planejamento de agência, e às vezes a<br />
agência como um todo, gostar de ficar intelectualizando, questionando,<br />
ruminando, pensando e repensando. Uma punheta mental que às<br />
vezes até gera um trabalho bem esclarecido, bem defendido. Mas que<br />
nunca funciona muito quando colocado em prática.<br />
Se até as regras <strong>da</strong> física que a gente aprende no colégio são para<br />
abstrair e não funcionam na prática como nos livros, imagina no universo<br />
<strong>da</strong> imaginação e criativi<strong>da</strong>de, onde as bases são bem mais subjetivas<br />
e abstratas.<br />
Acho que se o Ronaldinho pensasse muito, não tentaria fazer os dribles<br />
maravilhosos que ele faz. Quem pensa muito, não pula na piscina<br />
porque a água tá fria. Quem fica pensando muito, sempre pede mais<br />
uma cerveja antes de chegar na mulher que já tá encarando há mais<br />
de 10 minutos. Só pra ver um outro filho <strong>da</strong> puta chegar e levar a mina<br />
(é só um exemplo, não que tenha acontecido comigo). Se tu parar pra<br />
pensar em to<strong>da</strong>s as conseqüências possíveis, provavelmente tu não<br />
vai entrar vestido de vaca numa sala de aula. Se tu parar pra pensar,<br />
já tem tanta facul<strong>da</strong>de de comunicação e publici<strong>da</strong>de, ninguém vai<br />
querer fazer a Perestroika.<br />
Se tu parar pra pensar, vai ver que todos os teus projetos geniais ficam<br />
guar<strong>da</strong>dos na gaveta porque no fundo tu tem medo do que pode<br />
<strong>da</strong>r errado. De tentar fintar e perder a bola. De tomar um fora. De os<br />
alunos te tirarem pra trouxa. Mas a grande ver<strong>da</strong>de, a grande ver<strong>da</strong>de<br />
que eu acredito, pelo menos, é que a linha que separa a geniali<strong>da</strong>de<br />
do fiasco é muito fina. Muito tênue. E que as poucas pessoas que se<br />
arriscam a an<strong>da</strong>r em cima dessa linha, podem cair pros dois lados.<br />
Mas passar um pouco de vergonha ou de frio não é na<strong>da</strong> perto <strong>da</strong><br />
recompensa de ser realmente genial.<br />
Lembrem-se que até mesmo os grandes pensadores também tinham<br />
que ser grandes escritores. Pense nisso. Mas só um pouquinho, tá?<br />
229
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
2. pessoas apaixona<strong>da</strong>s<br />
são pessoas apaixonantes.<br />
Eu sou um cara megasensível. E muito passional. Talvez, na Perestroika,<br />
o mais passional de todos. O que tem o lado bom e o ruim,<br />
como tudo na vi<strong>da</strong>. O lado ruim é que fica mais difícil li<strong>da</strong>r com críticas.<br />
Muitas vezes já quero brigar com comentários no nosso blog, com<br />
twita<strong>da</strong>s e com outros percalços naturais do processo de se ter uma<br />
empresa, administrar uma marca e li<strong>da</strong>r com pessoas. Graças a Deus<br />
tem o Tiago aqui que sempre faz o contraponto e me faz pensar sobre<br />
essas coisas antes de sair tomando atitudes.<br />
O lado bom é que fico emocionado com as coisas, com as oportuni<strong>da</strong>des,<br />
com os elogios, com as coisas que dão certo e tal. Fico feliz<br />
mesmo, arrepiado, com vontade de sair pulando às vezes, chorando<br />
outras e, algumas vezes, de sair pela Perestroika an<strong>da</strong>ndo de cueca<br />
– o que de fato já aconteceu algumas vezes. Talvez por isso, tenha me<br />
emocionado tanto com o surfe do Romeu no Dilúvio.<br />
Sou um cara que se leva pelas paixões. E embora isso tenha também<br />
o seu lado bom e o ruim, ser extremamente racional também tem. E<br />
sou feliz assim, mesmo que momentos de tristeza também acompanhem<br />
essa jeito apaixonado de viver.<br />
Para mim, viver sem paixão não faz o menor sentido. Trabalhar sem<br />
paixão também não. E o resumo do que quero dizer para vocês é esse:<br />
persigam a paixão. Na vi<strong>da</strong>, no trabalho e em tudo o que fizerem.<br />
Posso <strong>da</strong>r essa sugestão com a tranquili<strong>da</strong>de de quem arriscou muita<br />
coisa em nome disso. Vejam bem: eu comecei minha carreira na publici<strong>da</strong>de<br />
como atendimento na Dez Propagan<strong>da</strong>, em 98. E não foi um<br />
estagiozinho de 3 meses, como acontece com muita gente. Fiz estágio,<br />
em pouco tempo, fui contratado como assistente. Passei 3 anos<br />
e meio no atendimento. Era uma jovem promessa, que cresceu rápido<br />
na agência. Eu tinha 22 anos e era o segundo atendimento <strong>da</strong> agência<br />
na época. Mas eu não estava feliz. Pedi demissão e decidi que ia para<br />
a criação. Fui absorvido na própria Dez, como estagiário de re<strong>da</strong>ção,<br />
ganhando 8 vezes menos do que ganhava como atendimento.<br />
Na criação, fui contratado com apenas 3 meses. 9 meses depois, fui<br />
o Re<strong>da</strong>tor do Ano do Prêmio Colunistas. Depois saí e fui trabalhar na<br />
Paim como re<strong>da</strong>tor. Em 2005, logo depois <strong>da</strong> conta <strong>da</strong> Renner ter ido<br />
para a Escala, assumi a área de Novos Negócios <strong>da</strong> Paim, deixando<br />
a trajetória de re<strong>da</strong>tor publicitário para trás e assumindo uma rotina<br />
liga<strong>da</strong> a prospecção, gestão de projetos e planejamento.<br />
Um ano depois, nova guina<strong>da</strong>: virei Diretor de Criação <strong>da</strong> Paim. Tinha<br />
28 anos. Era uma coisa bem fora do normal uma pessoa dessa i<strong>da</strong>de<br />
estar numa posição dessas numa <strong>da</strong>s 5 maiores agências do estado.<br />
Uma situação bem confortável, digamos assim. Bom, eu não tinha<br />
nem 4 meses como DC e fui convi<strong>da</strong>do para trabalhar na LiveAD, uma<br />
empresa que eu nem sabia o que fazia. Mas segui totalmente meus<br />
instintos – porque a razão talvez man<strong>da</strong>sse eu ficar.Menos de 2 anos<br />
depois de assumir a Criação <strong>da</strong> LiveAD, larguei tudo para me dedicar<br />
exclusivamente à Perestroika, que ain<strong>da</strong> estava engatinhando, sem<br />
nenhuma garantia que <strong>da</strong>ria certo, e ganhando si-gnificativamente<br />
menos do que lá.<br />
Em to<strong>da</strong>s essas mu<strong>da</strong>nças, eu sempre tive medo. Foi um trabalho<br />
árduo dos meus sentimentos tentando convencer minha razão de que<br />
era a coisa certa a fazer, o que é mais difícil que o contrário (a razão<br />
convencendo os sentimentos). Mas nunca consegui jogar para debaixo<br />
do tapete o que o meu coração (ui, que gay) dizia para fazer. E em<br />
231
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
to<strong>da</strong>s, absolutamente TODAS as mu<strong>da</strong>nças, eu nunca me arrependi.<br />
Sempre fiquei mais feliz. Que na real é o que importa.<br />
Tá: para não parecer que tudo foi tão perfeito, teve uma vez que eu<br />
fiquei um tempão numa empresa sem amá-la mais. Tipo to<strong>da</strong>s as células<br />
do meu corpo diziam que eu não tinha mais que estar lá. Menos<br />
o meu cérebro. “O que tu vai fazer?” “Tu vai arregar?” “Se tu sair, tu<br />
vai assumir o teu fracasso.”<br />
Na real, eu queria racionalmente vencer aquela situação. Não queria<br />
pecar por omissão, por falta de tentativa. E fiquei um bom tempo<br />
(mesmo) nessa empresa. Claro, no final o fato de eu ter ficado lá<br />
me gerou muito aprendizado. Mas quando finalmente eu saí, tive uma<br />
puta sensação de alívio, de libertação, de felici<strong>da</strong>de. E fiquei me perguntando<br />
por que não tinha saído antes. Isso também foi aprendizado.<br />
Hoje, eu sei que dá para ser feliz fazendo o que se quer fazer. Vivo isso<br />
na Perestroika todos os dias. Ca<strong>da</strong> trabalho, ca<strong>da</strong> novo projeto, ca<strong>da</strong><br />
novo curso é um puta tesão. Muita vontade de se envolver, de mergulhar,<br />
de se entregar. E quando a gente se entrega, não tem problema<br />
ter que trabalhar todos os sábados, não tem na<strong>da</strong> de errado acor<strong>da</strong>r<br />
às 8 <strong>da</strong> manhã de domingo para fazer reunião. O amor é cego.<br />
E o mais legal é que a recompensa é o próprio processo de trabalho.<br />
Muita gente não se dá conta disso e fica se focando no trabalho final,<br />
na execução final, no filme pronto na formatura. Mas o processo<br />
criativo – uma <strong>da</strong>s poucas coisas que absorvi do curso do Charles<br />
Watson – deve ser um processo autotélico, onde encontramos e focamos<br />
o prazer no processo, e não no ponto final. Em outras palavras, o<br />
caminho é a viagem, não o lugar de chega<strong>da</strong>.<br />
A gente vê que os alunos que mais se puxam, mais se empenham,<br />
mais nos impressionam, são os mais apaixonados. Pela Perestroika.<br />
Pelo projeto que estão fazendo. Pela vi<strong>da</strong>, como é o caso do Romeu.<br />
O Tiago já escreveu um post muito legal nesse blog sobre as recompensas<br />
que se obtém no trabalho. Eu acho que a paixão é uma <strong>da</strong>s<br />
recompensas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>.<br />
Tem outra coisa que eu acho que torna todo esse discurso mais relevante<br />
ain<strong>da</strong> que é o seguinte: a gente trabalha com criação. Ou pelo<br />
menos com o processamento de um monte de informação, conteúdo<br />
e estímulos que recebemos para a formatação de um produto criativo.<br />
Seja ele comercial, experimental ou autoral.<br />
Eu particularmente acredito que a sensibili<strong>da</strong>de necessária para identificar<br />
esses estímulos, essas vibrações vêm <strong>da</strong> paixão.<br />
Uma vez li em algum lugar uma história do Lupicínio Rodrigues sobre<br />
as várias mulheres que ele teve, e o sofrimento que a paixão não<br />
correspondi<strong>da</strong> ou traumática que algumas desses romances geraram<br />
nele. E ele disse algo, que não foi bem isso, mas que é mais ou menos<br />
por aqui: ele não se arrependia de ter se apaixonado e ter se entregado<br />
em todos esses casos, mesmo para as mulheres que mais fizeram<br />
ele sofrer. Porque as que mais fizeram ele sofrer foram as responsáveis<br />
pelas melhores obras dele.<br />
Felici<strong>da</strong>de, tristeza, emoções fortes são combustível criativo.<br />
Vejam o Vinícius de Moraes. O cara foi fo<strong>da</strong> na produção cultural e artística<br />
brasileira. Foi um cara que se apaixonou muitas vezes. Casou 9,<br />
só para a gente ter noção. Porra, era um cara que acreditava no amor.<br />
E provavelmente, na paixão.<br />
A razão é muito importante, é claro. Pensem, racionalizem. Mas lembrem-se<br />
que a razão nos deixa seguros, e nos deixa brabos. O que<br />
nos deixa feliz ou triste é emoção.<br />
Planejar, projetar, pensar é bem racional. Mas a paixão é que vai a<br />
gente ir lá e fazer.<br />
233
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Vão lá e faça. Se apaixonem. E, de vez em quando, deixem se<br />
levar pelas paixões. Acho que vocês vão concor<strong>da</strong>r comigo que<br />
vale a pena.<br />
Beijos, Felipe<br />
3. não olhe para o lado.<br />
olhe para frente.<br />
Há um tempo, eu ouvi falar de um estudo sobre felici<strong>da</strong>de que eu<br />
achei fantástico. Inclusive, sugiro que você faça o teste antes de ler o<br />
resto do post.<br />
O entrevistador conversava com os funcionários de uma determina<strong>da</strong><br />
empresa, um a um, separa<strong>da</strong>mente. E pedia que eles apontassem<br />
qual situação faria deles pessoas mais felizes.<br />
1. Você prefere ganhar um salário de 100,<br />
sendo que todos os seus colegas ganham 50.<br />
2. Você prefere ganhar um salário de 150,<br />
sendo que todos os seus colegas ganham 200.<br />
Segundo o estudo, a maioria optou pelo primeiro cenário. Mesmo que<br />
no segundo, a pessoa tivesse uma ren<strong>da</strong> maior.<br />
A tese do cara é que a nossa noção de felici<strong>da</strong>de está diretamente<br />
relaciona<strong>da</strong> à comparação. Você tem que olhar para o lado e ver uma<br />
situação pior que a sua. Só assim as pessoas (ou, pelo menos, a maioria<br />
delas) se sente realmente feliz.<br />
Isso talvez justifique várias manifestações <strong>da</strong> nossa socie<strong>da</strong>de. Como<br />
a gangorra do futebol, a popularização <strong>da</strong>s fofocas, a grande audiência<br />
<strong>da</strong>s tragédias e dos programas sensacionalistas.<br />
235
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Eu fIquei bem surpreso ao saber do resultado. Quando me perguntaram,<br />
respondi de bate-pronto. “Óbvio que eu prefiro ganhar mais!”.<br />
Provavelmente, muito em função de uma crença que eu tenho.<br />
Não olhe para o lado. Olhe para frente.<br />
O que, em outras palavras, quer dizer: o importante é você buscar as<br />
suas próprias metas. Sejam elas re levantes ou não para os outros.<br />
O fun<strong>da</strong>mental desse conceito é entender que você deve simplesmente<br />
ignorar aquilo que não influencia a sua vi<strong>da</strong>. Mas ficar atento para<br />
o que influencia.<br />
Por exemplo: trabalham no mesmo departamento você e o João, um<br />
cara chato, vagabundo e incompetente. Se o João receber um aumento,<br />
e esse aumento não tiver relação nenhuma com o seu salário, isso<br />
não afeta em na<strong>da</strong> a sua vi<strong>da</strong>. Bom para o cara.<br />
Agora, se o João receber um aumento, e esse aumento influenciar em<br />
todo o planejamento financeiro <strong>da</strong> empresa, de forma que você não<br />
seja promovido jus tamente por isso: bom, aí o furo é mais embaixo.<br />
Eu sou um cara bastante competitivo. E não acho isso ruim. Porque<br />
sou competitivo olhando para frente, não olhando para o lado.<br />
Gosto de estar na fatia de cima <strong>da</strong> pirâmide. Mas na medi<strong>da</strong> do possível,<br />
não me preocupo muito com o que os outros estão fazendo.<br />
Vou <strong>da</strong>r um exemplo bem ilustrativo que aconteceu na minha vi<strong>da</strong>:<br />
Eu queria ser Re<strong>da</strong>tor do Ano. E quando fui, não fiquei preocupado<br />
se os outros re<strong>da</strong>tores do mercado estavam produzindo coisas boas<br />
ou não. Se os outros re<strong>da</strong>tores <strong>da</strong> agência estavam recebendo jobs<br />
melhores que os meus. Se estavam fazendo fantasmas. Eu simplesmente<br />
baixei a cabeça e produzi o meu melhor. Via em ca<strong>da</strong> pit uma<br />
oportuni<strong>da</strong>de de emplacar um trabalho legal. Não produzi um único<br />
fantasma, uma única campanha filantrópica, uma única peça de caráter<br />
duvidoso. Tudo o que fiz foi pelas vias normais.<br />
E deu certo.<br />
Porque se eu fizesse o meu melhor, eu não poderia me sentir culpado<br />
numa eventual derrota. Pô, eu fiz o meu melhor!<br />
Agora que está começando um novo ano, aproveite e pense um pouco<br />
sobre isso. O que você realmente quer para 2009? O que vai fazer<br />
você feliz?<br />
Se na hora do amigo secreto o seu par de meias for mais feio que o do<br />
seu primo, não dê bola.<br />
237
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
4. o fritador de<br />
hambúrgueres.<br />
Ca<strong>da</strong> vez mais eu acredito numa coisa. E ca<strong>da</strong> vez mais, eu acredito<br />
que é essa coisa que diferencia os bons criadores.<br />
É a disciplina. Por mais contraditório que isso possa parecer.<br />
Eu sinceramente acho que, se nós pegássemos qualquer departamento<br />
de uma agência de propagan<strong>da</strong> (atendimento, produção, mídia,<br />
etc.) e colocássemos na criação, e treinássemos durante alguns meses<br />
essas pessoas, o resultado seria surpreendente.<br />
Chegar em boas ideias não é difícil. Pensar em porralouquices não<br />
é difícil. Estou convencido disso. Quanto mais estudo o processo<br />
brainstorming, e como as ideias surgem, mais eu me impressiono. O<br />
brain é só um processo. Que qualquer um pode seguir.<br />
O que talvez facilite a nossa vi<strong>da</strong> (nossa = criadores do departamento<br />
de criação) é a personali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s pessoas que vão para a Criação.<br />
Porque, em geral, nós temos traços que FACILITAM o processo<br />
de brainstorm. Como (só para citar dois exemplos) a desinibição e<br />
a sensibili<strong>da</strong>de.<br />
Mas se uma pessoa qualquer decidir treinar essas características,<br />
e investir tempo e energia exercitando (de novo, só para citar dois<br />
exemplos) a desinibição e a sensibili<strong>da</strong>de, eu acredito, sinceramente,<br />
que o resutado não será muito diferente do que temos hoje no dia-adia<br />
de uma agência.<br />
Parece loucura. Mas eu juro que acredito nisso.<br />
Daí, você pode dizer. “Tiago, você realmente acha que um atendimento<br />
criaria um bom título? Que uma mídia pensaria numa ideia<br />
visual bacana?”.<br />
Sim, acredito. Com alguns meses de treino e muito disciplina por parte<br />
do cara, acredito pra caralho.<br />
Daí, você pode insistir: “Mas Tiago, você acha que eles vão conseguir<br />
criar aquelas ideias inusita<strong>da</strong>s, que a gente fica morrendo de inveja?”.<br />
Aí eu não sei.<br />
Ao mesmo tempo, eu não sei quantas ideias realmente inovadoras<br />
e inustita<strong>da</strong>s um departamento de criação produz por ano. Aquelas<br />
ideias que a gente diz: QUE COISA NOVA!<br />
Porque se formos realmente críticos com os nossos próprios portfólios,<br />
vamos ver que a maioria absoluta do que fazemos são fórmulas.<br />
São padrões. Até as peças que criamos exclusivamente<br />
para festivais.<br />
Vocês já ouviram falar do Faking It? É um reality show antigo, que passava<br />
na TV inglesa e era reproduzido por alguma canal a cabo aqui do<br />
Brasil (acho que era o Multishow).<br />
A moral era a seguinte: eles pegavam um profissional X e o treinavam<br />
durante um mês para executar uma ativi<strong>da</strong>de diferente <strong>da</strong> que ele fazia<br />
anteriormente (ex: um tosador de ovelhas viraria cabeleireiro).<br />
No final, outros três profissionais (no caso, outros três cabeleireiros)<br />
passavam pelo crivo de um júri, que avaliava o desempenho dos qua-<br />
239
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
tro. Então, o júri era comunicado que havia um impostor infiltrado. Na<br />
maioria dos casos, o júri não acertava quem era o picareta.<br />
Tipo, um vigário virava vendedor de carros usados. Um bailarino virava<br />
lutador de luta-livre. Um fritador de hambúrgueres virava chef. Um<br />
pintor de casas virava pintor de quadros (e hoje ganha uma puta grana<br />
como artista plástico).<br />
Você acha que o programa encontrou talentos em meio à multidão?<br />
Que foi sorte? Que foi uma chance em um milhão? Eu prefiro acreditar<br />
que foi só disciplina, foco, treino.<br />
Procure no Youtube o cantor punk que se tornou maestro. Tudo bem,<br />
tudo bem. O cara não virou um maestro. Ele regeu apenas uma música,<br />
uma única vez. Não sei se é suficiente para comprovar a teoria. No<br />
mínimo, nos deixa uma pulga atrás <strong>da</strong> orelha.<br />
To<strong>da</strong> essa longa introdução é para dizer o seguinte: a gente, na Criação,<br />
tem uma tendência a achar que somos insubstituíveis. Quando<br />
chegamos num determinado patamar, simplesmente relaxamos. Achamos<br />
que o nosso talento, que o nosso histórico, é suficiente para nos<br />
garantir uma cadeira e um computador.<br />
Não, não é.<br />
Qualquer um pode nos substitutir. A dupla mais jovem. O estagiário<br />
que recém entrou. Ou o estu<strong>da</strong>nte, que ain<strong>da</strong> nem foi contratado<br />
pela agência.<br />
É só um processo. É só treino. É só foco.<br />
E essa é, na minha opinião, a principal razão pela qual muitos profissionais<br />
de mais de 30 anos somem, desaparecem. Depois de um<br />
certo tempo, falta aquele tesão. E aí, vem o fritador de hambúrgueres<br />
e rouba a vaga do chef.<br />
Certa vez, criei uma campanha para um festival de publici<strong>da</strong>de que<br />
dizia: Você é tão bom quanto o seu último trabalho. Nem achava a<br />
ideia tão legal, mas o conceito eu realmente curtia.<br />
Se nos dermos conta que um fritador de hambúrgueres pode virar<br />
chef, em apenas um mês, nós vamos nos <strong>da</strong>r conta que somos extremamente<br />
vulneráveis.<br />
A não ser, é claro, que a gente continue fazendo coisas boas. Todos<br />
os dias.<br />
Esse foi um dos principais motivos para eu vir para a Perestroika.<br />
Recomeçar do zero, numa função onde você não sabe na<strong>da</strong> (no caso,<br />
eu não sabia na<strong>da</strong> sobre “administrar uma escola”), é a melhor forma<br />
de não deixar a vai<strong>da</strong>de nos detonar.<br />
241
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
5. a pergunta de 1 milhão<br />
de dólares.<br />
Uma <strong>da</strong>s coisas mais legais <strong>da</strong> Perestroika é a relação que a gente<br />
tem com os alunos. Sem dúvi<strong>da</strong>, é uma proximi<strong>da</strong>de muito diferente<br />
do normal. Pelo menos, muito diferente de tudo o que eu vivenciei<br />
como aluno. Seja no colégio, na universi<strong>da</strong>de, quando fiz intercâmbio<br />
ou até na Miami Ad School.<br />
A gente curte pra caralho isso, se sente feliz por ser importante para os<br />
alunos e pelos vários papeis que a gente acaba assumindo nessa relação.<br />
Por um lado, nós somos professores – ou facilitadores, como preferimos<br />
chamar. A gente procura explicar a técnica, o processo, os<br />
atalhos, as dicas, mostrando o que a gente acha que funciona e o que<br />
normalmente não funciona.<br />
De outro, a gente serve como provocadores. Para provocar a curiosi<strong>da</strong>de,<br />
sugerir novas soluções, fomentar o pensamento lateral e a<br />
busca de respostas para perguntas que ain<strong>da</strong> não existem.<br />
Mas vários alunos nos procuram para pedir conselhos sobre a profissão<br />
e a vi<strong>da</strong>. Meio naquela pilha Sr. Miyagi.<br />
O que eu faço, isso ou aquilo?<br />
O que é melhor, este ou aquele outro?<br />
Para onde eu vou, para cá ou para lá?<br />
A famosa PERGUNTA DE UM MILHÃO DE DÓLARES.<br />
Na teoria, a vi<strong>da</strong> é muito simples. A gente só precisa saber duas coisas:<br />
1. O que a gente quer.<br />
2. O que a gente vai fazer para conseguir aquilo que se quer.<br />
Um tanto óbvio, não?<br />
Óbvio o caralho! Na prática, a gente sabe que não é bem assim.<br />
Às vezes, a gente já está contratado, mas pinta uma proposta de estágio<br />
num lugar muito legal. E fica dias e dias se remoendo para saber<br />
o que fazer.<br />
Em outras, bate aquele desespero. Pe<strong>da</strong>lo a facul<strong>da</strong>de para apostar<br />
no trabalho ou invisto no curso e vejo o que acontece depois?<br />
Tem horas que a gente se vê numa encruzilha<strong>da</strong>. Não sabe se se<br />
dedica à vi<strong>da</strong> pessoal ou à vi<strong>da</strong> profissional. Especialmente quando<br />
se tem vários amigos que fazem Direito ou Adminitração e sabem do<br />
trabalho às 17h30.<br />
Porra, é isso mesmo que eu quero fazer nos próximos 30 anos?<br />
Vou para a capital ou continuo aqui, na minha ci<strong>da</strong>de pequena?<br />
Será que eu sou criativo mesmo ou sou uma farsa?<br />
Em meio a tudo isso, há uma boa e uma má notícia.<br />
A má notícia é que, desde que a Humani<strong>da</strong>de é Humani<strong>da</strong>de, essa é a<br />
pergunta mais difícil que existe. Porque só você tem a resposta.<br />
A boa é que, como o próprio nome sugere, essa é uma pergunta de 1<br />
milhão de dólares. Se você responder, e responder certo, na<strong>da</strong> mais<br />
segura você. O 1 milhão de dólares – seja em dinheiro, seja em outro<br />
243
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
tipo de recompensa – é inevitável. Você pode largar o psiquiatra e viver<br />
a vi<strong>da</strong> numa boa.<br />
O grande problema é que, diferente do Show do Milhão, essa pergunta<br />
não dá pra pular. A gente infelizmente (ou felizmente) tem que<br />
enfrentar isso de frente. Porque só assim a gente sabe o que é melhor:<br />
isso ou aquilo, ir pra lá ou pra cá.<br />
Então, valendo 1 milhão de dólares: qual é a sua resposta?<br />
6. a len<strong>da</strong> do<br />
mercado saturado.<br />
Todo mundo já ouviu len<strong>da</strong>s urbanas.<br />
“Não aceite bebi<strong>da</strong> de estranhos, ou você pode acor<strong>da</strong>r numa banheira<br />
cheia de gelo e sem os seus rins.”<br />
“Não vá no cinema do Iguatemi, porque os caras colocam agulhas<br />
infecta<strong>da</strong>s com HIV.”<br />
“Não coma no McDonald’s: os hambúrgueres são feitos com carne<br />
de minhoca.”<br />
É ou não é? Ain<strong>da</strong> mais, depois que inventaram o e-mail. Len<strong>da</strong> urbana<br />
é o que não falta.<br />
Pois bem: dentro <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>, existe uma len<strong>da</strong> que me incomo<strong>da</strong><br />
bastante. A de que “o mercado está saturado”.<br />
Eu já troquei de emprego quatorze vezes. Já fui peão de gráfica e host<br />
de restaurante metido. Já fui assistente de arte, arquivador de fitas e<br />
jornalista de um veículo totalmente picareta. Já distribuí flyer na praia.<br />
Já fui o último estagiário na hierarquia de uma grande produtora (aquele<br />
que vem depois do cu do cachorro). Hoje, sou Diretor <strong>da</strong> minha<br />
própria empresa. Mas sabe-se lá o que virá amanhã.<br />
E por todos esses lugares, eu sempre acompanhei o desespero dos<br />
meus chefes quando alguém pedia demissão. Guar<strong>da</strong><strong>da</strong>s algumas ex-<br />
245
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
ceções, era sempre um parto achar um substituto. Fosse quem fosse.<br />
Do novato ao presidente.<br />
Isso indica que, diferente do que se diz nos corredores, o mercado<br />
não está saturado. Quer dizer: o mercado está saturado, sim.<br />
Mas saturado de profissionais que estão abaixo <strong>da</strong> expectativa de<br />
quem contrata.<br />
Quando se precisa de alguém bom, realmente bom, que entregue coisas<br />
acima <strong>da</strong> média, que tenha o respaldo de um bom portfólio, com<br />
maturi<strong>da</strong>de e postura, que seja do bem e não tenha medo de trabalho,<br />
é fo<strong>da</strong> de achar.<br />
Vi isso se repetir por to<strong>da</strong>s as agências que passei. Mas também no<br />
restaurante, na gráfica e até no jornal picareta.<br />
Esse cara valioso, quase insubstituível, que é uma mistura de Romário<br />
(pelo talento) e Dunga (pela postura), é dificílimo de achar. E se você<br />
abrir mão dos nomes de maior visibili<strong>da</strong>de (que normalmente já recebem<br />
um bom salário, ou já atendem boas contas, ou já estão felizes<br />
na empresas em que trabalham), fica mais difícil ain<strong>da</strong>.<br />
Se você for bom, mas bom mesmo, você vai ser valorizado pela<br />
sua agência e respeitado pelos colegas. E vocês viverão felizes<br />
para sempre.<br />
THE END<br />
7. tempo todo mundo tem.<br />
é só uma questão<br />
de priori<strong>da</strong>de.<br />
Certa vez, estava na noite e vi a cena com meus próprios olhos. Uma<br />
loira maravilhosa se aproximou do balcão e pediu um drink. Nem deu<br />
tempo dela receber a bebi<strong>da</strong> e já chegou um magrão solando.<br />
Fiquei só ouvindo a conversa para ver onde ia terminar. Dava pra sacar<br />
que o cara era endinheirado. Só o relógio devia custar mais que o meu<br />
apartamento. Era um Patek Philippe todo balaqueiro. Não tinha como não<br />
notar. A loirosa também percebeu. Talvez por isso fosse só sorrisos.<br />
Papo vai, papo vem, não deu nem dois minutos e o cara largou.<br />
— Então, vamos para o meu apê?<br />
A loira foi muito elegante, e respondeu sem levantar o tom de voz.<br />
— Acho que você se confundiu. Eu não sou dessas.<br />
— E se eu pagasse para você 200 reais?<br />
— Meu amigo, eu já falei. Você está me ofendendo.<br />
— E se eu desse 10 mil reais, agora, na bucha. Você ia?<br />
Ela mudou o semblante. Pensou, pensou, olhou o relógio.<br />
— Por 10 mil reais eu vou.<br />
— Então eu te ofereço 500.<br />
247
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
— Tá maluco? Você acha que eu sou puta?<br />
— Puta eu já sei que você é. Agora nós só estamos negociando<br />
o preço.<br />
Essa pia<strong>da</strong> é um ótimo exemplo de um conceito que eu defendo<br />
insistentemente.<br />
Existe uma coisa dentro de ca<strong>da</strong> um de nós que é o nosso combustível.<br />
Que nos estimula a fazer absolutamente tudo. É ela que define<br />
o que é importante e o que não é importante. Que determina a nossa<br />
relação de priori<strong>da</strong>des na vi<strong>da</strong>.<br />
Essa coisa se chama motivação. O sinal mais claro e evidente do que<br />
nos dá prazer.<br />
Se eu oferecer cinco reais para você correr uma maratona, você talvez<br />
ache a proposta ridícula. Agora, se eu oferecer um milhão de reais, é<br />
bem possível que você se interesse. E até consiga chegar à linha de<br />
chega<strong>da</strong>, por mais fora de forma que esteja.<br />
Um milhão de reais é uma grande motivação. É muito dinheiro, e dinheiro<br />
é importante pra (quase) todo mundo.<br />
Só que no mundo real, ninguém oferece um milhão de reais para<br />
você fazer o seu trabalho bem feito. Ou para você chegar na hora<br />
nos compromissos. Ou para fazer as coisas com antecedência, e<br />
não em cima <strong>da</strong> hora.<br />
Para fazer tudo isso, você precisa de motivação. É uma força interior.<br />
Ninguém precisa dizer na<strong>da</strong>. Você simplesmente faz porque<br />
aquilo é importante.<br />
Ninguém precisa dizer para você: dê atenção para a sua namora<strong>da</strong>. Se<br />
você gosta dela, naturalmente vai agradá-la.<br />
Se o seu filho adoecer e baixar hospital, você vai <strong>da</strong>r bola para o ro<strong>da</strong>pé<br />
que tinha que layoutar até as 11h? Que na<strong>da</strong>: você vai sair correndo<br />
e deixar tudo pra trás. Afinal, essa é a sua priori<strong>da</strong>de.<br />
Fico imaginando um torcedor fanático dizendo Não fui no jogo porque<br />
esqueci que ontem era a Final <strong>da</strong> Libertadores.<br />
Portanto, não se engane. As coisas que você lembra, que você dá<br />
atenção, que você coloca em primeiro plano são ver<strong>da</strong>deiramente importantes<br />
para você. É que o dá prazer, é o que é relevante, são as<br />
coisas que você acredita.<br />
O que você faz aos trancos e barrancos, correndo, na última hora, não.<br />
Todo mundo sabe que, como professor, sou bem exigente. E defendo<br />
essa posição pelo princípio <strong>da</strong> motivação.<br />
Se você tem uma semana para fazer o tema, e deixou para a última<br />
hora, me desculpe. É sinal de que fazer o tema não era tão importante<br />
para você quando você está tentando me convencer que era.<br />
Você tinha outras priori<strong>da</strong>des. Ver a namora<strong>da</strong>, ir no jogo do Inter, beber<br />
com os amigos, dormir. Respeito e dou o maior apoio. Quem define<br />
as priori<strong>da</strong>des <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong> é você. Agora, só não me venha dizer<br />
que não teve tempo. Porque o dia tem 24h para todos nós.<br />
Tempo todo mundo tem. É só uma questão de priori<strong>da</strong>de.<br />
Se você não fez o tema, ou fez mal feito, sinal de que tinha outras<br />
249
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
priori<strong>da</strong>des. E aí, essa é uma escolha sua, não minha. Por isso, quem<br />
tem que arcar com as consequências é você, não eu.<br />
O mais importante de todo esse papo de motivação, pra mim, é<br />
se conhecer.<br />
Por exemplo: se você procura determinado amigo só para pedir favores,<br />
é sinal de que aquela pessoa não é importante para você. Os<br />
favores dela é que são.<br />
Se você diz que adora o seu emprego, mas está sempre de saco cheio,<br />
sem a menor paciência para fazer o que estão lhe pedindo, contando<br />
as horas para o final de semana, pense bem. Tem coisa erra<strong>da</strong> aí.<br />
Perceba: as maiores dicas estão nos seus atos repetidos. É impossível<br />
fugir <strong>da</strong> nossa natureza.<br />
Se você sempre chega na hora quando o seu chefe man<strong>da</strong>, e sempre<br />
chega atrasado nos encontros <strong>da</strong> sua turma, você definitivamente não<br />
é um cara pontual.<br />
Se você fica todos os dias até tarde na agência, isso tem alguma importância<br />
para você. Talvez, você esteja investindo na sua carreira,<br />
porque isso é uma coisa na qual você acredita. Talvez você queria só<br />
mostrar para os outros como é trabalhador, e por isso não abre mão<br />
de entrar noite adentro. Talvez esse seja um valor <strong>da</strong> sua família, talvez<br />
você esteja apenas repetindo o que o seu pai e a sua mãe workaholics<br />
fizeram a vi<strong>da</strong> inteira. Talvez você more sozinho, e não queira ficar isolado.<br />
Ou talvez você esteja duro e goste de ficar até tarde pra ganhar<br />
pizza de graça.<br />
Não importa. Seja com a sua namora<strong>da</strong>, com o seu dupla, com os<br />
seus sócios ou com a sua família. Se você não faz espontaneamente<br />
determina<strong>da</strong>s coisas, acredite: elas não são tão importantes quanto<br />
você acha que são.<br />
A minha dica é não ficar lutando contra isso. Se você faz as coisas por<br />
obrigação, e não por vontade própria, tente mu<strong>da</strong>r esse panorama. Ou<br />
você vai ficar sofrendo a vi<strong>da</strong> inteira.<br />
Você tem que estar apaixonado pelas coisas que faz e pelas pessoas<br />
com quem convive.<br />
Eu sou apaixonado pela Perestroika. E é por isso que, mesmo viajando,<br />
mesmo de férias, eu não consigo ficar longe do nosso Blog.<br />
251
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
8.diamantes.<br />
Nesse final de semana, tive o privilégio de filmar novamente com o<br />
Bernardinho. Ele é um cara fantástico no set. Não reclama, não tem<br />
nenhum estrelismo e topa to<strong>da</strong>s as bizarrices que a gente inventa. E<br />
ain<strong>da</strong> é puro alto astral, está sempre fazendo pia<strong>da</strong> e divertindo a galera<br />
<strong>da</strong> produção.<br />
Mas dessa vez, eu tive um privilégio maior que nas edições anteriores.<br />
Em determinado momento <strong>da</strong> filmagem, quando estavam ro<strong>da</strong>ndo<br />
uma cena só com o Giba, ficamos batendo um papo in off. Sem câmeras,<br />
sem microfones, sem responsabili<strong>da</strong>des.<br />
Seria até presunção dizer que foi uma conversa. Porque durante aqueles<br />
20 minutos, eu praticamente não falei. Não valia a pena investir<br />
aqueles poucos minutos ouvindo a minha própria voz.<br />
Vale lembrar: o Bernardinho cobra muito caro pelas palestras que dá.<br />
Falamos principalmente de esporte. Eu adoro espor te, e parecia que<br />
eu estava lendo um almanaque. Ele sabia <strong>da</strong>tas, placares, nomes,<br />
tudo de cor. Detalhes que fariam inveja ao PVC. Impressionante.<br />
No meio disso tudo, ele explicou qual é a principal diferença entre um<br />
grande jogador e um campeão. Usando outras palavras, ele disse que<br />
“o grande jogador é aquele que praticamente não erra. E o campeão é<br />
o que não erra quando não pode errar.”<br />
Tá, eu sei que esse não é um ponto de vista muito novo. Muita gente<br />
fala isso e não é de hoje. Mas sei lá: ouvir essas palavas do cara que<br />
montou o time mais vitorioso <strong>da</strong> história do esporte, em todos esportes,<br />
em todos os tempos, foi diferente.<br />
Peguemos como exemplo o Michael Jor<strong>da</strong>n.<br />
Sempre que tinha jogo decisivo, a história era a mesma. Faltavam<br />
poucos segundos. O técnico adversário sabia que a bola ia para o<br />
Jor<strong>da</strong>n. O time adversário sabia que a bola ia para o Jor<strong>da</strong>n. A torci<strong>da</strong>,<br />
o comentarista, o mundo inteiro sabia que a bola ia para o Jor<strong>da</strong>n.<br />
E bola ia para o Jor<strong>da</strong>n. Mas parecia impossível marcá-lo. Na pressão,<br />
ele não arrepiava.<br />
Acho que esse conceito se aplica um pouco ao nosso negócio.<br />
Os grandes profissionais com quem convivi foram justamente aqueles<br />
que, na hora do aperto, tiraram leite de pedra. Quando alguém virava<br />
e dizia “ou a gente acerta nessa campanha, ou vamos perder a conta”.<br />
E o cara ia lá, e fazia o melhor anúncio <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>.<br />
Ou quando <strong>da</strong>va um problema num comercial, que mu<strong>da</strong>va o roteiro<br />
depois de filmado. E a dupla era obriga<strong>da</strong> a fazer um remendo, com as<br />
cenas já capta<strong>da</strong>s, deixando tão bom quanto a versão original.<br />
Ou naquelas vezes que está tudo pronto, montado, e alguém descobre<br />
que a concorrência vai lançar uma campanha igual. Daí é virar a<br />
noite e produzir algo tão bom quanto o que acabou de ser feito, mas<br />
em tempo recorde.<br />
Existe um ditado que eu amo, que é: diamantes nascem sob pressão.<br />
Sempre que eu vejo os vencedores de um festival, faço a minha própria<br />
avaliação.<br />
253
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Ca<strong>da</strong> vez mais eu valorizo aqueles trabalhos de ver<strong>da</strong>de, para produtos<br />
de ver<strong>da</strong>de. Que dá para ver o briefing sendo resolvido. O problema<br />
que o cliente tinha e a solução que foi encontra<strong>da</strong>. É aí que estão<br />
os diamantes.<br />
Só nessas condições, só um trabalho que vai para a rua MESMO é<br />
que me impressiona. Porque só assim a ideia é coloca<strong>da</strong> a prova por<br />
um diretor de criação que está pensando seriamente sobre o assunto.<br />
Que tem um cliente avaliando de forma séria o que vai ao ar. E que é<br />
julgado pelo consumidor, o ver<strong>da</strong>deiro júri <strong>da</strong>s nossas ideias.<br />
Criar para o mercado publicitário, ou para filantropia, ou fazer fantasmas,<br />
ou até esses clientes que não remuneram a agência e topam<br />
qualquer barbari<strong>da</strong>de, é como jogar um amistoso.<br />
Eu já criei, e vez por outra continuo criando para esse segmento. Não<br />
sou a favor do fim desse tipo propagan<strong>da</strong>. Por favor!<br />
Agora, lá no fundinho, eu sei que existe uma grande diferença entre<br />
isso e o anúncio produto-e-preço <strong>da</strong> STIHL que volta e meia entra na<br />
nossa pauta.<br />
Então, to<strong>da</strong> vez que pintar um job casca grossa para você, não veja<br />
como uma engronha. Veja como um teste. Um teste para saber se<br />
você já está preparado para desafios maiores. Um teste para saber se<br />
você já pode assumir grandes responsabili<strong>da</strong>des. Se você já se transformou<br />
em diamante, ou se ain<strong>da</strong> é carvão.<br />
E se o prazo for curto, lembre-se do Michael Jor<strong>da</strong>n. Ele normalmente<br />
tinha que se virar só com alguns segundos.<br />
9. correria? correria!<br />
É comum a gente, numa rodinha de publicitários, ouvir o seguinte papo:<br />
— Esse findi eu trabalhei pra caralho.<br />
Ou:<br />
— Essa semana saí todos os dias às três <strong>da</strong> manhã.<br />
Ou ain<strong>da</strong>:<br />
— Putz, faz quatro meses que eu trabalho sábado e domingo.<br />
Ca<strong>da</strong> vez mais, eu acho que esse discurso não é por causa <strong>da</strong> nossa<br />
rotina mega-atarefa<strong>da</strong>. O que eu percebi, e essa é a tese que eu defendo,<br />
é que nós vemos a fodelança como status.<br />
Isso aí. No nosso meio, se fuder é ser fo<strong>da</strong>.<br />
Você pode até nem concor<strong>da</strong>r comigo. Mas sei lá. Parece que existe<br />
uma necessi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> gente mostrar para os outros que se está trabalhando<br />
muito.<br />
Não consigo identificar bem a razão.<br />
Talvez, isso signifique que a gente está numa agência grande (afinal, a<br />
maioria <strong>da</strong>s agências grandes são assim).<br />
Ou um sinal de que temos muitas responsabili<strong>da</strong>des, que somos imprescindíveis<br />
no processo.<br />
255
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Ou que nós somos mega-exigentes e, dessa forma, nunca nos <strong>da</strong>mos<br />
por satisfeitos saindo na hora (quem garante que o próximo Leão não<br />
vai pintar às 3h <strong>da</strong> madruga<strong>da</strong>?).<br />
Repare que, nos corredores dos festivais de propagan<strong>da</strong>, o discurso<br />
clássico é:<br />
— E aí, como tá lá?<br />
— Correria, e lá?<br />
— Correria, correria.<br />
É ou não é?<br />
Parece meio aquela pia<strong>da</strong> <strong>da</strong> Sharon Stone na ilha deserta. Se você<br />
come uma gostosa, e não conta pra ninguém, não tem a menor graça.<br />
Se você vira a noite trabalhando, e não conta para seus colegas, ninguém<br />
vai saber que você foi um herói.<br />
Não seria essa uma prova de que vemos a fodelança como status?<br />
Eu, num encontro desses, há alguns anos, fiz questão de responder<br />
pra todo mundo “Pois é, minha vi<strong>da</strong> está bem tranquila, tenho saído<br />
no horário”. (OK, não era ver<strong>da</strong>de. Mas eu só queria ver a reação<br />
<strong>da</strong>s pessoas.)<br />
E não é que todo mundo me olhava meio estranho? Como se fosse<br />
proibido estar bem posicionado no mercado e sair às 19h.<br />
Mais: se a questão é se exibir, não seria mais lógico o raciocínio inverso?<br />
“Eu trabalho pouco, chego às 11h, saio pra almoçar, só volto às 15h,<br />
nunca fico até mais tarde, tô cagando para todo mundo, e ain<strong>da</strong> assim<br />
precisam de mim”.<br />
Ninguém se vangloria de ter um carro caindo aos pe<strong>da</strong>ços, ou de ganhar<br />
mal, ou de morar num JK alugado.<br />
Ninguém, tirando o Jorge Kajuru, chega para uma mina dizendo “Eu<br />
sou ruim de cama, tenho pau pequeno e já fiz troca-troca”.<br />
Ninguém se vende assim. Porque não existe status nisso.<br />
Então, por que insistimos tanto nessa Síndrome de Sofrenildo?<br />
Agora, não confun<strong>da</strong> isso tudo com falta de ralação.<br />
Uma coisa é trabalhar para caralho. Ser um eterno insatisfeito. Ser exigente<br />
e não se contentar com o que já fizeram. Não aceitar bem a média.<br />
Outra coisa é ter a necessi<strong>da</strong>de de falar para todo mundo que você<br />
trabalha para caralho. É se afirmar em cima disso.<br />
Uma coisa é a reali<strong>da</strong>de do mercado. Que exige bastante e faz a gente<br />
virar a noite. Que joga para o acostamento que não agUenta o tranco.<br />
Outra coisa é se exibir. Como se o fato de ficar até tarde fosse um troféu.<br />
Sinceramente, espero que esse post sirva para recrutar pessoas que<br />
também pensam como eu. Não existe nenhum problema em trabalhar<br />
bastante, nem em ser exigente. O bizarro é ver alguma vantagem nisso.<br />
É ou não é, Kajuru?<br />
257
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
10. quando a história<br />
é conta<strong>da</strong> de trás<br />
para frente.<br />
Esses dias encontrei uma revista Wired que me chamou a atenção. A<br />
capa tinha o logo <strong>da</strong> Apple e dizia “Reze”.<br />
Aposto que a grande maioria <strong>da</strong>s pessoas, hoje, lê o “Reze” como<br />
“Reze em nome <strong>da</strong> Apple, afinal de contas, ela é fo<strong>da</strong>”.<br />
Quando olhei com atenção, e vi a <strong>da</strong>ta, me impressionei. “Junho de<br />
1997”. Sim, essa edição tem mais de dez anos. E, ao contrário do que<br />
possa parecer, o significado de “Pray” é justamente o contrário. “Reze<br />
pela Apple, pois ela está quase morrendo”.<br />
A Wired previa um futuro extremamente nebuloso para a companhia.<br />
Justo quando Steve Jobs voltava à empresa como consultor e começava<br />
a tornar a Apple uma <strong>da</strong>s empresas mais inovadoras do mundo.<br />
Talvez A mais inovadora do mundo.<br />
Revista Wired, 1997. A reportagem tem como título “101 maneiras de<br />
salvar a Apple”. Curiosamente, o item 1 sugere: “Admita, Apple. Você<br />
está fora do ramo de hardwares”. Hoje nós sabemos que a Apple não<br />
só aumentou sua fatia no mercado de computa- dores, como criou<br />
uma nova plataforma de hardware: o Ipod.<br />
Canso de ver jogos de futebol que, até os 25 do segundo tempo, estão<br />
indefinidos. Um time na pressão, outro na retranca. Aí, num contra-<br />
ataque, sai o segundo. A equipe se joga para tentar empatar, mas<br />
abre espaços na defesa. Termina 4x0 e o comentarista larga: “foi uma<br />
parti<strong>da</strong> de um time só, que mostrou superiori<strong>da</strong>de, soube se defender<br />
e matar o jogo na hora certa”.<br />
Quando a história é conta<strong>da</strong> de trás para frente, é tudo muito fácil.<br />
Cresci ouvindo meu pai dizer que as pessoas julgam o sucesso dos<br />
outros, mas nunca consideram os riscos envolvidos para alcançar<br />
esse sucesso. No caso do jogo de futebol: colocar o time inteiro na<br />
retranca pode ser um tiro no pé. Se tomar um gol, o técnico é burro.<br />
Se ganhar, é um herói.<br />
Muita gente erra porque se arrisca. No ramo de computadores, no<br />
futebol e na propagan<strong>da</strong>. Quantas campanhas a gente vê no ar e diz<br />
“caralho, onde é que eles estavam com a cabeça?”.<br />
Se dissessem que “para anunciar o PSP, a Sony vai grafitar muros de<br />
Nova York com imagens de caras jogando”. Alguém em sã consciência<br />
teria coragem de reprovar esse viral?<br />
Você com certeza ain<strong>da</strong> enfrentará muitas situações assim. Agora,<br />
como criador <strong>da</strong>s suas próprias ideias. E mais para frente, como avaliador<br />
<strong>da</strong>s ideias dos outros.<br />
Eu aprendi a admirar quem, no mundo <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>, sabe correr riscos.<br />
Sejam os doentes ou sejam os comportados. Sim, porque quando<br />
se fala em riscos, muitos confundem com ousadia. Às vezes, ser<br />
conservador é o mais inusitado, justamente o que garante vi<strong>da</strong> longa<br />
para determina<strong>da</strong> campanha.<br />
Veja o exemplo de marcas que não alteram as suas embalagens há<br />
déca<strong>da</strong>s. Aposto que algum chato passou anos e anos tentando convencer<br />
o Seu Maizena a trocar o rótulo para que o produto não parecesse<br />
velho.<br />
259
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Quando vir uma grande realização, valorize todos os capítulos <strong>da</strong> história.<br />
E, principalmente, os personagens que a fizeram possível.<br />
Porque o sucesso só é fácil quando a história é conta<strong>da</strong> de trás<br />
para frente.<br />
11. o atendimento.<br />
Acho que existe um preconceito, até uma certa ingenui<strong>da</strong>de, quando<br />
se fala que o atendimento é burro.<br />
Claro, eles não entendem a sutileza de determina<strong>da</strong>s ideias. Simplesmente<br />
porque não têm o cérebro treinado para isso. Assim como você<br />
provavelmente não entende um monte de coisa que eles fazem muito<br />
bem. E com uma mão nas costas.<br />
Claro, eles não escrevem tão bem quanto um re<strong>da</strong>tor. E por isso aparecem<br />
erros de português no PIT. Por outro lado, você provavelmente não<br />
tem o tato que os atendimentos precisam ter quando o cliente liga bufando<br />
porque acabou de ver que o seu anúncio saiu borrado no jornal.<br />
Esse tato é talento. Um talento diferente do criador, mas igualmente<br />
importante para a agência.<br />
Se você fez um anúncio do caralho e o atendimento não aprovou, não<br />
significa que ele tenha apresentado mal. Existem infinitos fatores para<br />
que o cliente renegue um trabalho. Quem já esteve na linha de frente<br />
sabe como é.<br />
Já vi um diretor de arte reclamar que o atendimento tinha enviado sua<br />
campanha para o cliente por email. E eu perguntei: “Você foi até o<br />
atendimento defender a ideia? Ou mandou por email?”. Ele nem teve<br />
coragem de responder.<br />
Você já se imaginou no papel do atendimento? Como reagiria se alguém<br />
chegasse em cima do prazo e disesse “olha, vai demorar mais<br />
261
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
uma hora até terminar de layoutar”. Ou quando apresentassem um<br />
anúncio completamente fora do briefing quando não desse mais tempo<br />
de refazer?<br />
Está cheio de atendimento burro ganhando 3, 4, 5 vezes mais que o<br />
esperto <strong>da</strong> criação. Conheço muitos atendimentos que têm o cliente<br />
na mão. Que se saísse <strong>da</strong> agência, levaria a conta junto. E conheço<br />
pouquíssimos criadores com esse poder.<br />
Até concordo que, na média, eles são menos capacitados que os criadores.<br />
Mas discordo <strong>da</strong> generalização. Até porque, se eu concor<strong>da</strong>r,<br />
não aprovo mais nenhuma ideia.<br />
12. eu adoro<br />
Volante bandido.<br />
Uma <strong>da</strong>s coisas que eu mais gosto na Perestroika é, como diz o<br />
Felipe, quebrar a matrix <strong>da</strong> turma. Porque no primeiro dia, a gente<br />
olha lá de cima e fica imaginando quem vocês são. No primeiro contato,<br />
é impossível tirar qualquer conclusão sem cair em preconceitos<br />
e estereótipos.<br />
Com o passar <strong>da</strong>s semanas, ca<strong>da</strong> um vai se revelando. E é aí que a<br />
coisa fica bacana. O Lucas deixa de ser o filho <strong>da</strong> Helena. O Panichi<br />
deixa de ser o pinta que imita o Silvio Santos. Ca<strong>da</strong> um se transforma<br />
num cara diferente <strong>da</strong>quele neguinho do primeiro dia de aula. E invariavelmente<br />
essa nova pessoa é muito mais legal.<br />
É nessa hora que a gente vê quem vocês realmente são.<br />
O mercado publicitário nos induz a seguir um modelo que nem sempre<br />
combina com a gente. Temos que cortar o cabelo no Sexton. Temos<br />
que an<strong>da</strong>r de All-Star. Temos que ter um Iphone. Ou não. Mas <strong>da</strong>í<br />
vão olhar você dos pés à cabeça com um ar de reprovação. Justo o<br />
mundo <strong>da</strong> publici<strong>da</strong>de, que se diz tão mente aberta.<br />
Não há na<strong>da</strong> de errado em gostar de All-Star. O errado é ser engolido<br />
por esse universo. Não é fácil ser pagodeiro num meio onde todo<br />
mundo gosta de música eletrônica. Não é fácil ser mauricinho quando<br />
todo mundo é hype. E se você é pagodeiro ou mauricinho, tenho certeza<br />
que vai concor<strong>da</strong>r comigo.<br />
263
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
O mais importante é ser autêntico. Porque você só consegue dizer<br />
coisas ver<strong>da</strong>deiras – seja na propagan<strong>da</strong>, seja na vi<strong>da</strong> – se você for<br />
ver<strong>da</strong>deiro. Quando a gente vive um personagem o tempo todo, e só<br />
deixa o papel quando deita na cama, alguma coisa está erra<strong>da</strong>.<br />
Se o seu negócio é pagodão, desses bem bagaceiros, não tenha<br />
medo de assumir. Até porque, uma hora ou outra, isso vai ser uma<br />
puta vantagem competitiva para você. Já pensou, quando tiver que<br />
criar um jingle chicletão para aquela rádio popular? Tenho certeza que<br />
vai tirar de letra.<br />
Seja autêntico. Os caras mais fo<strong>da</strong>s que eu conheço são assim. E só<br />
são fo<strong>da</strong>s porque são assim.<br />
Eu adoro volante bandido, jogar poker, Jack Black, cafuné, almoçar<br />
sozinho, feijão com farinha, camisa de botão, humor negro, filmes de<br />
máfia, <strong>da</strong>r aula na Perestroika, a sobremesa do Constantino, as pia<strong>da</strong>s<br />
do meu vô, Diogo Mainardi, conversar com estrangeiros, Buenos<br />
Aires, fazer churrasco ouvindo Sala de Domingo.<br />
Eu odeio dirigir, tirar fotos, casamentos, fazer a barba, trabalhar no<br />
final de semana, livros com mais de 100 páginas, frutas, verduras, inverno,<br />
morar longe dos meus pais, Cinema Novo, gente que <strong>da</strong>nça no<br />
meio <strong>da</strong> rodinha, Faustão e luau com violão.<br />
E tudo isso, certo ou errado, eu tento colocar nos meus títulos e roteiros<br />
<strong>da</strong> maneira mais ver<strong>da</strong>deira possível. Porque essa conjunção de<br />
fatores, essa visão de mundo, é um privilégio só meu.<br />
Se eu conseguir transformar isso numa coisa interessante, será impossível<br />
copiar.<br />
Nesse sentido, um aluno conquistou meu respeito e admiração. Um<br />
cara que é bem resolvido, que não se intimidou nem pelos alunos,<br />
nem pelos professores. Que li<strong>da</strong> com as brincadeiras com bom humor,<br />
sem nunca esquentar a cabeça. E que, mesmo com to<strong>da</strong>s as provocações,<br />
nunca foi capaz de nos xingar com um único palavrão.<br />
*Esse post faz referência a um aluno chamado Tronquini, que não falava<br />
palavrão até entrar na Perestroika. Lembro com carinho desse cara.<br />
265
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
13.Vai lá e faz. mas Vai lá<br />
e acaba.<br />
Muita gente conhece o lema “Vai lá e faz”. Mas muita gente o interpreta<br />
de forma erra<strong>da</strong>.<br />
Vai lá e faz é mais do que começar. Vai lá e faz é ir do início ao fim do<br />
processo. É tirar o projeto do papel e colocá-lo de pé. Porque começar<br />
a primeira página de um livro é moleza. Porque montar o business<br />
plan de um novo site de compra coletiva é teta. Porque ligar para a<br />
menina e convidá-la pra sair não é o mais fo<strong>da</strong>.<br />
Difícil é ver o livro publicado, a empresa inaugura<strong>da</strong> ou o beijo<br />
consumado.<br />
Portanto, to<strong>da</strong> vez que você pensar em “vai lá e faz”, não esqueça que,<br />
tão importante quanto começar, é terminar. Projetos pela metade têm<br />
muito, muito pouco valor. Muitas vezes, não têm nenhum valor.<br />
No meio corporativo, chamam isso de acabativa. Mas eu, sinceramente,<br />
não gosto desse termo. Prefiro a simplici<strong>da</strong>de do “vai lá e acaba”,<br />
que é um tapa na cara <strong>da</strong>s pessoas que são ótimas em desistir.<br />
Nessas horas, faz todo o sentido se utilizar <strong>da</strong> lógica beta. Pense no<br />
jeito mais simples de levantar o seu projeto. E aí, com ele funcionando,<br />
comece a mu<strong>da</strong>r. Aplique as melhorias. Ajuste o que puder ser evoluído.<br />
Troque a cor, mude o preço, reforce a equipe.<br />
Se a Perestroika decidisse ser uma escola de ativi<strong>da</strong>des criativas na<br />
sua primeira edição, a gente nunca teria conseguido tornar o negócio<br />
rentável. Foi justamente essa lógica orgânica, de um passo de ca<strong>da</strong><br />
vez, que nos deu um crescimento ágil, porém sustentável.Se você fica<br />
olhando lá para frente, você nunca acaba. E só quando você acaba é<br />
que as coisas começam.<br />
Vai lá e faz. Mas vai lá e acaba o que você fizer.<br />
267
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
14. saiba o que Você sabe.<br />
e o que Você não sabe.<br />
Quem acompanha o blog sabe. Gosto muito de futebol. Acompanho<br />
meu time, mas também acompanho o esporte como um todo. Gosto<br />
de fazer aqueles desenhos táticos. Gosto de entender o que está passando<br />
pela cabeça do técnico. Gosto <strong>da</strong>s movimentações silenciosas,<br />
que não são valoriza<strong>da</strong>s pela maioria dos torcedores.<br />
Mas também adoro o lado business. A estratégia macro de um clube.<br />
Do que ele pensa para a instituição, e não apenas para o plantel<br />
de jogadores.<br />
Hoje, li que o Inter estu<strong>da</strong> fazer uma pré-tempora<strong>da</strong> na Argentina, com<br />
a intenção de difundir sua marca no exterior. E aí, quando você ouve<br />
isso, fica mais fácil entender por que Guiñazu, Bolatti e D’alessandro<br />
são figuras importantes no grupo colorado. Aí, fica mais fácil perceber<br />
o motivo <strong>da</strong> contratação de Pato Abbon<strong>da</strong>nzieri, mesmo em fim de<br />
carreira. Aí, fica mais fácil sacar por que Jorge Fossati e Paulo Roberto<br />
Falcão foram apostas <strong>da</strong> diretoria.<br />
Se você olhar o microcosmo, olhar o jogo que vem pela frente, talvez<br />
ache que o Guiñazu ser convocado para a Seleção Argentina é um<br />
péssimo negócio. Mas quando você entende o contexto geral, fica<br />
claro que – para a instituição – é um circunstância favorável.<br />
As decisões num clube de futebol não são feitas, exclusivamente,<br />
pensando no rendimento dentro <strong>da</strong>s quatro linhas. Existe uma série<br />
de coisas para se levar em conta. O reserva descontente que começa<br />
a minar o vestiário. O goleiro que brigou com a mulher e que<br />
talvez não esteja seguro para a próxima parti<strong>da</strong>. O dirigente que<br />
quer se reeleger na eleição do ano que vem. O conselheiro que está<br />
em dívi<strong>da</strong> com um jornalista e que tem uma informação privilegia<strong>da</strong>.<br />
A valorização de um atleta que está com o contrato encerrando. E<br />
assim por diante.<br />
Se você olha o micro, você pensa “puxa, por que ele não escala os<br />
melhores!”. Mas se você entende o macro, você entende que ele,<br />
provavelmente, ESCALOU OS MELHORES. A diferença é que você<br />
não tem informação suficiente para fazer esse julgamento.<br />
Isso, que é fácil de perceber em futebol, acontece em todos os organismos<br />
sociais. E a gente, do alto <strong>da</strong> nossa sabedoria, faz um julgamento<br />
leviano, raso, com a pretensão de que sabe tudo o que está se<br />
passando. E diz, como senhor <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de: “que cara idiota!”.<br />
Criticamos o trabalho do colega, sem sabermos que ele passou a noite<br />
em claro cui<strong>da</strong>ndo do filho que estava com febre.<br />
Criticamos a empresa concorrente, sem sabermos que eles estão a<br />
ponto de fechar com um cliente gigante, e não puderam <strong>da</strong>r muita<br />
bola para o produto recém lançado.<br />
Criticamos o amigo que não sai de casa nunca, que é um velho, sem<br />
sabermos que, no fundo, ele está em depressão profun<strong>da</strong>.<br />
Criticamos um tweet sem sabermos que, na ver<strong>da</strong>de, o cara está man<strong>da</strong>ndo<br />
uma mensagem vela<strong>da</strong> para uma gatinha que está saindo.<br />
Criticamos a política, a economia, o trânsito. Xingamos muito no Twitter.<br />
Avaliamos tudo por um prisma incompleto e batemos o martelo<br />
numa sentença de certeza.<br />
Eu faço isso. Você faz isso. Todo mundo faz isso.<br />
269
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Claro: o mundo seria muito chato se não houvesse essas opiniões. Talvez<br />
a graça <strong>da</strong>s discussões de bar, dos papos informais, <strong>da</strong>s conjecturas<br />
paranóicas esteja justamente aí. No caráter experimental, na dúvi<strong>da</strong>,<br />
na incerteza, na convicção de um quebra-cabeças cheio de furos.<br />
Por favor, não é isso que estou dizendo.<br />
Só acho perigoso o cara que não apenas ignora várias variáveis <strong>da</strong><br />
equação, mas nem considera que elas possam existir. E aí, além de<br />
errado, muitas vezes passa por ingênuo.Como empresário, vivi experiências<br />
boas e ruins nesses dois sentidos. Já me senti dono <strong>da</strong><br />
ver<strong>da</strong>de e me quebrei bonito (e ain<strong>da</strong> vou me quebrar muitas vezes),<br />
por achar que estava a par de tudo. Assim como já vivi situações em<br />
que, por ter informações privilegia<strong>da</strong>s, vi como eram ingênuas certas<br />
colocações.<br />
Na obra-prima de Francis Ford Coppola, O Poderoso Chefão, que revi<br />
esses dias, existe um diálogo que resume tudo isso que falei. Michael<br />
Corleone, filho de Dom Corleone e futuro herdeiro do império <strong>da</strong> máfia,<br />
conversa com sua futura esposa, Kate.<br />
— Meu pai não é diferente de nenhum outro homem poderoso,<br />
como um presidente ou um senador.<br />
— Você percebe como é ingênuo? Presidentes e senadores não<br />
man<strong>da</strong>m matar pessoas.<br />
— Quem está sendo ingênuo, Kay?<br />
Moral <strong>da</strong> história? Não basta só saber o que você sabe. Você tem<br />
que ter uma noção do quanto você não sabe. Só assim você vai estar<br />
preparado para uma rasteira que pode vir ali na frente. E evita uma<br />
exposição desnecessária.<br />
Evita que aquele comentário que você faz, convicto, gere uma troca<br />
de olhares constrangidos entre todos os outros presentes na reunião.<br />
Que pensam silenciosamente:<br />
Se ele soubesse…<br />
É difícil, muito difícil, especialmente para pessoas que ain<strong>da</strong> estão<br />
amadurecendo na profissão (meu caso como empresário). Mas é importante.<br />
Especialmente quando o técnico escala um terceiro volante<br />
e seu colega ao lado resmunga.<br />
E isso é tudo o que sei. Ou que não sei.<br />
271
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
15. as três principais<br />
coisas que aprendi com<br />
empreendedores.<br />
Esse período no Rio está fantástico. A quanti<strong>da</strong>de de reuniões que a<br />
gente tem feito com pessoas influentes é absur<strong>da</strong>. A recepção, em<br />
todos os locais, sem exceção, foi ótima. E o aprendizado, às vezes<br />
deliberado, às vezes por observação, às vezes por osmose, tem sido<br />
pra vi<strong>da</strong>.<br />
Na volta <strong>da</strong> Farm, onde trocamos uma ideia com o Marcelo Bastos,<br />
twittei uma conclusão que tirei desse intensivão. E agora que o dia acalmou<br />
um pouco, resolvi descrever melhor a minha linha de raciocínio.<br />
Portanto, as três principais coisas que aprendi com empreendedores<br />
até agora são:<br />
1. Conheça e se ConeCte Com gente Fo<strong>da</strong>.<br />
A maioria dos negócios que fiz nasceu depois de ter encontrado<br />
gente relevante. Essas pessoas sugeriram ideias, me indicaram outras<br />
pessoas, convi<strong>da</strong>ram para oportuni<strong>da</strong>des que nunca rolariam<br />
se eu não estivesse lá, naquele lugar, naquela hora. Outra: gente<br />
fo<strong>da</strong> atrai gente fo<strong>da</strong>.<br />
Um dos meus lemas é sempre tentar ser o cara mais burro <strong>da</strong> reunião.<br />
Sinal de que eu talvez não tivesse que estar lá. E se estou, é porque<br />
tive méritos em me conectar com gente do caralho.<br />
Quando falo com esses fo<strong>da</strong>lhões, é sempre assim. Eles vão se juntando<br />
com gente legal, que traz mais gente legal e, quando vê, é um<br />
batalhão de mentes diferencia<strong>da</strong>s.<br />
Não tem como sair algo ruim.<br />
2. Faça mais e planeje menos.<br />
Não estou dizendo para não haver planejamento. Só estou dizendo<br />
que SÓ o planejamento não leva a lugar nenhum. A ação, mesmo que<br />
mal planeja<strong>da</strong>, leva. Porque, muitas vezes, sem planejamento, e só<br />
com intuição, é possível fazer muita coisa legal.<br />
Moral <strong>da</strong> história: todos os caras incríveis que conheci na vi<strong>da</strong> tinham<br />
isso no sangue.<br />
Eles planejavam, mas antes do planejamento estar 100% pronto, já<br />
saíam tocando a ideia de alguma forma.<br />
Não dá para explicar exatamente. Não é um sistema, não é uma ferramenta.<br />
É um modelo mental que confirma aquela máxima. Papel não<br />
para em pé.<br />
3. quando Chegar lá, não vire um esCroto.<br />
É óbvio que, quanto mais o cara cresce na vi<strong>da</strong> profissional, mais<br />
complica<strong>da</strong> fica a agen<strong>da</strong>. Chega uma hora que, por mais legal que<br />
o neguinho seja, ele não vai conseguir <strong>da</strong>r atenção para todo mundo.<br />
E alguns emails vão ficar sem resposta. Alguns telefonemas vão cair<br />
na caixa. E alguns comentários como É, agora está se achando vão<br />
surgir naturalmente.<br />
Mas os neguinhos fo<strong>da</strong>, mesmo com sucesso, não fazem isso por cu<br />
doce. Fazem porque fica inviável. No final <strong>da</strong>s contas, eles continuam<br />
caras legais, mas ocupados.<br />
273
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Óbvio que existem os megaempresários do mal. E não são poucos.<br />
Mas esses caras são desmascarados rapidinho e são referência negativa<br />
nos seus mercados. Não são bem falados, não são inspiração. E<br />
eu não conheço nenhum líder que não inspire.<br />
Se um dia eu ficar rico e milionário, vou tentar manter o mesmo relacionamento<br />
com as pessoas que tenho hoje. Não sou o cara mais carismático<br />
do mundo, fato. Mas estou longe de ser um bandido. E, se você<br />
quer saber, tem até umas pessoas que me acham legal. Vai entender.<br />
Importante: essas não são As três regras para o empreendedor de<br />
sucesso. São leituras que fiz, empiricamente, como muitos desses<br />
empresários fazem. Concorde, discorde, opine. Mas, por favor, não<br />
deturpe o que escrevi.<br />
16. deixe sua criança<br />
liVre liVre.<br />
Há um tempo, participei de uma imersão de 36 horas bastante inusita<strong>da</strong>.<br />
Vivi alguns momentos tensos, outros de tédio, outros bastante discutíveis<br />
(que beiraram a irresponsabili<strong>da</strong>de). Mas alguns valeram bastante<br />
a pena, e me trouxeram lições que não vou esquecer tão cedo.<br />
Uma <strong>da</strong>s coisas mais legais que tirei de lá foi o conceito <strong>da</strong> Análise<br />
Funcional <strong>da</strong> Personali<strong>da</strong>de. Não sei se entendi completamente os<br />
fun<strong>da</strong>mentos psicológicos apresentados (não sou um mega especialista<br />
do assunto, e nem pretendo ser). Mas, sinceramente, saber tintim<br />
por tintim nem era o mais importante. O legal foi o aprendizado que<br />
tirei de tudo isso.<br />
De forma bem resumi<strong>da</strong>, o que entendi: nós somos resultado de várias<br />
pessoas que dialogam dentro do nosso eu. Sendo bem reducionista,<br />
podemos listar seis figuras, que estão constantemente determinando<br />
a nossa maneira de pensar e agir.<br />
Pai crítico: nosso lado crítico, controlador, autoritário.<br />
Pai protetor: nosso lado caridoso, bondoso, que aju<strong>da</strong> e é amoroso.<br />
Adulto: nossa faceta responsável, que avalia a situação com bom<br />
senso, que pondera.<br />
Criança rebelde: é o nosso lado do contra, subversivo e contestador.<br />
Criança submissa: responsável por aquele nossa parte mais covarde,<br />
com um certo medo exagerado.<br />
Criança livre: é nossa parte mais espontânea, criativa, intuitiva,<br />
sem muitos filtros.<br />
275
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Quando olho esse diagrama, consigo entender perfeitamente porque<br />
alguns de nós são mais criativos que outros. Nós, adultos, com nossas<br />
regras, leis, preconceitos e ver<strong>da</strong>des absolutas, matamos a criança<br />
que existiu um dia.<br />
Essa criança desenhava um círculo azul e dizia que era um sol. Por<br />
quê? Ora, por que a representação gráfica de um sol tem que ser NE-<br />
CESSARIAMENTE amarela? Quem determinou isso?<br />
Um adulto, provavelmente.<br />
Essa criança pintava e se sujava sem medo. Faz parte do processo, não<br />
faz? Existe artista mais visceral que uma mente infantil com um pincel?<br />
Essa criança escrevia mesmo sem estar alfabetiza<strong>da</strong>. Criava sua própria<br />
linguagem, seus algarismos, seus caracteres e sua lógica de leitura.<br />
Por que tem que ser <strong>da</strong> esquer<strong>da</strong> para a direita e de cima para<br />
baixo? Quem inventou isso?<br />
Um adulto, provavelmente.<br />
Essa criança compunha músicas que não tinham corpo/refrão/corpo/ponte/refrão/solo/ponte/refrão.<br />
Porque esse jeito comercial é<br />
completamente contrário ao caos musical de um menino de cinco<br />
anos, que sai do ritmo, que esquece a letra e ain<strong>da</strong> assim se diverte<br />
pra caramba.<br />
Essa criança questionava tudo. Por quê? Por quê? Por quê? Depois<br />
de velhos, nós ficamos previsíveis, preguiçosos e chatos. Não questionamos<br />
quase na<strong>da</strong>. Se essa é a regra, que se siga a regra. Se esse<br />
é o padrão, que se siga o padrão. E se a criança sai do padrão, a gente<br />
vai lá e dá um cascudo.<br />
Coisa de adulto, né?<br />
Eu aprendi, ao longo dessas 36 horas, que deixar a Criança Livre LI-<br />
VRE é a melhor maneira de ser criativo.<br />
Por isso, é uma bobagem aqueles que dizem: sou experiente, tenho<br />
muitas referências, já vi de tudo nesse mercado. Quem diz isso só<br />
está reforçando o seu lado adulto, e ca<strong>da</strong> vez mais distante <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>deira<br />
criativi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s mentes infantis.<br />
Lembro de ver de perto as obras de Miró e ouvir de uma senhora crítica<br />
ao meu lado: Isso parece coisa de criança. Pois é, minha senhora:<br />
talvez esteja justamente aí a sua geniali<strong>da</strong>de.<br />
Este texto está aberto a críticas, a discordâncias, a contraposições.<br />
Mas antes de deixar sua mensagem, deixe a sua Criança Livre um<br />
pouco mais livre, beleza?<br />
Um beijo babado, com sabor de nuvem.<br />
Titi Loquinho (meu apelido <strong>da</strong> 4a. série).<br />
277
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
17. ganha-ganha.<br />
Nas minhas vi<strong>da</strong>s passa<strong>da</strong>s, eu devo ter sido um árabe, <strong>da</strong>queles que<br />
vendem bugigangas no meio de algum feirão de Constantinopla.<br />
Eu adoro vender. E com certeza esse foi um fator que contribuiu muito<br />
para que eu tenha caído na publici<strong>da</strong>de. (Aos que ain<strong>da</strong> não se deram<br />
conta: publici<strong>da</strong>de é só, e simplesmente só, vender.)<br />
Lembro que quando tinha 15 anos, pedi autorização para o meu pai<br />
para trabalhar no McDonald’s. Ele não entendeu muito bem meu pedido.<br />
Mas eu queria trabalhar no balcão, conhecendo pessoas. E convencendo<br />
pessoas a levar por apenas mais R$ 2,00 uma tortinha de maçã.<br />
Mas não convencer na mal<strong>da</strong>de. Não convencer para forçar um consumismo<br />
injustificado. Eu queria tentar, de alguma forma, aju<strong>da</strong>r na<br />
escolha <strong>da</strong> pessoa. Queria que ela fizesse uma compra melhor a partir<br />
<strong>da</strong> minha indicação.<br />
Meus amigos de Farroupilha achavam muito imbecil tudo isso. Pensavam<br />
que eu só poderia estar louco. Qual é a graça de ser um vendedor,<br />
Tiago? De tanto ouvir aqui e ali, desisti do meu plano e nunca entrei<br />
para a trupe do Ronald e cia.<br />
Mas essa filosofia, de ser um intermediário <strong>da</strong> boa compra, ficou.<br />
Eu acho que o bom vendedor não é aquele que engana o consumidor.<br />
Não é o picareta. Não é o que força a barra. Não é o que joga sujo para<br />
ganhar uma comissão no final do mês.<br />
É quem interpreta o problema e encontra uma boa solução. É aquele<br />
que convence a pessoa a comprar algo que seja realmente útil. É o<br />
cara que consegue abrir os olhos do consumidor para funcionali<strong>da</strong>des<br />
que ele nem sabia que existiam. É quem acredita que, no final, a compra<br />
pode ser boa para to<strong>da</strong>s as partes.<br />
É o cara que diz: Realmente, Dona Maria, a senhora não precisa de<br />
uma cama King Size. Mas quem sabe nós vemos um colchão novo,<br />
para diminuir essa sua dor na coluna?<br />
Talvez, a profissão de vendedor seja a que melhor represente a filosofia<br />
Ganha-ganha. Porque, para mim, o bom vendedor é justamente o<br />
cara que acredita no ganha-ganha. Que acredita que ninguém precisa<br />
perder para que todos saiam ganhando.<br />
Por sinal, eu acho que to<strong>da</strong>s as relações entre as pessoas deveriam<br />
respeitar esse princípio. To<strong>da</strong>s as relações deveriam ser (ou tentar ser)<br />
ganha-ganha.<br />
Porque quando a gente acha que, para se <strong>da</strong>r bem em alguma coisa,<br />
tem que enrolar o outro: cui<strong>da</strong>do. Tem coisa erra<strong>da</strong> aí.<br />
Sempre que eu participo de um “momento ganha-ganha”, parece que<br />
eu estou contribuindo para o equilíbrio do universo. Para a Corrente<br />
do Bem. Para (OK, já que estamos em período de Ano Novo) um mundo<br />
mais bonzinho.<br />
Quando isso acontece, eu não me sinto culpado, já que não estou<br />
prejudicando ninguém. E também não me sinto mal, porque não deixei<br />
que ninguém me sacaneasse. É só o justo, ora.<br />
Mas é complicado. Porque nós fomos educados para levar máxima<br />
vantagem em tudo. Quando talvez o raciocínio correto seja simplesmente<br />
tentar tirar algo bom para todo mundo em to<strong>da</strong>s as situações.<br />
279
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Naquela cena famosa do Mente Brilhante, o Nash diz: Se todos chegarem<br />
na loira, todo mundo sai perdendo. Se todos chegarmos nas<br />
amigas, todo mundo se dá bem. Perfeito. Mas será que não existe um<br />
jeito de não deixar a loira chupando dedo? Aí sim, todo mundo saiu<br />
ganhando. (Inclusive a loira, porque ela vai terminar se <strong>da</strong>ndo bem de<br />
alguma forma.)<br />
É curioso, mas as relações ficam mais autênticas, genuínas e humanas.<br />
Tanto você com seus amigos. Você com sua família. Você na sua<br />
empresa. Você com a sua namora<strong>da</strong>. Você com você mesmo.<br />
Ou simplesmente você com o vendedor <strong>da</strong> Magazine Luiza.<br />
18. querem saber quanto eu<br />
ganho? então Vou dizer.<br />
Uma <strong>da</strong>s perguntas mais recorrentes dos alunos é sobre o nosso salário.<br />
E eu não vejo isso pelo lado bisbilhoteiro. Acho que, de certa<br />
forma, eles nos vêem como ponto de referência. Então, quando perguntam<br />
quanto ganhamos, acredito que seja mais pra saber quais são<br />
as perspectivas salariais no futuro.<br />
Só que tanta gente tem essa dúvi<strong>da</strong> que eu resolvi abrir o jogo. Lendo<br />
esse post, vocês vão saber quanto eu ganho. Juro.<br />
A primeira coisa importante é perceber que grana é só uma parte <strong>da</strong><br />
nossa remuneração. Além dos benefícios tradicionais, como ticket,<br />
vale e plano de saúde, tem muito mais coisa envolvi<strong>da</strong>.<br />
Por exemplo: você tem duas propostas idênticas. Mas numa, você vai<br />
trabalhar com um chefe legal pra caralho. Na outra, com um pau no cu.<br />
Imagino que, em condições normais de temperatura e pressão, todos<br />
fechariam na primeira. Por quê? Ora, porque as CONDIÇÕES DE TRA-<br />
BALHO (no caso, o chefe) também contam como salário.<br />
Assim como as condições de trabalho, existem outras coisas que devem<br />
ser vistas como remuneração, e às vezes a gente nem se dá<br />
conta. (Não listei todos os itens que compõem um “salário”. Só peguei<br />
alguns representativos para ilustrar o raciocínio.)<br />
281
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Início de carreira<br />
Salário: ruim<br />
Trabalhos: ruins<br />
Aprendizado: alto<br />
Networking: alto<br />
O neguinho no início <strong>da</strong> carreira ganha pouca grana, sim. Mas por outro<br />
lado, ganha muito conhecimento. Porque o dia-a-dia o faz aprender<br />
com os profissionais mais experientes. E isso é uma forma de<br />
salário. Lembre-se: se você paga para aprender sobre propagan<strong>da</strong><br />
numa universi<strong>da</strong>de, é sinal de que esse conhecimento tem um valor. E<br />
numa agência, teoricamente você está recebendo de graça.<br />
Dependendo do ponto de vista, o salário de um iniciante na propagan<strong>da</strong><br />
pode ser considerado uma puta grana. Vejam só.<br />
Muita gente não se dá conta, mas a rede de contatos que você faz<br />
quando entra numa empresa é valiosíssima. Se contato não valesse<br />
dinheiro, não existiriam palavras como “lobbystas” ou “tráfico de influências”.<br />
Ninguém compraria mailings. E por aí vai.<br />
Com o passar do tempo, você cresce na profissão. Agora, em vez de<br />
trabalhar num computador podre, você já tem uma máquina bacana.<br />
Agora, você não faz só ro<strong>da</strong>pés: já pega campanhas com rádio e TV.<br />
E além disso, você está com carteira assina<strong>da</strong>, ganhando o dobro do<br />
trampo anterior. Ou seja, você está ganhando mais. Certo?<br />
Depende.<br />
A agência que está pagando mais dinheiro para você só está fazendo<br />
isso porque, hoje, você tem uma certa experiência. Tem mais critério.<br />
Tem mais conhecimento técnico. E, logicamente, isso faz com que<br />
você resolva melhor e mais rapi<strong>da</strong>mente os trabalhos.<br />
Mas vejam o outro lado. Como você sabe mais hoje do que sabia<br />
ontem, as novi<strong>da</strong>des diminuem. O aprendizado continua, lógico. Mas<br />
fica mais lento. Antes, você mal sabia alinhar as coisas. Agora você já<br />
entende de combinação de cor, diagramação, escolha de fontes. Os<br />
conceitos básicos, que foram úteis para você antes, agora não são<br />
mais. Se não são, sinal de que esse conteúdo você já domina. E se<br />
você já domina, não vai pagar por ele.<br />
Esse tipo de situação acontece na fase intermediária <strong>da</strong> carreira. A<br />
gente passa a ganhar mais de um lado, mas deixa de ganhar do outro.<br />
Veja só.<br />
Início de carreira<br />
Salário: médio<br />
Trabalhos: médio<br />
Aprendizado: médio<br />
Networking: médio<br />
Até que um dia você fica grandão, vai para uma puta agência, ganhando<br />
uma puta grana, com contas animais. E agora, você está ganhando<br />
mais do que antes?<br />
Pode ser que sim, pode ser que não. Tudo depende de como você<br />
percebe o valor dessas coisas intangíveis.<br />
Maturi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> carreira<br />
Salário: alto<br />
Trabalhos: alto<br />
Aprendizado: baixo<br />
Networking: baixo<br />
Por esse raciocínio, a grande maioria <strong>da</strong>s pessoas ganha mais ou menos<br />
a mesma coisa. De formas totalmente diferentes, mas com valores<br />
semelhantes.<br />
283
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
Evidente que existem injustiças por aí. Tem cara Tabajara ganhando<br />
mais do que deveria, tem neguinho competente ganhando menos do<br />
que merece. O mundo não é perfeito.<br />
Portanto, quer saber quanto eu ganho? O mesmo que você.<br />
Fiquei sabendo que um estagiário <strong>da</strong> turma um, depois de ouvir essa<br />
minha teoria, fez uma sensacional. Percebeu que o salário dele era<br />
uma bosta. Que a agência em que trabalhava só tinha contas fodi<strong>da</strong>s.<br />
Mas que ao seu lado, sentava uma estagiária muito gostosa.<br />
Ele virou para o lado e falou.<br />
“Olha, não me tire pra machista, não me leve a mal. Mas a gente vai ter<br />
que negociar umas coisinhas. Você faz parte do meu salário.”<br />
19. o especialista em<br />
mÍdias digitais.<br />
Hoje em dia, qualquer pessoa que possui mais de 1.000 followers no<br />
Twitter, mantenha um blog por mais de um ano e já tenha trabalhado<br />
para alguma marca pode se auto-proclamar um “especialista em mídias<br />
digitais”.<br />
Eles estão aí, aos cântaros, pipocando e vendendo um peixe que nem<br />
sempre é tão profissional assim.<br />
Claro: existem várias pessoas que dominam esse conteúdo, e podem<br />
cobrar – e cobrar caro – pelo conhecimento que detêm.<br />
Ao mesmo tempo, vário novatos estão se aventurando num terreno<br />
complexo. E muitas vezes, com o consentimento <strong>da</strong> própria<br />
empresa, que contratam um estagiário e o deixam coordenando<br />
Twitter, Facebook e Blog. Já que “ele é <strong>da</strong> Geração Y e sabe mexer<br />
nessas coisinhas”.<br />
Complicado, não?<br />
Sou um liberal por natureza. Acredito no livre mercado. Na<strong>da</strong> de protecionismo.<br />
Quem sabe fazer, que faça.<br />
Agora, é notório que muitas marcas estão gerindo mal suas plataformas.<br />
E acho que este é um dos furos.<br />
Na minha opinião (e aí, você pode discor<strong>da</strong>r ou concor<strong>da</strong>r, o mundo é<br />
285
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
livre), um especialista em mídias digitais têm que reunir uma série de<br />
quali<strong>da</strong>des. Que não são <strong>da</strong> noite para o dia que você adquire.<br />
Vou listar apenas algumas <strong>da</strong>s skills que julgo necessárias. De novo:<br />
você pode concor<strong>da</strong>r ou não, e não tem problema nenhum nisso. Essa<br />
ain<strong>da</strong> é uma profissão em formação. Existem muito mais dúvi<strong>da</strong>s do<br />
que certezas.<br />
Também não acho que um EMD (Especialista em Mídias Digitais) precise<br />
de TODAS essas características. Se a Internet é um sistema dinâmico,<br />
seria anacrônico enxergar por uma ótica cartesiana.<br />
1. entender a história <strong>da</strong> internet:<br />
o passado, o presente e o Futuro.<br />
Os protocolos de convivência <strong>da</strong> internet, também chamados de “O<br />
comportamento do usuário nas mídias sociais”, têm origem direta na<br />
forma como a rede foi construí<strong>da</strong>. Os fatores tecnológicos são a base<br />
dos fatores humanos.<br />
2. entender o protoColo Criado pela revolução digital<br />
do ponto de vista téCniCo e soCiológiCo.<br />
Acredito que muitos EMDs dominam a parte ferramental, <strong>da</strong>s novas<br />
tecnologias que surgem. Mas nem sempre essas pessoas conseguem<br />
mergulhar no que mais importa, que é: o impacto sociológico que a<br />
Revolução trouxe.<br />
3. ir muito além do “CrowdsourCing”<br />
e “poder <strong>da</strong>s massas”.<br />
To<strong>da</strong> hora surge um termo novo. Snack Culture, Storytelling, Engagement<br />
e por aí vai. Muitos desses temas são sobreposições. Temos que<br />
tomar cui<strong>da</strong>do para não usarmos palavras novas para dizer exatamente<br />
as mesmas coisas que estavam sendo ditas anteriormente.<br />
4. aCompanhar as mu<strong>da</strong>nças.<br />
Tudo acontece muito rápido. A ca<strong>da</strong> dia, surge uma nova rede social.<br />
Qual vai pegar? Qual é fogo de palha? O que é o Promoted to Twitter?<br />
Você é beta tester do Google+? Por que o Facebook tem tanto rolo<br />
com privaci<strong>da</strong>de? Esses questionamentos fazem parte, ou deveriam<br />
fazer parte, do dia-a-dia de um EMD.<br />
5. estu<strong>da</strong>r<br />
Muito do que se aprende sobre mídias sociais se aprende na marra,<br />
fazendo, executando. Mas há uma vasta bibliografia que aju<strong>da</strong>, e aju<strong>da</strong><br />
muito, a entender esse novo universo.<br />
6. não ter medo de errar.<br />
A internet é beta. Então, saber criar riscos calculados é um dos talentos<br />
que eu julgo mais importante num EMD.<br />
7. ter CapaCi<strong>da</strong>de de gerar teorias próprias.<br />
Este e o próximo item são parecidos, mas não iguais. Então: ser<br />
um simples consumidor do que os outros EMDs dizem é meio que<br />
ser um papagaio dos formadores de opinião. O legal é ter poder de<br />
análise, conseguir conectar pontos que nem todos estão vendo e<br />
formular, a partir <strong>da</strong>í, uma visão particular. Isso é o que dá valor ao<br />
seu trabalho.<br />
8. ter CapaCi<strong>da</strong>de de desenhar Cenários Futuros.<br />
O grande valor de um profissional é ter a capaci<strong>da</strong>de de antecipação.<br />
Então, acredito que um EMD que não consegue prever cenários, muitas<br />
vezes, trabalha apagando incêndios, em vez de evitá-los.<br />
287
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
9. dominar as Ferramentas mainstream.<br />
Existe uma certa ditadura do hype entre os EMD. Um papinho meio<br />
chato de que o Facebook está Orkutizando. Pois é: no Brasil, o cara<br />
que não usa Orkut está virando as costas para a rede mais popular no<br />
país. Tem que saber o que é cool? Claro. Mas não pode largar o osso<br />
do mainstream.<br />
10. entender de ComuniCação.<br />
Hoje, todos nós sabemos que a internet não é uma mídia. É muito<br />
mais. Mas, inicialmente, ela foi entendi<strong>da</strong> assim. O fato é que a internet<br />
TAMBÉM é uma mídia. Por isso, entender de comunicação (não<br />
confun<strong>da</strong> entender de comunicação com ter um diploma em comunicação)<br />
é fun<strong>da</strong>mental. Sem falar no óbvio: alguém que vai gerenciar os<br />
canais com o consumidor, vai FALAR com os consumidores em nome<br />
<strong>da</strong> marca. Tem que ter a manha, né?<br />
11. ter história.<br />
As novas gerações, que nascem praticamente dentro de um computador,<br />
têm muito a nos ensinar. Esse é um exercício de humil<strong>da</strong>de<br />
que eu faço diariamente. Mas nós não podemos ser ingênuos<br />
e achar que os nativos digitais sabem tudo. Até porque, boa parte<br />
do dia-a-dia de um profissional de dessa área é comum a qualquer<br />
outra profissão. Por isso, acredito que um EMD não nasce do na<strong>da</strong>.<br />
Ele precisa ter lastro.<br />
12. ter Carisma digital.<br />
Acredito que um EMD não é, necessariamente, um Geek. Mas o cara<br />
tem que ter, no mínimo, carisma digital. Ele tem que absorver tudo<br />
isso de forma natural, não com sofrimento.<br />
13. ter reFerênCias.<br />
Explicar através de exemplos é sempre uma ótima forma de fortalecer<br />
o nosso ponto de vista. Um EMD deve ter repertório, já que essa é<br />
uma área nova e, muitas vezes, o exemplo ao lado é o melhor aprendizado<br />
que podemos ter.<br />
14. ter Criado material autoral Com relevânCia na weB.<br />
Os fenômenos de cultura popular estão nascendo, ca<strong>da</strong> vez mais, <strong>da</strong><br />
Internet. Quem já fez algum webhit parece ter mais autori<strong>da</strong>de para<br />
discutir, em alto nível, o que faz sentido no consumo de conteúdo.<br />
Sem falar que esses caras, em geral, já controlam uma audiência própria.<br />
E esse trabalho de gerenciamento talvez seja a skill mais importante<br />
que se possa exigir.<br />
15. ter respeito de memBros <strong>da</strong> rede.<br />
Muito ouvir falar do termo panelosfera – que talvez já esteja até bem<br />
<strong>da</strong>tado. Existe sim um grupinho que se auto-referencia na internet<br />
e que se protege. Mas esses caras sabem reconhecer novos talentos,<br />
têm olho clínico para ver quando alguém vai explodir e, como<br />
passam muito tempo conectados, são impactados por quem estiver<br />
fazendo um trabalho relevante. Se eles já ouviram falar de você, ótimo.<br />
Bom sinal.<br />
16. ter perFis nas redes soCiais Com métriCas relevânCia<br />
nas Ferramentas de análise.<br />
São trihões de ferramentas usa<strong>da</strong>s para medir a sua importância<br />
na Internet. Mas eu gosto muito <strong>da</strong> Família Grader (BlogGrader, FacebookGrader,<br />
TwitterGrader e WebsiteGrader), que chegaram até<br />
mim pelo Dan Zarella, um dos maiores estudiosos de mídias sociais<br />
no mundo.<br />
289
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
17. ter reFerênCias multidisCiplinares que Façam voCê<br />
olhar muito além <strong>da</strong> internet.<br />
Um cara que só vive a internet tem uma capaci<strong>da</strong>de muito limitade<br />
de análise. Os grandes pensadores, em geral, são pessoas que vivem<br />
experiências multidisciplinares e têm conhecimento em mais de uma<br />
área. É o cruzamento desses conteúdos aparentemente desconexos<br />
que torna o contexto mais rico.<br />
18. saBer disCutir qualquer um desses itens<br />
Com uma autori<strong>da</strong>de.<br />
Bancar o espertão com um leigo, beleza. Agora, difícil é sentar numa<br />
mesa de debatedores e não arrepiar em meio a outros especialistas.<br />
19. saBer eXpliCar qualquer um desses itens para uma<br />
pessoa que nunCa ligou um Computador.<br />
Eu acredito que um picareta é aquele cara que fala, fala, fala, fala e ninguém<br />
entende na<strong>da</strong>. Ele não tenta facilitar, digerir, mastigar o conteúdo.<br />
Ele tenta tornar o mais complexo possível para sair por cima e parecer<br />
superinteligente. Se você vir um desses caras, cui<strong>da</strong>do. Ele pode estar<br />
aplicando pra cima <strong>da</strong> sua marca.<br />
20. saBer mu<strong>da</strong>r de opinião.<br />
Só uma pessoa que nasceu sabendo tudo não mu<strong>da</strong> de opinião. E como<br />
eu acredito que nenhum EMD nasce com esse predicado, o cara tem<br />
que saber rever os seus pontos de vista. Não pode se ter uma visão<br />
dogmática. Veja o caso do Refresh, que fez a Pepsi despencar para o<br />
terceiro lugar do mercado. Será que isso não é um indicativo?<br />
21. gostar de Co-autoria<br />
Esse negócio de ficar colocando a culpa no cliente (“eu proponho<br />
ideias, mas os caras nunca aprovam”) é um raciocínio muito infantil.<br />
Se você tem boas ideias, ótimo. Mas saber aprová-las com consistência<br />
é parte do seu trabalho. É sempre mais legal ser co-autor de algo<br />
brilhante que autor solitário de algo comum.<br />
Buenas, espero não gerar muita polêmica com este post. A ideia é abrir<br />
a discussão e ver se mais gente pensa como eu. Como falei: não é<br />
uma ciência exata. É um mercado que está nascendo, que ain<strong>da</strong> gera<br />
muitas incertezas e, por isso, não podemos ser obtusos em na<strong>da</strong>.<br />
Agora, isso não significa que temos que entregar a gerência <strong>da</strong>s nossas<br />
plataformas digitais para o primeiro cara que aparecer.<br />
Obs: O termo “mídias digitais”, em vez de “mídias sociais”, foi colocado<br />
delibera<strong>da</strong>mente. Um compreende o outro. O outro não compreende<br />
o um.<br />
291
as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />
20. as empresas deVeriam<br />
ser mais ronald rios.<br />
Esses dias, a Perestroika twitou uma frase tipo: “Eu nunca pegaria<br />
a Carrie Bradshaw”. Aí, uma seguidora nossa, perguntou que “a Perestroika<br />
não poderia dizer isso, porque era Pessoa Jurídica, e não<br />
Pessoa Física”.<br />
Pois eu repliquei dizendo que era exatamente esse o nosso jeito de se<br />
comunicar por lá. Nós temos dupla personali<strong>da</strong>de (às vezes é o Felipe,<br />
às vezes sou eu) e não pedimos autorização um para o outro. Simplesmente<br />
escrevemos o que julgamos ser legal. Às vezes, falamos<br />
como Pessoa Jurídica. Mas muitas vezes – provavelmente a maioria<br />
<strong>da</strong>s vezes –, como Pessoas Físicas.<br />
E quer saber? Acho legal pra caralho que a gente tenha essa postura.<br />
Porque gente fala como gente, não fala como empresa. Gente prefere<br />
pizza de calabresa do que muzarella. Gente odeia passear no parque.<br />
Gente nunca pegaria a Carrie Bradshaw. E gente, muitas vezes, diz<br />
que nunca pegaria a Carrie Bradshaw só para implicar com os outros.<br />
Ou por ironia. Ou como pia<strong>da</strong> interna.<br />
Gente fala como gente, e isso se torna muito mais interessante do<br />
que os discursos manjados <strong>da</strong>s empresas falam. Que sempre “estão<br />
pensando no futuro do planeta, com ações de sustentabili<strong>da</strong>de e presercação<br />
<strong>da</strong> natureza”. Já pensou, como seria um um papo de bar<br />
entre várias empresas? Um saco, só com aqueles discursos oficilistas<br />
e politicamente corretos.<br />
Eu acredito que já foi o tempo em que as marcas tinham que se chapa<br />
branca. Ou que tinham que se alinhar apenas com causas neutras. Ou<br />
ter posições necessariamente boazinhas.<br />
Eu acho que, <strong>da</strong>qui pra frente, vão se destacar as marcas que não<br />
tiverem problemas em posicionar. As marcas que tiverem um discurso<br />
de gente, mas gente de ver<strong>da</strong>de. Porque gente de ver<strong>da</strong>de fala mal de<br />
pagode pra defender o heavy metal.<br />
Na minha opinião, as empresas deveriam ser mais Ronald Rios. Vão<br />
saber dizer mais “eu gosto disso, eu não gosto disso”. (Atenção: se<br />
você não gosta de palavrões, opiniões agressivas e ironia <strong>da</strong>s fortes,<br />
melhor não procurá-lo no Youtube – se é que você não o conhece.)<br />
Claro que não estou dizendo que as empresas, a partir de agora, devem<br />
sair xingando todo mundo e emitindo opiniões racistas, fascistas<br />
e Southpárkicas.<br />
Mas chega <strong>da</strong>quele discursinho morno e bege. Fico pensando se a<br />
OI exigisse que a OI FM “contemplasse na sua programação todos<br />
os gêneros musicais com o mesmo número de horas, faixas e com<br />
a mesma participação no horário nobre”. Já pensou? Terminaria The<br />
Killers e começaria Molejo.<br />
293
o autor.<br />
Tiago Mattos é publicitário formado pela PUC/RS. Estudou como bolsista<br />
<strong>da</strong> Miami Ad School – na época, considera<strong>da</strong> por muitos a melhor<br />
portfolio school do mundo. Em 2012, ganhou novamente uma<br />
bolsa e se formou Futurista pela Singularity University, parceria entre<br />
Nasa e Google, no Vale do Silício.<br />
Foi re<strong>da</strong>tor publicitário durante mais de uma déca<strong>da</strong>. Em 2005, venceu<br />
a disputa Young Creative (seleção dos melhores portfolios até 28<br />
anos) e fez parte <strong>da</strong> delegação que representava o Brasil no Festival<br />
Mundial de Cannes. No ano seguinte, foi Re<strong>da</strong>tor do Ano, maior distinção<br />
que poderia receber na sua função dentro do seu mercado. Um<br />
ano depois, começou a transição, e lançou a Perestroika. Em 2008,<br />
lançou a Balalaika, um dos primeiros grupos de Stand-Up Comedy do<br />
Brasil. Foi quando, finalmente, largou a publici<strong>da</strong>de e assumiu o posto<br />
de Diretor de Whatever, passando a atual full-time na empresa.<br />
Foi o palestrante de abertura do TEDxPortoAlegre e debatedor do Fórum<br />
<strong>da</strong> Liber<strong>da</strong>de. Adora estu<strong>da</strong>r e é palestrante de assuntos como<br />
Futurismo, Comportamento Pós-revolução Digital, Inovação Empreendedora,<br />
Comunicação Contemporânea, Educação Disruptiva e<br />
Criativi<strong>da</strong>de aplica<strong>da</strong>.<br />
Hoje, é co-gestor <strong>da</strong>s uni<strong>da</strong>des Perestroika São Paulo, Rio de Janeiro<br />
e Porto Alegre. Também éb sócio do Iscola.cc, plataforma de crowdlearning.<br />
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