Masculinidade e Homofobia em O Ateneu ... - Fazendo Gênero
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evitar a constituição de adultos perversos que constituiriam um “perigo” ao corpo populacional.<br />
Antes de entrarmos nesta discussão específica, contextualizar<strong>em</strong>os a especificidade brasileira da<br />
constituição de uma sociedade de normalização.<br />
Normalização no Brasil finissecularo<br />
Biopoder e poder disciplinar aqui se conectaram a partir da ascensão da higiene médica<br />
aliada ao Estado. Esta aliança foi responsável pela transformação progressiva da família patriarcal<br />
na família burguesa. Na sociedade de base da família patriarcal “do hom<strong>em</strong> era exigida toda<br />
iniciativa econômica, cultural, social e sexual. Os d<strong>em</strong>ais m<strong>em</strong>bros do grupo ligavam-se<br />
mutuamente e ao pai, de modo absolutamente passivo” (COSTA, J., 1999, p. 55). A normalização<br />
higiênica das famílias qualificou o papel da mãe, segundo Jurandir Freire Costa (1999, p. 73): “a<br />
mãe devotada e a criança b<strong>em</strong>-amada vão ser o adubo e a s<strong>em</strong>ente do adolescente futuro adulto<br />
patriótico”.<br />
No entanto, produziam-se outras formas de subalternização da mulher. Criava-se a imag<strong>em</strong><br />
da mulher como mãe zelosa, frágil, com faculdades físicas e intelectuais inferiores e a imag<strong>em</strong> do<br />
hom<strong>em</strong>, <strong>em</strong> oposição ao f<strong>em</strong>inino, marcada pelo vigor físico e intelectual, com a obrigação de<br />
prover a família financeiramente (COSTA, J., 1999). Neste sentido, pod<strong>em</strong>os dizer que a família<br />
nuclear higienizada não solapou, mas r<strong>em</strong>odelou, uma das características centrais da família<br />
patriarcal: o androcentrismo 1 .<br />
Segundo Sedgwick (1985), uma das características centrais das sociedades androcêntricas é<br />
o desejo homossocial masculino: uma força social que torna os vínculos entre homens a tônica das<br />
relações de poder. Uma relação, “mesmo quando sua manifestação é de hostilidade ou ódio ou<br />
alguma coisa menos carregada <strong>em</strong>otivamente, que configura um importante relacionamento” (p. 02,<br />
tradução nossa). Em uma sociedade androcêntrica, na qual as mulheres são objetos de troca entre<br />
homens, as relações homossociais masculinas são seu suporte principal, a ponto de as próprias<br />
relações heterossexuais ser<strong>em</strong> instrumentais para elas. As mulheres são, portanto, objeto de desejo<br />
heterossexual masculino e elo funcional de desejo homossocial masculino.<br />
Porém, tal desejo se constitui historicamente nas sociedades modernas relacionado com um<br />
dos desdobramentos do dispositivo de sexualidade que Sedgwick analisou a partir de romances<br />
ingleses: a homofobia. Trata-se não apenas da opressão direta a homossexuais, mas de um amplo<br />
mecanismo que evita o potencial erótico do desejo homossocial. Perceb<strong>em</strong>os uma tríade então<br />
estruturante das relações sociais: homossociabilidade masculina, homofobia e dominação das<br />
mulheres.<br />
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