A Lisboa do Império e o Portugal dos Pequeninos ... - Análise Social
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— ou, no caso presente, a indemnização estabelecida numa eventual contrapartida<br />
àquele tributo fundiário — é um valor arbitrário, cujos limites de<br />
arbitrariedade decorrem, directa e exclusivamente, da natureza <strong>do</strong> poder<br />
político <strong>do</strong>minante. As diferenças, aparentemente económicas, sobre a «valorização»<br />
<strong>do</strong>s terrenos expropria<strong>do</strong>s, nos <strong>do</strong>is momentos conjunturais acima<br />
referi<strong>do</strong>s, aparecem agora como diferenças <strong>do</strong>minantemente políticas, justifican<strong>do</strong>,<br />
por isso, o corte representa<strong>do</strong> pelas alterações político-urbanísticas<br />
surgidas a partir de 1943. Em tais circunstâncias, o segun<strong>do</strong> momento conjuntural<br />
constituiu, antes de mais, o inicio da reconciliação entre o novo<br />
«poder municipal» e os interesses <strong>do</strong>s proprietários fundiários, independentemente<br />
da natureza da propriedade a expropriar — ou, melhor, a adquirir,<br />
uma vez que, tal como já o dissemos, a «grande unanimidade» da generalidade<br />
das comissões de expropriação sublinhava sobretu<strong>do</strong> o «acor<strong>do</strong> amigável»<br />
daquela transacção comercial. Paralelamente, também a partir de 1943,<br />
o volume de expropriações irá decrescer de urtia forma bastante progressiva,<br />
sinal de que estava chegan<strong>do</strong> a altura de se exorcisar definitivamente o «fantasma»<br />
da municipalização/estatização da propriedade privada <strong>do</strong>s solos de<br />
<strong>Lisboa</strong>.<br />
Fantasma ou não, o que é certo é que, no primeiro momento conjuntural,<br />
até 1943, se actuou intensamente na estrutura fundiária de <strong>Lisboa</strong>, sem<br />
que, por isso, se possa concluir sobre uma eventual ruptura <strong>do</strong> respectivo sistema<br />
urbano. Basicamente, tratou-se de uma outra perequação <strong>do</strong>s interesses<br />
<strong>do</strong>minantes, fazen<strong>do</strong> pagar aos proprietários fundiários — sobretu<strong>do</strong>,<br />
como vimos, aos proprietários de terrenos «rústicos», mas administrativamente<br />
dependentes <strong>do</strong> Município de <strong>Lisboa</strong> — uma parte <strong>do</strong> custo económico<br />
de um projecto político que, conceben<strong>do</strong> a cidade como um território metropolitano<br />
— isto é, como um espaço pleno de produção económica e de<br />
reprodução social —, cumpria, assim, uma das condições estruturalmente<br />
necessárias ao modelo político-urbanístico <strong>do</strong>minante nos anos iniciais da<br />
conjuntura que vimos analisan<strong>do</strong>.<br />
E, se, ao longo daquele perío<strong>do</strong> — de 1938 até à morte de Duarte Pacheco,<br />
em 1943 —, a atitude <strong>do</strong>s proprietários fundiários nem sempre foi pacífica<br />
(ver cap. 1), resistin<strong>do</strong>, inclusivamente, em relação ao valor atribuí<strong>do</strong> como<br />
indemnização — o que, em muitos casos, era pretexto para, uma vez mais, o<br />
ministro/presidente da CML assumir uma atitude «expedita», isto é, paternalista<br />
e autoritária... 69 —, raros serão, contu<strong>do</strong>, os casos em que seja posto<br />
em causa, em termos formais, o próprio acto de expropriação 70 , numa atitude<br />
de contida(?) resignação, significativa não tanto da eventual fragilidade<br />
económica desses proprietários fundiários, mas sobretu<strong>do</strong> da dimensão política<br />
e ideológica <strong>do</strong> projecto metropolitano em curso.<br />
ponto de incluir valores percentuais (obviamente baixos) <strong>do</strong>s casos «conflituosos», isto é, <strong>do</strong>s casos em que o<br />
proprietário reclamou contra o valor da indemnização proposta. (Recordar que só a partir de 1946 se tornou<br />
possível recorrer das decisões tomadas pelas «comissões de arbitragem» <strong>do</strong>s actos de expropriação.)<br />
69 Cottinelli Teimo — cuja fidelidade política, ideológica e estética a Duarte Pacheco não será certamente<br />
controversa — escrevia, em 1944 (pouco tempo depois, portanto, da morte <strong>do</strong> ministro), um texto de homenagem<br />
ao «grande homem de acção». Entre factos e comentários apologéticos, C. Teimo dá conta, em jeito<br />
um tanto anedótico e a propósito das indemnizações, da facilidade com que Duarte Pacheco resolvia as queixas<br />
que os ex-proprietários apresentavam. E rematava:«[...] às vezes um toque amigável nas costas tinha o valor<br />
de um decreto» (cf. C. Teimo, «Um grande homem de acção», in Panorama* n.° 19, 1944).<br />
70 É evidente que não seria fácil pôr em causa, formalmente, o próprio acto de expropriação. Contu<strong>do</strong>,<br />
as resistências, nem sempre veladas, <strong>do</strong>s proprietários, <strong>do</strong>s promotores e mesmo <strong>do</strong>s construtores chegaram a<br />
ter uma dimensão política importante, mas, significativamente, elas surgirão, sobretu<strong>do</strong>, depois da morte de<br />
720 Duarte Pacheco!