14.04.2013 Visualizações

Capítulo do livro: A Arte da Capoeira de Camille Adorno O caminho ...

Capítulo do livro: A Arte da Capoeira de Camille Adorno O caminho ...

Capítulo do livro: A Arte da Capoeira de Camille Adorno O caminho ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Transforme seus PDFs em revista digital e aumente sua receita!

Otimize suas revistas digitais para SEO, use backlinks fortes e conteúdo multimídia para aumentar sua visibilidade e receita.

<strong>Capítulo</strong> <strong>do</strong> <strong>livro</strong>: A <strong>Arte</strong> <strong>da</strong> <strong>Capoeira</strong> <strong>de</strong> <strong>Camille</strong> A<strong>do</strong>rno<br />

O <strong>caminho</strong> <strong>da</strong> <strong>Capoeira</strong> - A Lei Áurea<br />

• A Lei Áurea e outras formas <strong>de</strong> castigo<br />

A Lei Áurea<br />

Negro<br />

<strong>de</strong> ganho<br />

<strong>de</strong> lanho<br />

<strong>de</strong> lenha<br />

No lombo<br />

a lenha<br />

o lanho, o ganho<br />

Na cabeça<br />

a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

É <strong>do</strong> conhecimento geral que a história oficial <strong>do</strong> Brasil é feita pelas elites e para a celebração <strong>da</strong>s<br />

elites. É a história <strong>de</strong> uma classe - não a história <strong>de</strong> um povo. Mas ela é ain<strong>da</strong> muito mais<br />

discriminatória quan<strong>do</strong> trata <strong>da</strong> presença <strong>do</strong>s negros na construção <strong>de</strong>ste País. É uma história <strong>do</strong><br />

branco. E esta negação vai além <strong>da</strong> própria negação <strong>do</strong> negro no Brasil - ela vai até a negação <strong>da</strong><br />

história <strong>da</strong> África. A negação <strong>do</strong> ser africano é anterior mesmo à negação <strong>da</strong> cultura negra no Brasil.<br />

Este é um <strong>do</strong>s elementos <strong>do</strong> que po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> como processo <strong>de</strong> extermínio <strong>do</strong> negro<br />

brasileiro. Porque procura <strong>de</strong>senraizá-lo <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os seus fun<strong>da</strong>mentos. Para que fique pairan<strong>do</strong> no<br />

cenário social, sem referências culturais. A não ser aquelas impostas pela assimilação, pela<br />

aculturação <strong>da</strong>s tradições <strong>de</strong> origem européia.<br />

O negro tem seu papel mistifica<strong>do</strong> na história oficial. A abolição <strong>da</strong> escravatura é um exemplo. Na<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, os <strong>de</strong>tentores <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r fomentaram a miséria e a fome, impedin<strong>do</strong> o acesso aos meios <strong>de</strong><br />

produção e não propician<strong>do</strong> condições <strong>de</strong> trabalho aos novos ci<strong>da</strong>dãos. Não lhes foram pagas<br />

in<strong>de</strong>nizações pelos longos séculos <strong>de</strong> escravidão. Na<strong>da</strong> receberam os ex-escravos pelas riquezas<br />

gera<strong>da</strong>s nos trabalhos força<strong>do</strong>s. E também não foram assegura<strong>da</strong>s condições a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong>s para que<br />

ingressassem no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> trabalho livre.<br />

Entretanto, foram trazi<strong>do</strong>s para o Brasil imigrantes <strong>de</strong> diferentes partes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, com o propósito<br />

<strong>de</strong> preencher as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>do</strong> sistema produtivo, sob a alegação <strong>de</strong> que havia falta <strong>de</strong> braços para<br />

o trabalho. Mas o que faltava mesmo era vonta<strong>de</strong> política para efetuar uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira<br />

transformação <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Começou uma nova etapa no processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sintegração <strong>do</strong> negro brasileiro - ao nível econômico e<br />

<strong>da</strong> sua personali<strong>da</strong><strong>de</strong>, permitin<strong>do</strong> vislumbrar um plano calcula<strong>do</strong> para erradicar a presença negra <strong>da</strong><br />

nossa história.<br />

É fácil enten<strong>de</strong>r essa época como perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> confusão na cabeça e na vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s populações<br />

negras. Nesse tempo ficou registra<strong>do</strong> eleva<strong>do</strong> índice <strong>de</strong> criminali<strong>da</strong><strong>de</strong>, pois a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

garantir a sobrevivência, numa socie<strong>da</strong><strong>de</strong> injusta, provocou situação muito semelhante à que<br />

presenciamos agora.<br />

Foi cria<strong>da</strong> então a figura <strong>do</strong> negro como agente criminoso. Suas práticas mais comuns: a vadiagem,<br />

a capoeiragem... quan<strong>do</strong> o que realmente ocorria era a impossibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> trabalho livre! Na<strong>da</strong> foi


feito pela integração social <strong>do</strong> ci<strong>da</strong>dão cria<strong>do</strong> com a lei <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> maio.<br />

A República que suce<strong>de</strong>u ao Império her<strong>do</strong>u seus preconceitos e impediu a participação política <strong>do</strong><br />

negro, negan<strong>do</strong> o direito <strong>de</strong> voto aos analfabetos.<br />

Ora, a cultura africana, ágrafa, se baseia na comunicação oral. Aos escravos não era ministra<strong>da</strong><br />

nenhuma instrução. O negro era, portanto, obriga<strong>do</strong> a assumir uma língua que não era a <strong>de</strong>le e<br />

a<strong>do</strong>tar uma forma <strong>de</strong> comunicação totalmente estranha aos seus costumes, a escrita, para ser<br />

admiti<strong>do</strong> como eleitor! Como po<strong>de</strong>ria ler e escrever nos mol<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s opressores e ser imediatamente<br />

- ci<strong>da</strong>dão <strong>do</strong> país? Essa e outras questões nunca preocuparam a nossa socie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Permanecem até hoje inúmeras distorções. O que vali<strong>da</strong> a assertiva que, para construirmos uma<br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>mocrática, o negro tem que participar <strong>da</strong> <strong>de</strong>finição <strong>de</strong>ssa socie<strong>da</strong><strong>de</strong>. As iniciativas <strong>de</strong><br />

caráter cultural <strong>de</strong>vem estar vincula<strong>da</strong>s à emergência <strong>do</strong>s problemas políticos e sociais, pois cultura<br />

é a integração <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s humanas, e não uma fração, um elemento <strong>de</strong>corativo.<br />

Quan<strong>do</strong> uma parcela <strong>da</strong> população é obriga<strong>da</strong> a aceitar os valores impostos, ela se anula e per<strong>de</strong> a<br />

perspectiva <strong>do</strong> que é ser livre. Não po<strong>de</strong>mos esquecer que a luta pela libertação é antes <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> um<br />

ato cultural. Encontraremos a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> quan<strong>do</strong> resgatarmos nossa i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>, reencontran<strong>do</strong>-nos<br />

com os elementos forma<strong>do</strong>res <strong>da</strong> nossa civilização, que é afro-índia-brasileira. O jogo <strong>da</strong> capoeira é<br />

um <strong>de</strong>ntre os <strong>caminho</strong>s para a nossa re<strong>de</strong>scoberta. Por que não tentar?

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!