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universidade federal fluminense programa de pós-graduação - UFF

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE<br />

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO<br />

CARLOS ARTEXES SIMÕES<br />

JUVENTUDE E EDUCAÇÃO TÉCNICA:<br />

A experiência na formação <strong>de</strong> jovens trabalhadores do Colégio<br />

Estadual Prof. Horacio Macedo/CEFET-RJ<br />

NITERÓI/RJ<br />

2007


CARLOS ARTEXES SIMÕES<br />

JUVENTUDE E EDUCAÇÃO TÉCNICA:<br />

A experiência na formação <strong>de</strong> jovens trabalhadores do<br />

Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo/CEFET-RJ<br />

Dissertação <strong>de</strong> mestrado apresentado ao Programa<br />

<strong>de</strong> Pós-Graduação em Educação da Universida<strong>de</strong><br />

Fe<strong>de</strong>ral Fluminense, como pré-requisito à<br />

obtenção do título <strong>de</strong> Mestre em Educação.<br />

Orientador: Prof. Dr. Paulo Cesar Rodrigues Carrano<br />

Campo <strong>de</strong> confluência: Diversida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> social e<br />

educação.<br />

Niterói/RJ<br />

2007<br />

ii


Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoatá<br />

S593 Simões, Carlos Artexes.<br />

JUVENTUDE E EDUCAÇÃO TÉCNICA: a experiência na formação <strong>de</strong><br />

jovens trabalhadores da Escola Estadual Prof. Horacio Macedo/CEFET-RJ /<br />

Carlos Artexes Simões. – 2007.<br />

148 f.<br />

Orientador: Paulo Cesar Rodrigues Carrano.<br />

Dissertação (Mestrado) – Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral Fluminense,<br />

Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Educação, 2007.<br />

Bibliografia: f. 87-91.<br />

1. Juventu<strong>de</strong> – Educação - Brasil. 2. Juventu<strong>de</strong> – Emprego - Brasil. 3. Ensino<br />

técnico - Brasil. I. Carrano, Paulo Cesar Rodrigues. II. Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral<br />

Fluminense. Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Educação. III. Título.<br />

CDD 373.2460981<br />

iii


CARLOS ARTEXES SIMÕES<br />

JUVENTUDE E EDUCAÇÃO TÉCNICA:<br />

A experiência na formação <strong>de</strong> jovens trabalhadores do Colégio Estadual<br />

Prof. Horacio Macedo/CEFET-RJ<br />

Aprovada em agosto <strong>de</strong> 2007.<br />

iv<br />

Dissertação apresentada ao Curso <strong>de</strong> Pós-<br />

Graduação em Educação da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral<br />

Fluminense como requisito parcial para obtenção<br />

do Grau <strong>de</strong> Mestre. Área <strong>de</strong> Concentração:<br />

Diversida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> social e educação.<br />

BANCA EXAMINADORA<br />

_________________________________________________________________________<br />

Prof. Dr. PAULO CESAR RODRIGUES CARRANO-Orientador<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral Fluminense<br />

_________________________________________________________________________<br />

Prof. Dr. GAUDÊNCIO FRIGOTTO<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral Fluminense/Universida<strong>de</strong> Estadual do Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />

Prof. Drª. MARISE NOGUEIRA RAMOS<br />

Universida<strong>de</strong> Estadual do Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />

Niterói<br />

2007


A todos os jovens que, <strong>de</strong> alguma forma, participam<br />

da experiência educacional no Colégio Prof. Horacio<br />

Macedo, na busca <strong>de</strong> um sentido existencial e lutam<br />

por um lugar melhor <strong>de</strong> se viver, para si e para os<br />

outros.<br />

v


AGRADECIMENTOS<br />

vi<br />

Á minha família, Goretti, Bruno, Tainá, Danielle e o<br />

meu neto Vinicius, que faz com que seja mais fácil<br />

acreditar no futuro;<br />

À amiga Inês Bonfim, que, pelo incentivo, serviu <strong>de</strong><br />

“madrinha” para o retorno aos estudos na aca<strong>de</strong>mia,<br />

Ao orientador Paulo Carrano, que, na simplicida<strong>de</strong> e<br />

responsabilida<strong>de</strong>, mostra o verda<strong>de</strong>iro perfil <strong>de</strong> um<br />

pesquisador social;<br />

À Diretora do Colégio Estadual Prof. Horacio <strong>de</strong><br />

Macedo, Julieta <strong>de</strong> Macedo, pela sua obstinação e<br />

compromisso com a educação pública <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>; e<br />

Aos companheiros <strong>de</strong> profissão, que teimam em<br />

acreditar que a Educação tem uma tarefa fundamental<br />

no <strong>de</strong>senvolvimento humano.


vii<br />

“A teoria sempre acaba, mais cedo<br />

ou mais tar<strong>de</strong>, assassinada pela<br />

experiência”.<br />

(Albert Einstein)<br />

“Para compreen<strong>de</strong>r as pessoas<br />

<strong>de</strong>vo tentar escutar o que elas não<br />

estão dizendo, o que elas talvez<br />

nunca venham a dizer”.<br />

(John Powell)


SUMÁRIO<br />

RESUMO ……………..................................................................................................... x<br />

ABSTRACT ……………………………………………................................................. xi<br />

INTRODUÇÃO ...............................................................................................................01<br />

CAPÍTULO I - JUVENTUDE: ENTRE A ESCOLARIZAÇÃO E O TRABALHO.<br />

1.1- ESCOLARIZAÇÃO: INCLUSÃO EXCLUDENTE ......................................................13<br />

1.2- IDENTIDADES PROFISSIONAIS DE JOVENS TRABALHADORES .............................. 19<br />

CAPÍTULO II - A EDUCAÇÃO TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO: SUBORDINAÇÃO<br />

AO CAPITAL E EMANCIPAÇÃO DOS JOVENS TRABALHADORES.<br />

2.1- TRABALHO COMO PRÁXIS HUMANA E ALIENAÇÃO .............................................28<br />

2.2 - A EDUCAÇÃO NO ESTADO CAPITALISTA: REDE DUAL DE ESCOLARIZAÇÃO .......30<br />

2.3 – A POLITECNIA NO ENSINO MÉDIO .....................................................................35<br />

2.4 – A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA NO NÍVEL MÉDIO NO BRASIL...................36<br />

CAPÍTULO III - UMA ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA DOS JOVENS NO<br />

PROGRAMA EDUCACIONAL DO COLÉGIO ESTADUAL PROF. HORACIO DE<br />

MACEDO/CEFET-RJ<br />

3.1- O CEFET-RJ E O ACESSO DE ALUNOS DA ESCOLA PÚBLICA .............................. 50<br />

3.1.1 - O PRÓ-TÉCNICO ........................................................................................53<br />

3.1.2 - O COLÉGIO PROF. HORACIO MACEDO .......................................................59<br />

3.2 - PROCEDIMENTOS DE PESQUISA ...........................................................................64<br />

viii


3.3 - TRAJETÓRIA ESCOLAR E INSERÇÃO NO TRABALHO DE JOVENS TRABALHADORES<br />

3.3.1 - IDENTIDADE SÓCIO-FAMILIAR ................................................................. 66<br />

3.3.2 - PARTICIPAÇÃO NO CURSO TÉCNICO...........................................................69<br />

3.3.3 - OCUPAÇÃO E ESCOLARIDADE DOS PAIS ....................................................70<br />

3.3.4 - ENTRE O TRABALHO E A CONTINUIDADE DOS ESTUDOS............................71<br />

3.4 – A VOZ DOS JOVENS TRABALHADORES: A ORDEM PELO AVESSO .......................73<br />

3.4.1 - O VALOR DA EDUCAÇÃO NA VIDA DOS JOVENS ........................................76<br />

3.4.2 - A IMPORTÂNCIA DO EDUCAÇÃO TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO .....................77<br />

3.4.3 - O EMPREGO E PROFISSÃO ........................................................ ................78<br />

3.4.4 - O TRABALHO COMO RECONHECIMENTO SOCIAL E AUTONOMIA ...............79<br />

3.4.5 - TRABALHO E CONTINUIDADE DE ESTUDOS NO ENSINO SUPERIOR .............79<br />

3.4.6 - FUTURO E PLANOS DE VIDA......................................................................80<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................... ..............................................81<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 87<br />

ANEXOS:<br />

ANEXO 1: QUESTIONÁRIO ...........................................................................................92<br />

ANEXO 2: PEQUENA CRONOLOGIA DO CEFET-RJ.........................................................93<br />

ANEXO 3: RESOLUÇÃO 03/97-CNE ..........................................................................94<br />

ANEXO 4: DECRETO 5154/04 .....................................................................................99<br />

ANEXO 5: TRANSCRIÇÃO DAS REUNIÕES DO GRUPO FOCAL .......................................102<br />

ix


RESUMO<br />

SIMÕES, Carlos Artexes. Juventu<strong>de</strong> e Educação Técnica: A experiência na formação <strong>de</strong><br />

jovens trabalhadores da Escola Estadual Prof. Horacio Macedo/CEFET-RJ. Orientador: Prof. Dr.<br />

Paulo César Rodrigues Carrano. Dissertação (Mestrado em Educação), 148 páginas. Campo <strong>de</strong><br />

Confluência: Diversida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> social e educação.<br />

No inicio do século XXI, o Brasil enfrenta gran<strong>de</strong>s dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r à sua<br />

população e, em particular, aos jovens nos seus direitos básicos <strong>de</strong> uma educação <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong><br />

para todos e <strong>de</strong> trabalho não alienado. O trabalho informal e o subemprego predominam nas<br />

relações <strong>de</strong> produção e a expansão quantitativa da escolarização tem se caracterizado como uma<br />

oferta <strong>de</strong>gradada para os setores populares. Um gran<strong>de</strong> contingente <strong>de</strong> jovens tem abandonado a<br />

perspectiva do estudo e do trabalho. Algumas propostas educacionais buscam se contrapor a esta<br />

realida<strong>de</strong> social, aqui vista como uma tensão entre a estrutura <strong>de</strong> um sistema capitalista e a<br />

estratégia utilizada pelos atores sociais e, em particular, pelos jovens trabalhadores. Essa<br />

dissertação busca <strong>de</strong>svendar a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> utilização da educação técnica pelos “jovens<br />

pobres” para a sua ascensão social e <strong>de</strong>senvolvimento pessoal e coletivo. Tem como objetivo<br />

analisar a experiência <strong>de</strong> jovens oriundos da escola pública em suas trajetórias educacionais e <strong>de</strong><br />

inserção no trabalho, a partir da conclusão e participação no <strong>programa</strong> educacional <strong>de</strong> oferta do<br />

Ensino Médio, do Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo, articulado com a Educação Técnica<br />

do Centro <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> <strong>de</strong> Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET-RJ). Trata-se <strong>de</strong><br />

um estudo <strong>de</strong> caso que ressalta originalida<strong>de</strong>s e particularida<strong>de</strong>s da experiência <strong>de</strong> jovens <strong>de</strong><br />

camadas populares, que concluíram o Ensino Médio, e tiveram a oportunida<strong>de</strong> da Educação<br />

Técnica no CEFET-RJ, mas com uma perspectiva abrangente <strong>de</strong> compreensão do tema, referente<br />

à questão da formação <strong>de</strong> jovens e sua relação com o trabalho.<br />

Palavras-chave: Juventu<strong>de</strong>, Trabalho, Educação técnica.<br />

x


ABSTRACT<br />

At the beginning of the 21st century, Brazil faces huge difficulties in meeting the needs<br />

of its population, especially the young people basic rights to quality education for all and non-<br />

alienated work. Informal work and un<strong>de</strong>remployment prevail in production relations and the<br />

quantitative expansion of the school system has been characterized as a <strong>de</strong>grading offering to<br />

popular sectors. A large contingent of young people has abandoned their perspective on study<br />

and work. Some educational proposals seek if a counterpoint to this social reality, seen here as a<br />

tension between the structure of a capitalist system and the strategy used by the social artists,<br />

and, in particular, the working young people. This dissertation seeks to unveil the possibility of<br />

using technical formation to the “poor young people” in their social rising and personal and<br />

collective <strong>de</strong>velopment. It has the objective of analyzing the experience of young people coming<br />

from state schools, in their educational trajectories and insertion into work after graduating and<br />

participating in the educational program of secondary education offered at Colégio Estadual<br />

Prof. Horacio Macedo, in articulation with the technical education of Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong><br />

Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET-RJ). This study <strong>de</strong>als with a case that<br />

emphasizes originalities and peculiarities of the experience of young people from popular layers<br />

of society, that finished secondary education and had the opportunity to attend technical<br />

education at CEFET-RJ, but with a comprehensive perspective of the un<strong>de</strong>rstanding of the theme<br />

related to the issue of the young people formation and their relation with work.<br />

Key-words: Youth, Work, Technical Education<br />

xi


Introdução<br />

O estudo apresentado <strong>de</strong>corre <strong>de</strong> minha formação e trajetória profissional na Educação<br />

Técnica <strong>de</strong> nível médio. Formei-me técnico pela Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral do Pará (1974),<br />

Engenheiro Eletrônico pela UFRJ (1980), Pedagogo pela UFRJ (1984) e Especialista em<br />

Didática da Educação aplicada em Educação Tecnológica pelo CEFET-RJ (1995). Como<br />

professor (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1980) e dirigente (1996-2007) <strong>de</strong> um Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica,<br />

tenho vivenciado a experiência <strong>de</strong> ser protagonista, a partir da década <strong>de</strong> 1980, nos <strong>de</strong>bates e<br />

implementação das políticas <strong>de</strong> educação para a juventu<strong>de</strong> e, em particular, da formação<br />

profissional técnica <strong>de</strong> nível médio. Dentre esses <strong>de</strong>bates, os que ocorreram durante a<br />

Constituinte, os que antece<strong>de</strong>ram a promulgação da Lei 9394/96, do Decreto 2208/97, das<br />

Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio (1998), das Diretrizes Curriculares Nacionais<br />

da Educação Profissional <strong>de</strong> Nível Técnico (1999) e, recentemente, do Decreto 5154/04, foram<br />

<strong>de</strong>cisivos para a compreensão das políticas públicas referentes à educação profissional no Brasil.<br />

Ao longo dos últimos 20 anos venho, portanto, acompanhando centenas <strong>de</strong> jovens, <strong>de</strong><br />

várias origens sociais, em sua trajetória <strong>de</strong> vida, <strong>de</strong> transição da educação técnica para o mundo<br />

do trabalho e o prosseguimento dos estudos na educação superior. A proposta temática <strong>de</strong>ste<br />

estudo reflete esse percurso e “não se dá por mero acaso, mas por estar intimamente relacionada<br />

com a trajetória <strong>de</strong> vida e a opção política do pesquisador frente aos problemas do mundo”<br />

(Tiriba, 2001).<br />

A temática da juventu<strong>de</strong>, ainda que não seja uma novida<strong>de</strong>, ocupa um território cada vez<br />

maior nas ciências humanas. Universida<strong>de</strong>s, centros <strong>de</strong> pesquisa e organizações da socieda<strong>de</strong><br />

civil têm mobilizado cada vez mais recursos humanos e financeiros em pesquisas que envolvem<br />

a juventu<strong>de</strong>, em inúmeras temáticas: violência, trabalho, sexualida<strong>de</strong>, cultura, e suas <strong>de</strong>correntes<br />

interligações. No Brasil são criados observatórios da juventu<strong>de</strong>, cujo objetivo é mobilizar re<strong>de</strong>s e<br />

construir bases <strong>de</strong> dados. Os dados sobre a juventu<strong>de</strong> têm sido fornecidos predominantemente<br />

por estudos quantitativos que revelam hábitos <strong>de</strong> consumo, lazer, perfis socioeconômicos, fatores<br />

<strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> social, emprego e saú<strong>de</strong>. O jovem, como campo <strong>de</strong> investigação, surge na<br />

contemporaneida<strong>de</strong> pesquisado por antropólogos, psicólogos, psiquiatras, sociólogos, educadores<br />

e assistentes sociais.<br />

1


As pesquisas sobre a juventu<strong>de</strong> <strong>de</strong>monstram que os temas da educação e do trabalho são<br />

assuntos sempre presentes na preocupação dos jovens e da socieda<strong>de</strong>. É importante, portanto, um<br />

estudo da realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> jovens em condições específicas <strong>de</strong> vida, que se configuram no modo <strong>de</strong><br />

produção capitalista, com diferentes relações com o trabalho e a educação escolarizada.<br />

Na atualida<strong>de</strong>, configura-se uma realida<strong>de</strong> da educação da juventu<strong>de</strong> em uma socieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais com profundas mudanças no mundo do trabalho. Constata-se a<br />

exclusão <strong>de</strong> muitos do acesso e da permanência na educação escolarizada, a baixa qualida<strong>de</strong><br />

educacional e a difícil inserção social do sujeito como cidadão produtivo.<br />

Segundo a OIT (Organização Internacional do Trabalho), o <strong>de</strong>semprego alcançou, em<br />

2003, cerca <strong>de</strong> 88 milhões <strong>de</strong> jovens entre 15 a 24 anos, representando 47% do total global <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sempregados. Haverá pelo menos um bilhão <strong>de</strong> pessoas que enfrentarão a ameaça do<br />

<strong>de</strong>semprego ou o subemprego nos próximos anos. Aproximadamente 40% da população mundial<br />

tem menos <strong>de</strong> 20 anos atualmente. E 85% dos jovens vive em países em <strong>de</strong>senvolvimento, on<strong>de</strong><br />

muitos trabalham em condições <strong>de</strong> pobreza, agravada pela falta <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s. A taxa <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>semprego juvenil subiu <strong>de</strong> 11,7% para 13,8% na última década. Em média, os jovens têm três<br />

vezes mais possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> estarem <strong>de</strong>sempregados que os adultos.<br />

Por outro lado, milhões <strong>de</strong> jovens não po<strong>de</strong>m permitir-se o luxo <strong>de</strong> estarem<br />

<strong>de</strong>sempregados e, por isso, trabalham durante longas jornadas em troca <strong>de</strong> salários muito baixos,<br />

tratando <strong>de</strong> construir sua vida na economia informal. Enfrentar o <strong>de</strong>safio mundial do emprego<br />

também requer que os empregos sejam <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>. A maior parte dos habitantes do<br />

mundo em <strong>de</strong>senvolvimento vive e trabalha no quintal da economia <strong>de</strong> mercado, isto é, na<br />

economia informal. São trabalhadores que encontramos no campo e nas ruas. Desprotegidos pela<br />

lei, se vêem obrigados a subsistir com suas famílias em condições precárias.<br />

Em termos <strong>de</strong> trabalho e escolarização da juventu<strong>de</strong>, os dados da Pesquisa Nacional <strong>de</strong><br />

Amostra por Domicílios (PNAD/IBGE-2001) já revelavam que entre os jovens <strong>de</strong> 15 a 24 anos<br />

no Brasil: 24,7% - só estudavam, 18,7% - estudavam e trabalhavam, 32%- só trabalhavam, 5,2 %<br />

- estudavam e procuravam emprego, 5,9% - só procuravam trabalho e 13,5% - não estudavam,<br />

não trabalhavam, nem procuravam trabalho.<br />

No Brasil (IBGE-PNAD-2005), a População Economicamente Ativa contava com 96<br />

milhões <strong>de</strong> pessoas com taxa <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego <strong>de</strong> 9,2%. Na faixa etária <strong>de</strong> 16 a 17 anos a taxa <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>semprego era <strong>de</strong> 26,39% e na faixa <strong>de</strong> 18 a 24 anos <strong>de</strong> 17,79%. Dos jovens ocupados <strong>de</strong> 15 a<br />

2


17 anos, 41% eram assalariados sem carteira <strong>de</strong> trabalho e do total <strong>de</strong> jovens com ida<strong>de</strong> entre 16<br />

a 24 anos apenas 25% só estudavam. Segundo pesquisa <strong>de</strong> emprego e <strong>de</strong>semprego do DIEESE<br />

(2005), nas regiões metropolitanas do Brasil os jovens representam 25% da População<br />

economicamente ativa, mas 20,7% dos ocupados e 45,5% dos <strong>de</strong>sempregados. Somente em São<br />

Paulo, 76,8% dos jovens <strong>de</strong> 16 a 24 anos estão no mercado <strong>de</strong> trabalho com taxa <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego<br />

<strong>de</strong> 19,8%, sendo que 70,1% dos jovens ocupados só trabalhavam e 9,9% trabalhavam e<br />

estudavam. No trabalho, 11,3% são autônomos e 27,6% assalariados sem carteira <strong>de</strong> trabalho.<br />

Nesse quadro, encontra-se o dilema entre a tendência <strong>de</strong> garantir aos jovens um tempo<br />

maior <strong>de</strong> preparação na educação escolarizada, implicando, portanto, a suspensão provisória da<br />

inserção no mundo produtivo e, por outro lado, a necessida<strong>de</strong> concreta do trabalho dos jovens<br />

brasileiros como meio <strong>de</strong> aquisição das condições mínimas da cidadania. Do ponto <strong>de</strong> vista do<br />

trabalho, po<strong>de</strong>mos falar <strong>de</strong> distintas formas <strong>de</strong> socialização profissional relativas aos diversos<br />

grupos <strong>de</strong> jovens, diferenciados pela sua origem social ou seu capital escolar. As trajetórias<br />

profissionais não são mais previsíveis e a responsabilida<strong>de</strong> da inserção no trabalho é dirigida<br />

cada vez mais para o próprio jovem e seus atributos <strong>de</strong> escolarização e formação. Novos<br />

significados em relação ao trabalho são construídos pelos jovens, ante a intensida<strong>de</strong> com que<br />

foram tocados pela incerteza e o <strong>de</strong>semprego juvenil. O trabalho aparece muitas vezes como uma<br />

referência central entre as opiniões, atitu<strong>de</strong>s, expectativas e preocupações dos jovens e com<br />

significados diversos no imaginário juvenil, como valor, necessida<strong>de</strong>, direito ou mesmo como<br />

busca <strong>de</strong> aquisição <strong>de</strong> autonomia familiar e po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> consumo. Por outro lado, à escolarização,<br />

além <strong>de</strong> um direito social básico, ainda representa uma estratégia dos setores populares para o<br />

seu <strong>de</strong>senvolvimento individual e coletivo.<br />

Recentemente, no Brasil, cerca <strong>de</strong> 17,7 milhões <strong>de</strong> brasileiros, em um universo <strong>de</strong> 182<br />

milhões, tinham entre 15 e 19 anos (PNAD/IBGE-2004), faixa etária que correspon<strong>de</strong> à ida<strong>de</strong><br />

consi<strong>de</strong>rada a<strong>de</strong>quada para cursar o Ensino Médio. No entanto, apenas 6,8 milhões (38%), nessa<br />

faixa etária, estavam matriculados neste nível <strong>de</strong> ensino (CENSO ESCOLAR 2005).<br />

O Ensino Médio, em expansão no Brasil, tem-se constituído ao longo da história da<br />

educação brasileira como o nível <strong>de</strong> mais difícil enfrentamento, em termos <strong>de</strong> sua concepção,<br />

estrutura e formas <strong>de</strong> organização, em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> sua própria natureza <strong>de</strong> mediação e a<br />

particularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r aos jovens. Sua ambigüida<strong>de</strong> confere uma dupla função <strong>de</strong> preparar<br />

para a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos e ao mesmo tempo para o mundo do trabalho, produzida <strong>de</strong>ntro<br />

3


<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadas relações sociais e, em particular, no projeto capitalista <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>. Nesse<br />

contexto, a Educação Técnica Profissional <strong>de</strong> Nível Médio, no Brasil, ocupou um lugar<br />

importante nos conflitos que atravessam o campo educacional.<br />

Outros dados (CENSO ESCOLAR 2005) são relevantes nas matrículas do Ensino médio<br />

e na Educação Técnica no Brasil e no Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />

a) Registraram-se 9.031.302 matrículas no Ensino Médio, no Brasil, e 759.825 matrículas no Rio<br />

<strong>de</strong> Janeiro;<br />

b) Registraram-se 707.263 matrículas na Educação Técnica <strong>de</strong> Nível Médio no Brasil e 86.907<br />

matrículas no Rio <strong>de</strong> Janeiro;<br />

c) No Brasil, 48% da população é <strong>de</strong> raça/cor preta ou parda (PNAD/IBGE-2004); entretanto,<br />

apenas 43% dos alunos do Ensino Médio <strong>de</strong>claram-se <strong>de</strong> raça/cor preta ou parda, assim como<br />

26% dos alunos da Educação Técnica. No Rio <strong>de</strong> Janeiro, os pretos e pardos são 44% dos alunos<br />

do Ensino Médio e 32% dos alunos da Educação Técnica;<br />

d) São oferecidos, pela iniciativa privada, no Ensino Médio, 11% das matrículas no Brasil, e<br />

17% das matrículas no Rio <strong>de</strong> Janeiro, enquanto, na Educação Técnica, a iniciativa privada<br />

oferece 58% das matrículas no Brasil, e 47% das matrículas no Rio <strong>de</strong> Janeiro;<br />

e) Os alunos na faixa etária <strong>de</strong> 15 a 19 anos correspon<strong>de</strong>m, no Ensino Médio, a 75% das<br />

matrículas no Brasil e 65% no Rio <strong>de</strong> Janeiro, enquanto, na Educação Técnica, a 32% das<br />

matrículas no Brasil e 52% das matrículas no Rio <strong>de</strong> janeiro.<br />

A Educação Técnica oferecida pelas Escolas Técnicas Fe<strong>de</strong>rais e Centros Fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong><br />

Educação tecnológica apresentou uma forte elitização a partir da década <strong>de</strong> 80. As contradições<br />

da Lei 5692/71 e os pareceres do Conselho Nacional da Educação (CNE) levaram a aprovação<br />

da Lei 7044/82, que revogou a profissionalização universal e compulsória no 2º grau. Com a<br />

implementação da nova Lei,<br />

As Escolas Técnicas sofreram especialmente com este <strong>de</strong>sacerto, pois,<br />

por conseguirem manter um ensino <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong>, viram-se<br />

procurados por levas <strong>de</strong> estudantes que pouco ou nenhum interesse tinha<br />

por seus cursos profissionais. Desorganizado o ensino público <strong>de</strong> caráter<br />

geral nas escolas públicas <strong>de</strong> 2º grau das re<strong>de</strong>s estaduais, e <strong>de</strong>terioradas<br />

sua qualida<strong>de</strong>, esses estudantes viam nas escolas técnicas industriais a<br />

única maneira <strong>de</strong> terem acesso a um ensino gratuito <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong>,<br />

4


que lhes propiciava uma preparação competitiva para os exames<br />

vestibulares aos cursos superiores (CUNHA, 1997).<br />

Nesse ambiente <strong>de</strong> contradições, são criados mecanismos <strong>de</strong> contenção ao Ensino<br />

Superior e, ao mesmo tempo, <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização do acesso ao Ensino Técnico para as camadas<br />

populares.<br />

A <strong>de</strong>stinação social aos trabalhadores e seus filhos historicamente<br />

atribuída ao ensino profissional, à elitização do acesso, conseqüência do<br />

aumento e da mudança no perfil dos candidatos no concurso <strong>de</strong> acesso<br />

às escolas técnicas fe<strong>de</strong>rais e – talvez principalmente – a constatação <strong>de</strong><br />

que a mudança no perfil dos alunos dos cursos técnicos acentua a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso superior dos egressos das escolas técnicas<br />

fe<strong>de</strong>rais é a origem da instalação <strong>de</strong> Cursos Pró-Técnico nas escolas<br />

técnicas da re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> (CAMPELLO, 2000).<br />

Nesse sentido, foi criado, em 1990, o Projeto Pró-Técnico no Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação<br />

Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET-RJ), marcando o início <strong>de</strong> uma política <strong>de</strong> ação<br />

afirmativa para os alunos oriundos da re<strong>de</strong> pública <strong>de</strong> educação. Na justificativa do projeto <strong>de</strong><br />

criação do Curso Pró-Técnico no CEFET-RJ, partiu-se da constatação da elitização do acesso à<br />

escola e <strong>de</strong>finiram-se como objetivos oferecer condições aos alunos oriundos da re<strong>de</strong> municipal<br />

para que estes melhorassem seus conhecimentos, e, também, propiciar a inter-relação entre o<br />

CEFET-RJ e a Secretária Municipal <strong>de</strong> Educação.<br />

A reforma educacional brasileira implementada a partir da Lei 9394/96 e, em particular, a<br />

reforma da educação profissional regulamentada pelo Decreto 2208/97 consolidaram a política<br />

neoliberal e reafirmaram o dualismo estrutural para aten<strong>de</strong>r diferentes interesses <strong>de</strong> classe. Uma<br />

das conseqüências da reforma foi à redução da oferta do Ensino Médio pela re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> e a<br />

elevação da faixa etária dos seus estudantes: o espaço educacional da juventu<strong>de</strong> foi reduzido e<br />

cresceu a ameaça da fragmentação na oferta <strong>de</strong> uma educação integral <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>. A partir <strong>de</strong><br />

1998, as escolas técnicas fe<strong>de</strong>rais e CEFET’s, incluindo o CEFET-RJ, re<strong>de</strong>finiram ou<br />

<strong>de</strong>sativaram os Cursos Pró-Técnicos que vinham <strong>de</strong>senvolvendo.<br />

A redução da oferta obrigatória do Ensino Médio pela re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> <strong>de</strong> Educação<br />

Tecnológica, regulamentada na portaria 646/97, e a resistência/adaptação ao projeto<br />

governamental implicaram a criação <strong>de</strong> novas formas <strong>de</strong> acesso das camadas populares aos<br />

cursos técnicos. No CEFET-RJ, a realização do convênio com a Secretária Estadual <strong>de</strong> Educação<br />

5


possibilitou, em 2000, a criação do Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo, on<strong>de</strong> alunos<br />

oriundos do ensino fundamental da re<strong>de</strong> pública municipal participam <strong>de</strong> um <strong>programa</strong><br />

educacional articulado entre o Ensino Médio na escola estadual e o Curso Técnico ministrado<br />

pelo CEFET-RJ.<br />

Esse estudo analisou a vida profissional e educacional <strong>de</strong> jovens, oriundos <strong>de</strong> escolas<br />

públicas localizadas em bairros populares do Rio <strong>de</strong> Janeiro, que participaram do curso <strong>de</strong><br />

Educação Técnica <strong>de</strong> Nível Médio no Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educacional Celso Suckow da Fonseca<br />

(CEFET-RJ), concomitante com o Ensino Médio no Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo.<br />

Consi<strong>de</strong>ram-se, na análise, os sentidos <strong>de</strong>clarados pelos jovens sobre o trabalho, a inserção no<br />

mundo produtivo e a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos no Ensino Superior. Procura-se compreen<strong>de</strong>r como<br />

essas experiências <strong>de</strong>finem suas trajetórias profissional-educacionais e constroem i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s<br />

para o jovem trabalhador.<br />

A questão central da investigação é a analise da relação <strong>de</strong> trabalho e escolarização na<br />

juventu<strong>de</strong> através da observação da trajetória escolar e inserção no trabalho <strong>de</strong> jovens das<br />

camadas populares que concluíram o Ensino Médio no Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo e<br />

participaram da Educação Técnica no CEFET-RJ, aqui <strong>de</strong>sdobrada em algumas questões <strong>de</strong>la<br />

<strong>de</strong>correntes:<br />

a) Em relação à i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> sócio-familiar: Qual o perfil, em termos <strong>de</strong> origem étnica e social,<br />

dos alunos participantes do <strong>programa</strong> <strong>de</strong> formação profissional articulado com o Ensino Médio?<br />

Qual a ocupação e nível <strong>de</strong> escolarização dos pais e responsáveis? Qual a visão e sentido dado ao<br />

trabalho pelos participantes do <strong>programa</strong>?<br />

b) Em relação à permanência: Os alunos participantes do <strong>programa</strong> permanecem no Curso<br />

Técnico do CEFET-RJ? Qual o motivo <strong>de</strong>clarado para o abandono do mesmo? Qual o nível <strong>de</strong><br />

repetência dos alunos no em tal curso? Quantos obtiveram o diploma <strong>de</strong> técnico <strong>de</strong> Nível Médio<br />

no CEFET-RJ no período compreendido para análise?<br />

c) Em relação às expectativas e trajetórias <strong>pós</strong>-conclusão do curso: Os egressos do <strong>programa</strong><br />

estão trabalhando? Em que profissões? Preten<strong>de</strong>m continuar os estudos no Ensino Superior? Em<br />

quais instituições e cursos? Quais as suas expectativas em termos <strong>de</strong> profissionalização e <strong>de</strong><br />

6


continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos? A participação no <strong>programa</strong> provocou alterações nessas aspirações?<br />

Qual a autonomia adquirida e a relação <strong>de</strong> (in)<strong>de</strong>pendência frente à família, a<strong>pós</strong> a obtenção do<br />

diploma profissional?<br />

d) Em relação à mobilida<strong>de</strong> familiar: Qual a diferença dos níveis <strong>de</strong> escolarização e ocupação<br />

profissional entre os participantes do <strong>programa</strong> e seus pais ou responsáveis? Os profissionais<br />

formados representam uma nova geração <strong>de</strong> trabalhadores das classes populares em ocupações<br />

qualificadas no mundo do trabalho? Quais as percepções dos participantes do <strong>programa</strong> sobre a<br />

importância da formação profissional em suas vidas?<br />

Essa pesquisa ressalta originalida<strong>de</strong>s e particularida<strong>de</strong>s da experiência <strong>de</strong> jovens <strong>de</strong><br />

camadas populares em um <strong>programa</strong> <strong>de</strong> educação tecnológica do CEFET-RJ. O interesse está<br />

voltado para o caso específico, porém com a perspectiva <strong>de</strong> contribuir para a compreensão da<br />

questão mais ampla referente à formação da juventu<strong>de</strong> e sua relação com o trabalho. O ponto <strong>de</strong><br />

discussão central nesta direciona-se a uma análise para além do que se mostra, do que aparenta -<br />

a realida<strong>de</strong> social. Dessa forma, foi preciso um olhar tanto para o movimento do real que ocorre<br />

no campo da escolarização e inserção no trabalho <strong>de</strong> jovens pobres, como para a visão macro da<br />

educação técnica inserida na produção e reprodução das relações capitalistas – aí incluindo o<br />

eixo da reestruturação produtiva e o neoliberalismo.<br />

Foi com esses pressupostos que nos aproximamos do nosso campo <strong>de</strong> pesquisa para<br />

relacioná-lo a este movimento do real, que inclui, <strong>de</strong>ntre outros aspectos, a Educação Técnica e a<br />

própria história do Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo. Nesta, <strong>de</strong>limitamos o campo<br />

empírico <strong>de</strong> nossas observações, constatações, questionários e outros diálogos, que<br />

possibilitaram enten<strong>de</strong>r um pouco sobre a experiência <strong>de</strong> jovens trabalhadores na escolarização e<br />

inserção no mundo do trabalho como profissional qualificado.<br />

O trabalho <strong>de</strong> campo foi realizado com os alunos concluintes, <strong>de</strong> 2002 e 2003, do Ensino<br />

Médio do Colégio Estadual Prof. Horario Macedo e que participaram dos Cursos Técnicos do<br />

CEFET-RJ. O Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo iniciou suas ativida<strong>de</strong>s em 2000, tendo<br />

como critério <strong>de</strong> participação do <strong>programa</strong> a exigência <strong>de</strong> o aluno ter cursado <strong>de</strong> 5ª a 8ª serie em<br />

escola pública e a seleção pelo seu <strong>de</strong>sempenho escolar. Em parceria com o CEFET-RJ, os<br />

alunos aprovados na 1ª série do Ensino Médio do Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo têm<br />

7


assegurado a vaga automática e oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursar, na forma <strong>de</strong> concomitância, os cursos<br />

técnicos oferecidos pelo CEFET-RJ, com duração <strong>de</strong> 3(três) anos, mais o estágio supervisionado<br />

<strong>de</strong> 400 horas em empresas conveniadas. O trabalho <strong>de</strong> campo utilizou um questionário,<br />

<strong>de</strong>volvido por 140 pessoas <strong>de</strong> um total <strong>de</strong> 621 (seiscentos e vinte e um) alunos que entraram no<br />

<strong>programa</strong> em 2000 e 2001 e concluíram o Ensino Médio na Escola Estadual Prof. Horacio<br />

Macedo, sobre o perfil dos jovens e a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudo e trabalho dos sujeitos. A seleção <strong>de</strong><br />

jovens voluntários <strong>de</strong>finiu a realização <strong>de</strong> grupos focais, com a temática da trajetória e relatos <strong>de</strong><br />

vida dos jovens.<br />

É na tentativa <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r esta realida<strong>de</strong> que apresentamos uma pequena revisão<br />

bibliográfica, na exposição <strong>de</strong>sta pesquisa, para a compreensão da experiência dos jovens<br />

trabalhadores.<br />

No primeiro capítulo, abordaremos aspectos do dilema dos jovens entre a formação e a<br />

inserção no mundo do trabalho, sua relação com a escolarização e a formação <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

profissional configurada em um contexto complexo e <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais. Na<br />

atualida<strong>de</strong> brasileira, a negação da escolarização não significa somente a exclusão do acesso dos<br />

jovens à escola, mas uma exclusão que, no seu próprio interior, promove a perda da função<br />

social da escola <strong>de</strong> promover a formação dos seus educandos. A escola básica pública tem cada<br />

vez mais o acesso da população pobre; entretanto, é transformada em escola com menos<br />

características escolares. A relação da juventu<strong>de</strong> com a educação escolarizada tornou-se um<br />

campo <strong>de</strong> lutas on<strong>de</strong> a perspectiva da reprodução social se contrapõe à estratégia dos jovens<br />

pobres na sua experiência concreta <strong>de</strong> escolarização e formação profissional. Por outro lado, os<br />

jovens enfrentam a questão do trabalho em um quadro <strong>de</strong> precária situação sócio econômica. Isso<br />

implica a necessida<strong>de</strong> concreta, para sua sobrevivência, <strong>de</strong> sua inserção no mundo produtivo e o<br />

dilema para os jovens pobres <strong>de</strong> abandonar os estudos, ou <strong>de</strong> forma concomitante estudar e<br />

trabalhar. Nesse contexto, novos significados do trabalho são construídos nas distintas formas <strong>de</strong><br />

socialização, tornando central a questão da profissionalização dos jovens trabalhadores. O<br />

trabalho assume o papel <strong>de</strong> meio para continuar os estudos e um fim para sua realização pessoal.<br />

No segundo capítulo, procuraremos explicitar o significado da Educação Técnica <strong>de</strong> Nível<br />

Médio na articulação da formação profissional e o Ensino Médio no Brasil. Para isso, torna-se<br />

necessário recuperar o sentido do trabalho como práxis humana e a análise crítica do trabalho<br />

alienado das socieda<strong>de</strong>s capitalistas. É fundamental, também, explicitar a re<strong>de</strong> dual <strong>de</strong><br />

8


escolarização que se configura, no Brasil, entre a formação profissional Técnica e o Ensino<br />

Médio, bem como a proposição da politecnia como construção histórica <strong>de</strong> uma educação para a<br />

emancipação dos jovens trabalhadores.<br />

No terceiro capítulo, abordaremos a experiência <strong>de</strong> acesso dos alunos <strong>de</strong> escola pública ao<br />

Ensino Técnico do CEFET-RJ, por meio do projeto Pró-técnico e do Colégio Estadual Prof.<br />

Horacio <strong>de</strong> Macedo. Apresentamos o resultado da pesquisa <strong>de</strong> campo com a análise da<br />

experiência dos jovens a<strong>pós</strong> a participação no <strong>programa</strong> educacional, que articula o Ensino<br />

Médio e a Educação Técnica, oferecida respectivamente pelo Colégio Estadual Prof. Horacio <strong>de</strong><br />

Macedo e o CEFET-RJ.<br />

9


Capítulo I<br />

JUVENTUDE: ENTRE A ESCOLARIZAÇÃO E O TRABALHO<br />

As transformações no processo <strong>de</strong> produção da socieda<strong>de</strong> influenciam <strong>de</strong>cisivamente no<br />

papel que a educação e a formação profissional <strong>de</strong>sempenham na inserção e na trajetória<br />

ocupacional das pessoas ao longo da vida e, em particular, da juventu<strong>de</strong> brasileira. A realida<strong>de</strong><br />

social convive com a crise do <strong>de</strong>semprego, do trabalho precário e com as dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

escolarização efetiva da população. Os jovens com dificulda<strong>de</strong>s econômicas procuram sua<br />

inserção no mundo do trabalho, muitas vezes <strong>de</strong> forma instável, ainda durante a ida<strong>de</strong> própria da<br />

educação básica. Nesse cenário, encontra-se o dilema entre a <strong>de</strong>fesa do adiamento da inserção,<br />

no trabalho, dos jovens, ou a garantia <strong>de</strong> um trabalho mais qualificado durante a sua formação<br />

escolar. Colaborar com a construção <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> profissional dos jovens trabalhadores<br />

po<strong>de</strong> representar uma estratégia positiva nas múltiplas possibilida<strong>de</strong>s e interdições para suas<br />

transições para a vida adulta.<br />

O documento <strong>de</strong> conclusão do Projeto Juventu<strong>de</strong>, produzido pelo Instituto Cidadania em<br />

2004, avança no difícil conceito <strong>de</strong> juventu<strong>de</strong>, consi<strong>de</strong>rado como uma questão <strong>de</strong> faixa etária<br />

apenas, quando <strong>de</strong>fine que<br />

A condição juvenil é dada pelo fato <strong>de</strong> os indivíduos estarem vivendo<br />

um período específico do ciclo <strong>de</strong> vida, num <strong>de</strong>terminado momento<br />

histórico e cenário cultural. No contexto atual, juventu<strong>de</strong> é, i<strong>de</strong>almente,<br />

o tempo em que se completa a formação física, intelectual, psíquica,<br />

social e cultural, processando-se a passagem da condição <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>pendência para a <strong>de</strong> autonomia em relação à família <strong>de</strong> origem. A<br />

pessoa torna-se capaz <strong>de</strong> produzir (trabalhar), reproduzir (ter filhos e<br />

criá-los), manter-se e prover a outros, participar plenamente da vida<br />

social, com todos os direitos e responsabilida<strong>de</strong>s. Portanto, trata-se <strong>de</strong><br />

uma fase marcada centralmente por processos <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição e inserção<br />

social (PROJETO JUVENTUDE-INSTITUTO CIDADANIA, 2004).<br />

10


A condição juvenil remete a uma etapa do ciclo <strong>de</strong> vida, <strong>de</strong> ligação entre a infância, tempo<br />

da primeira fase <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento corporal (físico, emocional intelectual) e da primeira<br />

socialização, <strong>de</strong> quase total <strong>de</strong>pendência e necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> proteção, para a ida<strong>de</strong> adulta, capaz <strong>de</strong><br />

exercer as dimensões <strong>de</strong> produção, reprodução e participação.<br />

A juventu<strong>de</strong> se evi<strong>de</strong>ncia quando o indivíduo esboça necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência em<br />

relação à família e começa a buscar a auto-suficiência. O <strong>de</strong>senvolvimento se dá <strong>de</strong> forma<br />

contínua e o jovem inicia, na adolescência, seus contatos com grupos <strong>de</strong> acordo com seus<br />

interesses e possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> escolhas, ampliando, assim, sua experiência <strong>de</strong> vida.<br />

Para SPOSITO (1993), os jovens são espelhos da socieda<strong>de</strong> inteira, uma espécie <strong>de</strong><br />

paradigma dos problemas cruciais dos sistemas complexos. Representam tensões entre a<br />

expansão das chances <strong>de</strong> vida e o controle difuso; entre possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> individuação e <strong>de</strong>finição<br />

externa da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. Assim, a mobilização juvenil torna-se elemento revelador, trazendo à luz<br />

as <strong>de</strong>mandas profundas, os problemas e as tensões que percorrem toda a socieda<strong>de</strong>.<br />

A peculiarida<strong>de</strong> da condição da juventu<strong>de</strong> - a vivência <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong> “moratória<br />

social” – permite que o sujeito possa vivenciar experiências diferenciadas e produzir novas<br />

alternativas <strong>de</strong> vida social (FORACCHI, 1972). Essa possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> questionar está relacionada<br />

ao fato <strong>de</strong> o jovem estar em uma fase <strong>de</strong> <strong>de</strong>marcação do próprio território e <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

mais singularizada (SALEM, 1986). Essa experiência é constituída, cada vez mais, <strong>de</strong><br />

...re<strong>de</strong>s que se estabelecem nos contextos familiares, nos contextos da<br />

produção, nos contextos da cidadania, e nos contextos da mundialida<strong>de</strong><br />

concorrem para a formação <strong>de</strong> sujeitos cada vez mais imersos em<br />

processos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> complexida<strong>de</strong> social e em contato com saberes cada<br />

vez mais se apresentam como transversais (CARRANO, 2002).<br />

A potencialida<strong>de</strong> que os jovens <strong>de</strong>monstram <strong>de</strong> recusar valores e norma consi<strong>de</strong>radas<br />

fundamentais pela socieda<strong>de</strong> po<strong>de</strong> não se concretizar, ou apenas ser provisória, já que eles<br />

reivindicam o direito à provisorieda<strong>de</strong> e à reversibilida<strong>de</strong> das escolhas, assim como o direito à<br />

individualida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> mudar a própria existência (MARQUES, 1997).<br />

A idéia <strong>de</strong> que os jovens po<strong>de</strong>m optar por diversos caminhos é complementada pela noção<br />

<strong>de</strong> liminarida<strong>de</strong>. Estes jovens vivem entre códigos <strong>de</strong> regras distintas, entre a família, a escola, a<br />

organização, a atração exercida pela rua e os grupos que a povoam. Os limites que separam a<br />

11


a<strong>de</strong>são entre um modo <strong>de</strong> vida compatível com um mo<strong>de</strong>lo i<strong>de</strong>al e outro que foge às expectativas<br />

dominantes são tênues e nem sempre facilmente perceptíveis (SPOSITO, 1993).<br />

A juventu<strong>de</strong> é uma construção cultural que possui os traços da socieda<strong>de</strong> on<strong>de</strong> ela está<br />

inserida, mas cada grupo social organiza, à sua maneira, a passagem da infância para a vida<br />

adulta e, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma mesma socieda<strong>de</strong>, existem diversas formas e meios <strong>de</strong> transitar <strong>de</strong> uma<br />

condição para a outra, o que confere à idéia <strong>de</strong> juventu<strong>de</strong> uma intensa maleabilida<strong>de</strong> (FEIXA,<br />

1998).<br />

Existe diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> jovens e nem sempre essa diferenciação se encontra relacionada à<br />

condição social, ao gênero, ou à raça. Dentro <strong>de</strong> um mesmo grupo, com características<br />

socioeconômicas semelhantes, <strong>de</strong>senvolvem-se comportamentos distintos. A <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong><br />

que os jovens po<strong>de</strong>m trilhar caminhos diferentes reforça a concepção <strong>de</strong> que eles dispõem <strong>de</strong><br />

uma margem <strong>de</strong> escolha e <strong>de</strong> autonomia para traçar seus próprios <strong>de</strong>stinos. Os jovens são donos<br />

uma lógica própria, o que significa que eles são sujeitos das suas próprias ações.<br />

Estudos mais recentes da vida social valorizam sua dimensão cultural simbólica e<br />

ampliam a compreensão do espaço da reprodução social com a perspectiva da importância da<br />

significação e do imaginário social dos sujeitos. Entre os jovens e suas diversas formas<br />

simbólicas procura-se compreen<strong>de</strong>r sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural e social a partir da sua própria<br />

percepção e os sentidos que dão às suas experiências <strong>de</strong> vida. Cultura e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> são<br />

apreendidas <strong>de</strong> forma dinâmica no contexto específico <strong>de</strong> vida, por expressarem algum nível <strong>de</strong><br />

in<strong>de</strong>terminação e liberda<strong>de</strong>.<br />

Nesse sentido, a juventu<strong>de</strong> mostra diversida<strong>de</strong> e, ao mesmo tempo, <strong>de</strong>smembra-se em<br />

grupos que compartilham interesses. Sendo assim, interagem através <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

significados, atuando na esfera coletiva, <strong>de</strong>ntro do mesmo sistema <strong>de</strong> valores. Segundo VELHO<br />

(2003), nessas interações resi<strong>de</strong> um “campo <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s” alimentado pelo meio social e<br />

pelas oportunida<strong>de</strong>s e interesses <strong>de</strong> cada um. Para CARRANO (2002), o processo é influenciado<br />

pelo meio social do qual o jovem faz parte e pelas trocas que faz com o meio. Os jovens<br />

constroem seu modo <strong>de</strong> “ser jovem”. Nesse caso, <strong>de</strong>staca a noção <strong>de</strong> “juventu<strong>de</strong>s”, enfatizando a<br />

diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> “modos <strong>de</strong> ser jovens existentes”.<br />

Por outro lado, a tradição sociológica valoriza o significado cultural e político <strong>de</strong> ser<br />

jovem. Sob essa perspectiva, as gerações <strong>de</strong>veriam ser também analisadas como problema<br />

sociológico, observando-se que a representação usual sobre o inconformismo dos jovens e sua<br />

12


maior propensão à mudança <strong>de</strong>veria ser submetida à criteriosa análise, não sendo <strong>de</strong> modo algum<br />

algo somente inerente a uma fase do ciclo <strong>de</strong> vida, mas um fenômeno histórico-social.<br />

A análise sobre juventu<strong>de</strong> nos campos da antropologia, sociologia e da psicologia e nos<br />

recortes dos ciclos <strong>de</strong> vida, raça e gênero ganham maior <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> analítica quando também<br />

relacionadas à classe social. A literatura sociológica oscilou entre uma tensão entre análises que<br />

privilegiam o plano simbólico, a partir da idéia <strong>de</strong> uma condição juvenil referida a uma fase <strong>de</strong><br />

vida e análises vinculadas às condições materiais, históricas e a sua posição na estrutura<br />

socioeconômicas. Tal tensão po<strong>de</strong> ser resolvida, como sugere SPOSITO (2003), pela distinção<br />

entre “condição” (o modo como uma socieda<strong>de</strong> constitui e atribui significado a esse momento do<br />

ciclo <strong>de</strong> vida, referida a uma dimensão histórica geracional) e “situação” (revela como tal<br />

condição é vivida a partir dos diversos recortes às diferenças sociais). E nesse sentido, que a<br />

“juventu<strong>de</strong>, como toda categoria socialmente constituída, que aten<strong>de</strong> a fenômenos existentes,<br />

possui uma dimensão simbólica, mas também tem que ser analisada a partir <strong>de</strong> outras dimensões:<br />

aspectos fáticos, materiais, históricos e políticos, nos quais toda produção social se <strong>de</strong>senvolve”<br />

(MARGULIS, 1998).<br />

As gran<strong>de</strong>s diferenças <strong>de</strong> situações <strong>de</strong> vida e, em particular, da relação com o acesso à<br />

educação e a inserção no mundo produtivo, que ainda configuram na realida<strong>de</strong> brasileira,<br />

impossibilita uma análise <strong>de</strong> uma única juventu<strong>de</strong>, mas <strong>de</strong> juventu<strong>de</strong>s com recorte <strong>de</strong> classe<br />

social. As mudanças históricas trazidas pelas transformações econômicas e sociais, no mundo do<br />

trabalho, na política e na cultura produziram uma ampliação da juventu<strong>de</strong> em vários sentidos: na<br />

duração <strong>de</strong>sta etapa do ciclo <strong>de</strong> vida, na abrangência do fenômeno para vários setores sociais,<br />

incluindo os jovens trabalhadores, nos elementos constitutivos da experiência juvenil e nos<br />

conteúdos da noção socialmente estabelecida. Em <strong>de</strong>corrência, surgem muitas diferenciações nos<br />

processos <strong>de</strong> inserção social e, em particular, na educação e no trabalho.<br />

13


1.1- A Escolarização: A inclusão exclu<strong>de</strong>nte<br />

A escolarização dos jovens tem tido, no Brasil, um crescimento efetivo. Os jovens têm<br />

hoje maior acesso à escola, permanecendo nela por mais tempo. Mas a expansão quantitativa<br />

também é preenchida por reprovações sistemáticas e abandono “físico” e “espiritual” que<br />

configuram uma realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma inclusão exclu<strong>de</strong>nte.<br />

Portanto essa expansão que praticamente universalizou o acesso ao ensino fundamental<br />

tem somente 70% dos jovens que chegam ao seu término, e muitos através da EJA (Educação <strong>de</strong><br />

Jovens e Adultos). Dificulda<strong>de</strong> maior encontra-se no ensino médio no ponto <strong>de</strong> vista quantitativo<br />

e no dilema entre a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong>clarada <strong>de</strong> universalização e as condições reais para sua realização<br />

e uma <strong>de</strong>finição pedagógica mais apropriada. De qualquer maneira ampliaram, no ponto <strong>de</strong> vista<br />

do acesso, as oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> escolarização dos jovens das camadas pobres da socieda<strong>de</strong>.<br />

A educação é <strong>de</strong>fendida como direito, como bem social a ser universalizado, mas é<br />

tratada como privilégio <strong>de</strong> alguns segmentos, porque a lógica dos sistemas educacionais<br />

fundamenta-se na distribuição <strong>de</strong>sigual do capital simbólico que a escola <strong>de</strong>tém. A expansão da<br />

escola no Brasil, trazendo para o interior da instituição parcelas crescentes das classes populares,<br />

tem implicado na modificação paulatina da dinâmica institucional. A escola expan<strong>de</strong>-se<br />

per<strong>de</strong>ndo as suas próprias características, e abarcando funções cada vez mais coladas às formas<br />

tradicionais <strong>de</strong> regulação dos pobres na socieda<strong>de</strong> brasileira. A escola, no Brasil, se recusa à<br />

incorporação plena dos pobres à socieda<strong>de</strong> brasileira, através <strong>de</strong> formas <strong>de</strong> integração subalterna.<br />

Na incorporação dos jovens pobres à escola, a escola torna-se menos escola.<br />

A escola <strong>de</strong> educação básica pública assumiu, <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>gradada e preconceituosa, a<br />

inserção das camadas populares que até então excluídas da educação escolarizada, mas<br />

consolidando uma <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> oferta para os diferentes grupos sociais. Essa instituição já se<br />

consolida na literatura especializada como espaço <strong>de</strong> reprodução das classes, mas vem nos<br />

últimos tempos apresentando <strong>de</strong>safios que a posicionam como instituição fundamental também<br />

na estratégia <strong>de</strong> resistência e emancipação dos setores populares. A escola configura-se em um<br />

espaço <strong>de</strong> contradição entre os novos mecanismos <strong>de</strong> reprodução das relações sociais <strong>de</strong><br />

produção, que inclui a transformação da escola pública <strong>de</strong> educação básica em escolas para<br />

pobres, e as mudanças <strong>de</strong> condições dos trabalhadores para a superação da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> social.<br />

14


Se por um lado não há dúvida <strong>de</strong> que a escola reproduz as relações sociais <strong>de</strong> produção na<br />

perspectiva do sistema como um todo, por outro lado à questão é enten<strong>de</strong>r o papel da<br />

escolarização na luta e conquistas das pessoas e grupos no seu <strong>de</strong>senvolvimento individual e<br />

coletivo.<br />

A relação da juventu<strong>de</strong> com a educação institucionalizada tornou-se um gran<strong>de</strong> campo <strong>de</strong><br />

disputa <strong>de</strong> gerações, on<strong>de</strong> a potencialida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conquista <strong>de</strong> autonomia confronta-se com o<br />

formalismo escolar e interesses políticos e econômicos distantes do processo <strong>de</strong> aprendizagem<br />

dos jovens. Nesse sentido<br />

Existe uma dramática contradição entre jovens e escola. A escola se<br />

enfraquece num momento em que a vida social cobra a sua contribuição<br />

para a formação da cidadania responsável. As causas <strong>de</strong>sse processo<br />

po<strong>de</strong>m ser encontradas no sucateamento da instituição e na falta <strong>de</strong><br />

perspectivas <strong>de</strong> trabalho e vida futura, mas também pela interdição do<br />

diálogo entre os sentidos institucionais e as culturas da juventu<strong>de</strong>. (...) A<br />

evasão escolar, antes <strong>de</strong> se confirmar como evasão física, é também<br />

precedida por uma invisível e simbólica evasão <strong>de</strong> sentidos culturais e<br />

<strong>de</strong>sejos <strong>de</strong> presença <strong>de</strong> professores e alunos (CARRANO, 2002).<br />

Para Bourdieu, as disposições da família, sua atitu<strong>de</strong> diante da escola, a sua crença (ou<br />

não) no investimento na escola são elementos <strong>de</strong>terminantes do sucesso ou do fracasso escolar.<br />

Crença essa realimentada e reforçada pela ação da própria escola que, ao <strong>de</strong>sfavorecer os já<br />

<strong>de</strong>sfavorecidos, reforça a <strong>de</strong>sesperança e a sensação <strong>de</strong> inutilida<strong>de</strong> do investimento necessário<br />

para o prosseguimento dos estudos e para o acesso aos ramos mais privilegiados do ensino.<br />

Dessa maneira<br />

...o capital e o ethos, ao se combinarem, concorrem para <strong>de</strong>finir as<br />

condutas escolares e as atitu<strong>de</strong>s diante da escola, que constituem o<br />

principio <strong>de</strong> eliminação diferencial das crianças das diferentes classes<br />

sociais (BOURDIEU, 1998).<br />

Enquanto para as crianças <strong>de</strong> meios mais favorecidas socialmente o prosseguimento dos<br />

estudos é um fato social <strong>de</strong> provável ocorrência, as crianças dos meios populares precisam<br />

<strong>de</strong>monstrar um <strong>de</strong>sempenho excepcional para serem incentivadas, pelos pais e professores, a<br />

continuarem na escola.<br />

15


Nosso entendimento, entretanto, é <strong>de</strong> que a reprodução das relações sociais não se dá <strong>de</strong><br />

forma <strong>de</strong>terminística, mas em um cenário <strong>de</strong> disputa que possibilita a produção <strong>de</strong> novas relações<br />

sociais. A superação das dicotomias <strong>de</strong> “estruturas sem sujeito” ou <strong>de</strong> “sujeitos sem história”<br />

confere à escola, na sua configuração e proposta educacional, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> também ser<br />

<strong>de</strong>finida e constituída pelo trabalho <strong>de</strong> sujeitos que a <strong>de</strong>terminam e são por elas <strong>de</strong>terminadas. A<br />

análise da escolarização <strong>de</strong> jovens não po<strong>de</strong> prescindir das teorias da reprodução, como também<br />

da análise concreta das experiências <strong>de</strong> escolarização dos trabalhadores, <strong>de</strong> modo a compreen<strong>de</strong>r<br />

a relação dialética entre estrutura e sujeitos no processo social.<br />

Nosso <strong>de</strong>safio é enten<strong>de</strong>r as formas que, no cotidiano <strong>de</strong> jovens inseridos em <strong>programa</strong>s<br />

educativos específicos, parecem contrariar a exclusão, ou, pelo menos, que, no seu próprio ponto<br />

<strong>de</strong> vista, re<strong>de</strong>finem <strong>de</strong> forma favorável suas relações com a socieda<strong>de</strong>. Exclusão é aqui entendida<br />

como <strong>de</strong>scrição dos processos <strong>de</strong> <strong>de</strong>gradação: <strong>de</strong> relações sociais <strong>de</strong> maneira ampla, <strong>de</strong> relações<br />

referentes ao mundo do trabalho e <strong>de</strong> direitos sociais.<br />

Tudo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do ponto <strong>de</strong> vista e da distância <strong>de</strong> que se olha para o sistema escolar.<br />

Quando ele é observado sob um ponto <strong>de</strong> vista macro, global, a partir do conjunto dos dados<br />

referentes ao plano nacional, tudo parece imutável. É a imagem da reprodução que se impõe.<br />

Quando olhamos as coisas mais <strong>de</strong> perto, a imagem não é tão nítida: o sistema escolar não é<br />

homogêneo nem neutro, ele produz diversos efeitos próprios.<br />

No entanto, não se po<strong>de</strong> negar que a escola é meritocrática. Ela or<strong>de</strong>na, hierarquiza,<br />

classifica os indivíduos em função <strong>de</strong> seus méritos. Os indivíduos <strong>de</strong>vem, portanto, perceber-se<br />

como autores <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>sempenhos, como seus responsáveis. Ao contrário das socieda<strong>de</strong>s<br />

aristocráticas, que priorizavam o nascimento e não o mérito, as socieda<strong>de</strong>s, na atualida<strong>de</strong>,<br />

escolheram o mérito como um princípio essencial <strong>de</strong> justiça: a escola é justa porque cada um<br />

po<strong>de</strong> obter sucesso nela em função <strong>de</strong> seu trabalho e <strong>de</strong> suas qualida<strong>de</strong>s.<br />

Sabemos que a igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s sempre foi limitada e que, nas socieda<strong>de</strong>s<br />

mais <strong>de</strong>senvolvidas, a origem <strong>de</strong> classe continuava a pesar consi<strong>de</strong>ravelmente na orientação<br />

escolar dos alunos, nos sistemas divididos em várias escolas: a escola do povo, a escola das<br />

classes médias, a escola da burguesia, as escolas profissionais, as da cida<strong>de</strong>, as do campo, as da<br />

Igreja, as do Estado. E isso ainda ocorre na maioria dos países em <strong>de</strong>senvolvimento, on<strong>de</strong> o<br />

mérito <strong>de</strong>sempenha um papel apenas marginal para os filhos dos trabalhadores.<br />

A escola <strong>de</strong> massas visa oferecer diplomas a todos os alunos. Po<strong>de</strong>-se, então, consi<strong>de</strong>rar que<br />

16


esses diplomas tenham um valor utilitário, porque fixam o nível e as oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> emprego<br />

a que os indivíduos po<strong>de</strong>m preten<strong>de</strong>r. Consi<strong>de</strong>rar os diplomas como bens dotados <strong>de</strong> certa<br />

utilida<strong>de</strong> não diminuem em nada sua dimensão cultural. Uma das gran<strong>de</strong>s causas da injustiça<br />

provém do fato <strong>de</strong> que <strong>de</strong>terminados diplomas têm gran<strong>de</strong> utilida<strong>de</strong>, ao passo que outros não têm<br />

nenhuma, numa escola <strong>de</strong> massas on<strong>de</strong> muitos obtêm diploma. Evi<strong>de</strong>ntemente, seria uma ilusão<br />

imaginar que todos os diplomas têm a mesma utilida<strong>de</strong>, mas é preciso observar que certos<br />

diplomas não têm quase nenhuma , especialmente os que provêm <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> formação geral<br />

mais fraca, que não oferecem nem uma profissão, nem um nível <strong>de</strong> qualificação capaz <strong>de</strong> fazer<br />

diferença no mundo <strong>de</strong> trabalho. Com muita freqüência, esses cursos ven<strong>de</strong>m algum tipo <strong>de</strong><br />

ilusão e certos trabalhos sociológicos já mostraram que estudantes que os freqüentam <strong>de</strong>scobrem<br />

tardiamente, e com muita amargura, que caíram numa cilada da qualificação profissional. Os<br />

vínculos entre formação e emprego são, obviamente, extremamente complexos e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m<br />

essencialmente da situação do <strong>de</strong>senvolvimento econômico. Portanto, não seria possível acusar a<br />

escola <strong>de</strong> estar na origem do <strong>de</strong>semprego dos jovens. Todavia, isso também não significa que a<br />

escola seja totalmente isenta a este respeito. Diversas ofertas educacionais funcionam como<br />

verda<strong>de</strong>iras armadilhas, quando <strong>de</strong>svinculados da realida<strong>de</strong> do mundo do trabalho. De modo<br />

geral, os estudantes são encaminhados para cursos <strong>de</strong>sprovidos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> e utilida<strong>de</strong> social<br />

por falta <strong>de</strong> opção, alimentando a comercialização da educação como um novo e promissor<br />

produto do mercado capitalista.<br />

É preciso lembrar a relação muito particular da escola e da socieda<strong>de</strong>, estabelecida no<br />

final do século XIX, caracterizada por uma gran<strong>de</strong> distância entre aquela e a produção, e, <strong>de</strong><br />

outro, por uma forte a<strong>de</strong>quação e <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> da oferta escolar relacionada as posições <strong>de</strong><br />

classes sociais.<br />

Sabemos que a escola nasce com uma tendência acadêmica. Seus fundadores não se<br />

preocupavam com a economia e a formação profissional, tampouco os sindicatos operários ou o<br />

patronato insistiam nessa questão. A escola republicana era impelida pelo projeto <strong>de</strong> instalar uma<br />

cidadania nova e pela legitimida<strong>de</strong> das suas instituições. Esta ensinava menos a ciência que as<br />

belezas da ciência; ensinava menos a tecnologia que algumas noções elementares. O liceu<br />

burguês ficava centrado nas humanida<strong>de</strong>s e reivindicava a gratuida<strong>de</strong> do saber contra os<br />

conhecimentos diretamente úteis e produtivos. Sua é a história <strong>de</strong> uma longa resistência ao<br />

Ensino Técnico e Profissional, <strong>de</strong> um relegar esse ensino para as carreiras <strong>de</strong>svalorizadas - um<br />

17


confinamento simbólico, do qual hoje temos muita dificulda<strong>de</strong> em nos <strong>de</strong>svencilhar. Isso não<br />

significa que jamais tenha havido um <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> adaptação da formação aos empregos e às<br />

qualificações profissionais, expressa, simplesmente, que essa função permaneceu sempre<br />

marginal. Porém, a marca essencial <strong>de</strong>sse sistema era o dualismo escolar e o tipo <strong>de</strong> seleção das<br />

diversas clientelas. A escola primária acolhia as crianças do povo, e o liceu, aquelas da<br />

burguesia, ao passo que o ginásio funcionava ao mesmo tempo como uma triagem e como a<br />

escola das crianças das camadas médias. Não é diretamente a escola que realiza as gran<strong>de</strong>s<br />

operações <strong>de</strong> distribuição dos alunos, são as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais que comandam diretamente o<br />

acesso às diversas formas <strong>de</strong> ensino. Uma das conseqüências <strong>de</strong>sse sistema é que a escola<br />

aparece justa e neutra no seu funcionamento, enquanto as injustiças e as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais é<br />

que são diretamente a causa das <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s escolares. Num tal sistema, a escola intervém<br />

relativamente pouco sobre o <strong>de</strong>stino dos indivíduos, que é, antes <strong>de</strong> tudo, um <strong>de</strong>stino social, e,<br />

quando intervém, ela o faz, sobretudo segundo o mo<strong>de</strong>lo da promoção dos melhores alunos<br />

egressos do povo. Ou seja, já que é baseada num princípio <strong>de</strong> reprodução estrutural das<br />

<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais, essa instituição não aparece como um agente ativo da exclusão social. Ela<br />

simplesmente não intervém nesse domínio, ou o faz impedindo que algumas crianças do povo<br />

cumpram um <strong>de</strong>stino que lhes estava reservado pelas injustiças sociais. Não era a escola que era<br />

injusta, era antes, <strong>de</strong> tudo, a socieda<strong>de</strong>.<br />

Somos geralmente confrontados com dois pontos <strong>de</strong> vista que pontuam o <strong>de</strong>bate sobre a<br />

escola e a exclusão. Para uns, o <strong>de</strong>semprego e a precarieda<strong>de</strong> dos jovens advêm da falta <strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>quação entre formação e emprego. A escola produziria uma formação não adaptada às<br />

necessida<strong>de</strong>s da economia, fornecendo muitos diplomas <strong>de</strong> ensino geral, diplomas também<br />

responsáveis por introduzir uma rigi<strong>de</strong>z nociva ao acesso dos jovens ao emprego. Geralmente,<br />

essa argumentação se baseia em algumas idéias simples ou na i<strong>de</strong>alização do mo<strong>de</strong>lo dual<br />

alemão <strong>de</strong> formação profissional. Repousa, também, às vezes, sobre um estranho silogismo:<br />

bastaria que todos os jovens atingissem o nível <strong>de</strong> qualificação superior para que tivessem um<br />

emprego. Entretanto, as pesquisas dos últimos anos <strong>de</strong>monstram que não existe uma linearida<strong>de</strong><br />

simples entre escolarização e emprego, po<strong>de</strong>ndo, por exemplo, aumentar a taxa <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego<br />

entre os mais escolarizados por questões estruturais <strong>de</strong>correntes do processo <strong>de</strong> produção.<br />

18


Para outros o sistema educacional é totalmente isento em face da exclusão. Não somente<br />

o <strong>de</strong>semprego dos jovens é in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do sistema <strong>de</strong> formação, mas todas as dificulda<strong>de</strong>s da<br />

escola, a violência, a débil motivação dos jovens, vêm <strong>de</strong> fora, do capitalismo e do mercado. A<br />

exclusão social dos jovens <strong>de</strong>correria apenas das relações <strong>de</strong> produção.<br />

Essa dupla retórica, que acusa ora o sistema educacional, ora o sistema <strong>de</strong> produção, é<br />

também uma maneira <strong>de</strong> não tocar num problema relativamente complexo: o dos elos das<br />

relações <strong>de</strong> produção, <strong>de</strong>finidas pela produção <strong>de</strong> riquezas, e as relações <strong>de</strong> reprodução nas quais<br />

a escola distribui escalonamentos e oportunida<strong>de</strong>s. Ora, a relação entre a educação e a realida<strong>de</strong><br />

social foi profundamente transformada ao longo dos séculos, vinculando estreitamente a escola<br />

aos mecanismos <strong>de</strong> exclusão, sem fazer <strong>de</strong>la nem culpada nem isenta da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> social.<br />

1.2- I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> profissional <strong>de</strong> jovens trabalhadores.<br />

O trabalho, como uma preocupação central no imaginário, dos jovens instiga a pesquisa<br />

social ao <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r o significado da profissão na socieda<strong>de</strong> e a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

profissional do jovem trabalhador.<br />

Nesse quadro, encontra-se o dilema entre a tendência <strong>de</strong> garantir aos jovens um tempo<br />

maior <strong>de</strong> preparação na educação escolarizada, o que implica, portanto, a suspensão provisória<br />

da inserção no mundo produtivo e a necessida<strong>de</strong> concreta <strong>de</strong> trabalho dos jovens brasileiros,<br />

como meio <strong>de</strong> aquisição das condições mínimas da cidadania.<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista do trabalho, po<strong>de</strong>mos falar <strong>de</strong> distintas formas <strong>de</strong> socialização<br />

profissional relativas aos diversos grupos <strong>de</strong> jovens, diferenciados por sua origem social ou seu<br />

capital escolar. As trajetórias profissionais não são mais previsíveis e a responsabilida<strong>de</strong> da<br />

inserção no trabalho dirigida cada vez mais para o próprio jovem e seus atributos <strong>de</strong><br />

escolarização e formação. Os jovens constroem novos significados em relação ao trabalho, diante<br />

da intensida<strong>de</strong> com que foram tocados pela incerteza e o <strong>de</strong>semprego juvenil. O trabalho aparece,<br />

muitas vezes, como uma referência central entre as opiniões, atitu<strong>de</strong>s, expectativas e<br />

preocupações dos jovens, com significados diversos no imaginário juvenil, seja como valor,<br />

necessida<strong>de</strong>, direito ou mesmo como busca por autonomia familiar e po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> consumo.<br />

19


É significativa a análise da aparente contradição das expectativas teóricas <strong>de</strong> negação do<br />

valor do trabalho na socieda<strong>de</strong> e os resultados empíricos relativos à importância do trabalho,<br />

particularmente entre jovens<br />

... instigados a manifestarem-se com respeito ao significado e à<br />

importância <strong>de</strong> diferentes esferas <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> e sociabilida<strong>de</strong>, os jovens<br />

brasileiros ouvidos em pesquisa amostral realizada em 2003 não <strong>de</strong>ixam<br />

dúvidas: para eles, o trabalho não apenas ainda está na or<strong>de</strong>m do dia,<br />

como se <strong>de</strong>staca com relação a outros aspectos tidos como reveladores<br />

<strong>de</strong> interesses tipicamente juvenis (GUIMARÃES, 2005).<br />

Essa importância do trabalho se <strong>de</strong>ve, no quadro brasileiro, à <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> social<br />

existente,pois a inserção no mercado formal ou informal <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> contingente da<br />

população é precária em termos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> e níveis <strong>de</strong> remuneração. Vale dizer que, quando<br />

tratamos <strong>de</strong> jovens brasileiros, convém não suprimir um outro adjetivo imprescindível a<br />

qualificar sua especificida<strong>de</strong>: trata-se <strong>de</strong> jovens trabalhadores (GUIMARÃES, 2005) vivendo o<br />

imperativo da sobrevivência, e que, entre tantas interfaces da vida, precisam inventar “estratégias<br />

econômicas para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r-se das injustiças sociais” (TIRIBA, 2001). Estamos falando <strong>de</strong> jovens<br />

trabalhadores, concepção que, por si só, já revela perfil <strong>de</strong> classe. Essa força <strong>de</strong> trabalho, pela sua<br />

abundância, <strong>de</strong>sproteção legal e disponibilida<strong>de</strong> para tarefas que envolvem riscos, tem gran<strong>de</strong><br />

relevância para o capitalismo como fator <strong>de</strong> barateamento dos custos da produção e maximização<br />

dos lucros. O trabalho gera tensão nas relações sociais e familiares. Bem cedo, o jovem <strong>de</strong>ve ser<br />

inserido no mundo do trabalho, iniciando seu processo i<strong>de</strong>ntificatório, fora do ambiente familiar.<br />

A <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> econômica que caracteriza nosso país frustra a população, principalmente<br />

seus jovens, que precisam enfrentar a crise e inventar possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> sucesso profissional: as<br />

chances <strong>de</strong> trabalho são escassas. Assim, a educação profissional entra como uma estratégia <strong>de</strong><br />

enfrentamento da realida<strong>de</strong> on<strong>de</strong> vemos estatísticas indicativas <strong>de</strong> queda no número <strong>de</strong> postos <strong>de</strong><br />

trabalho regidos pelas leis trabalhistas, com o aumento concomitante do número <strong>de</strong> trabalhos<br />

temporários, sem direito às conquistas historicamente realizadas pelos trabalhadores. É<br />

assustador o número <strong>de</strong> famílias que retiram sua sobrevivência do trabalho informal.<br />

A precarieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> emprego entre os jovens leva muitos <strong>de</strong>les a utilizarem estratégias cuja<br />

singularida<strong>de</strong> abala os modos tradicionais <strong>de</strong> entrada na vida ativa. Não querem ser escravos do<br />

20


trabalho, mas também não o rejeitam, tanto como fonte <strong>de</strong> rendimentos como <strong>de</strong> realização<br />

pessoal.<br />

A estabilida<strong>de</strong> das relações trabalhistas e a proteção social ten<strong>de</strong> a <strong>de</strong>cair, mesmo nos<br />

países mais <strong>de</strong>senvolvidos, e não atinge o vasto contingente populacional, embora o consumo se<br />

universalize na proporção inversa. Milhares <strong>de</strong> jovens do meio urbano encontram como<br />

alternativa o mercado ilícito, ou irregular. A busca pelo emprego é uma trajetória não-linear e<br />

aci<strong>de</strong>ntada <strong>de</strong> ganchos, tachos e biscates 1 (PAIS, 2001).<br />

Nesse aspecto, a realida<strong>de</strong> é, ao mesmo tempo, sombria e animadora. Sombria, pela<br />

presença constante da ineficácia da Escola em produzir perspectivas, na precarieda<strong>de</strong> e<br />

perversida<strong>de</strong> das relações <strong>de</strong> trabalho e emprego. O fio <strong>de</strong> esperança aparece justamente refletido<br />

na gran<strong>de</strong> energia inventiva dos jovens em batalhar por i<strong>de</strong>ais que quase sempre são incertos ou<br />

inexistentes, ou na luta pela própria sobrevivência (PAIS, 2001).<br />

O futuro é incerto, visto que construído em trajetórias não-lineares, complexas e caóticas.<br />

O passado torna-se futuro, porque só está acessível no presente e é apenas no presente que<br />

po<strong>de</strong>mos planejar o futuro. Nesta tarefa <strong>de</strong> temporalizar está também a <strong>de</strong> espacializar. A não-<br />

linearida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>sespero para alguns, mas também implica liberda<strong>de</strong> e esperança.<br />

Estudar a juventu<strong>de</strong> e suas estratégias <strong>de</strong> sobrevivência envolve projetar cenários<br />

complexos, assim como, porém, dar visibilida<strong>de</strong> a modos <strong>de</strong> existência que se territorializam e<br />

permitem que políticas públicas possam ser elaboradas com mais consistência e insistência. A<br />

questão que surge é como esses indivíduos <strong>de</strong>senvolvem suas i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s no contexto<br />

globalizado, tão farto <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s quanto <strong>de</strong> difícil realização <strong>de</strong> projetos? Os cientistas<br />

sociais apontam que essas re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relações atravessam o mundo da família, do bairro, dos<br />

grupos <strong>de</strong> status, etnias e classes sociais. Vêem-se nesses grupos, combinações e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s<br />

particulares individualizados.<br />

Em conseqüência da precarieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> oferta <strong>de</strong> trabalho fixo, da competitivida<strong>de</strong> e do<br />

<strong>de</strong>semprego, o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> sucesso estabelecido pelos sistemas educacionais é colocado em<br />

1 Ganchos e biscates são termos que se usa no sentido equivalente, traduzindo o exercício das<br />

ativida<strong>de</strong>s profissionais <strong>de</strong> caráter precário ou secundário.<br />

21


xeque. Em lugar do trabalho fixo, os jovens encontram trabalhos provisórios, informais como<br />

estratégias <strong>de</strong> sobrevivência. Assim, a vida social se organiza num processo que acompanha um<br />

crescimento dos mecanismos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sestruturação institucional.<br />

Alguns jovens inclinam-se a negar a realida<strong>de</strong> através <strong>de</strong> projeções utópicas e alguns se<br />

sentem perdidos em relação às escolhas que precisam fazer e às <strong>de</strong>cisões em relação ao trabalho.<br />

Dentro do que i<strong>de</strong>alizam como saída, encontram obstáculos e muitos se <strong>de</strong>sencantam. Outros<br />

ainda acreditam na escola e sua proposta <strong>de</strong> inserção social e alguns a concretizam. Este processo<br />

estabelece o jogo da vida, ora <strong>de</strong> encontros, ora <strong>de</strong> <strong>de</strong>sencontros, seguindo <strong>de</strong> um lugar para o<br />

outro, refazendo sonhos e projetos.<br />

As estruturas sociais atuais motivam os jovens à inconstância, às flutuações em suas<br />

vidas; saem da casa dos pais, retornam, abandonam os estudos, trabalham, per<strong>de</strong>m o trabalho, se<br />

casam, se separam, nada parece certo. Assistimos a esses momentos oscilatórios que fazem parte<br />

do cotidiano <strong>de</strong> todos, principalmente dos indivíduos mais jovens. Diversos são os fatores que<br />

contribuem para essa oscilação, pois os jovens <strong>de</strong>senvolvem uma espécie <strong>de</strong> tributo à<br />

extravagância e à boêmia, chocando a socieda<strong>de</strong> e ao mesmo tempo realizando suas<br />

experimentações.<br />

A característica que marca fortemente a juventu<strong>de</strong> é a experimentação. É um <strong>de</strong> seus<br />

traços característicos a vivência <strong>de</strong> diversas e intensas experiências, fundamental para o processo<br />

<strong>de</strong> constituição da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, sendo concebida como relação social permeada pelo auto-<br />

reconhecimento e pelo heteroreconhecimento, o que só é possível por meio da experiência grupal<br />

(DAYRELL, 1999).<br />

As gerações mais velhas procuram orientar os jovens para o cotidiano da rotina e para a<br />

busca <strong>de</strong> segurança, enquanto os jovens escolhem, muitas vezes, os caminhos e os valores da<br />

ruptura. Trata-se <strong>de</strong> um tempo <strong>de</strong> experimentações e um momento favorável à formação <strong>de</strong><br />

agregações juvenis.<br />

Diante <strong>de</strong> todas as incertezas e instabilida<strong>de</strong>s do tempo contemporâneo, alguns jovens<br />

buscam, em seu tempo livre, fugir <strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong>, compensando em aventuras e sonhos nem<br />

sempre realizáveis. O cotidiano juvenil freqüentemente se apresenta como um tempo à <strong>de</strong>riva,<br />

com imprevisíveis rotas incertas, não necessariamente passivas., A rotina é quebrada por outras<br />

22


experiências vividas e, <strong>de</strong>ssas rupturas, emergem os valores <strong>de</strong>sses jovens. Dessa forma, a vida é<br />

vivida com riscos, investimentos, criativida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>svios, que levam o jovem à conquista <strong>de</strong> sua<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. Outros, por motivos individuais ou a influência das famílias, insistem em apostar na<br />

escola e na aquisição <strong>de</strong> conhecimentos como estratégia <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento pessoal e coletivo.<br />

Na medida em que o indivíduo se <strong>de</strong>staca e é cada vez mais sujeito, muda o caráter <strong>de</strong><br />

sua relação com as instituições. Novas formas <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> serão elaboradas, acompanhando<br />

os paradigmas emergentes. Coexistem nas socieda<strong>de</strong>s mo<strong>de</strong>rnas diferentes configurações <strong>de</strong><br />

valores e diferentes estilos <strong>de</strong> vida, on<strong>de</strong> predominam as i<strong>de</strong>ologias individualistas que fazem<br />

com que a trajetória do indivíduo passe a ter um importante significado. Outras socieda<strong>de</strong>s<br />

subordinam as pessoas a unida<strong>de</strong>s “englobantes e hierarquizantes” (VELHO, 2003). O indivíduo<br />

está exposto a múltiplas experiências contraditórias que po<strong>de</strong>m ser fragmentadoras <strong>de</strong>sta mesma<br />

experiência e da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>.<br />

A noção <strong>de</strong> projeto é vista como uma conduta organizada para atingir <strong>de</strong>terminado fim,<br />

po<strong>de</strong>ndo ser uma proposta individual, <strong>de</strong> um grupo ou uma categoria. Por esse prisma, a noção<br />

<strong>de</strong> projeto está associada à idéia <strong>de</strong> indivíduo-sujeito ou, visto por outro ângulo, o indivíduo-<br />

sujeito é aquele que faz projetos. A memória fornece indicadores ao indivíduo <strong>de</strong> um passado<br />

que produziu as circunstâncias do presente, sem a consciência das quais não seria possível<br />

elaborar projetos. Essas circunstâncias envolvem valores, preconceitos e emoções. Logo, o<br />

projeto e a memória associam-se e articulam-se ao dar significado à vida e às ações dos<br />

indivíduos, ou seja, à própria i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. Na constituição da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> social dos indivíduos nas<br />

socieda<strong>de</strong>s, a memória e o projeto são indispensáveis.<br />

Na compreensão da trajetória do sujeito social:<br />

...a memória permite uma visão retrospectiva mais ou menos organizada<br />

<strong>de</strong> uma trajetória e biografia, o projeto é a antecipação no futuro <strong>de</strong>ssa<br />

trajetória e biografia, na medida em que busca, através do<br />

estabelecimento <strong>de</strong> objetivos e fins, a organização dos meios através dos<br />

quais esses padrões são atingidos (VELHO, 2003).<br />

Como <strong>de</strong>sejamos enfatizar, projeto e memória articulam-se ao dar significado à vida, às<br />

ações dos indivíduos e à própria i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. São visões “retrospectivas” e “prospectivas” que<br />

23


compõem a trajetória <strong>de</strong> cada um. O projeto é dinâmico e está sempre em reelaboração, dando<br />

sentido e significado à vida e, repercutindo na construção e reconstrução da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>.<br />

Os planos da realização <strong>de</strong> projetos voltados para o trabalho e sua associação com a<br />

escolarização são cada vez mais reduzidos e <strong>de</strong> difícil previsibilida<strong>de</strong>. Entretanto, eles ainda<br />

retratam, <strong>de</strong> forma significativa, o imaginário social das famílias das camadas populares.<br />

Os projetos <strong>de</strong> vida que os jovens i<strong>de</strong>alizam abrem portas a um vazio temporal <strong>de</strong><br />

enchimento adiado. Projetos em <strong>de</strong>scoincidência com trajetos <strong>de</strong> vida. Em contrapartida, o<br />

presente enche-se <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s múltiplas, <strong>de</strong> diferentes experiências e <strong>de</strong>sejos profissionais.<br />

Por outro lado, a noção <strong>de</strong> profissão em uma população cuja característica é a alternância<br />

entre a ocupação e não ocupação precisa ser entendida nos seus diferentes aspectos envolvidos<br />

no processo <strong>de</strong> profissionalização. Compreen<strong>de</strong>r como se reproduzem e se transformam as<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s sociais implica elucidar os processos <strong>de</strong> socialização pelos quais elas se constroem e<br />

se reconstroem ao longo da vida. A dimensão profissional das i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s adquire uma<br />

importância particular. Ao se tornar um bem raro, o emprego condiciona a construção das<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s sociais; e, <strong>de</strong>vido a suas gran<strong>de</strong>s mudanças, o trabalho obriga a transformações<br />

i<strong>de</strong>ntitárias <strong>de</strong>licadas; porque acompanha, cada vez mais, as evoluções do trabalho e do emprego,<br />

a formação intervém nessas esferas i<strong>de</strong>ntitárias por muito tempo além do período escolar.<br />

(DUBAR, 2005)<br />

A profissão <strong>de</strong> um indivíduo é aqui <strong>de</strong>finida como o reconhecimento social dos saberes<br />

que ele adquiriu na esfera da formação, bem como dos serviços ou produtos que ele é capaz <strong>de</strong><br />

oferecer, reconhecimento esse conferido através <strong>de</strong> sua inserção no mercado <strong>de</strong> trabalho, em uma<br />

posição correspon<strong>de</strong>nte ao conhecimento adquirido. Da forma como é aqui entendida, profissão<br />

envolve: (a) correspondência entre a posição ocupada no mercado <strong>de</strong> trabalho e os<br />

conhecimentos adquiridos na esfera da formação (que po<strong>de</strong> se realizar no próprio trabalho); (b)<br />

reconhecimento da valida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses dois elementos – conhecimento e valor social dos serviços –<br />

por parte da socieda<strong>de</strong>, através da inserção <strong>de</strong>sse indivíduo no mercado <strong>de</strong> trabalho. Esse<br />

reconhecimento envolve remuneração e direitos correspon<strong>de</strong>ntes a essa posição ocupada, o que<br />

quer dizer que a inserção automaticamente dá acesso a um estatuto. Por outro lado, esse<br />

reconhecimento diz respeito ao profissional e não à profissão. Ou seja, mesmo que <strong>de</strong>terminada<br />

ativida<strong>de</strong> seja validada socialmente, a aquisição <strong>de</strong> um conhecimento e o valor social do mesmo<br />

24


não po<strong>de</strong>m ser verificados em abstrato, mas vinculam-se ao indivíduo que é supostamente<br />

portador <strong>de</strong>ssa profissão.<br />

Estreitamente ligado ao reconhecimento social da utilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada<br />

ativida<strong>de</strong>, e do conhecimento nele embutido, está o reconhecimento <strong>de</strong> ambos pelo sujeito que é<br />

<strong>de</strong>les o portador. Esse reconhecimento implica a sua i<strong>de</strong>ntificação com a ativida<strong>de</strong> que<br />

<strong>de</strong>sempenha, e é o que faz com que o indivíduo queira nela permanecer, ou ao contrário, na<br />

ausência <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação com ela, queira <strong>de</strong>sempenhar uma outra ativida<strong>de</strong>, ou seja, ter uma<br />

“nova profissão” nos horizontes que ele se coloca, face aos recursos por ele acumulados em<br />

<strong>de</strong>terminado momento <strong>de</strong> sua trajetória. Está em jogo, portanto, a i<strong>de</strong>ntificação do sujeito com<br />

uma profissão, dada pela articulação daquilo que o sujeito possui – os recursos <strong>de</strong> sua trajetória -<br />

e <strong>de</strong>seja para si – seus projetos futuros – com o reconhecimento e o lugar que a socieda<strong>de</strong> lhe<br />

reserva no mundo do trabalho. Assim como o reconhecimento por parte da socieda<strong>de</strong>, o<br />

reconhecimento por parte do indivíduo envolve, também, <strong>de</strong> forma articulada, tanto aspectos<br />

objetivos – como uma remuneração aceita como satisfatória pelo portador da profissão e direitos<br />

provenientes da posição, quanto aspectos subjetivos – gostar <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenhar a ativida<strong>de</strong>, por<br />

exemplo.<br />

O termo profissionalização está sendo aqui empregado não como o processo pelo qual<br />

uma ocupação torna-se uma profissão, como <strong>de</strong> maneira geral é consi<strong>de</strong>rado na sociologia das<br />

profissões, mas referindo-se a indivíduos, no sentido do ato <strong>de</strong> tornar-se um profissional.<br />

Significa o processo pelo qual o indivíduo constitui sua profissionalida<strong>de</strong>, ou seja, ocupa um<br />

lugar no “espaço profissional”. Como corolário da <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> profissão adotada, enten<strong>de</strong>-se<br />

que a profissionalização não se realiza apenas na formação, porém se completa com a inserção<br />

no trabalho, por um lado, porque o conhecimento necessita da prática para se efetivar; por outro,<br />

porque é com a inserção no trabalho que se concretizam as relações profissionais.<br />

Cumpre esclarecer que a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> profissionalização não <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ra a importância<br />

da formação profissional e, para os pro<strong>pós</strong>itos <strong>de</strong>ste trabalho, cabe lembrar que um sistema <strong>de</strong><br />

formação, se bem estruturado, po<strong>de</strong> funcionar ele mesmo como uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> articulação com a<br />

inserção. Também não se <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ra que na noção <strong>de</strong> formação encontra-se presente, em parte<br />

a <strong>de</strong> profissionalização, no sentido que lhe dá Ramos:<br />

Sob a ótica econômica, profissionalizar as pessoas significa formar os<br />

sujeitos para viverem do produto <strong>de</strong> seu trabalho, ocupando um lugar na<br />

25


divisão social e técnica do trabalho. Sob a ótica sociológica, essa<br />

inserção <strong>de</strong>senvolve no sujeito uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> sócio-profissional que se<br />

objetiva por meio do trabalho remunerado e pelo compartilhamento <strong>de</strong><br />

regras socialmente pactuadas. Sob a ótica ético-política, profissionalizar<br />

implica fazer interiorizar esse conjunto <strong>de</strong> regras que instalam o ato<br />

profissional, como uma troca entre uma contribuição social <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong><br />

e uma remuneração, <strong>de</strong>stacando um valor <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m social que supera o<br />

valor <strong>de</strong> mercado (RAMOS, 2001, p. 240).<br />

26


Capítulo II<br />

A EDUCAÇÃO TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO: SUBORDINAÇÃO AO<br />

CAPITAL E EMANCIPAÇÃO DOS JOVENS TRABALHADORES.<br />

A relação entre a educação e o trabalho tem sido estudada sob diversos enfoques e<br />

posicionamentos dos mais diversos e antagônicos. Em geral, há um esforço intelectual para<br />

articular e integrar o mundo da educação e do trabalho. Essa busca baseia-se, geralmente, no<br />

pressuposto <strong>de</strong> que é à educação que cabe acomodar-se a uma situação do trabalho. Se aceita,<br />

tacitamente, afirma-se o <strong>de</strong>terminismo econômico e a impossibilida<strong>de</strong> dos seres humanos<br />

implementarem uma nova realida<strong>de</strong> no mundo <strong>de</strong> trabalho; em vez disso, são os valores,<br />

atitu<strong>de</strong>s, expectativas, escolhas e habilida<strong>de</strong>s dos sujeitos que <strong>de</strong>vem adaptar-se.<br />

No entanto, a relação entre escola e trabalho é dialética, composta <strong>de</strong> uma tensão entre<br />

duas dinâmicas: os imperativos do modo <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> uma dada socieda<strong>de</strong> e os sujeitos que<br />

querem configurar suas aspirações com uma relativa autonomia. A luta <strong>de</strong> forças e diferentes<br />

interesses constituem a chave para compreen<strong>de</strong>r as mudanças na economia, nas relações sociais e<br />

na cultura. No modo <strong>de</strong> produção capitalista, as tentativas da burguesia <strong>de</strong> reproduzir as relações<br />

<strong>de</strong> produção e a divisão do trabalho opõem-se às reivindicações <strong>de</strong> questões mais gerais ou<br />

específicas <strong>de</strong> atendimento as diversas concepções e necessida<strong>de</strong>s da população.<br />

A escola po<strong>de</strong> reproduzir as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais apesar <strong>de</strong> sua expansão estar associada<br />

à luta da classe trabalhadora por mais igualda<strong>de</strong> e mobilida<strong>de</strong> social. O capitalismo, como nos<br />

diz LETTIERI (1980), não recusa o direito à escola. Ao contrário, ele precisa <strong>de</strong>la, não só por<br />

razões i<strong>de</strong>ológicas, mas por razões econômicas, porque precisa recusar o direito ao trabalho <strong>de</strong><br />

muitos que não estivessem na escola e não teriam outra escolha senão o <strong>de</strong>semprego. Portanto,<br />

não recusa o direito à escola, mas recusa-se a mudar a função social da escola.<br />

No conceito <strong>de</strong> hegemonia e contra-hegemonia a escola reproduz as classes, mas ao<br />

mesmo tempo, ela sofre a resistência das lutas dos jovens pertencentes à classe trabalhadora.<br />

Essa contra-hegemonia ou resistência fundamenta-se em movimentos sociais e políticos que<br />

ocorrem fora da escola.<br />

27


O sistema educacional não é só um instrumento da classe dominante, mas um produto do<br />

conflito dos interesses <strong>de</strong> classes. Por um lado, a escola é parte do aparelho do Estado,<br />

contribuindo para a reprodução da estrutura <strong>de</strong> classes por meio da distribuição <strong>de</strong> jovens pelas<br />

variadas funções da força <strong>de</strong> trabalho, com base em suas qualificações educacionais e a<br />

reprodução das relações por meio da transmissão i<strong>de</strong>ológica dos valores dominantes. Por outro, a<br />

escola é utilizada como estratégia das pessoas em superar as suas condições sócio-econômicas<br />

mais precárias <strong>de</strong> vida, como também a aquisição do conhecimento e busca <strong>de</strong> formação.<br />

2.1- Trabalho como práxis humana e alienação<br />

Ao trabalho, freqüentemente associado ao esforço manual e físico, acabou se agregando<br />

a idéia <strong>de</strong> sofrimento, <strong>de</strong>vido sua origem etimológica associada ao “tripalium”, instrumento<br />

usado para tortura na ida<strong>de</strong> média.<br />

Todavia, o que <strong>de</strong>fine a realida<strong>de</strong> humana é o trabalho. O homem se constitui como tal à<br />

medida que necessita produzir continuamente a sua existência. Trabalhar não é outra coisa senão<br />

agir sobre a natureza e transformá-la. Essa ação transformadora sobre a natureza, por parte do ser<br />

humano, é guiada por objetivos, antecipando mentalmente o que vai fazer.<br />

O trabalho po<strong>de</strong> ser compreendido pelo conceito <strong>de</strong> auto-realização. A evolução do ser<br />

humano em toda a história caracteriza-se pela luta do homem contra a natureza. Em certo ponto<br />

da história, o ser humano terá <strong>de</strong>senvolvido as forças produtivas da natureza a tal ponto que o<br />

antagonismo entre ele e a natureza po<strong>de</strong>rá ser, finalmente, solucionado.<br />

O trabalho é um ato <strong>de</strong> autocriação do ser humano. O trabalho é uma ativida<strong>de</strong> e não uma<br />

mercadoria. O trabalho é uma expressão própria do ser humano, uma expressão <strong>de</strong> suas<br />

faculda<strong>de</strong>s físicas e mentais. Nesse processo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> genuína, o ser humano <strong>de</strong>senvolve a si<br />

mesmo, torna-se ele próprio; o trabalho não é só um meio para um fim - o produto -, mas um fim<br />

em si mesmo, a expressão significativa da energia humana; por isso, po<strong>de</strong>-se gostar do trabalho.<br />

A crítica central feita ao capitalismo não é a injustiça na distribuição da riqueza; é a perversão do<br />

trabalho, convertendo-o em trabalho forçado, alienado, sem sentido. O conceito do trabalho<br />

como expressão da individualida<strong>de</strong> do ser humano é expresso sucintamente em sua visão da<br />

abolição completa da sujeição do homem a vida inteira a uma única ocupação. Visto que a meta<br />

28


do <strong>de</strong>senvolvimento humano é a do <strong>de</strong>senvolvimento do homem total e universal, o ser humano<br />

tem que ser emancipado da influência mutiladora da especialização.<br />

Neste sentido enten<strong>de</strong>mos que aqui<br />

... está a compreensão do trabalho no seu duplo sentido: a) ontológico,<br />

como práxis humana e, então, como a forma pela qual o homem produz<br />

sua própria existência na relação com a natureza e com os outros<br />

homens e, assim, produz conhecimentos; b) histórico, que no sistema<br />

capitalista, se transforma em trabalho assalariado ou fator econômico,<br />

forma específica da produção da existência humana sob o capitalismo;<br />

portanto, como categoria econômica e práxis produtiva que, baseadas em<br />

conhecimentos existentes, produzem novos conhecimentos (RAMOS,<br />

2004).<br />

O conceito do ser humano ativo e produtivo, que compreen<strong>de</strong> e controla o mundo<br />

objetivo com suas próprias faculda<strong>de</strong>s, não po<strong>de</strong> ser compreendido sem o conceito da negação da<br />

produtivida<strong>de</strong>: a alienação. A alienação significa que o ser humano não se vivencia como agente<br />

ativo do seu controle sobre o mundo, mas que o mundo permanece alheio ou estranho a ele.<br />

Alienar-se é vivenciar o mundo e a si próprio passivamente, receptivamente, como o sujeito<br />

separado do objeto.<br />

Com a expansão da proprieda<strong>de</strong> privada e da divisão do trabalho, todavia, o trabalho<br />

per<strong>de</strong> sua característica <strong>de</strong> expressão do po<strong>de</strong>r do ser humano. O trabalho e seu produto assumem<br />

uma existência à parte do homem, <strong>de</strong> sua vonta<strong>de</strong> e <strong>de</strong> seu planejamento. O trabalho é alienado,<br />

porque trabalhar <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> fazer parte da natureza do trabalhador. Assim, no ato <strong>de</strong> produzir, a<br />

relação do trabalhador com sua própria ativida<strong>de</strong> é vivenciada como algo alheio e não<br />

pertencente a ele. No capitalismo, o trabalho humano se afasta <strong>de</strong> suas próprias faculda<strong>de</strong>s<br />

criadoras e os objetos <strong>de</strong> seu trabalho tornam-se seres estranhos.<br />

Historicamente, sob as condições <strong>de</strong> produção capitalistas que se <strong>de</strong>senvolveram a partir<br />

do advento da manufatura, o trabalho passa a assumir características notadamente novas para o<br />

trabalhador, quais sejam: a fragmentação e parcelarização do processo <strong>de</strong> trabalho, a perda do<br />

controle da produção; a separação entre concepção e execução; a expropriação do produto do<br />

trabalhador; a instalação da relação salarial em que foi possível ampliar a extração da mais-valia,<br />

29


em que no valor da mercadoria produzida estava embutida toda a mão-<strong>de</strong>-obra do trabalhador e<br />

que, por sua vez, era subtraída na hora <strong>de</strong> receber pelo seu trabalho. Ao trabalhador era dado<br />

participar do processo da execução na produção <strong>de</strong> bens e mercadorias.<br />

No processo <strong>de</strong> acumulação capitalista, que teve acentuado seus contornos a<strong>pós</strong> a<br />

revolução burguesa <strong>de</strong> fins do século XVIII e o advento da maquinaria – enquanto uso, abuso e<br />

expulsão da mão-<strong>de</strong>-obra <strong>de</strong> contingentes <strong>de</strong> trabalhadores, expulsão esta fortemente agravada a<br />

partir do século XIX, o trabalho assume formas que distanciam o homem <strong>de</strong> suas reais<br />

potencialida<strong>de</strong>s.<br />

Em suma, o trabalho que é ação dirigida com o fim <strong>de</strong> criar bens úteis,<br />

valores <strong>de</strong> uso, forma <strong>de</strong> apropriar-se dos elementos da natureza para<br />

satisfazer necessida<strong>de</strong>s humanas, condição do intercâmbio entre homens<br />

e natureza, condição do próprio <strong>de</strong>vir humano – aparece sob a<br />

<strong>de</strong>terminação social e histórica <strong>de</strong> trabalho abstrato, um trabalho<br />

separado dos sujeitos – força <strong>de</strong> trabalho, mercadoria (FRIGOTTO,<br />

1983).<br />

2.2 A Educação no Estado capitalista: re<strong>de</strong> dual <strong>de</strong> escolarização<br />

A questão continua sendo a das <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s produzidas pelo capital, a marca da<br />

<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> nossos dias, a <strong>de</strong>gradação contínua das condições <strong>de</strong> vida para a maior parte da<br />

população.<br />

O capitalismo, na verda<strong>de</strong> <strong>de</strong>senraiza e brutaliza a todos, exclui a todos.<br />

Na socieda<strong>de</strong> capitalista essa é a regra estruturante: todos nós, em vários<br />

momentos <strong>de</strong> nossa vida, e <strong>de</strong> diferentes modos, dolorosos ou não,<br />

fomos <strong>de</strong>senraizados e excluídos. É própria <strong>de</strong>ssa lógica <strong>de</strong> exclusão, a<br />

inclusão. A socieda<strong>de</strong> capitalista <strong>de</strong>senraiza, exclui, para incluir, <strong>de</strong><br />

outro modo, segundo suas próprias regras, segundo sua própria lógica<br />

(MARTINS, 1997).<br />

30


A exclusão seria o efeito mais perverso dos processos <strong>de</strong> inclusão subordinada dos<br />

países latino-americanos nos “núcleos globalizados” do capitalismo mundial, e que, para isso,<br />

abrem mão da integração <strong>de</strong> uma parcela significativa <strong>de</strong> sua população.<br />

... países como os nossos, com <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s abismais entre as várias<br />

classes sociais, esse tipo <strong>de</strong> política transforma-se em exclusão (...)<br />

(...) “A diferença, expressada com eloqüência por ninguém menos do<br />

que o presi<strong>de</strong>nte F. H. Cardoso é <strong>de</strong> que não se preten<strong>de</strong> (e ele diz que<br />

não se po<strong>de</strong>) mais integrá-los, mesmo que seja através das clivagens<br />

reificadas pelo processo <strong>de</strong> acumulação. Ele criou o neologismo<br />

“inempregáveis” para nomear os que, na nova or<strong>de</strong>m globalizada em que<br />

o país se insere, não terão nenhuma vez (OLIVEIRA, 1998, p.213/214).<br />

Diversos autores analisam as transformações atuais – reestruturação produtiva,<br />

acumulação flexível, políticas neoliberais, entre outras - como uma resposta às crises do<br />

capitalismo, e vêem nelas um esforço <strong>de</strong>ste regime em manter seu ritmo <strong>de</strong> acumulação.<br />

Consoante com essas premissas, <strong>de</strong>bruçam-se sobre o curso do padrão <strong>de</strong> acumulação taylorista-<br />

fordista e i<strong>de</strong>ntificam seu esgotamento como mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> acumulação <strong>de</strong> capital. E, nesse esforço<br />

<strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r a trajetória do capitalismo, o fordismo, com seus esquemas rígidos <strong>de</strong> produção<br />

e gerenciamento, já não respondia, em especial a partir da década <strong>de</strong> 1970, às <strong>de</strong>mandas que<br />

vinham sendo postas em jogo. Dessa forma, gesta-se um novo mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> acumulação que vai se<br />

chamar <strong>de</strong> “flexível”, <strong>de</strong>screvendo-o como marcado por um confronto direto com a rigi<strong>de</strong>z do<br />

fordismo. A acumulação flexível se apóia na flexibilida<strong>de</strong> dos processos <strong>de</strong> trabalho, dos<br />

mercados <strong>de</strong> trabalho, dos produtos e padrões <strong>de</strong> consumo. Caracteriza-se pelo surgimento <strong>de</strong><br />

setores <strong>de</strong> produção inteiramente novos, novas maneiras <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> serviços financeiros,<br />

novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas <strong>de</strong> inovação comercial, tecnológica<br />

e organizacional. Se, <strong>de</strong> um lado, as inovações e transformações atingem diferentemente as<br />

regiões geográficas do globo, criando abismos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento e provocando conseqüências<br />

nada igualitárias para os que se encontram à margem das benesses do capitalismo, por outro,<br />

<strong>de</strong>ntro das regiões “<strong>de</strong>sprivilegiadas”, emergem e consolidam-se profundas <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s.<br />

31


A partir <strong>de</strong>sse contexto, cabe apontar a situação da classe trabalhadora, em especial<br />

amplos setores populares que apresentam severas dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> sobrevivência. Na tentativa <strong>de</strong><br />

apagar incêndios causados pelo próprio ritmo <strong>de</strong> acumulação, surgem as políticas<br />

compensatórias <strong>de</strong> alívio da pobreza, que seriam um “pronto-socorro social” para tentar “reparar<br />

as rupturas do tecido social” (CASTEL,1997). O <strong>de</strong>semprego atinge a todos <strong>de</strong> uma maneira<br />

geral, e o Estado não dá conta (tampouco o quer o capital) das <strong>de</strong>mandas dos trabalhadores por<br />

postos <strong>de</strong> trabalho, melhores condições <strong>de</strong> trabalho e salários dignos.<br />

O <strong>de</strong>senvolvimento do capitalismo industrial transforma e re<strong>de</strong>fine posições na<br />

socieda<strong>de</strong>, a emergente vitória da burguesia é responsável pelo progresso técnico. Com isso,<br />

houve necessida<strong>de</strong> e exigência social <strong>de</strong> mudanças radicais nos rumos da escola. A disciplina<br />

científica adquire importância em <strong>de</strong>trimento dos conteúdos clássicos e literários, que satisfaziam<br />

a nobreza pelo caráter diferenciador na aquisição cultural. A escola se mo<strong>de</strong>rniza para aten<strong>de</strong>r os<br />

interesses da burguesia, que percebe a necessida<strong>de</strong> da instrução da massa trabalhadora para<br />

dinamizar o processo industrial. A necessária re<strong>de</strong>finição dos objetivos educacionais apoiados no<br />

discurso liberal cria a escola popular. A dominação persistia na coexistência <strong>de</strong> dois tipos <strong>de</strong><br />

escola, a burguesia seguia um caminho à parte garantindo a continuida<strong>de</strong> dos estudos, enquanto à<br />

classe trabalhadora era assegurada, em parte, a sua educação. As re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> escolarização pública e<br />

privada representam mecanismos diferenciadores para servir a grupos diferentes <strong>de</strong>ntro da<br />

socieda<strong>de</strong>.<br />

Nesse sentido, a teoria da reprodução enten<strong>de</strong> que a escola é o aparelho i<strong>de</strong>ológico<br />

responsável pela incultação da i<strong>de</strong>ologia dominante sobre a base <strong>de</strong> formação da força <strong>de</strong><br />

trabalho. Para esta teoria, a escola no capitalismo não é a única, nem unificadora, mas constituída<br />

pela unida<strong>de</strong> contraditória <strong>de</strong> duas re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> escolarização: a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação dos trabalhadores<br />

manuais e a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação dos trabalhadores intelectuais. A escola, como aparelho i<strong>de</strong>ológico<br />

do estado, substitui a noção da escola como sistema e é o instrumento encarregado <strong>de</strong> assegurar a<br />

dominação da i<strong>de</strong>ologia dominante.<br />

De acordo com essa concepção, a estrutura da escola capitalista é uma estrutura dual,<br />

para cuja apreensão é preciso colocar-se do ponto <strong>de</strong> vista daqueles que a escola exclui. A<br />

repetência, o abandono, a produção do retardo escolar são mecanismos <strong>de</strong> funcionamento da<br />

escola e que fazem parte mesmo <strong>de</strong> suas características. Seus <strong>de</strong>feitos e fracassos são, em<br />

verda<strong>de</strong>, a realida<strong>de</strong> necessária para seu funcionamento.<br />

32


Como modo <strong>de</strong> produção mais elástica e adaptável da historia da civilização o<br />

capitalismo gerou a globalização econômica e um mercado sem fronteiras. Na estagnação da<br />

produção <strong>de</strong> bens materiais, busca a transformação da educação em mercadoria e, por outro lado,<br />

precisa legitimar seus pressupostos <strong>de</strong> acumulação, assim, portanto, utilizando ainda a escola<br />

como instrumento i<strong>de</strong>ológico e controle social.<br />

A escola reproduz as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais apesar <strong>de</strong> sua expansão<br />

associada à luta da classe trabalhadora por maior igualda<strong>de</strong> e mobilida<strong>de</strong><br />

social “. Raramente as escolas inovam <strong>de</strong> modo in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte das<br />

relações sociais <strong>de</strong> produção, mas as alteram rapidamente quando os<br />

movimentos sociais contestam essas relações. Porque é justamente esta a<br />

capacida<strong>de</strong> da escola capitalista: a <strong>de</strong> disciplinar o aluno para aceitá-las e<br />

não para socializar o conhecimento, como o <strong>de</strong>monstra Braverman. Na<br />

escola capitalista apren<strong>de</strong>-se a respeitar a autorida<strong>de</strong>, a aten<strong>de</strong>r às<br />

palavras <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m. Uns são preparados para governar e outros para<br />

obe<strong>de</strong>cer (função classista da escola). Mas ela também está em crise,<br />

crise esta diretamente relacionada com a própria crise nas relações <strong>de</strong><br />

produção.<br />

O capitalismo, como diz Antonio Lettieri, não recusa o direito à escola.<br />

Ao contrario, ele precisa <strong>de</strong>la, não só por razões i<strong>de</strong>ológicas, mas por<br />

razões econômicas, porque precisa recusar o direito ao trabalho <strong>de</strong><br />

muitos que não estivessem na escola não teriam outra escolha senão o<br />

<strong>de</strong>semprego ou o exército. Portanto, não recusa o direito à escola, mas<br />

recusa-se a mudar a função social da escola (GADOTTI, 1987).<br />

A socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna, que centraliza as exigências do conhecimento sistematizado, é<br />

marcada por uma contradição. Como se trata <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> alicerçada na proprieda<strong>de</strong><br />

privada dos meios <strong>de</strong> produção, a maximização dos recursos produtivos do homem realiza-se em<br />

benefícios dos proprietários dos meios <strong>de</strong> produção, em <strong>de</strong>trimento da gran<strong>de</strong> maioria <strong>de</strong><br />

trabalhadores que possuem apenas sua força <strong>de</strong> trabalho. Na socieda<strong>de</strong> capitalista, a ciência é<br />

incorporada ao trabalho produtivo, convertendo-se em potência material. O conhecimento se<br />

converte em força produtiva e, portanto, em meio <strong>de</strong> produção. No entanto, os trabalhadores não<br />

po<strong>de</strong>m ser expropriados <strong>de</strong> forma absoluta dos conhecimentos, porque, sem conhecimento, eles<br />

não po<strong>de</strong>m produzir e, se eles não trabalham, não acrescentam valor ao capital. Desse modo, o<br />

capitalismo <strong>de</strong>senvolveu mecanismos através dos quais procura expropriar o conhecimento dos<br />

trabalhadores e distribuí-lo <strong>de</strong> forma parcelada.<br />

33


O taylorismo é a expressão <strong>de</strong>ssa contradição. Taylor partiu da observação dos<br />

conhecimentos sobre o trabalho produzido pelos trabalhadores , uma vez sistematizado, o<br />

conhecimento passa a ser proprieda<strong>de</strong> privada dos donos dos meios <strong>de</strong> produção, ou <strong>de</strong> seus<br />

representantes. Esse mesmo conhecimento é <strong>de</strong>volvido aos trabalhadores; porém, na forma<br />

parcelada e controlada. Os trabalhadores têm <strong>de</strong> dominar um conjunto mínimo <strong>de</strong> conhecimentos<br />

necessários para serem eficientes no processo produtivo, mas não <strong>de</strong>vem ultrapassar este limite.<br />

Nesse quadro é que se <strong>de</strong>limita a concepção <strong>de</strong> profissionalização, <strong>de</strong> ensino<br />

profissionalizante no capitalismo: a fragmentação do trabalho em especialida<strong>de</strong>s autônomas. Tal<br />

concepção implica a divisão entre os que concebem e controlam o processo <strong>de</strong> trabalho e aqueles<br />

que o executam. O ensino profissional é <strong>de</strong>stinado aos que <strong>de</strong>vem executar, ao passo que o<br />

ensino científico - intelectual é reservado àqueles que <strong>de</strong>vem conceber e controlar o processo.<br />

Para jovens oriundos das classes trabalhadoras, o lugar na esfera produtiva <strong>de</strong>ve começar<br />

bem cedo em virtu<strong>de</strong> dos imperativos <strong>de</strong> sobrevivência e composição da renda familiar. A forma<br />

<strong>de</strong>ssa inserção no mundo do trabalho segue as <strong>de</strong>lineações <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte da classe trabalhadora<br />

no momento atual: uma escola que, calcada na subordinação ao mercado <strong>de</strong> trabalho, prepara os<br />

jovens para um emprego incerto, pois a não-oferta <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho move contingentes <strong>de</strong><br />

jovens para variadas formas trabalho, entre eles o chamado assalariado formal, com ou sem a<br />

garantia <strong>de</strong> direitos trabalhistas, para assim gerir a sobrevivência.<br />

2.3 A Politecnia no Ensino Médio<br />

Especificamente o Ensino Médio, no Brasil, tem-se constituído ao longo da história da<br />

educação brasileira como o nível <strong>de</strong> mais difícil enfrentamento, em termos <strong>de</strong> sua concepção,<br />

estrutura e formas <strong>de</strong> organização, em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> sua própria natureza <strong>de</strong> mediação e a<br />

particularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r a juventu<strong>de</strong>.<br />

Sua ambigüida<strong>de</strong> confere a dupla função <strong>de</strong> preparar para a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos e ao<br />

mesmo tempo para o mundo do trabalho, produzida <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadas relações sociais e,<br />

em particular, no projeto capitalista <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>.<br />

A noção <strong>de</strong> politecnia postula que o processo <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong>senvolva, em uma unida<strong>de</strong><br />

indissolúvel, os aspectos manuais e intelectuais. Um pressuposto é que o trabalho humano<br />

34


envolve conjuntamente o exercício das mãos e da mente. A separação <strong>de</strong>ssas funções é produto<br />

histórico-social construído particularmente nas socieda<strong>de</strong>s capitalistas.<br />

A união entre trabalho intelectual e trabalho manual só po<strong>de</strong>rá se realizar com a<br />

superação da proprieda<strong>de</strong> privada dos meios <strong>de</strong> produção, colocando todo o processo produtivo a<br />

serviço da coletivida<strong>de</strong>, do conjunto da socieda<strong>de</strong>. Na medida em que o processo <strong>de</strong> trabalho,<br />

historicamente, liberta os homens do jugo da natureza, do trabalho braçal, transferindo-o<br />

progressivamente para as máquinas, não ocorre nada mais do que um <strong>de</strong>senvolvimento do<br />

próprio controle da natureza pelo homem. As máquinas não são outras coisas senão energia<br />

natural que o homem controla. Ao construir máquinas, o homem usa a energia da natureza para<br />

vencer obstáculos que ele antes tinha <strong>de</strong> vencer com a energia dos próprios músculos, do próprio<br />

corpo.<br />

Quando transfere para as máquinas gran<strong>de</strong> parte do trabalho socialmente necessário, o<br />

homem liberta tempo para o seu usufruto. O trabalho intelectual, ao mesmo tempo em que<br />

resulta em um crescimento material- que por sua vez, repercute no trabalho intelectual-,<br />

disponibiliza mais tempo para o ser humano.<br />

No entanto, tal processo, na socieda<strong>de</strong> capitalista, é marcado por uma distorção: os frutos<br />

<strong>de</strong>sse processo são apropriados privadamente, o que faz com que o usufruto <strong>de</strong> tempo livre só<br />

exista para uma pequena parcela da humanida<strong>de</strong>, ao passo que os trabalhadores, em que pese o<br />

crescimento da riqueza social, são urgidos a prosseguir em um processo <strong>de</strong> trabalho forçado. A<br />

superação <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> é que viabiliza as condições para que todos possam <strong>de</strong>dicar-se,<br />

ao mesmo tempo, ao trabalho intelectual e ao trabalho manual. A idéia <strong>de</strong> politecnia se esboça<br />

nesse contexto, ou seja, a partir do <strong>de</strong>senvolvimento atingido pela humanida<strong>de</strong> no nível da<br />

socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna, da socieda<strong>de</strong> capitalista, já <strong>de</strong>tectando a tendência do <strong>de</strong>senvolvimento para<br />

outro tipo <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> que corrija as distorções atuais.<br />

A noção <strong>de</strong> politecnia diz respeito ao domínio dos fundamentos científicos das diferentes<br />

técnicas que caracterizam o processo <strong>de</strong> trabalho mo<strong>de</strong>rno. Está relacionada aos fundamentos das<br />

diferentes modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho e tem como base <strong>de</strong>terminados princípios, <strong>de</strong>terminados<br />

fundamentos, que <strong>de</strong>vem ser garantidos pela formação. Supõe-se que, dominando esses<br />

fundamentos o trabalhador esteja em condições <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver as diferentes modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

trabalho, com a compreensão <strong>de</strong> sua essência. Não se trata <strong>de</strong> um trabalhador a<strong>de</strong>strado para<br />

executar com perfeição <strong>de</strong>terminada tarefa e que se encaixe no mercado <strong>de</strong> trabalho para<br />

35


<strong>de</strong>senvolver aquele tipo <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>. Diferentemente, trata-se <strong>de</strong> propiciar-lhe um<br />

<strong>de</strong>senvolvimento multilateral, um <strong>de</strong>senvolvimento que abarque todos os ângulos da prática<br />

produtiva, na medida em que ele domina aqueles princípios que estão na base da organização da<br />

produção mo<strong>de</strong>rna. O conceito <strong>de</strong> politecnia implica a união entre escola e trabalho, ou entre<br />

instrução intelectual e trabalho produtivo.<br />

A superação da re<strong>de</strong> dual <strong>de</strong> educação, através da implementação da escola única,<br />

reverte-se <strong>de</strong> importância singular para a questão cultural e educacional. Somente a reivindicação<br />

<strong>de</strong> mais educação para os trabalhadores não é suficiente, mas também a luta por uma escola <strong>de</strong><br />

tipo completamente novo, vinculado às perspectivas <strong>de</strong> transformação social.<br />

A marca social é dada pelo fato <strong>de</strong> que cada grupo social tem um tipo <strong>de</strong><br />

escola próprio, <strong>de</strong>stinado a perpetuar nestes grupos uma <strong>de</strong>terminada<br />

função tradicional, diretiva ou instrumental. Se quiser <strong>de</strong>struir esta<br />

trama, portanto, <strong>de</strong>ve-se evitar a multiplicação e <strong>graduação</strong> dos tipos <strong>de</strong><br />

escola profissional, criando-se, ao contrario, um tipo único <strong>de</strong> escola<br />

preparatória (elementar-média) que conduza o jovem ate os umbrais da<br />

escolha profissional, formando-o entrementes como pessoa capaz <strong>de</strong><br />

pensar, <strong>de</strong> estudar, <strong>de</strong> dirigir ou <strong>de</strong> controlar quem dirige.(...) escola<br />

única inicial <strong>de</strong> cultura geral, humanista, formativa, que equilibre<br />

equanimemente o <strong>de</strong>senvolvimento da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhar<br />

manualmente (tecnicamente, industrialmente) e o <strong>de</strong>senvolvimento das<br />

capacida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho intelectual. Deste tipo <strong>de</strong> escola única, através<br />

<strong>de</strong> repetidas experiências <strong>de</strong> orientação profissional, passar-se-á a uma<br />

das escolas especializadas ou ao trabalho produtivo (GRAMSCI, 1968).<br />

2.4 A Educação Profissional Técnica <strong>de</strong> nível Médio no Brasil<br />

A formação profissional envolve um vínculo com o contexto maior da educação e<br />

representa um conjunto <strong>de</strong> significados, circunscrito aos caminhos históricos percorridos por<br />

nossa socieda<strong>de</strong>. Várias são as expressões que tentam, através da história, imprimir significado<br />

<strong>de</strong> estágios formativos relacionados mais estreitamente com o trabalho: qualificação profissional,<br />

formação profissional, ensino industrial ou técnico-profissional, educação profissional, educação<br />

técnica, educação politécnica e educação tecnológica. Os referidos termos ganham novos<br />

36


significados, na disputa <strong>de</strong> interesses <strong>de</strong> classe, que levam em conta a reorganização dos<br />

processos produtivos e novas concepções do âmbito educacional.<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista da educação, a formação profissional po<strong>de</strong> ser tratada sob dupla<br />

perspectiva: formação profissional na concepção <strong>de</strong> educação continuada para a readaptação,<br />

reciclagem e aperfeiçoamento permanente “imediatamente” vinculada ao mundo do trabalho e<br />

formação profissional na concepção da educação técnica, política e cultural da força <strong>de</strong> trabalho<br />

na perspectiva do <strong>de</strong>senvolvimento pessoal e social “mediatamente” vinculada ao mundo do<br />

trabalho.<br />

Na primeira perspectiva, assumimos o conceito <strong>de</strong> “Qualificação profissional” como um<br />

conjunto <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s educacionais que se situam no embate direto da relação capital-trabalho e,<br />

portanto, na fronteira <strong>de</strong> articulação da educação com as políticas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />

econômico local e <strong>de</strong> geração <strong>de</strong> renda, o que resulta em relação assalariada, <strong>de</strong> empreen<strong>de</strong>dores<br />

individuais e solidários (imediatamente vinculada ao mundo do trabalho). Na segunda<br />

perspectiva, adotamos o conceito <strong>de</strong> “Educação Tecnológica” como aquela que, em consonância<br />

com o avanço do conhecimento científico e tecnológico e aparecimento das ativida<strong>de</strong>s mais<br />

complexas, incorpora à educação escolarizada a cultura técnica e busca a integração da ciência,<br />

tecnologia, cultura e trabalho (mediatamente vinculada ao mundo do trabalho). Ao<br />

conceituarmos Educação Tecnológica, expressamos a formação humana numa dimensão<br />

multilateral, com foco centrado no conhecimento da técnica e sua relação com a ciência e a<br />

cultura geral e a qualificação profissional, nas necessida<strong>de</strong>s dos trabalhadores inseridos no<br />

processo produtivo <strong>de</strong> um modo <strong>de</strong> produção. A Educação Tecnológica <strong>de</strong>safia a escola a fazer<br />

da cultura técnica um verda<strong>de</strong>iro componente da formação geral. Por outro lado, a cultura geral<br />

passa a pressupor a vinculação estrita da ciência com a prática, o reconhecimento do<br />

anacronismo da dicotomia entre humanismo e tecnologia e da separação entre a formação teórica<br />

geral e formação técnica instrumental. Em essência a Educação Tecnológica não representa<br />

nenhum nível ou modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> educação, mas uma dimensão fundamental da realida<strong>de</strong><br />

contemporânea da socieda<strong>de</strong> a ser inserida no processo formativo, uma qualida<strong>de</strong> do processo<br />

educacional como um todo e, especificamente, <strong>de</strong> cada nível <strong>de</strong> ensino em sua complexida<strong>de</strong><br />

própria.<br />

A “Educação Tecnológica” se fundamenta na centralida<strong>de</strong> na educação do sujeito e<br />

normalmente escolarizada e a “Qualificação Profissional” no processo <strong>de</strong> relação imediata com a<br />

37


produção econômica, normalmente no espaço mais amplo da socieda<strong>de</strong>. A necessária e <strong>de</strong>sejada<br />

aproximação entre estas duas realida<strong>de</strong>s formativas - Educação Tecnológica e Qualificação<br />

Profissional - não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> somente da implantação imediata da integração e articulação <strong>de</strong><br />

<strong>programa</strong>s “i<strong>de</strong>alizados” por pessoas, grupos ou setores, mas da realida<strong>de</strong> <strong>de</strong>correntes das<br />

mudanças estruturais e o nível <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento da socieda<strong>de</strong>. Portanto, o estágio da<br />

socieda<strong>de</strong> capitalista exige ainda atuação e políticas diferenciadas e articuladas para a Educação<br />

Tecnológica e a Qualificação Profissional. A confusão entre a natureza da Educação Tecnológica<br />

e da Qualificação profissional gerou as tendências e contradições da historia legislação<br />

educacional profissional brasileira, em particular, para o Ensino Técnico.<br />

O Ensino Técnico como prática educativa se insere <strong>de</strong> forma diferenciada, <strong>de</strong> acordo<br />

com os momentos históricos e a política vigente, adquirindo a natureza ora da educação<br />

tecnológica, ora da natureza <strong>de</strong> Qualificação Profissional. Nesse sentido, o Ensino Técnico é uma<br />

oferta educativa que representa, historicamente, no âmbito da educação, uma questão<br />

contraditória e com ambigüida<strong>de</strong>s entre a Qualificação Profissional e a educação propriamente<br />

dita. Observa-se, curiosamente, que na sua relação com o Ensino Médio (secundário) dá-se uma<br />

disputa permanente entre orientações profissionalizantes e/ou acadêmicas, entre objetivos<br />

propedêuticos e econômicos.<br />

Na década <strong>de</strong> sessenta, estimulados pelo disposto no artigo 100 da Lei Fe<strong>de</strong>ral n.º<br />

4.024/61, uma série <strong>de</strong> experimentos educacionais, orientados para a profissionalização <strong>de</strong><br />

jovens, foi implantada no território nacional, tais como o GOT (Ginásios Orientados para o<br />

Trabalho) e o PREMEN (Programa <strong>de</strong> Expansão e Melhoria do Ensino). A Lei Fe<strong>de</strong>ral n.º<br />

5.692/71, que reformulou a Lei Fe<strong>de</strong>ral n.º 4.024/61 no tocante ao então ensino <strong>de</strong> primeiro e<br />

segundo graus, também representa um capítulo marcante na história da Educação Profissional, ao<br />

generalizar a profissionalização no Ensino Médio, então <strong>de</strong>nominado segundo grau. Gran<strong>de</strong> parte<br />

do quadro atual da Educação Profissional po<strong>de</strong> ser explicada pelos efeitos <strong>de</strong>ssa lei. Nesse<br />

quadro não po<strong>de</strong>m ser ignoradas as centenas e centenas <strong>de</strong> cursos ou classes profissionalizantes<br />

sem investimentos apropriados e perdidos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um segundo grau supostamente único.<br />

Dentre seus efeitos vale <strong>de</strong>stacar: a introdução generalizada do Ensino Profissional no segundo<br />

grau, que se fez sem a preocupação <strong>de</strong> preservar a carga horária <strong>de</strong>stinada à formação <strong>de</strong> base; o<br />

<strong>de</strong>smantelamento, em gran<strong>de</strong> parte, das re<strong>de</strong>s públicas <strong>de</strong> Ensino Técnico então existentes, assim<br />

como a <strong>de</strong>scaracterização das re<strong>de</strong>s do ensino secundário e normal mantidas por estados e<br />

38


municípios; a criação <strong>de</strong> uma falsa imagem da formação profissional como solução para os<br />

problemas <strong>de</strong> emprego, possibilitando, assim, a criação <strong>de</strong> muitos cursos mais por imposição<br />

legal e motivação político-eleitoral que por <strong>de</strong>mandas reais da socieda<strong>de</strong>. A Educação<br />

Profissional <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser limitada às instituições especializadas. A responsabilida<strong>de</strong> da oferta<br />

ficou difusa e recaiu também sobre os sistemas <strong>de</strong> ensino público estaduais, os quais estavam às<br />

voltas com a <strong>de</strong>terioração acelerada que o crescimento quantitativo do primeiro grau impunha às<br />

condições <strong>de</strong> funcionamento das escolas. Isso não interferiu diretamente na qualida<strong>de</strong> da<br />

Educação Profissional das instituições especializadas, mas sim nos sistemas públicos <strong>de</strong> ensino,<br />

que não receberam o necessário apoio para oferecer um Ensino Profissional <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong><br />

compatível com as exigências <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento do país. Esse novo quadro, que conjugava a<br />

visível expansão industrial com um discurso oficial que não podia ser contestado, por estar o país<br />

no auge da repressão política, começa a atrair a classe média para as escolas técnicas fe<strong>de</strong>rais, já<br />

que estas eram as únicas preparadas para oferecer o ensino profissionalizante <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início da<br />

vigência da nova lei, pois já o faziam havia décadas.<br />

As Leis nºs 5.540/68 e 5.692/71, promulgadas num cenário marcado por pressões das<br />

camadas médias por educação, representariam uma estratégia governamental no sentido <strong>de</strong><br />

conter a forte <strong>de</strong>manda por ensino superior. Nesse sentido, a Lei nº 5.692/71, em nome da<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> técnicos <strong>de</strong> nível médio, atribui ao ensino <strong>de</strong> 2º grau um caráter <strong>de</strong><br />

profissionalização compulsória, mas na realida<strong>de</strong> teria outro objetivo oculto em que:<br />

...seria a função manifesta da reforma do ensino <strong>de</strong> 2 º grau aten<strong>de</strong>r a um<br />

mercado <strong>de</strong> trabalho carente <strong>de</strong> profissionais <strong>de</strong> nível técnico e a função<br />

não manifesta direcionar para esse mercado uma parcela do contingente<br />

<strong>de</strong> jovens que pressionavam por mais vagas nas Universida<strong>de</strong>s públicas,<br />

eximindo o governo <strong>de</strong> maiores investimentos nas mesmas (CUNHA,<br />

1998).<br />

Convém ainda salientar que as reformas educacionais dos anos 70 tiveram inspiração<br />

na teoria do capital humano, que creditava à educação o po<strong>de</strong>r quase mágico <strong>de</strong> favorecer o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento das nações e a ascensão social dos indivíduos. Essa teoria, surgida nos Estados<br />

Unidos e Inglaterra, nos anos 60, e no Brasil, nos anos 70, foi estruturada no âmbito das teorias<br />

do <strong>de</strong>senvolvimento ou i<strong>de</strong>ologia <strong>de</strong>senvolvimentista do <strong>pós</strong>-guerra, como parte da estratégia <strong>de</strong><br />

39


hegemonia americana. Sistematicamente criticada por educadores e economistas, a teoria do<br />

capital humano influenciou a própria prática educativa. Esta, à guisa <strong>de</strong> obter resultados mais<br />

imediatistas, passou a pautar-se por uma pedagogia fundamentada nos princípios da<br />

racionalida<strong>de</strong> e da eficiência que regem a lógica do mercado, dando ao trabalho escolar um<br />

caráter acentuadamente tecnicista, que se materializava em propostas fechadas, restritas a uma<br />

aprendizagem para o saber fazer. Esta política educacional expressa na Lei n o 5.692/71 tem a<br />

marca da racionalização imposta pelo governo militar <strong>pós</strong>-64. Os pressupostos para a<br />

implantação da profissionalização compulsória em nível médio foram rapidamente sendo<br />

<strong>de</strong>smentidos.<br />

Contudo, o objetivo <strong>de</strong> profissionalização universal e compulsória atribuído ao ensino<br />

<strong>de</strong> 2º grau não apenas <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r aos pro<strong>pós</strong>itos estratégicos da Lei nº 5692/71, como<br />

também acentuou a crise <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> característica <strong>de</strong>sse nível <strong>de</strong> ensino. As resistências à<br />

medida foram generalizadas. Houve resistência por parte dos alunos, por não aceitarem <strong>de</strong> bom<br />

grado o acréscimo <strong>de</strong> disciplinas profissionalizantes em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outras que, segundo<br />

supunham, fossem necessitar no exame vestibular; resistiram os proprietários <strong>de</strong> escolas<br />

privadas, pelo acréscimo <strong>de</strong> custos que isso representava; e os empresários mostraram-se avessos<br />

a receber estagiários em nome da preservação da rotina <strong>de</strong> produção. Já os professores,<br />

especialmente das escolas técnicas fe<strong>de</strong>rais, temiam pela <strong>de</strong>svalorização do Ensino Técnico que<br />

ofereciam, em função <strong>de</strong> outras ofertas <strong>de</strong>scomprometidas com a qualida<strong>de</strong> que sempre<br />

caracterizou tais escolas (CUNHA, 1998). Essas circunstâncias teriam contribuído para a<br />

<strong>de</strong>sorganização das escolas públicas <strong>de</strong> 2º grau, tornando seus currículos um amontoado <strong>de</strong><br />

disciplinas sem unida<strong>de</strong>. Desse modo, o ensino <strong>de</strong> 2º grau já não garantia uma base sólida <strong>de</strong><br />

conhecimentos gerais, o que, além <strong>de</strong> comprometer o tão criticado caráter propedêutico <strong>de</strong>sse<br />

nível <strong>de</strong> ensino, não lhe outorgava o status <strong>de</strong> nível a<strong>de</strong>quado à profissionalização.<br />

As escolas resistiram à implantação da nova legislação, tanto pela tradição daquelas que<br />

mantinham a formação propedêutica voltada à preparação para a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos em<br />

nível superior, quanto pela dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> conseguir profissionais do ensino para as áreas<br />

específicas <strong>de</strong> formação profissional, <strong>de</strong> adquirir material necessário às ativida<strong>de</strong>s práticas e <strong>de</strong><br />

promover as a<strong>de</strong>quações materiais (laboratórios, oficinas, equipamentos) e curriculares.<br />

40


Esses efeitos foram atenuados pela modificação trazida pela Lei Fe<strong>de</strong>ral n.º 7.044/82, <strong>de</strong><br />

conseqüências ambíguas, que tornou facultativa a profissionalização no ensino <strong>de</strong> segundo grau.<br />

Se, por um lado, tornou esse nível <strong>de</strong> ensino livre das amarras da profissionalização, por outro,<br />

praticamente restringiu a formação profissional às instituições especializadas. Muito rapidamente<br />

as escolas <strong>de</strong> segundo grau reverteram suas “gra<strong>de</strong>s curriculares” e passaram a oferecer apenas o<br />

ensino acadêmico, às vezes acompanhado <strong>de</strong> um arremedo <strong>de</strong> profissionalização. Enfim, a Lei<br />

Fe<strong>de</strong>ral n.º 5.692/71, conquanto modificada pela <strong>de</strong> n.º 7.044/82, gerou falsas expectativas<br />

relacionadas com a Educação Profissional ao se difundirem, caoticamente, habilitações<br />

profissionais <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um ensino <strong>de</strong> segundo grau sem i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> própria, mantido<br />

clan<strong>de</strong>stinamente na estrutura <strong>de</strong> um primeiro grau agigantado.<br />

Com a substituição da qualificação para o trabalho, que ensejava a<br />

aquisição obrigatória <strong>de</strong> uma profissão, pela preparação para o trabalho,<br />

voltou-se ao ponto <strong>de</strong> partida em situação pior do que no momento da<br />

largada. As escolas públicas <strong>de</strong> 2 º grau foram <strong>de</strong>sorganizadas, seus<br />

currículos transformaram-se num amontoado <strong>de</strong> disciplinas sem<br />

unida<strong>de</strong>. As escolas técnicas sofreram especialmente com esse<br />

<strong>de</strong>sacerto, pois, por conseguirem manter um ensino <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong>,<br />

viram-se procuradas por levas <strong>de</strong> estudantes que pouco ou nenhum<br />

interesse tinha por seus cursos profissionais. Desorganizado o ensino<br />

público <strong>de</strong> caráter geral nas escolas públicas <strong>de</strong> 2 º grau das re<strong>de</strong>s<br />

estaduais, e <strong>de</strong>terioradas sua qualida<strong>de</strong>, esses estudantes viam nas<br />

escolas técnicas industriais a única maneira <strong>de</strong> terem acesso a um ensino<br />

gratuito <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong>, que lhes propiciava uma a<strong>de</strong>quada preparação<br />

para os exames vestibulares aos cursos superiores (CUNHA, 1998).<br />

A Lei n o 7.044/82 veio para legalizar uma situação <strong>de</strong> fato: a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

universalizar a profissionalização no Ensino Médio, em uma socieda<strong>de</strong> em que muito da<br />

ativida<strong>de</strong> educacional é norteada pela busca do lucro financeiro (privado) ou pela economia <strong>de</strong><br />

investimentos (públicos). A nova orientação, <strong>de</strong>ixando a critério <strong>de</strong> cada escola ou sistema <strong>de</strong><br />

ensino <strong>de</strong>finir o tipo <strong>de</strong> formação oferecida, talvez pela imposição da fórmula anterior, promoveu<br />

um refluxo para a situação anterior à Lei n o 5.692/71, reforçando a dualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nossa educação,<br />

que, por sua vez, reflete a estrutura da socieda<strong>de</strong> brasileira, a qual separa trabalhadores<br />

intelectuais e trabalhadores manuais e lhes <strong>de</strong>stina diferentes formas e quantida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> educação.<br />

41


A partir <strong>de</strong>sta época a re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> <strong>de</strong> Educação Profissional vai constituindo, em seu<br />

interior, uma mudança conceitual e prática da Educação Técnica, em uma perspectiva <strong>de</strong><br />

superação da dualida<strong>de</strong> e das dicotomias existentes entre a educação propedêutica e a<br />

profissional. Registra-se a introdução e fortalecimento do termo Educação Tecnológica, que,<br />

além <strong>de</strong> inserir-se na Educação Superior, no Ensino Técnico buscava preservar o caráter <strong>de</strong><br />

preparação <strong>de</strong> profissionais <strong>de</strong> nível médio para o mundo do trabalho, com uma forte<br />

característica <strong>de</strong> integração do conhecimento técnico com a cultura geral.<br />

A Educação Tecnológica então surgida buscava superar a relação estreita e unilateral<br />

com o mercado <strong>de</strong> trabalho, para assumir um processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque no cenário educacional, social<br />

e econômico. Supera-se a concepção <strong>de</strong> uma escola para o pobre e a outra para o rico, induzindo<br />

as instituições a assumirem um caráter universalista e com publico diversificado. O <strong>de</strong>staque<br />

<strong>de</strong>ssa evolução se materializa inicialmente na Lei 6545/78, que transforma as Escolas Técnicas<br />

fe<strong>de</strong>rais do Rio <strong>de</strong> Janeiro, do Paraná e Minas gerais em Centros Fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong> Educação<br />

Tecnológica. Nas Instituições Fe<strong>de</strong>rais, CEFET’s e Escolas Técnicas, inicia-se um vertiginoso<br />

processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> um projeto pedagógico que, efetivamente, caminhava para a<br />

superação do dualismo entre a cultura tecnológica e cultura humanística, com reflexo direto nas<br />

relações com a população e com o próprio <strong>de</strong>senvolvimento sócio-econômico local.<br />

Estimulados pelos ares dos movimentos que engendraram a abertura política, os anos 80<br />

foram marcados por um conjunto <strong>de</strong> medidas educacionais não estruturais, mas levadas a termo<br />

em experiências localizadas em diferentes regiões do país. Aglutinadas em torno da <strong>de</strong>fesa do<br />

ensino público <strong>de</strong> boa qualida<strong>de</strong> e da <strong>de</strong>mocratização da educação, essas experiências voltavam-<br />

se para a educação <strong>de</strong> crianças e jovens das camadas populares, com ênfase na participação dos<br />

próprios interessados e das direções das escolas.<br />

A re<strong>de</strong>mocratização da socieda<strong>de</strong> brasileira, a partir <strong>de</strong> 1985, fez surgir um movimento<br />

<strong>de</strong> revisão <strong>de</strong> suas instituições e leis, que resultaram na Assembléia Nacional Constituinte eleita<br />

em 1986. A Constituição Fe<strong>de</strong>ral, promulgada em cinco <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1988, trouxe mudanças<br />

nos direitos civis, entre eles o da educação, mas não fez as reformas no sistema educacional para<br />

a<strong>de</strong>quá-lo ao cumprimento dos preceitos constitucionais, o que cabe a uma legislação ordinária.<br />

Nesse sentido, ainda em 1987, começou a ser elaborada <strong>de</strong> forma participativa, pela<br />

socieda<strong>de</strong> organizada, a proposta para a nova Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da Educação Nacional<br />

42


(LDB). Entre elas surgiram propostas da politecnia no Ensino Médio, que a incorporavam na<br />

Educação Tecnológica e propostas diversas e contraditórias <strong>de</strong> formação profissional. As forças<br />

conservadoras presentes no Congresso Nacional, porém, conseguiram retardar a aprovação <strong>de</strong>ssa<br />

Lei e, quando tiveram a conjuntura política favorável, apresentaram um outro projeto, <strong>de</strong> caráter<br />

<strong>de</strong>sregulamentador, <strong>de</strong>ntro do espírito neoliberal que passou a dominar o estado brasileiro, a<br />

partir <strong>de</strong> 1990.<br />

O Projeto <strong>de</strong> Lei nº 1258, <strong>de</strong> 1988, do <strong>de</strong>putado Otávio Elísio, nem sequer se reportou à<br />

Educação Profissional, como modalida<strong>de</strong> da educação escolar. Já o Substitutivo Jorge Hage,<br />

prescreveu, no seu capítulo 16, a existência <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> específica e da formação profissional.<br />

Nessa perspectiva também se posicionou o Projeto <strong>de</strong> Lei da Câmara, nº 101, <strong>de</strong> 1993, no<br />

capítulo XI, com a <strong>de</strong>nominação “Da formação técnico-profissional” e a constituição <strong>de</strong> uma<br />

re<strong>de</strong> própria. A <strong>de</strong>nominação educação profissional só aparece no Substitutivo Cid Sabóia, no<br />

Senado Fe<strong>de</strong>ral, mas manteve as mesmas características do ensino técnico existente no País. O<br />

Projeto <strong>de</strong> Lei do senador Darcy Ribeiro, apresentado como alternativa ao projeto em tramitação<br />

na Câmara dos Deputados, no capítulo VII (Da formação técnico-profissional), propôs também<br />

que essa modalida<strong>de</strong> da educação escolar fosse oferecida fora dos sistemas <strong>de</strong> ensino.<br />

A partir <strong>de</strong> 1994, ocorre um movimento <strong>de</strong> retrocesso na concepção da Educação<br />

Tecnológica e na expansão e <strong>de</strong>senvolvimento da re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong>. No Governo <strong>de</strong> Fernando<br />

Henrique Cardoso, a Educação Profissional sofreu uma alteração conceitual abrangente e<br />

“aparentemente” inserida ao sistema regular, porém consolidando maior contradição e<br />

antagonismo no interior do sistema. De fato, o objetivo parece ser <strong>de</strong> <strong>de</strong>squalificar o Ensino<br />

Técnico e impedir sua possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> articulação integrada com o Ensino Médio para formação<br />

da juventu<strong>de</strong> na direção da politecnia. A re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> <strong>de</strong> Educação Tecnológica foi vista como<br />

uma ameaça na perspectiva do governo e, portanto, sofreu uma forte tentativa <strong>de</strong> <strong>de</strong>smonte e<br />

mudança <strong>de</strong> finalida<strong>de</strong> das instituições.<br />

Antes mesmo <strong>de</strong> promulgada a nova LDB, a Lei n o 9.394, em 20 <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1996, o<br />

Ministério da Educação encaminhou ao Congresso Nacional um Projeto <strong>de</strong> Lei, que tomou o<br />

número 1.603/96, separando o Ensino Médio do Ensino Técnico. Em essência, a proposta do<br />

MEC passava a <strong>de</strong>nominar o ensino <strong>de</strong> 2 º grau <strong>de</strong> Ensino Médio, como na LDB em tramitação, e<br />

o tornava unicamente <strong>de</strong> formação geral. Estabelecia a modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Educação Profissional, a<br />

43


qual seria dividida em três níveis: Básico - <strong>de</strong>stinado à qualificação e requalificação básicas <strong>de</strong><br />

trabalhadores sem escolarida<strong>de</strong> prévia; Técnico - <strong>de</strong>stinado a oferecer habilitação a alunos<br />

matriculados ou egressos <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> nível médio, e Tecnológico, que seriam cursos <strong>de</strong> nível<br />

superior na área tecnológica, <strong>de</strong>stinados a egressos <strong>de</strong> cursos médio e técnico.<br />

Pela proposta, o Ensino Técnico seria constituído <strong>de</strong> forma in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e a ele po<strong>de</strong>ria<br />

ter acesso quem estivesse cursando o Ensino Médio ou quem já o tivesse concluído. Os cursos<br />

técnicos seriam estruturados, preferencialmente, sob a forma <strong>de</strong> módulos, constituídos estes por<br />

um conjunto <strong>de</strong> disciplinas ou conteúdos articulados e com caráter <strong>de</strong> terminalida<strong>de</strong>, para efeito<br />

<strong>de</strong> qualificação profissional, dando direito a um Certificado <strong>de</strong> Qualificação. A quem concluísse<br />

um conjunto <strong>de</strong> módulos que compõem um dado curso, seria conferida a Habilitação <strong>de</strong> Nível<br />

Técnico. Os módulos po<strong>de</strong>riam ser cursados em diferentes instituições, num prazo máximo <strong>de</strong><br />

cinco anos entre a conclusão do primeiro e do último, cabendo ao estabelecimento <strong>de</strong> ensino<br />

on<strong>de</strong> foi cursado o último módulo a expedição do diploma <strong>de</strong> Técnico <strong>de</strong> Nível Médio. Estava<br />

previsto o aproveitamento <strong>de</strong> módulos comuns a diferentes habilitações, bem como o<br />

reconhecimento <strong>de</strong> outros estudos, através <strong>de</strong> Certificação <strong>de</strong> Competências.<br />

O MEC só po<strong>de</strong>ria expandir a oferta <strong>de</strong> Ensino Técnico em parceria com Estados,<br />

Municípios, setor produtivo ou organizações não-governamentais, que seriam responsáveis pela<br />

manutenção e gestão dos novos estabelecimentos educacionais. A União faria os repasses<br />

financeiros necessários e po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>smembrar escolas existentes, remanejando pessoal e<br />

patrimônio.<br />

Apesar <strong>de</strong> a composição das forças políticas no Congresso Nacional favorecerem o<br />

governo, a pressão da socieda<strong>de</strong> conseguiu retardar a aprovação do PL 1.603/96. Entretanto, com<br />

a aprovação da Lei 9394/96, o governo <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> enten<strong>de</strong>u que po<strong>de</strong>ria fazer a reforma do Ensino<br />

Médio e do Ensino Técnico através <strong>de</strong> <strong>de</strong>cretos presi<strong>de</strong>nciais e portarias ministeriais e assim o<br />

fez, retirando do Congresso o projeto <strong>de</strong> lei antes apresentado.<br />

A Lei Fe<strong>de</strong>ral n.º 9.394/96, atual LDB – Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da Educação Nacional<br />

- configura a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do Ensino Médio como uma etapa <strong>de</strong> consolidação da educação básica,<br />

<strong>de</strong> aprimoramento do educando como pessoa humana, <strong>de</strong> aprofundamento dos conhecimentos<br />

adquiridos no Ensino Fundamental, para continuar apren<strong>de</strong>ndo e <strong>de</strong> preparação básica para o<br />

trabalho e a cidadania. A LDB dispõe em um capitulo próprio, como modalida<strong>de</strong>, no qual "a<br />

44


Educação Profissional, integrada às diferentes formas <strong>de</strong> educação, ao trabalho, à ciência e à<br />

tecnologia, conduz ao permanente <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> aptidões para a vida produtiva”.<br />

Consi<strong>de</strong>rando o contexto político <strong>de</strong> elaboração da Lei nº 9.394/96, não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />

pontuar que o início <strong>de</strong> sua gestação, nos anos 80, coinci<strong>de</strong> com uma avassaladora ascensão do<br />

neoliberalismo, promovida, em parte, pelo <strong>de</strong>smantelamento da quase totalida<strong>de</strong> dos regimes<br />

socialistas e, por outra, pelo <strong>de</strong>smonte do estado <strong>de</strong> bem-estar social. Era então consi<strong>de</strong>rada<br />

como imperativa a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reformas institucionais baseadas em políticas <strong>de</strong> menor<br />

regulamentação do mercado e, conseqüentemente, <strong>de</strong> redução das obrigações estatais, para<br />

melhor alinhamento ao processo <strong>de</strong> globalização. O campo da educação não ficou indiferente ao<br />

confronto entre o público e o privado, ganhando a<strong>de</strong>ptos <strong>de</strong> todos os matizes i<strong>de</strong>ológicos em<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> uma abertura no que tange ao papel do Estado, tido mesmo, entre muitos, como vilão,<br />

em face da precarieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> resultados <strong>de</strong> nosso sistema educacional.<br />

Para melhor entendimento <strong>de</strong>ssa questão, não se po<strong>de</strong> negligenciar o fato <strong>de</strong> que as<br />

reformas educacionais nos países periféricos, da América Latina e Caribe, foram realizadas sob<br />

orientação <strong>de</strong> organismos internacionais interessados nos rumos da economia <strong>de</strong>sses países. No<br />

caso brasileiro, sob recomendação do Banco Mundial, o po<strong>de</strong>r público <strong>de</strong>via priorizar<br />

investimentos no Ensino Fundamental, que po<strong>de</strong>ria ser complementado por qualificação<br />

profissional <strong>de</strong> curta duração e baixo custo. No que concerne às ações da Educação Profissional,<br />

consi<strong>de</strong>rada processo prolongado e caro, a recomendação é <strong>de</strong> que fossem repassadas,<br />

progressivamente, para a esfera privada.<br />

A teoria do capital humano, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter sido criticada negativamente por uma intensa<br />

produção intelectual nas décadas <strong>de</strong> 1980 e 1990 e estar aparentemente superada, voltara a servir<br />

<strong>de</strong> fundo para a formulação <strong>de</strong> novas políticas educacionais, daí ser importante nos <strong>de</strong>termos em<br />

comentários sobre a mesma. Assim:<br />

O novo discurso, fundamentado na Teoria do Capital Humano, apontava<br />

a baixa produtivida<strong>de</strong> e a ina<strong>de</strong>quação da proposta educacional em<br />

relação ao momento histórico que o país atravessava, principalmente no<br />

que diz respeito às necessida<strong>de</strong>s do mercado <strong>de</strong> trabalho em função das<br />

metas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento econômico acelerado e <strong>de</strong> <strong>de</strong>smobilização<br />

política. Segundo esta lógica, a maioria dos cursos era excessivamente<br />

acadêmica e não preparavam para o exercício das funções produtivas,<br />

45


não aten<strong>de</strong>ndo às necessida<strong>de</strong>s do mercado <strong>de</strong> trabalho, o que se<br />

consi<strong>de</strong>rava um dos fatores explicativos para a crise econômica em que<br />

mergulhara o país (KUENZER, 1998).<br />

Nos termos da legislação em vigor, já se faz sentir essa tendência. As disposições legais<br />

atribuem às agências <strong>de</strong> Educação Profissional autonomia para organizar os currículos <strong>de</strong> suas<br />

ofertas <strong>de</strong> cursos técnicos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que tomem como referência as Diretrizes Curriculares<br />

Nacionais, consi<strong>de</strong>rando seus respectivos projetos pedagógicos e as peculiarida<strong>de</strong>s regionais. Ao<br />

po<strong>de</strong>r público fica reservada a avaliação da qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> resultados, o que reflete, no âmbito<br />

educacional, a máxima do Estado mínimo que caracteriza o pensamento liberal.<br />

Paralelamente, o fascínio pela possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> melhor qualificação do trabalho e do<br />

trabalhador, embutida no conjunto das transformações econômicas e tecnológicas da<br />

contemporaneida<strong>de</strong>, favoreceu a revitalização da perspectiva economicista <strong>de</strong> educação. Sob a<br />

constante afirmação <strong>de</strong> que vivemos hoje em uma socieda<strong>de</strong> do conhecimento, reafirma-se, mais<br />

uma vez, o papel re<strong>de</strong>ntor da educação, numa versão atualizada da teoria do capital humano. Em<br />

uma primeira leitura da atual legislação da educação nacional, a proposição <strong>de</strong> que os currículos<br />

<strong>de</strong>vam pautar-se pelos perfis profissionais <strong>de</strong> conclusão, favorecendo a <strong>de</strong>limitação mais clara <strong>de</strong><br />

itinerários profissionais, parece estar acenando para a superação da dualida<strong>de</strong> até então<br />

característica da educação no país.<br />

No entanto, existem interpretações menos otimistas referentes à questão antes<br />

mencionada. os instrumentos legais que regulamentam a educação nacional, que,ao tratarem em<br />

separado os Ensinos Básico e Médio e o Ensino Profissional, instituíram dois sistemas paralelos<br />

<strong>de</strong> educação no país. Desse modo,<br />

restabelecem-se as duas trajetórias sem equivalência, negando-se a<br />

construção da integração entre educação geral e educação para o<br />

trabalho, que vinha historicamente se processando nas instituições<br />

responsáveis pela educação profissional, certamente mais orgânica à<br />

nova realida<strong>de</strong> da vida social e produtiva (KUENZER, 1998).<br />

46


O Decreto n o 2.208, baixado pelo Presi<strong>de</strong>nte da República em 17 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1997, que<br />

regulamentou o <strong>de</strong>creto para a re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> <strong>de</strong> Educação Tecnológica, incorporou todos os pontos<br />

do projeto <strong>de</strong> lei 1603/96 e radicalizou a separação entre o Ensino Médio e o Ensino Profissional.<br />

A nova legislação levou à extinção dos cursos técnicos integrados ao Ensino Médio. Os novos<br />

cursos técnicos, que po<strong>de</strong>m ser concomitantes ou seqüenciais ao Ensino Médio, começaram a ser<br />

implantado nas instituições <strong>de</strong> ensino no ano <strong>de</strong> 1998.<br />

Às Escolas Técnicas, Agrotécnicas e aos CEFETs (Centros Fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong> Educação<br />

Tecnológica), na Portaria ministerial n o 646 do MEC <strong>de</strong> 14 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1997, foi consentido,<br />

a<strong>pós</strong> uma resistência ativa, a oferta do Ensino Médio <strong>de</strong> caráter não profissionalizante, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

as vagas não ultrapassassem a meta<strong>de</strong> das atualmente oferecidas para os cursos técnicos<br />

regulares.<br />

A Lei 9394/96 (LDB) marca a modalida<strong>de</strong> da Educação Profissional como ativida<strong>de</strong><br />

excluída da educação escolar (Educação Básica e Educação Superior) e faz retornar o forte<br />

atrelamento da Educação Profissional ao mercado <strong>de</strong> trabalho. A separação entre o Ensino Médio<br />

e a Educação Técnica, que extinguiu o curso técnico integrado até então existente, é um dos<br />

objetivos da reforma educacional implementada no Brasil. A <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong>sse novo mo<strong>de</strong>lo tem<br />

como apoio o aspecto econômico. Os estudantes que procuram as escolas técnicas mantidas pelo<br />

Estado não estariam seguindo as profissões em que se formam, causando <strong>de</strong>sperdício dos<br />

recursos públicos investidos em sua educação. Com a separação, preten<strong>de</strong>-se que apenas os<br />

interessados em atuar na função <strong>de</strong> técnico façam os cursos, pois isso exige mais tempo <strong>de</strong><br />

estudo. Com a modularização, também preten<strong>de</strong>-se que o trabalhador procure a qualificação ou a<br />

requalificação profissional para manter-se empregável, à medida que o <strong>de</strong>senvolvimento<br />

tecnológico o obrigue a preparar-se para as mudanças no processo <strong>de</strong> produção.<br />

Outras análises elaboradas sobre essas mudanças e as previsões sobre seus efeitos<br />

apontam para a formação dicotomizada e para a semelhança com o mo<strong>de</strong>lo educacional anterior<br />

a 1961, preparando profissionais para postos <strong>de</strong> trabalho, e não pessoas com uma habilitação<br />

profissional associada a uma visão <strong>de</strong> mundo que permita enten<strong>de</strong>r o seu papel na socieda<strong>de</strong> e no<br />

processo produtivo.<br />

KUENZER(1998) colabora para <strong>de</strong>svelar aspectos contraditórios do novo mo<strong>de</strong>lo<br />

educacional para a formação profissional. Lembra que apenas 25% dos jovens, na faixa etária<br />

47


correspon<strong>de</strong>nte ao Ensino Médio, estão nele matriculados e que, além disso, a taxa <strong>de</strong> evasão<br />

<strong>de</strong>sse ensino é da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> 50%. Conclui que a estratégia <strong>de</strong> levar o Ensino Técnico para a<strong>pós</strong> o<br />

Médio, além <strong>de</strong> conten<strong>de</strong>dora do ingresso em cursos superiores, é também elitista, por reduzir o<br />

contingente dos que terão acesso ao Técnico. Pergunta, ainda, se o Ensino Médio propedêutico, o<br />

qual vê como “marcadamente aca<strong>de</strong>micista, livresco e <strong>de</strong> baixo custo”, servirá como base<br />

a<strong>de</strong>quada para os cursos técnicos <strong>pós</strong>-médios, sobre o que sugere futuras pesquisas.<br />

Em absoluta concordância com as transformações ocorridas no mundo do trabalho, as<br />

políticas públicas <strong>de</strong> educação objetivam a contenção do acesso aos níveis mais elevados <strong>de</strong><br />

ensino para os poucos incluídos, respon<strong>de</strong>ndo à lógica da polarização; para estes, <strong>de</strong> fato são<br />

asseguradas boas oportunida<strong>de</strong>s educacionais, <strong>de</strong> modo a viabilizar a formação dos profissionais<br />

<strong>de</strong> novo tipo: dirigentes, especialistas, críticos, criativos e bem-sucedidos. Para a gran<strong>de</strong> maioria,<br />

são propostas aligeiradas <strong>de</strong> formação profissional que in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> Educação Básica anterior,<br />

como forma <strong>de</strong> viabilizar o acesso a alguma ocupação precarizada, que permita alguma condição<br />

<strong>de</strong> sobrevivência.<br />

Sustenta FRIGOTTO(1996) que tal formação – técnica e profissional – em uma<br />

socieda<strong>de</strong> na qual se busque construir, ainda no presente, relações solidárias e <strong>de</strong>mocráticas,<br />

pressupõe o <strong>de</strong>senvolvimento omnilateral das capacida<strong>de</strong>s humanas, em contraposição ao<br />

<strong>de</strong>senvolvimento unilateral e fragmentário hoje reinante. Oferece indicação da socieda<strong>de</strong> para a<br />

qual propõe um novo mo<strong>de</strong>lo educacional, calcado na escola unitária:<br />

(...) é na luta pela construção <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> assentada no<br />

industrialismo <strong>de</strong> novo tipo, orgânico e unitário, que rompa com o<br />

taylorismo, fordismo e sua versão <strong>pós</strong>-mo<strong>de</strong>rna, o toyotismo, que ganha<br />

sentido a luta por uma escola básica <strong>de</strong> 1 º e 2 º graus unitária. Esta é a<br />

formação técnico-profissional <strong>de</strong> novo tipo que necessitamos <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r e<br />

construir neste fim <strong>de</strong> século na socieda<strong>de</strong> brasileira (FRIGOTTO, 1996,<br />

p. 139).<br />

O enfoque atual da formação profissional é o chamado mo<strong>de</strong>lo da competência,<br />

enquanto o anterior é chamado <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>lo da qualificação. A formação <strong>de</strong>sse novo trabalhador<br />

<strong>de</strong>ve dotá-lo, além <strong>de</strong> conhecimentos, <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>s e atitu<strong>de</strong>s, para que possa<br />

disputar no mercado uma colocação.<br />

48


Essas transformações sofridas pela Educação Profissional, em nosso país, têm merecido<br />

análises críticas <strong>de</strong> nomes <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque na área educacional. Algumas abordagens traçam<br />

paralelos entre os dois mo<strong>de</strong>los e buscam um caminho <strong>de</strong> superação das limitações <strong>de</strong> ambos,<br />

sem per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista a concretu<strong>de</strong> do atendimento às <strong>de</strong>terminações legais. A situação atual da<br />

Educação Profissional e Tecnológica vem sendo caracterizada por um conjunto <strong>de</strong> problemas e<br />

dificulda<strong>de</strong>s, provocados, entre outros, pelos impactos da chamada “administração zig-zag”<br />

(CUNHA, 1991), na qual as mudanças freqüentes das autorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> governo <strong>de</strong>finem oscilações<br />

periódicas nas diretrizes e políticas educacionais.<br />

Nesse sentido, o Decreto 2208/97, do governo <strong>de</strong> Fernando Henrique Cardoso retoma,<br />

em outro contexto, a Educação Profissional da década anterior <strong>de</strong> 60, on<strong>de</strong> se configurava uma<br />

re<strong>de</strong> dual entre a Educação Geral e a Educação Profissional. Portanto, a separação entre o Ensino<br />

Médio e o Ensino Técnico reforçou a idéia <strong>de</strong> duas re<strong>de</strong>s, aprofundando a dualida<strong>de</strong> estrutural do<br />

sistema educacional brasileiro.<br />

Na implementação <strong>de</strong> novas políticas do governo Lula para o Ensino Médio e para a<br />

Educação Profissional, insere-se a revogação do <strong>de</strong>creto 2208/97 e a aprovação do Decreto<br />

5154/04, que estabelece a flexibilização na articulação do Ensino Médio com o Ensino Técnico,<br />

e o incentivo do retorno do Ensino Técnico Integrado. Essa nova referência legal impõe estudos<br />

da realida<strong>de</strong> concreta da educação oferecida à juventu<strong>de</strong> e as conseqüências para a luta dos<br />

jovens trabalhadores na garantia dos seus direitos sociais básicos <strong>de</strong> educação e trabalho.<br />

49


Capítulo III<br />

UMA ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA DOS JOVENS NO PROGRAMA<br />

EDUCACIONAL DO COLÉGIO ESTADUAL PROF. HORACIO DE<br />

MACEDO/CEFET-RJ.<br />

No capítulo que se inicia, a intenção foi apresentar propostas <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização do<br />

acesso <strong>de</strong>senvolvidas, a partir da década <strong>de</strong> 90, no CEFET-RJ e sistematizar o resultado do<br />

questionário e os relatos dos jovens na pesquisa <strong>de</strong> campo. Para isso foi importante recuperar,<br />

inicialmente, as experiências do acesso diferenciado <strong>de</strong> alunos oriundos da escola pública aos<br />

cursos técnicos do CEFET-RJ através do Projeto do Pró-técnico e, posteriormente, na criação do<br />

Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo no prédio do CEFET-RJ <strong>de</strong> Maria da Graça.<br />

3.1- O CEFET-RJ e o acesso dos alunos da escola pública.<br />

Des<strong>de</strong> 1983, quando comecei a trabalhar no CEFET-RJ, tenho convivido com questões<br />

que dizem respeito à dificulda<strong>de</strong> do acesso a essa escola dos jovens dos meios populares. O<br />

processo seletivo que se realiza anualmente, tanto pelos seus aspectos quantitativos quanto pelos<br />

seus aspectos qualitativos – tipo <strong>de</strong> prova, conteúdos e questões –, tem como conseqüência a<br />

classificação majoritária <strong>de</strong> alunos pertencentes aos segmentos <strong>de</strong> mais alto po<strong>de</strong>r aquisitivo da<br />

socieda<strong>de</strong>.<br />

Apesar <strong>de</strong> saber que as estatísticas não fazem outra coisa senão confirmar o fracasso<br />

escolar dos filhos das camadas populares, eu insistia em questionar o fato <strong>de</strong> que uma escola<br />

pública que forma profissionais <strong>de</strong> nível médio selecionasse, para serem seus alunos, justamente<br />

aqueles que freqüentavam o Ensino Fundamental em escolas particulares. Os dados eram<br />

alarmantes: apesar <strong>de</strong> um equilíbrio do número <strong>de</strong> formandos na 8º série do Ensino Fundamental<br />

entre escolas públicas municipais e escolas particulares no município do Rio <strong>de</strong> janeiro, no<br />

50


CEFET-RJ se mantinha, na década <strong>de</strong> 80, apenas em torno <strong>de</strong> 15% dos alunos aprovados no<br />

concurso <strong>de</strong> admissão aos seus cursos técnicos eram oriundos <strong>de</strong> escola pública.<br />

A falta <strong>de</strong> vagas no Ensino Médio gratuito, o atendimento precário da <strong>de</strong>manda que vem<br />

crescendo significativamente e o prestígio social <strong>de</strong> que goza como instituição <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> voltada<br />

para o Ensino Técnico faz com que, anualmente, o número <strong>de</strong> candidatos que se inscrevem no<br />

concurso <strong>de</strong> admissão aos cursos técnicos do CEFET-RJ seja muitas vezes superior ao número<br />

<strong>de</strong> vagas oferecidas, conforme a Tabela 1.<br />

TABELA 1: Número <strong>de</strong> candidatos e vagas do concurso para o Ensino Técnico no CEFET-<br />

RJ no período <strong>de</strong> 1992 a 2006<br />

Ano Candidatos Vagas<br />

1992 10792 790<br />

1993 12880 795<br />

1994 13005 845<br />

1995 15390 845<br />

1996 13675 845<br />

1997 10564 800<br />

1998 10013 800<br />

1999 9878 600<br />

2000 10.926 600<br />

2001 13.131 600<br />

2002 14.753 660<br />

2003 15.527 800<br />

2004 12.241 840<br />

51


2005 7.953 840<br />

2006 9.649 900<br />

Fonte: Setor <strong>de</strong> Concurso CEFET-RJ<br />

Os dados do concurso 1997/1998 já indicavam que, dos candidatos aprovados, 74,8%<br />

concluíram o Ensino Fundamental em escolas particulares. Naquele ano, os candidatos<br />

originários das escolas particulares representavam pouco mais da meta<strong>de</strong> (58,6%) do total <strong>de</strong><br />

inscritos, mas ocuparam quase três quartos das vagas oferecidas. Com relação aos egressos das<br />

escolas públicas municipais, observa-se o oposto: sua participação entre os classificados (12,6%)<br />

é bem menor do que no total <strong>de</strong> candidatos (31,3%) Assim, é possível concluir, que além <strong>de</strong><br />

participar menos como candidato ao concurso, quem conclui o ensino fundamental em escolas<br />

públicas municipais tem menor possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> classificação e, portanto, <strong>de</strong> ingresso no<br />

CEFET-RJ.<br />

Essa realida<strong>de</strong> serviu para justificar a reforma da Educação Profissional na década <strong>de</strong> 90.<br />

O governo lançou mão, principalmente, <strong>de</strong> dois argumentos; por um lado, o alto custo do aluno<br />

das escolas técnicas e por outro lado, a elitização do acesso aos cursos técnicos, o fato <strong>de</strong> que<br />

muitos dos seus alunos não têm interesse no curso técnico ou em se profissionalizarem, e o<br />

freqüentam <strong>de</strong> forma propedêutica, pensando no acesso ao Ensino Superior. Na separação entre<br />

Ensino Médio e Técnico, implementada em 1997, argumenta-se que isso favoreceria aqueles<br />

alunos que <strong>de</strong>monstram interesse e necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação profissional e têm como perspectiva<br />

o ingresso no mercado <strong>de</strong> trabalho, ou aqueles já engajados no mercado <strong>de</strong> trabalho e que<br />

buscam uma melhor qualificação. Ao i<strong>de</strong>ntificar-se o que parece ter sido um "<strong>de</strong>svio da classe" a<br />

ser atendida pelo Ensino Técnico-profissional, re<strong>de</strong>fine-se esse ramo do ensino <strong>de</strong> maneira a<br />

voltá-lo para o atendimento daqueles a quem seria originariamente <strong>de</strong>stinado.<br />

Não se questiona o processo seletivo adotado, e nem se articula o aumento da procura das<br />

escolas técnicas fe<strong>de</strong>rais com a <strong>de</strong>terioração do Ensino Médio oferecido nas escolas da re<strong>de</strong><br />

estadual. Em nome do que, aparentemente, seria uma forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização e justiça social<br />

(afinal, com que direito os mais ricos ocupariam o lugar que, preferencialmente, seria dos mais<br />

52


pobres no Ensino Técnico?) re<strong>de</strong>fine-se a estrutura do sistema educacional brasileiro,<br />

conjugando-se as reformas do Ensino Médio e Técnico no objetivo comum <strong>de</strong> contenção do<br />

acesso ao Ensino Superior. E ainda, na reforma da Educação Profissional, reedita-se o dualismo<br />

escolar, na medida em que fica estabelecida a sua <strong>de</strong>stinação explícita para o atendimento a uma<br />

<strong>de</strong>terminada classe social. Não se preten<strong>de</strong> uma escola única, para todos, mas uma escola que se<br />

diferencia segundo a classe social a que <strong>de</strong>ve aten<strong>de</strong>r.<br />

O <strong>de</strong>safio que se coloca para a instituição educacional comprometida com a<br />

<strong>de</strong>mocratização do acesso à escola pública seria o <strong>de</strong> garantir aos setores populares a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> entrar e concluir, com sucesso, os cursos oferecidos, e, ao mesmo tempo,<br />

garantir uma escola que fortaleça a escola única para todos, e não uma escola com diferenciação<br />

<strong>de</strong> classes ou grupos sociais.<br />

3.1.1 O Pró-Técnico<br />

Os cursos Pró-técnico, implantados a partir da década <strong>de</strong> 70, na maioria das escolas<br />

técnicas e, posteriormente, nos CEFET’s, têm sua origem no Programa Especial <strong>de</strong> Bolsas <strong>de</strong><br />

Estudo do Ministério do Trabalho para propiciar ensino a trabalhadores sindicalizados e seus<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, através <strong>de</strong> convênios com instituições <strong>de</strong> Ensino Técnico. Na década <strong>de</strong> 80, o<br />

Ministério da Educação estimula todas as escolas técnicas fe<strong>de</strong>rais e CEFET’s a assumirem a<br />

iniciativa <strong>de</strong> realizar o curso <strong>de</strong> modo a preparar jovens com perfil <strong>de</strong> baixo po<strong>de</strong>r aquisitivo para<br />

os cursos técnicos.<br />

Como uma alternativa à elitização do acesso aos seus cursos técnicos, foi implantado,<br />

pelo CEFET-RJ, em 1990, o Curso Pró-Técnico, cujo objetivo específico era a ampliação das<br />

chances <strong>de</strong> ingresso nesses cursos dos alunos da re<strong>de</strong> pública municipal <strong>de</strong> Ensino Fundamental.<br />

Na justificativa do projeto <strong>de</strong> criação do Curso Pró-Técnico, parte-se da constatação da elitização<br />

do acesso via concurso, e enten<strong>de</strong>-se que, em conseqüência <strong>de</strong> uma disputa <strong>de</strong>sigual, o curso<br />

técnico não tem atingido <strong>de</strong>terminados segmentos da socieda<strong>de</strong>.<br />

53


Com pequenas alterações e ajustes, principalmente no que diz respeito aos critérios <strong>de</strong><br />

seleção dos alunos que constituiriam suas turmas, o Curso Pró-Técnico funcionou até 1994 como<br />

um "cursinho" preparatório para o concurso. Seus alunos participavam do Concurso <strong>de</strong><br />

Admissão aos Cursos Técnicos como os <strong>de</strong>mais candidatos, e eram selecionados através <strong>de</strong><br />

critérios previamente <strong>de</strong>finidos entre os alunos das escolas municipais do Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />

Na tabela 2 estão sistematizados os dados <strong>de</strong> atendimento no Curso Pró-Técnico e <strong>de</strong><br />

classificação para ingresso nos cursos técnicos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1990 até 1998. Percebe-se, facilmente, que<br />

o índice <strong>de</strong> aproveitamento dos alunos do Curso Pró-Técnico é muito pequeno. Com exceção <strong>de</strong><br />

1992, no qual a seleção foi realizada através <strong>de</strong> prova seletiva, o número <strong>de</strong> alunos classificados<br />

no Concurso é muito baixo. O cursinho preparatório que eles freqüentam, no CEFET-RJ, parece<br />

não influir quase nada, ou muito pouco, nas suas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> classificação.<br />

Tabela 2 – Curso Pró-Técnico: matrícula inicial e classificados para os cursos técnicos<br />

período <strong>de</strong> 1992 a 2006<br />

Ano Matrículas Classificados<br />

1990 130 04<br />

1991 121 04<br />

1992 109 25<br />

1993 120 06<br />

1994 167 02<br />

1995 157 52<br />

1996 154 52<br />

1997 160 54<br />

1998 160 52<br />

Fonte: CEFET-RJ/Diren/Pró-Técnico. "Relatório do Curso Pró-Técnico", 1990 a 1998.<br />

54


A cada ano, repetia-se a frustração: apesar <strong>de</strong> todos os esforços <strong>de</strong>spendidos,<br />

pouquíssimos eram os classificados. A estratégia utilizada <strong>de</strong> oferecer um cursinho preparatório<br />

para o concurso não representava uma real ampliação das possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acesso dos alunos<br />

das escolas públicas municipais <strong>de</strong> Ensino Fundamental aos cursos técnicos do CEFET-RJ. Por<br />

outro lado, o acompanhamento da freqüência dos alunos selecionados pelo Concurso mostrava<br />

que aproximadamente 10% do total <strong>de</strong> classificados, apenas, se matriculavam, assegurando suas<br />

vagas no primeiro ano do curso técnico, e não freqüentam as aulas. A ocupação <strong>de</strong>ssas vagas,<br />

que ficavam ociosas pela evasão inicial dos alunos classificados no concurso, foi a justificativa<br />

para a criação <strong>de</strong> 52 novas vagas nos cursos técnicos – duas vagas em cada uma das turmas <strong>de</strong> 1º<br />

ano – <strong>de</strong>stinadas especificamente aos alunos do Curso Pró-Técnico.<br />

Assim, a partir <strong>de</strong> 1995, muda a natureza do Curso Pró-Técnico que, <strong>de</strong> simples<br />

preparatório para o concurso, passa a ser, também, uma alternativa <strong>de</strong> seleção e acesso aos cursos<br />

técnicos do CEFET-RJ para os alunos <strong>de</strong> escolas públicas municipais <strong>de</strong> Ensino Fundamental.<br />

Anualmente, seus melhores alunos têm, a partir <strong>de</strong> então, assegurado direito <strong>de</strong> matrícula nos<br />

cursos técnicos <strong>de</strong> nível médio, sem precisarem prestar concurso. A partir <strong>de</strong> então, passam a<br />

conviver, no CEFET-RJ, dois modos <strong>de</strong> seleção <strong>de</strong> alunos para os cursos técnicos <strong>de</strong> nível<br />

médio: o Concurso <strong>de</strong> Admissão e o Curso Pró-Técnico.<br />

O Curso Pró-Técnico é <strong>de</strong>senvolvido <strong>de</strong> abril a outubro, com aulas diárias, quatro vezes<br />

por semana. Os alunos freqüentam em turnos alternados o Pró-Técnico e a oitava série. Trabalha-<br />

se em sala <strong>de</strong> aula o <strong>programa</strong> do concurso que abrange conteúdos <strong>de</strong> Matemática, Língua<br />

Portuguesa, Física, Química, Biologia, História e Geografia. Além disso, os alunos têm também<br />

Iniciação à Informática e assistem a palestras <strong>de</strong> Informação Profissional. Em sala <strong>de</strong> aula,<br />

busca-se <strong>de</strong>senvolver uma experiência pedagogicamente significativa: para além da preparação<br />

para os cursos técnicos, o <strong>de</strong>spertar do gosto pelas ciências, o <strong>de</strong>senvolvimento do raciocínio<br />

lógico, a percepção da aplicabilida<strong>de</strong> do conhecimento matemático nos acontecimentos<br />

cotidianos, a apropriação da língua portuguesa falada e escrita como instrumento <strong>de</strong><br />

comunicação, o situar-se histórica e geograficamente como cidadãos resi<strong>de</strong>ntes no município do<br />

Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />

Os professores são os responsáveis pela avaliação dos alunos do Curso Pró-Técnico.<br />

Essa avaliação se realiza por meio <strong>de</strong> provas e também <strong>de</strong> forma continuada, ao longo do curso,<br />

55


através <strong>de</strong> exercícios e trabalhos. Ao final do curso, é calculada a média dos alunos em cada uma<br />

das disciplinas do concurso. A partir da soma <strong>de</strong> suas médias, os alunos são classificados. Os<br />

cinqüenta e dois primeiros colocados ingressam diretamente nos cursos técnicos, sendo que os<br />

<strong>de</strong>mais prestam concurso tanto para o CEFET-RJ, quanto para outras escolas públicas <strong>de</strong> Ensino<br />

Técnico.<br />

Os alunos do Pró-Técnico é selecionado nas escolas da re<strong>de</strong> pública municipal <strong>de</strong> Ensino<br />

Fundamental e freqüentam, em turnos alternados, o Curso Pró-Técnico, e a oitava série do ensino<br />

fundamental. A sistemática anual <strong>de</strong> implantação do Projeto e seleção <strong>de</strong> alunos para o Curso<br />

Pró-Técnico privilegia o contato com todas as instâncias da re<strong>de</strong> municipal: técnicos da<br />

Secretaria Municipal <strong>de</strong> Educação (SME) e das Coor<strong>de</strong>nadorias Regionais <strong>de</strong> Educação (CREs),<br />

diretores e professores <strong>de</strong> escolas municipais, pais e membros dos Conselhos Escola-<br />

Comunida<strong>de</strong> (CECs). Para participar do projeto, é preciso que as escolas interessadas se<br />

inscrevam. Em seguida, faz-se o sorteio <strong>de</strong> 40 escolas – 4 por CRE. Apenas nessas 40 escolas<br />

sorteadas são selecionados os alunos do Pró-Técnico. Em cada uma <strong>de</strong>ssas 40 escolas, com base<br />

em seu <strong>de</strong>sempenho na 7ª série, são selecionados quatro alunos. 25 São assim selecionados os<br />

160 alunos que formam, anualmente, as quatro turmas do Curso Pró-Técnico.<br />

Esses jovens, com ida<strong>de</strong> variando entre 13 e 15 anos, moradores distantes do CEFET-RJ,<br />

se submetiam durante sete meses – <strong>de</strong> abril a novembro – a uma dupla jornada escolar. De<br />

manhã no CEFET, <strong>de</strong> tar<strong>de</strong> na Escola Municipal, ou vice-versa. Pegam o primeiro ônibus, ainda<br />

escuro, antes das cinco horas da manhã, e, às vezes, mais dois ônibus para estarem em sala <strong>de</strong><br />

aula às sete horas.<br />

Ingressar no CEFET-RJ é uma gran<strong>de</strong> meta para a família <strong>de</strong>sses meninos e meninas,<br />

alunos <strong>de</strong> escolas públicas municipais durante o Ensino Fundamental. Orgulham-se <strong>de</strong> que seus<br />

filhos sejam alunos do CEFET e que estejam se preparando, ao longo do Ensino Médio, também<br />

profissionalmente. Antecipam para o curso técnico <strong>de</strong> nível médio o sentimento <strong>de</strong> orgulho<br />

i<strong>de</strong>ntificados nos familiares dos graduandos do Ensino Superior: "quem já tenha observado o<br />

orgulho dos pais ou esposas pelo diplomando, no dia da <strong>graduação</strong>, dificilmente po<strong>de</strong> negar que<br />

as satisfações dos familiares são algo real" (BOWEN, 1997).<br />

56


Fazer CEFET é para eles um gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>safio. Fazer um curso técnico é o começo da<br />

concretização <strong>de</strong> um sonho – ter uma profissão. Imaginam a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma entrada<br />

privilegiada no mercado <strong>de</strong> trabalho e valorizam o curso técnico. Saem <strong>de</strong> escolas pequenas,<br />

situadas próximas <strong>de</strong> suas residências, aon<strong>de</strong> convivem com colegas que têm um perfil sócio-<br />

econômico e cultural semelhante ao seu. Entram em uma escola gran<strong>de</strong>, longe <strong>de</strong> casa, passam a<br />

conviver com colegas <strong>de</strong> classe que majoritariamente têm um po<strong>de</strong>r aquisitivo bem superior ao<br />

seu. Enfrentam dificulda<strong>de</strong>s cotidianas em sala <strong>de</strong> aula: não têm dinheiro para comprar os livros<br />

e materiais didáticos exigidos pelos professores. Têm pouca chance <strong>de</strong> usufruto dos chamados<br />

bens culturais. Tiveram uma escolarida<strong>de</strong> anterior precária, muitas vezes em suas antigas escolas<br />

não tiveram professor <strong>de</strong> algumas disciplinas. Por isso, espera-se que o jovem não tenha êxito no<br />

concurso público, o que legitima, pelo <strong>de</strong>sempenho, a sua exclusão do acesso à escola.<br />

A progressão dos alunos do Pró-Técnico melhora significativamente a cada grupo que<br />

ingressa anualmente no CEFET-RJ e é cada vez mais expressiva a porcentagem daqueles que<br />

avançam <strong>de</strong> série para série sem repetência. Do grupo que ingressou em 1996, apenas meta<strong>de</strong><br />

(50%) conseguiu chegar ao 4º ano sem repetir nenhum ano; dos que ingressaram em 1997,<br />

71,15% chegam ao 3º ano sem repetência; e, finalmente, no grupo <strong>de</strong> 1998, 94,4% cursou a 2ª<br />

série. Comparando-se com o os aprovados no concurso, percebe-se que os alunos do Pró-<br />

Técnico, a cada ano, melhoram sua performance. Parece que os que ingressaram em 1996<br />

tiveram um pouco mais <strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong> para progredir nos estudos e permanecer na escola, mas o<br />

grupo <strong>de</strong> 1997 já apresenta uma progressão ligeiramente superior ao grupo do concurso,<br />

enquanto o grupo <strong>de</strong> 1998 supera os alunos do concurso, tanto em termos <strong>de</strong> permanência,<br />

quanto <strong>de</strong> progressão nos estudos.<br />

De modo geral, po<strong>de</strong>-se afirmar que a repetência na 1ª série – apesar <strong>de</strong> alta também para<br />

os alunos selecionados pelo concurso – atinge <strong>de</strong> modo mais significativo os alunos que<br />

ingressam no CEFET-RJ pela via do Curso Pró-Técnico, enquanto que a evasão ou abandono é<br />

um fenômeno quase que restrito aos alunos concursados.<br />

Os alunos selecionados pelo Pró-Técnico, para ingresso em 1998, no CEFET-RJ,<br />

<strong>de</strong>monstraram, nesses dois anos, um excelente <strong>de</strong>sempenho. A repetência, na 1ª série, foi<br />

pequena - 5,6%. Quase todos, portanto, passaram para a 2ª série, e todos, repetentes ou não,<br />

continuavam estudando no CEFET, em 1999.<br />

57


Da análise <strong>de</strong>sses dados quantitativos, <strong>de</strong>staca-se, em primeiro lugar, uma certeza: não<br />

prestar concurso, ou não se classificado nele, não significa necessariamente não ser capaz <strong>de</strong><br />

acompanhar as aulas e dar prosseguimento aos estudos nos cursos técnicos do CEFET-RJ. Os<br />

alunos selecionados pela alternativa do Curso Pró-Técnico <strong>de</strong>monstram, ao longo do<br />

<strong>de</strong>senvolvimento do curso técnico, uma capacida<strong>de</strong> bastante semelhante, algumas vezes até<br />

superior, <strong>de</strong> acompanhar as aulas e prosseguir nos estudos, com relação àqueles selecionados<br />

pelo concurso. Na seleção <strong>de</strong>sses jovens, com ida<strong>de</strong> variando entre 14 e 15 anos, em pleno<br />

processo <strong>de</strong> formação, o fator prepon<strong>de</strong>rante parece ser sua escolarida<strong>de</strong> anterior, seu passado<br />

educacional. Uma vez que cursaram o Ensino Fundamental em escolas públicas municipais, não<br />

conseguem ultrapassar o obstáculo representado pelo concurso. Depois que ingressam,<br />

participando do mesmo processo educacional, recuperam as lacunas provocadas pela "falta <strong>de</strong><br />

base" e prosseguem na escolarização.<br />

O Curso Pró-Técnico tem como proposta a <strong>de</strong>mocratização do acesso e ampliação das<br />

chances <strong>de</strong> ingresso nos Cursos Técnicos do CEFET-RJ dos alunos das escolas públicas<br />

municipais <strong>de</strong> Ensino Fundamental. Por sua via, ingressam alunos que, em princípio, não<br />

ingressariam via concurso e que passam a conviver cotidianamente nas diferentes turmas dos<br />

cursos técnicos.<br />

A partir dos dados analisados, e pela repetência observada no primeiro ano técnico dos<br />

alunos selecionados pelo Pró-Técnico, parece ser possível afirmar que a falta <strong>de</strong> base faz com<br />

que os alunos selecionados pelo Pró-Técnico tenham uma dificulda<strong>de</strong> maior no primeiro ano do<br />

que aqueles selecionados pelo concurso (CAMPELLO, 2000). Superada essa dificulda<strong>de</strong> inicial,<br />

a progressão dos dois grupos é bastante semelhante. Percebe-se, a partir da segunda série, certa<br />

vantagem dos alunos provenientes do Pró-Técnico. Aqui parece que sua posição social influi<br />

positivamente, na medida em que suas famílias valorizam o fato <strong>de</strong> que estudam no CEFET e<br />

consi<strong>de</strong>ram da maior importância a possibilida<strong>de</strong> da profissionalização.<br />

Esses jovens (e suas famílias) parecem ter uma relação muito especial com a escola, com<br />

a cultura escolar e a respeito do futuro oferecido pelos estudos. O investimento que fazem, ao<br />

participar do Pró-Técnico, encarando uma dupla jornada escolar e <strong>de</strong>slocando-se muitos <strong>de</strong>les <strong>de</strong><br />

bairros bastante distantes, é um indicador <strong>de</strong>ssa disposição diferenciada, o que parece fornecer<br />

alguns dos elementos que permitiriam o entendimento das razões do seu sucesso.<br />

58


O grupo selecionado pelo Pró-Técnico para ingresso em 1998 <strong>de</strong>monstrou, nesses dois<br />

anos, um <strong>de</strong>sempenho excepcional, ultrapassando <strong>de</strong> forma significativa o grupo selecionado<br />

pelo concurso. O paradoxo observado, em um primeiro momento, até causa espanto: esse grupo<br />

<strong>de</strong> alunos provavelmente não ingressaria pelas "vias normais" e, no entanto, no interior da escola<br />

se <strong>de</strong>staca, permanece e progri<strong>de</strong> melhor em seus estudos do que os alunos selecionados pelo<br />

Concurso.<br />

A partir dos dados analisados, parece ser possível afirmar que a implantação e<br />

<strong>de</strong>senvolvimento do Curso Pró-Técnico contribuem efetivamente para a <strong>de</strong>mocratização do<br />

acesso aos Cursos Técnicos do CEFET-RJ, na medida em que constituem um processo seletivo<br />

alternativo, que valoriza o ensino público fundamental e seus egressos.<br />

A convivência com estes jovens que passaram ao longo <strong>de</strong>sses anos pelo Curso Pró-<br />

Técnico e nos Cursos Técnicos do CEFET-RJ, o contato direto com seus familiares permite<br />

dimensionar o quanto para eles significa estar fazendo curso técnico - é um passaporte para o<br />

emprego e uma possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ascensão social. Durante a 4ª série no Ensino Técnico, começam<br />

já a pensar no acesso ao Ensino Superior. Conseguiram, <strong>de</strong>sse modo, adiar a entrada no mercado<br />

<strong>de</strong> trabalho, com muito sacrifício para eles e suas famílias. Agora, já qualificados, pensam<br />

trabalhar <strong>de</strong> dia e continuar estudando, à noite.<br />

3.1.2 O Colégio Prof. Horacio Macedo<br />

A reforma educacional brasileira implementada a partir da Lei 9394/96 e, em particular, a<br />

reforma da Educação Profissional regulamentada pelo Decreto 2208/97 consolidaram a política<br />

neoliberal e reafirmaram o dualismo estrutural para aten<strong>de</strong>r diferentes interesses <strong>de</strong> classe. Uma<br />

das conseqüências da reforma foi a redução da oferta do Ensino Médio e a elevação da faixa<br />

etária dos estudantes da re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong>, com o espaço educacional da juventu<strong>de</strong> reduzido e a<br />

ameaça da fragmentação na oferta <strong>de</strong> uma educação integral <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>. A partir <strong>de</strong> 1998, as<br />

escolas técnicas fe<strong>de</strong>rais e CEFET’s, incluindo o CEFET-RJ, re<strong>de</strong>finiram ou <strong>de</strong>sativaram os<br />

Cursos Pró-Técnicos que vinham <strong>de</strong>senvolvendo.<br />

A redução da oferta obrigatória do Ensino Médio pela re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> <strong>de</strong> Educação<br />

Tecnológica regulamentada na portaria 646/97, e a resistência/adaptação ao projeto<br />

59


governamental implicaram a criação <strong>de</strong> novas formas <strong>de</strong> acesso das camadas populares aos<br />

cursos técnicos. No CEFET-RJ, a realização do convênio com a Secretária Estadual <strong>de</strong> Educação<br />

(SEE) possibilitou, em 2000, a criação do Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo (CEPHM),<br />

on<strong>de</strong> alunos oriundos do Ensino Fundamental da re<strong>de</strong> pública municipal participam <strong>de</strong> um<br />

<strong>programa</strong> educacional articulado entre o Ensino Médio na escola estadual com o curso técnico<br />

ministrado pelo CEFET-RJ. Em um certo sentido, a proposta <strong>de</strong> criação do Colégio Estadual<br />

Prof. Horacio <strong>de</strong> Macedo, em articulação com o ensino Técnico do CEFET-RJ, representa a<br />

continuida<strong>de</strong> do projeto Pró Técnico e suas finalida<strong>de</strong>s.<br />

O Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo é uma instituição pública, gratuita,<br />

hierarquicamente subordinada à Coor<strong>de</strong>nadoria Regional Metropolitana III e à Secretaria <strong>de</strong><br />

Estado <strong>de</strong> Educação do Rio <strong>de</strong> Janeiro (SEE-RJ).<br />

O Colégio foi implantado no ano letivo <strong>de</strong> 2000, a<strong>pós</strong> a assinatura do Convênio entre a<br />

SEE e o CEFET-RJ, com a incumbência e a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver um projeto<br />

i<strong>de</strong>alizado por professores representantes dos níveis <strong>de</strong> Governo (Estadual e Fe<strong>de</strong>ral), tendo<br />

como foco central valorizar e incentivar o aluno do Ensino Fundamental da Re<strong>de</strong> Pública <strong>de</strong><br />

Ensino selecionado pelo seu <strong>de</strong>sempenho escolar.<br />

Segundo o acordo firmado entre as partes, cada instituição tem <strong>de</strong>finidas as suas<br />

atribuições, tendo como base legal Decreto 93872/86 e a Instrução Normativa número 04/92,<br />

Decreto número 3.149, <strong>de</strong> 28 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> l980, que regulamentou o título XI do Código <strong>de</strong><br />

Administração Financeira Pública do Estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro, aprovado pela Lei número 287,<br />

<strong>de</strong> 04/12/1979, e pelas disposições contidas na Lei Fe<strong>de</strong>rais número 8.666/93 e suas alterações,<br />

IN número 01/97 e ainda pelas cláusulas e condições especificadas no mesmo. O C.E.P.H.M.<br />

recebe repasses <strong>de</strong> verbas da S.E.E. através da Associação <strong>de</strong> Apoio à Escola do Colégio<br />

Estadual Professor Horacio Macedo, sendo uma associação civil sem fins lucrativos, com se<strong>de</strong> e<br />

foro nesta cida<strong>de</strong>, tendo como principais objetivos promover o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> recursos<br />

pedagógicos e auxiliar na administração <strong>de</strong>sta Unida<strong>de</strong> Escolar. Sendo inscrita no Ministério da<br />

Fazenda sob o número 04.437.873/0001-17 (C.G.C.). Atualmente o Colégio recebe, através da<br />

referida Associação, 4(quatro) cotas no valor <strong>de</strong> R$ 4.800,00 para cobrir as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> refeições<br />

dos alunos e 4(quatro) cotas no valor <strong>de</strong> R$ 4.500,00 para as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> manutenção, por<br />

semestre.<br />

60


O CEPHM fica situado no Bairro <strong>de</strong> Maria da Graça, que era uma Fazenda <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />

porte, cuja se<strong>de</strong> se localizava num prédio que atualmente é ocupado pela General Eletric (G.E.) e<br />

o nome do bairro foi em homenagem à dona da fazenda, que se chamava Maria da Graça. Mais<br />

tar<strong>de</strong> a fazenda foi vendida para uma Imobiliária que a dividiu em loteamentos. Conforme<br />

cadastramento no último censo consta 9.110 habitantes, possuindo seis praças. uma Delegacia<br />

Policial, um Batalhão da Polícia Militar, um conjunto habitacional, uma feira livre, dois clubes,<br />

cinco seitas religiosas, uma Clínica particular, Metrô Maria da Graça x Estácio, uma Associação<br />

<strong>de</strong> Moradores, uma Escola Municipal, dois Colégios Estaduais e um Fe<strong>de</strong>ral. Maria da Graça é<br />

cercado por duas comunida<strong>de</strong>s, a do Jacarezinho, uma das maiores do mundo, e a Chácara <strong>de</strong><br />

Del Castilho, também conhecida como Ban<strong>de</strong>ira Dois.<br />

A Unida<strong>de</strong> Escolar funciona <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua implantação no Campus do CEFET-RJ (em<br />

Maria da Graça), à Rua Miguel Ângelo, número 96 – local no qual funcionava uma gráfica <strong>de</strong><br />

ca<strong>de</strong>rnos do MEC (FAE – Fundação <strong>de</strong> Apoio ao Estudante), tendo sido adaptada para<br />

funcionamento do Colégio, que iniciou suas ativida<strong>de</strong>s no dia 14 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 2000.<br />

O CEPHM, quanto ao seu tamanho e clientela atendida, é classificado pela Secretaria <strong>de</strong><br />

Estado <strong>de</strong> Educação do Rio <strong>de</strong> Janeiro, segundo critérios estabelecidos em Diário Oficial do<br />

Estado, como “C”, pois aten<strong>de</strong> em torno <strong>de</strong> 610 alunos, distribuídos em 18 turmas. O Colégio<br />

funciona em dois turnos e possui o quantitativo <strong>de</strong> 64 pessoas, como força <strong>de</strong> trabalho, entre<br />

professores e pessoal <strong>de</strong> apoio. A Unida<strong>de</strong> Escolar ocupa parte <strong>de</strong> um prédio cedido pelo<br />

CEFET-RJ, no Campus <strong>de</strong> Maria da Graça, há 6(seis) anos.<br />

Todos os alunos são oriundos da 8 a .série do Ensino Fundamental, e <strong>de</strong>vem estar<br />

aten<strong>de</strong>ndo às exigências do Convênio acima citado, entre a SEE e o CEFET-RJ (quadro 1).<br />

QUADRO 1 – Etapas <strong>de</strong> encaminhamento dos alunos à U.E.<br />

Etapas Especificação Período<br />

01 A Direção do CEPHM consulta à Direção do CEFET-RJ<br />

sobre disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vagas para o ano seguinte<br />

outubro<br />

(2 a . quin.)<br />

02 A Direção do CEPHM comunica à CRM III novembro<br />

(1 a .quin)<br />

03 A Direção do CEPHM, <strong>de</strong>vidamente autorizada pela Coor<strong>de</strong>nadora da novembro<br />

CRM IIII, comunica às CRE(s) o número <strong>de</strong> vagas disponibilizadas para (2<br />

o período seguinte, através <strong>de</strong> Ofício ou E-mail, com todo o cronograma<br />

pré-estabelecido em reuniões, das etapas seguintes até a efetivação das<br />

matrículas.<br />

a .quin)<br />

até<br />

janeiro<br />

(1 a .quin)<br />

Fonte: Secretária do Colégio Prof. Horacio <strong>de</strong> Macedo (2006)<br />

61


CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO da seleção dos alunos<br />

META ETAPA<br />

FASE<br />

ESPECIFICAÇÃO DURAÇÃO<br />

1<br />

1<br />

2<br />

3<br />

Seleção <strong>de</strong> candidatos para a 1ª. Série do Ensino Médio<br />

seguindo critérios especiais:<br />

Critérios <strong>de</strong> Seleção p/C. E. Prof. Horacio Macedo/CEFET.<br />

a) ter 13 anos completos na 8ª. Série, preferencialmente até o<br />

limite <strong>de</strong> 15 anos, em 31/12/2005;<br />

b) ser aluno da Escola Pública, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a 5ª. Série, vinculada a<br />

I CRE, II CRE, III CRE, IV CRE, V CRE, VI CRE e<br />

VII CRE, e<br />

Re<strong>de</strong> oficial do Estado;<br />

c) ter conseguido, no <strong>de</strong>correr do ano letivo <strong>de</strong> 2005, conceitos<br />

nas disciplinas <strong>de</strong> Língua Portuguesa,<br />

Matemática e<br />

Ciências, para os alunos da Re<strong>de</strong><br />

Municipal;<br />

d) ter conseguido, no <strong>de</strong>correr do ano letivo <strong>de</strong> 2005, médias<br />

entre 90 e 100, nas disciplinas <strong>de</strong> Língua Portuguesa,<br />

Matemática e<br />

Ciências, para os alunos<br />

da Re<strong>de</strong> Estadual.<br />

Obs: - em caso <strong>de</strong> empate, as normas constantes na Resolução<br />

2614, <strong>de</strong> 27/09 <strong>de</strong> 04/10/2004e darão apoio legal.<br />

As diretoras <strong>de</strong>verão encaminhar as relações nominais dos<br />

alunos, com seus respectivos boletins e <strong>de</strong>clarações, especificando<br />

que os alunos indicados são oriundos da re<strong>de</strong> pública <strong>de</strong> Ensino<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a 5ª série, diretamente às suas respectivas CRE(s).<br />

As CRE(s) encaminharão as relações ao Colégio Estadual<br />

Prof. Horacio Macedo.<br />

- o Cefet po<strong>de</strong>rá utilizar, se assim o <strong>de</strong>sejar, até 10% do<br />

total <strong>de</strong> vagas <strong>de</strong>claradas do Colégio (Resíduo do<br />

concurso).<br />

Cursam o Ensino Médio no C. E. Prof. Horacio Macedo e cursos<br />

profissionais no CEFET, concomitantemente a partir do 2º ano,<br />

aqueles que não ficarem em regime <strong>de</strong> Dependência.<br />

Aluno cursa no CEFET a formação profissional e realiza estágio.<br />

62<br />

três anos<br />

1ª. Série – E. M.<br />

2ª. Série E. M.<br />

e<br />

3ª. Série Profissional<br />

4ª. Série<br />

Ensino Profissional


Os alunos do CEPHM iniciam o Curso Técnico, a partir da 2 a .série do Ensino Médio,<br />

a<strong>pós</strong> uma análise <strong>de</strong> suas médias no <strong>de</strong>correr da 1 a .série, levando em consi<strong>de</strong>ração também o<br />

número <strong>de</strong> vagas disponibilizadas pelo CEFET-RJ, para os diversos cursos.<br />

O CEPHM aten<strong>de</strong> em dois turnos (manhã e tar<strong>de</strong>). Os alunos estão assim distribuídos: 1°<br />

Turno: <strong>de</strong> 07:00 às 12:15/ 2° Turno: <strong>de</strong> 13:00 às 18:15. Cada aula tem a duração <strong>de</strong> 50 minutos,<br />

com 6 (seis) aulas diárias sendo os intervalos <strong>de</strong> 10:20 à 10:35, e o da tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> 16:20 às 16:35,<br />

respectivamente. Os alunos são oriundos <strong>de</strong> Escola pública e a maioria proveniente <strong>de</strong> bairros<br />

populares em torno do bairro <strong>de</strong> Maria da Graça.<br />

No período <strong>de</strong> sua criação até 2006. Apresenta-se assim o resultado geral da escola,<br />

conforme Quadro 2.<br />

QUADRO 2: Situação dos alunos do Colégio Prof. Horacio <strong>de</strong> Macedo 2000-2006<br />

Matriculas aprovados reprovados Dependênciatransferidos evadidos trancamento<br />

2000 357 270 20 48 7 11 1<br />

2001 701 598 17 58 7 12 9<br />

2002 859 764 18 46 12 15 4<br />

2003 832 741 16 60 7 6 2<br />

2004 601 525 37 24 9 1 5<br />

2005 585 523 9 40 5 2 2<br />

2006 570 --- --- --- --- --- ---<br />

Fonte: Secretária do Colégio Prof. Horacio <strong>de</strong> Macedo (2006)<br />

O CEPHM surgiu no cenário educacional do Estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro com<br />

características próprias e diferenciadas. No mesmo ano em que fora implantado,<br />

concomitantemente, na Re<strong>de</strong> Estadual <strong>de</strong> Ensino é implementado o Programa Nova Escola.<br />

Quanto às avaliações do Programa Nova Escola, o CEPHM obteve em 2000, 2001, 2003 e 2004<br />

pontuações máximas. Sendo as Instituições Externas avaliadoras a CESGRANRIO, inicialmente,<br />

e, no último, ano o CAED – MG (observando-se que, no ano <strong>de</strong> 2002, houve a interrupção do<br />

referido Programa).<br />

63


O Colégio foi incluído na lista <strong>de</strong> colégios públicos em pesquisa <strong>de</strong> opinião pública, na<br />

seguinte seqüência: 1.Colégio <strong>de</strong> Aplicação (Cap) da UFRJ; 2. Cap Fernando Rodrigues da<br />

Silveira (Uerj); 3 CEFET /RJ; 4. Colégio Pedro II - S. Cristóvão; 5. Colégio Pedro II; Tijuca; 6.<br />

Colégio Pedro II – Centro; 7. C. E. Prof.Horacio Macedo; 8. C. E. Pedro Braile Neto; 9. E. T. E.<br />

R.; 10. Instituto <strong>de</strong> Educação / RJ (“ O Dia “– 18/02/03).<br />

O quadro 3 <strong>de</strong>monstra a movimentação dos alunos no acesso e saída do Ensino Médio<br />

no CEPHM e a entrada na Educação Técnica no CEFET-RJ.<br />

QUADRO 3: Movimentação dos Alunos do Colégio Prof. Horacio Macedo 2000-2006<br />

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 Total<br />

Entrada médio357 385 203 305 126 191 273 1840<br />

Concluinte médio - - 291(*) 330(*) 184 252 104 1161<br />

Entrada Técnico<br />

(CEFET)<br />

- 326 337 136 238 97 290 1424<br />

Fonte: Secretária do Colégio Prof. Horacio <strong>de</strong> Macedo e do CEFET-RJ (2006)<br />

(*) Alunos estudados na pesquisa<br />

3.2 Procedimentos da pesquisa<br />

Essa pesquisa, ao utilizar como metodologia, o estudo <strong>de</strong> caso, ressalta originalida<strong>de</strong>s e<br />

particularida<strong>de</strong>s do Programa educacional que articula o Ensino Médio e Educação Técnica<br />

oferecidos pelo Colégio Prof. Horacio Macedo e o CEFET-RJ respectivamente. O trabalho <strong>de</strong><br />

campo foi realizado com os alunos concluintes, <strong>de</strong> 2002 e 2003, do Ensino Médio da Escola<br />

Estadual Prof. Horacio Macedo.<br />

O trabalho utilizou um questionário, <strong>de</strong>volvido por 140 pessoas (23,7%) <strong>de</strong> um total <strong>de</strong><br />

621 (seiscentos e vinte e um) alunos que entraram no <strong>programa</strong> em 2000 e 2001 e concluíram o<br />

Ensino Médio na Escola Estadual Prof. Horacio Macedo em 2002 e 2003. O questionário (Anexo<br />

1) foi encaminhado pelo correio ou entregue pessoalmente, tendo sido assinalado com en<strong>de</strong>reço<br />

não i<strong>de</strong>ntificado um total <strong>de</strong> 31(5%) das correspondências encaminhadas.<br />

O contacto direto com os sujeitos da pesquisa foi realizado através <strong>de</strong> um convite para<br />

participação <strong>de</strong> uma reunião encaminhado juntamente com o questionário. A reunião ocorrida no<br />

dia 28/10/2006 teve a participação <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> ex-alunos formados em 2002 e 2003<br />

64


(185 assinaturas no livro <strong>de</strong> presença), quando foi solicitado que registrassem o interesse <strong>de</strong><br />

participar da pesquisa. A partir <strong>de</strong>ssa disposição voluntária, foram realizadas duas reuniões <strong>de</strong><br />

grupo focal, on<strong>de</strong> prevaleceu a fala dos sujeitos participantes em relação a sua experiência <strong>de</strong><br />

inserção no mundo do trabalho e à continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos na Educação Superior (Anexo 5).<br />

Em cada uma <strong>de</strong>las, pu<strong>de</strong> estabelecer diálogo aberto com os jovens do <strong>programa</strong> e<br />

perceber seus principais valores do trabalho e da experiência realizada no <strong>programa</strong>, bem como<br />

as variadas formas <strong>de</strong> aprendizagens a que estavam sujeitos, quer do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> limites<br />

postos como das possibilida<strong>de</strong>s daquela iniciativa. E é a partir da apreensão que esses jovens<br />

fazem da esfera do trabalho e das relações sociais aí mediadas que construímos este capítulo da<br />

pesquisa.<br />

A partir dos referenciais metodológicos orientadores <strong>de</strong> nossa pesquisa, não optamos por<br />

uma <strong>de</strong>scrição analítica do fazer diário <strong>de</strong>sses jovens na sua ativida<strong>de</strong> atual. Tampouco pensamos<br />

em amplos dados quantitativos neste momento da pesquisa. O número <strong>de</strong> jovens com que<br />

realizamos o grupo focal nesta etapa da pesquisa não representa uma amostragem para fins <strong>de</strong><br />

análise quantitativa, nem sequer as entrevistas aqui realizadas inserem-se num critério <strong>de</strong><br />

representativida<strong>de</strong> estatística. Trata-se <strong>de</strong> diálogos, com um número <strong>de</strong> doze jovens, em que<br />

abordam os principais aspectos que vivenciam em sua prática diária. Nesse sentido, as respostas<br />

apresentadas não po<strong>de</strong>m ser tomadas como a experiência toda do projeto. Elas, no entanto,<br />

referenciam a nossa análise e servem <strong>de</strong> base para nos dizer o que pensam esses jovens.<br />

As reuniões foram realizadas no dia 11/11 e 25/11 <strong>de</strong> 2006 e todas elas aconteceram no<br />

espaço da própria instituição. Utilizamos uma câmara <strong>de</strong> ví<strong>de</strong>o com o respectivo áudio para que<br />

pudéssemos mais facilmente sistematizar a fala e orientar nossa análise. Os jovens se sentiram<br />

bem à vonta<strong>de</strong> na realização da gravação, que contou com um roteiro para as questões. No geral,<br />

po<strong>de</strong>mos dizer que a abertura das pessoas para a realização das conversas foi muito facilitada.<br />

Para tentar melhor compreen<strong>de</strong>r a experiência dos jovens a<strong>pós</strong> a conclusão do <strong>programa</strong>,<br />

estabelecemos algumas categorias, <strong>de</strong>scritas a seguir, para análise dos registros obtidos no grupo<br />

focal.<br />

Percebo as dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong>correntes do fato <strong>de</strong> que estudo uma situação na qual estou<br />

diretamente envolvido como gestor da instituição <strong>de</strong> Educação Profissional, e com a qual estou<br />

comprometido. Mas, entendo que<br />

65


Querendo ou não, somos peças que são manipuladas e, ao mesmo<br />

tempo, peças que querem influenciar o <strong>de</strong>senrolar da partida. Não po<strong>de</strong><br />

haver uma <strong>de</strong>finição abstrata <strong>de</strong> problemas. Os problemas são aqueles da<br />

situação estratégica em que nos encontramos colocados (ALVES, 1995,<br />

p.91).<br />

3.3 Trajetória escolar e inserção no trabalho <strong>de</strong> jovens<br />

trabalhadores<br />

O questionário respondido pelos jovens (Anexo 1) concluintes do Ensino Médio do<br />

CEPHM possibilitou enten<strong>de</strong>r um pouco quem são, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> vem, o que fazem e sua experiência<br />

no trabalho e na continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos.<br />

3.3.1 - I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> sócio-familiar<br />

A partir da análise do questionário, é possível <strong>de</strong>linear alguns traços que compõem o<br />

perfil dos alunos do Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo.<br />

Gênero<br />

A maioria dos alunos (65%) é majoritariamente feminina. Resultado do processo <strong>de</strong><br />

seleção adotado, valorizando o mérito, isso indica que, nas escolas municipais públicas, as<br />

meninas se <strong>de</strong>stacam como as melhores alunas <strong>de</strong> suas turmas. Fato interessante é o fato <strong>de</strong> que,<br />

no Brasil, o percentual feminino nos cursos técnicos é bem menor do que o masculino. No<br />

CEFET-RJ, historicamente, em torno <strong>de</strong> 30% dos candidatos e dos classificados do concurso do<br />

curso técnico são do sexo feminino.<br />

66


Faixa etária<br />

As pessoas pesquisadas apresentam a ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> 20 a 22 anos (86,6%) conforme o quadro<br />

4. Isso significa que, na conclusão do Ensino Médio, no Colégio Prof. Horacio <strong>de</strong> Macedo<br />

ocorrida em 2002 e 2003, os jovens estavam na faixa etária <strong>de</strong> 17 a 19 anos e, portanto, com<br />

baixo nível <strong>de</strong> repetência na Educação Básica.<br />

QUADRO 4 – Ida<strong>de</strong> atual (2006), em percentual, dos alunos concluintes em 2002-2003<br />

19 anos 20 anos 21 anos 22 anos 23 anos 25 anos<br />

2,9% 24,3% 42,3% 20% 6,4% 2,1%<br />

Etnia/raça<br />

O quadro 5 mostra a realida<strong>de</strong> dos alunos pesquisados, <strong>de</strong> acordo com a qual 47% se<br />

<strong>de</strong>clara <strong>de</strong> raça preta ou parda. Consi<strong>de</strong>rando a mesma proporção <strong>de</strong> pretos e pardos com os<br />

brancos na população brasileira, po<strong>de</strong>mos concluir que o acesso por mérito na escola pública não<br />

discrimina a raça/etnia. Discriminação esta que configura o acesso ao Ensino Técnico no Brasil,<br />

on<strong>de</strong> apenas 26% <strong>de</strong> negros e pardos estão matriculados. Por outro lado, po<strong>de</strong>mos concluir que o<br />

acesso por cotas para alunos <strong>de</strong> escola pública também repercute positivamente na questão da<br />

<strong>de</strong>mocratização do acesso <strong>de</strong> negros e pardos no Ensino Técnico.<br />

QUADRO 5- Distribuição, percentual, por raça dos alunos concluintes 2002-2003<br />

Branca Preta Parda<br />

48% 15% 32%<br />

Local <strong>de</strong> moradia<br />

O local <strong>de</strong> moradia concentra-se em bairros populares do município do Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />

QUADRO 6- local <strong>de</strong> moradia dos jovens<br />

Bairro %<br />

Inhaúma 23,6%<br />

Jacaré 5,7%<br />

Del Castilho 5,7%<br />

Engenho <strong>de</strong> Dentro 5,7%<br />

Bonsucesso 5%<br />

Pilares 5%<br />

67


Méier 4,3%<br />

Cachambi 3,6%<br />

Pieda<strong>de</strong> 3,6%<br />

Água Santa 3,6%<br />

Tomas Coelho 3,6%<br />

Engenho Novo 3,6%<br />

Outros (com 1% a 2%): (Campo Gran<strong>de</strong>, Marechal Hermes, Rocha, Engenho da Rainha,<br />

Sampaio, Manginhos, S. Francisco Xavier, Todos os Santos, Encantado, Riachuelo,<br />

Higienópolis, Ramos, Abolição, Lins, Benfica, Irajá e Quintino).<br />

Questões gerais do perfil<br />

Outras informações obtidas na análise dos questionários registram que a maioria é<br />

solteira (89%), e alguns tiveram filhos (7,1%), <strong>de</strong>ntre os alunos concluintes <strong>de</strong> 2002 e 2003. A<br />

situação pessoal <strong>de</strong> bens <strong>de</strong> consumo, em comparação entre o ano <strong>de</strong> entrada no <strong>programa</strong> (2000)<br />

e o ano da pesquisa (2006), está registrada no quadro 7.<br />

QUADRO 7- Situação dos jovens em 2000-2006<br />

2000 2006<br />

Morava com os Pais 97,9% 88,6%<br />

Trabalhava 2,9% 75,7%<br />

TV 100% 100%<br />

Computador 40,7% 75,7%<br />

Automóvel 22,1% 26,4%<br />

Telefone Celular 42,1% 97,1%<br />

O número <strong>de</strong> pessoa que mora com os jovens mostra um total <strong>de</strong> 82,9% <strong>de</strong> famílias com<br />

três a cinco membros.<br />

QUADRO 8 – Número <strong>de</strong> pessoas que moram na casa dos jovens<br />

Membros 1 2 3 4 5 6 7 8<br />

% 1,4 % 5,7 % 24,3 % 40 % 18,6 % 5 % 4,3 % 1,4 %<br />

68


3.3.2 Participação no curso técnico<br />

Dos 140 sujeitos que respon<strong>de</strong>ram aos questionários, todos (100%) iniciaram o curso<br />

técnico no CEFET-RJ, sendo que 38 (27,14%) jovens abandonaram o referido curso e 102<br />

(72,86%) concluíram-no.<br />

QUADRO 9 – Cursos Técnicos realizados pelos jovens<br />

Curso técnico %<br />

Segurança do trabalho 23,53 %<br />

Informática 19,61 %<br />

Mecânica 13,73 %<br />

Turismo 7,84 %<br />

Automobilística 6,87 %<br />

Edificações 6,87 %<br />

Estradas 5,88 %<br />

Administração 3,92 %<br />

Telecomunicações 3,92 %<br />

Eletrônica 1,96 %<br />

Quando se perguntou sobre os motivos do abandono do curso técnico, foi registrado: a)<br />

Curso in<strong>de</strong>sejável (34,20%); b) Não adaptação (23,68%); c) Estar cursando Ensino Superior<br />

(7,90%); d) Outros motivos (34,22%).<br />

69


3.3.3 Ocupação e escolarida<strong>de</strong> dos pais<br />

Observando-se as profissões dos pais, encontra-se a predominância ampla <strong>de</strong> ocupações<br />

não qualificadas e na área <strong>de</strong> serviços.<br />

Quadro 10 – Ocupação dos Pais dos jovens<br />

Ocupação Pai % Ocupação Mãe %<br />

Aposentado 8,6% Do Lar 40,4%<br />

Desconhecida 7,9% Costureira 5,7%<br />

Autônomo 7,9% Doméstica 5%<br />

Comerciante 7,1% Funcionária pública 3,6%<br />

Motorista 5% Autônoma 3,6%<br />

Mecânico 4,3% Cabeleireira 2,1%<br />

Taxista 3,6% Professora 2,1%<br />

Ven<strong>de</strong>dor 2,9% Manicure 1,4%<br />

Falecido 2,9% Meren<strong>de</strong>ira 1,4%<br />

Pedreiro 2,1% Comerciante 1,4%<br />

Desempregado 1,4% Auxiliar<br />

Enfermagem<br />

1,4%<br />

Artesã 1,4%<br />

Cozinheira 1,4%<br />

Desempregada 1,4%<br />

Recepcionista 1,4%<br />

Assistente<br />

Administrativo<br />

1,4%<br />

Serviços Gerais 1,4%<br />

Outras ocupações dos pais (com menos <strong>de</strong> 1%): (carteiro, funcionário público,<br />

estivador, ourives, contador, operário, supervisor, recepcionista, balconista, auxiliar <strong>de</strong> escritório,<br />

cobrador, artesão, pintor, agente <strong>de</strong> viagem, advogado, marítimo, encarregado, chefe <strong>de</strong> cozinha,<br />

técnico em mecânica, analista <strong>de</strong> sistemas, professor, engenheiro, policial, fotógrafo, barbeiro,<br />

70


tecelão, gráfico, segurança, porteiro, eletricista, metalúrgico, ladrilheiro, carpinteiro, engraxate,<br />

técnico em eletrônica).<br />

Outras ocupações da mãe (com menos <strong>de</strong> 1%): (telefonista, acompanhante, maquiadora,<br />

estudante, copeira, secretária, lava<strong>de</strong>ira, aposentada, operária, pensionista, falecida).<br />

Quanto à escolarida<strong>de</strong>, encontramos predominância do Ensino Fundamental no nível <strong>de</strong><br />

escolarida<strong>de</strong> dos pais.<br />

QUADRO 11- Escolarida<strong>de</strong> dos Pais<br />

Fundamental Ensino Médio Técnico Ensino Superior<br />

Pai 43,6% 33,6% 5,7% 9,3%<br />

Mãe 45% 42,9% 2,9% 5,7%<br />

3.3.4 Entre o trabalho e a continuida<strong>de</strong> dos estudos<br />

A situação dos jovens em relação ao a situação <strong>de</strong> trabalho e continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos<br />

mostra que 66,4% <strong>de</strong>les continua a estudar e 72,1% está trabalhando.<br />

QUADRO 12 -Situação <strong>de</strong> estudo e trabalho dos jovens<br />

Situação %<br />

Só trabalha 22,8 %<br />

Só estuda 17,1 %<br />

Estuda e trabalha 49,2 %<br />

Não estuda e não trabalha 10,7 %<br />

A maioria dos jovens que concluíram o Ensino Técnico está trabalhando (72,1%) em<br />

ocupações qualificadas, e 48,51 % dos que trabalham exercem a função <strong>de</strong> técnicos <strong>de</strong> nível<br />

médio.<br />

71


QUADRO 13 – Habilitações profissionais dos Técnicos que trabalham<br />

Habilitação profissional %<br />

Segurança do trabalho 26,53 %<br />

Informática 14,29 %<br />

Mecânica 6,12 %<br />

Telecomunicações 6,12 %<br />

Edificações 6,12 %<br />

Estradas 4,08 %<br />

Auxiliar Técnico (não <strong>de</strong>finido) 10,20 %<br />

Estagiário (não <strong>de</strong>finido) 20,41 %<br />

Não <strong>de</strong>finido 6,12 %<br />

Dos jovens que estão estudando (66,4%), a maioria (89,93%) cursa o Ensino Superior, a<br />

maior parte em instituição pública.<br />

QUADRO 14 – Instituições em que os jovens dão continuida<strong>de</strong> aos estudos superiores<br />

Instituição Pública 70,24 % Instituição privada 29,76 %<br />

UERJ 47,62 % Estácio <strong>de</strong> Sá 7,14%<br />

UFRJ 10,71 % UNISUAM 7,14 %<br />

<strong>UFF</strong> 4,76 % UGF 3,57 %<br />

CEFET-RJ 4,76 % UNIVERCIDADE 3,57 %<br />

CEFETEQ 1,19 % UVA 3,57 %<br />

UNIRIO 1,19 % CASTELO Branco 1,19 %<br />

UNESA 1,19 %<br />

ETAM 1,19 %<br />

PUC 1,19 %<br />

Os cursos que estão freqüentando são <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> diversida<strong>de</strong>, mas com predominância em<br />

áreas do conhecimento afins aos cursos técnicos realizados.<br />

72


QUADRO 15 – Cursos que os jovens freqüentam no Ensino Superior<br />

Curso %<br />

Engenharia 16,67 %<br />

Informática 9,52 %<br />

Administração 8,33 %<br />

Pedagogia 8,33 %<br />

Enfermagem 5,95 %<br />

Artes 5,95 %<br />

Letras 4,76 %<br />

Psicologia 3,57 %<br />

Direito 2,38 %<br />

Historia 2,38 %<br />

Fisioterapia 2,38 %<br />

Física 2,38 %<br />

Matemática 2,38 %<br />

Pré-Vestibular 9,52 %<br />

Quanto à perspectiva <strong>de</strong> futuro, os jovens fazem citações referentes ao trabalho e<br />

emprego, mas predominam as metas <strong>de</strong> estudo. A conclusão do Ensino Superior aparece na<br />

perspectiva <strong>de</strong> 47,86 % dos jovens, enquanto 16,43 % priorizam o emprego e 16,43 %, a carreira.<br />

Chama à atenção a perspectiva <strong>de</strong> 7,86 % dos jovens <strong>de</strong> <strong>programa</strong>s <strong>de</strong> <strong>pós</strong>-<strong>graduação</strong> e 4,95 %<br />

<strong>de</strong> serem professores.<br />

3.4 A voz dos jovens trabalhadores: a or<strong>de</strong>m pelo avesso<br />

A experiência <strong>de</strong> jovens oriundos da escola pública em sua trajetória escolar e <strong>de</strong><br />

inserção no trabalho, a partir da conclusão e participação no <strong>programa</strong> educacional articulado<br />

entre a Educação Técnica <strong>de</strong> nível Médio do CEFET-RJ e o Ensino Médio do Colégio Estadual<br />

Prof. Horacio Macedo constitui-se objeto <strong>de</strong> estudo <strong>de</strong>sta dissertação. Procura-se, no entanto,<br />

73


também perceber esta experiência a partir da ótica do próprio jovem trabalhador, ponto <strong>de</strong> vista<br />

nem sempre consi<strong>de</strong>rado legítimo pela socieda<strong>de</strong>. È na perspectiva <strong>de</strong> pensar o tema ouvindo os<br />

jovens trabalhadores, que este trabalho procura se <strong>de</strong>senvolver, através das reuniões do grupo<br />

focal realizado (Anexo 5). Discute-se, aqui, não só a versão do jovem sobre o trabalho e a<br />

Educação Profissional Técnica <strong>de</strong> nível Médio e sua trajetória escolar e <strong>de</strong> inserção no mundo do<br />

trabalho, como também as formas pelas qual sua consciência capta a situação num contexto mais<br />

amplo, em que a sua origem social tem um peso fundamental na sua i<strong>de</strong>ntificação como jovem<br />

trabalhador.<br />

A palavra dos jovens trabalhadores, a lógica pela qual percebem o valor do trabalho e da<br />

educação, revela um conjunto <strong>de</strong> questões que indicam a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> rever concepções há<br />

muito tempo repetidas e que encobrem relações <strong>de</strong>sconhecidas entre o jovem e o mundo da<br />

produção e da reprodução social. À medida que esse trabalho foi sendo realizado, foi-se<br />

<strong>de</strong>scobrindo, gradativamente, um outro lado das velhas hipóteses segundo as quais a educação<br />

reproduz o sistema <strong>de</strong> produção social, ou é vista como um caminho <strong>de</strong> salvação dos jovens<br />

pobres. Percebe-se a importância do trabalho como estratégia dos jovens, para alcançar não só os<br />

seus projetos <strong>de</strong> vida e objetivos educacionais, como, também, na busca <strong>de</strong> inclusão social e <strong>de</strong><br />

autonomia individual. Em síntese, a estratégia dos jovens <strong>de</strong> utilizar as oportunida<strong>de</strong>s<br />

educacionais para sua emancipação social e <strong>de</strong>senvolvimento pessoal se estabelece <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong><br />

uma contradição incorporada <strong>de</strong> negativida<strong>de</strong>s e positivida<strong>de</strong>s.<br />

As características compensatórias dos <strong>programa</strong>s educacionais e formação profissional<br />

para superar <strong>de</strong>ficiências e alcançar a cidadania das pessoas, através da inserção no mundo do<br />

trabalho, estão relacionadas às especificida<strong>de</strong>s do modo <strong>de</strong> vida e indícios <strong>de</strong>sses mesmos<br />

indivíduos em estado <strong>de</strong> pobreza. Basta ver os <strong>de</strong>stinatários <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados <strong>programa</strong>s <strong>de</strong><br />

formação profissional, para perceber uma evi<strong>de</strong>nte ligação entre os seus objetivos educacionais e<br />

<strong>de</strong> inserção social, no mundo produtivo com os grupos sociais mais pobres. O modo <strong>de</strong><br />

i<strong>de</strong>ntificar uma pessoa sujeita a esses <strong>programa</strong>s <strong>de</strong> Educação Profissional está sempre muito<br />

mais referido a aspectos próprios, como membros que são <strong>de</strong>sses grupos sociais, do que a<br />

evidência <strong>de</strong> suas características próprias individuais. Não se reconhece o sujeito, mas sua<br />

posição <strong>de</strong> classe social. Na verda<strong>de</strong>, o reconhecimento do jovem a participar <strong>de</strong> um <strong>programa</strong><br />

educativo está, essencialmente, no fato <strong>de</strong> morar na favela, ser negro, ou ser pobre. São esses os<br />

74


indícios explicitamente admitidos pela socieda<strong>de</strong> para a i<strong>de</strong>ntificação dos participantes <strong>de</strong> tais<br />

<strong>programa</strong>s.<br />

Os próprios jovens trabalhadores reproduzem essa associação entre a oferta educacional<br />

e a pobreza, on<strong>de</strong> a escola aparece como elo fundamental <strong>de</strong> soluções aparentes para superar a<br />

situação <strong>de</strong> vida, e que, na verda<strong>de</strong>, muitas vezes concorrem para mantê-lo. Por outro lado,<br />

também percebem a importância da educação para o seu <strong>de</strong>senvolvimento pessoal e projeto <strong>de</strong><br />

vida. O trabalho é reconhecido como valor ontológico e, ao mesmo tempo, como transitório para<br />

estudos superiores, e meio para alcançar objetivos específicos.<br />

Essa visão não esteve clara para o pesquisador <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início. À medida que foi<br />

compreen<strong>de</strong>ndo a lógica dos jovens trabalhadores e a forma pela qual a socieda<strong>de</strong> se apresenta<br />

para eles, começou a perceber as implicações do significado da escolarização e o trabalho numa<br />

socieda<strong>de</strong> como a nossa. Ao pesquisador não foram dadas priori concepções teóricas sobre o<br />

tema, mas foi <strong>de</strong>scobrindo e se apropriando <strong>de</strong>stas ao longo da pesquisa, sempre <strong>de</strong>rivadas das<br />

indicações obtidas pelo método <strong>de</strong> ver as coisas a partir dos jovens.<br />

De fato, assumiu-se a perspectiva <strong>de</strong> trabalhar o discurso dos jovens a respeito <strong>de</strong> suas<br />

condições concomitantes e posteriores à participação no <strong>programa</strong> educativo. Incluem-se aí<br />

consi<strong>de</strong>rações sobre o perfil sócio-econômico, trajetória educacional e inserção no mundo do<br />

trabalho.<br />

As formulações dos jovens trabalhadores são acrescidas do valor estratégico <strong>de</strong> via <strong>de</strong><br />

acesso às questões levantadas em torno da Educação Técnica e do trabalho. Elas fornecem as<br />

relações a partir das quais se tenta a construção <strong>de</strong> articulações sociologicamente mais<br />

elucidativas das questões propostas.<br />

Levar em conta a percepção dos jovens implica, pois, em certo posicionamento teórico e<br />

metodológico: teoricamente, indica a valorização do ponto <strong>de</strong> vista do sujeito;<br />

metodologicamente, concentra-se no esforço <strong>de</strong> discernir os princípios que regem a percepção<br />

dos mesmos, com o objetivo <strong>de</strong> atingir fórmulas mais explicativas e dar or<strong>de</strong>m à compreensão da<br />

realida<strong>de</strong>.<br />

A análise das formulações do sujeito passa, no entanto, pela compreensão das categorias<br />

não conscientes através das quais ele organiza seu universo. Trata-se, portanto, <strong>de</strong> conhecer essas<br />

categorias. Para tanto, é necessário <strong>de</strong>svendar noções <strong>de</strong>sconhecidas que se ocultam sob termos,<br />

todavia conhecidos, tomados à linguagem comum. Essas noções, chamadas categorias, são<br />

75


tomadas aqui no sentido <strong>de</strong> “instrumentos do pensamento”. Através <strong>de</strong>las, um grupo social<br />

expressa a concepção que tem do mundo em que vive: classifica (agrupa, distingue, relaciona) os<br />

objetos (seres, sentimentos, acontecimentos) que conhece e com os quais se relaciona. O<br />

<strong>de</strong>poimento dos jovens possibilita o acesso a uma enorme complexida<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações e posições,<br />

em jogo nesse espaço ocupado por pessoas no campo educacional e no trabalho.<br />

3.4.1 O valor da educação para a vida<br />

A educação tem sido consi<strong>de</strong>rada por muitos como valor essencial para o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento pessoal e social. Contudo, <strong>de</strong> forma abstrata e na ausência <strong>de</strong> políticas públicas<br />

estruturantes, a educação se assume, geralmente, como apenas uma “palavra da moda”, sem<br />

maiores conseqüências sociais. Por outro lado, observamos que a educação escolar não apresenta<br />

um projeto curricular consistente para o jovens, tendo gerado uma resistência passiva e ativa <strong>de</strong><br />

rejeição dos estudantes, o que vem provocando alarmantes índices <strong>de</strong> abandono da escola .<br />

Entretanto, observamos, no grupo <strong>de</strong> jovens estudantes do Colégio Estadual Horacio <strong>de</strong><br />

Macedo, uma surpreen<strong>de</strong>nte valorização da educação com força <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> e motivação para a<br />

busca do conhecimento como um “fim” para o seu <strong>de</strong>senvolvimento individual, e como “meio”<br />

<strong>de</strong> inserção qualificada no processo produtivo.. A categoria educação é fundamental na<br />

representação <strong>de</strong>stes jovens que participaram do <strong>programa</strong> educacional on<strong>de</strong> o Ensino Médio do<br />

Colégio Estadual Horacio <strong>de</strong> Macedo é articulado com o Ensino Técnico do CEFET-RJ.<br />

Referimo-nos a situações distintas da relevância da escola para o seu <strong>de</strong>senvolvimento<br />

pessoal e da socieda<strong>de</strong>. A importância do estudo é valorizada e consi<strong>de</strong>rada fundamental para<br />

seu crescimento, como também para melhoria da situação <strong>de</strong> vida. Porém, exige sacrifício que<br />

consi<strong>de</strong>ram valer a pena, pois, na sua perspectiva, garante conquistas materiais e <strong>de</strong> auto estima.<br />

Reconhecem que a educação está per<strong>de</strong>ndo o valor e que a escola pública vive uma crise<br />

com a ameaça <strong>de</strong> privatização. Há um reconhecimento geral do ensino <strong>de</strong> baixa qualida<strong>de</strong> das<br />

escolas estaduais, mas <strong>de</strong>tectam, em alguns professores, o interesse que garante o bom ensino do<br />

Colégio Estadual Prof. Horacio <strong>de</strong> Macedo.<br />

A escola faz diferença para alcançar coisas importantes para eles, e a educação é <strong>de</strong>cisiva<br />

para a questão <strong>de</strong> se o jovem terá um “futuro” e uma inserção favorável na socieda<strong>de</strong>. Para eles,<br />

76


o Ensino Médio <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> garante a base necessária para o prosseguimento nos estudos, e o<br />

Ensino Técnico <strong>de</strong>staca-se como um gran<strong>de</strong> diferencial na educação que receberam.<br />

3.4.2 A importância do ensino técnico<br />

O Ensino Técnico vive, no Brasil, um processo contraditório <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e finalida<strong>de</strong>,<br />

em que prevalece uma estrutura e concepção dualista da educação. Por um lado, representa uma<br />

modalida<strong>de</strong>, ou outra forma, <strong>de</strong> proposta educacional para o Ensino Médio. Nesse sentido, o<br />

Ensino Técnico po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado, <strong>de</strong>ntro da perspectiva da Educação Tecnológica, da qual a<br />

cultura técnica e o trabalho, como ativida<strong>de</strong>s criadoras, são componentes curriculares integrados<br />

à cultura geral. Sob outro aspecto, quando visto somente na perspectiva da formação profissional<br />

e preparação para o mercado <strong>de</strong> trabalho, assume uma finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> subordinação econômica e<br />

<strong>de</strong> relação unilateral da educação com o trabalho.<br />

A observação da percepção dos jovens trabalhadores po<strong>de</strong> nos ajudar a enten<strong>de</strong>r e<br />

superar essa visão dualista das finalida<strong>de</strong>s do Ensino Técnico e a sua relação com o trabalho em<br />

uma socieda<strong>de</strong> que não garante os direitos mínimos para o exercício da cidadania da maioria <strong>de</strong><br />

sua população. Consi<strong>de</strong>ra-se, na sua experiência, a diferença entre a finalida<strong>de</strong> e objetivo <strong>de</strong> seu<br />

<strong>de</strong>senvolvimento pessoal e social e os meios que po<strong>de</strong>m utilizar para superar sua situação <strong>de</strong><br />

vida. Nesse sentido, assumem o caráter “provisório” do trabalho como técnico e encaram o<br />

aspecto econômico como meio e estratégia <strong>de</strong> alcançar objetivos mais amplos.<br />

Para além <strong>de</strong> motivos econômicos, o Ensino Técnico aparece como uma estratégia<br />

fundamental para os jovens <strong>de</strong> aproveitar o conhecimento adquirido na escola para potencializar<br />

seu projeto <strong>de</strong> vida, através da inserção no mundo do trabalho <strong>de</strong> forma mais favorável.<br />

Reconhecem a importância da teoria, mas priorizam a ativida<strong>de</strong> prática, numa clara valorização<br />

<strong>de</strong> articulação do conhecimento como subjetivação e objetivação. Como estudantes, querem um<br />

conteúdo com significado, que possa não só enten<strong>de</strong>r como transformar a realida<strong>de</strong>.<br />

Para eles, o diferencial do Ensino Técnico em relação à formação do Médio não é<br />

somente possibilitar a inserção no trabalho como profissional e facilitar o emprego. O primeiro é<br />

visto como algo compensador, pela “boa” remuneração e reconhecimento social, sendo utilizado<br />

na sua vida como fator <strong>de</strong>cisivo e que potencializa sua trajetória escolar e no trabalho.<br />

77


Aqueles que abandonam o curso técnico reconhecem a dificulda<strong>de</strong> da inserção do<br />

jovem no trabalho. Em alguns casos, só percebem mais tar<strong>de</strong> a importância da Educação<br />

Profissional <strong>de</strong> nível Técnico e sentem arrependimento pela <strong>de</strong>sistência do curso. Vivem a<br />

experiência da exploração no trabalho <strong>de</strong>squalificado quando, sem uma profissão <strong>de</strong>finida, não<br />

realizam seus objetivos mais imediatos e seus planos <strong>de</strong> vida.<br />

Os jovens parecem perceber que a profissão <strong>de</strong> técnico eleva a qualida<strong>de</strong> da inserção no<br />

mercado <strong>de</strong> trabalho e possibilita uma posição, mesmo que transitória, mais favorável à<br />

realização <strong>de</strong> seus objetivos.A profissão <strong>de</strong> técnico <strong>de</strong> nível médio é uma possibilida<strong>de</strong> tanto <strong>de</strong><br />

realização profissional quanto <strong>de</strong> estratégia mediadora para atingir objetivos <strong>de</strong> educação e<br />

trabalho. Uma outra perspectiva do jovem é a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> financiar o Ensino Superior que,<br />

em alguns casos, <strong>de</strong>vido à situação sócio-econômica da família, só po<strong>de</strong>rá ser realizado pelo<br />

próprio trabalho remunerado do jovem.<br />

3.4.3 Emprego e profissão<br />

A diferenciação entre o emprego e a profissão <strong>de</strong>fine, para o jovem trabalhador, uma<br />

distinção fundamental na sua relação com o mundo do trabalho. O emprego aparentemente é<br />

consi<strong>de</strong>rado como uma ativida<strong>de</strong>, somente ligada à necessida<strong>de</strong> financeira, uma inserção instável<br />

e <strong>de</strong>squalificada, enquanto a profissão assume um valor social e <strong>de</strong> auto reconhecimento.<br />

O exercício da profissão <strong>de</strong> técnico facilita a estruturação <strong>de</strong> um plano <strong>de</strong> vida mais<br />

organizado e com “foco”.<br />

A profissão se contrapõe ao emprego <strong>de</strong>squalificado que submete o jovem a uma relação<br />

<strong>de</strong> trabalho precário, seja no ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> tempo <strong>de</strong> trabalho e da própria ativida<strong>de</strong> sem<br />

perspectiva <strong>de</strong> crescimento, ou como prática sem agregar conhecimento.<br />

O técnico é consi<strong>de</strong>rado um profissional especialista, com uma finalida<strong>de</strong> objetiva, que<br />

aplica conhecimento adquirido na sua ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalho. A escolha profissional do técnico,<br />

mesmo que não <strong>de</strong>finitiva, representa um “meio” <strong>de</strong> alcançar outras realizações e um “fim” para<br />

a satisfação <strong>de</strong> um trabalho reconhecido financeiramente e socialmente.<br />

78


3.4.4 Trabalho como reconhecimento social e autonomia<br />

O exercício profissional do jovem técnico aparece como uma oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

autonomia diante do controle familiar. e permite um reconhecimento social que <strong>de</strong>fine uma<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> marcante <strong>de</strong> forte auto estima e a sensação <strong>de</strong> pertencimento e valorização.<br />

O sentido da valorização e orgulho da família, ao fazer a comparação das gerações com<br />

os filhos, em sua trajetória <strong>de</strong> escolarização e inserção qualificada no trabalho, é significativo,<br />

tanto para os jovens quanto os familiares.<br />

A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> para po<strong>de</strong>r tomar <strong>de</strong>cisões próprias em relação a suas<br />

ativida<strong>de</strong>s ganha uma dimensão relevante quando o jovem adquire autonomia financeira pelo seu<br />

trabalho. O trabalho também po<strong>de</strong> significar realização pessoal e utilida<strong>de</strong> social, o que acarreta<br />

satisfação para o jovem trabalhador. Todavia, algumas vezes, aparece como forma intermediaria<br />

entre a realização pessoal e a obrigação <strong>de</strong> trabalho para sobrevivência, <strong>de</strong>vido às condições<br />

sociais e econômicas.<br />

3.4.5 Trabalho e continuida<strong>de</strong> dos estudos no ensino superior<br />

Apesar da valorização prioritária da necessida<strong>de</strong> dos jovens <strong>de</strong> inserção no mundo do<br />

trabalho, a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos no Ensino Superior aparece <strong>de</strong> forma muito contun<strong>de</strong>nte nos<br />

projetos <strong>de</strong> vida. A característica majoritária <strong>de</strong>sses jovens é o fato <strong>de</strong> estarem trabalhando e<br />

estudando ao mesmo tempo.<br />

Reconhecem que a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estar trabalhando e estudando <strong>de</strong> forma concomitante<br />

não representa a maioria dos estudantes <strong>de</strong> Ensino Superior das escola públicas, como também<br />

i<strong>de</strong>ntificam as enormes dificulda<strong>de</strong>s e exigências do fato <strong>de</strong> estarem estudando e trabalhando.<br />

Entretanto, o acúmulo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s é afirma-se como um sacrifício que vale a pena fazer pelas<br />

perspectivas do futuro. Assim, não surpreen<strong>de</strong> a opção <strong>de</strong> alguns <strong>de</strong> abandonar o emprego e<br />

investir na educação para uma posterior inserção no mundo do trabalho, em melhores condições<br />

79


e com maior i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> escolha profissional. Também não surpreen<strong>de</strong>m as diversas<br />

experiências profissionais, em áreas diferentes, entre a primeira profissão <strong>de</strong> nível médio e a<br />

profissão <strong>de</strong> nível superior.<br />

3.4.6 Futuro e planos <strong>de</strong> vida<br />

É comum ouvir afirmações <strong>de</strong> que a juventu<strong>de</strong> per<strong>de</strong>u a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pensar o futuro e<br />

se tornou imediatista em sua perspectiva <strong>de</strong> vida. No entanto, observamos uma força <strong>de</strong><br />

expectativas e sonhos nos jovens trabalhadores da pesquisa que, <strong>de</strong> alguma forma, surpreen<strong>de</strong> no<br />

que se refere à capacida<strong>de</strong> dos jovens <strong>de</strong> se organizarem em torno <strong>de</strong> um plano <strong>de</strong> vida que ainda<br />

aposta na educação escolarizada e no trabalho.<br />

Uma escola que ensina com qualida<strong>de</strong> e on<strong>de</strong> o professor assume a tarefa da educação<br />

com prazer e com respeito aos estudantes po<strong>de</strong> constituir-se em forte influência no futuro<br />

profissional e na trajetória <strong>de</strong> escolarização do jovem, inclusive no reconhecimento <strong>de</strong> gratidão e<br />

o interesse <strong>de</strong> seguir a profissão <strong>de</strong> educador.<br />

Em uma socieda<strong>de</strong> on<strong>de</strong> as pessoas per<strong>de</strong>ram a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sonhar, esses jovens<br />

trabalhadores representam uma esperança, pois eles reconhecem que a difícil questão social<br />

brasileira <strong>de</strong>riva do fato <strong>de</strong> que a socieda<strong>de</strong> oferece poucas oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> educação <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong> e trabalho qualificado. As dificulda<strong>de</strong>s não são <strong>de</strong> caráter individual, mas da falta <strong>de</strong><br />

propiciar uma escola a<strong>de</strong>quada para a juventu<strong>de</strong> e oferta <strong>de</strong> trabalho para todos. Quando um<br />

pouco <strong>de</strong>sta oferta educacional acontece, como é o caso do Colégio Estadual Horacio <strong>de</strong><br />

Macedo, o resultado é altamente positivo. Encontramos a maioria dos jovens com alegria,<br />

entusiasmo e com projetos <strong>de</strong> escolarização e trabalho com horizonte cada vez mais amplo.<br />

80


CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

A pesquisa teve como objetivo compreen<strong>de</strong>r a experiência <strong>de</strong> jovens oriundos da escola<br />

pública, em sua trajetória escolar e inserção no trabalho, a partir da conclusão e participação no<br />

<strong>programa</strong> educacional articulado entre a Educação Técnica <strong>de</strong> nível Médio do CEFET-RJ e o<br />

Ensino Médio do Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo. O movimento <strong>de</strong> apreensão e<br />

compreensão do objeto exposto nesta pesquisa conduz-nos, portanto, a algumas consi<strong>de</strong>rações<br />

finais, como um retorno ao concreto pensado. Ao longo <strong>de</strong>sse estudo, tecemos algumas<br />

consi<strong>de</strong>rações que po<strong>de</strong>m ser vistas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro capítulo. O que fazemos aqui representa<br />

uma agregação àquelas observações, consi<strong>de</strong>rando o caminhar da pesquisa e suas relações da<br />

teoria e do campo experimental.<br />

A relação da educação escolarizada com a formação para o trabalho na socieda<strong>de</strong><br />

brasileira vem ganhando importância, à medida que, por um lado, o trabalho tem reconhecida sua<br />

centralida<strong>de</strong> para a existência humana e para a vida em socieda<strong>de</strong> e, por outro lado, que o mundo<br />

da produção <strong>de</strong>manda por educação <strong>de</strong> trabalhadores com novo perfil e capacida<strong>de</strong>s.<br />

No Brasil, a preparação para o trabalho foi inserida na educação escolar no século XIX,<br />

voltando-se para os órfãos e <strong>de</strong>svalidos da “sorte”, em funções que exigiam mais a ativida<strong>de</strong><br />

manual do que a ativida<strong>de</strong> intelectual. Até então, o preparo para os ofícios se dava nos próprios<br />

locais <strong>de</strong> trabalho. Foi no início do século XX que a formação profissional escolar ganhou<br />

caráter regular, com as Escolas <strong>de</strong> Aprendizes e Artífices, no nível primário. Posteriormente a<br />

industrialização do país elevou o status da formação profissional, com a criação dos cursos<br />

técnicos <strong>de</strong> nível médio, na década <strong>de</strong> 1940. Porém, até hoje, aparecem concepções e práticas<br />

diferentes e contraditórias da relação da formação profissional e a educação geral.<br />

O Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ), em<br />

conseqüência da evolução histórica, transforma em CEFET, em 1978, a então Escola Técnica<br />

Fe<strong>de</strong>ral, mas continua a oferta, <strong>de</strong> forma significativa, do Ensino Técnico, e a busca <strong>de</strong><br />

aproximação da formação profissional com a educação geral regular. A socieda<strong>de</strong> encontra um<br />

espaço formativo público, gratuito e <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> forma especial e privilegiada <strong>de</strong> educação<br />

81


da juventu<strong>de</strong>. A forte <strong>de</strong>manda pelos cursos técnicos gerou, na década <strong>de</strong> 90, questões<br />

importantes sobre o perfil dos estudantes que obtinham acesso à oferta educacional do CEFET-<br />

RJ e a disputa do público a ser atendido pela instituição. A elitização do acesso promoveu a<br />

implementação <strong>de</strong> uma política <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização através <strong>de</strong> uma ação afirmativa para alunos<br />

oriundos das escolas públicas <strong>de</strong> Ensino Fundamental. O Pró-técnico e a criação do Colégio<br />

Estadual Prof. Horacio <strong>de</strong> Macedo, no espaço físico do CEFET-RJ, representam <strong>programa</strong>s e<br />

experiências marcantes na história institucional <strong>de</strong> valorização da escola pública, e no<br />

atendimento <strong>de</strong> uma população em situação adversa, sob o ponto <strong>de</strong> vista sócio econômico. Essa<br />

experiências <strong>de</strong>mandam estudos para sua compreensão e avaliação do impacto na vida das<br />

pessoas e na socieda<strong>de</strong>.<br />

Analisar a experiência dos jovens trabalhadores que participaram do <strong>programa</strong><br />

educacional articulado na oferta do Ensino Médio pelo Colégio Estadual Prof. Horacio Macedo<br />

com o Curso técnico pelo CEFET-RJ, em sua trajetória escolar e sua inserção no mundo do<br />

trabalho, possibilitou repensar teorias e análises da escola capitalista e da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> do acesso<br />

à escola pública <strong>de</strong> nível médio.<br />

Significou também perceber as reformas da Educação Profissional, na perspectiva da<br />

escola e dos estudantes, e o impacto que provocaram na escola e, em particular, na sua proposta<br />

pedagógica. Apesar dos interesses políticos nas <strong>de</strong>cisões e regulamentação da educação nacional,<br />

a realida<strong>de</strong> cotidiana da escola e dos jovens reconstrói a sua própria lógica e <strong>de</strong>fine seus próprios<br />

objetivos. Muitas vezes, infelizmente, há uma falta <strong>de</strong> linearida<strong>de</strong> entre os objetivos e as<br />

conseqüências e resultados da implementação <strong>de</strong> um projeto educacional com orientação da<br />

macro política.<br />

O Ensino Técnico representa uma estratégia dos jovens trabalhadores, muitas vezes<br />

imperceptíveis para gestores e legisladores educacionais. Sua importância para os setores<br />

populares relativizam questões que, do ponto <strong>de</strong> vista teórico, representariam uma subordinação<br />

aos interesses do capital, mas que, por outro lado, evi<strong>de</strong>nciam um chance <strong>de</strong> fortalecer os jovens<br />

trabalhadores em sua emancipação e <strong>de</strong>senvolvimento pessoal e coletivo. Nesse aspecto, a<br />

importante luta pelo Ensino Médio Integrado ao Técnico não <strong>de</strong>squalifica a experiência marcante<br />

dos jovens trabalhadores na proposta educacional da Educação Técnica concomitante ao Ensino<br />

médio em instituições diferentes, como é o caso do <strong>programa</strong> pesquisado.<br />

82


Nos <strong>de</strong>poimentos dos jovens, ficou bastante claro que a profissão <strong>de</strong> técnico favorece sua<br />

inserção na socieda<strong>de</strong> e possibilita e fortalece sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> continuar os estudos no Ensino<br />

Superior. A falta da profissão <strong>de</strong> nível médio para os jovens pobres po<strong>de</strong> não só interromper sua<br />

trajetória <strong>de</strong> estudante como, principalmente, sua inserção no trabalho se dá <strong>de</strong> forma precária e<br />

<strong>de</strong>svalorizada.<br />

Também verificamos que a reforma da Educação Profissional implementada no governo<br />

Fernando Henrique Cardoso, na década <strong>de</strong> 90, com clara subordinação a interesses do capital,<br />

provocou a extinção do <strong>programa</strong> Pró-técnico e, ao mesmo tempo, motivou e gerou, na<br />

contradição, um novo processo institucional na criação da Escola Estadual prof. Horacio <strong>de</strong><br />

Macedo, o que possibilitou, no meu entendimento, uma importante oferta educacional <strong>de</strong><br />

interesse dos trabalhadores. È curioso observar que a justificativa <strong>de</strong> tal reforma dá uma forte<br />

relevância à distorção do público atendido nos CEFET’s e Escolas técnicas fe<strong>de</strong>rais. Apropria-se<br />

<strong>de</strong> um discurso aparentemente favorável aos setores populares para implementar uma política,<br />

que, em ultima instância, dificulta o acesso dos jovens trabalhadores a uma educação <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong> ampla e <strong>de</strong>mocrática.<br />

É verda<strong>de</strong> que o acesso às escolas da re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> já há algum tempo tinha se<br />

transformado em privilégio, quase exclusivo, dos filhos da classe média, que buscam nessas<br />

escolas um Ensino Médio público <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> e que lhes garanta o acesso ao Ensino Superior.<br />

A perspectiva econômica prevalecente na reforma da Educação Profissional, que alegou o alto<br />

custo do aluno <strong>de</strong>sse sistema, e que, por serem esses alunos provenientes da classe média, não<br />

estariam ingressando no mercado <strong>de</strong> trabalho como técnicos, mas preferencialmente dirigindo-se<br />

ao Ensino Superior. Daí conclui-se que, como os filhos dos trabalhadores foram afastados das<br />

escolas fe<strong>de</strong>rais, seria preciso reformular os cursos técnicos para “<strong>de</strong>mocratizar” seu acesso e<br />

voltá-los para o atendimento daqueles que <strong>de</strong>veriam ser seus verda<strong>de</strong>iros <strong>de</strong>stinatários.<br />

Em nome do que, aparentemente, seria uma forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização e justiça social, em<br />

que os mais pobres teriam seu direito no Ensino Técnico, re<strong>de</strong>fine-se a estrutura do sistema<br />

educacional brasileiro, conjugando-se as reformas do Ensino Médio e do Ensino Técnico no<br />

objetivo comum <strong>de</strong> contenção do acesso ao Ensino Superior. Ao mesmo tempo, tenta-se<br />

<strong>de</strong>sconfigurar a proposta em andamento <strong>de</strong> uma Educação Média integrada aos conhecimentos<br />

tecnológicos.<br />

83


O processo seletivo adotado não é questionado, nem se articula o aumento da procura das<br />

escolas da re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> com a <strong>de</strong>teriorização e insuficiência da ofertas do Ensino Médio das<br />

escolas da re<strong>de</strong> estadual. O argumento <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização do acesso, razão manifesta da reforma,<br />

não se sustenta como justificativa, na simples impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratizar efetivamente o<br />

acesso <strong>de</strong> uma oferta reduzida.<br />

O dualismo implementado, mais sutil, explicitado na nova Educação Profissional que é<br />

<strong>de</strong>stinada ao atendimento <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada classe social, motivou a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> melhor<br />

perceber como se concretizou no passado a dualida<strong>de</strong> estrutural do sistema <strong>de</strong> educação<br />

brasileiro. O contraditório é que o dualismo, no ponto <strong>de</strong> vista estrutural, se <strong>de</strong>slocava para o<br />

Ensino Superior e, no meu entendimento, tinha como objetivo <strong>de</strong>struir o Ensino Técnico como<br />

projeto <strong>de</strong> educação média escolar para o jovem trabalhador. Essa argumentação se sustenta à<br />

medida que não se propunha uma estrutura dual no nível médio, sendo o Técnico complementar<br />

ao Médio, preferencialmente na forma subseqüente. Por outro lado, induzia um curso técnico não<br />

escolar, <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> da esfera privada e a<strong>de</strong>quado às necessida<strong>de</strong>s do mercado <strong>de</strong><br />

trabalho.<br />

O Ensino Técnico articulado com o Ensino Médio, preferencialmente Integrado,<br />

representa para a juventu<strong>de</strong> uma possibilida<strong>de</strong> que não só colabora na sua questão da<br />

sobrevivência econômica e inserção social, como também uma proposta educacional, que na<br />

integração <strong>de</strong> campos do saber, torna-se fundamental para os jovens na perspectiva <strong>de</strong> seu<br />

<strong>de</strong>senvolvimento pessoal e na transformação da realida<strong>de</strong> social em que estão inseridos. A<br />

relação e integração da teoria e prática, do trabalho manual e intelectual, da cultura técnica e da<br />

cultura geral, interiorização e objetivação vão representar um avanço conceitual e a<br />

materialização <strong>de</strong> uma proposta pedagógica avançada em direção a politecnia como configuração<br />

da educação média <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> <strong>pós</strong>-capitalista.<br />

Nesse contexto, a pesquisa procura mostrar como isso se estabelece a partir dos<br />

<strong>de</strong>poimentos dos jovens trabalhadores, sujeitos participantes da oferta <strong>de</strong> um <strong>programa</strong> <strong>de</strong><br />

Educação Técnica concomitante ao Ensino Médio. Procurei sistematizar referências teóricas que<br />

possam colaborar na compreensão da experiência estudada e obter dados objetivos da trajetória<br />

escolar e no trabalho <strong>de</strong> jovens <strong>de</strong> escolas pública inseridos no <strong>programa</strong>. Acrescentam-se alguns<br />

relatos dos jovens que caracterizam sua percepção da questão, e po<strong>de</strong>m possibilitar enten<strong>de</strong>r<br />

84


melhor o significado da experiência no qual estão <strong>de</strong>finindo e sendo <strong>de</strong>finidos pela realida<strong>de</strong><br />

social.<br />

Os estudos realizados e os dados obtidos procuraram respon<strong>de</strong>r às questões colocadas na<br />

pesquisa que po<strong>de</strong>m assim ser resumida:<br />

a) Em relação à i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> sócio-familiar:<br />

Os jovens trabalhadores participantes da pesquisa se caracterizam <strong>de</strong> forma<br />

diferenciada, se comparados com os dados nacionais dos alunos do Curso<br />

Técnico: Na questão <strong>de</strong> gênero, sobressai a participação feminina <strong>de</strong> 65%,<br />

enquanto, em nível nacional, não alcança 45%, e a raça/cor preta ou parda <strong>de</strong> 47%<br />

dos jovens pesquisados supera em muito os 26% no Ensino Técnico, em nível<br />

nacional. Po<strong>de</strong>mos concluir que o <strong>programa</strong> se configura com uma ação <strong>de</strong><br />

inclusão <strong>de</strong> grupos que, normalmente, não têm acesso ao Ensino Técnico, grupos<br />

estes <strong>de</strong> moradores <strong>de</strong> bairros com predominância <strong>de</strong> pobres e <strong>de</strong> famílias com<br />

baixa escolarida<strong>de</strong>, a maioria sem o ensino Fundamental completo, e com<br />

ocupação <strong>de</strong>squalificada no mundo do trabalho. O trabalho é consi<strong>de</strong>rado <strong>de</strong><br />

forma diferenciada, muitas vezes, como causa ou efeito na sua relação com a<br />

educação, e como necessida<strong>de</strong> material ou realização pessoal em outros<br />

momentos, importante fator no ponto <strong>de</strong> vista individual e coletivo.<br />

b) Em relação à permanência:<br />

A permanência dos jovens pesquisados, <strong>de</strong> 72,86% nos cursos técnicos, é alta<br />

comparada à gran<strong>de</strong> evasão, em torno <strong>de</strong> 60%, ocorrida no Ensino Técnico na<br />

re<strong>de</strong> <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong>, a<strong>pós</strong> a separação do Ensino Médio do Técnico. Os que abandonam<br />

<strong>de</strong>claram sua incompatibilida<strong>de</strong> e a não adaptação ao curso técnico que estavam<br />

cursando.<br />

c) Em relação às expectativas e trajetórias:<br />

Observa-se que a maioria dos jovens encontra-se no mercado <strong>de</strong> trabalho, e<br />

um grupo gran<strong>de</strong> está também estudando, sendo que a maioria estuda e trabalha<br />

ao mesmo tempo. Os dados nacionais, em que apenas 18,7% dos jovens entre 15 a<br />

85


24 anos estão estudando e trabalhando, são muito menores do que os 49,2%, nesta<br />

situação dos jovens pesquisados. Isso po<strong>de</strong>ria significar o valor agregado do<br />

ensino técnico que possibilita não só um trabalho qualificado, mas uma<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inserção no ensino superior. A maioria exerce a profissão <strong>de</strong><br />

técnico e estuda em instituições públicas. Os cursos são diversos, com tendência a<br />

estabelecer relação aos cursos técnicos realizados. Uma das conclusões possíveis<br />

neste estudo é <strong>de</strong> que a participação no curso técnico não só efetivamente<br />

melhorou a vida social e econômica das pessoas/famílias, como ampliou o<br />

horizonte e os sonhos das pessoas. A perspectiva <strong>de</strong> mais educação e <strong>de</strong> melhoria<br />

profissional é extremamente relevante no resultado da pesquisa. Também chama<br />

atenção o registro da in<strong>de</strong>pendência financeira frente à família e o<br />

reconhecimento social a partir <strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>ntificação profissional com técnico.<br />

d) Em relação à mobilida<strong>de</strong> familiar:<br />

Fica evi<strong>de</strong>nte, nos estudos, o diferencial no nível <strong>de</strong> escolarização e<br />

inserção qualificado no trabalho, quando comparando os jovens com os<br />

familiares. A mobilida<strong>de</strong> social, nesse caso, acontece quando o jovem se insere<br />

em uma ocupação qualificada diferente da ocupação dos pais e na discrepância<br />

entre a escolarida<strong>de</strong> dos pais (a maioria com Ensino Fundamental incompleto)<br />

com a escolarização do jovem (Ensino Médio completo e em torno <strong>de</strong> 60% no<br />

Ensino Superior). A percepção dos pesquisados valoriza, sem registro ao<br />

contrário, o Ensino Técnico como estratégia positiva para o seu <strong>de</strong>senvolvimento<br />

pessoal na sua vida profissional e educacional.<br />

A pesquisa, ainda que ancorada numa realida<strong>de</strong> particular, po<strong>de</strong> perfeitamente servir para<br />

analisar outras iniciativas que relacionam a educação e o trabalho <strong>de</strong> jovens trabalhadores. A<br />

presente dissertação não se constitui numa palavra final sobre o tema, mas <strong>de</strong>seja trazer uma<br />

contribuição para ações e discussões acerca da educação e sua relação com o trabalho, para a<br />

juventu<strong>de</strong> brasileira.<br />

Entretanto, há uma questão metodológica que parece ser <strong>de</strong>cisiva para estudos<br />

posteriores: o reconhecimento da importância das escutas dos jovens alunos-trabalhadores.<br />

86


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91


ANEXO 1<br />

Q U E S T I O N Á R I O<br />

Nome: ____________________________________________________________<br />

Data <strong>de</strong> nascimento: _________________<br />

En<strong>de</strong>reço:______________________________________ Bairro:____________<br />

Raça/Etnia: Branca( ) Preta( ) Parda( ) Outra( )<br />

Casado: sim( ) não( ) filhos: sim( ) não( )<br />

Profissão do Pai(responsável):_____________________________<br />

Profissão da Mãe (responsável):____________________________<br />

Fundamental Médio Técnico Superior Outro<br />

Escolarida<strong>de</strong> do Pai ( ) ( ) ( ) ( ) ( )<br />

Escolarida<strong>de</strong> da Mãe ( ) ( ) ( ) ( ) ( )<br />

Marque os itens <strong>de</strong> sua realida<strong>de</strong> em 2000 e 2006:<br />

2000 2006<br />

.morava com os pais não( ) sim( ) não( ) sim( ).<br />

.trabalhava não ( ) sim( ) não( ) sim( )<br />

.TV na sua casa não( ) sim( ) não( ) sim( )<br />

. Automóvel não( ) sim( ) não( ) sim( )<br />

. Computador não( ) sim( ) não( ) sim( )<br />

. Telefone celular não( ) sim( ) não( ) sim( )<br />

Número <strong>de</strong> pessoas que moram na sua casa: __________<br />

Trabalha: sim( ) não( )<br />

On<strong>de</strong>:________________ Função:______________________<br />

O que você acha do seu trabalho?______________________________________<br />

_________________________________________________________________<br />

Estuda: sim( ) não( )<br />

On<strong>de</strong>: ________________Curso:_____________________<br />

O que você acha da sua escola ou curso? _______________________________<br />

_________________________________________________________________<br />

Você concluiu o Ensino Médio no C. E. P. Horacio Macedo? sim( ) não( )<br />

Você iniciou o curso técnico no CEFET-RJ? Sim( ) não( )<br />

Você abandonou o curso técnico? Sim( ) não( )<br />

Porque:___________________________________________________________<br />

Você concluiu o Curso Técnico no CEFET/RJ? sim( ) não( )<br />

Qual o Curso Técnico?__________________________Ano <strong>de</strong> conclusão:_____<br />

Você faz estágio:_________________Qual empresa:______________________<br />

Como você avalia a importância do Curso Técnico para a sua vida?<br />

Qual a sua perspectiva para o futuro?<br />

Dê um <strong>de</strong>poimento sobre sua vida a<strong>pós</strong> a saída da escola.<br />

92


ANEXO 2<br />

PEQUENA CRONOLOGIA DO CEFET-RJ<br />

1918 (9 <strong>de</strong> nov.)- inauguração da Escola Normal <strong>de</strong> Artes e Ofícios Wenceslau Brás pela<br />

prefeitura do Distrito Fe<strong>de</strong>ral.<br />

1919 (jun/nov)- passagem da Wenceslau Brás para o governo <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong>.<br />

1919 (ago)- início das ativida<strong>de</strong>s escolares da Wenceslau Brás.<br />

1920 (mar)- reabertura das aulas, já subordinada ao governo <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong>.<br />

1937 (set)- encerramento das ativida<strong>de</strong>s escolares para início das obras.<br />

1942 (15 <strong>de</strong> jul)- inauguração da nova escola, a Escola Técnica Nacional (ETN).<br />

1944 (7 <strong>de</strong> out)- inauguração oficial da ETN, com a presença <strong>de</strong> Getúlio Vargas.<br />

1965- a ETN passa a ser <strong>de</strong>nominada <strong>de</strong> Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral da Guanabara.<br />

1967- nova <strong>de</strong>nominação, Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral Celso Suckow da Fonseca (ETF-CSF).<br />

1978- A ETF se transforma em Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica Celso Suckow da<br />

Fonseca (CEFET-RJ).<br />

93


RESOLUÇÃO CNE/CEB N.º 04/99<br />

ANEXO 3<br />

94<br />

Institui as Diretrizes Curriculares<br />

Nacionais para a Educação Profissional<br />

<strong>de</strong> Nível Técnico.<br />

O Presi<strong>de</strong>nte da Câmara <strong>de</strong> Educação Básica do Conselho Nacional <strong>de</strong> Educação, no<br />

uso <strong>de</strong> suas atribuições legais, e <strong>de</strong> conformida<strong>de</strong> com o disposto na alínea “c” do § 1º<br />

do artigo 9º da Lei 4.024, <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro<strong>de</strong> 1961, com a redação dada pela Lei<br />

9.131, <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1995, nos artigos 39 a 42 e no § 2º do artigo 36 da Lei<br />

9.394, <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1996 e no Decreto Fe<strong>de</strong>ral 2.208, <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1997,<br />

e com fundamento no Parecer CNE/CEB 16/99, homologado pelo Senhor Ministro da<br />

Educação em 25 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1999,<br />

RESOLVE:<br />

Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a<br />

Educação Profissional <strong>de</strong> Nível Técnico.<br />

Parágrafo único. A educação profissional, integrada às diferentes formas <strong>de</strong> educação,<br />

ao trabalho, à ciência e à tecnologia, objetiva garantir ao cidadão o direito ao<br />

permanente <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> aptidões para a vida produtiva e social.<br />

Art. 2º Para os fins <strong>de</strong>sta Resolução, enten<strong>de</strong>-se por diretriz o conjunto articulado <strong>de</strong><br />

princípios, critérios, <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> competências profissionais gerais do técnico por área<br />

profissional e procedimentos a serem observados pelos sistemas <strong>de</strong> ensino e pelas<br />

escolas na organização e no planejamento dos cursos <strong>de</strong> nível técnico.<br />

Art. 3º São princípios norteadores da educação profissional <strong>de</strong> nível técnico os<br />

enunciados no artigo 3.º da LDB, mais os seguintes:<br />

I - in<strong>de</strong>pendência e articulação com o ensino médio;<br />

II - respeito aos valores estéticos, políticos e éticos;<br />

III - <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> competências para a laborabilida<strong>de</strong>;<br />

IV - flexibilida<strong>de</strong>, interdisciplinarida<strong>de</strong> e contextualização;<br />

V - i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> dos perfis profissionais <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> curso;<br />

VI - atualização permanente dos cursos e currículos;<br />

VII - autonomia da escola em seu projeto pedagógico.<br />

Art. 4º São critérios para a organização e o planejamento <strong>de</strong> cursos:<br />

I - atendimento às <strong>de</strong>mandas dos cidadãos, do mercado e da socieda<strong>de</strong>;<br />

II - conciliação das <strong>de</strong>mandas i<strong>de</strong>ntificadas com a vocação e a capacida<strong>de</strong> institucional<br />

da escola ou da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino.


Art. 5º A educação profissional <strong>de</strong> nível técnico será organizada por áreas profissionais,<br />

constantes dos quadros anexos, que incluem as respectivas caracterizações,<br />

competências profissionais gerais e cargas horárias mínimas <strong>de</strong> cada habilitação.<br />

Parágrafo único. A organização referida neste artigo será atualizada pelo Conselho<br />

Nacional <strong>de</strong> Educação, por proposta do Ministério da Educação, que, para tanto,<br />

estabelecerá processo permanente, com a participação <strong>de</strong> educadores, empregadores<br />

e trabalhadores.<br />

Art. 6º Enten<strong>de</strong>-se por competência profissional a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mobilizar, articular e<br />

colocar em ação valores, conhecimentos e habilida<strong>de</strong>s necessários para o<br />

<strong>de</strong>sempenho eficiente e eficaz <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s requeridas pela natureza do trabalho.<br />

Parágrafo único. As competências requeridas pela educação profissional, consi<strong>de</strong>rada<br />

a natureza do trabalho, são as:<br />

I - competências básicas, constituídas no ensino fundamental e médio;<br />

II - competências profissionais gerais, comuns aos técnicos <strong>de</strong> cada área;<br />

III - competências profissionais específicas <strong>de</strong> cada qualificação ou habilitação.<br />

Art. 7º Os perfis profissionais <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> qualificação, <strong>de</strong> habilitação e <strong>de</strong><br />

especialização profissional <strong>de</strong> nível técnico serão estabelecidos pela escola,<br />

consi<strong>de</strong>radas as competências indicadas no artigo anterior.<br />

§ 1º Para subsidiar as escolas na elaboração dos perfis profissionais <strong>de</strong> conclusão e na<br />

organização e planejamento dos cursos, o Ministério da Educação divulgará<br />

referenciais curriculares por área profissional.<br />

§ 2º Po<strong>de</strong>rão ser organizados cursos <strong>de</strong> especialização <strong>de</strong> nível técnico, vinculados a<br />

<strong>de</strong>terminada qualificação ou habilitação profissional, para o atendimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandas<br />

específicas.<br />

§ 3º Demandas <strong>de</strong> atualização e <strong>de</strong> aperfeiçoamento <strong>de</strong> profissionais po<strong>de</strong>rão ser<br />

atendidas por meio <strong>de</strong> cursos ou <strong>programa</strong>s <strong>de</strong> livre oferta.<br />

Art. 8º A organização curricular, consubstanciada no plano <strong>de</strong> curso, é prerrogativa e<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada escola.<br />

§ 1º O perfil profissional <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong>fine a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do curso.<br />

§ 2º Os cursos po<strong>de</strong>rão ser estruturados em etapas ou módulos:<br />

I - com terminalida<strong>de</strong> correspon<strong>de</strong>nte a qualificações profissionais <strong>de</strong> nível técnico<br />

i<strong>de</strong>ntificadas no mercado <strong>de</strong> trabalho;<br />

II - sem terminalida<strong>de</strong>, objetivando estudos subseqüentes.<br />

95


§ 3º As escolas formularão, participativamente, nos termos dos artigos 12 e 13 da LDB,<br />

seus projetos pedagógicos e planos <strong>de</strong> curso, <strong>de</strong> acordo com estas diretrizes.<br />

Art. 9º A prática constitui e organiza a educação profissional e inclui, quando<br />

necessário, o estágio supervisionado realizado em empresas e outras instituições.<br />

§ 1º A prática profissional será incluída nas cargas horárias mínimas <strong>de</strong> cada<br />

habilitação.<br />

§ 2º A carga horária <strong>de</strong>stinada ao estágio supervisionado <strong>de</strong>verá ser acrescida ao<br />

mínimo estabelecido para o respectivo curso.<br />

§ 3º A carga horária e o plano <strong>de</strong> realização do estágio supervisionado, necessário em<br />

função da natureza da qualificação ou habilitação profissional, <strong>de</strong>verão ser explicitados<br />

na organização curricular constante do plano <strong>de</strong> curso.<br />

Art. 10. Os planos <strong>de</strong> curso, coerentes com os respectivos projetos pedagógicos, serão<br />

submetidos à aprovação dos órgãos competentes dos sistemas <strong>de</strong> ensino, contendo:<br />

I - justificativa e objetivos;<br />

II - requisitos <strong>de</strong> acesso;<br />

II - perfil profissional <strong>de</strong> conclusão;<br />

IV - organização curricular;<br />

V - critérios <strong>de</strong> aproveitamento <strong>de</strong> conhecimentos e experiências anteriores;<br />

VI - critérios <strong>de</strong> avaliação;<br />

VII - instalações e equipamentos;<br />

VIII - pessoal docente e técnico;<br />

IX - certificados e diplomas.<br />

Art. 11. A escola po<strong>de</strong>rá aproveitar conhecimentos e experiências anteriores, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

que diretamente relacionados com o perfil profissional <strong>de</strong> conclusão da respectiva<br />

qualificação ou habilitação profissional, adquiridos:<br />

I - no ensino médio;<br />

II - em qualificação profissional e etapas ou módulos <strong>de</strong> nível técnico concluídos em<br />

outros cursos;<br />

III - em cursos <strong>de</strong> educação profissional <strong>de</strong> nível básico, mediante avaliação do aluno;<br />

IV - no trabalho ou por outros meios informais, mediante avaliação do aluno;<br />

V - e reconhecidos em processos formais <strong>de</strong> certificação profissional.<br />

Art.12. Po<strong>de</strong>rão ser implementados cursos e currículos experimentais em áreas<br />

profissionais não constantes dos quadros anexos referidos no artigo 5º <strong>de</strong>sta<br />

Resolução, ajustados ao disposto nestas diretrizes e previamente aprovados pelo<br />

órgão competente do respectivo sistema <strong>de</strong> ensino.<br />

Art. 13. O Ministério da Educação organizará cadastro nacional <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> educação<br />

profissional <strong>de</strong> nível técnico para registro e divulgação em âmbito nacional.<br />

96


Parágrafo único. Os planos <strong>de</strong> curso aprovados pelos órgãos competentes dos<br />

respectivos sistemas <strong>de</strong> ensino serão por estes inseridos no cadastro nacional <strong>de</strong><br />

cursos <strong>de</strong> educação profissional <strong>de</strong> nível técnico.<br />

Art. 14. As escolas expedirão e registrarão, sob sua responsabilida<strong>de</strong>, os diplomas <strong>de</strong><br />

técnico, para fins <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> nacional, sempre que seus planos <strong>de</strong> curso estejam<br />

inseridos no cadastro nacional <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> educação profissional <strong>de</strong> nível técnico<br />

referido no artigo anterior.<br />

§ 1º A escola responsável pela última certificação <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado itinerário <strong>de</strong><br />

formação técnica expedirá o correspon<strong>de</strong>nte diploma, observado o requisito <strong>de</strong><br />

conclusão do ensino médio.<br />

§ 2º Os diplomas <strong>de</strong> técnico <strong>de</strong>verão explicitar o correspon<strong>de</strong>nte título <strong>de</strong> técnico na<br />

respectiva habilitação profissional, mencionando a área à qual a mesma se vincula.<br />

§ 3º Os certificados <strong>de</strong> qualificação profissional e <strong>de</strong> especialização profissional<br />

<strong>de</strong>verão explicitar o título da ocupação certificada.<br />

§ 4º Os históricos escolares que acompanham os certificados e diplomas <strong>de</strong>verão<br />

explicitar, também, as competências <strong>de</strong>finidas no perfil profissional <strong>de</strong> conclusão do<br />

curso.<br />

Art. 15. O Ministério da Educação, em regime <strong>de</strong> colaboração com os sistemas <strong>de</strong><br />

ensino, promoverá processo nacional <strong>de</strong> avaliação da educação profissional <strong>de</strong> nível<br />

técnico, garantida a divulgação dos resultados.<br />

Art. 16. O Ministério da Educação, conjuntamente com os <strong>de</strong>mais órgãos fe<strong>de</strong>rais das<br />

áreas pertinentes, ouvido o Conselho Nacional <strong>de</strong> Educação, organizará um sistema<br />

nacional <strong>de</strong> certificação profissional baseado em competências.<br />

§ 1º Do sistema referido neste artigo participarão representantes dos trabalhadores,<br />

dos empregadores e da comunida<strong>de</strong> educacional.<br />

§ 2º O Conselho Nacional <strong>de</strong> Educação, por proposta do Ministério da Educação, fixará<br />

normas para o cre<strong>de</strong>nciamento <strong>de</strong> instituições para o fim específico <strong>de</strong> certificação<br />

profissional.<br />

Art. 17. A preparação para o magistério na educação profissional <strong>de</strong> nível técnico se<br />

dará em serviço, em cursos <strong>de</strong> licenciatura ou em <strong>programa</strong>s especiais.<br />

Art. 18. A observância <strong>de</strong>stas diretrizes será obrigatória a partir <strong>de</strong> 2001, sendo<br />

facultativa no período <strong>de</strong> transição, compreendido entre a publicação <strong>de</strong>sta Resolução<br />

e o final do ano 2000.<br />

97


§ 1º No período <strong>de</strong> transição, as escolas po<strong>de</strong>rão oferecer aos seus alunos, com as<br />

adaptações necessárias, opção por cursos organizados nos termos <strong>de</strong>sta Resolução.<br />

§ 2º Fica ressalvado o direito <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> cursos organizados com base no<br />

Parecer CFE n.º 45, <strong>de</strong> 12 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1972, e regulamentações subseqüentes, aos<br />

alunos matriculados no período <strong>de</strong> transição.<br />

Art. 19. Esta Resolução entra em vigor na data <strong>de</strong> sua publicação, revogadas as<br />

disposições em contrário, em especial o Parecer CFE n.º 45/72 e as regulamentações<br />

subseqüentes, incluídas as referentes à instituição <strong>de</strong> habilitações profissionais pelos<br />

Conselhos <strong>de</strong> Educação.<br />

ULYSSES DE OLIVEIRA PANISSET<br />

Presi<strong>de</strong>nte da Câmara <strong>de</strong> Educação Básica<br />

98


ANEXO 4<br />

Decreto ° 5.15 4 <strong>de</strong> 23 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 2004<br />

Regulamenta o § 2° do at. 36 e os arts. 39 a 41 da lei n° 9.394 <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong><br />

1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional e dá outras<br />

providências<br />

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso<br />

IV, da Constituição,<br />

DECRETA:<br />

Art. 1º A educação profissional, prevista no art. 39 da Lei no 9.394, <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro<br />

<strong>de</strong> 1996 (Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da Educação Nacional), observadas as diretrizes<br />

curriculares nacionais <strong>de</strong>finidas pelo Conselho Nacional <strong>de</strong> educação, será<br />

<strong>de</strong>senvolvida por meio <strong>de</strong> cursos e <strong>programa</strong>s <strong>de</strong>:<br />

I - formação inicial e continuada <strong>de</strong> trabalhadores;<br />

II - educação profissional técnica <strong>de</strong> nível médio; e<br />

III - educação profissional tecnológica <strong>de</strong> <strong>graduação</strong> e <strong>de</strong> <strong>pós</strong>-<strong>graduação</strong>.<br />

Art. 2º A educação profissional observará as seguintes premissas:<br />

I - organização, por áreas profissionais, em função da estrutura sócioocupacional<br />

e tecnológica;<br />

II - articulação <strong>de</strong> esforços das áreas da educação, do trabalho e emprego, e<br />

da ciência e tecnologia.<br />

Art. 3º Os cursos e <strong>programa</strong>s <strong>de</strong> formação inicial e continuada <strong>de</strong> trabalhadores,<br />

referidos no inciso I do art. 1o, incluídos a capacitação, o aperfeiçoamento, a<br />

especialização e a atualização, em todos os níveis <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>rão ser<br />

ofertados segundo itinerários formativos, objetivando o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> aptidões<br />

para a vida produtiva e social.<br />

§ 1o Para fins do disposto no caput consi<strong>de</strong>ra-se itinerário formativo o conjunto <strong>de</strong><br />

etapas que compõem a organização da educação profissional em uma <strong>de</strong>terminada<br />

área, possibilitando o aproveitamento contínuo e articulado dos estudos.<br />

§ 2o Os cursos mencionados no caput articular-se-ão, preferencialmente, com os<br />

cursos <strong>de</strong> educação <strong>de</strong> jovens e adultos, objetivando a qualificação para o trabalho e a<br />

elevação do nível <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong> do trabalhador, o qual, a<strong>pós</strong> a conclusão com<br />

aproveitamento dos referidos cursos, fará jus a certificados <strong>de</strong> formação inicial ou<br />

continuada para o trabalho.<br />

Art. 4o A educação profissional técnica <strong>de</strong> nível médio, nos termos dispostos no § 2o do<br />

art. 36, art. 40 e parágrafo único do art. 41 da Lei no 9.394, <strong>de</strong> 1996, será <strong>de</strong>senvolvida<br />

<strong>de</strong> forma articulada com o ensino médio, observados:<br />

99


I - os objetivos contidos nas diretrizes curriculares nacionais <strong>de</strong>finidas pelo Conselho<br />

Nacional <strong>de</strong> Educação;<br />

II - as normas complementares dos respectivos sistemas <strong>de</strong> ensino; e<br />

III - as exigências <strong>de</strong> cada instituição <strong>de</strong> ensino, nos termos <strong>de</strong> seu projeto pedagógico.<br />

§ 1o A articulação entre a educação profissional técnica <strong>de</strong> nível médio e o ensino<br />

médio dar-se-á <strong>de</strong> forma:<br />

I - integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental,<br />

sendo o curso planejado <strong>de</strong> modo a conduzir o aluno à habilitação profissional técnica<br />

<strong>de</strong> nível médio, na mesma instituição <strong>de</strong> ensino, contando com matrícula única para<br />

cada aluno;<br />

II - concomitante, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental<br />

ou esteja cursando o ensino médio, na qual a complementarida<strong>de</strong> entre a educação<br />

profissional técnica <strong>de</strong> nível médio e o ensino médio pressupõe a existência <strong>de</strong><br />

matrículas distintas para cada curso, po<strong>de</strong>ndo ocorrer:<br />

a) na mesma instituição <strong>de</strong> ensino, aproveitando-se as oportunida<strong>de</strong>s educacionais<br />

disponíveis;<br />

b) em instituições <strong>de</strong> ensino distintas, aproveitando-se as oportunida<strong>de</strong>s educacionais<br />

disponíveis; ou<br />

c) em instituições <strong>de</strong> ensino distintas, mediante convênios <strong>de</strong> intercomplementarida<strong>de</strong>,<br />

visando o planejamento e o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> projetos pedagógicos unificados;<br />

III - subseqüente, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino<br />

médio.<br />

§ 2o Na hipótese prevista no inciso I do § 1o, a instituição <strong>de</strong> ensino <strong>de</strong>verá, observados<br />

o inciso I do art. 24 da Lei no 9.394, <strong>de</strong> 1996, e as diretrizes curriculares nacionais para<br />

a educação profissional técnica <strong>de</strong> nível médio, ampliar a carga horária total do curso, a<br />

fim <strong>de</strong> assegurar, simultaneamente, o cumprimento das finalida<strong>de</strong>s estabelecidas para<br />

a formação geral e as condições <strong>de</strong> preparação para o exercício <strong>de</strong> profissões<br />

técnicas.<br />

Art. 5o Os cursos <strong>de</strong> educação profissional tecnológica <strong>de</strong> <strong>graduação</strong> e <strong>pós</strong><strong>graduação</strong><br />

organizar-se-ão, no que concerne aos objetivos, características e duração, <strong>de</strong> acordo<br />

com as diretrizes curriculares nacionais <strong>de</strong>finidas pelo Conselho Nacional <strong>de</strong> educação.<br />

Art. 6o Os cursos e <strong>programa</strong>s <strong>de</strong> educação profissional técnica <strong>de</strong> nível médio e os<br />

cursos <strong>de</strong> educação profissional tecnológica <strong>de</strong> <strong>graduação</strong>, quando estruturados e<br />

organizados em etapas com terminalida<strong>de</strong>, incluirão saídas intermediárias, que<br />

possibilitarão a obtenção <strong>de</strong> certificados <strong>de</strong> qualificação para o trabalho a<strong>pós</strong> sua<br />

conclusão com aproveitamento.<br />

§ 1o Para fins do disposto no caput consi<strong>de</strong>ra-se etapa com terminalida<strong>de</strong> a conclusão<br />

intermediária <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> educação profissional técnica <strong>de</strong> nível médio ou <strong>de</strong> cursos<br />

<strong>de</strong> educação profissional tecnológica <strong>de</strong> <strong>graduação</strong> que caracterize uma qualificação<br />

para o trabalho, claramente <strong>de</strong>finida e com i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> própria.<br />

100


§ 2o As etapas com terminalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>verão estar articuladas entre si, compondo os<br />

itinerários formativos e os respectivos perfis profissionais <strong>de</strong> conclusão.<br />

Art. 7o Os cursos <strong>de</strong> educação profissional técnica <strong>de</strong> nível médio e os cursos <strong>de</strong><br />

educação profissional tecnológica <strong>de</strong> <strong>graduação</strong> conduzem à diplomação a<strong>pós</strong> sua<br />

conclusão com aproveitamento.<br />

Parágrafo único. Para a obtenção do diploma <strong>de</strong> técnico <strong>de</strong> nível médio, o aluno <strong>de</strong>verá<br />

concluir seus estudos <strong>de</strong> educação profissional técnica <strong>de</strong> nível médio e <strong>de</strong> ensino<br />

médio.<br />

Art. 8o Este Decreto entra em vigor na data <strong>de</strong> sua publicação.<br />

Art. 9o Revoga-se o Decreto no 2.208, <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1997.<br />

101


11/11/2006<br />

ANEXO 5<br />

Transcrição das reuniões do grupo focal<br />

Daniel: Vou falar um pouco aí do que aconteceu. Eu terminei o Ensino Médio, aí <strong>de</strong>pois fiquei<br />

um ano a<strong>pós</strong> no técnico. Nesse um ano eu entrei em estágio, fiz estágio, em empresa,<br />

assim até <strong>de</strong> construção civil. Fiz estágio <strong>de</strong> acordo com o curso técnico. Vi mais o lado<br />

profissional, preferi trabalhar a estudar.<br />

Pesquisador: Qual curso?<br />

Daniel: Fiz Segurança do Trabalho. Luísa também fez, Kely também fez.<br />

Daniel: Aí, fiz estágio um ano, trabalhei um ano <strong>de</strong> carteira assinada, tudo. E agora, concurso,<br />

passei no concurso e tô trabalhando em empresa pública. É isso, continuando e<br />

trabalhando. Até o companheiro ali passou também no concurso.<br />

Pesquisador: Concurso <strong>de</strong> on<strong>de</strong>?<br />

Daniel: Petrobrás.<br />

Jefersson: To aguardando aí, ser chamado.<br />

Lílian: Qual curso você fez?<br />

Jefersson: Fiz mecânica. É, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> pequeno eu gostava <strong>de</strong> montar e <strong>de</strong>smontar carrinho, aquela<br />

coisa. Aí entrei pro técnico, realmente gostei <strong>de</strong> praticamente o curso inteiro. Aí, no<br />

finalzinho do curso, fiz estágio, na Souza Cruz, com manutenção mecânica e <strong>de</strong>pois<br />

fui contratado. Tô lá até hoje trabalhando. E paralelo a isso, passei no vestibular<br />

também, da UERJ, e faço hoje Engenharia Mecânica. Estudo e trabalho<br />

paralelamente. É uma correria, mas acho que vai valer à pena.<br />

Pesquisador: Como você vê sua vida <strong>de</strong>pois que acabou a escola, você acha que mudou alguma<br />

coisa?<br />

Jefersson: Com certeza. Eu acho que se não houvesse o curso técnico, com certeza eu estaria um<br />

nível abaixo hoje. O curso técnico é muito importante, no meu modo <strong>de</strong> ver, pra vida<br />

profissional porque você apren<strong>de</strong> a prática também, não só a teoria, mas também a<br />

prática. E isso é muito importante.<br />

Daniel: Interessante mesmo no curso técnico, é que te dá um foco profissional, não é só teoria,<br />

tem muita parte <strong>de</strong> teoria, mas também muito foco profissional. Isso é interessante.<br />

102


Débora: Eu acho que o curso técnico, ele assim, ele abre às portas pro jovem entrar no mercado<br />

<strong>de</strong> trabalho. É difícil você sair do segundo grau, eu vejo isso por vários amigos meus<br />

que se formaram e não têm uma profissão. Então eles se formaram e não conseguem<br />

entrar no mercado <strong>de</strong> trabalho. Eu vejo por mim, eu saí do curso técnico, eu arrumei um<br />

estágio, do estágio eu fiquei sete meses estagiando, fui efetivada, fiquei mais nove<br />

meses <strong>de</strong>ntro da mesma empresa, né, <strong>de</strong>pois disso eu saí, fui trabalhar também com a<br />

minha profissão, tive mais um emprego e agora é o meu terceiro emprego.<br />

Pesquisador: E qual é a profissão?<br />

Débora: Eu fiz técnico em eletrônica. Então eu já tô no meu terceiro emprego. Eu posso dizer<br />

que eu gosto muito da Eletrônica, eu me <strong>de</strong>scobri lá <strong>de</strong>ntro, quando eu comecei a fazer<br />

o curso eu vi como era aberto o campo <strong>de</strong> trabalho. Trabalhei em três áreas diferentes.<br />

Então hoje eu vejo que o curso técnico ajudou bastante a minha vida profissional e<br />

também… No futuro não é o que eu tô fazendo faculda<strong>de</strong>, eu fui pra outra área. Mas<br />

com certeza me ajudou muito e me ajuda muito ter feito o curso técnico.<br />

Lúcio: É, o curso técnico dá um guia seguro pra gente seguir, porque se não fosse o curso<br />

técnico eu estaria fazendo qualquer coisa e qualquer coisa nem sempre é bom.<br />

Kely: É, é até interessante o Lúcio falar isso, porque eu lembro quando eu terminei a oitava<br />

série, aí eu recebi aquela divisão que você… que eles fazem pra você saber qual colégio<br />

você vai fazer o segundo grau, você termina a oitava e eles vão dividindo você. Então<br />

eu, como era mais velha, atrasadinha, eu fiquei à noite. Recebi uma carta que eu ia pra<br />

um colégio em Água Santa, à noite, estadual. Eu nunca tive vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudar à noite.<br />

Mas, pelo que a gente ouve falar das dificulda<strong>de</strong>s do professor passar e do aluno<br />

receber, e há uma <strong>de</strong>svalorização sim, né, infelizmente, porque não é proporcional. E eu<br />

fiquei triste: vou estudar à noite, não era o que eu queria! Tudo bem, eu sou mais<br />

velhinha, mas eu não queria isso. E logo <strong>de</strong>pois eu recebi a carta que tava tendo uma<br />

junção, do <strong>fe<strong>de</strong>ral</strong> com o estadual. Eu fiquei surpresa, eu não entendi aquilo, mas fiquei<br />

super feliz, ai, chorei e tudo! Não entendi muito bem, vim fazer a convocação que teve<br />

pra gente fazer a matrícula. E quando eu vim estudar, senti dificulda<strong>de</strong>s, porque o<br />

ensino era muito diferente da base que eu tive no meu fundamental. Tinha uma<br />

dificulda<strong>de</strong> lá <strong>de</strong> falta <strong>de</strong> professor e tudo. E aqui não era igual aos nossos outros<br />

ensinos, até mesmo porque acho que o Estado tivesse aquela posição <strong>de</strong> puxar da gente.<br />

Então isso foi muito difícil pra mim. Então eu fiz o primeiro. Fiz o segundo, fiquei em<br />

<strong>de</strong>pendência, foi mó dificulda<strong>de</strong>, não consegui fazer meu curso técnico, porque <strong>de</strong><br />

manhã estudava e à tar<strong>de</strong> fazia a <strong>de</strong>pendência, mas não <strong>de</strong>sisti. Queria fazer construção<br />

Civil, passei pra Estradas, com a <strong>de</strong>pendência, não consegui fazer Construção Civil, é<br />

Estradas. Até que apareceu o curso <strong>de</strong> Segurança. Não tinha noção, não tinha idéia, era<br />

uma área nova e… falei: vam’bora! Eu sabia que era cuidar <strong>de</strong> profissionais. Eu gosto<br />

<strong>de</strong> lidar com pechas, falei: bom, acho que vai ser bom pra mim. Terminei. Terminei à<br />

noite, terminei o segundo grau aqui, aí <strong>de</strong>pois terminei meu curso pra noite, botei pra<br />

noite, trabalhando <strong>de</strong> dia. Terminei.<br />

Pesquisador: Você trabalhou em quê mesmo?<br />

103


Kely: Antes <strong>de</strong> fazer o curso técnico eu era promotora. Promotora <strong>de</strong> produtos, fazia umas<br />

figurações também, então, trabalhos temporários. Aí acabei me formando. E pra<br />

conseguir estágio? Depois que você termina, pra conseguir estágio pro técnico. Falei:<br />

não vou conseguir estágio! Porque é bom você fazer estágio estudando, pra você<br />

colocar em prática o que você tá vendo. Então terminei o curso, e o estágio? Até que eu<br />

consegui pelo… aquele convênio, convênio da escola, e ele fizeram um anúncio do<br />

estágio. E no estágio, eu já tinha feito minhas horas, cumprido as horas que são<br />

necessárias, apareceu o meu trabalho. Eu trabalho numa empresa há dois anos, em<br />

Segurança do Trabalho, num laboratório, uma marca bem conceituada no mercado,<br />

crescendo muito, e a empresa dando um valor gigante pra gente, vendo a importância<br />

da Segurança hoje em dia nas empresas. Tá sendo maravilhoso. Dois anos que eu tô lá.<br />

Eu não sei se eu quero continuar na área. Meu plano é fazer engenharia. Mas minha<br />

vida assim, poxa, <strong>de</strong>u um salto.<br />

Pesquisador:… e a vida <strong>de</strong> vocês, acham que melhoraram como pessoas?<br />

Daniel: Só a base, né.<br />

Jefersson: É a responsabilida<strong>de</strong>, né.<br />

Lílian: O amadurecimento.<br />

Jefersson: Bem mais responsabilida<strong>de</strong>.<br />

Lílian: Você cresce.<br />

Jefersson: Você, como profissional, você tem uma idéia <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> que você não tinha.<br />

Felipe: Pensar <strong>de</strong> um outro jeito, profissionalmente, até porque você tá lidando com pessoas no<br />

trabalho, você acaba sendo profissional, não é um emprego que você tem, você tem<br />

uma profissão. Você tendo uma profissão hoje em dia ,eu acho que é o que procuram<br />

no mercado, Porque emprego você pula daqui, pula dali, profissão você segue aquela<br />

profissão, você vai ter sempre certo o que você, aquilo que você sabe fazer e acaba<br />

tendo um jeito <strong>de</strong> lidar com as pessoas. Você tem que, tem que ter um relacionamento,<br />

na verda<strong>de</strong> bem pensado, as suas atitu<strong>de</strong>s são bem analisadas, você acaba por si só<br />

sendo uma pessoa correta diante…<br />

Daniel: Dá um foco, na vida. Às vezes você sai do Fundamental: Ah, que você vai fazer? Ah<br />

,vou arranjar um emprego aí, vou estudar, qualquer coisa. Você tem um emprego. Lá<br />

não, tu tens um foco, assim, até pessoal, vou fazer isso pra <strong>de</strong>pois ser isso, pra <strong>de</strong>pois<br />

fazer isso. Cria um plano <strong>de</strong> vida. Uma perspectiva. Um plano <strong>de</strong> vida.<br />

Débora: Até na escola mesmo, os professores, eles já dão essa ajuda, essa base pra você po<strong>de</strong>r se<br />

orientar. Eu quando tava em dúvida o que eu ia fazer, se ia fazer engenharia, se ia fazer<br />

matemática, então, meus professores, eles vinham e conversavam comigo. Não,<br />

Débora, você tem que ver o que você prefere. Então, é a escola, tanto aqui no Horácio<br />

104


105<br />

Macedo, quanto lá no CEFET, quando a gente tava fazendo o técnico, os professores os<br />

alunos, tudo, nos ajudaram a gente a crescer, ter essa base, ter essa responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

saber lidar com outras pessoas, porque a gente lidava com pessoas totalmente<br />

diferentes, ainda mais quando você estuda em dois colégios, você lida com dois<br />

mundos. Então isso realmente ajuda bastante.<br />

Pesquisador: O que significa isso no ambiente familiar?<br />

Rodrigo: Acho que a família valorizou mais, enten<strong>de</strong>u. Nos teus estudos, por exemplo.<br />

Lílian: Lá em casa tem a relação também da in<strong>de</strong>pendência. Você ser in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do seu pai,<br />

da sua mãe, ter uma profissão, não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>de</strong>les mais daqui pra frente, porque eles<br />

não vão durar a vida inteira, não vão ficar do teu lado a vida inteira.<br />

Wilson: É, eles realmente percebem a que a gente amadureceu. Isso que aconteceu.<br />

Lílian: Você sai <strong>de</strong> manhã, vai pro estágio, vai trabalhar: Nossa, minha filha tá trabalhando, tá<br />

estagiando em tal lugar. Aí te eleva um pouco assim.<br />

Débora: Às vezes perguntam assim: Ah, o que seu filho faz? Ah, meu filho é técnico.<br />

Lílian: É. Tá trabalhando em tal lugar.<br />

Pesquisador: Mas vocês têm pais que foram técnicos, alguma coisa assim?<br />

Débora: O meu pai é técnico e minha irmã também.<br />

Lílian: Meus pais, não.<br />

Felipe: Os meus pais têm só o Fundamental, é segundo grau só completo, e quando vê que o<br />

filho tá, nem é nem alcançando as expectativas, é superando as expectativas pro futuro,<br />

porque acho que nenhum pai, nenhuma mãe quer ver o filho <strong>de</strong>sempregado, quer ver o<br />

filho perdido por aí, aí acaba dando um orgulho, né.<br />

Jefersson: A oportunida<strong>de</strong> que a gente tiver… aí eles se alegram assim.<br />

Pesquisador: Parece que a gente tem um pertencimento na socieda<strong>de</strong>? Vocês se sentem assim?<br />

Daniel: É, sim, é, acho que, não sei, acho que acontece: Pô, mamata! Não sei o quê, que inveja.<br />

Aí tu: Não, pô… É um reconhecimento da socieda<strong>de</strong> em si.<br />

Débora: Muita gente às vezes pergunta pra mim: Ah, você trabalha? Você trabalha em quê?<br />

Não, eu sou técnica em Eletrônica. O pessoal: Ahhh! Técnico em eletrônica!Formou<br />

on<strong>de</strong>? No CEFET. Poxa! Então você sente o reconhecimento <strong>de</strong> todo mundo né.<br />

Pesquisador: E o estudo?


Jefersson: Eu faço Engenharia Mecânica na UERJ.<br />

Pesquisador: Entrou por cotas?<br />

Jefersson: Entrei, entrei por cotas. Eu acho que a vida é feita <strong>de</strong> força <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> e oportunida<strong>de</strong>.<br />

Aqui nós encontramos a oportunida<strong>de</strong> que a gente precisava pra alcançar um objetivo<br />

na vida, aí eu acho que, quem i<strong>de</strong>alizou esse <strong>programa</strong>, teve uma visão muito boa, e<br />

parabenizar todo mundo, porque influenciou na vida <strong>de</strong> muitas pessoas e positivamente.<br />

Felipe: Muita gente quando chega aqui no colégio, que sai do Fundamental e vem pro segundo<br />

grau, até quando tá no segundo grau, tem uma visão, assim <strong>de</strong> tô estudando e ainda não<br />

sei o que vou fazer daqui pra frente e o colégio, ele te dá o leque <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s pra<br />

você meio que… e durante o Ensino Médio ele vai meio que separando você, te<br />

reconhece. Você é melhor nisso, você é melhor nisso. Te dá essa oportunida<strong>de</strong> e a gente<br />

acaba ganhando um norte aqui <strong>de</strong>ntro.<br />

Rodrigo: Eu abandonei o Técnico. Hoje eu vejo que o estudo hoje em dia é fundamental, porque<br />

sem estudos <strong>de</strong> segundo grau, acho que até o segundo grau, terminando o segundo grau,<br />

eu acho que é muito difícil arrumar um emprego hoje em dia. Tem que ter técnico. Tem<br />

que ter faculda<strong>de</strong> e vários cursos. Eu fiquei fazendo só segundo grau. Eu tava fazendo<br />

curso técnico <strong>de</strong> Edificações, eu não gostei, vou ser sincero, saí. Eu queria muito. Eu<br />

quero trabalhar, pô, eu quero ter meu próprio dinheiro, mas pra quê? Fiquei trabalhando<br />

no McDonald’s durante seis meses, pedi <strong>de</strong>missão, vi que era muita ralação.<br />

Trabalhando sábado e domingo. Todo dia, levando esporo, não ganhando aquilo que eu<br />

queria. Agora to trabalhando como operador <strong>de</strong> caixa. Eu fiz curso técnico <strong>de</strong><br />

Fisioterapeuta e também <strong>de</strong> repente faço uma faculda<strong>de</strong>. Hoje eu vejo que faculda<strong>de</strong> é<br />

fundamental pra nossa vida, porque você seguindo um caminho vai ser aquilo que você<br />

vai querer fazer a vida toda. Eu tô fazendo agora também curso <strong>de</strong> informática, porque<br />

eu não fiz e técnico administrativo, pra me atualizar um pouco. Porque também,<br />

informática, curso <strong>de</strong> inglês, isso tudo é fundamental. E também o curso… do CEFET,<br />

enten<strong>de</strong>u. Os cursos do CEFET são bons, mas foi o curso que eu caí e não gostei.<br />

Pesquisador: Você tá estudando?<br />

Lílian: Eu tô, tô fazendo duas faculda<strong>de</strong>s.<br />

Pesquisador: Duas?<br />

Lílian: Eu faço duas, uma <strong>de</strong> manhã e uma à noite, mas assim, logo que também terminou o<br />

Ensino Técnico, eu tentei vestibular, não fui passando, tentei 2003, tentei 2004, tentei<br />

2005, passei pra 2006, passei pra duas, mas assim, eu não <strong>de</strong>sisti. Eu faço letras na<br />

UFRJ <strong>de</strong> manhã e faço pedagogia no Instituto <strong>de</strong> Educação à noite. E pra mim, o estudo<br />

tem muita importância, porque, como dizem, se você estuda já é difícil, não estudando<br />

então... Então eu acho que tem que estudar sim, e procurar sempre tá crescendo, o<br />

estudo pra mim eu acho que é fundamental.<br />

106


Tatiana: Eu vejo o seguinte, todo mundo aqui <strong>de</strong>u muita sorte porque esse colégio, eu digo no<br />

nível <strong>de</strong> Horácio Macedo, é muito bom, é um nível diferente <strong>de</strong> qualquer outra escola,<br />

não vou citar nomes, mas acho que todo mundo sabe. É um nível muito alto, o estudo é<br />

muito bom mesmo, sabe um nível super diferente dos outros. Foi baseado nesse nível<br />

que eu consegui muitas coisas importantes, sabe.<br />

Pesquisador: Você tá estudando?<br />

Tatiana: To, graças a Deus. Eu terminei o técnico em Turismo. Aí, quando acabou, eu falei: cara,<br />

e agora, o que eu vou fazer? Só que eu tinha feito ENEM e eu tinha conhecimento, tudo<br />

que eu adquiri aqui em nível <strong>de</strong> Horácio Macedo e fazendo o ENEM eu consegui, pelo<br />

PROUNI, eu consegui uma bolsa <strong>de</strong> 100%. E eu tô fazendo agora secretariado<br />

executivo e tá assim, eu tô <strong>de</strong>scobrindo, tá excelente. Mas eu paro e analiso, se eu não<br />

tivesse tido aqui o Horácio Macedo como uma base forte, uma base firme, eu não teria<br />

tirado uma ótima nota no ENEM e também… sabe… enten<strong>de</strong>u, eu não estaria agora<br />

fazendo… agora eu to na faculda<strong>de</strong> particular, só que eu não pago nada, então pra mim<br />

é pública, e… é assim… tem muitos recursos… e agora eu tô conseguindo um estágio<br />

na Eletrobrás que é show-<strong>de</strong>-bola, um nível assim excelente, uma empresa imensa, você<br />

vê que você cresceu enten<strong>de</strong>u e que agora você tá virando gente, você não po<strong>de</strong> mais<br />

usar calça jeans, usa sapatinho. Eu ia pro estágio <strong>de</strong> calça jeans e rasteirinha, <strong>de</strong><br />

Turismo. Agora não, agora eu tenho que usar um terninho todo dia, e é outro nível, mas<br />

eu não estaria nesse nível se não fosse a base excelente do Horácio Macedo, que me<br />

<strong>de</strong>u suporte.<br />

Débora: É o que me ajudou a estar na faculda<strong>de</strong> hoje.<br />

Pesquisador: Você tá fazendo o quê?<br />

Débora: Tô fazendo matemática na UERJ e eu passei duas vezes pra UERJ. Porque eu terminei o<br />

segundo grau aqui em 2002, né, e fiz a prova, só que eu fiz assim por fazer, eu falei, ah<br />

eu não vou passar mesmo. Aí eu tentei fazer pelo SAID que a reserva <strong>de</strong> vagas, só que<br />

eu não podia. Eu não podia porque eu estu<strong>de</strong>i até a terceira série primária, né, em<br />

colégio particular. Aí eu passei e falei: ai, não acredito que eu passei! Aí passei, fui<br />

fazer a inscrição, eles não aceitaram. Aí falei: ah, agora <strong>de</strong>ixa. Passei pra Matemática<br />

também. Aí, no ano seguinte, eu falei: ah não, agora vou só trabalhar, não vou fazer<br />

faculda<strong>de</strong>, não. Aí no ano seguinte eu fiquei só trabalhando e falei: não, <strong>de</strong>pois eu faço<br />

vestibular e estudo, aí eu também não estu<strong>de</strong>i, eu peguei, fiz a prova só com a base que<br />

eu tinha no segundo grau e passei, eu não fiz pela reserva <strong>de</strong> vagas <strong>de</strong>ssa vez, fiz pelo<br />

estadual normal e consegui entrar na faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Matemática, já tô há um ano e meio<br />

lá, já. Sem precisar <strong>de</strong> pré-vestibular, só com o que eu aprendi aqui no segundo grau e<br />

também eu não tenho tanta dificulda<strong>de</strong> assim lá <strong>de</strong>ntro, por causa <strong>de</strong>ssa base que eu<br />

tive, então, sem sombra <strong>de</strong> dúvida o que ajudou a gente a crescer é o segundo grau<br />

mesmo.<br />

Felipe: Eu não fiz pré-vestibular, aí no finalzinho do terceiro ano aqui no colégio, prestei<br />

vestibular e consegui passar pro curso <strong>de</strong> física na UERJ, curso <strong>de</strong> física na UERJ,<br />

mas… passei pela reserva <strong>de</strong> vagas, mas embora eu tenha estudo em colégio público<br />

107


108<br />

durante meu período escolar eles exigiam muito. Você tem que provar que é muito<br />

pobre e fazer muita <strong>de</strong>claração pra provar. Mas é isso, eu até tranquei a faculda<strong>de</strong> esse<br />

final <strong>de</strong> ano porque eu tô pensando em mudar <strong>de</strong> curso, tô pensando em fazer<br />

Engenharia <strong>de</strong> Produção, pensei em fazer Engenharia Elétrica por causa da Eletrotécnica<br />

que eu fiz curso no CEFET, mas tô pensando agora em pular pra Engenharia <strong>de</strong><br />

Produção, que é o que eu trabalho hoje e gosto muito do que eu trabalho. E é isso.<br />

Pesquisador: Do ponto <strong>de</strong> vista econômico, vocês acham que vocês foram pra frente? E em<br />

relação à família também.<br />

Tatiana: É muito diferente <strong>de</strong> você ter que pedir dinheiro pros seus pais pra po<strong>de</strong>r sair e tá<br />

arriscado a levar um não como eu já levei muitas vezes: não vai porque não tem<br />

dinheiro. E você falar: eu vou, porque eu tenho dinheiro. Enten<strong>de</strong>u? Eu posso ir e se eu<br />

ajudo lá em casa, qualquer coisa se eles falarem eu: eu ajudo nesta casa enten<strong>de</strong>u,<br />

tchau. Acabou. E muda, inverte a situação, porque eu que pedia dinheiro aos meus pais,<br />

agora é minha mãe que me pe<strong>de</strong> dinheiro.<br />

Daniel: É engraçado, porque meu pai também é funcionário público, ele trabalha há vinte anos<br />

né, na Eletrobrás também, lá no DAC, no setor <strong>de</strong> informática. Então, hoje eu ganho<br />

quase 90% do que ele ganha, só por causa do Técnico. Chega com o Técnico já ganho<br />

quase 90% e ele: pô, entrou agora já ta ganhando isso, mamata. E eu falo: não, pai, por<br />

causa do Técnico. Pô, esse Técnico é mentira. É mamata. Mas é por causa do Técnico,<br />

porque o Técnico realmente te dá um up, um plus na sua carreira, né, porque qualquer<br />

Técnico que você tem o pessoal investe em você. Você é um especialista daquela área,<br />

aí tu, logicamente ganhas mais.<br />

Pesquisador: Quem é que estuda e trabalha e faz as duas coisas? O que significa isso, fala um<br />

pouco disso.<br />

Débora: Porque você vê assim: não é todo mundo que estuda e trabalha, né. Quando eu entrei na<br />

faculda<strong>de</strong> eu achei assim: pô, <strong>de</strong>ve ter um monte <strong>de</strong> gente na mesma situação que eu,<br />

né, mas não a gente vê assim que você ta lá, eu, no caso, estudo <strong>de</strong> manhã e trabalho à<br />

tar<strong>de</strong>. Eu acredito que muita gente aqui tá numa situação pior do que eu, que trabalha o<br />

dia inteiro e estuda a noite. Eu acho isso pior, eu não sei se eu agüentaria, mas, por<br />

exemplo, eu saio <strong>de</strong> manha da faculda<strong>de</strong> e é muito puxado, então assim o tempo que eu<br />

tenho pra estudar é o tempo que eu to lá. Então eu saio <strong>de</strong> lá correndo, vou pro trabalho,<br />

é complicado. A minha facilida<strong>de</strong> que eu tenho é que no trabalho eu posso estudar.<br />

Então, assim, enquanto eu tô no trabalho, tem um tempinho <strong>de</strong> folga eu vou lá, vou<br />

fazendo meus cálculos lá, estudando um pouquinho pras provas, mas é uma rotina<br />

muito cansativa, mas que vale à pena.<br />

Rodrigo: Pior é quando você estuda e trabalha e ainda tem que trabalhar fim <strong>de</strong> semana, é muito<br />

pior. Eu tô fazendo dois cursos, Técnico-administrativo e Informática, são às terças e<br />

quintas, eu não tô estudando <strong>de</strong> segunda a sexta não, se eu começar a fazer faculda<strong>de</strong> e<br />

tiver trabalhando ainda vai ser… Não daria pra mim mesmo.


Jefersson: É, a vida <strong>de</strong> estudar e trabalhar é loucura, porque no início é um choque, você sempre<br />

só estudou na vida, pelo menos a maioria, acordava e ia estudar. Agora, você acorda<br />

cedo vai trabalhar, tem a responsabilida<strong>de</strong> lá, você tem que dar conta dos recados, seu<br />

chefe te cobrando toda hora e à noite você vai pra faculda<strong>de</strong> cansada, estressada, ainda<br />

tem que estudar e dar conta do recado porque é o seu futuro. Mas eu acho que vai valer<br />

à pena, no futuro vai valer à pena sim, porque é um sacrifício que vale à pena.<br />

Tatiana: É um esforço muito louco mesmo. Eu trabalho durante o dia e estudo à noite, chego<br />

cansado, aí sexta-feira me liga: vamos sair! Não tenho que ir pra faculda<strong>de</strong>. Eu já tô no<br />

centro e aí o centro ferve a noite, sexta-feira à noite então aquilo ali bomba e eu tenho<br />

que ir pra faculda<strong>de</strong>.<br />

Pesquisador: Você acha que o trabalho te ajuda assim, também no estudo, financeiramente? Tem<br />

alguma coisa no trabalho que garantiu vocês estarem estudando?<br />

Débora: Eu, por exemplo, eu só faço faculda<strong>de</strong> por causa do meu trabalho, porque meus pais não<br />

conseguiriam manter, porque eles teriam que arcar com as minhas <strong>de</strong>spesas pessoais,<br />

mais passagem, almoço e tudo que você gasta na faculda<strong>de</strong>, apesar <strong>de</strong> ser uma<br />

faculda<strong>de</strong> pública a gente tem gastado. Então hoje o que eu tenho na faculda<strong>de</strong> é por<br />

causa do meu trabalho, por que eu pago a minha passagem, eu pago as minhas contas e<br />

se eu posso sair da faculda<strong>de</strong>, do trabalho e <strong>de</strong>pois sair pra me divertir é por causa do<br />

meu trabalho. Se eu não tivesse trabalhando, eu nem sei e eu po<strong>de</strong>ria tá continuando na<br />

faculda<strong>de</strong>.<br />

Pesquisador: E o futuro?<br />

Rodrigo: O futuro a gente tá fazendo no presente.<br />

Lílian: Eu, particularmente, pretendo terminar minha faculda<strong>de</strong>, fazer uma <strong>pós</strong>, um mestrado,<br />

um doutorado, pretendo morar na França. Mas eu pretendo isso.<br />

Pesquisador: Qual a área que você quer?<br />

Daniel: Qual a especialização em letras?<br />

Lílian: Eu faço português-francês.<br />

Daniel: Tá no caminho já.<br />

Lílian: E eu pretendo dar aula em <strong>universida<strong>de</strong></strong> também, então…<br />

Pesquisador: Você não tá trabalhando não?<br />

Lílian: Não, porque os meus pais eles preferem que eu estu<strong>de</strong> e o meu tempo também não dá,<br />

como eu faço duas faculda<strong>de</strong>s. Eles falam: ó, eu prefiro que você estu<strong>de</strong>, por enquanto<br />

eles tão po<strong>de</strong>ndo me bancar, enquanto eles tão po<strong>de</strong>ndo me bancar eu tô estudando. Eu<br />

já pedi tantas vezes: eu quero trabalhar. Não, estuda primeiro, <strong>de</strong>pois você trabalha.<br />

109


Rodrigo: O que a gente é hoje é o que a gente plantou no passado. É. A gente planta o que a<br />

gente colhe.<br />

Wilson: A outra influência que o Horácio teve na minha vida foi à iniciativa que ele <strong>de</strong>u ao<br />

teatro. Eu já tinha certa criativida<strong>de</strong>. Eu comecei a escrever, escrevia as peças da<br />

escola, escrevi umas seis peças e recentemente escrevi um livro. Um romance que se<br />

passa m São Paulo na década <strong>de</strong> 40 até os dias <strong>de</strong> hoje. Eu falo um pouco <strong>de</strong> pago<strong>de</strong>, <strong>de</strong><br />

pago<strong>de</strong> não, <strong>de</strong> samba, <strong>de</strong> rádio…<br />

Pesquisador: Você não quer me ajudar a fazer esse roteiro não?<br />

Wilson: Não sei. Então, no futuro eu quero ser talvez um escritor reconhecido.<br />

Rodrigo: Eu quero ser fisioterapeuta.<br />

Jefersson: Eu fiz segundo grau técnico, tô fazendo engenharia, pretendo ser engenheiro e<br />

também no futuro fazer mestrado pra talvez conciliar à profissão <strong>de</strong> engenheiro com<br />

também dar aula em faculda<strong>de</strong>, sei lá. Eu também tenho essa perspectiva também.<br />

Pesquisador: Tem mais gente querendo dar aula aqui?<br />

Débora: Eu. Meu futuro eu vejo sendo professora, porque eu faço Matemática por isso. Eu<br />

<strong>de</strong>ixei <strong>de</strong> fazer Eletrônica porque eu não queria trabalhar e sim eu queria dar aula. A<br />

minha vocação que eu <strong>de</strong>scobri é ensinar mesmo.<br />

Pesquisador: De on<strong>de</strong> você acha que essa vocação veio? Você acha que veio das aulas aqui, ou<br />

não? Os professores <strong>de</strong> Matemática.<br />

Débora: É o Carlos que ajudou muito, eu vejo ele assim como um exemplo. Eu, às vezes eu fico<br />

imaginando assim, quando eu for professora eu quero ser igual a ele. Não igual a ele<br />

assim, cada professor que a gente teve a gente quer tirar um pedacinho, não só<br />

professor <strong>de</strong> Matemática. Eu tive um professor maravilhoso <strong>de</strong> português aqui também,<br />

eu tive professores maravilhosos aqui no Técnico. Então a gente sempre tira um<br />

pouquinho <strong>de</strong> cada um e fala assim: quando eu for professora eu vou ser um pouquinho<br />

<strong>de</strong>les.<br />

Felipe: Eu entrei na Física assim também. Pra dar aula, pra entrar em sala <strong>de</strong> aula. Porque<br />

embora assim agente discuti muito: ah, professor ganha pouco. Mas lidar, comandar<br />

trinta, quarenta pessoas assim, uma atenção legal, e conversar, isso eu gosto muito.<br />

Daniel: Eu quero fazer engenharia. Eu pensei em produção, petróleo, vamos ver aí. Tô lá <strong>de</strong>ntro.<br />

Lá <strong>de</strong>ntro os caras: pô, tem que fazer faculda<strong>de</strong>, não sei o que. Pô, vou fazer. Mas eu<br />

penso em alguma engenharia porque é uma gran<strong>de</strong> carreira que tem lá <strong>de</strong>ntro também.<br />

Kely: Eu fiz pré-vestibular, vestibular pra Nutrição, eu não amava Nutrição, aí ia fazer<br />

Pedagogia. Eu ainda não to muito certa ainda, mas ano que vem tô tentando…<br />

110


Daniel: Já tá certa?<br />

Kely: Não, eu tô em duas assim ainda. Tô, ainda pesquisando assim.<br />

Débora: Faz as duas que aí você consegue escolher.<br />

Kely: Não. Eu quero tá convicta <strong>de</strong> que eu quero aquilo mesmo.<br />

Rodrigo: Olha, antes eu queria muito fazer Educação Física. Eu quero fazer Educação Física, eu<br />

quero fazer Educação Física, só tava pensando nisso. Aí eu fiz o curso <strong>de</strong> fisioterapia.<br />

Aí eu gostei. Aí eu tava pensando: pô, vou fazer fisioterapia ou educação física. Eu tava<br />

em dúvida. Aí eu tô pensando em fazer as duas, sendo que se eu fizer fisioterapia eu só<br />

tenho dois anos pra fazer Educação Física só, ao invés <strong>de</strong> três e meio. Aí eu termino e<br />

faço duas faculda<strong>de</strong>s.<br />

Pesquisador: Alguém quer falar alguma coisa final?<br />

Kely: Eu queria agra<strong>de</strong>cer a oportunida<strong>de</strong> que nós tivemos, né, porque. Eu costumo dizer<br />

assim, o que falta é oportunida<strong>de</strong>. Se todos os alunos aí do público tivessem a<br />

oportunida<strong>de</strong> que a gente teve com certeza eles também estariam traçando um caminho<br />

parecido com o nosso. E a oportunida<strong>de</strong>, que eu acho que incentiva, né, tem vários<br />

convênios e a multiplicar a escola pra dar oportunida<strong>de</strong> pros alunos. Inclusive eu estive<br />

há pouco tempo na escola que eu estu<strong>de</strong>i no Fundamental, aí a diretora quer que eu vá à<br />

sétima série pra falar, pra incentivar. Porque é uma escola próxima a uma comunida<strong>de</strong><br />

carente e as pessoas têm aquela auto-estima baixa enten<strong>de</strong>u? Por achar que é meio<br />

inferiorizado, mas não é isso. Eles são capazes tanto quanto a gente, eu vim <strong>de</strong> lá,<br />

enten<strong>de</strong>u? Mas com a oportunida<strong>de</strong>.<br />

Daniel: Podia tá roubando, matando, mas a gente tá aqui trabalhando.<br />

Débora: A gente vê que… eu vejo assim… eu fiquei espantada que quando eu cheguei lá na<br />

UERJ, eu vi assim, quanta gente do Horácio Macedo tá estudando na UERJ e tem gente<br />

que faz duas faculda<strong>de</strong>s iguais a ela. Tem uma menina que, é maluquice, eu acho, mas<br />

ela faz Física na UERJ e Engenharia Elétrica na UFRJ. Então… veio daqui. Então é<br />

uma oportunida<strong>de</strong>. Abrir mão <strong>de</strong>ssa oportunida<strong>de</strong> eu acho burrice. É uma oportunida<strong>de</strong><br />

que <strong>de</strong>veria ser dada a todos, mas já que não são todos que têm, os poucos têm que<br />

aproveitar.<br />

Lílian: Foi feito um convite pra gente e a gente era os melhores, por conta disso a gente veio<br />

pro Horácio.<br />

Tatiana: Tinha eu acho que todos os colégios do Rio <strong>de</strong> Janeiro, tinham que ter um pouquinho do<br />

que tem o Horácio, assim uma mistura do Horácio com o CEFET. Tinha que ter,<br />

porque ia ser muito mais pra frente, muito melhor. Investir maciçamente nos jovens,<br />

porque, por exemplo, eu vejo lá na cida<strong>de</strong> tanto pivetinho, assim, tudo garotinho<br />

pequeno que tinha que estar na escola, tá roubando.<br />

111


Daniel: Eu acho que a importância <strong>de</strong> tudo, da educação vem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o Ensino Fundamental. O<br />

Ensino Fundamental tá per<strong>de</strong>ndo seu valor. Eu acho isso. Aí tá recebendo gente<br />

<strong>de</strong>spreparada no estadual. Ai isso vai sendo <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ado até o Superior. E o que<br />

aconteceu com a gente, acho que foi alguns resquícios da boa Educação Fundamental,<br />

da boa Educação Estadual. Pra mim, eu to vendo assim, a educação pública tá<br />

acabando. Tá acabando, vão privatizar tudo daqui a pouco. Vão ven<strong>de</strong>r: na educação a<br />

gente vai passar isso ai. Porque ter o Fundamental com média quatro? No Ensino<br />

Fundamental a gente pega o moleque <strong>de</strong> escola privada, média sete pra um moleque <strong>de</strong><br />

oito anos.<br />

Débora: E você vê esse negócio <strong>de</strong> aprovação automática.<br />

Daniel: Aí você vê na faculda<strong>de</strong>, quem tá? Eu vou na faculda<strong>de</strong>, na UFRJ, só carro zero, só<br />

gente <strong>de</strong> zona sul, por quê?<br />

Lílian: Só gente que estuda em colégio particular. São pouquíssimas pessoas que estudaram em<br />

colégio público.<br />

Daniel: Tu vês, caramba, que oportunida<strong>de</strong> eu tive, caramba que momento eu tive, que<br />

importante foi isso na minha vida.… agora que você dá o valor. Aí o pessoal: não isso<br />

não é importante não, aí tu vês o cara, pô aconteceu várias cosias “ruins” com o cara<br />

como eu <strong>de</strong>i valor, agora eu tô aqui.<br />

Débora: E é uma oportunida<strong>de</strong> única que a gente teve. Se eu não tivesse vindo pra cá eu hoje<br />

não seria a meta<strong>de</strong> do que eu sou. Porque tinha passado, aquela história que a Kely<br />

falou, eu passei pra outro colégio que eu não ia fazer Técnico, se eu conseguisse eu<br />

faria Administração com pouca oportunida<strong>de</strong> porque não era um colégio reconhecido,<br />

então a gente vê que se a gente for tentar voltar um pouquinho atrás no que a gente faria<br />

se não tivesse vindo pra cá seria bem diferente.<br />

Kely: Você vê quantas pessoas largando o segundo grau.<br />

Felipe: O terceiro ano aqui foi o melhor do colégio, brincava, chorava. Uma família mesmo.<br />

Dava vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong>, sabe, mesmo cansado, <strong>de</strong> estudar.<br />

Daniel: Eu sabia <strong>de</strong> gente que morava longe. Nova Iguaçu, sei lá e vinham. Não! Tem que<br />

estudar.<br />

Felipe: Eu tinha um amigo que morava em Embariê.<br />

Daniel: Ele totalmente motivado, e eu morava aqui do lado, como é que eu não vou estudar?<br />

Tatiana: Não eu só queria colocar que esse é o momento que pelo menos no meu caso eu acho,<br />

que <strong>de</strong> repente pra vocês também. Eu consigo começar a ver quem é que vai pra frente,<br />

quem é que vai ter um emprego e quem é que vai ter um subemprego. Porque eu ficava<br />

muito chateada, até comentava com a Lílian. Poxa, Lílian, caramba, a gente ta indo pra<br />

112


113<br />

escola agora e tem gente indo pra praia, cara eu quero ir pra praia. Eu não quero estudar<br />

,eu quero ir pra praia. Mas eu: não, eu vou pra escola, tenho que ir pra escola. E agora<br />

eu vejo que as pessoas que iam pra praia agora têm um subemprego, vamos colocar<br />

assim, um emprego não tão bom e eu que me esforçava, agora eu tenho uma realização.<br />

E eu to continuando batalhando pra não precisar ir pra praia <strong>de</strong> metrô, eu vou com o<br />

meu carro. Eu acho que agora eu tenho uma visão <strong>de</strong> que eu vou estudar porque agora<br />

eu quero ir pra praia com meu carro. Eu não preciso pegar um metrô, pegar um ônibus<br />

lotado. E isso me traz uma satisfação muito gran<strong>de</strong> porque eu vejo positivamente meu<br />

futuro que eu vou alcançar.<br />

Jefersson: É aquela velha história, se você estudar o tempo passa, se você não estudar o tempo<br />

também passa, então vamos passar o tempo estudando que você vai ter um futuro<br />

melhor. Essa aí eu acho que é a filosofia.<br />

Tatiana: Tem uma frase que resume bem isso que eu acabei <strong>de</strong> falar, que diz assim: As pessoas<br />

que pararam pra esperar quando se <strong>de</strong>ram conta perceberam que as que não pararam<br />

estão tão mais à frente que elas não po<strong>de</strong>m mais ser alcançadas. Isso me <strong>de</strong>u uma<br />

satisfação muito gran<strong>de</strong>.<br />

Rodrigo: Imagina as pessoas que nem terminaram o segundo grau? Não fizeram o segundo grau,<br />

não fizeram o Ensino Fundamental? Imagina essas pessoas? Ou fizeram <strong>de</strong> qualquer<br />

jeito, não estavam nem ai? Que ta <strong>de</strong>sempregado. Eu vejo, vou na cida<strong>de</strong> assim, muita<br />

gente <strong>de</strong>sempregada procurando emprego, muita... mas muita mesmo.<br />

Felipe: E eu não sei se isso é <strong>de</strong> praxe, mas assim as pessoas que têm uma profissão eu acho<br />

que trabalham menos do que as que têm um emprego. Você ter um emprego numa loja<br />

Americana, por exemplo, você tem segundo grau completo só, você rala muito mais do<br />

que uma pessoa que tem uma profissão, que tem um técnico em engenharia, por<br />

exemplo, um técnico em Administração, que tem aquele trabalho <strong>de</strong> segunda a sexta,<br />

no escritório. Até trabalha às vezes no final <strong>de</strong> semana e feriado, mas eu acho que quem<br />

não tem esse grau <strong>de</strong> estudo é muito mais peão, muito mais ralação e a perspectiva <strong>de</strong><br />

crescimento <strong>de</strong>ntro do que você faz é quase que nula.<br />

Daniel: Você vira um especialista no Ensino Técnico, você vira o cara que tem conhecimento<br />

naquilo, você não é mais um bombril, um cara que fazer tudo, não, só faz aquilo. O<br />

conhecimento que você adquiriu você aplica realmente, você não vai ser o cara que vai<br />

fazer tudo. Não, você cuida <strong>de</strong>sse assunto aqui que você é o cara <strong>de</strong>sse assunto, dá uma<br />

valorizada.<br />

Débora: Tem uma frase que eu li no site da minha faculda<strong>de</strong> que eu achei muito legal, que eu até<br />

copiei, <strong>de</strong>corei e tal, que dizia assim: jamais consi<strong>de</strong>re seus estudos como uma<br />

obrigação, mas como uma oportunida<strong>de</strong> invejável <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r. Então, eu acho que todo<br />

mundo aqui conseguiu ver esse valor que o estudo tem pra gente.<br />

Tiago: Fiz técnico <strong>de</strong> Segurança do Trabalho. Tive um problema no ano <strong>de</strong> 2003, que tive que<br />

servir ao serviço militar, mas concluí no ano seguinte em 2004, vindo logo a fazer um<br />

estágio e, complementando, um trabalho em 2005. Já trabalhei como técnico <strong>de</strong>


114<br />

Segurança do Trabalho <strong>de</strong>ntro da “Shell”, por exemplo, na Ribeira, na Ilha do<br />

Governador, e logo em seguida, ainda nesse ano, numa empresa chamada…<br />

Pesquisador: Como foi sua experiência no trabalho?<br />

Tiago: Foi muito boa, muito gratificante. Gran<strong>de</strong>s conhecimentos. Trabalhei com uma empresa<br />

que trabalha com sistema <strong>de</strong> gestão, tive uma aula muito gran<strong>de</strong> em relação a isso que<br />

eles passaram todas as informações para que o trabalho saísse todo <strong>de</strong> acordo e tivesse<br />

um rendimento bom e, ao mesmo tempo, um nível <strong>de</strong> segurança que não causasse<br />

nenhum ato inseguro nem nenhum aci<strong>de</strong>nte.<br />

Pesquisador: O que significa ser técnico pra você?<br />

Tiago: Eu acho que é um meio e ao mesmo tempo uma profissão. O meio <strong>de</strong> alcançar outros<br />

objetivos e uma profissão, porque eu levo isso pra minha vida e ela me ajuda muito a<br />

adquirir experiência na minha vida profissional e, ao mesmo tempo, ajudar as pessoas.<br />

O técnico absorve gran<strong>de</strong>s conhecimentos tecnológicos aon<strong>de</strong> ele po<strong>de</strong> usufruir disso<br />

tanto pra si, quanto pras pessoas que o envolvem.<br />

Pesquisador: Sua vida melhorou <strong>de</strong>pois que você passou por essa experiência?<br />

Tiago: Bem, melhorou minha vida profissional. Em relação a minha vida pessoal é uma<br />

adaptação. Eu tô sempre me adaptando, principalmente, às empresas que eu entro pra<br />

trabalhar. Eu acho interessante levar, tanto o meu nome Tiago, como técnico, como a<br />

quem me formou.<br />

Pesquisador: Qual a importância do trabalho pra você?<br />

Tiago: Trabalhar pra mim é primeiramente a satisfação, gratificação, principalmente <strong>de</strong> trabalhar<br />

em equipe. Eu costumo dizer que trabalhar é responsabilida<strong>de</strong>, é ética pessoal, eu<br />

trabalho muito com meu bom senso, eu não gosto <strong>de</strong> fazer nada que seja contrário a<br />

isso. Trabalhar pra mim é prazer, é um gosto e isso também acarreta uma forma <strong>de</strong><br />

equilibrar minha vida pessoal e no coletivo.<br />

Pesquisador: E continuida<strong>de</strong> no estudo, como é que você vê isso?<br />

Tiago: Bem, eu tive o prazer <strong>de</strong> disputar o vestibular que não é uma coisa tão fácil, mas também<br />

não é tão difícil. Fiz pra UFRJ, fiz pra UERJ, mas não alcancei meu objetivo que seria<br />

estar <strong>de</strong>ntro do curso, <strong>de</strong> repente hoje até terminando engenharia. Meu <strong>de</strong>sejo é fazer<br />

Engenharia ou Civil, ou <strong>de</strong> Produção, que são muito ligados.<br />

Pesquisador: E o seu futuro, qual sua perspectiva <strong>de</strong> futuro?<br />

Tiago: Eu penso sempre no melhor. Me consi<strong>de</strong>ro uma pessoa ambiciosa, mas com aquela<br />

ambição mais branda, procuro sempre satisfazer minha vida profissional junto com<br />

minha vida pessoal. Eu queria, a partir do ano que vem, iniciar um estudo, na<br />

engenharia principalmente, que venha a me dar outras profissões, venha a me qualificar


115<br />

para fazer outras coisas. Ao mesmo tempo, eu sou uma pessoa que gosta muito <strong>de</strong><br />

trabalhar com o público também, então que eu venha a ter esse prazer <strong>de</strong> trabalhar com<br />

o público, eu vou tentar procurar estudar muito sobre isso. Então, eu pretendo fazer<br />

uma faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> engenharia, logo uma Pós, ou então <strong>de</strong> repente fazer uma outra<br />

faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> comunicação. E daqui a <strong>de</strong>z anos, ou daqui a 20 anos me tornar um bom<br />

profissional.<br />

Pesquisador: O que <strong>de</strong> melhor o Horácio Macedo e o CEFET trouxeram pra você?<br />

Tiago: Bem, vamos dizer que o técnico me abriu caminhos para que eu pu<strong>de</strong>sse ter várias<br />

escolhas. Eu po<strong>de</strong>ria assumir a profissão como técnico ou então <strong>de</strong>ixar isso <strong>de</strong> lado,<br />

mas eu preferi assumir o técnico porque isso me facilitaria na procura <strong>de</strong> um emprego.<br />

Vamos dizer que é um facilitador <strong>de</strong> certa forma. Aprendi a gostar e valorizar a<br />

profissão e procuro sempre meios <strong>de</strong> ser o melhor profissional principalmente nessa<br />

parte <strong>de</strong> técnico que é a minha profissão.<br />

Pesquisador: Sua perspectiva é trabalhar e estudar ao mesmo tempo?<br />

Tiago: Eu acho que é possível <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma disciplina, eu também aprendi muito isso durante<br />

o período que eu estive aqui, estudando e estando no CEFET. O que eu aprendi muito<br />

com os professores do CEFET é que tudo po<strong>de</strong> ser feito <strong>de</strong>ntro da sua capacida<strong>de</strong>,<br />

<strong>de</strong>ntro do seu nível, dos seus objetivos, criando métodos.<br />

Pesquisador: Você já tinha tido alguma experiência <strong>de</strong> trabalho antes <strong>de</strong> ser técnico?<br />

Tiago: Já, trabalhei em loja como ven<strong>de</strong>dor e também no quartel como soldado, durante o<br />

serviço militar.<br />

Pesquisador: Como você compara esses dois trabalhos? É só econômica a diferença?<br />

Tiago: Não, tiveram outras. Como técnico, eu tenho que trabalhar muito com documentação.…<br />

Quando você trabalha como técnico, você tem um objetivo. O técnico <strong>de</strong> Segurança do<br />

Trabalho tem um objetivo <strong>de</strong>ntro da empresa. Que é, para o empregador, ganhar<br />

dinheiro, o lucro e principalmente para o empregado fornecer mais segurança, mais<br />

qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida. É isso que eu procuro fazer quando trabalho como técnico <strong>de</strong><br />

Segurança do Trabalho.<br />

Lílian Caroline: Eu saí do Horácio, fui fazer pré-vestibular em 2004. Consegui uma bolsa no<br />

GPI. Estu<strong>de</strong>i o ano todo, todos os dias da semana, <strong>de</strong> domingo a domingo. Aí passei no<br />

vestibular em 3º lugar na UniRio, pra Pedagogia, e em 2005 eu comecei a estagiar.<br />

Pesquisador: Que curso técnico você fez?<br />

Lílian Caroline: Segurança do Trabalho. Em 2004, quando eu comecei a fazer o pré-vestibular,<br />

eu tranquei o curso técnico no CEFET, fiz o pré-vestibular todo, quando eu <strong>de</strong>scobri<br />

que tinha passado, eu <strong>de</strong>stranquei o CEFET. Voltei pra <strong>de</strong>strancar e no primeiro dia


116<br />

consegui um estágio, aí comecei a estagiar, fazia CEFET e comecei a faculda<strong>de</strong>, então<br />

fazia as três coisas juntas. De manhã estágio, <strong>de</strong> tar<strong>de</strong> CEFET, <strong>de</strong> noite faculda<strong>de</strong>.<br />

Pesquisador: Porque Pedagogia?<br />

Lílian Caroline: Porque eu gosto da área <strong>de</strong> ensino e me ajuda muito na Segurança do Trabalho,<br />

eu dou muito treinamento para os peões <strong>de</strong> obra. O maior tempo que eu passo na obra é<br />

dando treinamento, uma vez por semana eu dou treinamento adicional pros caras que<br />

estão começando Construção Civil; então, a Pedagogia me ajuda muito nessa parte.<br />

Pesquisador: Qual a importância pra você do trabalho?<br />

Lílian Caroline: Pra mim é a maior satisfação trabalhar ainda mais que eu amo muito o que eu<br />

faço. Eu amo muito tá ajudando. Eu posso fazer com que o cara não se aci<strong>de</strong>nte, eu<br />

posso fazer com que o cara não morra, eu tô contribuindo até pra diminuir as<br />

estatísticas <strong>de</strong> morte na Construção Civil. Então eu gosto muito <strong>de</strong> tudo que eu faço.<br />

Pesquisador: E como é que você concilia isso? Trabalho e estudo?<br />

Lílian Caroline: Como eu falei, <strong>de</strong> manhã eu trabalho, fico a maior parte do meu tempo na obra,<br />

saio da obra ou da Praça da Ban<strong>de</strong>ira às cinco hortas da tar<strong>de</strong>. Vou pra faculda<strong>de</strong>, saio<br />

da faculda<strong>de</strong> às 10 da noite, vou pra casa. Mas, eu acho assim, tudo quando você tem a<br />

vonta<strong>de</strong>, quando você tá com vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> crescer, <strong>de</strong> fazer alguma coisa por você, acho<br />

que as coisas rolam.<br />

Pesquisador: Qual a importância do Ensino Técnico?<br />

Lílian Caroline: Bem, pra mim, e eu costumo falar, pra todo mundo. Se hoje em dia é difícil com<br />

o técnico, imagina sem o técnico? Hoje o mercado <strong>de</strong> trabalho tá difícil, então você tem<br />

que ter uma qualificação. O técnico te ajuda. Antes <strong>de</strong> você começar a faculda<strong>de</strong>, você<br />

já tem um emprego. Até pra mim, eu não nasci em berço <strong>de</strong> ouro, minha família não<br />

tem dinheiro, então eu tenho que trabalhar pra tá me sustentando na própria faculda<strong>de</strong>.<br />

Pesquisador: Como é o reconhecimento da família?<br />

Lílian Caroline: É o maior orgulho pra eles. Eu peguei o registro há pouco tempo. Antes disso eu<br />

já era auxiliar técnica, hoje não, sou técnica mesmo em Segurança do Trabalho. Então é<br />

o maior orgulho pra todo mundo. Eu sei que eu dou exemplo pros meus irmãos, assim<br />

<strong>de</strong>sse jeito, então é muito bom, acho que é uma satisfação muito gran<strong>de</strong>. Apesar <strong>de</strong>, no<br />

começo, meus pais não queriam que eu fizesse Segurança do Trabalho. Minha mãe nem<br />

opinou, mas meu pai queria que eu fizesse Telecomunicação.<br />

Pesquisador: Sua vida melhorou?<br />

Lílian Caroline: O lado pessoal e o financeiro também, com certeza. Porque, hoje em dia, as<br />

coisas que eu compro é com meu dinheiro, eu não preciso ficar pedindo nada. Ajudo.


Pesquisador: E na sua família, a profissão dos seus pais é <strong>de</strong> técnico?<br />

Lílian Caroline: Minha mãe é Pedagoga, meu pai é formado em Pedagogia, mas ele exerce<br />

Análise <strong>de</strong> Sistemas.<br />

Pesquisador: E o futuro? Qual é a sua expectativa <strong>de</strong> futuro?<br />

Lílian Caroline: Eu quero me formar na faculda<strong>de</strong>, quero fazer minha Pós-<strong>graduação</strong> em<br />

Psicologia do Trabalho, porque eu quero continuar atuando <strong>de</strong>ntro da Construção Civil<br />

com a educação, casar, ter filhos, essas coisas.<br />

25/11/06<br />

Pesquisador pe<strong>de</strong> para contarem histórias da trajetória <strong>de</strong> amigos da escola.<br />

Lílian: Eu tenho. Tem uma amiga minha que até, hoje ela tá fazendo letras comigo na UFRJ,<br />

ela faz Literaturas. E ela fez técnico comigo, estudou na mesma sala no terceiro ano,<br />

concluiu o técnico, só que não quis fazer estágio, porque ela viu que não era aquilo, e<br />

não conseguiu se formar. Acabou indo pra um outro lado. Ela fez faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Dança,<br />

não gostou e agora ela faz Letras.<br />

Igor: Tem o PJ também, que era da sua Turma.<br />

Lílian: Paulo José?<br />

Igor: É, o Paulo José. Ele fez Informática comigo no CEFET. Aí ele estagiou numa empresa<br />

<strong>de</strong> advocacia, mas como advocacia também tem laboratório <strong>de</strong> Informática, tem muito<br />

computador, advogado mexe muito com computador, aí ele se interessou por Direito e<br />

tá fazendo Direito.<br />

Geice: Na mesma turma da Juliana Fonseca, também tinha uma outra menina que eu conheço<br />

elas, porque elas são da mesma igreja que eu, a Juliana Duim, ela fez Automobilística,<br />

aí ela tava trabalhando, mas esse ano parece que teve um problema lá no setor que ela<br />

tava trabalhando da Petrobrás. Aí ela ficou <strong>de</strong>sempregada, mas ela também passou pra<br />

Cenografia na Uni Rio.<br />

Lílian: Ela tá fazendo duas faculda<strong>de</strong>s.<br />

Geice: Ela tá fazendo Cenografia na Uni-Rio, e ela passou pra arquitetura na UFRJ, mas ela<br />

não queria fazer arquitetura, queria trocar pra…, não, ou ela passou pra mesma coisa<br />

nas duas.<br />

Lílian: Não, ela tá fazendo duas faculda<strong>de</strong>s. Na Uni-Rio, ela tá fazendo a mesma coisa que na<br />

UFRJ também.<br />

Geice: Isso. E ela tava querendo trocar pra não fazer a mesma cosia nas duas faculda<strong>de</strong>s.<br />

117


Kely: A maioria dos colegas que fizeram também Segurança comigo, a maioria que eu tenho<br />

contato terminou, fizeram estágio e tão trabalhando.<br />

Débora: Tem a Carla, ela tá trabalhando com o Daniel lá no CECOCI, e tá fazendo Engenharia<br />

<strong>de</strong> Produção na UERJ. Então ela fez Segurança e agora tá fazendo Engenharia <strong>de</strong><br />

Produção lá na UERJ também. Sempre trabalhou junto com o Daniel.<br />

Geice: Você foi da turma da Taís?<br />

Kely: A Taís.<br />

Geice: Ela também tá trabalhando, mas ela agora ta fazendo Fisioterapia na faculda<strong>de</strong>, mas ela<br />

trabalha com Segurança também.<br />

Kely: Taís, Luís Susie, um monte <strong>de</strong> gente, Orlando.<br />

Débora: Tem a Sara, também <strong>de</strong> Segurança. Eu lembro que ela trabalhava numa empresa lá no…<br />

não sei qual era empresa e o que ela fazia, mas era Segurança do Trabalho lá no centro<br />

da cida<strong>de</strong>. Aí, agora ela tá trabalhando com Mecânica <strong>de</strong> avião lá no aeroporto, aí ela tá<br />

amando. Ela saiu <strong>de</strong> uma empresa <strong>de</strong> Segurança e tá lá na Segurança também, só que na<br />

parte <strong>de</strong> Mecânica <strong>de</strong> avião.<br />

Lílian: Tem um amigo meu que fez Mecânica e agora tá fazendo Fisioterapia, assim. Não<br />

chegou a concluir o curso <strong>de</strong> Mecânica, foi reprovado, assim, uma ou duas vezes e<br />

agora tá fazendo Fisioterapia, acho que é uma área totalmente diferente.<br />

Débora: Tinha uma menina que andava comigo, a Amanda, ela fazia Construção Civil, aí no<br />

primeiro período ela já <strong>de</strong>sistiu, viu que não era aquilo pra ela. No segundo grau, ela foi<br />

pra área <strong>de</strong> Enfermagem, alguma coisa ligada a isso. Eu lembro que ela tava<br />

trabalhando no Hemo-Rio, hoje eu não sei se ela ainda ta lá, mas ela foi pra essa área<br />

assim. Não tinha nada a ver com ela e ela largou o técnico <strong>de</strong> Edificações, mas agora<br />

ela ta bem nessa área <strong>de</strong>la <strong>de</strong>… área <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> né.<br />

Kely: Eu não sei se vocês lembram, quem estudava aqui também. A Marcela, que a gente era<br />

muito amiga, e a gente até... nós somos bastante amigas ainda. E ela, semanas atrás, eu<br />

tava comentando com ela sobre o encontro aqui, sobre os encontros aqui. E eu vejo.<br />

Hoje ela tá fazendo Construção Civil, e eu há vejo um pouco, assim, ressentida porque<br />

ela não conseguiu terminar, ela não conseguiu passar e não teve como concluir o curso.<br />

Eu sinto que hoje ela, sabe, ela tem um ressentimento em relação a isso, porque ela<br />

queria ter terminado e hoje ela não trabalha, não é técnica, trabalha em outros tipos <strong>de</strong><br />

áreas.<br />

Pesquisador: Você sabe o que ela faz?<br />

Kely: Ela trabalha como, assim, trabalhos extras <strong>de</strong> loja, né, trabalho <strong>de</strong> loja <strong>de</strong> shopping, mas<br />

eu vejo um ressentimento, assim, que ela tinha mó orgulho <strong>de</strong> colocar o jaleco, todos<br />

118


119<br />

aqueles instrumentos <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho, aquele canudo gigante, ela tinha mó<br />

orgulho <strong>de</strong> andar com aquilo.<br />

Débora: É igual à Bárbara. Hoje ela se arrepen<strong>de</strong> <strong>de</strong> ter largado o técnico. Você lembra da<br />

Bárbara né? Ela fez o técnico <strong>de</strong> Eletrotécnica, mas aí tava muito difícil, aí ela<br />

engravidou e tal, aí ela largou, hoje ela se arrepen<strong>de</strong>. Ela falou que se arrepen<strong>de</strong> <strong>de</strong> não<br />

ter continuado e arrumado um emprego legal. Porque, assim, ela já trabalhou em loja<br />

também, e tal. Ai agora ela disse que vai tentar pra UERJ, fazer História. É um sonho<br />

<strong>de</strong>la, né.<br />

Felipe: Daniel. fez Eletrotécnica comigo, fez estágio na Light e foi efetivado. Agora tá na<br />

Light. Trabalhando pra caramba. Só que ele trancou a faculda<strong>de</strong>, ele fazia Física<br />

comigo, só que ele trancou. Porque, também lá na Light, acho que ele trabalha por<br />

turnos, então tem dia que ele tá <strong>de</strong> dia, tem dia que ele tá <strong>de</strong> tar<strong>de</strong>, tem dia que ele tá <strong>de</strong><br />

noite, tem dia que ele trabalha três e folga dois, mas ele se <strong>de</strong>u muito bem, foi efetivado<br />

lá na Light.<br />

Kely: Tem a Carol também, não sei se vocês lembram da Carol. Ela fez Telecomunicações.<br />

Eu lembro que ela reclamava que a turma iniciou com muitos alunos e o curso era<br />

muito difícil e foi reduzindo, reduzindo, reduzindo.<br />

Débora: A minha turma também.<br />

Kely: E ela hoje trabalha com Telecomunicações mesmo, como técnica <strong>de</strong> Telecomunicações e<br />

ainda faz faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia. Ela tava lá pra comemorar o aniversário do Paulo<br />

José, que fez Informática com a gente. Aí ele em <strong>de</strong>u uma notícia tão boa assim, ele<br />

falou: pô fui promovido, tõ ganhando mais. E falei: pô, cara, que bom, pô. Porque <strong>de</strong>ve<br />

ser mó barra tu per<strong>de</strong>r o pai assim. É per<strong>de</strong> o chão, apesar do emocional ainda tem o<br />

financeiro, mas ele me <strong>de</strong>u essa resposta, eu fiquei feliz pra caramba. Pô, fui<br />

promovido. Pô, fiquei feliz por ele pra caramba.<br />

Felipe: Eu tenho um colega que fez Eletrônica, hoje ele passou pra Medicina na UERJ e é a<br />

área <strong>de</strong>le. Só fala <strong>de</strong> sangue, operações.<br />

Pesquisador: Eu vi aqui outro dia um caso <strong>de</strong> gente que casou aqui no Horácio.<br />

Lílian: O Diego e Juliana.<br />

Pesquisador: Vocês conhecem outro caso?<br />

Kely: O Tiago.<br />

Lílian: Eu não sei se o pessoal ainda tá junto, mas tinha um pessoal que tava namorando e há<br />

pouco tempo atrás eles ainda estavam namorando ainda, eu não sei agora, porque eu<br />

perdi o contato, mas era o namoro que começou na sala. O Eric e a Vanessa, não sei<br />

nem se eles tão juntos ainda. Mas eles continuaram <strong>de</strong>pois que saíram do Horácio<br />

Macedo.


Pesquisador: Muitos casaram?<br />

Geice: O Douglas e a Monique, que eram do Grêmio.<br />

Felipe: A minha namorada, eu conheci ela no terceiro ano. Mas assim, eu comecei a namorar<br />

com ela <strong>de</strong>pois que eu saí daqui. Na época ela tinha um namorado.<br />

Kely: E você respeitou, que legal!<br />

Felipe: Não, eu não respeitei na verda<strong>de</strong>. Eu ficava em cima, e ela nada. Mas <strong>de</strong>pois ela terminou<br />

com ele e a gente se encontrou, aí a gente tá mais <strong>de</strong> um ano, um ano e dois meses, eu<br />

acho.<br />

Pesquisador: E vocês conhecem alguém que tem filhos?<br />

Kely: É um exemplo, o da Marcela. Ela teve um nenenzinho, <strong>de</strong> um ano, e tá lindo, o Igor.<br />

Lílian: Eu só conheço a Juliana e o Diego. Diego já estudou comigo, mas…<br />

Pesquisador: Mas a Juliana parou <strong>de</strong> estudar e trabalhar. Ela só cuida do filho <strong>de</strong>la, não é isso?<br />

Lílian: Teve uma época que eu, porque ela mora perto da minha casa, eu a via indo pro CEFET,<br />

não sei agora se ela concluiu. Como ela tá, porque a gente não tem contato, mas eu<br />

encontrava com ela na rua.<br />

Pesquisador: E a experiência <strong>de</strong> vocês na formação técnica, no curso técnico, o que vocês<br />

lembram?<br />

Lílian: Deixa-me começar então? Bom, o que eu lembro <strong>de</strong> bom eram as viagens que a gente<br />

fazia. Eu fui pra São Paulo, Petrópolis. Era muito legal a convivência. A gente<br />

apren<strong>de</strong>u a conviver com outras pessoas. Eu tive que dormir no mesmo quarto que a<br />

minha amiga. À noite a gente saiu pra perturbar um no quarto do outro. Em Petrópolis,<br />

a gente po<strong>de</strong> levar, por exemplo, eu levei meu pai, teve gente que levou a avó, teve<br />

aquele convívio, aquela aprendizagem, por exemplo, <strong>de</strong> um conhecer o pai do outro.<br />

Teve um evento que eu organizei lá no CEFET, junto com a minha turma, que foi um<br />

evento, eu não sei se vocês lembram e se participaram, era sobre cultura nor<strong>de</strong>stina se<br />

não em engano. A gente levou pessoas muito legais, aá foi muito legal. E tinha também<br />

a parte ruim, que foi a dificulda<strong>de</strong> com as línguas, pelo menos pra mim. Tinha aula <strong>de</strong><br />

Inglês e tinha aula <strong>de</strong> Espanhol. Espanhol eu nunca tinha tido na minha vida, Inglês<br />

sim, mas era um ensino totalmente voltado para o Turismo, então eu sentia muita<br />

dificulda<strong>de</strong> porque eu não fazia outro curso fora. E aí era muito difícil, era muito<br />

complicado. E, às vezes, também acontecia da mesma semana <strong>de</strong> prova no Horácio<br />

Macedo era junto com as provas do técnico, você tinha que estudar na mesma semana<br />

pro curso técnico e pro Horácio Macedo.<br />

120


Geice: Isso pra quem estudava lá era melhor né porque eles, quem fazia o Médio lá, eles<br />

tinham separado, esquematizado, mas a gente não. Então, geralmente acontecia isso, a<br />

gente ter prova aqui, trabalho pra apresentar, que a gente tinha muito trabalho pra<br />

apresentar né, e tá em semana <strong>de</strong> prova lá também. Acontecia muito.<br />

Lílian: Acontecia também <strong>de</strong> vir correndo do curso técnico, pra vir almoçar aqui no colégio, pra<br />

po<strong>de</strong>r ter aula uma hora da tar<strong>de</strong> e ficar até seis horas da noite, voltar pra casa,<br />

<strong>de</strong>scansar, fazer alguns exercícios <strong>de</strong> casa, dormir e no outro dia tá lá.<br />

Débora: Com o Técnico eu <strong>de</strong>scobri o que era a prova final. Eu nunca tinha ido pra prova final,<br />

recuperação, nada. No Técnico, eu acho que todos os períodos, só não fui pra prova<br />

final no último período, todos os períodos eu fui pra prova final. Um foi em<br />

Eletricida<strong>de</strong>, outro foi em Telecom, em Telecom eu fui a todos, porque o professor era<br />

difícil. Muita gente largou, muita gente porque achava… não dava. Minha turma<br />

começou com cinqüenta alunos e cinco meninas, <strong>de</strong>sses cinqüenta alunos se formaram<br />

trinta e três meninas.<br />

Igor: A minha foi pior. Começando com cinqüenta se formaram sete. Formaram-se três, né,<br />

que têm diploma, mas eu acho que sete conseguiram concluir todas as matérias, estão<br />

estagiando aí, não sei se vão conseguir o diploma.<br />

Lílian: Mas acontece isso, às vezes empaca numa matéria, num professor que não gosta muito.<br />

‘Ai não vai dar, não vai dar’. Aí pega e <strong>de</strong>siste e larga tudo, assim. Porque acha que não<br />

vai dar.<br />

Débora: Mas apesar <strong>de</strong> ser difícil, que a gente ficou lá batalhando, mas tem que gostar. Eu<br />

achava muito difícil, muito difícil, mas eu só continuei porque eu queria trabalhar com<br />

eletrônica. Eu falei assim: Ah, eu vou passar. Aí eu estudava, estudava, estudava, eu<br />

gostava das aulas práticas <strong>de</strong> laboratório, era divertido pra caramba. Aí eu falei: Eu<br />

quero trabalhar com Eletrônica, então eu me mato <strong>de</strong> estudar e <strong>de</strong>pois isso passa.<br />

Felipe: Mas existiu muito esse negócio <strong>de</strong> correr do professor. Tinha um professor <strong>de</strong><br />

Eletrotécnica, o Daniel até foi pra tar<strong>de</strong>. Haedi, tem até comunida<strong>de</strong>: ‘Haedi, eu<br />

sobrevivi’. O cara era o terror. Você chegando ao quarto período, sabia que ia ter aula<br />

<strong>de</strong> (?) com o Haedi, muitos repetiam. Muitos trocavam, já trocavam antes.<br />

Lílian: E também outros alunos que fizeram o curso anteriormente já avisavam: ó, esse<br />

professor é o cão. Bem eu não fui assim, porque eu fui da primeira turma <strong>de</strong> Turismo<br />

do CEFET. Então, eu meio que fui conhecendo aos poucos, eu fui a cobaia <strong>de</strong> todo<br />

mundo. Mas tinha gente que acontecia isso.! Ele era físico. Então apesar <strong>de</strong> ter<br />

professores, <strong>de</strong> ser difícil, eu acho que não tenho muito que reclamar dos professores<br />

não.<br />

Kely: Eu tive um professor, vários, mas um dos que marcou bastante foi um professor <strong>de</strong><br />

incêndio. Segurança do Trabalho tem uma matéria <strong>de</strong> incêndio. O professor era tão<br />

apaixonado pelo que ele fazia que ele levava ví<strong>de</strong>os, materiais extras. Ele era tão<br />

apaixonado por fogo que ele fala que ia pro shopping com a esposa passear e ficava<br />

olhando hidrante, extintores, e a gente começou a ficar apaixonada. E quando eu saí do<br />

121


122<br />

curso numa entrevista que eu fiz numa empresa, eles perguntaram: qual a matéria que<br />

você mais gosta? E eu: incêndio. E quando eu entrei, eu fui pro estágio e a parte que eu<br />

cui<strong>de</strong>i: <strong>de</strong> incêndio. Fui pro meu trabalho, on<strong>de</strong> eu trabalho hoje, a princípio eram<br />

divididos os assuntos, né, os tipos <strong>de</strong> trabalho e eu fiquei com a parte <strong>de</strong> incêndio.<br />

Então eu gostei bastante. Hoje eu cuido mais <strong>de</strong> outras coisas, mas incêndio marcou<br />

bastante e me <strong>de</strong>u bastante crescimento. Tinha um outro professor também, que foi meu<br />

professor e hoje é meu chefe. Ele é engenheiro lá e me <strong>de</strong>u muita força. Eu terminei o<br />

técnico e toda dúvida que eu tinha, quando eu fiz estágio eu fiz na assessoria, então<br />

tudo era ele, Francisco que é isso? Coisa que eu não tinha visto, porque teoria e prática<br />

são coisas bem diferentes, então toda hora: socorro! E ele era super atencioso, é um<br />

professor que é professor na sala e fora. Ele tem o interesse <strong>de</strong> passar, comprou pra<br />

mim vários CDs <strong>de</strong> coisas <strong>de</strong> informações pra gente e me <strong>de</strong>u, assim, ele tem interesse,<br />

ele gosta <strong>de</strong> sentir assim, <strong>de</strong> passar as coisas sabe. Você pergunta pra ele, ele gosta <strong>de</strong><br />

ajudar, quando ele não sabe, eu costumo falar que ele é uma biblioteca ambulante. Ele<br />

não sabe, ele quer procurar. Eu aprendo muito com ele e tenho aprendido esse dois<br />

anos, e foi marcante.<br />

Geice: É, tem professor que realmente permanece assim até <strong>de</strong>pois. Edificações é um curso<br />

muito gostoso. Pelo menos <strong>de</strong> manhã não tinha nenhum professor que fosse um horror.<br />

Tinha uma matéria, que é <strong>de</strong> Estrutura, que era o cão, assim, calcular, era muito difícil,<br />

a turma inteira ficava horrorizada. Mas os professores eram muito bons, muito<br />

atenciosos, muito interessados. E, <strong>de</strong>pois, até que eu terminei quando eu fui trabalhar<br />

numa empresa, na primeira semana que eu tava na empresa em <strong>de</strong>ram um levantamento<br />

pra eu fazer e eu olhei aquela planta e eu falei: socorro! Aí eu voltei no CEFET, aí o<br />

Madureira e o Salvador me ajudaram. Eu já tinha terminado eu não tinha nada a ver,<br />

mesmo assim eles me ajudaram. Tem muitos professores que até <strong>de</strong>pois tem esse<br />

interesse <strong>de</strong> tá, ajudando o aluno. Eu só tive, com relação a professores, quando eu fui<br />

fazer História, né, e aí não tem muita coisa a ver com Edificações, eu sofri meio que um<br />

pouco <strong>de</strong> preconceito. Porque eu entrei na faculda<strong>de</strong> no primeiro semestre, e eu tava no<br />

ultimo ano do técnico, aí eu fazia CEFET <strong>de</strong> manhã e faculda<strong>de</strong> à noite. E aí, quando<br />

alguns professores <strong>de</strong>scobriram que eu tava fazendo faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> História, pra quê!<br />

Queriam que eu saísse do curso. ‘Você tem que sair, como é que você vai’… Eles<br />

achavam que eu tava per<strong>de</strong>ndo tempo, enten<strong>de</strong>u, fazendo curso técnico, e eu tinha<br />

consciência <strong>de</strong> que não, <strong>de</strong> que eu queria ter uma profissão, que até pra eu me manter<br />

na faculda<strong>de</strong> seria interessante se eu tivesse um trabalho e que se não fosse assim<br />

qualquer trabalho, ah se eu fosse trabalhar no shopping, nada contra trabalhar no<br />

shopping, mas seria mais interessante se eu tivesse uma profissão. E eu não tava<br />

<strong>de</strong>cidida ainda quando eu fiz vestibular, eu pensei em fazer Arquitetura, mas acabei<br />

indo pra História, mas eu tava muito na dúvida ainda. Eu falei: ah eu vou começar a<br />

faculda<strong>de</strong> em outra área e <strong>de</strong>pois, se me interessar, eu posso voltar pra essa área, posso<br />

trabalhar com Edificações, fazer um concurso. Acabei ficando com a História, que eu<br />

gosto mais <strong>de</strong> gente do que <strong>de</strong> número, né. Mas tem professores que ajudam muito e<br />

tem professores que <strong>de</strong>sanimam. Eu, no quinto período e, ah não, o que você tá fazendo<br />

aqui ainda? Enten<strong>de</strong>u, aconteceu isso. Mas Edificações é um curso muito gostoso. Eu<br />

lembro até hoje <strong>de</strong> fazer trabalho <strong>de</strong> Topografia na Quinta da Boa Vista com o, esqueci<br />

o nome do professor, foi o Madureira mesmo, aí a gente fez piquenique, foi super legal.<br />

É um curso que não tem tanta evasão assim, a turma não terminou tão vazia, terminou


123<br />

mais ou menos coma mesma quantida<strong>de</strong> que entrou e sempre muito legal, muito<br />

divertido.<br />

Débora: O que ajuda bastante a gente no curso técnico são os colegas, né, porque se eu não<br />

tivesse ninguém pra me ensinar à matéria eu não teria continuado. E, assim, a minha<br />

turma, eu <strong>de</strong>testava a minha turma, eu <strong>de</strong>testava, eu não falava com ninguém, porque só<br />

tinha homem e eu os achava muito bobos, eles eram muito bobos e chatos, então, assim,<br />

pra mim era muito chato tá lá na sala <strong>de</strong> aula com eles, mas tinha o meu grupo, né, que<br />

eram , mais duas meninas e eu, achávamos que eram uns cinco meninos que andavam<br />

com a gente. Então, aí, eles é que davam aquele apoio pra gente, pra mim<br />

principalmente. Aí tinha uma menina, do Horácio Macedo também, que estudava na<br />

mesma turma do Médio e do Técnico, e ela era inteligente pra caramba, ela tá até<br />

fazendo Física e Engenharia ao mesmo tempo, aí ela me ajudava pra caramba, me<br />

ensinava lá me ensinava aqui, então pra estudar sempre estudava junto pra fazer<br />

trabalho fazia junto, então isso que ajuda você a não <strong>de</strong>sistir, né. Aí eles ficavam: não,<br />

você vai conseguir. Você vai passar. Te estimula, porque senão a gente <strong>de</strong>siste.<br />

Lílian: A gente teve um caso pra <strong>de</strong>sistência, que eu tive uma professora, prefiro não dizer o<br />

nome nem a matéria, que ela, ao invés <strong>de</strong> dar aula, ela ficava sambando na sala. Eu<br />

lembro que ela queria sambar: Ah, eu quero apren<strong>de</strong>r a sambar, eu quero apren<strong>de</strong>r a<br />

sambar. Aí tinha eu, a Juliana, a Juliana dança, a Tatiana também. Ela levava o som pra<br />

sala, ela pedia o som emprestado e a gente começava a ensinar ela a sambar, a gente<br />

ficava sambando <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> sala. O resto da turma ficava olhando aquilo.<br />

Lílian: A matéria era Contabilida<strong>de</strong>. Eu acho que ela caiu <strong>de</strong> pára-quedas no curso, e ela dava<br />

aula aqui no Horácio Macedo também, aí caiu <strong>de</strong> pára-quedas no curso e acho que ela<br />

não sabia muito que ensinar <strong>de</strong> Contabilida<strong>de</strong> pros alunos <strong>de</strong> Turismo, ela achou que<br />

aquilo pra gente não ia servir e ela contava os casos dos namorados <strong>de</strong>la. Não vou falar.<br />

Contava história <strong>de</strong> aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong>la. Era muito engraçada a aula <strong>de</strong>la, a gente se divertia,<br />

mas tinha gente que não gostava. Que a nossa sala era dividida, eu não lembro como é<br />

que era <strong>de</strong>nominado, mas tinha um grupo isolado e outro grupo. A sala era dividida ao<br />

meio, literalmente dividida. O pessoal era muito excluído, digamos assim.<br />

Pesquisador: Volta a falar um pouco disso dos grupos em sala <strong>de</strong> aula.<br />

Lílian: Pelo menos no meu caso era assim. O pessoal que eu andava no meu grupo a gente<br />

estudava na mesma sala, tinha amigos na outra sala e o outro grupo era, por exemplo, o<br />

pessoal que fez Turismo à tar<strong>de</strong>, eu era da manhã e aí quando juntou todo mundo não<br />

tinha aquela afinida<strong>de</strong>, não tinha aquele… Às vezes o curso técnico também acontece à<br />

mesma coisa, o pessoal não batia <strong>de</strong> frente. Tanto que pra fazer trabalho em grupo a<br />

turma toda pra organizar evento sempre dava confusão, sempre dava briga por conta<br />

disso. Eu lembro que em São Paulo, no Hotel, o pessoal tinha combinado <strong>de</strong> ir pro Hopi<br />

Hari, tava chovendo e a professora falou: não, a gente vai pro Hopi Hari. E na hora <strong>de</strong>u<br />

confusão por conta <strong>de</strong>ssa divisão.<br />

Débora: Essa divisão é ruim, porque, igual ao que falei, eu não me dava mesmo com os meninos<br />

da minha turma, e eram poucos os que eu falava e menos ainda os que eu me dava bem.


124<br />

Só que nos grupos <strong>de</strong> laboratório, eram três grupos e você não tinha como escolher. O<br />

grupo <strong>de</strong> laboratório, você tinha que ficar com aquele grupo e no meu grupo era uma <strong>de</strong><br />

menina e só os meninos e só tinha um que eu falava. Que era por or<strong>de</strong>m alfabética, né.<br />

É horrível. Eu me lembro que um dia eu me queimei na sala, gente, mas eu gritei, e os<br />

meninos começaram a zoar. Eles ficaram rindo <strong>de</strong> mim, ah, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> bobeira, não sei o<br />

quê, mas <strong>de</strong>pois que eles viram que eu tinha me queimado sério eles se acalmaram. É<br />

complicado, né, às vezes eu ia pra sala, aí o garoto que fazia comigo que eu falava não<br />

tava, aí tinha que fazer em dupla com outra pessoa. É muito chato.<br />

Pesquisador: E quanto ao conteúdo do Ensino Técnico?<br />

Lílian: Bem pra mim assim, foi importante. Por ser Turismo, eu conheci muito do Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro e outros lugares. Acho que foi um curso que teve <strong>de</strong> tudo, teve exatas, teve<br />

humanas. Eu lembro que eu tive aula <strong>de</strong> Segurança do Trabalho, não lembro a matéria,<br />

eu tive isso, eu tive contabilida<strong>de</strong>, eu tive Sítios e Monumentos, tive aula <strong>de</strong> Inglês, tive<br />

aula <strong>de</strong> Espanhol, tive aula <strong>de</strong> um monte <strong>de</strong> coisa que eu acho que pegou um pouco <strong>de</strong><br />

cada um assim. Pra minha vida, hoje, acho que serviu muito assim. Eu tive uma base<br />

em casa também do meu pai, que ele é taxista e em ajudava muito em todas as matérias<br />

e acho que até hoje. Eu passo pelos lugares assim, eu lembro: poxa, da época que eu<br />

estudava. E que eu não esqueci.<br />

Igor: As matérias que você fazia lá, <strong>de</strong> Inglês e Espanhol ajudaram no curso <strong>de</strong> Letras da<br />

faculda<strong>de</strong>?<br />

Lílian: Não, acho que não, nem a aula <strong>de</strong> Português que eu tinha era diferente, era voltado<br />

pra… não, não tiveram muita influência, não. Hoje pra mim é importante. Se eu quiser<br />

hoje seguir o curso <strong>de</strong> Turismo, seguir Turismo e Hotelaria vai ter ajuda, mas acho que<br />

não foi suficiente, porque o Espanhol e o Inglês <strong>de</strong> lá era necessário que você já tivesse<br />

uma base. Não era gramática, que nem se apren<strong>de</strong> no curso o beabá, não, lá era a<br />

situação em inglês. Por exemplo, você tá na Espanha, como é que você vai indicar pro<br />

turista que ele vai pro trem? Era totalmente diferente.<br />

Geice: Mas essas coisas assim <strong>de</strong> você passar nos pontos turísticos e lembrar da escola, acho<br />

que <strong>de</strong>pois que a gente acaba o técnico a gente fica meio fissurado, porque eu se passo<br />

numa obra eu fico olhando e eu vejo e a gente vê, aí vem alguém <strong>de</strong> Segurança, vai e<br />

vai dizer: ele tá sem capacete, sem luva. Você fica meio assim, sei lá o conteúdo passa<br />

a fazer parte da sua vida.<br />

Igor: Passa numa obra: ó, essa é uma obra da empresa que eu estagiei, ali na frente tem outra,<br />

ali em Realengo tem outra, do outro lado tem outra…<br />

Kely: Eu já tive algumas situações <strong>de</strong> estar na rua, lá no bairro on<strong>de</strong> eu trabalhava, <strong>de</strong> ver<br />

situações totalmente erradas dos trabalhadores estarem sem proteção e <strong>de</strong> eu me segurar<br />

pra não falar. Eu sei que eles têm um supervisor, que é a pessoa direcionada a dar a<br />

proteção pro funcionário, só que aquilo ali me trouxe uma revolta, enten<strong>de</strong>u, porque eu<br />

sei que aquilo ali vai prejudicar o cara, se ele trabalhar daquele jeito e acontecer um<br />

aci<strong>de</strong>nte, e vai ter várias situações, né. Deu me segurar assim.


Débora: Pelo que a gente estuda no técnico, eu acho que o conteúdo que a gente teve no CEFET<br />

é muito bom, se você for comparar com os cursos técnicos você vê que alguns têm certa<br />

<strong>de</strong>ficiência. Pra mim eu só tive uma <strong>de</strong>ficiência na prática <strong>de</strong> telecomunicações, mas <strong>de</strong><br />

resto, quando eu fui estagiar, eu fui fazer uma entrevista <strong>de</strong> estágio e tinha que fazer<br />

prova, né. E teve uma prova prática <strong>de</strong> soldar. Aí eu falei: brinca<strong>de</strong>ira! Aí se eu não<br />

tivesse tido aula pra soldar placa, pra fazer a placa, eu não teria feito o estágio. Hoje, na<br />

faculda<strong>de</strong> eu tenho laboratório <strong>de</strong> física. Cara, eu já sei fazer isso tudo! Aí eu vou lá e já<br />

sei fazer, então aquilo que eu fiz, que eu estu<strong>de</strong>i lá que eu aprendi eu não esqueço. Hoje<br />

minha amiga ta fazendo curso <strong>de</strong> Telecomunicações e ela vem me perguntar as coisas e<br />

eu falo, eu lembro das matérias, aí eu: poxa, você já <strong>de</strong>u isso, já <strong>de</strong>u aquilo? Então foi<br />

muito importante pra mim aquilo que a gente estudou, tanto em sala <strong>de</strong> aula, quanto na<br />

parte prática.<br />

Lílian: Meu curso técnico eu tive aula <strong>de</strong> etiqueta e organização <strong>de</strong> eventos. Pra mim, eu acho<br />

que essas matérias foram fundamentais. Etiqueta como se portar à mesa, como comer,<br />

copo <strong>de</strong> vinho copo <strong>de</strong> água, guardanapo e tal, mas que <strong>de</strong>pois. pra minha vida acho<br />

que foi legal. Organização <strong>de</strong> eventos, por exemplo, eu quero organizar alguma coisa lá<br />

em casa. eu já sei quanto <strong>de</strong> comida e bebida vou precisar. Eu lembro que a avaliação<br />

era montar uma festa <strong>de</strong> quinze anos. Nunca mais eu me esqueço. Eu tive que procurar<br />

como se eu tivesse montando mesmo, eu tive que ligar pros lugares e procurar saber<br />

preço, roupa tudo isso eu tive que fazer.<br />

Geice: É que nem a gente fazendo orçamento também, a gente tem que ligar e ver o preço do<br />

tijolo, do concreto.<br />

Lílian: E o que a gente apren<strong>de</strong>u serve pra nossa vida também.<br />

Geice: Em Edificações, eu consi<strong>de</strong>ro que a gente teve duas <strong>de</strong>ficiências, que eu senti na minha<br />

vida. O Autocad, porque a gente só passa a ter Autocad no último período, a gente<br />

primeiro apren<strong>de</strong> a <strong>de</strong>senhar no papel, tá é importante apren<strong>de</strong>r a <strong>de</strong>senhar no papel,<br />

mas todas as empresas, quando eu ia procurar estágio, queriam que você soubesse<br />

Autocad e eu tava no quinto período, tentando arrumar estágio e eu só ia ter Autocad no<br />

sexto. Aí isso foi um problema pra mim assim, e acabou que quando eu terminei o<br />

Autocad que eu fui pro estágio, não precisava <strong>de</strong> Autocad o estágio. Agora eu tenho<br />

Autocad, vou pro estágio, o estágio que eu arrumei não precisava <strong>de</strong> Autocad. E <strong>de</strong>pois<br />

eu senti também alguma coisa <strong>de</strong>ficiente, no caso, porque se enfatiza muito em<br />

Edificações a parte acima da fundação, né, a construção mesmo e eu fui trabalhar numa<br />

empresa <strong>de</strong> Geotecnia, que mexe com tudo que tá em baixo da terra, fundação,<br />

sondagem, rebatimento <strong>de</strong> lençol, aí por isso que eu saí correndo um dia e fui lá<br />

procurar o Madureira. Mas, mesmo assim os conteúdos até hoje, mesmo sem tá<br />

trabalhando na área, eu tenho uma amiga que ta fazendo Edificações lá no CEFET a<br />

gente conversa muito e eu ajudo ela a fazer as coisas dos orçamentos <strong>de</strong>la e a gente às<br />

vezes conversando, falando com outra: ah, não sei o que, que você tem que aprumar. Aí<br />

a menina virou: o que é aprumar? Aí eu: você não fez Edificações, não sabe <strong>de</strong> nada.<br />

Muito engraçado.<br />

125


Kely: Na Segurança, eu já acho que o curso podia ser mais um pouco aprofundado em<br />

algumas matérias. Porque, o que acontece. Eu trabalho em um laboratório e trabalho<br />

numa transportadora. É muito diferente, é muito, não tem nada a ver. Construção<br />

Civil… você aplicar Segurança. Mas não é só você aplicar o que você apren<strong>de</strong> lá <strong>de</strong><br />

documentações e legislação, é muito mais do que isso. Eu aprendi muita coisa na<br />

prática, claro, sempre na prática você apren<strong>de</strong> muito mais. Mas algumas matérias<br />

<strong>de</strong>ixaram a <strong>de</strong>sejar sabe, ou visitas. Visitas assim curriculares.<br />

Débora: Foi o que eu senti falta também.<br />

Kely: Visita curricular acho que isso é importante, um laboratório hoje, <strong>de</strong>pois, ah, vamos<br />

numa obra. Enten<strong>de</strong>u, já que existe a área <strong>de</strong>sses diferentes tipos <strong>de</strong> empresa né, <strong>de</strong><br />

áreas, vamos visitar, vamos conhecer um pouquinho, enten<strong>de</strong>u, ter uma noção como é<br />

que é enten<strong>de</strong>u. Porque eu senti.<br />

Débora: Meu professor ele disse que ia <strong>programa</strong>r. Todo ano ele ia <strong>programa</strong>r pras turmas <strong>de</strong>le,<br />

que ele dava aula <strong>de</strong> sistema <strong>de</strong> TV, <strong>de</strong> ir ao PROJAC, só que ele não conseguiu a visita<br />

pra gente. E é legal, né. pra você ver como é que funciona, pra ver se você quer ir<br />

praquela área. Porque Eletrônica, assim como Segurança do Trabalho, ela é muito<br />

ampla, você po<strong>de</strong> trabalhar em várias coisas, então é legal pra escolher, né. Tanto que<br />

eu consegui <strong>de</strong>pois um estágio na GLOBOSAT ,eu fiquei na dúvida e eu não fui,<br />

porque eu falei assim: Gente! Eu já tava estagiando na parte <strong>de</strong> Radiologia, aí eu falei:<br />

se eu for pra área <strong>de</strong> TV e não gostar? Aí eu <strong>de</strong>ixei <strong>de</strong> lado. Então, se a gente, se tivesse<br />

ido ver como é que é, eu acho que ficaria mais fácil. Porque na escola o que a gente vê?<br />

A gente vê televisão e ví<strong>de</strong>o, <strong>de</strong>ntro. A gente não vê a parte <strong>de</strong> antena como seria pra<br />

trabalhar, então é bom você ver várias áreas assim.<br />

Pesquisador: E a experiência <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> vocês, como é que foi a vida <strong>de</strong> vocês em relação ao<br />

trabalho?<br />

Débora: Bom, eu fiz dois estágios né, comecei com <strong>de</strong>zessete anos eu ainda tava no finalzinho<br />

do técnico. Tava acabando, no final <strong>de</strong> 2004. Aí eu fui comecei um estágio numa<br />

empresa que ela fazia tacógrafo. Tacógrafo ele é um medidor daquele negócio do<br />

ônibus, né, pra medir a velocida<strong>de</strong>. Era até interessante, só que o estágio lá eu só tinha<br />

que montar placa. Era muito chato e eu não gostava <strong>de</strong> lá, eu odiava aquele estágio, eu<br />

não via a hora <strong>de</strong> arrumar outro. Eu continuei fazendo entrevista, fazendo entrevista, aí<br />

eu consegui entrar numa empresa <strong>de</strong> Engenharia Médica, aí eu: ah! Graças a Deus! Aí<br />

eu fiquei um mês só nesse emprego, saí <strong>de</strong>sse estágio, aí, no mês seguinte eu já entrei<br />

nesse <strong>de</strong> Engenharia Médica. Lá a gente trabalhava com clínicas e hospitais na parte <strong>de</strong><br />

radiologia. Aí a gente consertava equipamento <strong>de</strong> raio-x equipamento <strong>de</strong> mamografia,<br />

<strong>de</strong>nsitometria e as processadoras <strong>de</strong> raio-x, que é a parte que revela filme. Era muito<br />

legal. Eu tive um curso lá <strong>de</strong>ntro que era curso pra gente saber como é que fabricava o<br />

raios-X, pra gente po<strong>de</strong>r enten<strong>de</strong>r qual era o problema do equipamento. Então a gente<br />

consertava, ia aos hospitais. Eu fiquei sete meses nesse estágio, até que eles mandaram<br />

embora o menino do estoque <strong>de</strong> peças e equipamentos da empresa. Aí eles falaram<br />

assim: Débora a gente vai te efetivar e você fica no estoque. Aí eu parei um pouquinho<br />

<strong>de</strong> ir pra rua e fiquei só no estoque e aquilo já tava me enchendo, eu não tava mais<br />

126


127<br />

gostando, porque eu gostava das máquinas, <strong>de</strong> ir lá ao cliente consertar. Aí eu também<br />

já não tava mais agüentando, peguei e saí. Aí eu tava doida pra sair, só que eu tinha que<br />

arrumar um outro emprego. Um amigo meu me ligou e falou assim: Débora, você tá<br />

trabalhando? Eu falei: tô. Ele: ah, então <strong>de</strong>ixa. Eu falei: não, fala. Aí ele: não, eu queria<br />

te fazer uma proposta. Eu: ah, eu aceito. Aí fui lá à empresa <strong>de</strong>le, que ele tem uma<br />

empresa <strong>de</strong> segurança eletrônica e fui contratada. Só que eu já tava prestes a entrar na<br />

UERJ, que eu tinha passado, só que eu passei pra entrar no segundo período. Aí eu falei<br />

assim: e agora? Eu tô com um emprego <strong>de</strong> oito horas, não vou estudar à noite <strong>de</strong> jeito<br />

nenhum, vou ter que sair do emprego. Eu já tinha até conversado com ele. Olha, vou<br />

ficar aqui só até começar a faculda<strong>de</strong>. Depois eu vou ter que largar. Aí ele: não tudo<br />

bem. Aí eu fiquei dois meses lá, dois meses que eu fiquei lá arrumei um emprego <strong>de</strong><br />

meio período que é o que eu to agora, na Xérox. Aí eu dou suporte técnico pras<br />

máquinas, é por telefone, mas eu também tive um curso lá <strong>de</strong>ntro. Então eu cresci<br />

bastante porque eu tive um curso da área <strong>de</strong> Radiologia, um curso <strong>de</strong> Segurança<br />

Eletrônica e agora um curso <strong>de</strong> Xerografia. Então agora eu sei tudo <strong>de</strong> impressora,<br />

copiadora, scaner. Eu não tinha aprendido nada na área <strong>de</strong> Re<strong>de</strong>s na escola. Eu aprendi<br />

lá. Tive um cursinho básico <strong>de</strong> Re<strong>de</strong>s, conforme o cliente liga: ah, que a minha re<strong>de</strong> é<br />

tal, não sei o que. Aí você acaba pegando aquela experiência, né, então é maravilhoso.<br />

A parte que eu mais gostei foi a parte da Radiologia, <strong>de</strong> quando eu ia ao cliente pra<br />

consertar a máquina, ficava um dia inteiro as vezes num cliente só e agora nessa parte<br />

<strong>de</strong> conserto <strong>de</strong> impressora. É muito legal.<br />

Pesquisador: Você teve alguma experiência antes <strong>de</strong>sse estágio?<br />

Débora: Não, a primeira experiência foi o estágio ruim, que eu nem conto. Pra mim, a<br />

experiência que tive profissional mesmo eu comecei na área <strong>de</strong> Radiologia.<br />

Felipe: Eu comecei a trabalhar mais ou menos nesse mesmo período assim <strong>de</strong> vida. Saí do<br />

Horácio, terminei aqui o terceiro ano, aí minha irmã trabalhava numa locadora. Aí<br />

surgiu uma vaga lá pra trabalhar. Eu tava parado, tinha acabado <strong>de</strong> estudar, só tinha o<br />

curso técnico, tinha mais dois períodos pela frente. Aí fui pra locadora. Aí comecei a<br />

ficar <strong>de</strong> manhã, <strong>de</strong> noite, comecei a gostar, gostar e teve um período das férias que eu<br />

fiquei o período todo, minha irmã saiu conseguiu outro emprego. Aí fiquei o período<br />

todo. Eu comecei a organizar a vida da locadora. Eles confiavam muito na gente.<br />

Comecei a gostar <strong>de</strong>ssa parte <strong>de</strong> administrar, comecei a administrar a locadora. Fazia o<br />

curso técnico <strong>de</strong> manhã e ia pra locadora na parte da tar<strong>de</strong>, conseguiram uma pessoa pra<br />

colocar na parte da tar<strong>de</strong> e fiquei mantendo. Eu terminei o curso técnico em 2004 e na<br />

locadora, na locadora. Só que eu já tava muito acomodado, tinha que fazer o estágio ou<br />

então não ganhava o certificado do curso. Aí comecei a procurar estágio e só comecei a<br />

fazer estágio esse ano em fevereiro. Foi numa empresa <strong>de</strong> helicóptero, motor <strong>de</strong><br />

helicóptero. Muito maneiro, sei tudo <strong>de</strong> motor <strong>de</strong> helicóptero. Show. Agora tá até<br />

surgindo uma oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser efetivado, já conversaram comigo, talvez até<br />

<strong>de</strong>zembro, que termina o período <strong>de</strong> uma menina lá, talvez me efetivem, é show <strong>de</strong><br />

bola. Eu tranquei agora a faculda<strong>de</strong>, faço faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Física, e eu tranquei porque eu<br />

tô querendo mudar pra Engenharia <strong>de</strong> Produção, que é com o que eu trabalho lá, sou<br />

controlador <strong>de</strong> produção e é sensacional trabalhar com motor <strong>de</strong> helicóptero em Xerém,<br />

que é longe pra caramba, mas é muito maneiro, a empresa dá a maior confiança.


Kely: Eu comecei como babá. Pegava criança no colégio, levava as crianças. Várias crianças,<br />

quase a rua inteira, eu fui babá <strong>de</strong>les. Aniversário eles ficavam lá cantando parabéns pra<br />

mim.<br />

Pesquisador: Quantos anos?<br />

Kely: Ah! treze pra quatorze anos. Aí <strong>de</strong>pois eu comecei com trabalhos temporários como<br />

promotora. Trabalhar com produtos <strong>de</strong> mercado, tipo aquelas paradas <strong>de</strong> <strong>de</strong>gustação, ou<br />

apresentando um produto novo. Aí trabalhei um bom tempo com isso. Quando eu<br />

iniciei o técnico eu continuei trabalhando durante o dia como promotora e à noite eu<br />

fazia o técnico <strong>de</strong> Segurança. Tudo isso trabalho sem carteira assinada. Meu primeiro<br />

trabalho <strong>de</strong> carteira assinada foi como técnico <strong>de</strong> Segurança do Trabalho. Tem lá, a<br />

única assinatura da carteira é como técnico. E hoje eu tõ trabalhando como técnica <strong>de</strong><br />

Segurança do Trabalho.<br />

Pesquisador: E o estágio, você fez estágio?<br />

Kely: Fiz, fiz estágio numa transportadora e logo <strong>de</strong>pois arrume o trabalho.<br />

Lílian: Bom meu caso foi, eu nunca tinha trabalhado antes. Logo que eu terminei o curso<br />

técnico, em 2004, fui trabalhar num hotel on<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte da minha turma tinha<br />

passado. E assim o estágio era meio ruim porque eles não davam passagem, apesar <strong>de</strong>u<br />

ter a passagem do CEFET, mas não dava passagem e não era remunerado. A única<br />

coisa que eles davam era alimentação. E assim era um estágio que eu trabalhava muito,<br />

muito, muito. Eu comecei trabalhando na área <strong>de</strong> banquetes, eu fazia uns eventos lá, eu<br />

arrumava a mesa, via tudo <strong>de</strong> eventos e <strong>de</strong>pois eu fui trabalhar na área <strong>de</strong> frigobar, fazer<br />

reposição <strong>de</strong> frigobar. E isso sem ganhar nada. Eu tinha terminado meu curso técnico<br />

em 2004, e até o meio <strong>de</strong> 2005 eu fiquei trabalhando. E aí eu carregava carrinho<br />

pesado, eu passava em 111 quartos sozinha trocando tudo, fazendo notinha, indo lá na<br />

recepção, lançando o que o pessoal tinha comido. Era muito ruim. Tinha dia que eu era<br />

escalada pra trabalhar sábado e domingo sem ganhar nada. Aí em 2005, eu fiquei<br />

procurando estágio porque eu queria fazer outro tipo <strong>de</strong> estágio, eu queria fazer outra<br />

coisa. Fiz algumas entrevistas, não consegui. Até que eu fui pro Sheraton-Barra, hotel<br />

cinco estrelas, super legal. Fiz uma entrevista pro cargo lá, não consegui. Depois me<br />

chamaram pra trabalhar temporariamente, no final <strong>de</strong> ano, ven<strong>de</strong>ndo pacote das festas<br />

<strong>de</strong> Natal e <strong>de</strong> final <strong>de</strong> ano que tinha lá. Aí gostaram do meu trabalho, e me pediram pra<br />

trabalhar no ano novo também, no Ano Novo e no Natal. Foi legal, porque eu acho que<br />

foi a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> eu ganhar mais dinheiro. Eu nunca tinha trabalhado, eu trabalhei<br />

muito. Acho que trabalhar em hotelaria se trabalha muito, eu tinha hora pra chegar, mas<br />

não tinha hora pra sair, às vezes eu chegava em casa onze horas da noite, uma hora da<br />

manha, pra tá lá <strong>de</strong> novo <strong>de</strong>z horas da manhã. E era na Barra, então eu pegava dois<br />

ônibus, mais <strong>de</strong> uma hora <strong>de</strong> viagem, mas foram as únicas experiências <strong>de</strong> trabalho e<br />

acho que me ajudaram muito. E agora eu tõ fazendo faculda<strong>de</strong> que é uma área que não<br />

tem nada a ver, mas eu acho que me ajudou <strong>de</strong> certa forma, no que eu tô fazendo hoje<br />

teve certa influência.<br />

128


Geice: Minha primeira experiência profissional também foi o estágio do CEFET e eu fui<br />

estagiar num projeto Construção Civil <strong>de</strong> carreta sobre rodas e foi muito legal o projeto,<br />

porque eu não era a única estagiária. Uns cinco alunos da minha turma também estavam<br />

fazendo estágio lá. Então era um clima muito legal apesar <strong>de</strong> ser em Jardim Primavera,<br />

um pouco antes <strong>de</strong> Xerém, mas era uma coisa assim muito família. O professor Mussi,<br />

que era o professor lá do CEFET, né, contratava uma van que ia buscar a gente <strong>de</strong><br />

manhã lá no CEFET, aí a gente ia pra lá. A gente ficava lá o dia inteiro também, <strong>de</strong> sete<br />

às cinco e aí <strong>de</strong>pois me <strong>de</strong>ixava no CEFET e eu ia correndo pra UERJ e estudava.<br />

Começou em fevereiro meu estágio, e em maio eu comecei na UERJ e eu fiquei lá sete<br />

meses, saí também porque eu fazia História, porque aí, quando <strong>de</strong>scobriram que eu<br />

fazia História, falaram que se tivesse que escolher entre um estagiário que fizesse<br />

Engenharia e um que fizesse História, tinha que escolher um que fizesse Engenharia.<br />

Não tinha ninguém fazendo Engenharia, mas eu saí porque fazia História. Aí <strong>de</strong>pois, eu<br />

fiquei vinte dias em casa, procurando estágio, procurando emprego, aí consegui um<br />

emprego nessa empresa que trabalhava com Geotecnia e fiquei lá durante um ano, saí<br />

foi ano passado por causa da faculda<strong>de</strong>, porque eu tinha que começar a fazer os estágios<br />

e era integral, tipo semana inglesa, era <strong>de</strong> oito às seis. E eu saía às seis horas do centro<br />

da cida<strong>de</strong>, tinha que estar seis horas na UERJ também, aí passei um ano assim nessa<br />

vida, sendo que chegou uma hora que eu tive que parar e falar qual era a minha<br />

priorida<strong>de</strong>. E eu vi que a minha priorida<strong>de</strong> não era…, não que não fosse trabalhar,<br />

porque eu sei que eu preciso trabalhar, preciso ter o meu dinheiro, que não dá pra eu<br />

ficar nas costas da minha mãe, mas eu tinha que pensar mais no futuro e o meu futuro<br />

eu queria com história e não como técnica e aí eu saí ano passado e esse ano eu tÔ no<br />

meu segundo estágio já, com História. É muito engraçado, que eu fiz estágio <strong>de</strong><br />

História na RioUrbe, que é a empresa <strong>de</strong> urbanização da prefeitura. E eu era a única<br />

pessoa que fazia História lá e dava conselhos pros meus amigos lá e todos faziam<br />

Arquitetura, não sei o que e eu era a única estagiária <strong>de</strong> História que tinha lá porque era<br />

um projeto que a RioUrbe fez vinte anos e tal, aí tinha o projeto. Curioso disso tudo é<br />

que o meu primeiro estágio era muito família, porque eram professores do CEFET e<br />

meus amigos, todos tinham a minha ida<strong>de</strong>, ou eram mais novos do que eu, ou se mais<br />

velhas, eram pouco mais velhas. Aí quando eu fui pra Tecnisonda, eu tava com <strong>de</strong>zoito<br />

pra <strong>de</strong>zenove anos e eu era a mais nova <strong>de</strong> lá, então foi um baque assim muito gran<strong>de</strong><br />

que eu tive. Porque por mais que no estágio a gente amadurecesse, não era a mesma<br />

coisa porque lá tinha um clima família. Na Tecnosonda não, era uma empresa todo<br />

mundo era mais velho do que e a postura tinha que ser diferente. Tive que adotar uma<br />

outra postura. Na RioUrbe foi interessante, porque eu conheci o setor público, embora<br />

eu não fosse funcionária pública, a gente vê que é muito diferente o sistema <strong>de</strong> uma<br />

empresa pública pra uma empresa privada. E atualmente eu tô fazendo estágio na UERJ<br />

mesmo, eu sou bolsista <strong>de</strong> lá, tenho uma bolsa <strong>de</strong> extensão, tenho um projeto na<br />

Universida<strong>de</strong> da terceira ida<strong>de</strong>, que é muito legal, muito fofo e eu vou até apresentar<br />

trabalho essa semana, é a semana <strong>de</strong> extensão e é isso.<br />

Igor: A minha primeira e única experiência profissional foi estágio do CEFET. Foi uma<br />

empresa que trabalhava principalmente com Re<strong>de</strong>s, Internet, acesso à Internet. Então,<br />

tinha que lidar com o público e também tinha que lidar com o procedimento interno da<br />

empresa, com funcionamento essas coisas assim. O que acontece, eu não gosto muito<br />

<strong>de</strong> lidar com o público, <strong>de</strong>scobri isso durante o estágio. Principalmente quando ocorreu<br />

129


130<br />

um problema e eu tinha que consertar, aí eu chegava na casa do cliente e o cliente<br />

virava: não tá funcionando, isso aqui tá ruim, tem que fazer isso, isso e isso. Aí eu: sim<br />

senhor, a gente já vai resolver, calma senhor. Aí você tem que escutar calado, sair<br />

calado, porque você tem que ter um respeito com o cliente. O cliente tá ali, se não tiver<br />

mesmo funcionando, mesmo que você não tenha culpa ele sempre tem razão.<br />

Débora: Você não po<strong>de</strong> falar: eu sou técnico, você não.<br />

Igor: Pois é. Tem vários tipos <strong>de</strong> cliente, a gente vai conhecendo. Durante toda a minha<br />

experiência, eu fui conhecendo os tipos <strong>de</strong> cliente, aí a gente vai <strong>de</strong>scobrindo um jogo<br />

<strong>de</strong> cintura, mas mesmo assim não é a minha área. Eu prefiro ficar sentadinho, <strong>de</strong>scobri<br />

isso, prefiro ficar sentadinho em frente ao computador <strong>programa</strong>ndo ou qualquer cosia<br />

assim <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um escritório qualquer. Mas foi muito bom, porque apesar disso, <strong>de</strong>u<br />

ter percebido que não é a minha área mexer com cliente, lidar com as pessoas, eu<br />

percebi que eu tive um engran<strong>de</strong>cimento nessa parte, <strong>de</strong> falar, não muito, mas tive. Foi<br />

um bom estágio quanto a aprendizado, quanto à complementação ao que eu aprendi no<br />

CEFET <strong>de</strong> conteúdo. Porque eu tive Re<strong>de</strong>s no CEFET, no curso <strong>de</strong> Informática, mas lá<br />

eu tive a aplicação da matéria <strong>de</strong> Re<strong>de</strong>s e <strong>de</strong> muitas outras cosias que o CEFET não<br />

ensinou, inclusive, quando eu tava em conjunto com outros alunos do curso técnico do<br />

CEFET, dava pra perceber que eu tava me sobressaindo mais um pouco por causa <strong>de</strong>sse<br />

conhecimento que eu tinha recebido durante o estágio e era muito bom. Eu atendia<br />

também o suporte técnico por telefone, enten<strong>de</strong>u, e fazia trabalho <strong>de</strong> campo na rua<br />

também, mas era pesada a carga, às vezes eu também chegava lá no horário certo, que<br />

tinha que chegar lá uma da tar<strong>de</strong> e não tinha horário pra sair, porque se <strong>de</strong>sse algum<br />

problema com algum servidor, se algum prédio caísse, prédio <strong>de</strong> Internet caísse, eu ia<br />

ter que ficar lá até resolver o problema, a não ser que passasse <strong>de</strong> onze da noite e eu não<br />

tivesse resolvido o problema, eles não me mandavam <strong>de</strong> volta, eu ficava lá até resolver.<br />

E isso foi em 2004, no meu último ano <strong>de</strong> CEFET, então ainda tinha aula <strong>de</strong> manhã, às<br />

vezes atrapalhava um pouco, porque eu ficava até tar<strong>de</strong> no estágio, chegava tar<strong>de</strong> em<br />

casa, às vezes tinha trabalho pra fazer, enten<strong>de</strong>u, foi até nessa época que eu fiz minhas<br />

primeiras viradas <strong>de</strong> noite fazendo trabalho. Chegava no outro dia no CEFET todo<br />

quebrado. Mas foi difícil, mas é isso que acontece, dificulda<strong>de</strong> ensina a gente às vezes,<br />

né.<br />

Pesquisador: O que é trabalho pra vocês?<br />

Débora: Pra mim o trabalho é uma forma <strong>de</strong> você se realizar mais ou menos, né. Eu troquei <strong>de</strong><br />

profissão mais ou menos por isso, porque eu não queria trabalhar. Aí pra mim, na<br />

verda<strong>de</strong>, você tem que gostar daquilo que você faz, não é só o dinheiro, lógico, você<br />

precisa trabalhar porque você precisa se sustentar, mas se você trabalha com uma coisa<br />

que você gosta, você não vai acordar <strong>de</strong> manhã tipo assim: ai, eu não acredito que eu<br />

tenho que ir trabalhar. E é isso que acontece, sempre aconteceu comigo, né.<br />

Felipe: Eu acho que esse negócio <strong>de</strong> você levantar, por mais que você goste muito <strong>de</strong> trabalhar,<br />

eu acho que ainda existe aquele dia que você: pô, segunda feira, bem que eu po<strong>de</strong>ria,<br />

não, eu quero dormir mais um pouco. Mas eu não gostaria <strong>de</strong> hoje estar <strong>de</strong>sempregado,<br />

eu gosto <strong>de</strong> trabalhar, eu gosto <strong>de</strong> sair <strong>de</strong> casa <strong>de</strong> manhã, ir trabalhar, fazer o negócio


131<br />

bem feito, ser reconhecido ganhar o dinheiro no final do mês e voltar pra casa <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

um dia <strong>de</strong> trabalho. Não trabalhar, hoje em dia pra mim, não seria cabível, eu não<br />

gostaria <strong>de</strong> ficar parado. Eu não saberia ficar parado, não estar num emprego.<br />

Débora: Meu chefe sempre fala uma coisa interessante pra gente, ele fala que você tem que ser<br />

comprometido naquilo que você faz. Eu gosto muito, não tenho o que reclamar <strong>de</strong> lá,<br />

meus colegas <strong>de</strong> trabalho, meu chefe são muito legais, eu gosto daquele tipo <strong>de</strong> serviço,<br />

eu em divirto, e ele sempre fala assim: se você não é comprometido ganhando pouco,<br />

não vai ser quando você ganhar muito que você vai ser comprometido. Então o<br />

trabalho, você tem que ter aquela responsabilida<strong>de</strong>, não importa o que você faça. Então<br />

assim, eu não gosto <strong>de</strong> ter que trabalhar, mas o que eu faço eu faço bem. E eu tÔ<br />

fazendo Matemática pra sair da área <strong>de</strong> Eletrônica pra entrar no que eu mais gosto que é<br />

dar aula. Eu acho que você po<strong>de</strong>r ensinar é a melhor coisa do mundo.<br />

Lílian: Minha vida me levou pra caminhos diferentes. Quando eu fui entrar por segundo grau,<br />

no Ensino Médio, eu tinha me inscrito numa escola <strong>de</strong> normalistas já pensando em ser<br />

professora, só que ai eu fui pro CEFET e acabou mudando. Quando eu fui prestar<br />

vestibular, eu queria ser professora, mas não sabia ainda professora <strong>de</strong> quê. Queria ser<br />

<strong>de</strong> criança no passado, mas aí, <strong>de</strong>pois, o quê? Queria fazer Educação Física, não<br />

passava pra Educação Física, aí eu passei pra Letras e quero dar aula <strong>de</strong> Francês quero<br />

dar aula <strong>de</strong> Português, quero dar aulas pra criança também, mas além <strong>de</strong> dar aula pra<br />

crianças, dar aula <strong>de</strong> línguas, eu quero dar aulas na faculda<strong>de</strong>, quero trabalhar dando<br />

aula para universitários, fazer mestrado, doutorado, acho que esse é um pouco do que<br />

eu quero. Na minha família, meu pai, minha mãe eles não estudaram assim, não tem<br />

ninguém <strong>de</strong> referência pra eu ser professora, mas a minha irmã vai ser professora, faz as<br />

mesmas faculda<strong>de</strong>s do que eu. Francês, faz Pedagogia, a mesma cosia. Eu acho que dar<br />

aula é o que eu quero assim, é uma coisa que eu queria <strong>de</strong>s<strong>de</strong> criança e que vai ser<br />

conseqüência da minha faculda<strong>de</strong>. Vai ser legal.<br />

Pesquisador: E quanto à continuação dos estudos?<br />

Igor: Pra mim o próprio estudo já é um trabalho, eu sinto prazer em estudar. Talvez eu seja<br />

até pesquisador, faça um mestrado, doutorado pra ser pesquisador, porque eu adoro<br />

estudar pegar um livro <strong>de</strong> cálculo e estudar Cálculo, pegar um livro <strong>de</strong> Física, Mecânica<br />

e estudar Mecânica, Programação, estudar Programação.<br />

Pesquisador: O que você faz?<br />

Igor: Ciência da computação na <strong>UFF</strong>. Poxa, é maravilhoso, eu não sei, você andando com só<br />

gran<strong>de</strong>s, você um dia vai se tornar gran<strong>de</strong>, enten<strong>de</strong>u? Eu ando com (?) às vezes (?) que<br />

é <strong>de</strong> Cálculo também, os caras dos livros. Eu acho ótimo estudar assim. Meu plano é ser<br />

Doutor, <strong>de</strong> repente fazer <strong>pós</strong>-doutorado, <strong>pós</strong>-mestrado.<br />

Débora: Eu acho que por mais dificulda<strong>de</strong> que você tenha, fazendo faculda<strong>de</strong> é muito legal. Eu<br />

me divirto. Eu pego meu livro <strong>de</strong> Cálculo também, aí eu vou fazendo exercício, eu<br />

passo a tar<strong>de</strong> inteira no meu trabalho estudando. E é divertido, é muito legal, eu faço as<br />

matérias que eu mais gosto, que é Geometria e Cálculo, aí eu cheguei na faculda<strong>de</strong>


132<br />

achando que eu gostava <strong>de</strong> Álgebra, <strong>de</strong>pois eu <strong>de</strong>scobri que eu não gosto <strong>de</strong> Álgebra.<br />

Porque a Álgebra que a gente estuda na escola é uma coisa, quando você chega na<br />

faculda<strong>de</strong> é diferente.<br />

Lílian: Letras também é diferente.<br />

Débora: É, você apren<strong>de</strong> o porquê das coisas, é complicado, mas é muito divertido estudar, eu<br />

gosto muito do que eu estudo. Matemática, tudo, tudo, tudo na Matemática eu gosto. Eu<br />

não gosto das matérias pedagógicas, mas tem que fazer, mas é muito legal e tem sido<br />

muito importante na minha vida, tem acrescentado bastante, tá fazendo a faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Matemática que eu sempre quis <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sexta série. Na minha sexta série, eu falei<br />

assim, vou ser professora <strong>de</strong> Matemática. Ai fiz Eletrônica e <strong>de</strong>scobri que o que eu<br />

queria mesmo era fazer faculda<strong>de</strong> e to indo em frente.<br />

Felipe: E vai aumentando a cobrança em cima da gente, por exemplo, no Ensino Médio, Ensino<br />

Fundamental, você prestava atenção na aula, não estudava ou então dava uma lida antes<br />

no dia da prova e tirava oito, <strong>de</strong>z na prova, na faculda<strong>de</strong>, não. Na faculda<strong>de</strong>, você tem<br />

que prestar atenção na aula, quando não, gravar a aula em mp3, em gravador, repassar a<br />

aula, estudar em casa, refazer trinta, quarenta, sessenta exercícios, ir pra monitoria, pra<br />

tirar um seis, sete na prova.<br />

Lílian: Tem uma cobrança que não tem no Ensino Médio, no Ensino Fundamental, que é o CR,<br />

você é muito cobrado por conta do seu CD. Seu CR tem que estar acima <strong>de</strong> sete, oito<br />

pra você conseguir as coisas <strong>de</strong>ntro da <strong>universida<strong>de</strong></strong>. A cobrança é muito diferente.<br />

Igor: Uma simples reivindicação que você faça, às vezes a pessoa te discrimina por CR.<br />

Lílian: Histórico conta muito na hora da avaliação, pra qualquer coisa que você consiga,<br />

histórico é <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância. Se você é reprovado em uma matéria então, esquece,<br />

tá fora.<br />

Débora: Pra você dar aula <strong>de</strong> monitoria, né, se você for reprovado naquela matéria não po<strong>de</strong> né.<br />

Você gosta da matéria, você sabe e quer dar aula, se você for reprovado, não po<strong>de</strong>.<br />

Lílian: Às vezes, o problema não é nem com você é com o professor que tá te dando aula e aí<br />

você sente dificulda<strong>de</strong>.<br />

Débora: Por exemplo, tem um professor lá na UERJ, graças a Deus ele se aposentou e eu não<br />

tive aula com ele.<br />

Igor: Quem é?<br />

Débora: Ele.<br />

Igor: Todo mundo conhece o cara.


Débora: Se aposentou período passado, então o que acontece, é impossível passar com ele. Tipo<br />

assim, oitenta por cento <strong>de</strong> reprovação. Você não tem culpa. ‘Você reprovou em<br />

Cálculo com quem?’ ‘Com o (?)’ ‘Ah então você sabe Cálculo I. ’ Pelo menos você sai<br />

sabendo. Eu, graças a Deus, eu entrei num período <strong>de</strong>pois. Ele <strong>de</strong>u aula em 2005/01 e<br />

eu entrei em 2005/02. Aí ele se aposentou, pra felicida<strong>de</strong> geral da nação. Então é<br />

complicado, é muito difícil. O CR da Matemática, normal lá, é cinco, da maioria é<br />

cinco. Meu CR tá quase sete eu tô feliz da vida. É complicado, mas é muito divertido.<br />

Geice: Eu tô no oitavo período <strong>de</strong> história, já tô terminando, mas não termino esse período<br />

ainda porque, como eu tava explicando pra elas, o curso é bacharelado e a gente tem<br />

que puxar licenciatura por fora e é claro que eu quero fazer licenciatura, porque eu<br />

quero dar aula. Eu tô fazendo faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> História porque eu quero ser professora <strong>de</strong><br />

História. Até quando eu entrei pra faculda<strong>de</strong> as pessoas falavam: não, você faz História,<br />

mas você po<strong>de</strong> ser pesquisadora também. Aí eu falava: não, eu entrei pra faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

História porque eu quero ser professora, eu sempre gostei foi isso, até aqui no Horácio<br />

mesmo, a gente tinha prova e todo mundo: ai, não tô enten<strong>de</strong>ndo, não tô enten<strong>de</strong>ndo e<br />

eu, ai, lia explicava e as pessoas vinham me agra<strong>de</strong>cer: poxa, aquela explicação que<br />

você me <strong>de</strong>u, <strong>de</strong>pois me ajudou. E eu sempre gostei muito disso. E ai eu tõ terminando,<br />

essa semana eu terminei o estágio, Prática <strong>de</strong> Ensino II ,que a gente dá aula no CAP,<br />

<strong>de</strong>i aula pro segundo ano e foi assim muito legal, muito gratificante. Aí quando eu<br />

terminar ano que vem, não sei, eu pretendo fazer Pós, ou fazer mestrado, mas assim eu<br />

não sei se eu vou conseguir entrar logo <strong>de</strong> cara, talvez pra pois eu consiga, mas pro<br />

mestrado talvez seja um pouco mais difícil, até porque tenho que ter língua estrangeira<br />

e eu não tenho, eu vou começar a fazer ano que vem. Eu não sei se eu quero dar aula<br />

pra nível superior. Até um professor meu diz que a gente apren<strong>de</strong> mesmo é dando aula,<br />

então eu quero passar num concurso, quero dar minha aula e a parte acadêmica eu vou<br />

vendo em paralelo.<br />

Pesquisador: Gente, agora é com vocês.<br />

Lílian: Eu queria saber se alguém teve preconceito no curso assim. Se alguém quando fez a<br />

prova pro curso: ah, você tá fazendo o quê? Eu tô fazendo Automobilística. Nossa, que<br />

curso chato, que você apren<strong>de</strong> lá?<br />

Igor: Na faculda<strong>de</strong> quem faz Ciência da Computação, aliás, não só Ciência, Matemática,<br />

Física, o pessoal fala: você é maluco?. Você tá fazendo isso por quê?<br />

Débora: Não, é mais doido que o nerd, a gente é taxado <strong>de</strong> maluco. Pra fazer Matemática e<br />

Física, só doido mesmo. Mas eu chego a conclusão que é mesmo. Você que todos os<br />

professores <strong>de</strong> Física são esquisitos. É verda<strong>de</strong>, é verda<strong>de</strong>, mas por que isso? Eu acho<br />

que a pessoa entra normal e sai <strong>de</strong>ficiente. É sério, gente, todo professor bom, aquele o<br />

cara, ele é esquisito, ele é maluco.<br />

Lílian: Os pais <strong>de</strong> vocês apoiaram vocês tanto no técnico quanto na faculda<strong>de</strong>? Você por<br />

exemplo, você fez Eletrônica?<br />

Débora: Fiz eletrônica.<br />

133


Lílian: A sua mãe falou alguma coisa, ou os seus pais eu familiares falaram alguma coisa?<br />

Débora: Não, meu pai e minha mãe, eles, assim, queriam que eu fizesse Edificações porque<br />

minha irmã tava fazendo Edificações. E eu falei assim: justamente porque a minha irmã<br />

faz Edificações eu não quero fazer. Que eu <strong>de</strong>scobri que eu não gostava. Aí eu fui fazer<br />

Eletrônica, aí assim eu sempre fui mais ou menos o homenzinho da casa, então pro meu<br />

pai: Ah, que legal, ah, Débora, a televisão aqui quebrou, ah, não sei o que vamos fazer<br />

isso aqui. Eu usei ferramenta do meu pai no técnico, sempre fui tudo assim. Então,<br />

nunca tive nenhum preconceito, não, mas eu tive preconceito fora. Poxa, é coisa <strong>de</strong><br />

homem isso. E é mesmo, pra você conseguir estágio é coisa <strong>de</strong> homem. Você vai lá<br />

procurar estágio. Empresa tal, vai ganhar tanto, não sei o que… homem.<br />

Kely: Exigência masculina.<br />

Débora: Então é difícil.<br />

Kely: Discriminatório.<br />

Débora: Matemática também, eles dão foco mais pra homem. É complicado.<br />

Lílian: No caso da minha família teve preconceito. Meu pai não queria que eu fizesse<br />

Automobilística, Mecânica, nenhum que fosse relacionado pra homem, aí eu passei pra<br />

Turismo: ah, você fez Turismo, pra que você fez Turismo? Ah, Turismo, mas você não<br />

vai trabalhar? Você não tá trabalhando. Rolava isso, assim. E meu pai queria que eu<br />

fizesse Direito, alguém lá em casa tinha que fazer Direito. Eu passei pra Letras, ele não<br />

sabia nem o que é Letras.<br />

Débora: Meu pai e minha mãe, eles são da área <strong>de</strong> Odontologia. Meu pai é técnico em prótese<br />

<strong>de</strong>ntária e minha mãe é auxiliar <strong>de</strong> consultório <strong>de</strong>ntário. ‘Ah, faz Odontologia’.<br />

Lílian: ‘Se eu tivesse tido oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudar eu teria feito Direito, então faz Direito’. Meu<br />

pai fala isso, se eu tivesse oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudar teria feito Direito, colocando a filha<br />

pra realizar o sonho <strong>de</strong>les.<br />

Geice: A minha mãe sempre me <strong>de</strong>ixou muito livre assim, ela me falou até: por mim, você fazia<br />

Segurança, mas eu quero que você escolha. Essa liberda<strong>de</strong> minha mãe sempre <strong>de</strong>u.<br />

‘Não, você vai fazer o que você quiser porque quem vai estudar é você. Não adianta eu<br />

falar pra você vai lá e faz isso.’ Ela só falou uma coisa pra mim, porque quando eu fiz<br />

vestibular eu tava na dúvida, Arquitetura, Engenharia, e eu cheguei a pensar até em<br />

fazer Economia. Aí eu fui conversar com ela e ela falou assim: ah minha filha você é<br />

muito no mundo da lua, Economia é muito real, é bom você não fazer Economia, não.<br />

Minha mãe me chamou <strong>de</strong> totalmente aérea, mas <strong>de</strong>ixa pra lá, mãe a gente perdoa. Aí<br />

eu não fiz Segurança, mas a vonta<strong>de</strong> da minha mãe era que eu fizesse Segurança, mas<br />

ela também nunca reclamou nem nada. E eu não queria fazer Segurança, porque eu ia<br />

ter que estudar <strong>de</strong> manhã aqui, porque Segurança era <strong>de</strong> tar<strong>de</strong> e eu estudava à tar<strong>de</strong>, aí<br />

eu coloquei assim, minha primeira opção foi Edificações, aí a segunda eu acho que foi<br />

134


135<br />

Edificações também, e aí em terceiro eu coloquei Segurança, mas aí eu passei logo pra<br />

primeira, então minha mãe ficou pra trás.<br />

Débora: Mas esse negocio aí,que você falou, é interessante. Porque tem uma menina que eu<br />

conheço que ela fez Eletrônica lá no CEFET. Aí ela queria ir pra Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Química<br />

pra fazer Nutrição, aí o pai <strong>de</strong>la: não, vai fazer Eletrônica no CEFET. Ela foi fazer<br />

Eletrônica, não arrumou estágio e tá se formando agora na UERJ em Nutrição. De que<br />

adiantou?<br />

Geice: É, os sonhos dos nossos pais, são os sonhos dos nossos pais. Minha mãe diz, quem vai<br />

fazer é você, não adianta impor.<br />

Débora: Você vai carregar isso pro resto da sua vida.<br />

Geice: É verda<strong>de</strong>.<br />

Igor: Mas, às vezes, essa é uma exceção, é que a garota <strong>de</strong>via ser muito obstinada, quero<br />

Nutrição, quero Nutrição, vou fazer, mas às vezes o pai chega: faz isso, faz aquilo…<br />

Débora: Não, às vezes você gosta.<br />

Lílian: É que as vezes ele acha que não tem mercado <strong>de</strong> trabalho para aquilo e acha que aquilo<br />

não é legal para aquela pessoa. Tem isso também. Tem aquela relação também do<br />

preconceito dos meninos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> sala, eu fazia Turismo. Os meninos que estudavam<br />

comigo, os outros meninos que estudavam no Horácio achavam que eles eram gays.<br />

Todo mundo achava. ‘Porque Turismo, Turismo é coisa <strong>de</strong> boiola gente’<br />

.<br />

Igor: Uns chamavam, outros eram mesmo, né.<br />

Lílian: Tem gente que é gay? Tem, mas tem gente que não é também. Pois é aí o curso tem essa<br />

tendência, só porque trabalha em hotel com Turismo.<br />

Débora: Meu professor <strong>de</strong> Eletrônica, ele falava o seguinte, que… você é <strong>de</strong> Eletrônica?… que o<br />

técnico em Eletrônica ou ele é gay ou é maluco, aí falou assim: eu sou maluco. E eu<br />

acho assim, que realmente, tem áreas que são rotuladas, tem coisas que são rotuladas,<br />

não tem jeito.<br />

Kely: Eu sempre quis trabalhar em Construção Civil, em obra, né. Achei legal esse povo,<br />

pedreiro, a galera, a forma <strong>de</strong> falar, <strong>de</strong> conversar <strong>de</strong>les, você tem que ter um jogo <strong>de</strong><br />

cintura, mas ao mesmo tempo humilda<strong>de</strong> e a reação <strong>de</strong>les, às vezes <strong>de</strong>… é um pouco <strong>de</strong><br />

medo, mesmo <strong>de</strong> aproximação <strong>de</strong> um profissional, Às vezes ele nem conhece. Ah<br />

<strong>de</strong>sculpa, corta isso, eu me embolei toda, <strong>de</strong>sculpa, tem como, voltar? Tem? Eu<br />

embolei tudo. Não eu tinha vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhar com Construção Civil e meu primeiro<br />

estágio foi com a transportadora e lá, <strong>de</strong> cem funcionários, noventa eram homens e a<br />

minha chefe não gostava que eu ficasse no campo com o pessoal, os transportadores<br />

porque homem e tudo podia não ter respeito. Aí aquela complicação <strong>de</strong> como lidar. Ao


136<br />

mesmo tempo eu ter que impor á pessoa a se proteger com os equipamentos, mas<br />

também explicar como e também não ser muito, porque uma menina, poxa, nova e…<br />

Débora: Você tem que se impor e ao mesmo tempo não po<strong>de</strong> ser grossa e mal educada.<br />

Kely: É. E pelo contrário assim, eu expliquei pra minha chefe que eu não podia ficar só no<br />

escritório, que eu tinha que lidar com eles, conversar e foi tão boa a relação que a gente<br />

teve, que quando eu saí até hoje <strong>de</strong> vez em quando eles me ligam, falam pra eu passar<br />

lá. Foi legal, porque eu tive que apren<strong>de</strong>r a linguagem <strong>de</strong>les. Chegar e mostrar que não<br />

tem essa divisão, porque tem preconceito. Ah! administrativo não po<strong>de</strong>…<br />

Felipe: Tem peão.<br />

Kely: Não, eu tive que falar: gente, nada a ver, eu to aqui pra cuidar <strong>de</strong> vocês, pra proteção <strong>de</strong><br />

vocês, então eu tive que enten<strong>de</strong>r essa linguagem, foi perfeito.<br />

I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s dos participantes do grupo focal<br />

Rodrigo: Bom dia. Meu nome é Rodrigo Pelegrino. Tenho 21 anos. Eu terminei o Ensino Médio<br />

em 2003, no Horácio Macedo, mas eu não completei o curso técnico <strong>de</strong> Edificações.<br />

Atualmente eu trabalho como operador <strong>de</strong> caixa na “Pague Menos” e eu gostaria muito<br />

<strong>de</strong> me formar em Fisioterapia.<br />

Felipe: Oi, meu nome é Felipe Monteiro. Tenho 20 anos. Terminei o curso técnico <strong>de</strong><br />

Eletrotécnica em 2004. Tô fazendo estágio em uma empresa <strong>de</strong> motor <strong>de</strong> helicóptero<br />

em Xerém, um pouquinho longe, mas muito gratificante e to fazendo faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Física.<br />

Jefersson: Meu nome é Jefersson Lins, terminei o segundo grau aqui no Colégio Estadual<br />

Professor Horácio Macedo, em 2003. Fiz o curso técnico <strong>de</strong> Mecânica no CEFET,<br />

conclui. A<strong>pós</strong> isso fiz um estágio na “Souza Cruz S.A.”, na Área <strong>de</strong> Manutenção<br />

Mecânica, fui contratado, trabalho hoje lá, vou fazer dois anos <strong>de</strong> contratado, na mesma<br />

área <strong>de</strong> manutenção. E faço Engenharia Mecânica na UERJ.<br />

Lílian: Meu nome é Lílian Ferreira. Tenho 19 anos. Terminei o Ensino Médio em 2003.<br />

Terminei o curso técnico em Turismo em 2004. Atualmente faço duas faculda<strong>de</strong>s. Faço<br />

Letras na UFRJ e Pedagogia no Instituto <strong>de</strong> Educação.<br />

Débora: Meu nome é Débora Lopes. Eu tenho 21 anos. Me formei no Horácio Macedo em 2002<br />

e me formei no técnico <strong>de</strong> Eletrônica no CEFET em 2003. Fiz estágio com Engenharia<br />

Médica, na parte <strong>de</strong> Radiologia e hoje eu trabalho na “Xerox do Brasil”, dando suporte<br />

técnico para as impressoras multifuncionais. Faço Matemática atualmente na UERJ.


Daniel: Meu nome é Daniel Abreu. Tenho 21 anos. Me formei na turma <strong>de</strong> 2002 do Horácio<br />

Macedo. Atualmente eu trabalho na “Petrobrás” como concursado em técnico <strong>de</strong><br />

Segurança. Fiz o técnico <strong>de</strong> Segurança no CEFET.<br />

Wilson: Oi ,eu sou Wilson. Tenho 25 anos. Terminei o Horácio Macedo em 2002. Fiz técnico <strong>de</strong><br />

Segurança no CEFET, terminei em 2003. O Estágio eu fiz em 2005 e agora tÇo<br />

prestando serviço pra “Transpetro” numa obra, só que a obra terminou e agora eu tô<br />

sem emprego.<br />

Kely: Oi, meu nome é Kely. Eu terminei o Horácio Macedo em 2002, o curso técnico em<br />

Segurança do Trabalho em 2003/2004 com o estágio. E hoje trabalho com Segurança<br />

do Trabalho em um laboratório, e ainda não iniciei a faculda<strong>de</strong>, mas breve, breve estou<br />

iniciando.<br />

Tatiana: Oi, meu nome é Tatiana Trinda<strong>de</strong>. Tenho 20 anos. Terminei o Horácio Macedo em 2003<br />

e o Técnico em Turismo em 2004. Atualmente eu tô fazendo secretariado executivo<br />

trilingue pelo ProUni estou trabalhando na Eletrobrás.<br />

Tiago: Meu nome é Tiago Eros da Silva <strong>de</strong> Almeida. Tenho 22 anos e estu<strong>de</strong>i aqui em Maria da<br />

Graça, terminei em 2002. Assim, os anos <strong>de</strong> 2000 a 2002, que foi o período que eu<br />

estu<strong>de</strong>i aqui no Horácio, foram muito importantes na minha vida. Eu tive o prazer <strong>de</strong> ter<br />

muitas amiza<strong>de</strong>s, além <strong>de</strong> um bom estudo. Tivemos professores que nos <strong>de</strong>ram uma<br />

capacida<strong>de</strong> muito boa para disputar qualquer tipo <strong>de</strong> vestibular, concurso, uma base<br />

muito forte.<br />

Geice: Meu nome é Geice Faustino. Tenho 21 anos. Terminei meu curso Médio aqui no<br />

Horácio Macedo em 2002. Terminei o curso Técnico em Edificações no CEFET em<br />

2003. Fiz estágio durante sete meses, saí porque o projeto acabou. Trabalhei numa<br />

empresa durante um ano e dois meses, mas eu tive que sair porque eu estou fazendo<br />

faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> História e chegou a época <strong>de</strong> fazer os estágios que a gente tem que fazer,<br />

então eu tô um ano sem trabalhar com Edificações, somente fazendo estágio na área <strong>de</strong><br />

História que eu tô terminando a faculda<strong>de</strong> na UERJ.<br />

Igor: Meu nome é Igor da Silva. Tenho 21 anos. Conclui o Ensino Médio pelo Horácio<br />

Macedo em 2003. Conclui o curso técnico em Informática pelo CEFET em 2004 e<br />

estagiei durante sete meses com uma empresa que trabalhava principalmente coma área<br />

<strong>de</strong> Re<strong>de</strong>s. Mas eu não quis ser efetivado, porque eu visava fazer uma faculda<strong>de</strong> na área<br />

<strong>de</strong> Computação também e hoje eu curso na <strong>UFF</strong>, Ciência da Computação, estou no<br />

segundo período.<br />

Lílian Caroline: Meu nome é Lílian Caroline Pereira da Silva. Tenho 20 anos. Tô cursando<br />

Pedagogia na UniRio, tô no terceiro período. Fiz o curso técnico <strong>de</strong> Segurança do<br />

Trabalho no CEFET, conclui o Ensino Médio no Horácio Macedo em 2003 e trabalho<br />

hoje em dia como técnica <strong>de</strong> Segurança no Serviço Social da Construção Civil-<br />

SECONC-Rio<br />

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