45-54 - Universidade de Coimbra
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PÍ. 0 5 0<br />
Defensor<br />
Itica e aiist<br />
A sabia politica e a boa administração<br />
das nossas vastas e ricas províncias ultramarinas<br />
está reduzida, por parte do actual<br />
governo, a méros expedientes <strong>de</strong> occasião.<br />
Tem-se limitado a sua activida<strong>de</strong>, dirigente<br />
e previ<strong>de</strong>nte, a organisar, á pressa e<br />
<strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nadamente, uma ou outra expedição<br />
militar insuficientíssima para reprimir a<br />
revolta do gentio e castigar os revoltosos,<br />
com pesadíssimos encargos para o thesouro<br />
publico, doloroso e, para mais, inútil sacrifício<br />
<strong>de</strong> muitas vidas, sem resultado algum<br />
pratico, que possa garantir a or<strong>de</strong>m e a segurança<br />
em nossas colonias, a sua conservação<br />
e futuro <strong>de</strong>senvolvimento agrícola e<br />
commercial.<br />
E' certo que a pacificação çTaqtiellàs<br />
regiões e a sujeição dos rebel<strong>de</strong>s ao nosso<br />
domínio economico e soberania politica é<br />
condição primaria, indispensável á manutenção<br />
e progresso do nosso patrimonio colonial.<br />
Isso porém não basta.<br />
Ha muito tempo que os governos <strong>de</strong><br />
Portugal <strong>de</strong>viam ler cuidadosamente estudado,<br />
e posto em execução um syslema regular<br />
e aperfeiçoado <strong>de</strong> sabia politica e boa<br />
administração, por meio do qual, promovendo<br />
e realisando, d'um modo efficaz e<br />
proveitoso, a prosperida<strong>de</strong> das nossas provincias<br />
ultramarinas da Africa e na índia,<br />
evitasse a revolta dos indígenas, e contivesse<br />
no <strong>de</strong>vido respeito as ávidas nações<br />
da Europa, nomeadamente a Inglaterra, que<br />
não recua <strong>de</strong>anle dos meios mais baixos e<br />
dos mais ignóbeis expedientes, para nos<br />
expoliar e chamar a si o que é nosso, muito<br />
nosso, e só a nós <strong>de</strong> facto e por direito pertence.<br />
Votadas, porém, ao abandono, a um<br />
quasi syslematico <strong>de</strong>sprezo, as nossas possessões,<br />
que são parte integrante e valiosa<br />
do territorio portuguez, penhor da nossa<br />
imporlancia internacional, esquecidos, mal<br />
tratados em lodo o sentido os seus habitantes,<br />
que em gran<strong>de</strong> parte são cidadãos portuguezes,<br />
e como laes <strong>de</strong>viam ser havidos e<br />
tratados, não é para estranhar que os indígenas<br />
e os proprios colonos se revoltem, e<br />
que as outras nações, invocando o principio<br />
da expropriação por utilida<strong>de</strong> publica, os<br />
direitos da humanida<strong>de</strong>, os interesses e<br />
aspirações da civilisação, nos espoliem, e<br />
<strong>de</strong>sapossem do que por ignorancia. incúria<br />
e <strong>de</strong>sleixo é em nosso po<strong>de</strong>r improductivo,<br />
prejudicando assim as conveniências e lesando<br />
os direitos <strong>de</strong> outros, que na Africa e<br />
na índia são nossos visinhos e também possuidores<br />
<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s e po<strong>de</strong>rosas extensões<br />
<strong>de</strong> lerritorio, que elles utilmente aproveitam,<br />
sabiamente governam e administram.<br />
Ao passo que oulras nações tem adiantado<br />
e feito progredir notavelmente as suas<br />
colonias, e d'ellas sabido tirar abundantes<br />
recursos, adquirir cada anno maior força e<br />
predomínio entre as outras nações da Europa<br />
e gran<strong>de</strong> prestigio em todo o mundo,<br />
Portugal, que já foi a maior e mais opulenta<br />
das potencias coloniaes, vê largamente cerceado<br />
e consi<strong>de</strong>ravelmente reduzido o seu<br />
patrimonio colonial; as suas possessões<br />
ultramarinas somente representam, para o<br />
oulr'ora po<strong>de</strong>roso senhor do Oriente, uma<br />
velha <strong>de</strong>coração histórica, uma dispendiosa<br />
ostentação <strong>de</strong> fidalgo arruinado, origem <strong>de</strong><br />
confliclos, vexames e humilhações vergonhosas.<br />
Servem ainda para mais alguma cousa:<br />
— São um attestado permanente da<br />
incapacida<strong>de</strong> dos noss0s governantes, e<br />
um monumento secular e já agora eterno<br />
para, sem duvida, attestar ao mundo a nossa<br />
antiga'virilida<strong>de</strong> e gran<strong>de</strong>za, mas também<br />
a inépcia, a cobardia, a imbecilida<strong>de</strong>, a<br />
inércia <strong>de</strong> um povo, que se <strong>de</strong>ixa roubar e<br />
escarnecer, <strong>de</strong>ntro e fóra do seu paiz.<br />
O brio do exercito<br />
Tem causado funda impressão o energico<br />
artigo editorial — O brio do exercito — que<br />
o Tempo publicou no seu numero <strong>de</strong> quinta<br />
feira, da penna do respeitável general, sr.<br />
Camara Leme.<br />
E' um protesto violento saído da energia<br />
d'um velho portuguez, com serviços relevantes<br />
á patria, seu leal servidor, que vem<br />
em <strong>de</strong>feza dos brios do nosso exercito, conspurcados<br />
por esses infames dictadores, aos<br />
quaes accusa <strong>de</strong> manterem em Lourenço Marques<br />
— como réprobo ao exercito — um commissario<br />
régio, investido do mais alto grau<br />
hierarchico militar!<br />
Não fugiremos á tentação <strong>de</strong> transcrever<br />
doeste brilhante artigo, alguns períodos, já<br />
que o não po<strong>de</strong>mos dar na integra por falta<br />
<strong>de</strong> espaço.<br />
Começa por estas enthusiastas palavras:<br />
«Foi sempre a honra a mais valiosa moeda com que<br />
se galardoaram feitos <strong>de</strong> armas e annos consumidos<br />
por acampamentos e bivaques, com sacrifício da própria<br />
vida. Ainda hoje o é, e sel-o-ha sempre, porque<br />
a religião das ban<strong>de</strong>iras impõe como primeiro <strong>de</strong>ver a<br />
abnegação heróica e o <strong>de</strong>sprendimento <strong>de</strong> toda a commodida<strong>de</strong><br />
pessoal.<br />
«Trata-se <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a ban<strong>de</strong>ira que tem por iemma<br />
as quinas, a cruz e a espada, essa ban<strong>de</strong>ira boje tão humilhada<br />
e tão heróica outr'ora, <strong>de</strong>sfraldada com assombro<br />
nos confins do mundo. Organisam-se forças do<br />
exercito da inetropole, e nem ura único soldado se recusa<br />
a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a sua patria, affrontando os perigos do<br />
clima, não inferiores aos do inimigo que vae combater.<br />
«O governo, porém, submette ás or<strong>de</strong>ns d'um commissario<br />
régio, embora cavalheiro <strong>de</strong> reconhecida iilustração,<br />
a quem investe do mais alto gráo biefarchico<br />
militar, officiaes <strong>de</strong> patentes superiores e encanecidos<br />
no serviço I Fére a dignida<strong>de</strong> d'uma classe que abdica<br />
da vonta<strong>de</strong> pela disciplina, da conservação pelo perigo,<br />
do interesse pela modicida<strong>de</strong>, quasi pobreza, da sua<br />
pagai<br />
«Nobre exemplo <strong>de</strong> disciplina, tão pouco apreciado,<br />
<strong>de</strong>plorável contraste do <strong>de</strong>ver.<br />
«Quando na nossa riquíssima possessão <strong>de</strong> Moçambique<br />
se reclamava um militar <strong>de</strong> patente superior,<br />
bravo e intelligente, para dirigir a melindrosa politica<br />
internacional e as operações militares d'aquella preciosa<br />
pérola da corôa portugueza, o governo usurpador<br />
<strong>de</strong> todas a regalias constitucionaes, exercendo a mais<br />
nefasta dictadura com manifestos intuitos autocratas,<br />
conserva, n'esta grave conjunctura, em Lourenço Marques,<br />
um funccionario alheio á nobre profissão das armas,<br />
com or<strong>de</strong>nado <strong>de</strong> príncipe, ferindo assim o <strong>de</strong>coro<br />
dos officiaes do exercito portuguez I<br />
«E o sr. ministro da guerra, a quem estão confiados<br />
os <strong>de</strong>stinos do exercito, a sua honra e a sua dignida<strong>de</strong>,<br />
ainda está nos conselhos da corôa 11!<br />
«Mas o sr. ministro da guerra continua a gastar os<br />
dinheiros do paiz em manobras inúteis, em reformas e<br />
promoções dispendiosas, preoceupando-se pouco com<br />
os brios do exercito, e o sr. Ennes, aliás distincto escriptor<br />
e dramaturgo, conserva-se em Lourenço Marques,<br />
como se fosse rei d'aquelia possessão.<br />
«Oxalá que não venha <strong>de</strong> la com apontamentos para<br />
uma tragedia tétrica, intitulada: A perda <strong>de</strong> Moçambique<br />
ou a humdhaçao <strong>de</strong> Portugal.<br />
E termina por esta <strong>de</strong>claração patriótica:<br />
«Eu que tenho sempre pugnado pelos interesses legítimos<br />
do exercito na imprensa e no parlamento, ainda<br />
tenho voz, comquanto débil, e penna comquanto mal<br />
aparada, para continuar com energia na brecha, pugnando<br />
pela honra offendida do exercito portuguez.»<br />
Portuguez <strong>de</strong> lei — d'antes quebrar que<br />
torcer — ha <strong>de</strong> cumprir a sua palavra.<br />
Que não é palavra <strong>de</strong> rei!...<br />
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