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O CORPO EO CUIDAR NO FEMININO Maria Fernanda - Repositório ...

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SARA: ser mulher, ser mãe - uma história vivida num corpo vivido<br />

preparada para o ter sozinha. Acho que nem sequer pus a hipótese de ficar com ele. E, por outro<br />

lado, ia interferir na minha vida, estava a fazer o curso de Biologia. Foi três anos antes do<br />

casamento. Ninguém me obrigava a casar. Eu hoje pensaria doutra maneira. É evidente que ia ter<br />

montes de problemas com a minha mãe e essas coisas todas, mas não acredito que a minha mãe<br />

me pusesse fora da porta. Não tinha uma situação económica, precisava de alguém que me<br />

resolvesse a situação, que nos sustentasse a mim e à criança.<br />

Aquela semana, entre saber e tomar a atitude, custou imenso. Não sabia o que é que ia<br />

fazer. Foi a minha cunhada que me disse onde é que ia fazer, porque aconteceu que ela perdeu<br />

um bebé e logo a seguir ficou grávida e fez um aborto. O que é que eu havia de fazer? Queria<br />

continuar o curso.<br />

Não sei se sei precisar bem os pormenores de como foi. O Fernando tratou de tudo e<br />

arranjou o dinheiro. Escrevi uma carta depois disso, que lha dei, sobre o que se passou e o que<br />

eu achei. Disse-lhe que nunca mais queria 1er aquilo. Já não sei muito bem o que escrevi mas,<br />

lembro-me que escrevi muitos poemas depois disso. Uma das coisas que escrevi foi que a bacia<br />

era azul, a bacia onde ela pôs aquilo... Estou convencida, hoje, que até continuava o curso.<br />

Também os anos passam e a gente tem outra possibilidade: se calhar se voltasse ao mesmo<br />

sítio, não fazia o mesmo. Tinha vinte anos, não pensei muito nisso, podia assumir a criança<br />

sozinha, podia não me casar com ele e não me impedia de ser mãe. Também não tinha os<br />

conhecimentos que tenho hoje e acho que me custa mais a viver com isso. Acredito na<br />

espiritualidade, acredito que os espíritos existem e não ajuda nada continuar a martelar nisso.<br />

Às vezes, estou a olhar para este filho, e penso assim, como é que era o outro se<br />

estivesse aqui. Com este bebé, custa-me pensar: "assim como este não foi, o outro podia estar<br />

aqui se viesse noutra altura". Do Mateus, lembro-me que no princípio, tomara eu que ele fosse!<br />

Deus me livre, não o queria. Cheguei a pensar nisso mas, a partir de certa altura, uma pessoa<br />

começa a estabelecer uma relação com ele, e até dizia que se perdesse este bebé ia ter um<br />

desgosto muito grande.<br />

Uma pessoa, depois, como tudo, habitua-se.<br />

fica-se numa posição muito mais ingrata!<br />

A decisão fica sempre em nós. Claro, que há mais pessoas e as coisas também lhes vão<br />

parar mas, sobretudo a decisão é nossa. Depois disso, quando nos vem parar alguns casos<br />

semelhantes fica-se numa posição muito ingrata, quer dizer, desaconselhar uma pessoa a fazer<br />

uma coisa que a gente já fez; se calhar porque fez é que desaconselha.<br />

Quando estive na instituição C, ao lado estava uma miúda com dezanove anos. Tinha ido<br />

fazer uma raspagem, porque não lhe devem ter feito aquilo bem feito. O feto ainda estava lá,<br />

morto, e fez uma grande infecção. Esteve com antibiótico. Quando vinha de lá de cima, vinha a<br />

chorar, mas ainda disse que o queria. Ela ainda falou, dizendo:<br />

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