19.04.2013 Views

O home de Camele - Asociación de Escritores en Lingua Galega

O home de Camele - Asociación de Escritores en Lingua Galega

O home de Camele - Asociación de Escritores en Lingua Galega

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

PAG: E09SR04 -- EDI: JAN09<br />

[Descobrim<strong>en</strong>to]<br />

Quando a tua mao macia e ser<strong>en</strong>a <strong>de</strong> branco<br />

se est<strong>en</strong><strong>de</strong>u fraternalm<strong>en</strong>te para min<br />

e através Índicos <strong>de</strong> preconceitos<br />

apertou com carinho meus <strong>de</strong>dos mulatos <strong>en</strong>clavinhados;<br />

quando teus olhos inhado <strong>de</strong> compre<strong>en</strong>sao<br />

pousaram no mapa doloroso do meu rosto <strong>de</strong> África;<br />

quando a piroga do teu amor se fez ao mar<br />

e veio aportar ao meu peito <strong>en</strong>sangu<strong>en</strong>tado e céptico;<br />

ah, quando a tua voz doce e fresca como um lanho<br />

me trouxe a ban<strong>de</strong>ira branca da palavra ‘IRMÁ’<br />

é que eu s<strong>en</strong>ti, profunda como um selo em brasa<br />

verrumando a carne,<br />

a força terrível e única do nosso abraço fraterno,<br />

a inquebrável ca<strong>de</strong>ia das nossas maos <strong>en</strong>fim juntas,<br />

a in<strong>de</strong>strutível resistência da muralha erguida<br />

por nossas maravilhosas juv<strong>en</strong>tu<strong>de</strong>s unidas.<br />

Ah!, amigo, quando a tua mao certa e ser<strong>en</strong>a <strong>de</strong> branco<br />

procurou o <strong>de</strong>sespero da minha mao sem rumo...<br />

[Sangue negro]<br />

Ó minha África misteriosa e natural,<br />

minha virgem viol<strong>en</strong>tada,<br />

minha Mae!<br />

Como eu andava há tanto <strong>de</strong>sterrada,<br />

<strong>de</strong> ti alheada<br />

distante e egocêntrica<br />

por estas ruas da cida<strong>de</strong><br />

<strong>en</strong>gravidadas <strong>de</strong> estrangeiros!<br />

Minha mae, perdoa!<br />

Como se eu pu<strong>de</strong>sse viver assim,<br />

<strong>de</strong>sta maneira, eternam<strong>en</strong>te,<br />

ignorando a carícia fraternam<strong>en</strong>te<br />

morna do teu lar<br />

(meu princípio e meu fim)...<br />

Como se nao existisse para além<br />

dos cinemas e dos cafés, a ansieda<strong>de</strong><br />

dos teus horizontes estranhos, por <strong>de</strong>sv<strong>en</strong>dar...<br />

Como se nos teus matos cacimbados<br />

nao cantassem em surdina a sua liberda<strong>de</strong>,<br />

as aves mais belas, cujos nomes sao mistérios ainda fechados!<br />

Como se tres filhos –régias estátuas sem par–,<br />

altivos, em bronze talhados,<br />

do teu sol causticante, tropical,<br />

como se os teus filhos intemeratos, sobretudo lutando,<br />

à terra amarrados,<br />

como escravos, trabalhando,<br />

amando, cantando –<br />

meus irmaos nao fossem!<br />

Ó minha Mae África, ngoma pagá,<br />

escrava s<strong>en</strong>sual,<br />

Mística, sortílega – perdoa!<br />

Á túa filha tresvirada,<br />

abre-te e perdoa!<br />

Que a força da tua seiva v<strong>en</strong>ce tudo!<br />

E nada mais foi preciso, que o feitiço ímpar<br />

dos teus tantás <strong>de</strong> guerra chamando,<br />

dundundundundun – tantá – dundundundundun – tantá<br />

nada mais que a loucura elemntar<br />

dos teus batuques bárbaros, trerrivelm<strong>en</strong>te belos...<br />

para que eu vibrasse<br />

para que eu gritasse<br />

para que eu s<strong>en</strong>tisse, funda, no sangue, a tua voz, Mae!<br />

E v<strong>en</strong>cida, reconhecesse os nossos elos...<br />

e regressasse à minha origem mil<strong>en</strong>ar,<br />

Mae, minha Mae África<br />

das cnaçoes escravas ao luar,<br />

nao posso, nao posso repudiar<br />

o sangue negro, o sangue bárbaro que me legaste...<br />

Porque em min, em minha alma, em meus nervos,<br />

ele é mais forte que tudo,<br />

eu vivo, eu sofro, eu rio através <strong>de</strong>le, Mae!<br />

Em seus formais cantos r<strong>en</strong>dilhados<br />

foste tu, negra...<br />

m<strong>en</strong>os tu.<br />

E ainda bem.<br />

Ainda bem que nos <strong>de</strong>ixaram a nós,<br />

do mesmo sangue, mesmo nervos, carne, alma,<br />

sofrim<strong>en</strong>to,<br />

a glória única e s<strong>en</strong>tida <strong>de</strong> te cantar<br />

com emoçao verda<strong>de</strong>ira e radical,<br />

a glória conmovida <strong>de</strong> te cantar, toda amassada,<br />

moldada, vazada nesta sílaba impresa e luminosa: MAE.<br />

[Magaíça]<br />

A manhá azul e ouro dos folhetos <strong>de</strong> propaganda<br />

<strong>en</strong>goliu o mamparra,<br />

<strong>en</strong>tontecido todo pela algazarra<br />

incompre<strong>en</strong>sível dos brancos da estaçao<br />

e pelo refolegar trepidante dos comboios,<br />

tragou seus olhos redondos <strong>de</strong> pasmo,<br />

seu coraçao apertado na angústia do <strong>de</strong>sconhecido,<br />

sua trouxa <strong>de</strong> farrapos<br />

carregando a ânsia <strong>en</strong>orme, tecida<br />

dos sonhos insatisfeitos do mamparra.<br />

E um dia,<br />

o comboio voltou, arfando, arfando...<br />

oh nhanisse, voltou!<br />

E com ele, magaíça,<br />

<strong>de</strong> sobretudo, cachecol e meia listrada<br />

é um ser <strong>de</strong>slocado,<br />

embrulhado em ridículo.<br />

Ás costas – ah, on<strong>de</strong> te ficou a trouxa <strong>de</strong> sonhos, magaíça? –<br />

trazes as malas cheias <strong>de</strong> falso brilho (190)<br />

4 O Correo Galego 9/1/03 O Correo Galego 9/1/03 5

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!