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Artigo Completo - Um Mundo de Experiências

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A linguagem visual das vinhetas da MTV como<br />

expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

The MTV spots visual language as an expression of postmo<strong>de</strong>rn culture<br />

Costa, Carla Cristina da; Ms; PUC-Rio<br />

carlacct@gmail.com<br />

Resumo<br />

O artigo apresenta e discute a relação existente entre a linguagem visual das vinhetas da MTV<br />

e as manifestações próprias da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna, através <strong>de</strong> uma análise <strong>de</strong> vinhetas<br />

selecionadas a partir da programação da emissora. Dessa forma, elementos próprios do mundo<br />

pós-mo<strong>de</strong>rno, como a fragmentação, a efemerida<strong>de</strong>, o pastiche e a quebra da narrativa, ficam<br />

evi<strong>de</strong>nciados nesses produtos do vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign.<br />

Palavras Chave: Vinheta, vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign, MTV, cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

Abstract<br />

The article presents and discusses the relationship between MTV spots visual language and<br />

the manifestations of the postmo<strong>de</strong>rn culture, through an analysis of selected spots from the<br />

TV channel programming. Thus, peculiar facts of the postmo<strong>de</strong>rn world, such as the<br />

fragmentation, ephemerality, pastiche and the breaking of the narrative, it will be expressed<br />

through these products of vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign.<br />

Keywords: Spot, vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign, MTV, postmo<strong>de</strong>rn culture


A linguagem visual das vinhetas da MTV como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

Introdução<br />

Este presente trabalho é baseado nos resultados finais obtidos durante a pesquisa que<br />

<strong>de</strong>senvolvi no Mestrado em Design na PUC-Rio, cujo título é “A linguagem visual das<br />

vinhetas da MTV: vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna” i<br />

. Tais resultados<br />

estão sendo divulgados pela primeira vez em artigo científico. Vale dizer que esse ano é<br />

especial para a MTV Brasil, já que a emissora comemora 20 anos <strong>de</strong> existência no país, no<br />

mês <strong>de</strong> outubro.<br />

O artigo está centrado nos resultados obtidos a partir da análise das vinhetas sob a ótica<br />

da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna, já que a relação do vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign com essa cultura já foi divulgado em<br />

outros artigos. Porém, antes <strong>de</strong> tal análise ser exposta, é importante ressaltar alguns pontos<br />

principais do projeto, que foram essenciais para embasar e dar corpo ao seu resultado final,<br />

capitaneado pelo estudo das vinhetas. Além disso, contribuirá para um melhor entendimento<br />

do trabalho.<br />

O principal objetivo da pesquisa foi mostrar a relação existente entre o vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign e a<br />

cultura pós-mo<strong>de</strong>rna, tendo como foco <strong>de</strong> estudo a linguagem visual das vinhetas da Music<br />

Television (MTV). Porém, a linguagem visual da emissora, que inclui programação, VJs,<br />

vi<strong>de</strong>oclipes, cenários, <strong>de</strong>ntre outros, também foi analisada para que se pu<strong>de</strong>sse enten<strong>de</strong>r<br />

melhor como a linguagem visual das vinhetas se constitui, já que está inserida <strong>de</strong>ntro do<br />

sistema visual adotado pela emissora, que atinge diferentes instâncias. Foi importante<br />

conhecer primeiro o universo no qual essa linguagem está imersa, repleto <strong>de</strong> elementos que se<br />

referem à cultura pós-mo<strong>de</strong>rna.<br />

<strong>Um</strong> dos assuntos que mais suscita discussões no âmbito acadêmico na atualida<strong>de</strong> é<br />

exatamente a cultura pós-mo<strong>de</strong>rna, com suas características, suas condições <strong>de</strong> surgimento e<br />

suas implicações éticas e estéticas. Os aspectos que são creditados por diferentes autores a<br />

esta cultura, como a multiplicida<strong>de</strong>, o pastiche, a efemerida<strong>de</strong>, a fragmentação, o<br />

consumismo, o resgate do passado, a <strong>de</strong>scartabilida<strong>de</strong>, a <strong>de</strong>scontinuida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ntre outras,<br />

refletiu-se nas mais diversas áreas econômicas, artísticas e sociais, incluindo o <strong>de</strong>sign.<br />

<strong>Um</strong>a das áreas <strong>de</strong> atuação do <strong>de</strong>sign mais privilegiada em expressar essa influência<br />

advinda da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna é o vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign, que representa o <strong>de</strong>sign gráfico voltado para<br />

o ví<strong>de</strong>o, principalmente para a televisão, tendo como um dos melhores exemplos a criação <strong>de</strong><br />

vinhetas televisivas. Algumas questões contribuem para isso, como o fato do vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign ter<br />

surgido quase simultaneamente à emergência da pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, ocorrida entre os anos 60 e<br />

70, juntamente com as inovações tecnológicas que apareceram na mesma época, como<br />

advento da computação gráfica.<br />

Além disso, o ambiente <strong>de</strong> criação do vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>signer, que utiliza o computador <strong>de</strong> forma<br />

maciça, através <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> edição e manipulação <strong>de</strong> imagens, faz com que esse<br />

profissional seja ao mesmo tempo produto e reprodutor da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna. As<br />

tecnologias computacionais criam recursos, como edição não-linear e modificação digital <strong>de</strong><br />

imagens, que contribuem para que o vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>signer consiga expressar graficamente as<br />

manifestações pós-mo<strong>de</strong>rnas presentes à sua volta, através da criação <strong>de</strong> imagens em<br />

movimento. Ou seja, com o uso do sistema “copy-cut-mix-edit” dos softwares <strong>de</strong> edição e<br />

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A linguagem visual das vinhetas da MTV como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

manipulação <strong>de</strong> imagens, o vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>signer projeta objetos gráficos repletos <strong>de</strong> influências da<br />

cultura pós-mo<strong>de</strong>rna, da qual a MTV participa.<br />

A linguagem visual da MTV, um canal <strong>de</strong> televisão voltado para música e<br />

entretenimento, possui lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque na reprodução da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna, já que a<br />

emissora, como meio <strong>de</strong> comunicação <strong>de</strong> massa, é parte integrante da indústria cultural,<br />

divulgada por Adorno e Horkheimer, fazendo uso dos principais artifícios atribuídos a esta<br />

indústria para gerar lucros e chamar a atenção <strong>de</strong> sua audiência, prioritariamente jovem.<br />

As vinhetas da MTV aparecem como um dos principais elementos representativos da<br />

linguagem da emissora, conseguindo exprimir graficamente aspectos da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

incorporados pela MTV. O alto grau <strong>de</strong> experimentação, com o uso <strong>de</strong> edição não-linear,<br />

associado às vinhetas da emissora, incentiva a tradução <strong>de</strong> aspectos que participam do mundo<br />

pós-mo<strong>de</strong>rno, como a fragmentação e a transitorieda<strong>de</strong>. As vinhetas seriam também<br />

importantes objetos <strong>de</strong> estudo em relação ao <strong>de</strong>sign pós-mo<strong>de</strong>rno, apresentando as principais<br />

características que são atreladas a este <strong>de</strong>sign, que naturalmente é muito influenciado pela<br />

cultura no qual está inserido.<br />

Em relação à metodologia da pesquisa, não foi aplicada uma metodologia previamente<br />

estabelecida, mas houve a construção <strong>de</strong> um procedimento metodológico no <strong>de</strong>correr da<br />

própria pesquisa. Ao mesmo tempo em que realizava a pesquisa bibliográfica sobre as teorias<br />

e os autores que discutem a pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, busquei apreen<strong>de</strong>r as características sensíveis<br />

que permeiam a cultura pós-mo<strong>de</strong>rna, como a fragmentação, a efemerida<strong>de</strong>, o pastiche e<br />

outras que já foram indicadas. De maneira gradativa, observei que estas características<br />

correspondiam a <strong>de</strong>terminados processos e efeitos utilizados e obtidos na produção <strong>de</strong><br />

vi<strong>de</strong>oclipes e nas criações do vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign, po<strong>de</strong>ndo ser citadas a colagem, a superposição <strong>de</strong><br />

imagens, a quebra da narrativa, <strong>de</strong>ntre outros. A partir disso, procurei evi<strong>de</strong>nciar através da<br />

análise das vinhetas da MTV, a presença <strong>de</strong>sses processos e <strong>de</strong>stes efeitos, relacionando-os<br />

com as características da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna.<br />

A pesquisa contou com uma extensa bibliografia, que não inclui apenas obras <strong>de</strong> autores<br />

que falam sobre o pós-mo<strong>de</strong>rno, mas também teóricos que discutem outros assuntos<br />

importantes relacionados a este trabalho, como a comunicação e a história do <strong>de</strong>sign. Além<br />

disso, vários artigos e matérias publicados em revistas, jornais e anais <strong>de</strong> eventos compõem o<br />

material bibliográfico. A dissertação também se baseou em entrevistas e <strong>de</strong>poimentos com<br />

profissionais vinculados à MTV Brasil ou que já trabalharam para o canal, e em uma pesquisa<br />

<strong>de</strong> campo na própria MTV Brasil, que permitiu um conhecimento mais apurado do ambiente<br />

<strong>de</strong> criação das vinhetas da emissora. A MTV Brasil inclusive forneceu parte das peças<br />

audiovisuais que foram analisadas. Outras vinhetas foram captadas através <strong>de</strong> recursos<br />

próprios, via computador ou VHS.<br />

As vinhetas da MTV: IDs, PIs, MPs, <strong>de</strong> abertura e SUPs<br />

Antes <strong>de</strong> analisar as vinhetas da MTV selecionadas para a pesquisa, é importante<br />

conhecer melhor seu processo <strong>de</strong>ntro da emissora, que inclui o estabelecimento <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>terminados termos e categorias que classificam as vinhetas, <strong>de</strong> acordo com o objetivo<br />

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A linguagem visual das vinhetas da MTV como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

proposto. A MTV possui um <strong>de</strong>partamento chamado Promo que se subdivi<strong>de</strong> em Promo,<br />

usando o mesmo nome do <strong>de</strong>partamento geral, e Gráficos. O Promo faz as chamadas dos<br />

programas, as vinhetas Promo-Imagem (PI), Marketing-Point (MP) e os SUPs, serviços <strong>de</strong><br />

utilida<strong>de</strong> pública, como as campanhas <strong>de</strong> Aids e <strong>de</strong> conscientização política. Já o Gráficos<br />

<strong>de</strong>senvolve as vinhetas <strong>de</strong> abertura dos programas, os IDs e gráficos <strong>de</strong> apoio para a<br />

programação.<br />

Vinheta ID<br />

A maior parte das vinhetas IDs é <strong>de</strong> curta duração, variando entre 10 a 15 segundos.<br />

Geralmente têm como conteúdo principal o logotipo da emissora associado a algum tipo <strong>de</strong><br />

animação ou a uma pequena história criada pelos redatores. O objetivo principal é i<strong>de</strong>ntificar<br />

a emissora e fixar a marca da MTV na mente dos telespectadores.<br />

Com gran<strong>de</strong> nível <strong>de</strong> experimentação visual, as vinhetas ID utilizam diferentes técnicas<br />

<strong>de</strong> animação e incluem o logotipo da MTV nas mais diferentes situações. O logotipo po<strong>de</strong><br />

ganhar formas apropriadas para se transformar no invasor <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong>, no melhor estilo<br />

King Kong, ou então aparecer na ban<strong>de</strong>ira fincada por um astronauta na Lua. Nessas vinhetas<br />

aparecem as diversas mutações sofridas pela marca, que a tornaram célebre, com direito à<br />

exibição <strong>de</strong> diferentes texturas, cores e até formas, embora consiga manter um alto grau <strong>de</strong><br />

reconhecimento junto ao público.<br />

Figura 1 – Vinheta ID com a marca da MTV em estilo “King Kong”,<br />

invadindo uma cida<strong>de</strong><br />

As vinhetas ID criadas pela MTV Brasil são na sua maioria baseadas em diversos tipos<br />

<strong>de</strong> experimentações com imagens abstratas ou figurativas, mesclando diferentes técnicas <strong>de</strong><br />

animação e vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign. O uso <strong>de</strong> pessoas durante as vinhetas não é muito comum. Na maior<br />

parte das vezes os personagens são <strong>de</strong>senhados, havendo apenas uma música e/ou efeitos<br />

sonoros ao fundo.<br />

Há uma constante troca <strong>de</strong> vinhetas ID entre as diversas filiais da MTV, promovendo um<br />

certo intercâmbio cultural e estético, já que cada localida<strong>de</strong> possui suas peculiarida<strong>de</strong>s e<br />

diferentes maneiras <strong>de</strong> criar. Essa troca acaba sendo proveitosa para os próprios<br />

vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>signers da MTV, que têm a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se reciclar, através do conhecimento dos<br />

trabalhos <strong>de</strong>senvolvidos por profissionais <strong>de</strong> várias partes do mundo, incluindo Índia, Rússia e<br />

Argentina.<br />

“Nós temos uma troca muito saudável <strong>de</strong> promos, <strong>de</strong> vinhetas. Nos comunicamos com<br />

os <strong>de</strong>partamentos promo <strong>de</strong> todos os lugares do mundo. A gente faz reuniões anuais, a gente<br />

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assiste, troca, elogia. Da mesma maneira acontece com a programação. A gente recebe <strong>de</strong><br />

todo lugar do mundo e a gente manda os nossos. Tem programa nosso que serviu <strong>de</strong> exemplo<br />

para programas estrangeiros e vice-versa”. ii<br />

Vinhetas PI e MP<br />

As vinhetas PI (Promo-Imagem), também buscam promover a imagem da MTV, mas <strong>de</strong><br />

forma mais publicitária, ligada ao marketing, a uma campanha e ao self promotion, e<br />

geralmente estão associadas a algum tipo <strong>de</strong> piada ou a uma pequena história <strong>de</strong> cunho<br />

absurdo e inusitado, incluindo pessoas, o que difere um pouco da ID.<br />

Essas pequenas narrativas com enredo nonsense po<strong>de</strong>m ser feitas com <strong>de</strong>senho animado<br />

ou a participação <strong>de</strong> pessoas representando personagens, como será visto na análise. Além<br />

disso, essas vinhetas têm a tendência <strong>de</strong> serem mais longas, po<strong>de</strong>ndo chegar a 2 minutos ou<br />

mais, embora a duração <strong>de</strong> 30 segundos a um minuto seja a mais comum. Porém, o tempo não<br />

é exatamente o parâmetro i<strong>de</strong>al para <strong>de</strong>terminar se uma vinheta é Promo-Imagem ou não,<br />

segundo o ex-<strong>de</strong>signer da MTV Carlos Bêla. iii<br />

Outra característica marcante é que as PIs geralmente estão relacionadas a uma<br />

campanha publicitária <strong>de</strong>senvolvida para a MTV, que inclui a criação <strong>de</strong> um pacote <strong>de</strong><br />

vinhetas com uma unida<strong>de</strong> visual entre si. Quando estão ligadas a um slogan que é repetido ao<br />

final <strong>de</strong> cada uma <strong>de</strong>las junto com o logo da emissora são chamadas <strong>de</strong> vinhetas MP<br />

(Marketing-Point). <strong>Um</strong>a <strong>de</strong>ssas vinhetas, que tinha como slogan a frase “Better than<br />

anything” (Melhor do que qualquer coisa), mostrava duas amigas que não conseguiam se<br />

divertir em nenhum dos programas que faziam juntas, chegando à conclusão no final que o<br />

melhor seria ir para a casa assistir à MTV.<br />

Vinheta <strong>de</strong> abertura<br />

As vinhetas <strong>de</strong> abertura po<strong>de</strong>m ou não contar com elementos simbólicos que estejam<br />

relacionados ao conteúdo do programa, embora seja comum i<strong>de</strong>ntificarmos elementos <strong>de</strong><br />

inspiração nas vinhetas a partir dos programas para os quais foram criados. Se o programa é<br />

voltado para namoro, é bem provável que a vinheta seja um pouco mais romântica, e caso a<br />

vinheta seja <strong>de</strong>stinada a um programa <strong>de</strong> esportes, a tendência é que seja mais veloz e<br />

dinâmica.<br />

Vários recursos são utilizados na criação das vinhetas <strong>de</strong> abertura como “colagens,<br />

aquarelas, massinhas <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>lagem, <strong>de</strong>senho <strong>de</strong> animação, sucatas, plantas, texturas,<br />

fragmentos <strong>de</strong> cenas” e também uma trilha sonora compatível com a atração (PEDROSO in<br />

Pedroso & Martins, 2006, p.114). Segundo o gerente do Departamento <strong>de</strong> Promo da MTV,<br />

Rodrigo Pimenta, embora os outros tipos <strong>de</strong> vinheta possuam na maioria das vezes um roteiro<br />

escrito, no caso das vinhetas <strong>de</strong> abertura, geralmente é feito diretamente um storyboard,<br />

estando mais centrada na questão visual para sua realização.<br />

Algumas vinhetas <strong>de</strong> abertura contam com a presença do VJ que apresenta o programa<br />

ao qual ela se refere. Há também muitos movimentos <strong>de</strong> câmera, imagens editadas <strong>de</strong> forma<br />

veloz e fragmentada, mudança constante <strong>de</strong> planos, e outros recursos comuns à linguagem<br />

visual adotada pela MTV, inspirada na sua matéria-prima principal: o vi<strong>de</strong>oclipe. Essas<br />

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características semelhantes, como a falta <strong>de</strong> narrativa e o privilégio do significante sobre o<br />

significado, geralmente são responsáveis pelas expressões pós-mo<strong>de</strong>rnas que po<strong>de</strong>m ser<br />

encontradas na vinheta.<br />

“Pans, tilts, zoom, travelling <strong>de</strong> aproximação e <strong>de</strong> afastamento, câmera ‘nervosa’ na<br />

mão e em steadycam, personagem em movimento, variação <strong>de</strong> luzes, efeitos <strong>de</strong><br />

distorção <strong>de</strong> objetos e <strong>de</strong> personagens com teleobjetiva ou gran<strong>de</strong> angular são<br />

elementos <strong>de</strong> apoio que auxiliam na criação daquilo que se convencionou chamar <strong>de</strong><br />

padrão MTV Brasil <strong>de</strong> imagem” (TAVEIRA in Pedroso & Martins, 2006, p.53).<br />

Vinheta SUP<br />

A vinheta <strong>de</strong> Serviço <strong>de</strong> Utilida<strong>de</strong> Pública, a SUP, tratam <strong>de</strong> assuntos controversos como<br />

Aids, sexo, corrupção, política e drogas, mas <strong>de</strong> uma forma <strong>de</strong>scontraída, para se comunicar<br />

<strong>de</strong> forma eficiente com sua jovem audiência. Algumas vinhetas SUPs ganharam gran<strong>de</strong><br />

repercussão entre o público e na própria imprensa em função <strong>de</strong> sua originalida<strong>de</strong>. A<br />

linguagem visual das SUPs segue a mesma <strong>de</strong>monstrada nas <strong>de</strong>mais categorias <strong>de</strong> vinheta:<br />

cortes rápidos, ângulos inusitados e imagens entrecortadas que transmitem rapi<strong>de</strong>z e<br />

dinamismo.<br />

Segundo Rodrigo Pimenta iv<br />

, as vinhetas SUPs são criadas seguindo um calendário<br />

interno anual <strong>de</strong>signado pelo Departamento <strong>de</strong> Promo. Neste calendário são estabelecidas<br />

cerca <strong>de</strong> quatro ou cinco datas, nas quais o <strong>de</strong>partamento irá <strong>de</strong>senvolver campanhas, sendo a<br />

mais fixa <strong>de</strong>las a <strong>de</strong>stinada ao “Dia Mundial <strong>de</strong> Combate à Aids”, que acontece no dia<br />

primeiro <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro. Existem também as vinhetas SUPS “expressas”, que exibem os<br />

<strong>de</strong>poimentos <strong>de</strong> jovens, pessoas comuns, sobre <strong>de</strong>terminados assuntos, e que po<strong>de</strong>m ser<br />

gravados nas ruas <strong>de</strong> São Paulo ou em outra localida<strong>de</strong>. Rodrigo fornece o exemplo <strong>de</strong><br />

vinhetas expressas feitas para o “Fórum Social Mundial”, em Porto Alegre, nas quais<br />

apareciam <strong>de</strong>poimentos colhidos entre os participantes do evento.<br />

A mensagem contida em uma vinheta SUP busca sempre soar o menos autoritária<br />

possível, para tentar firmar um diálogo franco e cúmplice com o jovem. “A expressão é ‘Se<br />

Liga’ em vez <strong>de</strong> ‘Não faça isso’” (CANEVACCI et al, in Pedroso & Martins, 2006, p.67).<br />

Dessa forma, a MTV assume o seu papel <strong>de</strong> “amiga”, tentando não adotar o excesso <strong>de</strong><br />

didatismo e serieda<strong>de</strong> da maior parte das campanhas do Governo, que po<strong>de</strong>riam associá-la à<br />

figura <strong>de</strong> um “pai” opressor. Em nenhum momento a emissora preten<strong>de</strong> parecer doutrinária.<br />

Em 2004, estreou na MTV uma das campanhas que mais repercutiu na imprensa e entre<br />

os jovens: a vinheta “Desligue a TV e vá ler um livro”. O que poucos sabem é que esta<br />

vinheta foi uma encomenda feita pelo próprio presi<strong>de</strong>nte da MTV Brasil ao Departamento <strong>de</strong><br />

Promo/Gráficos. Com a entrada da vinheta no ar, aparecia uma tela preta, com a frase que <strong>de</strong>u<br />

nome à peça, escrita em letras brancas. Essa campanha tinha como objetivo incentivar a<br />

leitura entre os jovens. Inicialmente a vinheta tinha 30 segundos, mas <strong>de</strong>pois foi estendida<br />

para 15 minutos, o que é uma marca consi<strong>de</strong>rável na televisão.<br />

"Nas duas primeiras semanas da campanha, mais <strong>de</strong> 200 mil telespectadores <strong>de</strong>sligaram<br />

a TV. Se foram realmente ler um livro eu não sei", diz André Mantovani, diretor geral da<br />

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MTV Brasil (Valor Econômico, 2005). Vale dizer também que a campanha agradou aos<br />

jovens, pais, editores <strong>de</strong> livros e ONGs ligadas à educação, que elogiaram bastante essa<br />

iniciativa da MTV.<br />

Figura 2 – Vinheta SUP “Desligue a TV e vá ler um livro”<br />

A cultura pós-mo<strong>de</strong>rna expressa nas vinhetas selecionadas<br />

As vinhetas da MTV analisadas em relação a elementos presentes na cultura pósmo<strong>de</strong>rna<br />

foram selecionadas <strong>de</strong> acordo com a metodologia <strong>de</strong>scrita na introdução do presente<br />

artigo. Como já foi mencionado, a linguagem visual do vi<strong>de</strong>oclipe influenciou <strong>de</strong> forma<br />

proeminente aquela exibida pelas vinhetas da emissora, assim como também o próprio cinema<br />

e a televisão. No caso das vinhetas da MTV essa inspiração ocorreu também em função do<br />

formato da programação da emissora, que <strong>de</strong>dica um espaço razoável à exibição <strong>de</strong><br />

vi<strong>de</strong>oclipes, embora tenha diminuído bastante ao longo do tempo.<br />

Gran<strong>de</strong> parte dos autores que estudam a área audiovisual observa as manifestações pósmo<strong>de</strong>rnas<br />

presentes no vi<strong>de</strong>oclipe, mas não fazem qualquer tipo <strong>de</strong> estudo específico sobre a<br />

expressão <strong>de</strong> tais manifestações na vinheta. Portanto, em alguns casos, embora os autores que<br />

são citados estejam se referindo ao vi<strong>de</strong>oclipe, será possível perceber facilmente o quanto tais<br />

conceitos também po<strong>de</strong>m ser aplicáveis à linguagem visual da vinheta.<br />

É importante também dizer que as manifestações pós-mo<strong>de</strong>rnas que são analisadas nas<br />

vinhetas selecionadas são recorrentes em outras vinhetas da emissora, estando longe <strong>de</strong> serem<br />

exemplos únicos e isolados. As vinhetas escolhidas apenas auxiliam na i<strong>de</strong>ntificação e<br />

ilustração <strong>de</strong> parte das expressões pós-mo<strong>de</strong>rnas presentes na linguagem visual da MTV.<br />

A seguir serão analisados exemplos <strong>de</strong> vinhetas <strong>de</strong> duas categorias: vinhetas <strong>de</strong> abertura<br />

e vinhetas IDs, com alguns exemplos <strong>de</strong> vinhetas Promo-Imagem (PI) inseridas durante<br />

algumas análises. Até por seu alto grau <strong>de</strong> experimentação, as vinhetas ID são as que exibem<br />

mais características relacionadas à cultura pós-mo<strong>de</strong>rna, e por isso mesmo também foram<br />

privilegiadas na análise em relação às outras categorias.<br />

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Vinhetas dos programas Top Top e Piores clipes do mundo<br />

A primeira vinheta analisada faz parte do programa Top Top, apresentado pelos VJs<br />

Marina Person e Léo Ma<strong>de</strong>ira. O Top Top continua sendo exibido pela emissora, mas já<br />

possui outra vinheta. O programa apresenta toda a semana uma parada Top 10 com temas<br />

inusitados ligados ao mundo musical, como as melhores parcerias já realizadas entre dois<br />

músicos ou as maiores brigas já travadas entre duas bandas.<br />

Figura 3 – Vinheta <strong>de</strong> abertura do programa Top Top<br />

A vinheta do programa foi <strong>de</strong>senvolvida pelo vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>signer Carlos Bêla, que trabalhou<br />

na MTV durante cinco anos e atualmente está na Lobo Filmes. O tema principal <strong>de</strong>ssa vinheta<br />

<strong>de</strong> abertura é um circo <strong>de</strong> pulgas, on<strong>de</strong> cada um dos insetos tem uma função que po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong><br />

equilibrista, <strong>de</strong> trapezista e <strong>de</strong> engolidor <strong>de</strong> espadas.<br />

Existe a vinheta principal que abre e fecha o programa, com um mix <strong>de</strong> todas as ações<br />

executadas pelas pulgas e há também os bumpers v<br />

numéricos <strong>de</strong> 1 a 10, que são exibidos<br />

durante o programa, cada vez que é anunciada uma posição no Top 10. Nestes bumpers<br />

aparece apenas uma das ativida<strong>de</strong>s exercidas pelos insetos. Existem dois tipos <strong>de</strong> bumper: o<br />

bumper in que é o começo do bloco do programa e o bumper out que é a saída para o break<br />

comercial. Mas o termo acaba também sendo utilizado em outras ocasiões, como acontece no<br />

Top Top, <strong>de</strong>vido à reduzida dimensão <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> vinheta.<br />

Figura 4 – Bumpers numéricos da vinheta <strong>de</strong> abertura do programa Top Top<br />

<strong>Um</strong>a das características mais presentes nesta vinheta é o resgate <strong>de</strong> elementos do<br />

passado, com referências aos antigos circos que peregrinavam entre as cida<strong>de</strong>s no começo do<br />

século XX. Quando assistimos à vinheta é como se fizéssemos uma viagem no tempo,<br />

embalados pelo típico tema circense da trilha sonora utilizada nessa época. As imagens<br />

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receberam um tratamento <strong>de</strong> “envelhecimento” e vários grafismos utilizados remetem ao<br />

circo tradicional, como o uso <strong>de</strong> estrelas e listras. As ativida<strong>de</strong>s circences escolhidas para as<br />

pulgas executarem também são aquelas mais antigas, como a do mágico, a do equilibrista e a<br />

do homem-bala, que diferem bastante das rebuscadas performances apresentadas por gran<strong>de</strong>s<br />

circos da contemporaneida<strong>de</strong>, como o Cirque du Soleil. O clima <strong>de</strong> nostalgia é presente em<br />

toda a peça, fabricando sensações ilusórias <strong>de</strong> que aquela suposta “boa época” dos circos,<br />

produzida em cima <strong>de</strong> imagens estereotipadas, não volta mais.<br />

“Essa abordagem (...) do pastiche do passado estereotípico, empresta à realida<strong>de</strong><br />

presente, e à abertura da história presente, o encanto e a distância <strong>de</strong> uma miragem<br />

reluzente. Entretanto essa mesma modalida<strong>de</strong> estética hipnótica emerge como a<br />

elaboração <strong>de</strong> um sintoma do esmaecimento <strong>de</strong> nossa historicida<strong>de</strong>, da possibilida<strong>de</strong><br />

vivenciada <strong>de</strong> experimentar a história ativamente” (JAMESON, 2002, p.48).<br />

Embora a continuida<strong>de</strong> histórica tenha sido aniquilada pela negação da idéia <strong>de</strong><br />

progresso, a tentativa <strong>de</strong> resgatar as “raízes” do passado é paradoxalmente algo muito<br />

presente na atualida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> uma forma ou <strong>de</strong> outra acaba proporcionando a geração <strong>de</strong> mais<br />

mercadorias para a indústria cultural. A vinheta não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser um produto a serviço <strong>de</strong> tal<br />

indústria. “A busca <strong>de</strong> raízes termina, na pior das hipóteses, sendo produzida e vendida como<br />

imagem, como um simulacro ou pastiche (comunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> imitação construídas para evocar<br />

imagens <strong>de</strong> algum passado agradável)” (HARVEY, 1989, p.273).<br />

O próprio circo <strong>de</strong> pulgas produzido para a vinheta, através <strong>de</strong> recursos <strong>de</strong> animação,<br />

não correspon<strong>de</strong> à realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um verda<strong>de</strong>iro circo <strong>de</strong>sse tipo, não sendo uma representação,<br />

mas uma simulação. “É para esses objetos que <strong>de</strong>vemos reservar a concepção <strong>de</strong> Platão do<br />

‘simulacro’, a cópia idêntica <strong>de</strong> algo cujo original jamais existiu” (JAMESON, 2002, p.45).<br />

Os circos <strong>de</strong> pulgas “reais” foram muito populares nas primeiras décadas do século XX,<br />

existindo até hoje amestradores no interior do país. As pulgas executavam ativida<strong>de</strong>s bem<br />

menos “perigosas” e viáveis do que as mostradas na vinheta, como dançar e empurrar um<br />

carrinho, <strong>de</strong> acordo com os comandos <strong>de</strong> seu amestrador.<br />

O circo <strong>de</strong> pulgas também não guarda nenhuma relação direta com o tema do programa,<br />

havendo apenas uma associação remota entre os “<strong>de</strong>z incríveis números <strong>de</strong> circo” realizados<br />

pelas pulgas e as “<strong>de</strong>z performances” exibidas durante o programa, <strong>de</strong> acordo com o tema da<br />

edição, conforme argumenta Rodrigo Pimenta, gerente do Departamento <strong>de</strong> Promo da MTV,<br />

que achou a princípio absurda a idéia proposta por Carlos Bêla, mas resolveu <strong>de</strong>ixá-lo<br />

<strong>de</strong>senvolver o projeto para ver o resultado final, que acabou suprindo as expectativas do<br />

gerente.<br />

A partir <strong>de</strong>sse fato, po<strong>de</strong>-se perceber também o caráter nonsense presente na vinheta e<br />

também muito recorrente em outras vinhetas da MTV. Como um típico produto da cultura<br />

pós-mo<strong>de</strong>rna, a vinheta não preten<strong>de</strong> realmente produzir algum tipo <strong>de</strong> sentido específico ou<br />

ser auto-explicativa. Com o fim das gran<strong>de</strong>s narrativas, a superficialida<strong>de</strong> e a pura ironia, sem<br />

maiores intenções, ganharam espaço nos mais diferentes âmbitos.<br />

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A linguagem visual das vinhetas da MTV como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

“Talvez haja um consenso quanto a dizer que o artefato pós-mo<strong>de</strong>rno típico é<br />

travesso, auto-ironizador e até esquizói<strong>de</strong>; e que ele reage à austera autonomia do<br />

alto mo<strong>de</strong>rnismo ao abraçar impru<strong>de</strong>ntemente a linguagem do comércio e da<br />

mercadoria. Sua relação com a tradição cultural é <strong>de</strong> pastiche irreverente, e sua falta<br />

<strong>de</strong> profundida<strong>de</strong> intencional solapa todas as solenida<strong>de</strong>s metafísicas, por vezes<br />

através <strong>de</strong> uma brutal estética da sordi<strong>de</strong>z e do choque” (EAGLETON, 1987 apud<br />

HARVEY, 1989, p.19).<br />

Outra vinheta que representa bem essas consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong> Eagleton é a que já fez<br />

parte do extinto programa Os piores clipes do mundo, apresentado pelo VJ Marcos Mion. O<br />

programa se baseava na ridicularização <strong>de</strong> clipes selecionados por Mion a cada edição. O<br />

apresentador imitava os trejeitos que os astros musicais fazem nos clipes e apontava erros <strong>de</strong><br />

gravação ou então situações que ele julgava “absurdas” <strong>de</strong> aparecerem em um vi<strong>de</strong>oclipe.<br />

Seguindo o clima do programa, a “auto-ironia”, a ridicularização e o nonsense também<br />

são os pontos-chave <strong>de</strong>sta vinheta. <strong>Um</strong> senhor <strong>de</strong> bengala ensina ao telespectador, <strong>de</strong> modo<br />

totalmente irônico, a como criar um vi<strong>de</strong>oclipe. “Bom dia, você sabe como fazer um<br />

vi<strong>de</strong>oclipe? É muito simples. Escolha um personagem, posicione-o em algum local. Adicione<br />

belas transições. Coloque algo bonito na imagem. Não esqueça os efeitos especiais.<br />

Excelente”. Conforme o senhor vai dizendo essas frases, vão aparecendo atrás <strong>de</strong>le imagens<br />

correspon<strong>de</strong>ntes e ele mesmo recebe efeitos especiais. Quando ele fala, por exemplo, sobre as<br />

transições e os efeitos especiais, aparecem vários <strong>de</strong>les no chroma-key, mas todos em estilo<br />

exagerado e kitsch. Dessa forma, o senhor na verda<strong>de</strong> expressa tudo aquilo que não <strong>de</strong>ve<br />

constar em um vi<strong>de</strong>oclipe, por ser <strong>de</strong> mau gosto, o que remete diretamente ao título do<br />

programa. Mas o discurso irônico dissimula um pouco essa intenção.<br />

Figura 5 – Vinheta <strong>de</strong> abertura do programa Piores Clipes do <strong>Mundo</strong><br />

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A linguagem visual das vinhetas da MTV como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

Segundo Alan Wil<strong>de</strong>, a ironia pós-mo<strong>de</strong>rna po<strong>de</strong>ria ser chamada <strong>de</strong> “suspensiva”, tendo<br />

como característica principal o aumento da consciência <strong>de</strong> incoerência que começou no<br />

mo<strong>de</strong>rnismo, “chegando ao ponto em que esta parece não mais po<strong>de</strong>r ser controlada e contida<br />

mesmo nas estruturas or<strong>de</strong>nadoras do estético; ao lado disso há um <strong>de</strong>clínio da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m, reduzindo-se, em conseqüência, a intensida<strong>de</strong> organizacional” (CONNOR, 2000,<br />

p.97).<br />

Assim como a pastiche, a ironia pós-mo<strong>de</strong>rna não tem nenhuma intenção <strong>de</strong> fazer<br />

alguma crítica séria ao assunto ao qual ela se dirige. Com a ironia, o indivíduo que vivencia o<br />

pós-mo<strong>de</strong>rno lança um olhar cínico sobre <strong>de</strong>terminada situação, sem qualquer pretensão <strong>de</strong><br />

modificá-la. De acordo com Wil<strong>de</strong>, “uma in<strong>de</strong>cisão quanto aos significados ou relação das<br />

coisas é compensada por uma propensão a viver na incerteza, a tolerar e, em alguns casos, a<br />

dar boas-vindas a um mundo visto como aleatório e múltiplo, e até, por vezes, absurdo. (...)<br />

<strong>Um</strong> mundo que precisa <strong>de</strong> conserto é substituído por um mundo além do reparo” (WILDE,<br />

1981 apud CONNOR, 2000, p.97).<br />

Vinhetas dos programas Gordo a go-go e Daniella no país da<br />

MTV<br />

O programa Gordo a go-go, apresentado pelo VJ João Gordo e que não está mais no<br />

ar, possuía como mote principal entrevistas com pessoas famosas, que não se importavam<br />

com perguntas inusitadas e com o humor “escrachado” próprio do músico/apresentador. Na<br />

verda<strong>de</strong>, o programa já contou com algumas vinhetas <strong>de</strong> abertura, mas uma <strong>de</strong>las chamou<br />

atenção especialmente.<br />

A vinheta lembra em muito a linguagem fragmentada e veloz que costuma estar<br />

presente nas vinhetas IDs da emissora. Muitos elementos que são mostrados durante a<br />

vinheta, simplesmente não po<strong>de</strong>m ser captados pela visão, a não ser que se use o recurso <strong>de</strong><br />

câmera lenta, para conseguir apreen<strong>de</strong>r todos os <strong>de</strong>talhes. A mudança <strong>de</strong> planos e quadros é<br />

frenética e as informações gráficas que compõem a vinheta são muito diversificadas,<br />

incluindo ovelhas, uma mosca, dois homens fazendo um duelo <strong>de</strong> armas e dicas para<br />

emagrecer. Todos os objetos que aparecem são <strong>de</strong>senhados e animados. Há o uso <strong>de</strong> várias<br />

interferências visuais, ruídos, sujeiras e imagens fragmentadas.<br />

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A linguagem visual das vinhetas da MTV como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

Figura 6 – Vinheta <strong>de</strong> abertura do programa Gordo a go-go<br />

Segundo Rodrigo Pimenta, nenhuma das vinhetas é feita <strong>de</strong> modo aleatório, a não ser<br />

que a própria aleatorieda<strong>de</strong> seja o conceito da vinheta. “Vou fazer uma vinheta totalmente<br />

aleatória: entro nos computadores dos caras (<strong>de</strong>signers que trabalham no Promo) e acho uma<br />

imagem que começa com a letra P e monto uma vinheta com as 12 imagens. Mas não tem<br />

nada que seja gratuito, as coisas não aparecem sozinhas na tela do computador”, ressalta<br />

Rodrigo. vi<br />

No caso das vinhetas <strong>de</strong> abertura, há sempre uma tentativa <strong>de</strong> fazer referência ao<br />

programa ao quais estão associadas, por mais que tal associação só acabe sendo percebida<br />

pelo próprio vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>signer e seus colegas <strong>de</strong> trabalho. Na verda<strong>de</strong>, a falta <strong>de</strong> sentido na<br />

vinheta está diretamente relacionada à ausência <strong>de</strong> narrativa na maior parte <strong>de</strong>ssas peças<br />

gráficas, sendo análoga a muitos vi<strong>de</strong>oclipes da atualida<strong>de</strong>.<br />

“O clipe é, muitas vezes, exatamente isso: um rio que corre sem leito, ou seja, um<br />

emaranhado <strong>de</strong> correntezas, por vezes, em direções contrárias, sem uma idéia central<br />

que justifique a existência <strong>de</strong> seus mais diversos elementos ou sequer, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> eles<br />

possam partir; ao contrário, a sensação é <strong>de</strong> que os elementos pipocam aqui e ali”<br />

(CARVALHO, 2002, p.10).<br />

Cada um dos elementos que vão aparecendo na tela possui seu próprio discurso, sem<br />

haver necessariamente a criação <strong>de</strong> um fio condutor <strong>de</strong> sentido que conecte todos eles.<br />

Mesmo que se refiram a aspectos do programa, o fazem <strong>de</strong> maneira in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte um do outro<br />

e <strong>de</strong> formas diferentes. Em geral, não existe uma narrativa com começo, meio e fim,<br />

organizada <strong>de</strong> modo lógico. Po<strong>de</strong>ríamos dizer que há muitos “começos, meios e fins” durante<br />

a exibição <strong>de</strong> uma vinheta como esta.<br />

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A linguagem visual das vinhetas da MTV como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

“O ví<strong>de</strong>o não nos oferece uma hierarquia <strong>de</strong> conotações, escreve Jameson, por meio<br />

da qual pudéssemos ser capazes <strong>de</strong> dizer como uma parte ou seqüência ‘interpreta’<br />

ou traduz metaforicamente qualquer outra, razão por que o ví<strong>de</strong>o sempre fugirá a<br />

toda tentativa <strong>de</strong> compreensão ou <strong>de</strong> <strong>de</strong>cifração, no dilúvio <strong>de</strong> seus ‘começos e<br />

emergências temáticas, combinações e <strong>de</strong>senvolvimentos, resistências e lutas pelo<br />

domínio, resoluções parciais, formas <strong>de</strong> fechamento que levam a um ou outro corte<br />

pleno’” (CONNOR, 2000, p.135).<br />

É interessante também observar na vinheta do Gordo a go-go, o nível <strong>de</strong> repetição, em<br />

várias seqüências, <strong>de</strong> uma mesma imagem, lado a lado. Este fato nos remete à<br />

reprodutibilida<strong>de</strong> técnica da imagem que é própria do universo pós-mo<strong>de</strong>rno, seja na arte ou<br />

na mídia. A reprodução <strong>de</strong> imagens em série, <strong>de</strong> forma cada vez mais apurada, origina vários<br />

simulacros, segundo a <strong>de</strong>finição proposta por Harvey. “Por ‘simulacro’ <strong>de</strong>signa-se um estado<br />

<strong>de</strong> réplica tão próxima da perfeição que a diferença entre o original e a cópia é quase<br />

impossível <strong>de</strong> ser percebida. Com as técnicas mo<strong>de</strong>rnas, a produção <strong>de</strong> imagens como<br />

simulacros é relativamente fácil” (HARVEY, 1989, p.261).<br />

Esse alto grau <strong>de</strong> repetição <strong>de</strong> uma mesma imagem também é muito presente na vinheta<br />

<strong>de</strong> abertura do extinto programa Daniella no país da MTV. A atração tinha como temática<br />

mostrar os bastidores da produção <strong>de</strong> diversos programas da MTV, com visitas supostamente<br />

“surpresa” da apresentadora. Além disso, eram entrevistados durante a atração VJs,<br />

produtores, diretores e outros profissionais da emissora. Baseado no conto <strong>de</strong> fadas Alice no<br />

país das maravilhas, no qual também se inspirou o nome do programa, a vinheta possui<br />

Daniella assumindo o papel da personagem Alice e passeando em um mundo encantado<br />

<strong>de</strong>senvolvido digitalmente. Neste universo aparecem imagens repetidas seqüencialmente <strong>de</strong><br />

alguns VJs da MTV, <strong>de</strong> flamingos e também <strong>de</strong> coelhos, transformando a vinheta em uma<br />

gran<strong>de</strong> “salada visual”.<br />

Figura 7 – Vinheta <strong>de</strong> abertura do programa Daniella no país da MTV<br />

Essa técnica <strong>de</strong> reprodutibilida<strong>de</strong> presente nas duas vinhetas citadas também po<strong>de</strong> ser<br />

associada às obras da pop art <strong>de</strong> artistas como Andy Warhol, que transferia diretamente para a<br />

tela imagens fotográficas por meio <strong>de</strong> estênceis. Através <strong>de</strong>ste recurso, as figuras míticas <strong>de</strong><br />

Mao Tsé Tung, <strong>de</strong> Marylin Monroe e <strong>de</strong> outras celebrida<strong>de</strong>s, absorvidas pela cultura <strong>de</strong><br />

massa, eram reproduzidas em série por Warhol em uma mesma tela ou em telas distintas,<br />

havendo apenas mudança na cor <strong>de</strong> preenchimento das imagens.<br />

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A linguagem visual das vinhetas da MTV como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

“(...) a obra <strong>de</strong> Warhol faz-nos readquirir consciência <strong>de</strong> objetos que per<strong>de</strong>ram seu<br />

reconhecimento visual através da exposição constante. Olhamos como se fosse a<br />

primeira vez para coisas que nos são familiares, mas que foram separadas <strong>de</strong> seus<br />

contextos correntes, e refletimos sobre os significados da existência contemporânea”<br />

(STANGOS, 2000, p.162).<br />

Várias vinhetas têm inspiração na cultura pop, que promove mudanças significativas <strong>de</strong><br />

atitu<strong>de</strong> em relação aos objetos, transformando-os em peças seriadas, <strong>de</strong>sprovidas <strong>de</strong><br />

personalização. <strong>Um</strong> mesmo objeto é <strong>de</strong>senvolvido <strong>de</strong> forma idêntica em quantida<strong>de</strong>s<br />

expressivas, sendo difícil distinguir um artefato do outro. O artista pop também expressa essa<br />

nova realida<strong>de</strong> através da repetição dos objetos escolhidos para fazer parte da composição <strong>de</strong><br />

um quadro. “O que freqüentemente parece interessar ao pintor pop é o fato <strong>de</strong> que o objeto<br />

está <strong>de</strong>spersonalizado, torna-se um tipo, mais do que um indivíduo – o artifício da imagem<br />

idêntica e monotonamente repetida com que nos <strong>de</strong>paramos tantas vezes na arte pop é uma<br />

prova disso” (Ibid., p.167).<br />

A maior parte das ilustrações utilizadas durante a vinheta do Gordo a go-go também faz<br />

referências ao passado, incluindo a tipografia utilizada, porém, ao contrário da vinheta do Top<br />

Top, as imagens não parecem ter sido produzidas especialmente para a vinheta, mas apenas<br />

reproduzidas a partir <strong>de</strong> diferentes fontes, que po<strong>de</strong>m ser jornais e revistas do começo do<br />

século XX. Assim como os rótulos da Sopa Campbell foram <strong>de</strong>scontextualizados e<br />

reproduzidos em diversas obras <strong>de</strong> Warhol, o mesmo acontece com as imagens que aparecem<br />

na vinheta, que passaram pelo mesmo processo <strong>de</strong> “recontextualização”, per<strong>de</strong>ndo seus<br />

significados originais.<br />

As frases <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m e em letras “garrafais”, já citadas, que aparecem durante a vinheta do<br />

Gordo a go-go como “Men! Don´t stay fat” e “You can loose up to” também po<strong>de</strong>m ser<br />

comparadas com as obras <strong>de</strong> outro artista pop: Robert Indiana. Suas telas possuem “insígnias<br />

gigantescas e ameaçadoras, <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns que nos intimam, como ‘EAT’ [‘Coma’] ou ‘Die’<br />

[‘Morra’]” (STANGOS, 2000, p.163).<br />

É importante dizer que o <strong>de</strong>sign pós-mo<strong>de</strong>rno busca inspiração em alguns movimentos<br />

artísticos mo<strong>de</strong>rnos, como o dadaísmo, o surrealismo e a pop art, e também em outros como o<br />

cubismo. Portanto, tais referências a estes movimentos não são exclusivida<strong>de</strong> da linguagem<br />

visual produzida para a MTV, mas se manifestam em outras ocasiões on<strong>de</strong> o <strong>de</strong>sign pósmo<strong>de</strong>rno<br />

está presente. Tais movimentos artísticos, principalmente o dadaísmo e o<br />

surrealismo, já possuíam na sua espinha dorsal alguns dos conceitos que mais tar<strong>de</strong> seriam<br />

atrelados ao pós-mo<strong>de</strong>rnismo, como a fragmentação <strong>de</strong> idéias, a multiplicida<strong>de</strong>, o nonsense e<br />

a quebra <strong>de</strong> valores.<br />

Vinhetas IDs e Promo-Imagem<br />

As vinhetas IDs e Promo-Imagem selecionadas serão analisadas <strong>de</strong> modo seqüencial,<br />

pois não se relacionam a nenhum programa específico que necessite <strong>de</strong> uma explicação<br />

prévia.<br />

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A linguagem visual das vinhetas da MTV como expressão da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna<br />

<strong>Um</strong>a das vinhetas ID escolhida é a que possui dois homens <strong>de</strong> terno e gravata, imitando<br />

os sons e os movimentos <strong>de</strong> uma galinha. O cenário on<strong>de</strong> os homens se encontram carrega<br />

elementos díspares que lembram um quadro surrealista, havendo ao fundo um céu azul com<br />

nuvens, um chão artificial misturado a uma superfície <strong>de</strong> terra, um trator e dois cavaletes. O<br />

nonsense <strong>de</strong> dois homens imitando uma ave acaba sendo supostamente censurado no final<br />

com a entrada do logo da MTV, quando parece que os dois indivíduos vão inesperadamente<br />

iniciar um ato sexual. Esta vinheta possui diversos significantes que não necessariamente se<br />

ligam a significados, representando uma das principais características da vinheta ID, que não<br />

<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser também inerente a um ví<strong>de</strong>o experimental.<br />

Figura 8 – Vinheta ID<br />

“(...) o texto pós-mo<strong>de</strong>rnista (...) é, por essa perspectiva, <strong>de</strong>finido como um fluxo <strong>de</strong><br />

estruturas ou <strong>de</strong> signos que resiste ao significado, cuja lógica interna fundamental<br />

está na exclusão da emergência <strong>de</strong> temas propriamente ditos, e que, portanto,<br />

sistematicamente se propõe a frustrar tentações interpretativas tradicionais”<br />

(JAMESON, 2002, p.113).<br />

As tentativas <strong>de</strong> interpretação das vinhetas da MTV geralmente fogem do controle, já<br />

que os inúmeros significantes presentes nestas peças gráficas escapam <strong>de</strong> qualquer tipo <strong>de</strong><br />

entendimento limitado ou condicionado. É como se os inúmeros significantes imagéticos das<br />

vinhetas “corressem” <strong>de</strong> seus significados <strong>de</strong> modo contínuo. Por mais que as vinhetas não<br />

sejam aleatórias, não existe uma intenção real em torná-las repletas <strong>de</strong> sentido para o<br />

telespectador. Os múltiplos discursos surgidos a partir do fim das metanarrativas e da<br />

compressão do tempo-espaço, on<strong>de</strong> tudo é muito veloz e efêmero, estão espelhados na<br />

linguagem visual das vinhetas adotada pelos vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>signers da MTV.<br />

Qualquer coisa, qualquer situação, qualquer sonho po<strong>de</strong> servir como ponto <strong>de</strong> partida<br />

para a criação <strong>de</strong> uma vinheta. As idéias mais “absurdas” po<strong>de</strong>m se tornar uma vinheta, como<br />

se estas idéias estivessem baseadas no automatismo surrealista. As associações realizadas pelo<br />

vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>signer entre os elementos presentes em uma vinheta po<strong>de</strong>m fazer sentido para ele, <strong>de</strong><br />

um modo muito pessoal, mas po<strong>de</strong>m não significar realmente nada para a maioria dos<br />

telespectadores. Afinal <strong>de</strong> contas, <strong>de</strong>vaneios e sonhos, na maioria dos casos, só tem<br />

significado para quem os imagina e não para os <strong>de</strong>mais. A liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> criação das vinhetas<br />

ID da MTV acaba sendo suportada diretamente pela emergência <strong>de</strong>ssa nova or<strong>de</strong>m cultural,<br />

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que não vê mais o supérfluo, o fútil e o superficial como algo que <strong>de</strong>va ser sumariamente<br />

<strong>de</strong>scartado, mas pelo contrário, <strong>de</strong>ve ser incentivado.<br />

“As mensagens não são totalmente vazias, o experimental pelo experimental e<br />

também não são malignamente cheias <strong>de</strong> significados embutidos, escondidos. São<br />

coisas que estão no universo pop. Vai num show: ‘nossa, essas blusas são muito<br />

legais...’; vai numa boate: ‘nossa, essa iluminação é incrível’, dá pra fazer uma<br />

vinheta com isso, porque visualmente ela é interessante. Essa vinheta <strong>de</strong> luzes <strong>de</strong><br />

boate tem a ver com música, tem a ver com luz, que remete aos raios da televisão.<br />

Não são aleatórias e nem impregnadas <strong>de</strong> sentido. Acho que são experimentações<br />

estético-visuais, mas que <strong>de</strong> certa maneira tem algum pano <strong>de</strong> fundo, on<strong>de</strong> isso<br />

brota, nem que seja um interesse pessoal. Gosto muito <strong>de</strong> lápis-cotoquinho, então<br />

vou fazer vários <strong>de</strong>senhos com lápis-cotoquinho”. vii<br />

Existe uma antiga vinheta Promo-Imagem da MTV, on<strong>de</strong> o caráter nonsense é<br />

extremamente presente: a da Vacaláctica. A vinheta se baseia em uma história literalmente<br />

sem “pé nem cabeça”, on<strong>de</strong> uma vaca intergaláctica faz visitas à Terra periodicamente. Foram<br />

criadas uma série <strong>de</strong> vinhetas ligadas a essa personagem, que rapidamente se popularizou<br />

entre a audiência. Na vinheta abaixo a menina diz que está tomando sorvete no <strong>de</strong>serto como<br />

forma <strong>de</strong> chamar a Vacaláctica. Quando a tal vaca chega, o menino pergunta porque a cabeça<br />

<strong>de</strong>la está invertida. Em seguida, o cenário fica todo <strong>de</strong> cabeça para baixo e as cabeças dos<br />

personagens caem.<br />

Figura 9 – Vinheta Promo-Imagem da Vacaláctica<br />

Há uma outra antiga vinheta ID on<strong>de</strong> aparece o logo da emissora adaptado a diferentes<br />

momentos artísticos da história da humanida<strong>de</strong>. Algumas vezes esses momentos também<br />

aparecem misturados. A vinheta começa com o logo da MTV “vestido” como um <strong>de</strong>us<br />

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egípcio em cima <strong>de</strong> uma coluna grega. Em seguida o logo se mistura a uma pintura <strong>de</strong><br />

Michelangelo, para <strong>de</strong>pois se transformar em um quadro <strong>de</strong> Van Gogh. Após isso, o símbolo<br />

da MTV se transmuta, seqüencialmente, em duas pinturas abstratas, para <strong>de</strong>pois ilustrar a<br />

capa <strong>de</strong> uma lata, que lembra a Sopa Campbell presente na pop art, pelas mãos <strong>de</strong> Andy<br />

Warhol. Por último, o logo assume uma forma metalizada, meio futurista. Mais uma vez as<br />

referências ao passado se fazem presentes na linguagem visual adotada pela MTV. É<br />

impressionante como a linguagem gráfica associada à emissora se abastece constantemente <strong>de</strong><br />

elementos referentes a diferentes períodos e realiza colagens com esses objetos, que se<br />

transformam em gran<strong>de</strong>s pastiches.<br />

Figura 10 – Vinheta ID<br />

“Postmo<strong>de</strong>rn art is characterized by pastiche and collage. Art in a post-mo<strong>de</strong>rn<br />

world does not belong to a unitary frame of reference, nor a project or a Utopia. The<br />

plurarity of perspectives leads to a fragmentation of experience, the collage<br />

becoming a key artistic technique of our time. Styles from different periods and<br />

cultures are put together; in postmo<strong>de</strong>rn art high-tech may exist si<strong>de</strong> by si<strong>de</strong> with<br />

antique columns and romantic ornamentation, the effects being shocking and<br />

fascinating” (KVALE apud CARVALHO, 2002, p.39).<br />

Essa mistura indiscriminada entre significantes <strong>de</strong> diferentes épocas se relaciona<br />

diretamente com a afirmativa que Jameson faz sobre a ascensão da lógica espacial em<br />

<strong>de</strong>trimento da temporal, on<strong>de</strong> o indivíduo não consegue “mais organizar seu passado e seu<br />

futuro como uma experiência coerente”. A produção cultural pós-mo<strong>de</strong>rna estaria baseada em<br />

uma lógica “esquizofrênica”, que po<strong>de</strong>ria ser traduzida como “um amontoado <strong>de</strong> fragmentos e<br />

em uma prática da heterogeneida<strong>de</strong> a esmo do fragmentário, do aleatório” (JAMESON, 2002,<br />

p.52).<br />

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Assim como acontece com um esquizofrênico, que rompe a ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> significação,<br />

“reduzindo sua experiência a uma série <strong>de</strong> puros presentes, não relacionados no tempo”, a<br />

vinheta da MTV também basearia parte <strong>de</strong> sua produção no jogo aleatório dos significantes<br />

inerente ao mundo pós-mo<strong>de</strong>rno (Ibid., p.53).<br />

“(...) a reificação penetra o próprio signo e separa o significante do significado.<br />

Agora a referência e a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong>saparecem <strong>de</strong> vez, e o próprio conteúdo – o<br />

significado – é problematizado. Resta-nos o puro jogo aleatório dos significantes<br />

que nós chamamos <strong>de</strong> pós-mo<strong>de</strong>rnismo, que não mais produz obras monumentais<br />

como as do mo<strong>de</strong>rnismo, mas embaralha sem cessar os fragmentos <strong>de</strong> textos<br />

preexistentes, os blocos <strong>de</strong> armar da cultura e da produção social, em uma nova<br />

bricolagem potencializada: metalivros que canibalizam outros livros, metatextos que<br />

fazem colagem <strong>de</strong> pedaços <strong>de</strong> outros textos – tal é a lógica do pós-mo<strong>de</strong>rnismo em<br />

geral, que encontra uma <strong>de</strong> suas formas mais fortes, mais originais e autênticas na<br />

nova arte do ví<strong>de</strong>o experimental” (Jameson, 2002, p.118).<br />

Essa citação <strong>de</strong> Jameson resume bem a essência da vinheta da MTV, calcada em vários<br />

aspectos da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna já mencionados e expostos durante o texto. Esse artigo<br />

contemplou somente algumas das análises <strong>de</strong> vinhetas da MTV realizadas durante a pesquisa,<br />

para exemplificar a relação que foi estabelecida pelo trabalho entre essas peças gráficas e<br />

manifestações da cultura pós-mo<strong>de</strong>rna.<br />

A pesquisa realizada durante o mestrado não preten<strong>de</strong>u promover conclusões finais<br />

sobre os principais assuntos abordados, mas suscitar novas reflexões e ampliar seu alcance<br />

para outros campos <strong>de</strong> conhecimento que não foram contemplados, mas que também se<br />

relacionam às questões que foram levantadas. Outros estudos sobre a relação entre o<br />

vi<strong>de</strong>o<strong>de</strong>sign e a cultura pós-mo<strong>de</strong>rna <strong>de</strong>vem ser realizados através da análise <strong>de</strong> materiais<br />

diversificados, que <strong>de</strong> preferência se refiram a outros canais <strong>de</strong> televisão ou a outras mídias<br />

para que se possa ampliar o espectro da pesquisa e dar novas contribuições para essas<br />

instigantes áreas <strong>de</strong> conhecimento.<br />

Notas<br />

i<br />

A dissertação foi <strong>de</strong>fendida em 2006. A linguagem visual da emissora não sofreu gran<strong>de</strong>s<br />

modificações <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então, principalmente em relação ao objeto <strong>de</strong> estudo principal <strong>de</strong>ssa<br />

pesquisa que foram as vinhetas da emissora. Essas peças gráficas na verda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início<br />

da emissora nos Estados Unidos, há quase 30 anos, seguem um padrão visual facilmente<br />

reconhecível e atrelado à linguagem visual da Music Television (MTV), como po<strong>de</strong>rá ser<br />

percebido ao longo <strong>de</strong>sse paper também.<br />

ii<br />

Entrevista concedida para esta pesquisa pelo gerente do Departamento <strong>de</strong> Promo da MTV,<br />

Rodrigo Pimenta, no dia 27/10/2005, no próprio <strong>de</strong>partamento. O local é responsável pela<br />

criação das vinhetas da emissora.<br />

iii<br />

Entrevista concedida para esta pesquisa por Carlos Bêla, ex-<strong>de</strong>signer do Departamento <strong>de</strong><br />

Promo da MTV.<br />

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iv Vi<strong>de</strong> nota 1.<br />

v Os bumpers são vinhetas menores que costumam apresentar uma síntese dos elementos<br />

presentes na abertura principal <strong>de</strong> um programa.<br />

vi Vi<strong>de</strong> nota 1.<br />

vii Vi<strong>de</strong> nota 1.<br />

Referências<br />

AZNAR, Sidney Carlos. Vinheta: do pergaminho ao ví<strong>de</strong>o. São Paulo: Arte e Ciência, 1997.<br />

BAUMAN, Zygmunt. A mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> líquida. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Jorge Zahar, 2001.<br />

CARVALHO, Leilah. Vi<strong>de</strong>oclipe: imagens da música popular e linguagem-síntese da pósmo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>.<br />

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