Prosa - Academia Brasileira de Letras
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Tarcísio Padilha<br />
Há uma inteligibilida<strong>de</strong> universal sublinhada por Leibniz que alcança níveis<br />
superiores aos da racionalida<strong>de</strong> matemática. Reconheceu-o lapidarmente Peter<br />
Wust, ao concluir que “a soma total da vida dividida pela razão não dá jamais<br />
quociente sem resto”.<br />
Impen<strong>de</strong> resguardar a amplitu<strong>de</strong> da inteligência a envolver a razãoeaintuição,<br />
<strong>de</strong> sorte a firmar a dimensão espiritual que lhe serve <strong>de</strong> coroamento.<br />
O espírito caminha em direção à sua incontida busca da verda<strong>de</strong>, sem oprimir<br />
o homem. Antes, iluminando o percurso e projetando-o a um patamar<br />
do qual se vislumbra o sentido profundo do ser. Não há porque <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar<br />
a razão em nome da espiritualida<strong>de</strong>, nem esta se sentirá diminuída ante a<br />
presença fulgurante da razão. Ambas se dão as mãos, respeitando embora os<br />
limites respectivos. A irracionalida<strong>de</strong> não é o termo do processo <strong>de</strong> crescimento<br />
do homem, mas sim a consciência <strong>de</strong> que existem instâncias não<br />
abrangidas pela racionalida<strong>de</strong> que prefiguram momentos <strong>de</strong> enriquecimento<br />
humano por vias distintas da lógica e da matemática. A mathesis universalis preconizada<br />
por Descartes não mais encontra guarida em nossos dias ante o<br />
progresso estupendo das ciências em geral e das ciências humanas em particular,<br />
hoje em perseguição do ajuste entre os planos do saber ainda parcialmente<br />
segregados.<br />
A gran<strong>de</strong>za humana provém da primazia do espírito, <strong>de</strong> sua vigência em<br />
nossos atos e na consciência <strong>de</strong> que há uma centelha superior que nos propicia<br />
o privilégio que reconhecemos em certos instantes em que queremos o <strong>de</strong>stino<br />
que nos cabe, como se nós mesmos o houvéssemos escolhido, em que transformamos<br />
a nossa vocação em <strong>de</strong>stino.<br />
Vivemos um período tisnado pela redução do espaço subjetivo. A objetivida<strong>de</strong><br />
é a priorida<strong>de</strong>. O sujeito se vê cercado pela linguagem fria <strong>de</strong> um<br />
realismo predatório do mundo interior, da intimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> si para consigo e<br />
daí para o amplexo radioso do encontro com o outro. A intersujetivida<strong>de</strong> é<br />
condição <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong> para o autoconhecimento e para o reconhecimento<br />
da outra subjetivida<strong>de</strong> que participa <strong>de</strong>cisivamente da construção<br />
do nosso eu.<br />
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