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Cap 16 - Biossíntese e armazenamento de ácidos gordos.pdf - Molar

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<strong>Biossíntese</strong> e Armazenamento <strong>de</strong> Ácidos Graxos<br />

U.V. Kulkarni, I. Broom<br />

OBJETIVOS<br />

Após concluir este capítulo, o leitor estará apto a:<br />

Descrever a via <strong>de</strong> síntese <strong>de</strong> ácido graxo, em particular os papéis da acetil-CoA carboxilase e da enzima multifuncional<br />

ácido graxo sintase.<br />

Descrever a regulação <strong>de</strong> curto e longo prazos da síntese <strong>de</strong> ácido graxo.<br />

Explicar os conceitos <strong>de</strong> alongamento e <strong>de</strong>ssaturação da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ácido graxo.<br />

Descrever a síntese <strong>de</strong> triglicerí<strong>de</strong>os.<br />

Debater sobre a função endócrina do tecido adiposo.<br />

INTRODUÇÃO<br />

A maioria dos <strong>ácidos</strong> graxos <strong>de</strong> que os humanos necessitam provém da alimentação; no entanto, a via para sua síntese <strong>de</strong><br />

novo (lipogênese) a partir <strong>de</strong> compostos <strong>de</strong> 2 carbonos está presente em muitos tecidos como fígado, cérebro, rim, glândulas<br />

mamárias e tecido adiposo. Em geral, a via <strong>de</strong> síntese <strong>de</strong> novo se encontra ativa principalmente em situações <strong>de</strong> excesso <strong>de</strong><br />

consumo energético, especificamente na forma <strong>de</strong> excesso <strong>de</strong> carboidrato. Nessa situação, o carboidrato é convertido em<br />

ácido graxo no fígado e armazenado como triacilglicerol (TAG, também conhecido como triglicerí<strong>de</strong>o) no tecido adiposo. Em<br />

humanos, o tecido adiposo não é um local importante para a síntese <strong>de</strong> ácido graxo: o principal órgão lipogênico é o fígado. A<br />

lipogênese não parece ser um requerimento crítico em humanos, e nenhuma doença que acarrete risco <strong>de</strong> vida associada a sua<br />

disfunção foi i<strong>de</strong>ntificada. No entanto, a lipogênese possui um importante papel no <strong>de</strong>senvolvimento da obesida<strong>de</strong>.<br />

A via da lipogênese não é simplesmente o inverso da oxidação <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos vista nas vias oxidativas ( <strong>Cap</strong>. 15). A<br />

lipogênese requer um grupo <strong>de</strong> enzimas completamente diferente e ocorre em um compartimento celular diferente, o citosol.<br />

Além disso, ela utiliza a nicotinamida a<strong>de</strong>nina dinucleotí<strong>de</strong>o fosfato (NADP + ) como fonte redutora, e não a nicotinamida<br />

a<strong>de</strong>nina dinucleotí<strong>de</strong>o (NAD + ) necessária na β-oxidação.<br />

<strong>16</strong>


SÍNTESE DE ÁCIDO GRAXO<br />

Ácidos graxos são sintetizados a partir <strong>de</strong> acetil-CoA<br />

A síntese <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos nos sistemas <strong>de</strong> mamíferos po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada um processo com dois estágios, ambos<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acetil-CoA e ambos empregando proteínas multifuncionais em complexos multienzimáticos.<br />

Estágio 1: formação do precursor-chave malonil-CoA a partir <strong>de</strong> acetil-CoA pela acetil-CoA carboxilase.<br />

Estágio 2: alongamento da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ácido graxo em incrementos <strong>de</strong> 2 carbonos pela ácido graxo sintase.<br />

O estágio preparatório: acetil-CoA carboxilase<br />

A carboxilação <strong>de</strong> acetil-CoA a malonil-CoA é a etapa-chave da síntese <strong>de</strong> ácido graxo<br />

No primeiro estágio da biossíntese <strong>de</strong> ácido graxo, o acetil-CoA, <strong>de</strong>rivado principalmente do metabolismo <strong>de</strong><br />

carboidratos, é convertido em malonil-CoA pela ação da enzima acetil-CoA carboxilase ( Fig. <strong>16</strong>.1). Essa é uma enzima<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> biotina com funções enzimáticas distintas e função <strong>de</strong> proteína carreadora: suas subunida<strong>de</strong>s agem como uma<br />

biotina carboxilase, uma transcarboxilase e uma proteína carreadora <strong>de</strong> carboxil-biotina. Essa enzima é sintetizada na forma <strong>de</strong><br />

um protômero inativo, cada protômero contendo todas as subunida<strong>de</strong>s mencionadas anteriormente, uma molécula <strong>de</strong> biotina e<br />

um sítio alostérico regulatório para ligação do citrato (um metabólito do ciclo <strong>de</strong> Krebs) ou do palmitoil-CoA (o produto final<br />

da via <strong>de</strong> biossíntese <strong>de</strong> ácido graxo). Essa reação também se dá em estágios: inicialmente há a carboxilação da biotina,<br />

envolvendo a<strong>de</strong>nosina trifosfato (ATP), seguida da transferência <strong>de</strong>sse grupo carboxila para o acetil-CoA, produzindo o<br />

produto final da reação: malonil-CoA. Nesse estágio, o complexo enzima-biotina livre é liberado.<br />

Esse processo permite a síntese <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos com número par <strong>de</strong> átomos <strong>de</strong> carbono no próximo estágio. O<br />

propionil-CoA é um substrato usado na síntese <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos com número ímpar <strong>de</strong> átomos <strong>de</strong> carbono.<br />

A acetil-CoA carboxilase está sujeita a uma rigorosa regulação<br />

Os protômeros <strong>de</strong> acetil-CoA carboxilase se polimerizam na presença <strong>de</strong> citrato ou isocitrato, produzindo a forma ativa<br />

da enzima. O processo <strong>de</strong> polimerização também é inibido pelo palmitoil-CoA no mesmo sítio alostérico. Os respectivos<br />

efeitos estimulatório e inibitório do citrato e do palmitoil-CoA são inteiramente lógicos: em condições <strong>de</strong> alta concentração <strong>de</strong><br />

citrato, o <strong>armazenamento</strong> <strong>de</strong> energia é <strong>de</strong>sejado, mas quando o palmitoil-CoA, o produto final da via, se acumula, uma<br />

diminuição na síntese <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos é apropriada. Há um mecanismo adicional <strong>de</strong> controle, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> citrato ou<br />

palmitoil-CoA, envolvendo a fosforilação e <strong>de</strong>sfosforilação da enzima. Esse mecanismo envolve proteínas quinase/fosfatase<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> hormônio ( Fig. <strong>16</strong>.1). A fosforilação inibe a enzima, e a <strong>de</strong>sfosforilação ativa a enzima. A fosforilação da<br />

enzima é promovida por glucagon ou adrenalina, e a forma ativa <strong>de</strong>sfosforilada é promovida pela insulina, que é um hormônio<br />

lipogênico.<br />

A carboxilação do acetil-CoA a malonil-CoA direciona a via para a síntese <strong>de</strong> ácido graxo. É por esse motivo que essa<br />

enzima se encontra sob rigoroso controle a curto prazo. Existe também um controle <strong>de</strong> mais longo prazo exercido pela<br />

alimentação, através da indução ou repressão da síntese enzimática: a síntese <strong>de</strong> acetil-CoA carboxilase é aumentada em<br />

condições <strong>de</strong> ingesta <strong>de</strong> alto teor <strong>de</strong> carboidrato/baixo teor <strong>de</strong> gordura, enquanto a inanição ou uma ingesta <strong>de</strong> alto teor <strong>de</strong><br />

gordura/baixo teor <strong>de</strong> carboidrato leva a uma diminuição na síntese <strong>de</strong>ssa enzima.<br />

ANORMALIDADES LIPÍDICAS NO ALCOOLISMO<br />

Uma mulher <strong>de</strong> 36 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> atendida em um centro <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> da mulher, apresentou concentrações séricas <strong>de</strong><br />

triglicerí<strong>de</strong>o <strong>de</strong> 73,0 mmol/L (6.388 mg/dL) e <strong>de</strong> colesterol <strong>de</strong> 13 mmol/L (503 mg/dL). Após uma evasiva inicial, ela admitiu<br />

beber três garrafas <strong>de</strong> vodca e seis garrafas <strong>de</strong> vinho por semana. Quando ela se absteve do álcool, a concentração <strong>de</strong><br />

triglicerí<strong>de</strong>o foi reduzida a 2 mmol/L (175 mg/dL) e a concentração <strong>de</strong> colesterol a 5 mmol/L (193 mg/dL). Três anos <strong>de</strong>pois,<br />

a mulher se apresentou novamente com fígado dilatado e o retorno das anormalida<strong>de</strong>s lipídicas. Uma biópsia do fígado<br />

indicou doença hepática alcoólica com esteatose, ou seja, células hepáticas infiltradas com gordura.<br />

Comentário. Em indivíduos alcoólatras, o metabolismo do álcool produz quantida<strong>de</strong>s aumentadas <strong>de</strong> nicotinamida<br />

a<strong>de</strong>nina dinucleotí<strong>de</strong>o reduzida (NADH<br />

reesterificados com glicerol para formar triglicerí<strong>de</strong>os. Nos estágios iniciais <strong>de</strong> alcoolismo, estes são reunidos com<br />

apolipoproteínas e secretados como lipoproteínas <strong>de</strong> muito baixa <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> (VLDL). Concentrações crescentes <strong>de</strong> VLDL e,<br />

portanto, <strong>de</strong> triglicerí<strong>de</strong>os séricos, estão frequentemente presentes em estágios iniciais <strong>de</strong> doença hepática alcoólica. Com o<br />

progresso da doença hepática, surge uma falha na produção <strong>de</strong> apolipoproteínas e na secreção <strong>de</strong> gordura na forma <strong>de</strong><br />

VLDL, resultando em um acúmulo <strong>de</strong> triglicerí<strong>de</strong>os nas células hepáticas.<br />

+ ) no fígado. Um aumento na razão NADH + H + /NAD + inibe a oxidação <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong><br />

graxos. Ácidos graxos que chegam ao fígado sejam <strong>de</strong> fontes alimentares ou mobilizados do tecido adiposo são


Fig. <strong>16</strong>.1 Conversão do acetil-CoA em malonil-CoA. (A) Reação catalisada pela acetil-CoA carboxilase. A enzima se liga<br />

covalentemente à biotina, que é carboxilada utilizando uma molécula <strong>de</strong> ATP. (B) A acetil-CoA carboxilase requer a presença <strong>de</strong> citrato<br />

que estimula a polimerização para a sua forma ativa. (C) A ativida<strong>de</strong> da acetil-CoA carboxilase é regulada por um mecanismo <strong>de</strong><br />

fosforilação/<strong>de</strong>sfosforilação. Esse, por sua vez, é controlado por hormônios que regulam o metabolismo do combustível: insulina,<br />

glucagon e adrenalina. AMPc, a<strong>de</strong>nosina monofosfato cíclico.


Sintetizando uma ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ácido graxo: ácido graxo sintase<br />

O segundo passo importante na síntese <strong>de</strong> ácido graxo também envolve um complexo multienzimático, a ácido graxo sintase.<br />

Esse sistema enzimático é muito mais complexo que a acetil-CoA carboxilase. A proteína contém sete ativida<strong>de</strong>s enzimáticas<br />

distintas e uma proteína carreadora <strong>de</strong> acil (ACP). A ACP, uma proteína altamente conservada, substitui a CoA como a<br />

entida<strong>de</strong> que se liga à ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ácido graxo para seu alongamento. A estrutura <strong>de</strong>ssa molécula está ilustrada na Figura <strong>16</strong>.2 e<br />

consiste em um dímero <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s polipeptí<strong>de</strong>os idênticos dispostos em direções opostas. Cada monômero possui todas as<br />

sete ativida<strong>de</strong>s enzimáticas e a ACP. Ele também possui um longo grupo panteteína que funciona como um “braço” flexível,<br />

permitindo que a molécula que está sendo sintetizada esteja acessível a diferentes enzimas no complexo ácido graxo sintase. A<br />

função <strong>de</strong> síntese <strong>de</strong> ácido graxo é compartilhada pelas duas ca<strong>de</strong>ias polipeptídicas.<br />

Fig. <strong>16</strong>.2 Estrutura da ácido graxo sintase. A ácido graxo sintase é um dímero constituído <strong>de</strong> duas subunida<strong>de</strong>s gran<strong>de</strong>s dispostas<br />

em direções opostas. Ela contém sete ativida<strong>de</strong>s enzimáticas distintas e uma proteína carreadora <strong>de</strong> acil (ACP). Cys, cisteína.<br />

A ácido graxo sintase sintetiza a molécula <strong>de</strong> ácido graxo com até <strong>16</strong> carbonos <strong>de</strong> comprimento<br />

A reação prossegue após uma ligação inicial do grupo cisteína (Cys-SH) com o acetil-CoA, uma reação catalisada pela<br />

acetil transacilase ( Fig. <strong>16</strong>.3). O malonil-CoA é então transferido pela malonil transacilase para o resíduo -SH do grupo<br />

panteteína ligado à ACP da outra subunida<strong>de</strong>. Depois, a 3-cetoacil sintase (a enzima con<strong>de</strong>nsadora) catalisa a reação entre o<br />

grupo acetil previamente acoplado e o resíduo <strong>de</strong> malonil, liberando CO 2 e formando o complexo 3-cetoacil – enzima. Isso<br />

libera o resíduo <strong>de</strong> cisteína da ca<strong>de</strong>ia 1 que se encontrava ocupado pelo acetil-CoA. O grupo 3-cetoacil posteriormente sofre<br />

sequencialmente redução, <strong>de</strong>sidratação e nova redução, formando um complexo acil–enzima saturado. A próxima molécula <strong>de</strong><br />

malonil-CoA <strong>de</strong>sloca o grupo acil do grupo pantoteína-SH para o grupo cisteína recém-liberado, e a sequência <strong>de</strong> reação é<br />

repetida por mais seis ciclos (sete ciclos no total). Uma vez que a ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> <strong>16</strong> carbonos (palmitato) é formada, o complexo<br />

acil-enzima saturado ativa a tioesterase, liberando a molécula <strong>de</strong> palmitato do complexo enzimático. Os dois sítios -SH estão<br />

agora livres, permitindo que um novo ciclo <strong>de</strong> síntese <strong>de</strong> palmitato seja iniciado.


Fig. <strong>16</strong>.3 Reações catalisadas pela ácido graxo sintase. A síntese da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ácido graxo é iniciada por uma molécula <strong>de</strong> malonil-<br />

CoA (C3) que reage com a primeira molécula <strong>de</strong> acetil-CoA (C2); isso produz uma molécula C4 (um carbono é perdido em forma <strong>de</strong><br />

CO 2 durante a con<strong>de</strong>nsação <strong>de</strong> malonil-CoA e acetil-CoA). Existem mais seis ciclos, cada um adicionando 2C à ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ácido graxo<br />

(sete ciclos no total), e o resultado é uma molécula <strong>de</strong> palmitato com <strong>16</strong> carbonos. NADPH, nicotinamida a<strong>de</strong>nina dinucleotí<strong>de</strong>o<br />

fosfato reduzida; Pan, panteteína.<br />

*Essa reação ocorre uma vez que a ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> acil graxo <strong>de</strong> <strong>16</strong> carbonos esteja formada.<br />

A síntese <strong>de</strong> uma molécula <strong>de</strong> palmitato requer 8 moléculas <strong>de</strong> acetil-CoA, 7 <strong>de</strong> ATP, 14 <strong>de</strong> NADPH e 14 H+:<br />

Assim como o sistema da acetil-CoA carboxilase, a ácido graxo sintase também é regulada pelo fluxo <strong>de</strong> substrato (a<br />

presença <strong>de</strong> açúcares fosforilados) através <strong>de</strong> um efeito alostérico e também por indução e repressão da enzima.<br />

A alteração na quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> enzima é exercida pelo estado nutricional do indivíduo; consequentemente, esse é o<br />

principal fator que controla a taxa <strong>de</strong> lipogênese. As taxas <strong>de</strong> síntese <strong>de</strong> ácido graxo são maiores quando um indivíduo segue<br />

uma dieta <strong>de</strong> alto teor <strong>de</strong> carboidrato/baixo teor <strong>de</strong> gordura e são baixas durante jejum/inanição ou numa dieta <strong>de</strong> alto teor <strong>de</strong><br />

gordura. Situações em que há uma alta concentração sistêmica <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos levam a uma marcante inibição da lipogênese.


A lança<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> malato<br />

A lança<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> malato permite o recrutamento <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> 2 carbonos da mitocôndria para o citoplasma<br />

A molécula primária necessária para a síntese <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos é a acetil-CoA. No entanto, a acetil-CoA é gerada na<br />

mitocôndria e não consegue atravessar livremente a membrana mitocondrial interna. Como mencionado anteriormente, a<br />

biossíntese <strong>de</strong> ácido graxo ocorre no citosol. A lança<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> malato é um mecanismo que permite a transferência <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> 2 carbonos da mitocôndria para o citosol: ele envolve o antiporte malato-citrato ( Fig. <strong>16</strong>.4). O piruvato <strong>de</strong>rivado da<br />

glicólise é <strong>de</strong>scarboxilado em acetil-CoA na mitocôndria: subsequentemente ele reage com oxalacetato no ciclo do ácido<br />

tricarboxílico (TCA) (<strong>Cap</strong>. 14) para formar o citrato. A translocação <strong>de</strong> uma molécula <strong>de</strong> citrato para o citosol por antiporte é<br />

acompanhada pela transferência <strong>de</strong> uma molécula <strong>de</strong> malato para a mitocôndria. No citosol, o citrato, na presença <strong>de</strong> ATP e<br />

CoA, é submetido a uma clivagem em acetil-CoA e oxalacetato pela citrato liase. Isso disponibiliza o acetil-CoA para<br />

carboxilação em malonil-CoA e para a síntese <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos. A síntese <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos é também ligada ao metabolismo<br />

da glicose através da via da pentose fosfato que é a maior fornecedora <strong>de</strong> NADPH necessário à lipogênese. Uma parte do<br />

NADPH é também gerada pela <strong>de</strong>scarboxilação do malato a piruvato, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> NADP + , pela enzima málica:<br />

Fig. <strong>16</strong>.4 A lança<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> malato. A acetil-CoA é gerada na mitocôndria e não consegue atravessar a membrana mitocondrial. A<br />

lança<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> malato facilita o transporte das unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> 2 carbonos das mitocôndrias para o citoplasma. A acetil-CoA é ressintetizada<br />

no citoplasma e entra na lipogênese. Fru-6-P, Frutose-6-fosfato; Glc-6-P, Glicose-6-fosfato; NADH, nicotinamida a<strong>de</strong>nina<br />

dinucleotí<strong>de</strong>o (reduzido). (Fig. 9.7.)


ALONGAMENTO DO ÁCIDO GRAXO<br />

O alongamento da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ácido graxo além <strong>de</strong> <strong>16</strong> carbonos requer um outro conjunto <strong>de</strong> enzimas.<br />

O palmitato liberado da ácido graxo sintase se torna um substrato para a síntese <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos mais<br />

longas, com exceção <strong>de</strong> alguns <strong>ácidos</strong> graxos essenciais (veja adiante). O alongamento da ca<strong>de</strong>ia ocorre através da adição <strong>de</strong><br />

novos fragmentos <strong>de</strong> 2 carbonos <strong>de</strong>rivados do malonil-CoA (Fig. <strong>16</strong>.5). Esse processo ocorre no retículo endoplasmático por<br />

ação <strong>de</strong> um outro complexo multienzimático – a ácido graxo alongase. As reações que ocorrem durante o alongamento da<br />

ca<strong>de</strong>ia são similares àquelas envolvidas na síntese <strong>de</strong> ácido graxo, com a exceção do ácido graxo, que é acoplado à CoA, em<br />

vez da ACP.<br />

Fig. <strong>16</strong>.5 Alongamento <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos. O alongamento <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos ocorre no retículo endoplasmático e é efetuado por um<br />

complexo multienzimático, a ácido graxo alongase.<br />

Os substratos para a ácido graxo alongase citosólica são <strong>ácidos</strong> graxos saturados com ca<strong>de</strong>ia contendo <strong>de</strong> 10 carbonos<br />

para cima, e também <strong>ácidos</strong> graxos insaturados. Ácidos graxos <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ia muito longa (22-24 carbonos) são produzidos no<br />

cérebro, e o alongamento do estearil-CoA (C18) no cérebro aumenta rapidamente durante a mielinização, produzindo <strong>ácidos</strong><br />

graxos requeridos para a síntese <strong>de</strong> esfingolipí<strong>de</strong>os.<br />

Os <strong>ácidos</strong> graxos também po<strong>de</strong>m ser alongados na mitocôndria, on<strong>de</strong> outro sistema é utilizado: é NADH <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e<br />

usa acetil-CoA como fonte <strong>de</strong> fragmentos <strong>de</strong> dois carbonos. É simplesmente o reverso da β-oxidação (<strong>Cap</strong>. 15) e os<br />

substratos para o alongamento <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ia são <strong>ácidos</strong> graxos <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ia média e curta contendo menos do que <strong>16</strong> átomos <strong>de</strong><br />

carbono. Durante o jejum e a estarvação, o alongamento <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos é intensamente reduzido.


DESSATURAÇÃO DE ÁCIDOS GRAXOS<br />

Reações <strong>de</strong> <strong>de</strong>ssaturação requerem oxigênio molecular<br />

O corpo tem uma necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos mono- e poli-insaturados, além dos <strong>ácidos</strong> graxos saturados. Alguns<br />

<strong>de</strong>stes precisam ser fornecidos através da alimentação; esses dois <strong>ácidos</strong> graxos insaturados, linoleico e linolênico, são<br />

conhecidos como <strong>ácidos</strong> graxos essenciais (EFA; ver adiante). O sistema <strong>de</strong> <strong>de</strong>ssaturação requer oxigênio molecular, NADH<br />

e citocromo b 5 . O processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>ssaturação, assim como o <strong>de</strong> alongamento da ca<strong>de</strong>ia, ocorre no retículo endoplasmático e<br />

resulta na oxidação <strong>de</strong> ambos, ácido graxo e NADH (Fig. <strong>16</strong>.6).<br />

Fig. <strong>16</strong>.6 Dessaturação <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos. A <strong>de</strong>ssaturação <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos ocorre no retículo endoplasmático. A reação requer<br />

oxigênio molecular, NADH 2, FADH 2 e citocromo b 5. cyt b 5, citocromo b 5; FAD, flavina a<strong>de</strong>nina dinucleotí<strong>de</strong>o; FADH 2, flavina<br />

a<strong>de</strong>nina dinucleotí<strong>de</strong>o reduzido; Fe3+ , Íon férrico.<br />

No homem, o sistema da <strong>de</strong>saturase é incapaz <strong>de</strong> introduzir duplas ligações entre átomos <strong>de</strong> carbono além do átomo <strong>de</strong><br />

carbono-9 e carbono ω (metil terminal). A maioria das <strong>de</strong>ssaturações ocorre entre os átomos <strong>de</strong> carbono 9 e 10 (chamados<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssaturações Δ 9 ), como, por exemplo, aquela com o ácido palmítico produzindo ácido palmitoleico (C-<strong>16</strong>:1, Δ 9 ) e aquela<br />

com o ácido esteárico produzindo ácido oleico (C-18:1, Δ 9 ).


ÁCIDOS GRAXOS ESSENCIAIS<br />

Os <strong>ácidos</strong> graxos ω-3 e ω-6 (ou seus precursores) <strong>de</strong>vem ser fornecidos através da alimentação<br />

Como discutido anteriormente, a <strong>de</strong>saturase humana é incapaz <strong>de</strong> introduzir duplas ligações além <strong>de</strong> C-9. Por outro lado,<br />

dois tipos <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos – aqueles contendo duplas ligações no terceiro carbono a partir do metil terminal (<strong>ácidos</strong> graxos<br />

ω-3) e no sexto carbono a partir do metil terminal (<strong>ácidos</strong> graxos ω-6) – são necessários para a síntese <strong>de</strong> eicosanoi<strong>de</strong>s<br />

(<strong>ácidos</strong> graxos C-20), precursores <strong>de</strong> moléculas importantes como prostaglandinas, tromboxanos e leucotrienos. Portanto, os<br />

<strong>ácidos</strong> graxos ω-3 e ω-6 (ou seus precursores) <strong>de</strong>vem ser fornecidos através da alimentação. De fato, eles são obtidos pelo<br />

consumo <strong>de</strong> óleos vegetais que contêm o ácido graxo ω-6, ácido linoleico (C-18:2, Δ 9,12 ) e o ácido graxo ω-3, ácido<br />

linolênico (C-18:3, Δ 9,12,15 ). O ácido linoleico é convertido por uma série <strong>de</strong> reações <strong>de</strong> alongamento e <strong>de</strong>ssaturação em<br />

ácido araquidônico (C-20:4, Δ 5,8,11,14 ), o precursor da síntese <strong>de</strong> outros eicosanoi<strong>de</strong>s no homem. O alongamento e a<br />

<strong>de</strong>ssaturação do ácido linolênico produzem o ácido eicosapentaenoico (EPA; C-20:5, Δ 5,8,11,14,17 ), que é um precursor <strong>de</strong><br />

outra série <strong>de</strong> eicosanoi<strong>de</strong>s (Tabela 3.2).<br />

ARMAZENAMENTO E TRANSPORTE DE ÁCIDOS GRAXOS: A SÍNTESE DE<br />

TRIACILGLICERÓIS<br />

Ácidos graxos, <strong>de</strong>rivados da síntese endógena ou da alimentação, são armazenados e transportados como<br />

triacilgliceróis<br />

No fígado e no tecido adiposo, os triacilgliceróis são produzidos por uma via envolvendo o ácido fosfatídico como<br />

intermediário (Fig. <strong>16</strong>.7). A fonte <strong>de</strong> glicerol-fosfato é, no entanto, diferente nos dois tecidos. O próprio glicerol é a fonte <strong>de</strong><br />

ácido fosfatídico no fígado. Porém, no tecido adiposo, <strong>de</strong>vido à falta <strong>de</strong> glicerol quinase, a glicose é a fonte indireta <strong>de</strong><br />

glicerol, com o metabólito glicolítico di-hidroxiacetona fosfato sendo o seu precursor imediato (Fig. <strong>16</strong>.7). O <strong>armazenamento</strong><br />

<strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos no tecido adiposo ocorre, portanto, somente quando a glicólise está ativada, ou seja, no estado alimentado.


Fig. <strong>16</strong>.7 Síntese do triacilglicerol. Os triacilgliceróis (triglicerí<strong>de</strong>os) são sintetizados no fígado e no tecido adiposo. A fonte <strong>de</strong><br />

glicerol-3-P é diferente nos dois tecidos. No fígado é o glicerol, mas o tecido adiposo não possui ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> glicerol quinase. Neste, o<br />

glicerol-3-P é formado a partir do intermediário da glicólise, di-hidroxiacetona fosfato.<br />

Os triacilgliceróis produzidos no retículo endoplasmático liso do fígado não são armazenados ali, mas são conjugados<br />

com colesterol, fosfolipí<strong>de</strong>os e apolipoproteínas (também sintetizadas no retículo endoplasmático) para serem secretados na<br />

forma <strong>de</strong> lipoproteínas <strong>de</strong> muito baixa <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> (VLDL). As VLDL são então processadas no complexo <strong>de</strong> Golgi e<br />

liberadas na corrente sanguínea para captação por outros tecidos.<br />

Uma vez liberadas no sangue, as VLDL sofrem ação da lipoproteína lipase (LPL). Essa enzima é encontrada acoplada a<br />

glicoproteínas da membrana basal do endotélio capilar e é ativa tanto sobre VLDL quanto quilomícrons, sendo o último<br />

originado no intestino após a ingestão <strong>de</strong> alimentos ( <strong>Cap</strong>. 18). A natureza <strong>de</strong>ssa enzima é diferente <strong>de</strong> tecido para tecido: a<br />

isoenzima muscular possui um K m muito baixo para o substrato e, portanto, permite a utilização <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos da VLDL,<br />

para transdução <strong>de</strong> energia, mesmo em concentrações muito baixas. No adipócito, no entanto, a isoenzima possui um valor <strong>de</strong><br />

Km alto para o substrato e logo só é ativa em termos <strong>de</strong> captação <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos pelo tecido adiposo, quando as<br />

concentrações <strong>de</strong> VLDL e quilomícrons estão elevadas.<br />

No estado alimentado, quando o tecido adiposo está ativamente captando <strong>ácidos</strong> graxos a partir <strong>de</strong> lipoproteínas e os<br />

armazenando como triacilgliceróis, os adipócitos sintetizam LPL e a secretam nos capilares do tecido adiposo. Esse aumento<br />

na síntese e secreção <strong>de</strong> LPL é estimulado pela alta razão <strong>de</strong> insulina:glucagon observada na alimentação. Níveis elevados <strong>de</strong><br />

insulina também estimulam a captação <strong>de</strong> glicose pelo tecido adiposo e promovem a glicólise. Isso tem como efeito líquido a<br />

produção <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong>s aumentadas <strong>de</strong> glicerol, bem como facilita a síntese <strong>de</strong> triacilgliceróis no adipócito.


A insulina é um hormônio importante para a síntese e <strong>armazenamento</strong> <strong>de</strong> ácido graxo ( Fig. <strong>16</strong>.8). Ela promove a<br />

captação <strong>de</strong> glicose tanto no fígado quanto no tecido adiposo. No fígado, por aumentar os níveis <strong>de</strong> frutose-2,6-bifosfato, ela<br />

estimula a glicólise, aumentando assim a produção <strong>de</strong> piruvato. Ao estimular a <strong>de</strong>sfosforilação do complexo piruvato<br />

<strong>de</strong>sidrogenase e ativar essa enzima, a insulina promove a produção <strong>de</strong> acetil-CoA, estimulando assim o ciclo da TCA e<br />

aumentando os níveis <strong>de</strong> citrato que, por sua vez, através da estimulação da acetil-CoA carboxilase, aumentam a taxa <strong>de</strong><br />

síntese <strong>de</strong> ácido graxo (<strong>Cap</strong>. 21).<br />

Fig. <strong>16</strong>.8 Transporte e <strong>armazenamento</strong> da gordura em resposta à alimentação. Uma refeição estimula a secreção <strong>de</strong> insulina, e a<br />

insulina direciona o metabolismo <strong>de</strong> gorduras para a síntese e <strong>armazenamento</strong>. A insulina estimula a glicólise no fígado, aumentando<br />

<strong>de</strong>sse modo a produção <strong>de</strong> piruvato. Além disso, ela ativa o complexo piruvato <strong>de</strong>sidrogenase (por <strong>de</strong>sfosforilar a enzima) e, portanto,<br />

promove a síntese <strong>de</strong> acetil-CoA a partir do piruvato. Isso estimula o ciclo do TCA e gera citrato. O citrato por sua vez estimula a<br />

acetil-CoA carboxilase, aumentando a taxa <strong>de</strong> biossíntese <strong>de</strong> ácido graxo. DHAP, di-hidroxiacetona fosfato; Fru-1,6-BP, frutose-1,6bifosfato;<br />

Glc-6-P, glicose-6-fosfato; IDL, lipoproteína <strong>de</strong> <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> intermediária; TCA, ciclo do ácido tricarboxílico; VLDL,<br />

lipoproteína <strong>de</strong> muito baixa <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>. (Veja <strong>de</strong>talhes no capítulo 18 sobre o metabolismo <strong>de</strong> lipoproteínas; compare também com a<br />

Figura 21.11.)<br />

MUDANÇAS NA EXPRESSÃO ENZIMÁTICA EM RESPOSTA A INGESTÃO DE ALIMENTO<br />

REGULA O ARMAZENAMENTO DE SUBSTRATOS ENERGÉTICOS<br />

O estado alimentado está associado com a indução <strong>de</strong> enzimas que aumentam a síntese <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos no fígado. Um<br />

gran<strong>de</strong> grupo <strong>de</strong> enzimas são induzidas, incluindo aquelas envolvidas na glicólise, exemplo glicoquinase (forma hepática da<br />

hexoquinase) e piruvato quinase, assim como enzimas ligadas à produção aumentada <strong>de</strong> NADPH (Glc-6-P <strong>de</strong>sidrogenase, 6-<br />

P-gluconato <strong>de</strong>sidrogenase, e enzima málica). Além disso, existe expressão aumentada <strong>de</strong> citrato liase, acetil-CoA<br />

carboxilase, ácido graxo sintase, e Δ 9 <strong>de</strong>saturase.<br />

Além disso, no estado alimentado, existe concomitante uma repressão <strong>de</strong> enzimas chave envolvidas na gliconeogênese.<br />

Fosfoenolpiruvato carboxiquinase, glicose-6-P fosfatase (Glc-6-P-ase), e algumas aminotransferases encontram-se reduzidas<br />

em quantida<strong>de</strong>, ou por redução na síntese ou por aumento na <strong>de</strong>gradação (<strong>Cap</strong>. 21).


REGULAÇÃO DOS ESTOQUES DE GORDURA CORPORAL TOTAL<br />

O tecido adiposo é um órgão endócrino ativo<br />

Já se sabe há muito tempo que um aumento no consumo <strong>de</strong> energia sem um aumento a<strong>de</strong>quado no gasto <strong>de</strong> energia está<br />

associado com a obesida<strong>de</strong>, a qual é caracterizada por uma maior adiposida<strong>de</strong>, tanto em termos <strong>de</strong> número <strong>de</strong> adipócitos<br />

quanto <strong>de</strong> seu conteúdo <strong>de</strong> gordura. Está claro que o tecido adiposo, longe <strong>de</strong> ser um reservatório inerte, é hormonalmente<br />

ativo. Hormônios como leptina, adiponectina e resistina (conhecidas conjuntamente como adipocinas), fatores <strong>de</strong> crescimento<br />

como fator <strong>de</strong> crescimento do endotélio vascular e citocinas pró-inflamatórias como o fator <strong>de</strong> necrose tumoral α (TNF-α) e<br />

interleucina 6 (IL-6) são todos produzidos por adipócitos (<strong>Cap</strong>. 22).<br />

A quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leptina presente no sangue é proporcional à quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gordura corporal<br />

A principal molécula que <strong>de</strong>monstrou, até agora, conter informações sobre os estoques <strong>de</strong> gordura em um indivíduo é a<br />

leptina. Os níveis <strong>de</strong> leptina sinalizam a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tecido adiposo presente. Ela atravessa a barreira hematoencefálica,<br />

reduz o apetite e leva a um aumento no gasto energético. Animais <strong>de</strong>ficientes em leptina são obesos e letárgicos; a reposição<br />

<strong>de</strong> leptina nesses animais reverte essas características. No entanto, a maioria <strong>de</strong> indivíduos obesos possui altos níveis <strong>de</strong><br />

leptina sem que isso limite seu peso. Eles parecem ser resistentes ao efeito da leptina no sistema nervoso central, e a<br />

administração <strong>de</strong> leptina adicional não resulta na resolução das características clínicas e metabólicas da obesida<strong>de</strong>.<br />

ESTILO DE VIDA E OBESIDADE<br />

Um ex-soldado <strong>de</strong> infantaria do exército, <strong>de</strong> 48 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> (altura 1,91 m), apresentou problemas <strong>de</strong> ganho <strong>de</strong> peso<br />

nos últimos oito anos após sair do exército. No momento do seu afastamento da ativa, ele pesava 95 kg, mas no momento da<br />

consulta pesava 193 kg. Sua ocupação atual era motorista <strong>de</strong> caminhão. Ele negou qualquer mudança na dieta <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que saiu<br />

do exército, mas admitiu que pratica pouco ou nenhum exercício. Um questionamento <strong>de</strong>talhado indicou que sua dieta diária<br />

fornecia <strong>de</strong> 12.600 a <strong>16</strong>.800 kJ (3.000 e 4.000 kcal), com ingesta <strong>de</strong> gordura próxima dos 40%. O paciente foi inicialmente<br />

colocado em uma dieta saudável, com ingesta <strong>de</strong> gordura reduzida para 35% do total <strong>de</strong> calorias. Aconselharam-no a se<br />

exercitar e ele passou a nadar <strong>de</strong> três a quatro vezes por semana. Seu peso começou imediatamente a cair, rapidamente no<br />

início e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> 3-4 kg por mês, até se estabilizar em 145-150 kg. Ele foi colocado, então, em uma dieta rica em proteína, e<br />

pobre em carboidrato e gordura, levando ao retorno da perda <strong>de</strong> peso que durou por mais um ano, resultando em um peso<br />

final <strong>de</strong> 93 kg.<br />

Comentário. A obesida<strong>de</strong> vem crescendo em prevalência em muitas partes do mundo. A obesida<strong>de</strong> clínica está<br />

claramente <strong>de</strong>finida em termos <strong>de</strong> altura e peso através do índice <strong>de</strong> massa corporal (IMC), que é calculado dividindo-se o<br />

peso em quilogramas pelo quadrado da altura em metros (veja <strong>de</strong>talhes no capítulo 13):<br />

Um IMC <strong>de</strong> 25-30 kg/m 2 é classificado como sobrepeso ou obesida<strong>de</strong> grau I, IMC >30 kg/m 2 é dito obesida<strong>de</strong> clínica<br />

ou <strong>de</strong> grau II, e IMC >40 kg/m 2 é classificado como obesida<strong>de</strong> mórbida ou <strong>de</strong> grau III. Nosso paciente tinha um IMC <strong>de</strong> 53<br />

no momento da consulta caindo para 26 após dieta prolongada. Se o consumo <strong>de</strong> energia exce<strong>de</strong>r o gasto <strong>de</strong> energia por<br />

tempo prolongado então haverá ganho <strong>de</strong> peso. A obesida<strong>de</strong> predispõe a várias doenças. A mais importante é diabetes<br />

mellitus tipo 2: oitenta por cento dos casos <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> diabetes estão associados com a obesida<strong>de</strong>. Entre outras doenças<br />

associadas estão doença cardíaca coronariana, hipertensão, aci<strong>de</strong>nte vascular cerebral, artrite e doença <strong>de</strong> cálculos<br />

vesiculares (<strong>Cap</strong>. 22).<br />

Alguns agentes semelhantes a hormônios estão envolvidos nos estoques totais <strong>de</strong> gordura corporal<br />

Os níveis <strong>de</strong> insulina também são afetados pela quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gordura corporal, com o pâncreas endócrino secretando<br />

maiores quantida<strong>de</strong>s para compensar o fenômeno da resistência à insulina ( <strong>Cap</strong>. 21), que é observado particularmente na<br />

obesida<strong>de</strong> abdominal. Há uma relação complexa entre insulina, peso e estoques <strong>de</strong> gordura: já se <strong>de</strong>monstrou que a insulina<br />

possui um efeito supressor do apetite no sistema nervoso central, mas frequentemente causa ganho <strong>de</strong> peso em pessoas com<br />

diabetes que iniciam tratamento com injeções <strong>de</strong> insulina. Fisiologicamente, a insulina inibe a lipólise, e suas ações são<br />

influenciadas por outros hormônios liberados pelo tecido adiposo, como a adiponectina.<br />

O número <strong>de</strong> hormônios e marcadores celulares envolvidos na integração do balanço energético e dos estoques <strong>de</strong><br />

tecido adiposo está aumentando e suas inter-relações são complexas ( <strong>Cap</strong>s. 21 e 22). Isso é agravado pelo fato <strong>de</strong> esses<br />

mecanismos fisiológicos se integrarem e po<strong>de</strong>rem ser sobrepostos por fatores ambientais, sociais e comportamentais.


Resumo<br />

A síntese e <strong>armazenamento</strong> <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos são componentes essenciais da homeostase da energia do corpo.<br />

A lipogênese ocorre no citosol. Sua etapa-chave é a reação catalisada pela acetil-CoA carboxilase.<br />

O alongamento da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ácido graxo (até um comprimento <strong>de</strong> <strong>16</strong> átomos <strong>de</strong> carbono) é realizado pela ácido graxo<br />

sintase dimérica, que possui várias ativida<strong>de</strong>s enzimáticas. Ambas estão sujeitas a uma regulação complexa.<br />

A lança<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> malato facilita a transferência <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> 2 carbonos da mitocôndria para o citoplasma para serem<br />

usadas na lipogênese.<br />

O po<strong>de</strong>r redutor na forma <strong>de</strong> NADPH é suprido pela via da pentose fosfato e também pela lança<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> malato.<br />

Os <strong>ácidos</strong> graxos insaturados essenciais são o ácido linoleico e linolênico. O ácido linoleico é convertido em ácido<br />

araquidônico, que por sua vez serve como precursor <strong>de</strong> prostaglandinas.<br />

Sinais <strong>de</strong> adiposida<strong>de</strong> são fornecidos pelas adipocinas, particularmente a leptina. A insulina também é importante para a<br />

regulação da alimentação.<br />

QUESTÕES DE APRENDIZADO<br />

1. Descreva como uma ca<strong>de</strong>ia crescente <strong>de</strong> <strong>ácidos</strong> graxos é transferida entre as subunida<strong>de</strong>s da ácido graxo sintase.<br />

2. Como os eicosanoi<strong>de</strong>s são sintetizados?<br />

3. Explique por que a taxa <strong>de</strong> lipólise no estado <strong>de</strong> satisfação é baixa.<br />

4. Qual o papel das adipocinas?<br />

5. Descreva a etapa limitante da lipogênese e sua regulação.<br />

6. Quais são as fontes <strong>de</strong> acetil-CoA para a síntese <strong>de</strong> ácido graxo?<br />

7. Compare e contraste a lipogênese e a lipólise.<br />

Leituras sugeridas<br />

Angulo P. Nonalcoholic fatty liver disease. 2002;346:1221-1231.<br />

Lenz A, Diamond FB. Obesity: the hormonal milieu. 2008;15:9-20.<br />

Wynne K, Stanley S, McGowan B, Bloom S. Apetite control. 2005;184:291-318.

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