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Charles Baudelaire – As Flores do Mal

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Serei teu ataúde, amável pestilência,<br />

Testemunho de tua força e virulência,<br />

Veneno angelical, licor que sem perdão<br />

Me rói, o vida e morte de meu coração!<br />

O VENENO<br />

Sabe o vinho vestir o ambiente mais espúrio<br />

Com seu luxo prodigioso,<br />

E engendra mais de um pórtico miraculoso<br />

No ouro de um vapor purpúreo,<br />

Como um sol que se põe no ocaso nebuloso.<br />

O ópio dilata o que contornos não tem mais,<br />

Aprofunda o ilimita<strong>do</strong>,<br />

Alonga o tempo, escava a volúpia e o peca<strong>do</strong>,<br />

E de prazeres sensuais<br />

Enche a alma para além <strong>do</strong> que conter lhe é da<strong>do</strong>.<br />

Mas nada disso vale o veneno que escorre<br />

De teu verde olhar perverso,<br />

Laguna onde minha alma se mira ao inverso...<br />

E meu sonho logo acorre<br />

Para saciar-se nesse abismo em fel imerso.<br />

Nada disso se iguala ao prodígio sombrio<br />

Da tua saliva forte,<br />

Que a alma me impele ao esquecimento num transporte,<br />

E, carrean<strong>do</strong> o desvario,<br />

Desfalecida a arrasta até os umbrais da morte!<br />

CÉU NUBLADO<br />

Dir-se-ia teu olhar coberto de uma bruma;<br />

Teu olhar misterioso(é azul, verde ou se esfuma?)<br />

Às vezes terno e sonha<strong>do</strong>r, às vezes cruel,<br />

Reflete a palidez e a in<strong>do</strong>lência <strong>do</strong> céu.<br />

Lembras os dias brancos, mornos e vela<strong>do</strong>s,<br />

Que em prantos põem os corações enfeitiça<strong>do</strong>s,<br />

Quan<strong>do</strong>, desperto por torção desconhecida,<br />

Os nervos tensos zombam da alma a<strong>do</strong>rmecida.<br />

Não raro imitas essas cores vaporosas<br />

Que fulguram aos sóis das estações brumosas...<br />

Como resplendes, horizonte assim molha<strong>do</strong><br />

Quan<strong>do</strong> a flama <strong>do</strong> sol aquece o céu nubla<strong>do</strong>!<br />

Ó mulher perigosa, ó climas sedutores!<br />

Hei de a<strong>do</strong>rar a tua neve e os teus rigores?<br />

E como arrancarei <strong>do</strong> inverno em que me enterro<br />

Mais agu<strong>do</strong> prazer que os <strong>do</strong> gelo e <strong>do</strong> ferro?

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