BARROS, Diana Luz Pessoa de - Teoria Semiotica do - No-IP
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O estu<strong>do</strong> da narrativa <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> restringir-se ao exame da ação, para ocuparse<br />
também da manipulação, da sanção e da <strong>de</strong>terminação da competência <strong>do</strong> sujeito<br />
e <strong>de</strong> sua existência passional.<br />
Para encerrar este longo capítulo sobre a sintaxe narrativa, serão retomadas<br />
as duas <strong>de</strong>finições <strong>de</strong> narrativa inicialmente propostas: sucessão <strong>de</strong> esta<strong>do</strong>s e <strong>de</strong><br />
transformações; sucessão <strong>de</strong> estabelecimentos e <strong>de</strong> rupturas <strong>de</strong> contratos. A<br />
primeira <strong>de</strong>finição a<strong>do</strong>ta a perspectiva <strong>do</strong> sujeito e <strong>de</strong> sua ação; a segunda, a das<br />
relações entre o <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>r e o <strong>de</strong>stinatário-sujeito O esquema narrativo engloba os<br />
<strong>do</strong>is pontos <strong>de</strong> vista e simula a história <strong>do</strong> homem. A partir <strong>de</strong> certos valores e <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s contratos o homem age e transforma o mun<strong>do</strong>, à procura <strong>de</strong>sses<br />
valores. Opõe-se, na busca, a sujeitos interessa<strong>do</strong>s nos mesmos valores e<br />
comprometi<strong>do</strong>s com outros <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>res. Cumpri<strong>do</strong> ou não o acor<strong>do</strong>, o sujeito,<br />
sua ação e os resulta<strong>do</strong>s <strong>de</strong>la só cobrarão senti<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> reconheci<strong>do</strong>s e<br />
interpreta<strong>do</strong>s no quadro <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> valores.<br />
Os esquemas narrativos, assim como as <strong>de</strong>mais unida<strong>de</strong>s sintáticas,<br />
organizam-se hierarquicamente, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> um texto contar com um esquema<br />
narrativo a que outros estejam subordina<strong>do</strong>s.<br />
<strong>No</strong> texto <strong>de</strong> José Cândi<strong>do</strong> <strong>de</strong> Carvalho, “Toda honestida<strong>de</strong> tem sua fita<br />
métrica” (1972, p. 4-5), há esquemas hierarquiza<strong>do</strong>s e <strong>de</strong>limitam-se claramente os<br />
três segmentos <strong>do</strong> esquema narrativo, embora a ênfase não esteja no percurso <strong>do</strong><br />
<strong>de</strong>stina<strong>do</strong>r-manipuja<strong>do</strong>r.<br />
CRAVINO DIAS, encharca<strong>do</strong> <strong>de</strong> água <strong>de</strong> matar gato, subiu para o alto da torre da Igreja<br />
<strong>de</strong> <strong>No</strong>ssa Senhora <strong>do</strong> Parto e <strong>de</strong>u <strong>de</strong> gritar:<br />
— Vou criar asa, minha gente! Vou virar aeroplano. Se morrer, meu bon<strong>do</strong>so primo<br />
Sicarino Dias, que mora em Morrinhos, está capacita<strong>do</strong> para mandar um relatório <strong>de</strong> minha lavra<br />
ao pessoal <strong>do</strong> governo. Triste <strong>de</strong> Jacubais <strong>do</strong> <strong>No</strong>rte se meu relatório abrir a boca. Fecha este<br />
ninho <strong>de</strong> sem-vergonhismo, <strong>de</strong> não abrir em <strong>de</strong>rre<strong>do</strong>r <strong>de</strong> cem anos. Não fica uma reputação em<br />
pé. Nem o sacristão Cravino Papa-Hóstia escapa, que é o maior belisca<strong>do</strong>r <strong>de</strong> popa <strong>de</strong> moça que<br />
já vi. Meu relatório, povo <strong>de</strong> Jacubais <strong>do</strong> <strong>No</strong>rte, é pior que mordida <strong>de</strong> lobisomem em noite <strong>de</strong><br />
sexta-feira. Pega to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. É pedir a Deus que meu relatório não saia ventan<strong>do</strong> pelos<br />
compartimentos <strong>do</strong> governo. E ma<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> dar em <strong>do</strong>i<strong>do</strong>!<br />
Diante <strong>de</strong> tamanha ameaça, Jacubais <strong>do</strong> <strong>No</strong>rte mobilizou os préstimos <strong>do</strong> Dr. Varjão<br />
Doura<strong>do</strong>, sujeito <strong>de</strong> muito respeito, <strong>de</strong> colarinho engoma<strong>do</strong>, sempre <strong>de</strong> preto, <strong>do</strong> chapéu às<br />
botinas. Nunca, em vinte anos, soltou uma risada. Quan<strong>do</strong> esse boitatá chegou na Praça da<br />
Matriz, recebeu <strong>de</strong> Cravino uma tijolada <strong>de</strong> <strong>de</strong>smontar os parafusos. Neste jeito empena<strong>do</strong>:<br />
— Logo quem vem falar comigo! Varjão <strong>do</strong> cartório! Esse, minha gente, não agüenta<br />
meia sindicância. Pega logo trinta anos <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ia no abrir da primeira página. Com partezinha <strong>de</strong><br />
lavrar escrituras, é o maior dilapida<strong>do</strong>r <strong>de</strong> viúvas <strong>de</strong> Jacubais <strong>do</strong> <strong>No</strong>rte. Não per<strong>de</strong> uma! Este<br />
boitatá puxa o estandarte <strong>do</strong> meu relatório. Para que esse avassala<strong>do</strong>r papel não rolasse para as<br />
mãos <strong>do</strong> governo, como uma cascavel <strong>de</strong> chocalho aceso, Jacubais <strong>do</strong> <strong>No</strong>rte fez uma subscrição<br />
<strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a limpar todas as dívidas <strong>de</strong> Cravino Dias, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que mamou até que botou sapato no<br />
pé. Cravino já <strong>de</strong>sceu da torre da Igreja <strong>de</strong> <strong>No</strong>ssa Senhora <strong>do</strong> Parto com um cargo <strong>de</strong> bons<br />
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