O jornal de literatura do Brasil Preciso escrever ... - Jornal Rascunho
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abisco<br />
: : entrevista : : MarCos bagno<br />
<strong>literatura</strong> infantil e juvenil<br />
a<br />
um tesouro<br />
QUEM SOMOS C O N TAT O ASSINATURA DO JORNAL IMPRESSO C A RTA S<br />
escondi<strong>do</strong><br />
EDIÇÕES ANTERIORES COLUNISTAS DOM CASMURRO ENSAIOS E RESENHAS ENTREVISTASPAIOL LITERÁRIO PRATELEIRA NOTÍCIAS OTRO OJO<br />
ouro <strong>de</strong>Ntro da cabeÇa tem a realida<strong>de</strong> como matéria-prima literária<br />
: : adriano Koehler<br />
Curitiba – Pr<br />
Miú<strong>do</strong>, Coisa-nenhuma,<br />
Piá, vários nomes para<br />
indicar uma mesma<br />
criança, uma que é várias,<br />
pois como Coisa-nenhuma nascem<br />
muitas outras a cada instante no<br />
<strong>Brasil</strong> e no mun<strong>do</strong>. Coisa-nenhuma<br />
nasceu em um quilombo escondi<strong>do</strong>,<br />
esqueci<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s e mal toca<strong>do</strong> pela<br />
civilização. E ali viveria para sempre<br />
se um dia não tivesse encontra<strong>do</strong> um<br />
viajante feri<strong>do</strong> perto <strong>de</strong> on<strong>de</strong> morava.<br />
Não que o viajante fosse especial.<br />
No entanto, à medida que o viajante<br />
melhorava graças aos cuida<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />
Coisa-nenhuma, ele contava histórias<br />
para pagar o seu tratamento. O<br />
menino perguntava <strong>de</strong> on<strong>de</strong> vinham<br />
tantas histórias, e o viajante apontou<br />
para uma caixa da qual ele não<br />
se separava: um baú cheio <strong>de</strong> livros.<br />
O menino não sabia o que era livro,<br />
mas o viajante explicou o que era. E a<br />
partir <strong>de</strong>sse momento o menino botou<br />
na cabeça que precisava apren<strong>de</strong>r<br />
a ler. E saiu por esse mun<strong>do</strong> atrás<br />
<strong>de</strong> quem lhe ensinasse a ler.<br />
O enre<strong>do</strong> é simples, mas<br />
Maria Valéria Rezen<strong>de</strong> consegue,<br />
com seu Ouro <strong>de</strong>ntro da cabeça,<br />
contar uma história singela e<br />
até mesmo emocionante, ao narrar<br />
a trajetória <strong>de</strong> um menino em<br />
busca <strong>de</strong> um tesouro que, para ele,<br />
é mais importante que ouro ou<br />
qualquer outra coisa.<br />
Coisa-nenhuma, que <strong>de</strong>pois<br />
se auto-batiza <strong>de</strong> Marílio da Conceição,<br />
em homenagem a uma professora<br />
que por pouco tempo morou<br />
em seu quilombo, <strong>de</strong>ixa sua vidinha<br />
simples para encontrar o seu te-<br />
<strong>literatura</strong> <strong>de</strong> fronteira<br />
: : guilherMe Magalhães<br />
Curitiba – Pr<br />
Marcos Bagno nasceu<br />
em Cataguases (MG)<br />
em 1961, mas gosta<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar claro que lá,<br />
pouco viveu. O escritor, poeta, tradutor<br />
e lingüista já morou <strong>de</strong> norte<br />
a sul <strong>do</strong> país, residin<strong>do</strong> hoje na capital<br />
fe<strong>de</strong>ral, on<strong>de</strong> atua como professor<br />
<strong>de</strong> tradução na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Brasília (UnB). Bagno publicou seu<br />
primeiro livro, A invenção das<br />
horas, em 1988, mas já escrevia<br />
poesia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> antes. Vinte e quatro<br />
anos e 14 livros <strong>de</strong>pois, seu romance<br />
As memórias <strong>de</strong> Eugênia é finalista<br />
<strong>do</strong> prêmio Jabuti na categoria<br />
Livro juvenil, e na categoria Melhor<br />
autor estreante <strong>do</strong> São Paulo <strong>de</strong> Literatura.<br />
O livro habita uma espécie<br />
<strong>de</strong> fronteira entre a <strong>literatura</strong> juvenil<br />
e a adulta. Mas Bagno possui<br />
também um la<strong>do</strong> militante, no caso<br />
contra os reacionários da língua<br />
portuguesa. O mineiro <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> um<br />
idioma vivo, atento às diferentes<br />
realida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> seus falantes. Nesta<br />
entrevista por e-mail, ele conversa<br />
sobre o processo <strong>de</strong> escrita <strong>de</strong> seu<br />
romance mais recente, além <strong>de</strong> suas<br />
motivações literárias.<br />
• Em que momento você <strong>de</strong>cidiu<br />
enveredar pela <strong>literatura</strong> infan-<br />
ouro <strong>de</strong>Ntro<br />
da cabeÇa<br />
Maria valéria rezen<strong>de</strong><br />
ilustrações: diogo droschi<br />
autêntica<br />
104 págs.<br />
a autora<br />
maria valéria rezeN<strong>de</strong><br />
nasceu em 1942, na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
santos (sP), on<strong>de</strong> viveu até os 18<br />
anos. trabalhou durante 20 anos<br />
na formação <strong>de</strong> educa<strong>do</strong>res. em<br />
2001, começou a publicar ficção<br />
e poesia para adultos, jovens<br />
e crianças. vive na Paraíba.<br />
souro. Na viagem, Coisa-nenhuma<br />
passa por várias <strong>de</strong>sventuras. Cada<br />
uma <strong>de</strong>las retrata um pouco <strong>do</strong> drama<br />
<strong>de</strong> quem não sabe ler.<br />
O menino que logo vira homem<br />
é engana<strong>do</strong> por explora<strong>do</strong>res<br />
<strong>do</strong> trabalho escravo, é ajuda<strong>do</strong> por<br />
pessoas <strong>de</strong> bom coração, viaja sem<br />
saber para on<strong>de</strong>, procura por ajuda<br />
sem saber a quem se dirigir. Em<br />
várias ocasiões, pensa em <strong>de</strong>sistir<br />
<strong>de</strong> sua busca e voltar à sua al<strong>de</strong>ia<br />
natal, on<strong>de</strong> as letras não faziam<br />
falta. Mas as histórias que estavam<br />
no baú o chamavam, e ele não resistia<br />
ao chama<strong>do</strong>, e continuava<br />
sua luta. Não é necessário dizer<br />
qual é a conclusão da história.<br />
Ouro <strong>de</strong>ntro da cabeça<br />
to-juvenil e por que motivo?<br />
Com o prêmio Nestlé <strong>de</strong> 1988, começou<br />
minha carreira como escritor<br />
publica<strong>do</strong>, pois já tinha muitas<br />
obras escritas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a juventu<strong>de</strong><br />
e a a<strong>do</strong>lescência. O interessante é<br />
que sempre escrevi poesia. Quan<strong>do</strong><br />
envere<strong>de</strong>i pela prosa, pelo conto,<br />
tive mais sucesso em ser li<strong>do</strong> e<br />
publica<strong>do</strong>. A <strong>literatura</strong> infanto-juvenil<br />
sempre esteve entre minhas<br />
leituras prediletas. Escrevi meu<br />
primeiro trabalho nessa área, O<br />
papel roxo da maçã, em <strong>de</strong>corrência<br />
<strong>de</strong> diversos fatores, entre<br />
os quais o nascimento <strong>de</strong> minha<br />
primeira filha, Júlia, que ocorreu<br />
também em 1988. O livro nasceu<br />
junto com ela e foi premia<strong>do</strong>, no<br />
mesmo ano, com o João <strong>de</strong> Barro,<br />
um importante prêmio da <strong>literatura</strong><br />
infanto-juvenil, concedi<strong>do</strong> pelo<br />
governo <strong>de</strong> Minas Gerais.<br />
• As memórias po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong><br />
um livro na fronteira<br />
da <strong>literatura</strong> infanto-juvenil<br />
com a adulta. Como você vê a<br />
indicação <strong>do</strong> livro ao prêmio<br />
São Paulo, tradicionalmente<br />
volta<strong>do</strong> para <strong>literatura</strong> adulta?<br />
Po<strong>de</strong> parecer lugar-comum, mas<br />
eu realmente não vejo diferença<br />
entre <strong>literatura</strong> infanto-juvenil e<br />
<strong>literatura</strong> adulta. Quan<strong>do</strong> criança,<br />
eu lia obras <strong>de</strong> filosofia, sociologia<br />
consegue passar algumas mensagens<br />
legais ao leitor sem ser piegas.<br />
Maria Valéria toma cuida<strong>do</strong> para<br />
não ser piegas nos momentos em<br />
que a solução mágica parece ser<br />
a mais fácil. To<strong>do</strong>s os benfeitores<br />
que Coisa-nenhuma encontra ao<br />
longo <strong>do</strong> caminho são pessoas que<br />
po<strong>de</strong>riam ser reais, que o ajudam,<br />
pois são como pessoas boas na vida<br />
real. Não há exageros, há a realida<strong>de</strong>.<br />
Do mesmo mo<strong>do</strong>, os ruins são<br />
como são, no livro e na vida.<br />
E mesmo sen<strong>do</strong> um livro para<br />
mostrar o quão bacana é po<strong>de</strong>r ler,<br />
Maria Valéria não dá a isso uma importância<br />
<strong>de</strong>smedida. É um tesouro<br />
o que temos <strong>de</strong>ntro da cabeça, essa<br />
capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ler e contar histórias,<br />
olga vlahou/divulgação<br />
e história, tanto quanto <strong>literatura</strong><br />
juvenil. Muitas obras concebidas<br />
para crianças hoje são clássicos da<br />
<strong>literatura</strong> universal, como Alice<br />
no país das maravilhas ou As<br />
viagens <strong>de</strong> Gulliver. Para mim, o<br />
importante é que as pessoas leiam,<br />
in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>do</strong> gênero, e é<br />
importante que haja espaço para<br />
to<strong>do</strong> e qualquer tipo <strong>de</strong> <strong>literatura</strong>.<br />
Quan<strong>do</strong> o editor Marcelo Del’Anhol<br />
disse que tinha inscrito o livro no<br />
prêmio, achei muita ousadia da<br />
parte <strong>de</strong>le e não acreditei que ela<br />
fosse recompensada. No entanto,<br />
aí está o livro entre os finalistas.<br />
Isso já é uma vitória, porque, como<br />
você mesmo diz, é um livro que fica<br />
no limite entre o juvenil e o adulto.<br />
Isso <strong>de</strong>monstra, a meu ver, uma<br />
boa atitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> júri, que avaliou a<br />
obra pelo que ela é, sem preconceitos<br />
com relação ao gênero.<br />
• Você se diz um militante contra<br />
o preconceito lingüístico<br />
que sofrem as pessoas que falam<br />
as variações <strong>do</strong> português<br />
<strong>do</strong> cotidiano. Essa militância<br />
aparece <strong>de</strong> alguma forma em<br />
sua <strong>literatura</strong>?<br />
Ela aparece <strong>de</strong> forma não explícita,<br />
mas pelo uso tranqüilo que faço<br />
das formas lingüísticas que já estão<br />
incorporadas há muito tempo ao<br />
português brasileiro urbano culto,<br />
mas que são ainda con<strong>de</strong>nadas pelos<br />
reacionários da língua. Escreven<strong>do</strong><br />
como escrevo já <strong>do</strong>u a minha<br />
contribuição para a plena aceitação<br />
<strong>de</strong>ssas formas lingüísticas inova<strong>do</strong>ras,<br />
muitas das quais, inclusive,<br />
não são tão inova<strong>do</strong>ras assim, pois<br />
vêm sen<strong>do</strong> usadas por gran<strong>de</strong>s escritores<br />
há mais <strong>de</strong> 200 anos!<br />
150 • outubro_2012<br />
17<br />
Prateleirinha<br />
QUEM SOMOS C O N TAT O ASSINATURA DO JORNAL IMPRESSO<br />
meNiNa <strong>do</strong> País<br />
daS NeveS<br />
he zhihong<br />
trad.: sérgio Marinho<br />
edições sM<br />
36 págs.<br />
EDIÇÕES ANTERIORES COLUNISTAS DOM CASMURRO ENSAIOS E RESENHAS ENTREVISTASPAI<br />
reProdução: diogo drosChi<br />
mas não é o único tesouro. Mesmo<br />
quem já <strong>de</strong>scobriu as letras po<strong>de</strong><br />
não estar muito bem, como <strong>de</strong>monstra<br />
a autora ao fazer Coisa-nenhuma<br />
encontrar a sua professora.<br />
Esse cuida<strong>do</strong> ao não exagerar e,<br />
ao mesmo tempo, manter Coisanenhuma<br />
com uma cabeça <strong>de</strong> menino,<br />
mesmo crescen<strong>do</strong>, atrai o<br />
leitor. Em tempos <strong>de</strong> bruxos, fadas<br />
e quaisquer outras invenções oníricas,<br />
ter um pouco <strong>de</strong> realida<strong>de</strong><br />
po<strong>de</strong> ser bom. A história é bem<br />
escrita, tem ritmo e cadência, e as<br />
ilustrações <strong>de</strong> Diogo Droschi formam<br />
um painel agradável e boa<br />
companhia à leitura. A edição bem<br />
cuidada da Autêntica também colabora<br />
para o bom resulta<strong>do</strong>.<br />
leia a entrevista<br />
CoMPleta no site<br />
rasCunho.CoM.br<br />
fang mora no extremo norte da<br />
China, no País nas neves. to<strong>do</strong>s<br />
os dias observa, pela janela, as<br />
crianças da al<strong>de</strong>ia sain<strong>do</strong> para<br />
a escola. seu sonho é um dia<br />
ser como elas. basea<strong>do</strong> em<br />
uma história verídica, este livro<br />
é ilustra<strong>do</strong> por pinturas em<br />
seda feitas pela filha <strong>de</strong> fang.<br />
JereMiaS <strong>de</strong>SeNHa<br />
uM MoNStro<br />
Peter McCarty<br />
trad.: rosemarie ziegelmaier<br />
globinho<br />
40 págs.<br />
Jeremias é um menino solitário<br />
que um dia <strong>de</strong>senha um monstro<br />
que ganha vida. a criatura se<br />
revela bem man<strong>do</strong>na, não<br />
pára <strong>de</strong> chatear o garoto com<br />
inúmeras exigências. Como<br />
se livrar <strong>de</strong> um monstro tão<br />
chato? o autor tenta mostrar<br />
nesta obra a impossibilida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> se viver no mun<strong>do</strong> real<br />
sem respeitar ao próximo.<br />
caPoeira caMará<br />
Cesar Car<strong>do</strong>so<br />
ilustrações: graça lima<br />
Paulus<br />
64 págs.<br />
em um dia que teria tu<strong>do</strong><br />
para ser igual aos outros,<br />
ana olívia encontra Mestre<br />
sorriso, um simpático professor<br />
<strong>de</strong> capoeira que a leva para<br />
conhecer lugares e pessoas<br />
muito interessantes. Por meio<br />
<strong>de</strong> um berimbau mágico, os<br />
<strong>do</strong>is viajam no tempo para<br />
séculos atrás, até a chegada<br />
da capoeira ao brasil.<br />
o raMiNHo <strong>de</strong> arruda<br />
bel assunção azeve<strong>do</strong><br />
ilustrações: simone Matias<br />
Caramelo<br />
32 págs.<br />
a história <strong>de</strong> um pequeno ramo<br />
<strong>de</strong> arruda que vai passan<strong>do</strong><br />
<strong>de</strong> mão em mão, encontra<br />
diferentes personagens e<br />
nos mostra os vários usos e<br />
significa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> uma planta<br />
tão especial para a cultura<br />
brasileira. Cenas panorâmicas<br />
que ocupam as duplas <strong>de</strong><br />
páginas conferem à narrativa<br />
um tom cinematográfico.