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Ano 3, Volume 1,<br />

Janeiro-Março, 2012<br />

ISSN 2177-0719<br />

O ANATOMISTA<br />

Medicina Evolutiva<br />

Genética<br />

Políticas <strong>de</strong> Expansão Universitária<br />

no Ensino da <strong>Anatomia</strong><br />

Nervo Facial<br />

Técnica <strong>de</strong> Injeção <strong>de</strong> Tinta da China<br />

em Corações <strong>de</strong> Bovinos e Ovinos<br />

REVISTA DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ANATOMIA


O ANATOMISTA<br />

REVISTA DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ANATOMIA<br />

Expediente<br />

Editores: Nadir Eunice Valver<strong>de</strong> Barbato <strong>de</strong> Prates<br />

Richard Halti Cabral<br />

Conselho Editorial: Arani Nanci Bomfim Mariana<br />

Capa:<br />

José A<strong>de</strong>rval Aragão<br />

Marcelo Cavenaghi Pereira da Silva<br />

Jõao Carlos <strong>de</strong> Souza Cortes<br />

Mirna Duarte Barros<br />

Telma Sumie Masuko<br />

“O Elefante Composto” – Pintura persa, datada do final<br />

do século XIV. Figura extraída do artigo KOENTGES, G. Evolution<br />

of anatomy and gene control. Nature, v. 451, p. 658-663, 2008 (doi:<br />

10.1038/451658a).<br />

A responsabilida<strong>de</strong> do conteúdo dos artigos <strong>de</strong>ve ser atribuída,<br />

exclusivamente, aos seus respectivos autores. As opiniões<br />

manifestadas nos artigos não refletem, necessariamente, a opinião<br />

da <strong>Socieda<strong>de</strong></strong>.<br />

<strong>Socieda<strong>de</strong></strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong><br />

Av. Prof. Lineu Prestes, 2415 - Prédio Biomédicas III<br />

Cid. Universitária. Cep: 05508-900 São Paulo / SP<br />

E-mail: sba@icb.usp.br / Website: http://www.sbanatomia.org.br<br />

Tel.: (11) 3091-7978 / Tel./Fax: (11) 3813-8587 2


O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Sumário<br />

Artigos Originais<br />

Medicina evolutiva e uma nova visão<br />

do porquê ficamos doentes ........................................... 03<br />

GENÉTICA: o pão nosso <strong>de</strong> cada dia ....................... 09<br />

A Influência das políticas brasileiras <strong>de</strong> expansão<br />

universitária no ensino <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong> Humana ........... 16<br />

Artigo <strong>de</strong> Revisão<br />

Nervo facial: uma revisão focada em sua divisão<br />

parassimpática ................................................................. 20<br />

Como eu faço...<br />

Técnica <strong>de</strong> injeção <strong>de</strong> tinta da China para<br />

<strong>de</strong>monstração da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> purkinje em corações<br />

<strong>de</strong> bovinos e ovinos ....................................................... 29<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original<br />

MEDICINA EVOLUTIVA E UMA NOVA VISÃO DO PORQUE<br />

FICAMOS DOENTES<br />

Ana Lúcia dos Anjos Duarte1, Daniella Franco Curcio2, Mirna Duarte Barros2<br />

1 Docente do Curso <strong>de</strong> Medicina, Universida<strong>de</strong> São Camilo<br />

2 Docente do Departamento <strong>de</strong> Morfologia, Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências Médicas da Santa Casa <strong>de</strong> São Paulo<br />

A Medicina Evolutiva ou Darwiniana tem sido consi<strong>de</strong>rada uma nova subdisciplina<br />

e vem se <strong>de</strong>senvolvendo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1991, com a publicação do trabalho <strong>de</strong> Williams & Nesse. Ela<br />

po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finida como o estudo das consequências do processo dinâmico <strong>de</strong> seleção natural,<br />

tanto sobre a espécie humana, quanto sobre patógenos a ela relacionados (Spotorno, 2005;<br />

Stearns, 2002). A Medicina Evolutiva estuda os princípios biológicos evolutivos pertinentes para a<br />

compreensão dos processos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e doença <strong>de</strong> modo mais amplo e, assim, propõe novas<br />

linhas e abordagens <strong>de</strong> tratamentos que possam ser mais eficientes (Hirsch et al. 2002 apud<br />

Naugler, 2008).<br />

Os objetivos da Medicina Evolutiva <strong>de</strong>vem ser a investigação das causas evolutivas<br />

para as diversas patologias, disfunções e alterações morfológicas das estruturas orgânicas no ser<br />

humano, visando prolongar o estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e estimular novas pesquisas com a mesma<br />

finalida<strong>de</strong>. Segundo este prisma, os mecanismos <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>adores dos processos patológicos<br />

po<strong>de</strong>m ser classificados em dois grupos, distintos por nível <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>: os processos<br />

patológicos advindos <strong>de</strong> causas diretas (proximate causes) e os relacionados a causas evolutivas. Os<br />

primeiros correspon<strong>de</strong>riam a alterações morfológicas, funcionais ou morfofuncionais ligadas a<br />

fatores imediatos, os quais resultam em doenças ou <strong>de</strong>svios da normalida<strong>de</strong>. Os processos<br />

patológicos <strong>de</strong> causa evolutiva, por sua vez, teriam relação com eventos ocorridos ao longo da<br />

história evolutiva da espécie humana. Este paradigma <strong>de</strong> análise dos mecanismos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e<br />

doença confere uma perspectiva histórica à <strong>de</strong>terminação da causalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> doenças ou <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>svios morfofuncionais dos padrões <strong>de</strong> normalida<strong>de</strong> (Harris & Malyango, 2005).<br />

por exemplo:<br />

Dentro do conceito evolucionista, alguns questionamentos ganham nova dimensão,<br />

1. Por que a seleção natural não eliminou <strong>de</strong>terminada doença?;<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: MEDICINA EVOLUTIVA E UMA NOVA VISÃO DO PORQUE FICAMOS DOENTES<br />

2. Por que o corpo humano apresenta características que o torna suscetível a <strong>de</strong>terminadas<br />

patologias e por que algumas <strong>de</strong>las causam complicações orgânicas irreversíveis? Ou ainda;<br />

3. Po<strong>de</strong>ria uma <strong>de</strong>terminada doença ser o resultado <strong>de</strong> uma incompatibilida<strong>de</strong> entre a herança<br />

biológica e o estilo <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados grupos?<br />

Raciocínios guiados exclusivamente pela somatória <strong>de</strong> causas diretas, base teórica<br />

da Medicina Atual, parecem insuficientes para respon<strong>de</strong>r <strong>de</strong> modo <strong>de</strong>cisivo a estas perguntas.<br />

Assim, a medicina evolutiva busca <strong>de</strong>tectar um amplo espectro <strong>de</strong> causas ou fatores que acabam<br />

por culminar em uma enfermida<strong>de</strong>.<br />

Spotorno (2005) cita exemplos: alguns sintomas clínicos como febre, tosse, vômito,<br />

diarreia, dor, irritação, ansieda<strong>de</strong>, normalmente são consi<strong>de</strong>rados como parte do problema na<br />

visão tradicional; já sob a análise evolucionista, estes sintomas são funcionais, ou seja, são aspectos<br />

incorporados pela pressão da seleção natural e <strong>de</strong>vem ser consi<strong>de</strong>rados como uma das<br />

respostas/<strong>de</strong>fesas do organismo a uma infecção ou trauma.<br />

Weiner (1998) alerta para a resistência dos cientistas à biologia evolutiva, o que<br />

seria justificado por questões <strong>de</strong> maior complexida<strong>de</strong>, como por exemplo: Por que a doença não<br />

ocorre em todos os indivíduos? ou Por que a seleção natural não leva à perfeição, através da<br />

eliminação <strong>de</strong> falhas morfológicas e funcionais que predispõem humanos a infecções,<br />

<strong>de</strong>generações relacionadas à ida<strong>de</strong>, e suscetibilida<strong>de</strong> a diversas patologias, como alergias, câncer,<br />

hipertensão, diabetes mellitus, doenças mentais e outras.<br />

A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a evolução é progressiva e ten<strong>de</strong> à perfeição em organismos<br />

biológicos imunes a doenças é um resíduo do pensamento dos séculos XVIII e XIX (Ruse, 1996),<br />

que po<strong>de</strong> ser abordado e reavaliado nas salas <strong>de</strong> aulas dos cursos médicos mo<strong>de</strong>rnos, oferecendo<br />

novas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> pensamentos a respeito dos processos patológicos.<br />

Os paradigmas clássicos da medicina, que consi<strong>de</strong>ram os conceitos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e<br />

doença como inseridos em categorias opostas, seriam inevitavelmente remo<strong>de</strong>lados, em função <strong>de</strong><br />

princípios básicos da biologia evolutiva. Do mesmo modo que ocorrem variações biológicas intra<br />

e interespécies, variam também a suscetibilida<strong>de</strong> individual às diversas patologias, seus sinais e<br />

sintomas e, em última análise, o estado geral <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e doença.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: MEDICINA EVOLUTIVA E UMA NOVA VISÃO DO PORQUE FICAMOS DOENTES<br />

Assim, nos paradigmas mo<strong>de</strong>rnos, os conceitos médicos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e doença só<br />

po<strong>de</strong>riam ser compreendidos através da análise evolutiva (Weiner, 1998).<br />

A biologia evolutiva apresenta dois ramos que contribuem para a ciência médica:<br />

o primeiro <strong>de</strong>les representa a perspectiva adaptacionista, embasado nas consequências da<br />

seleção natural, nas adaptações <strong>de</strong> humanos e <strong>de</strong> seus patógenos, e na resposta rápida e<br />

dinâmica das intervenções humanas. O segundo diz respeito à perspectiva histórica, a qual<br />

consi<strong>de</strong>ra as transformações evolutivas e suas consequências na <strong>de</strong>terminação do estado <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> ou doença; inclui-se aqui, por exemplo, o processo evolutivo <strong>de</strong> rebaixamento da laringe<br />

em primatas ancestrais da espécie humana que, apesar <strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado como um dos fatores<br />

para a viabilização da fala, resultou antes no cruzamento das vias dos sistemas respiratório e<br />

digestório e no aumento do risco <strong>de</strong> morte por asfixia (Stearns & Ebert, 2001).<br />

O diâmetro estreito do canal <strong>de</strong> nascimento, a existência do terceiro molar e a<br />

persistência <strong>de</strong> genes que causam doença bipolar e senescência, são condições cujas origens<br />

estão fincadas na história evolutiva humana (Nesse & Williams, 1994).<br />

Naugler (2008) comenta que uma hipótese evolutiva para a origem das doenças<br />

humanas consiste em más combinações (mismatches) entre genes e ambiente. Esta teoria está<br />

embasada no fato <strong>de</strong> que vários genes humanos condicionaram adaptações a um ambiente<br />

ancestral em particular (tal como a savana africana).<br />

Mudanças ambientais e <strong>de</strong> condição <strong>de</strong> vida ao longo da história evolutiva<br />

humana ocorreram mais rápido do que a ação da seleção natural sobre as frequências alélicas e<br />

genotípicas, resultando em doenças dos tempos mo<strong>de</strong>rnos.<br />

Ainda que a inclusão da medicina evolutiva no currículo das escolas médicas seja<br />

uma i<strong>de</strong>ia que vem sendo <strong>de</strong>fendida há mais <strong>de</strong> uma década (Williams & Nesse, 1991;<br />

Charlton, 1997; Nesse & Schiffman, 2003; Shanks & Pyles, 2007; Abbot & Abboud, 2006), a<br />

maioria das escolas ainda <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ra este aspecto da teoria para a compreensão dos processos<br />

<strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e doença.<br />

Este fato reflete que a relevância dos conceitos da biologia evolutiva ainda é<br />

subestimada na área médica (Nesse & Schiffman, 2003).<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: MEDICINA EVOLUTIVA E UMA NOVA VISÃO DO PORQUE FICAMOS DOENTES<br />

Um raciocínio mais amplo é estabelecido com a perspectiva evolucionista, uma<br />

vez que todo o processo biológico é consi<strong>de</strong>rado como parte da doença, incluindo-se os fatores<br />

evolutivos a ela relacionados – como as modificações, alterações ou adaptações genéticas,<br />

morfológicas e funcionais, no estudo da própria patologia. Iniciativas educacionais e <strong>de</strong> pesquisa<br />

nesta área são promissoras e po<strong>de</strong>m contribuir <strong>de</strong> modo único para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong><br />

soluções criativas em termos <strong>de</strong> prevenção e tratamento dos diversos tipos <strong>de</strong> patologias.<br />

Referências Bibliográficas<br />

ABBOT, A. & ABBOUD, G. Evolutionary medicine: a mo<strong>de</strong>l for medical school introduction.<br />

Medical Education, 40(5): 471 – 472. 2006.<br />

CHARLTON, BG. The inequity of inequality. J Health Psychol 2 (3): 413-425. 1997.<br />

HARRIS, E.E & MALYANGO, A.A. Evolutionary explanations in medical and health<br />

profession courses: are you answering your stu<strong>de</strong>nts “why” questions? BMC Medical Education<br />

(5): 1 – 7. 2005.<br />

NAUGLER, C.T. Evolutionary medicine. Update on the relevance to family practice. Can Fam<br />

Physician 54; 1265-9. 2008.<br />

NESSE, R.M. & SCHIFFMAN, J.D. Evolutionary biology in the medical school curriculum.<br />

BioScience 53(6): 585-587. 2003.<br />

NESSE, R.M. & WILLIAMS, G.C., Why we get sick: the new science of darwinian medicine.<br />

Vintage Books, New York, 1994.<br />

RUSE, M. Monad to Man. The concept of progress in evolutionary biology. Cambridge, MA,<br />

Harvard University Press, 1996.<br />

SHANKS, N. & PYLES, R.A. Evolution and medicine: the long reach of “Dr. Darwin”.<br />

Philosophy, Ethics, and Humanities in Medicine 2:4 (1 – 14) 2007.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: MEDICINA EVOLUTIVA E UMA NOVA VISÃO DO PORQUE FICAMOS DOENTES<br />

SPOTORNO, A.E. Medicina evolucionaria: una ciencia básica emergente. Rev Med Chile 133:<br />

231-240. 2005<br />

STEARNS, S. Darwinian Medicine. In: Pagel, M. ed. Encyclopedia of Evolution. Vol. 1. New<br />

York, NY: Oxford University Press, 67 – 76. 2002.<br />

STEARNS, S.C. & EBERT, D. Evolution in Health and Disease: Work in Progress. Q Rev<br />

Biol, 76 (4), 2001.<br />

WEINER, H. Notes on an Evoltionary Medicine. Psychosomatic Medicine, 60: 510-520. 1998.<br />

WILLIAMS, GC & NESSE, RM. The dawn of Darwinian medicine. Q Rev Biol, 66: 1- 22.<br />

1991.<br />

Profa. Dra. Ana Lúcia dos Anjos Duarte<br />

Bióloga<br />

Docente do Curso <strong>de</strong> Medicina da<br />

Universida<strong>de</strong> São Camilo<br />

Sócia da <strong>Socieda<strong>de</strong></strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong><br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original<br />

GENÉTICA: o pão nosso <strong>de</strong> cada dia<br />

Mirna Duarte Barros & Daniella Franco Curcio<br />

Departamento <strong>de</strong> Morfologia, Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências Médicas da Santa Casa <strong>de</strong> São Paulo<br />

“Sou membro <strong>de</strong> uma espécie frágil, ainda nova na Terra, as criaturas mais novas em<br />

qualquer escala, presentes aqui há apenas alguns momentos na perspectiva evolucionária <strong>de</strong> tempo, uma espécie<br />

juvenil, a criança das espécies[...]<br />

Este é um lugar muito gran<strong>de</strong> e eu não sei como ele funciona.”<br />

Lewis Thomas (1913-1993), médico e autor do livro The Fragile Species<br />

Em vertiginosa velocida<strong>de</strong> <strong>de</strong> expansão a Genética tem se estabelecido como uma<br />

fonte inesgotável <strong>de</strong> novos conhecimentos cuja aplicação permeia silenciosamente nosso cotidiano<br />

e se esten<strong>de</strong> às mais avançadas áreas da biologia, medicina, agricultura, pecuária, zootecnia,<br />

ecologia, e assim por diante, aten<strong>de</strong>ndo a antigas necessida<strong>de</strong>s e criando novas <strong>de</strong>mandas,<br />

incessantemente. Calças jeans são confeccionadas com fibras <strong>de</strong> algodão que em muito diferem<br />

do seu ancestral natural; linhagens geneticamente selecionadas <strong>de</strong> milho e <strong>de</strong> trigo constituem a<br />

massa básica do alimento universal, o pão; diversas doenças e síndromes humanas têm suas causas<br />

<strong>de</strong>scobertas e ganham perspectivas <strong>de</strong> tratamentos tão inovadores, quanto promissores. A<br />

socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna está impregnada pelo estudo e pelos produtos do conhecimento da Genética.<br />

O conhecimento científico reflete o interesse e a filosofia da socieda<strong>de</strong> que o<br />

produz e gera consequências na vida dos indivíduos que a compõem. A Genética e todas as áreas<br />

científicas relacionadas têm <strong>de</strong>terminado um marcante impacto no estabelecimento <strong>de</strong> novos<br />

conceitos na socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna.<br />

Este artigo preten<strong>de</strong> traçar um breve panorama histórico <strong>de</strong>sta ciência instigante<br />

que inspira o trabalho <strong>de</strong> muitos, traz alento e esperança a tantos e promove o <strong>de</strong>senvolvimento,<br />

nos mais diferentes aspectos da vida que conhecemos.<br />

HEREDITARIEDADE<br />

Enquanto a transmissão <strong>de</strong> conceitos intelectuais, títulos <strong>de</strong> nobreza e bens<br />

materiais ocorre <strong>de</strong> acordo com os costumes e leis vigentes na socieda<strong>de</strong>, muitas características<br />

físicas, fisiológicas e comportamentais são recombinadas e transmitidas por meio dos gametas, o<br />

único elo <strong>de</strong> transmissão entre as gerações contíguas.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: GENÉTICA: o pão nosso <strong>de</strong> cada dia<br />

A hereditarieda<strong>de</strong> é a transferência <strong>de</strong> características individuais dos ancestrais<br />

para seus <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes. Classicamente, os genes são <strong>de</strong>finidos como as unida<strong>de</strong>s padrão <strong>de</strong><br />

transmissão <strong>de</strong> caracteres hereditários. Os genes correspon<strong>de</strong>m a um segmento <strong>de</strong> uma<br />

molécula <strong>de</strong> DNA, cuja sequência <strong>de</strong> bases nitrogenadas contém informação codificadora <strong>de</strong><br />

proteínas. Assim, são os genes que coor<strong>de</strong>nam a produção das proteínas.<br />

Entretanto, muito antes do conhecimento da existência da célula, dos genes ou<br />

do DNA, os princípios da hereditarieda<strong>de</strong> foram reconhecidos e aplicados pela humanida<strong>de</strong>.<br />

Por volta <strong>de</strong> 8.000 a.C., em Çatal Hüyük, a primeira cida<strong>de</strong> a se formar no mundo antigo, na<br />

atual Turquia, cultivava-se uva para a fabricação <strong>de</strong> vinho, havendo indícios da possibilida<strong>de</strong> do<br />

uso <strong>de</strong> princípios básicos <strong>de</strong> melhoramento vegetal. Achados arqueológicos <strong>de</strong> pedigrees <strong>de</strong><br />

cavalos, datados <strong>de</strong> 6.000 a.C., na Caldéia, hoje Iraque, sugerem a transmissão <strong>de</strong> certas<br />

características da crina através <strong>de</strong> gerações selecionadas. No Livro do Gênesis, versículos 30-46,<br />

consta que Jacó e Labão separavam as ovelhas <strong>de</strong> seu rebanho levando consi<strong>de</strong>rando a cor da<br />

sua pelagem, se branca ou salpicada, o que indica a distinção <strong>de</strong> duas varieda<strong>de</strong>s da mesma<br />

característica.<br />

Filósofos gregos propuseram algumas idéias sobre hereditarieda<strong>de</strong>. Teophrastus<br />

(371-286 B.C.) postulava a hipótese <strong>de</strong> que as flores masculinas causavam a maturação das flores<br />

femininas. Aristóteles e Hipócrates especulavam que “sementes” seriam produzidas por várias<br />

partes do corpo e transmitidas aos <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes no momento da concepção, tendo sido<br />

conduzidas na corrente sanguínea até as gônadas. Essa teoria, <strong>de</strong>nominada <strong>de</strong> “Teoria da<br />

Pangenesis”, foi consi<strong>de</strong>rada como verda<strong>de</strong>ira até o século XIX, por cientistas como Charles<br />

Darwin, tendo sido experimentalmente <strong>de</strong>scartada por Francis Galton, em 1870.<br />

A primeira observação dos espermatozoi<strong>de</strong>s é datada <strong>de</strong> 1677, e foi realizada por<br />

Antoine van Leeuwenhoek, microscopista holandês, que os <strong>de</strong>screveu como animalcules, que<br />

habitavam o esperma humano e <strong>de</strong> outros animais. Nicolas Hartsoeker, que fora seu aluno e<br />

disputaria a primazia <strong>de</strong>sta <strong>de</strong>scoberta com Leeuwenhoek, postulou em 1694 a existência <strong>de</strong> um<br />

pequeno ser humano completamente formado, o homúnculos, no interior <strong>de</strong> cada<br />

espermatozoi<strong>de</strong>, conceito fundamentou o início a Teoria Espermista. Por esta teoria, a<br />

contribuição feminina para a nova geração resumia-se ao ambiente uterino e a manutenção <strong>de</strong><br />

todas as condições para o crescimento do homúnculo.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: GENÉTICA: o pão nosso <strong>de</strong> cada dia<br />

Em contraposição, a Teoria Ovista reuniu cientistas que acreditavam que eram as<br />

mulheres que carregavam ovos contendo ínfimos meninos ou meninas, já formados, e a<br />

presença do espermatozoi<strong>de</strong> seria necessária apenas para estimular seu crescimento.<br />

Ambos, espermistas ou ovistas, partilhavam a teoria da hereditarieda<strong>de</strong> pré-<br />

formista, on<strong>de</strong> os processos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento limitavam-se ao crescimento do indivíduo, cujo<br />

sexo e características já estariam <strong>de</strong>terminados antes da concepção.<br />

Diante <strong>de</strong>stes conceitos, doenças genéticas e malformações eram interpretadas<br />

como manifestações da ira divina, provocadas pelo excesso ou pela falta <strong>de</strong> sementes fornecidas<br />

pelo genitor, ou <strong>de</strong>vidas às contrarieda<strong>de</strong>s que a mãe teria sofrido durante o período gestacional.<br />

Em função disto, Napoleão Bonaparte chegou a sancionar uma lei que permitia<br />

que mulheres grávidas se apropriassem <strong>de</strong> bens alheios, sem que se caracterizasse furto, para<br />

que estas não passassem por nenhum constrangimento ao procurarem saciar seus <strong>de</strong>sejos<br />

enquanto nesta condição.<br />

<strong>de</strong>scartada.<br />

Com o <strong>de</strong>senvolvimento das técnicas <strong>de</strong> microscopia, a teoria pré-formista foi<br />

A visão predominante à época <strong>de</strong> Darwin era a da Herança da Mistura, on<strong>de</strong> do<br />

cruzamento <strong>de</strong> indivíduos com expressão extrema <strong>de</strong> uma característica dariam origem a uma<br />

prole com característica em ponto intermediário, ou seja: do cruzamento <strong>de</strong> um indivíduo<br />

gran<strong>de</strong> e um pequeno, a <strong>de</strong>scendência seria <strong>de</strong> tamanho médio. Entretanto, se fatores<br />

hereditários se apresentassem sempre <strong>de</strong> forma intermediária quando combinados, haveria<br />

perda <strong>de</strong> variabilida<strong>de</strong>, numa proporção <strong>de</strong> meta<strong>de</strong> a cada geração, levando à uniformização das<br />

características, o que não ocorre nas populações naturais.<br />

Expressões como “parente <strong>de</strong> sangue”, “puro-sangue” e “mistura <strong>de</strong> sangue”<br />

usadas ainda hoje, são reflexos das premissas da Teoria da Mistura e da Teoria da Pangenesis.<br />

A teoria da herança <strong>de</strong> caracteres adquiridos, proposta por Jean-Baptiste<br />

Lamarck, predominava no cenário científico à época <strong>de</strong> Darwin. Por esta teoria, mudanças<br />

adquiridas ao longo da vida, em relação à forma ou à função <strong>de</strong> partes <strong>de</strong> um organismo, seriam<br />

transmitidas à sua <strong>de</strong>scendência.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: GENÉTICA: o pão nosso <strong>de</strong> cada dia<br />

Após realizar experimentos com o intuito <strong>de</strong> testar a hipótese da pangênese, na<br />

década <strong>de</strong> 1870, Galton publicou uma série <strong>de</strong> trabalhos on<strong>de</strong> apresentou os resultados <strong>de</strong> seus<br />

estudos com as genealogias. Então Darwin admitiu que a teoria da Pangenesis não podia ser<br />

comprovada experimentalmente e que, do mesmo modo, não podia adotar a Teoria da Mistura,<br />

porque sua teoria da evolução das espécies baseava-se justamente nas observações que ele fazia<br />

sobre a variabilida<strong>de</strong> intra e interespecífica. Sendo assim, Darwin acabou por admitir, em parte,<br />

a teoria dos caracteres adquiridos. Foi o experimento <strong>de</strong> August Weismann, em 1880, cujo<br />

método baseava-se na amputação <strong>de</strong> caudas <strong>de</strong> ratos por várias gerações, que <strong>de</strong>monstrou, pelo<br />

fato <strong>de</strong>ste procedimento não ter resultado no nascimento <strong>de</strong> ratos sem cauda, que a Teoria dos<br />

Caracteres Adquiridos não se sustentava.<br />

Ainda assim, o embasamento para a Genética como ramo estabelecido da ciência<br />

foi constituído inicialmente pelos estudos <strong>de</strong> Gregor Men<strong>de</strong>l, um monge austríaco, que<br />

pesquisou características transmitidas através das gerações da ervilha <strong>de</strong> jardim.<br />

Men<strong>de</strong>l, contemporâneo <strong>de</strong> Darwin, teve acesso a uma versão em alemão do seu<br />

livro “Origem das Espécies”, e Darwin, por sua vez teve um livro <strong>de</strong> Focke que fazia referência<br />

aos trabalhos <strong>de</strong> Men<strong>de</strong>l. Apesar disso, somente a partir <strong>de</strong> 1930 estabeleceu-se a Teoria<br />

Sintética da Evolução, com a contribuição dos conhecimentos dos genes e das Leis <strong>de</strong> Men<strong>de</strong>l<br />

sobre hereditarieda<strong>de</strong> para a Teoria Evolucionista, por conta do estabelecimento dos princípios<br />

da genética <strong>de</strong> populações. Pelo fato <strong>de</strong> Darwin consi<strong>de</strong>rar a hereditarieda<strong>de</strong> como um<br />

problema a ser resolvido por meio <strong>de</strong> estudos sobre embriologia, o contato com os resultados<br />

dos trabalhos <strong>de</strong> Men<strong>de</strong>l não foram consi<strong>de</strong>rados significativos para complementar a Teoria<br />

Evolucionista na época. Do mesmo modo, como Men<strong>de</strong>l consi<strong>de</strong>rou seus resultados como um<br />

caso particular, não po<strong>de</strong> relacioná-los com a variabilida<strong>de</strong> intra e interespecífica que Darwin<br />

observou nas populações naturais. Somente após a i<strong>de</strong>ntificação do DNA como o material<br />

responsável pela hereditarieda<strong>de</strong>, na década <strong>de</strong> quarenta, a proposta do mo<strong>de</strong>lo da estrutura<br />

molecular do DNA, em 1953, e o esclarecimento do seu mecanismo <strong>de</strong> duplicação e<br />

transmissão através das gerações a partir <strong>de</strong> 1958, a hereditarieda<strong>de</strong> passou a ser compreendida<br />

como a reprodução bem sucedida <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s replicadoras através das gerações, sendo que a<br />

unida<strong>de</strong> replicadora é o DNA. A cada manhã, quando o forno da padaria faz crescer, assar e<br />

tostar nosso pão, juntamente com o fermento e as farinhas, na massa estão presentes os genes<br />

que se estabeleceram pela seleção natural e pela ação seletiva do homem.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Referências Bibliográficas<br />

Artigo Original: GENÉTICA: o pão nosso <strong>de</strong> cada dia<br />

Bowler, P. J., 1989.The Men<strong>de</strong>lian Revolution: The Emergence of Hereditarian Concepts in<br />

Mo<strong>de</strong>rn Science and Society. Baltimore: Johns Hopkins University Press.<br />

Downes, S. M., 2007. Heredity and Heritability,.The Stanford Encyclopedia of Philosophy<br />

(Fall 2007 Edition), Edward N. Zalta (ed.)<br />

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Polizello, A. O <strong>de</strong>senvolvimento das i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> herança <strong>de</strong> Francis Galton: 1865 - 1897. Filosofia<br />

e História da Biologia, v. 6, n. 1, p. 1-17, 2011<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: GENÉTICA: o pão nosso <strong>de</strong> cada dia<br />

Portin P. 2002. Historical <strong>de</strong>velopment of the concept of the gene. J Med Philos 27(3):257-86.<br />

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Translated from the German by C. Stuart Gager. On-line Facsimile Edition: Electronic<br />

Scholarly Publishing. Prepared by Robert Robbins.<br />

Watson, JD & Crick, FHC. Molecular Structure of Nucleic Acids. Nature, 25: 737-738, 1953.<br />

Profa. Dra. Mirna Duarte Barros<br />

Bióloga<br />

Chefe do Departamento <strong>de</strong> Morfologia da<br />

Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências Médicas da Santa Casa <strong>de</strong> São Paulo<br />

Sócia da <strong>Socieda<strong>de</strong></strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong><br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original<br />

A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO<br />

UNIVERSITÁRIA NO ENSINO DE ANATOMIA HUMANA<br />

Josemberg da Silva Baptista 1 , An<strong>de</strong>rson Scardua 2 , Givanilson Brito <strong>de</strong> Oliveira 3 , Renner <strong>de</strong> Souza<br />

Leite 3 , Carlos Eduardo Seyfert 4 , Patrícia Marega 4<br />

1 Departamento <strong>de</strong> Morfologia, Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Espírito Santo; 2 Centro <strong>de</strong> Ciências Biológicas e da Saú<strong>de</strong>,<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Campina Gran<strong>de</strong>; 3 Centro <strong>de</strong> Educação e Saú<strong>de</strong>, Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Campina Gran<strong>de</strong>; 4 Centro<br />

<strong>de</strong> Formação <strong>de</strong> Professores, Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Campina Gran<strong>de</strong><br />

RESUMO<br />

Este artigo <strong>de</strong>screve a experiência dos processos públicos para construção do<br />

laboratório <strong>de</strong> anatomia humana, e do ensino da referida disciplina para cursos <strong>de</strong> graduação da<br />

área biomédica campus <strong>de</strong> expansão universitária subsidiado pelo Programa <strong>de</strong> Reestruturação e<br />

Expansão das Universida<strong>de</strong>s Fe<strong>de</strong>rais no Brasil – REUNI. Foi dada especial atenção a todo<br />

histórico da instituição com vistas nesta disciplina, a aquisição <strong>de</strong> recursos humanos, <strong>de</strong><br />

infraestrutura e materiais para o funcionamento das aulas. Também são discutidos quais são os<br />

impactos sobre o processo <strong>de</strong> ensino-aprendizagem nesta situação, métodos para contornar as<br />

dificulda<strong>de</strong>s pedagógicas encontradas, e sugestões para solução <strong>de</strong> problemas neste âmbito, já que<br />

o programa REUNI ainda está em vigor até 2014.<br />

Palavras-chave: Políticas públicas, expansão universitária, ensino <strong>de</strong> anatomia, construção <strong>de</strong><br />

laboratório.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO UNIVERSITÁRIA NO<br />

INTRODUÇÃO<br />

ENSINO DE ANATOMIA HUMANA<br />

Na última década as Instituições Fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong> Ensino Superior no Brasil (IFES)<br />

elaboraram planos <strong>de</strong> expansão universitária subsidiados pelo Programa <strong>de</strong> Expansão do Ensino<br />

Superior do Ministério da Educação e, principalmente, através do programa <strong>de</strong> Reestruturação<br />

e Expansão das Universida<strong>de</strong>s Fe<strong>de</strong>rais (REUNI), o qual foi instituído através do <strong>de</strong>creto n o<br />

6.096, <strong>de</strong> 24 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2007. Este programa tem como meta geral ampliar o acesso e a<br />

permanência em cursos <strong>de</strong> graduação, aumentando a taxa <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> cursos da graduação<br />

numa média <strong>de</strong> 90%. Além disso, todo o subsídio financeiro requisitado pelas IFES, seja ele<br />

para suprir <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> infraestrutura, <strong>de</strong> bens e serviços, ou <strong>de</strong> pessoal, será provi<strong>de</strong>nciado<br />

pelo governo fe<strong>de</strong>ral após a aprovação do plano <strong>de</strong> reestruturação ou expansão apresentado<br />

pela IFES ao Ministério da Educação e Cultura (MEC).<br />

Contempla-se assim que haja um aumento no número <strong>de</strong> vagas nos cursos <strong>de</strong><br />

graduação, sobretudo no período noturno, que ocorram inovações pedagógicas, e que o ensino<br />

seja interiorizado para dar acesso <strong>de</strong>mocrático à educação superior. Desta maneira, muitos<br />

municípios no interior do país foram contemplados por tais medidas, o que aumentou a oferta<br />

<strong>de</strong> cursos superiores, além da contratação efetiva <strong>de</strong> novos docentes e técnicos por meio <strong>de</strong><br />

concurso público nestas regiões.<br />

No caso da criação <strong>de</strong> cursos biomédicos, o currículo básico exige a disciplina <strong>de</strong><br />

anatomia humana por se tratar <strong>de</strong> uma disciplina normativa e <strong>de</strong> relevância notória<br />

(MEC/SESu, 2010). O processo <strong>de</strong> ensino-aprendizagem da disciplina em questão mostra-se<br />

complexo, uma vez que é gran<strong>de</strong> a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conceitos e estruturas a serem assimiladas<br />

pelos estudantes. Para tanto, a predominância <strong>de</strong> aulas práticas em laboratório aproxima e<br />

familiariza o estudante com as estruturas a serem estudadas, e dá a ele subsídio <strong>de</strong> leitura e<br />

interpretação das <strong>de</strong>nominações auxiliando na construção do raciocínio e na consolidação do<br />

aprendizado (Aversi-Ferreira et al., 2009).<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO UNIVERSITÁRIA NO<br />

ENSINO DE ANATOMIA HUMANA<br />

Esta expansão do ensino superior no atual momento histórico do Brasil tem<br />

apresentado vários problemas que são conhecidos e comentados por diversos docentes do<br />

ensino superior. Contudo, este <strong>de</strong>bate costuma ser restrito às conversas nos ambientes <strong>de</strong><br />

trabalho e em alguns casos como ponto <strong>de</strong> pauta <strong>de</strong> reivindicação <strong>de</strong> melhores condições <strong>de</strong><br />

trabalho, no sentido amplo, <strong>de</strong> categorias funcionais organizadas. Neste sentido, um dos<br />

objetivos <strong>de</strong>ste trabalho é chamar a atenção <strong>de</strong>sta problemática enquanto uma questão<br />

acadêmica que afeta as diversas atuações da universida<strong>de</strong> (Extensão, Ensino e Pesquisa). Assim,<br />

buscamos fomentar uma discussão que engloba os posicionamentos frente às necessida<strong>de</strong> e<br />

soluções didáticas enfrentadas pelos docentes no atual contexto <strong>de</strong> expansão do ensino superior<br />

brasileiro.<br />

Portanto, partindo-se das premissas do programa REUNI, e das peculiarida<strong>de</strong>s<br />

impelidas às IFES pelo Governo Fe<strong>de</strong>ral, preten<strong>de</strong>-se aqui relatar situações e adaptações<br />

ocorridas para com a disciplina <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong> Humana no Centro <strong>de</strong> Educação e Saú<strong>de</strong> (CES)<br />

da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Campina Gran<strong>de</strong> (UFCG), e também discutir e propor outras<br />

soluções com relação ao processo <strong>de</strong> implantação <strong>de</strong> laboratórios <strong>de</strong> ensino baseando-se<br />

principalmente em documentos públicos oficiais e na experiência <strong>de</strong> docentes e técnicos <strong>de</strong><br />

laboratório.<br />

DESCRIÇÃO<br />

Atualmente os Anatomistas discutem nas socieda<strong>de</strong>s da classe, encontros,<br />

simpósios, congressos, e trabalhos científicos publicados em periódicos específicos da área as<br />

metodologias aplicadas em aulas teóricas, nas aulas práticas, seja com ou sem manipulação <strong>de</strong><br />

peças cadavéricas, e na utilização da infraestrutura mais a<strong>de</strong>quada e eficaz aos laboratórios <strong>de</strong><br />

<strong>Anatomia</strong> Humana (Goldman, 2010; Sguissardi, 2008; Nunes, 2007). Sendo assim, é evi<strong>de</strong>nte<br />

que existem algumas peculiarida<strong>de</strong>s na execução <strong>de</strong> aulas práticas em laboratórios <strong>de</strong> anatomia<br />

humana.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO UNIVERSITÁRIA NO ENSINO DE<br />

ANATOMIA HUMANA<br />

Mundialmente conhecida é a diminuição progressiva da oferta <strong>de</strong> cadáveres<br />

humanos não reclamados, o que ainda é a principal fonte <strong>de</strong> aquisição <strong>de</strong> peças anatômicas no<br />

Brasil, oficialmente legislada pela Lei Fe<strong>de</strong>ral 8.501 <strong>de</strong> 1992. Nesse sentido, as políticas <strong>de</strong><br />

expansão universitária geraram aumento na <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> material anatômico em <strong>de</strong>corrência do<br />

surgimento <strong>de</strong> novas instituições <strong>de</strong> ensino superior. Fatores emocionais, religiosos, culturais, e<br />

informativos acerca do tema influenciam diretamente na doação voluntária <strong>de</strong> corpos, ou<br />

mesmo <strong>de</strong> cadáveres não reclamados pelos Serviços <strong>de</strong> Verificação <strong>de</strong> Óbito. Vários países<br />

<strong>de</strong>senvolvidos já lidam com esta questão também. Sendo assim, estes lançam campanhas e<br />

programas <strong>de</strong> doação voluntária do corpo, seja em vida ou após falecimento (sendo tomada<br />

<strong>de</strong>cisão pelos familiares), em direção às instituições <strong>de</strong> educação superior e <strong>de</strong> pesquisa. Para<br />

citar exemplos <strong>de</strong> pioneirismo no Brasil temos a Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Minas Gerais<br />

(UFMG) e a Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Ciências da Saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> Porto Alegre (UFCSPA) que<br />

possuem programas <strong>de</strong> doação <strong>de</strong> cadáveres que já geraram aquisição <strong>de</strong> material anatômico<br />

para estas instituições, baseando-se principalmente na conscientização e instrução sobre a<br />

importância do ato. Neste ínterim, a sugestão <strong>de</strong> se criar uma diretriz nacional <strong>de</strong> divulgação<br />

sobre o processo <strong>de</strong> doação <strong>de</strong> cadáveres, assim como é feita sobre a doação <strong>de</strong> órgãos em caso<br />

<strong>de</strong> morte cerebral, po<strong>de</strong>ria ser interessante para alavancar esta prática. O esclarecimento e<br />

<strong>de</strong>bate sobre o uso <strong>de</strong> cadáveres para fins acadêmicos junto à socieda<strong>de</strong> civil e jurídica <strong>de</strong> cada<br />

país são fundamentais. Esta prática certamente ajudará a aumentar o número <strong>de</strong> doadores e<br />

fomentar projetos melhor arquitetados para tal prática. Isto se justifica pois a maior parte dos<br />

professores <strong>de</strong> anatomia humana do Brasil sustenta a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que as aulas práticas com peças<br />

cadavéricas sejam extremamente necessárias para o êxito na aprendizagem dos alunos, e o uso<br />

<strong>de</strong>sse conhecimento em seu cotidiano profissional.<br />

Ainda sim soma-se a esta problemática o in<strong>de</strong>vido planejamento e infraestrutura<br />

para aulas e acondicionamento <strong>de</strong> material nas IFES expandidas, além <strong>de</strong> recursos humanos<br />

necessários para <strong>de</strong>sempenhar tal trabalho. Neste ponto existe um entrave burocrático oriundo<br />

da política <strong>de</strong> licitações para aquisição e fiscalização <strong>de</strong> materiais e construção dos prédios que<br />

<strong>de</strong>mandam tempo, e corriqueiramente geram atrasos (Nunes, 2007), influenciando<br />

negativamente na formação dos estudantes. Estes aspectos se tornam mais alarmantes quando se<br />

observa que um dos principais objetivos do programa REUNI é a <strong>de</strong> subsidiar a maior parte da<br />

expansão universitária para cida<strong>de</strong>s pequenas localizadas no interior do país, o que<br />

verda<strong>de</strong>iramente sofrem com menos oferta <strong>de</strong> serviços, <strong>de</strong> recursos econômicos, <strong>de</strong> transporte e<br />

<strong>de</strong> infraestrutura pública em geral.<br />

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Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO<br />

UNIVERSITÁRIA NO ENSINO DE ANATOMIA HUMANA<br />

No caso do CES/UFCG, as aulas <strong>de</strong> anatomia humana datam <strong>de</strong> 2006,<br />

coincidindo com o início do funcionamento do curso <strong>de</strong> Licenciatura em Biologia no turno<br />

diurno, e posteriormente também no turno noturno. Nesta ocasião o centro não dispunha <strong>de</strong><br />

laboratórios apropriados, mo<strong>de</strong>los anatômicos, ou peças cadavéricas para realização <strong>de</strong> aulas<br />

práticas. Até o segundo semestre <strong>de</strong> 2008 as aulas eram ministradas por professores substitutos,<br />

contratados temporariamente, sem titulação na área, e que realizavam suas ativida<strong>de</strong>s<br />

fundamentalmente <strong>de</strong> forma teórica.<br />

Em 2007 foram implantados os cursos <strong>de</strong> enfermagem e farmácia no período<br />

diurno (integral), tornando necessário em caráter <strong>de</strong> urgência a fundação do edifício <strong>de</strong>stinado<br />

ao laboratório <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong> Humana (somente iniciada em 2008), bem como aquisição <strong>de</strong><br />

material anatômico e finalmente a contratação <strong>de</strong> corpo docente efetivo e qualificado. No<br />

segundo semestre <strong>de</strong> 2008, o CES, por meio <strong>de</strong> concurso público, contrata o primeiro professor<br />

e técnico efetivo da referida disciplina. No primeiro semestre <strong>de</strong> 2009 foi implantado o curso <strong>de</strong><br />

nutrição no período noturno, o que também faz parte da política da expansão universitária no<br />

Brasil, já que os cursos superiores neste período do dia têm específica função <strong>de</strong> inclusão social<br />

daqueles que possuem vínculo empregatício diurno.<br />

Em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> a obra permanecer inacabada, e a <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> aulas práticas<br />

aumentarem com a inclusão dos novos cursos, são utilizados <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a fundação do centro os<br />

laboratórios <strong>de</strong> anatomia do Centro <strong>de</strong> Ciências Biológicas e da Saú<strong>de</strong> (CCBS, Campina<br />

Gran<strong>de</strong>-PB) campus central da UFCG, localizado aproximadamente a 120 km do CES.<br />

Excursões esporádicas e extremamente cansativas utilizando o transporte institucional são<br />

realizadas com os 160 alunos regulares que cursam a disciplina <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong> Humana, <strong>de</strong><br />

acordo com a disponibilida<strong>de</strong> do CCBS, para apreciação da aula durante todo dia em<br />

<strong>de</strong>trimento das outras disciplinas. No período noturno o CCBS não se encontra em expediente,<br />

o que condiciona os alunos <strong>de</strong>ste turno a assistirem as aulas práticas <strong>de</strong> anatomia no período<br />

diurno. Isso configura um gran<strong>de</strong> problema, visto que uma das metas do Reuni é a <strong>de</strong> ampliar a<br />

oferta <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> graduação no período noturnos para ocorrer o aproveitamento da<br />

infraestrutura, e para contemplar aqueles que exercem ativida<strong>de</strong>s empregatícias durante o dia.<br />

No entanto as edificações <strong>de</strong>stinadas ao laboratório <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong> foram<br />

inauguradas em novembro <strong>de</strong> 2009, porém, não concluídas. Este tipo <strong>de</strong> ação aparenta ser um<br />

reflexo da promoção política <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados segmentos da universida<strong>de</strong>, e indiretamente do<br />

governo, pois geram números para o plano <strong>de</strong> expansão universitária.<br />

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Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO<br />

UNIVERSITÁRIA NO ENSINO DE ANATOMIA HUMANA<br />

O resultado disto é a falta <strong>de</strong> condições para acondicionamento e manipulação<br />

<strong>de</strong> peças anatômicas, e ausência <strong>de</strong> materiais básicos para estudo em laboratório. No Brasil, as<br />

obras públicas são realizadas através <strong>de</strong> processos <strong>de</strong> licitação, on<strong>de</strong> uma empresa é contratada<br />

por apresentar o menor orçamento para o empreendimento o que, evi<strong>de</strong>ntemente, sem auxílio<br />

técnico específico, extremo planejamento, e fiscalização pela instituição, permite que estas<br />

mesmas empresas busquem “oportunida<strong>de</strong>s” <strong>de</strong>ntro dos projetos lançados, com um intuito <strong>de</strong><br />

obterem rentabilida<strong>de</strong> máxima. Em consequência <strong>de</strong>ssa prática, os laboratórios são concluídos<br />

com falhas na execução, uso <strong>de</strong> materiais <strong>de</strong> baixa qualida<strong>de</strong> e ina<strong>de</strong>quados, o que acarreta<br />

atraso e impossibilita a utilização dos mesmos. Prova disso está na falha para com a vedação das<br />

cubas para os cadáveres. Exatamente todas as cubas obtiveram vazamento e alguma infiltração<br />

nas pare<strong>de</strong>s do laboratório.<br />

O paradoxo que existe nessas práticas é que a primeira turma <strong>de</strong> biologia foi<br />

titulada em agosto <strong>de</strong> 2010 sem ao menos ter frequentado aulas práticas <strong>de</strong> anatomia no próprio<br />

centro no qual lhe conce<strong>de</strong>u o grau. Perante este aspecto, a expansão universitária que está<br />

ocorrendo no Brasil é <strong>de</strong>ficitária, mediante ao mau planejamento, pois ampliou-se a oferta <strong>de</strong><br />

curso superior sem a <strong>de</strong>vida aquisição <strong>de</strong> estrutura. Desta forma, gera-se um contrassenso, on<strong>de</strong><br />

há uma política que busca incluir mais indivíduos no ensino superior no Brasil, mas que terão<br />

uma formação <strong>de</strong>fasada, produzindo profissionais menos capacitados para se inserirem no<br />

mercado <strong>de</strong> trabalho, o que po<strong>de</strong> inclusive <strong>de</strong>ixá-los marginalizados <strong>de</strong>ste, mesmo sendo<br />

diplomados, o que corrobora com as i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> Sguissardi (2008) e <strong>de</strong> Scardua e Xavier Neto<br />

(2011).<br />

Por outro lado, este po<strong>de</strong> ser apenas o reflexo <strong>de</strong> uma política social utilizando-se<br />

do ensino superior e, consequentemente, elevando índices <strong>de</strong> instrução <strong>de</strong> 3º grau no país.<br />

Apesar disso, outras disciplinas dos <strong>de</strong>mais cursos da instituição e várias outras IFES que<br />

expandiram para o interior dos estados sofrem com esta política apontando que estes aspectos<br />

não são singulares ou <strong>de</strong> visões unilaterais.<br />

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Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO<br />

UNIVERSITÁRIA NO ENSINO DE ANATOMIA HUMANA<br />

Para superar as dificulda<strong>de</strong>s supracitadas, medidas didáticas têm sido tomadas no<br />

intuito <strong>de</strong> ampliar o conhecimento prático em anatomia humana. Sendo assim, a maioria <strong>de</strong>stas<br />

aulas é ministrada utilizando mo<strong>de</strong>los anatômicos (sintéticos), <strong>de</strong>ntro da sala <strong>de</strong> aula teórica.<br />

Apesar <strong>de</strong>stes mo<strong>de</strong>los auxiliarem o processo pedagógico, eles ainda não substituem a<br />

observação e manuseio das peças anatômicas cadavéricas, sobretudo para o curso <strong>de</strong><br />

enfermagem, em especial no CES (Aversi-Ferreira, 2009). Além disso, algumas práticas são<br />

realizadas com auxílio dos próprios estudantes, baseado em métodos <strong>de</strong> estudo da anatomia <strong>de</strong><br />

superfície, método palpatório <strong>de</strong> estruturas ósseas, musculatura superficial e exame das<br />

articulações, técnicas semiológicas e entre outras, o que têm em geral uma ótima aceitação pelos<br />

alunos. Além disso, a manufatura <strong>de</strong> maquetes contendo estratos musculares, do tegumento, do<br />

olho, e pôsteres contendo inervação e vascularização dos órgãos e regiões corporais também são<br />

utilizados com boa aceitação. No entanto estas ativida<strong>de</strong>s tomam gran<strong>de</strong> parte do tempo<br />

extraclasse dos discentes, que também precisam se <strong>de</strong>dicar a outras disciplinas e ativida<strong>de</strong>s<br />

acadêmicas, além <strong>de</strong> comprometer, no caso <strong>de</strong> alguns alunos, o <strong>de</strong>sempenho das ativida<strong>de</strong>s<br />

empregatícias fora do horário acadêmico.<br />

Como esta problemática é ponto comum para diversas IFES que possuem cursos<br />

<strong>de</strong> graduação na área da saú<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>-se sugerir como complemento ao aprendizado do aluno a<br />

utilização <strong>de</strong> meios eletrônicos para estudo sistematizado e orientado pelo professor, como atlas<br />

<strong>de</strong> anatomia interativos que possam ser aplicados a computadores portáteis, telefones móveis ou<br />

os novos tablets. É importante ratificar aqui que o interesse do aluno em utilizar estes<br />

dispositivos é gran<strong>de</strong> e, por vezes, esta medida po<strong>de</strong> se apresentar agradável à limitação existente<br />

<strong>de</strong> materiais e estrutura do laboratório <strong>de</strong> anatomia. Ainda como complemento po<strong>de</strong>-se sugerir<br />

o estudo domiciliar através da plataforma moodle <strong>de</strong> ensino, on<strong>de</strong> também sobre<br />

direcionamento e orientação do professor o aluno po<strong>de</strong> estudar, discutir, e interagir com outros<br />

colegas na formação do conhecimento anatômico sob um meio cibernético e não laboratorial.<br />

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Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO<br />

UNIVERSITÁRIA NO ENSINO DE ANATOMIA HUMANA<br />

Muito embora existam adaptações frente a este quadro acadêmico, sugestões a<br />

serem colocadas nas pautas <strong>de</strong>stas instituições em expansão <strong>de</strong>vem ser discutidas. Observando a<br />

política <strong>de</strong> expansão universitária, somada à disseminação <strong>de</strong> campus universitário para<br />

crescimento e <strong>de</strong>senvolvimento econômico e intelectual <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> menor expressão<br />

populacional, propõem-se aqui que o processo <strong>de</strong> licitação <strong>de</strong>ve ser em nível estadual. Explica-<br />

se esta proposta tendo em vista a facilida<strong>de</strong> para lidar com as licitações num âmbito estadual,<br />

principalmente do ponto <strong>de</strong> vista da fiscalização e autuação, a geração <strong>de</strong> receita para o estado e<br />

município, o abreviamento do pregão eletrônico <strong>de</strong> materiais e serviços, além <strong>de</strong> que a entrega<br />

po<strong>de</strong> ser agilizada. Mesmo no estado mais humil<strong>de</strong> do Brasil e, mesmo havendo a necessida<strong>de</strong><br />

dos comerciantes regionais buscarem certos materiais específicos fora do estado aumentando o<br />

seu custo, está prática fatalmente levará a um todo crescimento econômico, logístico e<br />

profissional da região; criam-se vários postos <strong>de</strong> trabalho, e em nichos interessantes para estas<br />

regiões em crescimento. Isto se torna importante porque a maior parte das licitações é<br />

conquistada por gran<strong>de</strong>s empresas da região su<strong>de</strong>ste, por oferecerem menor custo <strong>de</strong> execução<br />

da tarefa, on<strong>de</strong> necessariamente vai gerar todos os benefícios supracitados na região <strong>de</strong> sua<br />

localização, mas, com verba oriunda <strong>de</strong> IFES localizadas em outras regiões.<br />

A proposta para planejamento, a<strong>de</strong>quação, e aplicação <strong>de</strong> um projeto estrutural<br />

para um laboratório ou curso universitário <strong>de</strong>ve ser realizada por consultoria <strong>de</strong> docentes da<br />

área oriundos <strong>de</strong> outras IFES on<strong>de</strong> exista estrutura similar já concluída. Esta prática <strong>de</strong><br />

consultoria já existe, a caráter <strong>de</strong> exemplo, quando um grupo <strong>de</strong> docentes é escalado para avaliar<br />

e pontuar os cursos que pe<strong>de</strong>m autorização do MEC para iniciar ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> graduação. Por<br />

outro lado, outra interessante proposta seria <strong>de</strong> contratar docentes através <strong>de</strong> concurso público,<br />

e das diversas áreas do curso <strong>de</strong> graduação, para aten<strong>de</strong>rem a <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> planejamento,<br />

projeto e execução. Sendo assim, a implantação <strong>de</strong> qualquer curso <strong>de</strong> graduação, seja numa<br />

IFES ou numa instituição privada <strong>de</strong>verá se iniciar com um mínimo <strong>de</strong> recursos humanos,<br />

materiais didáticos e permanentes bem próximo do i<strong>de</strong>al para capacitação final <strong>de</strong> um<br />

profissional <strong>de</strong> terceiro grau.<br />

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Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO UNIVERSITÁRIA NO ENSINO DE ANATOMIA<br />

HUMANA<br />

Contudo, retornando ao nosso caso específico, somente em março <strong>de</strong> 2012 é que<br />

houve material cadavérico apropriado para se começar a diminuir as excursões ao<br />

CCBS/UFCG, o que já havia se tornando com o passar do tempo uma prática insustentável e<br />

onerosa para a instituição e alunos, além <strong>de</strong> ampliar enormemente a carga horária dos<br />

professores da disciplina. A propósito isso subtraiu, por bastante tempo, a <strong>de</strong>dicação <strong>de</strong>stes<br />

profissionais para com os projetos <strong>de</strong> extensão e <strong>de</strong> pesquisa, o que faz parte da filosofia<br />

acadêmica das instituições <strong>de</strong> ensino superior brasileira (ensino-pesquisa-extensão).<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

As Universida<strong>de</strong>s Fe<strong>de</strong>rais brasileiras historicamente formam profissionais <strong>de</strong><br />

excelência, pois observa-se boa qualida<strong>de</strong> docente, discente e uma infraestrutura que propicia e<br />

estimula estes resultados. Com o advento da expansão universitária ampliam-se as<br />

oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acesso, porém, atualmente, com dúvidas sobre a qualida<strong>de</strong> que a prece<strong>de</strong>.<br />

Sendo assim, é importante estimular a comunida<strong>de</strong> acadêmica da área biomédica no sentido <strong>de</strong><br />

suscitar discussões e ações sobre temas como:<br />

• Planejamento e criação <strong>de</strong> instituições públicas <strong>de</strong> ensino;<br />

• O impacto da expansão universitária sobre o ensino da anatomia humana, e <strong>de</strong> outras<br />

ciências que são predominantemente práticas;<br />

• Os processos <strong>de</strong> licitação e execução <strong>de</strong> obras públicas <strong>de</strong>stinadas ao ensino;<br />

• A abordagem didática dos professores em instituições que vivenciam um processo <strong>de</strong><br />

implantação <strong>de</strong> novos cursos superiores, ou que pa<strong>de</strong>cem <strong>de</strong> materiais apropriados para o<br />

ensino <strong>de</strong> anatomia humana;<br />

• Formação <strong>de</strong> profissionais em falta <strong>de</strong> condições <strong>de</strong> ensino-aprendizagem não apenas<br />

a<strong>de</strong>quadas, mas necessárias para a formação <strong>de</strong> um profissional apto a correspon<strong>de</strong>r e<br />

atuar <strong>de</strong> acordo com as exigências <strong>de</strong> sua profissão e as necessida<strong>de</strong>s da socieda<strong>de</strong> e;<br />

• A postura a<strong>de</strong>quada para enfrentar essa situação.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO<br />

Referências Bibliográficas<br />

UNIVERSITÁRIA NO ENSINO DE ANATOMIA HUMANA<br />

BRASIL. Decreto n 6.096, <strong>de</strong> 24 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2007. Institui o Programa <strong>de</strong> Apoio a Planos <strong>de</strong><br />

Reestruturação e Expansão das Universida<strong>de</strong>s Fe<strong>de</strong>rais – REUNI.<br />

BRASIL. Referências Curriculares Nacionais dos Cursos <strong>de</strong> Bacharelado e Licenciatura.<br />

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Goldman, E. Building a low-cost gross anatomy laboratory: A big step for a small university.<br />

Anat Sci Educ. v.3, 195-201, 2010.<br />

Scardua, A.; Xavier Neto, L.P. A inclusão exclu<strong>de</strong>nte: reflexões sobre a expansão universitária<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo Original: A INFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS BRASILEIRAS DE EXPANSÃO<br />

UNIVERSITÁRIA NO ENSINO DE ANATOMIA HUMANA<br />

Prof. Me. Josemberg da Silva Baptista<br />

Fisioterapêuta<br />

Sócio da <strong>Socieda<strong>de</strong></strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong><br />

Professor Assistente <strong>de</strong> <strong>Anatomia</strong> Humana<br />

Departamento <strong>de</strong> Morfologia<br />

Centro <strong>de</strong> Ciências da Saú<strong>de</strong> - CCS<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Espírito Santo-UFES<br />

Av. Maruípe, 1468, 29.043-900, Vitória/ES<br />

Fonefax: 27 3335-7358<br />

Email: josemberg.baptista@ufes.br<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo <strong>de</strong> Revisão<br />

Resumo<br />

Nervo facial: uma revisão focada em sua divisão parassimpática<br />

Ignatz Rohrbacher<br />

Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Medicina da Universida<strong>de</strong> Positivo<br />

Objetivo: O objetivo <strong>de</strong>ste trabalho foi revisar livros e artigos científicos referentes principalmente<br />

à anatomia do nervo facial e sua divisão parassimpática.<br />

Métodos: Foram analisados artigos na língua inglesa in<strong>de</strong>xados ao PubMed e PICO PubMed<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1968 até maio <strong>de</strong> 2009 e livros <strong>de</strong> anatomia e neuroanatomia. Buscou-se<br />

comparar os resultados obtidos e construir um resumo com as principais partes e particularida<strong>de</strong>s<br />

do nervo e seus ramos.<br />

Resultados: O nervo facial é complexo e possui uma trajetória igualmente complexa. Seus ramos<br />

parassimpáticos e sensitivos percorrem um gran<strong>de</strong> percurso e atravessam diversas estruturas para<br />

atingir seu <strong>de</strong>stino. Sua função vai muito além <strong>de</strong> inervar os músculos da face, uma vez que os<br />

componentes sensitivo e parassimpático atuam na gustação, sensibilida<strong>de</strong> do meato acústico<br />

externo, inervação das mucosas nasais, faríngeas, palato e atua diretamente na produção <strong>de</strong> saliva<br />

e lágrimas inervando os gânglios pterigopalatino e submandibular.<br />

Conclusão: Os dados obtidos foram suficientes para se obter uma i<strong>de</strong>ia dos ramos e percursos do<br />

nervo facial e seus ramos sensitivos e parassimpáticos. As informações anatômicas obtidas nos<br />

artigos científicos mostraram sempre um diferencial em relação aos livros, sendo mais precisas e<br />

objetivas.<br />

Palavras-chave: Nervo facial, gânglio geniculado, nervo intermédio, nervo petroso maior, nervo<br />

petroso profundo, nervo do canal pterigói<strong>de</strong>o, canal pterigói<strong>de</strong>o.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

Nervo facial<br />

O nervo facial, formado pela raiz motora somática e nervo intermédio, é<br />

composto por fibras aferentes somáticas, aferentes viscerais, aferentes viscerais especiais, fibras<br />

eferentes viscerais gerais e eferentes viscerais especiais. 1,2 A maior raiz é a raiz motora, e a<br />

menor, que está entre a motoras e o nervo acústico, é o nervo intermédio (nervo <strong>de</strong> Wrisberg).<br />

A origem superficial <strong>de</strong> ambas as raízes situa-se na borda inferior da ponte, no sulco<br />

bulbopontino, estando a raiz motora medial, o nervo vestibulococlear lateral e o nervo<br />

intermédio situando-se entre eles. 1,2,3<br />

Núcleos<br />

São diversos núcleos relacionados ao nervo facial e seus ramos. As fibras<br />

aferentes somáticas tem sua terminação no núcleo espinal do trigêmio. As fibras aferentes<br />

viscerais tem sua terminação no núcleo salivatório superior do bulbo. As fibras aferentes<br />

viscerais especiais tem seu núcleo na parte gustatória do núcleo do trato solitário do bulbo. As<br />

fibras eferentes viscerais gerais, que são as fibras autônomas, originam-se do núcleo salivatório<br />

superior. 2,3,4<br />

O núcleo do nervo facial é o maior núcleo <strong>de</strong>ntre os núcleos motores e está<br />

situado no tegmento da ponte 5 . Nele originam-se fibras que se esten<strong>de</strong>m póstero-medialmente<br />

e, em seguida, esten<strong>de</strong>m-se superiormente no tegmento para formar um feixe compacto<br />

próximo ao núcleo do nervo abducente no assoalho do quarto ventrículo, chamado <strong>de</strong> colículo<br />

facial 5,6 . Apenas as fibras eferentes viscerais especiais se curvam lateralmente para formar este<br />

joelho interno e <strong>de</strong>pois esten<strong>de</strong>rem-se ântero-lateralmente para e emergir na margem lateral da<br />

ponte 2 . As <strong>de</strong>mais fibras formam uma raíz lateral separada do nervo facial, o nervo intemédio 2 .<br />

O núcleo do nervo facial é dividido em subnúcleos, que estão relacionados a músculos faciais<br />

específicos.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

São eles os subnúcleos medial, posterior, intermédio e lateral. Os neurônios<br />

superiores que inervam os músculos superiores da face localizam-se na parte posterior do<br />

núcleo, os que inervam os músculos inferiores da face situam-se principamente na parte lateral<br />

do núcleo, e os que inervam o platisma e o músculo auricular posterior estão na parte medial do<br />

núcleo. 1,2<br />

Emergência do Tronco<br />

De sua origem superficial no sulco bulbopontino as duas raízes passam em<br />

direção lateral junto do nervo vestibulococlear, cruzam o espaço subaracnoi<strong>de</strong>o e penetram no<br />

meato acústico interno. No fundo do meato o nervo intermédio separa-se do vestibulococlear,<br />

mas continua junto do facial. Eles penetram na substância da porção petrosa do osso temporal e<br />

percorre um trajeto tortuoso <strong>de</strong> um canal próprio, o canal facial. 1,2,7 Eles continuam, no início,<br />

em direção lateral na região entre a cóclea e os canais semicirculares. Quando estão próximo da<br />

cavida<strong>de</strong> timpânica apenas o nervo facial faz uma curva abrupta posteriormente, corre na pare<strong>de</strong><br />

medial da cavida<strong>de</strong> logo acima da janela oval, on<strong>de</strong> está coberto na maioria das vezes por fina<br />

lâmina <strong>de</strong> osso que faz ligeira proeminência na pare<strong>de</strong>, e <strong>de</strong>pois aprofunda-se em direção às<br />

células aéreas mastói<strong>de</strong>as para alcançar o forame estilomastói<strong>de</strong>o. 1,10 Essa mudança abrupta <strong>de</strong><br />

trajeto forma uma estrutura chamada <strong>de</strong> joelho e, próximo a esse ponto, as duas raíses se<br />

fun<strong>de</strong>m e formam uma estrutura chamada <strong>de</strong> gânglio geniculado. O nervo intermedio fica<br />

a<strong>de</strong>rido ao nervo vestibulococlear por uma distância variável até chegar ao gânglio geniculado. 8,9<br />

Assim que emerge do forame estilomastoi<strong>de</strong>o, o nervo facial corre anteriormente na substância<br />

da glândula parótida, cruza a artéria carótida externa e divi<strong>de</strong>-se na borda posterior do ramo da<br />

mandíbula em dois ramos primários: um superior, o temporofacial, e um inferior, o<br />

cervicofacial. A partir do cervicofacial distribuem-se muitos pequenos ramos, em uma<br />

disposição plexiforme chamada <strong>de</strong> plexo parotí<strong>de</strong>o, que se dirigem para o crânio, face e porção<br />

superior do pescoço, suprindo os músculos superficiais <strong>de</strong>stas regiões. 1,2,3<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

Fibras Nervosas<br />

As fibras aferentes somáticas, fibras exteroceptivas ou fibras dolorosas, são<br />

processos periféricos <strong>de</strong> neurônios que têm origem nas células do gânglio geniculado, são<br />

poucas e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> partirem do gânglio unem-se ao ramo auricular do nervo vago para suprir<br />

uma pequena parte pele do meato acústivo externo, mastói<strong>de</strong> e face externa da membrana<br />

timpânica. Este nervo possivelmente suplementa o nervo mandibular com a sensibilida<strong>de</strong> da<br />

pare<strong>de</strong> do meato acústico externo e superfície externa da membrana timpânica. 7 Sua terminação<br />

central é o núcleo espinal do nervo trigêmio, seguindo provavelmente no trato espinal do nervo<br />

trigêmio. 1,2,7,8,9<br />

As fibras aferentes viscerais suprem a membrana mucosa da faringe, nariz e<br />

palato através do nervo petroso maior. Elas se originam <strong>de</strong> células do gânglio geniculado e<br />

unem-se ao trato solitário no bulbo. 1 As fibras aferentes viscerais especiais, fibras gustatórias,<br />

também presentes no nervo petroso maior, são responsaveis pela gustação na borda lateral dos<br />

dois terços posteriores da língua, do palato duro e mole. 7 Elas têm origem em células do gânglio<br />

geniculado e os processos periféricos <strong>de</strong>sses neurônios chegam aos calículos gustatórios situados<br />

nos dois terços anteriores da língua e palato. Os processos centrais a<strong>de</strong>ntram o tronco encefálico<br />

com o nervo intermédio e projetam-se para os neurônios situados na parte gustatória do núcleo<br />

do trato solitário, juntamente com fibras dos nervos glossofaríngeo e vago. Existem conexões<br />

com o núcleo salivatório, o núcleo ambíguo, o núcleo do hipoglosso, o núcleo dorsal do vago e<br />

com a medula espinhal através do tracto reticuloespinhal. 1,2,4,11 O gosto é diferenciado como<br />

uma modalida<strong>de</strong> especial por ser mediado por orgãos receptores cranianos especializados, os<br />

botões gustatórios, e não diretamente pelas terminações nervosas. 11<br />

As fibras eferentes viscerais gerais, fibras autônomas, originam-se do núcleo<br />

salivatório superior. Os axônios <strong>de</strong>stas fibras parassimpáticas pré-ganglionares reúnem-se no<br />

nervo intermédio, que as distribui para os gânglio submandibular e pterigopalatino. O gânglio<br />

submandibular é inervado pelo nervo corda do tímpano e então envia fibras para as glândulas<br />

submandibular e sublingual. O gânglio pterigopalatino é inervado pelo nervo petroso maior,<br />

agora chamado <strong>de</strong> nervo vidiano, e então envia fibras para as glândulas lacrimais e glândulas da<br />

mucosa nasal e palatina. 1,2,3,8<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

As fibras eferentes viscerais especiais suprem os músculos estriados da expressão<br />

facial. O núcleo motor do nervo facial, situado na formação reticular da ponte, é serialmente<br />

homólogo ao núcleo ambíguo e à porção lateral do corno ventral da medula espinhal. As células<br />

multipolares motoras que inervam a porção inferior da face recebem conexões do sistema<br />

piramidal aberrante que é inteiramente cruzado. Aquelas para a porção superior da face são<br />

tanto cruzadas como não cruzadas. Conexões reflexas são formadas com o núcleo do tracto<br />

espinhal do trigêmio, com os núcleos cocleares e com numerosos outros núcleos e mecanismos<br />

na formação reticular da medula oblonga e ponte, algumas <strong>de</strong>las relacionadas com a expressão<br />

emocional. 1,2<br />

Gânglio Geniculado<br />

O nervo facial e o intermédio saem juntos do tronco encefálico, atravessam o<br />

meato acústico interno e penetram no canal facial na parte petrosa do osso temporal até o<br />

gânglio geniculado. O gânglio geniculado é uma pequena saliência fusiforme do joelho, on<strong>de</strong> o<br />

nervo facial se volta abruptamente para trás, no hiato do canal facial. 1,2,7<br />

É o gânglio sensitivo do nervo facial. Os prolongamentos centrais <strong>de</strong> suas células<br />

ganglionares pseudo-unipolares alcançam o tronco cerebral através do nervo intermédio. A<br />

maioria dos prolongamentos periféricos dirige-se aos calículos gustatórios dos dois terços<br />

anteriores da língua através do nervo corda do tímpano e nervo lingual. Um número<br />

consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> prolongamentos periféricos passa através do nervo petroso maior para o palato<br />

mole e um número menor junta-se ao ramo auricular do vago para suprir a pele do meato<br />

acústico externo e processo mastói<strong>de</strong>. 1,2,3,5,8<br />

O gânglio é suprido predominantemente pela artéria perióstea, que surge da<br />

artéria meningea média e corre com o nervo petroso maior para suprir o gânglio geniculado e<br />

nervo facial. Ele está localizado posterolateral, diretamente posterior ou diretamente lateral ao<br />

genu da artéria carótida petrosa. O gânglio geniculado está geralmente separado do piso da fossa<br />

media por uma camada <strong>de</strong> osso. 10<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

Nervo Intermédio<br />

O nervo intermédio (nervo <strong>de</strong> Wrisberg), que é a parte intermédia do nervo<br />

facial contém as fibras aferentes somátivas, aferentes viscerais, aferentes viscerais especiais e<br />

eferentes viscerais gerais. 1,8 A distribuição periférica <strong>de</strong>ssas fibras, cujas células <strong>de</strong> origem<br />

formam o gânglio geniculado, ainda não é compreendida por completo, mas além das fibras<br />

distribuidas com os ramos motores e aquelas distribuidas para as papilas gustativas, há um<br />

pequeno componente cutâneo que inclui fibras da dor. 8<br />

O nervo intermédio, também chamado <strong>de</strong> nervo glossopalatino, é geralmente<br />

<strong>de</strong>scrito como um componente do nervo facial que separa-se da raiz motora no meato acústico<br />

interno para correr para o tronco cerebral entre o nervo facial e o vestibulococlear. 1,9 Ele po<strong>de</strong><br />

estar intimamente a<strong>de</strong>rido ao oitavo nervo por uma distância variada antes <strong>de</strong> entrar no tronco<br />

cerebral. Estudos em autópsias indicam que a a<strong>de</strong>rência do nervo intermédio com o nervo<br />

vestibular adjacente ao tronco cerebral é a regra e não a exceção e que neste tajeto o nervo po<strong>de</strong><br />

ligar-se <strong>de</strong> forma integral ou gradual ao oitavo nervo por meio <strong>de</strong> raizes. 9 As raízes po<strong>de</strong>m surgir<br />

ao longo <strong>de</strong> toda a face anterior do oitavo nervo, porém, elas costumam convergir<br />

imediatamente <strong>de</strong> maneira proximal à junção com a raíz motora do facial para formar um único<br />

feixe que corre anterior ao nervo vestibular superior. Multiplas raízes po<strong>de</strong>m ser i<strong>de</strong>ntificadas<br />

mais facilmente quando elas juntam-se à raíz motora do facial, on<strong>de</strong> ele corre anteriormente ao<br />

nervo vestibular superior. 9 A porção do nervo entre o tronco cerebral e o meato acústico interno<br />

é divisível em três partes: um segmento proximal que a<strong>de</strong>re-se intimamente como oitavo nervo,<br />

um segmento intermediáro que fica livre entre o oitavo nervo e a raiz motora do sétimo, e um<br />

segmento distal que une-se à raíz motora do sétimo para formar o nervo facial. 9<br />

Nervo Petroso Maior<br />

O nervo petroso maior é um nervo misto que contém fibras aferentes viscerais,<br />

provenientes na mucosa do palato e que seguem rumo ao núcleo salivatório superior, fibras<br />

aferentes viscerais especiais, responsáveis pela gustação dos dois terços anteriores da língua, que<br />

seguem rumo ao núcleo ao núcleo e trato solitário no tronco cerebral e estão unidas ao nervo<br />

intermédio, e fibras eferentes viscerais gerais, que fazem sinápse com o gânglio pterigopalatino e<br />

partem do núcleo salivatório superior. 4,6<br />

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Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

A massa do nervo consiste <strong>de</strong> fibras sensitivas que são os prolongamentos<br />

periféricos <strong>de</strong> células do gânglio geniculado e distribuem-se ao palato mole através dos nervos<br />

palatinos menores. 1,4 A parte proximal do nervo petroso maior está geralmente coberta por<br />

osso. O comprimento médio do nervo petroso maior coberto por osso antes <strong>de</strong> sair no hiato é<br />

<strong>de</strong> 3,7mm. 10 O nervo petroso maior geralmente corre acima do segmento horizontal da carótida<br />

petrosa e abaixo do gânglio trigeminal rumo ao canal pterigói<strong>de</strong>o. Como ele proce<strong>de</strong><br />

medialmente, ele vira para baixo ao longo da parte anterior do canal carotí<strong>de</strong>o para unir-se ao<br />

nervo petroso profundo. O comprimento do nervo petroso maior do gânglio geniculado até a<br />

abertura posterior do canal pterigói<strong>de</strong>o é em média 28,8mm 4 .<br />

. Ele separa-se do nervo intermédio, agora parte do nervo facial, no gânglio<br />

geniculado, sai através do osso no hiato do canal facial na fossa média e corre em direção rostral<br />

sob a dura-máter em uma direção anteromedial rumo ao gânglio trigeminal, passa<br />

superiormente à cartilagem da tuba auditiva que preenche o forame lacerado, cruza a face lateral<br />

da artéria carótida interna, e une-se ao o nervo petroso profundo para formar o nervo<br />

vidiano 1,4,12 . As fibras do nervo petroso maior inervam a glândula lacrima, mucosa nasal,<br />

palatina e da faringe. As fibras <strong>de</strong>stinadas à glândula lacrimal <strong>de</strong>ixam o nervo intermédio e<br />

esten<strong>de</strong>m-se pelo nervo petroso maior e nervo do canal pterigói<strong>de</strong>o antes <strong>de</strong> fazer sinapse no<br />

gânglio pterigopalatino, a partir do qual fibras pós-ganglionares esten<strong>de</strong>m-se pelos nervo maxilar,<br />

zigomático, zigomaticotemporal e lacrimal para chegar à glândula lacrimal 2,12 . Além disso, essas<br />

fibras também se dirigem para as glândulas mucosas da cavida<strong>de</strong> nasal, oral, palatina, uvular e<br />

labial superior 3 .<br />

Nervo Petroso Profundo<br />

O nervo petroso profundo é comumente chamado <strong>de</strong> raiz simpática do gânglio<br />

pterigopalatino, embora seja apenas uma comunicação entre o gânglio e o sistema simpático 1 . O<br />

nervo petroso profundo origina-se do plexo simpático carotí<strong>de</strong>o. As fibras do nervo carotí<strong>de</strong>o,<br />

ramo do gânglio cervical superior, viajam para baixo no nervus plexus pela artéria carótida<br />

interna e ramifica-se em duas partes: um tronco maior anterossuperior e um menor postero-<br />

inferior.<br />

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Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

O ramo posterior envia raízes que acompanham as artérias cerebrais e os<br />

nervos troclear e trigêmio. O ramo anterior dá origem ao nervo petroso profundo 4,10 . O nervo<br />

petroso profundo corre ao longo do aspecto anterior da parte petrosa da a. carótida interna<br />

por uma pequena distância antes <strong>de</strong> penetrar no periósteo do canal carotí<strong>de</strong>o e unir-se ao<br />

nervo petroso maior para formar o nervo do canal pterigói<strong>de</strong>o (vidiano) 4 . Ele passa através do<br />

gânglio pterigopalatino sem fazer sinapses e acompanha os ramos dos nervos<br />

pterigopalatinos para o seu <strong>de</strong>stino na membrana mucosa nasal e palato 1 .<br />

Nervo do Canal Pterigói<strong>de</strong>o<br />

O nervo do canal pterigói<strong>de</strong>o, também conhecido por n. vidiano, é formado<br />

pela união do nervo petroso maior e nervo petroso profundo no canal carotí<strong>de</strong>o, que então<br />

sai pela parte lateral da extremida<strong>de</strong> anterior do canal carotí<strong>de</strong>o, faz um curto percurso em<br />

baixo da dura e através da fossa média, passa ao longo da parte superior da borda<br />

anterolateral do forame lacerado, passa então através do tecido cartilaginoso na parte<br />

superior da margem anterolateral do forame lacerado, atravessa o canal pterigói<strong>de</strong>o e<br />

termina no gânglio pterigopalatino posicionado em frente da abertura anterior do canal e na<br />

parte posterior da fossa pterigopalatina 1,2,4 . Devido a união dos nervos petroso maior e<br />

profundo, o nervo do canal pterigói<strong>de</strong>o é composto por fibras aferentes viscerais, aferentes<br />

viscerais especiais, eferentes viscerais gerais, e simpáticas. As fibras eferentes viscerais gerais<br />

fazem sinapses no gânglio pterigopalatino, enquanto as fibras aferentes viscerais, aferentes<br />

viscerais especiais e simpáticas passam através do gânglio sem fazer sinapse. As fibras que<br />

saem do gânglio unem-se aos nervos na órbita para suprir a glândula lacrimal e unir-se aos<br />

nervos nasal, nasopalatino e palatino para levar impulsos secretores para as conchas nasais e<br />

mucosas nasais e palatinas 1,4 . As fibras secretórias para a glândula lacrimal passam do gânglio<br />

pterigopalatino através do nervo maxilar e seu ramo zigomático para entrar na órbita através<br />

da fissura orbital inferior e alcançar a glândula através <strong>de</strong> uma comunicação com o ramo<br />

lacrimal do nervo oftálmico 4,12 .<br />

Canal Pterigói<strong>de</strong>o<br />

O canal pterigói<strong>de</strong>o, também conhecido por canal vidiano, está localizado na<br />

linha <strong>de</strong> fusão entre o processo pterigói<strong>de</strong> e corpo do osso esfenoidal.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

Dentro <strong>de</strong>le há tecido adiposo e através <strong>de</strong>sse tecido passam o nervo e vasos do<br />

canal pterigói<strong>de</strong>o (vidianos). A artéria do canal pterigói<strong>de</strong>o geralmente surge da artéria maxilar<br />

interna na fossa pterigopalatina e é direcionada posteriormente <strong>de</strong>ntro do canal 4 . Ela também<br />

po<strong>de</strong> surgir do segmento horizontal da carótida e entrar no canal pterigói<strong>de</strong>o com o nervo<br />

pterigói<strong>de</strong>o 10 . As artérias do canal pterigói<strong>de</strong>o cursam medialmente em torno <strong>de</strong> 7mm ao longo<br />

da pare<strong>de</strong> anterior do canal antes <strong>de</strong> sair através da cartilagem do forame lacerado e continuar<br />

para o canal pterigói<strong>de</strong>o. O diâmetro <strong>de</strong>sses ramos gira em torno <strong>de</strong> 0,5mm 10 .<br />

O canal pterigói<strong>de</strong>o conecta a fossa pterigopalatina e o forame lacerado. Ele é<br />

uma via em linha reta ligeiramente curvada direcionada posterolateralmente em relação a sua<br />

abertura anterior e seu comprimento ao longo <strong>de</strong> sua pare<strong>de</strong> medial é em média 13,7mm. A<br />

extremida<strong>de</strong> anterior do canal, que abre-se na parte medial da pare<strong>de</strong> posterior da fossa<br />

pterigopalatina, tem formato <strong>de</strong> funil. A abertura anterior do canal pterigói<strong>de</strong>o está localizada<br />

inferomedialmente ao forame redondo na parte medial superior da superfície anterior do<br />

processo pterigói<strong>de</strong> do osso esfenói<strong>de</strong>. A abertura posterior do canal pterigói<strong>de</strong>o está localizada<br />

acima da margem posterior da lâmina medial do processo pterigói<strong>de</strong>. Ela abre-se<br />

posteriormente <strong>de</strong>ntro da parte superior da margem anterolateral do forame lacerado. Esta<br />

abertura posterior está preenchida com tecido cartilaginoso que mistura-se em cartilagem<br />

posicionada mais medialmente que preenche o fome lacerado 1,4 . A extremida<strong>de</strong> posterior do<br />

canal pterigói<strong>de</strong>o está localizada inferolateralmente à extremida<strong>de</strong> anterior do canal carotí<strong>de</strong>o e<br />

anterior à parte petrosa da a. carótida interna, na margem anterolateral da parte superior do<br />

preenchimento cartilaginoso do forame lacerado, e inferolateralmente à eminência óssea<br />

sobrejacente à parte petrosa da a. carótida interna na pare<strong>de</strong> lateral do seio esfenoidal. A<br />

abertura posterior do canal pterigói<strong>de</strong>o está situada medialmente ao forame oval e<br />

superiormente à tuba auditiva. A distância entre a abertura posterior do canal pterigói<strong>de</strong>o e a<br />

margem medial do forme oval é, em média, 6,9mm. A extremida<strong>de</strong> superior da margem<br />

posterior da lâmina medial do processo pterigói<strong>de</strong> está localizada abaixo da abertura posterior<br />

do canal pterigói<strong>de</strong>o.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

Outras estruturas posicionadas abaixo do canal pterigói<strong>de</strong>o são a fossa escafói<strong>de</strong>,<br />

posicionada no lado lateral da parte superior da lâmina medial do processo pterigói<strong>de</strong> on<strong>de</strong> o<br />

músculo tensor do véu palatino surge, o tubérculo pterigói<strong>de</strong>, que é uma pequena projeção<br />

localizada acima da borda posterior da lâmina medial do processo pterigói<strong>de</strong>, e a parte medial<br />

da tuba auditiva, que está anexada acima da superfície do forame lacerado e, anteriormente,<br />

aproxima-se à margem posterior da parte superior da lâmina medial do processo pterigói<strong>de</strong>. O<br />

segmento horizontal e a parte petrosa da a. carótida interna encontram-se acima da tuba<br />

auditiva 4 .<br />

O canal sempre leva posteriormente para a superfície inferolateral da parte<br />

petrosa da a. carótida interna quando exposto através da fossa média ou pela via inferior, através<br />

da cavida<strong>de</strong> nasal e dos seios paranasais. O ângulo lateral em frente no plano axial no nível do<br />

assoalho da fossa média entre o eixo longo do segmento horizontal da parte petrosa da a.<br />

carótida interna e do canal pterigói<strong>de</strong>o, tem em media 133 graus. A margem medial da abertura<br />

posterior do canal pterigói<strong>de</strong>o está localizada a uma distância média <strong>de</strong> 2,4mm anteriormente à<br />

parte petrosa da a. carótida interna e a uma distância média <strong>de</strong> 3,2mm anteriormente do ápice<br />

da parte petrosa do osso temporal 1,4 .<br />

O canal pterigói<strong>de</strong>o localiza-se no assoalho do seio esfenoidal e po<strong>de</strong> se projetar<br />

para o interior <strong>de</strong>ste seio, especialmente para a parte anterior <strong>de</strong> um seio bem pneumatizado.<br />

Uma proeminência óssea sobrepõem-se ao canal pterigói<strong>de</strong>o no assoalho do seio esfenoidal. O<br />

grau em que o canal pterigói<strong>de</strong>o se projeta para o interior do seio <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do grau <strong>de</strong><br />

pneumatização <strong>de</strong>ste último. Não haverá marcas acima do canal pterigói<strong>de</strong>o em osssos<br />

esfenoidais do tipo concha ou em tipos pré-selares tendo apenas uma célula <strong>de</strong> ar localizada<br />

anteriormente à sela túrcida 4 . Isto apenas em esfenói<strong>de</strong>s bem pneumatizados, o tipo selar no<br />

qual a célula <strong>de</strong> ar exten<strong>de</strong>-se abaixo da sela, o tipo mais comum <strong>de</strong> esfenoi<strong>de</strong> em adultos, que<br />

tem uma protrusão sobrepondo o canal no piso do seio esfenoidal. As partes anterior e<br />

posterior do canal vidiano ficam a uma distância média <strong>de</strong> 2,2mm e 2,8mm abaixo do piso do<br />

seio, respectivamente 1,4 .<br />

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Nervo Corda do Tímpano<br />

As fibras da corda do tímpano são aferentes viscerais especiais para o gosto, que<br />

correm para o núcleo salivatório superior, distribuídas com os ramos do nervo lingual aos dois<br />

terços anteriores da língua. Ele também contém fibras eferentes viscerais gerais pré-ganglionares<br />

secretomotoras do nervo intermédio, que terminam em sinapses com células do gânglio<br />

submandibular 1,3 .<br />

O nervo corda do tímpano origina-se do nervo intermédio no gânglio geniculado<br />

e corre na porção inicial do canal do nervo facial e verticalmente para baixo, na pare<strong>de</strong> posterior<br />

do tímpano, logo antes <strong>de</strong> alcançar o forame estilomastoi<strong>de</strong>o 1,3 . Penetra em seu próprio canal<br />

no osso, a cerca <strong>de</strong> 6mm acima do forame estilomastói<strong>de</strong>. Ele volta-se em direção cranial, quase<br />

paralela ao nervo facial, mas diverge em direção à pare<strong>de</strong> lateral do tímpano. Emerge <strong>de</strong> uma<br />

abertura na pare<strong>de</strong> posterior do tímpano entre a base da pirâmi<strong>de</strong> e a fixação da membrana<br />

timpânica. Corre horizontalmente ao longo da pare<strong>de</strong> lateral do tímpano, coberto pela fina<br />

membrana mucosa, e colocando-se contra a membrana timpânica cruza o manúbrio do<br />

martelo 1,2,3 . Deixa a cavida<strong>de</strong> timpânica perto da margem anterior da membrana, atravessa um<br />

canal na fissura petrotimpânica e emerge do crânio na face medial da espinha do osso esfenói<strong>de</strong>.<br />

Após cruzar a espinha do osso esfenoidal e ser alcançado por uma pequena comunicação do<br />

gânglio ótico, o n. corda do tímpano une-se ao nervo lingual em ângulo agudo entre as lâminas<br />

medial e lateral do processo pterigói<strong>de</strong>o 1,12 .<br />

Gânglio Peterigopalatino<br />

O gânglio pterigopalatino está localizado profundamente na fossa pterigopalatina,<br />

logo inferiormente ao nervo maxilar assim que este cruza a fossa junto ao forame<br />

pterigopalatino, É triangular e me<strong>de</strong> cerva <strong>de</strong> 5mm <strong>de</strong> comprimento; é encoberto por tecido<br />

fibroso entre os ossos vizinhos, e está intimamente preso aos ramos pterigopalatinos da divisão<br />

maxilar do nervo trigêmio. É um gânglio parassimpático retransmitindo, principalmente,<br />

impulsos secretomotores da divisão intermédia do nervo facial. A raiz parassimpática do gânglio<br />

pterigopalatino é o nervo petroso maior, e sua continuação é o nervo do canal pterigopalatino.<br />

As fibras são pré-ganglionares parassimpáticas que <strong>de</strong>ixam o tronco cerebral no nervo<br />

intermédio 1 .<br />

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Gânglio Submandibular<br />

O gânglio submandibular é uma pequena massa, <strong>de</strong> 2 a 5mm <strong>de</strong>, situada acima<br />

da porção profunda da glândula submandibular, no hioglosso, perto da borda posterior do<br />

milohiói<strong>de</strong>, e suspenso da margem inferior do nervo lingual por dois filamentos <strong>de</strong><br />

aproximadamente 5mm em comprimento. O filamento proximal é a raiz parassimpática que<br />

conduz fibras originárias do nervo intermédio e levadas ao lingual pela corda do tímpano. Estas<br />

são fibras eferentes viscerais pré-ganglionares secretomotoras cujas fibras pós-ganglionares<br />

inervam as glândulas submandibular, sublingual, lingual e glândulas salivares vizinhas 1 .<br />

Os ramos <strong>de</strong> distribuição são: cinco ou seis filamentos distribuídos à glândula<br />

submandibular e seu ducto, às pequenas glândulas no soalho da boca, e o filamento distal que<br />

pren<strong>de</strong> o gânglio ao nervo lingual, que conduz as fibras distribuídas à sublingual e glândulas<br />

linguais pequenas, com os ramos terminais do nervo lingual. Grupos pequenos <strong>de</strong> células<br />

ganglionares são constantemente encontrados no estroma da glândula submandibular, em geral<br />

perto <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s ramos do ducto; estas células são consi<strong>de</strong>radas, do ponto <strong>de</strong> vista funcional,<br />

uma parte do gânglio submandibular.<br />

Uma comunicação com os feixes simpáticos sobre a artéria facial tem sido<br />

chamada raiz simpática do gânglio, mas as fibras são pós-ganglionares e não têm sinapses no<br />

gânglio 1 .<br />

Fibra aferentes viscerais que passam através da raiz ao lingual e daí à corda do<br />

tímpano têm sido chamadas raiz sensitiva, embora elas não tenham sinapses no gânglio e seus<br />

corpos celulares estejam no gânglio geniculado 1 .<br />

Referências Bibliográficas<br />

Gray H. <strong>Anatomia</strong>. 29a ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Editora Guanabara Koogan; 1988. p. 714-716, 756-<br />

764, 824-826,<br />

Afifi A. K., Bergman R. A. Neuroanatomia funcional: texto e atlas. 2a ed. São Paulo: Editora<br />

Roca S.A.; 2008. p. 121-124.<br />

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Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

Menesses M. S. Neuroanatomia aplicada. 2a ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Editora Guanabara Koogan<br />

S.A.; 2006. p. 154-158, 168-172, 310-311.<br />

Osawa S., Rhoton Jr. A. L., Seker A., Shimizu S., Fujii K., Kassam A. B. Microsurgical and<br />

Endoscopic Anatomy of the Vidian Canal. Neurosurgery 2009; 64 : 385 – 412.<br />

Brodal A. <strong>Anatomia</strong> neurológica com correlações clínicas. 3a ed. São Paulo: Editora Roca<br />

LTDA; 2005. p. 398-404<br />

<strong>de</strong> Groot. J. Neuroanatomia. 21a ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A.; 1994. p.<br />

66-68.<br />

Wilson-Pauwels L., Akesson E. J., Stewart P. A., Spacey S. D. Cranial nerves in health and<br />

disease. 2a ed. London: BC Decker Inc; 2002. p. 116-128.<br />

Rhoton Jr. A. L., Kobayashi S., Hollinshead W. H. Nervus Intermedius. Journal of<br />

Neurosurgery 1968; 29: 609-618.<br />

Rhoton Jr. A. L. Microsurgery of the Internal Acoustic Meatus. Surgical Neurology 1974; 2 :<br />

311- 318.<br />

Paullus W. S., Pait T. G., Rhoton Jr. A. L. Microsurgical exposure of the petrous portion of the<br />

carotid artery. Journal of Neurosurgery 1997; 47: 713-726.<br />

Martin J. H. Neuroanatomia: texto e atlas. 2a ed. Porto Alegre: Editora Artes Médicas; 1998. p.<br />

224-234.<br />

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Artigo <strong>de</strong> Revisão: NERVO FACIAL: UMA REVISÃO FOCADA EM SUA DIVISÃO PARASSIMPÁTICA<br />

Burt A. M. Neuroanatomia. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A.; 1995. p. 233, 306.<br />

Ignatz Rohrbacher<br />

Acadêmico <strong>de</strong>Medicina<br />

Universida<strong>de</strong> Positivo<br />

Curitiba , Paraná<br />

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Como eu faço...<br />

TÉCNICA DE INJEÇÃO DE TINTA DA CHINA PARA DEMONSTRAÇÃO<br />

DA REDE DE PURKINJE EM CORAÇÕES DE BOVINOS E OVINOS<br />

INTRODUÇÃO<br />

Marcos Célio De Almeida*; Pedro Fontes**; Fábio Lopes**<br />

*Instituto <strong>de</strong> biologia - Departamento <strong>de</strong> genética e morfologia. Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Brasilia. DF<br />

** Alunos do curso <strong>de</strong> Farmácia da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Brasília.<br />

Tawara 1 em 1906, utilizando cortes microscópicos seriados, foi o primeiro a<br />

mostrar a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Purkinje em várias espécies animais, inclusive a humana. Lhamon 2 , ao<br />

<strong>de</strong>scobrir uma cápsula fibrosa envolvendo as fibras <strong>de</strong> Purkinje no coração <strong>de</strong> ungulados,<br />

<strong>de</strong>senvolveu a técnica <strong>de</strong> injeção com tinta da China ou tinta nanquim para <strong>de</strong>monstrar o sistema<br />

<strong>de</strong> Purkinje nesses animais. Recentemente, <strong>de</strong>senvolvemos uma melhoria nessa técnica 3 para<br />

facilitar seu uso. Por outro lado, temos evi<strong>de</strong>nciado que muitos alunos <strong>de</strong> anatomia humana<br />

representam a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Purkinje com um padrão morfológico que lembra um leito arterial<br />

terminal 4 . Acreditamos que isso se <strong>de</strong>ve, em parte, à dificulda<strong>de</strong> em <strong>de</strong>monstrar a re<strong>de</strong> em<br />

corações humanos. O uso da técnica <strong>de</strong> injeção <strong>de</strong> tinta nanquim em corações <strong>de</strong> bovinos e<br />

ovinos, como mo<strong>de</strong>lo didático, po<strong>de</strong> corrigir este aspecto 5 . É importante salientar que, até on<strong>de</strong><br />

pu<strong>de</strong>mos verificar, não há em nossa literatura <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong>sse procedimento. O objetivo do<br />

presente artigo é <strong>de</strong>screver a técnica <strong>de</strong> maneira a disseminar seu uso .<br />

Palavras-chave: Sistema <strong>de</strong> condução do coração. Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Purkinje. Injeção <strong>de</strong> tinta da China.<br />

OBTENÇÃO E PREPARO DOS CORAÇÕES<br />

Corações <strong>de</strong> bovinos e ovinos, obtidos em abatedouros, são congelados por 12<br />

horas ou assim mantidos até o momento do uso. Para realização da técnica, são <strong>de</strong>scongelados e<br />

<strong>de</strong>ixados à temperatura ambiente até estarem flácidos. Corações em rigor mortis ou fixados em<br />

formol não permitem a injeção a<strong>de</strong>quada <strong>de</strong> tinta nanquim ou da China 2 . Não obtivemos bons<br />

resultados com corações <strong>de</strong> suínos.<br />

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O ANATOMISTA Ano 3, Vol ume 1, Janeiro-Março, 2012<br />

Como eu faço ...: TÉCNICA DE INJEÇÃO DE TINTA DA CHINA PARA DEMONSTRAÇÃO DA REDE DE<br />

PURKINJE EM CORAÇÕES DE BOVINOS E OVINOS<br />

ABERTURA DAS CAVIDADES CARDÍACAS<br />

Inicialmente eliminam-se as a<strong>de</strong>rências entre os vasos da base, retirando-se o<br />

excesso <strong>de</strong> tecido adiposo e conjuntivo que une essas estruturas. As cavida<strong>de</strong>s cardíacas são<br />

abertas seguindo-se o percurso do sangue. Inicia-se com um corte que vai da veia cava superior<br />

até a inferior, expondo o interior do átrio direito. A seguir, com a face diafragmática do coração<br />

posicionada sobre uma superfície plana, insere-se no átrio direito uma faca longa, pontiaguda e<br />

<strong>de</strong> pequena espessura até o ápice do ventrículo direito. Aqui, <strong>de</strong>ve-se ter o cuidado <strong>de</strong> inserir o<br />

instrumento <strong>de</strong> corte entre os músculos papilares anterior e posterior, sem lesar o endocárdio.<br />

Proce<strong>de</strong>-se então a perfuração da ponta e, em movimento único, retrógrado, corta-se a borda<br />

direita seguindo entre os músculos papilares até o átrio. Durante esse movimento, <strong>de</strong>ve-se ter o<br />

cuidado <strong>de</strong> manter o coração imóvel, o que se consegue facilmente pressionando a face esterno-<br />

costal com uma compressa sob uma das mãos do instrumentador. Outra possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> corte<br />

é inserir a faca no ápice, rente ao septo interventricular, na porção posterior, e realizar um corte<br />

em direção à face diafragmática tanto do ventrículo quanto do átrio. Na próxima etapa, a partir<br />

da cavida<strong>de</strong> ventricular direita, a faca <strong>de</strong> corte é inserida no cone da artéria pulmonar, acima do<br />

músculo papilar anterior, ultrapassando a valva pulmonar e indo até a artéria. Em movimento<br />

único, em direção à face esterno-costal faz-se o corte.<br />

O átrio esquerdo é exposto seccionando-se a pare<strong>de</strong> atrial entre as veias<br />

pulmonares. Da mesma forma que para o lado direito, o instrumento <strong>de</strong> corte é inserido até o<br />

ápice ventricular, e o corte é feito em movimento único e retrógrado pela borda esquerda. A<br />

faca <strong>de</strong>ve ser inserida entre os músculos papilares esquerdo e direito. É fundamental não<br />

lesionar as falsas cordas tendíneas. Estando a cavida<strong>de</strong> ventricular esquerda aberta, coloca-se o<br />

coração <strong>de</strong> modo a se observar frontalmente o septo interventricular. Com o ápice apontado<br />

para o instrumentador, insere-se o instrumento <strong>de</strong> corte no vestíbulo aórtico, indo até a aorta<br />

ascen<strong>de</strong>nte. A lâmina do instrumento olha em direção ao instrumentador e na direção da linha<br />

média do folheto aórtico da valva mitral. Nesse corte o folheto aórtico da valva mitral fica divido<br />

ao meio.<br />

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Como eu faço ...: TÉCNICA DE INJEÇÃO DE TINTA DA CHINA PARA DEMONSTRAÇÃO DA REDE DE<br />

PURKINJE EM CORAÇÕES DE BOVINOS E OVINOS<br />

O óstio coronário direito ficará, após a secção simultânea do folheto aórtico da<br />

mitral e aorta adjacente, em posição frontal ao instrumentador e o óstio esquerdo à esquerda.<br />

Obs: Como a técnica <strong>de</strong> injeção <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do conhecimento da macroscopia do sistema <strong>de</strong><br />

condução, faremos uma breve <strong>de</strong>scrição do mesmo.<br />

MACROSCOPIA DO SISTEMA DE CONDUÇÃO<br />

CAVIDADE VENTRICULAR ESQUERDA<br />

Os ramos principais são facilmente observados sob o endocárdio, por<br />

transparência, ou como cordas aéreas (Fig1 ). O ramo principal esquerdo, ao perfurar o septo<br />

interventricular, se apresenta sob o endocárdio logo abaixo e à direita da lúnula da coronária<br />

direita. Na verda<strong>de</strong>, uma observação mais <strong>de</strong>talhada, após o uso <strong>de</strong> tinta da China, mostra que<br />

não se trata <strong>de</strong> um ramo único mas <strong>de</strong> vários ramos que caminham juntos até o terço médio<br />

superior do septo interventricular. A partir daí surgem ramos principais, como falsas cordas<br />

tendíneas ou cordas aéreas, um para o músculo papilar direito e outro para o esquerdo e um<br />

terceiro ou quarto subendocárdicos em direção à cavida<strong>de</strong> ventricular. Esses ramos principais<br />

originam uma complexa re<strong>de</strong> <strong>de</strong> minúsculos ramos interanastomosantes (Fig.2 e 3). Esses ramos<br />

se distribuem em toda cavida<strong>de</strong> ventricular, mas nunca chegam aos óstios valvares respeitando<br />

uma faixa <strong>de</strong> 1-2 cm <strong>de</strong> espessura.<br />

Fig 1. Ramo principal esquerdo e cordas aéreas. Coração bovino<br />

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PURKINJE EM CORAÇÕES DE BOVINOS E OVINOS<br />

Fig. 2 Ramo principal esquerdo e re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Purkinje em coração ovino fixado após<br />

injeção com nanquim<br />

Fig. 3 Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Purkinje na cavida<strong>de</strong> ventricular esquerda após injeção <strong>de</strong> tinta da<br />

China. Observar a ampla re<strong>de</strong> sobre o músculo papilar à esquerda. Coração<br />

Bovino.<br />

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CAVIDADE VENTRICULAR DIREITA<br />

PURKINJE EM CORAÇÕES DE BOVINOS E OVINOS<br />

A observação direta do sistema <strong>de</strong> condução é muito menos evi<strong>de</strong>nte que no<br />

coração esquerdo. O feixe <strong>de</strong> His, antes <strong>de</strong> perfurar o septo membranoso interventricular,<br />

origina um ramo direito, em geral profundo, no subendocárdio, raramente po<strong>de</strong>ndo ser<br />

observado por transparência (Fig.4). O ramo direito dirige-se para a trabécula septo-marginal ou<br />

feixe mo<strong>de</strong>rador correndo no seu interior. Ao atingir a base do músculo papilar anterior,<br />

origina ramos para o próprio músculo papilar e para a cavida<strong>de</strong> direita. (Fig.5). A re<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Purkinje é muito mais <strong>de</strong>lgada na cavida<strong>de</strong> ventricular direita que esquerda e, portanto, <strong>de</strong> mais<br />

difícil observação direta.<br />

Fig. 4 Ramo principal direito e seu percurso na trabécula septo marginal <strong>de</strong>monstrado com injeção <strong>de</strong><br />

nanquim. Coração bovino.<br />

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PURKINJE EM CORAÇÕES DE BOVINOS E OVINOS<br />

TÉCNICA DE INJEÇÃO DE TINTA DA CHINA<br />

Utilizamos uma solução <strong>de</strong> tinta da China Acrilex® em solução 1/ 20 em NACL<br />

0,9% (v/v). Seringas plásticas 1-10ml e agulhas 13x4,5 . Como as estruturas são muito frágeis e<br />

finas, a manipulação a<strong>de</strong>quada da seringa é fundamental. Obtivemos melhor resultado<br />

segurando o corpo seringa com a palma da mão. O polegar é usado para pressionar o êmbolo.<br />

A mão segurando a seringa fica na posição do sinal <strong>de</strong> “positivo”. A lubrificação prévia do<br />

êmbolo com óleo também facilita a injeção. Outros preferem segurar o corpo da seringa com o<br />

<strong>de</strong>do médio e o polegar, pressionando o êmbolo com o indicador. Embora simples este é um<br />

<strong>de</strong>talhe <strong>de</strong>terminante na qualida<strong>de</strong> da técnica.<br />

anatômico.<br />

Fig. 5 Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Purkinje na saída do cone da pulmonar. Observe faixa livre <strong>de</strong> ramos<br />

abaixo da inserção da valva pulmonar . Coração bovino.<br />

O preparado se mantém após fixação em formal<strong>de</strong>ído ou outro fixador<br />

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PROCEDIMENTO POR CÂMARA CARDÍCA<br />

CÂMARA VENTRICULAR ESQUERDA<br />

PURKINJE EM CORAÇÕES DE BOVINOS E OVINOS<br />

A injeção é mais facilmente realizada no lado esquerdo do coração. Na nossa<br />

experiência isso <strong>de</strong>ve ser feito inicialmente pela punção da falsa corda tendínea (Fig. 1) que<br />

se dirige ao músculo papilar esquerdo e <strong>de</strong>pois na que se dirige para o lado direito. A corda é<br />

tensionada inserindo-se uma pinça aberta abaixo da mesma e a agulha punciona a corda<br />

tangencialmente, sob pressão constante e suave, para não romper a cápsula conjuntiva que<br />

envolve as fibras <strong>de</strong> Purkinje (Fig.6) É um movimento às cegas que po<strong>de</strong> ter pequenos<br />

avanços e recuos. Ao perfurar uma cápsula o liquido preenche a ampla re<strong>de</strong> que se distribui<br />

sobre o músculo papilar. A mesma corda po<strong>de</strong> ser puncionada no sentido contrário e a<br />

solução <strong>de</strong> tinta da China injetada retrogradamente para <strong>de</strong>monstrar os feixes do ramo<br />

principal. A partir dos ramos distais que foram preenchidos, novas punções e injeções são<br />

feitas até se completar a <strong>de</strong>monstração da re<strong>de</strong>. Uma manobra que ajuda bastante na<br />

<strong>de</strong>monstração dos menores ramos é a digito-pressão das áreas injetadas, com um movimento<br />

no sentido das áreas ainda a serem evi<strong>de</strong>nciadas<br />

Fig.6 Fibra <strong>de</strong> Purkinje envolta por cápsula conjuntiva marcada com tinta<br />

nanquim. Endocárdio sobre o músculo papilar esquerdo . Coração<br />

bovino. HE X400<br />

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CÂMARA VENTRICULAR DIREITA<br />

PURKINJE EM CORAÇÕES DE BOVINOS E OVINOS<br />

Aqui uma possível abordagem, quando o ramo principal não po<strong>de</strong> ser visto por<br />

transparência, é dissecá-lo quando atravessa a trabécula septo-marginal, e puncioná-lo. Nesse<br />

caso, segue-se injetando os ramos distais na base do músculo papilar. Po<strong>de</strong>-se também iniciar as<br />

injeções a partir <strong>de</strong> ramos menores, em geral mais fáceis <strong>de</strong> serem localizados no terço superior<br />

do septo interventricular, abaixo do folheto septal da valva tricúspi<strong>de</strong>.<br />

Agra<strong>de</strong>cimentos: Agra<strong>de</strong>cemos a Virgínia Vilhena do Nascimento pelo incentivo e revisão do<br />

texto. Ao professor Antônio Seben pela ajuda na fotografia <strong>de</strong> algumas peças. Aos frigoríficos<br />

Supremo e Silvestre pela cessão dos corações bovinos e ovinos respectivamente.<br />

Referências Bibliográficas<br />

Tawara, S. 1906. Das Reizleitungssystem <strong>de</strong>s Saugertierherzens. Gustav Fischer Verlag.<br />

(Tradução inglesa: The Conduction System of the Mammalian Heart, Imperial College<br />

Press.2000)<br />

Lhamon, R.M. 1912. The sheath of the sino-ventricular bundle. Am. Jour. Anat 13, 55-70.<br />

De Almeida, M.C ; Fontes, P. 2010. An improved variation of India Ink procedure for<br />

<strong>de</strong>monstration of Purkinje network in bovine heart. O Anatomista, 4, 735.<br />

De Almeida, M. C, ; Barra, F.R.; Batista, G.M; Lopes, F .M. 2011. Purkinje network<br />

misrepresentation in mo<strong>de</strong>rn international textbooks of human anatomy. XXII International<br />

symposium on morphological sciences. São Paulo. Brasil.<br />

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Como eu faço ...: TÉCNICA DE INJEÇÃO DE TINTA DA CHINA PARA DEMONSTRAÇÃO DA REDE DE<br />

PURKINJE EM CORAÇÕES DE BOVINOS E OVINOS<br />

De Almeida, M. C.; Lopes, F. M.; Batista, G.M. 2011. Listening to Aschoff advice, following<br />

Tawara footsteps: the usefulness of Ungulate’s heart mo<strong>de</strong>l in human anatomy for<br />

<strong>de</strong>monstration of Purkinje network. XXII International symposium on morphological sciences.<br />

São Paulo. Brasil.<br />

Marcos Célio De Almeida<br />

Professor Adjunto<br />

Instituto <strong>de</strong> Biologia - Departamento <strong>de</strong> Genética e Morfologia<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Brasilia. DF<br />

marcoscelio@unb.br, mcelioalmeida@hotmail.com.br<br />

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