Untitled - Oftalmologia USP
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Olho vermelho<br />
184<br />
Olho vermelho<br />
O olho vermelho é o distúrbio ocular mais freqüentemente<br />
encontrado em um serviço de<br />
pronto-atendimento não oftalmológico. Embora<br />
suas causas mais comuns sejam relativamente<br />
benignas, existem situações graves com elevado<br />
risco de perda de visão. Nesse contexto, cabe<br />
ao médico generalista reconhecer os principais<br />
diferenciais dessa síndrome, bem como iniciar o<br />
tratamento adequado ou encaminhar o paciente<br />
para uma avaliação especializada quando necessário.<br />
O passo inicial no cuidado primário do paciente<br />
com olho vermelho é a obtenção de seu histórico.<br />
Busca-se nesse momento excluir situações<br />
consideradas de maior risco como dor ocular, diminuição<br />
da acuidade visual, trauma, exposição<br />
a substâncias químicas, cirurgia intra-ocular recente<br />
e olho cronicamente vermelho.<br />
Embora um leve desconforto ocular, muitas vezes<br />
referido como sensação de “areia nos olhos”,<br />
esteja normalmente associado a condições menos<br />
graves, a presença de dor em olho vermelho<br />
sugere uma situação de alerta devido à maior<br />
gravidade dos diferenciais relacionados a esse<br />
sintoma. Da mesma forma, uma queda súbita de<br />
acuidade visual também é um sinal de maior gravidade.<br />
O relato de trauma ocular necessita de rápida<br />
avaliação por um médico oftalmologista devido<br />
ao risco de lesão de estruturas intra-oculares. Ex-<br />
posição a substâncias químicas seguida de dor e<br />
olho vermelho sugere queimadura química, sendo<br />
necessário como primeira conduta irrigação e<br />
lavagem copiosa com soro fisiológico ou, na falta<br />
deste, com água corrente em abundância, para<br />
então submeter-se o paciente a uma avaliação<br />
oftalmológica cuidadosa.<br />
Pacientes no período pós-operatório recente<br />
merecem maior atenção para que um processo<br />
inflamatório normal dessa fase seja diferenciado<br />
de uma endoftalmite, infecção intra-ocular com<br />
elevada taxa de evolução para perda de visão.<br />
Quanto ao olho vermelho crônico, a avaliação oftalmológica<br />
especializada é essencial para identificação<br />
e tratamento da patologia ocular de<br />
base. A Tabela 1 lista 10 sinais de alerta na síndrome<br />
do olho vermelho a serem obrigatoriamente<br />
pesquisados à primeira avaliação do paciente.<br />
A Tabela 2 é formada pelos principais diferenciais<br />
da síndrome do olho vermelho e suas características.<br />
Tabela 1 - Sinais de alerta<br />
· Dor ocular severa<br />
· Perda visual súbita<br />
· Exposição química<br />
· Trauma ocular<br />
· Presença de corpo estranho<br />
· Secreção purulenta<br />
· Anormalidades corneanas<br />
· Anormalidades da pupila<br />
· Cirurgia recente<br />
· Olho cronicamente vermelho<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Olho vermelho<br />
Tabela 2 – Diagnóstico diferencial das causas mais comuns de olho vermelho<br />
Episclerite Esclerite<br />
Uveíte anterior<br />
aguda<br />
Glaucoma<br />
agudo<br />
primário<br />
Úlcera de<br />
córnea<br />
Conjuntivite<br />
aguda<br />
bacteriana<br />
Conjuntivite<br />
aguda viral<br />
Hemorragia<br />
Subconjuntival<br />
Ausente Hialina Purulenta Aquosa ou Ausente Ausente Ausente Ausente<br />
Purulenta<br />
Secreção<br />
Conservada Conservada<br />
Baixa visual<br />
moderada<br />
Conservada Conservada ou Conservada ou Diminuída Baixa<br />
levemente levemente<br />
importante de<br />
diminuída diminuída<br />
acuidade<br />
visual<br />
Visão<br />
Olho vermelho<br />
Moderada Moderada a<br />
severa<br />
Dor Ausente Sensação de Sensação de Moderada Intensa Moderada a<br />
corpo<br />
corpo<br />
severa<br />
estranho estranho<br />
Pericerática Pericerática Localizada Localizada<br />
Difusa Difusa Pericerática<br />
Setorial,<br />
vermelho-vivo<br />
Hiperemia<br />
Transparente Normal Normal<br />
Normal Normal ou Normal Áreas<br />
Turva (edema<br />
inltrados<br />
opacicadas de córnea)<br />
Córnea<br />
Miose Normal Normal<br />
Normal Normal Normal Normal Médiomidríase<br />
Pupila<br />
Normal Normal<br />
Normal Normal Normal Normal Ausente Normal ou<br />
diminuída<br />
Reexo<br />
foto-motor<br />
185
Hiposfagma<br />
186<br />
Olho vermelho<br />
Aparecimento súbito de sangramento sob a<br />
conjuntiva, podendo ser localizado ou difuso,<br />
unilateral ou bilateral. Pode ocorrer após alguns<br />
eventos como: trauma com lesão conjuntival;<br />
após esforço ou manobra de Valsalva (carregar<br />
objetos pesados, tosse, espirro, etc.) ou espontaneamente,<br />
em pacientes idosos, em decorrência<br />
do comprometimento da estrutura vascular na<br />
arteriosclerose.<br />
Apresenta evolução benigna, com resolução espontânea<br />
em 2 a 3 semanas, não necessitando de<br />
tratamento específico. O paciente normalmente<br />
é assintomático ou pouco sintomático, podendo<br />
referir discreta sensação de corpo estranho.<br />
Não há acometimento da visão. Como se trata<br />
de uma afecção ocular de resolução espontânea,<br />
não é necessário tratamento. Em casos em que<br />
as recidivas são freqüentes, distúrbios na coagulação<br />
e alterações nos níveis pressóricos devem<br />
ser investigados.<br />
Pinguécula<br />
Espessamento da conjuntiva devido à degeneração<br />
hialina do tecido colágeno subepitelial da<br />
conjuntiva decorrente do envelhecimento ou da<br />
exposição crônica ao sol. Apresenta-se como depósitos<br />
branco-amarelados na conjuntiva bulbar<br />
adjacente ao limbo temporal ou nasal. Na maioria<br />
dos casos, o tratamento não é necessário, podendo-se<br />
prescrever lágrimas artificiais e orientar<br />
quanto ao uso de óculos de proteção solar.<br />
Quando há inflamação (pingueculite), o paciente<br />
apresenta hiperemia conjuntival e dor ocular. O<br />
tratamento nesses casos consiste em uso tópico<br />
de antiinflamatório esteroidal de baixa potência.<br />
Pterígio<br />
Crescimento fibrovascular subepitelial em formato<br />
triangular que avança sobre a córnea. Tem<br />
como fator causal principal a exposição solar crônica<br />
(irradiação UV). O pterígio muitas vezes está<br />
associado a quadro de irritação crônica, a distribuição<br />
irregular do filme lacrimal na superfície<br />
corneana e a quadro intermitente de inflamação<br />
e de hiperemia.<br />
O tratamento se faz com uso de lágrimas artificiais<br />
e, em alguns casos, esteróides fracos, por<br />
curto tempo. Conforme avança sobre a córnea, o<br />
pterígio pode induzir astigmatismo e, nos casos<br />
em que o eixo visual é comprometido, ou quando<br />
se deseja corrigir a parte estética, a abordagem<br />
cirúrgica é indicada.<br />
Blefarite<br />
Inflamação da margem palpebral de origem infecciosa<br />
ou não.<br />
Hiperemia da margem palpebral e conjuntival,<br />
crostas na base dos cílios, prurido, sensação de<br />
corpo estranho, lacrimejamento, filme lacrimal<br />
de aspecto espumoso, fotofobia leve, ardência,<br />
normalmente bilateral.<br />
Conduta:<br />
Orientar limpeza palpebral diária com xampu<br />
neutro (infantil) diluído e uso de lágrimas artificiais.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Olho vermelho<br />
A blefarite crônica é uma afecção palpebral que<br />
pode cursar com hiperemia conjuntival além de<br />
outras alterações corneanas e conjuntivais devido<br />
à íntima relação da pálpebra com a superfície<br />
ocular.<br />
A blefarite pode ser de vários tipos: blefarite estafilocócica,<br />
seborréica e mista; seborréia meibomiana<br />
e meibomite.<br />
A blefarite estafilocócica tem sua etiologia na<br />
infecção estafilocócica na qual os produtos tóxicos<br />
são irritantes e levam a quadro caracterizado<br />
pela hiperemia e por telangiectasias da margem<br />
palpebral anterior. É comum a formação de concreções<br />
em torno da base dos cílios conhecidos<br />
por “colaretes”. Pode haver cicatrização com hipertrofia<br />
da margem palpebral e perda dos cílios<br />
(madarose), além de triquíase e poliose.<br />
A blefarite seborréica caracteriza-se por hiperemia<br />
e oleosidade da margem palpebral junto aos<br />
cílios, formando crostas moles. O Corynebacterium<br />
acnes contribui na etiologia dessa afecção<br />
ao degradar quantidades excessivas de lipídeos<br />
Olho vermelho<br />
neutros em ácidos graxos irritantes. Há correlação<br />
dessa afecção ocular com quadro de dermatite<br />
seborréica, que pode acometer áreas extraoculares<br />
como couro cabeludo e região retroauricular,<br />
por exemplo. O tratamento envolve a<br />
higiene palpebral com uso de xampu neutro ou<br />
infantil diluído, por longo período, adequandose<br />
a freqüência de acordo com a intensidade dos<br />
sintomas. Podem ser associados antibioticoterapia<br />
tópica na margem palpebral, nos casos de foliculite<br />
aguda, e lágrimas artificiais, nos casos em<br />
que há instabilidade do filme lacrimal.<br />
A seborréia meibomiana é a afecção palpebral<br />
em que há secreção excessiva pelas glândulas de<br />
Meibomius. Pode ser visualizada nos óstios das<br />
glândulas de Meibomius a formação de gotículas<br />
de óleo. Geralmente está associado ao quadro<br />
um filme lacrimal de aspecto espumoso.<br />
Meibomite é a afecção palpebral em que há obstrução<br />
dos orifícios das glândulas de Meibomius.<br />
Caracteriza-se pela hiperemia da margem palpebral,<br />
a qual apresenta inflamação difusa adjacente<br />
às glândulas meibomianas.<br />
187
Episclerite<br />
188<br />
Olho vermelho<br />
Forma mais comum de inflamação escleral. Comumente<br />
apresenta-se como uma inflamação<br />
circunscrita, geralmente segmentar e nodular da<br />
episclera, podendo ser unilateral ou bilateral. As<br />
veias episclerais tornam-se dilatadas, com disposição<br />
radial, associada à hiperemia conjuntival<br />
nesse setor. A etiologia freqüentemente não<br />
pode ser identificada e, em alguns raros casos,<br />
pode-se relacioná-la a doenças sistêmicas (artrite<br />
reumatóide, polimiosite, dermatomiosite, sífilis,<br />
por exemplo).<br />
Durante a investigação, pode ser instilada uma<br />
gota de colírio de fenilefrina a 10% com o intuito<br />
de se obter vasoconstrição dos vasos conjuntivais.<br />
No caso da episclerite, os vasos conjuntivais<br />
se tornam constritos e os episclerais não, diferenciando<br />
esta de uma conjuntivite.<br />
A episclerite geralmente se resolve espontaneamente<br />
em 1 a 2 semanas, ainda que a forma<br />
nodular persista por período maior. No caso de<br />
sintomas mais expressivos, o uso de antiinflamatórios<br />
tópicos não esteroidais ou esteroidais leves<br />
pode ser considerado.<br />
Entrópio<br />
Afecção na qual ocorre inversão da borda palpebral<br />
causando atrito dos cílios contra o bulbo<br />
ocular. O atrito constante dos cílios na córnea<br />
em pacientes com entrópio de longa duração<br />
pode causar irritação, erosões corneanas epiteliais<br />
ponteadas e, nos casos graves, ulceração e<br />
formação de pannus.<br />
Divide-se em formas congênita e adquirida.<br />
A forma congênita do entrópio é muito rara. É<br />
importante ficar atento quanto ao diagnóstico<br />
diferencial de epibléfaro, que representa uma<br />
dobra de pele, na maioria das vezes na pálpebra<br />
inferior, a qual empurra os cílios contra o<br />
bulbo ocular simulando o entrópio congênito.<br />
A correção do entrópio congênito e do epibléfaro<br />
são cirúrgicas.<br />
O entrópio adquirido divide-se em dois grupos:<br />
involucional e adquirido.<br />
O entrópio involucional é a forma mais comum<br />
e afeta as pálpebras inferiores. A causa consiste<br />
no envelhecimento e conseqüente flacidez<br />
dos tecidos, levando ao alongamento dos retratores<br />
da pálpebra inferior e à desinserção<br />
destes em relação ao tarso.<br />
O entrópio cicatricial é causado pela retração<br />
da lamela posterior da pálpebra (tarso e conjuntiva).<br />
Essa retração pode ocorrer em quadros<br />
que levem a cicatrização intensa da pálpebra<br />
como tracoma, queimadura química,<br />
síndrome de Stevens-Johnson e penfigóide.<br />
O tratamento do entrópio adquirido é cirúrgico,<br />
com diversas técnicas existentes.<br />
Ectrópio<br />
Afecção em que ocorre eversão da margem palpebral.<br />
O ectrópio pode acarretar exposição da<br />
córnea e das conjuntivas bulbar e tarsal, levando<br />
a quadros de conjuntivite crônica, inflamação da<br />
borda palpebral, ceratite, dor e epífora.<br />
É dividido em duas formas: congênito e adquirido.<br />
O ectrópio congênito é causado por uma deficiência<br />
relativa da lamela anterior da pálpebra.<br />
Pode ser visto em pacientes portadores das<br />
seguintes síndromes: Down, Barber-Say, Neu-<br />
Laxova e Blefaro-cheilo-dontic. O tratamento<br />
é cirúrgico.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Olho vermelho<br />
O ectrópio adquirido pode ser dividido em involucional,<br />
cicatricial, mecânico e paralítico.<br />
O ectrópio involucional é o tipo mais freqüente.<br />
Apresenta-se inicialmente como uma flacidez<br />
de tecidos que evolui para o alongamento<br />
palpebral, para eversão da margem e, finalmente,<br />
para hipertrofia e queratinização da<br />
conjuntiva tarsal.<br />
O ectrópio cicatricial é o resultado do encurtamento<br />
da lamela anterior palpebral. Pode<br />
ocorrer em casos de trauma (queimadura térmica<br />
ou química, seqüela de blefaroplastia<br />
com ressecção excessiva de pele) ou de processo<br />
inflamatório crônico da pele (eczema,<br />
dermatite atópica, leishmaniose e linfoma<br />
cutâneo de célula T).<br />
O ectrópio mecânico está relacionado à presença<br />
de massa tumoral na margem palpebral.<br />
O ectrópio paralítico é causado pela paralisia<br />
do VII par craniano (nervo facial). Além do<br />
ectrópio, a paralisia do VII par craniano leva a<br />
quadro de lagoftalmo e de ptose de supercílio<br />
ipsilateral, e até a lesão.<br />
Todos os tipos de ectrópio adquirido são de<br />
tratamento cirúrgico, através de diversas técnicas.<br />
Triquíase<br />
Afecção caracterizada pela alteração da direção<br />
do cílio que, emergindo normalmente do folheto<br />
palpebral anterior, encurva-se e toca o bulbo<br />
ocular.<br />
Olho vermelho<br />
É importante frisar que o cílio triquiático tem<br />
cor e espessura semelhantes aos cílios normais.<br />
É uma condição adquirida muito comum.<br />
A triquíase é basicamente uma condição de<br />
natureza cicatricial. Pode ser resultado de: processos<br />
inflamatórios que afetam a margem<br />
palpebral e os folículos pilosos (meibomites,<br />
blefarites crônicas, tracoma, conjuntivites crônicas,<br />
hordéolos); alterações dermatológicas<br />
que gerem retração da pele periorbital e alteração<br />
de convexidade de cílios; doenças conjuntivais<br />
cicatrizantes (Stevens-Johnson, penfigóide<br />
ocular, conjuntivite lenhosa) as quais<br />
podem produzir retração cicatricial da conjuntiva<br />
tarsal, com conseqüente retração da<br />
margem palpebral e alteração da posição dos<br />
cílios; trauma cortante da margem palpebral;<br />
cirurgia palpebral com fratura de tarso; diminuição<br />
da produção lacrimal, a qual freqüentemente<br />
acarreta modificações conjuntivais.<br />
A maioria dos pacientes com triquíase encontra-se<br />
na faixa etária entre 60 e 70 anos de idade.<br />
Os sintomas são sensação de corpo estranho<br />
ocular, fotofobia, lacrimejamento e secreção<br />
seromucosa.<br />
O tratamento consiste em destruição dos cílios<br />
alterados com uso de eletrólise, de crioterapia<br />
ou de laser. Em casos muito severos, com grande<br />
quantidade de cílios acometidos, deve ser<br />
realizado procedimento cirúrgico.<br />
189
Figura 01:<br />
190<br />
Olho vermelho<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Olho vermelho<br />
Ceratites superficiais<br />
Podem fazer parte do quadro clínico de diversas<br />
afecções oftalmológicas: síndrome de olho seco,<br />
blefarite, trauma, ceratite de exposição, toxicidade<br />
por drogas de uso tópico, queimaduras,<br />
distúrbios relacionados ao uso de lentes de contato,<br />
ceratite ponteada superficial de Thygeson,<br />
corpo estranho, conjuntivite, triquíase, entrópio,<br />
ectrópio, síndrome de pálpebras frouxas, ceratite<br />
fotoelétrica, entre outras.<br />
O exame oftalmológico e a anamnese devem ser<br />
completos para o adequado diagnóstico do fator<br />
causal da ceratite superficial e para seu adequado<br />
tratamento.<br />
Olho vermelho<br />
191
Ceratites infecciosas<br />
Ceratites Bacterianas<br />
192<br />
Ceratites infecciosas<br />
A ceratite bacteriana constitui causa importante<br />
de déficit visual, associando-se freqüentemente<br />
a situações em que ocorrem alterações nos mecanismos<br />
de defesa corneal. Diagnóstico e tratamento<br />
imediatos podem limitar a perda de tecido,<br />
minimizar a cicatrização e reduzir a necessidade<br />
de cirurgia futura. Neisseria gonorrhoeae<br />
e Haemophilus influenzae são as duas bactérias<br />
capazes de invadir o epitélio corneano intacto.<br />
As demais bactérias somente são capazes de<br />
produzir ceratite após o comprometimento da<br />
integridade epitelial. Pseudomonas sp., Staphylococcus<br />
sp. e Streptococcus pneumoniae são os<br />
agentes etiológicos mais freqüentes. Em ceratite<br />
bacteriana associada a mau uso de lentes de<br />
contato, a Pseudomonas aeroginosa é o agente<br />
causador mais comumente isolado.<br />
No quadro clínico inicial, tipicamente há história<br />
de traumatismo ocular, de doença corneal<br />
pré-existente, de uso de lentes de contato ou<br />
de corticosteróide tópico. Sinais e sintomas incluem<br />
dor, lacrimejamento, fotofobia, diminuição<br />
de visão, edema palpebral, secreção purulenta<br />
e hiperemia conjuntival. Os sintomas podem<br />
ser mascarados ou retardados em usuários<br />
de lentes de contato. Ao exame oftalmológico,<br />
os sinais são injeção conjuntival e perilímbica,<br />
defeito epitelial associado a infiltrado ao redor<br />
da margem e na base da desepitelização corneal,<br />
aumento do infiltrado associado a edema<br />
estromal corneal, uveíte anterior estéril com<br />
hipópio. A progressiva ulceração pode causar<br />
perfuração corneal e endoftalmite bacteriana.<br />
Antes de se iniciar o tratamento, é imprescindível<br />
coleta de material para citologia e cultura. O<br />
tratamento consiste basicamente em utilização<br />
de antibioticoterapia tópica efetiva contra um<br />
amplo espectro de bactérias Gram-positivas e<br />
Gram-negativas.<br />
Em úlceras corneanas de menor gravidade (periféricas,<br />
superficiais e menores que 3 mm), é<br />
instituída monoterapia com fluorquinolonas tópica<br />
de 1 em 1 hora (ciprofloxacina 0,3%, ofloxacina<br />
0,3%, monofloxacina 0,5% ou gatifloxacina<br />
0,3%). Para úlceras graves, o tratamento consiste<br />
em utilização de dois antibióticos fortificados tópicos<br />
para a cobertura de patógenos Gram-positivos<br />
e Gram-negativos, de 1 em 1 hora (cefazolina<br />
fortificada 5% e gentamicina fortificada 2%).<br />
Uso de antibioticoterapia sistêmica com uso de<br />
fluorquinolonas estão indicados em casos com<br />
risco ou comprometimento escleral ou intraocular.<br />
A terapêutica inicial só deve ser modificada<br />
na existência de resistência demonstrada em<br />
cultura do organismo ao esquema terapêutico.<br />
Durante o tratamento, é importante não confundir<br />
dificuldade de reepitelização corneal por<br />
toxicidade medicamentosa com persistência da<br />
infecção.<br />
Ceratites Fúngicas<br />
As ceratites fúngicas são raras, porém podem<br />
evoluir com efeitos devastadores. Podem ser<br />
causadas por uma grande variedade de agentes.<br />
Os patógenos mais comuns são fungos filamentosos<br />
(Aspergillus spp. e Fusarium spp.) e Candida<br />
albicans. A ceratite causada por fungos filamentosos<br />
é mais prevalente em áreas de agricultura<br />
e é tipicamente precedida por trauma ocular<br />
envolvendo matéria orgânica como madeira e<br />
plantas. A ceratite por Candida ocorre tipicamente<br />
em associação a doenças corneanas pré-existentes<br />
ou em pacientes com comprometimento<br />
imunológico. A incidência de ceratite fúngica e o<br />
tipo de agente etiológico mais freqüente variam<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Ceratites infecciosas<br />
conforme a região geográfica devido a diferentes<br />
condições de temperatura e umidade. Há associação<br />
entre a ceratite fúngica por Fusarium sp.<br />
e o uso inadequado de lentes de contato.<br />
Os sintomas mais comuns das ceratites fúngicas<br />
são: sensação de corpo estranho, fotofobia, diminuição<br />
de acuidade visual e secreção. Ao exame<br />
oftalmológico, há diversos achados inespecíficos<br />
como hiperemia conjuntival, defeitos epiteliais,<br />
reação de câmara anterior e edema corneal. Os<br />
achados específicos de infecção fúngica são: infiltrados<br />
estromais com bordas mal definidas e<br />
margens hifadas, bordas elevadas, lesões satélites<br />
digitiformes, infiltrados imunes em anel, placa<br />
endotelial subjacente à úlcera e pigmentação<br />
acastanhada ou acinzentada.<br />
Antes de se iniciar a terapêutica, deve ser realizado<br />
raspado corneal, para reduzir a quantidade<br />
de fungos e aumentar a penetração dos agentes<br />
antifúngicos, além do envio de amostra a laboratório<br />
para pesquisa e cultura de fungos.<br />
O tratamento é realizado através de antifúngicos<br />
tópicos em geral por tempo prolongado. Em<br />
fungos filamentosos, a terapia inicial é com natamicina<br />
a 5% tópica de 1 em 1 hora, podendo<br />
ser associados cetoconazol sistêmico 400-800<br />
mg/dia ou miconazol subconjuntival 5-10 mg/<br />
dia. Em fungos leveduriformes, a terapia inicial<br />
é com anfotericina B tópica a 0,15% de 1 em 1<br />
hora, podendo ser associados cetoconazol 400-<br />
800 mg/dia , fluconazol 200mg/dia sistêmico ou<br />
miconazol subconjuntival 5-10 mg/dia.<br />
Em casos de progressão da doença apesar da terapia<br />
clínica, devem ser indicadas a ceratoplastia<br />
penetrante ou recobrimento conjuntival.<br />
Olho vermelho<br />
Ceratites Virais<br />
As ceratites virais representam um grupo de doenças<br />
causadas na sua grande maioria por vírus<br />
do grupo herpes. Dentre os vírus desse grupo, a<br />
doença ocular é geralmente causada pelo herpes<br />
simples (VHS) e pelo herpes varicela-zoster<br />
(HVZ).<br />
Ceratite pelo VHS<br />
A infecção ocular primária pelo VHS geralmente<br />
acomete crianças e pode estar associada a sintomas<br />
de virose sistêmica. Há o aparecimento de<br />
vesículas ao redor do olho com cicatrização em<br />
até duas semanas. Quando ocorre acometimento<br />
ocular na infecção primária (relativamente<br />
incomum), a infecção manifesta-se como conjuntivite<br />
folicular aguda unilateral associada a<br />
linfadenopatia pré-auricular.<br />
A ceratite herpética pelo VHS pode manifestar-se<br />
como ceratite epitelial, ceratite estromal necrotisante<br />
e endotelite disciforme.<br />
A ceratite epitelial pelo VHS pode ocorrer em<br />
qualquer faixa etária. A apresentação inclui desconforto<br />
ocular leve, lacrimejamento e turvação<br />
visual. Ao exame oftalmológico, manifesta-se<br />
por ceratite ponteada com posterior evolução<br />
para úlcera dendrítica (lesões lineares com ramificações<br />
de aspecto edemaciado característico<br />
– bulbos terminais), com diminuição de sensibilidade<br />
corneana. As úlceras dendríticas coram-se<br />
com aplicação tópica de fluoresceína e rosa bengala.<br />
A ceratite estromal necrotisante é uma entidade<br />
rara, porém de alta morbidade. Apresentase<br />
como uma intensa e progressiva redução de<br />
193
194<br />
Ceratites infecciosas<br />
acuidade visual associada a dor e desconforto.<br />
Ao exame, há presença de infiltrado inflamatório<br />
esbranquiçado, edema, uveíte anterior com precipitados<br />
ceráticos sob a área de infiltração estromal<br />
ativa, com presença ou não de neovasos.<br />
Pode evoluir com leucoma cicatricial vascularizado,<br />
ceratopatia lipídica ou perfuração corneal.<br />
A endotelite herpética disciforme apresenta-se<br />
com turvação visual gradual indolor, que pode<br />
estar associada a halos e glare ao redor de pontos<br />
luminosos. Ao exame, a região central corneal é<br />
acometida por edema epitelial, espessamento<br />
estromal, precipitados ceráticos (secundários a<br />
uveíte anterior associada), dobras da membrana<br />
de Descemet e redução de sensibilidade corneal.<br />
O tratamento inclui uso de agentes antivirais,<br />
com preferência pelo uso do aciclovir. Nos casos<br />
de infecção ocular primária, aplicação de aciclovir<br />
pomada a 3% sobre as lesões da pele (cinco<br />
vezes/dia por 2 a 3 semanas). No tratamento da<br />
ceratite deve ser ministrada pomada de aciclovir<br />
a 3% em fórnice conjuntival inferior (cinco vezes/dia<br />
por 2 a 3 semanas). Na presença de irite,<br />
acrescentar o uso de cicloplégicos e, em casos<br />
graves e disseminados, considerar uso de terapia<br />
antiviral sistêmica (aciclovir via oral 200 a 400<br />
mg 5 vezes/dia durante 2 semanas). As ceratites<br />
estromais, as vasculites, a endotelite e a ceratouveíte<br />
devem ser tratadas com associação de<br />
corticosteróide tópico. O uso de corticosteróide<br />
está contra-indicado em casos com presença de<br />
ulceração corneal.<br />
Ceratite pelo HVZ<br />
O herpes zoster pode acometer o ramo oftálmico<br />
do nervo trigêmeo em até 15% dos casos.<br />
Essa condição recebe o nome de “herpes zoster<br />
oftálmico”, independentemente da presença ou<br />
não do envolvimento ocular. É importante notar<br />
se há envolvimento pela doença do nervo nasal<br />
externo (sinal de Hutchinson), que inerva a asa<br />
do nariz, pois nesses casos há maior chance de<br />
ocorrer complicações oculares pela doença.<br />
A doença ocular mais comum é a ceratite, dividida<br />
em epitelial aguda, numular e disciforme;<br />
no entanto, pode haver casos de conjuntivite,<br />
episclerite, esclerite, uveíte anterior, além de<br />
complicações neurológicas com sintomas oculares,<br />
como neurite óptica e paralisia de nervos<br />
cranianos (principalmente terceiro par – oculomotor).<br />
O tratamento da doença ocular faz parte<br />
do tratamento da doença sistêmica (aciclovir via<br />
oral 800 mg 5 vezes/dia por 7 dias) associado ao<br />
uso de lubrificante tópico. O tratamento tópico<br />
com aciclovir pomada a 3% (5 vezes/dia por 2 semanas)<br />
é controverso e deve ser reservado em<br />
casos de maior gravidade.<br />
Ceratite por Acanthamoeba<br />
A Acanthamoeba é um protozoário de vida livre<br />
presente em praticamente todos os ambientes e<br />
altamente resistente a condições inóspitas (resiste<br />
a extremas condições de temperatura e pH,<br />
bem como ao cloro e a outros sistemas de desinfecção).<br />
Os humanos são amplamente resistentes à infecção;<br />
no entanto, a ceratite pode se instalar após<br />
abrasão corneana mínima. Os usuários de lentes<br />
de contato estão sob maior risco, principalmente<br />
usuários que freqüentam piscinas sem a retirada<br />
das lentes.<br />
A apresentação geralmente tem progressão lenta,<br />
com episódios de regressão e recidiva. O quadro<br />
inclui visão turva, lacrimejamento, fotofobia<br />
e dor intensa desproporcional aos sinais clínicos.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Ceratites infecciosas<br />
Dor desproporcional à lesão, infiltrado em forma<br />
de anel e história de uso de lentes de contato formam<br />
tríade muito sugestiva de ceratite por ameba.<br />
A lesão inicial é muito semelhante ao herpes<br />
simples. Achado característico da ceratite por<br />
Acanthamoeba é a ceratoneurite (infiltrados perineurais<br />
radiais). Alguns casos podem progredir<br />
com complicações como afilamento corneal (até<br />
perfuração), infecção secundária ou associada,<br />
esclerite, entre outras.<br />
O diagnóstico pode ser realizado por isolamento<br />
da ameba derivado de raspado corneal ou biópsia.<br />
A doença é de difícil tratamento com utilização<br />
de amebicidas tópicos a cada 1-2 horas (propamidina<br />
a 1%; hexamidina a1%; biguanida a<br />
0,02%; clorexidine a 0,02%). Em certos casos, algum<br />
tipo de intervenção cirúrgica é necessária<br />
como opção terapêutica ou diagnóstica.<br />
Olho vermelho<br />
195
Conjuntivite<br />
Ruth Miyuki Santo<br />
196<br />
Conjuntivite<br />
Conjuntivite é a inflamação da conjuntiva, podendo<br />
ocorrer em qualquer grupo etário, sem<br />
predileção por sexo. Pode ser classificada de várias<br />
formas, por exemplo:<br />
1. Considerando-se o tempo de início dos sintomas:<br />
a. Hiperaguda: menos de 12 horas<br />
b. Aguda: menos de 3 semanas<br />
c. Crônica: mais de 3 semanas<br />
d. Neonatal: do nascimento até 28 dias de vida<br />
2. Considerando-se o agente causal:<br />
a. Infecciosa<br />
i. Bacteriana<br />
ii. Viral<br />
iii. Clamídea<br />
b. Alérgica<br />
c. Irritativa<br />
d. Tóxica<br />
e. Relacionada a alterações palpebrais (floppy<br />
eyelid, lagoftalmo)<br />
f. Associada a doenças sistêmicas (síndrome de<br />
Sjöegren, doença de Graves, Síndrome de Reiter,<br />
penfigóide, psoríase)<br />
3. Considerando-se o tipo de resposta conjuntival:<br />
a. Papilar (Figura1)<br />
b. Folicular (Figura 2)<br />
c. Membranosa<br />
d. Cicatricial<br />
e. Granulomatosa<br />
f. Flictenular<br />
4. Considerando-se a lateralidade:<br />
a. Unilateral<br />
b. Bilateral<br />
Geralmente, o processo, quando restrito à conjuntiva,<br />
costuma ser autolimitado, e a resolução<br />
não implica em seqüelas. Entretanto, em alguns<br />
casos de conjuntivite, pode haver comprometimento<br />
da córnea com perda permanente da visão,<br />
como na conjuntivite gonocócica, ou pode<br />
levar a uma morbidade ocular prolongada, como<br />
nos casos de ceratoconjuntivite adenoviral e nas<br />
ceratoconjuntivites atópica e primaveril.<br />
Principais sinais e sintomas:<br />
• Secreção: aquosa (lacrimejamento), mucóide,<br />
mucopurulenta ou purulenta<br />
• Prurido<br />
• Queimação<br />
• Sensação de corpo estranho<br />
• Hiperemia conjuntival<br />
• Edema da conjuntiva (quemose)<br />
• Edema palpebral e pseudoptose<br />
Outros sinais: linfadenopatia satélite (Síndrome<br />
oculoglandular de Parinaud, conjuntivites adenovirais),<br />
hemorragias conjuntivais.<br />
Os pacientes com conjuntivite têm mais desconforto<br />
e ardor do que propriamente dor. A dor<br />
não é um sintoma freqüente. Além disso, devemos<br />
pensar em outras causas de olho vermelho<br />
que não a conjuntivite.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Conjuntivite<br />
A anamnese do paciente com conjuntivite inclui:<br />
1. Tempo de início dos sinais e sintomas<br />
2. Presença de manifestações sistêmicas<br />
a. Infecção de vias aéreas superiores<br />
b. Alergia<br />
c. Uretrite<br />
d. Artrite (a associação de conjuntivite, uretrite e<br />
artrite sugere o diagnóstico de Síndrome de Reiter)<br />
e. Doenças reumatológicas, Síndrome de Sjöegren,<br />
doenças dermatológicas<br />
3. Uso de lente de contato<br />
4. Uso de medicação tópica ocular (colírios e pomadas)<br />
Ao exame oftalmológico, verificar:<br />
1. Tipo de secreção<br />
2. Tipo de reação conjuntival<br />
3. Pálpebras, margens palpebrais e cílios<br />
a. Presença de vesículas<br />
b. Blefarite, canaliculite<br />
c. Dermatite seborréica<br />
d. Dermatite atópica<br />
4. Padrão da hiperemia: na conjuntivite, a hiperemia<br />
é difusa ou, às vezes, mais intensa nos fundos<br />
de saco e tarso (Figura 3)<br />
Quando o padrão for injeção ciliar (Figura 4), ou<br />
seja, congestão dos vasos na região do limbo, é<br />
necessário afastar outras causas de olho vermelho,<br />
como uveíte, glaucoma agudo, fístula carótido-cavernosa,<br />
e que normalmente são unilaterais.<br />
Na ceratoconjutivite límbica superior, a congestão<br />
vascular, como o próprio nome sugere, é<br />
restrita à região limbar superior.<br />
Olho vermelho<br />
5. Envolvimento da córnea:<br />
a. Ceratite superficial (ceratite ponteada)<br />
b. Infiltrados subepiteliais ou estromais<br />
c. Úlcera dendrítica<br />
d. Ceratite flictenular (manifestação imunoalérgica<br />
na região do limbo e da córnea periférica,<br />
resultante da antigenicidade de certos agentes<br />
como o estafilococo e o bacilo da tuberculose)<br />
A investigação laboratorial não é necessária na<br />
maioria das vezes, exceto se o processo é crônico<br />
ou recidivante, ou se é fulminante.<br />
A pesquisa laboratorial inclui:<br />
1. Exame citológico:<br />
a. Possibilita a identificação de tipos de células<br />
inflamatórias envolvidas (neutrófilos, linfócitos,<br />
eosinófilos) e de certas alterações celulares (células<br />
multinucleadas); presença de inclusões nucleares<br />
sugerem infecção por herpesvírus). Colorações<br />
específicas auxiliam o diagnóstico:<br />
i. GRAM – classifica as bactérias<br />
ii. Giemsa – útil na suspeita de conjuntivite por<br />
clamídea; identifica os corpúsculos de inclusão<br />
intracitoplasmáticos<br />
iii. Imunofluorescência: uso de anticorpos fluorescentes<br />
específicos (clamídea e vírus)<br />
2. Culturas<br />
a. Meios de ágar sangue ou chocolate (meios<br />
enriquecidos que favorecem o crescimento de<br />
bactérias)<br />
b. Neisseria: meio de Thayer Martin<br />
c. Vírus : pouco disponível<br />
197
Conjuntivite aguda<br />
198<br />
Conjuntivite<br />
Dentre as conjuntivites agudas, as mais freqüentes<br />
são as de etiologia viral, sobretudo as causadas<br />
pelos adenovírus; em seguida, com freqüência<br />
bastante menor, vêm as conjuntivites alérgicas<br />
agudas e as bacterianas.<br />
Conjuntivite aguda de origem infecciosa<br />
1. Viral<br />
Febre faringo-conjuntival<br />
É causada por adenovírus dos tipos 3, 4 e 7, e<br />
caracteriza-se pela presença de faringite e de febre.<br />
Presença de linfadenopatia pré-auricular é<br />
comum, e é mais freqüente em crianças. Na conjuntiva,<br />
a reação é do tipo folicular.<br />
Ceratoconjuntivite epidêmica<br />
Também é causada por uma variedade de cepas<br />
de adenovírus, incluindo os tipos 8 e 19. Inicialmente<br />
há hiperemia conjuntival, quemose, lacrimejamento,<br />
e é geralmente bilateral. Pode evoluir<br />
com comprometimento da córnea a partir de<br />
uma semana, o qual é representado por infiltrados<br />
subepitelias (Figura 5). Os pacientes acometidos<br />
dessa patologia queixam-se de fotofobia, e,<br />
dependendo da intensidade dos infiltrados, há<br />
redução na acuidade visual. A reação conjuntival<br />
é folicular, podendo cursar com formação de<br />
membrana ou de pseudomembrana. Pode haver<br />
linfadenopatia pré-auricular.<br />
Nas crianças, além do quadro ocular, pode haver<br />
febre e dor de garganta.<br />
Nas infecções por adenovírus não há tratamento<br />
específico. Estão indicados medidas de apoio e<br />
uso de lubrificantes oculares. Nos casos de formação<br />
de membrana e de ceratite com comprometimento<br />
visual importante, corticóide tópico<br />
é indicado, porém com muita parcimônia.<br />
Importante lembrar que as conjuntivites adenovirais,<br />
sobretudo a ceratoconjuntivite epidêmica,<br />
são altamente transmissíveis, devendo tomar-se<br />
todo o cuidado para evitar a disseminação. Os<br />
pacientes devem ser orientados a respeito das<br />
medidas preventivas de disseminação, como<br />
lavar as mãos antes e após a manipulação dos<br />
olhos e separar objetos de uso pessoal.<br />
Conjuntivite pelo herpes simples<br />
Forma mais rara de conjuntivite viral, acompanha<br />
a infecção primária pelo herpes simples. Ao<br />
exame, podemos encontrar vesículas herpéticas<br />
na pálpebra e nas margens, edema palpebral e<br />
eventualmente, ceratite com formação de dendritos.<br />
Linfadenopatia pré-auricular dolorosa<br />
está quase sempre presente. O tratamento inclui<br />
o uso de medicação antiviral tópica (pomada de<br />
Aciclovir). O uso de corticóide é contra-indicado.<br />
2. Bacterianas<br />
As bactérias mais freqüentes são: Staphylococcus<br />
aureus (em todas as faixas etárias), Streptococcus<br />
pneumoniae e Hemophilus influenza (mais comuns<br />
em crianças).<br />
Sinais e sintomas: ardor, hiperemia, secreção mucopurulenta<br />
leve a moderada, reação papilar.<br />
Exames laboratoriais não são necessários de forma<br />
rotineira e o tratamento inclui uso de colírio<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Conjuntivite<br />
de antibiótico (atualmente o grupo mais usado é<br />
o das quinolonas, de amplo espectro), além das<br />
medidas de apoio, como limpeza e compressas<br />
frias com solução salina 0,9% (soro fisiológico)<br />
ou com água filtrada ou mineral. Não é recomendado<br />
o uso de água boricada (pode ser irritante<br />
e alergênica).<br />
Conjuntivite hiperaguda<br />
É uma conjuntivite de evolução rápida e, geralmente,<br />
muito agressiva, podendo, se não tratada<br />
a tempo, levar à destruição da córnea. O principal<br />
agente desse grupo é a Neisseria; tanto a<br />
gonorrheae como a meningitidis podem causar<br />
conjuntivite, mas a gonocócica costuma ser mais<br />
grave. A conjuntivite gonocócica caracteriza-se<br />
pela presença de secreção purulenta abundante<br />
e exige tratamento imediato. É recomendável a<br />
obtenção de material para exame laboratorial. O<br />
não tratamento pode permitir a rápida evolução<br />
para perfuração corneana ou invasão da corrente<br />
sangüínea pelos vasos da conjuntiva (conjuntivite<br />
por N. meningitidis pode evoluir com meningite).<br />
Olho vermelho<br />
O tratamento é sistêmico com Ceftriaxone 1g IM,<br />
dose única, ou cefotaxime 1g EV, a cada 8 horas.<br />
Além disso, indicam-se as medidas locais, como<br />
remoção periódica da secreção conjuntival com<br />
solução salina 0,9%.<br />
Conjuntivite crônica<br />
Conjuntivite com duração de mais de 3 semanas.<br />
Pode ser classificada de acordo com os agentes<br />
causais:<br />
· Infecciosa:<br />
- Bacteriana<br />
- Viral<br />
- Clamídea<br />
· Tóxica (drogas atropina, antivirais, presenvativos,<br />
aminoglicosídeos)<br />
· Alérgica ou inflamatória<br />
· Anormalidade das pálpebras (floppy eyelid, lagoftalmo)<br />
· Ceratoconjuntivite sicca<br />
199
200<br />
Conjuntivite<br />
Além de se basear na história, o diagnóstico também<br />
é baseado no<br />
aspecto morfológico ao exame biomicroscópico<br />
da conjuntiva:<br />
Conjuntivite papilar<br />
blefaroconjuntivite<br />
ceratoconjuntivite límbica superior<br />
floppy eyelid<br />
Conjuntivite papilar gigante<br />
Primaveril (alérgica)<br />
Lente de contato, sutura, prótese<br />
Folicular<br />
Clamídea (conjuntivite de inclusão do adulto,<br />
considerada uma doença sexualmente transmissível)<br />
e tracoma; nos estágios mais avançados, os<br />
folículos podem não ser mais observados, existindo<br />
apenas extensa cicatrização conjuntival<br />
com presença da linha de Arlt e as fossetas de<br />
Herbert no limbo)<br />
Diferenciação das cinjuntivites<br />
ACHADOS CLÍNICOS E<br />
CITOLOGIA<br />
Prurido mínimo<br />
mínimo a moderado<br />
mínimo intenso<br />
Hiperemia moderada<br />
intensa<br />
moderada moderada<br />
Secreção mucopurulenta ou<br />
aquosa<br />
mucopurulenta mucóide ou<br />
purulenta<br />
mucopurulenta<br />
Reação conjuntival papilar<br />
folicular<br />
folicular e papilar papilar<br />
Dor de garganta<br />
e febre<br />
BACTERIANA<br />
ocasional<br />
Molusco contagioso (Vídeo)<br />
Microsporídeo: indivíduos imunocomprometidos<br />
Tóxica: atropina, antivirais, anestésico (preservativos<br />
e<br />
aminoglicosídeos costumam resultar em conjuntivite<br />
papilar)<br />
Conjuntivite membranosa<br />
conjuntivite lenhosa<br />
Conjuntivite cicatricial:<br />
Penfigóide<br />
Síndrome de Stevens-Johnson<br />
Queimaduras químicas<br />
Conjutivite granulomatosa<br />
Sarcoidose<br />
Síndrome oculoglandular de Parinaud (doença<br />
da arranhadura de gato,<br />
esporotricose, tuberculose)<br />
ocasional<br />
Citologia bactérias<br />
linfócitos,<br />
corpúsculos de<br />
PMN<br />
efeitos citopáticos<br />
inclusão<br />
citoplasmáticos<br />
VIRAL<br />
Olho vermelho<br />
CLAMÍDEA ALÉRGICA<br />
ausente ausente<br />
eosinólos<br />
cap. 07
cap. 07 Conjuntivite<br />
Importante<br />
As conjuntivites são uma das principais causas<br />
de “olho vermelho”. Dentre elas, as de origem<br />
adenoviral são as mais freqüentes. Quando o<br />
processo está restrito à conjuntiva costuma<br />
ser autolimitado, e a resolução não implica<br />
em seqüelas. O diagnóstico é clínico, e exames<br />
laboratoriais não são necessários de forma rotineira.<br />
Nas infecções por adenovírus não há<br />
tratamento específico. O uso indiscriminado<br />
de colírios antibióticos, além de não ter efeito<br />
sobre a infecção viral, pode favorecer a seleção<br />
bacteriana.<br />
Importante lembrar que as conjuntivites adenovirais,<br />
sobretudo a ceratoconjuntivite epidêmica,<br />
são altamente transmissíveis, devendo<br />
tomar-se todo o cuidado para evitar a disseminação.<br />
Os médicos devem lavar as mãos<br />
após o exame de um paciente com suspeita<br />
de conjuntivite. Os pacientes devem ser orientados<br />
com medidas de prevenção da disseminação:<br />
lavar as mãos antes e após a manipulação<br />
dos olhos, separar objetos de uso pessoal,<br />
trocar a toalha e a fronha diariamente, evitar<br />
beijos e cumprimento com as mãos, não tomar<br />
banho de mar, de piscina ou de banheira.<br />
O afastamento do ambiente escolar ou de trabalho<br />
é necessário nos casos de ceratoconjuntivite<br />
epidêmica e deve ser fornecido atestado<br />
médico por oftalmologista.<br />
Conjuntivite neonatal<br />
As conjuntivites neonatais estão associadas à infecção<br />
ocular do recém-nascido quando de sua<br />
passagem pelo canal vaginal contaminado no<br />
momento de parto.<br />
Olho vermelho<br />
Conjuntivite gonocócica<br />
Historicamente, a conjuntivite por Neisseria gonorrheae<br />
foi uma importante causa de cegueira.<br />
É uma conjuntivite hiperaguda que se desenvolve<br />
2 a 4 dias após o nascimento. O uso da solução<br />
de nitrato de prata 1% (manobra de Credé)<br />
diminuiu a ocorrência da infecção, mas não a erradicou.<br />
A infecção ocasiona edema palpebral intenso,<br />
secreção purulenta, ulceração, podendo ocorrer<br />
perfuração corneana.<br />
Diagnóstico clínico e laboratorial (diplococo G-<br />
intracelular).<br />
Tratamento: visa a prevenir as lesões oculares e<br />
sistêmicas (artrite, pneumonia, meningite e sépsis).<br />
Requer tratamento sistêmico com ceftriaxone<br />
125 mg IM, em dose única, ou cefotaxime 25<br />
mg/kg EV ou IM, a cada 8 ou 12 horas/7 dias.<br />
Outras conjuntivites bacterianas<br />
Incluem infecções por Strepto pneumoniae, Staphylo<br />
aureus, Haemophilus, E. coli, Pseudomonas<br />
(prematuros). Tratamento com antibiótico tópico.<br />
Se houver suspeita de complicação como celulite<br />
orbitária, o tratamento deve ser por via endovenosa.<br />
Conjuntivite química<br />
Devida à instilação do colírio de nitrato de prata,<br />
ocorre em geral ao nascimento ou 3 dias após.<br />
A secreção é discreta, aquosa, autolimitada. Em<br />
alguns serviços, o uso de colírio de eritromicina<br />
1% ou de tetraciclina 1% é usado como alternativa<br />
na profilaxia para a conjuntivite gonocócica e<br />
diminui a chance de conjuntivite química.<br />
201
Conjuntivite por Chlamydea<br />
202<br />
Conjuntivite<br />
Conjuntivite mucopurulenta, moderada a grave,<br />
que ocorre de 5 a 10 dias após o nascimento. Se<br />
não tratada pode resultar em pannus e em formação<br />
de cicatriz corneana. Pode haver quadro sistêmico<br />
com pneumonia, otite média, traqueíte,<br />
nasofaringite. Diagnóstico: clínico e laboratorial<br />
(presença de inclusões basofílicas intracitoplasmáticas<br />
à coloração por Giemsa, ou identificados<br />
por imunofluorescência).<br />
Tratamento: Tópico com pomada de eritromicina<br />
ou tetraciclina 4x ao dia, por 10 dias, e tratamento<br />
sistêmico deve ser feito nos pais e na criança.<br />
Suspensão de eritromicina 50mg/kg/dia, dividida<br />
em 4 doses por 14 dias.<br />
AGENTE<br />
Neisseria<br />
Outra bactérias<br />
Chlamydea<br />
Herpes<br />
Química<br />
INÍCIO<br />
2 - 4 dias<br />
2 - 30 dias<br />
5 - 10 dias<br />
7 - 10 dias<br />
1 - 3 dias<br />
CITOLOGIA<br />
diplococo G- intracelular<br />
G+ ou G-<br />
corp. inclusão intracitoplasmático<br />
imunofluorecência<br />
céls. gigantes multinucleadas / incl.<br />
intranucleares<br />
negativa<br />
Conjuntivite por Herpes simplex (tipo II)<br />
Geralmente unilateral, ocorre 7 a 10 dias após o<br />
nascimento, ou mesmo mais tardiamente. Provoca<br />
uma conjuntivite com secreção aquosa;<br />
pode haver presença de vesículas nas margens<br />
palpebrais, ceratite difusa ou dendrítica (mas<br />
rara), coriorretinite, uveíte. Diagnóstico: clínico<br />
e laboratorial (ao exame citológico, pode haver<br />
presença de células gigantes multinucleadas e<br />
inclusões eosinofílicas intranucleares). Em presença<br />
de lesão corneana, usa-se antiviral tópico<br />
na forma de pomada 5x ao dia, até a epitelização.<br />
CULTURA<br />
ágar sangue/chocolate<br />
negativa<br />
Olho vermelho<br />
ágar sangue/chocolate meio de<br />
Thayer-Martin<br />
cultura para vírus/PCR<br />
cap. 07
cap. 07 Esclerite<br />
Esclerite<br />
Pode ser anterior ou posterior ao equador do<br />
bulbo ocular, necrotizante ou não. É bem menos<br />
freqüente que a episclerite e acomete mais o<br />
sexo feminino e idades mais avançadas. Aproximadamente<br />
50% dos casos de esclerite anterior<br />
estão associados com doenças sistêmicas autoimunes<br />
ou reumatológicas. Já a esclerite posterior<br />
normalmente não apresenta associações<br />
com outras patologias.<br />
O tratamento consiste em instilação de colírios<br />
antiinflamatórios não esteroidais ou esteroidais<br />
e, em casos severos, corticoterapia sistêmica.<br />
Olho vermelho<br />
203
Olho Seco<br />
204<br />
Olho seco<br />
Doença multifatorial da lágrima e da superfície<br />
ocular que resulta em sintomas de desconforto,<br />
distúrbios visuais e instabilidade do filme lacrimal<br />
com potencial lesão da superfície ocular. O<br />
quadro é acompanhado por aumento de osmolaridade<br />
do filme lacrimal e inflamação da superfície<br />
ocular.<br />
A síndrome do olho seco pode ser classificada<br />
segundo sua etiologia em: evaporativa e<br />
por deficiência aquosa. A primeira divide-se<br />
em intrínseca (subdividida em: deficiência da<br />
glândula de Meibomius, distúrbios da abertura<br />
palpebral, redução da freqüência dos piscamentos,<br />
e, secundariamente, uso de drogas)<br />
e extrínseca (subdividida em: deficiência de<br />
vitamina A decorrente de preservativos dos<br />
colírios, uso de lentes de contato e doença da<br />
superfície ocular, p.ex., alergia). Já o olho seco<br />
por deficiência aquosa é subdividido em olho<br />
seco associado à síndrome de Sjögren (primário<br />
ou secundário) e olho seco sem síndrome<br />
de Sjögren (deficiência lacrimal, obstrução do<br />
ducto da glândula lacrimal, bloqueio reflexo e<br />
drogas de ação sistêmica).<br />
Ao exame ocular, nota-se redução do menisco<br />
do filme lacrimal, presença de debris no filme<br />
lacrimal pré-corneano, hiperemia conjuntival<br />
intermitente e ceratopatia ponteada. Em alguns<br />
casos pode haver evolução para ceratite<br />
filamentar. Blefarite é um achado associado<br />
freqüente. A propedêutica subsidiária inclui<br />
teste de rosa bengala, análise do tempo de<br />
rompimento do filme lacrimal (BUT – break-up<br />
time) e teste de Schirmer.<br />
O tratamento baseia-se na utilização de lágrimas<br />
artificiais. Casos mais graves podem necessitar<br />
de oclusão do ponto lacrimal e tarsorrafia.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Uveite<br />
Uveíte<br />
Inflamação do trato uveal cuja principal classificação<br />
baseia-se em sua localização anatômica:<br />
uveíte anterior (envolvendo íris e/ou corpo ciliar);<br />
intermediária (pars plana e extrema periferia<br />
da retina), posterior (atrás da borda posterior<br />
da base vítrea) e panuveíte (comprometimento<br />
de todo o trato uveal). A uveíte também é classificada<br />
de acordo com a fase de estabelecimento<br />
e com o tempo de evolução em aguda ou crônica.<br />
Ainda com base nas características fisiopatológicas,<br />
a uveíte pode ser dividida em granulomatosa<br />
e não-granulomatosa.<br />
Olho vermelho<br />
Os sintomas clássicos da uveíte são: fotofobia,<br />
dor ocular, hiperemia pericerática, redução da<br />
acuidade visual e lacrimejamento. Convém lembrar<br />
que casos crônicos freqüentemente se apresentam<br />
com ausência de hiperemia e mínimos<br />
sintomas, mesmo na presença de inflamação<br />
ativa.<br />
O tratamento da uveíte envolve uso de esteróides<br />
tópicos ou sistêmicos, de acordo com a severidade<br />
do quadro. Além disso, é imprescindível a<br />
realização de investigação sistêmica para a definição<br />
etiológica.<br />
205
Celulite Orbitária<br />
206<br />
Celulite orbitária<br />
Trata-se de um processo infeccioso dos tecidos<br />
moles posteriores ao septo orbitário. A forma<br />
bacteriana é a mais comum e pode ser secundária<br />
a sinusite etmoidal, decorrente de infecção<br />
de estruturas adjacentes, pós-traumática e<br />
pós-cirúrgica. Apresenta-se com rápido desenvolvimento<br />
unilateral de quemose, hiperemia<br />
conjuntival, proptose e diplopia. Existe um risco<br />
de evolução para complicações intracranianas<br />
(meningite, abscesso cerebral, trombose do seio<br />
cavernoso) em cerca de 4% dos casos.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Glaucoma agudo primário<br />
Glaucoma agudo primário<br />
Roberto Freire Santiago Malta<br />
O glaucoma agudo primário (GAP) é uma das<br />
principais emergências oftalmológicas.<br />
Do ponto de vista epidemiológico, essa doença<br />
é comum na raça amarela, menos freqüente na<br />
população caucasiana e na negra.<br />
A prevalência do GAP é nitidamente maior nas<br />
mulheres (70%), com idade em torno de 65 anos,<br />
portadoras de hipermetropia.<br />
De modo geral, os olhos acometidos possuem<br />
diâmetro ântero-posterior reduzido, a câmara<br />
anterior é menor e mais rasa que a população<br />
normal e o cristalino tem diâmetro axial aumentado.<br />
Essas características anatômicas fazem com que<br />
o ângulo da câmara anterior seja estreito, propiciando<br />
o seu fechamento com conseqüente aumento<br />
da pressão intra-ocular (PIO).<br />
Em relação à fisiopatogenia, observa-se uma dificuldade<br />
da passagem do humor aquoso da câmara<br />
posterior para a câmara anterior devido ao<br />
maior contato da face posterior da íris com a face<br />
anterior do cristalino. Esse evento é denominado<br />
“bloqueio pupilar” e ocorre durante uma eventual<br />
semimidríase pupilar. Essa dificuldade de trânsito<br />
do aquoso faz com que o mesmo se acumule<br />
na câmara posterior, aumentando a pressão<br />
nesse local e empurrando a periferia da íris para<br />
frente, fechando o seio camerular ou o ângulo da<br />
câmara anterior.<br />
O fechamento angular impede a drenagem do<br />
aquoso acarretando súbito aumento da PIO. A<br />
pressão que, por exemplo, situa-se em torno de<br />
15 mmHg, sobe, em questão de minutos, para<br />
Olho vermelho<br />
60 mmHg. Isso acarreta uma súbita isquemia do<br />
globo ocular e conseqüente quadro clínico associado.<br />
Na grande maioria dos casos, a crise aguda é<br />
unilateral, e clinicamente o paciente apresenta<br />
dor intensa no globo ocular, a qual pode irradiar<br />
para a cabeça e/ou para a hemiface acometida,<br />
e pode ser acompanhada de náuseas e vômitos.<br />
O olho acometido fica vermelho, de intensidade<br />
variável, acompanhado de lacrimejamento, fotofobia,<br />
diminuição da acuidade visual e visualização<br />
de halos coloridos ao redor das lâmpadas.<br />
O exame ocular mostra que a PIO está bastante<br />
elevada. A pressão bidigital, realizada com os<br />
dois dedos indicadores através das pálpebras<br />
superiores com olhar direcionado para baixo,<br />
mostra nítida assimetria de tensão entre o olho<br />
normal e o olho com GAP.<br />
O exame realizado com lanterna apropriada ou<br />
o exame externo assinalam ausência de secreção<br />
mucopurulenta na presença de congestão<br />
acentuada dos vasos conjuntivais e episclerais.<br />
A córnea está edemaciada, perdendo, portanto,<br />
seu brilho e transparência, e a pupila está em semimidríase<br />
fixa.<br />
É importante acentuar que o exame com lanterna<br />
deve ser realizado comparando-se o olho acometido<br />
com o olho normal, e isso evidenciará as<br />
diferenças dos achados entre um e outro olho.<br />
A crise de glaucoma agudo é uma das mais importantes<br />
urgências em oftalmologia, e o tratamento<br />
deve ser instituído o mais rapidamente<br />
possível. A intensa isquemia produzida pela elevação<br />
aguda da PIO exige medidas de urgência<br />
as quais devem ser instituídas pelo médico especialista.<br />
Assim sendo, o encaminhamento para o<br />
207
oftalmologista deve ser imediato.<br />
208<br />
Glaucoma agudo primário<br />
Inúmeras são as drogas de uso tópico e sistêmico<br />
que são utilizadas no tratamento da crise aguda,<br />
entretanto, elas não devem ser ministradas pelo<br />
médico generalista.<br />
Uma exceção é a acetazolamida, que é um inibidor<br />
da anidrase carbônica, comercializada com<br />
o nome de “Diamox”. A posologia é de 1 comprimido<br />
de 250 mg, via oral, de 6 em 6 horas. O<br />
uso dessa medicação fica prejudicado no caso da<br />
presença de vômitos, e a mesma deve ser utilizada<br />
com muito cuidado em portadores de gastrite<br />
e de calculose renal.<br />
Enquanto aguardam atendimento especializado,<br />
os pacientes devem permanecer em decúbito<br />
horizontal dorsal, em quarto escuro.<br />
Vários são os diagnósticos diferenciais do glaucoma<br />
agudo primário. Entre eles, podemos incluir<br />
os glaucomas agudos secundários, a uveíte<br />
hipertensiva, os glaucomas neovasculares e os<br />
glaucomas facogênicos. Todos podem ser perfeitamente<br />
confundidos com a crise de glaucoma<br />
agudo primário, e o diagnóstico diferencial somente<br />
será feito pelo médico especialista. As ceratites<br />
ou ceratoconjuntivites também estão associadas<br />
ao olho vermelho dolorido, porém, podem<br />
ocorrer em qualquer idade ou sexo, têm um<br />
curso insidioso associado à presença de secreção<br />
e de dor, com sensação de corpo estranho.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07<br />
Glaucoma de ângulo fechado<br />
Introdução<br />
O glaucoma de ângulo fechado, também denominado<br />
“glaucoma de ângulo estreito” ou “glaucoma<br />
de ângulo oclusível”, pode ser classificado<br />
como glaucoma primário ou secundário, e glaucoma<br />
agudo ou crônico. São inúmeros os mecanismos<br />
fisiopatológicos envolvidos em cada<br />
uma dessas entidades, de modo que os mesmos<br />
serão devidamente discutidos quando das suas<br />
respectivas apresentações.<br />
Glaucoma agudo primário<br />
Epidemiologicamente, o glaucoma agudo primário<br />
é uma doença rara na população negra e<br />
pouco freqüente na população caucasiana. Entretanto,<br />
essa é uma doença bastante comum<br />
nas populações dos esquimós, dos mongóis, na<br />
China, na Índia e no Vietnã.<br />
A prevalência do glaucoma agudo primário é nitidamente<br />
maior nas mulheres (70%), com idade<br />
em torno de 65 anos.<br />
Os doentes portadores de glaucoma agudo primário<br />
apresentam características biométricas<br />
típicas que favorecem o aparecimento da crise<br />
congestiva.<br />
Assim sendo, os olhos acometidos apresentam<br />
diâmetro ântero-posterior reduzido e câmara<br />
anterior estreita.<br />
O cristalino apresenta tamanho axial aumentado,<br />
e a sua inserção em relação ao limbo está<br />
anteriorizada, favorecendo, portanto, o estreitamento<br />
do ângulo da câmara anterior.<br />
Olho vermelho<br />
Saiba mais<br />
Associadamente, a maioria desses olhos são hipermétropes,<br />
e a ceratometria mostra uma curvatura<br />
corneana aumentada.<br />
Do ponto de vista fisiopatológico, todas essas<br />
condições anatômicas favorecem o mecanismo<br />
de bloqueio pupilar, o qual desencadeia a crise<br />
de glaucoma agudo.<br />
O bloqueio pupilar nada mais é que a dificuldade<br />
de passagem do humor aquoso da câmara posterior<br />
para a câmara anterior Segundo Mapstone,<br />
essa dificuldade é associada à drenagem simultânea<br />
do aquoso ainda presente na câmara<br />
anterior. O esvaziamento da câmara anterior associado<br />
à pressão aumentada na câmara posterior<br />
desloca o diafragma írido-cristaliniano para<br />
frente com conseqüentes fechamento do ângulo,<br />
interrupção da drenagem, aumento súbito da<br />
pressão intra-ocular e instalação do processo de<br />
isquemia do globo ocular.<br />
O desencadeamento do bloqueio pupilar é associado<br />
a semimidríase pupilar de origem autonômica<br />
desencadeada por inúmeros fatores (drogas,<br />
estresse, condições de iluminação, posição<br />
da cabeça, etc.).<br />
O paciente portador de glaucoma agudo primário,<br />
clinicamente, apresenta dor intensa no globo<br />
ocular acompanhada de diminuição acentuada<br />
da acuidade visual, de visualização de halos coloridos<br />
ao redor de lâmpadas, de náuseas e de<br />
vômitos.<br />
O exame ocular mostra que a pressão intra-ocular<br />
está elevada (por volta de 50-60 mmHg), os<br />
vasos conjuntivais e episclerais estão congestos,<br />
a córnea está edemaciada, o humor aquoso<br />
apresenta flare e tyndall em grau variado e a câmara<br />
anterior está bastante rasa.<br />
209
210<br />
Saiba mais<br />
É fundamental a realização do exame gonioscópico,<br />
apesar da dificuldade induzida pelo edema<br />
corneano. O uso do colírio de glicerina pode facilitar<br />
a visualização do ângulo, o qual, normalmente,<br />
está totalmente fechado.<br />
A isquemia produzida no segmento anterior leva<br />
à isquemia da íris e do músculo esfíncter da íris.<br />
Conseqüentemente, a íris pode sofrer áreas de<br />
atrofia segmentar associada a atrofia do músculo<br />
esfíncter, com deformação da área pupilar. Associadamente,<br />
ocorre dispersão generalizada de<br />
pigmentos irianos com deposição dos mesmos<br />
na camada de Henle, na face posterior da córnea,<br />
no seio camerular e na face anterior do cristalino.<br />
A aposição prolongada da íris no cristalino e da<br />
periferia da íris na esclera leva à formação de sinéquias<br />
írido-cristalinianas e de goniosinéquias.<br />
O cristalino sofre necrose do seu epitélio com<br />
conseqüente formação de opacidades subcapsulares<br />
anteriores denominadas “glaukomflecken”.<br />
Tais opacidades podem ser puntiformes ou<br />
abranger áreas maiores do cristalino lembrando<br />
o aspecto de “leite derramado” sobre uma superfície<br />
plana.<br />
O exame do nervo óptico é dificultado devido<br />
ao forte edema corneano, porém, de um modo<br />
geral, a papila está edemaciada durante a crise<br />
congestiva.<br />
A crise de glaucoma agudo é uma das mais importantes<br />
urgências em oftalmologia, e o tratamento<br />
deve ser instituído o mais rapidamente<br />
possível.<br />
Diversas são as medicações e os procedimentos<br />
utilizados e, de um modo geral, são utilizados<br />
quase que simultaneamente. Assim sendo, os<br />
pacientes são posicionados em decúbito hori-<br />
zontal dorsal e são medicados com as seguintes<br />
drogas:<br />
agentes hiperosmóticos: manitol a 20% via intravenosa<br />
- 2g/Kg de peso (3 a 5ml/minuto), de<br />
8/8 horas, ou glicerina 50% via oral - 1,5g/Kg de<br />
peso, de 8/8 horas.<br />
inibidores da anidrase carbônica: acetazolamida<br />
250 mg via oral, de 6 em 6 horas.<br />
pilocarpina a 2% colírio: 1 gota de meia em meia<br />
hora na primeira hora, 1 gota de hora em hora,<br />
na segunda e terceira hora, 1 gota de 6 em 6 horas<br />
a seguir.<br />
maleato de timolol a 0,5% colírio: 1 gota de 12<br />
em 12 horas.<br />
cortisona colírio (acetato de prednisolona): 1<br />
gota de 2 em 2 horas nas primeiras 24 horas.<br />
Nos casos em que a pressão intra-ocular está<br />
muito elevada (em torno de 60-70 mmHg) ocorre<br />
uma isquemia do músculo esfíncter da íris de<br />
modo que tal músculo não reage ao estímulo<br />
dos agentes mióticos. Portanto, com esses níveis<br />
de pressão, o início do uso de pilocarpina pode<br />
ser adiado por 1 ou 2 horas após a introdução<br />
das outras medicações e a conseqüente redução<br />
da pressão. Em relação aos agentes hiperosmóticos,<br />
deve-se levar em consideração que muitos<br />
desses pacientes apresentam náuseas e vômitos,<br />
o que impede o uso oral dessa droga.<br />
Um outro aspecto a ser considerado está relacionado<br />
com as condições físicas e cardiológicas do<br />
paciente a ser tratado.Várias dessas medicações<br />
podem alterar as condições hemodinâmicas de<br />
pacientes, muitas vezes idosos, de tal modo que<br />
uma monitorização clínica adequada é fundamental.<br />
Associada ao tratamento medicamentoso, realiza-se<br />
a compressão central da córnea com o<br />
intuito de abrir-se o seio camerular. Esse procedi-<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07<br />
mento é indispensável no tratamento adequado<br />
do glaucoma agudo primário. Quando as pressões<br />
são extremamente elevadas, opta-se por se<br />
iniciar essa manobra após cerca de uma hora do<br />
início do uso das medicações, quando já houve<br />
uma diminuição parcial da pressão intra-ocular.<br />
Com o paciente em decúbito horizontal dorsal,<br />
faz-se uma compressão na área central da córnea,<br />
utilizando, de preferência, o prisma destacado<br />
do tonômetro de aplanação de Goldmann.<br />
A compressão deve ser realizada por 3 vezes durante<br />
10 segundos, com intervalos de 10 segundos.<br />
Toda essa manobra pode ser repetida por<br />
mais de 2 ou 3 vezes, dependendo da resposta<br />
inicial.<br />
O tratamento adequado da crise de glaucoma<br />
agudo primário controla a pressão intra-ocular<br />
ou, pelo menos, aborta a crise congestiva em<br />
cerca de 90% dos casos, nas primeiras 12–24 horas.<br />
Assim sendo, dá-se prosseguimento ao tratamento<br />
com a realização da iridotomia, com a<br />
utilização do YAG-laser. Esse é um procedimento<br />
relativamente fácil em indivíduos sem edema<br />
de córnea e sem edema do estroma iriano. De<br />
um modo geral, um disparo de 6-8 mJ, em uma<br />
pseudocripta periférica, é suficiente para a realização<br />
de um orifício que liga a câmara posterior<br />
Olho vermelho<br />
Saiba mais<br />
com a câmara anterior, rompendo, portanto, o<br />
bloqueio pupilar.<br />
A iridotomia periférica adequada, rompendo<br />
esse bloqueio, impede o desenvolvimento de<br />
novas crises primárias, exceto se o paciente for<br />
portador de íris em platô, conforme será tratado<br />
a seguir. Entretanto, o paciente que teve uma crise<br />
de glaucoma agudo deve ser acompanhado<br />
de um modo muito regular, pois pode já ser portador<br />
de glaucoma crônico de ângulo estreito<br />
(sobre o qual se desenvolveu uma crise aguda),<br />
ou vir a apresentar um glaucoma crônico após<br />
crise aguda.<br />
Um outro aspecto fundamental na avaliação<br />
desses pacientes é o estudo do olho contralateral.<br />
Na grande maioria das vezes, o olho contralateral<br />
apresenta condições anatômicas mais<br />
ou menos semelhantes ao olho que teve a crise<br />
congestiva. Entretanto, podem ocorrer casos em<br />
que esse olho é míope e apresenta o ângulo da<br />
câmara anterior não oclusível. Essa informação é<br />
muito importante, pois pode levar ao tratamento<br />
profilático desnecessário do olho oposto.<br />
De um modo geral, está indicado o tratamento<br />
profilático em quase todos os olhos contralaterais,<br />
com a realização de uma iridotomia com<br />
YAG-laser.<br />
211
Figura 02:<br />
Glaucoma subagudo primário<br />
212<br />
Saiba mais<br />
O glaucoma subagudo ou intermitente é uma<br />
condição clínica que ocorre em olhos com características<br />
biométricas semelhantes ao glaucoma<br />
agudo primário. Os pacientes apresentam quadro<br />
clínico semelhante ao do glaucoma agudo,<br />
porém, de menor intensidade. Os episódios de<br />
diminuição da acuidade visual com discreta dor<br />
e de visão de halos coloridos são de pequena duração<br />
e intensidade.<br />
Muitas dessas crises podem estar relacionadas<br />
com a atividade profissional ou com outras ativi-<br />
dades do paciente acometido. Costureiras profissionais,<br />
leitores contumazes, freqüentadores assíduos<br />
de cinema podem, após essas atividades,<br />
desenvolver crises subagudas.<br />
No diagnóstico desses casos é fundamental a realização<br />
de uma anamnese bastante detalhada,<br />
assim como a realização do exame gonioscópico.<br />
Em vários desses pacientes observa-se a presença<br />
de goniosinéquias ou de pontos isolados<br />
de hiperpigmentação no seio camerular, o que<br />
pode sugerir o contato intermitente da íris sobre<br />
a parte escleral do ângulo da câmara anterior.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07<br />
Muitos desses pacientes podem caminhar para<br />
uma crise congestiva completa e, independentemente<br />
desse fato, devem ser tratados imediatamente,<br />
com a realização da iridotomia.<br />
Síndrome da íris de platô<br />
A configuração da íris em platô caracteriza, do<br />
ponto de vista biomicroscópico, olhos com câmara<br />
anterior relativamente profunda na sua<br />
área central, e rasa na sua periferia, de tal modo<br />
que a dilatação da pupila provoca bloqueio angular<br />
pela obstrução da malha trabecular devido<br />
a aposição da íris na periferia do seio camerular.<br />
A realização da iridotomia é suficiente para remover<br />
a presença de um possível componente<br />
de bloqueio pupilar; porém, a midríase pupilar<br />
pode levar a um aumento súbito da pressão<br />
intra-ocular devido ao fechamento angular, definindo<br />
o diagnóstico da síndrome da íris em platô.<br />
A realização da gonioscopia adequada é fundamental<br />
para o correto diagnóstico da íris com<br />
configuração em platô. Mais recentemente, a utilização<br />
da biomicroscopia ultra-sônica e do OCT<br />
Visante pode auxiliar na interpretação dessas alterações<br />
anatômicas.<br />
Os pacientes devem ser tratados com mióticos<br />
fracos ou com iridoplastia periférica.<br />
Glaucoma crônico de ângulo estreito<br />
O glaucoma crônico de ângulo estreito é um<br />
glaucoma primário em que o ângulo da câmara<br />
anterior é estreito, ou seja, no qual as diferentes<br />
estruturas do seio camerular somente são observadas,<br />
total ou parcialmente, através da realização<br />
da gonioscopia com manobras de identação.<br />
Olho vermelho<br />
Saiba mais<br />
Do ponto de vista epidemiológico, na população<br />
acima de 40 anos, a prevalência do glaucoma<br />
crônico de ângulo estreito é de cerca de<br />
80% considerando-se a população portadora de<br />
glaucoma de ângulo estreito, ou seja, do total<br />
dos indivíduos com glaucoma agudo, subagudo<br />
e crônico, cerca de 80 % têm manifestação crônica<br />
da doença.<br />
Uma das poucas exceções a esse número são os<br />
esquimós do Alaska, onde a prevalência do glaucoma<br />
crônico de ângulo estreito, após os 40 anos<br />
de idade, é de 36%, ou seja, 64% dos pacientes<br />
com glaucoma de ângulo estreito apresentam<br />
crises de glaucoma agudo.<br />
Em relação à fisiopatogenia, esse tipo de glaucoma<br />
pode ocorrer como conseqüência da dificuldade<br />
da drenagem do humor aquoso através da<br />
malha trabecular resultante de repetidos fechamentos<br />
angulares, por provável bloqueio pupilar<br />
parcial, acompanhado ou não de goniossinéquias<br />
e sem qualquer sinal ou sintoma compatível<br />
com crise subaguda ou intermitente.<br />
Em alguns casos, principalmente nos olhos que<br />
formaram goniossinéquias de modo crônico,<br />
pode ocorrer um episódio de glaucoma agudo e,<br />
de modo contrário, olhos previamente normais,<br />
que foram acometidos por crise de glaucoma<br />
agudo, e devidamente tratados com iridotomia,<br />
podem evoluir no futuro, com aumento crônico<br />
da pressão intra-ocular.<br />
O glaucoma crônico de ângulo estreito tem evolução<br />
clínica muitas vezes semelhante à do glaucoma<br />
crônico simples.<br />
A doença é geralmente bilateral e assimétrica, as<br />
alterações campimétricas e do nervo óptico assemelham-se<br />
ao do glaucoma de ângulo aberto,<br />
porém, as pressões intra-oculares podem cursar<br />
213
com picos bastante elevados.<br />
214<br />
Saiba mais<br />
Esses glaucomas devem ser tratados com a realização<br />
de iridotomia com YAG-laser, associada ao<br />
tratamento medicamentoso se necessário.<br />
A cirurgia da trabeculectomia está indicada nos<br />
olhos submetidos à iridotomia, associada ao tratamento<br />
medicamentoso, sendo que os olhos<br />
continuam sem controle adequado da pressão<br />
intra-ocular.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07
cap. 07 Auto-avaliação<br />
Auto-avaliação<br />
1. Paciente do sexo feminino, 30 anos, refere<br />
queixa de olho vermelho, associado à sensação<br />
de corpo estranho, dor ocular, lacrimejamento e<br />
diminuição de acuidade visual há 3 dias. Faz uso<br />
de lentes de contato. Nega trauma ou comorbidades<br />
clínicas. Diante desse quadro, assinale a<br />
alternativa que contém hipóteses diagnósticas<br />
possíveis e a conduta correta para o caso:<br />
a. Hiposfagma (hemorragia subconjuntival), conjuntivite<br />
bacteriana e glaucoma agudo. Lágrimas<br />
artificiais e encaminhamento ambulatorial ao oftalmologista.<br />
b. Hiposfagma, uveíte e meibomite. Encaminhamento<br />
urgente ao oftalmologista.<br />
c. Ceratite, glaucoma agudo e uveíte. Encaminhamento<br />
urgente ao oftalmologista.<br />
d. Hiposfagma, blefarite e pterígio. Encaminhamento<br />
ambulatorial ao oftalmologista.<br />
2. Paciente do sexo masculino, 50 anos, trabalhador<br />
rural, natural e procedente de Itapetinga-BA.<br />
Quadro de lesão avermelhada que recobre a região<br />
nasal escleral de ambos os olhos se estendendo<br />
até próximo à região central corneana.<br />
Assinale a alternativa que contém um diagnóstico<br />
possível:<br />
a. Conjuntivite. Encaminhamento urgente ao oftalmologista.<br />
b. Catarata. Encaminhamento ambulatorial ao<br />
oftalmologista.<br />
c. Glaucoma agudo. Encaminhamento urgente<br />
ao oftalmologista.<br />
d. Pterígio. Encaminhamento ambulatorial ao oftalmologista.<br />
3. Os seguintes sinais e sintomas estão presentes<br />
na crise de glaucoma agudo primário:<br />
Olho vermelho<br />
a. olho vermelho, secreção purulenta, diminuição<br />
da acuidade visual, sensação de corpo estranho,<br />
pupila em semimidríase<br />
b. olho vermelho, ausência de secreção, diminuição<br />
da acuidade visual, sensação de corpo estranho,<br />
pupila miótica<br />
c. olho vermelho, secreção mucóide, diminuição<br />
da acuidade visual, dor ocular, pupila miótica<br />
d. olho vermelho, ausência de secreção, diminuição<br />
da acuidade visual, intensa dor ocular, pupila<br />
em semimidríase<br />
4. São características do glaucoma agudo primário:<br />
a. acomete preferencialmente mulheres de origem<br />
asiática, jovens, míopes, com câmara anterior<br />
rasa<br />
b. acomete preferencialmente mulheres caucasianas,<br />
jovens, hipermétropes, com câmara anterior<br />
rasa<br />
c. acomete preferencialmente mulheres de origem<br />
asiática, da 3 a idade, hipermétropes, com<br />
câmara anterior rasa<br />
d. acomete preferencialmente mulheres caucasianas,<br />
da 3 a idade, hipermétropes, com câmara<br />
anterior rasa<br />
5. As características anatômicas mais comuns<br />
nos olhos portadores de glaucoma agudo primário<br />
são:<br />
a. Câmara anterior rasa, diâmetro ântero-posterior<br />
aumentado, cristalino anteriorizado<br />
b. Câmara anterior rasa, diâmetro ântero-posterior<br />
pequeno, cristalino anteriorizado<br />
c. Câmara anterior profunda, diâmetro ânteroposterior<br />
curto, cristalino não anteriorizado<br />
d. Câmara anterior profunda, diâmetro ânteroposterior<br />
aumentado e cristalino anteriorizado<br />
215
216<br />
Auto-avaliação<br />
6. Epidemiologicamente, o glaucoma agudo primário<br />
ocorre mais freqüentemente em:<br />
a. Homens negros e de meia-idade<br />
b. Mulheres brancas e jovens<br />
c. Homens de origem asiática e jovens<br />
d. Mulheres de origem asiática e de meia-idade<br />
6. Paciente de 80 anos é encaminhado ao Pronto<br />
Socorro da <strong>Oftalmologia</strong> com quadro de olho<br />
vermelho há 1 dia. Nega dor, baixa de acuidade<br />
visual ou história de trauma. Refere que trata irregularmente<br />
HAS e DM, além disso é usuário de<br />
AAS. Ao exame oftalmológico constatamos sangramento<br />
sob a conjuntiva nasal de olho direito.<br />
Qual o diagnóstico e conduta?<br />
a. Uveíte anterior; colírios de corticóide e midriático.<br />
b. Hiposfagma; avaliação da pressão arterial e<br />
orientações.<br />
c. Esclerite; anti-inflamatório não hormonal via<br />
oral e colírio de corticóide.<br />
d. Hiposfagma; colírio de corticóide e orientações.<br />
7. Diante do quadro de uma conjuntivite neonatal,<br />
qual a conduta mais certa:<br />
a. Tratar a criança com antibiótico tópico e sistêmico<br />
e reavaliação diária;<br />
b. Tratar a criança com antibiótico tópico e sistêmico,<br />
solicitar avaliação da pediatria para afastar<br />
outros diagnósticos (pneumonia, artrite, otite) e<br />
tratar os pais.<br />
c. Tratar a criança com antibiótico sistêmico e dar<br />
alta, já que se trata de quadro inocente, com baixa<br />
chance de complicação.<br />
d. Tratar a criança com antibiótico tópico e sistêmico,<br />
solicitar avaliação da pediatria para afastar<br />
outros diagnósticos (pneumonia, artrite, otite),<br />
reavaliar o quadro ocular em poucos dias e tratar<br />
os pais.<br />
8. Dentre os quadros abaixo, qual necessita de<br />
avaliação oftalmológica urgente:<br />
a. olho vermelho associado a lacrimejamento,<br />
sem baixa de visão, sem dor.<br />
b. Sensação de areia e coceira nos olhos há 3 meses.<br />
c. Pós-operatório de catarata recente, com baixa<br />
de acuidade visual e dor.<br />
d. Sangramento subconjuntival, sem dor ou baixa<br />
de visão.<br />
9. Assinale a alternativa que contém os sinais e<br />
sintomas da úlcera de córnea:<br />
a. Dor intensa, fotofobia, baixa de visão, hiperemia<br />
pericerática.<br />
b. Dor leve, sem baixa de visão, hiperemia difusa.<br />
c. Hiperemia localizada, baixa de visão leve, hifema<br />
e reação de câmara anterior.<br />
d. Sangramento subconjuntival, sem dor ou baixa<br />
de visão.<br />
Olho vermelho<br />
cap. 07