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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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153<br />

O mo<strong>do</strong> de consumo mais sistemático e regular só é possível quan<strong>do</strong><br />

existe uma fonte de aprovisionamento que não depen<strong>da</strong> de encontros, mais ou menos<br />

aleatórios, com outros consumi<strong>do</strong>res, que o mesmo é dizer, implica entrar em contacto<br />

com pessoas que fazem <strong>da</strong> ven<strong>da</strong> de estupefacientes profissão 164 . A partir <strong>do</strong><br />

momento em que são realiza<strong>da</strong>s compras em quanti<strong>da</strong>de, um novo tipo de consumo<br />

passa a ser possível 165 . Mais uma vez, é preciso ultrapassar uma série de obstáculos<br />

que se prendem com o facto de a ven<strong>da</strong> <strong>da</strong> droga ser ilegal. Para li<strong>da</strong>r com os<br />

revende<strong>do</strong>res é preciso saber onde os encontrar, e para que eles não hesitem em<br />

vender, é preciso ser conheci<strong>do</strong> deles. Tu<strong>do</strong> isto é impossível de realizar se não existir<br />

ligação com grupos que utilizam a droga. À medi<strong>da</strong> que se integra nestes grupos e<br />

ganha a sua confiança, o indivíduo pode obter informações sobre os vende<strong>do</strong>res, ser-<br />

lhes apresenta<strong>do</strong>, e, finalmente, ser considera<strong>do</strong> por eles como alguém em quem se<br />

pode ter confiança. Acontece, diz Becker, que muitos indivíduos não usam esta<br />

possibili<strong>da</strong>de, <strong>da</strong><strong>do</strong> o risco de serem captura<strong>do</strong>s.<br />

To<strong>da</strong>via, esses receios tendem a desaparecer a partir <strong>do</strong> momento em<br />

que a primeira compra foi bem sucedi<strong>da</strong>, que o indivíduo adquire uma capaci<strong>da</strong>de de<br />

avaliação <strong>do</strong> perigo e uma experiência que lhe conferem uma prudência realista e a<br />

toma<strong>da</strong> <strong>da</strong>s precauções elementares 166 .<br />

A aplicação <strong>da</strong> lei limita o uso <strong>da</strong> marijuana, não pela dissuasão directa<br />

<strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, mas porque, ao desestabilizar as fontes de aprovisionamento,<br />

ver<strong>da</strong>deiramente são quan<strong>do</strong> eu trabalho com rapazes que fumam… então eu também. Há seis meses<br />

que não plano. Não fumei na<strong>da</strong> durante to<strong>do</strong> este tempo. Mas desde que estou neste trabalho, faz três<br />

semanas, planei to<strong>da</strong>s as sextas e sába<strong>do</strong>s.(a observação deste homem durante várias semanas revelou<br />

que ele depende completamente, para o seu aprovisionamento de marijuana, <strong>do</strong>s outros membros <strong>da</strong><br />

orquestra na qual ele trabalhava e <strong>do</strong>s músicos que passavam no cabaret onde ele tocava)‖<br />

164 Howard Becker, Outsiders, Études de sociologie de la deviance op.cit., pág. 87 ―Naquela época, eu saia<br />

com um ban<strong>do</strong> que consumia. Eram sempre eles que ma forneciam e isso acabava por me incomo<strong>da</strong>r. Eu<br />

estava ver<strong>da</strong>deiramente aborreci<strong>do</strong> por nunca a possuir, de não poder oferecer-lhes na minha vez.<br />

Perguntei pois onde a poderia encontrar, eu acabei por descobri-la pela primeira vez‖.<br />

165 Howard Becker, Outsiders, Études de sociologie de la deviance op.cit., pág. 88 e segs. ―Se a ven<strong>da</strong><br />

fosse livre, eu utilizá-la-ia to<strong>do</strong> o tempo. Mas (tu queres dizer se não fosse contrária à lei?). Sim. (quer<br />

isso dizer que não desejas ser implica<strong>do</strong>?) É isso, eu não desejo ser muito implica<strong>do</strong>. Eu não quero estar<br />

em contacto muito estreito com pessoas que fazem este tráfico, que estão completamente lá dentro. Eu<br />

nunca tive dificul<strong>da</strong>de em obtê-la. … há sempre alguém que a tem e podes obtê-la quan<strong>do</strong> tu queres. É<br />

por isso, somente por isso, que nunca me foi necessário entrar em contacto mais ou menos directamente<br />

com revende<strong>do</strong>res; tu explicarás isto, suponho, pelo facto de eu nunca ter ti<strong>do</strong> necessi<strong>da</strong>de de cravar ou<br />

de ir procurar alguém ―.<br />

166 Howard Becker, Outsiders, Études de sociologie de la deviance op. cit., pág. 90 e segs. ―Para os que<br />

conseguiram estabelecer contactos, o uso regular é frequentemente interrompi<strong>do</strong> pela prisão ou<br />

desaparecimento <strong>do</strong> seu fornece<strong>do</strong>r. Nestas circunstâncias, o uso regular não se mantém a não ser que o<br />

utiliza<strong>do</strong>r seja capaz de encontrar uma nova fonte de aprovisionamento. Eis como um jovem deixou de<br />

fumar durante algum tempo: ―Aquele foi preso , como Tom. Em segui<strong>da</strong>, Cramer, eu devia-lhe algum<br />

dinheiro, não o tinha visto durante bastante tempo; quan<strong>do</strong> tentei vê-lo, ele tinha parti<strong>do</strong>, e ninguém me<br />

soube dizer para onde ele tinha i<strong>do</strong>. [então tu não sabias mesmo onde o encontrar?] Não. [então tu<br />

paraste?] Sim.‖

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