17.04.2013 Views

O jornalismo em O tempo eo vento

O jornalismo em O tempo eo vento

O jornalismo em O tempo eo vento

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Era talvez a única pessoa <strong>em</strong> Santa Fé que usava palavras como alhures, algures<br />

e nenhures. Nunca pedia silêncio; sussurrava: Caluda! Quando queria estimular<br />

alguém, exclamava: Eia! Sus! – Caspité! Era uma de suas interjeições prediletas.<br />

Para ela povo era s<strong>em</strong>pre turbamulta; mãe, genitora; vaga-lume, pirilampo; cobra,<br />

ofídio. Tinha seus adjetivos, advérbios, substantivos e verbos arrumadinhos aos<br />

pares. Aspiração nunca se separava de lídima. Massa s<strong>em</strong>pre andava junto com<br />

ignara. E podia haver uma coisa preparada que não fosse adrede? (O<br />

ARQUIPÉLAGO II, p. 306)<br />

N<strong>em</strong> na morte de D. Emerenciana, que por ironia do autor acontece durante uma<br />

sessão do cin<strong>em</strong>atógrafo, a amiga D. Vanja consegue distinguir o real do ficcional. Para D.<br />

Vanja, mais importante que a morte da companheira é o fato de que ela não poderá<br />

acompanhar o final do folhetim publicado no Correio. As palavras de D. Vanja são<br />

recuperadas por Rodrigo Cambará durante uma conversa sobre fé e religião com o padre<br />

Astolfo.<br />

– Vou lhe contar uma coisa padre, que lhe dará uma idéia de como sou preso<br />

aos prazeres deste mundo, por menores que sejam. Tia Vanja me disse lá no velório<br />

que foi uma pena D. Emerenciana morrer s<strong>em</strong> ter visto o final do folhetim do<br />

Correio do Povo. Acho que a velhinha não disse nenhuma tolice. Viver é bom por<br />

causa duma série de coisas grandes e pequenas entre as quais está também a de ler a<br />

Toutinegra do Moinho. A idéia da morte me é tão desagradável que n<strong>em</strong> a certeza<br />

de ganhar o Céu me faria encará-la com menos horror. (O RETRATO II, p. 491)<br />

Em 1915 a família Cambará está aliada à campanha contra a candidatura do<br />

Marechal Hermes da Fonseca ao Senado da República. Na noite do dia 14 de julho, <strong>em</strong> Porto<br />

Alegre, a Brigada Militar dissolve um comício dos estudantes que protestavam contra a<br />

candidatura. O resultado são cinco pessoas mortas e mais de trinta feridas. Em Santa Fé,<br />

Rodrigo recebe a notícia do confronto na Intendência e a novidade logo se alastra. Os<br />

personagens se encontram na praça e o narrador apresenta as diferentes reações contra o ato<br />

de violência. O personag<strong>em</strong> Saturnino, o estafeta, mostra <strong>em</strong> sua fala que acreditaria nos fatos<br />

e tiraria suas conclusões somente após ler a versão no jornal:<br />

Na praça encontraram Chiru e Saturnino, que já sabiam da notícia. Ficaram a<br />

conversar, sentados sob a figueira grande. Chiru achava que ia rebentar uma<br />

revolução. Saturnino, com seu ar reservado e grave, dizia que preferia aguardar os<br />

jornais para ler os detalhes e formar um juízo definitivo com conhecimento de<br />

causa. Rodrigo pensava já <strong>em</strong> barricadas. (O RETRATO II, p. 551)<br />

Enquanto leitor fervoroso dos jornais, Rodrigo pensa que qu<strong>em</strong> não lê jornal não<br />

pode ter uma opinião formada sobre as coisas. Ele lança essa acusação contra o amigo Roque<br />

38

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!