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Se você já leu As Mortas <strong>da</strong> Perestroika 1.0, boas notícias: esta aqui<br />

é uma edição revisa<strong>da</strong>. Demos um tapinha ali, outro aqui. E ain<strong>da</strong><br />

temos uma sequência de conselhos inéditos. Está tudo no Capítulo 9.<br />

Se quiser ganhar tempo, pule direto para lá.<br />

A sessão posts também sofreu drásticas mu<strong>da</strong>nças, principalmente<br />

com novos posts, que foram escritos no intervalo entre a primeira e a segun<strong>da</strong><br />

edição. Para você, que já leu o Mortas 1.0, vale <strong>da</strong>r uma olha<strong>da</strong>.<br />

A terceira novi<strong>da</strong>de é a própria revisão em si. Que me forçou a cortar<br />

muita coisa. Principalmente, as contribuições de profissionais do mercado.<br />

Agradeço muito e adoraria mantê-las. Mas percebi uma coisa:<br />

se a minha visão sobre comunicação mudou nesse meio tempo, a<br />

deles também poderia ter mu<strong>da</strong>do.<br />

Aqueles conselhos faziam parte de um contexto específico. E eu devia<br />

respeitá-lo.<br />

A solução seria consultar um a um. Como perdi contato <strong>da</strong> maioria<br />

dos profissionais, fiquei meio sem saí<strong>da</strong>. Se deixasse só algumas colaborações,<br />

<strong>da</strong>ria margem para confusão. Se deixasse todos, certamente<br />

ouviria alguma reclamação.<br />

Para não correr riscos, fiz o mais seguro: cortei todos dessa edição e<br />

os mantive na versão anterior, dentro do cenário apropriado. Achei o<br />

mais justo. Com eles, colaboradores. E com você, leitor.<br />

Novamente: agradeço a colaboração de todos os profissionais que dividiram<br />

sua experiência com os nossos leitores. E recomendo a você,<br />

que não leu, a procurá-los.<br />

tg


Olá,<br />

meu nome é Tiago.<br />

Durante mais de uma déca<strong>da</strong>, fui re<strong>da</strong>tor publicitário. Trabalhava no<br />

departamento de criação de agências de propagan<strong>da</strong>, fazendo campanhas<br />

para clientes nacionais. (Se você não troca de canal na hora do<br />

intervalo, é bem possível que tenha visto algum comercial que eu fiz).<br />

Hoje, dirijo – ao lado do meu sócio, Felipe Anghinoni – uma escola<br />

chama<strong>da</strong> Perestroika. Se você já ouviu falar <strong>da</strong> gente, legal. Se você<br />

nunca ouviu falar, não tem problema.<br />

Para seguir a leitura, a única coisa que você tem que saber sobre a<br />

Perestroika é que nós somos uma escola de criativi<strong>da</strong>de. Na ver<strong>da</strong>de,<br />

uma escola de ativi<strong>da</strong>des criativas. Temos, obviamente, projetos<br />

ligados à publici<strong>da</strong>de. Mas também em empreendedorismo, literatura,<br />

design, mo<strong>da</strong>, futebol como negócio, internet, comportamento do<br />

consumidor, arquitetura efêmera, poker profissional. E mais um monte<br />

de coisas que você não encontra em nenhum outro lugar.<br />

Mas vamos ao que interessa:<br />

No meu tempo de re<strong>da</strong>tor, um dos hábitos que eu tinha era receber<br />

candi<strong>da</strong>tos a estágio. As telefonistas <strong>da</strong>s agências até já sabiam: se<br />

alguém ligava querendo mostrar a pasta, passavam direto para o<br />

meu ramal.<br />

Fazia isso por vários motivos. O primeiro é que eu me sentia em dívi<strong>da</strong><br />

com o mercado. Muita gente me ajudou no início <strong>da</strong> carreira, sem<br />

nem me conhecer direito. Na<strong>da</strong> mais justo do que manter a Corrente<br />

do Bem.


Em segundo, porque eu sempre gostei de ser um caça-talentos. Então,<br />

quanto mais pastas eu via, maior era a chance de eu encontrar<br />

um Pelé no início de carreira. Esse meu costume se tornou tão comum<br />

que meu caderninho virou um departamento de RH informal. Quando<br />

a nossa equipe precisava de alguém, sempre me consultavam. E até<br />

quando amigos de outras agências estavam em busca de estagiário,<br />

meu telefone tocava.<br />

Por fim, essa era uma maneira de aprender também. Quando você<br />

se força a <strong>da</strong>r opinião técnica sobre um assunto, você precisa buscar<br />

no seu banco de <strong>da</strong>dos motivos para criticar ou elogiar determina<strong>da</strong><br />

peça. Esse exercício aguçava o meu critério e melhorava o meu próprio<br />

trabalho.<br />

E aí aconteceu um negócio engraçado. De tanto avaliar pastas, os<br />

candi<strong>da</strong>tos a estágio começaram a me ver como uma pessoa acessível<br />

dentro do mercado <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>. Um foi indicando outro,<br />

que foi indicando um terceiro, que falou para outro amigo. E quando<br />

eu vi, essa rotina de ver portfolios virou uma ver<strong>da</strong>deira rotina<br />

para mim.<br />

Mesmo saindo de agência (desde 2008 estou fulltime na Perestroika),<br />

ain<strong>da</strong> mantenho com alguns jovens publicitários – alguns nos nossos<br />

cursos, alguns pela amizade, alguns ain<strong>da</strong> do período de agência. E é<br />

interessante perceber que as dúvi<strong>da</strong>s e os dilemas prossionais continuam<br />

existindo – e continuam seguindo um certo padrão.<br />

Esse foi o grande motivo de escrever esse material. A ideia é reunir<br />

aqui as principais dúvi<strong>da</strong>s dos novatos <strong>da</strong> profissão que me procuraram<br />

nos últimos anos. Sejam dúvi<strong>da</strong>s sobre o mercado, sejam escolhas<br />

profissionais, sejam conselhos do ponto de vista técnico.<br />

Tudo o que está aqui, neste livro, saiu <strong>da</strong> minha cabeça. Mas muita<br />

coisa que está na minha cabeça veio de outras fontes. Por isso, na<strong>da</strong><br />

mais justo do que listar todo mundo que faz parte <strong>da</strong> ficha técnica.<br />

Certamente, a grande inspiração para começar a organizar esses conselhos<br />

foi o Manual do Estagiário, do Eugenio Mohallem. Um clássico<br />

<strong>da</strong> categoria. Mas além dele, também absorvi várias dicas do Criação<br />

Sem Pistolão, do Carlos Domingos. E muita coisa dos três livros do<br />

Paul Arden: It’s not how good you are, It’s how good you want to be /<br />

Whatever you think, think the opposite / God explained in a taxi cab.<br />

Os cinco são leituras praticamente obrigatórias para quem está começando.<br />

Também extraí bastante coisa <strong>da</strong>s conversas que tenho feito por força<br />

<strong>da</strong> Perestroika. Para citar apenas alguns nomes que dividiram seu a<br />

perspectiva de vanguar<strong>da</strong> do Roberto Martini (Cubo.cc), a visão de<br />

Riqueza Social do Lucas Mello (Livead), o olhar multidisciplinar do<br />

Eduardo Camargo (Mutato), as referências incansáveis do Carlos Merigo<br />

(Brainstorm9), a visão inovadora de clientes como Google (Félix<br />

Ximenes), Coca-cola (Gian Martinez) e Red Bull (Cássio Côrtes). As visões<br />

sobre criativi<strong>da</strong>de e inovação de gente como Fred Gelli, Ronaldo<br />

Fraga, Claude Troigos, Gringo Cardia, Emici<strong>da</strong>, Sebastián Borensztein,<br />

Lobão, Jum Nakao, Oskar Metsavaht, Federico Pistono, Lala Deheinzelin,<br />

MV Bill. Enfim, muita gente legal.<br />

Também respingam aqui as entrevistas que fiz num passado remoto<br />

(2007, 2008 e 2009), quando ain<strong>da</strong> era professor do curso de publici<strong>da</strong>de.<br />

Naquele momento, elas foram importantes para trazer os pontos<br />

de vista de profissionais relevantes do mercado offline. O próprio<br />

Eugenio Mohallem (na época, Diretor <strong>da</strong> Mohallem/Artplan), Ícaro Dória<br />

(na época, Diretor de Criação <strong>da</strong> Saa- tchi&Saatchi / Nova York),<br />

Marco Loco Bezerra (na época, Diretor de Criação <strong>da</strong> TBWA Berlim),<br />

Beto Baibich (na época, Diretor de arte na Crispin, Porter + Bogusky),<br />

Fernando Perottoni (na época, Diretor de arte <strong>da</strong> TBWA/Londres), Emiliano<br />

Trierveiller (na época, Diretor de Criação <strong>da</strong> TBWA/ Berlim), entre<br />

outros.<br />

Mas veja bem: não quero comprometer nenhum desses profissionais.<br />

Depois de ouvi-los, tirei minhas próprias conclusões. Nunca vou usar<br />

7


aspas, e raramente vou citá-los. Sem falar que todos poder ter mu<strong>da</strong>do<br />

de opinião nesse meio tempo. O que está escrito aqui é resultado<br />

do meu filtro.<br />

Falando em filtro: talvez este seja o grande valor deste material. A<br />

possibili<strong>da</strong>de de reunir to<strong>da</strong>s essas dicas em apenas um documento,<br />

de forma (mais ou menos) organiza<strong>da</strong>.<br />

Outra coisa boa é que ele foi a<strong>da</strong>ptado às mu<strong>da</strong>nças que a nossa<br />

propagan<strong>da</strong> sofreu nos últimos anos. (O Manual do Estagiário, por<br />

exemplo, foi escrito em 1997. De lá para cá, muita coisa mudou.<br />

Além disso, ele sempre esteve muito focado em São Paulo. Determina<strong>da</strong>s<br />

situações simplesmente não fazem sentido no dia-a-dia de<br />

outros mercados.) Apesar disso, a veloci<strong>da</strong>de de comunicação é tão<br />

rápi<strong>da</strong> que este manual, mesmo reeditado e revisado, corre o sério<br />

risco de estar com algumas informações defasa<strong>da</strong>s.<br />

Importante: não se esqueça de considerar a seguinte equação. Por<br />

um lado, estou fora do mercado, e realmente não estou vivendo o<br />

dia-a-dia <strong>da</strong>s empresas de comunicação. Por outro, convivemos nos<br />

nossos cursos com gente que está na vanguar<strong>da</strong> <strong>da</strong> comunicação do<br />

Brasil (em alguns casos, do mundo).<br />

Para fechar, enten<strong>da</strong> que a Perestroika é uma empresa um pouco<br />

diferente nesse sentido. Ela faz sua própria comunicação. Somos médico<br />

e monstro <strong>da</strong>s nossas próprias teses.<br />

Portanto, ao ler este manual, já treine uma <strong>da</strong>s principais quali<strong>da</strong>des que<br />

um profissional de comunicação deve ter: leia tudo com muito critério.<br />

Na<strong>da</strong> aqui é definitivo. São apenas opiniões, basea<strong>da</strong>s na minha experiência<br />

pessoal e na forma como alguns profissionais com quem<br />

conversei encaram o negócio <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>.<br />

Isso aqui não é um livro de auto-aju<strong>da</strong>. É um livro somente de<br />

aju<strong>da</strong>. Muitas dessas dicas funcionaram comigo e talvez ain<strong>da</strong><br />

funcionem para outras pessoas.<br />

Espero que seja o seu caso.


P.S.:<br />

Esse livro é uma obra que respeita o conceito Freemium, com distribuição<br />

gratuita através do site <strong>da</strong> Perestroika: www.<strong>perestroika</strong>.com.br<br />

(Caso o livro tenha repercussão positiva, e caso exista interesse por<br />

uma versão impressa, faremos uma leva de poucas uni<strong>da</strong>des – to<strong>da</strong>s<br />

elas cobra<strong>da</strong>s. Entretanto, mesmo que isso aconteça, a versão gratuita<br />

continuará disponível para download no nosso site.)<br />

Se alguém quiser vendê-lo para você, não compre. É picareta na certa.<br />

O que fizemos, para satisfazer aqueles que insistiram muito, foi abrir<br />

uma conta especificamente para receber contribuições espontâneas.<br />

Então, se você achar o livro uma porcaria, não deposite na<strong>da</strong>. Nós já<br />

fizemos você perder o seu tempo.<br />

Se você achar bom, mas estiver com preguiça, não deposite na<strong>da</strong><br />

também. Não queremos que você passe trabalho.<br />

Se você achar muito bom, mas estiver sem grana, a gente entende.<br />

Fica para a próxima.<br />

Agora, se você achar o livro bacana, e quiser contribuir, legal. Deposite<br />

o quanto achar justo. Não existe valor sugerido. Você é quem man<strong>da</strong>.<br />

Entre em contato pelo email tiago@<strong>perestroika</strong>.com.br que a gente<br />

explica como fazer o depósito.<br />

Parte do valor será revertido em outras ações Freemium <strong>da</strong> Perestroika.<br />

11


P.S. 2:<br />

Este livro, como bom filhote <strong>da</strong> internet, é Beta. E sempre será. Estará<br />

em constante atualização e, de tempos em tempos, sofrerá as mu<strong>da</strong>nças<br />

necessárias. To<strong>da</strong>s as novas versões estarão disponíveis para<br />

download gratuitamente nosso site: www.<strong>perestroika</strong>.com.br<br />

Lançar um Work in progress foi uma decisão difícil. Não queria que ele<br />

viesse ao mundo prematuro. Não queria que ele nascesse com cara<br />

de joelho.<br />

Mas também não <strong>da</strong>va para esperar mais. Especialmente depois<br />

que eu me dei conta que esse job estava há exatos nove meses na<br />

minha pauta.<br />

Se você tem sugestões, reclamações, dúvi<strong>da</strong>s, pode escrever para<br />

tiago@<strong>perestroika</strong>.com.br. Vou adorar ouvir o que você achou. E vou<br />

considerar tudo o que você disser para a próxima versão.<br />

Por fim, é legal saber que, por ser de graça, decidimos não contratar<br />

um revisor oficial. Estamos contando com a sua boa vontade: se você<br />

encontrar qualquer errinho, nos perdoe. E nos avise.<br />

13


P.S. 3:<br />

A ilustração <strong>da</strong> capa e todo projeto gráfico <strong>da</strong> edição 2.0 é de Vinícius<br />

Souza. Um trabalho incrível em “tempo recorde”. Muito obrigado.<br />

Se você também gostou, entre em contato com ele e agradeça a dedicação:<br />

facebook/vinicius.nrs. O cara merece.<br />

15


Índice<br />

Capítulo 1<br />

Manual Express • 18<br />

Capítulo 2<br />

Montando o portfólio • 40<br />

Capítulo 3<br />

Dentro <strong>da</strong> agência • 74<br />

Capítulo 4<br />

Trocando de emprego • 96<br />

Capítulo 5<br />

Primeiros dilemas profissionais • 110<br />

Capítulo 6<br />

Melhorando seu trabalho • 138<br />

Capítulo 7<br />

O novo criador • 156<br />

Capítulo 8<br />

O que aconteceu comigo • 170<br />

Capítulo 9<br />

As novas <strong>mortas</strong> • 224<br />

Capítulo 10<br />

Posts • 212


capÍtulo 1


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

Se você está sem saco de ler todo esse livro, pelo menos preste<br />

atenção nesses toques.<br />

São pílulas. E pílulas do dia seguinte: você lê e, amanhã mesmo,<br />

pode colocar em prática.<br />

Bem vindo ao nosso drive thru de conselhos profissionais.<br />

21


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

Vai lá e faz.<br />

To<strong>da</strong>s as pessoas do mundo têm boas ideias. Inclusive você. A grande<br />

diferença é que algumas conseguem executá-las. Portanto, não<br />

deixe seus planos mofando. Ideia na gaveta é a mesma coisa que<br />

ideia inexistente.<br />

a Vi<strong>da</strong> é a melhor<br />

referência.<br />

Você só consegue criar coisas legais se você for um cara legal. Isso<br />

significa viver situações inusita<strong>da</strong>s. Sair <strong>da</strong> zona de conforto. Sair do<br />

lugar comum. Lembre-se: o seu trabalho está intimamente ligado às<br />

experiências que você passou. Se você for uma pessoa com vivências<br />

únicas, o seu trabalho será único. E aí, ninguém vai conseguir copiá-lo.<br />

23


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

a quanti<strong>da</strong>de<br />

faz a quali<strong>da</strong>de.<br />

Você conhece a teoria <strong>da</strong> toalha molha<strong>da</strong>? Ela é bem simples: você<br />

pega uma toalha molha<strong>da</strong> e torce até sair to<strong>da</strong> água. Daí, você torce<br />

de novo, e vai ver que sai mais um pouco de água. E se você torcer<br />

uma terceira vez, vai sair mais um pouquinho. E mais um pouquinho.<br />

E mais um pouquinho. Insistir faz parte. As primeiras soluções são as<br />

mais fáceis, mas as mais óbvias. Não surpreendem e, pior: provavelmente<br />

alguém já teve antes de você.<br />

“mais ou menos” é menos.<br />

Se quando você acha que o seu trabalho está bom, muitas vezes ele<br />

é reprovado, imagine quando você acha que ele está médio. Não se<br />

acostume com a mediocri<strong>da</strong>de. Estresse a sua criação até chegar no<br />

seu limite.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

trabalhar com criação<br />

é diVertido, mas é trabalho.<br />

e trabalho às Vezes<br />

é um saco.<br />

Quando você vai no cinema, paga o ingresso. Quando você viaja, paga<br />

o avião. Quando você trabalha em propagan<strong>da</strong>, eles é que pagam<br />

você. E não pense que é porque você é um cara legal. Não: trabalho<br />

é trabalho. Por mais apaixonado que você seja por publici<strong>da</strong>de, há<br />

momentos em que até um monge budista perde a paciência.<br />

o melhor jeito de ser<br />

puxa-saco é com um<br />

bom trabalho<br />

Quem decide segurar o seu emprego apenas com bajulações normalmente<br />

se dá mal. Nem a Monica Lewinsky, que era uma estagiária<br />

extremamente dedica<strong>da</strong> ao patrão, conseguiu se manter no cargo.<br />

27


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

na maioria <strong>da</strong>s Vezes,<br />

a montanha não Vem<br />

a maomé.<br />

Por mais desistimulante que isso seja para alguém que está iniciando,<br />

é importante dizer: chegar lá vai <strong>da</strong>r trabalho.<br />

Você aprende sozinho.<br />

Para sobreviver numa empresa de comunicação é preciso ter um pouquinho<br />

de Chuck Norris no DNA. Ninguém tem tempo de pegar você<br />

pela mão e ensiná-lo a fazer as coisas. Seja observador, veja como os<br />

outros fazem, descubra o que eles gostam. E vá à luta.<br />

29


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

não encha o saco.<br />

Você tem todo direito de fazer quantas perguntas quiser. Mas por favor:<br />

existe uma linha tênue que separa o cara curioso do mala sem<br />

alça. Todo mundo adora um estagiário interessado. E todo mundo<br />

abomina um estagiário chato.<br />

quem se apega demais às<br />

ideias é porque tem poucas.<br />

Se você teve uma ideia bacana, e acredita nela, defen<strong>da</strong> até um certo<br />

limite. Se não aprovarem, parta para outra.<br />

31


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

apren<strong>da</strong> a li<strong>da</strong>r com<br />

a frustração:<br />

ela é a maioria<br />

do nosso trabalho.<br />

Você já se deu conta que praticamente tudo o que criamos vai para o<br />

lixo? No final <strong>da</strong>s contas, se tudo der certo, por mais que você tenha<br />

muitas ideias legais para um job, só uma vai sobreviver e veicular.<br />

ideias para publicitários<br />

só atingem um público:<br />

os publicitários.<br />

Faz cinco anos que saí <strong>da</strong> publici<strong>da</strong>de e, todos os anos, pós-Festival<br />

de Cannes, é sempre a mesma discussão. “Temos que parar de fazer<br />

fantasmas”. A questão é: só os publicitários podem mu<strong>da</strong>r isso. É<br />

uma decisão particular de ca<strong>da</strong> um. Recomendo que você não entre<br />

nessa. Nem experimente, fantasma porque é como crack: parece inofensivo,<br />

mas vicia de primeira. Sempre prefira investir sua energia em<br />

campanhas que caem no gosto do grande público, que viram parte <strong>da</strong><br />

cultura popular, que entram para a história <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>. Elas são<br />

muito diferentes <strong>da</strong>quelas ideias assépticas, comuns em festivais.<br />

33


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

é melhor ser co-autor de<br />

algo brilhante a ser autor<br />

solitário de algo comum.<br />

Acho que a frase diz tudo.<br />

a maioria dos gênios <strong>da</strong><br />

propagan<strong>da</strong> acor<strong>da</strong> cedo<br />

e dorme tarde.<br />

Os melhores profissionais que eu conheci na publici<strong>da</strong>de eram pessoas<br />

bastante dedica<strong>da</strong>s. A fantasia do gênio que senta na cadeira e<br />

tem uma ideia brilhante, assim, num lampejo, só existe na cabeça de<br />

dois tipos de profissionais. Os iniciantes, ain<strong>da</strong> muito ingênuos e deslumbrados.<br />

E a galera old school, que confunde propagan<strong>da</strong> com arte.<br />

35


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

propagan<strong>da</strong> é a sua<br />

carreira, não a sua Vi<strong>da</strong>.<br />

É normal que um criador de publici<strong>da</strong>de goste de criar publici<strong>da</strong>de.<br />

Mas é bem possível que ele se divirta mais fazendo outras coisas,<br />

como ver futebol na TV, comer churrasco com os amigos ou viajar ao<br />

redor do mundo. Acredite: isso é completamente sadio.<br />

uma ideia só é original<br />

até outra pessoal pensar<br />

a mesma coisa – e fazer<br />

antes de Você.<br />

Hoje em dia, um criador em Nova York e um na Sibéria têm acesso às<br />

mesmas referências. Então, não fique procrastinando. Ou você corre o<br />

sério risco de ver a sua lin<strong>da</strong> ideia estampa<strong>da</strong> na marca concorrente.<br />

37


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 1 – MANUAL EXPRESS<br />

câncer é um problema<br />

graVe. propagan<strong>da</strong> é só<br />

propagan<strong>da</strong>.<br />

Sempre que você se deparar com uma situação em que parece que o<br />

fim do mundo está próximo, lembre-se: isso é só propagan<strong>da</strong>.<br />

Ninguém vai morrer.<br />

39


capÍtulo 2


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

o que é um portfólio?<br />

O mercado está cheio de bons profissionais, com trabalhos fantásticos<br />

e campanhas memoráveis. Mas também está cheio de enroladores,<br />

que só têm pose e nunca fizeram na<strong>da</strong> de relevante.<br />

Na hora de contratar alguém, como saber se o candi<strong>da</strong>to faz parte do<br />

primeiro ou do segundo grupo?<br />

Para acabar com essa dúvi<strong>da</strong>, inventaram um negócio chamado portfólio.<br />

O nome é chique. Mas não passa de um compilado, que reúne todo<br />

o seu histórico de trabalhos.<br />

O objetivo do portfólio é desmascararar os metidos e provar que o seu<br />

passado justifica uma contratação.<br />

o portfólio analógico<br />

já era.<br />

No meu tempo, o portfólio era uma pasta, com os anúncios impressos<br />

em papel fotográfico. Hoje, a grande maioria dos profissionais avalia<br />

as peças em formato digital. Porque, convenhamos: é mais fácil para<br />

ambos os lados.<br />

Diria mais: se a pessoa que está contratando você exige um portfólio<br />

físico, preste atenção. Isso já indica alguma coisa.<br />

Como será apresentado? Bom, aí é com você. Pode ser um portfólio<br />

on-line. Constantemente atualizado. Mas é bom ter também JPGs <strong>da</strong>s<br />

suas peças. Nem muito pesados, para não atolar a caixa do cara. Nem<br />

muito leves, para a resolução não ficar baixa demais.<br />

O ideal é ter três tipos de arquivos. Bem pesado, com a máxima resolução,<br />

preservando os detalhes <strong>da</strong>s suas imagens. Um Tamanho intermediário,<br />

que preserve a quali<strong>da</strong>de, mas não atole o email de ninguém.<br />

E bem levinho, em caso de emergências.<br />

Não existe um padrão para o portfólio on-line. Acredito que o jeito<br />

mais fácil seja fazer um blog, Flickr, Tumblr. Ou se registrar num site<br />

como Behance ou Carbonmade, as centrais de portfólios mais populares<br />

<strong>da</strong> internet.<br />

E só para não deixar passar: na edição anterior, eu disse que a pasta<br />

impressa era importante. “Talvez, <strong>da</strong>qui uns anos, ela caia em desuso.<br />

Mas hoje ain<strong>da</strong> vale ter uma.” Pois nesse meio tempo, acho que ela<br />

morreu e está enterra<strong>da</strong> a sete palmos.<br />

43


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

portfólio sempre<br />

atualizado.<br />

Nunca me ligaram e disseram: Ouvi falar bem do seu trabalho. Que tal<br />

falarmos <strong>da</strong>qui um mês?<br />

Em agência de propagan<strong>da</strong>, na<strong>da</strong> tem prazo. Nem entrevista. Quando<br />

estão procurando gente, é sempre para ontem.<br />

Montar um portfólio na correria é uma dupla insani<strong>da</strong>de. Primeiro, porque<br />

é bastante estressante correr atrás dos arquivos com pouco prazo.<br />

Segundo, porque é um suicídio profissional. Já pensou, perder aquela<br />

vaga preciosa porque você deixou o portfólio defasado?<br />

Sempre tenha a pasta impecável. Tem gente que faz atualizações<br />

mensais. Tem gente que faz atualizações semanais. Nesse sentido,<br />

eu sempre fui bem CDF: fazia atualizações instantâneas. Se saía um<br />

anúncio legal, já separava o arquivo para mim.<br />

Para não ficar empurrando com a barriga, o jeito mais fácil é já deixar<br />

no seu desktop um folder Portfólio. Fez coisa bacana? Arrasta para lá.<br />

Se você for re<strong>da</strong>tor, encha o saco do seu dupla. É fun<strong>da</strong>mental estar<br />

com as peças ao seu alcance.<br />

como selecionar<br />

as peças <strong>da</strong> sua pasta.<br />

A regra básica é: o que joga a sua pasta para baixo, sai. O que joga a<br />

sua pasta para cima, fica.<br />

O problema é que, se você mostrar a sua pasta para dez criadores<br />

diferentes, ca<strong>da</strong> um vai dizer uma coisa. A única pista que você vai<br />

ter é sobre o que é muito ruim e o que é muito bom. Nisso, os caras<br />

experientes costumam concor<strong>da</strong>r.<br />

Em geral, os critérios são muito subjetivos. Por isso, não existe certo<br />

e errado. Existe o certo e errado para ca<strong>da</strong> situação.<br />

Não adianta chegar com um monte de ideias bundonas numa agência<br />

que faz só faz anúncios fora <strong>da</strong> casinha. E vice-versa.<br />

Você tem que se adequar ao seu público-alvo. Até na hora <strong>da</strong> entrevista.<br />

45


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

na matemática <strong>da</strong> pasta,<br />

1 + 1 = 1.<br />

Antes de sair <strong>da</strong> minha última agência, vivi uma situação inusita<strong>da</strong>. Um<br />

candi<strong>da</strong>to a estágio me ligou pedindo para mostrar a sua pasta, que<br />

tinha três anúncios. Sugeri que ele me procurasse novamente quando<br />

tivesse, no mínimo, dez peças.<br />

No dia seguinte ele me ligou. Fiquei um pouco intrigado. Mas marquei<br />

a entrevista mesmo assim.<br />

Como combinado, ele chegou com as dez peças. Mas elas faziam<br />

parte <strong>da</strong> mesma campanha. Dez anúncios, todos bem parecidos, com<br />

pequenas alterações de cor entre um e outro.<br />

Não sabia nem por onde começar.<br />

Esse episódio me ajudou a criar a Matemática <strong>da</strong> Pasta. Ela é simples<br />

e evita que você pague esse tipo de mico.<br />

Ca<strong>da</strong> peça vale um. Um anúncio, um outdoor, uma embalagem, um<br />

logo, um jingle, uma ação. Tudo isso vale um.<br />

Até aí, fácil.<br />

Se você tem uma campanha com três anúncios, e ca<strong>da</strong> um deles tem<br />

uma ideia diferente, contam três peças. Agora, se você tem uma campanha<br />

com três anúncios, e os três anúncios são razoavelmente parecidos,<br />

conta apenas um.<br />

Para complicar ain<strong>da</strong> mais: se essa campanha de três anúncios diferentes<br />

tiver um desdobramento (por exemplo, um outdoor), ele conta<br />

como uma nova peça. A não ser que ele seja apenas uma reprodução<br />

de um dos anúncios. Aí não vale na<strong>da</strong>.<br />

Só por favor: não leve ao pé <strong>da</strong> letra. A Matemática <strong>da</strong> Pasta é bem flexível<br />

e pode sofrer a<strong>da</strong>ptações caso a caso. O objetivo principal é ser um<br />

guia para não deixar o seu portfólio nem muito curto, nem longo demais.<br />

47


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

ordem.<br />

O Manual do Estagiário consagrou uma maneira de montar as pastas<br />

que funciona muito bem. Você pega as suas dez peças e coloca em<br />

ordem. Começando pela pior até a melhor.<br />

10 (a pior), 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1 (a melhor).<br />

Aí, você joga a melhor lá para o início:<br />

1 (a melhor), 10 (a pior), 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2 (a segun<strong>da</strong> melhor).<br />

Assim, você começa <strong>da</strong>ndo um chute no saco. E termina a pasta sem<br />

fazer feio, deixando uma boa impressão.<br />

Eu sou um defensor desse sistema. Mas para falar a ver<strong>da</strong>de, nunca<br />

segui esse método fielmente. Sempre usei como ponto de parti<strong>da</strong>.<br />

Depois, mu<strong>da</strong>va a partir de outras variáveis que considero igualmente<br />

importantes.<br />

Nunca contei esse meu método para ninguém. Me sentia meio herege<br />

de contrariar as dicas do Mohallem. Só fiquei mais tranquilo no<br />

dia em que tive a oportuni<strong>da</strong>de de entrevistar o próprio Eugenio. Ele<br />

comentou que ficava chocado ao ver algumas pessoas seguindo a<br />

ordem cegamente.<br />

Aí eu relaxei.<br />

Então, aí vai a minha sugestão: faça o 1, 10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2.<br />

Em segui<strong>da</strong>, avalie a relação de títulos vs. ideias visuais. Você não<br />

pode ter os cinco primeiros anúncios de um grupo e os cinco últimos<br />

de outro. Fica muito previsível. Seu objetivo é justamente surpreender<br />

quem está vendo a pasta, não é?<br />

O mesmo vale para design gráfico vs. design 3D ou propagan<strong>da</strong> offline<br />

vs. on-line. Monte de um jeito que fique interessante.<br />

Outra coisa importante é a relação de clientes. Se você tem no seu<br />

portfólio um total de nove campanhas, sendo três para ca<strong>da</strong> cliente,<br />

não deixe elas juntinhas.<br />

Cliente 1, Cliente 1, Cliente 1, Cliente 2, Cliente 2, Cliente 2, Cliente 3,<br />

Cliente 3, Cliente 3.<br />

Misture. Não pode parecer uma pasta com três blocos. Deve parecer<br />

uma pasta com nove campanhas.<br />

Cliente 1, Cliente 2, Cliente 3, Cliente 2, Cliente 1, Cliente 2, Cliente 3,<br />

Cliente 3, Cliente 1.<br />

E por último: cuide <strong>da</strong>s cores <strong>da</strong>s suas peças. Umas são mais avermelha<strong>da</strong>s.<br />

Outras têm fundo branco. Outras são escuras. Não deixe ela<br />

monótona. Crie estímulos visuais para quem estiver vendo.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

re<strong>da</strong>tor Vs. diretor de<br />

arte, offline Vs. online.<br />

Por mais que muitas agências já tenham migrado para um modelo híbrido,<br />

em que não há mais divisão de papeis, a ver<strong>da</strong>de é que a grande maioria<br />

do mercado ain<strong>da</strong> funciona de forma segmenta<strong>da</strong>.<br />

Re<strong>da</strong>tor é re<strong>da</strong>tor, DA é DA. Existe um departamento para off e um<br />

para on.<br />

Na teoria, sabemos que não deveria ser assim. Mas, ver<strong>da</strong>de seja dita:<br />

é bem complicado fazer essa migração.<br />

Enquanto ela não acontece, algumas sugestão para você.<br />

pequeno cui<strong>da</strong>do para se<br />

ter com os exercÍcios de<br />

fora <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>.<br />

Se o portfólio publicitário não estiver agra<strong>da</strong>ndo, não ultrapasse o limite<br />

do bom senso. Os exercícios fora <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> devem ser o tiro<br />

de misericórdia, não um tiro no próprio pé.<br />

Vamos supor que a sua pasta seja fraca. Alguém teve paciência para<br />

criticar vários títulos, textos e conceitos. Ficou lá, explicando por A+B<br />

porque você deveria refazer seus anúncios.<br />

Aí, no final <strong>da</strong> entrevista, você insiste para que ele leia algumas crônicas<br />

que você imprimiu do seu blog. Parece um pouco Joselito, não?<br />

Além disso, saiba que se o portfólio em si não estiver lá essas coisas,<br />

dificilmente uma parede que você grafitou ou uma letra <strong>da</strong> sua ban<strong>da</strong><br />

vai salvar a sua pasta. (Minha sincera opinião? Isso deveria contar<br />

mais do que os próprios anúncios. Mas não é o que o mercado costuma<br />

achar.)<br />

Os exercícios fora <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> costumam ser a cerejinha. Por isso,<br />

capriche no bolo.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

modernices.<br />

O perfil do portfólio mu<strong>da</strong> na mesma veloci<strong>da</strong>de que a propagan<strong>da</strong>.<br />

Então, ter ideias mais contemporâneas podem chamar a atenção. Algumas<br />

possibili<strong>da</strong>des:<br />

1. Um vídeo “viral” (muito cui<strong>da</strong>do com esse termo)<br />

2. Um prédio como solução de ambient media<br />

3. Estratégias de relacionamento on-line<br />

4. Um aplicativo para Iphone<br />

5. Um jogo de videogame<br />

Só não esqueça que esse tipo de solução criativa está em fase experimental<br />

nas maioria <strong>da</strong>s agências. Não é o job do dia-a-dia. Portanto,<br />

serve mais para mostrar o seu potencial criativo do que para demonstrar<br />

uma expertise que será aplica<strong>da</strong> na agência.<br />

Pelo menos, que será aplica<strong>da</strong> por você, que, no início, pegará só craca.<br />

por melhor que seja<br />

o seu currÍculo, ele só<br />

Vai atrapalhar Você.<br />

Durante a entrevista, vão perguntar se você está estu<strong>da</strong>ndo, onde você<br />

trabalhou, que programas domina, e tudo mais que julgarem necessário.<br />

Em outras palavras: não existe muita necessi<strong>da</strong>de de um currículo impresso.<br />

Para falar a ver<strong>da</strong>de, até pega mal. É até uma pia<strong>da</strong> entre os criadores:<br />

Veio um estagiário só com currículo querendo emprego, pode?<br />

Gaste tempo na sua pasta que vale mais a pena.<br />

Só não esqueça de deixar o seu contato. Pode ser um cartão de visitas<br />

ou seu nome e e-mail/celular na capa.<br />

Perder a vaga com um portfólio ruim, vá lá. Agora, perder a vaga por<br />

sumiço, aí já é demais.<br />

Se você quer que dê namoro, tem que deixar pelo menos o telefone, né?<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

o melhor jeito de fazer<br />

uma pasta é trabalhando<br />

numa agência. mas para<br />

entrar numa agência,<br />

Você precisa de uma<br />

pasta. e aÍ?<br />

Aí você senta na frente do computador, pensa num briefing que ren<strong>da</strong><br />

uma boa campanha e começa a trabalhar.<br />

Mas eu nunca trabalhei, como vou saber o que é um bom briefing?<br />

Ora, um bom briefing é aquele que você gostaria de ter em mãos. Normalmente,<br />

são assuntos nos quais você já se interessa. Quem gosta<br />

de futebol provavelmente vai curtir criar para a Nike. Quem é viciado<br />

em videogame vai adorar pensar em ideias para Playstation.<br />

Só não perca muito tempo nessa parte do processo. Pensar num<br />

briefing é infinitamente mais fácil do que pensar num anúncio para<br />

esse briefing.<br />

Outra boa maneira de iniciar a pasta é acionar o seu Banco de ideias.<br />

Todo criador tem um arquivo de Word chamado Banco_de_ideias.doc.<br />

Alguns preferem um caderninho de anotações (especialmente os diretores<br />

de arte) porque dá para rabiscar.<br />

Se você ain<strong>da</strong> não tem nenhum dos dois, comece hoje mesmo.<br />

Agora, se na<strong>da</strong> disso fez você se mexer, ain<strong>da</strong> existe uma última esperança.<br />

O Criação Sem Pistolão sugere o Método <strong>da</strong> Revista Veja. Você<br />

abre a revista em qualquer página que tenha pelo menos um anúncio.<br />

Aí, você identifica o briefing e tenta criar uma ideia melhor para o mesmo<br />

problema do anúncio.<br />

É difícil. Mas se você conseguir fazer anúncios melhores que os <strong>da</strong><br />

Veja, eu tenho certeza que você consegue uma vaga.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

seja o seu próprio<br />

atendimento.<br />

É legal você se colocar um prazo. Ou vai ficar empurrando com a<br />

barriga eternamente. O anúncio de amanhã sempre pode ficar para<br />

depois de amanhã.<br />

Então, caso você esteja com tempo livre, sugiro que você coloque a<br />

seguinte meta: produzir uma pasta com dez peças em um mês.<br />

É bem razoável. Você terá 2,5 dias para criar e executar ca<strong>da</strong> anúncio.<br />

O que, numa agência de ver<strong>da</strong>de, é um luxo. E ain<strong>da</strong> terá todos os<br />

finais de semana livres para não pensar em propagan<strong>da</strong>.<br />

Se você já tem uma pasta, mas quer trocar algumas peças que foram<br />

critica<strong>da</strong>s, dá para manter a média de 2,5 dias por peça.<br />

Eu mesmo já utilizei esse sistema. E como garoto-propagan<strong>da</strong> <strong>da</strong> minha<br />

própria ideia, afirmo com um sorriso no rosto: funciona!<br />

a hora <strong>da</strong> Ver<strong>da</strong>de:<br />

quando a pasta está boa<br />

para fazer uma entreVista?<br />

Assim como o surfista, que morre em busca <strong>da</strong> on<strong>da</strong> perfeita, você vai<br />

morrer e não vai ter o portfólio ideal.<br />

A moral <strong>da</strong> pasta é justamente essa: estar sempre melhorando o seu<br />

conjunto de peças. Então, não adianta ficar pe<strong>da</strong>lando a entrevista.<br />

Uma hora você tem que cair no mar.<br />

Para ser um pouco mais prático: pense num mínimo de dez peças.<br />

Menos que isso é per<strong>da</strong> de tempo. Para você, que terá pouca coisa<br />

para ser avalia<strong>da</strong>. E para quem entrevista, que vai criar um buraco na<br />

agen<strong>da</strong> para analisar o seu trabalho.<br />

Acima de vinte peças também não precisa. Sinal de que você filtrou<br />

mal. Corre o sério risco de aborrecer o cara. E aborrecer também esposa<br />

do cara, que odeia jantar sozinha.<br />

Entre quinze e dezoito peças está na medi<strong>da</strong>.<br />

Outra coisa importante: assim que você tiver um portfólio, não enrole.<br />

Marque logo as entrevistas, mesmo que dê um medo. Imagine que o<br />

objetivo <strong>da</strong> conversa não é ser contratado. É ouvir críticas e melhorar<br />

a sua pasta. Para, numa próxima vez, aí sim disputar a vaga.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

não precisa existir<br />

Vaga para marcar uma<br />

entreVista.<br />

Você está em casa e de repente toca o telefone. Fiquei sabendo que<br />

você gostaria de estagiar aqui na nossa agência. Estamos com uma<br />

vaga. Quer vir mostrar a pasta?<br />

Parece bizarro, mas é assim que alguns estu<strong>da</strong>ntes agem. Ficam esperando<br />

a oportuni<strong>da</strong>de, em vez de criá-la.<br />

O jeito mais fácil de conseguir uma entrevista é usando os seus contatos.<br />

Se você tem algum conhecido que trabalha em agência, peça<br />

para ele ver o seu trabalho. Dificilmente vão recusar.<br />

Se esse seu amigo for muito novato, peça para ele agilizar com outra<br />

pessoa mais experiente. Quase sempre dá certo. Ou simplesmente<br />

pegue o telefone e ligue para as agências. Pergunte se tem vaga para<br />

estágio. Se não houver, pergunte se alguém <strong>da</strong> Criação pode ver a<br />

sua pasta.<br />

O pior que pode acontecer é dizerem não. E você ficar na mesma.<br />

Não caia no truque do Fale conosco. Você provavelmente será ignorado.<br />

Por sinal, e-mail é uma ótima ferramenta para ignorar candi<strong>da</strong>tos<br />

a estágio. Ligar sempre é mais garantido.<br />

lugares legais para<br />

trabalhar. lugares ruins<br />

para trabalhar.<br />

To<strong>da</strong> empresa tem a cara do dono. E como ca<strong>da</strong> dono pensa de um<br />

jeito, as personali<strong>da</strong>des <strong>da</strong>s empresas também são muito diferentes.<br />

Não é difícil descobrir o estilo de ca<strong>da</strong> agência. Umas trabalham mais,<br />

outras trabalham menos. Umas pagam melhor, outras pagam pior.<br />

Umas têm mais benefícios, outras têm menos. Umas fazem mais festas,<br />

outras menos.<br />

É importante lembrar, também, que não é só o dono que faz o perfil <strong>da</strong><br />

empresa. Existem fatores externos e internos que influenciam. Como<br />

um novo Diretor de Criação ou uma mu<strong>da</strong>nça no cenário econômico.<br />

Pense na crise que tivemos há alguns anos (aquela que o Lula chamou<br />

de “marolinha”). Algumas empresas mais soltinhas ficaram assusta<strong>da</strong>s<br />

puxaram o freio de mão. E vice-versa.<br />

No meu tempo de estagiário, a F/Nazca era a agência com as ideias<br />

mais ousa<strong>da</strong>s. A DM9 era a agência mais sintoniza<strong>da</strong> com o novo<br />

padrão internacional. A Almap tinha a direção de arte e os títulos<br />

mais inteligentes.<br />

Evidente que, de lá para cá, houve mu<strong>da</strong>nças. Analise o que as agências<br />

estão fazendo, se informe com profissionais experientes. Vai ficar<br />

mais fácil para você entender a personali<strong>da</strong>de atual dessas agências.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

entretanto.<br />

Não existe empresa perfeita. E como a grama do vizinho é sempre<br />

mais verde, você costuma perceber apenas os defeitos do lugar onde<br />

você trabalha. E não valorizar o que ele tem de legal.<br />

Olhe a metade cheia do copo.<br />

por fim.<br />

Vem o mais importante: você quer trabalhar nesse lugar?<br />

Sim, porque se convi<strong>da</strong>rem você, mas você não estiver a fim, ou achar<br />

que o lugar não contribui para o seu crescimento, não vá.<br />

Não conheço nenhum departamento de RH que pren<strong>da</strong> as pessoas<br />

na agência. (Apesar de imaginar que muitos adorariam.) Você é livre<br />

para ir e vir.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

pasta para quem quer ser<br />

um criatiVo. mas não no<br />

departamento de criação.<br />

Muita gente me procura porque quer trabalhar com criação, mas não<br />

<strong>da</strong> forma tradicional. Uns se identificam mais com a área de Planejamento.<br />

Outros querem ter boas ideias para cliente, dentro do marketing<br />

<strong>da</strong> empresa.<br />

Fico bem feliz em ver estu<strong>da</strong>ntes pensando assim. Acredito até que<br />

a filosofia <strong>da</strong> Perestroika (Você sempre pode ser criativo, em qualquer<br />

área, em qualquer profissão) tenha uma importante participação<br />

nesse processo.<br />

Não conheço nenhum modelo de portfólio para Planejamento ou<br />

Marketing. Eu, se estivesse concorrendo a uma vaga nessas áreas,<br />

pensaria em projetos criativos. Apenas para mostrar meu potencial.<br />

Vamos pegar Nike como exemplo.<br />

Se eu quisesse trabalhar no Planejamento <strong>da</strong> agência que atende essa<br />

conta, ou no próprio cliente, eu faria o seguinte. Criaria várias ações<br />

envolvendo a marca. Novos produtos, eventos, hotsites, sugestões de<br />

crossmedia, ideias basea<strong>da</strong>s em tendências que ain<strong>da</strong> não se popularizaram.<br />

E por aí vai.<br />

É claro que só boas ideias não bastam. Esses três departamentos exigem<br />

de você outras quali<strong>da</strong>des bem específicas e diferentes <strong>da</strong> Criação.<br />

Mas mostrar que você tem ambições além do Excel também não<br />

atrapalha.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

pasta para quem quer<br />

trabalhar no lado<br />

mais business ou no<br />

operacional.<br />

Existem outras três áreas fun<strong>da</strong>mentais dentro de uma agência, que<br />

também exigem criativi<strong>da</strong>de, mas de uma forma diferente: o Atendimento,<br />

a Produção e a Mídia.<br />

São áreas em que o dia-a-dia exige respostas mais rápi<strong>da</strong>s. Então, a<br />

rotina é comprometi<strong>da</strong> muito pelo lado operacional.<br />

O currículo nessas áreas ain<strong>da</strong> pesa. Mas o que realmente pesa é a<br />

sua capaci<strong>da</strong>de de convencer o entrevistador. E até faz sentido. Se<br />

você não for bom em se vender, como vai negociar com clientes, fornecedores<br />

e veículos?<br />

Acho que aqui, mais do que qualquer outro lugar, vale demonstrar<br />

vontade pela vaga. Não tenha medo de dizer: Eu sei pouco, mas quero<br />

aprender e não arrepio.<br />

pasta para quem quer<br />

trabalhar no lado<br />

mais business ou no<br />

operacional, e já é um<br />

pouquinho mais ro<strong>da</strong>do.<br />

Se você está buscando vaga na Produção, pode montar tranquilamente<br />

um portfólio com seus melhores trabalhos. É legal, de alguma<br />

forma, explicar que interferência a Produção teve no processo de execução.<br />

Esse é o motivo pelo qual estão contratando você.<br />

Já na Mídia e no Atendimento, talvez você consiga reunir alguns cases<br />

onde sua participação foi fun<strong>da</strong>mental.<br />

E quando eu digo fun<strong>da</strong>mental, não é Eu fui lá e aprovei a campanha,<br />

ou Eu que fiz o plano de mídia.<br />

É: Eu percebi uma oportuni<strong>da</strong>de de negócio entre o meu cliente e uma<br />

outra marca. Fizemos uma promoção conjunta e vendemos que nem<br />

água. Ou: Eu sugeri um novo formato de anúncio. Mas ele fez tanto<br />

sucesso que entrou na grade de formatos-padrão do jornal X.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

engula o choro.<br />

Se você quer elogios, não vá mostrar a pasta. Ninguém está lá para<br />

bajular você. As pessoas vão dizer o que pensam, goste você ou não.<br />

A ver<strong>da</strong>de é que as chances de você ser duramente criticado<br />

são altíssimas.<br />

Lembre-se: você não é nem estagiário. É aspirante a estagiário. Na<strong>da</strong><br />

mais normal do que você ter uma pasta com erros de principiante.<br />

ca<strong>da</strong> cabeça, uma sentença.<br />

mas nunca uma sentença<br />

de morte.<br />

Sinto que muitos estagiários vão para a entrevista esperando uma opinião<br />

definitiva. Um oito ou oitenta. Se ele gostar, é porque eu nasci<br />

para a coisa. Se ele não gostar, é sinal de que sou um fracassado.<br />

O cara que vê a sua pasta não é um Imperador Romano, que levanta<br />

ou baixa o polegar e decide a sua vi<strong>da</strong>. Ele está ali apenas para julgar<br />

o trabalho que você quiser mostrar, e que reflete aquele momento específico<br />

<strong>da</strong> sua carreira. Só.<br />

Agora, se o entrevistador tiver um ataque de megalomania e resolver<br />

encerrar a sua carreira ali mesmo (dizendo algo como Troque de profissão,<br />

você não serve para a coisa), agradeça a oportuni<strong>da</strong>de educa<strong>da</strong>mente.<br />

E depois delete a entrevista do seu banco de <strong>da</strong>dos.<br />

Primeiro, porque ninguém tem poder para adivinhar o futuro. Segundo,<br />

porque quem faz isso é muito idiota. E você não tem por que ouvir<br />

conselhos de um idiota.<br />

Não são poucas as histórias folclóricas de profissionais de sucesso<br />

que ouviram esse tipo de conselho (Largue a propagan<strong>da</strong>!). E hoje são<br />

chefes dos idiotas.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

cui<strong>da</strong>do: tem<br />

entreVistador que<br />

só quer se liVrar de Você.<br />

A primeira coisa que eu sempre disse, mesmo antes de abrir a pasta,<br />

é: Vou ser brutalmente honesto. Quer continuar?<br />

Tome cui<strong>da</strong>do com quem vê a sua pasta. É muito mais fácil para o<br />

entrevistador passar os olhos rapidinho, dizer Legal, qualquer coisa eu<br />

mando um e-mail e chegar cedo em casa, do que dizer A sua pasta<br />

está muito ruim, eu sugiro que você mude isso, isso, isso, isso, isso,<br />

isso, isso, isso por causa disso, disso, disso, disso, disso, disso.<br />

Quando se é mais crítico, a entrevista costuma durar no mínimo meia<br />

hora. E o cara vai se incomo<strong>da</strong>r com a patroa, que vai jantar mais uma<br />

vez sozinha.<br />

Eu sempre prefiri o caminho mais difícil: ver a pasta de ver<strong>da</strong>de. Ou<br />

fazia assim ou nem marcava. Comentava peça a peça, entrava nos detalhes<br />

e fazia várias críticas. To<strong>da</strong>s, é claro, pensando em contribuir.<br />

E a janta eu aquecia no microon<strong>da</strong>s.<br />

(Obs: hoje eu não vejo mais portfolios. Não me sinto à vontade por<br />

estar há um tempo fora do mercado. Se essa era a sua ideia, por favor:<br />

não insista. Se ain<strong>da</strong> assim estiver tentado, releia a página 30.)<br />

portfólio Visto.<br />

No início <strong>da</strong> carreira, são pequenas as chances de qualquer entrevista<br />

se transformar em vaga. Aí, é natural ficar aquela impressão de que o<br />

esforço não valeu a pena.<br />

Mas valeu. Na pior <strong>da</strong>s hipóteses, você vai ter ouvido várias dicas<br />

para melhorar a pasta. Vai ter feito contato com pessoas importantes.<br />

Vai ter aguçado o seu critério, entendendo o que os mais experientes<br />

julgam ser bom e ser ruim.<br />

E se for a sua primeira entrevista, vai ter o que eu considero o mais<br />

importante: um choque de reali<strong>da</strong>de. No mundo profissional, não há<br />

lugar para paternalismos.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

tic-tac-tic-tac.<br />

o tempo passa<br />

e ninguém responde.<br />

Particularmente, eu acho legal se você man<strong>da</strong>r um e-mail depois <strong>da</strong><br />

entrevista sinalizando que está a fim <strong>da</strong> vaga. Outros podem achar<br />

meio malice. E não duvido que alguns considerem forçação <strong>da</strong> sua<br />

parte e o eliminem <strong>da</strong> disputa.<br />

Então, use o feeling para saber até onde dá para ir.<br />

O tempo <strong>da</strong> resposta é muito variável. Geralmente a contratação é<br />

rápi<strong>da</strong>. Mas em alguns casos, o processo pode demorar semanas.<br />

Fique sempre atento para saber se a vaga já foi preenchi<strong>da</strong> ou se você<br />

ain<strong>da</strong> está no páreo.<br />

na traaaaaaaaaaaVe.<br />

Se no final <strong>da</strong>s contas você não conseguir na<strong>da</strong>, não faz mal. Ouça com<br />

atenção tudo o que disseram e refaça a sua pasta. Uma nova entrevista<br />

só se justifica se você tiver mais <strong>da</strong> metade do portfólio remodelado.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 2 – Montando o portfólio<br />

tá no filó.<br />

Mais cedo ou mais tarde, você vai conseguir um estágio. Talvez, não<br />

seja a vaga dos seus sonhos. Mas não dá na<strong>da</strong>: o importante é que<br />

você mudou de status. Antes, você era candi<strong>da</strong>to a estagiário. Agora,<br />

você já é um estagiário. E está apto a ler o próximo capítulo.<br />

73


capÍtulo 3


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

round one: fight.<br />

O primeiro dia de um estagiário costuma ser parecido. O pessoal faz<br />

um tour rápido e apresenta você para o resto <strong>da</strong> agência. Depois, os<br />

caras <strong>da</strong> TI dão um jeito no seu computador, para que você tenha email<br />

e apren<strong>da</strong> a salvar na rede.<br />

A partir <strong>da</strong>í, você ganha um tapinha nas costas e um monte de pepinos<br />

para descascar.<br />

dois pontos.<br />

Para se <strong>da</strong>r bem dentro de uma agência, você precisa ser competente<br />

em duas frentes:<br />

1. A questão técnica, do trabalho propriamente dito.<br />

2. As regras de convivência, a etiqueta profissional, o seu comportamento<br />

no dia-a-dia.<br />

Em geral, os profissionais orientam você no que diz respeito ao ponto<br />

um. Mas não dão praticamente nenhuma aju<strong>da</strong> no ponto dois.<br />

Portanto, se você quer uma mãozinha, leia com atenção as próximas<br />

páginas. São dicas que aprendi quando ain<strong>da</strong> era estagiário. Fruto<br />

de muita observação, muito jogo de cintura e algumas cabeça<strong>da</strong>s na<br />

parede.<br />

77


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

malandro não é malandro.<br />

é mané.<br />

Estagiários são jovens. Aproveitam a vi<strong>da</strong> como jovens. Saem, enchem<br />

a cara, dormem duas horas e chegam na agência transpirando<br />

Whisky com Redbull.<br />

Eu entendo perfeitamente isso. E acho justo. O Early 20’s é a melhor<br />

época para fazer to<strong>da</strong>s as coisas irresponsáveis que se espera de<br />

um moleque.<br />

A única coisa que você não pode esquecer é que a sua pauta social<br />

não pode comprometer a sua pauta no trabalho. Administrar isso é<br />

problema seu. Só seu.<br />

Se você bebeu mais do que devia, se dormiu mais do que devia, não<br />

faça o que não deve. Não minta.<br />

O seu chefe já teve a sua i<strong>da</strong>de. Já passou pela mesma situação. E<br />

sabe exatamente o que passa pela cabeça numa hora dessas. Invento<br />

uma desculpa e tento sair limpo? Ou falo a ver<strong>da</strong>de e corro o risco de<br />

me queimar?<br />

Assuma o seu vacilo. Ouça o xixi com o rabo entre as pernas. Sente a<br />

bun<strong>da</strong> na cadeira. E trabalhe, trabalhe muito.<br />

Pior do que o estagiário que chega de ressaca é o estagiário não rende<br />

por causa <strong>da</strong> ressaca.<br />

cui<strong>da</strong>do com o efeito<br />

soneca do celular.<br />

Brasileiro nunca respeita horário. Você marca 9h30, o cara chega 9h45.<br />

Você marca 9h45, o cara chega às 10h. Você marca às 10h, o cara liga<br />

10h15 para dizer que está chegando.<br />

Eu acredito que estagiário tem que chegar na hora. Se a agência começa<br />

a funcionar 9h, acho que todo estagiário deveria estar lá, às 9h,<br />

de prontidão. Por um simples motivo: estagiário é o sol<strong>da</strong>do preparado<br />

para resolver qualquer problema. E problema não tem hora para<br />

aparecer.<br />

Como dizia o Ron Seichrist, Reitor <strong>da</strong> Miami Ad School: If you’re on<br />

time, you’re already late.<br />

79


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

dress code.<br />

Dentro dos ambientes criativos, é comum ver muita gente com o estilo<br />

moderninho. O primeiro conselho que eu dou a você é: não se intimide.<br />

Se você é emo, mauricinho ou surfista, não precisa trocar todo o<br />

guar<strong>da</strong>-roupa só para fazer parte <strong>da</strong> turma.<br />

Agora, não dá para patifar também. Não dá para chegar de Havaianas,<br />

calção do Inter e camiseta de regata fura<strong>da</strong>.<br />

Para não errar, é só fazer o óbvio. Os homens devem usar o clássico<br />

jeans com tênis e uma camiseta arrumadinha. Já as meninas só devem<br />

evitar as roupas minúsculas. Apesar de fazer sucesso nos corredores,<br />

os trajes micro viram assunto também na reunião de diretoria.<br />

missão <strong>da</strong><strong>da</strong><br />

é missão cumpri<strong>da</strong>.<br />

Não tem na<strong>da</strong> mais chato que o estagiário que não resolve problemas.<br />

Aquele cara que conjuga todos os verbos no gerúndio.<br />

— Já montou as peças que eu pedi há duas horas?<br />

— Estou só resolvendo uma coisa aqui e já vou pegar.<br />

— Você corrigiu aquele título que pediram para trocar?<br />

— Estou só vendo uma coisa e já faço.<br />

Se derem uma tarefa para você fazer, ou você diz alguma coisa na<br />

hora, ou a batata quente acabou de passar para a sua mão. É melhor<br />

não ficar cozinhando em banho-maria. Resolva rápido o que passarem,<br />

ou a chapa esquenta para o seu lado.<br />

Então, se você está cheio de trabalho, e não vai <strong>da</strong>r conta do recado,<br />

avise. Mas não avise quando o prazo estiver estourando. Lembre-se:<br />

estourando também está no gerúndio.<br />

Um estagiário é medido por produtivi<strong>da</strong>de: pela criativi<strong>da</strong>de nos jobs,<br />

não pela criativi<strong>da</strong>de nas desculpas.<br />

81


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

não deu tempo.<br />

Não deu tempo é uma frase que não existe. Ou melhor, existe, mas em<br />

outro tempo verbal: Gente, não vai <strong>da</strong>r tempo.<br />

De novo: se você se deu conta que o prazo está apertado demais, não<br />

deixe para avisar em cima <strong>da</strong> hora. Ou na<strong>da</strong> poderá ser feito.<br />

Assim que você receber o job, grite. Ou quem vai ouvir no final é você.<br />

inteligência emocional.<br />

Os EUA não ganharam a Segun<strong>da</strong> Guerra sozinhos. Formaram um<br />

bloco com os chamados Países Aliados e, aí sim: destruíram com<br />

Hitler e companhia.<br />

Pense comigo: se até a maior superpotência do planeta precisa de<br />

aju<strong>da</strong>, não vai ser você que vai resolver tudo sozinho, né?<br />

O dia-a-dia de uma agência é uma guerra. Vem bomba <strong>da</strong>qui, raja<strong>da</strong><br />

<strong>da</strong>li, grana<strong>da</strong> pelo alto. Se você não tiver amigos, morre antes mesmo<br />

de desembarcar na Normandia.<br />

Então, já de cara, exercite a fina arte <strong>da</strong> diplomacia. Depois, com o<br />

tempo, evolua e comece a formar o seu grupo de parceiros estratégicos.<br />

E aí vá expandindo seus territórios. Igualzinho ao War.<br />

Na hora que você precisar – e, acredite, um dia você vai precisar – é<br />

para essas pessoas que você vai ter que pedir água.<br />

83


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

aprofun<strong>da</strong>ndo o assunto:<br />

conta corrente subjetiVa.<br />

Sabe quando dizem Depois dessa, fico devendo uma? Essa Uma é a<br />

moe<strong>da</strong> <strong>da</strong> Conta Corrente Subjetiva.<br />

No momento em que você quebra um galho para alguém, você ganha<br />

pontos. Quando você pede auxílio, é justamente o contrário: entra no<br />

vermelho. Quanto maior o favor, maior o valor.<br />

A grande maneira de ser respeitado dentro do ambiente de trabalho<br />

é estar sempre no positivo. Com todo mundo. Assim, ninguém pode<br />

falar na<strong>da</strong> de você. E quando você precisar de uma mão, não vão<br />

poder recusar.<br />

Então, siga o conselho dos religiosos: dê sem esperar na<strong>da</strong> em troca.<br />

Ou, se preferir, siga a filosofia de Dom Corleone, o personagem célebre<br />

de O Poderoso Chefão, que dizia para quem vinha lhe pedir favores.<br />

Eu não quero o seu dinheiro. Quero a sua amizade.<br />

Capisce?<br />

pergunte.<br />

insista uma Vez.<br />

e era isso.<br />

Você está autorizado a perguntar. Inclusive, o porquê costuma ser o<br />

melhor amigo <strong>da</strong>s pessoas inteligentes.<br />

Mas se você é realmente inteligente, vai saber a hora em que a curiosi<strong>da</strong>de<br />

vira pentelhação. Em que a contestação vira desrespeito à hierarquia.<br />

E aí, mesmo não concor<strong>da</strong>ndo com a justificativa que deram a<br />

você, o jeito é sentar na frente do computador e fazer mais.<br />

85


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

facebook, twitter, Youtube<br />

e e-mail. não fique com<br />

a fama de Vagal.<br />

Em to<strong>da</strong>s as agências, sempre tem um estagiário que fica com o estigma<br />

do cara que passa o dia na internet. Fuja desse rótulo. Ou sua vi<strong>da</strong><br />

dentro <strong>da</strong> empresa vai durar menos que 140 caracteres.<br />

Minha sugestão é que você aproveite os horários extra-pauta (antes<br />

<strong>da</strong>s 9h, depois <strong>da</strong>s 19h e o intervalo para o almoço) para fazer o seu<br />

tour virtual.<br />

De novo: essa não é a minha opinião. Mas é o que percebo<br />

do mercado.<br />

Imagine a seguinte situação. O seu chefe está estressado, precisando<br />

que você termine um layout até as 16h. Faltando duas horas para a<br />

apresentação, ele passa pelo seu monitor e vê, abertas no seu e-mail,<br />

as últimas fotos <strong>da</strong> Carolina Dieckmann. Chega no final do trabalho, a<br />

montagem não fica como ele esperava.<br />

Vai sobrar para você. E para a Carol também.<br />

Sempre que você estiver man<strong>da</strong>ndo fotinhos de putaria, ou <strong>da</strong>ndo<br />

um like no post do Alemão, ou visitando o Twitter do Neymar, você<br />

está correndo o risco de que alguém chegue e pergunte: E aí, já<br />

limpou a pauta?<br />

Lembre-se: até conquistar o seu espaço, você não é o que você é.<br />

Você é o que os outros perceberem o que você é.<br />

Obs.: se o seu monitor estiver estrategicamente virado para a entra<strong>da</strong><br />

<strong>da</strong> Criação, onde todo mundo passa e vê o que está na tela<br />

(esses monitores sempre caem para os estagiários), o cui<strong>da</strong>do deve<br />

ser redobrado.<br />

87


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

ei, eu posso estar no<br />

Youtube Vendo referências<br />

para um trabalho.<br />

eu posso estar no facebook<br />

pesquisando um grupo<br />

de consumidores.<br />

Claro, ca<strong>da</strong> caso é um caso. Inclusive, racionalmente, todo mundo entende<br />

que essas coisas (o Neymar, a Carolina Dieckmann e o Alemão)<br />

são referências <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e que fazem de você um criador melhor.<br />

Ao mesmo tempo, o seu chefe tem uma pauta represa<strong>da</strong>, esperando<br />

que você diga Acabei! para passar o próximo job.<br />

E outra: não pense que o seu chefe não nota. Ele sabe exatamente<br />

a diferença entre um trabalho sério e alguém que está matando. Até<br />

porque, ele também tem um chefe, e também dá uma matadinha de<br />

vez em quando.<br />

estágio de seis horas.<br />

Há pouco tempo, entrou em vigor uma lei que determina que os estagiários<br />

não trabalhem mais que seis horas.<br />

Acho, sinceramente, a típica lei onde todo mundo sai perdendo. Principalmente<br />

o estagiário.<br />

Você está lá, cercado de um monte de gente melhor do que você.<br />

Profissionais que estão <strong>da</strong>ndo dicas, conselhos e oportuni<strong>da</strong>des para<br />

você mostrar o seu trabalho. Ca<strong>da</strong> hora, ca<strong>da</strong> minuto, ca<strong>da</strong> segundo<br />

num ambiente assim é valioso.<br />

Por que ficar apenas seis horas? Onde você aprende mais: dentro de<br />

uma agência ou em casa, coçando o saco?<br />

Se você for contratado para trabalhar seis horas, já se coloque à disposição<br />

para trabalhar mais, bem mais. No final <strong>da</strong>s contas, é bom<br />

para você.<br />

89


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

bem mais é beeeeeeem mais.<br />

Quando você decide trabalhar com publici<strong>da</strong>de, tenha em mente o<br />

seguinte: a sua jorna<strong>da</strong> de trabalho vai longe. Muitas vezes, entra final<br />

de semana e só termina quando o Tadeu Schimidt está mostrando os<br />

gols do Fantástico.<br />

Não fui eu que inventei isso. É a forma como o mercado <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong><br />

se organizou (ou se desorganizou).<br />

Essa é a regra do jogo. Se você não concor<strong>da</strong>, beleza. Não precisa<br />

entrar em campo. Mas se entrar em campo, não pode reclamar de<br />

carrinho no tornozelo.<br />

Moral <strong>da</strong> história: não seja um desses estagiários chatos que reclama<br />

dos horários malucos. Isso é um absurdo, é desumano. Não está satisfeito?<br />

Peça demissão. Ou você acha que uma empresa inteira vai se<br />

adequar ao seus horários?<br />

Conheço um monte de agência pequena que termina o expediente<br />

diariamente às 18h30. Mas só faz trabalhos de menor visibili<strong>da</strong>de. É o<br />

que você quer? Então vá lá.<br />

Aí, você pode dizer que tem gente que ganha bem, só faz trabalhos<br />

grandiosos e trabalha pouco.<br />

Claro, esses empregos existem, sim. Mas são pouquíssimos. E disputados<br />

pelo melhores dos melhores. Você, que recém começou, ain<strong>da</strong><br />

está muito longe dessa cadeira.<br />

dica de sobreViVência<br />

na selVa: não coloque tudo<br />

a perder nas bala<strong>da</strong>s<br />

<strong>da</strong> empresa.<br />

Existem agências e agências. Mas to<strong>da</strong>s elas fazem algum tipo de<br />

comemoração. Ou quando conquistam uma conta nova, ou quando<br />

ganham um grande prêmio, ou – se o ano for magro – a festa de<br />

final de ano.<br />

De novo: existem agências e agências. Em algumas, ninguém se importa<br />

se você tomar um porre, vomitar no meio <strong>da</strong> pista e chegar solando<br />

na mulher do VP. Em outras, todo mundo vai ficar de olho quando<br />

você pedir o segundo whisky.<br />

Já pensou? Você demora anos para construir uma reputação e duas<br />

tequilas colocam tudo a perder?<br />

Em geral, chega uma hora na festa em que o álcool pega. Quem não<br />

quer incomo<strong>da</strong>ção, vai embora. Quem está para a mal<strong>da</strong>de fica.<br />

A partir <strong>da</strong>í, está liberado.<br />

91


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

antes de chegar<br />

nos finalmentes:<br />

três coisas que todo<br />

mundo acha que tem.<br />

Propagan<strong>da</strong> é um meio extremamente subjetivo. Isso dá margem para<br />

muita discussão e opiniões controversas.<br />

No início <strong>da</strong> carreira, é legal fugir do fogo cruzado. Então, já ligue o<br />

seu ra<strong>da</strong>r para os três pontos a seguir:<br />

1. Bom senso<br />

Você já ouviu alguém dizer Eu não tenho bom senso?<br />

Eu nunca vi. Mas já vi muita reunião discutindo se fulano teve bom<br />

senso ou não. Quando isso acontecia, era um saco. Nunca se chegava<br />

a uma conclusão.<br />

2. Critério<br />

Certa vez, uma menina, que estava quase se formando, foi pedir estágio.<br />

Quando perguntaram se ela queria Re<strong>da</strong>ção ou Direção de Arte,<br />

a garota disse Direção de Criação. Eu não sou muito boa fazendo propagan<strong>da</strong>,<br />

mas sou ótima avaliando peças.<br />

Essa história é real e aju<strong>da</strong> a reforçar um ponto de vista que tenho:<br />

qualquer um se acha um bom avaliador de propagan<strong>da</strong>.<br />

Pense comigo: ca<strong>da</strong> pessoa tem um critério diferente. E como não<br />

existe uma Lei Universal, que determine o que é certo e o que é errado<br />

na publici<strong>da</strong>de, to<strong>da</strong> a pessoa tem a sensação de que o seu critério é<br />

melhor que o dos outros.<br />

Por isso que, se você não cui<strong>da</strong>r, sua peça vai receber pitaco de todo<br />

mundo. Até <strong>da</strong> tia do café.<br />

3. Caráter<br />

Você tem um amigo que é apaixonado por uma mulher gostosíssima.<br />

Mas ela não quer na<strong>da</strong> com o cara, e sim com você. Dar em cima <strong>da</strong><br />

gatinha é sacanagem?<br />

Uns vão dizer que sim, outros vão dizer que não. Depende do grau de<br />

amizade, <strong>da</strong> gostosa, e principalmente: dos conceitos que vocês têm<br />

sobre o assunto.<br />

Eu já vi muito filho <strong>da</strong> puta fazer filha<strong>da</strong>putice. E na maioria <strong>da</strong>s vezes,<br />

eles não se achavam filhos <strong>da</strong> puta por isso. Sempre tinham uma justificativa<br />

– que para mim não fazia sentido, mas para os caras era mais<br />

do que suficiente.<br />

De novo: é tudo uma questão de bom senso e critério.<br />

Por isso, sempre que você fizer alguma coisa, e o pessoal olhar torto,<br />

avalie a situação. De repente, na sua cabeça, está tudo bem. Mas os<br />

outros podem estar tirando você para mau caráter.<br />

93


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 3 – Dentro Da agência<br />

e finalmente: aproVeite.<br />

O estágio teria tudo para ser uma etapa de mer<strong>da</strong> na sua carreira.<br />

Você trabalha um monte. Pega só craqueira. E sempre que alguma<br />

coisa dá errado, sobra para você.<br />

Mas o estágio é uma <strong>da</strong>s épocas mais legais <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> profissional. E<br />

a última dica desse capítulo é justamente essa: aproveite. Curta. Tem<br />

um lado muito legal de ser estagiário.<br />

P.S.: Apesar de ser uma fase legal, eu não vou enrolar você. Uma hora,<br />

a coisa perde o encanto. E aí, quando o leite começa a aze<strong>da</strong>r, é hora<br />

de pular para o capítulo quatro.<br />

95


capÍtulo 4


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />

antes de qualquer coisa:<br />

planeje a sua carreira.<br />

É fácil planejar o seu dia. Hoje eu vou acor<strong>da</strong>r, trabalhar durante a manhã,<br />

ao meio-dia vou na academia, volto para agência, depois vou para<br />

a aula e quando voltar, durmo na minha namora<strong>da</strong>.<br />

Também não é difícil planejar o seu mês. Até o dia 15 eu vou economizar,<br />

no terceiro final de semana eu vou para a praia, perto do dia 30 eu<br />

faço uma puta bala<strong>da</strong> com a grana que sobrar.<br />

Agora, você consegue planejar os próximos seis meses? Os próximos<br />

dois anos? Os próximos cinco anos?<br />

Infelizmente, é um mal necessário. Porque você só vai saber se<br />

uma decisão na sua carreira é certa ou erra<strong>da</strong> se souber qual é o<br />

final <strong>da</strong> história.<br />

E saiba que todo plano foi feito para ser mu<strong>da</strong>do. O plano é um guia,<br />

não um cão-guia. Você não precisa seguir cegamente.<br />

mu<strong>da</strong>r é importante<br />

para a sua formação.<br />

Se você trabalhar durante anos em apenas uma agência, com um<br />

mesmo time de criadores, você vai aprender tudo o que eles têm de<br />

bom. Mas também vai aprender tudo o que eles têm de ruim.<br />

Ou você acha que os grandes profissionais não têm defeitos?<br />

Têm sim. E depois de consagrados, aí sim é que eles não mu<strong>da</strong>m mais.<br />

O complicado de trabalhar num lugar só é que você fica com uma<br />

visão vicia<strong>da</strong> e limita<strong>da</strong>. Dois defeitos que um criador não pode ter.<br />

E, não por acaso, a melhor época para trocar de agência é quando<br />

você é estagiário. Os compromissos são menores. As consequências<br />

são menores. Até o interesse em segurar você vai ser menor.<br />

99


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />

para saber se é hora<br />

de mu<strong>da</strong>r, preste atenção<br />

nessas duas coisas.<br />

1. a pasta estagna<strong>da</strong>.<br />

Não é regra, mas um bom indicativo para saber se o seu atual emprego<br />

está legal é analisar a sua pasta. Se faz horas que você não coloca<br />

nenhuma peça nova no portfólio, <strong>da</strong>s duas, uma:<br />

Ou você só está pegando trabalhos que não estão contribuindo para<br />

o seu crescimento. Craqueiras que não ensinam na<strong>da</strong>. E que também<br />

não dão oportuni<strong>da</strong>de de você mostrar o seu potencial;<br />

Ou você está desmotivado e não está rendendo o melhor que pode. O<br />

que também é um sinal de que talvez seja a hora de sair.<br />

2. o Copo enCheu.<br />

Existem também aqueles momentos em que você simplesmente enche<br />

o saco. Por mais que esteja crescendo, por mais que a sua pasta<br />

ganhe uma peça nova por semana.<br />

Via de regra, todo emprego tem um prazo de vali<strong>da</strong>de.<br />

Os criadores são pessoas que gostam de mu<strong>da</strong>nça, do novo. A rotina,<br />

para esse tipo de gente, é um vilão ain<strong>da</strong> mais malvado.<br />

mu<strong>da</strong>r é importante<br />

para a sua formação.<br />

e sua formação<br />

é importante para<br />

to<strong>da</strong> a sua carreira.<br />

Um jogador de futebol, enquanto está nas categorias de base, recebe<br />

constante orientação. Tem sempre alguém por perto ensinando os<br />

fun<strong>da</strong>mentos básicos, como o cabeceio, o passe e o chute. Tolerando<br />

os erros e indicando os atalhos do campo.<br />

O período de formação é muito importante e não pode ser atropelado.<br />

Quando o jogador sobe para os profissionais, ele precisa estar pronto.<br />

Porque nos profissionais, ninguém vai pegar o jogador pela mão e<br />

dizer Não, filho, é assim que se chuta.<br />

Se você não der resultado, vai para o banco. Ou pode até ser dispensado.<br />

Craques como o Ronaldinho Gaúcho ou o Alexandre Pato poderiam<br />

subir para os profissionais antes do tempo. Eles eram tão bons que,<br />

já com 15 anos, teriam condições de disputar de igual para igual<br />

com os gran<strong>da</strong>lhões.<br />

O problema é que esse período é precioso na formação. E se for tirado<br />

do jogador, nunca mais será recuperado.<br />

101


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />

O mesmo acontece com o estagiário de publici<strong>da</strong>de. Porque depois<br />

que você é contratado, a exigência mu<strong>da</strong>. Antes você tinha alguém<br />

para orientá-lo, agora você vai ter alguém para cobrá-lo.<br />

Se você não aprender o que precisa aprender na hora certa, não aprende<br />

mais. Então, por favor: não atalhe a sua formação. Não se deixe seduzir<br />

por uma proposta de contratação antes que você esteja pronto.<br />

Essa é a maior burrice que você pode fazer com a sua carreira.<br />

Conheço vários caras que queriam o cargo de Re<strong>da</strong>tor ou de Diretor<br />

de Arte. Queriam deixar o posto de estagiário a qualquer custo. Queriam<br />

subir para os profissionais antes <strong>da</strong> hora. Mas ain<strong>da</strong> não sabiam<br />

chutar nem cabecear.<br />

Resultado? Hoje estão jogando no Bragantino.<br />

Você não precisa<br />

crescer rápido.<br />

precisa crescer sempre.<br />

Um re<strong>da</strong>tor demora no mínimo três anos para se formar. Dois como estagiário<br />

e mais um como Re<strong>da</strong>tor Júnior (que é um estagiário com grife).<br />

Isso quer dizer que, se você conseguir um estágio no primeiro semestre<br />

<strong>da</strong> facul<strong>da</strong>de, e fizer tudo certo, só vai conseguir um contrato<br />

pouco antes de se formar.<br />

No início, você vai fazer bons títulos, boas ideias visuais e bons textos.<br />

Esse é o mínimo que se exige de alguém que queira trabalhar<br />

com Re<strong>da</strong>ção.<br />

Depois, você tem que ser capaz de criar campanhas. Conceitos fortes<br />

que se desdobrem em várias mídias.<br />

Em segui<strong>da</strong>, você tem que criar boas peças de rádio e, talvez, comerciais<br />

baratos de TV. Tem que saber brifar um produtora. Mais: você tem que<br />

conseguir analisar a produção e dizer se ela está boa ou não. Você tem<br />

que detectar os problemas e pedir alterações, até que ela fique boa.<br />

Achou muito?<br />

Pois um diretor de arte demora o dobro. Se você for assistente de<br />

alguém bom, você precisa de no mínimo dois anos de estágio. Se for<br />

você um cara mais ou menos, o ideal é ficar três anos.<br />

103


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />

Isso para aprender só o básico, como diagramação, combinação de<br />

cor, escolha de fonte e montagens fotográficas.<br />

Depois do estágio, você precisa de mais dois anos como Diretor de<br />

Arte Júnior. Só então você vai aprender os processos mais complexos,<br />

como produção de foto e ilustração.<br />

O que já dá uma dica.<br />

se for preciso,<br />

pe<strong>da</strong>le a facul<strong>da</strong>de.<br />

Fique esperto com a relação Estágio vs. Formatura. Se você não estiver<br />

com perspectivas de contratação, não adianta se formar. Muitas<br />

vezes, vale a pena prorrogar alguns semestres para não sair <strong>da</strong> facul<strong>da</strong>de<br />

com uma mão na frente e outra atrás.<br />

Alguns pais incomo<strong>da</strong>m, porque querem que os filhos se formem nos<br />

quatro anos. Mas o mais importante é o seu bem. Então, se for necessário,<br />

e se for possível fazer esse esforço financeiro (todo novo semestre<br />

existem taxas de matrícula), converse com eles e tome a decisão<br />

que for melhor para a sua carreira.<br />

Se aju<strong>da</strong>r, mostre esse capítulo para os seus pais e diga que a culpa<br />

é minha.<br />

105


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />

Voltando ao ponto<br />

principal deste capÍtulo:<br />

Você chegou à conclusão que é hora de trocar de agência. Então, prepare-se<br />

para o seu tour.<br />

Agende entrevistas nos principais lugares. Se você é estagiário, provavelmente<br />

ninguém conhece você e o seu trabalho. É hora de se<br />

apresentar para o mercado.<br />

Faça isso de forma discreta. É chato quando descobrem que você<br />

está mostrando pasta por aí. Até porque, quando a entrevista é durante<br />

o expediente, você vai ter que inventar uma desculpa (Vou ao<br />

médico). E to<strong>da</strong> vez que você sai, deixa a pauta pendura<strong>da</strong> para<br />

outro resolver.<br />

Lembre-se também que a chance de rolar alguma coisa imediatamente<br />

é baixa. Então, assim que você sentir que é hora de mu<strong>da</strong>r, faça o<br />

tour o quanto antes.<br />

Você pode contratar<br />

o seu noVo chefe.<br />

Pintou uma oportuni<strong>da</strong>de em outra agência. Será que vale a pena?<br />

A melhor maneira de saber quem é quem no mercado são os Anuários.<br />

Lá está a ficha corri<strong>da</strong> de todo mundo. Inclusive <strong>da</strong>quele cara que<br />

chamou você para uma entrevista.<br />

Não esqueça: antes de saber se ele quer contratar você, você deve<br />

saber se quer ser contratado por ele. Isso vai determinar o tom <strong>da</strong><br />

entrevista, as suas respostas e a sua postura.<br />

107


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 4 – Trocando de emprego<br />

abrindo parênteses:<br />

o que é um anuário.<br />

A maioria dos festivais de propagan<strong>da</strong> geram, ao final do evento, um<br />

livro/DVD que reúne as peças vencedoras e suas respectivas fichas<br />

técnicas. Assim, você sabem quem fez o que.<br />

Em outras palavras: é um registro do que de melhor foi feito naquele ano.<br />

O CCSP (Clube de Criação de São Paulo) é o mais famoso do Brasil,<br />

com trabalhos <strong>da</strong>s principais agências do país. Visite www.ccsp.com.<br />

br e encomende o seu.<br />

Existem também os Anuários gringos, como o AD&D, o Art Directors<br />

e o The One Show.<br />

Uma maneira barata é encomen<strong>da</strong>r pela Amazon. Demora mais que<br />

via os revendedores locais, e é chatinho de achar. Mas sai mais em<br />

conta e compromete menos o seu salário.<br />

Especialmente se o seu salário ain<strong>da</strong> é uma bolsa-estágio.<br />

a partir <strong>da</strong>Í,<br />

Vão surgir coisas.<br />

E você começa a viver os seus primeiros dilemas profissionais.<br />

109


capÍtulo 5


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

quando chamam Você<br />

para uma entreVista.<br />

Durante a entrevista, você tem que saber o seu objetivo. Você quer<br />

trabalhar com essa pessoa? Você quer trabalhar nessa agência? Você<br />

quer trabalhar com essas contas?<br />

Essas são algumas perguntas básicas que você tem que considerar antes<br />

<strong>da</strong> conversa, e não durante a conversa. Porque aí, você será capaz<br />

de tirar as informações que você precisa para tomar a sua decisão.<br />

Acho esse um erro bem comum cometido pelos estagiários. Eles dizem:<br />

Vou lá só ouvir. E levam isso ao pé <strong>da</strong> letra. Vão lá só para ouvir<br />

mesmo. Em vez de aproveitarem a oportuni<strong>da</strong>de para perguntar.<br />

Já dizia Guillaume D’Orange: Não há vento favorável para quem não a<br />

que porto se dirige.<br />

Só depois de pensar bastante sobre os pontos positivos e negativos<br />

de trocar de emprego você vai estar preparado para a entrevista.<br />

primeira parte <strong>da</strong><br />

entreVista: Você Vai ouVir<br />

exatamente o que quer.<br />

por isso, ouça com atenção.<br />

Primeiro ouça. Se o entrevistador for um cara esperto, ele vai dizer<br />

exatamente o que você quer ouvir. Lave bem os ouvidos. Mas sempre<br />

deixe uma pulga atrás <strong>da</strong> orelha.<br />

Tenha em mente que o entrevistador não mente. Mas sempre conta<br />

uma versão conveniente <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de.<br />

Conveniente para ele, não para você.<br />

A pessoa que estiver entrevistando você vai falar só maravilhas. Como<br />

a agência é interessante, <strong>da</strong>s oportuni<strong>da</strong>des que você vai ter, as pessoas<br />

legais que vai conhecer. Sempre com aquele leve exagero, natural<br />

<strong>da</strong>s tentativas de persuasão.<br />

Da mesma forma, sempre vai usar eufemismos para as coisas ruins.<br />

Em vez de dizer que o seu dupla é vagabundo, por exemplo, ele vai<br />

dizer que o seu dupla é um cara mais low profile.<br />

Fique atento a esses detalhezinhos.<br />

113


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

use o feitiço<br />

contra o feiticeiro.<br />

A primeira coisa importante é não se expor. Não entre em terrenos<br />

perigosos. Evite polêmicas. Evite opiniões muito fortes. Dê respostas<br />

convenientes.<br />

Eles não estão procurando um Prêmio Nobel. Estão procurando<br />

um estagiário.<br />

Evite falar dos seus defeitos. Se por acaso você tiver que abrir o jogo,<br />

use eufemismos também. E sempre que houver oportuni<strong>da</strong>de, valorize<br />

os seus pontos fortes. Mas de forma natural.<br />

faça o tema de casa.<br />

Entre no site <strong>da</strong> agência. Veja os trabalhos que foram feitos. Enten<strong>da</strong><br />

a filosofia <strong>da</strong> empresa. Tente identificar a visão de propagan<strong>da</strong> que<br />

essa pessoa tem.<br />

E fale exatamente o que ele quer ouvir. Se você fizer isso, e fizer bem<br />

feito, estará ali, ali para chegar lá.<br />

115


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

bom humor é mais<br />

do que bom.<br />

Pessoas contratam pessoas. Se você é um cara legal e interessante, aja<br />

naturalmente. Se você não é, tente ser. Pelo menos durante a entrevista.<br />

Bom humor é uma coisa que pega muito bem na entrevista. Rir na<br />

medi<strong>da</strong> certa e fazer rir na medi<strong>da</strong> certa é uma grande dica.<br />

Às vezes, para descontrair o clima, o entrevistador faz uma ou outra<br />

piadinha. Não veja isso como um sinal verde para você lançar o seu<br />

arsenal de tira<strong>da</strong>s geniais. Vá com calma.<br />

Conheço um estagiário que passou por to<strong>da</strong>s as etapas <strong>da</strong> triagem de<br />

uma grande agência. Então, foi falar com o Diretor de Criação, que começou<br />

a entrevista com uma pia<strong>da</strong> de gaúcho. O estagiário devolveu,<br />

fazendo uma pia<strong>da</strong> de catarinense.<br />

Ele só esqueceu de um detalhe: o Diretor de Criação era de Santa Catarina.<br />

segun<strong>da</strong> parte <strong>da</strong><br />

entreVista: as perguntas<br />

certas são mais<br />

importantes que<br />

as respostas certas.<br />

A partir <strong>da</strong>í, vão aparecer oportuni<strong>da</strong>des para você questionar. Pergunte,<br />

dentro do limite do bom senso, tudo o que você deseja saber.<br />

Fique atento aos sinais corporais. Se você perguntar alguma coisa, e<br />

o entrevistador cruzar os braços, ou se encostar para trás, é sinal de<br />

uma postura defensiva. Você deve ter tocado num ponto delicado.<br />

Também atente para os atos falhos. Por mais experiente que seja o<br />

entrevistador, ele pode muito bem cometer um deslize.<br />

E nunca esqueça desses dois pontos.<br />

117


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

ponto um: Você sempre<br />

está satisfeito com o seu<br />

atual emprego. mesmo que<br />

Você não esteja.<br />

Quando perguntarem se você está feliz, não titubeie. Diga que você<br />

está feliz, sim. É uma questão de sobrevivência.<br />

1. Detonar o seu atual emprego soa, no mínimo, arrogante. Já pensou<br />

se ele é amigo do seu chefe? É queimação na hora. O mercado<br />

é muito pequeno e todo mundo se conhece.<br />

2. Se você demonstrar desinteresse pelo atual emprego, talvez<br />

passe uma certa desmotivação. E tudo o que ele não quer é um<br />

estagiário sem energia.<br />

3. E o mais importante: abrindo totalmente o jogo (Aceito qualquer<br />

proposta!), você parece meio desesperado e se desvaloriza.<br />

Então, lembre-se: você está feliz no seu emprego, no matter what.<br />

Mas não assuste o entrevistado ao ponto dele pensar Pô, esse cara<br />

está tão feliz que eu nunca vou conseguir contratá-lo.<br />

É fun<strong>da</strong>mental verbalizar uma possível troca de ares. Se você fizer<br />

muitas juras de amor ao seu atual emprego, talvez ele nem faça<br />

uma proposta.<br />

É como no jogo de sedução. Você não pode sair disparando logo de<br />

cara (Vamos para um motel?). Por outro lado, tem que <strong>da</strong>r alguma dica.<br />

Então, quer uma carona?<br />

O melhor a dizer é algo assim: Feliz eu estou, mas também sempre<br />

penso em crescer. Um novo desafio pode ser bom a minha carreira.<br />

Por que não?<br />

Mais um detalhe: tome cui<strong>da</strong>do ao afirmar que adora trabalhar com<br />

Fulano, que Fulano sabe muito, que Fulano é muito bom. Não supervalorize<br />

o seu atual chefe – ain<strong>da</strong> mais, se você estiver vindo de uma<br />

agência menor.<br />

Talvez ele não seja tão bom assim e você já demonstre uma falta de<br />

critério.<br />

119


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

ponto dois: Você sempre<br />

deVe demonstrar<br />

interesse. mesmo se não<br />

tiVer interesse nenhum.<br />

Vai chegar um momento <strong>da</strong> entrevista que vão perguntar: E aí, você<br />

está a fim?<br />

Você sempre deve demonstrar interesse. Mesmo que você já saiba<br />

que vá recusar a proposta.<br />

Por quê? Bom, analise bem a situação sob o ponto de vista do cara<br />

que quer contratar você:<br />

Alguém, que é mais experiente que você, está fazendo um convite.<br />

Dizer não, assim, na lata, pode soar ofensivo. Por mais convincentes<br />

que sejam os seus motivos. Ninguém gosta de ser renegado. Especialmente<br />

por um estagiário. Ora, quem esse moleque pensa que é<br />

para recusar minha oferta?<br />

Sou partidário de sempre acenar positivamente, mas sem se comprometer.<br />

Algo como: Olha, achei a proposta bem legal, bem interessante,<br />

mas eu preciso falar com o pessoal lá <strong>da</strong> agência para ver direitinho<br />

como ficam as coisas. Posso <strong>da</strong>r uma resposta definitiva até 19h?<br />

É hora de ganhar tempo. É hora de ganhar o máximo que a situação permitir.<br />

Uma proposta na mão é a única e principal arma de um estagiário.<br />

cenários.<br />

Com a proposta na mão, você tem vários cenários. Escolha o que melhor<br />

combina com o seu momento e tente sair no lucro. Agora, na<strong>da</strong> de<br />

ser malandrinho e nem de ficar se achando. Todo cui<strong>da</strong>do é pouco.<br />

121


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

primeiro cenário: Você<br />

não quer trocar de<br />

agência. quer deixar tudo<br />

exatamente como está.<br />

Essa é a mais fácil de to<strong>da</strong>s. Basta ligar, ou man<strong>da</strong>r um e-mail (dependendo<br />

do que ficar combinado):<br />

Conversei com o pessoal aqui e eles me prometeram algumas mu<strong>da</strong>nças<br />

que vão ser bem legais para mim. Fiquei muito balançado,<br />

porque as duas propostas são ótimas. Mas dicidi ficar. Muito obrigado<br />

pelo convite, fiquei muito feliz pelo interesse. Espero ain<strong>da</strong><br />

trabalhar com vocês um dia.<br />

Se existem realmente mu<strong>da</strong>nças, se houve realmente uma conversa,<br />

isso é irrelevante. O importante é você demonstrar que realmente considerou<br />

a proposta. E que só não aceitou porque a situação que pro-<br />

puseram na sua atual agência foi realmente muito boa.<br />

O cara não pode pensar: Que estagiário FDP, se queimou comigo! Tem<br />

que pensar: Puxa, que pena. Quase deu. Fica para a próxima.<br />

Ah: não deixe de falar para o seu atual chefe que você recebeu a proposta.<br />

Ele precisa saber que você está sendo son<strong>da</strong>do.<br />

segundo cenário: Você não<br />

quer trocar de agência.<br />

mas quer aproVeitar<br />

a oportuni<strong>da</strong>de para<br />

tentar alguma Valorização.<br />

A resposta continua a mesma. O que mu<strong>da</strong> é a conversa entre você e<br />

o seu chefe. Nesse caso, você tem que convocar o bate-papo o quanto<br />

antes. E colocar a situação, sempre com muita humil<strong>da</strong>de:<br />

Recebi uma proposta para trabalhar na agência Tal. Eu gosto muito<br />

<strong>da</strong>qui, não quero sair, mas eles sinalizaram algumas coisas bem<br />

interessantes, oportuni<strong>da</strong>des que eu não tenho hoje. Eu estou bem<br />

dividido. Então, queria saber se existe alguma possibili<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s<br />

coisas mu<strong>da</strong>rem aqui na agência. Se existe a chance de eu receber<br />

um aumento ou ser contratado. Isso certamente me faria ficar. Eu<br />

quero muito continuar aqui, mas estou bem na dúvi<strong>da</strong>.<br />

Assim, você mete uma pressão de leve, sem botar o seu chefe na parede.<br />

E não cria um clima ruim para depois dizer: É, realmente, pensei<br />

bem e decidi ficar.<br />

Seja porque foi contratado. Seja porque recebeu um aumento. Ou não.<br />

123


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

terceiro cenário: Você<br />

nem quer ouVir uma<br />

contra-proposta. quer<br />

sair de qualquer jeito.<br />

Teoricamente, essa aqui também é barba<strong>da</strong>. É só comunicar a sua<br />

saí<strong>da</strong>. Se ninguém oferecer resistência, está resolvido.<br />

O problema é que, às vezes, o pessoal <strong>da</strong> sua atual agência se ofende<br />

com a decisão. Ou discor<strong>da</strong> <strong>da</strong> sua posição. E fica enchendo o saco.<br />

Para evitar qualquer constrangimento, para se esquivar de qualquer<br />

tipo de contra-proposta supostamente irrecusável, o jeito é arranjar<br />

um argumento que o seu futuro empregador possa oferecer, e o seu<br />

atual não. Só assim você sai ileso.<br />

Entendeu? Você tem que dizer que, na nova agência, vai receber uma<br />

coisa que o seu atual chefe não possa oferecer.<br />

Certa vez, eu recebi uma oferta muito boa. Por outro lado, eu sabia<br />

que meu Diretor de Criação faria todo e qualquer esforço financeiro<br />

para me manter. Como eu queria ir de qualquer jeito, já comecei a<br />

conversa sem <strong>da</strong>r muita chance:<br />

As nossas principais contas são de Indústria e Varejo. Adoro<br />

atender esses clientes. Mas eu não serei um Re<strong>da</strong>tor completo<br />

se eu não aprender a criar para Mo<strong>da</strong>. Eu ain<strong>da</strong> não tive oportu-<br />

ni<strong>da</strong>de de trabalhar nesse ramo. E lá, eu vou cui<strong>da</strong>r de uma <strong>da</strong>s<br />

maiores contas de Mo<strong>da</strong> do Brasil. Não tem dinheiro que pague<br />

essa experiência.<br />

Ele ficou mudo por alguns instantes, deu um sorriso meio amarelo e<br />

fez aquela cara de Bom, o que eu vou fazer? Depois emendou: Quando<br />

é o seu ultimo dia?<br />

O papo não durou nem cinco minutos.<br />

125


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

quarto cenário: Você<br />

está inclinado a sair. mas<br />

dependendo <strong>da</strong> contraproposta,<br />

até pode mu<strong>da</strong>r<br />

de ideia e ficar.<br />

Esse é uma mistura do segundo com o terceiro cenário. A diferença<br />

é que, aqui, a pressão é maior. Você já tem que chegar mais decidido.<br />

Mas sempre na humil<strong>da</strong>de:<br />

Recebi uma proposta para trabalhar na agência Tal. Eu gosto muito<br />

<strong>da</strong>qui, não quero sair, mas eles sinalizaram algumas coisas bem interessantes,<br />

oportuni<strong>da</strong>des que eu não tenho hoje. Então, botando<br />

a minha situação atual na balança, decidi ir. Ain<strong>da</strong> não respondi para<br />

os caras. Preferi falar primeiro com vocês, até para saber se existe<br />

alguma possibili<strong>da</strong>de de mu<strong>da</strong>nça na minha posição. Se existe, por<br />

exemplo, alguma chance de eu receber um aumento ou ser contratado.<br />

Isso poderia tranquilamente me fazer trocar de ideia.<br />

Quando perguntarem os motivos que fizeram você ir, arranje sempre<br />

argumentos que não possam ser oferecidos pela sua agência atual.<br />

Como no cenário três.<br />

Aí, é ver como as coisas se desenrolam.<br />

quinto cenário: Você está<br />

completamente indeciso.<br />

Antes de qualquer outra dica duvidosa, eu tenho uma dica infalível.<br />

Quando você está passando por um dilema (no caso, um dilema profissional),<br />

preste muita atenção e avalie muito bem os seus conselheiros.<br />

A coisa mais importante que eu aprendi fazendo terapia foi que, em<br />

geral, as pessoas dão opiniões completamente irresponsáveis. Normalmente,<br />

elas não conseguem se colocar na sua pele. Julgam a situação<br />

a partir do próprio ponto de vista, sem considerar o que você<br />

está sentido, os seus valores e os seus interesses.<br />

Cansei de ver vários profissionais experientes <strong>da</strong>ndo dicas muito ruins.<br />

Cansei de ouvir vários conselhos muito ruins. Inclusive de amigos bem<br />

próximos. Pessoas inteligentes, mas com dificul<strong>da</strong>de de se colocar na<br />

minha posição.<br />

Então, aí vai um conselho: cui<strong>da</strong>do com os conselhos. Especialmente<br />

quando você estiver totalmente dividido.<br />

(Como você pode notar, esse tópico coloca em xeque todos os meus<br />

conselhos anteriores. Por isso eu não coloquei lá no início do livro.<br />

Agora é tarde.)<br />

127


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

sexto cenário: Você<br />

consultou as pessoas<br />

certas. mas continua<br />

indeciso.<br />

Eu ain<strong>da</strong> não li o Blink: A Decisão Num Piscar de Olhos. Mas, assim<br />

como o Silvio Santos, recomendo.<br />

Na ver<strong>da</strong>de, achei tão interessante o assunto do livro que tratei de<br />

procurar resenhas e críticas na Internet, além de me informar com<br />

pessoas que já leram.<br />

O livro fala, entre outras coisas, <strong>da</strong> importância <strong>da</strong> intuição. Ele explica<br />

que uma parte do nosso cérebro, chama<strong>da</strong> de inconsciente a<strong>da</strong>ptável,<br />

é capaz de realizar associações em frações de segundo. Assim, ele<br />

chega a conclusões antes que a gente racionalize, antes que se tome<br />

consciência do que está acontecendo.<br />

Eu sempre acreditei no meu feeling. E até hoje continuo ouvindo com<br />

atenção o anjinho e o diabinho que ficam do lado <strong>da</strong> minha cabeça.<br />

Bom, tudo isso para dizer que: quando você está vivendo um dilema,<br />

você provavelmente já tomou a decisão. E tomou no exato instante<br />

que comparou A com B.<br />

Depois, você fica ali, enrolando, tentando encontrar argumentos racionais<br />

para justificar a sua escolha. Mas ela, lá dentro <strong>da</strong> sua cabeça,<br />

já está feita.<br />

como colocar em prática<br />

o método blink.<br />

Respon<strong>da</strong> de bate-pronto: você quer A ou B? Não pense, simplesmente<br />

respon<strong>da</strong>.<br />

Talvez o seu lado racional não consiga explicar o porquê. Mas é, sem<br />

dúvi<strong>da</strong>, um bom jeito de chegar a uma decisão. Especialmente se o<br />

jogo continua empatado depois do tempo normal, <strong>da</strong> prorrogação e<br />

dos pênaltis.<br />

Outro jeito simples é fazer um cara ou coroa. Quando você jogar a<br />

moe<strong>da</strong> para o alto, vai naturalmente torcer para uma <strong>da</strong>s alternativas.<br />

Só não abuse. Eu confio no meu feeling. Mas não usaria, por exemplo,<br />

o Método Blink na pergunta final do Show do Milhão.<br />

129


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

sétimo cenário: para quem<br />

não confia no método<br />

blink, o método tabelinha.<br />

Outro método consagrado é a Tabelinha.<br />

Você faz quatro colunas. Nas duas primeiras, coloca os prós e os contras<br />

do seu atual emprego. Nas outras, coloca as vantagens e desvantagens<br />

do novo. Depois compara tudo e tenta tirar alguma conclusão.<br />

Para muita gente, funciona. Mas para mim, ele parece muito racional<br />

e só complica.<br />

não se acaba namoro<br />

por sms.<br />

Você é um comunicador. Use o meio certo para man<strong>da</strong>r a sua mensagem.<br />

Se você vai recusar uma proposta de emprego, pense bem. Algumas<br />

coisas você pode man<strong>da</strong>r por e-mail. Outras, justificam uma ligação. E<br />

quando o papo é mais delicado, a conversa tem que ser olho no olho.<br />

131


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

nunca feche portas.<br />

A maioria <strong>da</strong>s portas de agência são giratórias: ela leva você para dentro.<br />

Mas rapidinho, pode estar levando você para fora.<br />

Seja lá qual for a sua decisão, nunca se queime com ninguém. Mesmo<br />

que seja uma agência pequena ou um profissional que você não admire.<br />

Trate todo mundo com o mesmo respeito que você teria com o<br />

Diretor de Criação <strong>da</strong> sua agência favorita.<br />

Se não for por amor ao próximo (é legal tratar todo mundo bem, você<br />

não acha?), pelo menos por amor próprio.<br />

eu preciso <strong>da</strong> grana.<br />

Se você depende do dinheiro que ganha, a sua situação é um pouco<br />

mais complica<strong>da</strong>. E exige um planejamento muito maior, já que você<br />

precisa encontrar uma oportuni<strong>da</strong>de que seja mais interessante para<br />

você. Seja ganhando mais. Seja ganhando o mesmo, mas num lugar<br />

mais legal. Seja ganhando mais – e num lugar mais legal.<br />

O único conselho que eu dou para você é tomar cui<strong>da</strong>do com a estagnação.<br />

Quem depende do dinheiro geralmente corre menos riscos.<br />

Esse tipo de gente costuma tomar decisões seguras demais para um<br />

criador. E, muitas vezes, esse conservadorismo é justamente uma boa<br />

causa para <strong>da</strong>rem um belo pé na sua bun<strong>da</strong>.<br />

A melhor maneira de não virar um refém dessa situação é o Fundo<br />

Fo<strong>da</strong>-se.<br />

133


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

fundo fo<strong>da</strong>-se<br />

Eu acredito que todo profissional, de todo e qualquer nível, deveria ter<br />

um fundo, onde estejam acumulados seis salários.<br />

Isso é uma garantia dupla. Primeiro, porque se você for demitido, não<br />

precisa se sujeitar a qualquer proposta.<br />

A segun<strong>da</strong> é que, assim, você pode ter a liber<strong>da</strong>de de trabalhar nas<br />

condições ideais. Pode <strong>da</strong>r opiniões sinceras, sem medos de retaliações.<br />

Pode criar sem um peso desnecessário nas costas.<br />

Em suma: assim, você não precisa vira nem um puxa-saco, nem<br />

um burocrata.<br />

o dilema mais comum:<br />

Viagem ou trampo?<br />

A pergunta que a maioria dos estagiários que me procurava era: eu<br />

tenho muita vontade de viajar, fazer um intercâmbio. Será que devo?<br />

Claro que deve. Não conheço ninguém, absolutamente ninguém, que<br />

se arrependeu de passar um tempo fora.<br />

Eu garanto que uma viagem vai ensinar muito mais do que você pode<br />

aprender dentro de uma empresa. E, na maioria dos casos, você ain<strong>da</strong><br />

volta falando uma outra língua, que é um puta diferencial competitivo.<br />

Um amigo meu sempre dizia que comer e viajar são as quatro melhores<br />

coisas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. Não sei se são. O que eu sei é que, quando se é<br />

novo, e dependendo do roteiro, uma viagem dá bastante oportuni<strong>da</strong>de<br />

para fazer as outras três.<br />

135


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 5 – Primeiros dilemas Profissionais<br />

a pergunta de<br />

um milhão de dólares.<br />

Às vezes, a gente pede conselhos. Mas são perguntas que apenas<br />

nós mesmos podemos responder.<br />

Você já deve ter se deparado com a famosa pergunta de um milhão de<br />

dólares. O que eu quero para a minha vi<strong>da</strong>?<br />

Se você tiver dificul<strong>da</strong>de para respondê-la, simplifique. O que eu quero<br />

para a minha vi<strong>da</strong> AGORA?<br />

Quero ficar na minha ci<strong>da</strong>de ou viajar? Quero investir no meu atual<br />

emprego ou <strong>da</strong>r uma espaireci<strong>da</strong>? Quero trocar de profissão ou continuar<br />

na mesma?<br />

Se você pensar num período de dez anos, vai ver que essa pergunta<br />

ganha um peso desproporcional. Às vezes, tudo o que a gente precisa<br />

saber é o que vai fazer pelos próximos três meses.<br />

tudo termina bem.<br />

Você pode simplesmente ignorar para to<strong>da</strong>s as sugestões que eu dei<br />

aqui. E ain<strong>da</strong> assim, eu tenho certeza que tudo vai <strong>da</strong>r certo para você.<br />

As coisas sempre terminam bem. Sempre.<br />

O único erro que eu tenho certeza que você não pode cometer é o <strong>da</strong><br />

enrolação. Não fique esperando as coisas acontecerem. Não fique aí<br />

parado. O mundo está lá fora esperando por você.<br />

Vai lá e faz.<br />

137


capÍtulo 6


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />

a nossa maior matériaprima:<br />

informação.<br />

Um pedreiro precisa de tijolos para levantar a sua parede. Um marceneiro<br />

precisa de madeira para desenvolver suas peças.<br />

E um criador publicitário, o que precisa?<br />

Antes de tudo, de conhecimento, informação, referências, bagagem.<br />

O motivo é muito simples. Uma peça publicitária na<strong>da</strong> mais é do que<br />

a reorganização de informações que já existem. O papel do criador é<br />

tornar essa informação mais interessante – com humor, emoção ou<br />

racionali<strong>da</strong>de.<br />

Um exemplo.<br />

Se você me pedir para definir a Dercy Gonçalves, eu poderia tirar <strong>da</strong><br />

Wikipedia: Dolores Gonçalves Costa, conheci<strong>da</strong> pelo nome artístico<br />

Dercy Gonçalves, foi uma atriz brasileira, oriun<strong>da</strong> do teatro de revista,<br />

notória por suas participações na produção cinematográfica brasileira<br />

<strong>da</strong>s déca<strong>da</strong>s de 1950 e 1960.<br />

Tudo é ver<strong>da</strong>de. Mas se pegarmos o segundo parágrafo, ela parece<br />

muito mais interessante.<br />

Celebra<strong>da</strong> por suas entrevistas irreverentes, bom humor e emprego<br />

constante de palavras de baixo calão, foi uma <strong>da</strong>s maiores expoentes<br />

do teatro de improviso no Brasil.<br />

Fica mais legal. Mas não <strong>da</strong>ria para dizer isso de uma forma ain<strong>da</strong><br />

mais bacana?<br />

A Dercy não morria nunca porque, to<strong>da</strong> vez que a morte chegava para<br />

levá-la, a veia man<strong>da</strong>va ela tomar no cu.<br />

Viu?<br />

E por que foi possível evoluir <strong>da</strong> primeira para a segun<strong>da</strong> forma? Porque<br />

tivemos mais informação, e com mais informação, pudemos escolher<br />

aquilo que torna a Dercy mais simpática para quem está lendo.<br />

Em segui<strong>da</strong>, fizemos um trabalho de processamento <strong>da</strong> informação:<br />

pegamos parte do primeiro parágrafo e parte do segundo e demos<br />

uma forma.<br />

141


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />

conclusão óbVia.<br />

Quanto mais informação você tem, maior a sua capaci<strong>da</strong>de de encontrar<br />

o lado mais simpático do produto/marca que você quer vender.<br />

informação: faça uma<br />

suruba na sua cabeça.<br />

Quando um homem e uma mulher se conhecem na noite, ninguém quer<br />

se comprometer muito. Ninguém quer queimar o filme logo de cara. Então<br />

os dois ficam se estu<strong>da</strong>ndo, com perguntas clichê e respostas evasivas.<br />

Por exemplo: quando um pergunta sobre o gosto musical do outro,<br />

vem a resposta. Eu sou bem eclético, curto de tudo.<br />

Ser eclético não é só bom em papo de bala<strong>da</strong>. Ser eclético é fun<strong>da</strong>mental<br />

para quem quer ser um bom publicitário. Inclusive dizem que<br />

Na propagan<strong>da</strong>, você tem que ler tudo, ver tudo, ouvir tudo.<br />

Apesar de ser meio batido, é mais ou menos por aí mesmo. Porque<br />

quando o cara tem uma formação muito popular, acaba não conseguindo<br />

sofisticar de termina<strong>da</strong>s peças que precisam de um polimento especial.<br />

Ao mesmo tempo, quando o cara é muito erudito, não sabe quem<br />

é o personagem central <strong>da</strong> novela <strong>da</strong>s oito. Também não funciona.<br />

O legal é quando você realmente gosta de tudo. Quando você consegue<br />

transitar com tranquili<strong>da</strong>de por esses mundos.<br />

Se você é fã de BBB, mas também fica amarradão com os documentários<br />

do History Channel, tem tudo para se <strong>da</strong>r bem.<br />

E quem não curte?<br />

Bom, quem não curte se ferrou. Vai ter que ser na marra. Cultura geral<br />

é ferramenta de trabalho.<br />

143


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />

crÍtica também é matériaprima.<br />

e uma <strong>da</strong>s melhores.<br />

A maioria <strong>da</strong>s pessoas, quando mostra o trabalho para os colegas<br />

de agência, pedindo uma opinião, mostra para ouvir elogio. Se você<br />

critica, sugere uma mu<strong>da</strong>nça, coloca um ponto de vista diferente, normalmente<br />

ouve uma resposta defensiva.<br />

É, mas isso aí veio no briefing.<br />

É, mas isso aí foi um pedido do cliente.<br />

É, mas isso aí foi ordem do meu Diretor de Criação.<br />

A crítica não pode ser leva<strong>da</strong> como uma coisa ruim. Pelo contrário:<br />

crítica é uma coisa maravilhosa.<br />

Se crítica também é informação, crítica também é matéria-prima. Enxergue<br />

ela como mais um <strong>da</strong>do que você pode usar a seu favor para<br />

deixar o trabalho melhor.<br />

as ideias mais simples são<br />

as que dão mais trabalho.<br />

O Marcello Serpa diz, no livro As 22 Consagra<strong>da</strong>s Leis <strong>da</strong> Propagan<strong>da</strong><br />

e Marketing, uma coisa que eu levei para o resto <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>:<br />

O simples só é sofisticado, só é valorizado quando é descoberto<br />

antes de se tornar óbvio. (...) Foi preciso que alguém pensasse<br />

primeiro, que descobrisse a idéia, para que outro alguém pudesse<br />

então dizer ‘uau, por que não pensei nisso antes?’ E, apenas<br />

depois desta frase, repeti<strong>da</strong> por muitos, é que uma idéia simples<br />

transforma-se no óbvio.<br />

Quando você vir uma ideia muito simples (não confun<strong>da</strong> ideias simples<br />

com ideia simplória), não pense que ela foi concebi<strong>da</strong> rapi<strong>da</strong>mente.<br />

Ao que tudo indica, foi fruto de muito trabalho.<br />

Observe as ideias simples e tente encontrar o que existe de genial por<br />

trás do seu raciocínio. To<strong>da</strong> ideia simples é uma aula de propagan<strong>da</strong>.<br />

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as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />

Você não é um gênio<br />

incompreendido.<br />

Aqui na Perestroika, eu tive oportuni<strong>da</strong>de de ter contato muitos caras<br />

bons. Em alguns casos, com os melhores dos melhores, nas mais<br />

diversas áreas. E engraçado: todos os caras realmente geniais que eu<br />

conheci não se achavam gênios. Se consideravam pessoas comuns,<br />

com algum talento e muita sorte.<br />

Imagine você, no início <strong>da</strong> carreira, já se achando o fodão. Você acha<br />

que isso vai ajudá-lo? Provavelmente não, né?<br />

Com o nariz empinado, você não vê direito o que tem pela frente. A<br />

chance de você tomar um tomar um tombo mais cedo ou mais tarde<br />

é grande.<br />

Então, seja humilde. Por mais que você olhe para os profissionais<br />

mais experientes e veja mediocri<strong>da</strong>de, você nunca pode pensar que é<br />

melhor que os caras do topo <strong>da</strong> pirâmide.<br />

Nessa etapa <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, você provavelmente não é.<br />

talento é algo discutÍVel.<br />

Quando você olha uma pessoa fazendo um desenho à mão, pode<br />

pensar: Nossa, esse cara tem muito talento.<br />

Mas e se esse cara treina, desde os cinco anos, doze horas por dia?<br />

Isso é talento? O que é talento? É facili<strong>da</strong>de em desenvolver determina<strong>da</strong><br />

tarefa? É uma habili<strong>da</strong>de natural? É treino? É ser eficiente<br />

numa função?<br />

Eu não gosto de entrar muito nesse terreno, porque acho ele quase<br />

irrelevante. Para mim, se um cara com talento e um sem talento chegam<br />

no mesmo lugar, eles são igualmente bons.<br />

Acredito que o importante não é o meio. O importante é atingir a meta.<br />

Se foi graças a um dom divino, horas de suor, macumba ou um pedido<br />

para o gênio <strong>da</strong> lâmpa<strong>da</strong>, que diferença faz?<br />

No final, é melhor quem tem um resultado melhor. Simples assim.<br />

147


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />

quando pedirem, faça.<br />

quando não pedirem,<br />

surpreen<strong>da</strong>.<br />

A expectativa é a mãe <strong>da</strong> mer<strong>da</strong>. Portanto, quando pedirem para que<br />

você faça algo bem feito, faça no mínimo bem feito. Ou vão achar<br />

uma porcaria.<br />

Agora, quando você propõe alguma coisa, você pega todo mundo<br />

pelo contrapé. Mesmo uma ideia não muito brilhante ganha outra dimensão.<br />

E você ain<strong>da</strong> faz o filme por demonstrar proativi<strong>da</strong>de.<br />

aos 45 do segundo tempo.<br />

Nas última semana, acompanhei uma aula <strong>da</strong> Keka Morelle cheia de<br />

dicas bacanas. O livro já estava selado, lacrado, dependendo apenas<br />

<strong>da</strong> revisão. Teoricamente, essas manhas deveriam entrar só na versão<br />

2.0. Mas eu achei elas tão úteis que resolvi fazer um puxadinho<br />

no capítulo.<br />

Fale tudo antes<br />

A hora de discutir tudo, absolutamente tudo, é antes do trabalho começar.<br />

Tirar dúvi<strong>da</strong>s sobre como vai ser realizado o trabalho, entender<br />

bem o briefing, brifar bem o fornecedor. Depois que o processo começou,<br />

tudo fica muito mais difícil.<br />

saiBa dizer não<br />

Não fique constrangido. Se o fornecedor não fez como você queria,<br />

diga não. Pior é dizer sim e ter que dizer não logo ali na frente. O não<br />

é um bom amigo do trabalho de excelência.<br />

resigniFique as reFerênCias<br />

Referência, como o próprio nome diz, é uma referência. Não é uma<br />

solução. O papel do criador é entender a referência, mas acrescentar<br />

em cima dela. Se é para simplesmente reproduzir algo que já foi feito<br />

por outra pessoa, a agência não precisa de você.<br />

149


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />

\tenha sua própria voz<br />

Você não é um artista, que cria tudo de um jeito e enfia goela abaixo<br />

dos outros. Mas você pode ter um estilo, uma personali<strong>da</strong>de, um<br />

jeito de trabalhar que ninguém mais tem. E é essa voz que você<br />

deve buscar.<br />

mantenha o entusiasmo<br />

O trabalho brilhante é aquele em que a gente consegue manter o entusiasmo<br />

do início ao fim. Quando os problemas nos fazem perder o<br />

tesão, isso naturalmente se reflete na peça. Não são raras as campanhas<br />

que começam lin<strong>da</strong>s e vão murchando, murchando, até ficarem<br />

mornas e sem graça.<br />

dicas bem práticas.<br />

1. a Folha em BranCo é sua inimiga.<br />

aCaBe Com ela o mais rápido possível.<br />

Costuma funcionar comigo. Logo que eu começo um brain, trato de<br />

escrever a primeira ideia que me vem à cabeça. Normalmente, esse<br />

é um gatilho para que o meu cérebro enten<strong>da</strong>: OK, agora entramos<br />

no trabalho.<br />

2. FiCar Conversando numa salinha não é Brain.<br />

Brainstorming é um processo de solução de problemas de insight. Por<br />

ser o mais popular dentro <strong>da</strong>s agências de propagan<strong>da</strong>, parece ser o<br />

único. Mas não é: existem outros, como o Seis Chapéus, o Release<br />

Thinking, o Matrix Game (criado pela Cubo.cc), entre muito outros.<br />

Brainstorming não é passar o dia numa salinha, conversando sobre a<br />

vi<strong>da</strong>. Brainstorm não é ficar só falando coisas sem sentido. Brainstorm<br />

ingdá trabalho.<br />

Por mais contraditório que pareça, Brainstorming exige uma certa disciplina.<br />

Quer ter bons brains? Estude o processo.<br />

3. na hora de Criar, ligue o Fo<strong>da</strong>-se. na hora de eXeCutar,<br />

nunCa ligue o Fo<strong>da</strong>-se.<br />

Uma coisa é certa: no brain, o seu filtro deve ser muito permissivo.<br />

Na<strong>da</strong> de criticar o seu dupla. Na<strong>da</strong> de fazer avaliações instantâneas.<br />

Sua mente tem que estar relaxa<strong>da</strong>.<br />

151


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />

Portanto, durante o brain, ligue o fo<strong>da</strong>-se.<br />

Agora, na hora de executar a ideia, e encontrar a melhor forma para<br />

concretizá-la, não relaxe. Leve o acabamento ao limite. Se você estiver<br />

cansado, louco para ir para casa, mas ain<strong>da</strong> não está totalmente<br />

satisfeito com o resultado, pegue um café e volte ao computador.<br />

Durante a execução, nunca ligue o fo<strong>da</strong>-se.<br />

4. registre as ideias.<br />

Primeiro, porque se você não anotar, pode esquecer.<br />

Segundo, porque verbalizar/desenhar/rafear/documentar a sua ideia<br />

é a senha para que o seu cérebro pense: Beleza, posso partir para a<br />

próxima.<br />

5. leia muito soBre o assunto antes<br />

de Começar a Criar: inCuBação.<br />

Eu tenho um monte de ideias tomando banho. Eu tenho um monte de<br />

ideias dirigindo.<br />

Ou, melhor: Eu sou aquela pessoa que está pensando na vi<strong>da</strong> e, de<br />

repente, dá um estalo.<br />

Vou contar um segredo para você: todo mundo tem ideias tomando<br />

banho, dirigindo. Todo mundo tem estalos. Esse é um processo natural<br />

na resolução dos problemas de insight (se eu não falei até agora,<br />

anotem: peças publicitárias normalmente são problemas de insight).<br />

Uma etapa natural, que vem antes do estalo, é a incubação. Quanto<br />

mais informação você tiver, maiores as chances de você encontrar um<br />

evento precipitador que cruze A com B – e resulte na sua ideia genial.<br />

6. não insista demais em determinado tema.<br />

Não quero parecer chato com esse papinho de problemas de insight,<br />

mas a maioria deles se resolve através desse estalo. É uma coisa meio<br />

assim: pá-pum.<br />

Então, quando você insiste demais em determinado tema (Acho que<br />

tem alguma coisa com dinossauro...Tô com um cutuco que dinossauro<br />

rende alguma coisa... Desculpa insistir, mas e se fosse um lance com<br />

dinossauro?), você está reduzindo drasticamente a sua chance de ter<br />

uma boa ideia.<br />

153


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 6 – melh0rando o seu trabalho<br />

por fim, a dica mais<br />

importante de to<strong>da</strong>s:<br />

trabalhe com gente boa.<br />

Isso sim faz diferença na sua vi<strong>da</strong>. Se aproxime dos bons, ouça o que<br />

eles dizem e, por um tempo, siga os conselhos dos caras. Normalmente<br />

dá certo.<br />

155


capÍtulo 7


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />

pequena introdução.<br />

Um bom criador, há quinze anos, não precisava nem ter e-mail. Hoje<br />

em dia, a maioria <strong>da</strong>s entrevistas para trabalhar numa agência são<br />

marca<strong>da</strong>s por e-mail.<br />

Talvez você, que é de outra geração, não enten<strong>da</strong> bem isso. Mas a<br />

propagan<strong>da</strong> está se reinventando nesses últimos anos. E você é quem<br />

vai fazer essa mu<strong>da</strong>nça.<br />

tenha uma Vi<strong>da</strong> digital atiVa.<br />

Nativo ou imigrante, você tem que ter que se relacionar bem com as<br />

mídias sociais. E aí, não importa se você não gosta muito de fuçar no<br />

Facebook, de trocar DM no Twitter ou de ficar stalkeando o Google+<br />

<strong>da</strong>quela gostosa.<br />

Não tem jeito: é trabalho.<br />

E não adianta você usar uma, duas vezes e achar que Já entendi como<br />

funciona. É um pouco mais complicado que isso. Internet é relacionamento,<br />

e isso significa entender os códigos, a conduta e o comportamento<br />

do usuário nessas plataformas. Porque ca<strong>da</strong> uma tem uma<br />

lógica, uma estética e as suas consequentes pia<strong>da</strong>s internas.<br />

Além disso, tudo mu<strong>da</strong> muito rápido. O que é novo hoje, fica velho<br />

amanhã, e pode voltar a ser novo na semana seguinte.<br />

159


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />

use o seu trabalho<br />

autoral como laboratório.<br />

Um bom jeito de se familiarizar com as novas mídias é desenvolver<br />

um trabalho autoral, em paralelo ao seu trabalho do dia-a-dia. Dessa<br />

maneira, você tem menos responsabili<strong>da</strong>des. Se der errado, ninguém<br />

vai ser demitido.<br />

E se der certo, bom: aí você tem um grande case no portfólio.<br />

Em 2007, o Felipe anghinoni criou junto com outros amigos o Bronze<br />

Brasil, Blog que sacaneava o desempenho dos atletas brasileiros<br />

no Pan.<br />

Essa brincadeira já seria uma ótima maneira de aprender a administrar<br />

um Blog com vários colaboradores e diversas postagens diárias. Mas<br />

o Bronze Brasil estourou, saiu na grande mídia e virou um webhit.<br />

No meu caso, já experimentei várias ideias para Youtube. Pelo menos<br />

quatro tiveram algum potencial viral, ultrapassando os 50 mil views. O<br />

último, lançado há quinze dias, bateu hoje nos 45 mil.<br />

E o keko? É que, na hora de levarmos isso para nossos conteúdos de<br />

marca, os aprendizados dos vídeos aju<strong>da</strong>ram muito. O nosso primeiro<br />

movimento no Youtube ultrapassou os 190 mil views. No segundo<br />

(uma série de seis episódios), pelo menos três ultrapassaram 100 mil<br />

views.<br />

Claro: esses números estão longe de um Pôneis Malditos. E, fazendo<br />

uma análise crítica, a gente acha que poderia melhorar muita coisa.<br />

Mas também não dá para dizer que não houve algum tipo de mérito.<br />

manje um mÍnimo<br />

de tecnologia.<br />

Você não precisa ser um geek. Você não precisa saber a última novi<strong>da</strong>de<br />

do blog mais espertinho <strong>da</strong>s coisas mais tecnológicas do mundo.<br />

Agora, você também não pode ser o último a saber <strong>da</strong>s novi<strong>da</strong>des.<br />

O motivo é bem lógico: sempre que surge uma nova tecnologia, o<br />

simples fato de colocar essa tecnologia numa ideia publicitária já tem<br />

impacto suficiente para chamar a atenção.<br />

Se a tecnologia vinga e começa a se popularizar, é natural que outras<br />

marcas também comecem a criar ideias para essa plataforma. E é aí<br />

que complica: se aumenta concorrência, não basta mais ter uma ideiazinha<br />

qualquer. Você vai ter que caprichar para chamar a atenção.<br />

Veja o exemplo do comercial <strong>da</strong> Toshiba. Eles apresentaram, pela primeira<br />

vez num filme de televisão, a tecnologia Timesculpture (algo parecido<br />

com o efeito bullet time do Matrix, procure no Youtube).<br />

Tem ideia? Tem. Mas ela é um pouco diferente <strong>da</strong>s ideias publicitárias<br />

tradicionais. Ela impressiona mais pelo visual, pela apresentação<br />

<strong>da</strong> tecnologia em si, do que por um raciocínio conceitual, com início,<br />

meio e fim.<br />

Moral <strong>da</strong> história: quando a tecnologia ain<strong>da</strong> é incipiente, você nem<br />

precisa ter uma grande ideia. A tecnologia já é a ideia.<br />

161


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />

fique esperto no que<br />

está bombando.<br />

De alguma forma, você tem que sacar o que está sendo comentado<br />

na internet. E aí, não estamos falando necessariamente de tecnologias.<br />

Mas <strong>da</strong>s novas celebri<strong>da</strong>des, <strong>da</strong>s pia<strong>da</strong>s internas, dos últimos webhits.<br />

Lembra quando começaram a aparecer os primeiros Literal Videos (videoclipes<br />

que literalizavam as imagens nas suas letras)? A linguagem<br />

era um prato cheio para qualquer marca, de qualquer segmento, de<br />

qualquer parte do mundo. Quem estivesse ligado, poderia se apropriar<br />

dessa estética e sugar todo o recall que ela tinha na web.<br />

apren<strong>da</strong> coisas que<br />

pouca gente sabe.<br />

Muitos criadores <strong>da</strong> velha geração falam, de forma até um pouco desinforma<strong>da</strong>,<br />

que é impossível planejar um “viral”.<br />

Evidente que existe técnica por trás de um “viral”, que aumenta consideravelmente<br />

a sua margem de sucesso. Agora, um profissional<br />

consagrado, com uma penca de prêmios de propagan<strong>da</strong> offline, talvez<br />

não tenha paciência para sentar, ouvir e aprender. Se reciclar não<br />

é fácil.<br />

É aí, é nessas brechas que você pode criar boas oportuni<strong>da</strong>des.<br />

E se tornar uma figura importante dentro <strong>da</strong> agência.<br />

Assim como o “viral”, existem muitas outras estratégias de comunicação<br />

e relacionamento digital que ain<strong>da</strong> estão engatinhando no Brasil.<br />

Você pode sair na frente.<br />

E só para explicar as aspas: “viral” é um adjetivo, não um substantivo.<br />

Portanto, não existe “crie um viral”. É como dizer: “crie um<br />

jingle chiclete”.<br />

163


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />

multidisciplinari<strong>da</strong>de.<br />

Na agência de propagan<strong>da</strong> antigas, os profissionais tinha que ser<br />

grandes especialistas nas suas áreas. O re<strong>da</strong>tor tinha que escrever<br />

muito bem, e só. O Layoutman tinha que fazer uma bela arte, e só. E<br />

tanto é ver<strong>da</strong>de que os dois nem sentavam juntos: ca<strong>da</strong> um ficava<br />

numa sala diferente.<br />

Não existia troca, não existiam vasos comunicantes. Era ca<strong>da</strong> um<br />

por si.<br />

Esse perfil foi sendo transformado, mas a herança do especialista ain<strong>da</strong><br />

existe em algumas agências mais old school.<br />

Acho que o perfil do profissional multidisciplinar vai, aos pouquinhos,<br />

substituir o especialista-mega-especializado.<br />

Se você também pensa assim, tem tudo para se <strong>da</strong>r bem.<br />

na dúVi<strong>da</strong>, siga a bússola.<br />

Se antigamente quem ditava a propagan<strong>da</strong> mundial era o Grand Prix<br />

de Film e de Press & Poster, ultimamente se criaram novas categorias<br />

que são muito mais ba<strong>da</strong>la<strong>da</strong>s.<br />

Exemplo? o Titanium Lions.<br />

O Titanium nasceu a partir do BMW Films, série com vários curtas metragens,<br />

dirigidos por nomes consagrados de Hollywood. Um projeto<br />

que chacoalhou e rediscutiu to<strong>da</strong> indústria <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>. O prêmio<br />

era só uma formali<strong>da</strong>de.<br />

O único problema é que ele não se encaixava em nenhuma <strong>da</strong>s categorias<br />

vigentes no Festival de Cannes. Tiveram que criar uma só para isso.<br />

Aí nasceu o Titanium.<br />

Logo depois do Titanium, nasceram muitas categorias. Algumas, na<br />

minha opinião, até um pouco contraditórias.<br />

O importante não é se ligar nos detalhes, mas no espectro geral. Para<br />

os caras de Cannes, só vale a pena lançar uma categoria quando já há<br />

trabalho relevante na categoria.<br />

Portanto, fique atento. Se amanhã surgir a categoria “Google Glass<br />

Ad”, é porque já tem bastante gente anunciando nessa plataforma.<br />

165


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />

big idea.<br />

Os novos formatos de Cannes valorizam a chama<strong>da</strong> Big Ideia: um<br />

conceito que se desdobre para várias mídias. A Crispin+Porter, Bogusky<br />

é uma agência famosa por criar dentro desse formato. Você<br />

pode procurar na internet os cases do Whopper Freakout, por exemplo.<br />

Nessa ação, um restaurante <strong>da</strong> rede Burger King simplesmente<br />

tirou de circulação o seu sanduíche mais famoso, o Whopper. Quando<br />

os clientes chegavam, recebiam a notícia de que o clássico havia<br />

sido descontinuado.<br />

Bizarro, né?<br />

Pois foi justamente essa estranheza que gerou um grande bafafá,<br />

valorizou o produto e se transformou num grande case <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong><br />

moderna.<br />

Outro case interessantíssimo é Tap Project desenvolvido pela Droga5.<br />

É legal justamente pela simplici<strong>da</strong>de e pelos resultados contundentes.<br />

Os dois são ótimas referências. Não só do que é bom, mas do que é<br />

considerado o norte <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> mundial.<br />

jj + pk + st.<br />

Esses dias, o Carlos Merigo (que é mais conhecido pelo seu blog,<br />

o #Brainstorm9) veio falar com a gente e apresentou um raciocínio<br />

muito bacana.<br />

Ele acredita que o criador do futuro é uma mistura de J.J. Abrams,<br />

Philip Kotler e Star Trek. Ou seja: temos que fundir, ca<strong>da</strong> vez mais, o<br />

lado entretenimento, com o marketing, com a tecnologia.<br />

Eu adorei essa visão. Acho que é bem por aí: a propagan<strong>da</strong> vai ter<br />

ca<strong>da</strong> vez menos cara de propagan<strong>da</strong>, mas isso não significa que ela<br />

vai deixar de ser propagan<strong>da</strong>. No final <strong>da</strong>s contas, tem que vender.<br />

O conhecimento tecnológico, como já falei há algumas páginas atrás,<br />

vai ser uma expertise Sine Qua Non para a boa criação. No momento<br />

em que o consumidor está (por exemplo) procurando restaurante via<br />

um aplicativo de Iphone, como que a gente faz? Se mete no meio,<br />

como fazia antigamente? Ou tenta ser tão útil, interativo e divertido?<br />

O cara esperto tem que estar muito esperto para essas as novas<br />

espertices.<br />

167


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 7 – o novo criador<br />

para fechar, um boa<br />

notÍcia: Você está ViVendo<br />

o momento mais legal <strong>da</strong><br />

história <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>.<br />

Esse é um raciocínio que o Vinícius Malinoski apresentou numa aula<br />

<strong>da</strong> Perestroika – e eu concordo totalmente.<br />

As possibili<strong>da</strong>des hoje são praticamente infinitas, e só vão ficar ain<strong>da</strong><br />

mais diverti<strong>da</strong>s <strong>da</strong>qui para frente.<br />

Pense comigo: o celular, os games, a TV digital, o cinema 3D, o GPS,<br />

a reali<strong>da</strong>de aumenta<strong>da</strong>. Tudo isso ain<strong>da</strong> vai evoluir e impactar diretamente<br />

no trabalho dos publicitários.<br />

o portfólio do<br />

noVo criador.<br />

Como falamos antes: agora, o novo padrão do mercado são as chama<strong>da</strong>s<br />

Big Ideas.<br />

Na ver<strong>da</strong>de, esse é um conceito antigo – muitas grandes campanhas<br />

do passado eram Big Ideas, só não tinham esse nome – que foi reciclado<br />

e agora é o objetivo de todo criador de agência de propagan<strong>da</strong>.<br />

Pois bem: um portfólio de Big Ideas é difícil de se conceber. A melhor<br />

maneira de apresentar isso é através de cases. Então, se você quer<br />

montar uma pasta mais moderninha, leve pelo menos um case de<br />

uma Big Idea.<br />

Você pode apresentar através de um vídeo, com uma lâmina que explique<br />

to<strong>da</strong>s as ações ou simplesmente inventar um jeito novo. Não existe<br />

padrão. E se a ideia for boa, isso se torna menos relevante ain<strong>da</strong>.<br />

169


capÍtulo 8


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

existe um ditado que diz.<br />

Pessoas espertas aprendem com os próprios erros. Pessoas muito espertas<br />

aprendem com os erros dos outros.<br />

Por isso, resolvi contar com mais de detalhes o meu início de carreira.<br />

Não serve para seguir à risca. Serve muito mais para você evitar (e rir)<br />

<strong>da</strong>s caga<strong>da</strong>s que eu fiz.<br />

o plano.<br />

Sempre quis ser re<strong>da</strong>tor, desde o primeiro dia de propagan<strong>da</strong>. E tentando<br />

alcançar esse objetivo, tive uma estratégia diferente <strong>da</strong> maioria<br />

dos meus contemporâneos.<br />

Não tentei uma vaga como assistente de Re<strong>da</strong>ção logo de cara. Achei<br />

que o melhor seria aprender outras coisas liga<strong>da</strong>s à criação.<br />

Áreas afins, que me fariam um re<strong>da</strong>tor melhor no futuro.<br />

173


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

o primeiro estágio.<br />

Meu primeiro emprego foi aos 17 anos, num jornal-piloto. Eu escrevia<br />

matérias, participava <strong>da</strong> diagramação e criava os anúncios que iam<br />

nos ro<strong>da</strong>pés <strong>da</strong>s páginas.<br />

Aí, você vai me perguntar: Como que um estagiário de publici<strong>da</strong>de<br />

escrevia matérias para um jornal? Isso não é proibido?<br />

Pois é: eu demorei um mês para me <strong>da</strong>r conta desse pequeno detalhe.<br />

Estava tão empolgado com o primeiro estágio que nem perguntei muita<br />

coisa. Já saí escrevendo.<br />

O jornal era picaretagem pura. O dono não dizia na<strong>da</strong> com na<strong>da</strong> e só<br />

man<strong>da</strong>va eu escrever. Quando eu comecei a desconfiar, ele veio com<br />

um papo de me transferir para a Europa com salário de US$ 3.000,00.<br />

Aproveitei que a história estava ficando nebulosa e desapareci no meio<br />

<strong>da</strong> fumaça. Nunca vi essa grana. Por sinal, nunca vi grana nenhuma.<br />

Mas eles também nunca mais ouviram falar de mim.<br />

rompendo o hÍmen.<br />

Sou <strong>da</strong> teoria que, se você ain<strong>da</strong> não trabalha, deve aceitar qualquer<br />

proposta de emprego. O primeiro trampo é apenas uma boa forma de<br />

perder a virgin<strong>da</strong>de profissional. Você começa a entender como o mundo<br />

real é. E percebe que ele é bem diferente <strong>da</strong>s relações que você tem<br />

com seus pais, com seus amigos, com seus colegas e professores.<br />

Arranje logo um primeiro emprego. Você não quer ser um virgem de<br />

40 anos, quer?<br />

Por sinal, não crie muitas expectativas sobre o seu primeiro emprego.<br />

É mais ou menos como imaginar que a sua primeira vez vai ser a melhor<br />

transa <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>.<br />

Se o seu primeiro emprego for ruim, ain<strong>da</strong> assim será ótimo.<br />

175


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

o segundo estágio.<br />

Antes mesmo do meu primeiro estágio, eu descobri que um amigo do<br />

meu pai era sócio de uma gráfica. Pedi um estágio na cara-dura. Deu<br />

a coincidência dos caras me chamarem em janeiro, alguns dias depois<br />

de eu desistir do jornal.<br />

Meu contrato era de apenas dois meses. As aulas começavam em<br />

março e, como o trabalho era em turno integral, e eu estu<strong>da</strong>va de<br />

manhã, não tinha escolha.<br />

Naquela época, não me <strong>da</strong>va conta que estu<strong>da</strong>r de manhã era um<br />

atraso profissional. (Se você estu<strong>da</strong> de manhã, peça transferência o<br />

quanto antes. Você está diminuindo em mais de 50% as suas chances<br />

de conseguir uma vaga num lugar legal.)<br />

Imaginei que, passando um tempo numa gráfica, eu poderia aprender<br />

mais sobre o processo de impressão. Só que a gráfica não fazia muitos<br />

trabalhos publicitários. Ela imprimia, basicamente, livros. Sempre<br />

com o mesmo papel, sempre PB, sempre nos mesmos formatos.<br />

Meu objetivo foi para o beleléu. Mas, sem querer querendo, aprendi<br />

naqueles dois meses uma coisa ain<strong>da</strong> mais interessante.<br />

um estudo antropológico.<br />

Ao contrário do que você pode imaginar, eu não ia para a parte administrativa<br />

<strong>da</strong> gráfica. Eu não ficava num escritório, com ar-condicionado,<br />

aju<strong>da</strong>ndo em tarefas burocráticas.<br />

Eu fui para o chão <strong>da</strong> fábrica.<br />

Só que as tarefas eram absolutamente mecânicas e fáceis de resolver,<br />

mesmo para uma pessoa recém chega<strong>da</strong>. Com isso, tive bastante<br />

tempo livre para conhecer melhor meus colegas de setor.<br />

Depois de algumas semanas, eu já estava bem entrosado com a galera.<br />

Cumprimentava todo mundo pelo nome, trocava uma ideia na hora<br />

do almoço. Até jogar bola com os caras eu joguei.<br />

Mas não foi sempre assim.<br />

No início, eu senti na pele o preconceito racial. Eu era um dos poucos<br />

funcionários brancos. E certamente o único de classe média (mesmo<br />

usando uniforme, <strong>da</strong>va para perceber que eu era filhinho de papai).<br />

Um alvo fácil para pia<strong>da</strong>s, sacanagens e apelidos semitas.<br />

Nos primeiros dias, eu me senti tão mal que estacionava o carro bem<br />

longe, para ninguém ver que eu tinha um Gol zero.<br />

Foi bom ver o outro lado <strong>da</strong> moe<strong>da</strong>. Me ensinou a ser mais humilde e<br />

mais humano. Um choque de reali<strong>da</strong>de que estourou a bolha onde eu<br />

vivi durante anos e anos.<br />

177


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

Mas o mais legal foi conhecer os gostos, os interesses, os valores de<br />

um grupo de pessoas com o qual eu nunca conviveria se não tivesse<br />

trabalhado lá.<br />

Só para citar um dos milhares de exemplos marcantes: logo que fui<br />

apresentado, um dos funcionários me perguntou.<br />

— Colorado ou gremista?<br />

— Colorado.<br />

— Imperadores ou Bambas?<br />

Carnaval para mim era apenas um feriado onde eu viajava, enchia<br />

a cara e tentava marcar muitos pontos. Imperadores, Bambas, Salgueiro<br />

ou Viradouro, isso não tinha a menor importância. Carnaval<br />

era gan<strong>da</strong>ia.<br />

Para eles, Carnaval era coisa séria.<br />

entretanto.<br />

A minha família tinha programado uma puta viagem para o Exterior<br />

para a mesma época. Daquelas grandes e inesquecíveis.<br />

Eu, obviamente, estava convi<strong>da</strong>do. Mas na época, eu era um legítimo<br />

Abobadinho <strong>da</strong> Propagan<strong>da</strong>. Tão abobadinho que não podia perder a<br />

chance de conhecer mais sobre o processo gráfico.<br />

Por mais legal e recompensador que essa experiência profissional tenha<br />

sido para a minha vi<strong>da</strong> e para a minha carreira, a viagem com a<br />

minha família era algo especial.<br />

Abrir mão disso foi uma burrice sem tamanho. E também me ensinou<br />

uma lição.<br />

179


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

lição.<br />

Nunca deixe de fazer algo que vai ficar marcado pelo resto <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong><br />

por causa de trabalho.<br />

Não deixe de acompanhar o nascimento do seu filho. Não falte ao casamento<br />

do seu melhor amigo. Não perca a formatura do seu irmão.<br />

Nenhum emprego, nenhuma agência, ninguém paga tão bem para<br />

que você abra mão <strong>da</strong>s coisas que não têm preço.<br />

o terceiro estágio.<br />

No jornal-picareta-piloto, fiz amizade com uma estu<strong>da</strong>nte de RP. Ela<br />

trabalhava numa agência minúscula, que era dividi<strong>da</strong> em duas áreas.<br />

De um lado, o departamento de Relações Públicas, onde ela assistia<br />

à RP Sênior, sócia do negócio. Do outro lado, era o departamento de<br />

propagan<strong>da</strong>. Onde ficava o outro sócio e um estagiário.<br />

Eu.<br />

Me interessei pela vaga justamente porque era uma legítima Eugência.<br />

Eu fazia tudo. Ia no banco. Atendia o telefone. Preparava o cafezinho.<br />

Man<strong>da</strong>va fax com os comprovantes de veiculação. Criava os títulos,<br />

os textos, layoutava e finalizava os anúncios.<br />

Neste caso específico, o que mais me interessava era aprender a<br />

mexer nos programas de Direção de Arte. Sempre acreditei que um<br />

criador só seria completo se ele fosse capaz de criar e executar as<br />

suas ideias.<br />

E aí vai a primeira dica do terceiro estágio.<br />

181


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

primeira dica do<br />

terceiro estágio.<br />

Se você é re<strong>da</strong>tor, você não pode depender do seu diretor de arte.<br />

Esse é um vício muito comum. Tem re<strong>da</strong>tor que não sabe as funções<br />

básicas do Photoshop. Tem re<strong>da</strong>tor que nem sabe abrir o Photoshop.<br />

Dominar as ferramentas de manipulação e diagramação fazem com<br />

que você crie melhor. Só praticando direção de arte é que você entende<br />

conceitos importantes de alinhamento, agrupamento e hierarquia.<br />

Em suma, você só consegue criticar com mais autori<strong>da</strong>de o layout do<br />

seu dupla se tiver futricado, pelo menos um pouquinho, nos programas.<br />

Do ponto de vista prático, tem mais uma vantagem. Você não precisa<br />

ficar mendigando para que o seu diretor de arte faça JPGs <strong>da</strong>s<br />

suas peças, ou grave um DVD com o seu portfólio. Se você dominar<br />

o básico do Photoshop e do Illustrator (ou um similar), vai ser um<br />

criador independente.<br />

Para finalizar, eu acredito que um criador tem que ser capaz de colocar<br />

em prática as suas ideias.<br />

Durante o período que estive na Miami Ad School (chegaremos lá), não<br />

foram poucas vezes que eu sentei no computador e criei tudo sozinho.<br />

É evidente que você não precisa se sofisticar ao ponto de virar um<br />

Diretor de Arte de ver<strong>da</strong>de. Eu, por exemplo, investi apenas dois anos<br />

<strong>da</strong> minha carreira, e decidi parar quando atingi o meu objetivo.<br />

O inverso também é ver<strong>da</strong>deiro. Diretor de Arte que não sabe escrever,<br />

que não sabe fazer título, que não sabe roteirizar um spot, fica totalmente<br />

dependente do dupla.<br />

O Rafa Bohrer, meu dupla por muitos anos, é um bom exemplo do<br />

criador completo. Além de ser um fenômeno como Diretor de Arte, ele<br />

sempre escreveu títulos e conceitos tão bons quanto qualquer re<strong>da</strong>tor<br />

experiente. Já vi ele criar textos invejáveis. Mais de uma vez.<br />

A moral é que você tem que ser um especialista, mas também tem que<br />

ser um generalista. Por mais contraditório que isso possa parecer.<br />

183


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

segun<strong>da</strong> dica do<br />

terceiro estágio.<br />

Construir uma network sóli<strong>da</strong> é um talento. E usar esses contatos com<br />

sabedoria é um talento ain<strong>da</strong> maior.<br />

A maioria absoluta dos estagiários entra na agência a partir de uma<br />

indicação. Os profissionais mais experientes, com poder de contratação,<br />

não têm contato com os estu<strong>da</strong>ntes dos primeiros semestres.<br />

Alguém precisa fazer esse meio campo.<br />

Boa parte <strong>da</strong>s vezes, as indicações são feitas diretamente para a pessoa<br />

que está contratando. Tenho um amigo que se interessa pela vaga.<br />

Vou pedir para ele man<strong>da</strong>r a pasta.<br />

Mas existe também uma rede de indicações muito mais poderosa,<br />

que circula por listas de e-mail, invade os Twitters, vira postagem<br />

no Facebook.<br />

Fulano me contou que Ciclano ouviu falar que estão procurando alguém<br />

na agência Tal.<br />

Nesse caso, nem sempre vence o mais forte. Às vezes, vence o<br />

mais rápido.<br />

Dependendo do caso, a agência precisa de um estagiário para ontem.<br />

Se você tiver uma ótima pasta, mas só ficar sabendo <strong>da</strong> oportuni<strong>da</strong>de<br />

depois de amanhã, pode ser tarde.<br />

o quarto estágio.<br />

A vantagem de uma Eugência é que você aprende a ser meio Homemban<strong>da</strong>:<br />

faz de tudo um pouco. Participa de to<strong>da</strong>s áreas e descobre<br />

qual é a sua preferi<strong>da</strong>. Você suja as mãos, perde eventuais frescuras<br />

e endurece o couro.<br />

A desvantagem de uma Eugência é que você faz tudo. E chega uma<br />

hora que enche o saco.<br />

Outra coisa ruim <strong>da</strong> Eugência é que, normalmente, os criadores não<br />

são lá caras muito competentes. São uns faça-você-mesmo, que<br />

aprenderam aos trancos e barrancos. Cheios de vícios e com olhares<br />

pouco profissionais do negócio.<br />

No início, você até aprende a fazer propagan<strong>da</strong>. Mas depois de um<br />

tempo, você aprende a como não fazer propagan<strong>da</strong>.<br />

Passados alguns meses, pedi demissão. Eu não tinha na<strong>da</strong> em vista.<br />

Só achei que o meu prazo de vali<strong>da</strong>de tinha expirado.<br />

E hoje, passados muitos anos, eu diria que existe um tática infalível<br />

para pedir demissão, desde que você tenha envergadura para enfrentar<br />

a situação.<br />

185


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

transparência absoluta.<br />

Passados alguns meses, pedi demissão. Eu não tinha na<strong>da</strong> em vista.<br />

Só achei que o meu prazo de vali<strong>da</strong>de tinha expirado. Pedi para conversar<br />

com o meu chefe.<br />

Recebi uma proposta de uma agência chama<strong>da</strong> ACS. É uma agência<br />

nova, pequena, que vai ser lança<strong>da</strong> por uns amigos do meu pai até o<br />

final do mês. Acho que vai ser uma boa para mim.<br />

Se você procurar na internet, não vai encontrar uma agência chama<strong>da</strong><br />

ACS. Ela não existe. Ela nunca existiu. Ela só existiu durante aquela<br />

rápi<strong>da</strong> conversa.<br />

Eu precisava dê um motivo para não haver resistência por parte do<br />

meu chefe. Do outro lado, ele precisava de um motivo para não se<br />

sentir rejeitado. No final, todos saíram felizes.<br />

Não sinto muito orgulho dessa minha atitude. Não me sinto bem fazendo<br />

essa recomen<strong>da</strong>ção. Mas também não posso ignorar: funcionou.<br />

Portanto, se você quer uma dica <strong>da</strong> Propagan<strong>da</strong> <strong>da</strong>s ruas de “como<br />

pedir demissão, sem ter nenhuma proposta, e não se queimar”, essa<br />

é uma boa estratégia<br />

***<br />

Há pouco tempo, eu tive uma estagiária que pediu as contas.<br />

Estou abrindo um negócio com umas amigas. A coisa está ficando<br />

séria e eu preciso dedicar mais tempo. Infelizmente, ain<strong>da</strong> não posso<br />

revelar o que é. Por mim, eu até falava, mas as minhas sócias pediram<br />

sigilo. Assim que a gente lançar, eu conto.<br />

A primeira coisa que eu pensei foi: Eu conheço esse golpe.<br />

Quando você quiser sair de um lugar, para ficar coçando em casa, a<br />

grande malandragem é criar uma historinha. Capriche no roteiro. Você<br />

tem que criar um cenário onde exista alguma informação que o seu<br />

chefe não possa ter acesso.<br />

No meu caso, eu tinha como trunfo o fato de ser uma empresa dos<br />

amigos do meu pai. Se ele pesquisasse sobre o assunto, nunca acharia<br />

na<strong>da</strong>.<br />

No caso <strong>da</strong> estagiária, ela tinha que manter o sigilo profissional do<br />

próprio negócio.<br />

Ambas histórias são duvidosas. Mas fazem sentido. E se você for um<br />

estagiário sério, com credibili<strong>da</strong>de, e não gaguejar na hora de pedir<br />

demissão, ninguém vai fazer uma sabatina para saber os detalhes.<br />

Mesmo que alguém desconfie, sua saí<strong>da</strong> vai ser aceita. E aceita<br />

com tranquili<strong>da</strong>de.<br />

É como a clássica cena do marido chegando em casa de madruga<strong>da</strong>.<br />

Ele diz que estava numa reunião extraordinária e põe a credibili<strong>da</strong>de à<br />

prova. Se o cara for um bom moço, não estiver com bafo de cerveja,<br />

perfume de mulher ou batom na gola, por que não acreditar?<br />

Você pode usar sua imaginação de criador.<br />

Agora, sinceramente, eu olho hoje para essa minha atitude e não acho<br />

legal. Diria mais: sinto vergonha. A minha recomen<strong>da</strong>ção é justamente<br />

o contrário.<br />

187


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

Se você realmente tiver tranquili<strong>da</strong>de e envergadura para enfrentar o<br />

seu chefe, e ele for um cara legal, a melhor maneira de sair é sendo<br />

transparente.<br />

Como diz o Felipe: a ver<strong>da</strong>de liberta.<br />

O grande problema é que as pessoas não estão prepara<strong>da</strong>s para a<br />

transparência. E que a maioria dos chefes são autoritários e egocêntricos.<br />

Aí, você tem que enfrentar o sistema. E talvez uma “ver<strong>da</strong>de com<br />

açúcar” não seja tão questionável.<br />

Mas não há na<strong>da</strong> melhor do que simplesmente dizer a ver<strong>da</strong>de, botar<br />

a cabeça no travesseiro e dormir tranquilo.<br />

o quinto estágio.<br />

Fiquei alguns dias parado, descansando, mas me entediei rapidinho.<br />

Queria um novo estágio, e não sabia como.<br />

Então, peguei o guia telefônico (naquela época, a internet estava engatinhando,<br />

não existia nenhum tipo de ca<strong>da</strong>stro de agências) e comecei<br />

a ligar uma a uma.<br />

Fui por ordem alfabética. Alô? Eu gostaria de saber: vocês estão procurando<br />

estagiário na área de re<strong>da</strong>ção?<br />

Já na primeira tentativa eu dei pé quente. Os caras queriam justamente<br />

um estagiário para criação. No mesmo dia, fui lá, mostrei alguns<br />

trabalhos, fiz uma espécie de teste vocacional (completamente sem<br />

sentido, diga-se de passagem) e fui selecionado.<br />

Era uma típica agência familiar, onde trabalhavam pai (atendimento),<br />

mãe (espécie de faz-tudo) e os dois filhos (um atendimento e outro<br />

diretor de criação).<br />

Apesar de também ser pequena – devia ter uma dez pessoas –, era<br />

uma evolução para mim. Lá, comecei a entender um pouco <strong>da</strong> dinâmica<br />

de departamentos.<br />

Eles tinham vários estagiários, todos fazendo um misto de direção<br />

de arte e produção. Por causa disso, o nível do trabalho era muito<br />

baixo. Também tinha uma re<strong>da</strong>tora contrata<strong>da</strong>. Mas ela não elevava<br />

muito o padrão: era desinteressa<strong>da</strong>, acomo<strong>da</strong><strong>da</strong> e não fazia quase<br />

na<strong>da</strong> legal.<br />

189


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

Como vocês devem ter notado, a minha vaga era muito mais de Direção<br />

de Arte do que de Re<strong>da</strong>ção. Passava o dia layoutando cartões,<br />

folhetos, tags, placas de esquina e anúncios ro<strong>da</strong>pé. Mas como eu<br />

não me satisfazia muito com os títulos <strong>da</strong> re<strong>da</strong>tora, comecei a sugerir<br />

opções em paralelo. Queria mostrar para eles que eu era capaz de<br />

fazer as duas coisas.<br />

E aí, eu naturalmente comecei a me destacar no meio dos outros estagiários.<br />

Enquanto todo mundo só fazia o que era pedido, eu ia além.<br />

Layoutava o que me man<strong>da</strong>vam – sempre muitas e muitas opções – e<br />

depois ficava lá, sugerindo títulos e outras ideias.<br />

Virei o queridinho do diretor de criação – o que não chegava a ser uma<br />

grande façanha, já que o resto do pessoal fazia um trabalho muito<br />

burocrático. Mas antes mesmo de colher os frutos desse reconhecimento,<br />

pedi as contas e fui embora.<br />

O lugar tinha um vibe estranha. A matrona tratava os estagiário como<br />

filhos, mas pelo lado ruim. Estava sempre xingando alguém, e sempre<br />

além do limite profissional. O atendimento tinha um jeito meio estranho.<br />

E o diretor de criação, segundo boatos, tinha um rolo que eu<br />

prefiro nem relatar aqui.<br />

Foram apenas três meses. Mas foram bem proveitosos. Como eu passava<br />

o dia layoutando, aprendi na marra a mexer nas ferramentas de<br />

layout. Posso até dizer que foi ali que eu aprendi a layoutar.<br />

A layoutar mal, mas aprendi.<br />

mãe dinah.<br />

Quando avisei que estava indo embora, falei para a publicitária-mãe.<br />

Estou indo trabalhar na Zeppelin. O que acabou sendo uma previsão<br />

de fazer inveja a qualquer jogador de búzios.<br />

Pouco tempo depois, eu realmente consegui um estágio na Zeppelin.<br />

Não por coincidência: eu tinha muitos amigos <strong>da</strong> facul<strong>da</strong>de por lá.<br />

Amigo indica amigo, que indica amigo, que me indicou.<br />

Como a tarefa que eu iria realizar não tinha nenhum pré-requisito, além<br />

de um teleencéfalo minimamente desenvolvido e de um polegar opositor,<br />

minha pasta não serviu para na<strong>da</strong>.<br />

Repare: o que me colocou lá dentro foi apenas o network, já falado<br />

neste guia.<br />

Este foi – disparado – o melhor estágio que eu poderia desejar para<br />

a minha formação como criador. E tudo o que eu precisei foi só um<br />

pouco de sorte, alguns bons contatos e perceber uma grande oportuni<strong>da</strong>de<br />

onde pouca gente percebeu.<br />

191


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

o sexto estágio.<br />

A Zeppelin é uma <strong>da</strong>s maiores produtoras de comerciais do Brasil. Na<br />

época, ela já era respeita<strong>da</strong> no mercado local, e estava começando a<br />

trabalhar de maneira mais constante com agências de São Paulo.<br />

Como to<strong>da</strong> produtora que se preze, ela tinha um arquivo, onde ficavam<br />

to<strong>da</strong>s as fitas VHS e Betas. Esse departamento era gerenciado<br />

por uma menina chama<strong>da</strong> Gabriela, que sabia de cor onde estavam<br />

todos os filmes.<br />

– Gabi, onde está o comercial Bola<strong>da</strong> Pepsi? – Naquela beta grande,<br />

que fica na última prateleira, atrás de uma pilha de fitas virgens.<br />

Só que um dia a Gabriela pediu as contas, e todo o arquivo <strong>da</strong> produtora<br />

teve que ser catalogado. Alguém teria que ver fita a fita, filme a<br />

filme, ca<strong>da</strong>strar um a um, com a secun<strong>da</strong>gem exata e breve descrição<br />

do comercial.<br />

E esse alguém era eu.<br />

Em outras palavras: eu tive oportuni<strong>da</strong>de de ver todo o acervo <strong>da</strong><br />

produtora. Desde os comerciais mais antigos aos mais modernos. Vi<br />

as fitas brutas, com as imagens não monta<strong>da</strong>s. Vi as matrizes, com<br />

os comerciais editados. Vi uma coleção inteira de Shots e Latin Spots,<br />

com comerciais estrangeiros premiados no mundo inteiro. Vi animações.<br />

Vi curtas metragens. Vi longas. Vi a história <strong>da</strong> Zeppelin. Vi a<br />

história <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> gaúcha.<br />

Tive acesso a referências que nenhum estagiário na minha i<strong>da</strong>de poderia<br />

ter. Eu estava no lugar certo, na hora certa.<br />

Além de catalogar as fitas, também tinha que fazer to<strong>da</strong>s as cópias <strong>da</strong><br />

produtora. Era meio chato, especialmente porque eu tinha que pedir<br />

licença para o pessoal <strong>da</strong> finalização (a dupla <strong>da</strong> época nunca me<br />

tratou com, digamos, muita consideração).<br />

Mas eu não estava nem aí. Fazer as cópias e aturar o mau humor<br />

alheio era um preço pequeno para tudo o que eu estava absorvendo.<br />

Pude perceber a evolução <strong>da</strong> fotografia, do tratamento <strong>da</strong> imagem,<br />

<strong>da</strong> montagem. Lá nos primórdios <strong>da</strong> Zeppelin, era tudo muito simples.<br />

Mas à medi<strong>da</strong> que a produtora ia crescendo, a sofisticação e o acabamento<br />

dos filmes iam ficando absolutamente nítidos.<br />

Eu era um bom estagiário. Apesar de alguns erros crassos – como enviar<br />

para a Globo um comercial errado, que felizmente foi trocado a tempo –,<br />

eu era um bom estagiário. Era voluntarioso e não afrouxava nunca.<br />

Por exemplo: uma vez, precisaram de alguém para <strong>da</strong>r uma força na<br />

produção de um comercial de cerveja. Não tinham quem convocar, e<br />

lá fui eu. Virei duas noites segui<strong>da</strong>s (isso não é figura de linguagem)<br />

mesmo não sendo minha função. E no outro dia, eu estava de pé, na<br />

produtora, fazendo as cópias e catalogando os comerciais. Por essas<br />

e outras, foram soltando a cor<strong>da</strong>. Comecei a digitalizar alguns materiais<br />

para montagem. Comecei a ser melhor recebido pelo pessoal <strong>da</strong> finalização.<br />

Começaram a pintar oportuni<strong>da</strong>des para que eu crescesse por lá.<br />

Mas você devem lembrar:<br />

Meu objetivo era ser re<strong>da</strong>tor. Então, nenhuma dessas possibili<strong>da</strong>des<br />

me comoveu muito. Pelo contrário: antes de assumir um compromisso<br />

lá dentro, saltei fora. Eu tinha um outro compromisso, comigo mesmo.<br />

Começava a última etapa do meu plano.<br />

193


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

perÍodo de reclusão.<br />

Sabe quando o vilão perde para o mocinho, desaparece por um tempo<br />

e, depois, ele volta muito mais poderoso? Aqueles trailers que dizem:<br />

He’s back!<br />

Pois eu queria fazer meio isso. Sair de circuito por um tempo e fortalecer<br />

a minha pasta. Para, quando voltasse a apresentá-la nas agências,<br />

tivesse um material mais maduro.<br />

Sentei a bun<strong>da</strong> na cadeira e, ao longo de dois meses, montei a melhor<br />

pasta que eu poderia produzir dentro <strong>da</strong>s minhas limitações. Eu<br />

praticamente <strong>da</strong>va expediente, só que em casa. Trabalhava to<strong>da</strong>s as<br />

tardes religiosamente. (À noite, eu saía com meus amigos. De manhã,<br />

curava a ressaca. Ninguém é de ferro.)<br />

Foi um dos períodos mais produtivos, talvez o mais produtivo, do meu<br />

início de vi<strong>da</strong> profissional. Eu era uma máquina. Ou melhor: uma maquininha,<br />

já que tinha um critério muito ingênuo na época.<br />

Produzia anúncios em série, praticamente um por dia. Fazia tudo. A<br />

direção de arte, a re<strong>da</strong>ção. Se tinha que tirar fotos, eu mesmo tirava.<br />

Se tinha que tratar imagem, lá ia eu. Viram por que é tão importante<br />

saber se virar sozinho?<br />

Em determinado momento, achei que estava bem servido. Eu tinha<br />

algo como 30 peças. Gravei tudo num Zip Drive – se você não sabe o<br />

que é isso, não se preocupe: você nunca vai precisar saber – e mandei<br />

imprimir na facul<strong>da</strong>de.<br />

Mas eu olhei para a minha pasta e achei que estava meio careta. Então,<br />

juntei todo o meu material autoral e coloquei junto. Crônicas, poesias,<br />

letras de música, ilustrações, charges. Na época, não sabia se ia<br />

<strong>da</strong>r certo. Hoje eu sei que pesou bastante a meu favor.<br />

Para aju<strong>da</strong>r, tive sucesso em três premiações universitárias, que confirmaram<br />

que o trabalho produzido nesse período de reclusão tinha algum<br />

valor. Numa delas, ganhei uma viagem para Porto Seguro. O que<br />

só facilitou as coisas: eu ia para a Bahia, tirava umas pequenas férias<br />

dentro <strong>da</strong>s minhas férias e, na volta, procurava um emprego.<br />

195


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

o primeiro estágio<br />

como re<strong>da</strong>tor.<br />

Uma <strong>da</strong>s agências mais tradicionais do mercado do RS tinha um programa<br />

de contratações muito legal, chamado Estagiário do Futuro.<br />

Funcionava assim: você man<strong>da</strong>va o seu portfólio e indicava se queria<br />

vaga para Direção de Arte ou Re<strong>da</strong>ção. Também havia vagas para os<br />

outros departamentos, mas a Criação era infinitamente mais concorri<strong>da</strong>.<br />

Muitas pastas entravam na disputa (não lembro exatamente, mas<br />

chutaria umas 100). Eles selecionavam três duplas. A melhor, trabalharia<br />

de janeiro a abril. A segun<strong>da</strong> melhor ficava de maio a agosto. E a<br />

terceira ia de outubro até o final do ano.<br />

Achei que essa era uma boa oportuni<strong>da</strong>de para testar o meu trabalho.<br />

E pelo visto, foi mesmo: minha pasta acabou sendo seleciona<strong>da</strong> como<br />

a melhor de Re<strong>da</strong>ção.<br />

Só isso bastaria para me deixar feliz por muitos e muitos dias. Mas<br />

tinha mais.<br />

Chegando na entrevista, a primeira coisa que perguntaram foi sobre o<br />

meu dupla. Estavam curiosos para saber quem tinha feito os layouts<br />

dos meus anúncios.<br />

Quando descobriram que era eu, veio a segun<strong>da</strong> grande notícia: eles<br />

haviam me selecionado também como melhor portfólio de Direção de<br />

Arte. Eu literalmente podia escolher com qual <strong>da</strong>s vagas ficar.<br />

Falando hoje, parece pouco. Mas para um estagiário cheio de dúvi<strong>da</strong>s,<br />

foi um suspiro de alívio. Lembrem-se: eu tinha um plano de carreira<br />

na<strong>da</strong> comum. Enquanto eu estava lá, escrevendo no jornal piloto,<br />

layoutando cartões de visita, catalogando comerciais, meus colegas<br />

de facul<strong>da</strong>de re<strong>da</strong>tores já estavam em agências legais.<br />

Eu sempre me perguntava se estava fazendo a coisa certa. Nesse dia,<br />

eu tive certeza que sim.<br />

197


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

o último estágio<br />

como re<strong>da</strong>tor.<br />

Logo na minha chega<strong>da</strong>, percebi que aquele era um ótimo ambiente<br />

para eu me firmar.<br />

A Re<strong>da</strong>tora do Ano estava lá e poderia me <strong>da</strong>r boas dicas. Por sinal,<br />

a agência tinha uma cultura de re<strong>da</strong>ção, especialmente nos trabalhos<br />

de rádio.<br />

A criação tinha apenas duas duplas, além dos estagiários. Numa estrutura<br />

assim, os brains coletivos são mais comuns. Para mim, era<br />

uma grande chance para conferir de perto o processo criativo dos<br />

caras mais experientes.<br />

A pauta era organiza<strong>da</strong> e os prazos bem razoáveis. Para um iniciante,<br />

um sonho.<br />

Mas apesar de trabalhar quase na CNTP, o que realmente acelerou<br />

minha carreira foi (mais) um festival universitário. Para minha sorte, o<br />

júri era forma do só por profissionais do mercado. Entre eles, estavam<br />

a Keka Morelle e o Gustavo Diehl (duas pessoas especiais que já nos<br />

prestigiaram com aulas na Perestroika).<br />

A minha campanha era totalmente all type, diferente dos outros caras,<br />

que fizeram ideias visuais rebuscadíssimas. Por sinal, vale a pena<br />

contextualizar: na época, as ideias visuais eram uma febre nas competições<br />

de propagan<strong>da</strong>.<br />

O Guga e a Keka gostaram do meu trabalho, pediram para a comissão<br />

organizadora o meu e-mail e marcamos uma entrevista. O papo foi bacana<br />

e me indicaram para o Diretor de Criação. O cara também gostou<br />

e, ao final <strong>da</strong> conversa, fez uma quase-proposta. Só pediu para eu esperar<br />

uma nova ligação, pois ele precisava resolver mínimos detalhes.<br />

Estava a um passo de trabalhar numa agência incrível. O sonho de<br />

consumo de todo estagiário <strong>da</strong> época. Tinha um perfil bastante criativo<br />

e recém havia criado uma <strong>da</strong>s campanhas mais criativas <strong>da</strong> história<br />

<strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> brasileira.<br />

A agência que eu estava era muito legal. Mas uma possível proposta<br />

seria irrecusável.<br />

Mesmo sem a confirmação, eu tinha motivos de sobra para acreditar<br />

que a vaga era minha. O principal deles foi uma extrema empolgação<br />

que virou afobação. Nunca se conta com o ovo no cu <strong>da</strong> galinha.<br />

Voltei para a agência, chamei os meus superiores e já fui avisando que<br />

estava de saí<strong>da</strong>. Isso causou um corre-corre. E por um bom motivo<br />

(pelo menos, bom para mim): os caras não queriam me perder de jeito<br />

nenhum. Então, me fizeram um pedido.<br />

Espere até amanhã para <strong>da</strong>r a resposta. Vamos fazer uma proposta<br />

para te contratar.<br />

Justo.<br />

Mas vejam só como é a vi<strong>da</strong>. No dia seguinte, antes mesmo de receber<br />

a proposta <strong>da</strong> agência que estava, recebi uma ligação do Gustavo.<br />

Achei que era apenas para confirmar a vaga. Só que era justamente<br />

o contrário: ele me contou que os planos tinham mu<strong>da</strong>do. Um atendimento<br />

<strong>da</strong> agência iria receber uma oportuni<strong>da</strong>de na criação. A vaga<br />

tinha se fechado para mim. (Curiosi<strong>da</strong>de: tempos depois, descobri<br />

que o cara em questão era o Felipe Anghinoni, hoje meu sócio.)<br />

199


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 8 – o que aconteceu comigo<br />

No final <strong>da</strong>s contas, a proposta para me segurar na agência veio. Mesmo<br />

sem confirmação <strong>da</strong> concorrente. Mesmo com apenas quatro meses<br />

de agência. Fui efetivado, ganhei carteira assina<strong>da</strong>, ticket, valerefeição<br />

e um belo aumento.<br />

E aí, deixei de ser estagiário.<br />

apêndice: miami ad school.<br />

Muita gente pergunta sobre a minha experiência na Miami Ad School.<br />

Então, acho que valem algumas palavrinhas.<br />

Na época em que eu fui, os Portfolio Programs só existiam no exterior.<br />

Por isso, rolava uma curiosi<strong>da</strong>de maior.<br />

Hoje em dia, com a proliferação desse modelo no país (só para citar<br />

algumas: Cuca, Lemon School, Escola de Criação <strong>da</strong> ESPM, além <strong>da</strong><br />

própria Miami Ad School de SP), essa curiosi<strong>da</strong>de diminuiu. Por isso,<br />

não vou gastar o seu tempo explicando tintim por tintim.<br />

Confesso para vocês que eu me frustei um pouco. Claro que aprendi<br />

muito. Claro que tive ótimos professores. Mas o modelo, na minha<br />

opinião, era previsível. E ser previsível é tudo o que eu não espero de<br />

uma escola de criação.<br />

A MAS ensinava pela tentativa e erro, e não pela instrumentalização. É<br />

um método válido, mas que não me satisfazia.<br />

Eu pensava: Se essa é considera<strong>da</strong> a melhor escola de criação do<br />

mundo, tem alguma coisa erra<strong>da</strong>.<br />

Que fique claro: não estou colocando to<strong>da</strong>s as portfolio school no<br />

mesmo saco. Acredito que muitas <strong>da</strong>s cita<strong>da</strong>s acima sejam excelentes.<br />

A questão não era a quali<strong>da</strong>de do ensino, mas a diferente entre<br />

a minha expectativa e o que eles tinham para me oferecer. Sonhava<br />

com uma escola com aulas realmente diferentes. Que conseguissem<br />

ser subversivas, técnicas e inspiradoras ao mesmo tempo.<br />

Esse foi um dos embriões fun<strong>da</strong>mentais para o nascimento <strong>da</strong> Perestroika.<br />

201


capÍtulo 9


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

se Você chegou até aqui.<br />

Parabéns. Ou resistiu bravamente aos oito capítulos anteriores. Ou<br />

você é leitor de segun<strong>da</strong> viagem, e veio só conferir o que há de novo.<br />

Seja qual for o seu caso, muito obrigado. Fico, sinceramente, agradecido<br />

com o prestígio.<br />

E pretendo retribuir à altura. Estou neste momento na Singularity, fazendo<br />

meu programa de Futurismo. Um nome cheio de pompa para<br />

“leitura de cenários”.<br />

Então, separei aqui o que julgo ser uma visão um pouco mais futurista<br />

<strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>. Talvez, para você, iniciante, algumas <strong>da</strong>s coisas nem<br />

façam muito sentido. Para você, que é desconfiado, talvez pareça ficção<br />

científica.<br />

Mas, a ver<strong>da</strong>de é que eu realmente acredito nisso.<br />

Peço desculpas se alguns dos meus pensamentos aqui parecerem<br />

contraditórios com o que foi dito antes. Corro esse risco. O conhecimento<br />

exponencial nos prega peças.<br />

Também não quero bancar o sabe-tudo. São apenas tentativas de desenhos<br />

de cenários futuros. O objetivo não é acertar. Mas tentar pensar<br />

qual é o próximo passo.<br />

Um futurista trabalha no mesmo terreno dos criativos: a imaginação.<br />

Então, como você bem sabe, as coisas não são fáceis.<br />

Estamos no mesmo lado.<br />

qual é o futuro<br />

<strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>?<br />

Obviamente, ninguém sabe. Nem o maior futurista do mundo é capaz<br />

de prever, com 100% de certeza, o que vem pela frente.<br />

Mas algumas tendências parecem nos aju<strong>da</strong>r a entender qual são os<br />

desafios <strong>da</strong> nova comunicação.<br />

A primeira delas é a compreensão dos avanços tecnológicos. Hoje, a<br />

inteligência artificial e o processamento de grandes capaci<strong>da</strong>des de<br />

<strong>da</strong>dos é muito diferente de dez anos atrás.<br />

As máquinas do presente são capazes de reproduzir (leia-se: copiar<br />

por conta própria, a partir de uma programação prévia), com muita facili<strong>da</strong>de,<br />

qualquer peça de design gráfico. São, inclusive, capazes de<br />

produzir arte. Nem mesmo os críticos profissionais são capazes de diferenciar<br />

o que é realizado por humanos e o que é feito por máquinas.<br />

A mesma coisa para texto. Bots coletam informações de um evento<br />

esportivo e escrevem um artigo sobre a parti<strong>da</strong>. Com pia<strong>da</strong>s, sarcasmo<br />

e referências externas. Impossível dizer que foi feito por um monte<br />

de silício. Só a Forbes, no ano passado, publicou milhares de artigos<br />

usando esse tipo de recurso. E quase ninguém notou.<br />

É fácil encontrar na internet artigos falando de computadores que<br />

criam música ou que editam vídeos sozinhos. Já existem algorítmos<br />

que identificam, com uma precisão de cerca de 60%, se uma música<br />

vai para as para<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Billboard ou não.<br />

205


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

Obviamente, já existem robôs produzindo propagan<strong>da</strong>. você preenche<br />

algumas informações (como clientes, o principal diferencial competitivo<br />

e qual é o objetivo <strong>da</strong> comunicação) e ele entrega, prontinho:<br />

uma foto (retira<strong>da</strong> de um banco de <strong>da</strong>dos), um conceito (criado pela<br />

máquina) e a assinatura. Está muito longe de ser bom. Mas não é difícil<br />

imaginar uma drástica evolução nos próximos anos.<br />

Esses exemplos não são futuro. São presente. Ou melhor: são passado,<br />

porque já existem há algum tempo.<br />

Quando percebemos isso, nos <strong>da</strong>mos conta de uma ver<strong>da</strong>de cruel: as<br />

máquinas serão – se já não são – criativas.<br />

Essa é uma ver<strong>da</strong>de dura. Porque nós, do ramo criativo, sempre imaginamos<br />

que não seríamos substituídos por esse monte de parafusos.<br />

Achávamos que nós, criativos, estaríamos ilesos aos avanços tecnológicos.<br />

Essa preocupação que deveria ter aquele cara que aperta parafuso<br />

na fábrica de carros e que, claramente, seria vencido por um<br />

braço mecânico. Muito mais preciso, muito mais rápido, muito mais<br />

barato, e que trabalha 24h por dia, sem férias e décimo terceiro.<br />

Minha impressão? Não dá para ter certeza quando isso acontecerá.<br />

Mas, provavelemnte, vai sobrar para os criativos publicitários também.<br />

peraÍ que agora fiquei<br />

nerVoso: como assim?<br />

Calma, calma. Vale lembrar que os grandes avanços tecnológicos demoram<br />

a chegar no mercado. Às vezes trinta anos. Ultimamente, tem<br />

sido mais rápido. Mas não será amanhã que você chegará na agência<br />

e encontrará um computador trabalhando sozinho.<br />

O mais importante, na minha opinião, é você entender o contexto.<br />

207


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

ok, essa é a má notÍcia.<br />

e qual é a boa?<br />

Na ver<strong>da</strong>de, essa é a boa notícia. A outra grande mu<strong>da</strong>nça que a<br />

comunicação enfrentará em breve é isso associado aos serviços de<br />

geolocalização.<br />

Imagine o seguinte: você está perto de um restaurante. O dono vendeu<br />

apenas dez pratos do dia, quando previu vinte. Se ficar encalhado<br />

com dez, terá um belo prejuízo. Melhor oferecer uma promoção<br />

de última hora e garantir um lucro, mesmo que seja menor do que<br />

o esperado.<br />

Legal. Mas como se faz isso?<br />

Simples: o nosso celular terá um imenso banco de <strong>da</strong>dos <strong>da</strong>s duas<br />

compras. Terá o nosso perfil, os nossos gostos, o nosso ticket médio,<br />

o nosso prato predileto.<br />

Do outro lado, a rede do restaurante emite uma mensagem para todos<br />

os mobiles num raio de 5 km. E, vejo só: capta você, baseado nas<br />

suas informações.<br />

“Só hoje: prato do dia com 50% de desconto”.<br />

Você gosta <strong>da</strong> ideia, vai lá, enche a pança e economiza uns trocados.<br />

Na<strong>da</strong>, ou muito pouco disso, será feito por humanos. A informação<br />

que o restaurante está encalhado será gera<strong>da</strong> automaticamente por<br />

um sistema de inteligência artificial, que criará o anúncio sozinho<br />

(como faz com os artigos jornalístico hoje em dia) e enviará por wireless.<br />

O seu celular cruza esse <strong>da</strong>do com o seu perfil automaticamente<br />

e, ao perceber que pode ser interessante, pula na tela um anúncio.<br />

Não entro no mérito se isso é criativo ou não. Mas acredito que esse<br />

formato é bastante viável, efetivo e não está muito longe de acontecer.<br />

Portanto, fica aí a minha dica.<br />

209


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

por outro lado.<br />

Por outro lado, você pode dizer. É, mas em vez de ter o anúncio do<br />

Weather Channel, pode ter um <strong>da</strong> Coca-cola. Aproveite que hoje está<br />

calor.<br />

Ver<strong>da</strong>de. Até que o Google mude o seu modelo de negócio (em breve).<br />

dica.<br />

Muita gente fala que o futuro <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong> é o mobile. E quando se<br />

fala em mobile, normalmente se pensa em celular.<br />

Mobile, se formos analisar de forma literal, significa “móvel”.<br />

Você já deve ter visto o Google Glass. As informações que aparecem<br />

ali não vêm do seu celular, mas de um aparelho móvel.<br />

E aí está o grande pulo do gato.<br />

Pense que, quando você olhar para o céu, enxergará a temperatura,<br />

sem ter que entrar no Weather Channel para conferir se fará sol ou se<br />

vai cair um toró.<br />

A lógica interruptiva <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>, que vê tudo como mídia, seria:<br />

“já sei, vamos botar um anúncio do Weather Channel ao lado <strong>da</strong> previsão<br />

do tempo. Assim, quando ele olhar para o céu, teremos nossa<br />

marca associa<strong>da</strong> ao serviço prestado”.<br />

A questão não é essa. A questão é: se ele já tem a informação <strong>da</strong><br />

temperatura (ofereci<strong>da</strong> por sensores, não pelo site), por que a gente<br />

precisa do Weather Channel?<br />

E se a gente não precisa do Weather Channel, qual é o sentido do<br />

Weather Channel existir?<br />

E se ele não existir, como vai anunciar?<br />

211


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

nem tudo está perdido.<br />

A ver<strong>da</strong>deiro boa notícia é que muitas <strong>da</strong>s empresas líderes no ramo<br />

de tecnologia ain<strong>da</strong> baseiam seu modelo de negócio em anúncios.<br />

Google e Facebook, só para citar dois, ain<strong>da</strong> não encontraram um<br />

modelo sustentável sem depender disso.<br />

Portanto: talvez o Google realmente precise botar algum tipo de anúncio<br />

para pagar as contas do sensor que informará você <strong>da</strong> temperatura.<br />

Se pensarmos assim, certamente por um bom tempo, ain<strong>da</strong> haverá<br />

espaço para a publici<strong>da</strong>de.<br />

O que você deve ter em mente é que o futuro nos reserva mu<strong>da</strong>nças.<br />

Seja qual for o sistema, provavelmente a informação será gera<strong>da</strong> automaticamente,<br />

com pouca (ou nenhuma) interferência humana.<br />

Será puro processamento de <strong>da</strong>dos.<br />

mu<strong>da</strong>nça na remuneração<br />

O próprio Google pode estar migrando para um modelo de remuneração<br />

através dos devices (o Google Glass não é grátis, certo?). Veja o<br />

tablet recém lançado. Ou o Google Car. Isso pode ser, tranquilamente,<br />

um indicativo de que propagan<strong>da</strong> não é quem paga a conta.<br />

Será que o Google não está mu<strong>da</strong>ndo o seu sistema de remuneração?<br />

E se o business model do Google mu<strong>da</strong>r, será que a indústria inteira<br />

não mu<strong>da</strong> junto?<br />

213


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

mas isso Vai<br />

acontecer quando?<br />

Não faço a menor ideia. Se você quer um chute, assim, sem responsabili<strong>da</strong>de?<br />

Diria que em cinco anos estará no mercado. O que não<br />

significa que estará em TODO o mercado. Como comentei antes: as<br />

tecnologias, depois de desenvolvi<strong>da</strong>s, demoram um bom tempo até<br />

se popularizarem.<br />

E se pensarmos no Brasil, um país que está crescendo, mas que ain<strong>da</strong><br />

tem muito a evoluir, pode ser que ser que demore muito mais. E se<br />

pensarmos que todo o nosso mercado ain<strong>da</strong> se remunera dentro de<br />

uma comissão de mídia, talvez seja ain<strong>da</strong> mais complicado.<br />

Entretanto, acho que você entendeu meu recado.<br />

Se não entendeu, eu peço aju<strong>da</strong> de um robozinho para escrever<br />

pra mim.<br />

importante:<br />

a propagan<strong>da</strong> está mu<strong>da</strong>ndo<br />

exponencialmente.<br />

Nós, seres humanos, temos uma mania de pensar de forma linear. Não<br />

nos <strong>da</strong>mos conta que o avanço tecnológico acontece de forma exponencial.<br />

Pense no caminho que as mídias percorreram. O jornal existia<br />

há muito tempo, quando chegou o rádio. Algum tempo depois, veio a<br />

TV. Algum tempo, começaram a pipocar novas mídias. Até que surgiu<br />

a internet e acelerou o processo de forma muito intensa.<br />

Para os mais desatentos, pode parecer que a internet é a grande responsável<br />

pela mu<strong>da</strong>nça. Quando, ao analisar o cenário de mídia como<br />

um todo, não é difícil perceber a curva que está subindo abruptamente.<br />

E a internet é só mais um ator dessa peça.<br />

Portanto, fique atento. As mídias serão substituí<strong>da</strong>s numa veloci<strong>da</strong>de<br />

muito diferente do que estamos acostumados a pensar.<br />

Pense nisso.<br />

215


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

reflexão.<br />

Se você entrou na publici<strong>da</strong>de para fazer a publici<strong>da</strong>de que você conhece<br />

hoje, eu tenho um conselho. Pense bem.<br />

É provável que os modelos sejam revistos nos próximos anos, e que<br />

tenhamos uma transformação muito maior do que a que está aconteceu<br />

pela internet.<br />

Esteja preparado para a mu<strong>da</strong>nça, porque ela vai acontecer.<br />

depois de tantos<br />

conselhos, só me faça um<br />

faVor: pense com carinho.<br />

Sei que você não disse na<strong>da</strong> aí do outro lado. Mas se você me pedisse<br />

um único conselho, eu diria, <strong>da</strong> maneira mais carinhosa possível:<br />

pense com carinho.<br />

Pense com carinho se você realmente quer trabalhar com propagan<strong>da</strong>.<br />

E quando disso isso, peço que você não interprete meu comentário<br />

como uma desaprovação. Quem sou eu para ir contra a sua vocação.<br />

Se você gosta de publici<strong>da</strong>de, e está decidido, me coloco justamente<br />

do outro lado. Dou o maior apoio.<br />

Também não estou dizendo que a propagan<strong>da</strong> vai morrer. Se você fez<br />

essa interpretação, peço que volte até a primeira casa, e revise todo o<br />

texto. Você vai ver que não é por aí.<br />

Meu ponto é: lembre-se que ninguém é OBRIGADO a trabalhar<br />

com propagan<strong>da</strong>.<br />

Digo isso porque, na minha época, as pessoas que queriam expressar<br />

a sua criativi<strong>da</strong>de não tinham muito para onde ir. Hoje, existem<br />

muitas alternativas. Na internet, elas são quase infinitas. Não é legal<br />

ver um monte de gente produzindo suas próprias séries no Youtube e<br />

ganhando dinheiro com isso?<br />

217


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

Eu acho o máximo.<br />

Antigamente, esses talentos seriam obrigado a trabalhar numa agência.<br />

Uma <strong>da</strong>s poucas alternativas viáveis para se envolver com criativi<strong>da</strong>de<br />

e pagar as contas no final do mês.<br />

Portanto, só pense com carinho.<br />

Repito: enten<strong>da</strong> bem o que estou dizendo. Não estou falando que a<br />

solução é largar a facul<strong>da</strong>de para produzir vídeos engraçadinhos no<br />

Youtube. Essa é só UMA <strong>da</strong>s alternativas.<br />

Também vale lembrar que fugir do tradicional é um caminho duro. Para<br />

ca<strong>da</strong> Porta dos Fundos que emplaca, temos milhares de anônimos<br />

que não chegam nem aos 100 views.<br />

O que estou fazendo é provocando você. Se você é realmente criativo,<br />

você deve, antes de qualquer movimento, sair <strong>da</strong> caixinha. Existem<br />

possibili<strong>da</strong>des incríveis fora do sistema tradicional. Especialmente<br />

para, nós, brasileiros, que demos o maior pé quente. O país decidiu<br />

crescer justamente quando a internet ofereceu oportuni<strong>da</strong>des nunca<br />

existentes em termos de criativi<strong>da</strong>de.<br />

Empreender (no caso, uma empresa liga<strong>da</strong> à criativi<strong>da</strong>de, que não<br />

trabalhe necessariamente com propagan<strong>da</strong>) não é fácil. Mas pode ser<br />

muito mais recompensador.<br />

Vi centenas de amigos optarem pela carreira publicitária por falta de<br />

opções. Não é o seu caso.<br />

Portanto, pense com carinho.<br />

O mundo é tão grande quanto a sua criativi<strong>da</strong>de.<br />

o noVo publicitário<br />

é um comunicador.<br />

Uma vez, twittei: “O maior erro <strong>da</strong> publici<strong>da</strong>de é tentar ser publici<strong>da</strong>de<br />

antes de ser comunicação”.<br />

Por isso, antes de virar um publicitário, que fala publicitês, apren<strong>da</strong><br />

outra língua. A língua mãe de todos os seres humanos. Que está na<br />

essência <strong>da</strong>s relações humanas.<br />

Na medi<strong>da</strong> que a comunicação um-para-muitos perde espaço para a<br />

um-para-um, que trabalhamos com plataforma, que emergem conceitos<br />

como Riqueza Social, fica claro: temos que ser mais RPs do PPs.<br />

Vou repetir: temos que ser mais RPs do que PPs. Se você me perguntar<br />

qual é o futuro <strong>da</strong> profissão, antes de falar em robôs criativos, eu<br />

certamente apostaria por aí.<br />

Isso não significa fazer um curso de RP, mas pensar que engajamento<br />

acontece muito mais pela profundi<strong>da</strong>de com poucos do que pela superficiali<strong>da</strong>de<br />

com muitos.<br />

219


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

último recado.<br />

Na Perestroika, temos alguns cursos de comunicação contemporânea.<br />

A tese que apresentamos é que, hoje, em termos contemporâneos,<br />

Fazer é maior Dizer.<br />

Ou, para ficar mais icônico: Fazer > Dizer.<br />

Muita gente confunde. Muita gente acha que estamos reforçando o<br />

conceito Vai lá e faz. “Ah, entendi: Fazer > Dizer é para a gente não<br />

ficar esperando muito e botar logo a mão na massa, né?”.<br />

Apesar do conselho acima também ser válido, não é bem isso.<br />

Fazer > Dizer significa que temos que procurar movimentos de comunição<br />

baseados menos no discurso e mais na ação. Uma propagan<strong>da</strong><br />

realizacional. Um evento. Uma coisa que aconteça.<br />

Para comunicar essa coisa, usamos as mídias tradicionais - que passam,<br />

dessa forma, a ser periféricas.<br />

Essa ação deve criar relacionamento com a sua audiência, criando Riqueza<br />

Social. Uma moe<strong>da</strong> invisível - mas que, ali na frente, vira dinheiro.<br />

De preferência, deve ter utili<strong>da</strong>de (Ad Utility, termo que ouvi pela primeira<br />

vez pela Livead), e ser um serviço para a socie<strong>da</strong>de.<br />

Deve deixar um legado, e fazer com que esse serviço se perpetue<br />

para muito além <strong>da</strong> ação de comunicação.<br />

E, para ser completa, deve ser auto-sustentável. É uma start-up comm:<br />

ela gera receita e se paga. Talvez, até dê lucro.<br />

O novo comunicador é um empreendedor.<br />

Realização, prestação de serviço, legado, riqueza social e lucro. Essas<br />

coisas não são excludentes. Já é presente. E será, na minha opinião, o<br />

futuro próximo de to<strong>da</strong> a comunicação.<br />

Minha dica final é essa: antes de ser publicitário, seja uma mistura de<br />

RP e empreendedor.<br />

221


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 9 – as novas <strong>mortas</strong><br />

último recado. juro.<br />

Quando convidei outros criadores para que contribuíssem com seus<br />

conselhos, percebi que não era uma situação muito confortável.<br />

Na ver<strong>da</strong>de, era um puta injustiça.<br />

Eu tinha escrito páginas e páginas com o que eu julgava ser interessante.<br />

Não tive a difícil missão de filtrar, entre to<strong>da</strong>s as dicas que dei,<br />

a mais importante.<br />

Já com eles foi bem diferente. Pedi para que dessem um único conselho.<br />

Um conselho.<br />

O conselho.<br />

E ain<strong>da</strong> dei um briefing cheio de polices. Limite de linhas, prazo apertado<br />

e um foco não muito camara<strong>da</strong>.<br />

Por isso, para fechar, resolvi me colocar na mesma panela de<br />

pressão, para ver se eu conseguia me virar tão bem quanto eles<br />

se saíram.<br />

Pois a minha dica é: tenha um projeto que lhe dê orgulho.<br />

O seu projeto pode ser autoral, como está sendo este livro. Pode ser<br />

empresarial, como foi a Perestroika para mim. Pode ser filantrópico,<br />

como foi o Clube dos Jovens Criativos, do qual eu fiz parte desde a<br />

primeira reunião.<br />

O seu projeto pode ser o roteiro de um longa metragem. Pode ser a<br />

sua festa de casamento. Pode ser uma viagem de barco ao redor do<br />

mundo.<br />

Pode ser uma coisa despretensiosa. Pode ser uma busca espiritual.<br />

Pode ser o projeto <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>.<br />

Não importa. Tenha um projeto.<br />

Não viva no piloto automático. Tenha um projeto que lhe dê orgulho.<br />

Saiba o que você está fazendo e por que está fazendo.<br />

E quando você acabar, encontre um novo. E comece tudo de novo. E<br />

de novo. E de novo.<br />

Essa é a melhor forma de se sentir vivo.<br />

223


capÍtulo 10


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

introdução.<br />

A Perestroika tem um blog (<strong>perestroika</strong>.com.br) com atualizações<br />

diárias. Ou quase diárias. Lá, a gente discute tudo o que acha interessante.<br />

E um dos temas mais requisitados por quem nos lê são os<br />

conselhos profissionais.<br />

Pensei em colocar aqui todos os posts legais. Mas quando fiz o meu<br />

primeiro short-list, percebi que teria um grande problema. Gostava<br />

de muitos.<br />

Então, tive que tomar uma decisão drástica. Primeiro, fiz um filtro com<br />

50. Sim: o Top 50 do Blog <strong>da</strong> Perestroika.<br />

Reuni aqueles que, na minha opinião, valem a pena ser lidos por alguém<br />

que está procurando aju<strong>da</strong> no início <strong>da</strong> carreira.<br />

Depois, fiz um novo corte, só com os posts que foram escritos por<br />

mim e pelo Felipe, para preservar as opiniões de quem ain<strong>da</strong> continua<br />

na empresa. Achei educado.<br />

Então, fiz um corte radical. Escolhi os top 15 que mais fazem para o<br />

público leitor desse manual.<br />

Foi quando lembrei que, <strong>da</strong> primeira edição para cá, rolaram posts<br />

legais. Fiz um novo filtro e fiquei com 20. E pronto.<br />

Vale lembrar algumas coisas:<br />

Eles não estão organizados por ordem cronológica ou de preferência.<br />

Foi absolutamente randômico.<br />

Alguns posts sofreram pequenos ajustes em virtude <strong>da</strong>s imagens e<br />

vídeos que não puderam ser reproduzidos aqui.<br />

Sempre tente imaginar o post dentro do seu contexto. Vários são antigos<br />

e, hoje, talvez sejam menos impactantes do que na época em que<br />

foram escritos.<br />

Muitos posts foram escritos antes <strong>da</strong> reforma ortográfica.<br />

Não são necessariametne os melhores posts, na minha opinião. São<br />

os mais apropriados para este manual.<br />

227


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

1. foi lá e fez.<br />

Eu tenho a impressão que quanto mais tempo a gente leva pensando,<br />

menos tempo a gente se envolve fazendo. Claro, pensar e planejar é<br />

importante, nem vou entrar muito nesse mérito. O que diferencia o ser<br />

humano de todos os outros animais é justamente a capaci<strong>da</strong>de de raciocinar.<br />

Mas, talvez, o que diferencie uma pessoa de todos os outros<br />

seres humanos seja a capaci<strong>da</strong>de de realizar.<br />

Já vi muito departamento de planejamento de agência, e às vezes a<br />

agência como um todo, gostar de ficar intelectualizando, questionando,<br />

ruminando, pensando e repensando. Uma punheta mental que às<br />

vezes até gera um trabalho bem esclarecido, bem defendido. Mas que<br />

nunca funciona muito quando colocado em prática.<br />

Se até as regras <strong>da</strong> física que a gente aprende no colégio são para<br />

abstrair e não funcionam na prática como nos livros, imagina no universo<br />

<strong>da</strong> imaginação e criativi<strong>da</strong>de, onde as bases são bem mais subjetivas<br />

e abstratas.<br />

Acho que se o Ronaldinho pensasse muito, não tentaria fazer os dribles<br />

maravilhosos que ele faz. Quem pensa muito, não pula na piscina<br />

porque a água tá fria. Quem fica pensando muito, sempre pede mais<br />

uma cerveja antes de chegar na mulher que já tá encarando há mais<br />

de 10 minutos. Só pra ver um outro filho <strong>da</strong> puta chegar e levar a mina<br />

(é só um exemplo, não que tenha acontecido comigo). Se tu parar pra<br />

pensar em to<strong>da</strong>s as conseqüências possíveis, provavelmente tu não<br />

vai entrar vestido de vaca numa sala de aula. Se tu parar pra pensar,<br />

já tem tanta facul<strong>da</strong>de de comunicação e publici<strong>da</strong>de, ninguém vai<br />

querer fazer a Perestroika.<br />

Se tu parar pra pensar, vai ver que todos os teus projetos geniais ficam<br />

guar<strong>da</strong>dos na gaveta porque no fundo tu tem medo do que pode<br />

<strong>da</strong>r errado. De tentar fintar e perder a bola. De tomar um fora. De os<br />

alunos te tirarem pra trouxa. Mas a grande ver<strong>da</strong>de, a grande ver<strong>da</strong>de<br />

que eu acredito, pelo menos, é que a linha que separa a geniali<strong>da</strong>de<br />

do fiasco é muito fina. Muito tênue. E que as poucas pessoas que se<br />

arriscam a an<strong>da</strong>r em cima dessa linha, podem cair pros dois lados.<br />

Mas passar um pouco de vergonha ou de frio não é na<strong>da</strong> perto <strong>da</strong><br />

recompensa de ser realmente genial.<br />

Lembrem-se que até mesmo os grandes pensadores também tinham<br />

que ser grandes escritores. Pense nisso. Mas só um pouquinho, tá?<br />

229


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

2. pessoas apaixona<strong>da</strong>s<br />

são pessoas apaixonantes.<br />

Eu sou um cara megasensível. E muito passional. Talvez, na Perestroika,<br />

o mais passional de todos. O que tem o lado bom e o ruim,<br />

como tudo na vi<strong>da</strong>. O lado ruim é que fica mais difícil li<strong>da</strong>r com críticas.<br />

Muitas vezes já quero brigar com comentários no nosso blog, com<br />

twita<strong>da</strong>s e com outros percalços naturais do processo de se ter uma<br />

empresa, administrar uma marca e li<strong>da</strong>r com pessoas. Graças a Deus<br />

tem o Tiago aqui que sempre faz o contraponto e me faz pensar sobre<br />

essas coisas antes de sair tomando atitudes.<br />

O lado bom é que fico emocionado com as coisas, com as oportuni<strong>da</strong>des,<br />

com os elogios, com as coisas que dão certo e tal. Fico feliz<br />

mesmo, arrepiado, com vontade de sair pulando às vezes, chorando<br />

outras e, algumas vezes, de sair pela Perestroika an<strong>da</strong>ndo de cueca<br />

– o que de fato já aconteceu algumas vezes. Talvez por isso, tenha me<br />

emocionado tanto com o surfe do Romeu no Dilúvio.<br />

Sou um cara que se leva pelas paixões. E embora isso tenha também<br />

o seu lado bom e o ruim, ser extremamente racional também tem. E<br />

sou feliz assim, mesmo que momentos de tristeza também acompanhem<br />

essa jeito apaixonado de viver.<br />

Para mim, viver sem paixão não faz o menor sentido. Trabalhar sem<br />

paixão também não. E o resumo do que quero dizer para vocês é esse:<br />

persigam a paixão. Na vi<strong>da</strong>, no trabalho e em tudo o que fizerem.<br />

Posso <strong>da</strong>r essa sugestão com a tranquili<strong>da</strong>de de quem arriscou muita<br />

coisa em nome disso. Vejam bem: eu comecei minha carreira na publici<strong>da</strong>de<br />

como atendimento na Dez Propagan<strong>da</strong>, em 98. E não foi um<br />

estagiozinho de 3 meses, como acontece com muita gente. Fiz estágio,<br />

em pouco tempo, fui contratado como assistente. Passei 3 anos<br />

e meio no atendimento. Era uma jovem promessa, que cresceu rápido<br />

na agência. Eu tinha 22 anos e era o segundo atendimento <strong>da</strong> agência<br />

na época. Mas eu não estava feliz. Pedi demissão e decidi que ia para<br />

a criação. Fui absorvido na própria Dez, como estagiário de re<strong>da</strong>ção,<br />

ganhando 8 vezes menos do que ganhava como atendimento.<br />

Na criação, fui contratado com apenas 3 meses. 9 meses depois, fui<br />

o Re<strong>da</strong>tor do Ano do Prêmio Colunistas. Depois saí e fui trabalhar na<br />

Paim como re<strong>da</strong>tor. Em 2005, logo depois <strong>da</strong> conta <strong>da</strong> Renner ter ido<br />

para a Escala, assumi a área de Novos Negócios <strong>da</strong> Paim, deixando<br />

a trajetória de re<strong>da</strong>tor publicitário para trás e assumindo uma rotina<br />

liga<strong>da</strong> a prospecção, gestão de projetos e planejamento.<br />

Um ano depois, nova guina<strong>da</strong>: virei Diretor de Criação <strong>da</strong> Paim. Tinha<br />

28 anos. Era uma coisa bem fora do normal uma pessoa dessa i<strong>da</strong>de<br />

estar numa posição dessas numa <strong>da</strong>s 5 maiores agências do estado.<br />

Uma situação bem confortável, digamos assim. Bom, eu não tinha<br />

nem 4 meses como DC e fui convi<strong>da</strong>do para trabalhar na LiveAD, uma<br />

empresa que eu nem sabia o que fazia. Mas segui totalmente meus<br />

instintos – porque a razão talvez man<strong>da</strong>sse eu ficar.Menos de 2 anos<br />

depois de assumir a Criação <strong>da</strong> LiveAD, larguei tudo para me dedicar<br />

exclusivamente à Perestroika, que ain<strong>da</strong> estava engatinhando, sem<br />

nenhuma garantia que <strong>da</strong>ria certo, e ganhando si-gnificativamente<br />

menos do que lá.<br />

Em to<strong>da</strong>s essas mu<strong>da</strong>nças, eu sempre tive medo. Foi um trabalho<br />

árduo dos meus sentimentos tentando convencer minha razão de que<br />

era a coisa certa a fazer, o que é mais difícil que o contrário (a razão<br />

convencendo os sentimentos). Mas nunca consegui jogar para debaixo<br />

do tapete o que o meu coração (ui, que gay) dizia para fazer. E em<br />

231


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

to<strong>da</strong>s, absolutamente TODAS as mu<strong>da</strong>nças, eu nunca me arrependi.<br />

Sempre fiquei mais feliz. Que na real é o que importa.<br />

Tá: para não parecer que tudo foi tão perfeito, teve uma vez que eu<br />

fiquei um tempão numa empresa sem amá-la mais. Tipo to<strong>da</strong>s as células<br />

do meu corpo diziam que eu não tinha mais que estar lá. Menos<br />

o meu cérebro. “O que tu vai fazer?” “Tu vai arregar?” “Se tu sair, tu<br />

vai assumir o teu fracasso.”<br />

Na real, eu queria racionalmente vencer aquela situação. Não queria<br />

pecar por omissão, por falta de tentativa. E fiquei um bom tempo<br />

(mesmo) nessa empresa. Claro, no final o fato de eu ter ficado lá<br />

me gerou muito aprendizado. Mas quando finalmente eu saí, tive uma<br />

puta sensação de alívio, de libertação, de felici<strong>da</strong>de. E fiquei me perguntando<br />

por que não tinha saído antes. Isso também foi aprendizado.<br />

Hoje, eu sei que dá para ser feliz fazendo o que se quer fazer. Vivo isso<br />

na Perestroika todos os dias. Ca<strong>da</strong> trabalho, ca<strong>da</strong> novo projeto, ca<strong>da</strong><br />

novo curso é um puta tesão. Muita vontade de se envolver, de mergulhar,<br />

de se entregar. E quando a gente se entrega, não tem problema<br />

ter que trabalhar todos os sábados, não tem na<strong>da</strong> de errado acor<strong>da</strong>r<br />

às 8 <strong>da</strong> manhã de domingo para fazer reunião. O amor é cego.<br />

E o mais legal é que a recompensa é o próprio processo de trabalho.<br />

Muita gente não se dá conta disso e fica se focando no trabalho final,<br />

na execução final, no filme pronto na formatura. Mas o processo<br />

criativo – uma <strong>da</strong>s poucas coisas que absorvi do curso do Charles<br />

Watson – deve ser um processo autotélico, onde encontramos e focamos<br />

o prazer no processo, e não no ponto final. Em outras palavras, o<br />

caminho é a viagem, não o lugar de chega<strong>da</strong>.<br />

A gente vê que os alunos que mais se puxam, mais se empenham,<br />

mais nos impressionam, são os mais apaixonados. Pela Perestroika.<br />

Pelo projeto que estão fazendo. Pela vi<strong>da</strong>, como é o caso do Romeu.<br />

O Tiago já escreveu um post muito legal nesse blog sobre as recompensas<br />

que se obtém no trabalho. Eu acho que a paixão é uma <strong>da</strong>s<br />

recompensas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>.<br />

Tem outra coisa que eu acho que torna todo esse discurso mais relevante<br />

ain<strong>da</strong> que é o seguinte: a gente trabalha com criação. Ou pelo<br />

menos com o processamento de um monte de informação, conteúdo<br />

e estímulos que recebemos para a formatação de um produto criativo.<br />

Seja ele comercial, experimental ou autoral.<br />

Eu particularmente acredito que a sensibili<strong>da</strong>de necessária para identificar<br />

esses estímulos, essas vibrações vêm <strong>da</strong> paixão.<br />

Uma vez li em algum lugar uma história do Lupicínio Rodrigues sobre<br />

as várias mulheres que ele teve, e o sofrimento que a paixão não<br />

correspondi<strong>da</strong> ou traumática que algumas desses romances geraram<br />

nele. E ele disse algo, que não foi bem isso, mas que é mais ou menos<br />

por aqui: ele não se arrependia de ter se apaixonado e ter se entregado<br />

em todos esses casos, mesmo para as mulheres que mais fizeram<br />

ele sofrer. Porque as que mais fizeram ele sofrer foram as responsáveis<br />

pelas melhores obras dele.<br />

Felici<strong>da</strong>de, tristeza, emoções fortes são combustível criativo.<br />

Vejam o Vinícius de Moraes. O cara foi fo<strong>da</strong> na produção cultural e artística<br />

brasileira. Foi um cara que se apaixonou muitas vezes. Casou 9,<br />

só para a gente ter noção. Porra, era um cara que acreditava no amor.<br />

E provavelmente, na paixão.<br />

A razão é muito importante, é claro. Pensem, racionalizem. Mas lembrem-se<br />

que a razão nos deixa seguros, e nos deixa brabos. O que<br />

nos deixa feliz ou triste é emoção.<br />

Planejar, projetar, pensar é bem racional. Mas a paixão é que vai a<br />

gente ir lá e fazer.<br />

233


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Vão lá e faça. Se apaixonem. E, de vez em quando, deixem se<br />

levar pelas paixões. Acho que vocês vão concor<strong>da</strong>r comigo que<br />

vale a pena.<br />

Beijos, Felipe<br />

3. não olhe para o lado.<br />

olhe para frente.<br />

Há um tempo, eu ouvi falar de um estudo sobre felici<strong>da</strong>de que eu<br />

achei fantástico. Inclusive, sugiro que você faça o teste antes de ler o<br />

resto do post.<br />

O entrevistador conversava com os funcionários de uma determina<strong>da</strong><br />

empresa, um a um, separa<strong>da</strong>mente. E pedia que eles apontassem<br />

qual situação faria deles pessoas mais felizes.<br />

1. Você prefere ganhar um salário de 100,<br />

sendo que todos os seus colegas ganham 50.<br />

2. Você prefere ganhar um salário de 150,<br />

sendo que todos os seus colegas ganham 200.<br />

Segundo o estudo, a maioria optou pelo primeiro cenário. Mesmo que<br />

no segundo, a pessoa tivesse uma ren<strong>da</strong> maior.<br />

A tese do cara é que a nossa noção de felici<strong>da</strong>de está diretamente<br />

relaciona<strong>da</strong> à comparação. Você tem que olhar para o lado e ver uma<br />

situação pior que a sua. Só assim as pessoas (ou, pelo menos, a maioria<br />

delas) se sente realmente feliz.<br />

Isso talvez justifique várias manifestações <strong>da</strong> nossa socie<strong>da</strong>de. Como<br />

a gangorra do futebol, a popularização <strong>da</strong>s fofocas, a grande audiência<br />

<strong>da</strong>s tragédias e dos programas sensacionalistas.<br />

235


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Eu fIquei bem surpreso ao saber do resultado. Quando me perguntaram,<br />

respondi de bate-pronto. “Óbvio que eu prefiro ganhar mais!”.<br />

Provavelmente, muito em função de uma crença que eu tenho.<br />

Não olhe para o lado. Olhe para frente.<br />

O que, em outras palavras, quer dizer: o importante é você buscar as<br />

suas próprias metas. Sejam elas re levantes ou não para os outros.<br />

O fun<strong>da</strong>mental desse conceito é entender que você deve simplesmente<br />

ignorar aquilo que não influencia a sua vi<strong>da</strong>. Mas ficar atento para<br />

o que influencia.<br />

Por exemplo: trabalham no mesmo departamento você e o João, um<br />

cara chato, vagabundo e incompetente. Se o João receber um aumento,<br />

e esse aumento não tiver relação nenhuma com o seu salário, isso<br />

não afeta em na<strong>da</strong> a sua vi<strong>da</strong>. Bom para o cara.<br />

Agora, se o João receber um aumento, e esse aumento influenciar em<br />

todo o planejamento financeiro <strong>da</strong> empresa, de forma que você não<br />

seja promovido jus tamente por isso: bom, aí o furo é mais embaixo.<br />

Eu sou um cara bastante competitivo. E não acho isso ruim. Porque<br />

sou competitivo olhando para frente, não olhando para o lado.<br />

Gosto de estar na fatia de cima <strong>da</strong> pirâmide. Mas na medi<strong>da</strong> do possível,<br />

não me preocupo muito com o que os outros estão fazendo.<br />

Vou <strong>da</strong>r um exemplo bem ilustrativo que aconteceu na minha vi<strong>da</strong>:<br />

Eu queria ser Re<strong>da</strong>tor do Ano. E quando fui, não fiquei preocupado<br />

se os outros re<strong>da</strong>tores do mercado estavam produzindo coisas boas<br />

ou não. Se os outros re<strong>da</strong>tores <strong>da</strong> agência estavam recebendo jobs<br />

melhores que os meus. Se estavam fazendo fantasmas. Eu simplesmente<br />

baixei a cabeça e produzi o meu melhor. Via em ca<strong>da</strong> pit uma<br />

oportuni<strong>da</strong>de de emplacar um trabalho legal. Não produzi um único<br />

fantasma, uma única campanha filantrópica, uma única peça de caráter<br />

duvidoso. Tudo o que fiz foi pelas vias normais.<br />

E deu certo.<br />

Porque se eu fizesse o meu melhor, eu não poderia me sentir culpado<br />

numa eventual derrota. Pô, eu fiz o meu melhor!<br />

Agora que está começando um novo ano, aproveite e pense um pouco<br />

sobre isso. O que você realmente quer para 2009? O que vai fazer<br />

você feliz?<br />

Se na hora do amigo secreto o seu par de meias for mais feio que o do<br />

seu primo, não dê bola.<br />

237


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

4. o fritador de<br />

hambúrgueres.<br />

Ca<strong>da</strong> vez mais eu acredito numa coisa. E ca<strong>da</strong> vez mais, eu acredito<br />

que é essa coisa que diferencia os bons criadores.<br />

É a disciplina. Por mais contraditório que isso possa parecer.<br />

Eu sinceramente acho que, se nós pegássemos qualquer departamento<br />

de uma agência de propagan<strong>da</strong> (atendimento, produção, mídia,<br />

etc.) e colocássemos na criação, e treinássemos durante alguns meses<br />

essas pessoas, o resultado seria surpreendente.<br />

Chegar em boas ideias não é difícil. Pensar em porralouquices não<br />

é difícil. Estou convencido disso. Quanto mais estudo o processo<br />

brainstorming, e como as ideias surgem, mais eu me impressiono. O<br />

brain é só um processo. Que qualquer um pode seguir.<br />

O que talvez facilite a nossa vi<strong>da</strong> (nossa = criadores do departamento<br />

de criação) é a personali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s pessoas que vão para a Criação.<br />

Porque, em geral, nós temos traços que FACILITAM o processo<br />

de brainstorm. Como (só para citar dois exemplos) a desinibição e<br />

a sensibili<strong>da</strong>de.<br />

Mas se uma pessoa qualquer decidir treinar essas características,<br />

e investir tempo e energia exercitando (de novo, só para citar dois<br />

exemplos) a desinibição e a sensibili<strong>da</strong>de, eu acredito, sinceramente,<br />

que o resutado não será muito diferente do que temos hoje no dia-adia<br />

de uma agência.<br />

Parece loucura. Mas eu juro que acredito nisso.<br />

Daí, você pode dizer. “Tiago, você realmente acha que um atendimento<br />

criaria um bom título? Que uma mídia pensaria numa ideia<br />

visual bacana?”.<br />

Sim, acredito. Com alguns meses de treino e muito disciplina por parte<br />

do cara, acredito pra caralho.<br />

Daí, você pode insistir: “Mas Tiago, você acha que eles vão conseguir<br />

criar aquelas ideias inusita<strong>da</strong>s, que a gente fica morrendo de inveja?”.<br />

Aí eu não sei.<br />

Ao mesmo tempo, eu não sei quantas ideias realmente inovadoras<br />

e inustita<strong>da</strong>s um departamento de criação produz por ano. Aquelas<br />

ideias que a gente diz: QUE COISA NOVA!<br />

Porque se formos realmente críticos com os nossos próprios portfólios,<br />

vamos ver que a maioria absoluta do que fazemos são fórmulas.<br />

São padrões. Até as peças que criamos exclusivamente<br />

para festivais.<br />

Vocês já ouviram falar do Faking It? É um reality show antigo, que passava<br />

na TV inglesa e era reproduzido por alguma canal a cabo aqui do<br />

Brasil (acho que era o Multishow).<br />

A moral era a seguinte: eles pegavam um profissional X e o treinavam<br />

durante um mês para executar uma ativi<strong>da</strong>de diferente <strong>da</strong> que ele fazia<br />

anteriormente (ex: um tosador de ovelhas viraria cabeleireiro).<br />

No final, outros três profissionais (no caso, outros três cabeleireiros)<br />

passavam pelo crivo de um júri, que avaliava o desempenho dos qua-<br />

239


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

tro. Então, o júri era comunicado que havia um impostor infiltrado. Na<br />

maioria dos casos, o júri não acertava quem era o picareta.<br />

Tipo, um vigário virava vendedor de carros usados. Um bailarino virava<br />

lutador de luta-livre. Um fritador de hambúrgueres virava chef. Um<br />

pintor de casas virava pintor de quadros (e hoje ganha uma puta grana<br />

como artista plástico).<br />

Você acha que o programa encontrou talentos em meio à multidão?<br />

Que foi sorte? Que foi uma chance em um milhão? Eu prefiro acreditar<br />

que foi só disciplina, foco, treino.<br />

Procure no Youtube o cantor punk que se tornou maestro. Tudo bem,<br />

tudo bem. O cara não virou um maestro. Ele regeu apenas uma música,<br />

uma única vez. Não sei se é suficiente para comprovar a teoria. No<br />

mínimo, nos deixa uma pulga atrás <strong>da</strong> orelha.<br />

To<strong>da</strong> essa longa introdução é para dizer o seguinte: a gente, na Criação,<br />

tem uma tendência a achar que somos insubstituíveis. Quando<br />

chegamos num determinado patamar, simplesmente relaxamos. Achamos<br />

que o nosso talento, que o nosso histórico, é suficiente para nos<br />

garantir uma cadeira e um computador.<br />

Não, não é.<br />

Qualquer um pode nos substitutir. A dupla mais jovem. O estagiário<br />

que recém entrou. Ou o estu<strong>da</strong>nte, que ain<strong>da</strong> nem foi contratado<br />

pela agência.<br />

É só um processo. É só treino. É só foco.<br />

E essa é, na minha opinião, a principal razão pela qual muitos profissionais<br />

de mais de 30 anos somem, desaparecem. Depois de um<br />

certo tempo, falta aquele tesão. E aí, vem o fritador de hambúrgueres<br />

e rouba a vaga do chef.<br />

Certa vez, criei uma campanha para um festival de publici<strong>da</strong>de que<br />

dizia: Você é tão bom quanto o seu último trabalho. Nem achava a<br />

ideia tão legal, mas o conceito eu realmente curtia.<br />

Se nos dermos conta que um fritador de hambúrgueres pode virar<br />

chef, em apenas um mês, nós vamos nos <strong>da</strong>r conta que somos extremamente<br />

vulneráveis.<br />

A não ser, é claro, que a gente continue fazendo coisas boas. Todos<br />

os dias.<br />

Esse foi um dos principais motivos para eu vir para a Perestroika.<br />

Recomeçar do zero, numa função onde você não sabe na<strong>da</strong> (no caso,<br />

eu não sabia na<strong>da</strong> sobre “administrar uma escola”), é a melhor forma<br />

de não deixar a vai<strong>da</strong>de nos detonar.<br />

241


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

5. a pergunta de 1 milhão<br />

de dólares.<br />

Uma <strong>da</strong>s coisas mais legais <strong>da</strong> Perestroika é a relação que a gente<br />

tem com os alunos. Sem dúvi<strong>da</strong>, é uma proximi<strong>da</strong>de muito diferente<br />

do normal. Pelo menos, muito diferente de tudo o que eu vivenciei<br />

como aluno. Seja no colégio, na universi<strong>da</strong>de, quando fiz intercâmbio<br />

ou até na Miami Ad School.<br />

A gente curte pra caralho isso, se sente feliz por ser importante para os<br />

alunos e pelos vários papeis que a gente acaba assumindo nessa relação.<br />

Por um lado, nós somos professores – ou facilitadores, como preferimos<br />

chamar. A gente procura explicar a técnica, o processo, os<br />

atalhos, as dicas, mostrando o que a gente acha que funciona e o que<br />

normalmente não funciona.<br />

De outro, a gente serve como provocadores. Para provocar a curiosi<strong>da</strong>de,<br />

sugerir novas soluções, fomentar o pensamento lateral e a<br />

busca de respostas para perguntas que ain<strong>da</strong> não existem.<br />

Mas vários alunos nos procuram para pedir conselhos sobre a profissão<br />

e a vi<strong>da</strong>. Meio naquela pilha Sr. Miyagi.<br />

O que eu faço, isso ou aquilo?<br />

O que é melhor, este ou aquele outro?<br />

Para onde eu vou, para cá ou para lá?<br />

A famosa PERGUNTA DE UM MILHÃO DE DÓLARES.<br />

Na teoria, a vi<strong>da</strong> é muito simples. A gente só precisa saber duas coisas:<br />

1. O que a gente quer.<br />

2. O que a gente vai fazer para conseguir aquilo que se quer.<br />

Um tanto óbvio, não?<br />

Óbvio o caralho! Na prática, a gente sabe que não é bem assim.<br />

Às vezes, a gente já está contratado, mas pinta uma proposta de estágio<br />

num lugar muito legal. E fica dias e dias se remoendo para saber<br />

o que fazer.<br />

Em outras, bate aquele desespero. Pe<strong>da</strong>lo a facul<strong>da</strong>de para apostar<br />

no trabalho ou invisto no curso e vejo o que acontece depois?<br />

Tem horas que a gente se vê numa encruzilha<strong>da</strong>. Não sabe se se<br />

dedica à vi<strong>da</strong> pessoal ou à vi<strong>da</strong> profissional. Especialmente quando<br />

se tem vários amigos que fazem Direito ou Adminitração e sabem do<br />

trabalho às 17h30.<br />

Porra, é isso mesmo que eu quero fazer nos próximos 30 anos?<br />

Vou para a capital ou continuo aqui, na minha ci<strong>da</strong>de pequena?<br />

Será que eu sou criativo mesmo ou sou uma farsa?<br />

Em meio a tudo isso, há uma boa e uma má notícia.<br />

A má notícia é que, desde que a Humani<strong>da</strong>de é Humani<strong>da</strong>de, essa é a<br />

pergunta mais difícil que existe. Porque só você tem a resposta.<br />

A boa é que, como o próprio nome sugere, essa é uma pergunta de 1<br />

milhão de dólares. Se você responder, e responder certo, na<strong>da</strong> mais<br />

segura você. O 1 milhão de dólares – seja em dinheiro, seja em outro<br />

243


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

tipo de recompensa – é inevitável. Você pode largar o psiquiatra e viver<br />

a vi<strong>da</strong> numa boa.<br />

O grande problema é que, diferente do Show do Milhão, essa pergunta<br />

não dá pra pular. A gente infelizmente (ou felizmente) tem que<br />

enfrentar isso de frente. Porque só assim a gente sabe o que é melhor:<br />

isso ou aquilo, ir pra lá ou pra cá.<br />

Então, valendo 1 milhão de dólares: qual é a sua resposta?<br />

6. a len<strong>da</strong> do<br />

mercado saturado.<br />

Todo mundo já ouviu len<strong>da</strong>s urbanas.<br />

“Não aceite bebi<strong>da</strong> de estranhos, ou você pode acor<strong>da</strong>r numa banheira<br />

cheia de gelo e sem os seus rins.”<br />

“Não vá no cinema do Iguatemi, porque os caras colocam agulhas<br />

infecta<strong>da</strong>s com HIV.”<br />

“Não coma no McDonald’s: os hambúrgueres são feitos com carne<br />

de minhoca.”<br />

É ou não é? Ain<strong>da</strong> mais, depois que inventaram o e-mail. Len<strong>da</strong> urbana<br />

é o que não falta.<br />

Pois bem: dentro <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>, existe uma len<strong>da</strong> que me incomo<strong>da</strong><br />

bastante. A de que “o mercado está saturado”.<br />

Eu já troquei de emprego quatorze vezes. Já fui peão de gráfica e host<br />

de restaurante metido. Já fui assistente de arte, arquivador de fitas e<br />

jornalista de um veículo totalmente picareta. Já distribuí flyer na praia.<br />

Já fui o último estagiário na hierarquia de uma grande produtora (aquele<br />

que vem depois do cu do cachorro). Hoje, sou Diretor <strong>da</strong> minha<br />

própria empresa. Mas sabe-se lá o que virá amanhã.<br />

E por todos esses lugares, eu sempre acompanhei o desespero dos<br />

meus chefes quando alguém pedia demissão. Guar<strong>da</strong><strong>da</strong>s algumas ex-<br />

245


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

ceções, era sempre um parto achar um substituto. Fosse quem fosse.<br />

Do novato ao presidente.<br />

Isso indica que, diferente do que se diz nos corredores, o mercado<br />

não está saturado. Quer dizer: o mercado está saturado, sim.<br />

Mas saturado de profissionais que estão abaixo <strong>da</strong> expectativa de<br />

quem contrata.<br />

Quando se precisa de alguém bom, realmente bom, que entregue coisas<br />

acima <strong>da</strong> média, que tenha o respaldo de um bom portfólio, com<br />

maturi<strong>da</strong>de e postura, que seja do bem e não tenha medo de trabalho,<br />

é fo<strong>da</strong> de achar.<br />

Vi isso se repetir por to<strong>da</strong>s as agências que passei. Mas também no<br />

restaurante, na gráfica e até no jornal picareta.<br />

Esse cara valioso, quase insubstituível, que é uma mistura de Romário<br />

(pelo talento) e Dunga (pela postura), é dificílimo de achar. E se você<br />

abrir mão dos nomes de maior visibili<strong>da</strong>de (que normalmente já recebem<br />

um bom salário, ou já atendem boas contas, ou já estão felizes<br />

na empresas em que trabalham), fica mais difícil ain<strong>da</strong>.<br />

Se você for bom, mas bom mesmo, você vai ser valorizado pela<br />

sua agência e respeitado pelos colegas. E vocês viverão felizes<br />

para sempre.<br />

THE END<br />

7. tempo todo mundo tem.<br />

é só uma questão<br />

de priori<strong>da</strong>de.<br />

Certa vez, estava na noite e vi a cena com meus próprios olhos. Uma<br />

loira maravilhosa se aproximou do balcão e pediu um drink. Nem deu<br />

tempo dela receber a bebi<strong>da</strong> e já chegou um magrão solando.<br />

Fiquei só ouvindo a conversa para ver onde ia terminar. Dava pra sacar<br />

que o cara era endinheirado. Só o relógio devia custar mais que o meu<br />

apartamento. Era um Patek Philippe todo balaqueiro. Não tinha como não<br />

notar. A loirosa também percebeu. Talvez por isso fosse só sorrisos.<br />

Papo vai, papo vem, não deu nem dois minutos e o cara largou.<br />

— Então, vamos para o meu apê?<br />

A loira foi muito elegante, e respondeu sem levantar o tom de voz.<br />

— Acho que você se confundiu. Eu não sou dessas.<br />

— E se eu pagasse para você 200 reais?<br />

— Meu amigo, eu já falei. Você está me ofendendo.<br />

— E se eu desse 10 mil reais, agora, na bucha. Você ia?<br />

Ela mudou o semblante. Pensou, pensou, olhou o relógio.<br />

— Por 10 mil reais eu vou.<br />

— Então eu te ofereço 500.<br />

247


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

— Tá maluco? Você acha que eu sou puta?<br />

— Puta eu já sei que você é. Agora nós só estamos negociando<br />

o preço.<br />

Essa pia<strong>da</strong> é um ótimo exemplo de um conceito que eu defendo<br />

insistentemente.<br />

Existe uma coisa dentro de ca<strong>da</strong> um de nós que é o nosso combustível.<br />

Que nos estimula a fazer absolutamente tudo. É ela que define<br />

o que é importante e o que não é importante. Que determina a nossa<br />

relação de priori<strong>da</strong>des na vi<strong>da</strong>.<br />

Essa coisa se chama motivação. O sinal mais claro e evidente do que<br />

nos dá prazer.<br />

Se eu oferecer cinco reais para você correr uma maratona, você talvez<br />

ache a proposta ridícula. Agora, se eu oferecer um milhão de reais, é<br />

bem possível que você se interesse. E até consiga chegar à linha de<br />

chega<strong>da</strong>, por mais fora de forma que esteja.<br />

Um milhão de reais é uma grande motivação. É muito dinheiro, e dinheiro<br />

é importante pra (quase) todo mundo.<br />

Só que no mundo real, ninguém oferece um milhão de reais para<br />

você fazer o seu trabalho bem feito. Ou para você chegar na hora<br />

nos compromissos. Ou para fazer as coisas com antecedência, e<br />

não em cima <strong>da</strong> hora.<br />

Para fazer tudo isso, você precisa de motivação. É uma força interior.<br />

Ninguém precisa dizer na<strong>da</strong>. Você simplesmente faz porque<br />

aquilo é importante.<br />

Ninguém precisa dizer para você: dê atenção para a sua namora<strong>da</strong>. Se<br />

você gosta dela, naturalmente vai agradá-la.<br />

Se o seu filho adoecer e baixar hospital, você vai <strong>da</strong>r bola para o ro<strong>da</strong>pé<br />

que tinha que layoutar até as 11h? Que na<strong>da</strong>: você vai sair correndo<br />

e deixar tudo pra trás. Afinal, essa é a sua priori<strong>da</strong>de.<br />

Fico imaginando um torcedor fanático dizendo Não fui no jogo porque<br />

esqueci que ontem era a Final <strong>da</strong> Libertadores.<br />

Portanto, não se engane. As coisas que você lembra, que você dá<br />

atenção, que você coloca em primeiro plano são ver<strong>da</strong>deiramente importantes<br />

para você. É que o dá prazer, é o que é relevante, são as<br />

coisas que você acredita.<br />

O que você faz aos trancos e barrancos, correndo, na última hora, não.<br />

Todo mundo sabe que, como professor, sou bem exigente. E defendo<br />

essa posição pelo princípio <strong>da</strong> motivação.<br />

Se você tem uma semana para fazer o tema, e deixou para a última<br />

hora, me desculpe. É sinal de que fazer o tema não era tão importante<br />

para você quando você está tentando me convencer que era.<br />

Você tinha outras priori<strong>da</strong>des. Ver a namora<strong>da</strong>, ir no jogo do Inter, beber<br />

com os amigos, dormir. Respeito e dou o maior apoio. Quem define<br />

as priori<strong>da</strong>des <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong> é você. Agora, só não me venha dizer<br />

que não teve tempo. Porque o dia tem 24h para todos nós.<br />

Tempo todo mundo tem. É só uma questão de priori<strong>da</strong>de.<br />

Se você não fez o tema, ou fez mal feito, sinal de que tinha outras<br />

249


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

priori<strong>da</strong>des. E aí, essa é uma escolha sua, não minha. Por isso, quem<br />

tem que arcar com as consequências é você, não eu.<br />

O mais importante de todo esse papo de motivação, pra mim, é<br />

se conhecer.<br />

Por exemplo: se você procura determinado amigo só para pedir favores,<br />

é sinal de que aquela pessoa não é importante para você. Os<br />

favores dela é que são.<br />

Se você diz que adora o seu emprego, mas está sempre de saco cheio,<br />

sem a menor paciência para fazer o que estão lhe pedindo, contando<br />

as horas para o final de semana, pense bem. Tem coisa erra<strong>da</strong> aí.<br />

Perceba: as maiores dicas estão nos seus atos repetidos. É impossível<br />

fugir <strong>da</strong> nossa natureza.<br />

Se você sempre chega na hora quando o seu chefe man<strong>da</strong>, e sempre<br />

chega atrasado nos encontros <strong>da</strong> sua turma, você definitivamente não<br />

é um cara pontual.<br />

Se você fica todos os dias até tarde na agência, isso tem alguma importância<br />

para você. Talvez, você esteja investindo na sua carreira,<br />

porque isso é uma coisa na qual você acredita. Talvez você queria só<br />

mostrar para os outros como é trabalhador, e por isso não abre mão<br />

de entrar noite adentro. Talvez esse seja um valor <strong>da</strong> sua família, talvez<br />

você esteja apenas repetindo o que o seu pai e a sua mãe workaholics<br />

fizeram a vi<strong>da</strong> inteira. Talvez você more sozinho, e não queira ficar isolado.<br />

Ou talvez você esteja duro e goste de ficar até tarde pra ganhar<br />

pizza de graça.<br />

Não importa. Seja com a sua namora<strong>da</strong>, com o seu dupla, com os<br />

seus sócios ou com a sua família. Se você não faz espontaneamente<br />

determina<strong>da</strong>s coisas, acredite: elas não são tão importantes quanto<br />

você acha que são.<br />

A minha dica é não ficar lutando contra isso. Se você faz as coisas por<br />

obrigação, e não por vontade própria, tente mu<strong>da</strong>r esse panorama. Ou<br />

você vai ficar sofrendo a vi<strong>da</strong> inteira.<br />

Você tem que estar apaixonado pelas coisas que faz e pelas pessoas<br />

com quem convive.<br />

Eu sou apaixonado pela Perestroika. E é por isso que, mesmo viajando,<br />

mesmo de férias, eu não consigo ficar longe do nosso Blog.<br />

251


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

8.diamantes.<br />

Nesse final de semana, tive o privilégio de filmar novamente com o<br />

Bernardinho. Ele é um cara fantástico no set. Não reclama, não tem<br />

nenhum estrelismo e topa to<strong>da</strong>s as bizarrices que a gente inventa. E<br />

ain<strong>da</strong> é puro alto astral, está sempre fazendo pia<strong>da</strong> e divertindo a galera<br />

<strong>da</strong> produção.<br />

Mas dessa vez, eu tive um privilégio maior que nas edições anteriores.<br />

Em determinado momento <strong>da</strong> filmagem, quando estavam ro<strong>da</strong>ndo<br />

uma cena só com o Giba, ficamos batendo um papo in off. Sem câmeras,<br />

sem microfones, sem responsabili<strong>da</strong>des.<br />

Seria até presunção dizer que foi uma conversa. Porque durante aqueles<br />

20 minutos, eu praticamente não falei. Não valia a pena investir<br />

aqueles poucos minutos ouvindo a minha própria voz.<br />

Vale lembrar: o Bernardinho cobra muito caro pelas palestras que dá.<br />

Falamos principalmente de esporte. Eu adoro espor te, e parecia que<br />

eu estava lendo um almanaque. Ele sabia <strong>da</strong>tas, placares, nomes,<br />

tudo de cor. Detalhes que fariam inveja ao PVC. Impressionante.<br />

No meio disso tudo, ele explicou qual é a principal diferença entre um<br />

grande jogador e um campeão. Usando outras palavras, ele disse que<br />

“o grande jogador é aquele que praticamente não erra. E o campeão é<br />

o que não erra quando não pode errar.”<br />

Tá, eu sei que esse não é um ponto de vista muito novo. Muita gente<br />

fala isso e não é de hoje. Mas sei lá: ouvir essas palavas do cara que<br />

montou o time mais vitorioso <strong>da</strong> história do esporte, em todos esportes,<br />

em todos os tempos, foi diferente.<br />

Peguemos como exemplo o Michael Jor<strong>da</strong>n.<br />

Sempre que tinha jogo decisivo, a história era a mesma. Faltavam<br />

poucos segundos. O técnico adversário sabia que a bola ia para o<br />

Jor<strong>da</strong>n. O time adversário sabia que a bola ia para o Jor<strong>da</strong>n. A torci<strong>da</strong>,<br />

o comentarista, o mundo inteiro sabia que a bola ia para o Jor<strong>da</strong>n.<br />

E bola ia para o Jor<strong>da</strong>n. Mas parecia impossível marcá-lo. Na pressão,<br />

ele não arrepiava.<br />

Acho que esse conceito se aplica um pouco ao nosso negócio.<br />

Os grandes profissionais com quem convivi foram justamente aqueles<br />

que, na hora do aperto, tiraram leite de pedra. Quando alguém virava<br />

e dizia “ou a gente acerta nessa campanha, ou vamos perder a conta”.<br />

E o cara ia lá, e fazia o melhor anúncio <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>.<br />

Ou quando <strong>da</strong>va um problema num comercial, que mu<strong>da</strong>va o roteiro<br />

depois de filmado. E a dupla era obriga<strong>da</strong> a fazer um remendo, com as<br />

cenas já capta<strong>da</strong>s, deixando tão bom quanto a versão original.<br />

Ou naquelas vezes que está tudo pronto, montado, e alguém descobre<br />

que a concorrência vai lançar uma campanha igual. Daí é virar a<br />

noite e produzir algo tão bom quanto o que acabou de ser feito, mas<br />

em tempo recorde.<br />

Existe um ditado que eu amo, que é: diamantes nascem sob pressão.<br />

Sempre que eu vejo os vencedores de um festival, faço a minha própria<br />

avaliação.<br />

253


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Ca<strong>da</strong> vez mais eu valorizo aqueles trabalhos de ver<strong>da</strong>de, para produtos<br />

de ver<strong>da</strong>de. Que dá para ver o briefing sendo resolvido. O problema<br />

que o cliente tinha e a solução que foi encontra<strong>da</strong>. É aí que estão<br />

os diamantes.<br />

Só nessas condições, só um trabalho que vai para a rua MESMO é<br />

que me impressiona. Porque só assim a ideia é coloca<strong>da</strong> a prova por<br />

um diretor de criação que está pensando seriamente sobre o assunto.<br />

Que tem um cliente avaliando de forma séria o que vai ao ar. E que é<br />

julgado pelo consumidor, o ver<strong>da</strong>deiro júri <strong>da</strong>s nossas ideias.<br />

Criar para o mercado publicitário, ou para filantropia, ou fazer fantasmas,<br />

ou até esses clientes que não remuneram a agência e topam<br />

qualquer barbari<strong>da</strong>de, é como jogar um amistoso.<br />

Eu já criei, e vez por outra continuo criando para esse segmento. Não<br />

sou a favor do fim desse tipo propagan<strong>da</strong>. Por favor!<br />

Agora, lá no fundinho, eu sei que existe uma grande diferença entre<br />

isso e o anúncio produto-e-preço <strong>da</strong> STIHL que volta e meia entra na<br />

nossa pauta.<br />

Então, to<strong>da</strong> vez que pintar um job casca grossa para você, não veja<br />

como uma engronha. Veja como um teste. Um teste para saber se<br />

você já está preparado para desafios maiores. Um teste para saber se<br />

você já pode assumir grandes responsabili<strong>da</strong>des. Se você já se transformou<br />

em diamante, ou se ain<strong>da</strong> é carvão.<br />

E se o prazo for curto, lembre-se do Michael Jor<strong>da</strong>n. Ele normalmente<br />

tinha que se virar só com alguns segundos.<br />

9. correria? correria!<br />

É comum a gente, numa rodinha de publicitários, ouvir o seguinte papo:<br />

— Esse findi eu trabalhei pra caralho.<br />

Ou:<br />

— Essa semana saí todos os dias às três <strong>da</strong> manhã.<br />

Ou ain<strong>da</strong>:<br />

— Putz, faz quatro meses que eu trabalho sábado e domingo.<br />

Ca<strong>da</strong> vez mais, eu acho que esse discurso não é por causa <strong>da</strong> nossa<br />

rotina mega-atarefa<strong>da</strong>. O que eu percebi, e essa é a tese que eu defendo,<br />

é que nós vemos a fodelança como status.<br />

Isso aí. No nosso meio, se fuder é ser fo<strong>da</strong>.<br />

Você pode até nem concor<strong>da</strong>r comigo. Mas sei lá. Parece que existe<br />

uma necessi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> gente mostrar para os outros que se está trabalhando<br />

muito.<br />

Não consigo identificar bem a razão.<br />

Talvez, isso signifique que a gente está numa agência grande (afinal, a<br />

maioria <strong>da</strong>s agências grandes são assim).<br />

Ou um sinal de que temos muitas responsabili<strong>da</strong>des, que somos imprescindíveis<br />

no processo.<br />

255


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Ou que nós somos mega-exigentes e, dessa forma, nunca nos <strong>da</strong>mos<br />

por satisfeitos saindo na hora (quem garante que o próximo Leão não<br />

vai pintar às 3h <strong>da</strong> madruga<strong>da</strong>?).<br />

Repare que, nos corredores dos festivais de propagan<strong>da</strong>, o discurso<br />

clássico é:<br />

— E aí, como tá lá?<br />

— Correria, e lá?<br />

— Correria, correria.<br />

É ou não é?<br />

Parece meio aquela pia<strong>da</strong> <strong>da</strong> Sharon Stone na ilha deserta. Se você<br />

come uma gostosa, e não conta pra ninguém, não tem a menor graça.<br />

Se você vira a noite trabalhando, e não conta para seus colegas, ninguém<br />

vai saber que você foi um herói.<br />

Não seria essa uma prova de que vemos a fodelança como status?<br />

Eu, num encontro desses, há alguns anos, fiz questão de responder<br />

pra todo mundo “Pois é, minha vi<strong>da</strong> está bem tranquila, tenho saído<br />

no horário”. (OK, não era ver<strong>da</strong>de. Mas eu só queria ver a reação<br />

<strong>da</strong>s pessoas.)<br />

E não é que todo mundo me olhava meio estranho? Como se fosse<br />

proibido estar bem posicionado no mercado e sair às 19h.<br />

Mais: se a questão é se exibir, não seria mais lógico o raciocínio inverso?<br />

“Eu trabalho pouco, chego às 11h, saio pra almoçar, só volto às 15h,<br />

nunca fico até mais tarde, tô cagando para todo mundo, e ain<strong>da</strong> assim<br />

precisam de mim”.<br />

Ninguém se vangloria de ter um carro caindo aos pe<strong>da</strong>ços, ou de ganhar<br />

mal, ou de morar num JK alugado.<br />

Ninguém, tirando o Jorge Kajuru, chega para uma mina dizendo “Eu<br />

sou ruim de cama, tenho pau pequeno e já fiz troca-troca”.<br />

Ninguém se vende assim. Porque não existe status nisso.<br />

Então, por que insistimos tanto nessa Síndrome de Sofrenildo?<br />

Agora, não confun<strong>da</strong> isso tudo com falta de ralação.<br />

Uma coisa é trabalhar para caralho. Ser um eterno insatisfeito. Ser exigente<br />

e não se contentar com o que já fizeram. Não aceitar bem a média.<br />

Outra coisa é ter a necessi<strong>da</strong>de de falar para todo mundo que você<br />

trabalha para caralho. É se afirmar em cima disso.<br />

Uma coisa é a reali<strong>da</strong>de do mercado. Que exige bastante e faz a gente<br />

virar a noite. Que joga para o acostamento que não agUenta o tranco.<br />

Outra coisa é se exibir. Como se o fato de ficar até tarde fosse um troféu.<br />

Sinceramente, espero que esse post sirva para recrutar pessoas que<br />

também pensam como eu. Não existe nenhum problema em trabalhar<br />

bastante, nem em ser exigente. O bizarro é ver alguma vantagem nisso.<br />

É ou não é, Kajuru?<br />

257


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

10. quando a história<br />

é conta<strong>da</strong> de trás<br />

para frente.<br />

Esses dias encontrei uma revista Wired que me chamou a atenção. A<br />

capa tinha o logo <strong>da</strong> Apple e dizia “Reze”.<br />

Aposto que a grande maioria <strong>da</strong>s pessoas, hoje, lê o “Reze” como<br />

“Reze em nome <strong>da</strong> Apple, afinal de contas, ela é fo<strong>da</strong>”.<br />

Quando olhei com atenção, e vi a <strong>da</strong>ta, me impressionei. “Junho de<br />

1997”. Sim, essa edição tem mais de dez anos. E, ao contrário do que<br />

possa parecer, o significado de “Pray” é justamente o contrário. “Reze<br />

pela Apple, pois ela está quase morrendo”.<br />

A Wired previa um futuro extremamente nebuloso para a companhia.<br />

Justo quando Steve Jobs voltava à empresa como consultor e começava<br />

a tornar a Apple uma <strong>da</strong>s empresas mais inovadoras do mundo.<br />

Talvez A mais inovadora do mundo.<br />

Revista Wired, 1997. A reportagem tem como título “101 maneiras de<br />

salvar a Apple”. Curiosamente, o item 1 sugere: “Admita, Apple. Você<br />

está fora do ramo de hardwares”. Hoje nós sabemos que a Apple não<br />

só aumentou sua fatia no mercado de computa- dores, como criou<br />

uma nova plataforma de hardware: o Ipod.<br />

Canso de ver jogos de futebol que, até os 25 do segundo tempo, estão<br />

indefinidos. Um time na pressão, outro na retranca. Aí, num contra-<br />

ataque, sai o segundo. A equipe se joga para tentar empatar, mas<br />

abre espaços na defesa. Termina 4x0 e o comentarista larga: “foi uma<br />

parti<strong>da</strong> de um time só, que mostrou superiori<strong>da</strong>de, soube se defender<br />

e matar o jogo na hora certa”.<br />

Quando a história é conta<strong>da</strong> de trás para frente, é tudo muito fácil.<br />

Cresci ouvindo meu pai dizer que as pessoas julgam o sucesso dos<br />

outros, mas nunca consideram os riscos envolvidos para alcançar<br />

esse sucesso. No caso do jogo de futebol: colocar o time inteiro na<br />

retranca pode ser um tiro no pé. Se tomar um gol, o técnico é burro.<br />

Se ganhar, é um herói.<br />

Muita gente erra porque se arrisca. No ramo de computadores, no<br />

futebol e na propagan<strong>da</strong>. Quantas campanhas a gente vê no ar e diz<br />

“caralho, onde é que eles estavam com a cabeça?”.<br />

Se dissessem que “para anunciar o PSP, a Sony vai grafitar muros de<br />

Nova York com imagens de caras jogando”. Alguém em sã consciência<br />

teria coragem de reprovar esse viral?<br />

Você com certeza ain<strong>da</strong> enfrentará muitas situações assim. Agora,<br />

como criador <strong>da</strong>s suas próprias ideias. E mais para frente, como avaliador<br />

<strong>da</strong>s ideias dos outros.<br />

Eu aprendi a admirar quem, no mundo <strong>da</strong> propagan<strong>da</strong>, sabe correr riscos.<br />

Sejam os doentes ou sejam os comportados. Sim, porque quando<br />

se fala em riscos, muitos confundem com ousadia. Às vezes, ser<br />

conservador é o mais inusitado, justamente o que garante vi<strong>da</strong> longa<br />

para determina<strong>da</strong> campanha.<br />

Veja o exemplo de marcas que não alteram as suas embalagens há<br />

déca<strong>da</strong>s. Aposto que algum chato passou anos e anos tentando convencer<br />

o Seu Maizena a trocar o rótulo para que o produto não parecesse<br />

velho.<br />

259


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Quando vir uma grande realização, valorize todos os capítulos <strong>da</strong> história.<br />

E, principalmente, os personagens que a fizeram possível.<br />

Porque o sucesso só é fácil quando a história é conta<strong>da</strong> de trás<br />

para frente.<br />

11. o atendimento.<br />

Acho que existe um preconceito, até uma certa ingenui<strong>da</strong>de, quando<br />

se fala que o atendimento é burro.<br />

Claro, eles não entendem a sutileza de determina<strong>da</strong>s ideias. Simplesmente<br />

porque não têm o cérebro treinado para isso. Assim como você<br />

provavelmente não entende um monte de coisa que eles fazem muito<br />

bem. E com uma mão nas costas.<br />

Claro, eles não escrevem tão bem quanto um re<strong>da</strong>tor. E por isso aparecem<br />

erros de português no PIT. Por outro lado, você provavelmente não<br />

tem o tato que os atendimentos precisam ter quando o cliente liga bufando<br />

porque acabou de ver que o seu anúncio saiu borrado no jornal.<br />

Esse tato é talento. Um talento diferente do criador, mas igualmente<br />

importante para a agência.<br />

Se você fez um anúncio do caralho e o atendimento não aprovou, não<br />

significa que ele tenha apresentado mal. Existem infinitos fatores para<br />

que o cliente renegue um trabalho. Quem já esteve na linha de frente<br />

sabe como é.<br />

Já vi um diretor de arte reclamar que o atendimento tinha enviado sua<br />

campanha para o cliente por email. E eu perguntei: “Você foi até o<br />

atendimento defender a ideia? Ou mandou por email?”. Ele nem teve<br />

coragem de responder.<br />

Você já se imaginou no papel do atendimento? Como reagiria se alguém<br />

chegasse em cima do prazo e disesse “olha, vai demorar mais<br />

261


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

uma hora até terminar de layoutar”. Ou quando apresentassem um<br />

anúncio completamente fora do briefing quando não desse mais tempo<br />

de refazer?<br />

Está cheio de atendimento burro ganhando 3, 4, 5 vezes mais que o<br />

esperto <strong>da</strong> criação. Conheço muitos atendimentos que têm o cliente<br />

na mão. Que se saísse <strong>da</strong> agência, levaria a conta junto. E conheço<br />

pouquíssimos criadores com esse poder.<br />

Até concordo que, na média, eles são menos capacitados que os criadores.<br />

Mas discordo <strong>da</strong> generalização. Até porque, se eu concor<strong>da</strong>r,<br />

não aprovo mais nenhuma ideia.<br />

12. eu adoro<br />

Volante bandido.<br />

Uma <strong>da</strong>s coisas que eu mais gosto na Perestroika é, como diz o<br />

Felipe, quebrar a matrix <strong>da</strong> turma. Porque no primeiro dia, a gente<br />

olha lá de cima e fica imaginando quem vocês são. No primeiro contato,<br />

é impossível tirar qualquer conclusão sem cair em preconceitos<br />

e estereótipos.<br />

Com o passar <strong>da</strong>s semanas, ca<strong>da</strong> um vai se revelando. E é aí que a<br />

coisa fica bacana. O Lucas deixa de ser o filho <strong>da</strong> Helena. O Panichi<br />

deixa de ser o pinta que imita o Silvio Santos. Ca<strong>da</strong> um se transforma<br />

num cara diferente <strong>da</strong>quele neguinho do primeiro dia de aula. E invariavelmente<br />

essa nova pessoa é muito mais legal.<br />

É nessa hora que a gente vê quem vocês realmente são.<br />

O mercado publicitário nos induz a seguir um modelo que nem sempre<br />

combina com a gente. Temos que cortar o cabelo no Sexton. Temos<br />

que an<strong>da</strong>r de All-Star. Temos que ter um Iphone. Ou não. Mas <strong>da</strong>í<br />

vão olhar você dos pés à cabeça com um ar de reprovação. Justo o<br />

mundo <strong>da</strong> publici<strong>da</strong>de, que se diz tão mente aberta.<br />

Não há na<strong>da</strong> de errado em gostar de All-Star. O errado é ser engolido<br />

por esse universo. Não é fácil ser pagodeiro num meio onde todo<br />

mundo gosta de música eletrônica. Não é fácil ser mauricinho quando<br />

todo mundo é hype. E se você é pagodeiro ou mauricinho, tenho certeza<br />

que vai concor<strong>da</strong>r comigo.<br />

263


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

O mais importante é ser autêntico. Porque você só consegue dizer<br />

coisas ver<strong>da</strong>deiras – seja na propagan<strong>da</strong>, seja na vi<strong>da</strong> – se você for<br />

ver<strong>da</strong>deiro. Quando a gente vive um personagem o tempo todo, e só<br />

deixa o papel quando deita na cama, alguma coisa está erra<strong>da</strong>.<br />

Se o seu negócio é pagodão, desses bem bagaceiros, não tenha<br />

medo de assumir. Até porque, uma hora ou outra, isso vai ser uma<br />

puta vantagem competitiva para você. Já pensou, quando tiver que<br />

criar um jingle chicletão para aquela rádio popular? Tenho certeza que<br />

vai tirar de letra.<br />

Seja autêntico. Os caras mais fo<strong>da</strong>s que eu conheço são assim. E só<br />

são fo<strong>da</strong>s porque são assim.<br />

Eu adoro volante bandido, jogar poker, Jack Black, cafuné, almoçar<br />

sozinho, feijão com farinha, camisa de botão, humor negro, filmes de<br />

máfia, <strong>da</strong>r aula na Perestroika, a sobremesa do Constantino, as pia<strong>da</strong>s<br />

do meu vô, Diogo Mainardi, conversar com estrangeiros, Buenos<br />

Aires, fazer churrasco ouvindo Sala de Domingo.<br />

Eu odeio dirigir, tirar fotos, casamentos, fazer a barba, trabalhar no<br />

final de semana, livros com mais de 100 páginas, frutas, verduras, inverno,<br />

morar longe dos meus pais, Cinema Novo, gente que <strong>da</strong>nça no<br />

meio <strong>da</strong> rodinha, Faustão e luau com violão.<br />

E tudo isso, certo ou errado, eu tento colocar nos meus títulos e roteiros<br />

<strong>da</strong> maneira mais ver<strong>da</strong>deira possível. Porque essa conjunção de<br />

fatores, essa visão de mundo, é um privilégio só meu.<br />

Se eu conseguir transformar isso numa coisa interessante, será impossível<br />

copiar.<br />

Nesse sentido, um aluno conquistou meu respeito e admiração. Um<br />

cara que é bem resolvido, que não se intimidou nem pelos alunos,<br />

nem pelos professores. Que li<strong>da</strong> com as brincadeiras com bom humor,<br />

sem nunca esquentar a cabeça. E que, mesmo com to<strong>da</strong>s as provocações,<br />

nunca foi capaz de nos xingar com um único palavrão.<br />

*Esse post faz referência a um aluno chamado Tronquini, que não falava<br />

palavrão até entrar na Perestroika. Lembro com carinho desse cara.<br />

265


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

13.Vai lá e faz. mas Vai lá<br />

e acaba.<br />

Muita gente conhece o lema “Vai lá e faz”. Mas muita gente o interpreta<br />

de forma erra<strong>da</strong>.<br />

Vai lá e faz é mais do que começar. Vai lá e faz é ir do início ao fim do<br />

processo. É tirar o projeto do papel e colocá-lo de pé. Porque começar<br />

a primeira página de um livro é moleza. Porque montar o business<br />

plan de um novo site de compra coletiva é teta. Porque ligar para a<br />

menina e convidá-la pra sair não é o mais fo<strong>da</strong>.<br />

Difícil é ver o livro publicado, a empresa inaugura<strong>da</strong> ou o beijo<br />

consumado.<br />

Portanto, to<strong>da</strong> vez que você pensar em “vai lá e faz”, não esqueça que,<br />

tão importante quanto começar, é terminar. Projetos pela metade têm<br />

muito, muito pouco valor. Muitas vezes, não têm nenhum valor.<br />

No meio corporativo, chamam isso de acabativa. Mas eu, sinceramente,<br />

não gosto desse termo. Prefiro a simplici<strong>da</strong>de do “vai lá e acaba”,<br />

que é um tapa na cara <strong>da</strong>s pessoas que são ótimas em desistir.<br />

Nessas horas, faz todo o sentido se utilizar <strong>da</strong> lógica beta. Pense no<br />

jeito mais simples de levantar o seu projeto. E aí, com ele funcionando,<br />

comece a mu<strong>da</strong>r. Aplique as melhorias. Ajuste o que puder ser evoluído.<br />

Troque a cor, mude o preço, reforce a equipe.<br />

Se a Perestroika decidisse ser uma escola de ativi<strong>da</strong>des criativas na<br />

sua primeira edição, a gente nunca teria conseguido tornar o negócio<br />

rentável. Foi justamente essa lógica orgânica, de um passo de ca<strong>da</strong><br />

vez, que nos deu um crescimento ágil, porém sustentável.Se você fica<br />

olhando lá para frente, você nunca acaba. E só quando você acaba é<br />

que as coisas começam.<br />

Vai lá e faz. Mas vai lá e acaba o que você fizer.<br />

267


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

14. saiba o que Você sabe.<br />

e o que Você não sabe.<br />

Quem acompanha o blog sabe. Gosto muito de futebol. Acompanho<br />

meu time, mas também acompanho o esporte como um todo. Gosto<br />

de fazer aqueles desenhos táticos. Gosto de entender o que está passando<br />

pela cabeça do técnico. Gosto <strong>da</strong>s movimentações silenciosas,<br />

que não são valoriza<strong>da</strong>s pela maioria dos torcedores.<br />

Mas também adoro o lado business. A estratégia macro de um clube.<br />

Do que ele pensa para a instituição, e não apenas para o plantel<br />

de jogadores.<br />

Hoje, li que o Inter estu<strong>da</strong> fazer uma pré-tempora<strong>da</strong> na Argentina, com<br />

a intenção de difundir sua marca no exterior. E aí, quando você ouve<br />

isso, fica mais fácil entender por que Guiñazu, Bolatti e D’alessandro<br />

são figuras importantes no grupo colorado. Aí, fica mais fácil perceber<br />

o motivo <strong>da</strong> contratação de Pato Abbon<strong>da</strong>nzieri, mesmo em fim de<br />

carreira. Aí, fica mais fácil sacar por que Jorge Fossati e Paulo Roberto<br />

Falcão foram apostas <strong>da</strong> diretoria.<br />

Se você olhar o microcosmo, olhar o jogo que vem pela frente, talvez<br />

ache que o Guiñazu ser convocado para a Seleção Argentina é um<br />

péssimo negócio. Mas quando você entende o contexto geral, fica<br />

claro que – para a instituição – é um circunstância favorável.<br />

As decisões num clube de futebol não são feitas, exclusivamente,<br />

pensando no rendimento dentro <strong>da</strong>s quatro linhas. Existe uma série<br />

de coisas para se levar em conta. O reserva descontente que começa<br />

a minar o vestiário. O goleiro que brigou com a mulher e que<br />

talvez não esteja seguro para a próxima parti<strong>da</strong>. O dirigente que<br />

quer se reeleger na eleição do ano que vem. O conselheiro que está<br />

em dívi<strong>da</strong> com um jornalista e que tem uma informação privilegia<strong>da</strong>.<br />

A valorização de um atleta que está com o contrato encerrando. E<br />

assim por diante.<br />

Se você olha o micro, você pensa “puxa, por que ele não escala os<br />

melhores!”. Mas se você entende o macro, você entende que ele,<br />

provavelmente, ESCALOU OS MELHORES. A diferença é que você<br />

não tem informação suficiente para fazer esse julgamento.<br />

Isso, que é fácil de perceber em futebol, acontece em todos os organismos<br />

sociais. E a gente, do alto <strong>da</strong> nossa sabedoria, faz um julgamento<br />

leviano, raso, com a pretensão de que sabe tudo o que está se<br />

passando. E diz, como senhor <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de: “que cara idiota!”.<br />

Criticamos o trabalho do colega, sem sabermos que ele passou a noite<br />

em claro cui<strong>da</strong>ndo do filho que estava com febre.<br />

Criticamos a empresa concorrente, sem sabermos que eles estão a<br />

ponto de fechar com um cliente gigante, e não puderam <strong>da</strong>r muita<br />

bola para o produto recém lançado.<br />

Criticamos o amigo que não sai de casa nunca, que é um velho, sem<br />

sabermos que, no fundo, ele está em depressão profun<strong>da</strong>.<br />

Criticamos um tweet sem sabermos que, na ver<strong>da</strong>de, o cara está man<strong>da</strong>ndo<br />

uma mensagem vela<strong>da</strong> para uma gatinha que está saindo.<br />

Criticamos a política, a economia, o trânsito. Xingamos muito no Twitter.<br />

Avaliamos tudo por um prisma incompleto e batemos o martelo<br />

numa sentença de certeza.<br />

Eu faço isso. Você faz isso. Todo mundo faz isso.<br />

269


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Claro: o mundo seria muito chato se não houvesse essas opiniões. Talvez<br />

a graça <strong>da</strong>s discussões de bar, dos papos informais, <strong>da</strong>s conjecturas<br />

paranóicas esteja justamente aí. No caráter experimental, na dúvi<strong>da</strong>,<br />

na incerteza, na convicção de um quebra-cabeças cheio de furos.<br />

Por favor, não é isso que estou dizendo.<br />

Só acho perigoso o cara que não apenas ignora várias variáveis <strong>da</strong><br />

equação, mas nem considera que elas possam existir. E aí, além de<br />

errado, muitas vezes passa por ingênuo.Como empresário, vivi experiências<br />

boas e ruins nesses dois sentidos. Já me senti dono <strong>da</strong><br />

ver<strong>da</strong>de e me quebrei bonito (e ain<strong>da</strong> vou me quebrar muitas vezes),<br />

por achar que estava a par de tudo. Assim como já vivi situações em<br />

que, por ter informações privilegia<strong>da</strong>s, vi como eram ingênuas certas<br />

colocações.<br />

Na obra-prima de Francis Ford Coppola, O Poderoso Chefão, que revi<br />

esses dias, existe um diálogo que resume tudo isso que falei. Michael<br />

Corleone, filho de Dom Corleone e futuro herdeiro do império <strong>da</strong> máfia,<br />

conversa com sua futura esposa, Kate.<br />

— Meu pai não é diferente de nenhum outro homem poderoso,<br />

como um presidente ou um senador.<br />

— Você percebe como é ingênuo? Presidentes e senadores não<br />

man<strong>da</strong>m matar pessoas.<br />

— Quem está sendo ingênuo, Kay?<br />

Moral <strong>da</strong> história? Não basta só saber o que você sabe. Você tem<br />

que ter uma noção do quanto você não sabe. Só assim você vai estar<br />

preparado para uma rasteira que pode vir ali na frente. E evita uma<br />

exposição desnecessária.<br />

Evita que aquele comentário que você faz, convicto, gere uma troca<br />

de olhares constrangidos entre todos os outros presentes na reunião.<br />

Que pensam silenciosamente:<br />

Se ele soubesse…<br />

É difícil, muito difícil, especialmente para pessoas que ain<strong>da</strong> estão<br />

amadurecendo na profissão (meu caso como empresário). Mas é importante.<br />

Especialmente quando o técnico escala um terceiro volante<br />

e seu colega ao lado resmunga.<br />

E isso é tudo o que sei. Ou que não sei.<br />

271


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

15. as três principais<br />

coisas que aprendi com<br />

empreendedores.<br />

Esse período no Rio está fantástico. A quanti<strong>da</strong>de de reuniões que a<br />

gente tem feito com pessoas influentes é absur<strong>da</strong>. A recepção, em<br />

todos os locais, sem exceção, foi ótima. E o aprendizado, às vezes<br />

deliberado, às vezes por observação, às vezes por osmose, tem sido<br />

pra vi<strong>da</strong>.<br />

Na volta <strong>da</strong> Farm, onde trocamos uma ideia com o Marcelo Bastos,<br />

twittei uma conclusão que tirei desse intensivão. E agora que o dia acalmou<br />

um pouco, resolvi descrever melhor a minha linha de raciocínio.<br />

Portanto, as três principais coisas que aprendi com empreendedores<br />

até agora são:<br />

1. Conheça e se ConeCte Com gente Fo<strong>da</strong>.<br />

A maioria dos negócios que fiz nasceu depois de ter encontrado<br />

gente relevante. Essas pessoas sugeriram ideias, me indicaram outras<br />

pessoas, convi<strong>da</strong>ram para oportuni<strong>da</strong>des que nunca rolariam<br />

se eu não estivesse lá, naquele lugar, naquela hora. Outra: gente<br />

fo<strong>da</strong> atrai gente fo<strong>da</strong>.<br />

Um dos meus lemas é sempre tentar ser o cara mais burro <strong>da</strong> reunião.<br />

Sinal de que eu talvez não tivesse que estar lá. E se estou, é porque<br />

tive méritos em me conectar com gente do caralho.<br />

Quando falo com esses fo<strong>da</strong>lhões, é sempre assim. Eles vão se juntando<br />

com gente legal, que traz mais gente legal e, quando vê, é um<br />

batalhão de mentes diferencia<strong>da</strong>s.<br />

Não tem como sair algo ruim.<br />

2. Faça mais e planeje menos.<br />

Não estou dizendo para não haver planejamento. Só estou dizendo<br />

que SÓ o planejamento não leva a lugar nenhum. A ação, mesmo que<br />

mal planeja<strong>da</strong>, leva. Porque, muitas vezes, sem planejamento, e só<br />

com intuição, é possível fazer muita coisa legal.<br />

Moral <strong>da</strong> história: todos os caras incríveis que conheci na vi<strong>da</strong> tinham<br />

isso no sangue.<br />

Eles planejavam, mas antes do planejamento estar 100% pronto, já<br />

saíam tocando a ideia de alguma forma.<br />

Não dá para explicar exatamente. Não é um sistema, não é uma ferramenta.<br />

É um modelo mental que confirma aquela máxima. Papel não<br />

para em pé.<br />

3. quando Chegar lá, não vire um esCroto.<br />

É óbvio que, quanto mais o cara cresce na vi<strong>da</strong> profissional, mais<br />

complica<strong>da</strong> fica a agen<strong>da</strong>. Chega uma hora que, por mais legal que<br />

o neguinho seja, ele não vai conseguir <strong>da</strong>r atenção para todo mundo.<br />

E alguns emails vão ficar sem resposta. Alguns telefonemas vão cair<br />

na caixa. E alguns comentários como É, agora está se achando vão<br />

surgir naturalmente.<br />

Mas os neguinhos fo<strong>da</strong>, mesmo com sucesso, não fazem isso por cu<br />

doce. Fazem porque fica inviável. No final <strong>da</strong>s contas, eles continuam<br />

caras legais, mas ocupados.<br />

273


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Óbvio que existem os megaempresários do mal. E não são poucos.<br />

Mas esses caras são desmascarados rapidinho e são referência negativa<br />

nos seus mercados. Não são bem falados, não são inspiração. E<br />

eu não conheço nenhum líder que não inspire.<br />

Se um dia eu ficar rico e milionário, vou tentar manter o mesmo relacionamento<br />

com as pessoas que tenho hoje. Não sou o cara mais carismático<br />

do mundo, fato. Mas estou longe de ser um bandido. E, se você<br />

quer saber, tem até umas pessoas que me acham legal. Vai entender.<br />

Importante: essas não são As três regras para o empreendedor de<br />

sucesso. São leituras que fiz, empiricamente, como muitos desses<br />

empresários fazem. Concorde, discorde, opine. Mas, por favor, não<br />

deturpe o que escrevi.<br />

16. deixe sua criança<br />

liVre liVre.<br />

Há um tempo, participei de uma imersão de 36 horas bastante inusita<strong>da</strong>.<br />

Vivi alguns momentos tensos, outros de tédio, outros bastante discutíveis<br />

(que beiraram a irresponsabili<strong>da</strong>de). Mas alguns valeram bastante<br />

a pena, e me trouxeram lições que não vou esquecer tão cedo.<br />

Uma <strong>da</strong>s coisas mais legais que tirei de lá foi o conceito <strong>da</strong> Análise<br />

Funcional <strong>da</strong> Personali<strong>da</strong>de. Não sei se entendi completamente os<br />

fun<strong>da</strong>mentos psicológicos apresentados (não sou um mega especialista<br />

do assunto, e nem pretendo ser). Mas, sinceramente, saber tintim<br />

por tintim nem era o mais importante. O legal foi o aprendizado que<br />

tirei de tudo isso.<br />

De forma bem resumi<strong>da</strong>, o que entendi: nós somos resultado de várias<br />

pessoas que dialogam dentro do nosso eu. Sendo bem reducionista,<br />

podemos listar seis figuras, que estão constantemente determinando<br />

a nossa maneira de pensar e agir.<br />

Pai crítico: nosso lado crítico, controlador, autoritário.<br />

Pai protetor: nosso lado caridoso, bondoso, que aju<strong>da</strong> e é amoroso.<br />

Adulto: nossa faceta responsável, que avalia a situação com bom<br />

senso, que pondera.<br />

Criança rebelde: é o nosso lado do contra, subversivo e contestador.<br />

Criança submissa: responsável por aquele nossa parte mais covarde,<br />

com um certo medo exagerado.<br />

Criança livre: é nossa parte mais espontânea, criativa, intuitiva,<br />

sem muitos filtros.<br />

275


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Quando olho esse diagrama, consigo entender perfeitamente porque<br />

alguns de nós são mais criativos que outros. Nós, adultos, com nossas<br />

regras, leis, preconceitos e ver<strong>da</strong>des absolutas, matamos a criança<br />

que existiu um dia.<br />

Essa criança desenhava um círculo azul e dizia que era um sol. Por<br />

quê? Ora, por que a representação gráfica de um sol tem que ser NE-<br />

CESSARIAMENTE amarela? Quem determinou isso?<br />

Um adulto, provavelmente.<br />

Essa criança pintava e se sujava sem medo. Faz parte do processo, não<br />

faz? Existe artista mais visceral que uma mente infantil com um pincel?<br />

Essa criança escrevia mesmo sem estar alfabetiza<strong>da</strong>. Criava sua própria<br />

linguagem, seus algarismos, seus caracteres e sua lógica de leitura.<br />

Por que tem que ser <strong>da</strong> esquer<strong>da</strong> para a direita e de cima para<br />

baixo? Quem inventou isso?<br />

Um adulto, provavelmente.<br />

Essa criança compunha músicas que não tinham corpo/refrão/corpo/ponte/refrão/solo/ponte/refrão.<br />

Porque esse jeito comercial é<br />

completamente contrário ao caos musical de um menino de cinco<br />

anos, que sai do ritmo, que esquece a letra e ain<strong>da</strong> assim se diverte<br />

pra caramba.<br />

Essa criança questionava tudo. Por quê? Por quê? Por quê? Depois<br />

de velhos, nós ficamos previsíveis, preguiçosos e chatos. Não questionamos<br />

quase na<strong>da</strong>. Se essa é a regra, que se siga a regra. Se esse<br />

é o padrão, que se siga o padrão. E se a criança sai do padrão, a gente<br />

vai lá e dá um cascudo.<br />

Coisa de adulto, né?<br />

Eu aprendi, ao longo dessas 36 horas, que deixar a Criança Livre LI-<br />

VRE é a melhor maneira de ser criativo.<br />

Por isso, é uma bobagem aqueles que dizem: sou experiente, tenho<br />

muitas referências, já vi de tudo nesse mercado. Quem diz isso só<br />

está reforçando o seu lado adulto, e ca<strong>da</strong> vez mais distante <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>deira<br />

criativi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s mentes infantis.<br />

Lembro de ver de perto as obras de Miró e ouvir de uma senhora crítica<br />

ao meu lado: Isso parece coisa de criança. Pois é, minha senhora:<br />

talvez esteja justamente aí a sua geniali<strong>da</strong>de.<br />

Este texto está aberto a críticas, a discordâncias, a contraposições.<br />

Mas antes de deixar sua mensagem, deixe a sua Criança Livre um<br />

pouco mais livre, beleza?<br />

Um beijo babado, com sabor de nuvem.<br />

Titi Loquinho (meu apelido <strong>da</strong> 4a. série).<br />

277


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

17. ganha-ganha.<br />

Nas minhas vi<strong>da</strong>s passa<strong>da</strong>s, eu devo ter sido um árabe, <strong>da</strong>queles que<br />

vendem bugigangas no meio de algum feirão de Constantinopla.<br />

Eu adoro vender. E com certeza esse foi um fator que contribuiu muito<br />

para que eu tenha caído na publici<strong>da</strong>de. (Aos que ain<strong>da</strong> não se deram<br />

conta: publici<strong>da</strong>de é só, e simplesmente só, vender.)<br />

Lembro que quando tinha 15 anos, pedi autorização para o meu pai<br />

para trabalhar no McDonald’s. Ele não entendeu muito bem meu pedido.<br />

Mas eu queria trabalhar no balcão, conhecendo pessoas. E convencendo<br />

pessoas a levar por apenas mais R$ 2,00 uma tortinha de maçã.<br />

Mas não convencer na mal<strong>da</strong>de. Não convencer para forçar um consumismo<br />

injustificado. Eu queria tentar, de alguma forma, aju<strong>da</strong>r na<br />

escolha <strong>da</strong> pessoa. Queria que ela fizesse uma compra melhor a partir<br />

<strong>da</strong> minha indicação.<br />

Meus amigos de Farroupilha achavam muito imbecil tudo isso. Pensavam<br />

que eu só poderia estar louco. Qual é a graça de ser um vendedor,<br />

Tiago? De tanto ouvir aqui e ali, desisti do meu plano e nunca entrei<br />

para a trupe do Ronald e cia.<br />

Mas essa filosofia, de ser um intermediário <strong>da</strong> boa compra, ficou.<br />

Eu acho que o bom vendedor não é aquele que engana o consumidor.<br />

Não é o picareta. Não é o que força a barra. Não é o que joga sujo para<br />

ganhar uma comissão no final do mês.<br />

É quem interpreta o problema e encontra uma boa solução. É aquele<br />

que convence a pessoa a comprar algo que seja realmente útil. É o<br />

cara que consegue abrir os olhos do consumidor para funcionali<strong>da</strong>des<br />

que ele nem sabia que existiam. É quem acredita que, no final, a compra<br />

pode ser boa para to<strong>da</strong>s as partes.<br />

É o cara que diz: Realmente, Dona Maria, a senhora não precisa de<br />

uma cama King Size. Mas quem sabe nós vemos um colchão novo,<br />

para diminuir essa sua dor na coluna?<br />

Talvez, a profissão de vendedor seja a que melhor represente a filosofia<br />

Ganha-ganha. Porque, para mim, o bom vendedor é justamente o<br />

cara que acredita no ganha-ganha. Que acredita que ninguém precisa<br />

perder para que todos saiam ganhando.<br />

Por sinal, eu acho que to<strong>da</strong>s as relações entre as pessoas deveriam<br />

respeitar esse princípio. To<strong>da</strong>s as relações deveriam ser (ou tentar ser)<br />

ganha-ganha.<br />

Porque quando a gente acha que, para se <strong>da</strong>r bem em alguma coisa,<br />

tem que enrolar o outro: cui<strong>da</strong>do. Tem coisa erra<strong>da</strong> aí.<br />

Sempre que eu participo de um “momento ganha-ganha”, parece que<br />

eu estou contribuindo para o equilíbrio do universo. Para a Corrente<br />

do Bem. Para (OK, já que estamos em período de Ano Novo) um mundo<br />

mais bonzinho.<br />

Quando isso acontece, eu não me sinto culpado, já que não estou<br />

prejudicando ninguém. E também não me sinto mal, porque não deixei<br />

que ninguém me sacaneasse. É só o justo, ora.<br />

Mas é complicado. Porque nós fomos educados para levar máxima<br />

vantagem em tudo. Quando talvez o raciocínio correto seja simplesmente<br />

tentar tirar algo bom para todo mundo em to<strong>da</strong>s as situações.<br />

279


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Naquela cena famosa do Mente Brilhante, o Nash diz: Se todos chegarem<br />

na loira, todo mundo sai perdendo. Se todos chegarmos nas<br />

amigas, todo mundo se dá bem. Perfeito. Mas será que não existe um<br />

jeito de não deixar a loira chupando dedo? Aí sim, todo mundo saiu<br />

ganhando. (Inclusive a loira, porque ela vai terminar se <strong>da</strong>ndo bem de<br />

alguma forma.)<br />

É curioso, mas as relações ficam mais autênticas, genuínas e humanas.<br />

Tanto você com seus amigos. Você com sua família. Você na sua<br />

empresa. Você com a sua namora<strong>da</strong>. Você com você mesmo.<br />

Ou simplesmente você com o vendedor <strong>da</strong> Magazine Luiza.<br />

18. querem saber quanto eu<br />

ganho? então Vou dizer.<br />

Uma <strong>da</strong>s perguntas mais recorrentes dos alunos é sobre o nosso salário.<br />

E eu não vejo isso pelo lado bisbilhoteiro. Acho que, de certa<br />

forma, eles nos vêem como ponto de referência. Então, quando perguntam<br />

quanto ganhamos, acredito que seja mais pra saber quais são<br />

as perspectivas salariais no futuro.<br />

Só que tanta gente tem essa dúvi<strong>da</strong> que eu resolvi abrir o jogo. Lendo<br />

esse post, vocês vão saber quanto eu ganho. Juro.<br />

A primeira coisa importante é perceber que grana é só uma parte <strong>da</strong><br />

nossa remuneração. Além dos benefícios tradicionais, como ticket,<br />

vale e plano de saúde, tem muito mais coisa envolvi<strong>da</strong>.<br />

Por exemplo: você tem duas propostas idênticas. Mas numa, você vai<br />

trabalhar com um chefe legal pra caralho. Na outra, com um pau no cu.<br />

Imagino que, em condições normais de temperatura e pressão, todos<br />

fechariam na primeira. Por quê? Ora, porque as CONDIÇÕES DE TRA-<br />

BALHO (no caso, o chefe) também contam como salário.<br />

Assim como as condições de trabalho, existem outras coisas que devem<br />

ser vistas como remuneração, e às vezes a gente nem se dá<br />

conta. (Não listei todos os itens que compõem um “salário”. Só peguei<br />

alguns representativos para ilustrar o raciocínio.)<br />

281


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Início de carreira<br />

Salário: ruim<br />

Trabalhos: ruins<br />

Aprendizado: alto<br />

Networking: alto<br />

O neguinho no início <strong>da</strong> carreira ganha pouca grana, sim. Mas por outro<br />

lado, ganha muito conhecimento. Porque o dia-a-dia o faz aprender<br />

com os profissionais mais experientes. E isso é uma forma de<br />

salário. Lembre-se: se você paga para aprender sobre propagan<strong>da</strong><br />

numa universi<strong>da</strong>de, é sinal de que esse conhecimento tem um valor. E<br />

numa agência, teoricamente você está recebendo de graça.<br />

Dependendo do ponto de vista, o salário de um iniciante na propagan<strong>da</strong><br />

pode ser considerado uma puta grana. Vejam só.<br />

Muita gente não se dá conta, mas a rede de contatos que você faz<br />

quando entra numa empresa é valiosíssima. Se contato não valesse<br />

dinheiro, não existiriam palavras como “lobbystas” ou “tráfico de influências”.<br />

Ninguém compraria mailings. E por aí vai.<br />

Com o passar do tempo, você cresce na profissão. Agora, em vez de<br />

trabalhar num computador podre, você já tem uma máquina bacana.<br />

Agora, você não faz só ro<strong>da</strong>pés: já pega campanhas com rádio e TV.<br />

E além disso, você está com carteira assina<strong>da</strong>, ganhando o dobro do<br />

trampo anterior. Ou seja, você está ganhando mais. Certo?<br />

Depende.<br />

A agência que está pagando mais dinheiro para você só está fazendo<br />

isso porque, hoje, você tem uma certa experiência. Tem mais critério.<br />

Tem mais conhecimento técnico. E, logicamente, isso faz com que<br />

você resolva melhor e mais rapi<strong>da</strong>mente os trabalhos.<br />

Mas vejam o outro lado. Como você sabe mais hoje do que sabia<br />

ontem, as novi<strong>da</strong>des diminuem. O aprendizado continua, lógico. Mas<br />

fica mais lento. Antes, você mal sabia alinhar as coisas. Agora você já<br />

entende de combinação de cor, diagramação, escolha de fontes. Os<br />

conceitos básicos, que foram úteis para você antes, agora não são<br />

mais. Se não são, sinal de que esse conteúdo você já domina. E se<br />

você já domina, não vai pagar por ele.<br />

Esse tipo de situação acontece na fase intermediária <strong>da</strong> carreira. A<br />

gente passa a ganhar mais de um lado, mas deixa de ganhar do outro.<br />

Veja só.<br />

Início de carreira<br />

Salário: médio<br />

Trabalhos: médio<br />

Aprendizado: médio<br />

Networking: médio<br />

Até que um dia você fica grandão, vai para uma puta agência, ganhando<br />

uma puta grana, com contas animais. E agora, você está ganhando<br />

mais do que antes?<br />

Pode ser que sim, pode ser que não. Tudo depende de como você<br />

percebe o valor dessas coisas intangíveis.<br />

Maturi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> carreira<br />

Salário: alto<br />

Trabalhos: alto<br />

Aprendizado: baixo<br />

Networking: baixo<br />

Por esse raciocínio, a grande maioria <strong>da</strong>s pessoas ganha mais ou menos<br />

a mesma coisa. De formas totalmente diferentes, mas com valores<br />

semelhantes.<br />

283


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

Evidente que existem injustiças por aí. Tem cara Tabajara ganhando<br />

mais do que deveria, tem neguinho competente ganhando menos do<br />

que merece. O mundo não é perfeito.<br />

Portanto, quer saber quanto eu ganho? O mesmo que você.<br />

Fiquei sabendo que um estagiário <strong>da</strong> turma um, depois de ouvir essa<br />

minha teoria, fez uma sensacional. Percebeu que o salário dele era<br />

uma bosta. Que a agência em que trabalhava só tinha contas fodi<strong>da</strong>s.<br />

Mas que ao seu lado, sentava uma estagiária muito gostosa.<br />

Ele virou para o lado e falou.<br />

“Olha, não me tire pra machista, não me leve a mal. Mas a gente vai ter<br />

que negociar umas coisinhas. Você faz parte do meu salário.”<br />

19. o especialista em<br />

mÍdias digitais.<br />

Hoje em dia, qualquer pessoa que possui mais de 1.000 followers no<br />

Twitter, mantenha um blog por mais de um ano e já tenha trabalhado<br />

para alguma marca pode se auto-proclamar um “especialista em mídias<br />

digitais”.<br />

Eles estão aí, aos cântaros, pipocando e vendendo um peixe que nem<br />

sempre é tão profissional assim.<br />

Claro: existem várias pessoas que dominam esse conteúdo, e podem<br />

cobrar – e cobrar caro – pelo conhecimento que detêm.<br />

Ao mesmo tempo, vário novatos estão se aventurando num terreno<br />

complexo. E muitas vezes, com o consentimento <strong>da</strong> própria<br />

empresa, que contratam um estagiário e o deixam coordenando<br />

Twitter, Facebook e Blog. Já que “ele é <strong>da</strong> Geração Y e sabe mexer<br />

nessas coisinhas”.<br />

Complicado, não?<br />

Sou um liberal por natureza. Acredito no livre mercado. Na<strong>da</strong> de protecionismo.<br />

Quem sabe fazer, que faça.<br />

Agora, é notório que muitas marcas estão gerindo mal suas plataformas.<br />

E acho que este é um dos furos.<br />

Na minha opinião (e aí, você pode discor<strong>da</strong>r ou concor<strong>da</strong>r, o mundo é<br />

285


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

livre), um especialista em mídias digitais têm que reunir uma série de<br />

quali<strong>da</strong>des. Que não são <strong>da</strong> noite para o dia que você adquire.<br />

Vou listar apenas algumas <strong>da</strong>s skills que julgo necessárias. De novo:<br />

você pode concor<strong>da</strong>r ou não, e não tem problema nenhum nisso. Essa<br />

ain<strong>da</strong> é uma profissão em formação. Existem muito mais dúvi<strong>da</strong>s do<br />

que certezas.<br />

Também não acho que um EMD (Especialista em Mídias Digitais) precise<br />

de TODAS essas características. Se a Internet é um sistema dinâmico,<br />

seria anacrônico enxergar por uma ótica cartesiana.<br />

1. entender a história <strong>da</strong> internet:<br />

o passado, o presente e o Futuro.<br />

Os protocolos de convivência <strong>da</strong> internet, também chamados de “O<br />

comportamento do usuário nas mídias sociais”, têm origem direta na<br />

forma como a rede foi construí<strong>da</strong>. Os fatores tecnológicos são a base<br />

dos fatores humanos.<br />

2. entender o protoColo Criado pela revolução digital<br />

do ponto de vista téCniCo e soCiológiCo.<br />

Acredito que muitos EMDs dominam a parte ferramental, <strong>da</strong>s novas<br />

tecnologias que surgem. Mas nem sempre essas pessoas conseguem<br />

mergulhar no que mais importa, que é: o impacto sociológico que a<br />

Revolução trouxe.<br />

3. ir muito além do “CrowdsourCing”<br />

e “poder <strong>da</strong>s massas”.<br />

To<strong>da</strong> hora surge um termo novo. Snack Culture, Storytelling, Engagement<br />

e por aí vai. Muitos desses temas são sobreposições. Temos que<br />

tomar cui<strong>da</strong>do para não usarmos palavras novas para dizer exatamente<br />

as mesmas coisas que estavam sendo ditas anteriormente.<br />

4. aCompanhar as mu<strong>da</strong>nças.<br />

Tudo acontece muito rápido. A ca<strong>da</strong> dia, surge uma nova rede social.<br />

Qual vai pegar? Qual é fogo de palha? O que é o Promoted to Twitter?<br />

Você é beta tester do Google+? Por que o Facebook tem tanto rolo<br />

com privaci<strong>da</strong>de? Esses questionamentos fazem parte, ou deveriam<br />

fazer parte, do dia-a-dia de um EMD.<br />

5. estu<strong>da</strong>r<br />

Muito do que se aprende sobre mídias sociais se aprende na marra,<br />

fazendo, executando. Mas há uma vasta bibliografia que aju<strong>da</strong>, e aju<strong>da</strong><br />

muito, a entender esse novo universo.<br />

6. não ter medo de errar.<br />

A internet é beta. Então, saber criar riscos calculados é um dos talentos<br />

que eu julgo mais importante num EMD.<br />

7. ter CapaCi<strong>da</strong>de de gerar teorias próprias.<br />

Este e o próximo item são parecidos, mas não iguais. Então: ser<br />

um simples consumidor do que os outros EMDs dizem é meio que<br />

ser um papagaio dos formadores de opinião. O legal é ter poder de<br />

análise, conseguir conectar pontos que nem todos estão vendo e<br />

formular, a partir <strong>da</strong>í, uma visão particular. Isso é o que dá valor ao<br />

seu trabalho.<br />

8. ter CapaCi<strong>da</strong>de de desenhar Cenários Futuros.<br />

O grande valor de um profissional é ter a capaci<strong>da</strong>de de antecipação.<br />

Então, acredito que um EMD que não consegue prever cenários, muitas<br />

vezes, trabalha apagando incêndios, em vez de evitá-los.<br />

287


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

9. dominar as Ferramentas mainstream.<br />

Existe uma certa ditadura do hype entre os EMD. Um papinho meio<br />

chato de que o Facebook está Orkutizando. Pois é: no Brasil, o cara<br />

que não usa Orkut está virando as costas para a rede mais popular no<br />

país. Tem que saber o que é cool? Claro. Mas não pode largar o osso<br />

do mainstream.<br />

10. entender de ComuniCação.<br />

Hoje, todos nós sabemos que a internet não é uma mídia. É muito<br />

mais. Mas, inicialmente, ela foi entendi<strong>da</strong> assim. O fato é que a internet<br />

TAMBÉM é uma mídia. Por isso, entender de comunicação (não<br />

confun<strong>da</strong> entender de comunicação com ter um diploma em comunicação)<br />

é fun<strong>da</strong>mental. Sem falar no óbvio: alguém que vai gerenciar os<br />

canais com o consumidor, vai FALAR com os consumidores em nome<br />

<strong>da</strong> marca. Tem que ter a manha, né?<br />

11. ter história.<br />

As novas gerações, que nascem praticamente dentro de um computador,<br />

têm muito a nos ensinar. Esse é um exercício de humil<strong>da</strong>de<br />

que eu faço diariamente. Mas nós não podemos ser ingênuos<br />

e achar que os nativos digitais sabem tudo. Até porque, boa parte<br />

do dia-a-dia de um profissional de dessa área é comum a qualquer<br />

outra profissão. Por isso, acredito que um EMD não nasce do na<strong>da</strong>.<br />

Ele precisa ter lastro.<br />

12. ter Carisma digital.<br />

Acredito que um EMD não é, necessariamente, um Geek. Mas o cara<br />

tem que ter, no mínimo, carisma digital. Ele tem que absorver tudo<br />

isso de forma natural, não com sofrimento.<br />

13. ter reFerênCias.<br />

Explicar através de exemplos é sempre uma ótima forma de fortalecer<br />

o nosso ponto de vista. Um EMD deve ter repertório, já que essa é<br />

uma área nova e, muitas vezes, o exemplo ao lado é o melhor aprendizado<br />

que podemos ter.<br />

14. ter Criado material autoral Com relevânCia na weB.<br />

Os fenômenos de cultura popular estão nascendo, ca<strong>da</strong> vez mais, <strong>da</strong><br />

Internet. Quem já fez algum webhit parece ter mais autori<strong>da</strong>de para<br />

discutir, em alto nível, o que faz sentido no consumo de conteúdo.<br />

Sem falar que esses caras, em geral, já controlam uma audiência própria.<br />

E esse trabalho de gerenciamento talvez seja a skill mais importante<br />

que se possa exigir.<br />

15. ter respeito de memBros <strong>da</strong> rede.<br />

Muito ouvir falar do termo panelosfera – que talvez já esteja até bem<br />

<strong>da</strong>tado. Existe sim um grupinho que se auto-referencia na internet<br />

e que se protege. Mas esses caras sabem reconhecer novos talentos,<br />

têm olho clínico para ver quando alguém vai explodir e, como<br />

passam muito tempo conectados, são impactados por quem estiver<br />

fazendo um trabalho relevante. Se eles já ouviram falar de você, ótimo.<br />

Bom sinal.<br />

16. ter perFis nas redes soCiais Com métriCas relevânCia<br />

nas Ferramentas de análise.<br />

São trihões de ferramentas usa<strong>da</strong>s para medir a sua importância<br />

na Internet. Mas eu gosto muito <strong>da</strong> Família Grader (BlogGrader, FacebookGrader,<br />

TwitterGrader e WebsiteGrader), que chegaram até<br />

mim pelo Dan Zarella, um dos maiores estudiosos de mídias sociais<br />

no mundo.<br />

289


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

17. ter reFerênCias multidisCiplinares que Façam voCê<br />

olhar muito além <strong>da</strong> internet.<br />

Um cara que só vive a internet tem uma capaci<strong>da</strong>de muito limitade<br />

de análise. Os grandes pensadores, em geral, são pessoas que vivem<br />

experiências multidisciplinares e têm conhecimento em mais de uma<br />

área. É o cruzamento desses conteúdos aparentemente desconexos<br />

que torna o contexto mais rico.<br />

18. saBer disCutir qualquer um desses itens<br />

Com uma autori<strong>da</strong>de.<br />

Bancar o espertão com um leigo, beleza. Agora, difícil é sentar numa<br />

mesa de debatedores e não arrepiar em meio a outros especialistas.<br />

19. saBer eXpliCar qualquer um desses itens para uma<br />

pessoa que nunCa ligou um Computador.<br />

Eu acredito que um picareta é aquele cara que fala, fala, fala, fala e ninguém<br />

entende na<strong>da</strong>. Ele não tenta facilitar, digerir, mastigar o conteúdo.<br />

Ele tenta tornar o mais complexo possível para sair por cima e parecer<br />

superinteligente. Se você vir um desses caras, cui<strong>da</strong>do. Ele pode estar<br />

aplicando pra cima <strong>da</strong> sua marca.<br />

20. saBer mu<strong>da</strong>r de opinião.<br />

Só uma pessoa que nasceu sabendo tudo não mu<strong>da</strong> de opinião. E como<br />

eu acredito que nenhum EMD nasce com esse predicado, o cara tem<br />

que saber rever os seus pontos de vista. Não pode se ter uma visão<br />

dogmática. Veja o caso do Refresh, que fez a Pepsi despencar para o<br />

terceiro lugar do mercado. Será que isso não é um indicativo?<br />

21. gostar de Co-autoria<br />

Esse negócio de ficar colocando a culpa no cliente (“eu proponho<br />

ideias, mas os caras nunca aprovam”) é um raciocínio muito infantil.<br />

Se você tem boas ideias, ótimo. Mas saber aprová-las com consistência<br />

é parte do seu trabalho. É sempre mais legal ser co-autor de algo<br />

brilhante que autor solitário de algo comum.<br />

Buenas, espero não gerar muita polêmica com este post. A ideia é abrir<br />

a discussão e ver se mais gente pensa como eu. Como falei: não é<br />

uma ciência exata. É um mercado que está nascendo, que ain<strong>da</strong> gera<br />

muitas incertezas e, por isso, não podemos ser obtusos em na<strong>da</strong>.<br />

Agora, isso não significa que temos que entregar a gerência <strong>da</strong>s nossas<br />

plataformas digitais para o primeiro cara que aparecer.<br />

Obs: O termo “mídias digitais”, em vez de “mídias sociais”, foi colocado<br />

delibera<strong>da</strong>mente. Um compreende o outro. O outro não compreende<br />

o um.<br />

291


as <strong>mortas</strong> <strong>da</strong> <strong>perestroika</strong> capítulo 10 – posts<br />

20. as empresas deVeriam<br />

ser mais ronald rios.<br />

Esses dias, a Perestroika twitou uma frase tipo: “Eu nunca pegaria<br />

a Carrie Bradshaw”. Aí, uma seguidora nossa, perguntou que “a Perestroika<br />

não poderia dizer isso, porque era Pessoa Jurídica, e não<br />

Pessoa Física”.<br />

Pois eu repliquei dizendo que era exatamente esse o nosso jeito de se<br />

comunicar por lá. Nós temos dupla personali<strong>da</strong>de (às vezes é o Felipe,<br />

às vezes sou eu) e não pedimos autorização um para o outro. Simplesmente<br />

escrevemos o que julgamos ser legal. Às vezes, falamos<br />

como Pessoa Jurídica. Mas muitas vezes – provavelmente a maioria<br />

<strong>da</strong>s vezes –, como Pessoas Físicas.<br />

E quer saber? Acho legal pra caralho que a gente tenha essa postura.<br />

Porque gente fala como gente, não fala como empresa. Gente prefere<br />

pizza de calabresa do que muzarella. Gente odeia passear no parque.<br />

Gente nunca pegaria a Carrie Bradshaw. E gente, muitas vezes, diz<br />

que nunca pegaria a Carrie Bradshaw só para implicar com os outros.<br />

Ou por ironia. Ou como pia<strong>da</strong> interna.<br />

Gente fala como gente, e isso se torna muito mais interessante do<br />

que os discursos manjados <strong>da</strong>s empresas falam. Que sempre “estão<br />

pensando no futuro do planeta, com ações de sustentabili<strong>da</strong>de e presercação<br />

<strong>da</strong> natureza”. Já pensou, como seria um um papo de bar<br />

entre várias empresas? Um saco, só com aqueles discursos oficilistas<br />

e politicamente corretos.<br />

Eu acredito que já foi o tempo em que as marcas tinham que se chapa<br />

branca. Ou que tinham que se alinhar apenas com causas neutras. Ou<br />

ter posições necessariamente boazinhas.<br />

Eu acho que, <strong>da</strong>qui pra frente, vão se destacar as marcas que não<br />

tiverem problemas em posicionar. As marcas que tiverem um discurso<br />

de gente, mas gente de ver<strong>da</strong>de. Porque gente de ver<strong>da</strong>de fala mal de<br />

pagode pra defender o heavy metal.<br />

Na minha opinião, as empresas deveriam ser mais Ronald Rios. Vão<br />

saber dizer mais “eu gosto disso, eu não gosto disso”. (Atenção: se<br />

você não gosta de palavrões, opiniões agressivas e ironia <strong>da</strong>s fortes,<br />

melhor não procurá-lo no Youtube – se é que você não o conhece.)<br />

Claro que não estou dizendo que as empresas, a partir de agora, devem<br />

sair xingando todo mundo e emitindo opiniões racistas, fascistas<br />

e Southpárkicas.<br />

Mas chega <strong>da</strong>quele discursinho morno e bege. Fico pensando se a<br />

OI exigisse que a OI FM “contemplasse na sua programação todos<br />

os gêneros musicais com o mesmo número de horas, faixas e com<br />

a mesma participação no horário nobre”. Já pensou? Terminaria The<br />

Killers e começaria Molejo.<br />

293


o autor.<br />

Tiago Mattos é publicitário formado pela PUC/RS. Estudou como bolsista<br />

<strong>da</strong> Miami Ad School – na época, considera<strong>da</strong> por muitos a melhor<br />

portfolio school do mundo. Em 2012, ganhou novamente uma<br />

bolsa e se formou Futurista pela Singularity University, parceria entre<br />

Nasa e Google, no Vale do Silício.<br />

Foi re<strong>da</strong>tor publicitário durante mais de uma déca<strong>da</strong>. Em 2005, venceu<br />

a disputa Young Creative (seleção dos melhores portfolios até 28<br />

anos) e fez parte <strong>da</strong> delegação que representava o Brasil no Festival<br />

Mundial de Cannes. No ano seguinte, foi Re<strong>da</strong>tor do Ano, maior distinção<br />

que poderia receber na sua função dentro do seu mercado. Um<br />

ano depois, começou a transição, e lançou a Perestroika. Em 2008,<br />

lançou a Balalaika, um dos primeiros grupos de Stand-Up Comedy do<br />

Brasil. Foi quando, finalmente, largou a publici<strong>da</strong>de e assumiu o posto<br />

de Diretor de Whatever, passando a atual full-time na empresa.<br />

Foi o palestrante de abertura do TEDxPortoAlegre e debatedor do Fórum<br />

<strong>da</strong> Liber<strong>da</strong>de. Adora estu<strong>da</strong>r e é palestrante de assuntos como<br />

Futurismo, Comportamento Pós-revolução Digital, Inovação Empreendedora,<br />

Comunicação Contemporânea, Educação Disruptiva e<br />

Criativi<strong>da</strong>de aplica<strong>da</strong>.<br />

Hoje, é co-gestor <strong>da</strong>s uni<strong>da</strong>des Perestroika São Paulo, Rio de Janeiro<br />

e Porto Alegre. Também éb sócio do Iscola.cc, plataforma de crowdlearning.<br />

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