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Universidade de São Paulo Faculdade de Filosofia, Letras - World ...

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coletadas em chás, xaropes, ungüentos, pomadas, pós, óleos e banhos, que são combinados<br />

com benzimentos e rezas. Seu potencial farmacológico soma-se, assim, à fé, resultante do<br />

sincretismo religioso entre o Cristianismo e os cultos <strong>de</strong> origem afro-indígena, cujos <strong>de</strong>uses<br />

eram a personificação dos atributos da natureza.<br />

Relatando a história <strong>de</strong> Pedro Bongo, curan<strong>de</strong>iro <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> escravos,<br />

AGUIAR 55 <strong>de</strong>monstra a importância e o valor que estas práticas <strong>de</strong> cura sempre tiveram<br />

para a socieda<strong>de</strong> em geral, até mesmo para a classe senhorial:<br />

“A silhueta esguia e alta, sempre com o ‘emborná carregado <strong>de</strong> raízes e<br />

pequenos vidros com todos os tipos <strong>de</strong> preparo para sarar os males da carne e<br />

do espírito’, andava Preto Bongo pelo interior dos municípios <strong>de</strong> <strong>São</strong> Mateus e<br />

Conceição da Barra, curando doentes <strong>de</strong>senganados do viver, que nunca<br />

tinham visto um médico e só acreditavam no rezador’.<br />

Tinha <strong>de</strong> tudo em seu ‘emborná’, cujas ‘terapêuticas acabaram se<br />

incorporando na nossa farmacopéia popular, contribuindo <strong>de</strong> forma empírica,<br />

mágica ou religiosa para, através <strong>de</strong> ‘chá <strong>de</strong> raiz, <strong>de</strong> folha ou casca <strong>de</strong><br />

árvores’, aliviar os sofrimentos do povo simples e pobre do Vale do Cricaré,<br />

constituindo-se no curan<strong>de</strong>iro dos escravos e ‘também do branco e do rico <strong>de</strong><br />

acordo com a precisão’. Os revolucionários em luta contra as Forças do<br />

Governo ou os capitães-do-mato, ao se ferirem, mandavam chamar o Preto<br />

Bongo e até mesmo pra ‘fechar corpo’ contra os inimigos, pois ninguém<br />

dispensava a sua proteção, suas rezas, benzimentos, garrafadas, purgantes,<br />

patuás, entre outras tantas simpatias e mágicas largamente difundidas entre os<br />

milhares <strong>de</strong> escravos da região”.<br />

Ainda hoje estas práticas <strong>de</strong> cura persistem nas comunida<strong>de</strong>s do Estremo Norte do<br />

Espírito Santo, institucionalmente pelas Pastorais da Saú<strong>de</strong>, nos municípios <strong>de</strong> <strong>São</strong> Mateus,<br />

Pinheiros e Conceição da Barra, e informalmente pelas senhoras mais idosas, que<br />

receberam este saber <strong>de</strong> sua ascendência indígena e negra escrava. Em Itaúnas, este saber<br />

passou a ser coletado pela Companhia Ofícios da Terra, formada em 1997 principalmente<br />

pelas “curan<strong>de</strong>iras” da Vila e por mulheres vindas <strong>de</strong> outros lugares para aí morar. Durante<br />

o ano <strong>de</strong> 1998, a Ofícios da Terra organizou encontros on<strong>de</strong> se aprendia sobre os usos<br />

55 AGUIAR, Maciel <strong>de</strong>. Preto Bongo – o mítico do encantamento. Série História dos Vencidos – cad. 4.<br />

Centro Cultural Porto <strong>de</strong> <strong>São</strong> Mateus, Editora Brasil-Cultura, 1995, pp. 19 e 20.<br />

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