Universidade de São Paulo Faculdade de Filosofia, Letras - World ...
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“A nosso ver, a Cabula é semelhante ao Espiritismo e à maçonaria, reduzindo<br />
as proporções para capacida<strong>de</strong>s africanas e outras do mesmo grau. Como o<br />
Espiritismo, acredita na direção imediata <strong>de</strong> um bom espírito chamado Tatá,<br />
que se encarna nos indivíduos, e assim mais perto os dirige em suas<br />
necessida<strong>de</strong>s temporárias e espirituais. Como a Maçonaria, obriga seus<br />
a<strong>de</strong>ptos –que se chamam Camanás (iniciados) para distinguir dos Caialos<br />
(profanos)- a segredo absoluto (...)”. 71<br />
O segredo absoluto fazia-se presente também acerca do local on<strong>de</strong> se praticava o<br />
ritual, preferencialmente na mata, próximo a nascentes e regatos:<br />
“As reuniões são secretas, ora em uma <strong>de</strong>terminada casa, mais comumente nas<br />
florestas, à alta noite. À hora aprazada, todos <strong>de</strong> camisa e calças brancas,<br />
<strong>de</strong>scalços, se dirigem ao Camucite (templo). Uns a cavalo, outros a pé,<br />
caminham silenciosos, fechando a retaguarda o Enbanda [chefe da Mesa]. (...)<br />
Em um ponto dado, <strong>de</strong>ixam o caminho e tomam uma vereda, só conhecida dos<br />
iniciados. Então acen<strong>de</strong>m as velas”.<br />
O ritual da Mesa <strong>de</strong> Santa Maria espalhava-se pelas matas e era dirigido por Mestres<br />
que também guardavam o saber da cura, como o conhecido Ducatora, que adivinhava a<br />
morte <strong>de</strong> algumas pessoas. Zirinha relembra suas memórias da época <strong>de</strong> criança:<br />
“Zirinha – A Mesa <strong>de</strong> Santa Maria eu nunca fui, né, num vô te falá mentira,<br />
não, que eu nunca fui. Era...meu pai ia...eles brinca no mato, né. Você já ouviu<br />
falar, né ? A Mesa <strong>de</strong>les é no mato, né, nas mata, mas dizia ele que num po<strong>de</strong><br />
ir, mas eu acho que até, num sei se já acabô essa tal <strong>de</strong> Mesa <strong>de</strong> Santa Maria.<br />
Sempre nos terreiro assim, em casa, saía gente, né, <strong>de</strong> Santa Maria, eu já vi.<br />
Saía assim, o santo chegava aí, dizia que era santo, né, pegava eles e sumia por<br />
aí, pelos mato, quando chegava todo amarrado. Tudo eles amarrado ! De mão<br />
pra trás. (...) Amarradinho, amarradinho, amarradinho, amarradinho,<br />
amarradinho, amarradinho ! Ninguém <strong>de</strong>samarrava eles. Rolava ái, ó. Rolava,<br />
rolava, acabava, levantava, ninguém... ih! Suava, os home ! Suava, ia<br />
<strong>de</strong>samarrá aquela pessoa, é ruim, hein ! Nó mesmo, feio ! Aí, eles saía outra<br />
vez. Quando chegava, limpinho, sem nada.” (Alzerina Batista, 55, em 18.11.01)<br />
71 AGUIAR, Maciel <strong>de</strong>. Viriato Canção-<strong>de</strong>-Fogo – o guerreiro dos baculos. Série História dos Vencidos –<br />
cad. 5. Centro Cultural Porto <strong>de</strong> <strong>São</strong> Mateus, Editora Brasil-Cultura, 1995, p. 16 a 19.<br />
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