datas limites para submeter comunicações científicas ... - SPORL
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Órgão Oficial da Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial VOL. 49 . Nº 4 . DEZEMBRO 2011<br />
• SURDEZ CONGÉNITA NEUROSSENSORIAL – ALGORITMO<br />
• TC NOS CARCINOMAS DA LARINGE/HIPOFARINGE<br />
• TESTES DA FALA EM CRIANÇAS PORTUGUESAS<br />
• INCISÃO NO ACESSO TRANS-SEPTO-ESFENOIDAL DA HIPÓFISE<br />
• CIRURGIA LASER CO2 NOS TUMORES MALIGNOS GLÓTICOS<br />
• RADIOFREQUÊNCIA DE CORNETOS<br />
• NEOPLASIAS DAS GLANDULAS SALIVARES<br />
• COMPLICAÇÕES DA CIRURGIA TIROIDEIA<br />
• SURDEZ NEURO-SENSORIAL SÚBITA IDIOPÁTICA<br />
• LARINGECTOMIA PARCIAL SUPRACRICOIDEIA RECONSTRUTIVA<br />
• ESTENOSE CONGÉNITA DO ORIFÍCIO PIRIFORME<br />
• SÍNDROME DA DEISCÊNCIA DO CANAL SEMICIRCULAR SUPERIOR<br />
• SARCOMA DE KAPOSI DA LARINGE<br />
• ENDOSCOPIA NASAL NAS LESÕES DA BASE DO CRÂNIO<br />
• FÍSTULAS ESPONTÂNEAS DE LCR DO OUVIDO MÉDIO.<br />
• ENXAQUECA VESTIBULAR
Órgão Oficial da Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial VOL. 49 . Nº 4 . DEZEMBRO 2011<br />
DIRECÇÃO<br />
EXECUTIVE BOARD<br />
DIRECTOR<br />
DIRECTOR<br />
António Sousa Vieira<br />
DIRECTOR ADJUNTO / EDITOR PRINCIPAL<br />
ASSISTANT DIRECTOR / EDITOR-IN-CHIEF<br />
Jorge Spratley<br />
EDITOR ADJUNTO<br />
ASSISTANT EDITOR<br />
Carla Pinto Moura<br />
CONSELHO CIENTÍFICO<br />
SCIENTIFIC BOARD<br />
Agostinho Pereira da Silva<br />
António Diogo Paiva<br />
António Marques Pereira<br />
António Sousa Vieira<br />
Carlos Carvalho<br />
Carlos Pinheiro<br />
Carlos Martins<br />
Carlos Ribeiro<br />
Cecília Almeida e Sousa<br />
Eurico Monteiro<br />
Ezequiel Barros<br />
João Marta Pimentel<br />
José Madeira da Silva<br />
Luís Antunes<br />
Luísa Monteiro<br />
Margarida Santos<br />
Mário Andrea<br />
Miguel Magalhães<br />
Rodrigues e Rodrigues<br />
Vítor Gabão Veiga<br />
CONSELHO EDITORIAL<br />
EDITORIAL BOARD<br />
Carla André<br />
Delfim Duarte<br />
Eduardo Cardoso<br />
João Subtil<br />
José Gameiro dos Santos<br />
Manuel Lima Rodrigues<br />
Paulo Vera-Cruz<br />
Pedro Marques<br />
FICHA TÉCNICA<br />
PUBLISHER’S INFORMATION<br />
PROPRIETÁRIO / PROPERTY<br />
Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia<br />
e Cirurgia Cérvico-Facial<br />
PUBLICAÇÃO TRIMESTRAL<br />
QUARTERLY PUBLICATION<br />
Nº avulso / Unit price:<br />
Portugal: 22,00€<br />
Estrangeiro / Abroad: US$ 25<br />
Assinatura anual / Annual subscripton:<br />
Portugal: 66,00€<br />
Estrangeiro / Abroad: US$ 75<br />
Depósito Legal nº 30611/89<br />
ISSN: 0873-3864<br />
MAQUETIZAÇÃO & IMPRESSÃO<br />
DESIGN & PRINTING<br />
MODOS DE VER, Design e Comunicação, Lda<br />
Praceta das Flores, Nº 6 A/B<br />
Quinta Grande - Alfragide<br />
2610-074 Amadora<br />
modosdever@tecnirede.pt<br />
www.modosdever.pt<br />
DIRECÇÃO<br />
BOARD<br />
PRESIDENTE<br />
PRESIDENT<br />
António Sousa Vieira<br />
VICE-PRESIDENTES<br />
VICE-PRESIDENTS<br />
Carlos Ribeiro<br />
Ezequiel Barros<br />
SECRETÁRIO GERAL<br />
GENERAL SECRETARY<br />
Jorge Spratley<br />
TESOUREIRO<br />
TREASURER<br />
Carlos Pinheiro<br />
VOGAIS<br />
MEMBERS<br />
António Marques Pereira<br />
Carlos Carvalho<br />
José Gameiro dos Santos<br />
Luísa Monteiro<br />
SEDE<br />
HEAD-OFFICE<br />
ORDEM DOS MÉDICOS<br />
Av. Almirante Gago Coutinho, 151<br />
1700 - 029 Lisboa<br />
Portugal<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 205
ÍNDICE INDEX<br />
209 EDITORIAL<br />
247<br />
211<br />
217<br />
223<br />
229<br />
235<br />
243<br />
ARTIGOS<br />
Surdez congénita neurossensorial – Proposta<br />
<strong>para</strong> algoritmo de investigação<br />
Congenital sensorineural hearing loss – Proposal<br />
for an investigation algorithm<br />
Rui Cerejeira, Natércia Silvestre, Clara Silva, Joana Ribeiro,<br />
Paulo Gonçalves, António Paiva<br />
Papel da TC nas decisões terapêuticas nos<br />
carcinomas da laringe/hipofaringe<br />
Role of CT in treatment decisions in laryngeal/<br />
hypopharyngeal carcinomas<br />
Andreia Ribeiro, Gustavo Lopes, Marta Pereira, Sara Cruz,<br />
Abílio Leonardo, Manuel Rodrigues e Rodrigues<br />
Construção e validação dos testes fala com ruído<br />
(FR) e dicótico de dígitos (DD) <strong>para</strong> aplicação em<br />
crianças portuguesas<br />
Construction and validation of speech tests<br />
with noise (SN) and dichotic with digits (DD) for<br />
application in portuguese children<br />
Cristiane L. Nunes, L. Desgualdo, G. S. Carvalho<br />
Incisão sublabial versus columelar no acesso<br />
trans-septal <strong>para</strong> cirurgia trans-esfenoidal<br />
microscópica da hipófise. Estudo retrospectivo<br />
Sublabial versus columellar incision in<br />
trans-septal transsphenoidal approach for<br />
microscopic pituitary surgery. Retrospective<br />
study<br />
Joana Guimarães, Joana Santos, Daniel Miranda,<br />
Filipa Carvalho Moreira, Nuno Marçal, Gabriel Pereira,<br />
Olinda Marques, Rui Almeida, Sérgio Vilarinho, Altino Frias,<br />
Carlos Alegria, Rui Pratas<br />
Cirurgia laser CO 2 no tratamento de tumores<br />
malignos glóticos<br />
CO 2 laser surgery for the treatment of glottic<br />
cancer<br />
Alexandra Jerónimo, Pedro Cavilhas, Luís Oliveira,<br />
Pedro Montalvão, Miguel Magalhães<br />
Radiofrequência de cornetos. A nossa<br />
experiência<br />
Radiofrequency of turbinates. Our experience<br />
Ana Sofia Araújo Da Costa, Olalla Castro Macía, Miriam<br />
Ileana Hamdan Zavarce, Jose Manuel Meléndez García,<br />
Dionisio Alonso Párraga, Gumersindo Espiña Campos<br />
206 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
255<br />
261<br />
267<br />
273<br />
281<br />
Neoplasias das glandulas salivares – experiência<br />
do IPOC FG - Últimos 10 anos<br />
Salivary gland neoplasms – IPO FG coimbra<br />
experience - Last 10 years<br />
Ana Margarida Simões, Francisco Branquinho, Azenha<br />
Cardoso, António Neves, Carlos Cruz, Henriques Pereira,<br />
João Ganho, Arnaldo Guimarães<br />
Complicaciones de la cirugía tiroidea:<br />
Control y tratamiento<br />
Complications of thyroid surgery:<br />
Control and treatment<br />
Solís Vázquez R, Ambel Albarrán A, Pereda Tamayo JM,<br />
Trinidad Ruiz G, Torrico Román P, Pantoja Hernández CG,<br />
Rejas Ugena E<br />
Surdez neuro-sensorial súbita idiopática -<br />
Resultados após 3 anos de implementação de<br />
protocolo terapêutico<br />
Idiopathic sudden sensorineural hearing loss<br />
- Results after 3 years of therapeutic protocol<br />
implementation<br />
João Diogo Martins, Vítor Certal, Tiago Santos, Hélder Silva,<br />
Hugo Amorim, Carlos Carvalho<br />
Laringectomia parcial supracricoideia<br />
reconstrutiva com C.H.E.P. – Experiência do<br />
serviço nos últimos 10 anos<br />
Supracricoid partial reconstructive<br />
laryngectomy with C.H.E.P. - Department<br />
experience for the last 10 years<br />
Joana Filipe, Helena Ribeiro, André Amaral, Rui Fino,<br />
Hugo Estibeiro, Pedro Montalvão, Miguel Magalhães<br />
Obstrução nasal no recém-nascido: Dois casos<br />
de estenose congénita do orifício piriforme<br />
Nasal obstruction in neonates: Two cases<br />
report of congenital nasal pyriform aperture<br />
stenosis<br />
Alexandra Jerónimo, Ana Casas Novas, Inês Moreira,<br />
Carla Conceição, Inês Cunha, Luísa Monteiro<br />
Síndrome da deiscência do canal semicircular<br />
superior: A propósito de dois casos clínicos<br />
Superior semicircular canal dehiscence<br />
syndrome: Two cases report<br />
Joana Guimarães, Daniel Miranda, Filipa Carvalho Moreira,<br />
Nuno Marçal, Gabriel Pereira, Sérgio Vilarinho, Matos<br />
Gonçalves, Rui Pratas
289<br />
293<br />
299<br />
305<br />
312<br />
313<br />
315<br />
316<br />
Sarcoma de kaposi da laringe - Caso clínico<br />
Laryngeal kaposi’s sarcoma - Case report<br />
Clara Silva, Carla Gapo, Natércia Silvestre, Jorge Miguéis,<br />
Ana Margarida Amorim, Sofia Caetano, Isabel Ramos,<br />
Maria José Julião, António Paiva<br />
A técnica endoscópica endonasal no<br />
diagnóstico de lesões da base do crânio:<br />
A propósito de um cordoma do clivus<br />
Intranasal endoscopy diagnosing skull base<br />
pathology: A case of clivus chordoma<br />
Cláudia Reis, José Gameiro dos Santos, Rosário Figueirinhas,<br />
Telma Feliciano, Cristina Ramos, Melo Pires,<br />
Cecília Almeida e Sousa<br />
Fístulas espontâneas de líquido cefalorraquidiano<br />
do ouvido médio - A propósito de um caso<br />
clínico<br />
Spontaneous cerebrospinal fluid otorrhea -<br />
Case report and literature revision<br />
Eurico Costa, Ana Guimarães, Filipe Freire, V. Gabão Veiga<br />
Enxaqueca Vestibular<br />
Migrainous Vertigo<br />
João Martins, Vítor Certal, Tiago Santos, Hugo Amorim,<br />
Carlos Carvalho<br />
VOTAÇÃO PARA MELHOR TRABALHO<br />
COLÉGIO DA ESPECIALIDADE<br />
AGENDA<br />
NORMAS DE PUBLICAÇÃO<br />
Imagem de capa<br />
Sarcoma de Kaposi da laringe<br />
Laryngeal Kaposi’s sarcoma<br />
Clara Silva, Carla Gapo, Natércia Silvestre, Jorge Miguéis, Ana Margarida Amorim,<br />
Sofia Caetano, Isabel Ramos, Maria José Julião e António Paiva<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 207
208<br />
REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
DR. EZEQUIEL BARROS<br />
Vice-Presidente da <strong>SPORL</strong>-CCC<br />
Caros Colegas<br />
O ano de 2011 chegou ao fim e 2012 está a começar,<br />
repleto de incertezas e desafios. Certo é que, a prática<br />
da Medicina como a conhecemos está a sofrer uma<br />
alteração profunda, que afectará a nossa atividade diária.<br />
Como iremos responder e adaptar os novos conceitos<br />
de uma medicina sustentada economicamente na<br />
realidade diária, é uma incógnita que o futuro próximo se<br />
encarregará de responder, mas que me deixa apreensivo.<br />
Permitam-me compartilhar convosco um facto, expresso<br />
no documento da ACSS sobre as “Actuais e Futuras<br />
Necessidades Previsionais de Médicos (SNS)” onde se<br />
lê que estão previstas, desde o ano de 2011 até ao ano<br />
de 2030, a entrada de 497 médicos <strong>para</strong> a especialidade<br />
contra a saída por aposentação de 189. Com estes valores<br />
em 2030 vai haver o dobro de médicos especialistas em<br />
ORL. Várias leituras se podem fazer deste facto, resta-nos<br />
a esperança de que, se a matemática é uma ciência exacta<br />
a politica não o é.<br />
Realizou-se no início do mês de Dezembro o 1º Congresso<br />
da Academia Ibero Americana de Otorrinolaringologia<br />
na Riviera Maia, México. Noventa e seis congressistas e<br />
oitenta e um palestrantes, provindos dos vários países<br />
da América Latina e da Península Ibérica, reuniramse<br />
<strong>para</strong> debater assuntos da actualidade da ORL. Um<br />
congresso idealizado <strong>para</strong> ser o palco no qual jovens<br />
especialistas e internos pudessem mostrar os seus<br />
trabalhos, na realidade teve uma fraca representação<br />
destes, talvez fruto da actual conjectura económica<br />
mundial. A Assembleia-geral da AIAORL, elegeu Portugal<br />
como organizador do 2º Congresso, que decorrerá na<br />
cidade do Porto em 2013 conjuntamente com o nosso<br />
Congresso Nacional. Será certamente um evento que<br />
prestigiará a ORL Portuguesa e <strong>para</strong> o qual contamos<br />
com a colaboração de todos. Uma nota, por razões de<br />
agenda, o 7º Congresso Luso-Brasileiro de ORL, decorrerá<br />
este ano de 2012, entre 14 e 17 de Novembro, em Recife.<br />
Por falar em congressos, aproxima-se o 59º Congresso<br />
da <strong>SPORL</strong> e 14º Congresso Luso-Espanhol de ORL,<br />
que decorrerá de 28 de Abril a 1 de Maio deste ano<br />
na bonita cidade de Viseu. Para além do convívio que<br />
estes eventos proporcionam, a parte cientifica está<br />
a ser cuidada, de modo a permitir a actualização de<br />
conhecimentos nas várias áreas da ORL e possibilitar<br />
uma montra, <strong>para</strong> a visualização dos trabalhos dos vários<br />
serviços portugueses. O convite endereçado aos serviços<br />
hospitalares públicos e privados, teve uma resposta<br />
positiva no passado recente, com elevada participação<br />
e apresentação de trabalhos com alto valor científico,<br />
pelo que se vai manter. Outra aposta ganha foi o “dia das<br />
comissões”, espaço do congresso da responsabilidade das<br />
várias comissões, que se mantém este ano e onde serão<br />
apresentados trabalhos com interesse temático. Uma<br />
das queixas que é recorrente, é a de que como existem<br />
várias salas em simultâneo a funcionar, por vezes, tornase<br />
difícil assistir a tudo que interessa pela simultaneidade<br />
de eventos. Vamos procurar ter duas salas a funcionar<br />
em simultâneo, oxalá o número de conferências o<br />
permita. A manter será o figurino das Comunicações<br />
Livres, com um máximo de 75, com formato obrigatório<br />
de artigo <strong>para</strong> publicação posterior na revista da <strong>SPORL</strong>.<br />
Com esta medida houve ganhos <strong>para</strong> ambos as partes<br />
interessadas, a <strong>SPORL</strong> garantiu a existência de matéria<br />
científica com qualidade <strong>para</strong> publicação e os autores<br />
viram o seu trabalho divulgado.<br />
O momento económico em que vivemos, também se faz<br />
sentir na organização dos congressos, com diminuição<br />
dos patrocínios por parte da indústria farmacêutica e<br />
das casas de material, que no passado possibilitaram<br />
a organização de reuniões muito participadas. Estes<br />
patrocínios, reflectem-se também nos prémios atribuídos<br />
pela <strong>SPORL</strong> e nas bolsas, que no ano transacto foram<br />
instituídas. Há a certeza de que, pelo menos este ano, os<br />
prémios e as bolsas serão atribuídos.<br />
Quero aqui expressar os meus votos de um Feliz Ano de<br />
2012, cheio de Saúde e Trabalho, <strong>para</strong> todos os colegas<br />
e familiares, esperando encontrá-los a todos em Viseu,<br />
aquando do 59º Congresso Nacional da <strong>SPORL</strong>-CCF.<br />
Cordiais Saudações<br />
Ezequiel Barros<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 209<br />
EDITORIAL
210<br />
REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Surdez congénita neurossensorial – Proposta <strong>para</strong><br />
algoritmo de investigação<br />
Congenital sensorineural hearing loss – Proposal<br />
for an investigation algorithm<br />
Rui Cerejeira Natércia Silvestre Clara Silva Joana Ribeiro Paulo Gonçalves António Paiva<br />
RESUMO<br />
Introdução: A incidência da surdez neurossensorial (SNS)<br />
congénita moderada a profunda está estimada em 4 por<br />
1000 nascimentos. Classicamente, classifica-se a etiologia da<br />
surdez congénita em hereditária ou adquirida, sendo que até<br />
50% dos casos de surdez moderada a profunda podem ser<br />
de causa genética. Até à presente data não existe ainda um<br />
protocolo diagnóstico de consenso <strong>para</strong> o estudo das crianças<br />
com SNS.<br />
Objectivos: Este trabalho tem por objectivo apresentar uma<br />
proposta de algoritmo de investigação etiológica da SNS<br />
congénita, com base numa revisão da literatura.<br />
Métodos: Para desenvolver um algoritmo de investigação<br />
etiológica da SNS foi realizada uma pesquisa bibliográfica<br />
na PubMed <strong>para</strong> artigos em língua inglesa e francesa, com<br />
as seguintes palavras-chave: “hearing loss/impairment”,<br />
“deafness”, “child”. Foram também consultadas as guidelines<br />
da British Association of Audiovestibular Physicians and<br />
British Association of Paediatricians in Audiology (BAAP/<br />
BAPA) e as recomendações de 2010 da Comisión <strong>para</strong> la<br />
Detección Precoz de la Hipoacusia (Espanha).<br />
Resultados: Crianças com SNS severa a profunda deverão<br />
ser inicialmente submetidas a testes genéticos <strong>para</strong> o gene<br />
GJB2; crianças com SNS ligeira a moderada deverão iniciar a<br />
Rui Cerejeira<br />
Médico(a) Interno(a) de ORL dos Hospitais da Universidade de Coimbra<br />
Natércia Silvestre<br />
Médico(a) Interno(a) de ORL dos Hospitais da Universidade de Coimbra<br />
Clara Silva<br />
Médico(a) Interno(a) de ORL dos Hospitais da Universidade de Coimbra<br />
Joana Ribeiro<br />
Médico(a) Interno(a) de ORL dos Hospitais da Universidade de Coimbra<br />
Paulo Gonçalves<br />
Assistente Hospitalar de ORL dos Hospitais da Universidade de Coimbra<br />
António Paiva<br />
Professor Catedrático de ORL da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra;<br />
Director do Serviço de ORL dos Hospitais da Universidade de Coimbra<br />
Correspondência:<br />
Rui Cerejeira<br />
Serviço de ORL - Hospitais da Universidade de Coimbra<br />
Praceta Mota Pinto<br />
3000 Coimbra - Portugal<br />
r.cerejeira@netcabo.pt<br />
Trabalho Apresentado no “Congresso Anual da APO – Otoneuro 2010”, Carvoeiro 2010<br />
investigação com a realização de uma TC do osso temporal.<br />
A investigação com análises laboratoriais não deverá ser<br />
usada de rotina, mas apenas quando a história clínica o<br />
justifique. A surdez unilateral deverá também ser investigada<br />
imagiologicamente. A realização do ECG está indicada em<br />
todos os casos de SNS bilateral severa a profunda, de forma<br />
a permitir a identificação de casos de intervalo QT longo que,<br />
embora seja um achado raro, é potencialmente fatal.<br />
Conclusões: A utilização de um algoritmo diagnóstico<br />
sequencial é mais eficiente, e com uma relação custo-<br />
-benefício mais favorável, do que o pedido simultâneo de<br />
uma bateria de exames <strong>para</strong> todos os casos.<br />
Palavras-chave: algoritmo; surdez neurossensorial; criança;<br />
guidelines<br />
ABSTRACT<br />
Introduction: The incidence of congenital, moderate to<br />
profound sensorineural hearing loss (SNHL) is estimated in<br />
4 per 1000 births. Traditionally, the etiologies of congenital<br />
SNHL have been broadly classified as either hereditary or<br />
acquired, and it is estimated that up to 50% of moderate<br />
to severe cases are genetic in etiology. To date, there is no<br />
consensus diagnostic protocol for children presenting with<br />
SNHL.<br />
Objectives: This study aims to present a proposal of an<br />
investigation algorithm for SNHL in children, based on a<br />
review of the literature.<br />
Methods: To develop the algorithm, the English and French<br />
literature were searched in PubMed with the following key<br />
words: “hearing loss/impairment”, “deafness”, “child”. The<br />
guidelines of the British Association of Audiovestibular<br />
Physicians and British Association of Paediatricians in<br />
Audiology (BAAP/BAPA) and the recommendations of the<br />
Spanish Committee for Early Detection of Deafness were also<br />
studied.<br />
Results: Children with severe to profound SNHL should first be<br />
tested with a GJB2 screen, as opposed to those with milder<br />
SNHL, who should undergo CT of the temporal bone as the<br />
initial step. Laboratory investigation should not be routine but<br />
based on clinical history. Children with unilateral SNHL should<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 211<br />
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
e investigated with imaging. The use of ECG is indicated in<br />
severe to profound bilateral SNHL to rule out the presence of<br />
a prolonged QT interval, because, in spite of an extremely low<br />
yield, it can be life-saving.<br />
Conclusions: A stepwise diagnostic <strong>para</strong>digm is more efficient<br />
and more cost-effective than the simultaneous testing<br />
approach.<br />
Key-words: algorithm, sensorineural hearing loss, child,<br />
guidelines<br />
INTRODUÇÃO<br />
A incidência da surdez neurossensorial (SNS) congénita,<br />
moderada a profunda, está estimada em 4 por cada 1000<br />
nascimentos 1 . Classicamente, classifica-se a etiologia<br />
da surdez congénita em hereditária ou adquirida,<br />
sendo que até 50% dos casos de surdez moderada<br />
a profunda podem ser de causa genética 2 . Destes,<br />
a maioria são transmitidos de forma autossómica<br />
recessiva (aproximadamente 80%) 3 .<br />
A investigação etiológica realizada precocemente tem<br />
como objectivos principais:<br />
- maximizar as hipóteses de se chegar a um diagnóstico<br />
etiológico;<br />
- dar a oportunidade aos pais de compreender a causa<br />
da surdez do seu filho;<br />
- permitir um melhor aconselhamento relativamente a<br />
futuros filhos;<br />
- permitir um tratamento/aconselhamento atempado<br />
e assim impedir a progressão da perda auditiva (ex.<br />
citomegalovirus, aqueduto vestibular alargado) ou<br />
outras complicações graves (ex. <strong>para</strong>gem cardíaca na<br />
Síndrome Jervell Lange-Nielsen);<br />
- mais fácil identificação de patologia associada (ex.<br />
alterações renais na Síndrome Brânquio-Otorrenal).<br />
A história clínica detalhada, o exame físico e a avaliação<br />
audiológica são os passos mais importantes na<br />
investigação de uma SNS 2 , permitindo o diagnóstico de<br />
doenças sindrómicas e de muitas etiologias infecciosas.<br />
O papel de outros testes (imagiologia, testes genéticos,<br />
hemograma, bioquímica, serologias, etc.) é controverso<br />
devido ao limitado contributo <strong>para</strong> o diagnóstico e aos<br />
custos elevados que acarretam. Os defensores de uma<br />
abordagem sistemática preconizam o pedido de uma<br />
bateria de testes <strong>para</strong> todos os casos, enquanto os<br />
defensores de uma abordagem sequencial consideram<br />
que o pedido sequencial de exames é mais eficiente e<br />
com uma relação custo-benefício mais favorável 5 .<br />
Até à presente data não existe ainda um protocolo<br />
diagnóstico de consenso <strong>para</strong> o estudo das crianças<br />
com SNS 4 . O objectivo deste artigo é apresentar uma<br />
proposta de algoritmo de investigação etiológica da<br />
212 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
SNS congénita, com base numa revisão da literatura.<br />
MÉTODOS<br />
Para desenvolver um algoritmo de investigação<br />
etiológica da SNS foi realizada uma pesquisa<br />
bibliográfica na PubMed <strong>para</strong> artigos em língua inglesa<br />
e francesa com as seguintes palavras-chave: “hearing<br />
loss/impairment”, “deafness”, “child”. Foram também<br />
consultadas as guidelines da British Association of<br />
Audiovestibular Physicians and British Association<br />
of Paediatricians in Audiology (BAAP/BAPA) 6 e as<br />
recomendações de 2010 da Comisión <strong>para</strong> la Detección<br />
Precoz de la Hipoacusia (Espanha) 7 . Foram identificados<br />
ainda artigos adicionais, a partir da revisão das listas de<br />
referências bibliográficas.<br />
RESULTADOS<br />
Os factores etiológicos da SNS em crianças têm sofrido<br />
variações ao longo do tempo, devido ao impacto do<br />
declínio das infecções pré e perinatais e à disseminação<br />
dos testes genéticos. Um estudo recente 8 estabeleceu as<br />
principais causas de SNS bilateral como se apresentam<br />
na Tabela 1.<br />
TABELA 1<br />
Causas de Surdez Neurossensorial bilateral em crianças 8<br />
Desconhecida (37,7%)<br />
Genética não sindrómica (29,2%)<br />
Prénatal (12%)<br />
Perinatal (9,6%)<br />
Pósnatal (8,2%)<br />
Genética sindrómica (3,2%)<br />
Etiologia Genética não Sindrómica<br />
É um tipo de surdez altamente heterogéneo, tendo sido<br />
já localizados dezenas de genes recessivos, dominantes<br />
e ligados ao X 8 .<br />
A grande maioria das mutações não sindrómicas<br />
recessivas originam uma surdez congénita profunda<br />
bilateral. A mutação mais comum localiza-se ao gene<br />
β2 (GJβ2) do cromossoma 13 que codifica uma proteína<br />
denominada conexina 26 (Cx26). Esta proteína forma<br />
gap junctions entre as células e pensa-se que tenha um<br />
papel na recirculação dos iões na endolinfa coclear 9 . As<br />
mutações neste gene são responsáveis por cerca de 50%<br />
das surdezes genéticas não sindrómicas recessivas, ou<br />
seja, causam 30 a 50% de todas as surdezes genéticas<br />
não sindrómicas 5 .<br />
Dada a baixa probabilidade de detectar anomalias<br />
concomitantes em crianças com mutação do gene<br />
GJβ2, e considerando os custos de um exame
imagiológico do osso temporal, não está indicada uma<br />
avaliação radiológica subsequente nestes casos 4 . O<br />
mesmo é válido <strong>para</strong> as crianças que realizaram em<br />
primeiro lugar um exame imagiológico e em que foram<br />
detectadas alterações – não necessitam de realizar o<br />
teste genético.<br />
Não existe evidência científica de que a mutação do<br />
gene da conexina 26 seja responsável por surdezes<br />
unilaterais, pelo que o teste genético não está indicado<br />
nestes casos 6 .<br />
Imagiologia<br />
Num estudo retrospectivo, 33 pacientes de um total de<br />
76 (37%) com SNS bilateral apresentavam alterações<br />
na TC 10 . O alargamento do aqueduto vestibular<br />
(AAV) foi a alteração isolada mais vezes detectada,<br />
seguido pela displasia do canal semicircular lateral,<br />
lucência da cápsula ótica, canais auditivos internos de<br />
pequeno diâmetro e cóclea hipoplásica. Pelo menos<br />
40% dos indivíduos com AAV irão desenvolver SNS<br />
profunda 11 . A presença de AAV pode também ser<br />
indicativa de malformações adicionais e está associada<br />
com a síndrome de Gusher, com a displasia do canal<br />
semicircular lateral e com a deformidade de Mondini 12 .<br />
O AAV isolado ou associado a uma malformação de<br />
Mondini “verdadeira” (descrição que associa uma<br />
dilatação do aqueduto do vestíbulo a uma cóclea<br />
incompletamente enrolada) orienta também <strong>para</strong><br />
o estudo genético complementar de mutações do<br />
gene da pendrina (PDS), responsáveis pela Síndrome<br />
de Pendred (SNS associada a bócio e alterações da<br />
hormonogénese tiroideia) 13 .<br />
Assim, perante uma surdez de percepção bilateral ou<br />
unilateral na criança, a TC é o exame gold standard<br />
(podendo ser ou não complementada pela RM) devido<br />
à elevada disponibilidade deste exame e à facilidade da<br />
sua realização na criança 4,7,13 .<br />
A British Association of Audiovestibular Physicians<br />
and British Association of Paediatricians in Audiology<br />
(BAAP/BAPA) preconiza como exame de primeira linha<br />
na surdez unilateral a RM 6 . Este exame permite um<br />
estudo mais minucioso do ouvido interno e do nervo<br />
coclear, com cortes de 0,3 a 0,7 mm de espessura.<br />
Torna possível identificar na cóclea a rampa timpânica<br />
e a rampa vestibular, detectar as obliterações focais<br />
do lúmen labiríntico (nas labirintites), estudar os<br />
nervos no meato acústico interno e na cisterna pontocerebelosa.<br />
No entanto, os tumores do ângulo pontocerebeloso<br />
são extremamente raros na infância 13 . O<br />
estudo do parênquima cerebral permite eliminar um<br />
possível atingimento central (por doença metabólica,<br />
lesão isquémica neonatal, etc.) e o sinal da base do<br />
crânio pode por vezes orientar <strong>para</strong> um atingimento<br />
ósseo displásico ou tumoral.<br />
Estudos Laboratoriais<br />
Alguns autores advogam o pedido de hemograma<br />
completo <strong>para</strong> detecção de casos de leucemia ou<br />
linfoma 14 . Também a hiperlipidémia foi implicada como<br />
possível factor etiológico da SNS 15 . No entanto, existem<br />
outros estudos que refutam estas associações 4,16 . De<br />
uma forma geral podemos dizer que é extremamente<br />
improvável que a surdez seja a forma de apresentação<br />
destas doenças, pelo que o pedido destes exames face<br />
a uma SNS isolada não parece ser justificado 4 .<br />
Em relação aos testes de função tiroideia, estes<br />
poderiam ser usados <strong>para</strong> identificar casos de<br />
Síndrome de Pendred. No entanto, aproximadamente<br />
56% destes doentes são eutiroideus e a existência de<br />
bócio também não é constante 17 . O teste gold standard<br />
<strong>para</strong> o diagnóstico de Síndrome de Pendred é o teste<br />
genético, mas o seu uso como método de rastreio tem<br />
uma relação custo benefício impraticável 4,5 .<br />
Uma sumária de urina de rotina acarreta uma baixo<br />
custo e é simples de realizar, mas não existe na literatura<br />
dados que suportem o seu uso no diagnóstico da<br />
Síndrome de Alport 5 . No entanto, a BAAP recomenda o<br />
pedido da micro-hematúria nos casos de surdez severa<br />
a profunda 6 .<br />
Também os estudos serológicos são alvo de alguma<br />
discussão. Um estudo demonstrou que o rastreio<br />
neonatal universal detecta menos de metade dos<br />
casos de surdez secundários a infecção congénita<br />
por citomegalovirus (CMV) 18 , dado que numa grande<br />
proporção destas crianças a surdez é progresssiva. O<br />
teste serológico tem de ser realizado em sangue do<br />
recém-nascido até às 3 semanas de vida, uma vez que<br />
a infecção adquirida não está associada a um mau<br />
prognóstico. A BAAP recomenda o screening urinário<br />
da infecção por CMV <strong>para</strong> todas as crianças com SNS<br />
bilateral e posterior confirmação em sangue do teste<br />
do pezinho 6 .<br />
Electrocardiograma (ECG)<br />
A Síndrome de Jervell e Lange-Nielsen (JLN) ou<br />
Síndrome do Intervalo Q-T longo Hereditário é uma<br />
doença rara com uma incidência estimada de 1 a 6 casos<br />
por milhão 5 . Resulta de mutações que alteram o canal<br />
de potássio que controla a repolarização miocelular 20 .<br />
Numa revisão de casos de Síndrome JLN a frequência<br />
de crianças com surdez foi de 0,3% 19 . Apesar da muito<br />
baixa probabilidade de identificar um destes casos com<br />
o ECG, o baixo custo do exame, associado ao facto de<br />
que pode salvar a vida do doente, parece justificar o<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 213<br />
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
seu pedido sistemático nas surdezes neurossensoriais<br />
bilaterais severas a profundas 4,5,7,20 .<br />
Algoritmo Diagnóstico (Figura 1)<br />
Crianças com SNS severa a profunda deverão ser<br />
inicialmente submetidas a testes genéticos <strong>para</strong> o<br />
gene GJB2; crianças com SNS ligeira a moderada<br />
deverão iniciar a investigação com a realização<br />
de uma TC do osso temporal. A investigação com<br />
análises laboratoriais não deverá ser usada de rotina,<br />
mas apenas quando a história clínica o justifique.<br />
A surdez unilateral deverá também ser investigada<br />
imagiologicamente. A realização do ECG está indicada<br />
FIGURA 1<br />
Algoritmo de Investigação da Surdez Neurossensorial Congénita<br />
214 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
em todos os casos de SNS bilateral severa a profunda,<br />
de causa desconhecida.<br />
CONCLUSÕES<br />
Podemos concluir que, embora não exista uma posição<br />
de consenso sobre a melhor forma de investigar as<br />
crianças com SNS, uma abordagem sequencial parece<br />
ser mais eficiente e com uma relação custo-benefício<br />
mais vantajosa do que o pedido simultâneo de uma<br />
bateria de exames <strong>para</strong> todos os casos.<br />
Este estudo providencia um algoritmo sequencial de<br />
investigação, <strong>para</strong> ser usado por otorrinolaringologistas<br />
gerais e pediátricos.
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VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 215<br />
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
Papel da TC nas decisões terapêuticas nos<br />
carcinomas da laringe/hipofaringe<br />
Role of CT in treatment decisions in laryngeal/<br />
hypopharyngeal carcinomas<br />
Andreia Ribeiro Gustavo Lopes Marta Pereira Sara Cruz Abílio Leonardo Manuel Rodrigues e Rodrigues<br />
RESUMO<br />
Objectivos: A presença de adenopatias pode ser avaliada<br />
clinicamente e imagiologicamente. O objectivo é avaliar se a<br />
Tomografia Computorizada (TC) nos dá informação adicional<br />
que possa influenciar as decisões terapêuticas.<br />
Material e Métodos: Revisão retrospectiva dos processos de<br />
doentes submetidos a cirurgia laríngea com esvaziamento<br />
cervical por neoplasia maligna entre Maio de 2001 e Dezembro<br />
de 2010.<br />
Resultados: Dos 31 doentes N0 clínicos e imagiológicos, em<br />
26 confirmou-se o estadiamento N0 pela anatomopatologia<br />
(83,9%) e 5 casos apresentaram gânglios metastizados<br />
(16,1%). Em 3 doentes N0 clínicos e N>0 imagiológicos em 2<br />
(66,7%) confirmou-se por anatomia patológica a presença de<br />
adenopatias.<br />
Dos 6 doentes clínicamente N>0, a TC estadiou como N>0 5<br />
doentes que se confirmaram serem N>0 por anatomopatologia<br />
(100%). A TC apresentou sensibilidade, valor preditivo positivo<br />
e valor preditivo negativo superiores à clínica.<br />
Conclusão: A TC aparentemente melhora os valores preditivos<br />
na detecção de metástases cervicais, mas a percentagem não<br />
desprezável de metástases cervicais ocultas impõe a dissecção<br />
cervical nos pescoços N0.<br />
Andreia Ribeiro<br />
Interna Complementar do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Pedro Hispano-E.P.E.<br />
Gustavo Lopes<br />
Assistente Hospitalar de Otorrinolaringologia do Hospital Pedro Hispano-E.P.E.<br />
Marta Pereira<br />
Serviço de Higiene e Epidemiologia, Faculdade de Medicina, Universidade do Porto<br />
Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto<br />
Sara Cruz<br />
Interna Complementar do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Pedro Hispano-E.P.E.<br />
Abílio Leonardo<br />
Assistente Hospitalar Graduado do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Pedro<br />
Hispano-E.P.E.<br />
Manuel Rodrigues e Rodrigues<br />
Director de Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Pedro Hispano-E.P.E.<br />
Correspondência:<br />
Andreia Ribeiro<br />
Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Pedro Hispano-E.P.E.<br />
Rua Dr. Eduardo Torres, 4464-513 Senhora da Hora<br />
Telefone: 229391000<br />
andreiamfribeiro@gmail.com<br />
Palavras-chave: Carcinoma da Laringe; Dissecção cervical;<br />
Tomografia computorizada; Estadiamento<br />
ABSTRACT<br />
Objectives: The presence of adenopathies can be evaluated<br />
clinically by tomographic imaging. The aim is to assess if<br />
computed tomography (CT) provides additional information<br />
that may influence therapeutic decisions.<br />
Methods: Retrospective review of medical records of patients<br />
undergoing surgery of the larynx and neck dissection for<br />
cancer between May 2001 and December 2010.<br />
Results: Of the 31 patients clinically and radiographically<br />
staged as N0, 26 were confirmed by pathology (83.9%) and<br />
5 cases had metastatic lymph nodes (16.1%). Of the three<br />
patients clinically staged as N0 and staged by imaging as N> 0<br />
in 2 was confirmed the presence of adenopathies by pathology<br />
(66,7%).<br />
Of the 6 patients clinically N> 0, CT staged as N> 0 5 patients<br />
who were confirmed to be N> 0 by pathology (100%). In this<br />
study CT showed sensitivity, positive predictive value and<br />
negative predictive value superior to the clinic.<br />
Conclusion: CT appears to enhance the predictive value in<br />
detecting cervical metastases, but the percentage of occult<br />
neck metastases currently imposes a neck dissection in N0<br />
necks.<br />
Key-words: Laryngeal carcinoma; Neck dissection; Computed<br />
tomography; Staging<br />
INTRODUÇÃO<br />
A incidência de neoplasias malignas da laringe varia<br />
entre 2,5 a 17,2 por 100000 pessoas-ano 1 . Representa<br />
aproximadamente 3% dos novos casos de neoplasias<br />
diagnosticados em todo o mundo 1 e aproximadamente<br />
¼ das neoplasias da cabeça e pescoço 2 . Os carcinomas<br />
da hipofaringe são aproximadamente 4 vezes menos<br />
comuns que os da laringe 2 .<br />
A grande maioria dos casos de neoplasias malignas<br />
da laringe e hipofaringe são carcinomas de células<br />
escamosas 1,2 sendo os linfomas o segundo diagnóstico<br />
mais comum 1 .<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 217<br />
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
Os principais factores de risco <strong>para</strong> as neoplasias<br />
malignas da laringe e hipofaringe são o consumo de<br />
tabaco e álcool.<br />
Os doentes com suspeita de neoplasia da laringe devem<br />
ser submetidos a exame físico completo da cabeça<br />
e pescoço de preferência com endoscopia o que vai<br />
permitir que o tumor seja directamente visualizado 1 .<br />
A avaliação clínica e endoscópica destes doentes tem<br />
limitações na avaliação da extensão da doença 3 .<br />
Os exames de imagem permitem a avaliação da<br />
extensão tumoral e da invasão ganglionar e metástases<br />
à distância 1 . A presença ou ausência de metástases<br />
ganglionares no momento do diagnóstico é importante<br />
no prognóstico e na orientação destes doentes 4 .<br />
Sistema de Estadiamento<br />
O sistema de estadiamento TNM permite classificar os<br />
tumores da região da cabeça e pescoço de uma forma<br />
uniforme, e é usado <strong>para</strong> determinar o prognóstico e<br />
auxiliar na decisão terapêutica.<br />
Três categorias integram o sistema: T - as características<br />
do tumor (pode ser com base na localização, tamanho<br />
ou ambos); N- o grau de envolvimento dos gânglios<br />
linfáticos regionais, e M - ausência ou presença de<br />
metástases à distância. Podemos ainda dividir em<br />
Estadios I, II, III e IV. Em geral, a doença em estadio inicial<br />
é classificada como estadio I ou II, e doença em estadio<br />
avançado como III ou IV. Qualquer doença com gânglios<br />
positivos vai ser classificada como doença avançada 5 .<br />
De seguida apresenta-se a classificação do estadiamento<br />
ganglionar segundo a American Academy of<br />
Otolaryngology– Head and Neck Surgery Foundation.<br />
NX - Os gânglios regionais não podem ser avaliados.<br />
N0 - Não há metástases regionais<br />
N1 - Metástase num único gânglio homolateral, com 3<br />
cm ou menos na sua maior dimensão.<br />
N2 - Metástase em um único gânglio homolateral, com<br />
mais de 3 cm, mas não mais de 6 cm em sua maior<br />
dimensão, ou metástases em gânglios homolaterais<br />
múltiplos, nenhum deles com mais que 6 cm na sua<br />
maior dimensão, ou metástases em gânglios bilaterais<br />
ou contralaterais mas nenhum maior que 6 cm em sua<br />
maior dimensão.<br />
N2a – Metástase em um único gânglio homolateral,<br />
com mais de 3 cm, mas não mais de 6 cm na sua maior<br />
dimensão.<br />
N2b – Metástases em gânglios homolaterais múltiplos,<br />
nenhum deles com mais que 6 cm na sua maior<br />
dimensão.<br />
N2c - Metástases em gânglios bilaterais ou contralaterais,<br />
nenhum deles mais de 6 cm na sua maior dimensão.<br />
N3 - Metástase em gânglio com mais de 6 cm na sua<br />
218 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
maior dimensão.<br />
O exame físico vs exames de imagem<br />
Desde 1976 que a Tomografia Computorizada (TC) é<br />
usada como uma técnica fiável <strong>para</strong> a avaliação dos<br />
tumores da cabeça e pescoço 3 .<br />
A extensão mucosa do tumor e a mobilidade laríngea<br />
podem ser avaliadas directa ou indirectamente pela<br />
avaliação clínica e endoscópica. No entanto, o exame<br />
físico com endoscopia tem limitações na avaliação da<br />
extensão da doença 3 : A extensão à região subglótica<br />
e a comissura anterior podem não ser visíveis em<br />
tumores mais volumosos; A extensão submucosa<br />
é subestimada 1,2 bem como <strong>para</strong> os espaços pré-<br />
-epiglótico, espaço <strong>para</strong>glótico; a extensão à cartilagem<br />
tiroideia e estruturas extralaríngeas que não podem ser<br />
avaliadas por endoscopia 3 .<br />
Neste caso os exames de imagem são complementares<br />
dado que permitem uma avaliação da extensão<br />
submucosa e da invasão das estruturas adjacentes 1,2 .<br />
No entanto a TC tem algumas limitações 3 especialmente<br />
na avaliação da invasão cartilagínea 3 devido à<br />
variabilidade de cartilagens calcificadas, ossificadas<br />
ou não calcificadas 3 . Há autores que defendem que os<br />
exames de imagem falham na avaliação da extensão<br />
mucosa superficial e podem superestimar a extensão<br />
profunda do tumor 4 .<br />
Os exames de imagem também nos dão informações<br />
acerca da invasão ganglionar e metástases à distância 1 .<br />
A presença ou ausência de metástases ganglionares<br />
no momento do diagnóstico é importante no<br />
prognóstico destes doentes 4 . A detecção por imagem<br />
de linfadenopatias no pescoço clinicamente negativo,<br />
ou de metástases à distância tem impacto na orientação<br />
destes doentes. Pensa-se que a sensibilidade da TC<br />
e RMN na detecção de metástases ganglionares é<br />
superior ao exame físico 4 . No entanto, pensa-se que o<br />
valor preditivo negativo dos exames de imagem não é<br />
suficiente <strong>para</strong> evitar a dissecção cervical 4 .<br />
Escolha da opção terapêutica<br />
Um factor importante na orientação e tratamento<br />
nestes doentes é o estadiamento pré-operatório 2,3 .<br />
O tratamento das neoplasias da laringe é muito variável<br />
de centro <strong>para</strong> centro. A opções terapêuticas incluem<br />
cirurgia, radioterapia e quimioterapia (sozinhas ou em<br />
combinação) 1 . As decisões terapêuticas vão depender<br />
da extensão da doença, do estado geral do doente e<br />
têm como objectivo melhorar a sobrevida do doente,<br />
tendo sempre em conta o benefício funcional 1 .<br />
Para os tumores em estadios mais iniciais a radioterapia<br />
ou a excisão endoscópica transoral são as opções de
tratamento 5 . Ambos apresentam bom controlo da<br />
doença mas os defensores de cada modalidade muitas<br />
vezes discordam sobre as sequelas funcionais dos dois<br />
tipos de tratamento 5 . Contudo, existem poucos estudos<br />
que avaliem os dois tratamentos a longo prazo em<br />
termos funcionais 5 .<br />
O tratamento dos tumores mais avançados pode ser<br />
ainda mais controverso. A laringectomia total com<br />
esvaziamento cervical foi tida como o tratamento<br />
de escolha das neoplasias da laringe T3 e T4,<br />
nomeadamente devido à invasão da cartilagem laríngea<br />
que reduziria a taxa de sucesso da radioterapia e excluiria<br />
cirurgias menos invasivas tornando a laringectomia<br />
total mandatória na maior parte dos casos 3 . No entanto<br />
a quimiorradioterapia tem-se mostrado, em alguns<br />
estudos, bastante eficaz no controlo loco-regional e<br />
sobrevivência com preservação do órgão 1,5 .<br />
Até 1950 nos doentes com carcinoma epidermóide<br />
da laringe submetidos a laringectomia total, o<br />
esvaziamento radical convencional foi o tratamento<br />
preferencial de escolha 6 .<br />
O esvaziamento cervical funcional, desenvolvido<br />
em 1952, tornou-se cada vez mais aceite durante os<br />
anos 1960 e 1970 e tornou-se o procedimento de<br />
escolha <strong>para</strong> tratamento cirúrgico das neoplasias da<br />
laringe 6 . O esvaziamento funcional remove os gânglios<br />
cervicais dos níveis I a V, preservando o músculo<br />
esternocleidomastóideu, veia jugular interna, nervo<br />
acessório espinhal, e glândula submandibular 6 . Vários<br />
estudos clínicos e patológicos têm apoiado a conclusão<br />
que o esvaziamento selectivo dos níveis II, III e IV é um<br />
procedimento eficaz no tratamento das neoplasias da<br />
laringe, e o esvaziamento funcional das áreas I a V é um<br />
procedimento desnecessariamente extenso <strong>para</strong> esse<br />
fim 6 .<br />
Há evidências na literatura científica que o esvaziamento<br />
selectivo, limitando a ressecção a áreas com maior<br />
probabilidade de estarem envolvidas, pode alcançar<br />
os mesmos resultados oncológicos que dissecções<br />
mais extensas. Nas ressecções mais limitadas pode-se<br />
reduzir a morbilidade operatória. Isto levanta a questão<br />
de saber se outras limitações da dissecção podem ser<br />
oncologicamente benéficas 6 .<br />
Objectivo<br />
O objectivo principal deste trabalho é avaliar se a TC nos<br />
dá informação adicional no estadiamento ganglionar<br />
dos tumores N0 com<strong>para</strong>ndo com a avaliação clínica por<br />
palpação cervical, de forma a poder evitar dissecções<br />
cervicais desnecessárias.<br />
MATERIAL E MÉTODOS<br />
Foram seleccionados os doentes submetidos a cirurgia<br />
da laringe/faringolaringe com esvaziamento cervical<br />
por neoplasia no Hospital Pedro Hispano durante o<br />
período compreendido entre Maio de 2001 e Dezembro<br />
de 2010 constituindo um total de 84 doentes.<br />
33 doentes foram eliminados do estudo por não<br />
apresentarem relatório da TC pré-operatória no<br />
processo clínico, 7 doentes foram eliminados por<br />
terem realizado RT e/ou QT pré-operatória, 1 doente<br />
foi excluído por ausência de registos de 1ª observação<br />
clínica, 3 doentes por impossibilidade de aceder ao<br />
processo clínico. Foram então analisados os processos<br />
de 40 doentes e aplicado um protocolo no qual os<br />
doentes foram estadiados conforme a classificação<br />
TNM da American Academy of Otolaryngology– Head<br />
and Neck Surgery Foundation em TNM clínico a partir<br />
da 1ª observação do doente em que foi diagnosticada<br />
neoformação da laringe/hipofaringe, TNM imagiológico<br />
a partir do relatório da TC pré-operatória e TNM<br />
patológico a partir do relatório da anatomia patológica<br />
da peça operatória. Foram também colhidos dados<br />
acerca da localização do tipo histológico e cirurgia a<br />
que foram submetidos. O estadiamento pela anatomia<br />
patológica é tido como a confirmação de que a doença<br />
está realmente presente.<br />
Utilizou-se o coeficiente Kappa simples <strong>para</strong> medir o<br />
nível de concordância entre os vários exames, corrigindo<br />
a concordância esperada por acaso. O coeficiente<br />
Kappa pode variar de 1 a -1, indicando concordância<br />
ou discordância completa, respectivamente. A<br />
especificidade, a sensibilidade, o valor preditivo positivo<br />
e negativo foram calculados assumindo o resultado da<br />
anatomia patológica como gold-standard.<br />
RESULTADOS<br />
Dos 40 doentes, 39 são homens (97,5%) e 1 é mulher<br />
(2,5%). As idades estão compreendidas entre os 43 e<br />
os 84 anos, sendo a média de idades 62,17 anos. 35<br />
doentes foram submetidos a laringectomia total com<br />
esvaziamento cervical bilateral (87,5%), 4 doentes<br />
foram submetidos a faringolaringectomia total com<br />
esvaziamento cervical bilateral (10,0%) e 1 doente foi<br />
submetido apenas a esvaziamento cervical bilateral<br />
por impossibilidade de ressecção do tumor por invasão<br />
extralaríngea (2,5%). O tipo histológico foi carcinoma<br />
espinocelular em 39 doentes (97,5%) e carcinoma<br />
basalóide escamoso em 1 doente (2,5%).<br />
Dos 40 doentes estudados 34 foram clinicamente<br />
classificados como N0 (85,0%), 5 doentes foram classificados<br />
como N1 (12,5%) e 1 doente foi classificado como N2b<br />
(2,5%), num total de 6 doentes com N>0 (15,0%).<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 219<br />
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
Tabela 1<br />
Estadiamento ganglionar pela clínica (total de 40 doentes)<br />
N0 clínico N1 clínico N2 clínico N3 clínico<br />
N2a N2b<br />
34 (85%) 5 (12,5%) 0 1 (2,5%) 0<br />
Dos 34 doentes que foram classificados como N0 pela<br />
avaliação clínica foram estadiados imagiologicamente<br />
(pela TC) como N0 31 doentes (91,2%). Destes, em 26<br />
confirmou-se o estádio N0 pela anatomia patológica<br />
(83,9%) e em 5 casos apresentavam gânglios positivos<br />
com N>0 (16,1%).<br />
Tabela 2<br />
Doentes com estadiamento N0 clínico (total de 34 doentes)<br />
N0 imagiológico N>0 imagiológico<br />
N0<br />
patológico<br />
N>0<br />
patológico<br />
N0<br />
patológico<br />
N>0<br />
patológico<br />
26 (83,9%) 5 (16,1%) 1 (33,2%) 2 (66,7%)<br />
31 3<br />
Dos 34 doentes N0 clínicos, em 3 doentes (8,8%) o TC<br />
sugeriu a presença de adenopatias positivas. Destes, 2<br />
confirmaram-se por anatomia patológica (66,7%) e 1<br />
não se confirmou na anatomia patológica (33,3%).<br />
Dos 6 doentes com avaliação clínica N>0, a TC estadiou<br />
como N>0 um total de 5 doentes (83,3%) dos quais todos<br />
se confirmaram serem N>0 por anatomia patológica.<br />
Apenas 1 (16,7%) doente foi estadiado como N0 pela<br />
imagiologia o que se confirmou por anatomia patológica.<br />
Tabela 3<br />
Doentes com estadiamento N>0 clínico (total de 6 doentes)<br />
N0 imagiológicos N>0 imagiológicos<br />
N0<br />
patológico<br />
N>0<br />
patológico<br />
N0<br />
patológico<br />
N>0<br />
patológico<br />
1 0 0 5<br />
1 5<br />
O coeficiente de kappa é de 0,5927 entre o estadiamento<br />
clínico e imagiológico, 0,3413 <strong>para</strong> o estadiamento<br />
imagiológico e patológico e 0,1837 <strong>para</strong> o estadiamento<br />
clínico e patológico.<br />
Para a presença de adenopatias a TC apresenta neste<br />
estudo uma sensibilidade de 58,3% e uma especificidade<br />
de 96,43%. Quanto ao valor preditivo positivo é de<br />
87,5% e o valor preditivo negativo de 84,37%.<br />
A clínica apresenta, <strong>para</strong> a presença de adenopatias,<br />
uma sensibilidade de 41,7% e uma especificidade de<br />
96,4%. O valor preditivo positivo é de 83,3% e o valor<br />
preditivo negativo de 79,4%.<br />
220 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
DISCUSSÃO<br />
O papel e o tipo de esvaziamento cervical nos<br />
carcinomas clinicamente N0 pode ser controverso. O<br />
procedimento inicialmente utilizado no esvaziamento<br />
cervical destes doentes era a dissecção cervical dos<br />
níveis I a V, que apresentava considerável morbilidade<br />
associada à lesão dos nervos espinhais, plexo cervical e<br />
lesão do canal torácico. A dissecção foi posteriormente<br />
limitadas aos níveis II, III e IV (‘’’esvaziamento cervical<br />
selectivo II-IV, de acordo com o Committee for Head and<br />
Neck Surgery and Oncology of the American Academy<br />
of Otolaryngology—Head and Neck Surgery, dada a<br />
raridade do envolvimento dos níveis I e V 7 .<br />
Mais recentemente, alguns autores contestaram a<br />
dissecação níveis IIb e IV, nos tumores N0, de forma<br />
a reduzir a morbilidade associada 7 . Outros autores<br />
consideram que a presença de metástases ocultas não<br />
é desprezível e que a dissecção cervical é a atitude<br />
correcta de forma a evitar a recorrência cervical 7 .<br />
O objectivo deste estudo foi com<strong>para</strong>r os resultados<br />
no estadiamento clínico, imagiológico e patológico das<br />
adenopatias cervicais de forma a avaliar a importância<br />
da TC no estadiamento ganglionar destes doentes.<br />
Estudos sugerem que apesar da clínica e da imagiologia,<br />
em cerca de 7-10% dos casos existem metástases<br />
ganglionares ocultas 8 . Neste estudo foi encontrado<br />
um valor de 16,1% de doentes clinicamente e<br />
imagiologicamente N0 mas com mestástases cervicais<br />
comprovadas pela anatomia patológica. A dissecção<br />
cervical nos doentes com mestástases ganglionares<br />
ocultas é importante dado que a doença quando se<br />
manifestar clinicamente o tratamento irá ser aplicado<br />
mais tardiamente e, apesar do acompanhamento<br />
regular destes doentes, a doença cervical pode ser<br />
inoperável na altura do diagnóstico e aumentar o risco<br />
de metástases à distância 8 . No entanto devemos ter em<br />
conta que a dissecção cervical aumenta a morbilidade,<br />
aumenta os custos médicos e o tempo de internamento 8 .<br />
Como já referido, estudos existentes sugerem que a<br />
sensibilidade da TC e RM na detecção de metástases<br />
ganglionares é superior ao exame físico, no entanto o<br />
valor preditivo negativo dos exames de imagem não<br />
é suficiente <strong>para</strong> evitar a dissecção cervical. Para a<br />
presença de adenopatias a TC apresenta neste estudo<br />
uma sensibilidade, valor preditivo positivo e valor<br />
preditivo negativo superiores. No entanto o pequeno<br />
número de casos dificultam a interpretação destes dados.<br />
É também de ter em conta que a análise anatomopatológica<br />
pode falhar no diagnóstico metástases<br />
menores que 2 ou até 5 milímetros 7 . Como tal, as<br />
micrometástases ganglionares podem ser sistematicamente<br />
subestimadas 7 .
Neste trabalho de<strong>para</strong>mo-nos com alguns problemas:<br />
- reduzido número de doentes por ausência de TC<br />
- tratarem-se, na maioria, de tumores localmente pouco<br />
avançados dado alguns tumores mais avançados serem<br />
encaminhados <strong>para</strong> outras instituições ou fazerem RT/<br />
QT prévia o que nos leva a uma redução substancial do<br />
número de casos<br />
Os valores de coeficiente de kappa são baixos/<br />
moderados o que aponta <strong>para</strong> uma baixa concordância<br />
tendo em conta aquela que é esperada pelo acaso.<br />
CONCLUSÃO<br />
Apesar da TC aparentemente melhorar os valores<br />
preditivos na detecção de metástases cervicais, a<br />
percentagem não desprezável de metástases cervicais<br />
ocultas impõe actualmente a realização de dissecção<br />
cervical em pescoços N0. A TC cervical tem, de momento,<br />
em papel mais importante no estadiamento e prognóstico<br />
do que na decisão terapêutica. O desenvolvimento das<br />
técnicas diagnósticas deverão identificar com maior<br />
certeza os pescoços verdadeiramente N0 e assim evitar<br />
dissecções cervicais desnecessárias.<br />
Referências Bibliográficas:<br />
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(IIA, III): A Rational Replacement for Complete Functional<br />
Neck Dissection in Patients With N0 Supraglottic and Glottic<br />
Squamous Carcinoma. The Laryngoscope 2008; 118:676-679.<br />
7. Mnejjaa M, Hammamia B, Bougachaa L, Chakrouna A, et<br />
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8. Gallo O, Boddi V, Bottai GV, Parrella F, et al. Treatment of the<br />
Clinically Negative Neck in Laryngeal Cancer Patients. Head &<br />
Neck 1996; 566-572.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 221<br />
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
Construção e validação dos testes fala com ruído<br />
(FR) e dicótico de dígitos (DD) <strong>para</strong> aplicação em<br />
crianças portuguesas<br />
Construction and validation of speech tests with<br />
noise (SN) and dichotic with digits (DD) for<br />
application in portuguese children?<br />
Cristiane L. Nunes L. Desgualdo G. S. Carvalho<br />
RESUMO<br />
A avaliação do Processamento Auditivo (PA) por meio de testes<br />
comportamentais inclui a apresentação de testes monóticos e<br />
dicóticos, com material verbal e não-verbal. Na apresentação de<br />
testes verbais é importante a escolha de uma voz adequada tanto<br />
na qualidade vocal quanto no tom e na inflexão vocal usada na<br />
região. O objetivo deste estudo foi construir e validar dois testes<br />
verbais, Fala com Ruído (FR) e Dicótico de Dígitos (DD), à fonética<br />
portuguesa. Após a análise vocal de 13 sujeitos selecionou-se uma<br />
locutora com padrão vocal mais adequado às exigências do teste.<br />
Usando a voz desta locutora foram construídos os testes FR e DD <strong>para</strong><br />
a fonética portuguesa, que depois de devidamente validados, foram<br />
considerados aptos a serem aplicados em estudos <strong>para</strong> avaliação de<br />
perturbações do processamento auditivo.<br />
Palavras-chave: Voz, Audição, Teste auditivo, Validação.<br />
ABSTRACT<br />
The assessment of auditory processing disorder through behavior<br />
testing includes the use of monotic and dichotic tests with verbal and<br />
non-verbal sounds. In order to present the verbal test, it is important<br />
to select an appropriate voice quality, regarding not only the tone<br />
quality but also the vocal inflection used in the local culture. The aim<br />
of this study is to produce and validate two verbal tests in European<br />
Portuguese: the Speech in Noise Test (SN) and the Dichotic Digit<br />
Test (DD). After the vocal assessment of 13 subjects, a woman that<br />
respected the characteristics of a good voice was selected. Using<br />
this female voice, the SN and DD tests where produced in European<br />
Portuguese. After validation, these tests were shown to be suitable<br />
for application in evaluation studies of auditory processing disorders.<br />
Key-words: Voice, Hearing, Auditory Tests, Validation.<br />
Cristiane L. Nunes<br />
CIEC, Instituto de Educação, Universidade do Minho, Braga, PORTUGAL<br />
L. Desgualdo<br />
Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal de São Paulo, BRASIL<br />
G. S. Carvalho<br />
CIEC, Instituto de Educação, Universidade do Minho, Braga, PORTUGAL<br />
Correspondência:<br />
Cristiane Lima Nunes<br />
Alameda do Lago, 38. Braga.<br />
cris.l.nunes@hotmail.com<br />
Bolsa: FCT- SFRH/BD/43512/2008<br />
INTRODUÇÃO<br />
O processamento auditivo (PA) envolve mecanismos do sistema<br />
auditivo responsáveis pela lateralização e localização do som,<br />
discriminação auditiva, reconhecimento de padrões e aspetos<br />
temporais da audição, incluindo resolução, mascaramento,<br />
integração e ordenação temporal, performance auditiva com<br />
sinais acústicos competitivos e degradados 1 . Apesar destas<br />
dificuldades as crianças com perturbação do processamento<br />
auditivo (PPA) apresentam limiares normais de audição e de<br />
níveis cognitivos 1 .<br />
A informação auditiva “viaja” do sistema auditivo periférico<br />
ao sistema nervoso auditivo central, denominado por alguns<br />
autores de CANS (Central Auditory Nervous System) e que se<br />
estende até o córtex auditivo 2 . Durante o percurso por esta<br />
via auditiva, o estímulo auditivo será processado por forma<br />
a que o indivíduo consiga localizar, discriminar, identificar e<br />
se<strong>para</strong>r o estímulo num ambiente com ruído de fundo e por<br />
fim interpretar este som 2,3 .<br />
Em geral as causas da PPA são desconhecidas, pois há uma<br />
série de fatores já estudados que podem estar relacionados<br />
com a etiologia da PPA. Yalcinkaya e Keith 2 sintetizaram as<br />
três causas mais comuns encontradas nos diversos estudos<br />
científicos pesquisados pelos autores: (i) problemas na<br />
gestação e no nascimento; (ii) otites médias crónicas que<br />
podem constituir um risco <strong>para</strong> a criança, tanto por perdas<br />
auditivas condutivas quanto por problemas associados ao<br />
PPA; (iii) problemas na neuromaturação do sistema auditivo.<br />
A PPA pode estar associada à dificuldades na aprendizagem,<br />
dificuldades de linguagem, afasias do desenvolvimento,<br />
dislexia do desenvolvimento, perturbação da hiperatividade<br />
com défice de atenção, prematuridade, baixo peso ao<br />
nascer, doenças genéticas, trauma craniano, doenças do<br />
sistema nervoso central, exposição a substâncias tóxicas<br />
como o monóxido de carbono e o chumbo, síndrome de<br />
Landau-Kleffner, epilepsia, disfunções metabólicas, doenças<br />
cérebro-vasculares, doença de Lyme, perturbações do<br />
desenvolvimento 2,4 .<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 223<br />
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
A avaliação do PA por testes comportamentais inclui testes<br />
monóticos e dicóticos, sendo recomendada a aplicação<br />
mínima de cinco categorias de testes auditivos: um teste<br />
de interação binaural, um dicótico, um monoaural de baixa<br />
redundância, um temporal e um de discriminação auditiva 3 .<br />
Os testes auditivos podem dividir-se em duas categorias, os<br />
denominados verbais e os não-verbais 5 . Os primeiros, incluem<br />
sempre um material com suporte linguístico que deve ser<br />
apresentado ao indivíduo avaliado na língua em que o mesmo<br />
domina. Assim, a escolha de uma voz adequada <strong>para</strong> a<br />
construção de testes verbais de processamento auditivo é de<br />
primordial importância, devendo ter em consideração alguns<br />
aspetos importantes como por exemplo frequência vocal, a<br />
clareza articulatória e a modulação da voz.<br />
Holube, Fredlake, Vlaming e Kollmeier 6 publicaram um<br />
estudo recente sobre o desenvolvimento e a análise de um<br />
teste <strong>para</strong> analisar a percepção da fala internacionalmente,<br />
o International Speech Test Signal (ISTS). De entre as<br />
características importantes que um teste deve ter <strong>para</strong><br />
analisar a audição com sons da fala, estes autores referem<br />
os parâmetros da frequência e da intensidade como os que<br />
devem ser tidos em consideração na gravação de testes<br />
verbais do PAC 6 .<br />
Os estudos apontam que a voz de representação feminina é a<br />
ideal <strong>para</strong> gravação de testes, pois abrange a maior parte dos<br />
parâmetros referentes ao espectro da fala, já que a frequência<br />
da fala feminina está entre a voz masculina e da criança 6,7 . No<br />
que diz respeito à intensidade do som, a recomendação recai<br />
sobre uma intensidade de 65dB, o que pode ser com<strong>para</strong>do a<br />
uma intensidade média obtida numa situação de conversação<br />
normal com uma distância de 1 metro de seu interlocutor 6 .<br />
De entre os testes existentes <strong>para</strong> avaliação em tarefas<br />
dicóticas e monóticas de baixa redundância optamos no<br />
nosso estudo pela aplicação do teste Fala com Ruído (FR) e<br />
224 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
Dicótico de Dígitos (DD). O teste FR foi descrito por Pereira<br />
e Fukuda 8 e tem como objetivo avaliar a capacidade do<br />
indivíduo de discriminar os sons da fala em situações de<br />
competição sonora com controlo da relação sinal/ruído. Por<br />
sua vez, o teste DD, que foi descrito por Pereira e Schochat 9 ,<br />
tem como objetivo avaliar a capacidade de integrar e se<strong>para</strong>r<br />
as informações ouvidas no ouvido direito e no ouvido<br />
esquerdo em simultâneo. O presente estudo visou adequar<br />
estes dois testes verbais já utilizados no Brasil à fonética da<br />
língua portuguesa em Portugal, <strong>para</strong> ser aplicado em crianças<br />
do nosso país como parte do conjunto mínimo de testes<br />
recomendados 3 .<br />
MATERIAL E MÉTODOS<br />
Seleção do locutor e gravação dos estímulos<br />
Para realização da gravação dos testes foi necessário encontrar<br />
uma voz cuja frequência fundamental (f0) estivesse à volta<br />
de 180Hz, frequência esta facilmente percebida pelo ouvido<br />
humano do adulto e da criança, pois encontra-se na média<br />
da faixa de frequência produzida pela criança (250 Hz), pela<br />
mulher adulta (231Hz) e pelo homem (116 Hz) 7 . Para além<br />
disso, era necessária uma articulação clara e precisa da fala<br />
<strong>para</strong> que fosse respeitada a locução ideal dos estímulos, sem<br />
omissões ou distorções do som.<br />
Para encontrarmos a(o) locutor(a) ideal, treze sujeitos<br />
voluntários, 4 homens e 9 mulheres, foram submetidos a<br />
análise vocal com uso software Vox Metria©, através da<br />
gravação da vogal sustentada /e/ e de algumas palavras do<br />
teste. As gravações foram realizadas nas salas Instituto de<br />
Educação da Universidade do Minho. Após a gravação dos 13<br />
sujeitos, a escolha recaiu sobre uma mulher, nascida numa<br />
família portuguesa e residente em Portugal Continental, que<br />
apresentou f0 média de 189Hz na produção das palavras que<br />
seriam utilizadas como estímulos nos teste (Imagem 1).<br />
Figura 1<br />
Imagem gerada pelo programa Vox Metria® da análise vocal dos estímulos verbais (teste FR) gravados pela locutora selecionada
Após a seleção da locutora, foi realizada a gravação de todos<br />
os sons de fala necessários <strong>para</strong> construção dos testes FR e DD<br />
em português europeu. Para a gravação foi utilizado um PC<br />
PowerMac G5 – 2.3 Ghz duplo; um equipamento de gravação<br />
M-Áudio projecto Mix I/o; um microfone AKG perception 100<br />
respeitando à distância microfone-boca cerca de 2 cm em<br />
posição lateral; um software Pro-Tools M Powered 7 – ano<br />
2008. Os estímulos foram gravados com taxa de padrão da<br />
amostragem de 44100Hz <strong>para</strong> manter a melhor qualidade<br />
possível no momento da reprodução 6 .<br />
Os estímulos selecionados <strong>para</strong> a gravação foram os vinte<br />
e cinco monossílabos a serem utilizados no teste FR e os<br />
vocábulos a serem utilizados no teste DD, nomeadamente os<br />
dígitos dissilábicos 4, 5, 7, 8 e 9.<br />
Para além dos dígitos e monossílabos a serem utilizados nos<br />
testes, foram gravados os seguintes estímulos: a sequência<br />
numérica “número 1, número 2, número 3…” até “…número<br />
25” a ser utilizada no teste FR <strong>para</strong> reforçar a atenção do sujeito<br />
avaliado e <strong>para</strong> o controlo da pesquisadora na identificação<br />
dos estímulos apresentados, bem como a palavra “repita”<br />
a ser utilizada no teste DD antes da apresentação de cada<br />
sequência numérica <strong>para</strong> que a criança reforce a sua atenção<br />
seletiva. A escolha destes vocábulos prévios foi mantida à<br />
semelhança do teste brasileiro <strong>para</strong> que evitássemos variáveis<br />
adicionais não estudadas nestes testes.<br />
Construção do Teste Fala com Ruído (FR) em português<br />
europeu<br />
O teste FR prevê uma tarefa monótica de reconhecimento de<br />
25 monossílabos apresentados a cada ouvido em conjunto<br />
com um ruído branco produzido pelo audiómetro denominado<br />
no equipamento de white noise.<br />
As quatro listas de monossílabos a serem utilizadas no nosso<br />
estudo foram designadas lista FR1, lista FR2, lista FR3 e lista<br />
FR4 (tabela 1). Os 25 monossílabos apresentados em cada lista<br />
repetem-se em ordem diferente. A gravação do estímulo foi<br />
realizada uma única vez de tal forma que quando determinada<br />
palavra é ouvida, todas as suas características se mantêm nas<br />
quatro listas do teste.<br />
A ordenação dos monossílabos nestas quatro listas, seguiu a<br />
mesma do teste original utilizado no Brasil e que serviu de base<br />
<strong>para</strong> o nosso estudo, nomeadamente o teste FR apresentado no<br />
livro “Processamento Auditivo Central: manual de avaliação”<br />
organizado por Pereira e Schochat 8 . Para a apresentação dos<br />
estímulos nas quatro sequências identificadas na tabela 1 foi<br />
utilizado o software Audacity® versão 1.3.9 <strong>para</strong> Windows<br />
Vista em um PC HP Pavilion dv2000.<br />
O intervalo de tempo inter-estímulo, isto é, entre a<br />
apresentação de um monossílabo e seguinte, foi de cerca<br />
de 2 segundos (Figura 1). Este intervalo pressupõe o tempo<br />
requerido <strong>para</strong> a resposta da criança na situação de teste.<br />
Cada monossílabo apresentado nas listas FR1, FR2, FR3 e<br />
FR4 precedia a contagem numérica da sua apresentação que<br />
seguiu do número 1 ao número 25. O teste FR foi finalizado<br />
com a produção de quatro arquivos de som que abrangiam<br />
um total de 25 monossílabos apresentados sequencialmente<br />
de acordo com as listas FR1, FR2, FR3 e FR4 (tabela 1).<br />
Tabela 1<br />
Listas de monossílabos do teste Fala de Ruído (FR).<br />
Item Lista FR1 Lista FR2 Lista FR3 Lista FR4<br />
1. TIL CHÁ DOR JAZ<br />
2. JAZ DOR BOI CÃO<br />
3. ROL MIL TIL CAL<br />
4. PUS TOM ROL BOI<br />
5. FAZ ZUM GIM NÚ<br />
6. GIM MEL CAL FAZ<br />
7. RIR TIL NHÁ GIM<br />
8. BOI GIM CHÁ PUS<br />
9. VAI DIL TOM SEIS<br />
10. MEL NÚ SUL NHA<br />
11. NÚ PUS TEM MIL<br />
12. LHE NHÁ PUS TEM<br />
13. CAL SUL NÚ ZUM<br />
14. MIL JAZ CÃO TIL<br />
15. TEM ROL VAI LHE<br />
16. DIL TEM MEL SUL<br />
17. DOR FAZ RIR CHÁ<br />
18. CHÁ LHE JAZ ROL<br />
19. ZUM BOI ZUM MEL<br />
20. NHÁ CAL MIL DOR<br />
21. CÃO RIR LHE VAI<br />
22. TOM CÃO LER DIL<br />
23. SEIS LER FAZ TOM<br />
24. LER VAI SEIS RIR<br />
25. SUL SEIS DIL LER<br />
Construção do Teste Dicótico de Dígitos (DD) em português<br />
europeu<br />
Para a construção do teste DD português europeu, foram<br />
mantidos os mesmos critérios de apresentação dos<br />
estímulos do teste DD português brasileiro, seja na ordem de<br />
apresentação, no tempo e intervalo entre cada estímulo e na<br />
escolha dos dígitos a serem apresentados em cada ouvido.<br />
Desta forma procedemos inicialmente à elaboração das listas<br />
DD1 e DD2, composta cada uma por 20 itens, como descrito<br />
na Tabela 2.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 225<br />
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
Tabela 2<br />
Listas DD1 e DD2 do teste Dicótico de Dígitos (DD).<br />
Itens Lista DD1 Lista DD2<br />
1. 5 4 8 7<br />
2. 4 8 9 7<br />
3. 5 9 8 4<br />
4. 7 4 5 9<br />
5. 9 8 7 5<br />
6. 5 7 9 5<br />
7. 5_8 9 4<br />
8. 4 5 8 9<br />
9. 4 9 7 8<br />
10. 9 5 4 8<br />
11. 4 7 8 5<br />
12. 8 5 4 7<br />
13. 8 9 7 4<br />
14. 7 9 5 8<br />
15. 9 7 4 5<br />
16. 7 8 5 4<br />
17. 7 5 9 8<br />
18. 8 7 4 9<br />
19. 9 4 5 7<br />
20. 8 4 7 9<br />
O teste DD prevê uma tarefa dicótica de reconhecimento<br />
dos pares de vocábulos apresentados em simultâneo e em<br />
sequência ao ouvido direito e esquerdo. Com base nas listas<br />
DD1 e DD2 construímos dois arquivos de som utilizando o<br />
software Audacity® versão 1.3.9 <strong>para</strong> Windows Vista em um<br />
PC HP Pavilion dv2000.<br />
Para a reprodução das listas foi selecionado o programa<br />
Audacity® em que a saída de som da lista DD1 estivesse<br />
direcionada <strong>para</strong> o ouvido direito (canal 1) e a saída de som da<br />
226 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
lista DD2 estivesse direcionada <strong>para</strong> o ouvido esquerdo (canal<br />
2). Desta forma, o canal 1 e o canal 2 produziriam a lista DD1<br />
e DD2 em simultâneo, cada uma com saída <strong>para</strong> um ouvido,<br />
conforme se pode observar na figura 2. Na produção de cada<br />
conjunto de estímulos da lista DD1 e DD2 foi adicionada a<br />
palavra prévia “repita” <strong>para</strong> apresentação nos dois canais.<br />
O intervalo de tempo inter-estímulo, isto é, entre um estímulo<br />
e outro, esteve ao redor de 9 segundos o que foi mantido à<br />
semelhança do teste DD português brasileiro de referência.<br />
O tempo de intervalo inter-estímulo é o tempo que a criança<br />
supostamente deveria utilizar <strong>para</strong> responder à tarefa e o<br />
examinador apontar a resposta, de tal forma que o examinador<br />
não precisasse de acionar os controlos de interrupção e<br />
continuidade da emissão do som.<br />
Análise acústica dos estímulos gravados<br />
Foi utilizado o software Vox Metria®, comercializado pela<br />
empresa brasileira CTS informática, <strong>para</strong> medição da<br />
intensidade e da frequência vocal dos estímulos gravados em<br />
português europeu e que foram utilizados na nossa pesquisa<br />
<strong>para</strong> aplicação dos testes FR e DD. Do programa Vox Metria®<br />
foi extraída a função “estatísticas” <strong>para</strong> análise da F0 média<br />
dos estímulos gravados no teste FR e no DD, tendo observado<br />
uma frequência fundamental média de 189 Hz <strong>para</strong> as 4 listas<br />
(teste FR) e de 167Hz (teste DD).<br />
Validação dos testes FR e DD<br />
Com vista a verificar o reconhecimento dos vocábulos, os<br />
estímulos dos testes FR e DD foram aplicados a cinco adultos<br />
nascidos em Portugal Continental, com audiograma dentro<br />
da faixa de normalidade e sem evidência de perturbação na<br />
comunicação.<br />
Para análise de reconhecimento dos vocábulos a serem<br />
apresentados no teste FR, cada indivíduo ouviu as listas<br />
FR1, FR2, FR3, FR4 num nível de intensidade de 40dB NS<br />
com referência ao limiar médio de audibilidade <strong>para</strong> tom<br />
Figura 2<br />
Imagem obtida no programa Audacity® com as listas DD1 e DD2 (teste DD) gravadas em dois canais diferentes com suas respetivas<br />
direções <strong>para</strong> saída de som.
puro nas frequências de 500Hz, 1000Hz e 2000Hz. As listas<br />
foram apresentadas via audiómetro (AA-222, Interacoustics)<br />
em cabina insonorizada. A instrução dada era que o<br />
sujeito repetisse os monossílabos ouvidos. Para análise de<br />
reconhecimento dos vocábulos a serem apresentados no teste<br />
DD cada indivíduo ouviu a gravação dos dígitos quatro, cinco,<br />
sete, oito e nove nas mesmas condições técnicas que <strong>para</strong> o<br />
teste FR.<br />
RESULTADOS<br />
A locutora escolhida no nosso trabalho apresentou uma<br />
frequência fundamental (f0) na vogal sustentada entre os 139<br />
e 147 Hz com média e moda de 143 Hz. A média da f0 durante<br />
a locução dos estímulos gravados <strong>para</strong> os testes FR e DD foi<br />
de 178 Hz. Durante a emissão da vogal sustentada obtivemos<br />
uma intensidade de voz gravada média de 53 dB, e na locução<br />
dos estímulos verbais, uma média de 70 dB.<br />
Da análise do reconhecimento dos estímulos do teste FR<br />
pelos cinco adultos portugueses verificou-se uma baixa<br />
quantidade de erros, nomeadamente dois erros na repetição<br />
nos vocábulos “gim” e “jaz” por um mesmo sujeito, um erro<br />
na repetição do vocábulo “zum” por um segundo sujeito,<br />
e ausência de erros nos demais. Assim, de um total de 25<br />
estímulos ouvidos e repetidos por cada um dos cinco adultos,<br />
obtivemos um percentil de 2,4% de erros, o que nos remeteu<br />
a aceitação dos estímulos gravados.<br />
Também no teste DD, os cinco adultos portugueses<br />
reconheceram 100% dos estímulos apresentados, pelo que<br />
aceitámos a gravação dos vocábulos das Listas DD1 e DD2 <strong>para</strong><br />
serem utilizados no teste Dicótico de Dígitos.<br />
Deste estudo, não só a clareza articulatória da locutora foi<br />
evidenciada pelos cinco adultos testados, como também a<br />
intensidade e a frequência da qualidade vocal da gravação<br />
dos testes estão de acordo com estudos anteriores 6,7 que<br />
apresentaram valores próximos dos obtidos na análise<br />
realizada sobre os mesmos testes gravados em português<br />
brasileiro, que serviu de referência <strong>para</strong> o presente estudo.<br />
CONCLUSÕES E IMPLICAÇÕES<br />
Neste estudo construímos dois testes, Fala com Ruído (FR) e<br />
Dicótico de Dígitos (DD), que foram devidamente validados<br />
<strong>para</strong> a fonética portuguesa, podendo por isso ser aplicados<br />
em estudos <strong>para</strong> avaliação de eventuais problemas de<br />
processamento auditivo. Estamos, atualmente, a aplicar estes<br />
dois testes (<strong>para</strong> além dos outros testes recomendados pela<br />
ASHA, 2005) em crianças de 10 a 13 anos da Região Norte de<br />
Portugal, com vista a detetar crianças com perturbações do<br />
processamento auditivo.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
Este estudo desenvolve-se no âmbito do centro de investigação<br />
CIFPEC/CIEC do Instituto de Educação, da Universidade do<br />
Minho e a primeira autora usufrui de uma bolsa da Fundação<br />
<strong>para</strong> Ciência e Tecnologia (FCT- SFRH/BD/43512/2008).<br />
Referências Bibliográficas:<br />
1.ASHA – American Speech-Language Hearing Association. Central<br />
auditory processing: current status of research and implications for<br />
clinical practice, task force on central auditory processing consensus<br />
development. Am J Audiology 1996; 5: 41-54<br />
2.Yalcinkaya F, Keith R. Understand auditory processing disorders.<br />
Turkish Journal of Pediatrics 2008; 50; 101-105<br />
3.American Speech-Language-Hearing Association (ASHA) – Technical<br />
report (Central) Auditory Processing Disorders: Working Group on<br />
Auditory Processing Disorder. 2005. http://www.asha.org/docs/<br />
html/tr2005-00043.html. (Acedido em Novembro 15, 2008).<br />
4.Bellis T. J., Central Auditory Processing in Clinical Practice. www.<br />
audilogyonline.com/articles.<br />
5.Nunes, C. L., Frota S. Audio Training: fundamentação teórica e<br />
prática. 1ª ed. São Paulo, Ed. AM3 Artes, 2005.<br />
6.Holube I, Fredlake S, Vlaming M, Kollmeier B. Development<br />
International Journal of Audiology 2010; 49; 891 – 903.<br />
7.Behlau M, Pontes P. Avaliação e Tratamento das Disfonias. São<br />
Paulo: Ed. Lovise, 1995, pp43- 49.<br />
8.Pereira LD, Fukuda Y. Audiometria verbal: teste de discriminação<br />
vocal com ruído. In: Behlau M (org).Fonoaudiologia Hoje, São Paulo,<br />
Lovise; 1995; pp265-66.<br />
9.Santos M, Pereira L. Escuta com dígitos. In: Pereira LD e Schochat<br />
E (Eds.). Processamento Auditivo Central: manual de avaliação, São<br />
Paulo, Lovise, 1997; pp147-149.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 227<br />
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
228<br />
REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Incisão sublabial versus columelar no acesso<br />
trans-septal <strong>para</strong> cirurgia trans-esfenoidal<br />
microscópica da hipófise. Estudo retrospectivo.<br />
Sublabial versus columellar incision in trans-septal<br />
transsphenoidal approach for microscopic<br />
pituitary surgery. Retrospective study.<br />
Joana Guimarães Joana Santos Daniel Miranda Filipa Carvalho Moreira Nuno Marçal Gabriel Pereira Olinda Marques<br />
Rui Almeida Sérgio Vilarinho Altino Frias Carlos Alegria Rui Pratas<br />
RESUMO<br />
Objectivos: Com<strong>para</strong>r a incisão sublabial com a incisão<br />
columelar no acesso trans-septal <strong>para</strong> cirurgia trans-<br />
-esfenoidal microscópica da hipófise, quanto às complicações<br />
perioperatórias e sequelas observadas.<br />
Desenho do estudo: Estudo retrospectivo.<br />
Material e métodos: Revisão dos registos clínicos de 50<br />
doentes submetidos a cirurgia trans-esfenoidal microscópica<br />
<strong>para</strong> ressecção de adenoma da hipófise, no Hospital de<br />
Braga, entre Julho de 2007 e Novembro de 2010. Foram<br />
colhidos e avaliados dados demográficos, co-morbilidades<br />
Joana Guimarães<br />
Interna de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Joana Santos<br />
Interna de Formação Específica do Serviço de Endocrinologia, Hospital de Braga<br />
Daniel Miranda<br />
Interno de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Filipa Carvalho Moreira<br />
Interna de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Nuno Marçal<br />
Interno de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Gabriel Pereira<br />
Interno de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Olinda Marques<br />
Assistente Graduada do Serviço de Endocrinologia, Hospital de Braga<br />
Rui Almeida<br />
Assistente Graduado do Serviço de Neurocirurgia, Hospital de Braga<br />
Sérgio Vilarinho<br />
Assistente Hospitalar do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Altino Frias<br />
Director do Serviço de Endocrinologia, Hospital de Braga<br />
Carlos Alegria<br />
Director do Serviço de Neurocirurgia, Hospital de Braga<br />
Rui Pratas<br />
Director do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Correspondência:<br />
Joana Guimarães<br />
Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Largo Carlos Amarante<br />
4701-965 Braga<br />
Tlm.: 917969155<br />
joanarguimaraes@gmail.com<br />
pré-operatórias, classificações histológica e imagiológica do<br />
adenoma, duração da cirurgia, duração do internamento e<br />
complicações per(pré)- e pós-operatórias. O seguimento dos<br />
doentes foi entre um e seis meses. Na análise estatística foi<br />
utilizado o programa SPSS® Statistics 17.0.<br />
Resultados: 50 doentes, 32 (64%) do sexo feminino e 18 (36%)<br />
do sexo masculino, com idades compreendidas entre os 16 e<br />
87 anos, média de 50 anos. 40 (80%) casos tratavam-se de<br />
macroadenomas e 10 (20%) de microadenomas. 15/47 (31.9%)<br />
doentes foram submetidos a cirurgia trans-esfenoidal transseptal<br />
através de incisão columelar e 32/47 (68.1%) doentes<br />
através de incisão sublabial. Verificaram-se complicações<br />
oronasais num total de 5/14 (35.7%) doentes no grupo em<br />
que foi utilizada incisão columelar e 14/29 (48.3%) doentes<br />
no grupo em que foi utilizada incisão sublabial (p>0.05).<br />
Verificou-se que doentes com excesso de peso tiveram mais<br />
frequentemente complicações (p
Material and methods: Revision of the clinical records of 50<br />
patients submitted to transsphenoidal microscopic surgery to<br />
resection of pituitary adenoma, in Braga Hospital, between July<br />
2007 and November 2010. Demographic data, pre-operative<br />
co-morbidities, histological and radiological classifications,<br />
operative time, lenght of hospital stay and per(pre)- and<br />
postoperative complications were collected and evaluated.<br />
Patient follow-up was one to six months. SPSS® Statistics 17.0<br />
program was used for statistical analysis.<br />
Results: 50 patients, 32 (64%) female and 18 (36%) male,<br />
ranging from 16 and 87 years old, mean 50 years old. 40 (80%)<br />
presented macroadenoma and 10 (20%) microadenoma.<br />
15/47 (31.9%) patients were submitted to transseptal<br />
transsphenoidal surgery with columellar incision and 32/47<br />
(68.1%) with sublabial incision. Oronasal complications were<br />
observed in 5/14 (35.7%) patients of the columellar group<br />
and 14/29 (48.3%) patients of the sublabial group (p>0.05).<br />
Overweight patients had more complications (p
oronasais. O seguimento dos doentes foi entre um<br />
e seis meses, com avaliação em consulta externa de<br />
Otorrinolaringologia. Na análise estatística dos dados<br />
foi utilizado o programa SPSS® Statistics 17.0.<br />
RESULTADOS<br />
A média de idades da amostra é de 50 anos.<br />
Dos 50 doentes avaliados, 10 (20%) tinham sido<br />
submetidos a mais de uma intervenção hipofisária,<br />
sabendo-se que em cinco pacientes (ou se utiliza a<br />
expressão “doente”, como referido anteriormente<br />
ou a expressão “paciente”) as duas cirurgias foram<br />
realizadas por via trans-esfenoidal com incisão<br />
sublabial. Nos restantes, desconhece-se a técnica<br />
utilizada na primeira cirurgia, pelo facto de ter sido<br />
realizada noutra instituição. Foram avaliados dados<br />
clínicos e endocrinológicos da amostra, representados<br />
na Tabela 1.<br />
TABELA 1<br />
Dados relativos a presença de co-morbilidades pré-operatórias.<br />
Sexo<br />
Co-morbilidade Feminino (n=32)<br />
n (%)<br />
Masculino (n=15)<br />
n (%)<br />
Diabetes 3 (9.4) 3 (20.0)<br />
Hipertensão<br />
arterial<br />
16 (50) 5 (33.3)<br />
Dislipidemia 5 (15.6) 3 (20.0)<br />
Hipopituitarismo<br />
(total ou parcial)<br />
13 (14.6) 11 (68.8)<br />
Excesso de Peso<br />
IMC ≥25 (Kg/m2 )<br />
21 (65.7) 10 (66.6)<br />
Através de imagem de Ressonância Magnética préoperatória<br />
(todos tinham RM pré-operatória?) Convém<br />
referir verificou-se que 40 (80%) dos tumores eram<br />
macroadenomas e os restantes 10 (20%) microadenomas.<br />
Os macroadenomas foram também classificados<br />
imagiologicamente de acordo com o tipo de crescimento,<br />
como se representa na Figura 1. A classificação histológica<br />
dos adenomas, após exame anatomopatológico da peça<br />
operatória está representada na Figura 2.<br />
Todos os doentes foram submetidos a cirurgia da hipófise<br />
por via trans-esfenoidal. O tipo de incisão utilizada,<br />
conhecida em 47 casos, foi a incisão sublabial em 32<br />
casos e a incisão columelar em 15 casos.<br />
3 doentes faleceram, 2 durante o primeiro mês pós-<br />
-operatório, no hospital, por hidrocefalia, sendo que um<br />
dos doentes apresentava já hidrocefalia pré-operatória.<br />
O outro doente veio a falecer cerca de 3 meses pósoperatório,<br />
no ambulatório, de causa indeterminada.<br />
Neste estudo, verificou-se então uma taxa de mortalidade<br />
de 4%. Nestes 3 casos, o acesso a informação foi mais<br />
FIGURA 1<br />
Classificação dos macroadenomas relativamente ao tipo de<br />
crescimento.<br />
FIGURA 2<br />
Classificação histológica dos adenomas.<br />
limitado pelo facto do processo se encontrar arquivado.<br />
Durante a cirurgia, em 6/47 (12.8%) doentes observou-se<br />
saída de líquido cefalorraquidiano (LCR).<br />
A duração da cirurgia teve uma média (desvio padrão) de<br />
210 (33) minutos no grupo da incisão sublabial e de 228<br />
(29) minutos no grupo da incisão columelar.<br />
Em 34/47 (72.3%) doentes foi efectuado tamponamento<br />
bilateral das fossas nasais com merocel® e a mediana de<br />
duração do tamponamento foi de 5 dias. Nos restantes o<br />
tamponamento foi realizado com spongostan®. Apenas<br />
um doente tamponado com spongostan® teve epistáxis<br />
ao segundo dia pós-operatório com necessidade de<br />
tamponamento com merocel®, removido ao fim de 3<br />
dias. Em nenhum outro caso se verificou complicação ou<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 231<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
queixa significativa da ferida cirúrgica relacionada com a<br />
abordagem. Verificaram-se complicações em 4 doentes<br />
no pós-operatório imediato, sendo que dois doentes<br />
complicaram com fístula de LCR, um doente complicou<br />
com meningite e outro doente complicou com trombose<br />
venosa profunda. Após a cirurgia, todos os doentes<br />
estiveram inicialmente internados em Unidade de<br />
Cuidados Intermédios (UCI) de Neurocirurgia, passando<br />
posteriormente <strong>para</strong> a enfermaria. Os resultados<br />
relativos a duração do internamento na UCI, tempo pós-<br />
-operatório até início da dieta e levante e duração total<br />
do internamento encontram-se resumidos na Tabela 2.<br />
TABELA 2<br />
Com<strong>para</strong>ção entre doentes submetidos a cirurgia com incisão<br />
sublabial e columelar.<br />
Duração da cirurgia<br />
Média (desvio-padrão)<br />
em minutos<br />
Início levante<br />
Mediana (mínimo-máximo)<br />
em dias<br />
Início dieta<br />
Mediana (mínimo-máximo)<br />
em dias<br />
Alta UCI<br />
Mediana (mínimo-máximo)<br />
em dias<br />
Alta enfermaria<br />
Mediana (mínimo-máximo)<br />
em dias<br />
Incisão<br />
Sublabial<br />
(n=32)<br />
Incisão<br />
Columelar<br />
(n=15)<br />
210 (33) 228 (29) 0.074<br />
2 (2-4) 2 (2-5) 0.886<br />
1 (1-3) 1 (1-1) 0.291<br />
2 (1-5) 2 (1-6) 0.324<br />
6 (5-8) 6 (5-10) 0.704<br />
Em nenhum caso havia, no momento da consulta<br />
externa de Otorrinolaringologia pós-operatória, queixa<br />
espontânea relacionada com sintomas nasais ou orais,<br />
cefaleia, dor na face, acerca de defeito estético columelar<br />
ou outras possivelmente relacionadas com complicações<br />
do procedimento cirúrgico.<br />
Ao exame objectivo, à rinoscopia e oroscopia, dos 43<br />
doentes em que foi possível consultar os registos da<br />
consulta externa de Otorrinolaringologia, entre um a<br />
seis meses após a cirurgia, verificaram-se um total de<br />
19 (44.2%) doentes com sequelas, dos quais, 9 (20.9%)<br />
doentes com perfuração septal, 8 (18.6%) doentes com<br />
crostas, 5 (11.6%) doentes com secreção purulenta, 2<br />
(4.7%) doentes com obstrução nasal e 2 (4.7%) doentes<br />
com sinéquias. Nenhum doente apresentou complicações<br />
da ferida cirúrgica. Verificaram-se sequelas oronasais<br />
num total de 14/29 (48.3%) doentes no grupo em que<br />
foi utilizada incisão sublabial e 5/14 (35.7%) doentes no<br />
grupo em que foi utilizada incisão columelar (Figura 3),<br />
232 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
p<br />
nenhum dos quais motivou alteração da conduta pós-<br />
-operatória ou intervenção correctiva.<br />
As Tabelas 3 e 4 representam a com<strong>para</strong>ção do tipo de<br />
sequelas de acordo com a incisão cirúrgica utilizada, nos<br />
doentes submetidos apenas a uma cirurgia e nos doentes<br />
submetidos a cirurgia de revisão, sendo que em alguns<br />
casos verificou-se mais do que uma complicação no<br />
mesmo doente.<br />
FIGURA 3<br />
Total de doentes com complicações submetidos a cirurgia com<br />
incisão sublabial e columelar.<br />
TABELA 3<br />
Número e percentagem de sequelas oronasais verificadas em<br />
doentes submetidos a cirurgia única com incisão sublabial e<br />
columelar.<br />
Sequelas<br />
Oronasais<br />
Incisão Sublabial<br />
(n=21)<br />
n (%)<br />
Incisão Columelar<br />
(n=13)<br />
n (%)<br />
Ferida Cirúrgica 0 (0) 0 (0)<br />
Obstrução Nasal* 0 (0) 1 (7.7)<br />
Sinéquias** 1 (4.8) 0 (0)<br />
Crostas 3 (14.3) 3 (23.1)<br />
Secreção Purulenta 1 (4.8) 2 (15.4)<br />
Perfuração Septal 5 (23.8) 1 (7.7)<br />
TABELA 4<br />
Número e percentagem de sequelas oronasais verificadas em<br />
doentes submetidos a cirurgia de revisão com incisão sublabial<br />
e columelar.<br />
Sequelas<br />
Oronasais<br />
Incisão Sublabial<br />
(n=21)<br />
n (%)<br />
Incisão Columelar<br />
(n=13)<br />
n (%)<br />
Ferida Cirúrgica 0 (0) 0 (0)<br />
Obstrução Nasal* 0 (0) 1 (100)<br />
Sinéquias** 1 (12.5) 0 (0)<br />
Crostas 2 (25) 0 (0)<br />
Secreção Purulenta 2 (25) 0 (0)<br />
Perfuração Septal 3 (37.5) 0 (0)<br />
Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas<br />
na taxa de doentes com sequelas de acordo com incisão
cirúrgica utilizada, idade, sexo, classificação imagiológica<br />
do adenoma, ou em doentes com diabetes, hipertensão<br />
arterial, dislipidemia ou hipopituitarismo pré-operatórios.<br />
Verificou-se que doentes com excesso de peso tiveram<br />
mais vezes complicações (p
ALERTA<br />
ABERTURA DE CANDIDATURAS PARA<br />
SUBMETER PROJECTOS<br />
BOLSAS DE ESTUDO <strong>SPORL</strong> / AMPLIFON<br />
DATA LIMITE 31 DE JANEIRO 2012<br />
(Normas na Rev Port ORL 2010;48(3):170)<br />
234 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Cirurgia laser CO 2 no tratamento de tumores<br />
malignos glóticos<br />
CO 2 laser surgery for the treatment of glottic<br />
cancer<br />
Alexandra Jerónimo Pedro Cavilhas Luís Oliveira Pedro Montalvão Miguel Magalhães<br />
RESUMO<br />
Introdução: A microcirurgia transoral com laser CO 2 (MTOL) é<br />
uma alternativa no tratamento de tumores malignos glóticos.<br />
Material e Métodos: Estudo retrospectivo dos doentes<br />
submetidos a MTOL, de Janeiro de 2000 a Dezembro de<br />
2005, incluindo apenas os casos em que o laser constituiu o<br />
tratamento primário.<br />
Resultados: Total de 45 doentes: CIS (n=9), T1a (n=29), T1b<br />
(n=5), T2 (n=1), T3 (n=1), com follow-up médio de 63,5<br />
meses. Obteve-se uma taxa de recidiva local global de 22,2%,<br />
verificando-se o envolvimento da comissura anterior em 40%<br />
das recidivas. A taxa de sobrevida global e livre de doença, aos<br />
5 anos, foi de 82,2%, com uma taxa de preservação laríngea<br />
de 89,2%.<br />
Conclusão: O laser CO 2 é uma opção eficaz na abordagem de<br />
neoplasias glóticas em estadio inicial. A taxa de recidiva tumoral<br />
é maior quando há tumor na margem e/ou envolvimento da<br />
comissura anterior. Tumores glóticos localmente avançados<br />
são mais susceptíveis ao insucesso terapêutico por esta<br />
técnica.<br />
Palavras-chave: tumor maligno glótico, microcirurgia transoral<br />
laser CO 2 , comissura anterior, margem cirúrgica.<br />
Alexandra Jerónimo<br />
Interna do Internato Complementar do Serviço de ORL do Centro Hospitalar Lisboa Central<br />
(CHLC): Hospital de São José<br />
Pedro Cavilhas<br />
Interno do Internato Complementar do Serviço de ORL do CHLO: Hospital de Egas Moniz<br />
(HEM)<br />
Luís Oliveira<br />
Assistente Hospitalar Graduado do Serviço de ORL do IPOFG<br />
Pedro Montalvão<br />
Assistente Hospitalar Graduado do Serviço de ORL do IPOFG<br />
Miguel Magalhães<br />
Chefe de Serviço e Director do Serviço de ORL do IPOFG<br />
Correspondência:<br />
Serviço de ORL do Instituto Português de Oncologia Franscisco Gentil<br />
Morada: Rua Professor Lima Basto, 1099-023 Lisboa<br />
Tel: 927089186<br />
Email: asjeronimo@gmail.com<br />
Trabalho <strong>para</strong> apresentação no 58º Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de<br />
Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial – Hotel CS Salgados Golf, Albufeira, Algarve, 5 a<br />
8 de Maio de 2011.<br />
ABSTRACT<br />
Introduction: Transoral laser microsurgery (TLM) can be<br />
considered a valid alternative in the treatment of glottic<br />
cancer.<br />
Matherial and Methods: Retrospective study, considering all<br />
patients treated with TLM, from January 2000 to December<br />
2005. Patients were considered for the present study if they<br />
underwent laser surgery as primary treatment of glottic<br />
cancer.<br />
Results: 45 patients: CIS (n=9), T1a (n=29), T1b (n=5), T2<br />
(n=1), T3 (n=1). The mean duration of follow-up was 63,3<br />
months. The rate of global local recurrence was 22,2%, with<br />
the anterior commissure involvement being responsible for<br />
40% of the recurrences. The 5-year overall survival and the<br />
5-year disease-free survival were 82,2%, and the laryngeal<br />
preservation rate was 89,2%.<br />
Conclusion: This study supports the role of TLM in treating<br />
early-stage glottic cancer. The highest recurrence rates occur<br />
with positive margins and anterior commissure involvement.<br />
Advanced glottic cancers are not a consensual indication for<br />
laser surgery, usually with worse oncological outcome.<br />
Keywords: glottic cancer, transoral CO 2 laser microsurgery,<br />
anterior commissure, margin status.<br />
INTRODUÇÃO<br />
A abordagem de doentes com tumor glótico em estádio<br />
inicial, por laringectomia parcial externa, radioterapia<br />
(RT) e, mais recentemente, por microcirurgia transoral<br />
laser, é um tema complexo, em constante mudança e<br />
envolto em controvérsia. Actualmente, o objectivo<br />
final prende-se não só com os resultados oncológicos<br />
mas também funcionais, gerando um conflito entre<br />
a necessidade de remoção tumoral com margem<br />
oncológica segura e a tentativa de preservação tecidular<br />
<strong>para</strong> um melhor resultado da função laríngea 1 . As três<br />
técnicas estão associadas a taxas de controlo local<br />
semelhantes, entre os 80-90% 2,3 .<br />
Estão descritas numerosas vantagens do tratamento das<br />
lesões malignas glóticas por cirurgia laser em detrimento<br />
da RT. Constitui um acto único, durante o qual é<br />
possível a realização simultânea de biopsia diagnóstica<br />
e a ressecção curativa, apresenta uma relação custo-<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 235<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
-eficácia favorável, reduzida taxa de complicações e<br />
morbilidade e ainda permite tratamentos posteriores no<br />
caso de recidiva ou segundo tumor primário da cabeça<br />
e pescoço 1,3,5 . É essencial um conhecimento correcto da<br />
extensão do tumor, durante a avaliação pré-operatória,<br />
de forma a seleccionar o tipo de cordectomia mais<br />
adequado a realizar, tendo por base a Classificação<br />
da Sociedade Europeia de Laringologia. A RT está<br />
associada a melhor qualidade vocal mas maior risco de<br />
recidiva loco-regional. As laringectomias parciais são<br />
mais seguras oncologicamente, mas com resultados<br />
funcionais menos satisfatórios e pós-operatórios mais<br />
complicados 4 .<br />
O uso do laser na microcirurgia transoral <strong>para</strong> o<br />
tratamento de tumores glóticos em estádio inicial, foi<br />
descrito pela primeira vez por Strong e Jako, em Boston,<br />
Massachusetts, em 1972 1,2,4,5,6 . Uma técnica que recebeu<br />
uma aceitação crescente e particularmente evidenciada<br />
pelos trabalhos de Steiner. Este último introduziu o<br />
conceito do uso do laser no tratamento curativo de<br />
tumores glóticos avançados por meio da fragmentação<br />
da peça operatória, estratégia que permite ao cirurgião<br />
um mapeamento microscópico da profundidade do<br />
tumor e o acesso às margens em múltiplos planos 4 .<br />
O envolvimento da comissura anterior (CA) está<br />
geralmente associado a um aumento da taxa de recidiva<br />
local, e a sua eficácia como barreira tumoral tem sido<br />
alvo de numerosas investigações. Alguns autores<br />
assumem que a CA representa um ponto de fraqueza à<br />
invasão tumoral, ao nível do ligamento de Broyle, onde a<br />
falta de pericôndrio na sua área de inserção, permite ao<br />
tumor a invasão do esqueleto laríngeo. Outros autores<br />
acreditam que a CA constitui um ponto de resistência à<br />
disseminação cranial dos tumores com origem na região<br />
cordocomissural 8 . Tumores primários da CA são raros,<br />
contudo, é frequente o seu envolvimento em tumores<br />
glóticos, sendo que um estadio aparentemente inicial<br />
nem sempre corresponde à realidade 9 . O tratamento<br />
por microcirurgia laser pode ser dificultado por<br />
uma exposição endoscópica deficiente, que poderá<br />
comprometer a excisão completa e conduzir a sequelas<br />
funcionais importantes, nomeadamente por sinéquia. A<br />
RT e a cirurgia conservadora da laringe por via externa<br />
mantêm-se como opções válidas na abordagem destas<br />
lesões.<br />
Uma ressecção tumoral com margem segura, num<br />
tumor maligno da cabeça e pescoço, é um dos<br />
principais factores com impacto na recidiva local,<br />
sendo que tumores da cavidade oral, orofaringe e<br />
hipofaringe requerem margens mais amplas que<br />
os tumores da laringe. Ansarin et al 10 , num estudo<br />
prospectivo publicado em 2009, concluiram que <strong>para</strong> a<br />
236 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
remoção de um tumor glótico, em estádio inicial, com<br />
microcirurgia laser, uma margem de 1mm do limite<br />
tumoral era oncologicamente segura. Contudo, face à<br />
técnica cirúrgica do laser, que envolve diferentes graus<br />
de destruição tecidular, as margens nem sempre são<br />
passíveis de uma interpretação inequívoca por parte<br />
do Anatomo-patologista. Nestes casos, é essencial a<br />
certeza, por parte do cirurgião, da excisão tumoral<br />
completa.<br />
Os autores pretendem com o presente trabalho, realizar<br />
um estudo retrospectivo dos resultados do uso de<br />
microcirurgia laríngea transglótica com laser CO 2 , na<br />
abordagem de 45 doentes com lesões malignas glóticas,<br />
no período de 2000 a 2005; analisar taxas de sobrevida<br />
aos 5 anos, global e livre de doença, de controlo local e<br />
de preservação laríngea, bem como avaliar o impacto do<br />
envolvimento da comissura anterior e da presença de<br />
margens cirúrgicas, seguras ou não, na taxa de recidiva.<br />
MATERIAL E MÉTODOS<br />
Entre Janeiro de 2000 e Dezembro de 2005, 147 doentes<br />
foram submetidos a microcirurgia transoral com laser<br />
CO 2 , no Serviço de Otorrinolaringologia do Instituto<br />
Português de Oncologia Francisco Gentil, em Lisboa.<br />
Destes doentes, foram excluídos 102, por patologia<br />
benigna, por lesões pré-malignas, por lesões supra e<br />
sub-glóticas, ou pelo facto de o laser não ter constituído<br />
o tratamento primário na abordagem dos tumores<br />
malignos glóticos. Um total de 45 doentes foram<br />
considerados elegíveis e incluídos no estudo, com um<br />
predomínio do sexo masculino (93,3% <strong>para</strong> 6,7%) e uma<br />
idade média de 61,6 anos, com uma idade mínima de 36<br />
e máxima de 84 anos. No que diz respeito aos factores<br />
de risco <strong>para</strong> tumor da laringe, foram considerados os<br />
hábitos alcoólicos, tabágicos e a papilomatose laríngea.<br />
Os hábitos tabágicos foram apenas conhecidos em<br />
82,2% dos doentes obtendo-se 24,3% de não fumadores<br />
e os restantes 75, 7% com hábitos entre os 10-135<br />
UMA (Unidade Maço Ano). Dos hábitos etanólicos,<br />
conhecidos em 28 casos, foram subdivididos em não<br />
consumidor (32,1%), ligeiros (10,7%), moderados<br />
(32,1%) e marcados (25%) de acordo com avaliação<br />
subjectiva do doente. Foi identificada papilomatose<br />
laríngea em 3 casos (6,7%).<br />
Foi utilizada a Classificação TNM da AJCC – 2002<br />
Laringe/Glote com a inclusão de 9 (20%) Carcinoma in<br />
situ (CIS), 29 (64,4%) T1a, 5 (11,2%) T1b, 1 (2,2%) T2 e 1<br />
(2,2%) T3, sendo que em 11 dos 45 casos se verificou o<br />
envolvimento da comissura anterior (24,4% dos casos).<br />
Nenhum dos doentes apresentava invasão ganglionar<br />
cervical ou metastização à distância.<br />
O estudo pré-operatório incluiu anamnese com exame
físico sempre complementado por endoscopia laríngea,<br />
rígida ou flexível, avaliação analítica, radiografia de<br />
tórax, electrocardiograma e tomografia computorizada<br />
<strong>para</strong> avaliar a verdadeira extensão tumoral.<br />
Todos os procedimentos cirúrgicos foram realizados<br />
sob anestesia geral, utilizando um tubo endotraqueal<br />
resistente a lesões térmicas e asseguradas as medidas<br />
de protecção <strong>para</strong> o doente, equipa cirúrgica e<br />
restantes elementos presentes no bloco operatório.<br />
Sob controlo microscópico, foi utilizado um aparelho<br />
de laser CO 2 programado em superpulso, modo<br />
contínuo e com potência de 6 a 8W. Nos casos em<br />
que não foi possível a excisão tumoral em bloco, esta<br />
foi removida por fragmentos, tendo o cirurgião, intraoperatoriamente,<br />
confirmado a excisão completa após<br />
exame detalhado da(s) peça(s). As margens foram<br />
avaliadas posteriormente, não se procedendo a exame<br />
extemporâneo das peças ou leito cirúrgico.<br />
O tipo de cordectomia foi classificado de acordo com<br />
as indicações da Sociedade Europeia de Laringologia<br />
(SEL) 1,2,15 da seguinte forma: Tipo I (cordectomia<br />
subepitelial) com remoção apenas de mucosa, <strong>para</strong><br />
lesões superficiais não ultrapassando o córion; Tipo II<br />
(cordectomia subligamentar) com remoção de mucosa<br />
e ligamento vocal até à porção superficial do músculo<br />
vocal; Tipo III (cordectomia transmuscular) com remoção<br />
de parte do músculo vocal; Tipo IV (cordectomia total)<br />
com excisão da apófise vocal à comissura anterior com<br />
ou sem inclusão de pericôndrio; Tipo V (cordectomia<br />
alargada) incluindo a ressecção da corda vocal contralateral,<br />
parcial ou total, e a comissura anterior (Tipo<br />
Va), aritenóide (Tipo Vb), banda ventricular (Tipo Vc) e/<br />
ou subglote (tipo Vd). Nenhum doente foi submetido<br />
a esvaziamento ganglionar cervical profiláctico,<br />
traqueotomia ou colocação de sonda nasogástrica<br />
(SNG). A média do internamento foi de 2,9 dias,<br />
com um mínimo de 1 e máximo de 11 dias (doente<br />
submetido concomitantemente a parotidectomia total<br />
por carcinoma pavimento-celular da parótida), com<br />
os doentes internados na véspera da cirurgia, sendo<br />
que 71,1% dos doentes teve alta até ao 2ºdia de pós-<br />
-operatório, com dieta mole e, quando considerado<br />
pertinente, agendamento de consulta de terapia da fala.<br />
Alguns dos doentes cujo resultado anatomo-patológico<br />
da peça revelou margem com tumor ou margem não<br />
avaliável pela técnica, foram submetidos a terapêutica<br />
adjuvante com Radioterapia (RT).<br />
Estes casos seleccionados dependeram da descrição<br />
intra-operatória do cirurgião e da agressividade<br />
e diferenciação histológica do tumor. O follow-up<br />
respeitou os intervalos aconselhados na literatura.<br />
Noventa por cento das recidivas foram submetidas<br />
a tratamento de resgate. Não foi realizado o estudo<br />
funcional quantitativo relativamente aos parâmetros da<br />
voz e da deglutição.<br />
RESULTADOS<br />
Os doentes incluídos no estudo foram submetidos a um<br />
follow-up médio de 63,5 meses, num intervalo de tempo<br />
de 10-120 meses. Registaram-se 8 mortes, pela doença<br />
ou por outras causas, aos 10 (2 casos), 12 (2 casos),<br />
19, 26, 34 e 45 meses após a data da cirurgia. Todos os<br />
restantes doentes tiveram um follow-up mínimo de 60<br />
meses (5 anos).<br />
As 45 cordectomias subdividiram-se da sequinte<br />
forma: 6 Tipo I, 2 Tipo II, 18 Tipo III, 6 Tipo IV e 13<br />
tipo V (Tabela 1). Na cordectomia tipo I, a referente<br />
ao caso de T1b, tratou-se de vaporização de extensa<br />
lesão de papilomatose, bilateral, mas foi considerada<br />
como procedimento único <strong>para</strong> uniformização dos<br />
dados. Nas cordectomias tipo V, os casos de CIS e T1a<br />
foram abordados por esta técnica por envolvimento<br />
da comissura anterior. A variante Va foi incluída na<br />
cordectomia Tipo V.<br />
TABELA 1<br />
Distribuição do tipo de cordectomia, nos 45 doentes, de acordo<br />
com a classificação da SEL.<br />
Tipo I Tipo II Tipo III Tipo IV Tipo V Totais<br />
CIS 1 2 5 - 1 9<br />
T1a 4 - 13 6 6 29<br />
T1b 1 - - - 4 5<br />
T2 - - - - 1 1<br />
T3 - - - - 1 1<br />
Totais 6 2 18 6 13 45<br />
O diagnóstico anatomo-patológico das peças cirúrgicas<br />
incluiu: carcinoma pavimento-celular (CPC) (n=41),<br />
carcinoma verrucoso (n=1), carcinoma híbrido (n=1) e<br />
carcinoma sarcomatoide (CS) (n=2).<br />
Relativamente às margens cirúrgicas, em 35,6% dos<br />
casos (n=16), o relatório da Anatomia Patológica<br />
confirmou margens livres de tumor e os doentes não<br />
foram submetidos a terapêutica adjuvante, mantendo-se<br />
em vigilância periódica. Nos restantes 64,4% dos casos<br />
(n=29), o relatório revelou margem positiva <strong>para</strong> tumor ou<br />
margem não avaliável pela técnica cirúrgica. Destes, um<br />
doente recusou RT e foi submetido a laringectomia total<br />
(LT) por excisão insuficiente e agressividade do tumor<br />
(cordectomia tipo I em T1b cujo resultado anatomopatológico<br />
revelou CPC invasivo bem diferenciado, com<br />
áreas de carcinoma verrucoso). Dos restantes 28 casos,<br />
10 foram submetidos a terapêutica adjuvante com RT e<br />
18 permaneceram em vigilância.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 237<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
Em 10 doentes ocorreu recidiva tumoral, confirmada<br />
histologicamente. Nove destes doentes foram submetidos<br />
a tratamento de resgate. O décimo doente apresentava<br />
uma lesão classificada como T3, já submetido a RT após<br />
a primeira intervenção, e que, quando da recidiva, não<br />
apresentava condições gerais <strong>para</strong> re-intervenção,<br />
tendo permanecido em cuidados paliativos e vindo a<br />
falecer. Os tratamentos de resgate consistiram em nova<br />
cordectomia com laser, laringectomia fronto-lateral,<br />
laringectomia total e RT associada ou não à LT. Excluindo<br />
TABELA 2<br />
Análise dos doentes que desenvolveram recidiva tumoral<br />
Nº Idade T inicial CA Cordectomia Margens RT Intervalo<br />
tempo<br />
238 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
os que faleceram (n=4/10), os restantes encontramse<br />
vivos, sem sinais de recidiva loco-regional até à<br />
data. Assim sendo, constatou-se uma Taxa de recidiva<br />
local global de 22,2% (10/45), sendo que a comissura<br />
anterior encontrava-se envolvida, na lesão inicial, em<br />
40% dos casos (4/10). A Taxa de recidiva em tumores<br />
com margem livre foi de 18,8% (3/16) enquanto que a<br />
Taxa de recidiva em tumores com margem positiva ou<br />
duvidosa foi de 24,1% (7/29). Os resultados encontram-<br />
-se esquematizados na Tabela 2.<br />
Histologia<br />
recidiva<br />
Tratamento<br />
resgate<br />
1 63 CIS - I - - 5m CIS laser VSD<br />
2 65 CIS - III ? - 14m CPC LT + RT VSD<br />
3 39 CIS sim V + - 2m CPC LP VSD<br />
4 58 T1a - IV - - 11m CPC LT VSD<br />
5 58 T1a - III + - 6m CPC LT + RT VSD<br />
6 79 T1a - III - - 8m CPC LT F<br />
7 79 T1a sim V + - 13m CPC RT VSD<br />
8 66 T1b sim V ? - 8m CS LT F<br />
9 63 T2 sim V ? - 2m CPC LT F<br />
10 73 T3 - V ? sim 23m CPC P F<br />
Margens: + com tumor, - livre de tumor, ? não avaliáveis. LT: laringectomia total; LP: laringectomia parcial; P: paliativo; VSD: vivo<br />
sem doença; F: falecido<br />
A Taxa de sobrevida global aos 5 anos foi de 82,2%<br />
(37/45), valor coincidente com a Taxa de sobrevida livre<br />
de doença aos 5 anos, que inclui o tratamento de resgate,<br />
uma vez que dos doentes vivos, todos se encontram sem<br />
doença loco-regional. A taxa de controlo local após o<br />
primeiro tratamento foi de 77,8% (35/45), engloba os<br />
doentes submetidos apenas a cordectomia com laser e<br />
os submetidos a laser com RT adjuvante. Relativamente à<br />
preservação de órgão (doentes vivos com laringe) a Taxa<br />
de preservação laríngea foi de 89,2% (33/37), tendo em<br />
conta que 3 doentes foram submetidos a laringectomia<br />
total como tratamento de resgate, e o quarto doente<br />
refere-se ao caso classificado como T1b com CPC invasivo<br />
que recusou RT.<br />
DISCUSSÃO<br />
A decisão terapêutica na abordagem de um tumor<br />
maligno glótico, em estadio inicial, tem de levar em<br />
conta os resultados oncológicos, reflectidos nas taxas<br />
de controlo local e sobrevida; os resultados funcionais,<br />
avaliados pela taxa de preservação laríngea e a qualidade<br />
vocal; a morbilidade <strong>para</strong> o doente e a relação custo-<br />
-benefício do tratamento. As opções actuais incluem<br />
a radioterapia, a laringectomia parcial por via externa<br />
Estado<br />
actual<br />
e a microcirurgia transoral com laser CO 2 . Desde a<br />
sua primeira descrição, em 1972, o laser CO 2 tem<br />
vindo a ser uma escolha consensual, amplamente<br />
utilizada em doentes correctamente seleccionados. Os<br />
melhores resultados são indubitavelmente conseguidos na<br />
abordagem de tumores em estadio inicial (CIS e T1), com<br />
boa exposição tumoral, onde estão descritas taxas de<br />
controlo local de 96-100%, de sobrevida livre de doença<br />
de 80-90% e de preservação laríngea de 93-100% 1,10 .<br />
A radioterapia também constitui uma alternativa viável,<br />
com excelente resultado na qualidade vocal, contudo<br />
associada a resultado oncológico menos favorável e a<br />
complicações como a disfagia e a dificuldade respiratória<br />
por edema pós-rádico. No caso de insucesso curativo, o<br />
tratamento de resgate mais eficaz é a laringectomia por via<br />
externa, sendo o uso do laser controverso. A não ser que<br />
a recidiva tumoral consista numa lesão bem delimitada<br />
na superfície da corda vocal, é extremamente difícil<br />
uma abordagem endoscópica com margens seguras, isto<br />
porque, é comum encontrar ninhos de células tumorais,<br />
entre áreas de tecido fibrosado pelas radiações, na<br />
profundidade do músculo vocal, dificultando o controlo<br />
histológico durante a ressecção. Também importante<br />
não esquecer, é o facto de a radioterapia constituir
um tratamento de uso único e, tendo em conta uma<br />
incidência de segundo tumor primário na cabeça e<br />
pescoço próxima de 10-20%, ela deverá ser reservada<br />
<strong>para</strong> o controle de tumores mais agressivos que possam<br />
afectar esta área 1,5 . Quanto mais avançado o estadio do<br />
tumor (T2 e T3), maior a probabilidade de recidiva e<br />
muitos autores consideram uma contra-indicação <strong>para</strong> o<br />
laser, sendo a laringectomia por via externa a abordagem<br />
tida com a mais eficaz. Outras contra-indicações <strong>para</strong><br />
o uso do laser incluem: lesões com envolvimento<br />
extenso da comissura anterior em proximidade com a<br />
cartilagem adjacente, do processo vocal, ventrículo ou<br />
subglote e diminuição da mobilidade aritenoideia, por<br />
possível envolvimento da articulação crico-aritenoideia,<br />
do músculo crico-aritenoideu posterior ou da porção<br />
posterior da cartilagem cricoide 2,7 .<br />
No nosso grupo de doentes verificou-se uma taxa de<br />
sobrevida global aos 5 anos de 82,2%, valor coincidente<br />
com a taxa de sobrevida livre de doença, também aos 5<br />
anos, uma vez que, dos doentes que sofreram recidiva,<br />
submetidos a tratamento de resgate e que se encontram<br />
actualmente vivos, nenhum apresenta sinais de recidiva<br />
loco-regional. Face às 10 recidivas tumorais, a taxa de<br />
controlo local após o primeiro tratamento foi de 77,8%.<br />
Torna-se difícil com<strong>para</strong>r as taxas de sobrevida, global<br />
e livre de doença, e de controlo local obtidas no nosso<br />
estudo com as descritas na literatura. Isto porque os<br />
critérios de inclusão diferem substancialmente entre<br />
estudos, nomeadamente no que se refere a localização<br />
e extensão tumoral, selecção da amostra e uso laser<br />
como tratamento primário versus secundário, <strong>para</strong> além<br />
do cálculo das taxas ser realizado muitas vezes aos 3<br />
e não aos 5 anos, como no presente estudo. Contudo,<br />
em termos gerais, os valores obtidos são bastante<br />
satisfatórios, sobreponíveis, em termos de taxa de<br />
controlo local, ao estudo realizado pelo IPOFG <strong>para</strong> o<br />
período de 1991-1998 12 , que foi de78,6%, embora com<br />
uma taxa de sobrevida global inferior com<strong>para</strong>tivamente<br />
aos 98,8% do estudo anterior.<br />
De salientar que, os dois casos de tumor mais avançado<br />
(T2 e T3), ambos recidivaram e, apesar do tratamento de<br />
resgate, faleceram, o que vem de encontro com os achados<br />
da literatura que desaconselham o uso de laser CO 2 em<br />
tumores glóticos malignos avançados, por maior taxa de<br />
insucesso 1-5, 7,10,11 . Contudo o reduzido número da amostra<br />
(n=2) também não nos permite refutar essas afirmações.<br />
A contrariar esta opinião unânime surge Steiner e os seus<br />
colaboradores, com a utilização do laser em tumores<br />
avançados. M. Hinni et al 4 , num estudo prospectivo de<br />
117 doentes com tumores malignos glóticos T2 a T4,<br />
publicaram taxas de sobrevida global, sobrevida livre de<br />
doença, controlo local e preservação laríngea, aos 2 anos,<br />
de 75%, 68%, 82% e 92%, respectivamente. Estes valores<br />
desceram <strong>para</strong> 55%, 58%, 74% e 86%, respectivamente,<br />
aos 5 anos.<br />
Com<strong>para</strong>ram ainda com a taxa de sobrevida global aos 2<br />
e 5 anos, de 74% e 54% com quimio-radioterapia (QRT) e<br />
de 75% e 56% com RT isolada, tratamentos com efeitos<br />
secundários importantes observados em 40 a 80% dos<br />
doentes, nomeadamente estenose faringo-esofágica em<br />
21% dos casos e taxa de condrorradionecrose mínima de 5%.<br />
Na nossa série, a taxa de recidiva global foi de 22,2%,<br />
com uma taxa de recidiva associada a ressecção tumoral<br />
com margem livre de 18,8% e, com margem positiva<br />
<strong>para</strong> tumor ou margem não avaliável, de 24,1%, apesar<br />
de 64,4% dos resultados anatomo-patológicos da(s)<br />
peça(s) apresentarem margem positiva <strong>para</strong> tumor<br />
ou margem não avaliável. Destes, apenas 34,5% dos<br />
casos receberam terapêutica adjuvante com RT, 62,1%<br />
ficaram em vigilância e um doente (3,4%) foi submetido<br />
a laringectomia total por recusar RT. Um dos maiores<br />
desafios do uso do laser CO 2 na microcirurgia transoral<br />
é a obtenção de margens quantitativamente avaliáveis e<br />
seguras em toda a extensão da peça cirúrgica, devido à<br />
retracção tecidual secundária ao efeito térmico, à reduzida<br />
quantidade de tecido excisado e aos artefactos induzidos<br />
pela técnica 1,5 . É de extrema importância a avaliação das<br />
margens de ressecção, por parte do cirurgião, durante o<br />
procedimento cirúrgico, sem menosprezar a confirmação<br />
de margem livre de tumor por anatomo-patologia, uma<br />
vez que os nossos resultados sugerem que, nesse caso, o<br />
risco de recidiva local é inferior. Ansarin et al 10 concluíram,<br />
num estudo prospectivo envolvendo 274 doentes (CIS a<br />
T2), que uma excisão com laser oncologicamente segura,<br />
deverá apresentar uma margem mínima de 1mm.<br />
Margens positivas e margens reduzidas (
exposição e controlo histológico por via endoscópica,<br />
encontrando-se associada a elevadas taxas de recidiva<br />
local. A eficácia da Classificação TNM na antevisão do<br />
prognóstico dos tumores da laringe é limitada pelo<br />
facto de não tomar em consideração os tumores com<br />
localização ao nível da CA, que se sabe comportarem-<br />
-se de forma diferente 8 .Bocciolini C. et al 2 recomendam<br />
o uso do laser apenas em casos de disseminação<br />
superficial à CA, ao nível glótico, sem extensão à supra<br />
e/ou subglote. No presente estudo o envolvimento da<br />
CA foi detectado em 40% das recidivas, sendo que a<br />
amostra é constituída por 11 casos de envolvimento da<br />
comissura anterior num total de 45 doentes (11/45). Na<br />
literatura estão documentadas taxas de 21% (24/48) 8 e<br />
21,6% (60/217) 11 . No estudo retrospectivo publicado<br />
pelo IPOFG em 1999 12 , referente ao uso do laser CO2 no<br />
tratamento de lesões pré-malignas e malignas glóticas<br />
no período de 1991 a 1998, o valor foi de 59,1% (22/84).<br />
O actual estudo indica um melhor controlo do tumores<br />
envolvendo a CA, com<strong>para</strong>ndo valores da mesma<br />
Instituição, mas pior quando tidos em conta as referências<br />
bibliográficas anteriores. Casiano RR 7 revela uma taxa de<br />
controlo local aos 5 anos, de 45% <strong>para</strong> tumores da CA,<br />
com<strong>para</strong>ndo com 65% nos tumores sem envolvimento da<br />
mesma, fazendo ainda referência ao estudo de Krespi e<br />
Meltzer que relataram uma taxa de recidiva de 100% nos<br />
tumores da CA tratados com laser. Aspectos relacionados<br />
com a selecção dos doentes, extensão tumoral, técnica<br />
e experiência cirúrgicas poderão estar na base destas<br />
diferenças. Um tratamento primário alternativo com<br />
RT ou laringectomia parcial por via externa deverão ser<br />
considerados. À cirurgia conservadora estão associadas<br />
algumas desvantagens como um internamento mais<br />
prolongado, necessidade de traqueotomia e colocação de<br />
SNG na maior parte dos casos. Durante o procedimento,<br />
o acesso ao tumor requer uma cervicotomia com<br />
dissecção por estruturas sem doença e a lesão apenas é<br />
visualizada com a abertura da laringe, e o defeito laríngeo<br />
requer reconstrução imediata <strong>para</strong> a preservação vocal e<br />
prevenção de fístula 8 .<br />
Em termos de resultados funcionais, obteve-se uma taxa<br />
de preservação laríngea de 89,2%. Por se tratar de um<br />
estudo retrospectivo, não se procedeu a uma análise<br />
objectiva da função vocal dos doentes submetidos a<br />
cordectomia com laser. De acordo com estudos prévios,<br />
apresentados na literatura 3 , o resultado funcional é<br />
dependente do processo individual de cicatrização<br />
e dos mecanismos de compensação vibratória por<br />
parte das bandas ventriculares e/ou das neo-cordas<br />
vocais, podendo ser benéfico o acompanhamento por<br />
terapeuta da fala no pós-operatório, com avaliação<br />
videoestrobolaringoscopica. De uma forma geral,<br />
240 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
cordectomias tipo I e II oferecem resultados excelentes e<br />
as tipo III aceitável 1 . Ressecções tecidulares mais extensas<br />
ou envolvendo a comissura anterior, com o aparecimento<br />
frequente de granulomas ou sinéquias, estão associadas<br />
a resultados menos satisfatórios.<br />
CONCLUSÃO<br />
O presente trabalho confirma o papel do laser CO 2 na<br />
microcirurgia transoral, na abordagem de tumores<br />
glóticos malignos em estadio inicial. A taxa de recidiva<br />
tumoral foi maior nos casos de presença de tumor na<br />
margem ou margem não avaliável, com<strong>para</strong>tivamente<br />
às ressecções tumorais com margens livre, bem como<br />
nos tumores com envolvimento da comissura anterior,<br />
confirmando as evidências da literatura que conferem a<br />
esta localização anatómica uma maior taxa de insucesso<br />
de controlo local por via endoscópica. Um tratamento<br />
de resgate adequado e atempado, em caso de recidiva<br />
tumoral, assegura, geralmente, um controlo loco-regional,<br />
sobreponível ao obtido com a RT e a laringectomia parcial<br />
por via externa. Tumores glóticos localmente avançados<br />
estão associados a maior insucesso terapêutico, com<br />
pior prognóstico, mesmo quando complementados por<br />
terapêutica adjuvante.
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VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 241<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
242<br />
REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Radiofrequência de cornetos. A nossa<br />
experiência.<br />
Radiofrequency of turbinates. Our experience<br />
Ana Sofia Araújo Da Costa Olalla Castro Macía Miriam Ileana Hamdan Zavarce Jose Manuel Meléndez García<br />
Dionisio Alonso Párraga Gumersindo Espiña Campos<br />
técnicas: não necessita tamponamento nasal, não altera a mucosa<br />
nem, consequentemente, o transporte muco ciliar. Apresenta escasso<br />
número de complicações e a sua realização não resulta complicada.<br />
Palavras-chave: Radiofrequência, hipertrofia de cornetos, rinomanometria<br />
RESUMO<br />
Introdução: A hipertrofia de cornetos inferiores representa uma das<br />
causas mais comuns de obstrução nasal. A radiofrequência é uma<br />
técnica relativamente nova <strong>para</strong> redução de tecido, apresentando<br />
vantagens com relação a outras alternativas.<br />
Objectivos: Avaliar a eficácia e as complicações da radiofrequência<br />
em pacientes diagnosticados de hipertrofia de cornetos inferiores.<br />
Material e Métodos: Apresentamos um estudo retrospectivo de<br />
40 pacientes com idades compreendidas entre os 14 e 60 anos,<br />
com obstrução nasal devida a hipertrofia de cornetos inferiores,<br />
refractaria a tratamento médico. Os pacientes foram tratados com<br />
radiofrequência, com anestesia local. Realizou-se um estudo do<br />
fluxo aéreo mediante rinomanometria anterior activa, prévio e<br />
posterior ao tratamento (aos 3 e 6 meses). Comparámos a melhoria<br />
subjectiva e objectiva em todos os pacientes e analisámos o índice de<br />
complicações maiores e menores.<br />
Resultados: O índice de complicações na nossa série é reduzido, não<br />
existindo complicações graves e registando-se menos de um 5% de<br />
complicações menores (formação de crostas ou necrose do tecido).<br />
A rinomanometria é uma técnica que nos permite demonstrar de<br />
forma objectiva a melhoria, ou não, que os pacientes manifestam de<br />
forma subjectiva. Obtivemos 80% de melhoria do fluxo aéreo aos 3<br />
meses, diminuindo este valor num 10% aos 6 meses.<br />
Conclusão: A radiofrequência de cornetos inferiores é uma técnica<br />
efectiva que representa algumas vantagens com respeito a outras<br />
Ana Sofia Araújo Da Costa<br />
Interna de ORL Hospital Xeral-Cíes (CHUVI)<br />
Olalla Castro Macía<br />
Interna de ORL Hospital Xeral-Cíes (CHUVI)<br />
Miriam Ileana Hamdan Zavarce<br />
Interna de ORL Hospital Xeral-Cíes (CHUVI)<br />
Jose Manuel Meléndez García<br />
Interno de ORL Hospital Xeral-Cíes (CHUVI)<br />
Dionisio Alonso Párraga<br />
Facultativo Especialista ORL Hospital Xeral-Cíes (CHUVI)<br />
Gumersindo Espiña Campos<br />
Chefe de Serviço ORL Hospital Xeral-Cíes (CHUVI)<br />
Correspondência:<br />
Ana Sofia Araújo da Costa<br />
C/ Pizarro nº20-22. Serviço ORL – Hospital Xera-Cíes<br />
Vigo – Pontevedra – Espanha<br />
Email: anaaraujocosta@hotmail.com<br />
Trabalho apresentado no: III Curso de Rinoplastía y Cirugía Complementaria Facial, Vigo.<br />
58º Congresso da Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico - Facial<br />
ABSTRACT<br />
Introduction: Inferior turbinate hypertrophy represents one of<br />
the most frequent causes for nasal airway obstruction. Turbinate<br />
radiofrequency is a relatively new technique presenting several<br />
advantages when compared with other alternatives.<br />
Objectives: To evaluate the efficacy and complications of<br />
radiofrequency in patients diagnosed of inferior turbinate<br />
hypertrophy.<br />
Methods: We present a retrospective study of 40 patients with ages<br />
between 14 and 60 years old, with nasal airway obstruction due<br />
to inferior turbinate hypertrophy refractory to medical therapy.<br />
Patients were treated with radiofrequency under local anesthesia.<br />
We analyzed the nasal flow with active anterior rhinomanometry<br />
previous and post treatment (at 3 and 6 months). We compared the<br />
subjective and objective improvement in all patients analyzing as<br />
well the rate of minor and major complications.<br />
Results: Our rate of complications is low, and we had no data of<br />
major complications, having found only a 5% of minor complications<br />
as (crust formation or tissue necrosis). The rhinomanometry is a<br />
technique that allows us to observe the objective improvement or<br />
not, that patients manifest in a subjective way. We obtained an 80%<br />
improvement in nasal airway flow at 3 months having this value<br />
decreased in 10% at the 6 months follow up.<br />
Conclusion: The radiofrequency of the inferior turbinate is an effective<br />
technique that presents some advantages when compared with other<br />
methods: does not need nasal packing, does not alter the mucosa<br />
and consequently preserves the mucociliary transportation. Presents<br />
a low rate of complications and it’s a simple procedure.<br />
Keywords: radiofrequency, turbinate hypertrophy, rhinomanometry<br />
INTRODUÇÃO<br />
A obstrução nasal constitui uma das principais queixas<br />
dos pacientes adultos e crianças, na consulta ORL 1 . Esta<br />
pode estar associada a deformações nasais, septais ou<br />
alterações da mucosa associada a hipertrofia de cornetos 2,3 .<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 243<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
Os cornetos inferiores formam parte da parede externa<br />
das fossas nasais, e o seu esqueleto é formado por<br />
relevos ósseos recobertos por uma membrana mucosa<br />
espessa, vascularizada, de epitelio tipo respiratório<br />
cilíndrico ciliado pseudoestratificado com células<br />
ciliadas prismáticas e células caliciformes secretoras de<br />
muco 4 . Esta mucosa é então responsável da modulação<br />
do volume dos cornetos e essencial <strong>para</strong> a função de<br />
aquecimento do ar e respiração 4 .<br />
Nos processos de hipertrofia existe uma alteração dos<br />
mecanismos cíclicos congestivos e descongestivos.<br />
Em fenómenos de inflamação e em determinadas<br />
patologias a congestão da mucosa nasal será regulada<br />
pelo sistema nervoso simpático (plexo carotídeo) que<br />
regula o aumento de resistência dos vasos produzindo,<br />
com a sua estimulação, a vasoconstrição e consequente<br />
descongestionamento nasal. Por outro lado o sistema<br />
<strong>para</strong>ssimpático regula o volume sanguíneo de modo<br />
que a sua estimulação é responsável pela vasodilatação,<br />
congestão e edema 5 .<br />
A hipertrofia dos cornetos pode-se justificar por rinite<br />
alérgica, rinite vasomotora, rinite hipertrófica crónica,<br />
por uma resposta compensadora a uma deformação<br />
septal importante, entre outras causas 2,3,6,9 .<br />
Apesar de não ser uma patologia grave, a hipertrofia de<br />
cornetos afecta de forma importante a qualidade de vida<br />
do paciente 2,3,6,8 , sendo responsável de até 20% dos casos<br />
de obstrução nasal crónica 6,10,11 . O tratamento de esta<br />
hipertrofia mucosa é cirúrgico no caso de ausência de<br />
resposta ao tratamento farmacológico 2,3,10,12 .<br />
A radiofrequência de tecido mole, descrita pela primeira<br />
vez por Powel et al, é um procedimento cirúrgico que<br />
usa o aquecimento por radiofrequência <strong>para</strong> induzir<br />
destruição da submucosa conduzindo deste modo à<br />
redução de volume do tecido 13 . É uma técnica utilizada<br />
em diversos campos da medicina como a neurocirurgia,<br />
urologia, oncologia, cardiologia entre outros 1,11 .<br />
Em ORL a radiofrequência pode ser aplicada não só na<br />
hipertrofia de cornetos mas também no palato mole,<br />
base de língua e amígdalas palatinas 14 .<br />
Através da indução de movimentos iónicos no tecido,<br />
produzida pela corrente alternada, a energia da<br />
radiofrequência, produz um aumento do calor local<br />
provocando uma lesão térmica que ocorre na mucosa<br />
profunda sem alterar a superfície 1,9,10 .<br />
Secundariamente, o processo de cicatrização induz<br />
fibrose e retracção da lesão conduzindo à diminuição de<br />
volume 1,10 .<br />
O objectivo deste estudo consiste na avaliação da eficácia<br />
e possíveis complicações do uso da radiofrequência no<br />
tratamento da hipertrofia de cornetos.<br />
244 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
METODOLOGIA<br />
Apresentamos um estudo retrospectivo com 40<br />
pacientes, num intervalo de idades entre os 14 e os 60<br />
anos, tratados com radiofrequência de cornetos no ano<br />
de 2010, no Hospital Xeral-Cies de Vigo. Os critérios de<br />
inclusão no estudo foram pacientes com obstrução nasal<br />
produzida por hipertrofia de cornetos cuja resposta a<br />
tratamento médico com anti-histamínicos, corticoides,<br />
descongestionante nasal ou imunoterapia 1,11 , não foi<br />
significativa. Foram excluídos os pacientes com obstrução<br />
nasal por outras causas como deformações septais,<br />
polipose nasal, sinusite ou tumores benignos e malignos.<br />
Para o diagnóstico desta patologia recorremos<br />
à elaboração da história clínica do paciente com<br />
exploração mediante rinoscopia anterior e posterior<br />
(cabeça e cauda de corneto) e exploração endoscópica<br />
com nasofibroscopio flexível. A exploração radiológica<br />
mediante TC realizou-se apenas em casos seleccionados.<br />
O tratamento aplicado a todos os pacientes consistiu na<br />
aplicação de anestesia tópica e infiltrada (mepivacaína)<br />
sem vasoconstrição, mediante controlo via endoscópica<br />
com óptica de 0º. A potência utilizada na radiofrequência<br />
variou entre 16-18W.<br />
O eléctrodo foi introduzido até à cauda do corneto e<br />
dependendo do tipo de hipertrofia efectuamos diversas<br />
descargas em zonas como cabeça, corpo e cauda do<br />
corneto. A duração de cada descarga foi dada pela<br />
mudança na coloração do corneto, convertendo-se em<br />
pálido.<br />
Após o tratamento cirúrgico, todos os pacientes foram<br />
sujeitos a tratamento com lavagens nasais seguidas de<br />
aplicação de prednisolona em pomada nasal durante um<br />
período de 10-15 dias.<br />
Prévia e posteriormente ao tratamento (aos 3 e 6 meses)<br />
realizou-se rinomanometria anterior activa a cada<br />
paciente de forma a avaliar de forma objectiva a melhoria,<br />
ou não, do quadro. Da mesma forma foi realizada uma<br />
valoração pelo próprio paciente da sintomatologia<br />
patente, de forma a obter uma avaliação subjectiva da<br />
evolução.<br />
A rinomanometria representa uma técnica objectiva <strong>para</strong><br />
a avaliação simultânea da pressão e fluxo transnasal. O<br />
Comité Europeu de Estandardização da Rinomanometria<br />
selecionou a fórmula da lei de Ohm a uma pressão<br />
recomendada de 150 Pascals (Pa) <strong>para</strong> determinar a resistência à<br />
passagem do ar pelas fossas nasais: R = Pa / fluxo 15 .<br />
Analisamos a incidência das principais complicações<br />
baseando-nos naquelas descritas na literatura como<br />
consequência de radiofrequência de cornetos:<br />
hemorragia, dor, formação de crostas, formação de<br />
sinequias 1,13,14 .
RESULTADOS<br />
Na distribuição por género obtivemos predomínio do sexo<br />
feminino 62,5% (25/40) em relação ao sexo masculino<br />
37,5% (15/40).<br />
Todos os pacientes receberam, previamente, tratamento<br />
com corticosteróides tópicos, e 34,61% dos pacientes<br />
com anti-histamínicos. Em 57,69% dos pacientes existiam<br />
antecedentes de rinite alérgica, e 11,53% tinham sido<br />
submetidos previamente a outros tratamentos cirúrgicos.<br />
O intervalo de idades distribui-se entre o paciente mais<br />
jovem com 14 anos e o mais velho de 60 anos.<br />
Obtivemos uma melhoria subjectiva (diminuição de<br />
rinorreia, insuficiência respiratória nasal, roncopatia,<br />
espirros) em 39 pacientes (97,5%) aos três meses e em<br />
35 pacientes (87,5%) aos seis meses.<br />
Nos três meses posteriores ao tratamento com<br />
radiofrequência verificamos que, relativamente à<br />
melhoria do fluxo nasal medido a 150 Pa, 16 pacientes<br />
apresentaram uma melhoria entre 0 e 30%, 8 pacientes<br />
melhoria entre 30 e 60% e 12 pacientes melhoria superior<br />
a 60%. (figura 1)<br />
FIGURA 1<br />
Controlo a 3 meses.<br />
Por sua vez aos 6 meses a melhoria de fluxo a 150Pa <strong>para</strong><br />
17 pacientes situou-se entre 0 e 30%, entre 30-60% <strong>para</strong><br />
7 pacientes e superior a 60% <strong>para</strong> 12 pacientes. (figura 2)<br />
Relativamente à análise de complicações verificamos<br />
a ausência de complicações maiores, encontrando-se<br />
apenas complicações menores como epistaxe em um<br />
paciente, formação de crostas em três pacientes e um<br />
caso de necrose.<br />
FIGURA 2<br />
Controlo a 6 meses.<br />
DISCUSSÃO<br />
A radiofrequência é um método relativamente recente<br />
<strong>para</strong> a redução do tecido submucoso da membrana<br />
mucosa do corneto inferior 3 .<br />
O objectivo da intervenção cirúrgica de cornetos<br />
consiste em obter uma melhoria da respiração nasal<br />
preservando a função fisiológica dos cornetos e<br />
minimizando o desconforto e outros efeitos efeitos<br />
adversos 2,10 . A variedade de técnicas cirúrgicas que<br />
existem disponíveis como opção terapêutica (infiltração<br />
de corticoesteroides, criocirurgia, electrocautério, laser,<br />
turbinectomia, turbinoplastia, descongestionamento<br />
submucoso 2,6,7,8,10,11,16 ) põe em evidência a falta de<br />
consenso com respeito à eleição de uma técnica<br />
ideal 2,6,10,11,13,16 .A infiltração de corticosteróides, apesar<br />
de minimamente invasiva, apresenta efeitos discutíveis.<br />
Estão descritos casos de cegueira após a infiltração, devido<br />
à oclusão do aporte vascular ocular 17 . A criocirurgia é<br />
uma técnica antiga que se baseia na redução do corneto<br />
com frio, sendo frequente a recidiva. O electrocauterio<br />
actua a nível da mucosa e submucosa 10 . É uma técnica<br />
dolorosa, com alto risco de hemorragia e formação de<br />
crostas e sinéquias. No entanto, está muito difundida<br />
pela sua fácil realização. O laser CO 2 /YAG realiza-se com<br />
anestesia local, é pouco doloroso e possui um baixo<br />
risco de hemorragia 18 . Por sua vez a turbinoplastia<br />
realiza-se com alguma dificuldade e necessita anestesia<br />
geral. Preserva a mucosa e apresenta baixo risco de<br />
hemorragia. Apresenta bons resultados. A turbinectomia<br />
caracteriza-se pela eliminação parcial ou total do corneto<br />
realiza-se com anestesia geral e a cicatrização realiza-se<br />
por segunda intenção. É uma técnica bastante discutida<br />
devido aos efeitos secundários que apresenta como<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 245<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
inites atróficas, desconforto respiratório, hemorragias<br />
e necessidade de tamponamento, formação de crostas e<br />
sinéquias 2,6,7,8,10,11,16 .<br />
A radiofrequência é uma técnica bem tolerada que<br />
se pode realizar de forma segura e ambulatória com<br />
anestesia local. Com uma energia que varia entre 400-<br />
500J e uma potência entre 10-18W, é produzida uma<br />
lesão térmica entre 2-4mm em torno ao eléctrodo 2,6,11 .<br />
Contrariamente à cirurgia por laser ou electrocauterização,<br />
que produzem temperaturas que podem alcançar os<br />
800ºC, a técnica da radiofrequência utiliza uma menor<br />
potencia <strong>para</strong> gerar uma temperatura que pode chegar<br />
aos 85ºC (produzindo a desnaturalização dos tecidos<br />
a 49,5º). Isto permite um maior controlo da lesão e<br />
um menor risco de destruição da mucosa adjacente ou<br />
necrose da arquitectura óssea do corneto 11 .<br />
Deste modo a redução do volume do corneto é<br />
consequência da retracção resultante da necrose do<br />
tecido que se produz com a lesão térmica.<br />
A radiofrequência apresenta como vantagens o facto<br />
de que se realiza de forma fácil e rápida com anestesia<br />
local. Como consequência esta intervenção dispensa<br />
hospitalização. Não necessita tamponamento nasal<br />
evitando deste modo a maceração da mucosa nasal e<br />
mal-estar do paciente. Além disso, esta técnica permite<br />
a preservação do epitélio nasal, não produz alterações<br />
no aclaramento mucociliar e não provoca aumento de<br />
secreções nem formação de crostas 3 . Os cuidados pós-<br />
-operatórios são simples, incluindo apenas lavagens<br />
nasais com soro e aplicação de prednisolona em pomada<br />
nasal. Torna-se também importante referir a possibilidade<br />
de repetir o procedimento noutras ocasiões se a melhoria<br />
da sintomatologia não for suficiente 19 .<br />
Apesar de aumento da sensação de congestionamento<br />
nasal na primeira semana em 83% dos pacientes existe<br />
um resultado satisfatório às oito semanas 19 .<br />
CONCLUSÃO<br />
Concluímos deste modo que a radiofrequência como<br />
tratamento da obstrução nasal por hipertrofia de<br />
cornetos inferiores, que não responde a tratamento<br />
médico, é uma técnica segura, minimamente invasiva<br />
e com baixo índice de complicações. Apresenta deste<br />
modo perspectivas favoráveis sendo o seu uso fácil e os<br />
resultados obtidos muito satisfatórios.<br />
246 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
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function with objective airway testing.<br />
Cummings Otolaryngology, Head and Neck Surgery 5th edition<br />
16.Seren E. Effect of radiofrequency volumetric tissue reduction of<br />
inferior turbinate on expiratory nasal sound frequency.<br />
Am J Rhinol Allergy. 2009 May-Jun; 23(3):316-20<br />
17.Roth M, Kennedy DW. The case for inferior turbinate preservation.<br />
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inferior turbinate hypertrophy with radiofrequency treatment: a new<br />
standard of care?<br />
Laryngoscope, 2006 Apr. 116(4): 554-7
Neoplasias das glandulas salivares – experiência<br />
IPOC FG - últimos 10 anos<br />
Salivary gland neoplasms – IPO FG coimbra<br />
experience – last 10 years<br />
Ana Margarida Simões Francisco Branquinho Azenha Cardoso António Neves Carlos Cruz Henriques Pereira João Ganho<br />
Arnaldo Guimarães<br />
RESUMO<br />
Introdução: A patologia das glândulas salivares é<br />
essencialmente do tipo inflamatória e neoplásica com<br />
comportamentos biológicos muito diferentes.<br />
Material e métodos: Estudo retrospectivo com avaliação dos<br />
casos de cirurgia de glândula salivar entre 2005 e 2010 e casos<br />
com diagnóstico histológico de neoplasia maligna epitelial de<br />
glândula salivar entre 2000 e 2010.<br />
Resultados: Entre 2005 e 2010, estudaram-se 261 pacientes,<br />
197 casos de tumores benignos e 64 malignos; o adenoma<br />
pleomórfico foi a lesão benigna e o carcinoma espinhocelular<br />
a lesão maligna mais frequentes; A parótida foi a glândula<br />
mais atingida. Os casos histológicos malignos epiteliais entre<br />
2000 e 2010, revelaram 55 casos, sendo o tipo histológico<br />
mais prevalente o carcinoma adenocístico (22%).<br />
Conclusões: Desta análise, o estadio tumoral parece ser o mais<br />
importante factor de prognóstico no caso neoplasias malignas<br />
epiteliais salivares. A Radioterapia tem um papel importante<br />
como terapeûtica complementar. As taxas de recidiva a longo<br />
prazo são altas e pode surgir metastização à distância mesmo<br />
Ana Margarida Simões<br />
Serviço ORL, Departamento de Cirurgia Cabeça e Pescoço, Instituto Português de Oncologia de<br />
Coimbra Francisco Gentil, Coimbra, Portugal<br />
Francisco Branquinho<br />
Serviço ORL, Departamento de Cirurgia Cabeça e Pescoço, Instituto Português de Oncologia de<br />
Coimbra Francisco Gentil, Coimbra, Portugal<br />
Azenha Cardoso<br />
Serviço Estomatologia, Departamento de Cirurgia Cabeça e Pescoço, Instituto Português de<br />
Oncologia de Coimbra Francisco Gentil, Coimbra, Portugal<br />
António Neves<br />
Departamento de Cirurgia Cabeça e Pescoço, Instituto Português de Oncologia de Coimbra<br />
Francisco Gentil, Coimbra, Portugal<br />
Carlos Cruz<br />
Departamento de Cirurgia Cabeça e Pescoço, Instituto Português de Oncologia de Coimbra<br />
Francisco Gentil, Coimbra, Portugal<br />
Henriques Pereira<br />
Departamento de Cirurgia Cabeça e Pescoço, Instituto Português de Oncologia de Coimbra<br />
Francisco Gentil, Coimbra, Portugal<br />
João Ganho<br />
Departamento de Cirurgia Cabeça e Pescoço, Instituto Português de Oncologia de Coimbra<br />
Francisco Gentil, Coimbra, Portugal<br />
Arnaldo Guimarães<br />
Serviço ORL, Departamento de Cirurgia Cabeça e Pescoço, Instituto Português de Oncologia de<br />
Coimbra Francisco Gentil, Coimbra, Portugal<br />
Correspondência:<br />
Ana Margarida Simões<br />
ana.simx@gmail.com<br />
Tlm: +351962574227<br />
em doença localmente controlada.<br />
Palavras-chave: glândulas salivares, adenoma pleomórfico,<br />
neoplasias epiteliais, adenóide cístico, carcinoma<br />
ABSTRACT<br />
Introduction: The pathology of the salivary glands is essentially<br />
inflammatory and neoplastic with very different biological<br />
behaviors.<br />
Material and methods: A retrospective review of cases of<br />
salivary gland surgery between 2005 and 2010 and the cases<br />
with histological diagnosis of malignant epithelial salivary<br />
gland neoplasm between 2000 and 2010.<br />
Results: Between 2005 and 2010, we studied 261 patients, 197<br />
cases of benign tumors and 64 malignant. The most frequent<br />
lesions were pleomorphic adenoma as benign lesion and<br />
squamous cell carcinoma as malignant lesion; The parotid was<br />
the most affected gland. The histological malignant epithelial<br />
cases between 2000 and 2010 revealed 55 cases with the most<br />
prevalent histological type being the adenoid cystic carcinoma<br />
(22%).<br />
Conclusions: In this analysis, tumor stage appears to be the<br />
most important prognostic factor in malignant epithelial<br />
salivary neoplasm. Radiation therapy has an important role<br />
as adjunctive therapy. Relapse rates are high in the long<br />
term and distant metastases can emerge even with locally<br />
controlled disease.<br />
Keywords: salivary glands, pleomorphic adenoma, epithelial<br />
neoplasms, adenoid cystic, carcinoma<br />
INTRODUÇÃO<br />
A patologia das glândulas salivares é essencialmente<br />
do tipo inflamatória e neoplásica. As neoplasias<br />
podem ser benignas ou malignas com múltiplos<br />
subtipos histológicos complexos que apresentam<br />
comportamentos biológicos muito diferentes e que<br />
colocam dificuldades diagnósticas devido ao largo<br />
espectro morfológico 1-5 .<br />
O objectivo primário deste estudo é caracterizar o tipo<br />
de lesões das glândulas salivares tratadas no IPO FG<br />
Coimbra e, dentro dessas, avaliar o comportamento<br />
biológico das lesões malignas.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 247<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
Secundariamente, pretendem-se retirar as conclusões<br />
possíveis quanto ao tratamento efectuado e controlo<br />
da doença.<br />
MATERIAL E MÉTODOS<br />
Procedeu-se a um estudo retrospectivo tendo por base<br />
os utentes com patologia de glândulas salivares tratados<br />
no IPO FG Coimbra.<br />
O estudo baseou-se na análise da informação clínica<br />
contida nos processos clínicos individuais.<br />
Foram avaliadas 2 populações:<br />
1. Avaliação dos casos submetidos a cirurgia de glândula<br />
salivar entre 2005 e 2010 – base: codificação clínica<br />
baseada em códigos cirúrgicos.<br />
2. Avaliação dos casos com diagnóstico histológico<br />
compatível com neoplasia maligna epitelial de glândula<br />
salivar entre 2000 e 2010 – base: codificação histológica.<br />
Após selecção inicial dos pacientes, foram excluídos:<br />
casos com informação clínica muito deficitária<br />
(praticamente nula), processos incacessíveis, processos<br />
com erros de codificação.<br />
Efectuada posteriormente avaliação estatística de<br />
dados demográficos, localização, factores de risco,<br />
exames complementares de diagnóstico, modalidades<br />
de tratamento, características histológicas, seguimento,<br />
recidivas e taxas de sobrevivência.<br />
As neoplasias malignas foram classificadas segundo a<br />
TNM-classification de tumores malignos da American<br />
Joint Committe for Cancer (AJCC).<br />
RESULTADOS<br />
Primeira fase:<br />
Da avaliação dos casos submetidos a cirurgida das<br />
glândulas salivares entre 2005 e 2010, identificaram-<br />
-se 318 casos, dos quais se excluiram 57 Casos por:<br />
informação insuficiente, mal classificados, glândulas<br />
salivares não atingidas/acometidas no caso de lesões<br />
malignas extrínsecas (isto porque nas benignas<br />
se incluiram algumas que não revelaram lesão),<br />
impossibilidade de consulta dos processos clínicos.<br />
Foram então avaliados 261 processos, de doentes<br />
com idades entre os 13 e 99 anos, média de idades<br />
de 57 anos. Verificou-se a existência de 200 casos<br />
com patologia benigna e 61 casos de malignidade,<br />
com média de idade de 54 e 68 anos respectivamente<br />
(Máximo 86 e 99 e Mínimo 13 e 23, respectivamente).<br />
248 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
FIGURA 1<br />
Idades distribuídas por intervalos e por tipo de patologia.<br />
Nota: Há 2 doentes sem informação de idade (1 com patologia<br />
maligna e 1 com patologia benigna).<br />
Em termos de distribuição por género, a nível global<br />
não houve prevalência significativa (Feminino:145<br />
casos (56%) vs Masculino: 116 casos (44%), embora se<br />
verificasse predomínio feminino nas lesões benignas<br />
(121 casos (61%)) e masculino nas lesões malignas (37<br />
casos (61%)).<br />
Em termos de tipos histológicos encontrados, entre<br />
as lesões benignas, o adenoma pleomórfico foi o mais<br />
frequente (123, 62%), seguido de Tumor de Whartin<br />
(Cistoadenoma papilar linfomatoso) (23, 12%).<br />
A Figura 2. descreve os tipos histológicos benignos<br />
encontrados.<br />
Em termos de lesões malignas, o Carcinoma Epidermóide<br />
(CEC) foi a lesão mais frequente (16, 26%), seguida de<br />
Linfoma (10, 16%). 32 (52%) eram lesões extrínsecas e<br />
29 (48%) referem-se a lesões intrínsecas epiteliais de<br />
glândula salivar.<br />
As Figuras 3A e 3B descrevem os tipos histológicos<br />
encontrados.<br />
Em termos de localização das lesões salivares, a<br />
glândula parótida, com ligeira preferência direita (55%),<br />
foi a glândula mais atingida quer nas lesões benignas ou<br />
malignas.<br />
A proporção maligno/benigno foi: 1:3 nas lesões<br />
parotídeas e 1:4 nas lesões submandibulares.<br />
Relativamente à avaliação por análise citológica após<br />
colheita com agulha fina:<br />
1. 82% (163) das lesões benignas foram avaliadas por<br />
este método, verificando-se 4% de falsos positivos <strong>para</strong><br />
malignidade.<br />
2. Das lesões malignas, 62% (38) foi avaliada pelo mesmo<br />
método, com 24% de falsos negativos <strong>para</strong> malignidade.<br />
Todos os casos foram submetidos a tratamento<br />
cirúrgico, tendo sido efectuadas: Submaxilectomia,<br />
Parotidectomia Superficial, Parotidectomia Total
FIGURA 2<br />
Tipos Histológicos Benignos<br />
FIGURA 3A<br />
Histologia das Lesões Malignas Extrínsecas<br />
Nota: Outros – Tumor primitivo neuroectodérmico (PNET) e<br />
Carcinoma de Merckel.<br />
com preservação do nervo facial, Parotidectomia<br />
Radical com ou sem Neuroplastia e alargada ou não<br />
às estruturas vizinhas, Parotidectomia Restante,<br />
Linfadenectomia Cervical (vários níveis), Reconstrução<br />
(retalhos) de acordo com a localização e achados pré e<br />
intra-operatórios.<br />
Segunda fase<br />
A base de pesquisa foi análise histológica compatível com<br />
neoplasia epitelial maligna de glandula salivar (major<br />
ou minor), entre 2000 e 2010, da qual se obtiveram 79<br />
casos. Excluiram-se 24 por serem incompatíveis com os<br />
FIGURA 3B<br />
Histologia das Lesões Malignas Intrínsecas. Ca. – Carcinoma<br />
diagnósticos histológicos pretendidos, após consulta<br />
dos respectivos processos clínicos.<br />
Avaliaram-se, portanto, 55 casos, com idades entre 23<br />
e 86 anos, média de idade de 60 anos, sem prevalência<br />
significativa em termos de género (56% Masculino, 44%<br />
Feminino). A grande maioria dos doentes tinha entre 41<br />
e 80 anos (47 - 86%).<br />
A localização mais frequente foi a glândula parótida (41,<br />
75%), seguida da glândula submandibular (11, 20%) e<br />
glandulas salivares minor (3, 5%, 2 casos na mucosa<br />
jugal e 1 caso na amigdala palatina); nenhum caso foi<br />
verificado a nível da glândula sublingual.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 249<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
O tempo de evolução da sintomatologia foi determinável<br />
em 37 doentes, com média de 13,2 meses de evolução;<br />
4 casos tinham longo tempo de evolução (anos) e 14<br />
(25%) não foi possível determinar este parâmetro.<br />
Clinicamente, associado à tumefacção local da glândula<br />
salivar, 10 doentes (18%) apresentavam dor inicial<br />
e 8 doentes (20% das apresentações parotídeas)<br />
apresentavam Paralisia Facial. Adenopatias cervicais<br />
iniciais foram clinicamente verificadas em 16 doentes<br />
(29%).<br />
A avaliação de eventuais factores de risco (Tabaco/<br />
Exposição a Radiação/Exposição a pó madeira/Etilismo/<br />
Diabetes/Imunodepressão) foi muito pouco proveitosa:<br />
raramente eram relatados estes antecedentes;<br />
verificados casos esporádicos de fumadores e diabéticos;<br />
nenhum doente com antecedentes de Radioterapia (RT)<br />
por outra causa na Cabeça e Pescoço.<br />
A avaliação complementar foi efectuada por Ecografia,<br />
Tomografia Computorizada (TC) cervical e colheita de<br />
material biológico <strong>para</strong> citologia por agulha fina.<br />
A Tabela 1 traduz a proporções das avaliações<br />
complementares de diagnóstico.<br />
Verificaram-se 33% de falsos negativos <strong>para</strong> malignidade<br />
nas análises citológicas efectuadas.<br />
TABELA 1<br />
Avaliação complementar. TC: Tomografia Computorizada;<br />
FNAB: Biópsia aspirativa por agulha fina.<br />
Ecografia 26 (47%)<br />
TC 40 (72%)<br />
FNAB 45 (82%)<br />
Maligno 24 (53%)<br />
Benigno 15 (33%)<br />
Inconclusivo 6 (13%)<br />
Em termos histológicos concluiu-se por um diagnóstico<br />
histológico em 53 casos. A Figura 4 traduz os resultados<br />
encontrados.<br />
Foram também classificados em termos de grau<br />
histológico: alto grau 24 (45%), Baixo grau 16 (30%),<br />
Médio grau 8 (15%) e Incerto 5 (10%).<br />
Histologicamente, verificou-se positividade ganglionar<br />
em 18 casos (34%) e negatividade em 66%.<br />
A classificação em estadios segundo o AJCC revelou<br />
sobretudo Estadios II (21 casos, 38%) e IV A (17 casos,<br />
31%). Estadio I em 11 casos (20%), II em 4 casos (7%) e<br />
IV B em 2 casos (4%).<br />
Em termos de actuação terapêutica, todos os doente<br />
foram submetidos a ressecção cirúrgica com excepção<br />
de 2 casos que correspondem aos casos com Estadio<br />
mais avançado (IV B) que receberam apenas terapêutica<br />
paliativa.<br />
250 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
FIGURA 4<br />
Proporções dos Tipos Histológicos. Ca. – Carcinoma<br />
A ressecção cirúrgica foi variável desde a sialoadenectomia<br />
conservadora a exéreses mais alargadas com<br />
plastia nervosa ou não e retalho cutâneo/miocutâneo<br />
de reconstrução ou não. A associação a Linfadenectomia<br />
cervical foi efectuado em 28 doentes (53%), sendo<br />
mais ou menos alargado dependento dos achados<br />
intraoperatórios, estadio inicial, localização ou decisão<br />
terapêutica posterior à cirurgia inicial.<br />
Relativamente a terapêutica complementar por RT,<br />
25 doentes não fizeram qualquer tipo de radiação. 24<br />
(44%) foram submetidos a RT pós-cirúrgica (incluindo 2<br />
após recidiva local) sobre loca de glândula salivar e/ou<br />
região cervical. 2 (4%) doentes efectuaram RT paliativa<br />
local e 7 (13%) paliativa por metastização à distância<br />
(holocraneana ou óssea). Salienta-se que 8 doentes<br />
(16%) tiveram indicação <strong>para</strong> RT pós-cirúrgica, mas que<br />
não foi efectuada (ultrapassada data óptima por várias<br />
razões). As doses administradas variaram de 50,4Gy/28<br />
a 68,4Gy/38fr, sendo mais frequentemente 59,4Gy/33fr<br />
sobre a loca cirúrgica e região cervical.<br />
10 doentes (18%) efectuaram terapêutica citostática<br />
(70%: Protocolo CLF – Carboplatina + Folinato de<br />
Cálcio + Fluoruracilo). Esta terapêutica foi efectuada<br />
por: metastização à distância (6), doença localmente<br />
avançada (3) e por recidiva (1).<br />
Em termos de recidiva de doença, dos doente<br />
submetidos a cirurgia, 13 (25%) tiveram recidiva local e<br />
4 (6%) recidiva ganglionar associada.<br />
Metástases à distância foram verificadas, ao longo do<br />
tempo de seguimento ou de início, em 15 doentes (28%).<br />
Os locais de metastização foram maioritariamente<br />
pulmonar (11 - 73%) e ósseo (6 - 40%). Houve também<br />
metastização craneana (4 - 27%) e hepática (1 - 7%).<br />
Salientas-se que 9 doentes apresentavam doença
localmente controlada, mas desenvolveram metástases<br />
à distância, sendo que 5 (56%) se encontravam no<br />
Estadio IV A. Os tipos histológicos foram variados sem<br />
preferência <strong>para</strong> determinada entidade. Dos doentes<br />
com metastização à distância sem recidiva local: 6<br />
(67%) tinham invasão vascular no exame histológico (3<br />
indeterminados); no entanto, salienta-se que, também<br />
desses, 7 (78%) apresentavam margens cirúrgicas<br />
invadidas e (2 (22%) com margens seguras). Daqueles<br />
ainda: 7 (78%) fizeram RT pos-cirúrgica (apenas 1 tinha<br />
indicação e não fez (por M1 extensa)); dos 2 doentes<br />
com histologia com margens seguras houve 1 que fez RT<br />
(adenocarcinoma pouco diferenciado). O tempo médio<br />
de seguimento global destes doentes nesta avaliação<br />
foi de 49 meses. As taxas de sobrevivência globais estão<br />
descritas na tabela 2.<br />
TABELA 2<br />
Taxas de sobrevivência globais<br />
Taxas<br />
Sobrevivência<br />
Globais<br />
1<br />
Ano<br />
42<br />
em<br />
44<br />
(95%)<br />
5<br />
anos<br />
18<br />
em<br />
23<br />
(78%)<br />
10<br />
anos<br />
3 em 8<br />
(38%)<br />
O tempo mínimo de sobrevivência, nesta série, desde o<br />
diagnóstico, foi de 2 meses e o máximo de 130 meses.<br />
Procedeu-se também a com<strong>para</strong>ção das taxas de<br />
sobrevivência, tendo como variáveis o tamanho da<br />
TABELA 3<br />
Taxas de sobrevivência por Tamanho da lesão.<br />
Nota: Indeterminado: 5 (10%).<br />
lesão (superior e inferior a 4cm), grau histológico (Alto,<br />
médio e baixo grau) e estadio clínico, tendo-se obtido os<br />
resultados abaixo descritos nas tabelas 3, 4 e 5.<br />
DISCUSSÃO<br />
As lesões das glândulas salivares, apresentam-se<br />
clinicamente sob a forma de tumefacção de crescimento<br />
mais ou menos rápido, com várias localizações possíveis.<br />
Existe uma grande variedade de diagnósticos<br />
histológicos como se relata na literatura internacional 1-5<br />
e que são fonte de dúvidas e miscelânias 2 .<br />
As lesões benignas são as mais frequentes, destacando-<br />
-se, sem dúvida, o adenoma pleomórfico (tumor benigno<br />
misto bifásico frequentemente capsulado), que, apesar<br />
de se tratar de neoplasia benigna, tem a capacidade<br />
de recidivar e sofrer transformação maligna 1 . A sua<br />
excisão cirúrgica completa é fundamental, embora a<br />
preservação de estruturas anatómicas adjacentes seja<br />
um factor limitante e de preocupação 1 – o objectivo<br />
será a remoção intacta do tumor e a preservação de<br />
estruturas saudáveis como o nervo facial 2 .<br />
Relativamente às lesões malignas intrínsecas,<br />
contrariamente à literatura 1,4 , o tipo histológico<br />
mais frequente foi o carcinoma adenóide cístico e<br />
secundariamente o carcinoma mucoepidermóide.<br />
Este último, representa, em grandes séries, 30% das<br />
neoplasias das glândulas salivares 4 , e clinicamente<br />
Tamanho da lesão 4cm<br />
40 (73%) 15 (27%)<br />
Taxa de sobrevivência a 1 ano 29 vivos em 31 (94%) 13 vivos em 13 (100%)<br />
Taxa de sobrevivência aos 5 anos 13 vivos em 16 (81%) 5 vivos em 7 (71%)<br />
Taxa de sobrevivência aos 10 anos 2 vivos em 6 (33%) 1 vivo em 2 (50%)<br />
TABELA 4<br />
Taxas de sobrevivência por Grau Histológico<br />
Grau Alto 24 (45%) Médio 24 (45%) Baixo 24 (45%)<br />
Taxa de sobrevivência a 1 ano 19 vivos em 20 (100%) 7 vivos em 7 (100%) 12 vivos em 12 (100%)<br />
Taxa de sobrevivência aos 5 anos 4 vivos em 8 (50%) 4 vivos em 5 (80%) 8 vivos em 8 (100%)<br />
Taxa de sobrevivência aos 10 anos 1 vivo em 4 (25%) 2 vivos em 3 (67%) 0 vivos em 1 (0%)<br />
TABELA 5<br />
Taxas de Sobrevivência por Estadio (AJCC).<br />
Estadio I II III IV A IV B<br />
Taxa de sobrevivência a 1 ano 9 vivos em 9<br />
(100%)<br />
Taxa de sobrevivência aos 5 anos 2 vivos em 2<br />
(100%)<br />
Taxa de sobrevivência aos 10 anos 0 vivo em 0<br />
(0%)<br />
18 vivos em 18<br />
(100%)<br />
10 vivos em 10<br />
(80%)<br />
3 vivos em 4<br />
(75%)<br />
3 vivos em 3<br />
(100%)<br />
2 vivos em 3<br />
(67%)<br />
1 vivos em 2<br />
(50%)<br />
12 vivos em 14<br />
(100%)<br />
4 vivos em 8<br />
(50%)<br />
0 vivos em 2<br />
(0%)<br />
0 vivos em 2<br />
(0%)<br />
-<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 251<br />
-<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
pode mimetizar um adenoma pleomórfico, sendo que<br />
dor local, alterações neurológicas e rápido crescimento<br />
favorecem a presença de uma lesão de alto grau 1 .<br />
Esta série revelou também um grande número de<br />
lesões extrínsecas metastáticas <strong>para</strong> as glândulas<br />
salivares, nomeadamente a glândula parótida. Mais<br />
frequentemente implicados estão as lesões cutâneas<br />
como o carcinoma espinhocelular e o melanoma<br />
maligno 1 , sendo que nesta série se destacam também<br />
as doenças linfoproliferativas. Este tipo de lesões, pode<br />
implicar excisões mais alargadas com aumento da<br />
morbilidade, mas a tendência será <strong>para</strong> cirurgia o mais<br />
conservadora possível, deixando as excisões extensas<br />
com necessidade de sacrifício de estruturas nobres e<br />
reconstruções mais ou menos complexas <strong>para</strong> os casos<br />
de doença recidivante ou invasiva 1 .<br />
Foi evidente, na nossa série, que o género masculino<br />
e idade avançada revelaram mais lesões malignas,<br />
embora internacionalmente, a maioria das séries não<br />
haja prevalência de género nem tendência evidente<br />
<strong>para</strong> ocorrer em idades particularmente tardias – são<br />
frequentes no adulto 1 , na 5ª/6ª décadas 2 , podendo, no<br />
entanto, ocorrer raramente em crianças.<br />
Relativamente à pesquisa de eventuais factores de<br />
risco (como os mencionados), é nossa opinião que<br />
o facto de não terem sido pesquisados activamente,<br />
provavelmente condicionou os resultados obtidos. A<br />
irradiação externa da cabeça e pescoço é um conhecido<br />
factor de risco e o tabaco está possivelmente implicado<br />
no desenvolvimento de Tumor de Warthin 2 .<br />
A citologia como método diagnóstico pode dar<br />
informações importantes, mas cujos resultados estão<br />
muito dependentes de uma técnica meticulosa, que<br />
sendo simples não é trivial 1 . Nesta série verificou-se<br />
uma taxa elevada de falsos negativos, o que pode estar<br />
relacionada com este factor.<br />
A cirurgia é o tratamento de escolha <strong>para</strong> a patologia<br />
neoplásica salivar 3 . Terapêuticas alternativas apresentam-<br />
-se como opções adjuvantes.<br />
A RT pós-operatória parece reduzir o risco de recidiva<br />
loco-regional e aumentar ligeiramente a sobrevida<br />
global 1 , por controlo de doença residual. De acordo com<br />
a literatura, RT pós-operatória está indicada nos casos<br />
de: margens positivas, nódulos linfáticos positivos,<br />
carcinomas de alto grau, estadio avançado ou casos<br />
recorrentes. A RT isolada só estará indicada nos casos<br />
de tumores inoperáveis ou metastização extensa, com<br />
intenção paliativa 2,3 .<br />
A RT também tem um papel benéfico como terapêutica<br />
adjuvante na recorrência multinodular de adenomas<br />
pleomórficos 2 .<br />
Os diferentes tipos histológicos podem responder<br />
252 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
de forma significativamente diferente a agentes<br />
quimioterápicos (QT), mas não há recomendações<br />
baseadas em evidências concretas que suportem<br />
a utilização rotineira de QT adjuvante 1 . Por isto,<br />
geralmente reserva-se o uso de QT <strong>para</strong> paliação de<br />
sintomas devido a doença localmente recorrente ou<br />
metastática 1,3 . A maioria dos casos provavelmente<br />
corresponderão a carcinomas adenóides císticos,<br />
mucoepidermóides ou adenocarcinomas de alto grau 1 .<br />
A opção por terapêutica com agente único ou de<br />
combinação pode ser feita tendo em conta o potencial<br />
de toxicidade 1 .<br />
Dos factores que afectarão a sobrevida nas neoplasias<br />
malignas das glândulas salivares, o mais importante<br />
será o estadiamento (intimamente relacionado com<br />
o tamanho da lesão), que se sobrepõe ao grau<br />
histológico 2,3 . De uma forma semelhante, o tamanho<br />
do tumor e o grau histológico são os melhores factores<br />
preditivos de adenopatias cervicais regionais 2 . Os<br />
factores preditores de mestastização à distância serão o<br />
tamanho da lesão, presença de adenopatias e extensão<br />
local, embora percentagem significativa de doentes com<br />
doença localmente controlada desenvolvam metástases<br />
à distância, o que sugere disseminação microscópica<br />
prévia à ressecção cirúrgica 2 – os resultados da nossa<br />
série foram consistentes com esta observação.<br />
A avaliação das taxas de sobrevivência aos 5 e 10 anos,<br />
é apenas indicativa, porque há poucos casos, sobretudo<br />
com o evoluir dos anos (60 e 120 meses), nesta série.<br />
Tendo sempre em conta o pequeno número amostral<br />
na com<strong>para</strong>ção destas taxas, pode aceitar-se que, <strong>para</strong><br />
esta série, em termos de taxas de sobrevivência:<br />
1. Tamanho da lesão: não se verificaram diferenças<br />
significativas – os resultados não são consistentes num<br />
ou noutro sentido.<br />
2. Grau histológico: alto grau corresponde a taxas de<br />
sobrevivência menores.<br />
3. Estadio clínico: estadios mais elevados são<br />
consistentes com taxas de sobrevivência menores ao<br />
longo do tempo.<br />
CONCLUSÕES<br />
As lesões salivares malignas, sendo lesões raras e<br />
morfologicamente difíceis de avaliar e classificar, ainda<br />
colocam dúvidas prognósticas e terapêuticas. Devido à<br />
grande variedade morfológica, tal como demonstrado<br />
neste estudo, revela-se difícil de homogeneizar<br />
entidades e prever comportamentos. A base terapêutica<br />
é sobretudo cirúrgica e um seguimento a longo prazo<br />
é necessário, em virtude da possibilidade de recidivas<br />
tardias, locais e/ou à distância.
AGRADECIMENTOS<br />
Todos os profissionais de sáude do Departamento de<br />
Cirurgia de Cabeça e Pescoço do IPOFG Coimbra, nos<br />
seus diversos serviços.<br />
Todos os funcionários do Arquivo Clínico do IPOFG<br />
Coimbra.<br />
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ARTIGO<br />
47-3: 141-144.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 253
DATAS LIMITES<br />
PARA SUBMETER COMUNICAÇÕES CIENTÍFICAS<br />
CONGRESSO NACIONAL DA <strong>SPORL</strong>-CCF<br />
Viseu, 28 de Abril a 1 de Maio, 2012<br />
DATA LIMITE PARA ENVIO DE ABSTRACTS DE COMUNICAÇÕES<br />
ORAIS E POSTERS<br />
28 DE FEVEREIRO DE 2012<br />
DATA LIMITE PARA ENVIO DOS MANUSCRIPTOS DAS<br />
COMUNICAÇÕES ORAIS PARA PUBLICAÇÃO NA REVISTA<br />
PORTUGUESA DE ORL-CCF<br />
31 DE MARÇO DE 2012<br />
254 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Complicaciones de la cirugía tiroidea:<br />
Control y tratamiento<br />
Complications of thyroid surgery:<br />
Control and treatment<br />
Solís Vázquez R. Ambel Albarrán A. Pereda Tamayo J.M. Trinidad Ruiz G. Torrico Román P. Pantoja Hernández C.G.<br />
Rejas Ugena E.<br />
RESUMEN<br />
Introducción:Existen nódulos tiroideos mayores de 1 cm<br />
en el 4% de la población. La indicación más frecuente de<br />
cirugía es el bocio multinodular, aumentando la incidencia<br />
en áreas con déficit de iodo. El diagnóstico de cáncer papilar<br />
en pacientes intervenidos por bocio se cifra entre un 7-14%,<br />
siendo el cáncer tiroideo la tumoración glandular maligna más<br />
frecuente.<br />
Material y métodos: Hemos realizado un estudio retrospectivo<br />
de los pacientes intervenidos por patología tiroidea desde<br />
2007 hasta 2009. Recopilamos datos epidemiológicos , la<br />
indicación quirúrgica y las complicaciones de la cirugía<br />
glandular como son la hipocalcemia o la parálisis recurrencial.<br />
Resultados: De la 139 intervenciones revisadas, la indicación<br />
de cirugía más frecuente fue el nódulo tiroideo (43.88%) y el<br />
bocio multinodular (38.84%).Existe un 28% de discrepancias<br />
pre/ postoperatorias en el resultado de la anatomía patológica.<br />
En todos estos casos, la PAAF (punción aspiración con aguja<br />
fina) preoperatoria era de bocio coloide, sin embargo tras la<br />
cirugía, se localizaron focos de microcarcinoma papilar en la<br />
pieza remitida <strong>para</strong> estudio patológico. El 27% presentaron<br />
hipocalcemia transitoria tras la cirugía. En 2 casos se evidenció<br />
una parálisis permanente del nervio laríngeo recurrente<br />
inferior. El 15.82 % de los bocios presentaban una extensión<br />
intratorácica.<br />
Solís Vázquez R.<br />
Servicio de Otorrinolaringología. Complejo Hospitalario Universitario de Badajoz (España)<br />
Ambel Albarrán A.<br />
Servicio de Otorrinolaringología. Complejo Hospitalario Universitario de Badajoz (España)<br />
Pereda Tamayo J.M.<br />
Servicio de Otorrinolaringología. Complejo Hospitalario Universitario de Badajoz (España)<br />
Trinidad Ruiz G.<br />
Servicio de Otorrinolaringología. Complejo Hospitalario Universitario de Badajoz (España)<br />
Torrico Román P.<br />
Servicio de Otorrinolaringología. Complejo Hospitalario Universitario de Badajoz (España)<br />
Pantoja Hernández C.G.<br />
Servicio de Otorrinolaringología. Complejo Hospitalario Universitario de Badajoz (España)<br />
Rejas Ugena E.<br />
Servicio de Otorrinolaringología. Complejo Hospitalario Universitario de Badajoz (España)<br />
Correspondência:<br />
Raquel Solís Vázquez<br />
ra.so.va@hotmail.com<br />
Teléfono: +34669140316<br />
Dirección: Castillo Puebla de Alcocer 73 portal 1, BADAJOZ CP.06006<br />
Discusión e Conclusiones: Se debe realizar un control<br />
postoperatorio de las cifras de calcio de forma diaria y con<br />
pauta de tratamiento doble si cifras menores de 7.2 mg/<br />
dl o inferiores a 8 mg/ dl en pacientes sintomáticos. Las<br />
parálisis permanentes recurrenciales resultantes fueron en<br />
pacientes intervenidos por cáncer papilar de tiroides lo que<br />
apoya la necesidad de monitorización del nervio recurrente<br />
en la cirugía tumoral maligna. La vía de abordaje de todos<br />
los bocios con extensión intratorácica fue cervical sin<br />
necesidad de realizar esternotomía. La cirugía de tiroides<br />
no está exenta de complicaciones y secuelas permanentes<br />
como parálisis recurrencial o hipocalcemia. La experiencia<br />
del otorrinolaringólogo en la cirugía cervical juega un<br />
papel fundamental en la reducción de complicaciones. Se<br />
debe realizar indicaciones y protocolos conjuntos con otros<br />
servicios como Endocrinología.<br />
Palabras claves: Cirugía de tiroides, nervio laringeo recurrente,<br />
carcinoma micropapilar, hipocalcemia<br />
ABSTRACT<br />
Introduction and goals: Thyroid nodules occur in 4% of the<br />
population. The most common indication for thyroid surgery<br />
is a multinodular goiter, increasing in areas with iodine<br />
deficiency. The diagnosis of thyroid carcinoma in patients<br />
operated on for multinodular goiter is between 7-14%.Thyroid<br />
cancer is the most common malignant glandular tumor.<br />
Methods: We performed a retrospective study on patients<br />
operated of thyroid pathology from 2007 to 2009 .We identified<br />
epidemiological data, surgical indication and complications of<br />
the surgery glandular as hypocalcemia or recurrent palsy.<br />
Results: A total of 139 patients were studied. The most common<br />
indications for surgery were thyroid nodule (43.88%) and<br />
multinodular goiter (38.84%). There was a 28% discrepancy<br />
between pre/postoperative results on pathological anatomy.<br />
In all these cases, preoperative FNAC (fine-needle aspiration<br />
cytology) had a result of colloid goiter, in contrast to the<br />
histopathology of the surgical specimen, in which localized<br />
foci of papillary microcarcinoma were found. After surgery<br />
27% of patients had temporary hypocalcemia. Two cases of<br />
139 patients showed permanent recurrent palsy. Intrathoracic<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 255<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
goiter was identified in 15.82% of patients.<br />
Discussion and Conclusions: There must be a daily monitoring<br />
of postoperative calcium levels. We recommend treatment<br />
with calcium (oral and intravenous) if lower levels of 7.2mg/<br />
dl or less than 8mg/dl but in patients with signs / clinical<br />
hypocalcemia. Recurrent permanent palsy were in patients<br />
operated on papillary carcinoma. The surgical approach in<br />
the case of intrathoracic goiter was cervical access without<br />
requiring sternotomy. Thyroid surgery is not without<br />
complications and permanent damage such as recurrent<br />
palsy or hypocalcemia. The experience of the otolaryngologist<br />
in cervical surgery have a key role in reducing of the<br />
complications. Indications should be performed protocols<br />
with other services such as Endocrinology.<br />
Keywords: Thyroid surgery, recurrent laryngeal nerve, papillary<br />
microcarcinoma, hypocalcemia.<br />
INTRODUCCIÓN<br />
La patología tiroidea es frecuente, con presencia en el<br />
0.5-1% de la población en general, siendo el 90% de los<br />
nódulos, adenomas eutiroideos¹.<br />
La decisión de cirugía viene marcada por la sospecha<br />
de malignidd, el aumento de tamaño, la presencia de<br />
clínica compresiva e incluso por motivos estéticos. La<br />
indicación más frecuente de cirugía tirodea es el bocio<br />
multinodular no tóxico (70.4%)².<br />
El cáncer tiroides es el tumor glándular más frecuente³.<br />
La incidencia mundial 0.5-10:100000 habitantes.La<br />
sospecha aparece con la existencia de nódulos fríos.<br />
Según los estudio hasta el 8.6% de los nódulos fríos<br />
son malignos³. El cáncer papilar representa la entidad<br />
maligna tiroidea más frecuente con una mortalidad del<br />
10%⁴. Los factores de riesgo asociados son antecedentes<br />
de radicación o existencia de un bocio multinodular.<br />
MATERIAL Y MÉTODOS<br />
Los objetivos de este estudio son realizar una revisión<br />
de los pacientes intervenidos en nuestro servicio<br />
por patología tiroidea (incluyendo origen benigno/<br />
maligno) atendiendo a los protocolos clínicos y<br />
terapéuticos establecidos en conjunto con el Servicio<br />
de Endocrinología.<br />
Se ha realiza un estudio observacional, descriptivo y<br />
retrospectivo durante un periodo de dos años desde<br />
enero 2007 a Marzo 2009, siendo un total de 139<br />
intervenciones.<br />
Se han recogido datos epidemiológicos, la indicación<br />
de la cirugía, intervención realizada y diagnóstico<br />
postoperatorio. Se han reflejado las complicaciones<br />
más temidas de la cirugía tiroidea (hipocalcemia y la<br />
parálisis nervio recurrente). Finalmente com<strong>para</strong>mos los<br />
resultados de anatomía patológica pre/postoperatoria.<br />
Indicaciones<br />
256 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
Los pacientes son derivados desde el servicio<br />
de Endocrinología tras estudio. Los criterios son<br />
establecidos conjuntamente por ambos servicios según<br />
protocolo. Son los siguientes:<br />
• Bocio multinodular ( figura1)<br />
• Nódulo tiroideo<br />
• Mayor de 3 cm sospechoso de malignidad<br />
• Tóxico<br />
• No control médico<br />
• Clínica: Disfonia, disfagia, disnea<br />
• Estético<br />
• Cáncer tiroideo<br />
• Tiroiditis de Riedel<br />
• Enfermedad de Graves con mal control<br />
médico,embarazo, bocio grande, contraindicación o<br />
rechazo del tratamiento médico.<br />
El estudio preoperatorio del paciente incluye ecografía,<br />
PAAF y gammagrafía. Se reserva la utilización de TAC<br />
cervical <strong>para</strong> bocios de gran dimensión y con sospecha<br />
de prolongación intratorácica.<br />
FIGURA 1<br />
Bocio multinodular<br />
Control postoperatorio cifras de calcio<br />
Se realiza por protocolo un control de las cifras de calcio<br />
previo a la cirugía, el día de la intervención y cada día<br />
durante el ingreso . Se indica tratamiento con calcio<br />
cuando las cifras son menores de 7.2 mg/dl o entre<br />
7.2-8 mg/ dl pero el paciente presenta clínica/signos<br />
de hipocalcemia (parestesias, Chvostek o Trousseau<br />
positivos).El objetivo del tratamiento es reinstaurar un<br />
nivel de calcio corregido de 9-10mg/dl (figura2) .A las<br />
24-48h de iniciar el tratamiento con Calcio intravenosos<br />
+ vía oral (si la respuesta es adecuada) debe reducirse
FIGURA 2<br />
Protocolo de tratamiento hipocalcemia<br />
la dosis del primero y aumentarse la del segundo<br />
progresivamente hasta mantener una administración<br />
oral exclusivamente a lo largo de las 48-72h siguientes.<br />
Este tratamiento debe complementarse con una dieta<br />
rica en calcio.<br />
Recomendaciones postoperatorias al alta<br />
Dieta blanda durante los primeros días, mantener la<br />
cabeza en alto, durmiendo con 2-3 almohadas. Los<br />
puntos de aproximación se mantiene durante 7-10 días.<br />
Son retirados en la consulta de revisión. Lavar la herida<br />
tras retirada de puntos, evitar la exposición solar y<br />
utilizar protección máxima durante 6 meses.<br />
Por parte del servicio de Endocrino se indica a los<br />
pacientes intervenidos de tiroidectomía total, la toma de<br />
levotiroxina 75 microgramos ( Eutirox®), hasta revisión<br />
por parte de Endocrinología. Control ambulatorio tras<br />
alta por parte de su médico de Familia.<br />
RESULTADOS<br />
La edad media de los pacientes intervenidos fue de<br />
49.43 años (rango 16 a 78) con alta prevalencia de<br />
mujeres (88%). En todas las intervenciones optamos por<br />
el abordaje abierto.<br />
La indicación de la cirugía fue de nódulo tiroideo<br />
(61 casos), bocio multinodular (54 casos) (figura3)<br />
.Referente a la patología tumoral maligna ,el cáncer<br />
papilar representa 19 casos de la muestra, encontramos<br />
otros casos tumorales tiroideos únicos como medular<br />
de tiroides y angiosarcoma tiroideo. Más de la<br />
mitad de las intervenciones (53%) realizadas fueron<br />
hemitoidectomías, tiroidectomías totales (42%),siendo<br />
el 7% de estas tiroidectomías totales completadas con<br />
vaciamientos cervicales por afectación tumoral maligna.<br />
El 5,03% fueron reintervenidos <strong>para</strong> realización<br />
de hemitiroidectomía contralateral por resultados<br />
patológicos de malignidad en hemitiroidectomía previa<br />
(figura4).<br />
FIGURA 3<br />
Indicaciones de la cirugía glándular<br />
FIGURA 4<br />
Bocio multinodular<br />
La complicación médica más frecuente tras tiroidectomía<br />
total, fue la hipocalcemia apareciendo en el 27 % de<br />
los pacientes. Siempre de forma transitoria, pero que<br />
precisaron tratamiento y prolongación de la estancia<br />
hospitalaria a 6.42 días de media.<br />
El 43% de los pacientes con hipocalcemia fue intervenido<br />
por cáncer papilar.La lesión del nervio recurrente<br />
laríngeo inferior definitiva apareció en el 1%. En<br />
otros 7 pacientes se evidenció una paresia transitoria<br />
recuperada en la revisión en la consulta a los 20 días.<br />
La estancia media fue de 4.35 días. Por protocolo, los<br />
pacientes intervenidos por tiroidectomía total recibían<br />
el alta a las 48 horas, las hemitoidectomías a las 24<br />
horas.<br />
DISCUSIÓN<br />
El bocio multinodular es la patología tiroidea más<br />
intervenida, aumentando los casos en zonas endémicas<br />
con déficit de iodo².Sin embargo en nuestra serie la<br />
indicación más frecuente fue la presencia de nódulo<br />
tiroideo sospechoso de malignidad (43.88%), siendo el<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 257<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
ocio multinodular la segunda indicación más frecuente<br />
(38.84%).<br />
La indicación quirúrgica es mediada por el mal control<br />
médico, alergia a algún componente del tratamiento,<br />
rechazo al Iodo o la presencia de bocio de gran tamaño⁵.<br />
Cuando la glándula crece hacia el tórax, produce un<br />
conflicto de espacio a nivel del estrecho torácico<br />
superior. El paciente presentará un aumento de la<br />
circulación colateral cervical, disnea disfagia e incluso<br />
aparición de disfonía por compresión del nervio<br />
recurrente⁶. En series consultada, el 3% de los bocios<br />
son intratorácicos⁷, en nuestra revisión el porcentaje<br />
fue más elevado (15.82%). Las intervenciones por<br />
bocio intratorácico fueron realizadas con la presencia<br />
del cirujano torácico, sin embargo el acceso <strong>para</strong> la<br />
tiroidectomía fue cervical en el 100% de los casos sin<br />
precisar esternotomía media <strong>para</strong> la extracción de la<br />
glándula.<br />
Se considera que entre el 75-80% de los cánceres de<br />
tiroides son de estirpe papilar⁸. En nuestra serie el<br />
13.66% de los pacientes fueron intervenidos por cáncer<br />
de tiroides, siendo el cáncer papilar la histología maligna<br />
más frecuente. El hallazgo de cáncer de tiroides en<br />
pacientes intervenidos con el diagnóstico preoperatorio<br />
de bocio multinoduar se cifra entre 7-17%³ , por lo que<br />
no debemos infravalorar el riesgo de malignización del<br />
bocio, sobre todo si existencia de nódulo dominante<br />
o solitario. Este dato motivó la com<strong>para</strong>ron de los<br />
resultados de PAAF pre/postoperatoria.En 16% no fue<br />
posible ya que no existía resultados preoperatorios.<br />
En el 56% de los pacientes los resultados fueron<br />
coincidentes, pero en el 28% existió una discrepancia,<br />
siendo la muestra preoperatoria benigna y el resultado<br />
diferido postoperatorio informado como maligno.<br />
(figura 5).El diagnóstico de más de la mitad de estos<br />
resultados discordantes fue carcinoma micropapilares<br />
de tiroides (11 casos).<br />
Según a OMS ,el carcinoma micropapilar es un tumor<br />
papilar de menos de 1 cm. Presentan un buen pronóstico<br />
con < 3% de mortalidad. La extensión viene marcada<br />
por la existencia de enfermedad bilateral en el 19.8%⁹.<br />
Baudin analizó 281 pacientes encontrando tumor<br />
micropapilar multifocal asociando un mayor riesgo<br />
de recidiva, por lo que recomienda tratamiento con I<br />
131 radiactivo en pacientes con lesiones multifocales<br />
micropapilares².<br />
En nuestra serie, tras hallazgo incidental en hemitiroidectomía<br />
de carcinoma micropapilar, completamos<br />
hasta la tiroidectomía total (5,03% en nuestra serie).<br />
No realizamos técnicas parciales entendiendo que la<br />
posibilidad de recidiva es mayor.<br />
La complicación más frecuente tras tiroidectomía total<br />
258 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
FIGURA 5<br />
Resultados definitivos Anatomía Patológica<br />
es la aparición de hipocalcemia. El porcentaje total<br />
fue del 27%. Todos los casos de hipocalcemia fueron<br />
transitorios. En las series consultadas estos cifras son<br />
muy variables, desde 8.4% 10 hasta el 50%¹¹, lo que<br />
identifica una discrepancia entre los hallazgos analíticos<br />
y clínicos del paciente.<br />
Por parte del cirujano es importante la localización al<br />
menos de dos <strong>para</strong>tiroides durante la intervención de<br />
tiroidectomías totales<br />
En los pacientes con clínica de hipocalcemia postquirúrgica,<br />
se localizaron el 100% glándulas <strong>para</strong>tiroides en el 8<br />
pacientes, 75% en dos pacientes, 50% en 6 casos, 3<br />
casos no se localizó ninguna. En el caso de <strong>para</strong>tiroides<br />
intracapsulares es preciso realizar un trasplante de la<br />
glándula en el esternocleidomastoideo.<br />
En series consultadas, se reserva el tratamiento con<br />
calcio intravenoso <strong>para</strong> pacientes con tetania¹¹.<br />
En nuestro servicio optamos por el doble tratamiento<br />
con calcio ( intravenoso/oral) cuando la cifra analítica<br />
es menor de 7.2 mg/dl o menor a 8 mg/ml pero con<br />
la presencia de clínica. El objetivo del tratamiento<br />
simultaneo, es restaurar en la mayor brevedad posible<br />
la calcemia y evitar la persistencia de la clínica. Durante<br />
su ingreso realizamos un control preoperatorio y<br />
postoperatorio diario de las cifras de calcio.<br />
Una de las secuelas más importantes tras la cirugía, es<br />
la lesión del nervio laríngeo recurrente. Esta puede<br />
ser de corta duración o permanente. No es infrecuente<br />
su paresia transitoria por presión, termocauterización<br />
o sección incompleta del mismo durante la cirugía.La<br />
parálisis definitiva oscila entre 0-11%¹³ en nuestra serie<br />
se evidenció en dos pacientes(1%), ambos intervenidos<br />
por cáncer papilar.<br />
Los porcentajes de parálisis con/sin monitorización en
manos experimentadas son semejantes¹⁴.<br />
No realizamos la monitorización del nervio recurrente<br />
de forma rutinaria, reservando la misma <strong>para</strong> casos<br />
presumiblemente complicados por patología maligna<br />
tiroidea.<br />
CONCLUSIONES<br />
El conocimiento del otorrinolaringólogo de la anatomía<br />
cervical y la experiencia son claves en la cirugía tiroidea.<br />
Es fundamental la localización el nervio laríngeo<br />
recurrente y las glándulas <strong>para</strong>tiroideas <strong>para</strong> evitar<br />
secuelas permanentes. El control de la calcemia debe<br />
continuar a nivel postoperatorio y de forma diaria ya<br />
que cifras bajas de calcio pueden aparecen en pacientes<br />
asintomáticos.<br />
La presencia de cáncer micropapilar oculto de esta<br />
serie (hasta en un 28% de los pacientes), nos obliga a<br />
establecer protocolos de actuación ante el hallazgo<br />
indidental de cáncer de tiroides menor de < 1cm y un<br />
seguimiento de los bocios multinodulares.<br />
La colaboración con otros servicios como Endocrino,<br />
Anatomía patológica y Cirugía Torácica permite la<br />
realización estos protocolos y determina indicaciones<br />
claras <strong>para</strong> cirugía tiroidea.<br />
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VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 259<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
260<br />
REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Surdez neuro-sensorial súbita idiopática -<br />
Resultados após 3 anos de implementação de<br />
protocolo terapêutico<br />
Idiopathic sudden sensorineural hearing loss -<br />
Results after 3 years of therapeutic protocol<br />
implementation<br />
João Diogo Martins Vítor Certal Tiago Santos Hélder Silva Hugo Amorim Carlos Carvalho<br />
RESUMO<br />
Introdução: A surdez neuro-sensorial súbita idiopática (SNSSI)<br />
é um diagnóstico clínico, caracterizado por uma perda auditiva<br />
neuro-sensorial superior ou igual a 30 dB em três frequências<br />
contíguas, de instalação súbita ou progressiva num período<br />
inferior a 72h.<br />
Este trabalho pretende avaliar os resultados do protocolo<br />
terapêutico instituído no Serviço de ORL do Hospital de São<br />
Sebastião na recuperação auditiva (média tonal em dB).<br />
Material e Métodos: Estudo retrospectivo, através de análise<br />
de processos clínicos, dos doentes com diagnóstico de surdez<br />
neuro-sensorial súbita idiopática entre Janeiro de 2008 e<br />
Dezembro de 2010 (3 anos), que realizaram o protocolo<br />
terapêutico do Serviço de ORL do Hospital de S. Sebastião<br />
(Centro Hospitalar Entre o Douro e Vouga). Foram excluídos<br />
os doentes que realizaram tratamento em ambulatório<br />
por opção ou por apresentarem uma evolução do quadro<br />
clínico superior a quinze dias. Os doentes estudados foram<br />
internados <strong>para</strong> realização de terapêutica endovenosa<br />
com prednisolona, pentoxifilina e valaciclovir. Por não ter<br />
ocorrido a melhoria auditiva satisfatória ao fim de 5 dias de<br />
tratamento endovenoso, foi proposta a todos os doentes<br />
a subsequente realização de oxigenoterapia hiperbárica,<br />
iniciada, preferencialmente, no prazo de uma semana após a<br />
alta hospitalar.<br />
João Diogo Martins<br />
Interno do Internato Complementar do Serviço de ORL do HSS<br />
Vítor Certal<br />
Interno do Internato Complementar do Serviço de ORL do HSS<br />
Tiago Santos<br />
Interno do Internato Complementar do Serviço de ORL do HSS<br />
Hélder Silva<br />
Assistente Hospitalar do Serviço de ORL do HSS<br />
Hugo Amorim<br />
Assistente Hospitalar do Serviço de ORL do HSS<br />
Carlos Carvalho<br />
Director de Serviço de ORL do HSS<br />
Correspondência:<br />
João Diogo Martins<br />
Telef: 965349916<br />
martins.jd@gmail.com<br />
Resultados: Foi colhida informação de 11 doentes, 6 do sexo<br />
masculino e 5 do sexo feminino, com uma média de idades<br />
de 51,1 anos (39-63 anos). Todos os doentes apresentavam<br />
como sintoma acompanhante acufenos homolaterais e cinco<br />
doentes (45,5%) apresentavam também queixas de vertigem.<br />
A média tonal (média dos limiares tonais nas frequências<br />
500, 1000, 2000 e 4000 Hz) no momento do diagnóstico foi<br />
de 82 dB. A oxigenoterapia hiperbárica foi realizada em sete<br />
doentes, tendo os restantes recusado esta terapêutica. Após<br />
a realização do protocolo terapêutico a média tonal foi de<br />
50 dB (15-107,5dB), com uma melhoria tonal média de 32,6<br />
dB (0-85dB). Em dois doentes (18%) não houve melhoria<br />
audiométrica após realização do protocolo terapêutico.<br />
Houve uma melhoria audiométrica significativa (superior ou<br />
igual a 20dB) em quatro dos doentes (57%) que realizaram<br />
oxigenoterapia hiperbárica.<br />
Conclusão: Apesar das melhorias auditivas observadas nesta<br />
revisão, os resultados são ainda insuficientes, ficando por<br />
determinar qual o tratamento mais eficaz. Apesar da amostra<br />
do estudo ser pequena e sem significado estatístico, parecenos<br />
que a oxigenoterapia hiperbárica é uma opção terapêutica<br />
que deve continuar ser oferecida aos doentes.<br />
Palavras-chave: surdez, neuro-sensorial, súbita, idiopática,<br />
corticóide, pentoxifilina, valaciclovir, oxigénio hiperbárico.<br />
ABSTRACT<br />
Introduction: The idiopathic sudden sensorineural hearing loss<br />
(ISSHL) is a clinical diagnosis, characterized by a sensorineural<br />
hearing loss of at least 30 decibel (dB) over three contiguous<br />
frequencies occurring within 72 hours. This study pretends<br />
to evaluate the results of the therapeutic protocol instituted<br />
in the ENT Department of Hospital de São Sebastião, in what<br />
concerns to hearing recovery (pure tone average in dB).<br />
Methods and Material: Retrospective study, by clinical files<br />
analysis, of all patients with the diagnosis of ISSHL between<br />
January 2008 and December 2010 (three years), that were<br />
treated with the therapeutic protocol of Hospital de São<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 261<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
Sebastião (Centro Hospitalar Entre o Douro e Vouga) ENT<br />
Department. Patients that were treated with outpatient<br />
treatment were excluded, which include those who presented<br />
with a clinical evolution of more than fifteen days and those<br />
that refused to be admitted for treatment. Patients were<br />
admitted in our Department to perform intravenous therapy<br />
with prednisolone, pentoxifilin and valacyclovir. Subsequent<br />
hyperbaric oxygen therapy was proposed to all patients that<br />
didn’t have a significant hearing improvement, and started,<br />
preferably, during the first week after hospital discharge.<br />
Results: Information was collected from 11 patients, 6 male<br />
and 5 female patients, with a mean age of 51,1 years (39-<br />
63 years). At time of diagnosis, all patients presented with<br />
homolateral tinnitus and five patients (45,5%) with vertigo<br />
complaints. The initial pure tone average (PTA), calculated as<br />
the average of thresholds at 500, 1000, 2000 and 4000 Hz,<br />
was 82 dB. Hyperbaric oxygen therapy was performed in<br />
seven patients. The rest of the patients refused this treatment.<br />
After treatment the average PTA was 50 dB (15-107,5 dB),<br />
with an average improvement of 32,6 dB (0-85 dB). There<br />
were two patients without audiometric recovery. In the group<br />
of patients that performed hyperbaric oxygen therapy, there<br />
was a significant audiometric recovery (equal or superior to 20<br />
dB) in four patients (57%).<br />
Conclusion: Despite the auditory improvements, the results<br />
are still insufficient, and the best treatment is still to be found.<br />
Despite the small sample and lack of statistical significance of<br />
our results, it seems to the authors that the hyperbaric oxygen<br />
therapy should be offered as a therapeutic option.<br />
Keywords: hearing loss; sensorineural, sudden, idiopathic,<br />
corticosteroids, pentoxifilin, hyperbaric oxygen, valacyclovir.<br />
INTRODUÇÃO<br />
A Surdez Neuro-sensorial Súbita Idiopática (SNSSI)<br />
caracteriza-se pela perda auditiva neuro-sensorial<br />
superior ou igual a 30 dB em três frequências contíguas,<br />
de instalação súbita ou progressiva num período inferior<br />
a 72h, sem factor precipitante identificável 1 .<br />
Estima-se que a sua incidência seja entre 5-20 por<br />
100.000 habitantes por ano 2,3 . Apresenta uma incidência<br />
semelhante em ambos os sexos 1 , pode atingir doentes<br />
de todas as idades, sendo no entanto rara em crianças<br />
e idosos, ocorrendo mais frequentemente entre os<br />
43 e 53 anos de idade 1,4,5 . É unilateral em 98-99% dos<br />
casos 1,6 .<br />
Os sintomas acompanhantes mais frequentes são os<br />
acufenos (70-94% dos casos) e a vertigem (20-50% dos<br />
casos) 1,2,4 .<br />
Em cerca de 85% dos casos de surdez neuro-sensorial<br />
súbita não se identifica a etiologia (idiopática).<br />
Aproximadamente 1% dos casos é devido a patologia<br />
retrococlear (schwanoma vestibular, doença desmielinizante<br />
262 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
ou episódio isquémico) 6 e cerca de 10-15% são causados<br />
por outras causas identificáveis, como a Doença de<br />
Menière, traumatismo, doença auto-imune, sífilis,<br />
Doença de Lyme ou fístula perilinfática 1,3 .<br />
Existem várias teorias que tentam explicar a<br />
etiopatogenia do SNSSI, relacionadas com alterações<br />
vasculares (obstrução completa ou parcial do fluxo<br />
sanguíneo ao nível da artéria labiríntica) 7,8 , infecções<br />
víricas 9,10,11 , distúrbios auto-imunes do ouvido<br />
interno 13,14 e ruptura da membrana de Reissner 15 .<br />
Sem uma etiologia específica, a terapêutica desta<br />
entidade mantém-se um tema de grande controvérsia,<br />
existindo na literatura mundial diversos esquemas e<br />
protocolos terapêuticos. A dificultar a determinação<br />
do melhor tratamento estão as elevadas taxas de<br />
recuperação espontânea relatada por alguns estudos,<br />
que variam de 32% 16 a 65% 17 . Entre os tratamentos<br />
mais populares estão combinações terapêuticas que<br />
incluem corticóides sistémicos ou intratimpânicos,<br />
fármacos vasoactivos (vasodilatadores ou expansores<br />
plasmáticos), diuréticos, anticoagulantes, inalação de<br />
carbogénio e vitaminas. No entanto, permanece por<br />
determinar a melhor abordagem terapêutica baseada<br />
na evidência.<br />
Com este trabalho efectua-se uma revisão dos doentes<br />
tratados no Serviço de ORL do Hospital de São Sebastião<br />
no período de Janeiro de 2008 a Dezembro de 2010<br />
com o diagnóstico de SNSSI. O objectivo deste estudo é<br />
avaliar os resultados do protocolo terapêutico instituído<br />
no Serviço na recuperação auditiva.<br />
MATERIAL E MÉTODOS<br />
Os autores realizaram um estudo retrospectivo,<br />
através de consulta de processo clínico, dos doentes<br />
com diagnóstico de SNSSI, entre Janeiro de 2008 e<br />
Dezembro de 2010. Foram incluídos apenas os doentes<br />
que realizaram o protocolo terapêutico instituído no<br />
Serviço, representando um total de 11 doentes. O<br />
protocolo terapêutico é proposto a todos os doentes<br />
com quadro de evolução inferior a 15 dias, implica o<br />
internamento do doente durante cinco dias realizando<br />
a seguinte terapêutica: dieta hipossalina, prednisolona<br />
1mg/Kg/dia ev, pentoxifilina 400mg 8/8h ev, diazepam<br />
5mg 12/12h po, omeprazol 20mg/dia po. Visto que<br />
diversos autores mostraram uma associação temporal<br />
entre a SNSSI e infecções virais activas ou recentes 11,12 ,<br />
valaciclovir 500mg 8/8h ev foi adicionado em doentes<br />
com contexto infeccioso da vias aéreas superiores<br />
actual ou recente. Após a alta, os doentes completam<br />
tratamento no ambulatório com: prednisolona 1mg/<br />
Kg/dia durante 5 dias com desmame progressivo<br />
durante outros 5 dias, pentoxifilina 400mg 8/8h (5
dias), omeprazol 20mg/dia (10 dias) e valaciclovir<br />
500mg 12/12h (5 dias). A todos os doentes em que não<br />
se constata uma melhoria auditiva completa (tabela 3)<br />
é oferecida a realização de oxigenoterapia hiperbárica<br />
(20 sessões de oxigénio a 100% em câmara hiperbárica<br />
a 2,5 atmosferas durante 90 minutos) na Unidade de<br />
Medicina Hiperbárica do Hospital Pedro Hispano, após<br />
a alta hospitalar.<br />
Os doentes realizam audiograma no momento do<br />
diagnóstico, ao 5º dia (dia da alta hospitalar), 1 mês<br />
e 3 meses após diagnóstico. Se não houver melhoria<br />
audiométrica após o tratamento instituído, é realizada<br />
ressonância magnética cerebral com gadolínio <strong>para</strong><br />
exclusão de patologia retrococlear.<br />
Foram excluídos deste estudo os doentes que não<br />
foram internados e realizaram tratamento ambulatório.<br />
Incluem-se neste grupo os doentes que apresentavam à<br />
data do diagnóstico um quadro de evolução superior a 15<br />
dias e aqueles que por opção recusaram internamento.<br />
As informações colhidas incluíram informação demográfica<br />
dos doentes, tempo de evolução dos sintomas até ao<br />
diagnóstico, sintomas acompanhantes, tratamento<br />
realizado, avaliações audiométricas realizadas e<br />
resultados de exames imagiológicos realizados.<br />
Para avaliação da variação audiométrica foi utilizado<br />
o PTA (pure tone average) ou limiar tonal puro,<br />
determinado pela média dos limiares tonais das<br />
frequências de 500, 1000, 2000 e 4000 Hz. A evolução<br />
TABELA 1<br />
Características epidemiológicas e clínicas dos doentes estudados<br />
Sexo Idade Ouvido Sintomas<br />
acompanhantes<br />
51<br />
+-<br />
7 anos<br />
ou resposta audiométrica foi calculada subtraindo PTA<br />
inicial (momento do diagnóstico) e final (3 meses).<br />
RESULTADOS<br />
As características epidemiológicas e clínicas dos doentes<br />
são apresentadas na tabela 1. Do total de 11 doentes,<br />
6 eram do sexo masculino e 5 do sexo feminino, com<br />
média de idades de 51 anos (39-63 anos). Os ouvidos<br />
direito e esquerdo foram afectados em 6 e 5 dos casos,<br />
respectivamente. O intervalo de tempo médio que<br />
decorreu desde o início dos sintomas e o momento de<br />
diagnóstico foi de 3,1 dias (1-8 dias, desvio padrão de<br />
2,02 dias).<br />
Todos os doentes apresentavam como sintoma<br />
acompanhante acufenos homolaterais e 5 doentes<br />
(45,4%) tinham também queixas de vertigens rotatórias.<br />
No momento do diagnóstico, 2 doentes (18,2%)<br />
apresentavam surdez neuro-sensorial (SNS) moderada<br />
de 1º grau (41-55 dB), 1 doente (9%) apresentava SNS<br />
moderada de 2º grau (56-70 dB), 4 doentes (36,4%)<br />
apresentavam SNS severa (71-90 dB) e 4 doentes<br />
(36,4%) apresentavam SNS profunda (91-119 dB). A PTA<br />
média inicial foi 82 dB (desvio padrão de 20 dB).<br />
Sete doentes realizaram oxigenoterapia hiperbárica.<br />
Com<strong>para</strong>ndo os limiares auditivos antes e depois de<br />
realizarem o tratamento com oxigénio hiperbárico,<br />
verificou-se uma melhoria audiométrica significativa<br />
(>15 dB) em 4 doentes (57,1%) (tabela 2). A melhoria<br />
auditiva média foi de 37 dB (desvio padrão de 16,6 dB).<br />
PTA<br />
inicial<br />
E D Acufenos Vertigens 82 dB<br />
+-<br />
20dB<br />
Moderada<br />
1º grau<br />
Grau de surdez inicial<br />
Moderada<br />
2ºgrau<br />
Severa Cofose<br />
5 6 5 6 100% 45,4% 2 1 4 4<br />
TABELA 2<br />
Evolução audiométrica<br />
Doente PTA inicial (dB) PTA - 5º dia (dB) O2 Hiperbárico PTA final (dB)<br />
1 60 60 Não 42,5<br />
2 75 70 Não 21,25<br />
3 87,5 55 Não 38,75<br />
4 42,5 35 Não 35<br />
5 101,25 100 Sim 70,75<br />
6 66,25 66,25 Sim 66,25<br />
7 100 68,75 Sim 15<br />
8 110 110 Sim 107,5<br />
9 91,25 91,25 Sim 73,75<br />
10 80 45 Sim 40<br />
11 88,75 78,75 Sim 31,25<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 263<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
TABELA 3<br />
Critérios de recuperação auditiva de Siegel 14<br />
Tipo Recuperação Audiométrica<br />
I. Recuperação completa Doentes com PTA final inferior a 25 dB independentemente da<br />
melhoria audiométrica<br />
II. Recuperação parcial Doentes com melhoria audiométrica superior a 15 dB e PTA<br />
final entre 25 e 45 dB<br />
III. Recuperação ligeira Doentes com melhoria audiométrica superior a 15 dB e PTA<br />
final superior a 45 dB<br />
IV. Sem melhoria Doentes com melhoria audiométrica inferior a 15 dB<br />
Para avaliar e classificar a melhoria audiométrica foram<br />
utilizados os critérios de Siegel (Tabela 3) 14 : tipo I em 2<br />
doentes (18,2%), tipo II em 4 doentes (36,4%), tipo III em<br />
2 doentes (18,2%) e tipo IV em 3 doentes (27,2%).<br />
A melhoria tonal média nos 5 casos que apresentavam<br />
vertigem foi de 23,1 dB (desvio padrão de 22 dB) e nos<br />
6 doentes sem vertigem acompanhante foi de 40,6 dB<br />
(desvio padrão de 29,5 dB).<br />
Com excepção dos dois doentes com recuperação<br />
completa da audição, todos os doentes realizaram<br />
ressonância magnética cerebral com contraste<br />
(gadolínio), não se identificando, em nenhum caso,<br />
alterações que justificassem a surdez.<br />
DISCUSSÃO<br />
Dada a variabilidade da história natural e a natureza<br />
idiopática desta entidade, mantém-se a dificuldade na<br />
determinação do melhor tratamento.<br />
No entanto, é importante oferecer aos doentes o<br />
tratamento mais benéfico e que menos efeitos adversos<br />
provoque.<br />
A elaboração de um protocolo terapêutico <strong>para</strong> o<br />
Serviço foi realizada por constatação da necessidade de<br />
uma uniformização de tratamento <strong>para</strong> estes doentes.<br />
A realização de terapêutica endovenosa durante 5<br />
dias apenas naqueles cuja evolução da hipoacúsia<br />
fosse inferior a 2 semanas, prende-se com o facto<br />
de recuperação audiométrica ser maior quando o<br />
tratamento é iniciado durante os primeiros 15 dias, e<br />
com a maior biodisponibilidade dos fármacos quando<br />
administrados por via parentérica 2,18 .<br />
Uma revisão recente da Cochrane Library de trabalhos<br />
publicados sobre o uso de corticóides sistémicos<br />
no tratamento da SNSSI concluiu que a eficácia da<br />
corticoterapia continua por provar 19 . No entanto, como<br />
a sua utilização por um curto período de tempo se<br />
associa a uma taxa reduzida de efeitos adversos, os<br />
corticóides são a terapêutica actualmente mais aceite<br />
e utilizada.<br />
Segundo alguns estudos internacionais 20,21 e nacionais 22 ,<br />
a oxigenoterapia hiperbárica pode ter um papel<br />
264 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
importante no tratamento inicial (principalmente se<br />
utilizada nos primeiros 15 dias) e até como tratamento<br />
“salvage”, ou seja, como tratamento após falência do<br />
tratamento primário. A análise dos nossos resultados<br />
colocou em evidência que a maioria dos doentes<br />
que realizaram este tratamento teve uma melhoria<br />
audiométrica significativa.<br />
Segundo a literatura, a presença de queixas de vertigem<br />
associadas confere um pior prognóstico <strong>para</strong> recuperação<br />
audiométrica 1,2,6 . Na nossa revisão, constatamos que<br />
a presença concomitante de vertigem representou, de<br />
facto, uma pior recuperação audiométrica.<br />
Apesar das melhorias audiométricas evidenciadas na<br />
maioria dos casos do nosso estudo, os resultados estão<br />
longe de ser os ideais, ou seja, a restituição ao nível<br />
audiométrico prévio.<br />
No que diz respeito a tratamentos alternativos dos usados<br />
no nosso protocolo, destacam-se os corticóides intratimpânicos.<br />
A vantagem da sua utilização é a obtenção de<br />
concentrações mais elevadas do fármaco no órgão alvo<br />
com exposição sistémica mínima. No entanto, quando<br />
usados como tratamento primário, apresentam taxas de<br />
sucesso semelhantes à corticoterapia sistémica 23,24 . Mas<br />
alguns estudos retrospectivos com amostras pequenas<br />
sugerem que poderão ser vantajosos quando usados<br />
como tratamento “salvage” 25,26,27 .<br />
CONCLUSÃO<br />
Apesar das melhorias auditivas observadas nesta<br />
revisão, fica a impressão de serem ainda insuficientes.<br />
A pequena dimensão da amostra, a ausência de grupo<br />
de controlo e as possíveis recuperações auditivas<br />
espontâneas, não nos permite tirar conclusões<br />
definitivas em relação à eficácia do nosso protocolo ou<br />
de qual o tratamento mais apropriado.
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26.Choung YH, Park K, Shin YR, Cho MJ. Intratympanic dexamethasone<br />
injection for refractory sudden sensorineural hearing loss.<br />
Laryngoscope 2006; 116:747-752<br />
27.Haynes DS, O’Malley M, Cohen S, Watford K et al. Intratympanic<br />
dexamethasone for sudden sensorineural hearing loss after failure of<br />
systemic therapy. Laryngoscope 2007; 117:3-15<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 265<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
266<br />
REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Laringectomia parcial supracricoideia reconstrutiva<br />
com C.H.E.P. – Experiência do serviço nos últimos<br />
10 anos<br />
Supracricoid partial reconstructive laryngectomy<br />
with C.H.E.P. – Department experience for the last<br />
10 years<br />
Joana Filipe Helena Ribeiro André Amaral Rui Fino Hugo Estibeiro Pedro Montalvão Miguel Magalhães<br />
RESUMO<br />
Em casos seleccionados de neoplasias da região glótica ou<br />
supra-glótica é possível proceder a cirurgia conservadora da<br />
laringe com realização de laringectomia parcial supracricoideia<br />
(LPSC).<br />
Dependendo da extensão da ressecção cirúrgica poder-se-á<br />
realizar a reconstrução por meio de Cricohiodopexia (CHP) ou<br />
de Cricohioidoepiglotopexia (CHEP).<br />
A possibilidade de poder preservar a voz, sem necessidade de<br />
traqueostomia constitui uma das vantagens, em reconstruções<br />
bem sucedidas, contudo a dificuldade de deglutição e a<br />
aspiração são complicações possíveis e frequentes.<br />
Objectivo: avaliar os resultados do tratamento das neoplasias<br />
da laringe nos doentes submetidos a laringectomia parcial<br />
supracricoideia com reconstrução com CHEP (LPSC-CHEP).<br />
Material e Métodos: os autores realizam um estudo<br />
retrospectivo dos doentes submetidos a LPSC-CHEP nos<br />
últimos 10 anos (2000-2009) no IPO de Lisboa, avaliando<br />
os parâmetros pré e pós-operatórios de maior relevância,<br />
Joana Filipe<br />
Interna do Internato Complementar do Serviço de ORL II do Centro Hospitalar Lisboa Norte<br />
(CHLN) - Hospital Pulido Valente (HPV)<br />
Helena Ribeiro<br />
Interna do Internato Complementar do Serviço de ORL II do CHLN - HPV<br />
André Amaral<br />
Interno do Internato Complementar do Serviço de ORL do CHLC – Hospital S. José<br />
Rui Fino<br />
Assistente Hospitalar Graduado do Serviço de ORL do Instituto Português de Oncologia (IPO) de<br />
Lisboa Francisco Gentil<br />
Hugo Estibeiro<br />
Assistente Hospitalar Graduado do Serviço de ORL do IPO de Lisboa<br />
Pedro Montalvão<br />
Assistente Hospitalar Graduado do Serviço de ORL do IPO de Lisboa<br />
Miguel Magalhães<br />
Director do Serviço de ORL do IPO de Lisboa<br />
Correspondência:<br />
Joana Rita de Caldas Ferreira Filipe Valentim<br />
Serviço de Otorrinolaringologia II do Centro Hospitalar Lisboa Norte (Hospital Pulido Valente)<br />
Alameda das Linhas de Torres, 117; 1769-001 Lisboa<br />
Telf: 217548268; E-mail: jrcffv@gmail.com<br />
Trabalho apresentado no 57º Congresso Nacional de Otorrinolaringologia e Cirurgia<br />
Cérvico-Facial<br />
nomeadamente, sexo, idade, estadiamento tumoral, média<br />
de dias de internamento, média de dias <strong>para</strong> descanulação,<br />
média de dias <strong>para</strong> remoção da sonda nasogástrica (SNG),<br />
complicações imediatas e a longo prazo.<br />
Resultados: Neste período foram realizadas 33 LPSC-CHEP,<br />
tendo sido incluídas 31 LPSC-CHEP neste estudo. Todos os<br />
doentes eram do sexo masculino com idade média de 57,7<br />
anos, 45,1% apresentando-se no estadio T1b. A média de<br />
internamento foi de 12,6 dias, tendo mais de 70% dos doentes<br />
sido descanulados até ao 19º dia (média de 29,7 dias). A SNG<br />
foi removida após uma média total de 48,9 dias. A longo prazo,<br />
a aspiração e a redundância da mucosa aritenoideia foram as<br />
complicações mais frequentes. A taxa global de sobrevida foi<br />
de 100% aos 12 meses de seguimento pós-operatório.<br />
Conclusão: Para casos seleccionados de cancro da laringe, a<br />
LPSC-CHEP é uma excelente opção de tratamento, permitindo<br />
a preservação da função.<br />
Palavras-chave: laringectomia parcial supra-cricoideia (LPSC),<br />
cricohioidoepiglotopexia (CHEP), preservação vocal, parâmetros<br />
pré e pós-operatórios.<br />
ABSTRACT<br />
For selected glottic and supraglottic cancers it is possible to<br />
perform conservation laryngeal surgery with supracricoid<br />
partial laryngectomy (SCLP).<br />
Depending on the extension of surgical resection achieved<br />
reconstruction can be done by cricohyoidopexy (CHP) or<br />
Cricohyoidoepiglottopexy (CHEP).<br />
The possibility of speech preservation without a permanent<br />
stoma is an advantage in successful reconstructions, however<br />
the problems with swallowing and aspiration are expected<br />
and frequent complications.<br />
Objective: To evaluate the results of laryngeal cancers on<br />
patients treated with SCLP-CHEP.<br />
Methods: Retrospective study of patients treated with SCLP-<br />
CHEP in the last 10 years (2000-2009) at IPO-Lx, with a revision<br />
of pre and postoperative <strong>para</strong>meters.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 267<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
Results: During this period 33 SCLP-CHEP were reported,<br />
although only 31 were included in this study. All patients<br />
were male, with a median age of 57,7 years, 45,1% presented<br />
a T1b state, average hospital stay of 12,6 days, and in more<br />
than 70% of the patients decannulation occurred up to the<br />
19º day (median time being 29,7 days). The nasogastric tube<br />
was removed after a median of 48,9 days. The most common<br />
long-term complications were aspiration and edema of the<br />
arytenoid mucosa. The global survival rate was 100% at 12<br />
months of post operative follow up.<br />
Conclusion: For selected laryngeal cancers, SCLP-CHEP<br />
demonstrates to be an excellent option for treatment, allowing<br />
function preservation.<br />
Keywords: supracricoid partial laryngectomy (SCLP),<br />
cricohyoidoepiglottopexy (CHEP), speech preservation, pre<br />
and postoperative <strong>para</strong>meters<br />
INTRODUÇÃO<br />
No tratamento de tumores da laringe, a laringectomia<br />
total surge como tratamento primário <strong>para</strong> tumores<br />
localmente avançados, contudo, constituindo por<br />
vezes uma opção terapêutica demasiado radical<br />
<strong>para</strong> determinados tumores laríngeos que poderiam<br />
beneficiar de uma cirurgia menos agressiva 1 .<br />
Em alternativa à laringectomia total foi desenvolvido nos<br />
anos 50 1,2 a laringectomia parcial supracricoideia (LPSC),<br />
que surge como uma cirurgia conservadora destinada<br />
ao tratamento de tumores glóticos e supra-glóticos<br />
seleccionados, com a vantagem de preservação da voz<br />
e da deglutição, sem necessidade de um traqueostoma<br />
permanente.<br />
Este tipo de laringectomia parcial horizontal, obriga<br />
à reconstrução por meio de duas técnicas distintas:<br />
Cricohioidoepiglotopexia (CHEP) ou Cricohiodopexia<br />
(CHP), dependendo da extensão da ressecção cirúrgica<br />
tumoral.<br />
A excisão das cordas vocais (CV) verdadeiras e bandas<br />
ventriculares, ambos os espaços <strong>para</strong>glóticos, a<br />
cartilagem tiroideia, a porção inferior da epiglote, com<br />
preservação de ambas ou apenas uma das cartilagens<br />
aritenóides, (figura 1 e 2) permite a reconstrução por<br />
intermédio de CHEP, na qual se sutura a cricoide ao osso<br />
hióide e à epiglote (figura 3).<br />
Quando é necessária uma excisão mais alargada<br />
incluindo as estruturas anteriormente referidas e,<br />
concomitantemente, a excisão da epiglote e espaço préepiglótico,<br />
ter-se-á de fazer reconstrução por intermédio<br />
de CHP (com sutura da cricóide directamente ao osso<br />
hióide). A unidade crico-aritenoideia desempenha um<br />
papel preponderante na fonação, deglutição e no risco<br />
de aspiração nestes doentes 1,2,3 , pelo que sempre que<br />
possível se deverão preservar ambas as aritenóides.<br />
268 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
FIGURA 1<br />
Laringectomia parcial supracricoideia com preservação de<br />
ambas as cartilagens aritenóides e epiglote<br />
FIGURA 2<br />
Peça operatória incluindo: cartilagem tiroideia, CV verdadeiras<br />
e bandas ventriculares, ambos os espaços <strong>para</strong>glóticos e<br />
porção inferior da epiglote<br />
FIGURA 3<br />
Reconstrução com cricohiodoepiglotpexia (CHEP)<br />
A dificuldade de deglutição e a aspiração são complicações<br />
esperadas no pós-operatório imediato destes doentes 2 ,<br />
com eventual risco de atelectasia ou inclusivamente<br />
pneumonia. Como tal, torna-se imperatória a avaliação<br />
pré-operatória da reserva pulmonar e das comorbilidades<br />
sistémicas, com exclusão de patologia cardíaca, arterite,<br />
diabetes mellitus, refluxo gastro-esofágico ou artrite
eumatóide 1 . Doentes com doença pulmonar obstrutiva<br />
crónica (DPOC) severa, diminuição do reflexo tússico ou<br />
diminuição da clearance pulmonar ciliar, como exemplo,<br />
apresentam um risco acrescido de complicações<br />
pulmonares com fortes contra-indicações <strong>para</strong> uma CHEP<br />
ou CHP.<br />
No caso concreto das LPSC, em reconstruções bem<br />
sucedidas com CHEP, o lúmen da neolaringe assume<br />
geralmente uma forma de T, com a epiglote numa<br />
posição anterior, havendo alteração da função<br />
esfincteriana da laringe 1 , com diminuição da qualidade<br />
vocal (voz pulmonar, soprada) e maior risco de aspiração,<br />
principalmente no período pós-operatório imediato. A<br />
epiglote e as aritenóides remanescentes conjuntamente<br />
com a base da língua são, contudo, em geral, suficientes<br />
<strong>para</strong> obter uma fonação e uma deglutição satisfatórias,<br />
sem necessidade de traqueostomia.<br />
São consideradas indicações formais <strong>para</strong> realização<br />
de uma LPSC com reconstrução com CHEP3: 1) tumor<br />
glótico envolvendo uma CV, estendendo-se da comissura<br />
anterior à aritenóide, com hipomobilidade ou fixação da<br />
CV; 2) tumor glótico envolvendo ambas as CV com ou sem<br />
envolvimento da comissura anterior; 3) tumor limitado da<br />
comissura anterior; 4) tumor glótico desenvolvido numa<br />
laringite crónica difusa; 5) pequeno tumor ventricular.<br />
Constituem contra-indicações absolutas 3 : 1) presença de<br />
fixação das aritenóides; 2) extensão tumoral ao petíolo<br />
da epiglote; 3) extensão subglótica significativa; 4)<br />
invasão extensa da comissura anterior e/ou espaço préepiglótico;<br />
5) mau estado geral.<br />
Apesar da idade não ser considerada uma contraindicação<br />
absoluta, doentes com idade superior a 70<br />
anos, em especial com comorbilidades, nomeadamente,<br />
refluxo gastro-esofágico e insuficiência pulmonar crónica,<br />
constituem uma contra-indicação relativa, pelo que cada<br />
caso deverá ser avaliado individualmente 3 .<br />
MATERIAL E MÉTODOS<br />
Os autores realizam um estudo retrospectivo, baseado na<br />
consulta de processos clínicos, dos doentes submetidos<br />
a laringectomia parcial supracricoideia com reconstrução<br />
com CHEP nos últimos 10 anos, no período entre 2000 e<br />
2009.<br />
São avaliados vários parâmetros pré-operatórios (sexo, idade,<br />
factores de risco, cirurgia ou RT prévias, estadiamento<br />
TNM, indicação cirúrgica) e pós-operatórios (resultado<br />
anatomopatológico, grau de diferenciação histológica,<br />
complicações no pós operatório imediato, data da<br />
descanulação e desentubação nasogástrica, complicações<br />
tardias, nomeadamente, aspiração e dispneia por edema<br />
da mucosa aritenoideia).<br />
RESULTADOS E DISCUSSÃO<br />
No período decorrido entre 2000 e 2009, foram<br />
realizadas 33 laringectomias subtotais supracricoideias<br />
reconstruídas com Cricohioidoepiglotopexia.<br />
Para o corrente estudo foram excluídos dois doentes que<br />
apresentavam dados incompletos no processo, pelo que<br />
fica um número total de 31 doentes.<br />
Em termos epidemiológicos, todos os doentes eram do<br />
sexo masculino, sendo a idade média de 57,7 anos, com<br />
intervalo entre os 36 e os 76 anos (Gráfico 1). Cerca de<br />
64,5% dos doentes tinha menos de 60 anos de idade e<br />
apenas 6,45% apresentava uma idade superior ou igual<br />
a 70 anos.<br />
GRÁFICO 1<br />
Reconstrução com cricohiodoepiglotpexia (CHEP)<br />
Todos os doentes apresentavam o principal factor de<br />
risco <strong>para</strong> neoplasia laríngea: hábitos tabágicos (100%<br />
eram fumadores, sendo que 10 % não eram activos com<br />
cessação dos hábitos tabágicos há mais de 4 anos) e<br />
mais de 75% dos doentes apresentava hábitos etílicos,<br />
moderados a graves, concomitantes.<br />
O sintoma de apresentação universal foi a disfonia, por<br />
vezes associada a outros sintomas acompanhantes pouco<br />
específicos, nomeadamente, odinofagia, hemoptises e<br />
tosse. Alguns doentes (30%) foram encaminhados <strong>para</strong> o<br />
IPO já com biópsia realizada no hospital de origem e com<br />
o diagnóstico prévio de carcinoma.<br />
Sete doentes já haviam realizado cirurgia prévia com<br />
intuito curativo antes de serem submetidos a LPSC-CHEP<br />
(6 doentes - cirurgia a laser/1 doente – laringectomia<br />
parcial tipo Tucker).<br />
Nenhum doente havia sido submetido a RT préoperatória.<br />
Todos os doentes realizaram TC préoperatória<br />
<strong>para</strong> estadiamento.<br />
Relativamente ao estadiamento, nenhum doente<br />
proposto <strong>para</strong> LPSC-CHEP apresentava metastização<br />
ganglionar (N 0 M x ). A maioria dos doentes (45,1%)<br />
apresentava tumor em ambas as CV (T1b); 35,5%<br />
apresentava diminuição da mobilidade da corda vocal<br />
ou extensão limitada à supraglote ou subglote (T2);<br />
19,4% dos doentes propostos <strong>para</strong> a cirurgia apresentava<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 269<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
TABELA 1<br />
Classificação TNM <strong>para</strong> tumores glóticos<br />
Tumor limitado às cordas vocais (pode envolver as comissuras) com normal mobilidade<br />
T1 T1a Tumor limitado a uma corda vocal podendo envolver a aritenóide ipsilateral<br />
T1b Tumor envolvendo as duas cordas vocais<br />
T2 Tumor com extensão à supraglote e/ou subglote ou com mobilidade diminuída<br />
T3<br />
Tumor limitado à laringe com fixação cordal e/ou invasão do espaço <strong>para</strong>glótico e/ou erosão limitada da cartilagem<br />
tiroideia<br />
Tumor com extensão através da cartilagem tiroideia e/ou invadindo tecidos extra-laríngeos (ex: traqueia,<br />
T4<br />
T4a tecidos moles do pescoço incluindo músculos profundos extrínsecos da língua, músculos pré-laríngeos,<br />
glândula tiróide ou esófago)<br />
T4b Tumor invadindo o espaço pré-vertebral, encarcerando a carótida ou invadindo o mediastino<br />
tumor em apenas uma corda vocal (em 66% dos casos,<br />
preferencialmente a CV esquerda), com envolvimento<br />
simultâneo da comissura anterior (T1a) (Tabela 1, Gráfico 2).<br />
A indicação foi frequentemente pré-operatória: 96% dos<br />
doentes tinha indicação pré-operatória <strong>para</strong> CHEP. Em<br />
4% dos doentes estava proposta outra cirurgia tendo a<br />
decisão de realização de LPSC-CHEP sido intra-operatória.<br />
Houve remoção cirúrgica total ou parcial de uma<br />
aritenóide em 33% dos casos.<br />
GRÁFICO 2<br />
Estadiamento TNM dos doentes<br />
O resultado anatomopatológico confirmou carcinoma<br />
pavimento celular (CPC) em 100 % dos doentes, na<br />
maioria dos casos, bem diferenciado (Gráfico 3).<br />
GRÁFICO 3<br />
Grau de diferenciação histológica (CPC)<br />
270 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
Em três doentes (9,6%) obteve-se margem microscópica<br />
positiva pelo que realizaram radioterapia (RT) adjuvante.<br />
Destes, um veio a revelar recidiva metastática cervical<br />
inoperável aos 12 meses de pós-operatório, estando<br />
actualmente em cuidados paliativos. Um outro doente<br />
apresentava invasão peri-neural com indicação<br />
<strong>para</strong> realizar quimioterapia (QT) adjuvante que não<br />
foi concretizada pela presença de co-morbilidades<br />
importantes associadas (AVC no pós-operatório). Este<br />
doente veio a revelar, igualmente, doença metastática no<br />
osso e pulmão, 8 meses após cirurgia, sem evidência de<br />
recidiva local, estando também em cuidados paliativos.<br />
Não houve registo de angioinvasão tumoral ou invasão<br />
da cartilagem tiroideia ao exame histopatológico em<br />
nenhum doente.<br />
Dentro das complicações no período pós-operatório<br />
imediato registou-se: um doente com infecção da ferida<br />
operatória; dois doentes com necessidade de revisão<br />
da hemostase; um doente com deiscência da sutura e<br />
necrose, com necessidade de totalização da laringectomia<br />
ao 9º dia de pós-operatório.<br />
A média de internamento foi de 12,6 dias, com intervalo<br />
entre os 6 e os 25 dias. Em dois dos doentes que realizaram<br />
RT adjuvante manteve-se a sonda nasogástrica (SNG) e a<br />
traqueotomia durante os ciclos de tratamento, pelo que<br />
estes doentes não serão contabilizados na média de dias<br />
<strong>para</strong> descanulação e remoção da SNG. Deste modo, a<br />
média de dias <strong>para</strong> descanulação foi de 29,7 dias, com<br />
intervalo entre os 5 e os 274 dias (gráfico 4), sendo que<br />
mais de 70% foram descanulados até ao 19º dia.<br />
A descanulação foi precedida, em todos os casos, por<br />
substituição da cânula <strong>para</strong> uma cânula fenestrada<br />
entre o 3º e o 8º dias de pós-operatório e posterior<br />
nasofibroscopia ou laringoscopia <strong>para</strong> visualização da<br />
permeabilidade do lúmen laríngeo.<br />
A SNG foi removida após uma média total de 48,9<br />
dias, com intervalo entre os 9 e os 183 dias (gráfico 5),<br />
revelando a dificuldade de deglutição que estes doentes<br />
apresentam no pós-operatório inicial, tendo sido a<br />
média de dias ligeiramente superior nos doentes com
GRÁFICO 4<br />
Representação do número de dias com traqueotomia no pós<br />
operatório<br />
GRÁFICO 5<br />
Representação do número de dias com SNG no pós operatório<br />
GRÁFICO 6<br />
Com<strong>para</strong>ção entre a média de dias <strong>para</strong> remoção de SNG nos<br />
doentes que removeram total ou parcialmente uma aritenóide<br />
e nos doentes com preservação de ambas as aritenóides<br />
remoção parcial ou total de uma das aritenóides (gráfico<br />
6), sugerindo uma maior dificuldade de deglutição e um<br />
risco acrescido de aspiração nestes últimos.<br />
Todos os doentes foram referenciados <strong>para</strong> Terapia da<br />
Fala <strong>para</strong> treino de deglutição. As duas complicações<br />
major a longo prazo desta intervenção cirúrgica são<br />
o risco de aspiração (alimentar e salivar) e a dispneia<br />
alta por edema redundante da mucosa aritenoideia,<br />
podendo condicionar a colocação de uma gastrostomia<br />
definitiva, a totalização da laringectomia ou a realização<br />
de traqueostomia permanente, respectivamente.<br />
À data do estudo, num follow up com intervalo entre<br />
os 13 e os 84 meses, cerca de 50% dos doentes não<br />
apresentava aspiração. Dos restantes 50%, a grande<br />
maioria apresentava aspiração ocasional, sendo que<br />
apenas 7% apresentava aspiração frequente (gráfico 7).<br />
GRÁFICO 7<br />
Representação do número de doentes com aspiração<br />
Estes últimos não careceram, contudo, de traqueostomia,<br />
alimentação por SNG, gastrostomia ou totalização<br />
da laringe até à data. De referir que os doentes que<br />
apresentavam aspiração grave frequente, apresentavam<br />
conservação de ambas as aritenoides, reforçando a<br />
ideia de que numa fase inical a remoção parcial ou<br />
total de uma aritenoide aumenta o risco de aspiração<br />
e dificuldade de deglutição no pós-operatório inicial<br />
(média de dias superior com a SNG), contudo não parece<br />
condicionar aspiração numa avaliação a longo prazo. A<br />
favor desta observação temos que dos 33% dos doentes<br />
com remoção total ou parcial de uma aritenoide, 16,5%<br />
apresentava aspiração ocasional a longo prazo e os<br />
restantes 16,5% não apresentava aspiração.<br />
Apesar de haver referência num estudo de Joo et al 1 ,<br />
que os doentes com idade igual ou superior a 60 anos<br />
apresentavam um risco mais elevado de complicações<br />
pulmonares, associado ao maior risco de aspiração,<br />
no presente estudo, a idade média dos doentes que<br />
apresentavam aspiração foi igual à idade média dos<br />
doentes que não apresentavam aspiração (57,78 e<br />
57 anos, respectivamente), não havendo registo de<br />
complicações pulmonares.<br />
Apenas 23% dos doentes apresentava edema importante<br />
da mucosa aritenoideia (gráfico 8, figura 4), o que<br />
corresponde a 7 doentes. Um destes teve necessidade<br />
de traqueotomia de urgência, 8 dias após descanulação,<br />
tendo sido descanulado definitivamente 30 dias depois e<br />
outros dois doentes tiveram necessidade de vaporização<br />
a laser de CO 2 , da mucosa aritenoideia redundante<br />
por dispneia (aos 14 e 33 meses de pós operatório),<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 271<br />
ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICLE
FIGURA 4<br />
Exemplo de mucosa aritenoideia redundante: a) durante a expiração; b,c) início da inspiração; d,e) obliteração total do lúmen<br />
traqueal durante a inspiração (mucosa redundante penetra totalmente na traqueia)<br />
GRÁFICO 8<br />
Representação do número de doentes com mucosa<br />
aritenoideia redundante<br />
mantendo à data do estudo a traqueotomia (6,6%).<br />
Todos os doentes apresentam preservação de voz audível<br />
satisfatória, em geral, caracteristicamente soprada e de<br />
baixo débito. À data de conclusão do estudo, com um<br />
follow up médio de 41,9 meses, com intervalo entre<br />
os 13 e os 84 meses, 90% dos doentes permanecia<br />
sem recidiva. Registou-se recidiva metastática em dois<br />
doentes, anteriormente referidos (aos 8 e 12 meses<br />
após cirurgia), encaminhados <strong>para</strong> cuidados paliativos e<br />
registou-se um óbito, aos 26 meses de seguimento após<br />
a cirurgia por aparecimento de um 2º tumor primário<br />
pouco diferenciado no brônquio. De referir que este<br />
doente mantinha hábitos tabágicos após a cirurgia.<br />
Aos 12 meses de seguimento pós-operatório, a taxa de<br />
sobrevida global foi, deste modo, de 100 % e a taxa de<br />
sobrevida livre de doença de 93,3%.<br />
CONCLUSÃO<br />
Para tumores glóticos seleccionados a laringectomia<br />
parcial supracricoideia com reconstrução com CHEP é<br />
considerada uma alternativa eficaz à laringectomia total,<br />
permitindo a preservação da voz e da deglutição sem<br />
necessidade de traqueostoma, com taxas de controlo<br />
local comparáveis.<br />
272 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
Referências Bibliográficas:<br />
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(2) Nemr N, Carvalho MB, Köhle J, Leite G, et al.. Functional Study of the<br />
voice and swallowing following supracricoid laryngectomy. Rev. Bras.<br />
Otorrinolaringol. [online].2007; 73-n.2: 151-155<br />
(3) Olias J, Mendonça F, Magalhães M, Montalvão P, et al.. Cirurgia<br />
parcial horizontal da laringe: laringectomia subtotal reconstrutiva.<br />
Cirurgia da Laringe, Atlas de Técnicas Cirúrgicas, Guia de Dissecção.<br />
Círculo Médico - 1ª Edição, 2004: 105-115
Obstrução nasal no recém-nascido: Dois casos de<br />
estenose congénita do orifício piriforme<br />
Nasal obstruction in neonates: Two cases report<br />
of congenital nasal pyriform aperture stenosis<br />
Alexandra Jerónimo Ana Casas Novas Inês Moreira Carla Conceição Inês Cunha Luísa Monteiro<br />
RESUMO<br />
A Estenose Congénita do Orifício Piriforme (ECOP) é uma causa<br />
rara de obstrução nasal no recém-nascido, um respirador<br />
nasal obrigatório, e por isso potencialmente fatal. Obriga a<br />
diagnóstico diferencial com causas mais comuns como a atrésia<br />
choanal. Na clínica predominam a apneia episódica e a cianose<br />
cíclica, sendo o diagnóstico confirmado imagiologicamente.<br />
Pode surgir isoladamente ou associada a alterações crâniofaciais,<br />
hipopituitarismo e cromossomopatias. A correcção<br />
cirúrgica impõe-se face ao insucesso do tratamento médico.<br />
Este artigo tem por objectivo relatar dois casos clínicos de ECOP.<br />
O primeiro caso foi diagnosticado à nascença, não apresentava<br />
patologia concomitante e estabilizou clinicamente apenas<br />
com terapêutica médica. O segundo caso relata lactente de<br />
3 meses, cujo estudo imagiológico identificou dente incisivo<br />
superior mediano único, como malformação associada. Pela<br />
gravidade da obstrução nasal a abordagem exigiu, <strong>para</strong> além<br />
da terapêutica nasal tópica, a correcção cirúrgica da estenose.<br />
Ambas as crianças encontram-se clinicamente bem.<br />
Palavras-chave: estenose congénita do orifício piriforme,<br />
recém-nascido, dente incisivo superior único.<br />
Alexandra Jerónimo<br />
Interna do Internato Complementar do Serviço de ORL do Centro Hospitalar Lisboa Central<br />
(CHLC): Hospital de São José<br />
Ana Casas Novas<br />
Interna do Internato Complementar do Serviço de ORL do CHLC: Hospital de Dona Estefânia (HDE)<br />
Inês Moreira<br />
Assistente Hospitalar do Serviço de ORL do CHLC: HDE<br />
Carla Conceição<br />
Assistente Hospitalar do Serviço de Neurorradiologia do CHLC: HDE<br />
Inês Cunha<br />
Assistente Hospitalar do Serviço de ORL do CHLC: HDE<br />
Luísa Monteiro<br />
Assistente Hospitalar Graduada e Directora do Serviço de ORL do CHLC: HDE<br />
Correspondência:<br />
Serviço de ORL do Hospital de Dona Estefânia<br />
Rua Jacinta Marto, 1169 Lisboa<br />
Tel: 927089186<br />
Email: asjeronimo@gmail.com<br />
Trabalho apresentado no 57º Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de<br />
Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial – Hotel Cascais Miragem, Cascais, 6 a 9 de Maio<br />
de 2010.<br />
ABSTRACT<br />
Congenital nasal pyriform aperture stenosis (CNPAS) is<br />
a rare form of nasal obstruction in neonates who are<br />
obligate nasal breathers, that may become a potential lifethreatening<br />
condition. Differential diagnosis must include<br />
the more common occurrence of choanal atresia. CNPAS is<br />
often characterized by episodic apnea and cyclical cyanosis,<br />
and the diagnosis is confirmed upon imaging findings.<br />
CNPAS may appear isolated or associated with cranio-facial<br />
anomalies, hypopituitarism and abnormal karyotype. Surgery<br />
should be considered if patients do not improve with medical<br />
treatment. The main purpose of this article is to report two<br />
cases of CNPAS. In the first case, the stenosis was diagnosed<br />
after birth, there were no other anomalies identified and the<br />
child overcame the situation with topical treatment only. In<br />
the second case the child presented another midline anomaly,<br />
consisting in one single central maxillary incisor. Due to the<br />
degree of obstruction and clinical symptoms it was performed<br />
a sublabial surgical approach of the stenosis. Both children<br />
have no complaints so far.<br />
Keywords: congenital nasal pyriform aperture stenosis,<br />
neonates, single central maxillary incisor<br />
INTRODUÇÃO<br />
A obstrução nasal no recém-nascido constitui uma<br />
condição potencialmente fatal pelo facto de este ser<br />
um respirador nasal obrigatório. O diagnóstico e a<br />
intervenção precoces são essenciais no sentido de<br />
restaurar a via aérea, evitando a falência respiratória com<br />
asfixia.<br />
O orifício piriforme corresponde à porção mais anterior<br />
e estreita do esqueleto ósseo da cavidade nasal, sendo<br />
que uma diminuição da sua área seccional, mesmo<br />
que pequena, se traduz num aumento significativo<br />
da resistência à passagem do ar, com aumento do<br />
esforço ventilatório que pode levar o recém-nascido à<br />
exaustão 1 . A Estenose Congénita do Orifício Piriforme<br />
(ECOP) é uma causa rara de obstrução nasal no recémnascido,<br />
cujo principal diagnóstico diferencial se faz com<br />
a atrésia choanal bilateral. Deve-se a um crescimento<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 273<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
ósseo excessivo do ramo montante do maxilar superior,<br />
bilateralmente, <strong>para</strong> o interior das fossas nasais,<br />
provocando o seu estreitamento, sem oclusão. Descrita<br />
radiologicamente pela primeira vez em 1988 por Ey et al<br />
e reconhecida como entidade clínica independente um<br />
ano depois por Brown et al 2 , a sua etiologia exacta ainda<br />
está por definir. É uma patologia de afecção bilateral<br />
que se manifesta à nascença ou nos primeiros meses<br />
de vida, como entidade isolada ou associada a outras<br />
malformações crânio-faciais da linha média, endocrino<br />
e cromossomopatias. Na clínica predominam a apneia<br />
episódica e a cianose cíclica, proporcionais ao grau da<br />
estenose, geralmente agravadas por quadro infeccioso<br />
ou durante a amamentação e aliviadas pelo choro. A<br />
clínica e o exame objectivo sugerem o diagnóstico mas a<br />
Tomografia Computorizada dos Seios Perinasais (TC dos<br />
SPN) confirma-o, sendo que, de acordo com Belden et<br />
al 3 , a identificação de um diâmetro transverso máximo<br />
do orifício piriforme inferior a 11mm, numa criança de<br />
termo, é diagnóstico. O tratamento cirúrgico impõese<br />
quando há persistência de insuficiência ventilatória<br />
e incapacidade de alimentação apesar do tratamento<br />
médico.<br />
Neste artigo apresentam-se dois casos clínicos de ECOP,<br />
um como entidade isolada e o outro com presença<br />
de malformações faciais da linha média associadas,<br />
realçando-se o dente incisivo superior mediano único.<br />
Ambos os casos pretendem alertar <strong>para</strong> a suspeição de<br />
ECOP, apesar da sua raridade, na avaliação de um recémnascido<br />
com compromisso da permeabilidade nasal.<br />
274 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
Primeiro Caso Clínico<br />
Recém-nascido (RN) de 9 dias, sexo masculino, raça<br />
caucasiana, transferido <strong>para</strong> a Unidade de Cuidados<br />
Intensivos Neonatais (UCIN) do Hospital de Dona<br />
Estefânia (HDE) em ventilação mecânica assistida por<br />
“malformação da pirâmide nasal”. Como antecedentes<br />
pessoais a referir gravidez de risco, pela idade materna,<br />
sem intercorrências, parto eutócico às 39 semanas<br />
no Hospital de São Marcos em Braga com peso: 3810g<br />
(P 75 ), comprimento: 52cm (P 75 ) e Índice de Apgar 4<br />
ao primeiro minuto de vida. Registou-se ausência de<br />
choro, cianose generalizada, movimentos respiratórios<br />
irregulares e tiragem global, pelo que foi entubado orotraquealmente<br />
ao 2º minuto de vida. Por melhoria dos<br />
sinais vitais e regularização ventilatória, foi feita tentativa<br />
de extubação que se verificou infrutífera e procedeu-se a<br />
nova entubação. Sem história familiar de malformações<br />
ou doenças geneticamente transmissíveis. Foi realizada<br />
uma TC dos SPN (películas não disponibilizadas) que<br />
revelou um estreitamento dos orifícios piriformes com<br />
choanas permeáveis bilateralmente. O RN foi então<br />
transferido <strong>para</strong> a Unidade de Neonatologia do Hospital<br />
de São João no Porto, ainda no primeiro dia de vida,<br />
<strong>para</strong> melhor assistência e orientação terapêutica. Ao<br />
segundo dia de vida foi observado pela Especialidade de<br />
Otorrinolaringologia (ORL) que procedeu à canalização<br />
das fossas nasais com sonda nasogastrica (SNG) número<br />
8, que ultrapassou as choanas bilateralmente. Contudo,<br />
não foi possível progredir com o fibroscópio pediátrico<br />
por acentuada estenose dos orifícios piriformes, tendo<br />
FIGURAS 1 e 2<br />
TC dos SPN : cortes axiais a dois níveis, observando-se obstrução bilateral dos orifícios piriformes, por hipertrofia das apófises nasais<br />
dos ossos maxilares, e permeabilidade choanal
epetido a TC dos SPN, com resultado sobreponível ao<br />
anterior.<br />
O RN esteve ventilado até ao segundo dia de vida com<br />
FiO 2 de 21%, iniciou ventilação espontânea ao terceiro<br />
dia, sem registo de episódios de cianose, dessaturação<br />
ou Síndrome de Dificuldade Respiratória. Dois dias<br />
depois iniciou alimentação oral por sonda orogástrica e<br />
foi transferido ao nono dia de vida <strong>para</strong> a UCIN do HDE, o<br />
Hospital da área de residência. Deu entrada conectado ao<br />
ventilador com suporte mínimo e observado novamente<br />
por ORL. Da observação realizada, com possibilidade de<br />
progressão do fibroscópio pediátrico (Ø3.8mm) apenas à<br />
direita, confirmaram-se fossas nasais de calibre reduzido,<br />
predominantemente à esquerda, por estreitamento<br />
da abertura piriforme e hipertrofia do corneto inferior,<br />
por provável rinite aguda do lactente concomitante. O<br />
RN foi submetido a terapêutica médica durante 5 dias,<br />
tendo esta consistido na aplicação tópica intra-nasal de<br />
vasoconstritor e corticoterapia endovenosa. Foi extubado<br />
ao 13º dia, permanecendo clinicamente estável, sem<br />
esforço respiratório, apenas com uma ligeira obstrução<br />
nasal em repouso. Iniciou alimentação por tetina ao<br />
14º dia com boa tolerância e teve alta hospitalar um<br />
dia depois, medicado com anti-histamínico. Durante o<br />
internamento foram realizados exames complementares<br />
de diagnóstico, <strong>para</strong> exclusão de patologia associada,<br />
nomeadamente ecografias transfontanelar, abdominal<br />
e renal, ecocardiograma, avaliação oftalmológica e<br />
rastreio auditivo com otoemissões acústicas e potenciais<br />
evocados auditivos, tendo todos eles sido normais. Foi<br />
reavaliado aos 3 meses de idade em consulta de ORL e<br />
Imunoalergologia. Apresentava-se clinicamente bem,<br />
sem registo de episódios de dificuldade respiratória. Não<br />
foi possível progredir o fibroscópio por espessamento<br />
septal, hipertrofia moderada dos cornetos inferiores e<br />
por manutenção do estreitamento do segmento anterior<br />
das fossas nasais. Os testes cutâneos foram negativos.<br />
A criança tem sido reavaliada semestralmente, a última<br />
observação realizada aos 18 meses de idade, sem registo<br />
de novas intercorrências, com indicação <strong>para</strong> realização<br />
de terapêutica em SOS.<br />
Segundo Caso Clínico<br />
Lactente de 3 meses de idade, sexo feminino, raça<br />
caucasiana, que recorreu por duas vezes ao Hospital<br />
de Torres Vedras por obstrução nasal crónica, de<br />
agravamento progressivo, com interferência na<br />
alimentação. À entrada do Serviço de Urgência, a criança<br />
encontrava-se apirética, hemodinamicamente estável,<br />
com saturação O 2 98%, pele e mucosas coradas, sem<br />
cianose, tendo-se no entanto verificada obstrução<br />
nasal marcada associada a rinorreia anterior serosa<br />
e ligeira tiragem global. Foi submetida a terapêutica<br />
variada nomeadamente à inalação de atmosfera húmida<br />
e aerossol com broncodilatador; administração de<br />
corticóide oral e aplicação nasal de vasoconstritor. A<br />
melhoria clínica foi discreta. Face à tentativa de aspiração<br />
de secreções nasais, constatou-se impossibilidade de<br />
progressão da sonda por ambas as fossas nasais. Foram<br />
admitidos como diagnósticos prováveis a atrésia choanal<br />
incompleta e rinofaringite com obstrução nasal grave,<br />
precedendo-se ao contacto com o Serviço de ORL do<br />
HDE <strong>para</strong> realização de endoscopia diagnóstica no<br />
dia seguinte. Antecedentes de gravidez vigiada, parto<br />
FIGURAS 3 e 4<br />
TC dos SPN: cortes axiais a dois níveis, observando-se dente incisivo superior mediano único e estenose do orifício piriforme.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 275<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
eutócico às 39 semanas, com um peso de 2880g (P ), 10<br />
comprimento de 48cm (P ) e Índice de Apgar de 7/8/10.<br />
25<br />
Referência a internamentos no período neonatal, um<br />
por taquicardia supraventricular idiopática e dois por<br />
bronquiolite aguda. Seguida nas consultas de Cardiologia<br />
e Pneumologia. Nos antecedentes familiares, a salientar<br />
apenas um primo em 1º grau com fenda do lábio e do<br />
palato. Desde o nascimento a criança apresentava<br />
história de obstrução nasal persistente de gravidade<br />
variável, alterações do ciclo sono-vigília, má conciliação<br />
da respiração com a deglutição e má progressão<br />
ponderal. Objectivamente, na consulta de ORL, aos 3<br />
meses de idade, constatou-se um estreitamento marcado<br />
das fossas nasais, curtos períodos de cianose peri-labial<br />
durante agitação motora com reversão espontânea e<br />
impossibilidade na progressão do fibroscópio pediátrico<br />
(Ø3.8mm). A permeabilidade choanal foi testada e<br />
confirmada através da instilação de soro fisiológico. Foi<br />
pedida TC dos SPN e Ressonância Magnética Crânio-<br />
Encefálica (RM CE), e medicada <strong>para</strong> ambulatório com<br />
anti-histamínico. A TC dos SPN identificou malformação<br />
da linha média, com presença de dente incisivo superior<br />
mediano único, palato duro estreito e com crista palatina<br />
de projecção bucal associada a estenose da vertente<br />
anterior das fossas nasais, ao nível do ramo montante do<br />
maxilar superior, condicionando obliteração quase total<br />
FIGURAS 5, 6, 7 e 8<br />
276 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
das mesmas, com arcadas choanais permeáveis.<br />
A RM CE demonstrou encéfalo morfologicamente normal,<br />
sem referência a alterações malformativas, sugestivas<br />
de holoprosencefalia, encefalocelo ou do complexo de<br />
Dandy-Walker. A criança foi reavaliada aos 4, 5 e 9 meses<br />
de idade, sempre com indicação <strong>para</strong> manter lavagens<br />
nasais e submetida a medicação diversa (Neostil®/<br />
Biopental®/Dexaval colírio®). Ao longo do tempo<br />
verificou-se apenas discreta melhoria da obstrução nasal<br />
e da rinorreia anterior, mantendo dificuldade respiratória,<br />
sono agitado com períodos de apneia, dificuldade na<br />
amamentação e má progressão estaturo-ponderal. Face<br />
a este quadro clínico, foi decidida intervenção cirúrgica<br />
<strong>para</strong> correcção da estenose do orifício piriforme por via<br />
sublabial, aos 14 meses de idade. Após descongestão<br />
nasal com fenilefrina e infiltração do sulco gengival<br />
superior e mucosa da abertura piriforme com lidocaína<br />
1% com adrenalina 1:100.000, procedeu-se a incisão<br />
sublabial de mucosa e periósteo com electrocautério.<br />
De seguida realizou-se descolamento do periósteo<br />
e elevação dos tecidos moles e mucosa, expondo a<br />
metade inferior do orifício piriforme (Figura 5), com<br />
brocagem, com broca diamantada, da face interna do<br />
ramo montante dos maxilares superiores (Figura 6).<br />
Devido a sucessivas tentativas de passagem de sondas de<br />
aspiração no passado, identificaram-se sinéquias entre
o corneto inferior e o septo à esquerda que se lisaram.<br />
Finalmente procedeu-se ao reposicionamento dos<br />
tecidos moles, colocação de stents (tubos de entubação<br />
oro-traqueal 3,5mm) (Figura 7) com fixação posterior e<br />
anterior junto à columela, com tubo transversal, e sutura<br />
do vestíbulo oral.<br />
A criança teve alta no segundo dia de pós-operatório,<br />
reavaliada 20 dias depois, sem referência a<br />
intercorrências (Figura 8). Um mês depois foi submetida<br />
a nova anestesia geral <strong>para</strong> remoção dos stents. No acto<br />
operatório verificou-se a existência de fossas nasais<br />
permeáveis bilateralmente, com sinéquias vestigiais e<br />
teve alta no dia seguinte. Dois meses depois, a criança<br />
apresentava-se sem queixas de obstrução nasal ou<br />
rinorreia anterior, com melhoria da qualidade do sono,<br />
diminuição dos despertares nocturnos e alimentação<br />
mais eficaz com boa coordenação ventilatória. Aos 2 anos<br />
de idade, com 10 meses de pós-operatório, a melhoria<br />
mantém-se, não existindo referência a episódio de<br />
dificuldade respiratória, apenas roncopatia intermitente<br />
associada a intercorrências infecciosas da via aérea<br />
superior. Neste momento é possível a passagem de uma<br />
sonda de aspiração (Ø3.33mm) em ambas as fossas<br />
nasais e a criança mantém-se em vigilância periódica.<br />
Face às alterações associadas da linha média, houve,<br />
concomitantemente à abordagem otorrinolaringológica,<br />
um encaminhamento <strong>para</strong> as consultas de Genética,<br />
Cardiologia e Endocrinologia pediátricas. Relativamente<br />
à Genética, foi identificado um cariotipo 46 XX, com<br />
pesquisa de regiões subteloméricas não conclusivo e<br />
de Síndrome Di George negativo. A aguardar estudos<br />
complementares de outras cromossomopatias. Foram<br />
pedidas ecografias abdominal superior, renal, suprarenal<br />
e pélvica que foram normais. Do ponto de vista da<br />
Cardiologia e da Endocrinologia, concluiu-se a existência<br />
de taquipneia transitória do recém-nascido e ausência de<br />
endocrinopatias com doseamentos hormonais normais,<br />
respectivamente. É uma criança com desenvolvimento<br />
psico-motor normal mas com uma curva de crescimento<br />
irregular com má progressão ponderal (P 5 ), encaminhada<br />
<strong>para</strong> consulta de Nutrição.<br />
DISCUSSÃO<br />
A obstrução congénita da via aérea afecta cerca de 1<br />
em cada 5000 recém-nascidos, sendo na maioria dos<br />
casos devida a atrésia choanal. A ECOP é uma causa rara<br />
desta entidade clínica, que de acordo com a experiência<br />
de Belden et al, apresenta uma incidência três a cinco<br />
vezes inferior à atrésia choanal 3 . Há ainda que ter em<br />
conta outros diagnósticos diferenciais nomeadamente<br />
traumatismo nasal durante o parto com hematoma ou<br />
sub-luxação do septo, outras malformações congénitas da<br />
base do crânio (encefalocelo ou meningoencefalocelo),<br />
quistos (dermóide ou epidermóide) hipoplasia nasal e<br />
tumores malignos (rabdomiossarcoma, hemangioma,<br />
glioma, linfangioma e teratoma) 4 .<br />
Os recém-nascidos são respiradores nasais obrigatórios<br />
até às 6-8 semanas de vida 1,4,5 . A gravidade dos sintomas vai<br />
depender do grau de estreitamento do orifício piriforme,<br />
variando de uma respiração ruidosa similar à congestão<br />
nasal a uma condição potencialmente fatal 5 . Manifesta-<br />
-se geralmente à nascença, com a presença de cianose<br />
cíclica, apneia episódica, obstrução nasal e dificuldade<br />
respiratória, principalmente durante a amamentação e<br />
que alivia com o choro. A impossibilidade de progressão<br />
de sonda nasogástrica, sonda de aspiração de secrecções<br />
ou fibroscópio pediátrico (Ø1.9mm) 4 pode sugerir o<br />
diagnóstico que é confirmado imagiologicamente. O<br />
primeiro caso clínico é representativo do acima descrito.<br />
Por vezes o diagnóstico pode ser mais tardio e estabelecerse<br />
nas primeiras semanas ou meses de vida, como ilustra<br />
o segundo caso clínico. Neste caso, repetidos episódios<br />
de obstrução nasal com dificuldade respiratória, que<br />
motivaram ida ao Serviço de Urgência, tiveram lugar<br />
antes que o diagnóstico final fosse estabelecido.<br />
O exame de eleição é a TC dos SPN. De acordo com<br />
Belden e tal 3 , um diâmetro transverso máximo da<br />
abertura piriforme inferior a 11mm é considerado<br />
diagnóstico numa criança de termo. Mais tarde Lee et al 6<br />
vieram realçar o benefício de uso de TC em 3 dimensões<br />
em detrimento da de 2 dimensões, geralmente utilizada.<br />
Segundo eles, o exame permitiria uma informação mais<br />
real do espaço tridimensional da abertura piriforme,<br />
delinear de forma mais fidedigna a quantidade de osso<br />
em excesso do processo nasal do maxilar superior<br />
no planeamento da cirurgia de correcção, e servir de<br />
controlo pós-operatório <strong>para</strong> uma avaliação qualitativa<br />
e quantitativa mais precisa. A TC tem por objectivo<br />
complementar fornecer dados anatómicos importantes<br />
como a localização das raízes dentárias e do canal<br />
lacrimo-nasal, a evitar durante o acto cirúrgico 7 .<br />
A etiopatogenia exacta da ECOP ainda está por definir,<br />
mas pondera-se que se trate de uma condição genética<br />
heterogénea com um padrão de hereditariedade variável.<br />
Surge geralmente isolada, mas em cerca de 40% dos<br />
casos ocorre associada a outras malformações crâniofaciais<br />
1,4,9 , também identificadas na TC. Os achados<br />
típicos incluem dente incisivo superior único; palato duro<br />
triangular, estreito, com crista óssea sagital mediana<br />
<strong>para</strong> a cavidade bucal, fenda palatina submucosa e seios<br />
maxilares hipoplásicos. Pensa-se que a presença de dente<br />
incisivo superior único (DISU) seja uma manifestação de<br />
holoprosencefalia. Por esta razão é essencial realizar<br />
ecografia transfontanelar ou RM CE. Também estão<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 277<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
descritas associações de ECOP e DISU com coloboma<br />
ocular, deficiência pituitária e anomalias cromossómicas<br />
(trissomia 13 e 18, delecções 18p/13q/5q/7q e r18) 7,8,9<br />
pelo que é mandatório, <strong>para</strong> complementar o estudo<br />
destes doentes, realizar exame oftalmológico completo,<br />
investigação hormonal do eixo hipotálamo-hipófise e<br />
estudo de cariotipo. Malformações extra-cranianas,<br />
nomeadamente uro-genitais, laringotraqueais e cardíacas<br />
foram também registadas na literatura 2 . Reportando<br />
aos nossos casos clínicos, no primeiro a ECOP surgiu<br />
como patologia isolada e o segundo caso é ilustrativo<br />
da associação com DISU, que de acordo com o estudo<br />
envolvendo 24 crianças realizado por Lo et al 8 está<br />
presente em 63% dos casos de ECOP, sem outras<br />
anomalias detectadas até à data.<br />
O tratamento deve ser instituído face aos primeiros<br />
sintomas e dependerá da sua severidade. Entubação<br />
e ventilação imediatas podem ser necessárias como<br />
aconteceu no primeiro caso clínico. Para casos ligeiros<br />
a moderados a primeira abordagem constitui num<br />
tratamento conservador que inclui atmosfera húmida,<br />
descongestionante nasal e corticoterapia, tratamento<br />
de refluxo gastro-esofágico, aspiração de secreções,<br />
alimentação por SNG e utilização de tetina de McGroven<br />
ou CPAP <strong>para</strong> manter a patência da via aérea 4,6,7 . A<br />
manipulação com passagem constante de sondas nasais<br />
ou a colocação de stents deve ser evitada por possível<br />
lesão da mucosa e cartilagem com a ocorrência de<br />
sinéquias, como verificado no segundo caso clínico.<br />
Esta atitude conservadora também deverá ser aplicada<br />
em doentes com múltiplas malformações e prognóstico<br />
reservado. Em crianças com bom prognóstico, a<br />
intervenção cirúrgica está indicada face ao insucesso<br />
de duas semanas de tratamento médico maximizado,<br />
em casos de obstrução nasal severa confirmada por<br />
TC, apneia do sono grave, insucesso na extubação ou<br />
entubações oro-traqueais de repetição, incapacidade de<br />
alimentação com cianose 4,6,7 e a não progressão de SNG<br />
com Ø1.67mm 10 .<br />
Relativamente à técnica cirúrgica, duas abordagens são<br />
possíveis, a via transnasal, descrita em adultos e de<br />
difícil execução em crianças, pelas dimensões reduzidas<br />
da cavidade nasal e maior risco de lesão da mucosa; e a<br />
via sublabial, que foi utilizada no segundo caso clínico. É<br />
uma técnica segura, efectiva, bem tolerada e escolha de<br />
eleição nos casos de ECOP 1,4,7 .<br />
O procedimento cirúrgico é realizado sob anestesia<br />
geral, com entubação oro-traqueal (EOT), fazendo<br />
uso de instrumentos de microcirurgia do ouvido,<br />
brocas diamantadas e microscópio óptico com elevada<br />
resolução. A técnica descrita no segundo caso clínico<br />
ilustra de forma fidedigna os passos aconselhados<br />
278 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
na literatura 1,4,7 . A ressecção óssea deve ser sempre<br />
realizada num plano anterior à cabeça do corneto<br />
inferior <strong>para</strong> evitar lesão do canal lacrimo-nasal, e a<br />
brocagem do pavimento nasal deve ser evitada <strong>para</strong><br />
não lesar as raízes dentárias. O procedimento termina<br />
aquando da possibilidade de canalização das fossas<br />
nasais com tubo de EOT com diâmetro 3,5mm. Por vezes<br />
pode ser necessário complementar o acto cirúrgico<br />
com turbinectomia inferior parcial <strong>para</strong> melhorar a<br />
permeabilização da cavidade nasal, que não foi necessária<br />
no nosso caso cirúrgico. Ao invés, a doente apresentava<br />
sinéquias entre o corneto inferior e o septo à esquerda,<br />
por manipulação repetida das fossas nasais, que foram<br />
lisadas. No final do procedimento, um stent transverso<br />
deve ser colocado junto à columela <strong>para</strong> evitar necrose<br />
por pressão 1,4,6,7 . A acrescentar que, no nosso caso, foi<br />
também realizada fixação posterior, com tubo transversal<br />
ao nível da rinofaringe, <strong>para</strong> estabilização dos stens. Os<br />
stents deverão ser removidos ao fim de 2 a 4 semanas,<br />
segundo Shikowitz 1 , entre o 3º e o 24º dia, de acordo<br />
com Baker et al 4 e entre o 5º e o 15º dia segundo Lee<br />
et al 6 . Os períodos de tempo aconselhados são variáveis.<br />
Deverão ser o suficiente <strong>para</strong> não permitir a deiscência<br />
dos tecidos, mas não deixados demasiado tempo, que<br />
condicione dano e necrose da mucosa nasal. No nosso<br />
caso, os stents foram removidos ao final de um mês,<br />
sem indícios de qualquer lesão da mucosa e constatação<br />
intra-operatória de permeabilidade nasal bilateral.<br />
Também não se registaram complicações pós-cirurgicas<br />
como as descritas na literatura, nomeadamente<br />
reestenose, sinéquia, perfuração do septo, granulações<br />
ou lesão iatrogénica do canal lacrimo-nasal e mucosa<br />
nasal 4,7 . Quanto às raízes dentárias, teremos de aguardar<br />
a eclosão da dentição definitiva <strong>para</strong> verificar possíveis<br />
danos.<br />
CONCLUSÃO<br />
A ECOP é uma entidade clínica rara a ter presente e sempre<br />
considerada hipótese de diagnóstico na abordagem<br />
de um RN com obstrução nasal grave. A confirmação<br />
imagiológica permite também a identificação mandatória<br />
de anomalias concomitantes. Um diagnóstico precoce e<br />
uma abordagem atempada conferem à ECOP um muito<br />
bom prognóstico. A maior parte das crianças necessita<br />
apenas de tratamento conservador, sendo que a<br />
sintomatologia tende a atenuar ou mesmo a desaparecer<br />
face ao crescimento progressivo da cavidade nasal. A<br />
cirurgia está apenas reservada <strong>para</strong> os casos mais graves<br />
e refractários ao tratamento médico.
Referências Bibliográficas:<br />
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VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 279<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
280<br />
REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Síndrome da deiscência do canal semicircular<br />
superior: A propósito de dois casos clínicos.<br />
Superior semicircular canal dehiscence syndrome:<br />
Two cases report.<br />
Conceição Peixoto José Bastos Carlos Ribeiro<br />
RESUMO<br />
A Síndrome da Deiscência do Canal Semicircular Superior<br />
(SDCSS) caracteriza-se por sintomas vestibulares induzidos<br />
por estímulos sonoros intensos (Fenómeno de Tullio) ou por<br />
variações da pressão intracraniana ou ouvido médio, e por<br />
hipoacusia de transmissão.<br />
Os autores apresentam os casos clínicos de 2 doentes do sexo<br />
feminino:<br />
• 44 anos, história de hipoacusia e acufeno à esquerda<br />
associados a vertigem; verificou-se hipoacusia de<br />
transmissão bilateral com gap aero-ósseo à esquerda<br />
maior nas baixas frequências e timpanograma tipo A<br />
com presença de reflexos estapédicos; os potenciais<br />
evocados miogénicos vestibulares (PEMV) e tomografia<br />
computorizada (TC) de ouvido confirmaram deiscência<br />
do canal semicircular superior. A doente foi submetida a<br />
re<strong>para</strong>ção da deiscência da cortical óssea, apresentando<br />
diminuição da sintomatologia vestibular um mês após a<br />
cirurgia;<br />
• 57 anos, com queixas de vertigem e desequilíbrio<br />
crónico, sem hipoacusia; apresentava audiometria e<br />
impedancimetria normais, videonistagmografia com<br />
Joana Guimarães<br />
Interna de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Daniel Miranda<br />
Interno de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Filipa Carvalho Moreira<br />
Interna de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Nuno Marçal<br />
Interno de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Gabriel Pereira<br />
Interno de Formação Específica do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Sérgio Vilarinho<br />
Assistente Hospitalar do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Matos Gonçalves<br />
Assistente Graduado Sénior do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Rui Pratas<br />
Director do Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Correspondência:<br />
Joana Guimarães<br />
Serviço de Otorrinolaringologia, Hospital de Braga<br />
Sete Fontes – S. Victor<br />
4710-243 Braga<br />
Tlm.: 917969155, joanarguimaraes@gmail.com<br />
Trabalho apresentado no 58º Congresso da Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e<br />
Cirurgia Cérvico-Facial<br />
hiporreflexia direita e electrococleografia sem critérios<br />
de hidrópsia endolabiríntica; confirmou-se deiscência do<br />
canal semicircular superior através de PEMV e TC.<br />
Palavras-chave: deiscência do canal semicircular superior,<br />
hipoacusia de condução, vertigem, potenciais evocados<br />
miogénicos vestibulares<br />
ABSTRACT<br />
The Superior Semicircular Canal Dehiscence Syndrome (SSCDS)<br />
has been characterized by vestibular symptoms induced by<br />
loud sound (Tullio phenomenon) or stimuli that change middle<br />
ear or intracranial pressure, and conductive hearing loss.<br />
The autors present the case report of 2 female patients:<br />
• 44 years-old, referring left hearing loss and tinnitus with<br />
vertigo; the observation revealed bilateral conductive<br />
hearing loss with a left larger air-bone gap in low<br />
frequencies and type A tympanogram with normal acoustic<br />
stapedial reflex; the vestibular evoked myogenic potential<br />
(VEMP) and computed tomography (CT) confirmed<br />
superior semicircular canal dehiscence. The patient was<br />
submitted to surgery to repair the bone dehiscence. One<br />
month after surgery, she presented vestibular symptoms<br />
improvement;<br />
• 57 years-old, who presents vertigo and chronic<br />
dysequilibrium complaints, with no hearing loss; the<br />
observation revealed normal audiometry and normal<br />
impedance, the videonystagmography showed right<br />
hyporeflexia and electrococleography had no labyrinthine<br />
hydrops criteria; VEMP and CT confirmed superior<br />
semicircular canal dehiscence.<br />
Keywords: superior semicircular canal dehiscence, conductive<br />
hearing loss, vertigo, vestibular evoked myogenic potential<br />
INTRODUÇÃO<br />
A Síndrome de Deiscência do Canal Semicircular Superior<br />
(SDCSS) é uma doença rara e pouco conhecida que se<br />
caracteriza principalmente por sintomas vestibulares<br />
induzidos por estímulos sonoros intensos ou por<br />
modificações da pressão intracraniana ou do ouvido<br />
médio, e hipoacusia de transmissão. Com este trabalho,<br />
por tratar-se de uma síndrome recentemente descrita, e<br />
a propósito de dois casos clínicos, os autores pretendem<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 281<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
enfatizar a importância da SDCSS no diagnóstico<br />
diferencial de vertigem e hipoacusia de transmissão.<br />
A deiscência do canal semicircular superior (anterior)<br />
é uma exposição anormal do labirinto membranoso<br />
vestibular na fossa média craniana. A Síndrome da<br />
Deiscência do Canal Semicircular Superior (SDCSS) foi<br />
descrita pela primeira vez em 1998 por Minor et al 1 .<br />
Ocorre quando a deiscência da camada óssea que<br />
recobre o canal semicircular superior produz um ou<br />
mais dos seguintes sintomas: hipoacusia de transmissão,<br />
sintomas vestibulares induzidos por estímulos sonoros<br />
intensos ou por modificações da pressão intracraniana<br />
ou ouvido médio e desequilíbrio crónico 2 .<br />
Sintomas causados por aberturas anormais do labirinto<br />
são conhecidos há várias décadas, entre os quais,<br />
movimentos oculares em resposta a um estímulo<br />
sonoro 3 . O fenómeno de Tullio refere-se a movimentos<br />
oculares desencadeados por um som intenso e verificase<br />
em casos de fístula perilinfática, traumatismo craniano<br />
e colesteatoma com erosão de canal semicircular e<br />
fenestração. Actualmente sabe-se que a SDCSS é uma<br />
causa de fenómeno de Tullio mais frequente que as<br />
citadas anteriormente 3 . Em doentes com fenómeno<br />
de Tullio, o sinal de Hennebert, que se caracteriza por<br />
movimentos oculares desencadeados por pressão<br />
aplicada no canal auditivo externo, também é bastante<br />
frequente.<br />
A incidência de deiscência do canal semicircular superior<br />
(DCSS), tendo em conta apenas as alterações anatómicas<br />
e não as características clínicas, foi estimada em 0.5%,<br />
através de um estudo com 1000 ossos temporais,<br />
nos quais em 1,4% dos casos, o osso tinha no máximo<br />
0,1mm 4 . A incidência de SDCSS não é conhecida, mas<br />
é provável que apenas uma parte dos casos com DCSS<br />
apresente sintomas 3 .<br />
De acordo com a literatura, não há evidência de<br />
predominância significativa de sexo, e a mediana de<br />
idade dos sintomáticos situa-se entre os 40 e 41 anos 5,6 .<br />
A etiopatogenia da alteração anatómica não é conhecida,<br />
mas existe a hipótese de que o defeito poderá ocorrer<br />
durante o desenvolvimento da camada óssea que<br />
recobre o canal semicircular, até aos 3 anos de idade 4,5,7 .<br />
Aquando de um segundo evento, por exemplo, um<br />
traumatismo craniano ou um aumento brusco da<br />
pressão intracraniana, poderá evoluir <strong>para</strong> a ruptura<br />
desta camada anormalmente delgada, completando-se<br />
a deiscência 4,5,7 .<br />
Os doentes com SDCSS normalmente apresentam-se<br />
com queixas de autofonia ou vertigem. Pelo facto de<br />
haver diversas causas de vertigem, o diagnóstico tem que<br />
ser dirigido, através de uma história clínica detalhada e<br />
avaliação diagnóstica correcta. Os sintomas vestibulares<br />
282 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
relacionados com a SDCSS são normalmente provocados<br />
por sons intensos ou variações de pressão e são de curta<br />
duração. Vertigem ou oscilópsia desencadeadas por<br />
estímulos sonoros estão presentes em 90% dos doentes 8 .<br />
Também são frequentes sintomas vestibulares induzidos<br />
por variações de pressão, tais como tosse ou esforço.<br />
Em alguns casos os doentes apresentam desequilíbrio<br />
crónico e algumas alterações cognitivas.<br />
Os sintomas auditivos são também uma característica do<br />
SDCSS. 52% dos doentes apresentam hiperacusia <strong>para</strong><br />
sons transmitidos por via óssea, por exemplo, ouvir o<br />
próprio pulso, os movimentos dos olhos ou o impacto dos<br />
pés no solo durante a marcha. Autofonia está presente<br />
em 60% dos doentes 8 .<br />
Pensa-se que a DCSS pode causar hipoacusia de<br />
transmissão, por actuar como uma terceira janela no<br />
ouvido interno, com perda de energia acústica da cóclea<br />
<strong>para</strong> o vestíbulo, resultando num aumento dos limiares<br />
de condução dos sons por via aérea e aumentando a<br />
diferença de impedância entre as escalas timpânica e<br />
vestibular, causando uma diminuição dos limiares por via<br />
óssea 9,10 . Neste caso, como a hipoacusia de transmissão<br />
tem origem no ouvido interno, também se designa<br />
“pseudo-hipoacusia de transmissão”. Uma situação<br />
semelhante verifica-se no Síndrome do Aqueduto<br />
Vestibular Largo (SAVL).<br />
Movimentos oculares no plano do canal semicircular<br />
superior são a principal característica da SDCSS e estão<br />
presentes em 60% dos casos 11 . Podem ser desencadeados<br />
por estímulo sonoro, manobra de Valsalva ou pressão<br />
aplicada no canal auditivo externo. Nestas situações,<br />
normalmente verifica-se um nistagmo vertical e rotatório,<br />
com componente lenta <strong>para</strong> cima e <strong>para</strong> o lado oposto<br />
do ouvido afectado. Os sons mais eficazes na indução de<br />
sintomas vestibulares são aqueles de frequências entre<br />
500 e 1000Hz 10 . Este fenómeno explica-se pelo facto de,<br />
aquando de DCSS, haver uma deflexão da cúpula na crista<br />
ampular do canal, provocada por som/pressão, causando<br />
a sintomatologia 10 .<br />
Para o diagnóstico é essencial a realização de audiograma,<br />
até porque, alguns doentes apresentam sintomas<br />
auditivos na ausência de sintomas e sinais vestibulares.<br />
Verifica-se normalmente uma hipoacusia de transmissão<br />
maior nas frequências baixas e limiares de condução<br />
óssea muitas vezes inferiores a 0dB nHL (hiperacusia<br />
de condução) e presença de reflexos estapédicos.<br />
Devido à hipoacusia de transmissão e otoscopia<br />
normal, o diagnóstico de otosclerose é algumas vezes,<br />
erroneamente atribuído a estes casos. As principais<br />
diferenças são que na otosclerose não surge hiperacusia<br />
e os reflexos estapédicos estão presentes na maior<br />
parte dos casos de SDCSS, enquanto estão ausentes na
otosclerose 12 .<br />
Potenciais evocados miogénicos vestibulares (PEMV)<br />
com limiares mais baixos e respostas de maior amplitude<br />
são indicativos de SDCSS. De acordo com Colebatch et<br />
al 13 , o limiar médio de respostas dos PEMV em sujeitos<br />
saudáveis era de 86 dB nHL, com um limiar mínimo de 70<br />
dB nHL. Em doentes com fenómeno de Tullio os limiares<br />
eram inferiores a 70 dB nHL. Os PEMV são considerados<br />
por alguns autores, um exame mais de 90% sensível e<br />
específico <strong>para</strong> SDCSS 14 . Em alguns doentes não é possível<br />
calcular os PEMV, especialmente naqueles submetidos<br />
previamente a cirurgia do ouvido médio. O limiar dos<br />
PEMV pode também estar diminuído em casos de SAVL 3 .<br />
Este exame é particularmente importante no diagnóstico<br />
diferencial com otosclerose, pois neste caso os limiares<br />
são altos ou até ausentes 9,10 .<br />
Finalmente, <strong>para</strong> o diagnóstico de DCSS ser considerado<br />
é necessário Tomografia Computorizada (TC) de osso<br />
temporal com imagem inequívoca de ausência da camada<br />
óssea que recobre o canal superior. TC de alta-resolução<br />
é o exame ideal visto ser necessário uma resolução de<br />
cerca de 0,2mm <strong>para</strong> se obter uma imagem adequada 3 .<br />
Apesar de essencial a imagem de DCSS na TC, o diagnóstico<br />
de SDCSS apenas é considerado num contexto de sinais<br />
clínicos, PEMV e audiograma compatíveis com o mesmo.<br />
As opções de tratamento são cirurgia ou tratamento<br />
conservador. A cirurgia baseia-se na re<strong>para</strong>ção da<br />
deiscência, com oclusão total (plugging) ou re<strong>para</strong>ção<br />
(resurfacing) do canal superior, utilizando fáscia temporal,<br />
pó de osso, cola de fibrina e/ou osso cortical, variando<br />
de autor <strong>para</strong> autor. Podem ser utilizadas duas vias de<br />
abordagem, através da fossa craniana média ou por via<br />
transmastoideia 1,3,5,15,16 .<br />
O tratamento conservador refere-se a alterações do<br />
estilo de vida de forma a evitar situações que causem<br />
exacerbação dos sintomas, como por exemplo, ruídos<br />
intensos.<br />
CASO CLÍNICO 1<br />
• Paciente do sexo feminino, de 44 anos de idade,<br />
cozinheira. Antecedentes pessoais de depressão<br />
e gastrite crónica, medicada habitualmente com<br />
trazodona e lorazepam. Recorreu à consulta externa<br />
de ORL, por hipoacusia esquerda com cerca de 4<br />
anos de evolução, com agravamento progressivo no<br />
último ano, associado a aparecimento de acufeno<br />
esquerdo e vertigem. A vertigem tinha carácter<br />
rotatório, de curta duração, sem relação com posição<br />
ou movimentos da cabeça, associada a náuseas.<br />
Referia episódios mais frequentes, assim como maior<br />
desconforto, em ambientes ruidosos, como por<br />
exemplo no centro comercial, restaurante ou café, em<br />
dias mais movimentados, quando questionada acerca<br />
da relação da vertigem com o barulho. Não tolerava<br />
locais com música alta, pois apresentava vertigem<br />
rotatória ou sensação de desequilíbrio. Referia<br />
também autofonia. Sem outras queixas otológicas.<br />
Esta sintomatologia tinha tido agravamento<br />
progressivo no último ano.<br />
• Ao exame objectivo apresentava otoscopia e<br />
acumetria normais, provas de Romberg, Unterberger<br />
e Dix-Hallpike negativas.<br />
• O estudo audiométrico e de impedancimetria revelava<br />
timpanograma tipo A com presença de reflexos<br />
estapédicos ispi e contralaterais bilateralmente<br />
e audiograma tonal (Figura 1) com hipoacusia de<br />
condução bilateral com gap aero-ósseo à direita de<br />
15 a 20dB entre 250 e 2000Hz e à esquerda de 20 a<br />
35dB nas mesmas frequências.<br />
• Realizou TC de ouvido (Figura 2) que não apresentava<br />
evidência imagiológica de otosclerose fenestral ou<br />
coclear, apresentava deiscência da cortical óssea que<br />
reveste superiormente o canal semicircular superior<br />
esquerdo, em 2 planos tomográficos coronais<br />
consecutivos.<br />
• Realizou PEMV que revelou uma relação entre os<br />
dois ouvidos de 0.37, apresentando uma resposta<br />
mais alargada no lado esquerdo, compatível com<br />
diagnóstico de deiscência do canal semicircular<br />
superior esquerdo.<br />
• Em exame audiométrico subsequente, com resultado<br />
sobreponível ao anterior, foi estimulado o ouvido<br />
esquerdo com um som de intensidade superior a<br />
100dB nos 1000Hz, tendo apresentado desequilíbrio<br />
e náuseas (Fenómeno de Tullio).<br />
• Foi submetida a abordagem da fossa média através<br />
de craniotomia temporal esquerda, com re<strong>para</strong>ção/<br />
tamponamento da deiscência da cortical óssea<br />
com aponevrose muscular, fragmentos ósseos da<br />
craniotomia e Tisselyo®, por equipa de Neurocirurgia.<br />
• O pós-operatório decorreu sem intercorrências. Teve<br />
alta ao 2º dia pós-operatório.<br />
• Um mês pós-operatório referia diminuição significativa<br />
da vertigem e sensação de desequilíbrio.<br />
• Dois meses após cirurgia apresentava-se assintomática,<br />
com melhoria da audição e acufeno, sem<br />
vertigem, nomeadamente em ambientes ruidosos<br />
onde apresentava sintomas antes da intervenção<br />
cirúrgica. O audiograma tonal (Figura 3) revelou<br />
diminuição do gap aero-ósseo <strong>para</strong> 15dB nos 250Hz<br />
e 10dB entre 500 e 2000Hz, à esquerda.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 283<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
FIGURA 1<br />
Audiograma tonal pré-operatório<br />
FIGURA 2<br />
TC ouvido esquerdo, cortes coronais consecutivos com distância de 1mm, evidenciando deiscência da cortical óssea que reveste o<br />
canal semicircular superior<br />
284 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
FIGURA 3<br />
Audiograma tonal pós-operatório<br />
CASO CLÍNICO 2<br />
• Paciente do sexo feminino, 57 anos, funcionária de<br />
farmácia. Antecedentes pessoais de hérnia discal<br />
lombar corrigida cirurgicamente e taquicardia/<br />
palpitações, medicada habitualmente com<br />
propranolol, furosemida e omeprazol. Recorreu<br />
à consulta externa de ORL por sensação de<br />
desequilíbrio muito frequente e vertigem rotatória,<br />
de curta duração, não posicional, associada a<br />
náuseas e vómitos, com vários anos de evolução,<br />
com agravamento progressivo no último ano.<br />
Referia episódios mais frequentes de vertigem ou<br />
desequilíbrio com manobra de Valsalva, por exemplo<br />
quando assoava o nariz ou quando fazia esforços.<br />
Sem hipoacusia nem outras queixas otológicas.<br />
• Ao exame objectivo apresentava otoscopia e<br />
acumetria normais, prova de Unterberger com desvio<br />
<strong>para</strong> o lado direito, provas de Romberg e Dix-Hallpike<br />
negativas.<br />
• O estudo audiométrico e de impedancimetria revelava<br />
timpanograma tipo A com presença de reflexos<br />
estapédicos ispi e contralaterais bilateralmente e<br />
audiograma tonal normal (Figura 4).<br />
• O exame de potenciais evocados auditivos<br />
precoces do tronco cerebral revelou uma condução<br />
nervosa normal bilateralmente, com um limiar<br />
electrofisiológico situado a 20dB em ambos os<br />
ouvidos; o exame electrococleográfico revelou<br />
ausência de critérios de hidrópsia endolinfática em<br />
ambos os ouvidos.<br />
• O exame de videonistagmografia revelou hiporreflexia<br />
vestibular direita.<br />
• Realizou TC de ouvido (Figura 5) que não revelava<br />
evidência de focos de otoespongiose, mas em que<br />
era possível observar esboço de deiscência do<br />
canal semicircular superior direito, em 2 planos<br />
tomográficos coronais consecutivos.<br />
• O exame de potenciais evocados miogénicos<br />
vestibulares revelava traçados compatíveis com<br />
deiscência do canal semicircular superior direito.<br />
• Em avaliação subsequente, foi testado o fenómeno<br />
de Tullio através de estímulo sonoro intenso, que<br />
foi negativo. Aquando de realização de manobra de<br />
Valsalva apresentou desequilíbrio, no entanto sem<br />
nistagmo evidente.<br />
• A doente foi medicada com beta-histina 24mg 2<br />
vezes/dia e mantém vigilância em consulta de ORL,<br />
tendo sido informada acerca dos cuidados a ter,<br />
nomeadamente evicção de estímulos precipitantes<br />
da sintomatologia vestibular. Apresenta melhoria das<br />
queixas.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 285<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
FIGURA 4<br />
Audiograma tonal pós-operatório<br />
FIGURA 5<br />
TC ouvido direito, cortes coronais consecutivos com distância<br />
de 1mm, evidenciando deiscência da cortical óssea que<br />
reveste o canal semicircular superior<br />
286 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
DISCUSSÃO<br />
Apesar da prevalência de deiscência completa do canal<br />
semicircular superior ser entre 0.5% e 0.7% na população<br />
total 1 , não se conhece a percentagem dos portadores de<br />
DCSS que são sintomáticos.<br />
Tal como aconteceu nos casos clínicos apresentados,<br />
a maioria destes indivíduos procura ajuda médica por<br />
sintomas vestibulares, tais como vertigem e desequilíbrio<br />
crónico. Embora haja, na SDCSS, relação íntima entre<br />
a vertigem ou a oscilópsia e a exposição a estímulos<br />
sonoros de alta intensidade, grande parte não refere que<br />
os seus sintomas pioram com o barulho, se tal não lhes for<br />
questionado. Os mesmos sintomas ocorrem também em<br />
muitos casos, quando realizam manobras que modificam<br />
a pressão do ouvido médio ou intracraniana, como<br />
ocorreu no segundo caso aqui descrito. Uma minoria<br />
procura o otorrinolaringologista apresentando apenas<br />
perda auditiva, sem sintomas vestibulares 1,5,6 .<br />
Sintomas e sinais característicos da SDCSS são<br />
raramente óbvios no momento da admissão. Portanto,<br />
os profissionais de saúde que lidam com estes doentes<br />
devem estar aptos a realizar uma investigação mínima<br />
suficiente <strong>para</strong> afastar ou tornar mais provável o<br />
seu diagnóstico. O exame clínico é de fundamental<br />
importância, visto exames considerados padrão <strong>para</strong><br />
investigação do aparelho vestibular, tais como electro<br />
ou videonistagmografia, não mostrarem alterações<br />
significativas.<br />
A SDCSS pode apresentar-se com hipoacusia de condução,<br />
que mimetiza otosclerose, podendo explicar alguns casos
de hipoacusia de condução que persiste após cirurgia<br />
estapédica 17,18 . Torna-se assim importante diferenciar a<br />
SDCSS de otosclerose. A hipoacusia de condução da SDCSS<br />
é caracterizada tipicamente por um gap aero-ósseo nas<br />
frequências baixas, por vezes com limiares de condução<br />
óssea inferiores a 0dB, pelo que se torna importante<br />
pesquisá-los. Os reflexos estapédicos estão normalmente<br />
presentes na SDCSS mas ausentes no processo de fixação<br />
do estribo por otosclerose. Os PEMV, se possível, devem<br />
ser utilizados na orientação diagnóstica, visto os limiares<br />
serem significativamente mais altos na otosclerose do<br />
que na SDCSS 10 . Em casos suspeitos de SDCSS, a presença<br />
de DCSS pode ser confirmada através de TC de altaresolução,<br />
com reformatação das imagens em planos<br />
<strong>para</strong>lelos e perpendiculares relativamente ao canal<br />
superior 9 .<br />
Na escolha das opções de tratamento, deve ser<br />
considerada a intensidade dos sintomas em cada indivíduo.<br />
Pacientes com sintomas mínimos ou ligeiros devem<br />
evitar estímulos causadores dos sintomas e experimentar<br />
medidas de suporte, tais como, reabilitação vestibular<br />
ou terapêutica antivertiginosa. Estes doentes requerem<br />
uma vigilância mais prolongada de forma a assegurar<br />
a resolução da sintomatologia. Aqueles com sintomas<br />
incapacitantes como vertigem, induzida pelo som ou<br />
pressão, desequilíbrio ou oscilópsia, podem necessitar de<br />
tratamento cirúrgico. A escolha do tratamento cirúrgico<br />
deve ter em conta a gravidade dos sintomas e os riscos<br />
e benefícios da cirurgia. Em alguns centros 3 , só parte<br />
dos doentes com SDCSS são submetidos a cirurgia. A<br />
maioria opta por alterar o estilo de vida de forma a evitar<br />
estímulos que desencadeiem sintomas. O Dizziness<br />
Handicap Inventory (DHI) pode ser um instrumento útil na<br />
avaliação da intensidade dos sintomas vestibulares, com<br />
uma escala de 0-100, inicialmente utilizada no tratamento<br />
cirúrgico de neurinoma do acústico, doença de Meniere<br />
e vertigem posicional paroxística benigna, tal como Crane<br />
et al. 3 demonstraram numa série de 19 doentes, em que<br />
verificaram um handicap alto em doentes com SDCSS,<br />
propostos <strong>para</strong> tratamento cirúrgico.<br />
As opções cirúrgicas mais comuns incluem craniotomia<br />
com abordagem da fossa média ou abordagem<br />
transmastoideia <strong>para</strong> oclusão ou re<strong>para</strong>ção do canal<br />
superior, sendo que a maioria dos centros usa a<br />
abordagem da fossa média 2,3 . O objectivo da cirurgia<br />
é ocluir a deiscência do canal semicircular superior<br />
de forma a eliminar a terceira janela móvel do ouvido<br />
interno. Os resultados a curto e longo prazo dependem<br />
da abordagem e procedimento utilizados.<br />
Em várias séries de doentes submetidos a cirurgia de<br />
re<strong>para</strong>ção do canal semicircular superior, todos os<br />
doentes operados obtiveram, pelo menos, melhoria dos<br />
sintomas incapacitantes, embora alguns tenham evoluído<br />
com complicações, tais como surdez neurossensorial ou<br />
hipofunção do labirinto do lado afectado 1,3,5,15,16,19 .<br />
A autofonia é um sintoma muito frequente nestes casos e<br />
que também pode melhorar após re<strong>para</strong>ção cirúrgica da<br />
deiscência, tal como Crane et al. 20 demonstraram numa<br />
série de 19 doentes, com melhoria em 94% dos casos.<br />
Por outro lado, relativamente à capacidade auditiva, os<br />
resultados não são tão lineares. Numa série de 29 doentes,<br />
Limb et al. 21 , se por um lado em doentes submetidos<br />
a cirurgia primária da fossa média, não encontraram<br />
associação com hipoacusia neurossensorial e até em<br />
alguns casos, verificaram melhoria da hipoacusia de<br />
condução, por outro, em casos de cirurgia da fossa média<br />
de revisão ou cirurgia estapédica prévia, verificaram<br />
poder haver associação com hipoacusia neurossensorial<br />
pós-operatória.<br />
Merchant et al. 9 nunca realizaram re<strong>para</strong>ção de deiscência<br />
do canal superior em doentes que apresentavam apenas<br />
hipoacusia de condução, pelo risco de desenvolvimento<br />
de surdez neurossensorial, <strong>para</strong> além dos potenciais<br />
riscos da cirurgia da fossa média. No caso por nós<br />
apresentado, a doente apresentou melhoria da<br />
hipoacusia de transmissão e não desenvolveu hipoacusia<br />
neurossensorial pós-operatória.<br />
No futuro, o reconhecimento e caracterização da<br />
hipoacusia de condução em doentes com SDCSS, em<br />
conjunto com uma forte suspeição diagnóstica, poderão<br />
ser importantes na redução do número de doentes<br />
submetidos sem necessidade a cirurgia do ouvido médio.<br />
CONCLUSÃO<br />
Apesar de rara e ainda pouco estudada, a SDCSS<br />
deve ser incluída tanto entre as causas de vertigem<br />
como de hipoacusia de transmissão. É importante a<br />
sua suspeição clínica, visto ser uma causa tratável de<br />
vertigem, podendo-se evitar a realização de abordagens<br />
diagnósticas e terapêuticas inapropriadas.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 287<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
Referências Bibliográficas:<br />
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288 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Sarcoma de Kaposi da laringe - Caso clínico<br />
Laryngeal Kaposi’s sarcoma - Case report<br />
Clara Silva Carla Gapo Natércia Silvestre Jorge Miguéis Ana Margarida Amorim Sofia Caetano Isabel Ramos Maria José Julião<br />
António Paiva<br />
RESUMO<br />
O sarcoma de Kaposi (SK) é a neoplasia mais frequente nos<br />
doentes com o Síndrome de Imunodeficiência Adquirida<br />
(SIDA). O envolvimento da cabeça e pescoço é frequente,<br />
no entanto o atingimento laríngeo com dispneia é raro. Os<br />
autores apresentam um caso clínico ilustrativo desta patologia<br />
como manifestação inicial de SIDA.<br />
Doente de 37 anos, sem antecedentes patológicos relevantes,<br />
com queixas de dispneia alta, disfonia e disfagia com 2 meses<br />
de evolução. Apresentava formação vegetante supraglótica,<br />
tendo sido realizada biópsia e traqueotomia. Os exames<br />
complementares confirmaram o diagnóstico de SK no contexto<br />
de infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (VIH).<br />
Iniciou quimioterapia, profilaxia das infecções oportunistas e<br />
terapêutica antiretrovírica, observando-se regressão completa<br />
das lesões e descanulação ao final do 4º ciclo de tratamento.<br />
Esta entidade, rara como manifestação inicial de SIDA, deve ser<br />
considerada no diagnóstico diferencial das massas laríngeas.<br />
Palavras-chave: Sarcoma de Kaposi, Laringe, VIH, SIDA.<br />
Clara Silva<br />
Interna de Otorrinolaringologia dos HUC<br />
Carla Gapo<br />
Assistente Hospitalar de Otorrinolaringologia dos HUC<br />
Natércia Silvestre<br />
Interna de Otorrinolaringologia dos HUC<br />
Jorge Miguéis<br />
Assistente Hospitalar Graduado de Otorrinolaringologia dos HUC<br />
Ana Margarida Amorim<br />
Assistente Hospitalar de Otorrinolaringologia dos HUC<br />
Sofia Caetano<br />
Interna de Infecciologia dos HUC<br />
Isabel Ramos<br />
Assistente Hospitalar de Infecciologia dos HUC<br />
Maria José Julião<br />
Assistente Hospitalar Anatomia Patológica dos HUC<br />
António Paiva<br />
Director de Serviço de Otorrinolaringologia dos HUC; Professor Catedrático da Faculdade de<br />
Medicina da Universidade de Coimbra<br />
Correspondência:<br />
Clara Silva<br />
ORL-10ºpiso<br />
Hospitais da Universidade de Coimbra<br />
Praceta Mota Pinto<br />
3000-075 Coimbra<br />
claranetosilva@gmail.com<br />
ABSTRACT<br />
Kaposi’s sarcoma (KS), is the most common malignancy<br />
observed in the patient with acquired immune deficiency<br />
syndrome (AIDS). Head and neck involvement is not unusual.<br />
However laryngeal involvement with dyspnoea is rare. The<br />
authors present a clinical case that illustrates this pathology<br />
as the first manifestation of AIDS.<br />
A 37 year-old male, with no prior pathology, with history of<br />
hoarseness, dysphagia and dyspnoea within 2 months. He<br />
presented with a supraglottic neoformation, and a biopsy of<br />
the lesion and a tracheotomy were performed. Complementary<br />
exams confirmed the diagnosis of laryngeal KS associated to<br />
human immunodeficiency virus (HIV) infection. He started<br />
chemotherapy, opportunistic infection prophylaxis and antiretroviral<br />
therapy. There was total regression of the lesions<br />
and he was decanulated after the 4 th cyle of chemotherapy.<br />
This entity, rare as the initial manifestation of AIDS, must be<br />
considered in the differential diagnosis of laryngeal mass.<br />
Keywords: Kaposi sarcoma, larynx, HIV, AIDS.<br />
INTRODUÇÃO<br />
O sarcoma de Kaposi (SK) é um tumor vascular indolente<br />
associado ao vírus herpes humano tipo 8 1-4 .<br />
A patogénese não está bem definida envolvendo uma<br />
interacção complexa entre factores de crescimento<br />
angiogénicos e citocinas 2,4,5 . Na infecção por VIH, a sua<br />
presença é definidora de SIDA 6 Foi descrito em 1872 pelo<br />
dermatologista húngaro, Moritz Kaposi, que caracterizou<br />
o tumor como lesões violáceas maculares cutâneas com<br />
bordos irregulares com predilecção pelas extremidades<br />
inferiores, mais frequentes em idosos do mediterrâneo<br />
e homens judeus. 6-8 Apresenta, no entanto, uma grande<br />
variância dependendo do subtipo epidemiológico:<br />
clássico, africano endémico, iatrogénico e epidémico<br />
associado a SIDA. 1-3,6 Em 1989, cerca de 40% dos homens<br />
homossexuais com SIDA desenvolviam SK. Destes,<br />
2/3 apresentavam lesões de SK na cabeça e pescoço e<br />
20% tinham envolvimento respiratório. Desde 1996, a<br />
incidência de SK associada a SIDA tem vindo a diminuir<br />
em parte devido à terapêutica antiretrovírica. 8 No<br />
entanto, a incidência de SK em indivíduos homossexuais<br />
que estão infectados com VIH é de cerca de 15-20%, 3%<br />
em heterossexuais que usam drogas injectáveis, 3% em<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 289<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
mulheres e crianças, 3% em receptores de transfusões e<br />
1% em hemofílicos. 4,6<br />
As lesões são muitas vezes multifocais podendo afectar<br />
qualquer parte do corpo. Embora a região da cabeça e<br />
pescoço esteja frequentemente envolvida pelo SK, o<br />
envolvimento laríngeo é pouco comum. 10 A apresentação<br />
do SK da laringe com obstrução das vias aéreas é rara,<br />
com apenas alguns casos descritos. 9 Ainda mais raro é<br />
ser a manifestação inicial de SIDA. 4<br />
CASO CLÍNICO<br />
Doente do sexo masculino, 37 anos, fumador (20UMA),<br />
sem antecedentes patológicos relevantes, que recorre à<br />
consulta de Otorrinolaringologia por disfonia, disfagia e<br />
dispneia alta com 2 meses de evolução. À laringoscopia<br />
indirecta verificou-se a presença de uma lesão vegetante,<br />
de bordos irregulares, friável, supraglótica que ocupava<br />
a região direita com edema perilesional. Realizou-se<br />
nasofibrolaringoscopia <strong>para</strong> documentar a lesão (figura 1).<br />
Foi solicitada Tomografia Computorizada (TC) cervicofacial<br />
e programada biópsia. A TC evidenciou um processo<br />
expansivo a nível da hipofaringe direita com extensão ao<br />
seio piriforme homolateral e prega ari-epiglótica direita<br />
com extensão inferior à hemilaringe (figura 2).<br />
FIGURA 1<br />
Nasofibrolaringoscopia: Lesão vegetante supraglótica direita.<br />
FIGURA 2<br />
TC cervico-facial- processo expansivo na hipofaringe direita<br />
290 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
A biópsia revelou um epitélio com alterações degenerativas<br />
superficiais de balonização e necrose, discreta<br />
papilomatose e congestão intensa da lâmina própria,<br />
portanto sem aspectos neoplásicos ou de processo<br />
granulomatoso. Entretanto recorre ao serviço de<br />
urgência por agravamento da dispneia com necessidade<br />
de traqueotomia, sob anestesia geral, por iminente<br />
obstrução das vias aéreas. Nessa altura foi repetida a<br />
biópsia (mais alargada). O estudo serológico evidenciou<br />
infecção por VIH e o estudo anatomo-patológico foi<br />
compatível com SK (figura 3). A contagem de linfócitos T<br />
CD4+ era de 3,7células /mm 3 e carga viral VIH-1: 189.244<br />
cópias/ml. Durante o internamento verifica-se a presença<br />
de lesões cutâneas toraco-abdominais esquerdas (figura<br />
4) e nos membros inferiores, compatíveis com SK cutâneo<br />
e a presença de candidíase oral.<br />
FIGURA 3<br />
Estudo histológico por microscopia óptica: Neoplasia<br />
fusocelular vascular. H10-18022x200 Hematoxilina-eosina<br />
FIGURA 4<br />
Lesões cutâneas torácicas violáceas com um padrão de<br />
distribuição linear típico.
O doente foi orientado <strong>para</strong> o Serviço de Infecciologia<br />
onde iniciou tratamento com doxorrubicina lipossómica<br />
e terapêutica antiretrovírica, tendo sido descanulado<br />
com sucesso ao fim do 4º ciclo de tratamento (figura 5).<br />
FIGURA 5<br />
Nasofibrolaringoscopia: Laringe após o 4º ciclo de<br />
quimioterapia<br />
DISCUSSÃO<br />
O SK da cabeça e pescoço está bem descrito na literatura,<br />
sendo o palato e as gengivas locais de envolvimento<br />
frequente. 6 Contudo o SK que resulta em obstrução<br />
das vias aéreas é raro. 5 Mochoulis et al conduziu um<br />
estudo retrospectivo, identificando 17 doentes com<br />
SK laríngeo, verificando que a região supra glótica é a<br />
mais afectada. 3,6,8 Como qualquer patologia laríngea<br />
manifesta-se por disfonia, disfagia ou dispneia podendo<br />
causar obstrução completa. Assim, o SK deverá entrar no<br />
diagnóstico diferencial das lesões laríngeas.<br />
Embora o SK seja reportado em todos os grupos de risco<br />
<strong>para</strong> infecção VIH verifica-se uma predominância nos<br />
homossexuais ou bissexuais do sexo masculino. 4<br />
O SK é muitas vezes assintomático e pode ocorrer em<br />
qualquer estadio da infecção VIH, mas a mortalidade está<br />
aumentada quando há envolvimento visceral e pulmonar.<br />
Consideram-se também factores de mau prognóstico, o<br />
tamanho do tumor, a contagem de linfócitos CD4+ inferior<br />
a 200células/mm 3 e história de infecções oportunistas. 5<br />
O diagnóstico do SK laríngeo é realizado por laringoscopia<br />
e biópsia sendo necessário manter um alto índice de<br />
suspeição, nomeadamente em doentes sem aparentes<br />
factores de risco <strong>para</strong> infecção por VIH. Histologicamente<br />
é caracterizado pela presença de células fusiformes com<br />
uma orientação aleatória, eritrócitos extravasados e a<br />
presença de finas fendas vasculares numa rede reticular<br />
de fibras de colagénio. 6<br />
Nos casos semelhantes ao por nós descrito, pode ser<br />
necessária uma intervenção urgente pelo risco de<br />
obstrução da via aérea. Especula-se que a cricotirotomia<br />
deverá ser preferida dado o risco de hemorragia<br />
associado à traqueotomia, muito embora não exista<br />
grande experiência com a primeira. 8,9,10 Grenberg<br />
et al e Roy et al reportaram casos de pacientes com<br />
SIDA e Kaposi laríngeo cuja traqueotomia resultou em<br />
hemorragia não controlada, <strong>para</strong>gem cardiorespiratória<br />
e morte. 8 Relativamente à biópsia, há autores que não<br />
a recomendam pelo risco de hemorragia associado. 6 A<br />
necessidade de realização de procedimentos invasivos<br />
está associada a uma maior morbilidade e mortalidade. 8<br />
No entanto, no caso clínico relatado não houve qualquer<br />
tipo de intercorrência hemorrágica.<br />
As opções terapêuticas são variadas incluindo: irradiação<br />
local, quimioterapia intralesional ou ablação laser e<br />
terapêutica sistémica, particularmente se a doença<br />
estiver disseminada ou for rapidamente progressiva. 10<br />
A terapêutica local é geralmente usada <strong>para</strong> como<br />
tratamento paliativo da dor e <strong>para</strong> obter melhoria<br />
funcional. 4,6<br />
Por outro lado, nestes doentes é fundamental o<br />
tratamento do VIH propriamente dito. No final<br />
dos anos 90 foram introduzidas duas novas classes<br />
de antiretrovíricos, os análogos dos inibidores da<br />
transcriptase reversa não nucleosídeos e os inibidores<br />
da protease, que melhoraram significativamente a<br />
eficácia deste tipo de terapêutica. 1,6 A combinação de<br />
3 ou mais agentes antiretrovíricos de pelo menos duas<br />
classes diferentes ficaram conhecidos como tratamento<br />
antiretroviral (TARV). Esta combinação leva a uma rápida<br />
diminuição plasmática da carga viral de RNA VIH e um<br />
aumento da contagem de linfócitos CD4+. Está também<br />
associada a supressão da replicação do VIH, redução das<br />
infecções oportunistas, da mortalidade, das neoplasias<br />
associadas a SIDA e do SK laríngeo epidémico. 1,6<br />
Durante a era pré TARV a radioterapia tinha um papel bem<br />
definido no tratamento do SK cutâneo e lesões dolorosas<br />
dos pés, genitais, cavidade oral e conjuntiva. No entanto<br />
é agora menos utilizada como 1ªlinha, tornando-se de<br />
2º ou 3ª linha depois da quimioterapia. 1 Cármen Ares e<br />
Abdelkarim S Allal apresentam um caso de SK laríngeo<br />
com boa resposta à radioterapia, considerando a mesma<br />
uma boa alternativa com elevado sucesso. Os agentes<br />
utilizados <strong>para</strong> quimioterapia incluem a vincristina,<br />
vinblastina, doxorrubicina lipossómica, daunorubicina<br />
lipossómica, paclitaxel e interferão alfa. 1,3<br />
A injecção intralesional de vinblastina foi usada<br />
inicialmente em 1968 por Klein, sendo um método válido<br />
<strong>para</strong> o tratamento de lesões pequenas a moderadas da<br />
orofaringe e laringe. Outras formas de tratamento local<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 291<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
incluem a injecção de interferão alfa, aplicação tópica de<br />
retinóides sintéticos e terapêutica fotodinâmica. 4<br />
Os doentes com SIDA têm uma sobrevida limitada.<br />
O subtipo de SK associado à mesma é a forma mais<br />
agressiva, sendo que habitualmente os doentes morrem<br />
em 15 a 24 meses. 3<br />
Dada a agressividade deste tumor é necessário investir<br />
em novas armas terapêuticas, de forma a garantir o<br />
aumento da taxa de sobrevida destes doentes.<br />
CONCLUSÃO<br />
O sarcoma de Kaposi pode ocorrer em indivíduos<br />
saudáveis ou imunodeprimidos e o seu aparecimento<br />
em locais atípicos é difícil de diagnosticar, requerendo<br />
um alto índice de suspeição. Portanto é necessário<br />
considerá-lo no diagnóstico diferencial de massas<br />
laríngeas. Apesar do risco associado a procedimentos<br />
invasivos como a traqueotomia e a biópsia, estas são de<br />
considerar na evidência de obstrução da via aérea e na<br />
necessidade de um diagnóstico, como ilustrado no caso<br />
clínico apresentado.<br />
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292 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
A técnica endoscópica endonasal no diagnóstico<br />
de lesões da base do crânio: A propósito de um<br />
cordoma do clivus<br />
Intranasal endoscopy diagnosing skull base<br />
pathology: A case of clivus chordoma<br />
Cláudia Reis José Gameiro dos Santos Rosário Figueirinhas Telma Feliciano Cristina Ramos Melo Pires Cecília Almeida e Sousa<br />
RESUMO<br />
A técnica endoscópica endonasal, universalmente implementada<br />
no diagnóstico e tratamento de múltiplas patologias<br />
nasossinusais, surge como uma alternativa válida aos métodos<br />
tradicionais de biópsia da base do crânio. De acordo com a<br />
literatura disponível, apresenta taxas de sucesso comparáveis<br />
ou mesmo superiores às abordagens neurocirúrgicas, com<br />
menor morbilidade, desde que efectuada por equipas<br />
cirúrgicas experientes e após um estudo pré-operatório<br />
cuidadoso. O objectivo deste artigo é a apresentação de um<br />
caso clínico de lesão tumoral do clivus, cuja biópsia realizada<br />
por via endoscópica demonstrou tratar-se de um cordoma,<br />
a mais frequente das neoplasias intrínsecas desta região da<br />
base do crânio.<br />
Palavras-chave: Técnica endoscópica endonasal, Clivus, Cordoma<br />
Cláudia Reis<br />
Interna Complementar do Serviço ORL do Hospital de Santo António – Centro Hospitalar do<br />
Porto<br />
José Gameiro dos Santos<br />
Assistente Hospitalar Graduado do Serviço ORL do Hospital de Santo António – Centro Hospitalar<br />
do Porto<br />
Rosário Figueirinhas<br />
Assistente Hospitalar do Serviço ORL do Hospital de Santo António – Centro Hospitalar do Porto<br />
Telma Feliciano<br />
Assistente Hospitalar do Serviço ORL do Hospital de Santo António – Centro Hospitalar do Porto<br />
Cristina Ramos<br />
Assistente Hospitalar do Serviço Neurorradiologia do Hospital de Santo António – Centro<br />
Hospitalar do Porto<br />
Melo Pires<br />
Assistente Hospitalar do Departamento de Neuropatologia do Hospital de Santo António –<br />
Centro Hospitalar do Porto<br />
Cecília Almeida e Sousa<br />
Directora do Serviço ORL do Hospital de Santo António – Centro Hospitalar do Porto<br />
Correspondência:<br />
Cláudia Reis<br />
E-mail: claudiapintoreis@gmail.com<br />
Serviço ORL do Hospital de Santo António – Centro Hospitalar do Porto<br />
Largo Abel Salazar - 4000 Porto<br />
ABSTRACT<br />
The endonasal endoscopic technique is widely used in diagnosis<br />
and treatment of multiple nasosinusal pathology, but also a<br />
viable alternative to the conventional biopsy approaches to<br />
the skull base. According to the previous literature, the success<br />
rates are com<strong>para</strong>ble or even better than the neurosurgical<br />
approaches, with lower morbidity, when performed by skilled<br />
surgeons and with a careful pre-operatory study. This study<br />
presents a clinical case of a neoplastic lesion of the clivus,<br />
accessed endoscopically, which biopsy revealed a chordoma,<br />
the most frequent intrinsic tumor of this skull base area.<br />
Keywords: Endonasal endoscopic technique, Clivus, Chordoma<br />
INTRODUÇÃO<br />
A generalização do uso da endoscopia endonasal a<br />
que se assistiu nas últimas décadas revolucionou o<br />
diagnóstico e terapêutica em Otorrinolaringologia<br />
(ORL), sendo aceite universalmente como um meio<br />
de eleição <strong>para</strong> uma grande variedade de patologia<br />
inflamatória, neoplásica e hemorrágica do nariz e seios<br />
perinasais. No entanto, o seu papel em campos distintos<br />
como procedimentos oftalmológicos (descompressão<br />
orbitária, dacriocistorrinostomia, descompressão do<br />
nervo óptico, entre outros) e na patologia da base do<br />
crânio (meningocelos, meningoencefalocelos, entre outros)<br />
encontra-se em franca expansão.<br />
A abordagem endonasal da base do crânio tem<br />
demonstrado taxas de sucesso comparáveis ou mesmo<br />
superiores às abordagens intracranianas tradicionais 1 ,<br />
com muito menor morbilidade, nomeadamente no que<br />
diz respeito à evicção de craniotomias, preservação do<br />
olfacto e menores tempos de internamento 2 .<br />
Este artigo pretende demonstrar, através da descrição<br />
de um caso clínico, a aplicação desta técnica no<br />
diagnóstico histológico de lesões da base do crânio,<br />
mais concretamente do clivus.<br />
O clivus é uma região composta pela porção dorsal do<br />
osso esfenóide e a porção do osso occipital localizada<br />
anteriormente ao foramen magnum. Assim, é limitado<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 293<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
anteriormente pela clinóide posterior e posteriormente<br />
pela margem do foramen magnum, encontrando-se<br />
na sua superfície dorsal o tronco cerebral e o sistema<br />
vertebrobasilar. Esta região pode ser afectada por<br />
doenças neoplásicas, infecciosas, vasculares, congénitas,<br />
entre outras. No que diz respeito a patologia tumoral<br />
no clivus, importa distinguir as neoplasias intrínsecas,<br />
a mais frequente das quais o cordoma, as neoplasias<br />
extrínsecas, como meningiomas com origem na duramater<br />
da superfície dorsal, e metástases, mais comuns<br />
que os tumores primários, frequentemente com origem<br />
no pulmão, mama, próstata ou rim.<br />
As lesões do clivus podem ser abordadas anteriormente<br />
por duas vias: a transesfenoidal, particularmente útil<br />
em lesões dos terços superior e médio, e a transoral,<br />
mais adequada <strong>para</strong> lesões do terço inferior e quando é<br />
necessária exposição da junção craniovertebral 3 .<br />
Os cordomas correspondem a 1 a 4% de todos os<br />
tumores ósseos malignos, com uma incidência estimada<br />
de
FIGURA 2<br />
Imagens de TC em cortes axiais sem contraste (a), com contraste<br />
(b) e em janela óssea, demonstrando lesão osteolítica do clivus<br />
atingindo o canal do nervo hipoglosso direito; corte sagital (d).<br />
no restante esqueleto (Figura 4). Analiticamente, de<br />
referir hemograma e estudo bioquímico sem alterações,<br />
exames serológicos negativos (nomeadamente VDRL,<br />
rubéola, herpes simplex tipo 1 e 2, herpes zooster,<br />
parvovírus, hepatite A, B e C, citomegalovírus e HIV 1 e<br />
2) e estudo de auto-anticorpos sem alterações.<br />
Foi submetido a biópsia sob anestesia geral, em área<br />
verificada por neuronavegação, com abordagem<br />
endoscópica endonasal, procedendo-se a incisão da<br />
mucosa na linha média da nasofaringe. Foi biopsada<br />
lesão de aspecto irregular e friável, tendo o exame<br />
histológico revelado um pequeno foco de proliferação<br />
linfóide, compatível com linfoma de células B (Figura<br />
5). No entanto, pela escassez de material enviado, a<br />
Anatomia Patológica sugeria estudo analítico e eventual<br />
repetição de biópsia. O estudo imunofenotípico<br />
dos linfócitos do sangue periférico não demonstrou<br />
alterações sugestivas de doença linfoproliferativa, pelo<br />
que o doente foi encaminhado <strong>para</strong> nova biópsia. A<br />
abordagem foi igualmente endoscópica endonasal, mas<br />
desta vez mais inferiormente, com remoção da mucosa<br />
da parede posterior da orofaringe retropalatal, e em<br />
maior profundidade, com recurso a escopro. O exame<br />
anatomo-patológico foi conclusivo <strong>para</strong> cordoma (Figura<br />
6a e b).<br />
FIGURA 3<br />
Imagens de RM em T1 (a) e T2 (b) e (c), demonstrado extensão inferior até ao plano do arco anterior de C1 e extremo superior da<br />
apófise odontóide.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 295<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
FIGURA 4<br />
Cintigrafia óssea de corpo inteiro, excluindo lesões síncronas ou secundárias<br />
FIGURA 5<br />
Pequena ampliação (coloração hematoxilina-eosina) da<br />
1ª biópsia, demonstrando apenas infiltrado inflamatório<br />
linfocitário<br />
296 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
FIGURA 6<br />
Pequena (a) e grande ampliação (b) (coloração hematoxilinaeosina)<br />
da 2ª biópsia, com evidência de neoplasia.
DISCUSSÃO<br />
O caso clínico descrito pretende demonstrar uma das<br />
possíveis aplicações da endoscopia nasal, cada vez mais<br />
um instrumento indispensável na prática clínica em<br />
ORL.<br />
Os cordomas correspondem a apenas 1% de todos<br />
os tumores intracranianos, sendo a localização<br />
mais frequente a sincondrose esfenooccipital. São<br />
diagnosticados em qualquer idade, mas geralmente em<br />
adultos, com pico de incidência na quarta década de vida.<br />
Parece haver uma maior incidência no sexo masculino<br />
(2:1). Clinicamente, são tumores de crescimento lento<br />
e muitas vezes assintomáticos, podendo manifestar-se<br />
com cefaleias, algias faciais, parestesias, diplopia ou<br />
outros défices neurológicos.<br />
Apesar das características acima descritas, a história<br />
clínica e os dados imagiológicos deixam muitas vezes<br />
por esclarecer a natureza da lesão, impondo-se um<br />
diagnóstico histológico, que, como foi demonstrado,<br />
pode ser conseguido por via endoscópica endonasal,<br />
com ou sem auxílio da neuronavegação 8 . A literatura<br />
disponível revela que se trata de uma abordagem<br />
menos agressiva, com menor morbilidade e tempo de<br />
internamento, passível de se efectuar em segurança<br />
com um estudo pré-operatório cuidado e por uma<br />
equipa cirúrgica experiente 9 .<br />
O caso clínico descrito corresponde a um caso típico<br />
de cordoma do clivus, com uma história insidiosa de<br />
cefaleias e lesão do XII par craniano, tendo decorrido<br />
um período de cerca de 15 meses entre o início dos<br />
sintomas e a confirmação do diagnóstico. Este período<br />
é consideravelmente inferior ao descrito na literatura,<br />
com tempo-médio <strong>para</strong> o diagnóstico de 25 meses,<br />
sendo que, em séries publicadas antes da década de<br />
1980, se descrevem períodos de cerca de 40 meses6.<br />
Esta redução do tempo <strong>para</strong> o diagnóstico é um<br />
mais que provável reflexo da melhoria dos métodos<br />
de diagnóstico, nomeadamente TC e RM, uma vez<br />
que a procura de cuidados médicos continua a ser<br />
relativamente tardia, dado o carácter insidioso e muitas<br />
vezes pouco sintomático desta patologia.<br />
A abordagem da face anterior do clivus pode ser feita<br />
por duas vias: a transesfenoidal, <strong>para</strong> lesões dos terços<br />
superior e médio, e a transoral, mais adequada <strong>para</strong><br />
lesões do terço inferior e quando é necessária exposição<br />
da junção craniovertebral. No caso descrito, ambas as<br />
biópsias foram realizadas sob endoscopia endonasal,<br />
diferindo fundamentalmente no nível de abordagem<br />
da parede posterior da faringe: nasofaringe na primeira<br />
biópsia, não tendo havido uma adequada colheita de<br />
material; orofaringe retropalatal na segunda biópsia,<br />
que se revelou conclusiva, facto que poderá ter relação<br />
com a extensão significativa da lesão no sentido caudal<br />
(até ao plano do arco anterior de C1 e extremo superior<br />
da apófise odontóide).<br />
De referir ainda a importância do estudo do restante<br />
esqueleto, neste caso pela realização de cintigrafia<br />
óssea de corpo inteiro, que permitiu excluir lesões<br />
síncronas, concretamente na região sacro-coccígea,<br />
que embora extremamente infrequentes, se encontram<br />
descritas na literatura 10 .<br />
Em conclusão, a técnica endoscópica endonasal é uma<br />
alternativa válida aos métodos tradicionais de biópsia<br />
da base do crânio, com taxas de sucesso comparáveis ou<br />
mesmo superiores e com menor morbilidade, desde que<br />
efectuada por equipas cirúrgicas experientes e após um<br />
estudo pré-operatório cuidadoso. Na patologia tumoral<br />
do clivus, a escolha da via de abordagem deverá reflectir<br />
a situação anatómica em causa, nomeadamente no<br />
que diz respeito à extensão caudal. Perante a suspeita<br />
clínica de cordoma do clivus, está formalmente indicado<br />
o estudo imagiológico da totalidade do esqueleto pela<br />
possibilidade, embora infrequente, de existência de<br />
lesões síncronas.<br />
Referências Bibliográficas:<br />
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Neck Oncology 2010, 2, p. 9-16<br />
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p. 865-868<br />
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The Oncologist, 2007; 12, p. 1344-1350<br />
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and review of the literature, Skull Base Surgery, 1991;1, p. 200-206<br />
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the United States, 1973-1995. Cancer Causes Control 2001; 12, p.1-11<br />
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technology for complex endoscopic endonasal surgery, Postgrad Med<br />
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9 Naokatsu, S. et al., Endoscopic endonasal pituitary and skull base<br />
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10 Shahzada, K.A. et al., Clivus chordoma: is it enough to image the<br />
primary site?, Skull Base, 2010; 20, p. 111-113<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 297<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
298<br />
REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Fístulas espontâneas de líquido cefalorraquidiano do<br />
ouvido médio – A propósito de um caso clínico.<br />
Spontaneous cerebrospinal fluid otorrhea – Case<br />
report and literature revision<br />
Eurico Costa Ana Guimarães Filipe Freire V. Gabão Veiga<br />
RESUMO<br />
Relata-se o caso clínico de mulher de 66 anos, referenciada<br />
à consulta de Otorrinolaringologia do Hospital Prof. Doutor<br />
Fernando Fonseca por acufeno e hipoacusia, bilaterais,<br />
mais intensos à direita, com vários anos de evolução mas<br />
com agravamento nos últimos dois. A observação e exames<br />
audiométricos eram sugestivos de derrame no ouvido médio,<br />
com fossas nasais e rinofaringe sem alterações. Foi submetida<br />
a miringotomia com intenção de colocação de tubo de<br />
ventilação transtimpânico. Intra-operatoriamente constatou-<br />
-se a drenagem abundante de líquido límpido e incolor tipo<br />
“água de rocha”, que rapidamente preenchia o canal auditivo<br />
externo.<br />
Foi colhida amostra do líquido <strong>para</strong> análise bioquímica,<br />
incluindo β2-transferrina e tamponou-se o canal<br />
auditivo externo. O resultado foi compatível com líquido<br />
cefalorraquidiano. Realizou tomografia computorizada de<br />
ouvidos e ressonância magnética de crânio, verificandose<br />
erosão inequívoca do tegmen á direita, sem sinais de<br />
meningoencefalocelo. Foi proposta correcção cirúrgica da<br />
fístula.<br />
Os autores propõem-se realizar uma breve revisão bibliográfica<br />
desta patologia.<br />
Palavras-chave: fístulas espontâneas, líquido cefalorraquidiano,<br />
ouvido médio.<br />
Eurico Costa<br />
Interno de Formação Específica em Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial do Hospital<br />
Prof. Doutor Fernando Fonseca.<br />
Ana Guimarães<br />
Assistente Hospitalar de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial do Hospital Prof. Doutor<br />
Fernando Fonseca.<br />
Filipe Freire<br />
Assistente Hospitalar Graduado de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial do Hospital<br />
Prof. Doutor Fernando Fonseca.<br />
V. Gabão Veiga<br />
Director de Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial do Hospital Prof. Doutor<br />
Fernando Fonseca.<br />
Correspondência:<br />
Eurico Humberto Rodrigues da Costa<br />
Morada: Rua Arminda Correia N.º 5, 5.ºD, 1750-183 Lisboa<br />
Telefone: 916717909<br />
E-mail: euricosta@gmail.com<br />
ABSTRACT<br />
The authors present the case report of a 66 years old female<br />
patient, referred to our department at Hospital Prof. Doutor<br />
Fernando Fonseca for tinnitus and hearing loss, bilateral,<br />
more intense on the right side, with several years of evolution<br />
but worse in the last two years. Physical examination and<br />
audiometric tests were suggestive of otitis media with effusion.<br />
Nasal cavity and nasopharynx were normal. She underwent<br />
myringotomy for transtympanic ventilation tube placement.<br />
Immediately after myringotomy abundant drainage of a clear,<br />
colorless liquid was found, quickly filling the external auditory<br />
canal. A fluid sample was collected for biochemical analysis,<br />
including β2-transferrin, and the external auditory canal was<br />
packed. The result was consistent with cerebrospinal fluid. A<br />
computed tomography and magnetic resonance imaging were<br />
performed and a defect on the right temporal bone tegmen<br />
was found, without signs of meningoencephalocele. We<br />
proposed surgical repair of the defect.<br />
Keywords: spontaneous fistulae; cerebrospinal fluid; middle<br />
ear<br />
INTRODUÇÃO<br />
As fístulas de líquido cefalorraquidiano (LCR) do<br />
ouvido médio e mastóide ocorrem quando defeitos no<br />
pavimento ósseo e dura-máter da fossa média põem em<br />
comunicação o espaço sub-aracnoideu, preenchido por<br />
LCR, com os espaços pneumatizados do osso temporal 1 .<br />
As causas mais frequentes de fístulas são as iatrogénicas<br />
e as traumáticas, embora também sejam possíveis<br />
causas neoplásicas, infecciosas e congénitas; otorreia<br />
espontânea de LCR refere-se aos casos em que nenhuma<br />
destas etiologias pôde ser encontrada 2 .<br />
Apesar da designação “otorreia espontânea de LCR” ser<br />
normalmente adoptada <strong>para</strong> descrever este fenómeno,<br />
uma designação mais precisa seria “efusão espontânea<br />
de LCR” 3 uma vez que a otorreia só estará presente se<br />
coexistir um defeito na membrana timpânica ou canal<br />
auditivo externo.<br />
Dois subgrupos distintos de doentes podem apresentar<br />
otorreia espontânea de LCR: Crianças com anomalias<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 299<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
congénitas do osso temporal e adultos de meia-idade,<br />
ou mais velhos, com efusão do ouvido médio. A otorreia<br />
de LCR congénita é rara e a sua primeira manifestação<br />
é muitas vezes uma meningite numa criança com<br />
hipoacusia neurossensorial profunda pré-existente.<br />
Estas crianças apresentam alterações do osso temporal<br />
como displasia de Mondini, platina do estribo deiscente,<br />
defeito na extremidade lateral do canal auditivo<br />
interno, aqueduto coclear amplamente patente, defeito<br />
na fissura de Hyrtl ou canal de Falópio deiscente. O<br />
segundo grupo de doentes consiste essencialmente em<br />
mulheres de meia-idade, ou mais velhas, com excesso<br />
de peso ou obesidade e que geralmente apresentam<br />
sinais e sintomas de efusão do ouvido médio 1 .<br />
Os mecanismos fisiopatológicos não estão ainda<br />
completamente esclarecidos mas defeitos congénitos do<br />
osso temporal, granulações aracnoideias e aumento da<br />
pressão intra-craniana parecem estar frequentemente<br />
implicados no desenvolvimento de fístulas espontâneas<br />
de LCR.<br />
Ao contrário das fístulas com origem traumática,<br />
as fístulas espontâneas raramente respondem à<br />
terapêutica médica conservadora pelo que, atendendo<br />
ao risco significativo de complicações infecciosas intracranianas,<br />
o encerramento cirúrgico está quase sempre<br />
indicado.<br />
A propósito de um caso clínico de fístula espontânea de<br />
LCR do ouvido médio no adulto os autores propõem-se<br />
fazer uma breve revisão bibliográfica da apresentação<br />
clínica, mecanismos fisiopatológicos, diagnóstico e<br />
tratamento desta patologia.<br />
DESCRIÇÃO DO CASO<br />
Doente de 66 anos, raça caucasiana, sexo feminino,<br />
doméstica, casada, dois filhos. Antecedentes pessoais<br />
FIGURA 1<br />
300 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
de hipertensão arterial, patologia osteoarticular<br />
degenerativa, obesidade mórbida – índice de massa<br />
corporal 42 kg/m 2 – e depressão.<br />
Sem antecedentes cirúrgicos. Medicação habitual:<br />
ácido acetisalicílico, diltiazem, indapamida, irbesartan,<br />
mexazolan e nimesulida.<br />
A doente recorreu à consulta externa de<br />
Otorrinolaringologia (ORL) do Hospital Prof. Dr.<br />
Fernando Fonseca por hipoacusia e acufeno pulsátil<br />
bilateral, embora com maior intensidade à direita,<br />
com cerca de 30 anos de evolução mas com notório<br />
agravamento nos últimos dois anos, sobretudo do<br />
lado direito. Ocasionalmente coexistiam queixas de<br />
plenitude auricular direita e cefaleias. Sem outras<br />
queixas, nomeadamente tontura ou vertigem.<br />
A otoscopia era compatível com a presença de efusão<br />
no ouvido médio. A rinoscopia e nasofibroscopia não<br />
revelaram alterações. Foi diagnosticada otite média<br />
com efusão direita, medicada com anti-histamínico<br />
oral e corticosteroide tópico nasal. O audiograma<br />
e timpanograma eram compatíveis com o mesmo<br />
diagnóstico (figuras 1 e 2). Em consulta de reavaliação,<br />
4 meses depois, não se verificava melhoria clínica pelo<br />
que foi proposta miringotomia com colocação de tubo<br />
de ventilação transtimpânico (TVT) à direita. Intraoperatoriamente,<br />
imediatamente após a miringotomia<br />
direita, constatou-se drenagem abundante de líquido<br />
límpido, incolor, tipo “água de rocha”, que rapidamente<br />
preenchia todo o canal auditivo externo. Colheu-se<br />
amostra do líquido <strong>para</strong> análise bioquímica, incluindo<br />
β 2 -transferrina e tamponou-se o canal auditivo externo.<br />
Nesse mesmo dia realizou tomografia computorizada<br />
(TC) de ouvidos de alta resolução sem contraste e<br />
ressonância magnética nuclear (RMN) de crânio. A TC<br />
revelou um defeito ósseo do tegmen mastoideu direito,
FIGURA 2<br />
com cerca de 9x6 mm, em comunicação com antro<br />
mastoideu e cujo limite anterior se estendia pelo tegmen<br />
timpânico até próximo da articulação incudo-maleolar<br />
(figuras 3 e 4); coexistia opacificação otomastoideia<br />
global à direita por componente com densidade de<br />
partes moles e eventual deiscência do canal semicircular<br />
superior direito; à esquerda o tegmen era de<br />
espessura muito reduzida mas sem aparentes erosões/<br />
efracções e a permeabilidade otomastoideia estava<br />
mantida; cápsulas óticas, cadeias ossiculares e canais<br />
auditivos internos normais bilateralmente. A RMN não<br />
FIGURAS 3 e 4<br />
apresentava sinais de mielomeningocelo, sela turca<br />
vazia, lesões ocupando espaço ou outras alterações<br />
valorizáveis. A determinação de β 2 -transferrina e<br />
restantes análises bioquímicas foram compatíveis<br />
com líquido cefalorraquidiano. Feito o diagnóstico de<br />
fístula de LCR, após verificação do encerramento da<br />
miringotomia, a doente teve alta com referenciação<br />
a consulta externa de ORL no intuito de programar<br />
o encerramento cirúrgico da fístula. Após a alta<br />
abandonou a consulta sem motivo aparente, tendo<br />
sido contactada telefonicamente cerca de 6 meses<br />
depois. Com dificuldade conseguiu-se que a doente<br />
comparecesse na consulta externa, onde foi reforçada a<br />
necessidade de encerramento cirúrgico da fístula dado<br />
o risco considerável de complicações infecciosas intracranianas.<br />
A doente, no entanto, recusou peremptoriamente<br />
a cirurgia.<br />
DISCUSSÃO<br />
O conceito de fístula espontânea de LCR foi descrito<br />
pela primeira vez por Thomson em 1899 numa criança<br />
de 10 anos 4 . O primeiro caso de efusão e otorreia<br />
espontânea de LCR no adulto foi publicado em 1913 5 .<br />
Numa revisão da literatura Fergunson et al 6 identificou<br />
um total de 29 casos reportados no adulto até 1986. Em<br />
2005 Leonetti et al 7 publicou um estudo envolvendo 51<br />
casos de fístulas espontâneas transtemporais de LCR. Só<br />
nos últimos 10 anos foram descritos mais de 150 casos<br />
de fístulas espontâneas no adulto. Face a este aumento<br />
constante do número de casos reportados, facilmente<br />
se depreende que estaremos perante uma patologia<br />
mais frequente do que inicialmente imaginado. Este<br />
aumento estará mais provavelmente relacionado com<br />
a crescente consciência e reconhecimento da patologia<br />
pelos otorrinolaringologistas, auxiliados por mais e<br />
melhores exames complementares de diagnóstico, do<br />
que a um real aumento na incidência da doença.<br />
O mecanismo fisiopatológico não se encontra ainda<br />
completamente esclarecido. Fazendo a média<br />
dos resultados obtidos em quatro estudos com<br />
autópsias, que em conjunto analisaram um total de<br />
241 ossos temporais, conclui-se que defeitos ósseos<br />
do tegmen estão presentes em cerca de 25% dos<br />
temporais 6,8,9,10 . Esta elevada prevalência de defeitos<br />
ósseos, contudo, não se coaduna com a raridade das<br />
otorreias espontâneas de LCR, pelo que mecanismos<br />
fisiopatológicos adicionais terão inevitavelmente<br />
de estar presentes, levando à rotura da dura-máter<br />
adjacente ao defeito ósseo. Uma premissa amplamente<br />
aceite é a de que anos de normal pulsação de LCR,<br />
em zonas com defeitos ósseos congénitos, levam ao<br />
alargamento desses defeitos e enfraquecimento da<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 301<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
dura-máter nessas zonas com consequente formação<br />
de fístulas de LCR e/ou meningoencefalocelos. Esta<br />
teoria é suportada pela constatação de que as fístulas<br />
espontâneas de LCR do tegmen surgem, na esmagadora<br />
maioria das vezes, apenas após os 55 anos.<br />
Outra teoria, inicialmente elaborada por Gacek 11 et al,<br />
envolve a presença de granulações aracnoideias com<br />
localizações ectópicas. As granulações aracnoideias<br />
são dilatações de minúsculas projecções da aracnóide,<br />
as vilosidades aracnoideias, cujo centro se encontra<br />
preenchido por LCR e que normalmente se projectam<br />
no interior dos seios venosos. O LCR passa do centro<br />
das vilosidades aracnoideias <strong>para</strong> os seios venosos<br />
intradurais permitindo, desta forma, a reabsorção do<br />
LCR e a manutenção de uma pressão intra-craniana<br />
normal. Por vezes, durante o desenvolvimento, em vez<br />
da normal localização nos seios venosos, as granulações<br />
ficam em contacto directo com osso. Ao longo dos anos<br />
a pressão directa exercida no osso pela pulsação do<br />
LCR nas granulações aracnoideias resulta em erosões<br />
e defeitos ósseos e no enfraquecimento da duramáter<br />
nestes locais, culminando em fístulas de LCR e/<br />
ou meningoencefalocelos. O facto de o temporal ser<br />
pneumatizado abaixo da fina lâmina de osso do tegmen<br />
da fossa média explica a localização mais frequente<br />
de fístulas espontâneas de LCR na fossa média em<br />
com<strong>para</strong>ção com a posterior.<br />
Numa linha de pensamento semelhante, uma elevação<br />
da pressão intra-craniana, independentemente da sua<br />
etiologia, parece estar associada a fístulas espontâneas<br />
de LCR em ossos temporais com defeitos pré-existentes<br />
ou granulações aracnoideias. Vários estudos recentes<br />
constataram que a maior parte dos doentes com efusão<br />
espontânea de líquor são obesos de meia-idade, sendo<br />
as mulheres mais afectadas que os homens 12,13,14 .<br />
A doente do nosso caso clínico apresentava estas<br />
três características. Schlosser et al 15,16 constatou que<br />
estes três aspectos eram comuns aos doentes com<br />
hipertensão intra-craniana idiopática ou benigna. Esta<br />
é definida pela presença de hipertensão intra-craniana<br />
na ausência de lesões ocupando espaço ou anomalias<br />
na composição do LCR e manifesta-se por cefaleias,<br />
acufenos pulsáteis, alterações visuais com papiledema<br />
e disfunções endócrinas. A obesidade é, por si só, um<br />
factor etiológico importante de hipertensão intracraniana<br />
benigna uma vez que aumenta a pressão intraabdominal,<br />
diminui o retorno venoso e desta forma<br />
aumenta a pressão intra-craniana. Imagiologicamente<br />
a manifestação mais frequente de hipertensão intracraniana<br />
idiopática é a sela turca vazia ou parcialmente<br />
vazia. Alguns estudos 15,16,17 demonstraram uma estreita<br />
relação entre fístulas espontâneas de LCR do ouvido<br />
302 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
ou nariz e a presença de sela turca vazia na RMN<br />
encefálica. Sendo certo que nem todos os doentes<br />
com fístulas espontâneas de líquor terão hipertensão<br />
intra-craniana, esta deverá ser sempre pesquisada.<br />
Em casos suspeitos deve-se realizar RMN encefálica<br />
<strong>para</strong> excluir leões ocupando espaço ou sela turca<br />
vazia. A RMN efectuada à doente no nosso caso clínico<br />
não apresentava qualquer alteração compatível com<br />
hipertensão intra-craniana e a fundoscopia não revelou<br />
papiledema; contudo, a presença de acufeno pulsátil,<br />
cefaleia ocasional e obesidade levou a que fosse<br />
equacionada essa possibilidade.<br />
O diagnóstico de efusão espontânea de LCR começa<br />
com um elevado grau de suspeição clínica, suportado<br />
por uma anamnese e exame objectivo rigorosos. Os<br />
sintomas mais frequentes são hipoacusia e sensação de<br />
plenitude auricular. Cefaleias e acufenos pulsáteis são<br />
também muitas vezes referidos. O líquor pode drenar<br />
via trompa de Eustáquio <strong>para</strong> a nasofaringe e originar<br />
queixas de rinorreia serosa intermitente e rinorráquia<br />
posterior. Mais raramente no adulto do que na criança,<br />
a primeira manifestação de fístula de líquor pode ser<br />
uma meningite ou meningoencefalite.<br />
Enquanto a hipoacusia, de condução ou mista no adulto<br />
e neurossensorial na criança, pode ser facilmente<br />
detectada com recurso a um simples diapasão ou<br />
audiometria, as alterações à otoscopia de fístulas<br />
de LCR são muito subtis. A presença de líquido no<br />
ouvido médio é muitas vezes ignorada na otoscopia<br />
devido à transparência da efusão de LCR, dificultando<br />
a identificação de níveis líquidos ou bolhas 3 . Se, ao<br />
atrás referido, acrescentarmos a frequente ausência de<br />
eritema, retracção ou outras alterações da membrana<br />
timpânica, facilmente se compreende que a grande<br />
maioria das otoscopias seja interpretada como normal 3 .<br />
As fístulas espontâneas de LCR do ouvido médio do<br />
adulto são frequentemente confundidas com otites<br />
médias com efusão. Alguns autores defendem que em<br />
qualquer paciente com mais de 50 anos e otite média<br />
com efusão recorrente deve suspeitar-se de fístula de<br />
LCR do ouvido médio até prova em contrário 18 .<br />
O diagnóstico de fístula de líquor pode tornar-se<br />
evidente apenas após realização de miringotomia. Em<br />
fístulas de baixo débito e/ou intermitentes o diagnóstico<br />
torna-se ainda mais difícil, contudo, a persistência de<br />
drenagem de líquido claro e fino, seroso e não mucoso<br />
deve levantar a suspeita de fístula de LCR. Nestes<br />
casos a identificação de β 2 - transferrina na otorreia é<br />
particularmente importante, sendo um exame com<br />
elevada sensibilidade e especificidade <strong>para</strong> LCR. A<br />
determinação da concentração de glicose na otorreia<br />
apresenta muitos factores de confundimento pelo que
a sua utilidade clínica é reduzida.<br />
Também no nosso caso clínico a sintomatologia,<br />
otoscopia e dados audiométricos da doente levaram<br />
ao diagnóstico errado de otite média com efusão à<br />
direita. O diagnóstico de fístula de líquor só foi obtido<br />
após miringotomia, com intuito de colocar tubo de<br />
ventilação transtimpânico, perante a observação da<br />
saída de líquido tipo “água de rocha”, muito abundante<br />
e que rapidamente preenchia o canal auditivo externo.<br />
A posterior determinação de β 2 -transferina confirmou<br />
tratar-se de LCR.<br />
Apesar do diagnóstico de fístula de LCR ser<br />
primariamente clínico, a β 2 - transferrina, a radiologia<br />
e a medicina nuclear podem ajudar na confirmação do<br />
diagnóstico, no planeamento cirúrgico e na exclusão de<br />
múltiplos defeitos ou envolvimento bilateral.<br />
Stone et al 19 comparou a utilidade da TC de alta resolução<br />
sem contraste com a cisternografia por TC com contraste<br />
e cisternografia com radionuclídeos. Stone concluiu que<br />
ambos os métodos de cisternografia não revelaram<br />
qualquer defeito que não tivesse sido previamente<br />
identificado por TC de alta resolução; os achados intraoperatórios<br />
apresentavam uma boa correlação com<br />
os previstos por TC de alta resolução. Desta forma,<br />
atendendo à natureza invasiva da cisternografia, Stone<br />
recomenda o seu uso apenas nos casos em que nenhum<br />
defeito tenha sido identificado por TC de alta resolução<br />
mantendo-se incerto o diagnóstico ou quando existe<br />
suspeita de envolvimento bilateral ou de múltiplos<br />
defeitos requerendo uma abordagem cirúrgica mais<br />
complexa. Este e outros autores 18,19,20 consideram a<br />
TC de alta resolução muito sensível na demonstração<br />
de defeitos ósseos responsáveis por fístulas de LCR<br />
e recomendam-na como método custo-efectivo na<br />
identificação do local da lesão. Sugerem o recurso<br />
pré-operatório a RMN apenas em casos suspeitos de<br />
meningoencefalocelo, nos quais o cirurgião considere<br />
ser útil definir a extensão da herniação cerebral,<br />
analisar a viabilidade do conteúdo herniado ou em<br />
que haja suspeita de compilações intra-cranianas 18,19,20 .<br />
Adicionalmente, a RMN pode identificar uma sela turca<br />
vazia que, como já referido, se encontra associada a<br />
hipertensão intra-craniana benigna.<br />
A nossa doente realizou TC de alta resolução de ouvidos<br />
e RMN de crânio. A TC identificou, de forma inequívoca,<br />
o defeito ósseo do tegmen direito, pelo que se optou<br />
por não realizar cisternografia. Como curiosidade, é<br />
de referir que os exames imagiológicos mencionavam<br />
não ser possível excluir eventual deiscência do canal<br />
semi-circular superior sem que, no entanto, a doente<br />
apresentasse qualquer sintomatologia vertiginosa.<br />
Nahas et al 3 observou, em 15 doentes com fístulas<br />
espontâneas de LCR, vários graus de estreitamento da<br />
cápsula ótica envolvendo o canal semi-circular superior<br />
sem que nenhum doente, como no nosso caso clínico,<br />
apresentasse fenómeno de Tullio ou outro sinal ou<br />
sintoma de deiscência do canal semi-circular superior.<br />
Nos doentes deste estudo, à semelhança do nosso<br />
caso clínico, a arquitectura óssea do labirinto não<br />
apresentava nenhuma outra alteração.<br />
Em termos cirúrgicos, as vias de abordagem mais<br />
usadas no encerramento de fístulas de LCR do ouvido<br />
médio e mastóide são a via transmastoideia e a via da<br />
fossa média, sendo por vezes usada uma abordagem<br />
combinada das duas técnicas.<br />
A via da fossa média, apesar de tecnicamente mais<br />
desafiante, possibilita o melhor acesso à totalidade do<br />
pavimento da fossa média, com boa exposição do tegmen<br />
anterior, permitindo identificar e re<strong>para</strong>r defeitos<br />
múltiplos, não-contíguos e por vezes assintomáticos.<br />
Contudo, esta via pode estar associada a complicações<br />
neurológicas como convulsões ou enfartes venosos<br />
relacionados com a veia de Labbé 18 .<br />
A abordagem transmastoideia tem a vantagem de<br />
permitir o acesso ao pavimento da fossa posterior<br />
e tegmen mastoideu evitando uma craniotomia e<br />
retracção do lobo temporal. Contudo não é a via ideal<br />
<strong>para</strong> o tratamento de defeitos grandes (superiores a 2 cm)<br />
defeitos múltiplos ou que se estendam anteriormente<br />
em direcção ao ápex petroso 18 . Quando o defeito se<br />
localiza no tegmen timpânico a cadeia ossicular pode<br />
impedir a correcta exposição e re<strong>para</strong>ção do defeito por<br />
via transmastoideia podendo ser necessário remover,<br />
pelo menos parcialmente, a cadeia ossicular, o que se<br />
traduzirá numa perda auditiva de condução, mesmo<br />
que se proceda à reconstrução da cadeia. Esta situação<br />
pode ser evitada com recurso à via da fossa média.<br />
Os materiais usados na re<strong>para</strong>ção das fístulas de líquor<br />
são múltiplos e variados, desde o simples material de<br />
sutura até enxertos biológicos de dura-máter obtidos<br />
a partir de colagénio bovino (Duragen ®, Duraform ®)<br />
passando pela cola de fibrina, cimento de hidroxiapatite,<br />
cera de osso e vários materiais autólogos como<br />
osso, cartilagem, músculo, gordura, fáscia temporalis,<br />
pericôndrio, entre outros.<br />
Savva et al 21 , num estudo retrospectivo de 92 fístulas<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 303<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
304<br />
REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Enxaqueca vestibular<br />
Migrainous vertigo<br />
João Martins Vítor Certal Tiago Santos Hugo Amorim Carlos Carvalho<br />
RESUMO<br />
A enxaqueca vestibular, considerada um sintoma vestibular<br />
da enxaqueca, é uma entidade clínica heterogénea cuja<br />
apresentação mais frequente é a crise vertiginosa recorrente.<br />
O diagnóstico baseia-se numa história clínica detalhada e num<br />
elevado índice de suspeição. Deve fazer parte do diagnóstico<br />
diferencial das síndromes vertiginosas recorrentes. Os<br />
tratamentos recomendados baseiam-se na identificação e<br />
evicção dos factores precipitantes e em fármacos usados na<br />
profilaxia da enxaqueca.<br />
Os autores apresentam um caso clínico de uma doente do<br />
sexo feminino, com 43 anos de idade, com antecedentes de<br />
enxaqueca e uma história de crises de vertigem rotatória<br />
recorrente de longa data, desencadeadas e/ou exacerbadas<br />
por factores precipitantes e acompanhadas por outros<br />
sintomas somato-sensoriais. Foi tratada eficazmente com<br />
evicção de factores precipitantes e medicação profilática da<br />
enxaqueca.<br />
Palavras-chave: vertigem; enxaqueca; disfunção vestibular<br />
João Martins<br />
Interno do Serviço de ORL do Centro Hospitalar Entre o Douro e Vouga (CHEDV)<br />
Vítor Certal<br />
Interno do Serviço de ORL do Centro Hospitalar Entre o Douro e Vouga (CHEDV)<br />
Tiago Santos<br />
Interno do Serviço de ORL do Centro Hospitalar Entre o Douro e Vouga (CHEDV)<br />
Hugo Amorim<br />
Assistente Hospitalar do Serviço de ORL do CHEDV<br />
Carlos Carvalho<br />
Director de Serviço de ORL do CHEDV<br />
Correspondência:<br />
João Diogo Martins<br />
Tlf: 965349916<br />
martins.jd@gmail.com<br />
ABSTRACTS<br />
Migrainous vertigo, assumed to be a migraine vestibular<br />
symptom, is a heterogeneous clinical entity which typically<br />
presents as recurrent vertigo attacks. Diagnosis is made with a<br />
careful history and examination and a high index of suspicion.<br />
It should be considered in the differential diagnosis of recurrent<br />
vertigo syndromes. Treatment recommendations are based<br />
on trigger identification and avoidance, and prophylactic<br />
migraine medications.<br />
The authors report a case of a 43-year-old woman, with<br />
history of migraine headaches, and a prolonged history of<br />
recurrent rotational vertigo attacks, provoked or exacerbated<br />
by identifiable triggers and accompanied by other somatosensorial<br />
symptoms. The patient was effectively treated with<br />
trigger avoidance and migraine prophylactic medication.<br />
Keywords: vertigo; migraine; vestibular dysfunction<br />
INTRODUÇÃO<br />
A vertigem é uma queixa frequente na prática clínica.<br />
Segundo estudos epidemiológicos, aproximadamente<br />
23% da população adulta, em algum momento da vida,<br />
sofrerá de algum tipo de perturbação do equilíbrio<br />
(vestibular ou não vestibular) 1 .<br />
A enxaqueca é uma síndrome clínica caracterizada<br />
por cefaleias hemicranianas pulsáteis, episódicas,<br />
associadas a outros sintomas como náuseas, aumento<br />
da sensibilidade à luz, som e movimentos cefálicos.<br />
Geralmente encarada como um problema de cefaleias,<br />
nos últimos anos, tem-se tornado cada vez mais evidente<br />
que as cefaleias podem não ser o sintoma dominante, mas<br />
sim queixas de vertigem / desequilíbrio, otalgia, sensação<br />
de plenitude auricular, pressão facial ou hipoacúsia<br />
flutuante 2 . Apresenta uma prevalência de 4-6,5% no sexo<br />
masculino e com uma prevalência aproximada de 20%<br />
em mulheres entre os 30 e 49 anos de idade. 3-5<br />
Diversos estudos demonstraram que existe uma<br />
associação frequente entre vertigem e enxaqueca, ou<br />
seja, as queixas de vertigem são comuns em doentes<br />
migranosos, e a enxaqueca é uma queixa frequente em<br />
doentes com vertigens 6,7,8 , principalmente entre doentes<br />
com vertigem não classificável8.<br />
Apesar da frequente associação entre vertigem e<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 305<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
enxaqueca, ainda não existe uma nomenclatura uniforme<br />
<strong>para</strong> descrever esta entidade. Vertigem migranosa 7 ,<br />
vestibulopatia relacionada com enxaqueca 9 , enxaqueca<br />
vestibular 10 e desequilíbrio associado a enxaqueca 11 são<br />
algumas das designações utilizadas.<br />
O objectivo deste artigo é salientar uma entidade clínica<br />
que tem ganho relevo no diagnóstico diferencial das<br />
síndromes vertiginosas recorrentes, e apresentar um<br />
caso clínico exemplificativo.<br />
FIGURA 1<br />
Resultados das provas rotatórias pendulares<br />
306 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
CASO CLÍNICO<br />
H.V., sexo feminino, caucasiana, 43 anos de idade,<br />
encaminhada <strong>para</strong> a Consulta Externa de ORL por<br />
queixas de perturbações do equilíbrio desde há cerca de<br />
15 anos com agravamento nos últimos 4 meses. A doente<br />
descreve uma variedade de sintomas, desde episódios de<br />
vertigem rotatória, desequilíbrio e sensação de “cabeça<br />
vazia”. Estes episódios são maioritariamente de vertigem<br />
rotatória, espontâneos, mas por vezes provocados<br />
ou exacerbados pelos movimentos cefálicos rápidos,
mudanças na posição da cabeça ou por fluxo intenso de<br />
estímulos visuais. Relaciona também o aparecimento<br />
dos sintomas com períodos de maior ansiedade, com o<br />
período menstrual e com a ingestão de certos alimentos<br />
(ex. pizza). Apresenta ainda uma sensação ilusória de<br />
movimento persistente após viagens de automóvel, barco<br />
e avião. Estes episódios apresentam duração variável,<br />
que pode ir desde dias a semanas, ou apresentar-se como<br />
queixas breves de vertigem posicional. Nega alterações<br />
na audição, plenitude auricular, acufenos ou otalgia.<br />
Nos antecedentes pessoais refere cefaleias tipo<br />
enxaqueca desde a adolescência, que melhoraram com<br />
o passar dos anos. Actualmente refere episódios mais<br />
frequentes de auras do tipo visual, reversíveis, que duram<br />
cerca de 5-10 minutos, caracterizadas por visão em túnel<br />
que progride <strong>para</strong> cegueira com luzes cintilantes, e que<br />
frequentemente precedem os episódios vertiginosos,<br />
mas sem cefaleia acompanhante. Nega outros sintomas<br />
neurológicos ou sistémicos.<br />
Antecedentes familiares irrelevantes.<br />
Ao exame objectivo, apresentava um exame ORL sumário<br />
sem alterações. O exame neurológico e otoneurológico<br />
sumário também eram normais.<br />
Foram realizados diversos exames complementares<br />
de diagnóstico que não mostraram alterações,<br />
FIGURA 2<br />
Resultados da posturografia computorizada dinâmica<br />
nomeadamente: audiograma tonal e vocal, impedancimetria,<br />
electronistagmografia com pesquisa de<br />
nistagmo espontâneo e do olhar descentrado, teste de<br />
agitação cefálica, testes de oculomotricidade (sacadas,<br />
perseguição ocular e nistagmo optocinético), pesquisa<br />
de nistagmo de posição (manobra de Dix-Hallpike) e<br />
provas calóricas; prova rotatória pendular; posturografia<br />
dinâmica computorizada e RMN cerebral.<br />
Perante o quadro clínico e o resultado dos exames<br />
complementares, foi assumido o diagnóstico de vertigem<br />
migranosa ou vertigem associada a enxaqueca.<br />
A doente foi inicialmente tratada apenas com<br />
modificações dietéticas, com especial ênfase em evitar<br />
os alimentos classicamente associados a enxaqueca.<br />
Após dois meses sem melhoria, iniciou tratamento com<br />
nortriptilina 10mg/dia com aumento progressivo da<br />
dose. A doente não melhorou e abandonou medicação<br />
por não tolerar os efeitos secundários (sonolência). A<br />
medicação foi alterada <strong>para</strong> gabapentina 300mg/dia e<br />
aumentada progressivamente até uma dose de 200mg<br />
de 8/8h, com melhoria franca da sintomatologia.<br />
Foi também aconselhada a tomar clonazepam 0,125mg<br />
antes de viagens e nas eventuais crises vertiginosas.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 307<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
DISCUSSÃO<br />
A vertigem migranosa pode ter início em qualquer<br />
idade, apresentando um pico de incidência entre a<br />
terceira e quinta década 10 . Atinge mais frequentemente<br />
o sexo feminino (1,5-5:1) 6,7,10 . Na sua apresentação mais<br />
comum, as queixas de enxaqueca precedem em muitos<br />
anos as queixas de vertigem (normalmente têm início na<br />
adolescência). Por vezes, os doentes referem remissão<br />
prolongada das cefaleias antes de surgirem as queixas<br />
vertiginosas 7,10 .<br />
Não raras vezes, as cefaleias são substituídas por vertigens<br />
nas mulheres perto da menopausa 13 . A vertigem pode<br />
também ser um sintoma inicial da enxaqueca, pode<br />
precedê-la ou ocorrer sem a cefaleia.<br />
A história familiar de enxaqueca é frequente 7 .<br />
A vertigem paroxística benigna da infância é uma<br />
manifestação precoce desta entidade. Muitas das<br />
crianças acabam por sofrer de enxaquecas anos após o<br />
desaparecimento dos episódios de vertigem 14 .<br />
A apresentação clínica mais frequente é como episódios<br />
de vertigem rotatória espontânea ou posicional. Nalguns<br />
casos a vertigem espontânea transforma-se em vertigem<br />
posicional após algumas horas ou dias 15 . Esta vertigem<br />
posicional é distinguível da vertigem paroxística posicional<br />
benigna (VPPB) por se associar com frequência a outros<br />
sintomas migranosos, durar horas a dias com remissão<br />
completa sem tratamento, apresentar uma elevada taxa<br />
de recorrência e o nistagmo posicional ser atípico <strong>para</strong><br />
VPPB 15,16 .<br />
A intolerância a movimentos da cabeça, semelhante ao<br />
enjoo de movimento (desequilíbrio, ilusão de movimento<br />
e náuseas provocados ou agravados por movimentos da<br />
cabeça) é um sintoma adicional frequente 9,10,17 .<br />
Outra característica proeminente nestes doentes é a<br />
vertigem visual, ou seja, desencadeada por estímulos<br />
visuais intensos (tráfego intenso de automóveis, multidões,<br />
corredores de supermercados) 9,14 .<br />
As náuseas e o desequilíbrio são sintomas menos<br />
frequentes mas que também podem acompanhar um<br />
episódio agudo de vertigem migranosa 18 .<br />
No que diz respeito à duração e frequência dos episódios<br />
apresenta uma grande variabilidade e pode modificarse<br />
ao longo do tempo. A vertigem pode durar segundos<br />
(10%), minutos (30%), horas (30%) ou vários dias (30%)<br />
e alguns doentes podem levar semanas a recuperar de<br />
um episódio 7,9,10,16 , no entanto, a maioria dos doentes<br />
não apresenta sintomas entre as crises. A frequência das<br />
crises é variável, podendo variar de episódios mensais a<br />
anuais. Não raras vezes os episódios surgem no período<br />
pré-menstrual 19 .<br />
Estudos clínicos realizados nas últimas décadas sugerem<br />
que estes episódios recorrentes de vertigem são um<br />
308 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
sintoma migranoso independente e dissociado das<br />
cefaleias, e distintos de uma aura 19 .<br />
Um dos desafios no diagnóstico é a frequente dissociação<br />
entre os episódios vertiginosos e as cefaleias. O quadro<br />
clínico mais frequente é a ocorrência simultânea dos dois<br />
sintomas, mas as vertigens podem ocorrer sem cefaleia<br />
ou preceder a mesma 10,16 . Estudos revelam que até 50%<br />
dos doentes nunca associam a cefaleia à vertigem 20 , e<br />
outros (até 48%) têm vertigem como o seu único sintoma<br />
de enxaqueca 10 .<br />
Nos doentes em que a vertigem ocorre sem cefaleia, o<br />
diagnóstico deve basear-se na presença dos restantes<br />
sintomas da enxaqueca. Juntamente com a vertigem<br />
os doentes podem apresentar fotofobia, fonofobia,<br />
sensibilidade aumentada a alterações de pressão e auras<br />
visuais ou outros tipos de aura 18 .<br />
A hipoacúsia e os acufenos são queixas raras mas descritas<br />
por alguns doentes. A perda auditiva é, normalmente,<br />
ligeira, transitória, não progressiva, unilateral, bilateral<br />
ou alternante 9,21 . Por poder apresentar sintomas de<br />
hipoacúsia unilateral e acufenos durante a crise, é<br />
muitas vezes confundida com a Doença de Menière<br />
(DM), principalmente quando os sintomas somatosensoriais,<br />
visuais ou a cefaleia estão ausentes na crise.<br />
Existem também relatos de uma elevada prevalência<br />
de enxaqueca em doentes com DM, assim como a<br />
ocorrência de enxaqueca durante uma crise de hidrópsia<br />
endolinfática 22 .<br />
A fisiopatologia desta entidade ainda se mantém<br />
desconhecida, mas os sintomas sugerem que estruturas<br />
periféricas e centrais estejam envolvidas. Algumas<br />
teorias sustentam alterações da libertação de certos<br />
neurotransmissores 23 , vasoespasmo transitório de vasos<br />
que irrigam o ouvido interno 24 ou disfunção dos canais<br />
iónicos ao nível do cerebelo e tronco cerebral 25 .<br />
Na maioria dos casos, o exame objectivo é normal<br />
entre as crises 23 . No entanto, alguns doentes podem<br />
apresentar alterações inespecíficas desta entidade<br />
nomeadamente, alterações da motricidade ocular de tipo<br />
central (perseguição ocular vertical alterada, nistagmo<br />
induzido pelo desviar do olhar) ou nistagmo posicional<br />
tipo central que persiste enquanto a posição da cabeça<br />
se mantenha 10,18 .<br />
Durante as crises, os doentes podem apresentar<br />
desequilíbrio na prova de Romberg, alterações da<br />
perseguição ocular e nistagmo. O nistagmo pode ter<br />
diversas apresentações: nistagmo espontâneo periférico,<br />
nistagmo espontâneo central, nistagmo posicional<br />
central.<br />
Em termos de exames complementares de diagnóstico,<br />
10 a 20% dos doentes apresentam hiporreflexia unilateral<br />
nas provas calóricas e 10% apresentam preponderância
direccional das respostas nistágmicas 10,17 . No entanto<br />
estes achados são inespecíficos, podendo surgir em<br />
doentes com enxaqueca sem vertigem e noutras<br />
síndromes vertiginosas 26 .<br />
A International Society of Headache não inclui a vertigem<br />
na definição de enxaqueca, com excepção da enxaqueca<br />
basilar. Por isso, os doentes com vertigem migranosa não<br />
preenchem nenhum dos critérios universalmente aceites<br />
de enxaqueca.<br />
Em 2001 Neuhauser et al propuseram critérios de<br />
diagnóstico 7 (Tabela 1).<br />
TABELA 1<br />
Critérios Diagnóstico de Enxaqueca Vestibular (adaptado de<br />
Neuhauser & Lempert 2001) 12<br />
Critérios Diagnóstico de Enxaqueca Vestibular<br />
Diagnóstico Definitivo de Enxaqueca Vestibular<br />
A. Sintomas vestibulares episódicos de intensidade<br />
moderada a severa<br />
B. História actual ou prévia de enxaqueca (de acordo com os<br />
critérios de 2004 da International Headache Society (IHS)<br />
C. Pelo menos um dos seguintes sintomas durante 2 crises<br />
de vertigem: cefaleia tipo enxaqueca, fotofobia, auras<br />
visuais ou outras auras<br />
D. Exclusão de outras causas através de investigação<br />
apropriada<br />
Comentário:<br />
Os sintomas vestibulares são vertigem rotatória ou<br />
outra ilusão de movimento. Podem ser espontâneos ou<br />
posicionais. Os sintomas vestibulares são moderados se<br />
interferem mas não impedem as actividades do dia-a-dia,<br />
e severos se impedem a realização das actividades diárias.<br />
Diagnóstico Provável de Enxaqueca Vestibular<br />
A. Sintomas vestibulares episódicos de intensidade<br />
moderada a severa<br />
B. Um dos seguintes:<br />
1. História actual ou prévia de enxaqueca (de acordo com<br />
os critérios de 2004 da IHS)<br />
2. Sintomas migranosos durante os sintomas vestibulares<br />
3. Presença de factores precipitantes da enxaqueca<br />
em mais de 50% das crises: precipitantes alimentares,<br />
irregularidades do sono, alterações hormonais<br />
4. Melhoria dos sintomas com medicação usada <strong>para</strong><br />
enxaqueca em mais de 50% das crises<br />
C. Exclusão de outras causas através de investigação<br />
apropriada.<br />
O diagnóstico de vertigem migranosa é feito através<br />
de uma história clínica detalhada, não existindo<br />
sinais objectivos, marcadores biológicos, alterações<br />
laboratoriais ou outros exames complementares de<br />
diagnóstico que sejam específicos desta entidade 12 .<br />
A pesquisa de potenciais precipitantes das crises pode<br />
ser essencial <strong>para</strong> o diagnóstico, nomeadamente a<br />
relação com a menstruação, ansiedade, irregularidades<br />
do sono, estímulos sensoriais (luzes, sons ou cheiros<br />
intensos) e ingestão de certos alimentos (ex. queijo,<br />
vinho, chocolate) 12 .<br />
O diagnóstico diferencial é feito com as principais causas<br />
de vertigem recurrente: VPPB, doença de Menière,<br />
vertigem posicional central, isquémia vertebro-basilar<br />
transitória, schwanoma do VIII par craniano, insuficiência<br />
vestibular unilateral não compensada e fístula<br />
perilinfática 27 .<br />
Os tratamentos propostos <strong>para</strong> estes doentes são a<br />
evicção de potenciais factores precipitantes, medicações<br />
profiláticas e o tratamento das crises.<br />
Nos casos mais ligeiros, a evicção dos factores<br />
precipitantes pode ser suficiente <strong>para</strong> uma melhoria<br />
substancial das queixas.<br />
Nos casos de crises mais frequente e severas, não<br />
controlados com medidas não farmacológicas, as<br />
medicações profiláticas têm um papel importante. As<br />
actuais recomendações baseiam-se na experiência clínica<br />
de alguns especialistas e não em estudos randomizados<br />
e controlados. Dada a sensibilidade aumentada desta<br />
população de doentes <strong>para</strong> os efeitos secundários das<br />
medicações, torna-se necessário iniciar os tratamentos<br />
com doses baixas, aumentando progressivamente ao<br />
longo de semanas ou meses, sendo recomendável a<br />
reavaliação da terapêutica após 3 meses 19 . Os fármacos<br />
mais utilizados são os usados na profilaxia da enxaqueca<br />
como os β-bloqueantes (propranolol, atenolol) 10,28 ,<br />
bloqueadores dos canais de cálcio (verapamil,<br />
flunarizina) 10 ], anti-depressivos tricíclicos (nortriptilina,<br />
amitriptilina) 10,29 , inibidores da anidrase carbónica<br />
(acetazolamida) 30 e anti-convulsivantes (gabapentina,<br />
topiramato) 31 .<br />
Os depressores vestibulares (ex. clonazepam) e antieméticos<br />
(ex. metoclopramida) podem aliviar os sintomas<br />
nas crises 15 .<br />
No que diz respeito ao caso clínico apresentado, diversos<br />
factores apontam <strong>para</strong> o diagnóstico: o facto de ser uma<br />
mulher de meia-idade, com antecedentes de cefaleias<br />
tipo enxaqueca e intolerância ao movimento, com queixas<br />
de vertigem rotatória espontânea ou desencadeada por<br />
estímulos visuais, alimentares, posicionais, alterações<br />
hormonais e ansiedade; por vezes as crises são precedidas<br />
por auras visuais típicas da enxaqueca; a duração das<br />
crises é variável (segundos, dias a semanas); o exame<br />
objectivo e os exames complementares de diagnóstico<br />
não revelaram alterações.<br />
Após a presunção do diagnóstico de vertigem migranosa, a<br />
eficácia do tratamento com alterações comportamentais<br />
e alimentares e medicação profilática <strong>para</strong> enxaqueca<br />
confirmou o diagnóstico.<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 309<br />
CASO CLÍNICO CASE REPORT
CONCLUSÕES<br />
A vertigem migranosa é uma entidade clínica em<br />
desenvolvimento que deve ser considerada no diagnóstico<br />
diferencial das vertigens recorrentes. Tem uma<br />
apresentação clínica variável em diversos aspectos e a<br />
associação a enxaqueca pode ser subtil. A chave <strong>para</strong><br />
o diagnóstico é a ocorrência simultânea de vertigem<br />
com enxaqueca ou com sintomas migranosos, presença<br />
de factores precipitantes de enxaqueca e a resposta da<br />
sintomatologia a fármacos usados no tratamento da<br />
enxaqueca.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
Os autores agradecem ao Dr. Richard Lewis do<br />
Departamento de ORL do Massachusetts Eye and Ear<br />
Infirmay pela disponibilização do caso clínico.<br />
Referências Bibliográficas:<br />
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classification, and psychiatric comorbility. Arch Intern Med 1993,<br />
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and treatment. N Engl J Med 2002, 346:257-270<br />
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31.Mathew NT. Antiepileptic drugs in migraine prevention. Headache<br />
2001; 41:18-24.
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 311
MELHOR ARTIGO BEST PAPER<br />
Prémio do melhor trabalho publicado<br />
No vol. 49, nº 3 de Setembro de 2011:<br />
Para a votação do melhor artigo científico publicado na edição<br />
nº 4, volume 49, de Dezembro de 2011 da Revista Portuguesa<br />
de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial verificou-se um<br />
número total de 11 votos expressos dentro dos 20 membros do<br />
Conselho Científico da Revista.<br />
Como resultado da votação foi distinguido com o prémio <strong>para</strong><br />
o melhor artigo o trabalho com o título “Dacriocistorrinostomia<br />
Endoscópica – Factores Preditivos de Recidiva”da autoria de Sonia<br />
Pereira, Sara Baptista, Ana Casas Nova, Rudolfo Montemor, José<br />
Araújo Martins, Ezequiel Barros.<br />
A entrega do prémio será efectuada durante a cerimónia de<br />
abertura do próximo Congresso Nacional da <strong>SPORL</strong>, a realizar em<br />
2012.<br />
312 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
Luís Antunes<br />
Presidente do Colégio<br />
de Especialidade de ORL<br />
da Ordem do Médicos<br />
O elevado número de vagas <strong>para</strong> a realização do internato<br />
complementar de otorrinolaringologia 2012/ 2017<br />
que este ano foram abertas a concurso tem suscitado<br />
muitas dúvidas sobre a forma e a quem compete a<br />
responsabilidade de definir o número de vagas que<br />
anualmente são atribuídas.<br />
Anualmente o Internato Médico de cada Hospital ou<br />
Centro Hospitalar solicita aos serviços que preencham<br />
uma ficha de Caracterização dos Serviços <strong>para</strong> Atribuição<br />
de Capacidades Formativas, na qual <strong>para</strong> alem dos dados<br />
relativos a recursos humanos e a produção são também<br />
indicadas as capacidades formativas que cada serviço<br />
disponibiliza <strong>para</strong> o ano seguinte.<br />
Esta ficha é recebida pela Ordem dos Médicos que as<br />
envia aos colégios respectivos que têm como competência<br />
confirmar se os serviços em causa têm ou não atribuída<br />
idoneidade formativa e elabora uma mapa com as<br />
capacidades formativas de cada serviço disponibiliza<br />
anualmente e a necessidade de estágios inerentes as<br />
características de cada um.<br />
Ao longo dos últimos anos o número de capacidades<br />
formativas disponibilizadas pelos serviços tem sido<br />
sempre superior ao número de vagas abertas <strong>para</strong><br />
Internato da Especialidade, fazendo a ACSS e o CNIM uma<br />
espécie de “rateio” das vagas atribuídas de acordo com as<br />
disponibilidades oferecidas pelos serviços.<br />
As capacidades formativas de Cada serviço com idoneidade<br />
são enviadas pela Ordem dos Médicos <strong>para</strong> o CNIM que<br />
em articulação com a ACSS e a ARS são os responsáveis<br />
pela definição do numero de vagas que anualmente são<br />
colocadas a concurso.<br />
A definição do número de vagas que serão abertas e o<br />
Hospital onde as mesmas se irão realizar é uma decisão<br />
que não está dependente nem obedece a nenhum parecer<br />
da Direcção do Colégio da Especialidade.<br />
Página do Colégio<br />
da Especialidade de ORL<br />
da Ordem dos Médicos<br />
Colégio da especialidade e seu papel na dinamização do<br />
internato<br />
Nos últimos anos como podemos ver pelos mapas que<br />
apresentamos o numero de vagas abertas tem sido sempre<br />
muito inferior ao numero de capacidades formativas que<br />
os serviços solicitam e quase sempre são 9 a 11 novos<br />
internos cada ano.<br />
Este ano a Direcção do Colégio e todos os Otorrinos em<br />
geral foram surpreendidos pelo número invulgar de vagas<br />
abertas a concurso, 29 no concurso A e 1 no concurso<br />
B, pois foram atribuídas vagas a todas as capacidades<br />
formativas apresentadas.<br />
A responsabilidade de abertura destas vagas é exclusivamente<br />
da responsabilidade da ACSS e ARS e não da<br />
ORDEM DOS MEDICOS.<br />
A Direcção do Colégio está preocupado com este numero<br />
tão elevado de vagas que faz que nalguns casos existam<br />
5 novos internos tendo já expressado ao Sr. Bastonário<br />
a sua preocupação pela formação destes novos médicos<br />
aproveitando <strong>para</strong> solicitar as Direcções dos Serviços o<br />
reforço do empenho <strong>para</strong> que o nível de formação destes<br />
internos e dos que já se encontram em formação possa<br />
manter-se como até agora com um elevado nível cientifico.<br />
Luis Antunes<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 313<br />
COLÉGIO DA ESPECIALIDADE DE ORL DA ORDEM DOS MÉDICOS
Norte<br />
Centro<br />
Sul<br />
Hospitais<br />
Centro Hospitalar do Alto Ave -<br />
Unidade Guimarães<br />
Capacidade e Idoneidade Formativa<br />
Serviços de Otorrinolaringologia - 2012<br />
Idoneidade Estágios<br />
Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
Centro Hospitalar Douro / Vouga Sim I.P.O. Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pecoço)<br />
Centro Hospitalar do Porto, E.P.E.<br />
- Hosp. de St.º António<br />
Centro Hospitalar de Trás-os-<br />
-Montes e Alto Douro, E.P.E.<br />
Centro Hospitalar de Vila Nova de<br />
Gaia / Espinho, E.P.E.<br />
Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
314 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
2011 2012<br />
Cap.<br />
Form.<br />
Não Não<br />
Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
Hospital de S. João Sim I.P.O.Porto 3 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
Hospital de Braga Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
Hospital Pedro Hispano Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
Centro Hospitalar Tamêga e Sousa Não<br />
Hospital Amato Lusitano Não Não<br />
Centro Hospitalar de Coimbra Sim I.P.O Coimbra- 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
Hospital S. Teótonio Não Para visita Não<br />
Idoneidade Estágios<br />
2 Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
Cap.<br />
Form.<br />
1 Sim 0<br />
1 Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
2 Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
1 Sim I.P.O.Porto 3 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
1 Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
0 Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
1 Sim I.P.O.Porto 6 meses<br />
(Oncologia - Cabeça e Pescoço)<br />
Hosp. Universitário de Coimbra Sim 4 Sim 4<br />
Hospital Infante D. Pedro - Aveiro Não Não<br />
Hospital D. Estefânia Sim I.P.O. 6 meses (Oncologia -<br />
Cabeça e Pescoço); S. José 18<br />
meses (O.R.L. Geral)<br />
Hospital de S. José Sim I.P.O. 6 meses (Oncologia - Cabeça<br />
e Pescoço), Estefânia 9 meses<br />
(Alergologia 6; O.R.L. Pediatrica 3)<br />
1 Sim I.P.O. 6 meses (Oncologia -<br />
Cabeça e Pescoço); S. José 18<br />
meses (O.R.L. Geral)<br />
2 I.P.O. 6 meses (Oncologia -<br />
Cabeça e Pescoço), Estefânia<br />
9 meses (Alergologia 6; O.R.L.<br />
Pediatrica 3)<br />
Hospital Fernando Fonseca Sim 5 Sim 5<br />
Hospital Pulido Valente Sim I.P.O 3 meses (Oncologia -<br />
Cabeça e Pescoço)<br />
Hospital Santo Espírito - Angra do<br />
Heroísmo<br />
1 Sim I.P.O 3 meses (Oncologia -<br />
Cabeça e Pescoço)<br />
Para visita<br />
Cuf - Intante Santo Sim 1<br />
Centro Hospitalar de Torres<br />
Vedras<br />
Não Não<br />
Hospital Garcia de Orta Sim 2 Sim 3<br />
Centro Hospitalr Oeste Norte -<br />
Caldas<br />
Não Não<br />
Centro Hospitalar do Funchal Sim I.P.O. Porto 6 meses (Oncologia<br />
- Cabeça e Pescoço); Estefânia 2<br />
meses (Alergologia)<br />
1 Para visita<br />
Hospital St.ª Maria Sim 4 Sim 4<br />
Hospital Egas Moniz Sim I.P.O.- 6 meses (Oncologia -<br />
Cabeça e Pescoço)<br />
Centro Hospitalar Barreiro /<br />
Montijo<br />
Não Não<br />
2 Sim I.P.O.- 6 meses (Oncologia -<br />
Cabeça e Pescoço)<br />
Hospital de Faro Não Para visita<br />
Centro Hospitalar do Barlavento<br />
Algarvio<br />
Hospital Espírito Santo de Évora Não<br />
Não<br />
2<br />
2<br />
2<br />
1<br />
1<br />
1<br />
1<br />
1<br />
1<br />
2
AGENDA 2012<br />
JANEIRO<br />
19-21<br />
NOSE 2012<br />
Hospital Privado da Boavista - Porto<br />
Contacto: www.diventos.com<br />
23-25<br />
13º CURSO DE MICROCIRURGIA OTOLÓGICA E<br />
OTO-ENDOSCOPIA<br />
LOCAL: Serviço de ORL - Hospitais da Universidade Coimbra<br />
ORGANIZAÇÃO: Serviço de ORL dos HUC<br />
TEMA: Otologia<br />
FEVEREIRO<br />
2<br />
2º CURSO DE MONITORIZAÇÃO ELECTROFISIOLÓGICA<br />
INTRA-OPERATÓRIA DO NERVO FACIAL<br />
Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital de Egas Moniz, Lisboa<br />
CONTACTO: gepg@fcm.unl.pt<br />
24-25<br />
6º CURSO TEÓRICO-PRÁTICO DE AUDIOVESTIBULOGIA<br />
LOCAL: Serviço de ORL - Hospitais da Universidade Coimbra<br />
ORGANIZAÇÃO: Serviço de ORL dos HUC<br />
TEMA: Otoneurologia<br />
MARÇO<br />
13-14<br />
IV CURSO DE RINOPLASTIA Y CIRUGIA COMPLEMENTARIA<br />
FACIAL<br />
Complexo Hospitalario Universitario de Vigo<br />
CONTACTO: fundacion@cmpont.es<br />
16-17<br />
9 as JORNADAS DE OTORRINOLARINGOLOGIA DO HGO<br />
TEMA: Patologia benigna da laringe<br />
Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial do<br />
Hospital Garcia de Orta - Almada<br />
CONTACTO: Veranatura<br />
joanawolckart@veranatura.pt<br />
23-24<br />
CURSO TEÓRICO-PRÁTICO DE IMPLANTES ACTIVOS DO<br />
OUVIDO MÉDIO E OSTEOINTEGRADOS<br />
Hospital CUF, Port<br />
diventos@diventos.com<br />
ABRIL<br />
16-17<br />
61º TEMPORAL BONE DISSECTION WORKSHOP<br />
LOCAL: Clinica Clarós, Barcelona, Espanha<br />
(Próximos Workshops: 7-8 Maio, 5-6 Novembro, 19-20<br />
Novembro)<br />
CONTACTO: clinica@clinicaclaros.com<br />
28-1<br />
59º CONGRESSO NACIONAL DE OTORRINOLARINGOLOGIA E<br />
CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
LOCAL: Viseu<br />
MAIO<br />
20-23<br />
11TH INTERNATIONAL CONGRESS OF THE EUROPEAN<br />
SOCIETY OF PEDIATRIC OTORHINOLARYNGOLOGY<br />
Amsterdam<br />
20-23<br />
II REUNIÃO IBÉRICA DE OTONEUROLOGIA<br />
LOCAL: HPP – Hospital da Boavista no Porto<br />
ORGANIZAÇÃO: APO - Associação Portuguesa de Otoneurologia<br />
TEMA: Otoneurologia<br />
NOVEMBRO<br />
14-17<br />
42º CONGRESSO BRASILEIRO DE OTORRINOLARINGOLOGIA<br />
E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
7º CONGRESSO LUSO-BRASILEIRO DE<br />
OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
Centro de Convenções de Pernambuco, Recife / PE / Brasil<br />
SITE: www.aborlccf.org.br/42cbo<br />
CONTACTO: eventos@aborlccf.org.br<br />
VOL 49 . Nº4 . DEZEMBRO 2011 315<br />
REUNIÕES CIENTÍFICAS SCIENTIFIC MEETING
NORMAS DE PUBLICAÇÃO INSTRUCTIONS TO THE AUTHORS<br />
Normas de publicação<br />
A Revista da Sociedade Portuguesa de<br />
Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-<br />
Facial, publica artigos dedicados à<br />
Especialidade, bem como outros assuntos<br />
científicos com interesse <strong>para</strong> os especialistas<br />
em ORL. A língua oficial da Revista<br />
é o Português, embora também sejam<br />
aceites trabalhos em Inglês, Francês<br />
e Espanhol. Para efeitos da sua inclusão<br />
na versão on-line em Inglês no<br />
portal da Sociedade, e uma consequente<br />
maior divulgação internacional, os<br />
autores são fortemente encorajados<br />
a <strong>submeter</strong> uma versão em Inglês do<br />
manuscrito.<br />
As declarações e opiniões expressas<br />
nos artigos que constam nesta publicação<br />
são da inteira responsabilidade dos seus<br />
autores e não correspondem necessariamente<br />
ás do editor. Os artigos são<br />
propriedade da Revista.<br />
Ao <strong>submeter</strong>em um trabalho, os autores<br />
comprometem-se que este não foi<br />
publicado anteriormente ou que não<br />
se encontra em fase de apreciação<br />
<strong>para</strong> publicação noutra revista ou<br />
livro. Igualmente, qualquer conflito de<br />
interesse dos autores deve ser alvo de<br />
declaração escrita.<br />
Os artigos que incluam experimentação<br />
em humanos devem mencionar a<br />
autorização da Comissão de Ética<br />
local e o respeito pela Declaração de<br />
Helsínquia de 1975 e sua revisão de<br />
1983. Experiências animais devem<br />
igualmente indicar o parecer respectivo<br />
da Comissão de Ética local.<br />
Os autores devem classificar o seu<br />
artigo numa das seguintes categorias:<br />
Original; Revisão; Caso Clínico; Opinião;<br />
História ORL.<br />
Todo o material <strong>para</strong> publicação deve<br />
ser enviado on-line <strong>para</strong>:<br />
www.sporl.pt<br />
Os artigos recebidos serão submetidos<br />
à revisão anónima por um ou mais<br />
Especialistas convidados pelo editor.<br />
Após esta fase, o autor correspondente<br />
será informado da aceitação do seu<br />
trabalho ou das eventuais alterações a<br />
introduzir previamente à sua publicação.<br />
O conselho redactorial reservase<br />
o direito de corrigir ou introduzir<br />
pequenas alterações no texto, visando<br />
a sua melhoria, desde que não<br />
prejudiquem o seu sentido.<br />
A pre<strong>para</strong>ção dos manuscritos deve<br />
obedecer às regras enunciadas em<br />
Uniform requirements for manuscripts<br />
submitted to biomedical journals, JAMA<br />
1997; 277:927-34. Este documento está<br />
disponível em www.icmje.org.<br />
Os autores devem enviar os artigos em<br />
suporte informático, com as páginas<br />
numeradas, formatados em Microsoft<br />
Word, a dois espaços, alinhado pela<br />
esquerda, com margens amplas e fonte<br />
#12.<br />
A primeira página, não numerada,<br />
incluirá:<br />
• Título do trabalho (Máximo 15 palavras)<br />
em Português, Francês ou<br />
Espanhol e em Inglês<br />
• Nome dos autores e graus<br />
• Afiliações dos autores e sua indexação<br />
numérica<br />
• Nome, morada, telefone, fax e endereço<br />
de e-mail do autor correspondente<br />
• Referência a suportes financeiros ou<br />
bolsas<br />
• Indicação da Reunião Científica onde<br />
o trabalho tenha sido apresentado<br />
previamente (Se aplicável)<br />
A segunda página, não numerada,<br />
compreenderá:<br />
• Título do Trabalho<br />
• Resumo estruturado em Português,<br />
Francês ou Espanhol e em Inglês<br />
(máximo de 150 palavras) com a<br />
seguinte sequência: Objectivos,<br />
Desenho do Estudo, Material e<br />
Métodos, Resultados e Conclusões.<br />
• Nos casos clínicos apenas será<br />
descrito o caso de forma abreviada<br />
• Palavras-chave<br />
• Título abreviado<br />
O texto do manuscrito (máximo 12<br />
páginas numeradas) deve também<br />
dividir-se em: Introdução, Material<br />
e Métodos, Resultados, Discussão,<br />
Conclusões (um parágrafo apenas),<br />
Agradecimentos, Referências Bibliográficas<br />
(máximo 25 citações). Os casos<br />
clínicos serão estruturados em: Introdução,<br />
Descrição do(s) Caso(s), Discussão e<br />
Referências.<br />
As Referências devem seguir as normas<br />
de Vancouver. Os autores devem ser<br />
citados até 4, e se mais de 4 citamse<br />
os primeiros 4 seguido de et al.<br />
As referências devem ser numeradas<br />
consecutivamente pela ordem em que são<br />
mencionadas no texto. As referências<br />
devem ser identificadas na lista de<br />
Referências Bibliográficas por números<br />
árabes, e no texto do artigo por números<br />
em superscript sem parêntesis. Artigos<br />
aceites mas ainda não publicados<br />
devem ser designados (no prelo /<br />
in press). A informação contida em<br />
manuscritos ainda não aceites deve<br />
ser registada com (Observações não<br />
publicadas/unpublished observations).<br />
316 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL<br />
As abreviações dos títulos das revistas<br />
devem ser abreviada de acordo com o<br />
Índex Medicus acessível em<br />
www.nim.nih.gov.<br />
ARTIGO DE REVISTA:<br />
1. Eriksson PO, Li J, Ny T, Hellstrom S.<br />
Spontaneous development of otitis<br />
media in plasminogen-deficient<br />
mice. Int J Med Microbiol. 2006<br />
Nov;296(7):501-9.<br />
CAPÍTULO DE LIVRO:<br />
2. Manning SC. Surgical Therapy for<br />
Sinusitis and Its Complications.<br />
In: Cotton RT and Myer CM (Eds.)<br />
Practical Pediatric Otolaryngology,<br />
Philadelphia, Lippincott-Raven;<br />
1999:pp405-25.<br />
LIVRO COMPLETO:<br />
3. Bluestone CD. Eustachian Tube.<br />
Structure, Function, Role in Otitis<br />
Media. Hamilton, BC Decker; 2005.<br />
REVISTAS ONLINE:<br />
4. Sousa LC, Piza MT, Coutinho-Netto<br />
J, Ruiz DB, et al. Biomembrana<br />
de látex: novo método <strong>para</strong> o<br />
revestimento da cavidade aberta<br />
nas timpanomastoidectomias. Rev<br />
Bras Otorrinolaringol (Online Engl<br />
Ed). 2007;73(3):331-6. www.rborl.<br />
org.br/conteudo/acervo/acervo_<br />
novas.asp?id=3515 Acedido em<br />
Julho 1, 2007<br />
As Ilustrações e as Respectivas Legendas<br />
das Figuras ou Tabelas devem ser<br />
inseridas em ficheiros informáticos à<br />
parte (formatos JPEG, TIFF, PDF, Word,<br />
Excel, Powerpoint), impressas em folhas<br />
de papel se<strong>para</strong>damente do texto<br />
principal e com numeração de acordo<br />
com a entrada no texto. Imagens não<br />
digitalizadas não serão aceites.
www.sporl.pt