3ª Edição da FGR em Revista - Fundação Guimarães Rosa
3ª Edição da FGR em Revista - Fundação Guimarães Rosa
3ª Edição da FGR em Revista - Fundação Guimarães Rosa
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<strong>em</strong> revista<br />
Publicação <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> · Ano 2 · Nº 03 · junho de 2008<br />
Educação é uma<br />
responsabili<strong>da</strong>de<br />
de todos.<br />
Centenário de nascimento<br />
de João <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong><br />
“Muito mais que to<strong>da</strong>s as línguas, ele<br />
aprendeu a falar ao coração <strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de,<br />
a ler e a desven<strong>da</strong>r os corações e mistérios<br />
dos homens.”<br />
Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong><br />
“Os projetos do presente são suportes para<br />
os projetos e programas do amanhã.”
A sAúde dA<br />
suA fAmíliA<br />
<strong>em</strong> primeiro lugAr.<br />
A Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> fez uma aliança com a Unimed-BH para oferecer a todos os<br />
integrantes do Sist<strong>em</strong>a de Defesa Social de Minas Gerais um Plano de Saúde moderno,<br />
de baixo custo e ampla cobertura, o UNIPART. Com ele, você garante o b<strong>em</strong>-estar dos<br />
dependentes que já perderam a cobertura do IPSM e netos com mais de um ano.<br />
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saudefgr@fgr.org.br
capa<br />
Educação: uma<br />
responsabili<strong>da</strong>de de<br />
todos<br />
editorial<br />
Álvaro Antônio Nicolau<br />
educação e cultura<br />
Escola <strong>da</strong> Paz<br />
A esperança para o século XXI<br />
A <strong>FGR</strong> e a Inclusão Digital<br />
Uma possibili<strong>da</strong>de de Inserção Social<br />
A orali<strong>da</strong>de negra na formação<br />
nacional e valorização <strong>da</strong><br />
SEPPIR<br />
Kelly Cardozo<br />
homenag<strong>em</strong><br />
João; um encantado<br />
Petrônio Souza Gonçalves<br />
especial<br />
Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong><br />
com<strong>em</strong>ora 6 anos<br />
Visibili<strong>da</strong>de, profissionalismo e equi<strong>da</strong>de<br />
nas ações<br />
Seis Anos de Excelência<br />
João Bosco de Castro<br />
ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia<br />
7<br />
4<br />
10<br />
13<br />
15<br />
18<br />
Caminhos <strong>da</strong> Soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de 28<br />
Andrea Neves <strong>da</strong> Cunha<br />
24<br />
26<br />
terceiro setor<br />
Valores e Resultados: um<br />
referencial de avaliação no<br />
Terceiro Setor<br />
Eloísa Helena de Souza Cabral<br />
O Terceiro Setor e o controle<br />
<strong>da</strong> Gestão Pública Municipal:<br />
lições a partir do caso de<br />
Bogotá<br />
Armindo dos Santos de Souza Teodósio<br />
defesa social<br />
A evolução <strong>da</strong> Educação na<br />
Polícia Militar de Minas Gerais<br />
Ten-Cel PM Márcio Antônio Macêdo Assunção<br />
Justiça Militar de Minas Gerais<br />
Setenta anos de existência<br />
Juiz Cel PM Rúbio Paulino Coelho<br />
Notas sobre organizações e<br />
servidores policiais<br />
Jésus Trin<strong>da</strong>de Barreto Júnior<br />
Segurança Ci<strong>da</strong>dã: qual<br />
controle?<br />
Ellen Márcia L. S. de Carvalho<br />
Corpo de Bombeiros Militar<br />
de Minas Gerais - Atuação <strong>em</strong><br />
prol <strong>da</strong> Segurança Pública<br />
José Honorato Ameno<br />
Segurança Pública no Brasil<br />
t<strong>em</strong> jeito!<br />
Luis Flavio Sapori<br />
Cultura de Paz pelo<br />
Desenvolvimento Humano:<br />
uma forma de combater a<br />
criminali<strong>da</strong>de e a violência na<br />
cont<strong>em</strong>poranei<strong>da</strong>de<br />
Álvaro Antônio Nicolau<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
sumário<br />
30<br />
33<br />
35<br />
40<br />
42<br />
46<br />
48<br />
51<br />
54<br />
3
editorial<br />
Álvaro Antônio Nicolau<br />
Superintendente-Geral <strong>da</strong> <strong>FGR</strong><br />
4 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
“<strong>FGR</strong> <strong>em</strong> <strong>Revista</strong>” retoma<br />
o estímulo ao debate<br />
entre seus leitores<br />
Iniciar um projeto editorial é um trabalho árduo, mas, com muito<br />
profissionalismo, a Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> começou esse<br />
processo <strong>em</strong> sua primeira revista, <strong>em</strong> 2003. Tão penoso é esse<br />
trabalho que, somente <strong>em</strong> 2007 tiv<strong>em</strong>os fôlego para a retoma<strong>da</strong>!<br />
A <strong>FGR</strong> <strong>em</strong> <strong>Revista</strong>, já <strong>em</strong> 2007, retoma<br />
o estímulo ao debate franco entre seus<br />
leitores, amigos e colaboradores, com a<br />
perspectiva de troca de idéias <strong>em</strong> busca<br />
de uma reflexão saudável para a melhoria<br />
<strong>da</strong> quali<strong>da</strong>de de vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s pessoas. A<br />
“<strong>FGR</strong> <strong>em</strong> <strong>Revista</strong>” t<strong>em</strong> o propósito de colocar<br />
<strong>em</strong> discussão questões vincula<strong>da</strong>s à<br />
Segurança, para que a socie<strong>da</strong>de, incentiva<strong>da</strong><br />
pelo conhecimento dos profissionais<br />
<strong>da</strong> área do Sist<strong>em</strong>a de Defesa Social<br />
e estudiosos do assunto, possa se envolver<br />
e estabelecer um diálogo construtivo,<br />
e, ao final, conjugar com uma agen<strong>da</strong> positiva<br />
para a Segurança Pública, especialmente<br />
<strong>em</strong> Minas Gerais.<br />
Nesse sentido, a Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong>, como to<strong>da</strong> enti<strong>da</strong>de de divulgação<br />
cultural, assim como outros modelos s<strong>em</strong><br />
fins lucrativos, depende de pessoas conscientes<br />
e identifica<strong>da</strong>s com sua razão de<br />
existir, cujo senso de atenção esteja voltado<br />
e centrado nos objetivos norteadores<br />
<strong>da</strong> revista, s<strong>em</strong> descui<strong>da</strong>r dos assuntos<br />
de Polícia Ostensiva (Polícia Militar),<br />
de Polícia Investigativa (Polícia Civil), de<br />
Ações de Bombeiros (Corpo de Bombeiros<br />
Militar), de Guar<strong>da</strong>s Municipais, de<br />
qualquer outra ativi<strong>da</strong>de do Sist<strong>em</strong>a de<br />
Defesa Social ou que se associam ao Sist<strong>em</strong>a<br />
<strong>em</strong> vista à melhoria <strong>da</strong> Quali<strong>da</strong>de<br />
de Vi<strong>da</strong> do Mineiro e, por extensão, do<br />
povo de todo o Brasil.<br />
Por oportuno, registra-se, para nosso<br />
gáudio, o apoio e compreensão, porquanto<br />
não nos t<strong>em</strong> faltado de parte dos nossos<br />
colaboradores, grupo composto pelas<br />
Instituições do Sist<strong>em</strong>a de Defesa Social<br />
do Estado de Minas Gerais e Socie<strong>da</strong>de<br />
Mineira como um todo, o apoio necessário<br />
ao desenvolvimento. Ao mesmo t<strong>em</strong>po,<br />
é de se observar que o despertar, nesta<br />
linha de editoração, t<strong>em</strong> crescido de<br />
forma gradual e constante, e já adquiriu<br />
um patamar de equilíbrio e maturi<strong>da</strong>de,<br />
oportunizando tranqüili<strong>da</strong>de e segurança<br />
para continuarmos nessa caminha<strong>da</strong>, <strong>em</strong><br />
vista cumprir uma proposta de transformação<br />
sociocultural, mesmo porque, se<br />
lança<strong>da</strong> <strong>em</strong> 2003, num momento singular<br />
<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> pública brasileira no campo<br />
<strong>da</strong> Segurança Pública, hoje, esta singulari<strong>da</strong>de<br />
continua presente, s<strong>em</strong> perder de<br />
vista a missão institucional.<br />
Certamente, a partir <strong>da</strong>s matérias que a<br />
Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> divulga por<br />
este instrumento de comunicação, pretende-se,<br />
com o t<strong>em</strong>po, mais que somar,<br />
multiplicar a formação doutrinária no<br />
campo <strong>da</strong> Defesa Social, aliás, como normalmente<br />
acontece <strong>em</strong> qualquer área do<br />
conhecimento humano, quando se busca<br />
a exteriorização de conhecimentos como<br />
forma de crescimento cultural e institucional.<br />
Nesse sentido, não é exagero afirmar<br />
que a “<strong>FGR</strong> <strong>em</strong> <strong>Revista</strong>”, pelo perfil
editorial que apresenta, ocupa posição<br />
ímpar no Estado de Minas Gerais<br />
e se prepara para crescer no contexto<br />
de nosso País. Neste mister, cumprimos<br />
nosso objetivo institucional.<br />
Nessa concepção, é de se fazer registro<br />
que esta enti<strong>da</strong>de, ao longo de seis<br />
anos de existência, conseguiu criar<br />
uma consciência institucional própria;<br />
conseguiu estabelecer sua identi<strong>da</strong>de,<br />
ao mesmo t<strong>em</strong>po perfeitamente sintoniza<strong>da</strong><br />
com os misteres <strong>da</strong> Defesa<br />
Social, <strong>em</strong> todos os seus matizes, especialmente<br />
Polícia Militar de Minas<br />
Gerais, s<strong>em</strong>, no entanto, perder a independência<br />
como órgão de divulgação<br />
e de prospecção do sentido de serno-mundo<br />
<strong>da</strong>s pessoas. Compreender<br />
para explicitar, esse t<strong>em</strong> sido o nosso<br />
caminho na inter-relação com todos os<br />
meios. Isso <strong>em</strong> muito se deve à persistência<br />
<strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong><br />
<strong>em</strong> manter-se nos seus limites estatutários<br />
e editoriais, s<strong>em</strong> imiscuir-se <strong>em</strong><br />
questões estranhas ou que não sejam<br />
puramente profissionais na relação<br />
com as questões de Defesa Social, porquanto<br />
t<strong>em</strong> o significado de um Sist<strong>em</strong>a<br />
ain<strong>da</strong> <strong>em</strong> construção. Aí está, talvez,<br />
um dos grandes motivos <strong>da</strong> nossa<br />
pretensa longevi<strong>da</strong>de.<br />
Nesta edição, como de costume, mostrar<strong>em</strong>os<br />
aos nossos estimados leitores<br />
um conjunto de t<strong>em</strong>as b<strong>em</strong> atuais,<br />
todos focados nas Questões Sociais e<br />
na Segurança Pública. Abor<strong>da</strong>r<strong>em</strong>os as<br />
seguintes questões sociais: “Valores e<br />
Rua Paraíba, 1441 - 8º an<strong>da</strong>r<br />
Funcionários - CEP 30130-141<br />
Belo Horizonte - MG<br />
Tel. (31) 3263-1600<br />
Endereço eletrônico<br />
www.fgr.org.br - fgr@fgr.org.br<br />
Superintendente-Geral<br />
Álvaro Antônio Nicolau<br />
<strong>em</strong> revista<br />
Resultados: um referencial de avaliação<br />
no Terceiro Setor” - Doutora Eloísa Helena<br />
de Souza Cabral; “A <strong>FGR</strong> e a Inclusão<br />
Digital: uma possibili<strong>da</strong>de de Inserção<br />
Social” - Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>;<br />
“Escola <strong>da</strong> Paz - A esperança para o século<br />
XXI” - Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>;<br />
“João; um encantado...,” de autoria do<br />
jornalista e escritor Petrônio Souza Gonçalves;<br />
“Caminhos <strong>da</strong> soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de” -<br />
Sra. Andréa Neves <strong>da</strong> Cunha, Presidente<br />
do Servas. Compondo o arcabouço <strong>da</strong><br />
discussão <strong>da</strong>s questões vincula<strong>da</strong>s ao<br />
sist<strong>em</strong>a de Defesa Social, apresentar<strong>em</strong>os:<br />
“A Atuação do Corpo de Bombeiros<br />
Militar de Minas Gerais <strong>em</strong> prol <strong>da</strong><br />
Segurança Pública” - Coronel BM José<br />
Honorato Ameno, Coman<strong>da</strong>nte do Corpo<br />
de Bombeiros de Minas Gerais; “A<br />
Evolução <strong>da</strong> Educação na Polícia Militar<br />
de Minas Gerais” - Tenente-Coronel PM<br />
de Minas Gerais, Márcio Antônio Macêdo<br />
Assunção; “Segurança Pública no<br />
Brasil t<strong>em</strong> Jeito!” - Professor Luis Flavio<br />
Sapori, Coordenador do Curso de Ciências<br />
Sociais <strong>da</strong> PUC Minas e pesquisador<br />
<strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção João Pinheiro; “Segurança<br />
Ci<strong>da</strong>dã: qual Controle?”, por Ellen Márcia<br />
L. S. de Carvalho, Coordenadora do<br />
Programa de Mediação de Conflitos <strong>em</strong><br />
Belo Horizonte, MG; “O Terceiro Setor e<br />
o controle <strong>da</strong> Gestão Pública Municipal:<br />
lições a partir do caso de Bogotá” - Armindo<br />
dos Santos de Sousa Teodósio; “A<br />
Justiça Militar de Minas Gerais: setenta<br />
anos de existência” - Juiz Cel PM Rúbio<br />
Paulino Coelho; “Notas sobre organizações<br />
e servidores policiais”, de autoria<br />
Superintendente Operacional<br />
Pedro Seixas <strong>da</strong> Silva<br />
Superintendente de Administração<br />
e Finanças<br />
José Antônio Gonçalves<br />
Setor de Comunicação, Cultura e Lazer<br />
Juliana Leonel Peixoto<br />
Jornalista Responsável<br />
Stefania Cavedoni - DRT/Mtb/MG 2129<br />
Projeto Gráfico, <strong>Edição</strong> e Diagramação<br />
Jota Campelo Comunicação<br />
Tirag<strong>em</strong><br />
3 mil ex<strong>em</strong>plares<br />
editorial<br />
do Dr. Jésus Barreto Júnior, Delegado<br />
Geral <strong>da</strong> Polícia Civil de Minas Gerais;<br />
“Cultura <strong>da</strong> Paz para o Desenvolvimento<br />
Humano: uma forma de combater a<br />
criminali<strong>da</strong>de e a violência na cont<strong>em</strong>poranei<strong>da</strong>de”,<br />
de Álvaro Antônio Nicolau,<br />
Cel PM QOR - Superintendente-<br />
Geral <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> e<br />
Diretor de Segurança <strong>da</strong> FUNDAMIG<br />
(Fun<strong>da</strong>ção Mineira de Fun<strong>da</strong>ções de<br />
Direito Privado), além <strong>da</strong> entrevista realiza<strong>da</strong><br />
pela Historiadora Kelly Cardozo<br />
com a equipe <strong>da</strong> Assessoria de Comunicação<br />
<strong>da</strong> SEPPIR (Secretaria Especial<br />
Políticas de Promoção <strong>da</strong> Igual<strong>da</strong>de Racial<br />
<strong>da</strong> Presidência <strong>da</strong> República) sobre<br />
“Orali<strong>da</strong>de negra na formação nacional<br />
e valorização <strong>da</strong> SEPPIR”.<br />
Nossos leitores perceberão que, neste<br />
conjunto, os articulistas fornec<strong>em</strong> um<br />
trabalho compreensivo, que nos permitirá<br />
conhecer melhor o fenômeno social e<br />
<strong>da</strong> Segurança Pública, e para o qual serão<br />
b<strong>em</strong>-vin<strong>da</strong>s to<strong>da</strong>s as colaborações e<br />
sugestões que nos ajud<strong>em</strong> a tornar ca<strong>da</strong><br />
vez melhor a vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s pessoas.<br />
Quer<strong>em</strong>os a “<strong>FGR</strong> <strong>em</strong> <strong>Revista</strong>” como<br />
um canal s<strong>em</strong>pre aberto para a participação,<br />
a colaboração e as suas mensagens.<br />
Somos Parte de um Todo que<br />
necessita de d<strong>em</strong>ocracia, diálogo, transparência,<br />
acesso à comunicação e à informação.<br />
Nosso estímulo é o “pensar<br />
simples”, é o “ter atitude” para confirmar<br />
a simplici<strong>da</strong>de nas ações e obter<br />
os resultados esperados.<br />
Fotos<br />
Vera Godoy / Arquivo Colaboradores <strong>FGR</strong> / BM5<br />
CBMMG / TJM<br />
Impressão<br />
Gráfica e Editora 101<br />
A Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> não se responsabiliza<br />
por conceitos <strong>em</strong>itidos <strong>em</strong> artigos assinados.<br />
É permiti<strong>da</strong> a divulgação <strong>da</strong>s informações desde<br />
que cita<strong>da</strong> a fonte.<br />
Foto de Capa<br />
Andrew Souza Moreira (Programa Escola <strong>da</strong> Paz<br />
e Projeto Portas Abertas) - Foto: Vera Godoy<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
5
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zilton@fgr.org.br • vere<strong>da</strong>sfgr@fgr.org.br
educação e cultura<br />
Educação: uma<br />
responsabili<strong>da</strong>de de todos<br />
“Na<strong>da</strong> é mais importante hoje do que a capacitação dos brasileiros para que possamos<br />
construir uma riqueza nacional mais sóli<strong>da</strong> e firmar uma presença ca<strong>da</strong> vez mais soberana<br />
no mundo. Isso só pode se <strong>da</strong>r pela melhoria na abrangência e na quali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> Educação<br />
do nosso País.” (Discurso do Presidente <strong>da</strong> República, Luiz Inácio Lula <strong>da</strong> Silva, no lançamento do PDE - Plano de<br />
Desenvolvimento <strong>da</strong> Educação - 24 de abril de 2007).<br />
O t<strong>em</strong>a Educação v<strong>em</strong> sendo exaustivamente<br />
debatido por organismos<br />
nacionais e internacionais, personali<strong>da</strong>des,<br />
educadores, governos e a socie<strong>da</strong>de.<br />
Em seu discurso na soleni<strong>da</strong>de<br />
de lançamento do PDE - Plano de Desenvolvimento<br />
<strong>da</strong> Educação, <strong>em</strong> abril<br />
de 2007, o Presidente Lula foi claro<br />
quando afirmou que “nenhum t<strong>em</strong>a é<br />
tão positivo, tão mobilizador e capaz<br />
de unir tanto o País quanto a Educação.<br />
Mas só transformar<strong>em</strong>os esta<br />
<strong>em</strong>oção física <strong>em</strong> reali<strong>da</strong>de quando<br />
houver uma profun<strong>da</strong> mu<strong>da</strong>nça de atitude<br />
dos governos, <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de civil<br />
e, muito especialmente, <strong>da</strong> família.”<br />
Mas, afinal, o que é Educação? É uma<br />
responsabili<strong>da</strong>de de todos. Ca<strong>da</strong> setor<br />
<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de deve ter um papel ativo no<br />
desenvolvimento <strong>da</strong> capaci<strong>da</strong>de física,<br />
moral e intelectual do ser humano.<br />
Educar não é apenas ensinar, é também<br />
aprender para a vi<strong>da</strong>.<br />
“A educação afirma valores e ações<br />
que contribu<strong>em</strong> para a formação<br />
humana, social e para a preservação<br />
ambiental. Ela estimula a formação<br />
de socie<strong>da</strong>des socialmente justas e<br />
ecologicamente equilibra<strong>da</strong>s, que<br />
conservam entre si relações de interdependência<br />
e diversi<strong>da</strong>de.” Diante<br />
de tal afirmativa, muito se discutiu<br />
sobre as bases para a integração <strong>da</strong><br />
responsabili<strong>da</strong>de individual e coletiva,<br />
assim como os princípios <strong>da</strong> educação<br />
para a construção de socie<strong>da</strong>des<br />
sustentáveis, durante “5º S<strong>em</strong>inário<br />
Nacional: Educação para uma Socie<strong>da</strong>de<br />
Sustentável”, evento simultâneo<br />
à Ecolatina - 7ª Conferência Latino-<br />
Americana sobre Meio Ambiente e<br />
Responsabili<strong>da</strong>de Social, realiza<strong>da</strong> <strong>em</strong><br />
Belo Horizonte de 16 a 19 de outubro<br />
de 2007 (www.ecolatina.com.br).<br />
O Brasil ain<strong>da</strong> está<br />
longe do ideal<br />
Apesar de todo o esforço do governo<br />
e <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de, um estudo recente <strong>da</strong><br />
UNESCO (Organização <strong>da</strong>s Nações<br />
Uni<strong>da</strong>s para a Educação, a Ciência<br />
e a Cultura) mostra que o Brasil<br />
está entre os 53 países que ain<strong>da</strong><br />
não atingiram, ou estão longe de<br />
atingir, até 2015, as metas do EPT<br />
(Educação para Todos): compromisso<br />
firmado por diversas nações durante<br />
a Conferência Mundial de Educação,<br />
realiza<strong>da</strong> <strong>em</strong> 2000, <strong>em</strong> Dacar, no<br />
Senegal. Entre as principais dificul<strong>da</strong>des<br />
que o País enfrenta estão as<br />
desigual<strong>da</strong>des educacionais e raciais,<br />
a situação econômica dos estu<strong>da</strong>ntes<br />
e a localização geográfica.<br />
De acordo com esse importante diagnóstico<br />
sobre a reali<strong>da</strong>de educacional<br />
brasileira, as dispari<strong>da</strong>des são mais<br />
evidentes no it<strong>em</strong> ren<strong>da</strong> familiar:<br />
“entre os jovens mais pobres, 25%<br />
estão na escola, ou seja, metade <strong>da</strong><br />
taxa apresenta<strong>da</strong> pelos jovens mais<br />
ricos; porém, menos de 1% encontrase<br />
no ensino superior, taxa que, para<br />
os mais ricos, é de 40,4%”. Também<br />
são acentua<strong>da</strong>s as desigual<strong>da</strong>des<br />
raciais, principalmente entre brancos<br />
e negros. O trabalho, denominado<br />
“Relatório de Monitoramento de EPT<br />
Brasil 2008”, foi lançado pela UNESCO<br />
<strong>em</strong> soleni<strong>da</strong>de no MEC (Ministério <strong>da</strong><br />
Educação), <strong>em</strong> Brasília, no dia 30 de<br />
abril de 2008, com presença do Ministro<br />
<strong>da</strong> Educação, Fernando Had<strong>da</strong>d,<br />
dirigentes do CONSED (Conselho<br />
Nacional de Secretários de Educação)<br />
e UNDIME (União Nacional dos<br />
Dirigentes Municipais de Educação).<br />
O evento fez parte <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des<br />
<strong>da</strong> S<strong>em</strong>ana de Ação Mundial, que<br />
<strong>em</strong> abril de 2008 abordou o t<strong>em</strong>a<br />
“Educação de Quali<strong>da</strong>de para Todos:<br />
Fim <strong>da</strong> Exclusão Já!” (UNESCO, Brasília,<br />
30/04/2008).<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
7
O que falta para o Brasil na Educação?<br />
Para o Presidente Lula, “o fortalecimento<br />
<strong>da</strong> Educação só pode se <strong>da</strong>r<br />
se houver uma mu<strong>da</strong>nça profun<strong>da</strong><br />
na quali<strong>da</strong>de e na filosofia do ensino<br />
e, para isso, é indispensável debater<br />
o ensino, a relação do Estado com o<br />
ensino e a relação <strong>da</strong> família com a<br />
Educação.” É o que se pretende com<br />
o desenvolvimento de projetos nos<br />
vários níveis educacionais, <strong>da</strong> creche<br />
ao pós-doutorado, levando-se <strong>em</strong><br />
conta fatores como alfabetização,<br />
rendimento dos alunos, taxa de<br />
repetência e evasão escolar, educação<br />
profissional, tecnologia, melhoria <strong>da</strong><br />
quali<strong>da</strong>de do ensino, aperfeiçoamento<br />
de professores e outros.<br />
O compromisso de<br />
Minas com a Educação<br />
O Estado de Minas Gerais ocupa<br />
hoje o quarto lugar no ranking <strong>da</strong><br />
Educação no Brasil, atrás somente do<br />
Distrito Federal, Rio Grande do Sul e<br />
Paraná. Em números, esta é a situação<br />
de Minas, de acordo com <strong>da</strong>dos <strong>da</strong><br />
Secretaria Estadual de Educação.<br />
• Minas Gerais possui a segun<strong>da</strong><br />
maior rede de ensino básico do País.<br />
• É o único Estado brasileiro que<br />
oferece ensino fun<strong>da</strong>mental de nove<br />
anos nas escolas públicas estaduais e<br />
municipais <strong>em</strong> 100% dos municípios.<br />
• Conta com 4,9 milhões de<br />
alunos, sendo 4,4 milhões<br />
na rede pública (90,5%).<br />
Destes, 58% estu<strong>da</strong>m na Rede<br />
Estadual.<br />
• Em 26 municípios mineiros<br />
não exist<strong>em</strong> escolas que ofereçam<br />
Ensino Médio, isso representa 2,9%<br />
do total e 1,5% <strong>da</strong> Região Sudeste.<br />
• Menos <strong>da</strong> metade dos jovens entre<br />
15 e 17 anos chegam ao Ensino Médio.<br />
8 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
• No ranking do ENEM (Exame<br />
Nacional do Ensino Médio), Belo<br />
Horizonte aparece com a melhor<br />
média entre as escolas classifica<strong>da</strong>s,<br />
com um total de 72,8 pontos. Ao<br />
mesmo t<strong>em</strong>po, apresenta a terceira<br />
pior classificação entre as escolas<br />
públicas de capitais do País, com um<br />
total de 27,4 pontos.<br />
• A capaci<strong>da</strong>de de leitura dos<br />
alunos do segundo ano do Ensino<br />
Fun<strong>da</strong>mental cresceu 6,8%, <strong>em</strong><br />
relação ao ano passado.<br />
A elevação dos níveis de aprendizag<strong>em</strong><br />
dos alunos <strong>da</strong>s escolas estaduais<br />
faz parte <strong>da</strong>s priori<strong>da</strong>des para 2008<br />
na área <strong>da</strong> Educação, além disso, é<br />
compromisso do Governo de Minas<br />
Gerais que to<strong>da</strong>s as crianças <strong>da</strong> rede<br />
pública estejam alfabetiza<strong>da</strong>s até os 8<br />
anos de i<strong>da</strong>de.<br />
educação e cultura<br />
Durante a homenag<strong>em</strong> que recebeu<br />
<strong>da</strong> Acad<strong>em</strong>ia Brasileira de Letras, no<br />
Rio de Janeiro, <strong>em</strong> dez<strong>em</strong>bro de 2007,<br />
o Governador do Estado, Aécio Neves,<br />
d<strong>em</strong>onstrou seu otimismo quanto aos<br />
resultados alcançados nos últimos anos<br />
e ressaltou os investimentos nas áreas<br />
de Educação e Cultura: “Viv<strong>em</strong>os um<br />
novo t<strong>em</strong>po e uma nova esperança <strong>em</strong><br />
Minas. Estamos orgulhosos dos resultados<br />
que nossas crianças alcançaram<br />
nos exames de avaliação independente<br />
existentes no Brasil. Voltamos a liderar<br />
<strong>em</strong> várias matérias, disputando com<br />
estados que não possu<strong>em</strong> os desníveis<br />
sociais de Minas. Continuar<strong>em</strong>os<br />
insistindo, investindo e inovando nessas<br />
áreas, porque sab<strong>em</strong>os que não há<br />
outro caminho para o desenvolvimento.”<br />
(Gazeta do Triângulo, 12 de dez<strong>em</strong>bro<br />
de 2007).<br />
Esse caminho foi aberto <strong>em</strong> outubro de<br />
2007, quando o Governador Aécio
educação e cultura<br />
implantou o PEP (Programa de Educação<br />
Profissional) e assinou decreto<br />
criando a Rede Mineira de Formação<br />
Profissional, com intuito de oferecer<br />
educação de quali<strong>da</strong>de e oportuni<strong>da</strong>des<br />
reais de trabalho para os mineiros.<br />
Em seu pronunciamento por ocasião do<br />
lançamento do programa, no Palácio<br />
<strong>da</strong> Liber<strong>da</strong>de, <strong>em</strong> Belo Horizonte, ele foi<br />
conclusivo: “Já se foi o t<strong>em</strong>po <strong>em</strong> que<br />
a busca devia ser por um canudo, por<br />
um diploma universitário. Isso é importante<br />
e, certamente, as oportuni<strong>da</strong>des<br />
para o acesso ao terceiro grau e ao<br />
ensino universitário também continuarão<br />
a ser amplia<strong>da</strong>s <strong>em</strong> Minas, mas o<br />
que estamos fazendo é permitindo que<br />
esses jovens se form<strong>em</strong> e se prepar<strong>em</strong><br />
e que tenham, imediatamente, condições<br />
de contribuir na sua região para<br />
o desenvolvimento de sua comuni<strong>da</strong>de<br />
e, obviamente, para o seu progresso<br />
pessoal.” (Governo do Estado)<br />
A Educação também é<br />
priori<strong>da</strong>de na Fun<strong>da</strong>ção<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong><br />
Educar os mineiros a partir <strong>da</strong> transformação<br />
e <strong>da</strong> inclusão social de crianças<br />
e adolescentes, <strong>da</strong> profissionalização<br />
de jovens e adultos, <strong>da</strong> capacitação,<br />
do treinamento e <strong>da</strong> expansão do<br />
conhecimento. Talvez esta seja uma <strong>da</strong>s<br />
estratégias que defin<strong>em</strong> com mais clareza<br />
os anseios <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> de ser reconheci<strong>da</strong> como a melhor<br />
solução de apoio aos órgãos públicos e<br />
organizações de modo geral.<br />
Nos últimos anos, a <strong>FGR</strong> v<strong>em</strong> d<strong>em</strong>onstrando<br />
seu know how na área <strong>da</strong> Educação,<br />
prioritariamente naqueles projetos<br />
que contribu<strong>em</strong> para a melhoria<br />
e o crescimento <strong>da</strong> Defesa Social <strong>em</strong><br />
Minas Gerais. O Superintendente-Geral<br />
<strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção, Álvaro Antônio Nicolau,<br />
analisou o ambiente no qual a instituição<br />
está inseri<strong>da</strong>: “Minas Gerais se destaca<br />
no cenário econômico nacional,<br />
certamente por vivenciar um período<br />
virtuoso que combina crescimento econômico,<br />
ajuste fiscal e reordenação<br />
institucional. Nesse ambiente de negócios,<br />
o Estado promove importantes<br />
inversões <strong>em</strong> projetos não só de infraestrutura,<br />
mas também de preparação<br />
de seu pessoal, no treinamento, cursos,<br />
além de concursos para compl<strong>em</strong>entação<br />
de seus quadros, mormente <strong>da</strong><br />
Defesa Social. Esse ambiente propiciou<br />
à Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>, com sua<br />
expertise <strong>em</strong> cursos, concursos, treinamentos<br />
e consultorias, participar <strong>da</strong>s<br />
diversas concorrências públicas, tendo<br />
participação no processo.”(Relatório<br />
Anual 2007).<br />
Nesse cenário, vale enfatizar o alto padrão<br />
na organização de concursos para<br />
atender aos setores <strong>da</strong> administração<br />
pública <strong>em</strong> Minas, especificamente <strong>da</strong><br />
Guar<strong>da</strong> Municipal <strong>da</strong> Capital e de ci<strong>da</strong>des<br />
como Juiz de Fora, Pitangui, Contag<strong>em</strong>,<br />
Alfenas, Varginha, Sabará e Três<br />
Pontas. Além dos concursos púbicos<br />
para os cargos de nível médio e superior<br />
dos quadros permanentes <strong>da</strong>s prefeituras,<br />
e para agente de segurança<br />
penitenciária de vários municípios.<br />
Por outro lado, a parceria com a SEDS<br />
(Secretaria de Estado <strong>da</strong> Defesa Social),<br />
PMMG (Polícia Militar de Minas Gerais),<br />
Polícia Civil, Guar<strong>da</strong> Municipal e Corpo<br />
de Bombeiros Militar permite à <strong>FGR</strong><br />
criar alternativas de aperfeiçoamento,<br />
b<strong>em</strong> como promover a valorização dos<br />
profissionais de segurança pública, visando<br />
à melhoria <strong>da</strong> quali<strong>da</strong>de dos serviços<br />
prestados à população. Em 2007,<br />
a relação de cursos incluiu desde a capacitação<br />
dos alunos <strong>da</strong> Guar<strong>da</strong> Municipal<br />
selecionados <strong>em</strong> concurso, passando<br />
por s<strong>em</strong>inários de ação comunitária,<br />
com envolvimento dos moradores; s<strong>em</strong>inários<br />
de avaliação do Comando de<br />
Policiamento <strong>da</strong> Capital; curso de segurança<br />
preventiva orienta<strong>da</strong> ao turismo,<br />
principalmente para o circuito <strong>da</strong><br />
Estra<strong>da</strong> Real; até os treinamentos do<br />
PROERD (Programa Educacional de Resistência<br />
às Drogas e à Violência).<br />
Em 2008, a <strong>FGR</strong> lançou os cursos<br />
livres de curta duração <strong>em</strong> diversas<br />
áreas do conhecimento. O programa<br />
educacional e informativo é aberto<br />
ao público e as aulas, ministra<strong>da</strong>s por<br />
profissionais reconhecidos no mercado,<br />
acontec<strong>em</strong> na própria instituição, entre<br />
eles: “Linux - Sist<strong>em</strong>a Operacional e<br />
Pacote de Escritório”; “Contratos e<br />
Licitações”; “Mediação de Conflito”;<br />
“Existir com Sexuali<strong>da</strong>de”; e “Auditoria”.<br />
No primeiro s<strong>em</strong>estre de 2008,<br />
a <strong>FGR</strong> capacitou 120 profissionais.<br />
Importante mencionar, ain<strong>da</strong>, as diferentes<br />
formas de transmitir conceitos,<br />
conhecimentos e produtos que a <strong>FGR</strong><br />
v<strong>em</strong> adotando com êxito <strong>em</strong> conjunto<br />
com enti<strong>da</strong>des de destaca<strong>da</strong> atuação<br />
<strong>em</strong> Minas Gerais e <strong>em</strong> outros estados.<br />
Diferent<strong>em</strong>ente dos cursos de curta duração,<br />
os s<strong>em</strong>inários, workshops, palestras<br />
e fóruns atra<strong>em</strong> interessados <strong>em</strong><br />
conhecer a atuação <strong>da</strong> instituição <strong>em</strong><br />
áreas como Segurança Pública, Desenvolvimento<br />
Sustentável, Psicologia e<br />
Sociologia. Entre os principais: CISED -<br />
Ciclo de Segurança <strong>em</strong> Debate, cuja primeira<br />
palestra, no final de 2007, abordou<br />
o t<strong>em</strong>a “Desafios <strong>da</strong> Segurança<br />
Pública no Século XXI”; II S<strong>em</strong>inário de<br />
Responsabili<strong>da</strong>de Socioambiental, <strong>em</strong><br />
5 de junho de 2008; e o I Simpósio de<br />
Psicoterapia Existencial, com previsão<br />
para acontecer <strong>em</strong> set<strong>em</strong>bro de 2008.<br />
Porém, os objetivos institucionais <strong>da</strong><br />
Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> vão além e<br />
compreend<strong>em</strong> ações sociais, comunitárias,<br />
voluntariado, pesquisa e desenvolvimento<br />
institucional. Desde o início<br />
de sua trajetória, há seis anos, é marcante<br />
o trabalho <strong>em</strong> favor <strong>da</strong>s crianças,<br />
adolescentes e idosos que viv<strong>em</strong><br />
nas comuni<strong>da</strong>des carentes, sendo reconhecido<br />
por organismos formados por<br />
representantes do governo e <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
civil. Ex<strong>em</strong>plos de uma atuação<br />
socioeducativa e cultural de sucesso<br />
pod<strong>em</strong> ser conferidos nesta edição do<br />
“<strong>FGR</strong> <strong>em</strong> <strong>Revista</strong>”: “Escola <strong>da</strong> Paz” e<br />
“Inclusão Digital”.<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
9
Escola <strong>da</strong> Paz<br />
O século XX foi considerado o mais<br />
violento e sangrento <strong>da</strong> história.<br />
Nesse século, o mundo assistiu a<br />
duas guerras mundiais; a explosão de<br />
bombas atômicas; as crises ambientais<br />
globais; a diversos conflitos territoriais,<br />
sociais e culturais; a guerra fria; a acumulação<br />
de armas de destruição <strong>em</strong><br />
massa e o surgimento do terrorismo<br />
internacional. Atualmente, a humani<strong>da</strong>de<br />
encontra-se <strong>em</strong> um momento de<br />
transição histórica, no qual o hom<strong>em</strong><br />
é convi<strong>da</strong>do a desvencilhar-se de<br />
práticas, atitudes e comportamentos<br />
que ger<strong>em</strong> violência e a construir um<br />
mundo de paz.<br />
A construção de um mundo de paz se<br />
torna pr<strong>em</strong>ente por causa do risco <strong>da</strong><br />
autodestruição e <strong>da</strong> diss<strong>em</strong>inação <strong>da</strong><br />
violência <strong>em</strong> todos os segmentos <strong>da</strong><br />
socie<strong>da</strong>de. E esse fenômeno é global.<br />
Mais do que <strong>em</strong> qualquer outro<br />
momento histórico, um clamor por<br />
mu<strong>da</strong>nças eclode no nosso t<strong>em</strong>po.<br />
Em todo o mundo, as pessoas têm<br />
sido confronta<strong>da</strong>s pela intolerância;<br />
pela violência; pela derroca<strong>da</strong> dos<br />
valores; pelo desrespeito aos direitos<br />
humanos. E isso t<strong>em</strong> contribuído para<br />
a reinstalação <strong>da</strong> barbárie, porque<br />
as pessoas estão usando a força e o<br />
derramamento de sangue para atingir<br />
interesses particulares. Para reverter<br />
esse rumo, é preciso construir uma<br />
cultura de paz, é preciso ter e viver<br />
num mundo de paz. Nessa construção,<br />
a Escola é chama<strong>da</strong> a des<strong>em</strong>penhar<br />
um papel fun<strong>da</strong>mental. Para isso,<br />
precisa estabelecer um clima dialógico<br />
e implantar uma Educação para a Paz<br />
no Século XXI.<br />
A consoli<strong>da</strong>ção desse mundo de paz<br />
requer uma Educação para ou pela<br />
Paz. A paz não é somente a resolução<br />
de guerras ou conflitos<br />
beligerantes, mas, também,<br />
a resolução de conflitos<br />
e injustiças entre as<br />
pessoas por meio do<br />
diálogo. Nesse sentido,<br />
a Escola pode contribuir<br />
para a construção de<br />
um mundo melhor ao<br />
implantar uma Educação<br />
para a Paz e promover um<br />
clima dialógico. Na medi<strong>da</strong><br />
<strong>em</strong> que o ambiente<br />
escolar favorecer a paz<br />
(e, por conseguinte, o<br />
diálogo), estará abrindo<br />
caminho para que os<br />
estu<strong>da</strong>ntes de hoje sejam<br />
os ci<strong>da</strong>dãos responsáveis<br />
e educados de amanhã. Seres<br />
humanos aptos a perpetuar a<br />
história <strong>da</strong> própria espécie e a<br />
preservar a história <strong>da</strong>s d<strong>em</strong>ais<br />
espécies e do planeta Terra.<br />
“Escola <strong>da</strong> Paz” na<br />
construção de um<br />
mudo melhor<br />
O Programa “Escola <strong>da</strong> Paz” se inscreve<br />
no esforço <strong>da</strong> construção de um<br />
mundo de paz, no qual a Educação é<br />
alicerce, coluna e viga de sustentação.<br />
Esse programa surgiu <strong>em</strong> 2007, depois<br />
que os participantes do projeto<br />
“Portas Abertas”, que eram, e muitos<br />
ain<strong>da</strong> são, alunos <strong>da</strong> Escola Estadual<br />
educação e cultura<br />
A esperança para o século XXI<br />
10 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
Henrique Diniz, divulgaram<br />
o trabalho desenvolvido<br />
pela Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> com crianças e adolescentes. Esse<br />
fato encorajou a diretora Tereza Cristina<br />
Queiroga de Morais e muitos professores<br />
<strong>da</strong> escola a formar uma parceria<br />
com a Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>.<br />
Após a realização dos primeiros contatos,<br />
a psicóloga Flávia Mônico, gestora<br />
psicossocial dos projetos sociais
educação e cultura<br />
<strong>da</strong> <strong>FGR</strong>, passou a visitar a escola e pôde<br />
constatar a existência de uma cultura<br />
de violência que conseguia desestabilizar<br />
o ambiente escolar, reproduzindo<br />
as graves dificul<strong>da</strong>des <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
brasileira. A violência gera<strong>da</strong> pela manifestação<br />
dos probl<strong>em</strong>as sociais na<br />
escola se amplificava pela falta de<br />
uma orientação educacional <strong>em</strong> favor<br />
<strong>da</strong> formação<br />
de<br />
valores civilizatórios. Diante disso, a<br />
parceria concretiza<strong>da</strong> entre a <strong>FGR</strong> e<br />
a Escola Estadual Henrique Diniz permitiu<br />
transformar as ações, atitudes<br />
e comportamentos impregnados pela<br />
cultura <strong>da</strong> violência <strong>em</strong> ações e valores<br />
de uma Educação <strong>da</strong> Paz.<br />
A Educação <strong>da</strong> Paz não busca a extinção<br />
do conflito, mas sua resolução e a mitigação<br />
<strong>da</strong>s injustiças entre as pessoas.<br />
Nesse sentido, a Educação <strong>da</strong> Paz é uma<br />
construção coletiva. Além disso, repõe<br />
ou propõe o diálogo e a negociação. Esses<br />
termos, por sua vez, implicam <strong>em</strong><br />
aprendizag<strong>em</strong> e relacionamento. Desses<br />
quatro termos, <strong>em</strong>erg<strong>em</strong> os eixos norteadores<br />
do Programa “Escola <strong>da</strong> Paz”.<br />
Esses guar<strong>da</strong>m conexão com os quatro<br />
pilares - aprender a conhecer, aprender<br />
a fazer, aprender a viver juntos, aprender<br />
a ser - <strong>da</strong> Educação para o Futuro,<br />
apontados no Relatório<br />
para a UNESCO (Organização<br />
<strong>da</strong>s Nações<br />
Uni<strong>da</strong>s para a<br />
Educação, a Ciência<br />
e a Cultura) <strong>da</strong><br />
Comissão Internacional<br />
sobre Educação<br />
para o Século<br />
XXI. O eixo “diálogo”<br />
corresponde a<br />
aprender a viver<br />
juntos. O eixo “negociação”,aprender<br />
a fazer (produzir<br />
por meio de<br />
determina<strong>da</strong> ação,<br />
realizar). O eixo “aprendizag<strong>em</strong>”,<br />
a aprender a<br />
conhecer. E o eixo “relacionamento”<br />
corresponde a<br />
aprender a ser.<br />
Os eixos norteadores do Programa<br />
“Escola <strong>da</strong> Paz” estruturam as três<br />
dimensões <strong>da</strong> atuação educacional<br />
do programa: trabalho interdisciplinar<br />
com conteúdos substantivos sobre valores<br />
e paz, a valorização dos “Heróis<br />
<strong>da</strong> Paz” e a abertura <strong>da</strong> escola nos<br />
finais de s<strong>em</strong>ana.<br />
O trabalho interdisciplinar com os conteúdos<br />
substantivos busca a internalização<br />
de conhecimentos e as práticas<br />
promotoras <strong>da</strong> paz e v<strong>em</strong> sendo realizado<br />
de acordo com programação t<strong>em</strong>ática<br />
apropria<strong>da</strong> a ca<strong>da</strong> momento<br />
educacional. O trabalho interdisciplinar<br />
com conteúdos substantivos<br />
parte <strong>da</strong>s representações dos alunos,<br />
s<strong>em</strong> se fechar nelas, procurando estabelecer<br />
um ponto de entra<strong>da</strong> no sist<strong>em</strong>a<br />
cognitivo que permita a desestabilização<br />
dessas representações, além<br />
de sua organização ou reorganização<br />
com os conhecimentos abor<strong>da</strong>dos <strong>em</strong><br />
sala de aula.<br />
A valorização dos “Heróis <strong>da</strong> Paz”<br />
privilegia ações de diversos ícones pacifistas<br />
como referência para se viver e<br />
praticar a paz. Nesse trabalho, a escola<br />
cria um banco de ícones <strong>da</strong> paz e submete<br />
os estu<strong>da</strong>ntes a uma escolha do<br />
“Herói <strong>da</strong> Paz” <strong>em</strong> ca<strong>da</strong> ano letivo. O<br />
herói eleito não poderá concorrer nos<br />
próximos pleitos até que todo o banco<br />
de ícones seja visto (a vi<strong>da</strong> e obra do<br />
herói serão trabalha<strong>da</strong>s nas diversas<br />
disciplinas). O exercício t<strong>em</strong> seu ponto<br />
alto no dia 21 de set<strong>em</strong>bro, “Dia Internacional<br />
<strong>da</strong> Paz”. Os alunos também<br />
poderão atuar como protagonistas<br />
<strong>da</strong> paz, inscrevendo-se nos diversos<br />
concursos culturais (poesia, re<strong>da</strong>ção,<br />
teatro, entre outros) durante o ano do<br />
“Herói <strong>da</strong> Paz”. A apresentação e pr<strong>em</strong>iação<br />
dos trabalhos vencedores ocorrerão<br />
durante a “S<strong>em</strong>ana Internacional<br />
<strong>da</strong> Paz”: uma festa cívica que celebra<br />
as ações pacifistas <strong>em</strong> âmbito local,<br />
nacional e internacional. Anualmente,<br />
as ativi<strong>da</strong>des realiza<strong>da</strong>s na “S<strong>em</strong>ana<br />
Internacional <strong>da</strong> Paz” farão parte do<br />
“Festival Escola <strong>da</strong> Paz”. E to<strong>da</strong>s as<br />
ativi<strong>da</strong>des serão avalia<strong>da</strong>s no “Fórum<br />
<strong>da</strong> Paz”, a ser realizado no final do ano,<br />
quando os alunos poderão se inscrever<br />
para participar <strong>da</strong> programação.<br />
A professora Luciamar Rosse Reis<br />
Ferreira, <strong>da</strong> 1ª série <strong>da</strong> Escola Estadual<br />
Henrique Diniz, fala <strong>da</strong> eleição<br />
do “Herói <strong>da</strong> Paz” na turma: “Com<br />
certeza, as crianças d<strong>em</strong>onstraram<br />
entusiasmo com a eleição do representante<br />
de turma e do personag<strong>em</strong>,<br />
que foi o ‘Piu-Piu’. Tudo na minha sala<br />
t<strong>em</strong> o ‘Piu-Piu’. Da lixeirinha ao lápis<br />
e ao caderno. Tudo deles também t<strong>em</strong><br />
o personag<strong>em</strong>. A turminha do ‘Piu-Piu’<br />
deixa recadinhos para os meninos do<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
11
Ensino Médio, <strong>da</strong> manhã e <strong>da</strong> noite,<br />
e troca bilhetinhos pedindo para que<br />
eles não rasgu<strong>em</strong> a nossa mascote.<br />
As crianças participam junto comigo e<br />
isso está repercutindo na escola inteira.<br />
Na minha sala eu, como professora de<br />
primeira série, estou amando, acho<br />
que não deve acabar nunca.”<br />
A abertura <strong>da</strong> escola nos fins de<br />
s<strong>em</strong>ana se efetivará com a realização<br />
de oficinas que proporcion<strong>em</strong> lazer, esportes<br />
e cultura, mas também espaços<br />
para a convivência comunitária e o<br />
protagonismo juvenil. Essa dimensão<br />
se espelha no Programa “Abrindo<br />
Espaços - Escolas de Paz”, promovido<br />
desde 2000 pela UNESCO <strong>em</strong> parceria<br />
com o Governo Estadual do Rio de<br />
Janeiro. Abrir a escola para a comuni<strong>da</strong>de<br />
nos finais de s<strong>em</strong>ana, além<br />
do acesso ao lazer, <strong>da</strong>rá aos jovens a<br />
oportuni<strong>da</strong>de de vivenciar ações de<br />
educação para valores e para a paz.<br />
As três dimensões do trabalho educacional<br />
do Programa “Escola <strong>da</strong> Paz”<br />
buscam, essencialmente, a transformação<br />
<strong>da</strong>s ações, atitudes e comportamentos<br />
impregnados pela cultura<br />
<strong>da</strong> violência que se verifica na escola<br />
<strong>em</strong> ações e valores de uma Educação<br />
<strong>da</strong> Paz. Além <strong>da</strong> operacionalização<br />
dos seus objetivos, o Programa “Escola<br />
<strong>da</strong> Paz” pretende atingir as seguintes<br />
metas: diminuir a ocorrência de fatos<br />
violentos na escola; diminuir o insucesso<br />
escolar (notas) e a ocorrência de<br />
comportamento inadequado (qualquer<br />
ação que atente contra a estruturação<br />
<strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des escolares); aumentar a<br />
participação <strong>da</strong> família do estu<strong>da</strong>nte<br />
na escola; estimular o aluno a internalizar<br />
e promover a cultura <strong>da</strong> paz; implantar<br />
a educação <strong>da</strong> paz e o ”Festival<br />
Escola <strong>da</strong> Paz”; incentivar o aluno a valorizar<br />
o diálogo, a negociação e o relacionamento;<br />
estimular o aluno a valorizar<br />
a escola e o conhecimento.<br />
12 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
O conjunto de ações proposto pelo Programa<br />
“Escola <strong>da</strong> Paz” é ousado. Sua<br />
execução requer cui<strong>da</strong>do, planejamento<br />
e esforço integrado. A primeira ação<br />
do programa na escola foi de conscientização<br />
sobre a paz com a turma 261<br />
(primeira turma de 6ª série do 2º turno<br />
escolar), no ano letivo de 2007. Esse<br />
trabalho, realizado no segundo s<strong>em</strong>estre,<br />
consistiu <strong>em</strong> uma pequena introdução<br />
<strong>da</strong> nobre tarefa de construir a<br />
Escola <strong>da</strong> Paz para o Século XXI. Feita<br />
a apresentação, foi preciso impl<strong>em</strong>entar<br />
um trabalho de maior envergadura<br />
na escola. Como o programa é muito<br />
amplo, os parceiros decidiram aplicar<br />
um teste-piloto com os 231 alunos do<br />
nível introdutório até a 4ª série e realizar<br />
uma pesquisa de clima escolar com<br />
os d<strong>em</strong>ais alunos e com todos os professores<br />
e funcionários <strong>da</strong> Escola Estadual<br />
Henrique Diniz.<br />
O teste-piloto foi iniciado <strong>em</strong> 2008<br />
com eventos de sensibilização e treinamento<br />
dos professores para a promoção<br />
<strong>da</strong> cultura de paz e <strong>da</strong> educação<br />
para a paz com os alunos do nível<br />
introdutório e de 1ª a 4ª séries. Em fevereiro,<br />
aconteceu a palestra “Vivendo<br />
Valores na Escola” com o fim de<br />
sensibilizar e motivar os professores<br />
a realizar<strong>em</strong> dinâmicas e reflexões.<br />
Simultaneamente, foram treinados<br />
18 professores para trabalhar com o<br />
material didático elaborado por uma<br />
equipe de profissionais <strong>da</strong> <strong>FGR</strong>. Esse<br />
material é composto por cadernos de<br />
ativi<strong>da</strong>des dos alunos e de orientações<br />
para os professores. O conteúdo do<br />
caderno de ativi<strong>da</strong>des enfatiza valores<br />
como convívio social, tolerância, soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de,<br />
responsabili<strong>da</strong>de, proteção<br />
à natureza, companheirismo, amor e<br />
ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia. Enfim, o teste-piloto pretende<br />
avaliar a execução <strong>da</strong>s três dimensões<br />
do trabalho educacional do<br />
Programa Escola <strong>da</strong> Paz com os alunos<br />
do introdutório e de 1ª a 4ª séries<br />
durante o ano de 2008.<br />
educação e cultura<br />
A vice-diretora <strong>da</strong> Escola Estadual<br />
Henrique Diniz, Mag<strong>da</strong> Simaria Simões,<br />
avalia os resultados dessa megaoperação<br />
<strong>em</strong> favor <strong>da</strong> paz: “Ain<strong>da</strong><br />
não t<strong>em</strong>os uma definição de tamanha<br />
grandiosi<strong>da</strong>de. Porém, já começamos<br />
a perceber mu<strong>da</strong>nças nos meninos,<br />
seu comportamento dentro de sala de<br />
aula, a relação entre os colegas e entre<br />
os professores. Então, a gente começa<br />
a ter mu<strong>da</strong>nças <strong>em</strong> relação aos procedimentos,<br />
ao resgate de valores diss<strong>em</strong>inados<br />
pela ‘Escola <strong>da</strong> Paz’.”<br />
Na pesquisa de clima escolar, será<br />
feito o diagnóstico <strong>da</strong> escola, o mapeamento<br />
<strong>da</strong>s idéias dos alunos sobre<br />
a violência escolar e a percepção que<br />
eles têm sobre o conjunto de ações<br />
do Programa “Escola <strong>da</strong> Paz”. Os<br />
primeiros passos para a construção de<br />
uma paz duradoura foram <strong>da</strong>dos. Cabe,<br />
agora, a todos os agentes envolvidos<br />
no Programa “Escola <strong>da</strong> Paz” regar e<br />
s<strong>em</strong>ear os frutos <strong>da</strong> paz.<br />
A Sra. Roselita Imacula<strong>da</strong> de Medeiros<br />
Brito, mãe de dois alunos <strong>da</strong> escola,<br />
um na <strong>3ª</strong> série e outro no Introdutório,<br />
já percebe os resultados do Programa<br />
“Escola <strong>da</strong> Paz” <strong>em</strong> casa: “Meus meninos<br />
mu<strong>da</strong>ram muito, eles não brigam<br />
mais e comentam sobre os livrinhos<br />
de ativi<strong>da</strong>des: eles gostam muito. O<br />
projeto é importante, principalmente<br />
para os meninos mais levados. Meus<br />
filhos levam to<strong>da</strong>s as novi<strong>da</strong>des e<br />
contam tudo sobre o que aprenderam<br />
na escola.”<br />
Hoje, 219 crianças são assisti<strong>da</strong>s<br />
pelo Programa “Escola <strong>da</strong> Paz”, com<br />
o total de 200 famílias beneficia<strong>da</strong>s<br />
indiretamente. Ao todo, a <strong>FGR</strong> investe<br />
R$ 2.300,00/mês <strong>em</strong> ações de transformação<br />
de atitudes e comportamentos<br />
impregnados de violência <strong>em</strong> <strong>em</strong>preendimentos<br />
de saudável convivência<br />
e de promoção contínua <strong>da</strong> paz e <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia.<br />
(Foto: Projetos Escola <strong>da</strong> Paz e Portas<br />
Abertas.)
educação e cultura<br />
A parceria entre a tecnologia e os<br />
métodos pe<strong>da</strong>gógicos tradicionais facilita<br />
a integração <strong>da</strong> educação com o<br />
mercado de trabalho e a formação de<br />
crianças e adolescentes <strong>em</strong> situação<br />
de vulnerabili<strong>da</strong>de social. Da mesma<br />
forma, a Inclusão Digital, caracteriza<strong>da</strong><br />
pela efetiva d<strong>em</strong>ocratização do<br />
acesso às tecnologias digitais, t<strong>em</strong><br />
auxiliado no processo de manuseio<br />
de ferramentas <strong>da</strong> comunicação e<br />
modernas técnicas para atender o<br />
ci<strong>da</strong>dão que depende de novos meios<br />
de sobrevivência.<br />
O termo Inclusão Digital surge a partir<br />
do avanço <strong>da</strong> globalização e significa<br />
melhorar as condições de vi<strong>da</strong> de uma<br />
determina<strong>da</strong> região ou comuni<strong>da</strong>de<br />
com a aju<strong>da</strong> <strong>da</strong> tecnologia. Incluir<br />
digitalmente não é apenas “alfabetizar”<br />
digitalmente, mas melhorar<br />
A <strong>FGR</strong> e a Inclusão Digital:<br />
uma possibili<strong>da</strong>de<br />
de Inserção Social<br />
quadros sociais a partir do uso dos<br />
computadores. A Inclusão Digital é<br />
representa<strong>da</strong> por grande número de<br />
pessoas com acesso às mais diversas<br />
tecnologias <strong>da</strong> informação, à Internet<br />
e aos serviços que ela oferece.<br />
Segundo <strong>da</strong>dos <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção Getúlio<br />
Vargas e IBGE (Instituto Brasileiro de<br />
Geografia e Estatística) aproxima<strong>da</strong>mente<br />
12% dos brasileiros têm computador<br />
<strong>em</strong> suas residências e pouco<br />
mais de 8% encontram-se conectados<br />
à Internet. Esses <strong>da</strong>dos retratam<br />
como a população brasileira t<strong>em</strong> sido<br />
priva<strong>da</strong> do acesso à tecnologia.<br />
Será necessária uma política ampla<br />
que trabalhe com as particulari<strong>da</strong>des<br />
de ca<strong>da</strong> região e para que o acesso à<br />
tecnologia faça parte efetivamente <strong>da</strong><br />
vi<strong>da</strong> desses grupos sociais, atendendo<br />
Aula de Tecnologia Linux para os participantes do Projeto Portas Abertas.<br />
as necessi<strong>da</strong>des específicas de ca<strong>da</strong><br />
um deles. Dessa forma, a informação<br />
poderá ser difundi<strong>da</strong> localmente e<br />
compartilha<strong>da</strong> entre eles.<br />
Tendo <strong>em</strong> vista a importância de<br />
se promover a Inclusão Digital, a<br />
Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> investe<br />
na produção e diss<strong>em</strong>inação de conhecimento<br />
digital nas comuni<strong>da</strong>des<br />
carentes que, por falta de recursos,<br />
são excluí<strong>da</strong>s <strong>da</strong> tecnologia. A possibili<strong>da</strong>de<br />
de desenvolvimento pessoal e<br />
de vínculo social para as comuni<strong>da</strong>des<br />
está ca<strong>da</strong> vez mais próxima, com as<br />
ações promovi<strong>da</strong>s pela <strong>FGR</strong>. O Projeto<br />
“Inclusão Digital: uma possibili<strong>da</strong>de<br />
de Inserção Social”, criado <strong>em</strong> 2006,<br />
t<strong>em</strong> o objetivo de desenvolver estratégias<br />
para promover a inclusão social<br />
de comuni<strong>da</strong>des menos favoreci<strong>da</strong>s,<br />
utilizando-se de ferramentas <strong>da</strong><br />
tecnologia e <strong>da</strong> comunicação como<br />
instrumento para construção, crescimento<br />
e exercício <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia.<br />
Para realizar as ativi<strong>da</strong>des do Projeto<br />
“Inclusão Digital”, a Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> dispõe de um laboratório<br />
de informática (Telecentro) com<br />
estrutura de Internet ban<strong>da</strong> larga, um<br />
computador por aluno, <strong>em</strong> turmas<br />
com dez alunos e apoio capacitado de<br />
monitoria e recursos de equipamentos<br />
multimídia. Os cursos de informática<br />
são aplicados por profissionais<br />
<strong>da</strong> área de Tecnologia <strong>da</strong> Informação<br />
com habili<strong>da</strong>des pe<strong>da</strong>gógicas, o<br />
que facilita a aprendizag<strong>em</strong> dos alunos.<br />
A metodologia do projeto prevê<br />
a aplicação de um curso básico de informática<br />
(Linux, BrOffice e Internet),<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
13
com carga horária de 56 horas, dividido<br />
nos turnos manhã e tarde.<br />
A participação de integrantes dos<br />
Programas e Projetos Sociais <strong>da</strong> <strong>FGR</strong><br />
é constante no Projeto “Inclusão<br />
Digital”. Adolescentes e jovens, entre<br />
12 e 24 anos completos, já matriculados<br />
<strong>em</strong> algum programa ou projeto,<br />
são beneficiados com os cursos de<br />
informática. Os alunos que passam<br />
pelo Projeto “Inclusão Digital”<br />
receb<strong>em</strong> conhecimento e prática para<br />
desenvolver uma consciência ci<strong>da</strong>dã<br />
e de transformação social, além de<br />
qualificação que facilita a inserção no<br />
mercado de trabalho.<br />
Número de atendidos<br />
20<br />
15<br />
10<br />
5<br />
0<br />
Participantes por Projeto<br />
Projeto Portas<br />
Abertas<br />
Projeto JOIA<br />
Crianças e Adolescentes assistidos pelo<br />
projeto <strong>da</strong> <strong>FGR</strong> “Inclusão Digital”, <strong>em</strong><br />
2007<br />
Com a finali<strong>da</strong>de de maximizar o uso<br />
do Telecentro <strong>FGR</strong>, gerando ren<strong>da</strong><br />
para auto-investimento, a participação<br />
do público externo também<br />
é destaque. A <strong>FGR</strong> oferece curso básico<br />
de Informática (Linux, BrOffice e<br />
Internet) e curso de Windows (Word,<br />
Excel e PowerPoint) a baixo custo<br />
para a comuni<strong>da</strong>de <strong>em</strong> geral. O projeto<br />
ain<strong>da</strong> inclui a capacitação dos colaboradores<br />
<strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong>, além de professores <strong>da</strong> rede pública<br />
estadual. É o conhecimento gerador<br />
de quali<strong>da</strong>de na prestação de<br />
14 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
Número de atendidos<br />
80<br />
70<br />
60<br />
50<br />
40<br />
30<br />
20<br />
10<br />
0<br />
Outros Segmentos<br />
Colaboradores <strong>FGR</strong> Público Externo<br />
Outros Segmentos Atendidos pelo “Inclusão<br />
Digital” <strong>em</strong> 2007<br />
serviços para a comuni<strong>da</strong>de. O IBGE<br />
(Instituto Brasileiro de Geografia e<br />
Estatística) publicou, <strong>em</strong> 2006, uma<br />
pesquisa que d<strong>em</strong>onstrava a participação<br />
dos municípios nas políticas de<br />
inclusão digital. O levantamento identificou<br />
que, <strong>em</strong> metade dos municípios<br />
(52,9%), a iniciativa foi adota<strong>da</strong>.<br />
Entre as regiões, a Sul aparece <strong>em</strong> primeiro<br />
lugar (59,4%) e a Sudeste <strong>em</strong><br />
segundo lugar, com 57,9%, na iniciativa<br />
de promover a inclusão digital.<br />
Em 2007/2008, a Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> já faz parte desta estatística.<br />
O Projeto “Inclusão Digital” foi levado<br />
para outras locali<strong>da</strong>des. A Escola Estadual<br />
Henrique Diniz recebeu a aju<strong>da</strong><br />
dos técnicos <strong>da</strong> <strong>FGR</strong> para montag<strong>em</strong> do<br />
laboratório de informática, capacitação<br />
de professores para manuseio do Sist<strong>em</strong>a<br />
de Tecnologia Linux, além de facilitar<br />
a formatura <strong>da</strong> primeira turma de<br />
“Inclusão Digital” dos alunos do Ensino<br />
Fun<strong>da</strong>mental e Médio. “Eu sou capaz<br />
de fazer! Existe um mundo informatizado<br />
e eu faço parte dele!”, é assim que<br />
a diretora Tereza Cristina Queiroga de<br />
Morais, <strong>da</strong> Escola Estadual Henrique Diniz,<br />
fala sobre a importância <strong>da</strong> inclusão<br />
digital para alunos <strong>da</strong> rede pública<br />
de ensino. “Hoje, a reali<strong>da</strong>de impõe<br />
educação e cultura<br />
esta tecnologia, que é importante e necessária<br />
no âmbito do Estado”, declara<br />
a diretora.<br />
De sonho à reali<strong>da</strong>de<br />
de um futuro melhor.<br />
O sonho de se tornar um profissional<br />
excelente e construir algo para<br />
si e para sua família estão ca<strong>da</strong> vez<br />
mais presentes na mente de um adolescente.<br />
E é isso que a <strong>FGR</strong> busca,<br />
além de proporcionar desenvolvimento<br />
pessoal e social por meio <strong>da</strong> Inclusão<br />
Digital: levar o ci<strong>da</strong>dão a entender a<br />
importância do conhecimento para<br />
vencer no mercado de trabalho.<br />
O jov<strong>em</strong> Luan Alves <strong>da</strong> Conceição,<br />
ex-participante do Projeto “Portas<br />
Abertas”, é um bom ex<strong>em</strong>plo de<br />
como a inclusão digital pode intervir<br />
de forma positiva no crescimento<br />
profissional do indivíduo. “Com a<br />
aju<strong>da</strong> do Projeto, já comecei a ter<br />
visão do que queria. Ajudou na minha<br />
formação do dia-a-dia.” Ele participou<br />
do Projeto “Inclusão Digital”<br />
e dos cursos de tecnologia Linux I e<br />
III. “Aprendi muito e me ajudou no<br />
trabalho que eu faço”. Tanto que o<br />
rapaz já foi contratado pela <strong>FGR</strong> para<br />
trabalhar no Departamento de Ensino<br />
e Pesquisa e diz que o curso é um<br />
diferencial: “A maioria <strong>da</strong>s <strong>em</strong>presas<br />
hoje utiliza essa tecnologia.”<br />
“A possibili<strong>da</strong>de<br />
de proporcionar<br />
desenvolvimento pessoal<br />
e vínculo social para a<br />
comuni<strong>da</strong>de está agora<br />
mais próxima, com as<br />
ações promovi<strong>da</strong>s pela<br />
Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong>”<br />
Fonte: IBGE, Disponível <strong>em</strong>:<br />
(http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=1006&id_<br />
pagina=1). Acesso <strong>em</strong> 28 de abril de 2008.
educação e cultura<br />
A orali<strong>da</strong>de negra na formação<br />
nacional e valorização <strong>da</strong> SEPPIR<br />
Kelly Cardozo<br />
Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>: A SEPPIR<br />
(Secretaria Especial Políticas de<br />
Promoção <strong>da</strong> Igual<strong>da</strong>de Racial<br />
<strong>da</strong> Presidência <strong>da</strong> República),<br />
<strong>em</strong> linhas gerais, foi cria<strong>da</strong> para<br />
o “reconhecimento <strong>da</strong>s lutas<br />
históricas do Movimento Negro e<br />
ampliou sua atuação para outros<br />
segmentos étnicos discriminados”.<br />
Perceb<strong>em</strong>os <strong>em</strong> algumas articulações<br />
realiza<strong>da</strong>s pela Fun<strong>da</strong>ção<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>, que envolv<strong>em</strong><br />
assuntos relacionados à SEPPIR<br />
<strong>em</strong> meios públicos e privados,<br />
um desconhecimento <strong>da</strong> maioria<br />
desses mesmos setores sobre<br />
suas ações. Você poderia explicar<br />
melhor a atuação <strong>da</strong> SEPPIR e sua<br />
divulgação na socie<strong>da</strong>de?<br />
Assessoria de Comunicação <strong>da</strong><br />
SEPPIR / Presidência <strong>da</strong> República:<br />
A SEPPIR foi cria<strong>da</strong> <strong>em</strong> 2003 com a<br />
missão de coordenar as políticas públicas<br />
e ações afirmativas para a proteção<br />
dos direitos sociais de indivíduos<br />
<strong>em</strong> grupos raciais e étnicos, com ênfase<br />
na população negra e povos etnicamente<br />
discriminados, como judeus, palestinos,<br />
indígenas e ciganos. A SEPPIR<br />
é resultado <strong>da</strong> histórica luta do Movimento<br />
Negro no Brasil, b<strong>em</strong> como do<br />
reconhecimento <strong>da</strong> enorme dívi<strong>da</strong> social<br />
para com o povo negro. T<strong>em</strong> por<br />
missão acompanhar e coordenar políticas<br />
de promoção <strong>da</strong> Igual<strong>da</strong>de Racial,<br />
executa<strong>da</strong>s por diferentes ministérios<br />
e outros órgãos do governo brasileiro.<br />
Além de articular, formular, promover<br />
e acompanhar a execução de diversos<br />
programas de cooperação com organismos<br />
públicos e privados, nacionais<br />
e internacionais, e, ain<strong>da</strong>, acompanhar<br />
e promover o cumprimento de acordos<br />
e convenções internacionais assinados<br />
pelo Brasil que digam respeito à promoção<br />
<strong>da</strong> Igual<strong>da</strong>de Racial e ao combate<br />
ao racismo.<br />
A Política Nacional de Promoção <strong>da</strong><br />
Igual<strong>da</strong>de Racial foi instituí<strong>da</strong> no<br />
mesmo ano, tratando de ações viáveis<br />
<strong>em</strong> longo, médio e curto prazos, primando<br />
pela defesa dos direitos, pela<br />
afirmação do caráter pluriétnico <strong>da</strong><br />
socie<strong>da</strong>de brasileira, pela preservação<br />
e proteção <strong>da</strong>s terras de comuni<strong>da</strong>des<br />
r<strong>em</strong>anescentes de quilombos, pelo<br />
cumprimento <strong>da</strong> criminalização do<br />
racismo, mediante ações afirmativas e<br />
transversali<strong>da</strong>de entre a questão racial<br />
e outros fatores de vulnerabili<strong>da</strong>de.<br />
A falta de conhecimento mais amplo<br />
<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de a respeito <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des<br />
<strong>da</strong> SEPPIR talvez se explique<br />
por ser a promoção <strong>da</strong> Igual<strong>da</strong>de Racial<br />
um t<strong>em</strong>a relativamente recente<br />
na agen<strong>da</strong> do Estado brasileiro; por<br />
não existir, <strong>em</strong> nenhuma outra parte<br />
do mundo, órgão governamental<br />
congênere; pela famigera<strong>da</strong> inaptidão<br />
dos veículos brasileiros de comunicação<br />
no trato com as questões<br />
raciais, o que reforça no imaginário<br />
popular o mito <strong>da</strong> d<strong>em</strong>ocracia racial<br />
brasileira; e por não ser a SEPPIR a<br />
executora final <strong>da</strong>s ações e políticas<br />
que formula e articula.<br />
<strong>FGR</strong>: O sist<strong>em</strong>a brasileiro, <strong>em</strong> geral,<br />
ain<strong>da</strong> encontra dificul<strong>da</strong>des na<br />
inserção <strong>da</strong> política de reparação<br />
<strong>da</strong> “História e Cultura Africana<br />
e Afro-Brasileira” na Educação,<br />
por intermédio <strong>da</strong> Lei Federal nº<br />
10.639, sanciona<strong>da</strong> <strong>em</strong> 2003, pois<br />
longo é o caminho <strong>da</strong> valorização<br />
cultural dessa matriz. Quais são os<br />
programas e <strong>em</strong> que áreas a SEPPIR<br />
atua? Qual é o direcionamento e<br />
como são disponibiliza<strong>da</strong>s essas<br />
ações para a socie<strong>da</strong>de?<br />
SEPPIR: O desafio <strong>da</strong> SEPPIR é fazer<br />
com que todos os agentes sociais incorpor<strong>em</strong><br />
a Política Nacional de Promoção<br />
<strong>da</strong> Igual<strong>da</strong>de Racial, seja por<br />
meio <strong>da</strong> ação direta, direcionando os<br />
programas do Governo Federal ou estimulando<br />
os estados e municípios,<br />
<strong>em</strong>presas e organizações não-governamentais,<br />
por meio de incentivos,<br />
convênios e parcerias, a adotar<strong>em</strong> programas<br />
de promoção <strong>da</strong> Igual<strong>da</strong>de Racial.<br />
A mesma situação se verifica <strong>em</strong><br />
relação à adoção e cumprimento <strong>da</strong> Lei<br />
nº 10.639/03, que institui o ensino de<br />
História <strong>da</strong> África e História dos Negros<br />
no Brasil na grade curricular de to<strong>da</strong>s<br />
as escolas brasileiras de nível fun<strong>da</strong>mental<br />
e médio, sejam elas públicas<br />
ou priva<strong>da</strong>s. A Lei nº 10.639/03 altera a<br />
LDB (Lei de Diretrizes e Bases <strong>da</strong> Educação).<br />
Como a implantação <strong>da</strong> Lei é<br />
de responsabili<strong>da</strong>de dos sist<strong>em</strong>as de<br />
ensino, a atuação <strong>da</strong> SEPPIR fica restrita<br />
à transversali<strong>da</strong>de, seja com o Ministério<br />
<strong>da</strong> Educação, seja com os governos<br />
estaduais e municipais.<br />
No entanto, há poucos organismos<br />
similares à SEPPIR no Brasil,<br />
<strong>em</strong> âmbito estadual ou municipal.<br />
Não existe marco legal ou jurídico<br />
que envolva os órgãos públicos <strong>em</strong><br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
15
geral para tratar de políticas públicas<br />
volta<strong>da</strong>s para a redução <strong>da</strong>s desigual<strong>da</strong>des<br />
raciais. Para alterar esse<br />
quadro é necessário que os gestores<br />
locais assumam a responsabili<strong>da</strong>de<br />
institucional na impl<strong>em</strong>entação <strong>da</strong>s<br />
políticas de promoção de Igual<strong>da</strong>de<br />
Racial. Nesse sentido, fortalecendo<br />
o diálogo com estados e municípios,<br />
a SEPPIR constituiu o FIPIR (Fórum<br />
Intergovernamental de Promoção <strong>da</strong><br />
Igual<strong>da</strong>de Racial), que promove uma<br />
ação continua<strong>da</strong> entre as três esferas<br />
de governo (federal, estaduais e<br />
municipais) com a finali<strong>da</strong>de de articular,<br />
capacitar, planejar, executar<br />
e monitorar ações de promoção <strong>da</strong><br />
Igual<strong>da</strong>de Racial. Conseguimos avanços<br />
e o governo de alguns estados,<br />
como o Rio de Janeiro, por ex<strong>em</strong>plo,<br />
já estão se preparando para adotar<br />
integralmente a medi<strong>da</strong>.<br />
Compreend<strong>em</strong>os, ain<strong>da</strong>, que a d<strong>em</strong>ora<br />
na adoção <strong>da</strong> Lei nº 10.639/03 se deve<br />
ao pequeno quantitativo de educadores<br />
capacitados para o ensino <strong>da</strong>s disciplinas<br />
<strong>em</strong> questão. Neste sentido, a<br />
SEPPIR - <strong>em</strong> parceria com a Petrobras, o<br />
Centro Brasileiro de Identi<strong>da</strong>de e Documentação<br />
do Artista Negro, a TV Globo<br />
e a Fun<strong>da</strong>ção Roberto Marinho - formulou<br />
e estu<strong>da</strong> a ampliação do Projeto<br />
“A Cor <strong>da</strong> Cultura”, que prevê a criação<br />
de conteúdos audiovisuais e impressos<br />
sobre a cultura afro-brasileira. Esse<br />
material está sendo diss<strong>em</strong>inado por<br />
meio <strong>da</strong> TV e também <strong>em</strong> duas mil escolas<br />
públicas de ensino fun<strong>da</strong>mental<br />
de vários estados do País. Para isso, os<br />
professores estão sendo capacitados<br />
para utilizá-lo <strong>em</strong> sala de aula, sendo<br />
acompanhados nessa impl<strong>em</strong>entação.<br />
Além disso, os conteúdos serão disponibilizados<br />
<strong>em</strong> uma página na Internet,<br />
que aprofun<strong>da</strong>rá os t<strong>em</strong>as tratados por<br />
meio de artigos e biografias.<br />
<strong>FGR</strong>: Ain<strong>da</strong> na questão <strong>da</strong> Educação,<br />
<strong>em</strong> março de 2008 foram altera<strong>da</strong>s<br />
a Lei nº 9.394, de Diretrizes e Bases,<br />
e a Lei nº 10.639, “Introdução<br />
16 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
<strong>da</strong> História e Cultura Africana, Afro-<br />
Brasileira”, para a Lei nº 11.645,<br />
“Introdução <strong>da</strong> História e Cultura<br />
Africana, Afro-Brasileira e Indígena”.<br />
A SEPPIR t<strong>em</strong> condições de<br />
se adequar à t<strong>em</strong>ática indígena no<br />
exercício do presente ano?<br />
SEPPIR: A comuni<strong>da</strong>de indígena é<br />
integrante do Conselho <strong>da</strong> SEPPIR.<br />
Quanto à nova Lei, foi realiza<strong>da</strong> uma<br />
reunião com os professores indígenas<br />
durante a I Conferência Nacional<br />
de Educação Básica, promovi<strong>da</strong> pelo<br />
MEC, no último mês de abril, <strong>em</strong> Brasília.<br />
Na ocasião, foi deliberado que o<br />
Comitê Nacional de Educação Escolar<br />
Indígena, vinculado ao MEC, irá debater<br />
a questão para obter uma posição<br />
sobre a melhor conduta a ser adota<strong>da</strong><br />
quanto à t<strong>em</strong>ática. Cabe destacar que<br />
a educação escolar indígena t<strong>em</strong> uma<br />
longa trajetória de construção, bastante<br />
diferencia<strong>da</strong> dos d<strong>em</strong>ais sist<strong>em</strong>as de<br />
ensino. Resta agora à SEPPIR aguar<strong>da</strong>r<br />
as diretrizes do Conselho Nacional de<br />
Educação, órgão do MEC que determina<br />
as diretrizes para a educação nacional<br />
e as decisões do próprio Comitê.<br />
<strong>FGR</strong>: Sobre o Patrimônio, o IPHAN<br />
(Instituto do Patrimônio Histórico<br />
e Artístico Nacional) sancionou o<br />
Decreto n° 3.551, de 4 de agosto<br />
de 2000: “No registro de bens culturais<br />
de natureza imaterial e preservação<br />
do patrimônio, focados<br />
no ser humano de forma inclusiva e<br />
d<strong>em</strong>ocrática”; e a UNESCO adotou<br />
a Convenção para a Salvaguar<strong>da</strong> do<br />
Patrimônio Cultural Intangível <strong>em</strong><br />
2003. No caso <strong>da</strong> SEPPIR, qual é o<br />
posicionamento <strong>em</strong> relação a esse<br />
t<strong>em</strong>a? A instituição possui departamentos<br />
específicos na t<strong>em</strong>ática<br />
<strong>da</strong> Orali<strong>da</strong>de e/ou Imateriali<strong>da</strong>de?<br />
Quais são os projetos? Ressalte os<br />
que têm cunho afrodescendente.<br />
SEPPIR: A SEPPIR atua, também, nos<br />
processos de identificação e preservação<br />
dos bens culturais de nossa<br />
educação e cultura<br />
população, colaborando com a Fun<strong>da</strong>ção<br />
Palmares, o IPHAN (Instituto<br />
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional)<br />
e outros órgãos. Um ex<strong>em</strong>plo<br />
recente foi a titulação do samba carioca<br />
como patrimônio. Em março de<br />
2008, <strong>em</strong> s<strong>em</strong>inário no Rio de Janeiro<br />
que celebrou um ano dessa titulação,<br />
começamos a discutir o programa de<br />
salvaguar<strong>da</strong> com ações volta<strong>da</strong>s para<br />
registro, recuperação e preservação<br />
dessas manifestações.<br />
<strong>FGR</strong>: Na promoção de Políticas<br />
Públicas, a SEPPIR produz materiais<br />
didático-pe<strong>da</strong>gógicos e culturais<br />
de educação patrimonial<br />
nas áreas de Patrimônio Material<br />
e Imaterial Afro?<br />
SEPPIR: A SEPPIR t<strong>em</strong> função de articular<br />
as políticas públicas volta<strong>da</strong>s para<br />
os segmentos populacionais que ain<strong>da</strong><br />
viv<strong>em</strong> sob situação de desigual<strong>da</strong>de.<br />
Dessa forma, muito de nosso esforço<br />
concentra-se <strong>em</strong> estimular entes federativos<br />
- órgãos do Governo Federal, prefeituras,<br />
governos estaduais e suas autarquias<br />
- a executar ações e a adotar<br />
políticas. Inúmeras publicações com este<br />
enfoque foram apoia<strong>da</strong>s pela SEPPIR.<br />
<strong>FGR</strong>: Explique qual procedimento<br />
as Enti<strong>da</strong>des (priva<strong>da</strong>s) que investigam<br />
o Patrimônio Material e Imaterial<br />
dev<strong>em</strong> seguir para estreitar<br />
laços e melhorar a articulação com<br />
a SEPPIR?<br />
SEPPIR: A SEPPIR está s<strong>em</strong>pre aberta<br />
e muitíssimo interessa<strong>da</strong> <strong>em</strong> estreitar<br />
laços com a socie<strong>da</strong>de civil que já manifesta<br />
suas preocupações com o patrimônio<br />
imaterial. Este tipo de parceria<br />
geralmente produz benefícios significativos.<br />
Em nossa página na Internet<br />
está publicado o Manual de Convênios<br />
que pode ser um caminho.<br />
Kelly Cardozo - Especialista <strong>em</strong> Cultura Africana<br />
e Afro-brasileira e gradua<strong>da</strong> <strong>em</strong> História.<br />
Gestora e Historiadora do Programa de Valorização<br />
<strong>da</strong> Cultura Negra <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> - <strong>FGR</strong> - Site: www.fgr.org.br
educação e cultura<br />
A cultura negra e afro-brasileira preserva<strong>da</strong><br />
<strong>em</strong> Bom Despacho<br />
“Não tenho a letra, só tenho a palavra!” Dona Fiota<br />
Na Tabatinga, comuni<strong>da</strong>de de afrodescendentes e bairro pobre de Bom Despacho (MG), ninguém conhece<br />
Dona Fiota pelo seu nome de batismo. Pode ser Fiota ou Fiotinha, mas, raramente, Maria Joaquina <strong>da</strong> Silva,<br />
a velha senhora de quase 80 anos que domina a Língua <strong>da</strong> Tabatinga: gíria de orig<strong>em</strong> banto e espécie de<br />
código secreto para conversação e troca de informações entre os moradores <strong>da</strong> locali<strong>da</strong>de. Pois há pouco<br />
t<strong>em</strong>po, a Dona Fiota resolveu que era hora de mostrar e ensinar a Língua <strong>da</strong> Tabatinga para os mais jovens,<br />
preservando, assim, a m<strong>em</strong>ória dos negros e a cultura oral de sua gente. Dessa forma, surgiu o Projeto “Dona<br />
Fiota”, como parte de um projeto maior - “Afro-Brasileiro: (Re) Criando Nossas Raízes” - desenvolvido <strong>em</strong><br />
Bom Despacho pela Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>. Um ex<strong>em</strong>plo de como as instituições, sejam elas públicas ou<br />
priva<strong>da</strong>s, pod<strong>em</strong> contribuir para a recuperação, preservação e diss<strong>em</strong>inação dos bens culturais de natureza<br />
imaterial do patrimônio brasileiro nas escolas e nos d<strong>em</strong>ais municípios mineiros.<br />
Desde 2006, a Historiadora e Especialista <strong>em</strong> Estudos Africanos e Afro-Brasileiros, Kelly Cardozo, e a Assistente de<br />
Pesquisa, Rosângela Melo Gontijo, se dedicam ao trabalho de coleta de documentos, informações e depoimentos<br />
para a elaboração de 12 cartilhas didático-pe<strong>da</strong>gógicas “Contando Saberes: Histórias <strong>da</strong> Dona Fiota”, que enfatizam<br />
t<strong>em</strong>as como história <strong>da</strong> África, vocabulário e cultura, além dos conceitos de família, plurali<strong>da</strong>de, ancestrali<strong>da</strong>de,<br />
preconceito racial e outros. Esta é uma coleção única e pioneira <strong>em</strong> que a própria Dona Fiota e uma<br />
turminha de alunos <strong>da</strong> Escola Estadual Matinho Fidelis (Bom Despacho) contam, de maneira lúdica e prazerosa,<br />
muitas histórias sobre a vin<strong>da</strong> dos negros escravos ao Brasil e como influenciaram nas tradições, costumes e valores<br />
do povo brasileiro. E mais, como a Língua <strong>da</strong> Tabatinga chegou a Bom Despacho, como foi ensina<strong>da</strong> a Dona<br />
Fiota e repassa<strong>da</strong> para os moradores <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de, l<strong>em</strong>brando s<strong>em</strong>pre que a orali<strong>da</strong>de t<strong>em</strong> papel relevante<br />
na manutenção dos valores histórico-culturais do negro no Brasil. Dessas 12 cartilhas, sete já foram distribuí<strong>da</strong>s<br />
para as crianças do Ensino Fun<strong>da</strong>mental.<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
17
João; um encantado...<br />
Nasceu: rosa no sertão infindo, João<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>, filho de Seu Fulô -<br />
Florduardo Pinto <strong>Rosa</strong>, e de Dona<br />
Chiquitinha - Francisca <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong>, a 27 de junho de 1908. Era<br />
no signo <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> um enluado, via-se<br />
b<strong>em</strong> no rosto e no olhar. Herdou no<br />
coração um burgo inteiro, uma ci<strong>da</strong>de<br />
povoa<strong>da</strong> pelas histórias mineiras que<br />
não poderia ter outro nome, senão<br />
Cordisburgo. Batizado foi de forma<br />
singular, numa pia batismal talha<strong>da</strong><br />
<strong>em</strong> milenar pedra calcária - uma<br />
estalagmite arranca<strong>da</strong> <strong>da</strong> Gruta de<br />
Maquiné. Assim, como no batismo<br />
glorificamos a nossa alma a Deus,<br />
o Encantado glorificou sua alma às<br />
coisas <strong>da</strong> sua terra, entranha<strong>da</strong>s no<br />
fundo do coração do povo, enterra<strong>da</strong>s<br />
<strong>em</strong> mistérios e transcendências, os<br />
fundos e abismos <strong>da</strong> alma, os mistérios<br />
<strong>da</strong>s grutas escuras do pensamento e<br />
sentimento humanos.<br />
Era o primeiro dos seis filhos de Dona<br />
Chiquitinha. O pai era caçador de<br />
onça e contador de história. O filho,<br />
caçou a vi<strong>da</strong> inteira as histórias <strong>da</strong>s<br />
onças que não foram caça<strong>da</strong>s, <strong>da</strong>s<br />
onças que viviam e rugiam dentro<br />
dele, para todo s<strong>em</strong>pre. Na vendinha<br />
que o pai tinha à casa g<strong>em</strong>ina<strong>da</strong>, o<br />
menino Joãzito, atento, no <strong>em</strong>bornal<br />
<strong>da</strong> m<strong>em</strong>ória, colecionava histórias dos<br />
que por ali passavam. Gente sertaneja,<br />
vaqueiros que conduziam boia<strong>da</strong>s<br />
a Cordisburgo, para <strong>em</strong>barque nos<br />
trens <strong>da</strong> Central do Brasil com destino<br />
a Belo Horizonte, Rio de Janeiro e<br />
São Paulo. O pai, com o filho ralhava:<br />
“Conversa de adulto não é para menino!”<br />
Mas Joãzito sabia muito b<strong>em</strong><br />
18 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
Petrônio Souza Gonçalves<br />
do tesouro mágico que aos seus olhos<br />
e ouvidos ali se desfral<strong>da</strong>va. Um dia,<br />
declarou: “O que eu gostava mesmo<br />
era fechar-me num quarto e trancar a<br />
porta. Deitar no chão e imaginar estórias,<br />
po<strong>em</strong>as, romances, botando todo<br />
mundo conhecido como personag<strong>em</strong>,<br />
misturando as melhores coisas vistas<br />
e ouvi<strong>da</strong>s.” Quando se fechava <strong>em</strong><br />
seu quarto, Joãzito libertava o pensamento<br />
e, montado no cavalo alado <strong>da</strong><br />
imaginação, desven<strong>da</strong>va o sertão que<br />
só conhecia pelas histórias ouvi<strong>da</strong>s na<br />
vendinha do pai.<br />
O menino Joãzito já gostava de ler,<br />
e, sentadinho no chão frio - à Bu<strong>da</strong>,<br />
se curvava diante do universo lúdico<br />
<strong>da</strong>s palavras. Assim ficava horas a fio.<br />
Certo dia, recebendo a vista do Dr.<br />
José Loureço, amigo <strong>da</strong> família, foi<br />
analisado pelo médico que estranhou<br />
o jeito do meninozinho ler, de forma<br />
tão curva<strong>da</strong>, com os olhos s<strong>em</strong>icerrados.<br />
Era miopia - vista curta - que<br />
o tornava cego para as coisas desprovi<strong>da</strong>s<br />
de translucidez, de algo além do<br />
mundo táctil normal. Via mais com os<br />
olhos do coração. Aprendeu a sentir<br />
o mundo que o cercava. Só aos nove<br />
anos de i<strong>da</strong>de, <strong>em</strong> Belo Horizonte,<br />
passou a usar óculos.<br />
Já aos sete anos, Joãzito começou<br />
sozinho, ou melhor, com os seus,<br />
a estu<strong>da</strong>r francês. Com o Frei Canísio<br />
Zoetmulder, frade franciscano<br />
holandês, iniciou-se no holandês e<br />
deu prosseguimento aos estudos de<br />
francês, que iniciara antes. Aos nove<br />
anos incompletos, foi morar com<br />
os avós na capital <strong>da</strong>s Gerais, onde<br />
terminou o curso primário no Grupo<br />
Escolar Afonso Pena. Na terra natal,<br />
foi aluno <strong>da</strong> Escola Mestre Candinho.<br />
Estudou ain<strong>da</strong> o curso secundário no<br />
Colégio Santo Antônio, <strong>em</strong> São João<br />
del Rei, por pouco t<strong>em</strong>po, retornando<br />
a Belo Horizonte e matriculando-se<br />
no Colégio Arnaldo, onde aprendeu<br />
al<strong>em</strong>ão com os padres al<strong>em</strong>ães.<br />
Algum t<strong>em</strong>po depois, definiu:<br />
homenag<strong>em</strong><br />
“Falo português, al<strong>em</strong>ão, francês,<br />
inglês, espanhol, italiano,<br />
esperanto, um pouco de russo;<br />
leio sueco, holandês, latim e grego<br />
(mas com o dicionário agarrado);<br />
entendo alguns dialetos al<strong>em</strong>ães;<br />
estudei a gramática: do húngaro,<br />
do árabe, do sânscrito, do lituânio,<br />
do polonês, do tupi, do hebraico,<br />
do japonês, do tcheco, do finlandês,<br />
do dinamarquês; bisbilhotei um<br />
pouco a respeito de outras. Mas<br />
tudo mal. E acho que estu<strong>da</strong>r o<br />
espírito e o mecanismo de outras<br />
línguas aju<strong>da</strong> muito à compreensão<br />
mais profun<strong>da</strong> do idioma nacional.<br />
Principalmente, porém, estu<strong>da</strong>ndose<br />
por divertimento, gosto e<br />
distração.”<br />
Muito mais que to<strong>da</strong>s as línguas,<br />
aprendeu a falar ao coração <strong>da</strong><br />
humani<strong>da</strong>de, a ler e a desven<strong>da</strong>r os<br />
corações e mistérios dos homens.<br />
Em 1925, matricula-se na Facul<strong>da</strong>de<br />
de Medicina <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de<br />
de Minas Gerais, aos 16 anos. Em<br />
1929, ain<strong>da</strong> estu<strong>da</strong>nte de medicina,<br />
João <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> estreou no
homenag<strong>em</strong><br />
mundo surdo <strong>da</strong>s palavras. Escreveu<br />
quatro contos: Caçador de Camurças,<br />
Chronos Kai Anagke (título grego, significando<br />
t<strong>em</strong>po e destino), O mistério<br />
de Highmore Hall e Makiné, para um<br />
concurso promovido pela revista “O<br />
Cruzeiro”. Visava mais os prêmios<br />
(c<strong>em</strong> mil réis o conto) do que propriamente<br />
a experiência literária. Todos os<br />
contos foram pr<strong>em</strong>iados e publicados<br />
com ilustrações <strong>em</strong> 1929 e 1930. Anos<br />
depois, <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> confessaria<br />
que nessa época escrevia friamente,<br />
s<strong>em</strong> paixão, preso a moldes alheios -<br />
era como se garimpasse <strong>em</strong> erra<strong>da</strong><br />
lavra. Seguindo o veio <strong>da</strong> sua vocação<br />
natural, <strong>em</strong> Tutaméia revelou o que<br />
com ele se passou: “Tudo se finge, primeiro;<br />
germina autêntico é depois.”<br />
Nele não apenas germinou, cresceu,<br />
floresceu, deu frutos e s<strong>em</strong>entes que<br />
são planta<strong>da</strong>s diariamente nos solos<br />
férteis <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> humana.<br />
Em 27 de junho de 1930, ao completar<br />
22 anos, casou-se com Lígia Cabral<br />
Penna, de apenas 16 anos. O casal<br />
teve duas filhas: Vilma e Agnes. No<br />
mesmo ano, formou-se <strong>em</strong> Medicina<br />
pela U.M.G. e, pela aclamação dos<br />
35 colegas, torna-se orador oficial <strong>da</strong><br />
turma. Seu discurso foi publicado no<br />
jornal “Minas Gerais” de 22 e 23 de<br />
dez<strong>em</strong>bro de 1930. Nele, o Encantado<br />
já perfilava o seu conhecimento lingüístico<br />
e a cultura literária clássica.<br />
Na parte final do discurso, referese<br />
à “Oração” do “illuminado<br />
Moysés Maimonides”:<br />
“Senhor, enche a minha<br />
alma de amor pela arte<br />
e por to<strong>da</strong>s as creaturas.<br />
Sustenta a força do<br />
meu coração, para que<br />
esteja s<strong>em</strong>pre prompto<br />
a servir ao pobre e<br />
ao rico, ao amigo e ao<br />
inimigo, ao bondoso e ao<br />
malvado. E faça com que<br />
eu não veja sinão o humano,<br />
naquelle que soffre!”<br />
Depois de formado, <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong><br />
foi exercer a profissão <strong>em</strong> Itaguara,<br />
então município de Itaúna (MG),<br />
onde permaneceria por cerca de dois<br />
anos. Lá, o doutor facultado, como<br />
na oração, vai conviver com a gente<br />
simples do lugar. Tornou-se amigo de<br />
Manoel Rodrigues de Carvalho,<br />
o Seu Nequinha, que morava<br />
num grotão enfurnado<br />
entre morros, conhecido<br />
por Sarandi. Seu Nequinha<br />
era adepto do<br />
espiritismo e parece ter<br />
inspirado a figura do<br />
Compadre Quel<strong>em</strong>ém,<br />
personag<strong>em</strong> de Grande<br />
Sertão: Vere<strong>da</strong>s.<br />
Ain<strong>da</strong> <strong>em</strong> Itaguara,<br />
nasceria sua primeira<br />
filha, Vilma, que, na<br />
ausência do farmacêutico<br />
oficial, fez ele mesmo o parto<br />
<strong>da</strong> primogênita. Quando saiu de<br />
Itaguara, <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> foi servir<br />
como médico voluntário <strong>da</strong> Força<br />
Pública, durante a Revolução Constitucionalista<br />
de 1932, indo parar no<br />
setor do Túnel. Posteriormente, entra<br />
para o quadro <strong>da</strong> Força Pública, por<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
19
concurso. Em 1933, vai para Barbacena<br />
na quali<strong>da</strong>de de Oficial-Médico<br />
do 9º Batalhão de Infantaria.<br />
De Barbacena, <strong>Guimarães</strong> prestou<br />
concurso para o Itamarati, obtendo<br />
o segundo lugar. Nessa época, <strong>Rosa</strong><br />
confidenciou ao seu colega, Dr. Pedro<br />
Moreira Barbosa, <strong>em</strong> carta <strong>da</strong>ta<strong>da</strong> de<br />
20 de março de 1934, a sua desilusão<br />
com a medicina:<br />
“Não nasci para isso, penso. Não<br />
é esta, digo como dizia Don Juan,<br />
s<strong>em</strong>pre ‘après avoir couché avec...’<br />
Primeiramente, repugna-me<br />
qualquer trabalho material – só<br />
posso agir satisfeito no terreno <strong>da</strong>s<br />
teorias, dos textos, do raciocínio<br />
puro, dos subjetivismos. Sou um<br />
jogador de xadrez – nunca pude,<br />
por ex<strong>em</strong>plo, com o bilhar ou com<br />
o futebol.”<br />
O Encantado queria mesmo era curar<br />
os homens por dentro, na sua alma,<br />
no seu coração. Por isso, com o título<br />
de doutor dos homens não foi apenas<br />
o médico-doutor, foi muito mais, foi<br />
o doutor-escritor que, com as mãos<br />
unta<strong>da</strong>s de poesia, curou muitos dos<br />
males que faz<strong>em</strong> dos homens o ser<br />
humano normal. Ele buscava o lado<br />
encantado-humano, o lado que só<br />
cabe no sentimento e derrama nas<br />
palavras... Sendo assim, anos depois,<br />
abandonou a medicina para plantar<br />
no coração de muitos um canteiro<br />
inteiro de ervas e palavras, to<strong>da</strong>s<br />
agua<strong>da</strong>s pela fonte <strong>da</strong> poesia, do<br />
etéreo, do lúdico, <strong>da</strong>s coisas que estão<br />
muito além de nós.<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> concorreu <strong>em</strong> 1936<br />
com um livro de versos intitulado<br />
Magma, ao prêmio de poesia <strong>da</strong><br />
Acad<strong>em</strong>ia Brasileira de Letras.<br />
Ganhou com louvor o primeiro lugar,<br />
encantando com seus versos o modernista<br />
Guilherme de Almei<strong>da</strong>. Anos<br />
depois, <strong>Rosa</strong> falaria sobre a sua inicial<br />
produção poética:<br />
20 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
“Meu começo, foram poesias (...)<br />
escrevi um volume na<strong>da</strong> pequeno<br />
de poesias que foram até elogia<strong>da</strong>s,<br />
e que me proporcionaram louvor.<br />
Mas aí, eu, quase diria felizmente,<br />
comecei a ser absorvido pela minha<br />
profissão: eu viajei pelo mundo,<br />
conheci muita coisa, aprendi<br />
línguas, acolhi tudo isso <strong>em</strong> mim,<br />
mas não pude mais escrever.<br />
Assim se passaram 10 anos até<br />
eu poder dedicar-me de novo à<br />
literatura. E quando eu revi, então,<br />
meus exercícios líricos, achei-os<br />
na ver<strong>da</strong>de não ruins de todo,<br />
mas também não particularmente<br />
convincentes. Sobretudo, descobri<br />
que a poesia profissional que<br />
a gente t<strong>em</strong> de lançar mão nos<br />
po<strong>em</strong>as pode ser a morte <strong>da</strong><br />
ver<strong>da</strong>deira poesia. Por isso eu me<br />
voltei para a len<strong>da</strong> heróica, o conto<br />
fabuloso, a estória simples. Por que<br />
isso são coisas que a vi<strong>da</strong> escreve,<br />
não a legali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s chama<strong>da</strong>s<br />
regras poéticas. Então, eu me sentei<br />
e comecei a escrever Sagarana.”<br />
Em 1937, <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>, com uma<br />
série de contos, os reuniu <strong>em</strong> um volume<br />
para concorrer, <strong>em</strong> dez<strong>em</strong>bro<br />
do mesmo ano, ao prêmio Humberto<br />
de Campos, criado pela Livraria José<br />
Olympio Editora. A comissão julgadora<br />
desse concurso foi composta por<br />
Graciliano Ramos, Marques Rebelo,<br />
Prudente de Morais Neto, Dias <strong>da</strong><br />
Costa e Peregrino Júnior. Com o pseudônimo<br />
de Viator - do latim: o passageiro,<br />
o vian<strong>da</strong>nte - o Encantado conquistou<br />
o segundo lugar no concurso,<br />
entre os 57 candi<strong>da</strong>tos.<br />
Em 1938, <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> é nomeado<br />
Cônsul Adjunto <strong>em</strong> Hamburgo. Já na<br />
Europa, conhece aquela que seria sua<br />
segun<strong>da</strong> esposa, Aracy Moebius de<br />
Carvalho, a Dona Ara. Junto à esposa,<br />
facilitou a migração de judeus al<strong>em</strong>ães<br />
para o Brasil no período <strong>da</strong> Al<strong>em</strong>anha<br />
nazista. Pela grandeza <strong>da</strong> alma, do<br />
coração <strong>em</strong> formato de rosa, João e<br />
homenag<strong>em</strong><br />
Ara tornaram-se nome de um bosque<br />
<strong>em</strong> Jerusalém, <strong>em</strong> 1985. Talvez, de<br />
uma forma figura<strong>da</strong>, para l<strong>em</strong>brar que<br />
no meio de tantos escombros e opressões,<br />
o encantamento se encontra<br />
abaixo dos homens, escondido, mas<br />
viceja num campo <strong>em</strong> flor.<br />
Quando o governo Vargas rompeu<br />
com a Al<strong>em</strong>anha <strong>em</strong> 1942, <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> foi internado <strong>em</strong> Baden-Baden,<br />
juntamente com outros compatriotas.<br />
Os brasileiros ficaram detidos durante<br />
quatro meses e foram libertados <strong>em</strong><br />
troca de diplomatas al<strong>em</strong>ães. Retornando<br />
ao Brasil, depois de uma rápi<strong>da</strong><br />
passag<strong>em</strong> pela capital federal, <strong>Rosa</strong><br />
segue para Bogotá, como Secretário<br />
<strong>da</strong> Embaixa<strong>da</strong>, ficando lá até 1944.<br />
Em 45, de volta ao Brasil, retoma os<br />
originais dos contos com os quais<br />
concorrera ao prêmio Humberto<br />
de Campos e, após uma reflexiva<br />
revisão, publica <strong>em</strong> 1946, pela Editora<br />
Universal, Sagarana, esgotando-se no<br />
mesmo ano duas edições. A palavra sagarana,<br />
uma formação híbri<strong>da</strong> cria<strong>da</strong><br />
pelo próprio autor, é a fusão de saga,<br />
substantivo comum de proveniência<br />
germânica, aplica<strong>da</strong> genericamente<br />
a narrativas históricas ou lendárias,<br />
e rana, adjetivo tupi que significa<br />
“parecido com, malfeito, tosco”. Um<br />
dia, <strong>Rosa</strong> definiu os enigmas do livro<br />
como sendo “uma série de histórias<br />
adultas <strong>da</strong> Carochinha”.<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> é nomeado <strong>em</strong> 1946<br />
Chefe de Gabinete do ministro João Neves<br />
<strong>da</strong> Fontoura e vai a Paris como m<strong>em</strong>bro<br />
<strong>da</strong> delegação à Conferência de Paz. Em<br />
nov<strong>em</strong>bro de 1947 publica no “Correio<br />
<strong>da</strong> Manhã” a reportag<strong>em</strong> poética com<br />
o Vaqueiro Mariano, resultado de uma<br />
viag<strong>em</strong> ao pantanal matogrossense que<br />
o deixou deslumbrado, a ponto de considerar<br />
a região “um ver<strong>da</strong>deiro paraíso<br />
terrestre, um Éden”.<br />
Como Secretário-Geral <strong>da</strong> delegação<br />
brasileira, <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> vai a Bogotá
homenag<strong>em</strong><br />
<strong>em</strong> 1948 à IX Conferência Inter-Americana.<br />
De 1948 a 1950, <strong>Rosa</strong> fica <strong>em</strong><br />
Paris, como 1º Secretário e Conselheiro<br />
<strong>da</strong> Embaixa<strong>da</strong>. Em 51, volta ao Brasil e<br />
é novamente nomeado Chefe de Gabinete<br />
de João Neves <strong>da</strong> Fontoura. Em 53,<br />
torna-se Chefe <strong>da</strong> Divisão de Orçamento<br />
e, <strong>em</strong> 58, é promovido Ministro de<br />
Primeira Classe (cargo correspondente a<br />
Embaixador). Em janeiro de 62, assume<br />
a chefia do Serviço de D<strong>em</strong>arcação de<br />
Fronteiras, tendo tomado parte decisiva<br />
<strong>em</strong> momentos-chaves com relação aos<br />
casos do Pico <strong>da</strong> Neblina e <strong>da</strong>s Sete<br />
Que<strong>da</strong>s. Em 1969, <strong>em</strong> homenag<strong>em</strong> ao<br />
seu des<strong>em</strong>penho como diplomata, seu<br />
nome é <strong>da</strong>do ao pico <strong>da</strong> Cordilheira<br />
Curupira, situado na fronteira Brasil/<br />
Venezuela. Já estava acima de nós, povoava<br />
os céus, o mundo leve enevoado.<br />
Em 52, depois de viajar o mundo, sentiu<br />
o peito desabitado pelas coisas que lhe<br />
eram mais baratas, caras e raras. Sentiu<br />
que estava despovoado do sertão que<br />
lhe era tudo, o princípio, o fim e o meio.<br />
De Três Marias, <strong>da</strong> lendária fazen<strong>da</strong><br />
Sirga, saiu ele junto de um grupo de<br />
vaqueiros para fazer uma viag<strong>em</strong><br />
para dentro dele mesmo, para os seus<br />
mistérios, suas crenças, o seu mundo<br />
escuro e desabitado. Na companhia<br />
de Manuelzão, redimensionou o seu<br />
coração vasto, <strong>em</strong>poeirado de glórias<br />
e histórias. Em comitiva, <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> percorreu 40 léguas de histórias<br />
abertas nos caminhos do seu peito,<br />
<strong>da</strong> sua alma, até chegar a Araçaí. No<br />
lombo do t<strong>em</strong>po, plantou nele mesmo<br />
uma s<strong>em</strong>ente que vingaria e <strong>da</strong>ria<br />
uma árvore imensa, frondosa, debaixo<br />
de onde descansaria e escreveria as<br />
histórias mágicas, colhi<strong>da</strong>s nas curvas<br />
<strong>da</strong>s estra<strong>da</strong>s, no sabor do vento.<br />
Em 1956, <strong>Rosa</strong> reaparece com as<br />
novelas de Corpo de Baile. A partir<br />
<strong>da</strong> <strong>3ª</strong> edição, o livro se desdobra <strong>em</strong><br />
três volumes: Manuelzão e Miguilim,<br />
No Urubùquaquá, no Pinhém e Noites<br />
do Sertão. Como o ano estava a favor<br />
do vento <strong>da</strong> história, <strong>Rosa</strong> lança a 4ª<br />
edição de Sagarana, com ilustrações<br />
de Poty e, para marcar de forma definitiva<br />
a literatura nacional, aparece<br />
ele com as flores do mês de maio, com<br />
o Grande Sertão: Vere<strong>da</strong>s, ou melhor,<br />
as vere<strong>da</strong>s do grande sertão, aquele<br />
que se esconde aos nossos olhos na<br />
linha do horizonte, aquele que não se<br />
mede na linha do t<strong>em</strong>po.<br />
Como tudo que está acima de nós não<br />
v<strong>em</strong>os completamente ao primeiro<br />
olhar, o sertão de <strong>Rosa</strong> ficou um pouco<br />
desabitado pelos leitores e, vendo<br />
o equívoco histórico que se sucedia,<br />
Afonso Arinos de Melo Franco soprou<br />
aos ouvidos mais atentos:<br />
“Cui<strong>da</strong>do com esse livro, pois Grande<br />
Sertão: Vere<strong>da</strong>s é como certos<br />
casarões velhos, certas igrejas cheias<br />
de sombras. No princípio a gente<br />
entra e não vê na<strong>da</strong>. Só contornos<br />
difusos, movimentos indecisos, planos<br />
atormentados. Mas aos poucos, não é<br />
luz nova que chega; é a visão que se<br />
habitua. E, com ela, a compreensão<br />
admirativa. O imprudente ou sai logo<br />
e perde o que não viu, ou resmunga<br />
contra a escuridão, pragueja, dá<br />
rabana<strong>da</strong>s e pontapés. Então arriscase<br />
a chocar inadverti<strong>da</strong>mente contra<br />
coisas que, depois, identificará como<br />
muito belas.”<br />
Depois, muitos, todos, mergulharam<br />
na catedral mágica do Sertão grandioso<br />
para rezar as histórias mágicas<br />
do Encantado, para comungar com<br />
o que é maior, com aquilo que não<br />
se toca, mas se sente no mais fundo<br />
<strong>da</strong> alma. Era uma <strong>Rosa</strong> nascendo<br />
no sertão infindo, definitivamente,<br />
ruminant<strong>em</strong>ente.<br />
O romance recebeu três prêmios: Machado<br />
de Assis, do Instituto Nacional<br />
do Livro; o Carm<strong>em</strong> Dolores Barbosa,<br />
de São Paulo; e o Paula Brito, <strong>da</strong> municipali<strong>da</strong>de<br />
do Rio de Janeiro. Em 1985,<br />
o sertão roseano era levado ao ar pela<br />
Rede Globo de televisão, entre 18 de<br />
nov<strong>em</strong>bro e 20 de dez<strong>em</strong>bro, num<br />
total de 25 capítulos, com direção de<br />
Walter Avancini.<br />
João <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> candi<strong>da</strong>ta-se<br />
pela primeira vez à Acad<strong>em</strong>ia Brasileira<br />
de Letras <strong>em</strong> 1957, mas obtém<br />
apenas 10 votos. Em 58, começa a<br />
sentir pesar o coração povoado pelas<br />
coisas impregna<strong>da</strong>s pelo t<strong>em</strong>po e é<br />
acometido por distúrbios cardiovasculares.<br />
Depois de ficar por um t<strong>em</strong>po<br />
cont<strong>em</strong>plando o sertão que descobrira<br />
dentro dele mesmo, <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong><br />
reapareceu <strong>em</strong> 1962 contando as suas<br />
Primeiras Estórias, numa coletânea de<br />
21 pequenos contos.<br />
Em maio de 63, candi<strong>da</strong>ta-se pela<br />
segun<strong>da</strong> vez à Acad<strong>em</strong>ia Brasileira<br />
de Letras, na vaga deixa<strong>da</strong> por João<br />
Neves <strong>da</strong> Fontoura. Na eleição realiza<strong>da</strong><br />
no dia 8 de agosto, o Encantado<br />
é eleito por unanimi<strong>da</strong>de. Mas sua<br />
posse só aconteceria anos mais tarde.<br />
Em janeiro de 65, <strong>Rosa</strong> participa<br />
do Congresso Latino-Americano de<br />
Escritores, <strong>em</strong> Gênova. Como resultado<br />
do Congresso ficou constituí<strong>da</strong><br />
a Primeira Socie<strong>da</strong>de de Escritores<br />
Latino-Americanos. Em 66, o conto<br />
A hora e vez de Augusto Matraga<br />
torna-se, por Roberto Santos, um<br />
filme admirável, que percorre vários<br />
festivais internacionais.<br />
Em abril de 1967, <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong><br />
vai ao México como representante<br />
do Brasil no I Congresso Latino-<br />
Americano de Escritores, no qual atua<br />
como vice-presidente. Publica nesse<br />
mesmo ano Tutaméia. Tutaméia foi o<br />
último livro publicado <strong>em</strong> vi<strong>da</strong> pelo<br />
autor. Foram publicados <strong>em</strong> 1969 e<br />
1970 os livros póstumos, Estas Estórias<br />
(contendo Meu Tio, o Iauaretê) e<br />
Ave, Palavra.<br />
No dia 16 de nov<strong>em</strong>bro de 1967, o<br />
escritor depois de muito se preparar,<br />
toma posse na Acad<strong>em</strong>ia Brasileira<br />
de Letras. Já havia levado o sertão<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
21
silencioso além fronteiras. Por seu<br />
trabalho reconhecido e reverenciado<br />
mundo afora, seria, nesse mesmo<br />
ano, indicado ao prêmio Nobel de<br />
Literatura. Três dias após sua posse<br />
na Acad<strong>em</strong>ia, João, tendo a certeza de<br />
que as pessoas não foram termina<strong>da</strong>s,<br />
resolveu continuar aprendendo e estu<strong>da</strong>ndo<br />
as línguas que não são fala<strong>da</strong>s<br />
aqui, pesquisar nomes <strong>da</strong>s coisas que<br />
não estão neste mundo, ver os sertões<br />
que estão por detrás do sertão que<br />
havia dentro e fora dele mesmo.<br />
100 anos de uma<br />
obra não termina<strong>da</strong>...<br />
Depois de ficar entre nós por um instantizinho<br />
enorme, 59 anos, João <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> escolheu ser novamente<br />
o menino Joãzito. Queria agora ler livros<br />
sentadinho de pernas cruza<strong>da</strong>s<br />
na esteira do céu. E, deitadinho numa<br />
nuvenzinha viajeira, passou a observar<br />
lá de cima o sertão profundo, o<br />
principio de tudo, o começo, o meio,<br />
o todo. Era o Encantando, uma rosa<br />
homenag<strong>em</strong><br />
mística no céu do Brasil, nasci<strong>da</strong> e<br />
cresci<strong>da</strong> no coração dos homens que<br />
acreditam nas transcendências, que<br />
admit<strong>em</strong> e comungam com o mistério,<br />
com o inenarrável. Com uma caneta<br />
<strong>em</strong>presta<strong>da</strong> por um anjinho de<br />
asas de manuelzinho-<strong>da</strong>-crôa, escreveu<br />
quando mal o sol se punha e lhe<br />
dourava a face, na página <strong>da</strong> história<br />
do coração <strong>da</strong> gente: travessia... Era o<br />
começo de tudo...<br />
Petrônio Souza Gonçalves é jornalista<br />
e escritor. Blog:<br />
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*No primeiro s<strong>em</strong>estre de 2008, a <strong>FGR</strong> capacitou 120 profissionais.<br />
Esta é a maneira mais<br />
fácil de você acompanhar<br />
as rápi<strong>da</strong>s mu<strong>da</strong>nças que<br />
acontec<strong>em</strong> no mercado global.<br />
44 horas/aula<br />
44 horas/aula<br />
Contratos e Licitações 20 horas/aula<br />
Mediação de Conflitos<br />
40 horas/aula<br />
Auditoria 20 horas/aula<br />
Pregão 12 horas/aula<br />
Segurança Patrimonial Ampla<br />
15 horas/aula<br />
Saúde <strong>da</strong> Criança 20 horas/aula<br />
Informações e inscrições: fgr@fgr.org.br ou tel. (31) 3263-1646
DEZEMBRO DE 2001<br />
Elaboração do primeiro<br />
Estatuto <strong>da</strong> <strong>FGR</strong> pelo Comando<br />
<strong>da</strong> PMMG<br />
Instituição <strong>da</strong> <strong>FGR</strong>, conforme<br />
Resolução do Ministério Público<br />
2002<br />
Ativi<strong>da</strong>des <strong>da</strong> <strong>FGR</strong>: apoiar<br />
ações de Segurança Pública,<br />
Habitacionais, Saúde, Educação<br />
e Capacitação, Cultura e Lazer,<br />
Ação Comunitária e Assistência<br />
Social, Administração de<br />
Recursos Humanos e Pesquisa<br />
FEVEREIRO DE 2003<br />
Primeira edição do “Informativo<br />
<strong>FGR</strong>”<br />
ABRIL DE 2003<br />
Inauguração <strong>da</strong> Clínica de<br />
Fisioterapia, no Prado<br />
JULHO DE 2003<br />
Lançamento do primeiro<br />
número <strong>da</strong> “<strong>FGR</strong> <strong>em</strong> <strong>Revista</strong>”<br />
<strong>FGR</strong> participa <strong>da</strong> <strong>3ª</strong> Conferência<br />
Executiva de Segurança Pública<br />
para a América Latina<br />
AGOSTO DE 2003<br />
Abertura do Laboratório de<br />
Análises Clínicas no HPM<br />
(Hospital de Polícia Militar)<br />
DEZEMBRO DE 2003<br />
Lançamento do Projeto “Artistas<br />
<strong>da</strong> Paz - Ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia e Segurança<br />
Também se Faz<strong>em</strong> com Música”<br />
especial<br />
Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> com<strong>em</strong>ora 6 anos<br />
Visibili<strong>da</strong>de, profissionalismo e equi<strong>da</strong>de nas ações<br />
“Os projetos do presente são suportes para os projetos e programas de amanhã, sobretudo<br />
na elaboração de um Plano Estratégico de Viabili<strong>da</strong>de.”<br />
(Álvaro Antônio Nicolau - Superintendente-Geral <strong>da</strong> <strong>FGR</strong>).<br />
Linha do T<strong>em</strong>po<br />
Para marcar a trajetória <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>,<br />
criamos uma “Linha do T<strong>em</strong>po” com os principais fatos e<br />
as ações realiza<strong>da</strong>s nesses seis anos.<br />
JULHO DE 2004<br />
Reestruturação do Estatuto<br />
<strong>da</strong> <strong>FGR</strong><br />
AGOSTO DE 2004<br />
Abertura <strong>da</strong> Livraria APM<br />
Implantação do Cartão de<br />
Identificação dos funcionários<br />
DEZEMBRO DE 2004<br />
<strong>FGR</strong> foi declara<strong>da</strong> Enti<strong>da</strong>de de<br />
Utili<strong>da</strong>de Pública Municipal<br />
2001 2002<br />
2003 2004
especial<br />
A Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> foi<br />
instituí<strong>da</strong> <strong>em</strong> 2001 com o objetivo de<br />
atuar nas áreas de ação comunitária,<br />
assistência social, trabalho voluntário,<br />
ensino e pesquisa, b<strong>em</strong> como no<br />
desenvolvimento institucional, mediante<br />
apoio, estímulo, planejamento<br />
e execução de programas, projetos<br />
e ativi<strong>da</strong>des inerentes à segurança<br />
pública; defesa social; defesa civil;<br />
conservação e preservação do meio<br />
2005<br />
Lançamento de programas e<br />
projetos socioeducativos:<br />
“Portas Abertas” <strong>em</strong> BH;<br />
“Saúde começa no Trabalho”<br />
Lançamento do 1º Fórum de<br />
Comunicação Ativa<br />
ABRIL DE 2005<br />
<strong>FGR</strong> declara<strong>da</strong> Instituição de<br />
Utili<strong>da</strong>de Pública Estadual<br />
JULHO DE 2005<br />
Concurso Público para Guar<strong>da</strong><br />
Municipal de BH bate recorde<br />
com mais de 30 mil candi<strong>da</strong>tos<br />
inscritos<br />
DEZEMBRO DE 2005<br />
Lançamento <strong>da</strong> Biblioteca Virtual<br />
2006<br />
Lançamento do “Meninos<br />
Pela Paz” e “Primeiros<br />
Passos: Educação para o<br />
Empreendedorismo”<br />
MARÇO DE 2006<br />
<strong>FGR</strong> declara<strong>da</strong> Instituição de<br />
Utili<strong>da</strong>de Pública Federal<br />
Lançamento do Projeto “Dona<br />
Fiota”, como parte do<br />
Programa “Afro-Brasileiro: (Re)<br />
Descobrindo Nossas Raízes”<br />
JUNHO DE 2006<br />
4º aniversário <strong>da</strong> <strong>FGR</strong><br />
Pr<strong>em</strong>iação do 1º Concurso de<br />
Prosa Literocientífica “João<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>”<br />
AGOSTO DE 2006<br />
Projeto “Afro-Brasili<strong>da</strong>de nas<br />
Trilhas <strong>da</strong> Cultura” aprovado<br />
pela Lei Rouanet de Incentivo<br />
à Cultura<br />
Lançamento do Programa<br />
“Inclusão Digital: Uma<br />
Possibili<strong>da</strong>de de Inserção Social”<br />
OUTUBRO DE 2006<br />
2º Fórum de Comunicação Ativa<br />
NOVEMBRO DE 2006<br />
Plano de Saúde <strong>FGR</strong><br />
Reestruturação dos projetos<br />
sociais<br />
ambiente; administração <strong>em</strong> geral;<br />
capacitação profissional; organização<br />
e execução de eventos e ativi<strong>da</strong>des<br />
conexas, para suporte de cursos de<br />
capacitação e treinamento; educação,<br />
cultura, lazer e turismo; direitos humanos<br />
e d<strong>em</strong>ocracia; gestão pública;<br />
saúde; habitação e moradia popular.<br />
Conforme Álvaro Antônio Nicolau,<br />
Superintendente-Geral, “na Fun<strong>da</strong>ção<br />
2007<br />
Programas e projetos sociais<br />
registrados nos Conselhos <strong>da</strong><br />
Criança e do Adolescente dos<br />
municípios<br />
Parceira entre <strong>FGR</strong> e Escola<br />
Estadual Henrique Diniz para<br />
viabilizar o Projeto “Escola <strong>da</strong> Paz”<br />
Inauguração <strong>da</strong> Clínica de<br />
Dermatologia no HPM<br />
MARÇO DE 2007<br />
Lançamento do I Concurso<br />
“Festas Natalinas”<br />
MAIO DE 2007<br />
Novo recorde: mais de 40 mil<br />
inscritos no concurso para<br />
Guar<strong>da</strong> Municipal de BH<br />
JUNHO DE 2007<br />
5º aniversário <strong>da</strong> <strong>FGR</strong><br />
2ª edição <strong>da</strong> “<strong>FGR</strong> <strong>em</strong> <strong>Revista</strong>”<br />
Lançamento do Concurso<br />
Literário “Prêmio <strong>FGR</strong> - Coronel<br />
Alvino Alvim de Menezes”<br />
OUTUBRO DE 2007<br />
3º Fórum de Comunicação Ativa<br />
DEZEMBRO DE 2007<br />
1ª CISED - Ciclo de<br />
Segurança <strong>em</strong> Debate<br />
Captação de recursos para o<br />
“Bom na Escola, Bom de<br />
Bola” <strong>em</strong> Sete Lagoas e<br />
registro no Fundo <strong>da</strong> Infância<br />
e Adolescência<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> o pensamento de<br />
crescer passa pela equi<strong>da</strong>de nos<br />
diversos campos de atuação e no<br />
favorecimento de apresentação no<br />
sentido de Ser-vir. Pensamos que<br />
pouco, muito pouco, adianta crescer<br />
se não contribuirmos para as transformações<br />
sociais e culturais gera<strong>da</strong>s<br />
pelo trabalho conjunto com parceiros<br />
que nos apóiam, que nos envolv<strong>em</strong><br />
com energia pura e revigoradora.”<br />
2008<br />
Projetos e programas <strong>da</strong> <strong>FGR</strong><br />
aprovados pela Lei Rouanet de<br />
Incentivo à Cultura:<br />
“Afro-Brasili<strong>da</strong>de nas Trilhas<br />
de Minas”; Afro-Brasileiro:<br />
(Re)Descobrindo Nossas<br />
Raízes<br />
FEVEREIRO DE 2008<br />
Aquisição do novo Espaço de<br />
Eventos Vere<strong>da</strong>s<br />
Criação <strong>da</strong> Biblioteca<br />
Fantásticas Vere<strong>da</strong>s<br />
JUNHO DE 2008<br />
6º aniversário <strong>da</strong> <strong>FGR</strong><br />
Com<strong>em</strong>oração do centenário<br />
de nascimento de João<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>, patrono<br />
<strong>da</strong> instituição<br />
2005 2006 2007 2008<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
25
Seis Anos de Excelência.<br />
João Bosco de Castro.<br />
No início de 2002, quando<br />
o então-Coman<strong>da</strong>nte-Geral <strong>da</strong><br />
Polícia Militar de Minas Gerais,<br />
Coronel Álvaro Antônio Nicolau,<br />
pediu-me síntese biográfica de um<br />
dos dois mineiros - ambos notáveis<br />
e consagrados! - finalistas do<br />
concurso adotado para a escolha<br />
de patrono de nascitura fun<strong>da</strong>ção,<br />
gesta<strong>da</strong> pela Ação F<strong>em</strong>inina de<br />
Assistência Social - AFAS -, para<br />
prestação de suporte humanístico<br />
de filosofia terceiro-setorista<br />
a quefazeres deontologicamente<br />
confiados ao Sist<strong>em</strong>a de Defesa<br />
Social de Minas Gerais, optei<br />
pelos primores de João <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> - ficcionista, poeta, diplomata<br />
e Capitão-Médico <strong>da</strong>quela<br />
magnífica Força Pública Mineira<br />
dos Anos Trinta, nossa atual e esplêndi<strong>da</strong><br />
Polícia Militar. S<strong>em</strong> nenhuma<br />
dúvi<strong>da</strong> sobre seus densos<br />
predicados, o nome desse Capitão-Patriota<br />
(Oficial-Médico Voluntário)<br />
do Décimo Segundo Batalhão<br />
de Infantaria Provisório, o<br />
12º BIP, <strong>da</strong> Revolução Constitucionalista<br />
de 1932, nas cercanias <strong>da</strong><br />
Mantiqueira 1 , e, <strong>em</strong> 1933-34, Capitão-Médico<br />
do Nono Batalhão<br />
de Caçadores Mineiros sediado<br />
<strong>em</strong> Barbacena 2 , cujo quartel se<br />
assenta na Praça Capitão-Doutor<br />
João <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>, energizoume<br />
para a urdidura <strong>da</strong> solicita<strong>da</strong><br />
síntese biográfica. Não desconsiderei<br />
o outro Finalista <strong>da</strong>quele<br />
certame - também fulgente Oficial-Médico<br />
de nossa gloriosa Polícia<br />
Militar Mineira, alçado às glórias<br />
<strong>da</strong> política <strong>em</strong>preendedorista,<br />
26 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
como festejado Prefeito de Belo Horizonte,<br />
inesquecível Governador de<br />
Minas Gerais, insuperável Presidente<br />
<strong>da</strong> República e decente Senador desta<br />
Encantadora Pátria <strong>da</strong>s Palmeiras 3 -,<br />
mas bati o malhete <strong>em</strong> favor de qu<strong>em</strong>,<br />
entre os dois, melhor se combina com<br />
o significado altivo de POLÍCIA, do<br />
Latim Politia, Politiae, com base no<br />
Grego Politéia (πολιτέια = a Deusa<br />
<strong>da</strong> Ci<strong>da</strong>de), escrita por Platão, nos séculos<br />
V-IV a.C., traduzi<strong>da</strong> para o Latim<br />
como Res Publica e transposta para o<br />
Português como República): Coisa do<br />
Povo, Paz Social.<br />
Embora efêmero no serviço<br />
ativo <strong>da</strong> Polícia Militar de Minas Gerais<br />
- à qual se enfileirou s<strong>em</strong> preparo<br />
policiológico n<strong>em</strong> devoção às causas<br />
castrenses -, João <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>,<br />
na condição de diplomata, ficcionista,<br />
poeta e médico, ostenta-se como sinônimo<br />
de Polícia: CIVILIZAÇÃO, melhoramento,<br />
progresso, avanço para<br />
o b<strong>em</strong>, diminuição do mal, desenvolvimento,<br />
subi<strong>da</strong>, evolução, limag<strong>em</strong>,<br />
polimento, educação, respeito, decência,<br />
conquista de novos e melhores<br />
horizontes, promoção, cultura,<br />
reforma, elegância, conserto, apuro,<br />
purificação, concerto, harmonia, equilíbrio,<br />
brunimento de caráter, organização,<br />
cui<strong>da</strong>do, esmero, proteção,<br />
consciência humanística, poder sinfrônico,<br />
raciocínio verbal, domínio<br />
estético, proativi<strong>da</strong>de, consideração,<br />
amor, aperfeiçoamento, compreensão<br />
do outro, consciência de utili<strong>da</strong>de social,<br />
transformação, HUMANIZAÇÃO,<br />
justiça, direitos humanos, comunitarismo,<br />
ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia, humil<strong>da</strong>de, crescimento<br />
eticomoral, hombri<strong>da</strong>de,<br />
especial<br />
valentia cortês, bravura respeitadora<br />
e respeitosa, bon<strong>da</strong>de, afeição, honorabili<strong>da</strong>de...<br />
Pouco depois de aprova<strong>da</strong> a<br />
pretendi<strong>da</strong> síntese biográfica escrita<br />
por mim, o vulto grandiloqüente<br />
desse Mineiro inigualável - desde<br />
21 de agosto de 1995, Patrono-<br />
Príncipe <strong>da</strong> única Acad<strong>em</strong>ia de Letras<br />
representativa de força militar,<br />
<strong>em</strong> domínios brasileiros, <strong>da</strong> qual<br />
tenho a honra de ser Presidente -<br />
passou a denominar, como Patrono<br />
Excelso, a ain<strong>da</strong>-nascitura Fun<strong>da</strong>ção<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>. Registrado o respectivo<br />
Estatuto, conheci-lhe o texto,<br />
por atenção do Coronel José Antônio<br />
Soares, seu primeiro Diretor-Geral<br />
(cargo chamado hoje de Superintendente-Geral),<br />
a cujos inteligentes<br />
esforços muito dev<strong>em</strong> o Sist<strong>em</strong>a de<br />
Defesa Social - mais explicitamente<br />
a Polícia Militar - de Minas Gerais, a<br />
prodigiosa Malha Terceiro-Setorista<br />
e a sofri<strong>da</strong> Comuni<strong>da</strong>de Mineira. Os<br />
propósitos contidos <strong>em</strong> tal Estatuto<br />
coer<strong>em</strong> com a plurali<strong>da</strong>de ímpar do<br />
referido Patrono Excelso, cujas realizações<br />
estéticas (<strong>em</strong> po<strong>em</strong>as e<br />
formas varia<strong>da</strong>s e elegantes <strong>da</strong> prosa<br />
de ficção), diplomáticas e médicas<br />
elevam-no à estatura de Emérito Civilizador<br />
e Eficiente Humanizador,<br />
somente consentânea com os conteúdos<br />
eticomorais e teleodeontológicos<br />
de qu<strong>em</strong> pensa e edifica a Proteção<br />
Comunitária, a Felici<strong>da</strong>de do Povo e<br />
a Tranqüili<strong>da</strong>de Pública, entendi<strong>da</strong>s<br />
como Paz Social, competência majestática<br />
<strong>da</strong> Polícia Militar r<strong>em</strong>anescente<br />
do Alferes-Mor do Brasil: o Súpero oficial<br />
subalterno Joaquim José <strong>da</strong> Silva
especial<br />
Xavier, do Regimento Regular de Cavalaria<br />
<strong>da</strong> Capitania <strong>da</strong>s Minas Gerais,<br />
sediado, no último quartel do século<br />
XVIII, <strong>em</strong> Cachoeira do Campo de Vila<br />
Rica de Nossa Senhora do Pilar, <strong>em</strong><br />
proveito <strong>da</strong> Coisa do Povo, pensa<strong>da</strong><br />
e teci<strong>da</strong> pelo Gênio de Platão, nos<br />
séculos V e IV a.C., na monumentosa<br />
πολιτέια: Politéia, Deusa <strong>da</strong> Comuni<strong>da</strong>de,<br />
Protetora do Estado, matriz <strong>da</strong><br />
Paz Social, a indispensável Gestora do<br />
Sossego Público.<br />
Agora, no Centenário de Nascimento<br />
do Sublime Cordisburguense<br />
realizador de Magma, Sagarana,<br />
Grande Sertão: Vere<strong>da</strong>s e outros<br />
fantásticos Mimos <strong>da</strong> Literatura Brasileira,<br />
considero-me feliz por haver<br />
contribuído, <strong>em</strong> 2002, para a escolha<br />
do Patrono Excelso de Instituição autêntica<br />
e legitimamente comprometi<strong>da</strong><br />
com a Ética, Transparência, Justiça<br />
e Felici<strong>da</strong>de Pública, Socioeducação,<br />
Melhoramento dos Meios e Modos de<br />
Vi<strong>da</strong>, Confiança e Humanização, Autodigni<strong>da</strong>de,<br />
Autoestima, Autoaperfeiçoamento<br />
e Autorrealização, conforme<br />
aos Preceitos de Promoção Social.<br />
Tudo isso a Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> faz, com autori<strong>da</strong>de técnica,<br />
zelo jurídico e <strong>em</strong>presarial, consciência<br />
de utili<strong>da</strong>de social e dedicação<br />
às Pessoas, prioritariamente às dos<br />
Servidores do Sist<strong>em</strong>a de Defesa Social<br />
- particularmente dos Integrantes<br />
<strong>da</strong> Polícia Militar - de Minas Gerais e<br />
respectivos Dependentes.<br />
Como Colaborador Emérito<br />
dessa prestimosa e utilíssima Instituição<br />
- mais objetivamente como seu<br />
curador e provedor intelectual e acadêmico<br />
de prêmios literoculturais, e<br />
seu consultor de cenários de cultura -,<br />
repito meu juízo acerca <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção<br />
<strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>: Ela conquista respeito<br />
e credibili<strong>da</strong>de, solidez e renome<br />
de Enti<strong>da</strong>de Humanizante, por<br />
devotar-se aos melhores projetos<br />
socioeducativos revigorados na leitura<br />
sinfrônica, erudição, destreza<br />
intelectual, domínio de cosmovisão,<br />
amor à pesquisa, exercícios de debates<br />
inteligentes e propícios à<br />
autocrítica, afeição à Língua Portuguesa<br />
e ao Patrimônio Lusía<strong>da</strong>,<br />
desenvoltura lingüística e dialógica,<br />
sabedoria e habili<strong>da</strong>de para o pensamento<br />
lúcido, capaci<strong>da</strong>de para a<br />
comunicação e expressão verbal,<br />
oralmente e, acima de tudo, por<br />
meio dos engenhos mais cultos e<br />
elegantes <strong>da</strong> produção de texto,<br />
notável e densamente mediante os<br />
cânones e técnicas indispensáveis à<br />
re<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> prosa literocientífica.<br />
Graças a todo esse feliz<br />
sucesso, merec<strong>em</strong> louvores <strong>da</strong> Opinião<br />
Pública o Superintendente-Geral, Coronel<br />
Álvaro Antônio Nicolau, e sua diligente<br />
Equipe de Assessores, Técnicos<br />
e diversos outros Funcionários, por ter<br />
garantido à Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>,<br />
com o apoio de seus Conselhos Curador<br />
e Permanente, e <strong>da</strong>divosos Colaboradores,<br />
seis anos de excelência terceirosetorista,<br />
sob os auspícios do Mundializador<br />
João <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>!<br />
João Bosco de Castro - Tenente-Coronel <strong>da</strong> PMMG; Presidente <strong>da</strong> Acad<strong>em</strong>ia de Letras “João <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong>”, <strong>da</strong> Polícia Militar de Minas Gerais, de cujo Conselho Superior é Presidente Emérito;<br />
Colaborador Emérito <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>; Prócere Magistral <strong>da</strong>s Ciências Militares <strong>da</strong><br />
Polícia Ostensiva; professor de Línguas Românicas e respectivas Literaturas; professor titular - ao<br />
nível de mestre, doutor e livre-docente - de Ciências Militares <strong>da</strong> Polícia Ostensiva e Disciplinas<br />
Policiológicas, na Acad<strong>em</strong>ia de Polícia Militar do Prado Mineiro.<br />
1- O Capitão-Médico Voluntário João <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> serviu à Revolução de 1932, nas cercanias <strong>da</strong> Mantiqueira - não no Setor<br />
do Túnel [de Passa-Quatro], como o afirma Vilma <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> Quiney-Reeves, sua filha, <strong>em</strong> Rel<strong>em</strong>bramentos: João <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong>, meu pai (m<strong>em</strong>órias), 1ª ed.: Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1983, mas no Décimo Segundo Batalhão de Infantaria Provisório,<br />
instalado pelo então-Presidente do Estado Olegário Dias Maciel no eixo Ponte Nova-Barbacena-Viçosa, de acordo com importantes<br />
documentos encontrados, <strong>em</strong> 2004, pelo Coronel Antônio Fernando de Alcântara.<br />
2- Aprovado <strong>em</strong> concurso público, João <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong>, <strong>em</strong> 1933, foi promovido ao posto de Capitão-Médico classificado no<br />
Nono Batalhão de Caçadores Mineiros - 9º BCM -, sediado <strong>em</strong> Barbacena, crista <strong>da</strong> Mantiqueira, onde serviu, até meados de<br />
1934, com o então-Tenente-Coronel Octávio Baptista Diniz, primeiro coman<strong>da</strong>nte <strong>da</strong> referi<strong>da</strong> Uni<strong>da</strong>de <strong>da</strong> Força Pública do Estado<br />
de Minas Gerais.<br />
3- Em Tupi: Pindorama = Pindó (Palmeira) + Retama (Pátria).<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
27
Caminhos <strong>da</strong> Soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de<br />
Andrea Neves <strong>da</strong> Cunha<br />
28 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
O SERVAS (Serviço Voluntário de Assistência<br />
Social) é uma enti<strong>da</strong>de priva<strong>da</strong><br />
que articula ações que envolv<strong>em</strong><br />
uma grande rede de soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de,<br />
enti<strong>da</strong>des sociais, enti<strong>da</strong>des de classe,<br />
<strong>em</strong>presas e ci<strong>da</strong>dãos <strong>em</strong> apoio ao poder<br />
publico estadual na promoção de<br />
assistência social <strong>em</strong> todo o Estado de<br />
Minas Gerais. Atua apoiando enti<strong>da</strong>des<br />
que promov<strong>em</strong> ações que buscam<br />
oferecer uma perspectiva de futuro<br />
para famílias que viv<strong>em</strong> <strong>em</strong> situação<br />
de risco social.<br />
São essas ações de assistência social,<br />
voluntárias, nasci<strong>da</strong>s no encontro <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia com a soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de que, estabelecendo<br />
novas formas de parceria<br />
entre pessoas, <strong>em</strong>presas e o Estado,<br />
<strong>em</strong> prol de causas comuns, aju<strong>da</strong>m<br />
a construir, cotidianamente, um<br />
modelo de Estado mais justo e<br />
participativo.<br />
ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia<br />
Os mineiros s<strong>em</strong>pre souberam que as<br />
ativi<strong>da</strong>des públicas não se confund<strong>em</strong><br />
e n<strong>em</strong> se limitam a ações de governo.<br />
A soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de, presente nas nossas<br />
relações interpessoais e nas nossas<br />
redes de vizinhança, s<strong>em</strong>pre inspiraram<br />
a ação de movimentos voltados<br />
para a melhoria <strong>da</strong> quali<strong>da</strong>de de vi<strong>da</strong><br />
e defesa de direitos.<br />
Minas é o berço, no Brasil, desse<br />
espírito solidário capaz de apontar<br />
e construir novos caminhos. Aqui,<br />
s<strong>em</strong>pre se multiplicaram as iniciativas<br />
priva<strong>da</strong>s com fins públicos. T<strong>em</strong>os<br />
constituído, <strong>em</strong> Minas Gerais, uma<br />
extensa rede de enti<strong>da</strong>des sociais com<br />
competência reconheci<strong>da</strong> <strong>em</strong> todo o<br />
território nacional.<br />
O fortalecimento dessa rede t<strong>em</strong><br />
sido uma orientação estratégica de<br />
governo que reconhece a capaci<strong>da</strong>de<br />
destas enti<strong>da</strong>des <strong>em</strong> gerar projetos,<br />
<strong>em</strong>preender iniciativas, assumir responsabili<strong>da</strong>des<br />
e mobilizar recursos.<br />
O Governo de Minas t<strong>em</strong> reconhecido<br />
que essas enti<strong>da</strong>des aprenderam<br />
e acumularam conhecimentos,<br />
metodologias,<br />
experiências e recursos<br />
sobre formas inovadoras<br />
de enfrentamento <strong>da</strong>s questões<br />
sociais que as qualificam<br />
como interlocutores<br />
e parceiros <strong>da</strong>s políticas<br />
governamentais.<br />
Empenhamos-nos <strong>em</strong><br />
apoiar e construir, <strong>em</strong> Minas<br />
Gerais, uma socie<strong>da</strong>de mais
ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia<br />
justa e solidária fun<strong>da</strong><strong>da</strong> na aliança<br />
entre conhecimento, desenvolvimento<br />
social e preservação ambiental; um<br />
modelo de desenvolvimento econômico<br />
sustentável onde economia e ética<br />
possam an<strong>da</strong>r juntas.<br />
É assim que estamos tornando Minas<br />
Gerais síntese socioeconômica do<br />
Brasil, no melhor Estado para se viver.<br />
Ex<strong>em</strong>plo dessa força solidária dos<br />
mineiros ocorreu <strong>em</strong> 2003, <strong>em</strong> uma<br />
<strong>da</strong>s maiores frentes de voluntariado<br />
<strong>da</strong> história de Minas.<br />
Ex<strong>em</strong>plo <strong>da</strong> capaci<strong>da</strong>de transformadora<br />
<strong>da</strong> soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de dos mineiros foi<br />
a criação do Movimento Minas Solidária,<br />
sob a coordenação institucional<br />
do SERVAS, <strong>em</strong> apoio às ações do<br />
Governo do Estado através <strong>da</strong> CEDEC/<br />
MG (Coordenadoria de Defesa Civil)<br />
e Polícia Militar do Estado de Minas<br />
Gerais, reunindo as maiores enti<strong>da</strong>des<br />
de classe e sindicatos, numerosos veículos<br />
de comunicação, <strong>em</strong>presas, enti<strong>da</strong>des<br />
sociais e ci<strong>da</strong>dãos <strong>em</strong> defesa e<br />
apoio às famílias desabriga<strong>da</strong>s pelas<br />
fortes chuvas que se abateram sobre<br />
o Estado <strong>em</strong> 2003 e 2004.<br />
Na coordenação dessa grande ação solidária<br />
e voluntária de logística operacional,<br />
o SERVAS arrecadou e distribuiu,<br />
para 201 municípios, 756 tonela<strong>da</strong>s de<br />
alimentos, 23.256 colchões, 17.180 cobertores<br />
e, ain<strong>da</strong>, 1.196.836 peças de<br />
vestuário, amenizando o drama vivido<br />
por milhares de famílias.<br />
E o Movimento Minas Solidária foi<br />
além. Foram também construí<strong>da</strong>s e<br />
doa<strong>da</strong>s 953 novas moradias para as<br />
famílias que perderam suas casas <strong>em</strong><br />
60 municípios.<br />
Nos últimos anos, o SERVAS v<strong>em</strong> se<br />
dedicando a um conjunto de ações<br />
volta<strong>da</strong>s para a infância, a juventude<br />
e a população idosa, atuando <strong>em</strong> centenas<br />
de municípios de Minas, tendo<br />
como matéria-prima de seu trabalho<br />
a soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de.<br />
Espaço de teatro e circo do Programa<br />
Valores de Minas.<br />
“É assim<br />
que estamos<br />
tornando Minas<br />
Gerais síntese<br />
socioeconômica<br />
do Brasil, no<br />
melhor Estado<br />
para se viver”<br />
Andrea Neves <strong>da</strong> Cunha nasceu <strong>em</strong> Belo<br />
Horizonte, é forma<strong>da</strong> <strong>em</strong> Jornalismo na PUC/<br />
RJ, trabalhou no Centro de Documentação<br />
e Pesquisa <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção Getúlio Vargas e<br />
coordenou o projeto de implantação do M<strong>em</strong>orial<br />
Tancredo Neves <strong>em</strong> São João Del Rei.<br />
Foi Secretária Estadual Adjunta <strong>da</strong> Cultura no<br />
Governo Hélio Garcia. Atualmente, é diretora<br />
<strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção Tancredo Neves e presidente do<br />
SERVAS - Serviço Voluntário de Assistência<br />
Social, onde coordena diversos programas<br />
sociais.Também coordenou a edição de dois<br />
livros :” São João Del Rei” e “Tancredo Neves,<br />
um hom<strong>em</strong> para o Brasil”.<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
29
Valores e Resultados<br />
A avaliação <strong>da</strong>s iniciativas sociais<br />
desenvolvi<strong>da</strong>s por organizações no<br />
Terceiro Setor (TS) apresenta a peculiari<strong>da</strong>de<br />
de ter por objeto não apenas<br />
os resultados destas iniciativas, mas<br />
também o fato de considerar, necessariamente,<br />
os valores reproduzidos<br />
nestes resultados, valores estes a<br />
partir dos quais os atores sociais envolvidos<br />
abor<strong>da</strong>m as questões sociais<br />
que motivam aquelas iniciativas. As<br />
realizações no TS se apresentam, portanto,<br />
duplamente, como projeções<br />
sociais de valores e como resultados<br />
que pretend<strong>em</strong> afetar materialmente<br />
indivíduos <strong>em</strong> socie<strong>da</strong>de, sugerindo<br />
que a reprodução de valores e a confirmação<br />
de mu<strong>da</strong>nças devam estar<br />
vincula<strong>da</strong>s. Requer-se, neste sentido,<br />
que a avaliação deva investigar os<br />
resultados como objetos susceptíveis<br />
à mensuração e apreender na medi<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong> efetivi<strong>da</strong>de ou impacto deles, os indicativos<br />
de sucesso que identifiqu<strong>em</strong><br />
os valores transmitidos. Isto significa<br />
reconhecer um vínculo essencial entre<br />
resultados almejados e os valores<br />
inerentes à concepção que os atores<br />
sociais apresentam sobre as assimetrias<br />
<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>em</strong> socie<strong>da</strong>de. Cabe à<br />
avaliação a tarefa de contribuir com<br />
a gestão para mensurar os resultados<br />
e explicitar os valores que lhes são<br />
inerent<strong>em</strong>ente vinculados.<br />
terceiro setor<br />
Um referencial de avaliação<br />
no Terceiro Setor Eloisa Helena de Souza Cabral<br />
A literatura apresenta esforços de<br />
construção de métodos, a<strong>da</strong>ptações<br />
de técnicas e roteiros ou manuais<br />
de desenvolvimento de processos de<br />
avaliação para o campo do TS, muitos<br />
dos quais de sucesso. Entretanto, na<br />
execução <strong>da</strong> avaliação e na comunicação<br />
de seus achados nos deparamos<br />
com o reconhecimento n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre<br />
satisfatório <strong>da</strong> natureza especial<br />
que envolve valores e resultados na<br />
gestão de iniciativas no TS. Embora os<br />
procedimentos de avaliação quantitativa,<br />
de investigação qualitativa, do<br />
impacto e <strong>da</strong> economici<strong>da</strong>de estejam<br />
estabelecidos, são comuns interrogações<br />
acerca <strong>da</strong> diversi<strong>da</strong>de de visões<br />
dos participantes e beneficiários <strong>da</strong>s<br />
organizações; <strong>da</strong> capaci<strong>da</strong>de interpretativa<br />
<strong>da</strong>s abor<strong>da</strong>gens, quantitativa<br />
ou qualitativa; <strong>da</strong> intangibili<strong>da</strong>de dos<br />
benefícios; <strong>da</strong>s dificul<strong>da</strong>des organizacionais<br />
de implantação de sist<strong>em</strong>as de<br />
controle e <strong>da</strong> ausência de grupos de<br />
tratamento e controle fidedignos; <strong>da</strong><br />
limitação de métodos a<strong>da</strong>ptados <strong>da</strong><br />
área mercantil e <strong>da</strong> área pública; dos<br />
interesses dos atores a qu<strong>em</strong> se destina<br />
a avaliação; e <strong>da</strong> diversi<strong>da</strong>de de<br />
explicações quanto às conseqüências<br />
sociais <strong>da</strong> questão a ser abor<strong>da</strong><strong>da</strong>,<br />
dos resultados atingidos e <strong>da</strong>s externali<strong>da</strong>des<br />
consegui<strong>da</strong>s. É também<br />
comum observarmos a recomen<strong>da</strong>ção<br />
“As realizações no TS se apresentam como<br />
projeções sociais de valores e como resultados<br />
que pretend<strong>em</strong> afetar materialmente<br />
indivíduos <strong>em</strong> socie<strong>da</strong>de”<br />
30 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
de <strong>em</strong>penho para a aplicação de<br />
métodos lógicos de planejamento<br />
e de cui<strong>da</strong>dos metodológicos que<br />
permitam apartar consistent<strong>em</strong>ente<br />
as fases dos programas entre meios e<br />
fins, entre causas e efeitos. Aponta-se<br />
também, a insuficiência do exame<br />
formal dos indicadores e de sua<br />
mensuração para a interpretação do<br />
impacto <strong>da</strong>s ações, considera<strong>da</strong>s por<br />
vezes intangíveis.<br />
Estas in<strong>da</strong>gações conflu<strong>em</strong> para a<br />
questão <strong>da</strong> garantia dos valores pretendidos<br />
e a efetivi<strong>da</strong>de dos resultados<br />
e indicam a necessi<strong>da</strong>de metodológica<br />
de se enfatizar dois conceitos para a<br />
avaliação peculiar <strong>da</strong>s iniciativas no TS.<br />
Trata-se <strong>da</strong> constatação dos vínculos<br />
entre os valores e resultados, ambos,<br />
objeto de mensuração; e <strong>da</strong> relevância<br />
do conceito de públicos constituintes<br />
com necessi<strong>da</strong>des, capaci<strong>da</strong>des e interesses<br />
diversos, que projetam estes<br />
valores e pretend<strong>em</strong> estes resultados.<br />
Com o concurso destes conceitos é<br />
possível construir o referencial de<br />
avaliação que esclareça e explicite<br />
quais os valores e os objetos dotados<br />
de valor que pretend<strong>em</strong>os avaliar.<br />
No momento atual de revalorização<br />
<strong>da</strong>s iniciativas no TS, associa<strong>da</strong> ao desenvolvimento<br />
<strong>da</strong> profissionalização<br />
no setor, duas outras motivações, para<br />
o desenvolvimento de metodologias<br />
de avaliação, dev<strong>em</strong> ser considera<strong>da</strong>s.<br />
De um lado a solicitação de agentes<br />
financiadores que requer<strong>em</strong> certeza<br />
<strong>da</strong> economici<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des e<br />
sua sustentabili<strong>da</strong>de e de outro, a necessi<strong>da</strong>de<br />
política dessas organizações
terceiro setor<br />
construír<strong>em</strong> um instrumento acreditador<br />
<strong>da</strong> sua capaci<strong>da</strong>de de executar<br />
propostas de abor<strong>da</strong>g<strong>em</strong> <strong>da</strong> questão<br />
social, de modo que as organizações<br />
do TS (OTS) sejam identifica<strong>da</strong>s socialmente<br />
como organizações autônomas,<br />
distintas <strong>da</strong>s organizações estatais<br />
e mercantis. O primeiro motivo, de<br />
ord<strong>em</strong> prática e como solicitação de<br />
curto prazo, sugere que as organizações<br />
desenvolvam procedimentos de<br />
avaliação que acredit<strong>em</strong> sua sustentabili<strong>da</strong>de;<br />
mas é o segundo motivo<br />
que indica a necessi<strong>da</strong>de de se tomar<br />
a avaliação como avanço necessário<br />
à gestão social <strong>da</strong> produção de bens<br />
públicos e como instrumento identificador<br />
do TS como um espaço social de<br />
produção destes bens.<br />
“O Terceiro Setor é o<br />
espaço de realização<br />
de esforços privados<br />
projetados sobre a<br />
questão social”<br />
A denominação Terceiro Setor é usa<strong>da</strong><br />
como designativa de um campo de<br />
relações sociais onde ativi<strong>da</strong>des,<br />
ações, <strong>em</strong>preendimentos e organizações<br />
sociais priva<strong>da</strong>s envolvi<strong>da</strong>s por<br />
propósitos solidários, expressam suas<br />
missões e participam <strong>da</strong> produção de<br />
bens públicos de proteção e desenvolvimento<br />
sociais. Ele é um espaço<br />
relacional onde lógicas diversas,<br />
discursos e racionali<strong>da</strong>des <strong>em</strong>ergindo<br />
do Estado, do setor mercantil e <strong>da</strong><br />
comuni<strong>da</strong>de, são interconectados por<br />
um propósito comum de proteção<br />
e desenvolvimento sociais. Neste<br />
sentido, o TS é o espaço de realização<br />
de esforços privados projetados sobre<br />
a questão social.<br />
As organizações surg<strong>em</strong> como formas<br />
priva<strong>da</strong>s e circunscritas por determinados<br />
públicos que nelas interag<strong>em</strong>,<br />
que atuam neste espaço público<br />
para a realização de missões. Estas<br />
missões comunicam, ou publicizam<br />
uma interpretação <strong>da</strong> questão social<br />
através de valores que se pretende<br />
sejam reproduzidos para a garantia<br />
de uma determina<strong>da</strong> quali<strong>da</strong>de de<br />
vi<strong>da</strong> <strong>em</strong> socie<strong>da</strong>de.<br />
Este processo de publicização no espaço<br />
público permite identificar os interesses<br />
de grupos sociais, confluentes<br />
na organização e expressos pelo que<br />
denominamos públicos constituintes:<br />
instituidores, que correspond<strong>em</strong> ao<br />
grupo original que instalou a OTS,<br />
manifestou sua missão e propiciou os<br />
recursos materiais e ideológicos iniciais;<br />
funcionários, que correspond<strong>em</strong><br />
ao grupo de indivíduos que se vincularam<br />
legalmente como <strong>em</strong>pregados<br />
<strong>da</strong> organização e assumiram, ao<br />
longo do t<strong>em</strong>po, determinado grau<br />
de identi<strong>da</strong>de com os pressupostos<br />
<strong>da</strong> organização; voluntários, como um<br />
grupo relativamente transitório que se<br />
articula à organização de modo autônomo<br />
e realiza parcelas <strong>da</strong>s tarefas, ou<br />
contribui com trabalho, participação<br />
ideológica ou <strong>em</strong>penho pessoal,<br />
não r<strong>em</strong>unerado, com intensi<strong>da</strong>de<br />
e características diversas; doadores,<br />
correspondentes ao conjunto não<br />
necessariamente articulado de indivíduos,<br />
que contribui financeiramente<br />
para a manutenção <strong>da</strong> organização;<br />
e, finalmente o público-alvo, que<br />
constitui o grupo de beneficiários dos<br />
serviços prestados pela OTS. A estes<br />
públicos estão associados valores,<br />
perspectivas, interesses e expectativas<br />
diversas como expressão de seus<br />
valores acerca <strong>da</strong> organização.<br />
Designamos o local social de interação<br />
destes públicos através do conceito<br />
de espaço público não estatal<br />
para o qual converg<strong>em</strong> atributos específicos<br />
e que não se confunde com<br />
o poder público conferido ao Estado,<br />
com o interesse econômico do mercado<br />
ou com a opinião <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
civil, mas relaciona-se com estes entes<br />
de maneira intermediária. Estes atributos<br />
são: representativi<strong>da</strong>de de interesses<br />
coletivos; d<strong>em</strong>ocratização;<br />
quali<strong>da</strong>de; efetivi<strong>da</strong>de dos resultados:<br />
visibili<strong>da</strong>de social; cultura pública; universali<strong>da</strong>de;<br />
autonomia; controle social;<br />
e sustentabili<strong>da</strong>de.<br />
Este conceito de espaço público<br />
dialoga com a concepção do TS como<br />
um campo com condições fronteiriças<br />
com o Estado, o mercado e a<br />
comuni<strong>da</strong>de. Os atributos do espaço<br />
público quando aplicados ao lugar<br />
social onde os públicos constituintes<br />
<strong>em</strong> organização, operam as iniciativas<br />
localiza<strong>da</strong>s, permit<strong>em</strong> compreender o<br />
TS como região de fluxos e influências,<br />
tensões e interesses presentes na<br />
socie<strong>da</strong>de civil, que se explicitam sob<br />
modos cooperativos e solidários. Neste<br />
sentido, a presença dos atributos garante<br />
a publicização <strong>da</strong>s iniciativas e<br />
de sua pertinência ao espaço público<br />
de realização de valores e resultados.<br />
A gestão <strong>da</strong>s organizações e programas<br />
no TS é insta<strong>da</strong> a produzir<br />
os resultados, perseguindo a reprodução<br />
dos valores, que estão na<br />
orig<strong>em</strong> <strong>da</strong> representação <strong>da</strong> questão<br />
social assumi<strong>da</strong> pelos públicos constituintes.<br />
Em pesquisa recente mostramos<br />
que a gestão <strong>da</strong>s OTS relega<br />
o controle a um plano subalterno<br />
comparativamente às outras funções<br />
<strong>da</strong> gestão, direção, planejamento e<br />
organização, sendo aponta<strong>da</strong> pelos<br />
“A presença dos<br />
atributos garante<br />
a publicização <strong>da</strong>s<br />
iniciativas e de<br />
sua pertinência ao<br />
espaço público de<br />
realização de valores<br />
e resultados”<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
31
gestores pesquisados como a menos<br />
desenvolvi<strong>da</strong> e menos importante<br />
delas. Propus<strong>em</strong>os então que para<br />
incorporarmos visão dos diversos<br />
públicos constituintes e a condição<br />
intermediária do TS como espaço<br />
público deveria caber á avaliação,<br />
como ferramenta à disposição <strong>da</strong><br />
gestão social, considerar os valores<br />
do espaço de arregimentação destes<br />
esforços e sua reprodução como<br />
condição de verificação do cumprimento<br />
<strong>da</strong> missão.<br />
A construção de um referencial para<br />
a avaliação <strong>da</strong>s iniciativas desenvolvi<strong>da</strong>s<br />
no TS, que considere os seus<br />
públicos constituintes, requer que<br />
se examin<strong>em</strong> quais resultados encampam<br />
valores para estes públicos<br />
e quão valiosos são estes resultados.<br />
Estas questões procuram configurar<br />
as condições de realização <strong>da</strong><br />
missão enquanto perspectiva de<br />
desenvolvimento de uma iniciativa<br />
que agregue aqueles indivíduos.<br />
É nesse sentido que pod<strong>em</strong>os nos<br />
referir à avaliação do cumprimento<br />
<strong>da</strong> missão pela gestão social.<br />
Tecnicamente é preciso que sejam<br />
respondi<strong>da</strong>s algumas questões, por<br />
ex<strong>em</strong>plo: como medir valores e expectativas,<br />
projetados <strong>em</strong> fatos e resultados?<br />
Como atribuir uma escala de<br />
importância a estes resultados substantivos?<br />
Como verificar capaci<strong>da</strong>des,<br />
condições, representações relativas <strong>da</strong><br />
questão social, que permitam o florescimento<br />
<strong>da</strong> ativi<strong>da</strong>de própria do TS e<br />
que seriam <strong>em</strong> primeira aproximação<br />
não necessariamente verificáveis, projetados<br />
sobre resultados que seriam<br />
por definição verificáveis?<br />
Da<strong>da</strong> a singulari<strong>da</strong>de do espaço público<br />
onde atuam as OTS, além dos<br />
resultados esperados do processo de<br />
avaliação, o avaliador é instado a refletir<br />
acerca dos propósitos do desenvolvimento<br />
humano; <strong>da</strong>s alternativas e<br />
processos de escolha viáveis para este<br />
32 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
desenvolvimento; <strong>da</strong> capaci<strong>da</strong>de de<br />
fruição dos bens públicos disponibilizados;<br />
<strong>da</strong> relevância <strong>da</strong>s ações apropria<strong>da</strong>s<br />
para a realização <strong>da</strong> missão;<br />
e <strong>da</strong> comunicação <strong>da</strong>s representações<br />
<strong>da</strong> questão social que os públicos<br />
constituintes realizam entre si.<br />
Estas questões não são ponderações<br />
abstratas para o avaliador, mas estão<br />
diretamente liga<strong>da</strong>s à contribuição<br />
que ele possa oferecer à gestão para<br />
o processo de decisão que envolve os<br />
vínculos entre os valores e resultados.<br />
Assim concebi<strong>da</strong>, como instrumento <strong>da</strong><br />
gestão social, a avaliação responde a<br />
uma d<strong>em</strong>an<strong>da</strong> estrutural do TS, de modo<br />
que a OTS que produz bens públicos <strong>em</strong><br />
um espaço público de proteção e desenvolvimento<br />
social, deve ser avalia<strong>da</strong><br />
para verificar se esses resultados são<br />
pertinentes a este espaço, corroborando<br />
a realização <strong>da</strong> missão institucional que<br />
publiciza os propósitos <strong>da</strong>queles públicos.<br />
Pod<strong>em</strong>os falar, portanto, <strong>em</strong> uma<br />
avaliação do cumprimento <strong>da</strong> missão,<br />
na medi<strong>da</strong> <strong>em</strong> que os atributos do espaço<br />
público sejam reconhecidos como<br />
referencial dos resultados efetivamente<br />
alcançados. Encontrar no processo de<br />
avaliação uma considerável percepção<br />
de desenvolvimento dos atributos no<br />
impacto causado pelos benefícios é<br />
sinônimo de que a missão é exitosa <strong>em</strong><br />
conferir e transmitir os valores. Neste<br />
sentido, estes atributos se constitu<strong>em</strong><br />
<strong>em</strong> um referencial a ser considerado<br />
para a proposição de indicadores <strong>da</strong> verificação<br />
de publicização <strong>da</strong>s iniciativas<br />
e de sua pertinência ao espaço público.<br />
Ao realizarmos a avaliação de impacto,<br />
que pretende estabelecer quais mu<strong>da</strong>nças<br />
um programa induz no público<br />
terceiro setor<br />
atingido, ou a avaliação <strong>da</strong> economici<strong>da</strong>de,<br />
que estabelece a relação dos<br />
custos com o benefício monetarizado<br />
que foi alcançado, o referencial proposto<br />
permite examinar os achados <strong>da</strong><br />
avaliação sob uma nova ótica, a ótica<br />
dos públicos que interag<strong>em</strong> no programa<br />
e a finali<strong>da</strong>de do cumprimento<br />
<strong>da</strong> missão institucional. Daí decorre<br />
que os atributos do espaço público,<br />
que acreditarão a natureza pública dos<br />
resultados, constitu<strong>em</strong>-se <strong>em</strong> valores<br />
que se manifestarão nos fatos e dev<strong>em</strong><br />
assim ser apreciados, b<strong>em</strong> como deve<br />
ser mensura<strong>da</strong> sua pertinência a estes<br />
fatos. A percepção pelos públicos constituintes<br />
de que estes atributos estão<br />
vinculados aos resultados alcançados,<br />
confere evidências <strong>da</strong> comunicação e<br />
realização <strong>da</strong> missão.<br />
“Encontrar no<br />
processo de<br />
avaliação uma<br />
considerável<br />
percepção de<br />
desenvolvimento<br />
dos atributos no<br />
impacto causado<br />
pelos benefícios é<br />
sinônimo de que a<br />
missão é exitosa <strong>em</strong><br />
conferir e transmitir<br />
os valores”<br />
Eloisa Helena de Souza Cabral - Doutora <strong>em</strong> Ciências Sociais e mestre <strong>em</strong> Políticas Públicas<br />
pela Pontifícia Universi<strong>da</strong>de Católica de São Paulo. Especialista <strong>em</strong> Administração e Educação,<br />
é professora convi<strong>da</strong><strong>da</strong> de cursos de pós-graduação <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção Getúlio Vargas, <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção<br />
Armando Álvares Penteado, dos Centros Universitários Facul<strong>da</strong>des Metropolitanas Uni<strong>da</strong>s, Centro<br />
Universitário Radial e Anh<strong>em</strong>bi Morumbi <strong>em</strong> São Paulo. É m<strong>em</strong>bro do International Society for<br />
Third Sector Research, <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de Johns Hopkins de Baltimore, USA e pesquisadora visitante<br />
do Centro de Estudos Sociais <strong>da</strong> Facul<strong>da</strong>de de Economia <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de de Coimbra, Portugal. É<br />
professora titular <strong>da</strong> Cadeira de Sociologia <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção Armando Álvares Penteado - SP. Publicou<br />
o livro Terceiro Setor: gestão e controle social, editado pela Editora Saraiva.
terceiro setor<br />
O Terceiro Setor e o controle<br />
<strong>da</strong> Gestão Pública Municipal:<br />
lições a partir do caso de Bogotá<br />
Armindo dos Santos de Sousa Teodósio<br />
A Colômbia é conheci<strong>da</strong> no mundo pela excelência de seu<br />
café e também pela quali<strong>da</strong>de de outras substâncias ilícitas<br />
que os abastados teimam <strong>em</strong> injetar continuamente <strong>em</strong> suas<br />
veias. Há dez anos atrás, Bogotá, capital colombiana, era uma<br />
ci<strong>da</strong>de martiriza<strong>da</strong> pelas chagas <strong>da</strong> criminali<strong>da</strong>de, degra<strong>da</strong>ção<br />
dos espaços públicos, políticas públicas insuficientes e ineficientes<br />
e grande descrença de seus moradores quanto a viver<br />
e conviver nesse espaço urbano. Sua imag<strong>em</strong> internacional,<br />
assim como Cáli e outras ci<strong>da</strong>des colombianas, era de refúgio<br />
seguro de traficantes que encurralavam o governo, deixando<br />
aberto o espaço público para a criminali<strong>da</strong>de. Hoje, a ci<strong>da</strong>de<br />
exporta experiências de gestão pública e envolvimento dos<br />
ci<strong>da</strong>dãos nas discussões sobre o futuro <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de. Espaços<br />
públicos foram reconquistados pela socie<strong>da</strong>de, que encurrala<br />
a criminali<strong>da</strong>de, mostrando ao mundo e a vários municípios<br />
brasileiros que se pode reduzir significativamente a violência<br />
<strong>em</strong> paralelo à expansão do respeito aos direitos humanos e<br />
a participação dos ci<strong>da</strong>dãos no controle <strong>da</strong> gestão pública.<br />
Várias ci<strong>da</strong>des brasileiras têm se articulado para<br />
caminhar <strong>em</strong> direção ao que se produz e reproduz<br />
atualmente <strong>em</strong> Bogotá. Não apenas municípios de<br />
grande porte como São Paulo e Rio de Janeiro já<br />
apresentam grupos e movimentos articulados para<br />
monitorar políticas públicas desenvolvi<strong>da</strong>s pelas<br />
prefeituras, mas também ci<strong>da</strong>des de menor porte,<br />
como Teresópolis no território fluminense, impl<strong>em</strong>entaram<br />
iniciativas s<strong>em</strong>elhantes. Belo Horizonte,<br />
na esteira dessas iniciativas, já começa a se articular<br />
e as perspectivas são bastante promissoras. O que<br />
acontecerá com Belo Horizonte? Novamente vai se<br />
perder o bonde <strong>da</strong> história de sonhos e realizações na<br />
construção de uma ci<strong>da</strong>de melhor?<br />
O controle social <strong>da</strong> administração pública desenvolvido<br />
pelos bogotanos envolve a sist<strong>em</strong>atização<br />
e produção de uma série de indicadores (14<br />
atualmente) sobre diferentes áreas <strong>da</strong>s<br />
políticas públicas que se desenvolv<strong>em</strong> na<br />
ci<strong>da</strong>de. Meio ambiente, saúde, segurança,<br />
educação, transporte e outros t<strong>em</strong>as são<br />
monitorados a partir de bases de <strong>da</strong>dos<br />
confiáveis e capazes de revelar detalhes positivos e negativos<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de que, muitas vezes, são imperceptíveis ou<br />
malcompreendidos pelos moradores, absorvidos por suas<br />
preocupações cotidianas. Tanto <strong>em</strong> Bogotá, quanto <strong>em</strong> São<br />
Paulo, além <strong>da</strong> sist<strong>em</strong>atização de indicadores e a sua publicização<br />
através de uma extensa rede de comunicação, são<br />
feitas pesquisas regulares sobre a percepção <strong>da</strong>queles que<br />
viv<strong>em</strong> e trabalham nessas ci<strong>da</strong>des acerca do que pensam e<br />
sent<strong>em</strong> com relação ao seu município.<br />
Bogotá deixou de ser<br />
uma ci<strong>da</strong>de marginaliza<strong>da</strong><br />
para se transformar<br />
<strong>em</strong> referência no Terceiro<br />
Setor<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
33
Em Bogotá, depois de uma déca<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong> experiência, grupos sociais se<br />
articularam e se tornou letra de lei<br />
a obrigatorie<strong>da</strong>de de depósito dos<br />
programas dos candi<strong>da</strong>tos à prefeitura,<br />
se comprometendo diretamente<br />
<strong>em</strong> trabalhar pela melhoria desses<br />
indicadores. São Paulo também t<strong>em</strong><br />
conquistado avanços e já foi aprovado<br />
projeto de lei que determina o mesmo<br />
compromisso dos candi<strong>da</strong>tos com a<br />
melhoria dos indicadores.<br />
Um aspecto importante dessas iniciativas<br />
é que não part<strong>em</strong> do poder<br />
público, mas são uma conquista dos<br />
grupos organizados <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
civil, inclusive com forte participação<br />
<strong>em</strong>presarial nos casos de Bogotá e<br />
São Paulo. Além disso, não há conotação<br />
político-partidária e não se<br />
constitu<strong>em</strong> <strong>em</strong> espaço de manobra do<br />
candi<strong>da</strong>to X ou Y à prefeitura. Indicadores<br />
reduz<strong>em</strong> a perspectiva de inferências<br />
politiqueiras e partidárias na<br />
discussão <strong>da</strong> gestão pública, apesar<br />
de nunca ser<strong>em</strong> completamente<br />
isentos por definição, pois não existe<br />
neutrali<strong>da</strong>de científica total e por reproduzir<strong>em</strong><br />
valores e desejos quanto<br />
à ci<strong>da</strong>de que se idealiza adequa<strong>da</strong><br />
para viver.<br />
O papel <strong>da</strong> mídia também é central<br />
nessa iniciativa, não só através dos<br />
grandes canais de comunicação, mas<br />
também via uma rede de inúmeros jornais<br />
e rádios comunitários e de bairro.<br />
Em Bogotá, o periódico mais lido <strong>em</strong><br />
to<strong>da</strong> a Colômbia, “El Ti<strong>em</strong>po”, divulga<br />
sist<strong>em</strong>aticamente os indicadores <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong>de. Em São Paulo, a comparação<br />
desses indicadores foi capaz de revelar<br />
o fato de que bairros como Pinheiros,<br />
de eleva<strong>da</strong> ren<strong>da</strong> per capita, receb<strong>em</strong><br />
até vinte vezes mais recursos <strong>da</strong> prefeitura<br />
do que regiões periféricas e<br />
pobres como Parelheiros. A desculpa<br />
dos gestores públicos é que há mais<br />
equipamentos públicos nesses bairros.<br />
No entanto, isso revela não apenas<br />
os equívocos de um determinado<br />
34 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
man<strong>da</strong>to, mas de déca<strong>da</strong>s de governos<br />
focalizando, propositalmente ou não,<br />
os mais abastados, <strong>em</strong> detrimento <strong>da</strong>queles<br />
que mais depend<strong>em</strong> <strong>da</strong> oferta<br />
de serviços públicos.<br />
Mas n<strong>em</strong> tudo são flores, há muitos<br />
desafios na construção de projetos<br />
como esses. Na<strong>da</strong> adianta produzir<br />
indicadores se a socie<strong>da</strong>de civil não<br />
os incorpora à sua discussão e percepção<br />
do que pensa sobre a ci<strong>da</strong>de.<br />
Sobretudo nas instâncias de gestão<br />
participativa dos municípios, como é<br />
o caso dos conselhos municipais que<br />
têm se instalado nas áreas de saúde,<br />
educação, infância e adolescência,<br />
meio ambiente e segurança pública,<br />
esses indicadores pod<strong>em</strong> servir para<br />
dotar os ci<strong>da</strong>dãos de maior poder<br />
de debate e negociação frente aos<br />
técnicos de governo. Por outro lado,<br />
indicadores pod<strong>em</strong> também se tornar<br />
refúgio para o pensamento tecnicista,<br />
que monopolizaria o poder através de<br />
seu conhecimento formal. Para tanto,<br />
projetos educacionais precisam se desenvolver<br />
a partir desses indicadores,<br />
fazendo com que pessoas com baixa<br />
escolari<strong>da</strong>de e sobretudo os jovens,<br />
possam voltar a se interessar pela política,<br />
tão <strong>em</strong> descrédito atualmente.<br />
Expressões culturais desenvolvi<strong>da</strong>s<br />
pelas comuni<strong>da</strong>des são essenciais<br />
para <strong>da</strong>r visibili<strong>da</strong>de e novas roupagens<br />
aos indicadores, aproximandoos<br />
dos grupos periféricos e excluídos<br />
<strong>da</strong>s decisões governamentais monopoliza<strong>da</strong>s<br />
por aqueles dotados de<br />
grande poder político e econômico<br />
<strong>da</strong>s ci<strong>da</strong>des.<br />
Belo Horizonte t<strong>em</strong> to<strong>da</strong>s as possibili<strong>da</strong>des<br />
para avançar <strong>em</strong> direção a<br />
um maior envolvimento de seus ci<strong>da</strong>dãos<br />
no futuro <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de. Inúmeras<br />
pesquisas sobre o município estão<br />
terceiro setor<br />
disponíveis, mas poucas delas reuni<strong>da</strong>s<br />
e sist<strong>em</strong>atiza<strong>da</strong>s para oferecer<br />
uma visão integra<strong>da</strong> e estrutura<strong>da</strong><br />
sobre a ci<strong>da</strong>de. Grupos sociais e indivíduos<br />
comprometidos com a melhoria<br />
<strong>da</strong> quali<strong>da</strong>de dos serviços públicos já<br />
atuam intensamente <strong>em</strong> vários conselhos<br />
e espaços de gestão participativa<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de. Resta articular e organizar<br />
esses grupos e indivíduos. Diferentes<br />
canais de comunicação, como os jornais<br />
e rádios locais, já ating<strong>em</strong> o ci<strong>da</strong>dão<br />
<strong>em</strong> seu cotidiano.<br />
Permanece assim uma pergunta que<br />
não quer calar: os ci<strong>da</strong>dãos e organizações<br />
do Terceiro Setor de Belo<br />
Horizonte estão dispostos a construir<br />
esse projeto de ci<strong>da</strong>de ou prefer<strong>em</strong> o<br />
espaço cômodo <strong>da</strong> crítica ou do elogio,<br />
s<strong>em</strong> fun<strong>da</strong>mento maior, sobre o que<br />
se faz na gestão municipal? Quando,<br />
no futuro, os novos moradores<br />
perguntar<strong>em</strong> “Belo Horizonte, como<br />
vamos?” O que responder<strong>em</strong>os? As<br />
respostas pod<strong>em</strong> se <strong>da</strong>r na perspectiva<br />
virtuosa colombiana ou pod<strong>em</strong> ser no<br />
estilo politiqueiro de s<strong>em</strong>pre. Quais<br />
respostas construir<strong>em</strong>os?<br />
“Na<strong>da</strong> adianta<br />
produzir indicadores<br />
se a socie<strong>da</strong>de civil<br />
não os incorpora<br />
à sua discussão<br />
e percepção do<br />
que pensa sobre a<br />
ci<strong>da</strong>de”<br />
Armindo dos Santos de Sousa Teodósio - Professor <strong>da</strong> PUC Minas, Doutorando <strong>em</strong> Administração<br />
de Empresas pela EAESP-FGV, Mestre <strong>em</strong> Ciências Sociais pela PUC Minas e Economista pela<br />
UFMG. Líder-parceiro <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção AVINA, desenvolve estudos sobre Organizações <strong>da</strong> Socie<strong>da</strong>de<br />
Civil, Políticas Sociais, Responsabili<strong>da</strong>de Social Empresarial e Desenvolvimento Sustentável.
defesa social<br />
A evolução <strong>da</strong> Educação na<br />
Polícia Militar de Minas Gerais<br />
Ten-Cel. PM Márcio Antônio Macêdo Assunção<br />
O referencial t<strong>em</strong>poral e o aperfeiçoamento são atributos do processo evolutivo. Por isso,<br />
o discurso sobre a evolução <strong>da</strong> Educação de Polícia Militar de Minas Gerais suscita a<br />
propensão para a narração de r<strong>em</strong>iniscências, as quais são resgata<strong>da</strong>s de forma a ressaltar<br />
episódios importantes decorrentes <strong>da</strong> marcha imposta pelos fatos componentes <strong>da</strong> relação<br />
bilateral causa e efeito. Este artigo furta-se a essa praxe, porquanto não enfatiza a crônica<br />
<strong>da</strong> educação na PMMG - <strong>em</strong>bora a ela, superficialmente, recorra -, mas ressalta aspectos<br />
de quali<strong>da</strong>de que potencializam seus valores morais, ratificam sua deontologia, vinculam<br />
sua eficácia à efetivi<strong>da</strong>de dos serviços prestados pela Corporação e inser<strong>em</strong>-na no cenário<br />
acadêmico nacional.<br />
Considerações<br />
conceituais<br />
A educação é o processo de interações<br />
sociais por meio <strong>da</strong>s quais as pessoas<br />
procuram modificar o comportamento,<br />
as disposições comportamentais e as<br />
Aula de educação física dos alunos do CTSP (Curso<br />
Técnico <strong>em</strong> Segurança Pública) no pátio principal <strong>da</strong><br />
APM (Acad<strong>em</strong>ia de Polícia Militar), <strong>em</strong> Belo Horizonte.<br />
características de personali<strong>da</strong>de de<br />
outras pessoas para alcançar uma<br />
meta. Essa meta integra etapas préfixa<strong>da</strong>s<br />
para que sejam alcançados<br />
objetivos estabelecidos pelo educador,<br />
ou pelo grupo por eles interessado,<br />
<strong>em</strong> função de valores e normas que<br />
consideram de especial importância.<br />
A Educação de Polícia Militar está<br />
defini<strong>da</strong> no artigo 1º <strong>da</strong> Resolução<br />
3.836, de 22 de janeiro de 2006 1 :<br />
“A Educação de Polícia Militar<br />
(EPM) é um processo formativo<br />
desenvolvido por meio do ensino,<br />
treinamento, pesquisa e extensão,<br />
integrados entre si, que permite<br />
ao militar adquirir competências<br />
que o habilit<strong>em</strong> ao exercício <strong>da</strong><br />
profissão.”<br />
É impossível dissociar o militarismo<br />
de um processo formativo. Para Santos<br />
(1999, p.17, apud BERTOCCHI,<br />
2006, p.21-35) 2 , os primeiros sinais do<br />
uso <strong>da</strong> ord<strong>em</strong>-uni<strong>da</strong> <strong>em</strong> combate foram<br />
encontrados nas ci<strong>da</strong>des-estado<br />
gregas, que, por ser<strong>em</strong> os sol<strong>da</strong>dos de<br />
seus exércitos também agricultores,<br />
não dispunham de t<strong>em</strong>po para extensas<br />
batalhas, porquanto a economia<br />
<strong>da</strong>s ci<strong>da</strong>des, também, dependia<br />
1 Aprova as Diretrizes de Educação <strong>da</strong> Polícia Militar (DEPMs);<br />
2 BERTOCCHI, Marcelo Martins. Marchar para Coman<strong>da</strong>r.<br />
2006. (Monografia do Curso de Formação de Oficiais) –<br />
Centro de Ensino de Graduação, Acad<strong>em</strong>ia de Polícia Militar,<br />
Belo Horizonte, 2006.<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
35
desses mesmos homens. A questão<br />
é: como <strong>em</strong>pregar ord<strong>em</strong>-uni<strong>da</strong> <strong>em</strong><br />
combate, s<strong>em</strong> que os sol<strong>da</strong>dos foss<strong>em</strong><br />
ensinados e treinados?<br />
Interessante é a correlação que se<br />
pode fazer entre a s<strong>em</strong>ântica de determina<strong>da</strong>s<br />
palavras para se chegar ao<br />
vínculo <strong>da</strong> educação com a ativi<strong>da</strong>de<br />
militar. As organizações militares, conforme<br />
Santos (1999, p. 16, apud BER-<br />
TOCCHI, 2006, p. 21-35) têm, como<br />
princípios essenciais, a hierarquia, a<br />
disciplina e a tradição. Com a ord<strong>em</strong>uni<strong>da</strong><br />
surgiram e desenvolveram-se a<br />
hierarquia e a disciplina. Ao fazer <strong>da</strong><br />
palavra “disciplina” objeto de abstração,<br />
vislumbrou-se a conveniência<br />
de recorrer à sua orig<strong>em</strong> etimológica:<br />
“lat. disciplína,ae ‘ação de<br />
se instruir, educação, ciência,<br />
disciplina, ord<strong>em</strong>, sist<strong>em</strong>a,<br />
princípios de moral’, cog. de<br />
discipulus; ver disc-” (HOUAISS,<br />
2001) 3 .<br />
Como sugere o autor, resta buscar o<br />
significado de disc:<br />
“el<strong>em</strong>ento de composição:<br />
antepositivo, do v.lat.<br />
disco,is,didìci,discère (s<strong>em</strong> supn.,<br />
n<strong>em</strong> part.pas.) ‘aprender’ [p.opos.<br />
a docèo ‘fazer aprender, ensinar’,<br />
ver doc(t)-]; (...); principais der.:<br />
discipùlus,i ‘aluno, discípulo’<br />
(p.opos. a magister); discipùla,ae<br />
(mais raro), condiscipùlus<br />
(antigo e usual); disciplina,ae<br />
‘ensino, educação, disciplina’ e<br />
esp. ‘disciplina militar’, sentido<br />
concreto ‘ensinamento, matéria<br />
ensina<strong>da</strong>’; (...) qualquer que seja<br />
o étimo de discipùlus, os antigos<br />
romanos não o separavam de<br />
disco, ao qual o sentido se liga<br />
estreitamente; der. prefixais de<br />
disco: (...); edisco ‘aprender a fundo<br />
ou de cor’; perdisco ‘aprender de<br />
3 DISCIPLINA. In: HOUAISS, Antônio. Dicionário Eletrônico Houaiss<br />
<strong>da</strong> Língua Portuguesa, versão 1.0. Objetiva Lt<strong>da</strong>. 2001 4 DISC. Ibid.<br />
36 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
cabo a rabo’; praedisco ‘aprender<br />
por antecipação’; disco é mal<br />
representado nas línguas român.,<br />
que recorr<strong>em</strong> a apprehendère<br />
(HOUAISS, 2001) 4 .<br />
Essa afini<strong>da</strong>de entre educação e militarismo<br />
é interessante, mas não é surpreendente,<br />
porquanto as forças militares<br />
do ocidente muito her<strong>da</strong>ram do modelo<br />
espartano. Santos (1999, p. 19 apud<br />
BERTOCCHI, 2006, p. 21-35) assevera<br />
que, <strong>em</strong> Esparta, a função militar era<br />
mais aperfeiçoa<strong>da</strong>. Os escravos mantinham<br />
a classe dominante e a deixavam<br />
dedicar-se inteiramente ao exército. Dos<br />
sete aos trinta anos, o espartano, aquartelado,<br />
preparava-se, no dia-a-dia,<br />
para a guerra. Era comum realizar<strong>em</strong><br />
operações militares de extermínio de<br />
escravos que fugiam, ou <strong>da</strong>vam outros<br />
probl<strong>em</strong>as, como forma de treinamento<br />
para os jovens.<br />
Evidenciam-se, aí, duas ativi<strong>da</strong>des<br />
específicas de educação: a preparação,<br />
assim subentendi<strong>da</strong> a idéia<br />
de ensino e treinamento; e o próprio<br />
treinamento, como aplicação prática<br />
dos conhecimentos adquiridos com a<br />
ativi<strong>da</strong>de de ensino.<br />
A PMMG não se furta a esse fenômeno,<br />
no qual se aliam, nas origens dela, o<br />
militarismo e o processo formativo. A<br />
conjuntura político-cultural de suas origens,<br />
no século XVIII, permite, inclusive,<br />
especular que, por ser a Instituição germe<br />
do iluminismo, seu modelo educacional<br />
não era tacanho. A impl<strong>em</strong>entação do<br />
ensino e do treinamento, naquela época,<br />
é fato inquestionável, e a realização de<br />
pesquisa - respeita<strong>da</strong>s as diferenças metodológicas<br />
- é fato provável, pois, sob<br />
a influência do racionalismo, a ver<strong>da</strong>de<br />
passou a ser busca<strong>da</strong>, <strong>em</strong> contraposição<br />
ao <strong>em</strong>pirismo e ao misticismo, para a<br />
solução de probl<strong>em</strong>as diversos.<br />
Constata-se que o processo formativo<br />
na PMMG evoluiu-se até os t<strong>em</strong>pos<br />
defesa social<br />
hodiernos, e culminou com a inclusão<br />
de novas ativi<strong>da</strong>des educacionais,<br />
b<strong>em</strong> como na sua sist<strong>em</strong>atização.<br />
A duali<strong>da</strong>de ensino-treinamento tornou-se<br />
ineficiente aos propósitos <strong>da</strong><br />
PMMG. Adotou-se a quatrinca ensino,<br />
treinamento, pesquisa e extensão, por<br />
configurar a educação universitária,<br />
hoje, a de melhor quali<strong>da</strong>de no País -<br />
quali<strong>da</strong>de deve ser corolário e atributo<br />
<strong>da</strong> educação.<br />
O ensino de polícia militar são as ativi<strong>da</strong>des<br />
e experiências que permit<strong>em</strong><br />
ao militar adquirir e desenvolver<br />
competências relaciona<strong>da</strong>s com a polícia<br />
ostensiva, preservação <strong>da</strong> ord<strong>em</strong><br />
pública e ativi<strong>da</strong>des administrativas.<br />
Seus cursos são desenvolvidos no<br />
afã de viabilizar-lhe a ascensão na<br />
carreira. Está o ensino vinculado ao<br />
passado, porquanto é instrumento de<br />
transmissão de conhecimentos.<br />
A pesquisa de polícia militar se constitui<br />
na busca, geração e divulgação<br />
de conhecimentos necessários ao desenvolvimento<br />
<strong>da</strong>s ciências militares,<br />
especificamente na área de defesa<br />
social. Essa ativi<strong>da</strong>de educacional se<br />
vincula ao futuro, pois buscará conhecimentos,<br />
ain<strong>da</strong>, inexistentes.<br />
A extensão de polícia militar consiste<br />
na aplicação de conhecimentos transmitidos<br />
na ativi<strong>da</strong>de de ensino ou adquiridos<br />
com a ativi<strong>da</strong>de de pesquisa,<br />
para o b<strong>em</strong>-estar e o desenvolvimento<br />
sociocultural <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de onde se<br />
insere a Acad<strong>em</strong>ia de Polícia Militar,<br />
já reconheci<strong>da</strong> como Instituição de<br />
Educação Superior pelo Conselho<br />
Estadual de Educação. Por isso, essa<br />
ativi<strong>da</strong>de vincula-se ao presente.<br />
O treinamento de polícia militar é a ativi<strong>da</strong>de<br />
de educação continua<strong>da</strong> que visa a<br />
atualizar e modificar o comportamento dos<br />
militares, no mister de melhor capacitá-los<br />
para exercer sua função policial-militar.<br />
Nele não há vínculo t<strong>em</strong>poral, mas há<br />
um comprometimento do presente com
defesa social<br />
o futuro. Seus cursos não têm o objetivo<br />
específico de viabilizar a ascensão na<br />
carreira do militar, <strong>em</strong>bora com isso possa<br />
contribuir. O treinamento de polícia militar<br />
constitui o diferencial <strong>da</strong> EPM.<br />
Essas ativi<strong>da</strong>des educacionais desenvolv<strong>em</strong>-se<br />
<strong>em</strong> dois níveis e quatro<br />
mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des diferentes de educação.<br />
No nível técnico <strong>da</strong> Educação de<br />
Polícia Militar, desenvolv<strong>em</strong>-se o<br />
ensino para formação <strong>da</strong>s praças; o<br />
treinamento que não exige o nível<br />
superior como quesito para matrícula;<br />
a pesquisa s<strong>em</strong> rigor metodológico;<br />
e a extensão, sob qualquer forma de<br />
manifestação. No nível superior <strong>da</strong><br />
EPM, desenvolv<strong>em</strong>-se o ensino para<br />
formação dos oficiais <strong>em</strong> Curso de<br />
Bacharelado <strong>em</strong> Ciências Militares,<br />
na área de Defesa Social; o Curso<br />
Superior de Tecnologia <strong>em</strong> Ciências<br />
Militares, na área de Defesa Social; e<br />
para especialização de oficiais, dois<br />
cursos de pós-graduação lato sensu:<br />
o de Especialização <strong>em</strong> Segurança Pública<br />
e o de Especialização <strong>em</strong> Gestão<br />
Estratégica de Segurança Pública.<br />
As mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des indicam que a EPM<br />
pode se apresentar, nos dias de hoje,<br />
sob a forma de educação profissional<br />
(formato original e essencial),<br />
Biblioteca Capitão PM Walter Geraldo <strong>da</strong> Cunha<br />
(APM/CPP - Centro de Pesquisa e Pós-Graduação).<br />
presencial, s<strong>em</strong>ipresencial, à distância<br />
e continua<strong>da</strong>. Neste azo, convém<br />
mencionar a educação corporativa,<br />
espécie de educação profissional, cujo<br />
objetivo é a qualificação do talento<br />
humano para que ele melhor se alinhe<br />
às estratégias de sua <strong>em</strong>presa, responsável<br />
pelo seu desenvolvimento.<br />
Na PMMG, o objetivo primordial <strong>da</strong><br />
EPM é, exatamente, esse.<br />
As regras que normalizam a EPM<br />
baseiam-se, além de outros nove, <strong>em</strong><br />
quatro princípios tonificantes <strong>da</strong> deontologia<br />
policial-militar: a disciplina,<br />
a hierárquica, os direitos humanos e<br />
a polícia comunitária. Fun<strong>da</strong>menta<strong>da</strong><br />
nesses princípios, a EPM qualifica um<br />
militar mais d<strong>em</strong>ocrática e altruísta,<br />
s<strong>em</strong> o olvido de seus pilares e tradições<br />
institucionais.<br />
Embora o conteúdo programático policial<br />
dos cursos de ensino e treinamento<br />
de polícia militar tenha suplantado<br />
o militar, há de se admitir que uma<br />
<strong>da</strong>s funções desses princípios <strong>da</strong> EPM<br />
consiste <strong>em</strong> servir-se como instrumento<br />
para manter o equilíbrio e a atuação<br />
judiciosa <strong>da</strong> Corporação como polícia<br />
de defesa do ci<strong>da</strong>dão e polícia de defesa<br />
do Estado. Polícia de defesa do ci<strong>da</strong>dão,<br />
enquanto deno<strong>da</strong><strong>da</strong> defensora dos<br />
“A pesquisa de<br />
polícia militar se<br />
constitui na busca,<br />
geração e divulgação<br />
de conhecimentos<br />
necessários ao<br />
desenvolvimento <strong>da</strong>s<br />
ciências militares,<br />
especificamente na<br />
área de defesa social”<br />
direitos e garantias individuais prescritos<br />
no artigo 5º <strong>da</strong> Constituição Federal<br />
vigente; e polícia de defesa do Estado,<br />
enquanto força auxiliar e reserva do<br />
Exército Brasileiro para o cumprimento<br />
de missões de interesse <strong>da</strong> defesa<br />
nacional, sobretudo com o exercício de<br />
ativi<strong>da</strong>des de defesa interna, conforme<br />
prescrição conti<strong>da</strong> no parágrafo 6º do<br />
artigo 144 <strong>da</strong> mesma Carta Magna.<br />
O conteúdo programático constituise<br />
<strong>da</strong> relação de assuntos, por disciplina,<br />
que será ministra<strong>da</strong> no curso,<br />
para desenvolver as competências do<br />
discente. A definição científica do conteúdo<br />
programático dos cursos retrata<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
37
outro aspecto <strong>da</strong> evolução <strong>da</strong> EPM.<br />
Esquivou-se do <strong>em</strong>pirismo com a concepção<br />
e a adoção do mapeamento de<br />
competências do profissional de segurança<br />
pública. Com ele, foram lista<strong>da</strong>s<br />
to<strong>da</strong>s as dimensões dessas competências:<br />
do conhecimento, <strong>da</strong>s habili<strong>da</strong>des<br />
e <strong>da</strong>s atitudes. Assim, para o<br />
des<strong>em</strong>penho <strong>da</strong> função policial-militar,<br />
não basta o militar saber; ele t<strong>em</strong><br />
de saber fazer e de ser.<br />
Embora seja uma referência de valor<br />
inefável, o mapeamento de competências,<br />
ao delinear as ativi<strong>da</strong>des para o<br />
profissional de segurança pública, coloca<br />
a qualificação do talento humano<br />
<strong>da</strong> Corporação numa condição reducionista,<br />
porquanto não mapeou as competências<br />
relaciona<strong>da</strong>s às ativi<strong>da</strong>des de<br />
Defesa Interna. Esta é uma reali<strong>da</strong>de:<br />
enquanto estiver prescrito na Constituição<br />
<strong>da</strong> República Federativa do<br />
Brasil, a PMMG é uma Organização Militar,<br />
reserva e auxiliar do Exército Brasileiro.<br />
Nesse contexto, necessário se<br />
faz r<strong>em</strong><strong>em</strong>orar o incomensurável ensinamento<br />
do <strong>em</strong>bl<strong>em</strong>ático Czar Pedro, o<br />
Grande: “Enquanto a lei existir, deve<br />
ser cumpri<strong>da</strong>. Se estiver erra<strong>da</strong>,<br />
todo esforço deve ser envi<strong>da</strong>do<br />
para modificá-la ou substituí-la.”<br />
A legitimi<strong>da</strong>de e<br />
a legali<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />
Educação de Polícia<br />
Militar<br />
No artigo 205 <strong>da</strong> Carta Magna, o<br />
constituinte introduziu a Educação<br />
Nacional ao prescrever que, apesar de<br />
ser dever do Estado, ela deve ser promovi<strong>da</strong><br />
com a colaboração <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
para o total desenvolvimento <strong>da</strong><br />
pessoa, o pleno gozo de seus direitos<br />
como ci<strong>da</strong>dão e para sua qualificação<br />
para o trabalho.<br />
A Polícia Militar do Estado de Minas<br />
Gerais, por integrar-se ao meio social,<br />
recebe, com a prescrição retromenciona<strong>da</strong>,<br />
a primeira impressão sobre suas<br />
obrigações para com o processo educacional.<br />
Essas obrigações são percebi<strong>da</strong>s<br />
pela Organização Militar Estadual<br />
sob dois aspectos: um endógeno,<br />
porém com a finali<strong>da</strong>de última volta<strong>da</strong><br />
para a consoli<strong>da</strong>ção do caráter do público<br />
externo, conforme pretende a filosofia<br />
dos direitos humanos - o policialmilitar<br />
é um educador!; outro exógeno,<br />
to<strong>da</strong>via necessário à qualificação de<br />
seu talento humano.<br />
Sala de aula do CHO - Curso de Habilitação de Oficiais (APM/CEG -<br />
Centro de Ensino de Graduação <strong>da</strong> Acad<strong>em</strong>ia de Polícia Militar).<br />
38 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
defesa social<br />
Para que as prescrições constitucionais<br />
foss<strong>em</strong> atendi<strong>da</strong>s, foi promulga<strong>da</strong> a<br />
Lei de Diretrizes e Bases <strong>da</strong> Educação<br />
Nacional (LDBEN), cognomina<strong>da</strong> de<br />
LDB. Ela é o instrumento que regula<br />
a educação nacional. Em razão do<br />
aspecto exógeno <strong>da</strong> participação<br />
<strong>da</strong> PMMG no processo educacional,<br />
as ativi<strong>da</strong>des desenvolvi<strong>da</strong>s para<br />
esse fim acolh<strong>em</strong> os auspícios desse<br />
dispositivo legal.<br />
Conforme prevê o caput do artigo 1º<br />
<strong>da</strong> LDB, a educação transpõe os umbrais<br />
<strong>da</strong> família e <strong>da</strong> escola, e alcança<br />
o âmbito <strong>da</strong> profissão. O parágrafo<br />
segundo do mesmo artigo arr<strong>em</strong>ata a<br />
duali<strong>da</strong>de educação-trabalho ao estabelecer<br />
que ela deverá vincular-se ao<br />
mundo laboral e à prática social, o que<br />
dá supedâneo legal aos investimentos<br />
<strong>da</strong> PMMG nessa área de atuação.<br />
A finali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> educação, segundo a<br />
LDB, que reitera a prescrição constitucional,<br />
é o pleno desenvolvimento do<br />
educando, seu preparo para o exercício<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia e sua qualificação para<br />
o trabalho. Infere-se, com isso, que a<br />
PMMG, ao <strong>em</strong>penhar-se nesse setor <strong>da</strong><br />
vi<strong>da</strong> social, não comete nenhuma usurpação<br />
de função, tão somente cumpre<br />
um dever constitucional e mantém sua<br />
tradição de colocar-se na vanguar<strong>da</strong><br />
com a impl<strong>em</strong>entação de iniciativas.<br />
A LDB, ao regular a educação nacional,<br />
estabelece os princípios que a reg<strong>em</strong><br />
(artigo 3º); prescreve diversos dispositivos<br />
e, de forma particular, define a educação<br />
profissional (artigo 39 a 42).<br />
De acordo com a LDB, a educação<br />
profissional conduz ao permanente<br />
desenvolvimento de aptidões para a<br />
vi<strong>da</strong> produtiva (artigo 39). A vi<strong>da</strong> produtiva<br />
com a qual PMMG se ocupa<br />
consiste no des<strong>em</strong>penho <strong>da</strong> função<br />
policial-militar para a preservação<br />
<strong>da</strong> ord<strong>em</strong> pública e polícia ostensiva,<br />
sintetiza<strong>da</strong>s, na identi<strong>da</strong>de organizacional,<br />
como paz social; e na execução
defesa social<br />
de missões peculiares à Defesa Interna,<br />
como força reserva e auxiliar do<br />
Exército Brasileiro.<br />
Especificamente, é no artigo 83 <strong>da</strong><br />
LDB que as organizações militares obtiveram<br />
a aquiescência para legislar<br />
sobre seus sist<strong>em</strong>as de ensino:<br />
“Art. 83. O ensino militar é regulado<br />
<strong>em</strong> lei específica, admiti<strong>da</strong> a<br />
equivalência de estudos, de acordo<br />
com as normas fixa<strong>da</strong>s pelos<br />
sist<strong>em</strong>as de ensino.” (BRASIL, 1996).<br />
A lei de ensino <strong>da</strong> PMMG 5 é obsoleta,<br />
no entanto é o instituto vigente que<br />
regulamenta a Educação de Polícia Militar.<br />
Para modernizá-la, o Coman<strong>da</strong>nte<br />
<strong>da</strong> Acad<strong>em</strong>ia de Polícia Militar encaminhou<br />
à Chefia do Estado-Maior <strong>da</strong><br />
Corporação proposta de projeto <strong>da</strong> lei<br />
já intitula<strong>da</strong> “Lei de Educação <strong>da</strong> Polícia<br />
Militar de Minas Gerais”. Vislumbrase,<br />
com a substituição <strong>da</strong> designação<br />
reducionista “ensino” pela designação<br />
abrangente e precisa “educação”, novo<br />
efeito evolutivo <strong>da</strong> EPM.<br />
Esse efeito prossegue, de forma dispersa<br />
e progressiva, com a vigência sucessiva<br />
de novas leis e normas internas. Cria-se<br />
o Instituto de Educação de Segurança<br />
Pública (IESP) para imprimir quali<strong>da</strong>de<br />
à habilitação e capacitação dos discentes,<br />
inclusive, com vistas à realização<br />
<strong>da</strong> pesquisa para o desenvolvimento<br />
técnico-científico. Resgata-se o nome<br />
<strong>da</strong> Acad<strong>em</strong>ia de Polícia Militar, <strong>em</strong> prol<br />
<strong>da</strong> tradição, porquanto, como escola de<br />
coman<strong>da</strong>ntes <strong>da</strong> Corporação, o novo<br />
designativo não conquistou a simpatia<br />
deles para sua perduração, sob o argumento<br />
de que nele na<strong>da</strong> indicava ser o<br />
educandário um órgão <strong>da</strong> PMMG.<br />
Publicam-se as Diretrizes para a<br />
Educação de Segurança Pública, que<br />
aprimoram o Sist<strong>em</strong>a de Educação<br />
de Segurança Pública, b<strong>em</strong> como<br />
sua dinâmica; no entanto, logo são<br />
5 Lei nº. 6 260, de 13 de dez<strong>em</strong>bro de 1973.<br />
substituí<strong>da</strong>s pelas Diretrizes para<br />
Educação de Polícia Militar, principalmente<br />
porque a segurança pública não<br />
esgota a missão <strong>da</strong> PMMG, por ser,<br />
apenas, uma <strong>da</strong>s vertentes <strong>da</strong> ord<strong>em</strong><br />
pública, missão constitucional maior<br />
atribuí<strong>da</strong> às polícias militares pela<br />
Constituição Federal. Essa medi<strong>da</strong><br />
foi judiciosa sob o enfoque filosófico,<br />
pois, se para ca<strong>da</strong> responsabili<strong>da</strong>de<br />
corresponde uma autori<strong>da</strong>de, seria<br />
um ônus para a Instituição responsabilizar-se<br />
perante a Carta Magna por<br />
uma atribuição-maior e ter autori<strong>da</strong>de<br />
de gestão, apenas, de parte dela.<br />
Quanto mais a Educação de Polícia<br />
Militar se aprimorar, melhor a PMMG<br />
promoverá o b<strong>em</strong>-estar social, pois<br />
<strong>da</strong> quali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> qualificação de<br />
seus talentos humanos depende a<br />
preservação <strong>da</strong> ord<strong>em</strong> pública e a<br />
polícia ostensiva. Por esse motivo, a<br />
revisão de suas normas não cessa,<br />
quer seja para corrigir, pontualmente,<br />
aspectos inadequados, quer seja para<br />
impl<strong>em</strong>entar medi<strong>da</strong>s oriun<strong>da</strong>s de<br />
novos conceitos.<br />
Considerações finais<br />
A Educação de Polícia Militar se<br />
aperfeiçoa paulatinamente, pois<br />
volta<strong>da</strong>, <strong>em</strong> última análise, para o<br />
atendimento <strong>da</strong>s d<strong>em</strong>an<strong>da</strong>s sociais<br />
por segurança, à evolução <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
deve acompanhar.<br />
Essa a<strong>da</strong>ptação contínua <strong>da</strong> EPM aos<br />
t<strong>em</strong>pos hodiernos constitui-se <strong>em</strong><br />
complexo desafio. Como desaguadouro<br />
dos anseios e receios do ci<strong>da</strong>dão,<br />
também a PMMG sofre as conseqüências<br />
<strong>da</strong> era pós-moderna. A<br />
veloci<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s transformações sociais<br />
decorrentes do desenvolvimento<br />
desenfreado <strong>da</strong> tecnologia imprime<br />
um ritmo descomunal à dinâmica do<br />
processo educacional na Corporação.<br />
Daí a importância <strong>da</strong> sua evolução.<br />
No entanto, essa evolução não se<br />
limita a esse mister. É necessário<br />
trazer à baila que ela é condição sine<br />
qua non para a valorização do talento<br />
humano <strong>da</strong> Instituição. É preciso, com<br />
ela, fazer contraponto às histórias de<br />
mau gosto envergonhadoras e r<strong>em</strong><strong>em</strong>ora<strong>da</strong>s,<br />
até mesmo, no seio <strong>da</strong> tropa,<br />
sobre civis que eram “apanhados<br />
a laço”, no interior do Estado, para<br />
ingressar nos quadros <strong>da</strong> Corporação.<br />
Esses infelizes “factoides” - se é que<br />
isso aconteceu - eram utilizados para<br />
justificar a existência de analfabetos<br />
na Instituição.<br />
A mesma corag<strong>em</strong> utiliza<strong>da</strong> para aventar<br />
essa infeliz épica deve ser busca<strong>da</strong><br />
para fazer <strong>da</strong> evolução <strong>da</strong> Educação<br />
de Polícia Militar um forte argumento<br />
para se requerer melhores condições de<br />
trabalho e justa r<strong>em</strong>uneração do talento<br />
humano <strong>da</strong> Corporação.<br />
“Quanto mais<br />
a Educação de<br />
Polícia Militar<br />
se aprimorar,<br />
melhor a PMMG<br />
promoverá o<br />
b<strong>em</strong>-estar social”<br />
Márcio Antônio Macêdo Assunção - Promovido ao Posto de Tenente-Coronel PM <strong>em</strong> 9 de Junho<br />
de 1998, especializou-se <strong>em</strong> Gestão Estratégica de Segurança Pública. Chefiou o Centro de<br />
Pesquisa e Pós-graduação <strong>da</strong> PMMG e, atualmente, é o Subcoman<strong>da</strong>nte <strong>da</strong> APM. Integra o rol<br />
de orientadores e avaliadores de monografia de discentes do Curso de Bacharelado <strong>em</strong> Ciências<br />
Militares, com ênfase <strong>em</strong> Defesa Social; Curso de Especialização <strong>em</strong> Segurança Pública; e Curso<br />
de Especialização <strong>em</strong> Gestão Estratégica de Segurança Pública.<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
39
Justiça Militar de Minas Gerais<br />
Setenta anos de existência<br />
Juiz Cel PM Rúbio Paulino Coelho<br />
“A Justiça Militar, organismo integrante dos quadros do Poder Judiciário do Estado é, s<strong>em</strong> dúvi<strong>da</strong>,<br />
um dos pontos mais altos na formação e na estrutura <strong>da</strong> nossa organização política. Esta casa t<strong>em</strong><br />
uma tradição de austeri<strong>da</strong>de, de cultura e integri<strong>da</strong>de. Desde a sua organização até os dias de hoje,<br />
são decênios de notável contribuição ao aprimoramento <strong>da</strong> ord<strong>em</strong> jurídica, social e humana de nosso<br />
Estado.” (Tancredo Neves, 1984)<br />
“Poucos ci<strong>da</strong>dãos conhec<strong>em</strong> o papel e a relevância social <strong>da</strong> Justiça Militar de Minas Gerais, que<br />
com<strong>em</strong>ora 70 anos de bons serviços prestados à coletivi<strong>da</strong>de mineira. Creio que a melhor homenag<strong>em</strong><br />
que posso prestar a este Tribunal de Justiça Militar e a todos aqueles que aqui trabalham é revelar a<br />
Minas que grande parte do mérito pelo elevado conceito que a Polícia Militar mineira conquistou <strong>em</strong><br />
todo o Brasil se deve à eficiência deste Tribunal. Setenta anos de história, de aplicação <strong>da</strong>s leis e de<br />
rigoroso cumprimento do dever, faz<strong>em</strong> <strong>da</strong> Justiça Militar um ex<strong>em</strong>plo e um modelo.” (Aécio Neves, 2007)<br />
Desde os t<strong>em</strong>pos do Império Romano<br />
(século XIII), já era reconheci<strong>da</strong> a<br />
necessi<strong>da</strong>de de uma jurisdição especial<br />
para os militares <strong>em</strong> ativi<strong>da</strong>de,<br />
existindo a intitula<strong>da</strong> Justiça Militar<br />
Romana, que tinha como objetivo primordial<br />
a tutela jurídica dos preceitos<br />
relativos à manutenção <strong>da</strong> hierarquia<br />
e disciplina, sustentáculos fun<strong>da</strong>mentais<br />
na vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s instituições militares.<br />
No Brasil, copiando um modelo adotado<br />
<strong>em</strong> Portugal, os crimes militares<br />
foram reconhecidos, processados e<br />
julgados, através de uma Justiça Militar<br />
especializa<strong>da</strong>, a partir do ano de<br />
1808, quando D. João VI baixou um<br />
Alvará, determinando a formação de<br />
um Conselho de Guerra.<br />
Fun<strong>da</strong>mentalmente, antes de 1808,<br />
o Judiciário brasileiro compunha-se<br />
de Tribunais de Relação sediados na<br />
Bahia, no Rio de Janeiro, <strong>em</strong> Pernambuco<br />
e no Maranhão. Somente <strong>em</strong><br />
maio <strong>da</strong>quele ano, com a elevação <strong>da</strong><br />
40 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
Relação do Rio de Janeiro à condição<br />
de Casa <strong>da</strong> Suplicação, os recursos<br />
não mais seguiriam para Portugal.<br />
A última instância, cuja sede era <strong>em</strong><br />
Lisboa, passaria a funcionar no Brasil.<br />
Com a criação <strong>da</strong>s instituições<br />
militares <strong>em</strong> vários níveis do poder<br />
público nacional, tornou-se necessária<br />
a existência de um ordenamento<br />
jurídico especial, diferente <strong>da</strong>quele do<br />
ci<strong>da</strong>dão comum, que deu orig<strong>em</strong>, nos<br />
dias atuais, ao Código Penal Militar e<br />
ao Código de Processo Penal Militar,<br />
b<strong>em</strong> como a leis, regulamentos e<br />
estatutos próprios, alicerçados <strong>em</strong><br />
conformi<strong>da</strong>de com o que prescreve a<br />
Constituição Federal.<br />
Até 1934, nenhuma <strong>da</strong>s constituições<br />
brasileiras fazia referência à Justiça<br />
Militar dos Estados. A Carta de 34,<br />
<strong>em</strong>bora não dispusesse expressamente<br />
sobre a Justiça Militar, conferiu<br />
à União, com base <strong>em</strong> seu artigo 84,<br />
a competência privativa para legislar<br />
defesa social<br />
sobre a organização, instrução, justiça<br />
e garantias <strong>da</strong>s forças policiais dos<br />
Estados, b<strong>em</strong> como as condições<br />
gerais de sua utilização <strong>em</strong> caso de<br />
mobilização ou de guerra.<br />
Em vista de tal dispositivo constitucional,<br />
a Lei Federal nº 192, de 17 de janeiro<br />
de 1936, autorizou a organização<br />
<strong>da</strong> Justiça Militar nos Estados. Em decorrência<br />
dessa lei, foi cria<strong>da</strong> a Justiça<br />
Militar do Estado de Minas Gerais, no<br />
dia 9 de nov<strong>em</strong>bro de 1937, através <strong>da</strong><br />
Lei nº 226, completando, assim, a Justiça<br />
Castrense, 70 anos de existência.<br />
Sua estrutura inicial contava apenas com<br />
um juiz auditor e os conselhos especiais<br />
ou permanentes. Esses conselhos funcionavam<br />
como a primeira instância. A<br />
segun<strong>da</strong> instância ain<strong>da</strong> não havia sido<br />
cria<strong>da</strong>. Os recursos eram julgados pela<br />
Câmara Criminal <strong>da</strong> Corte de Apelação,<br />
órgão que equivaleria hoje ao Tribunal<br />
de Justiça do Estado.
defesa social<br />
A primeira modificação substancial<br />
aconteceu <strong>em</strong> 1946, quando a Constituição<br />
Federal posicionou a Justiça<br />
Militar como um órgão do Poder<br />
Judiciário dos Estados, orientação<br />
esta segui<strong>da</strong> pelas constituições<br />
posteriores que previu a criação de<br />
órgãos de segun<strong>da</strong> instância, que hoje<br />
são os Tribunais de Justiça Militar.<br />
Em 1946, através do Decreto-Lei nº<br />
1.630, a Justiça Militar mineira foi<br />
reestrutura<strong>da</strong>, tendo sido criado o<br />
então chamado Tribunal Superior de<br />
Justiça Militar, com sede <strong>em</strong> Belo Horizonte,<br />
como órgão de segundo grau<br />
de jurisdição. Era composto por três<br />
juízes, sendo um civil e dois militares,<br />
todos nomeados pelo governador do<br />
Estado. Mesmo permanecendo uma<br />
só auditoria, o número de conselhos<br />
de justiça passou para três: o especial,<br />
o permanente e o de corpo.<br />
Oito anos se passaram até que a Lei<br />
nº 1.098/1954 trouxesse <strong>em</strong> seu texto<br />
uma nova mu<strong>da</strong>nça: o número de<br />
juízes passaria para cinco, sendo três<br />
militares e dois civis. Esse número foi<br />
mantido até que, <strong>em</strong> 1975, a Resolução<br />
nº 61 do Tribunal de Justiça de<br />
Minas Gerais aumentou o número de<br />
auditorias que passaria a ser três.<br />
Manti<strong>da</strong> <strong>em</strong> to<strong>da</strong>s as constituições,<br />
desde 1934, a Justiça Militar consolidou<br />
no Estado D<strong>em</strong>ocrático de Direito<br />
a sua competência especializa<strong>da</strong>,<br />
através <strong>da</strong> efetiva prestação<br />
jurisdicional, com celeri<strong>da</strong>de e independência.<br />
Protege os bens jurídicos<br />
tutelados pela lei penal militar, zelando<br />
pelos direitos e garantias fun<strong>da</strong>mentais<br />
dos militares estaduais.<br />
A Constituição ci<strong>da</strong>dã de 1988<br />
consagrou de forma definitiva a<br />
Justiça Militar estadual como parte<br />
constitutiva do Poder Judiciário e<br />
passou a dispor sobre a competência<br />
e a criação dos Tribunais de Justiça<br />
Militar nos Estados.<br />
Com a Emen<strong>da</strong> Constitucional nº 45,<br />
ocorreu a ampliação <strong>da</strong> competência<br />
<strong>da</strong> Justiça Militar, que passou a<br />
processar e julgar os crimes militares<br />
previstos no Código Penal Militar,<br />
além <strong>da</strong>s ações judiciais contra atos<br />
disciplinares, antes direciona<strong>da</strong>s para<br />
a Vara <strong>da</strong> Fazen<strong>da</strong> Pública e Autarquias<br />
<strong>da</strong> Justiça comum. Deu nomenclatura<br />
adequa<strong>da</strong> ao antigo cargo de juiz<br />
auditor que passou a se chamar juiz<br />
de direito do juízo militar.<br />
Com essa <strong>em</strong>en<strong>da</strong>, o Pleno do Tribunal<br />
de Justiça Militar de Minas Gerais inovou,<br />
através <strong>da</strong> Resolução nº 54/2006,<br />
ao decidir criar as Câmaras Cível e<br />
Criminal, trazendo mais celeri<strong>da</strong>de e<br />
especialização no julgamento dos processos.<br />
Esta decisão possibilitou aos<br />
julgadores a oportuni<strong>da</strong>de de realizar<br />
julgamentos mais coerentes e aprofun<strong>da</strong>dos.<br />
Foi manti<strong>da</strong> a competência exclusiva<br />
do Pleno para conhecer e julgar<br />
os feitos de competência originária,<br />
b<strong>em</strong> como os recursos contra as decisões<br />
<strong>da</strong>s Câmaras, como é o caso, por<br />
ex<strong>em</strong>plo, dos <strong>em</strong>bargos infringentes.<br />
Em 28 de dez<strong>em</strong>bro de 2005, a<br />
Lei Compl<strong>em</strong>entar nº 85 alterou a<br />
composição do Tribunal para sete<br />
juízes, sendo três oficiais <strong>da</strong> ativa<br />
do mais alto posto <strong>da</strong> Polícia Militar,<br />
um do mais alto posto do Corpo de<br />
Bombeiros Militar, um do Ministério<br />
Público, um <strong>da</strong> OAB e o último sendo<br />
promovido dentre os juízes de direito<br />
do juízo militar <strong>da</strong> primeira instância.<br />
No tocante às auditorias, também houve<br />
ampliação. As três auditorias sedia<strong>da</strong>s na<br />
Capital contam hoje com três juízes de direito<br />
titulares e três juízes substitutos concursados.<br />
A Lei nº 16.646, de 5 de janeiro<br />
de 2007, criou novos cargos para fazer<br />
face ao crescente número de processos<br />
encaminhados à Justiça Castrense, um<br />
reflexo <strong>da</strong> Emen<strong>da</strong> Constitucional nº 45.<br />
A Justiça Militar mineira t<strong>em</strong> a sua<br />
organização ampara<strong>da</strong> hoje pela Lei<br />
de Organização e Divisão Judiciárias,<br />
de iniciativa e competência exclusiva<br />
do Tribunal de Justiça do Estado de<br />
Minas Gerais, que a classificou como<br />
Justiça Especial. Está prevista no artigo<br />
125, § 3º, <strong>da</strong> Constituição Federal de<br />
1988, sendo importante segmento do<br />
Poder Judiciário do Estado de Minas<br />
Gerais, tendo como jurisdicionados os<br />
68 mil militares estaduais <strong>da</strong> ativa, <strong>da</strong><br />
reserva e os reformados.<br />
Em sua busca incessante pela modernização,<br />
a Justiça Militar do Estado de<br />
Minas Gerais conquistou recent<strong>em</strong>ente<br />
o seu sonho de uma nova sede, que<br />
reunirá a primeira e a segun<strong>da</strong> instância<br />
<strong>em</strong> um mesmo complexo, na Aveni<strong>da</strong><br />
Prudente de Morais, nº 1671, bairro<br />
Santo Antônio, nessa Capital. Com<br />
a nova edificação, a Justiça Militar mineira<br />
terá mais espaço, poderá concentrar<br />
to<strong>da</strong> a sua prestação jurisdicional,<br />
acompanhará as mu<strong>da</strong>nças no cenário<br />
jurídico nacional com o mesmo compromisso<br />
de seus antepassados de atender<br />
aos anseios <strong>da</strong> população mineira, s<strong>em</strong>pre<br />
merecedora de serviços de excelência,<br />
na luta por um ideal de justiça.<br />
Juiz Cel PM Rúbio Paulino Coelho - Presidente do Tribunal de Justiça Militar de MG, biênio<br />
2008/09. É bacharel <strong>em</strong> Direito pela PUC-MG, e formado <strong>em</strong> Educação Física pelo Exército Brasileiro.<br />
Mestre <strong>em</strong> Segurança Pública. Participou do Curso Internacional de Alta Especialização para<br />
Forças de Polícia, <strong>em</strong> Roma, e do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia <strong>da</strong> Escola Superior<br />
de Guerra, no RJ. Foi Chefe do Gabinete Militar e Coordenador Estadual de Defesa Civil de MG.<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
41
Notas sobre organizações<br />
e servidores policiais<br />
Jésus Trin<strong>da</strong>de Barreto Júnior<br />
O foco deste ensaio se projeta na<br />
questão dos recursos humanos <strong>da</strong>s<br />
organizações policiais, buscando<br />
transitar mais propriamente pelo eixo<br />
dos dil<strong>em</strong>as, para finalmente cogitar<br />
de algumas pistas sobre perspectivas<br />
de um novo paradigma, o que, vou<br />
defender, está associado ao desenho<br />
<strong>da</strong>s estruturas organizacionais <strong>da</strong>s<br />
polícias. Não pretendo sugerir modelos,<br />
mas sim lançar referenciais que<br />
suponho úteis para a construção do<br />
novo, para a superação de entraves<br />
clássicos ao labor policial. Recorro<br />
primeiramente a uma afirmação que<br />
fiz noutro lugar e que, agora, recupero<br />
como pr<strong>em</strong>issa <strong>da</strong> presente argumentação.<br />
Eu dizia que a tarefa deste<br />
instante político é a de promover os<br />
profissionais de polícia enquanto pessoas<br />
que se dedicam ao incr<strong>em</strong>ento<br />
dos padrões <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia brasileira,<br />
CIAD (Centro Integrado de<br />
Atendimento e Despacho).<br />
42 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
tal como ela v<strong>em</strong> sendo construí<strong>da</strong><br />
dentro do processo d<strong>em</strong>ocrático.<br />
Concluí que isto seria uma resposta<br />
aos ardentes apelos <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de <strong>em</strong><br />
geral e de amplos setores responsáveis<br />
<strong>da</strong> própria comuni<strong>da</strong>de policial<br />
brasileira. E terminei <strong>em</strong>en<strong>da</strong>ndo que<br />
tudo se resumiria, pois, num convite à<br />
mu<strong>da</strong>nça do sist<strong>em</strong>a ou, digamos, um<br />
ataque à sua fragmentação.<br />
Isto porque uma <strong>da</strong>s questões que<br />
se destacam na prática e que acaba<br />
percebi<strong>da</strong> no imaginário popular -<br />
como, também, do profissional de<br />
polícia - é a baixa densi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s<br />
enunciações técnico-científicas do<br />
fazer policial e a pouca visibili<strong>da</strong>de<br />
pública de seu compromisso ético<br />
como gestor de ações pela solução<br />
pacífica dos conflitos. Estas deficiências,<br />
<strong>em</strong> termos gerais, se revelam<br />
defesa social<br />
pelo anacronismo dos paradigmas<br />
doutrinários e operativos <strong>da</strong>s polícias;<br />
vale dizer, pela assimetria de valores e<br />
procedimentos que ca<strong>da</strong> qual pratica,<br />
oficial e oficiosamente. Partindo-se<br />
<strong>da</strong>í, surge o imperativo político <strong>da</strong> requalificação<br />
<strong>da</strong>s estruturas orgânicas<br />
e procedimentais <strong>da</strong>s instituições<br />
policiais e seus servidores, de modo<br />
a que se possa pensar, como política<br />
pública, num sist<strong>em</strong>a homogêneo, do<br />
ponto de vista <strong>da</strong> eficiência e eficácia<br />
do conjunto profissionais-instituições.<br />
Infere-se, então, que a consoli<strong>da</strong>ção<br />
do conhecimento policial (doutrina e<br />
prática) seja o fun<strong>da</strong>mento de uma<br />
integração estrutural entre os órgãos<br />
policiais e o ponto de parti<strong>da</strong> para<br />
a definitiva imersão do aparelho de<br />
polícia no projeto de aperfeiçoamento<br />
d<strong>em</strong>ocrático, naquilo que se refere a<br />
novos padrões de enfrentamento <strong>da</strong><br />
violência e criminali<strong>da</strong>de.<br />
Assim considerado, o anacronismo e<br />
a assimetria <strong>em</strong> destaque se revelam<br />
por distorções históricas que poderiam<br />
ser assim enfeixa<strong>da</strong>s: 1. inexistência<br />
de uma definição paradigmática do<br />
ciclo completo <strong>da</strong> ação policial (polícia<br />
ostensiva e polícia de investigações),<br />
cont<strong>em</strong>plando-se aí o papel de outros<br />
atores públicos e privados; e, como<br />
conseqüência, 2. a inexistência de<br />
protocolos de interação sistêmica<br />
entre as polícias, nas complexas fases<br />
do ciclo <strong>em</strong> questão.<br />
Daí, o pensar <strong>em</strong> formação de recursos<br />
humanos nas organizações policiais,<br />
isto é, numa estratégia para a construção<br />
e atualização permanente <strong>da</strong>
defesa social<br />
cultura policial esbarra, de plano, na<br />
ausência do cogitado projeto integralizador,<br />
na ausência de uma política<br />
sist<strong>em</strong>ática para a ação policial no<br />
País. Com efeito, ain<strong>da</strong> que a Constituição<br />
Federal de 1988 tenha sido<br />
explícita com o inovador capítulo sobre<br />
a segurança pública, dentro do título<br />
<strong>da</strong> defesa do Estado e <strong>da</strong>s instituições<br />
d<strong>em</strong>ocráticas, tudo ficou na dependência<br />
<strong>da</strong> regulamentação que ela<br />
mesma previu no parágrafo 7º do artigo<br />
144. Em outras palavras, a nação<br />
ficou priva<strong>da</strong> <strong>da</strong> norma jurídica infraconstitucional<br />
que definiria o caráter<br />
sistêmico <strong>da</strong> ação policial, integrando<br />
formal e pontualmente os papéis que<br />
ela genericamente distribuiu às polícias<br />
estaduais e às federais, vale dizer,<br />
àquelas que têm a missão do trabalho<br />
ostensivo e as que têm a missão do<br />
trabalho investigativo. Seria de se esperar<br />
que tal norma erigisse conceitos<br />
alinhados sobre os dois grandes ramos<br />
do fazer policial, vale repetir, o ostensivo<br />
e o de investigação, definindo aí,<br />
<strong>em</strong> termos metodológicos de índole<br />
técnica e científica, o denominado ciclo<br />
completo <strong>da</strong> ação policial.<br />
Evito delibera<strong>da</strong>mente explorar o<br />
t<strong>em</strong>a <strong>da</strong> unificação, entendendo<br />
que os objetivos <strong>da</strong> concepção que<br />
ora defendo pod<strong>em</strong> se concretizar<br />
independent<strong>em</strong>ente dela, <strong>em</strong>bora se<br />
deva admitir, com ótimas razões, que<br />
esta é uma hipótese admissível num<br />
processo sério de discussões.<br />
Esta visão exige que vincul<strong>em</strong>os o<br />
hom<strong>em</strong> (o operador) e a organização<br />
(a máquina produtiva), na busca<br />
de sentido para a inserção <strong>da</strong>quele<br />
nos domínios desta. Exige, pois, que<br />
coloqu<strong>em</strong>os frente à frente estas<br />
duas quali<strong>da</strong>des, concebendo-as <strong>em</strong><br />
conjunção. Vale perguntar: será que a<br />
mera reconstrução e incr<strong>em</strong>ento dos<br />
currículos <strong>da</strong>s escolas de polícia, por<br />
si só, pode pretender-se medi<strong>da</strong> suficiente<br />
para o fortalecimento de uma<br />
cultura policial d<strong>em</strong>ocrática? Será que<br />
esta tarefa depende exclusivamente<br />
<strong>da</strong> transformação do hom<strong>em</strong>? De<br />
outro modo, buscando respostas,<br />
construo duas in<strong>da</strong>gações, ca<strong>da</strong> qual<br />
desdobra<strong>da</strong> assim:<br />
1- Qu<strong>em</strong> é o ci<strong>da</strong>dão, hom<strong>em</strong> ou<br />
mulher, que se apresenta ao recrutamento<br />
<strong>da</strong>s organizações policiais?<br />
1.1- O que constitui o imaginário deste<br />
sujeito no ato de ingressar nestas<br />
organizações?<br />
1.2- Que expectativas ideológicas ele<br />
t<strong>em</strong> a respeito do seu papel como<br />
autori<strong>da</strong>de pública?<br />
1.3- Quais são as aptidões e conhecimentos<br />
prévios que traz consigo?<br />
E como associar tal bagag<strong>em</strong> de<br />
forma aplica<strong>da</strong> às quali<strong>da</strong>des <strong>da</strong> ação<br />
policial?<br />
1.4- Quais são os valores (plano <strong>da</strong><br />
ética) que deve assimilar enquanto<br />
sujeito que livr<strong>em</strong>ente decide se investir<br />
no poder de execução <strong>da</strong> força<br />
legítima, manifesta<strong>da</strong>, in extr<strong>em</strong>is, pela<br />
capaci<strong>da</strong>de letal?<br />
1.5- Quais os conhecimentos (plano <strong>da</strong><br />
técnica) que deve incorporar à respectiva<br />
formação, integrando o seu patrimônio<br />
ético e técnico ao patrimônio<br />
deontológico e técnico-operativo <strong>da</strong><br />
organização onde aporta?<br />
2- Que horizontes as organizações policiais<br />
descortinam para este sujeito,<br />
conferindo-lhe com clareza o respectivo<br />
papel, primeiro, enquanto agente<br />
de um man<strong>da</strong>do público de alta exigência<br />
ética e sociológica; segundo,<br />
enquanto executor de uma técnica<br />
rigorosamente adstrita a protocolos e<br />
rotinas científicas?<br />
2.1- Que modelo estrutural do<br />
aparato de polícia lhe é apresentado<br />
como visão de microcosmo, enfim,<br />
como canal de potencialização deste<br />
man<strong>da</strong>to?<br />
2.2- Que evidências há <strong>da</strong> consistência<br />
e coerência técnica dentro de ca<strong>da</strong><br />
ramo, o ostensivo e o investigativo?<br />
2.3- Que evidências exist<strong>em</strong> de que<br />
o ciclo completo <strong>da</strong> ação policial é<br />
praticado sob padrões culturais e operacionais<br />
solidários; ou seja, a prática<br />
articula<strong>da</strong> entre ação ostensiva e ação<br />
investigativa é um fato que anima a<br />
perfeição do mesmo man<strong>da</strong>to?<br />
Tais questões, que afinal não apresentam<br />
quaisquer novi<strong>da</strong>des <strong>em</strong><br />
si mesmas, são prejudica<strong>da</strong>s pela<br />
fragmentação estrutural do aparelho<br />
de polícia.<br />
O que se aponta como sinal disto é a<br />
ausência de uma teoria geral <strong>da</strong> ação<br />
<strong>da</strong> polícia brasileira, teoria sobre a qual<br />
estariam monta<strong>da</strong>s as bases tanto do<br />
universo ético quanto do universo<br />
técnico dos serviços policiais. Neste<br />
sentido, a construção de marcos seria<br />
condição fun<strong>da</strong>mental para o êxito de<br />
qualquer pretensão inovadora. Esta<br />
tarefa, contudo, depende de respostas<br />
a probl<strong>em</strong>as tópicos complexos como,<br />
por ex<strong>em</strong>plo, entre muitos outros:<br />
Qual é a exata d<strong>em</strong>arcação entre as<br />
ações <strong>da</strong> polícia ostensiva e as <strong>da</strong><br />
polícia de investigação, isto é, os dois<br />
grandes ramos do trabalho policial?<br />
Quais são as “áreas de produção” de<br />
ca<strong>da</strong> qual?<br />
Qual é a lógica <strong>da</strong> necessária interseção<br />
entre os ramos e as áreas, tanto<br />
no âmbito interno de ca<strong>da</strong> uma destas,<br />
quanto entre aqueles, <strong>em</strong> si mesmos?<br />
Qual é o modelo orgânico que melhor<br />
capacita o des<strong>em</strong>penho de ca<strong>da</strong> ramo<br />
e áreas?<br />
Quais são, tecnicamente, os procedimentos<br />
operativos de ca<strong>da</strong> uma <strong>da</strong>s<br />
polícias?<br />
Qual é o grau de imbricação técnica<br />
entre os respectivos procedimentos<br />
operativos?<br />
Qual é a concepção de hierarquia que<br />
lhes fun<strong>da</strong> o controle disciplinar?<br />
Qual é a racionali<strong>da</strong>de que norteia<br />
a composição de carreiras, cargos,<br />
postos e patentes policiais dentro de<br />
ca<strong>da</strong> ramo?<br />
Qual é a visão administrativa de controle<br />
interno?<br />
Qual é o valor ético fun<strong>da</strong>mental que<br />
instrui as ações policiais?<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
43
Quais são as correspondências entre os<br />
respectivos estamentos hierárquicos e<br />
o sincronismo entre os papéis de ca<strong>da</strong><br />
qual?<br />
Qual é o compromisso de mútuo progresso<br />
que incorporam às respectivas<br />
práticas enquanto agentes de defesa<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia?<br />
Qual o nível de soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de que ca<strong>da</strong><br />
qual assume frente ao outro?<br />
Qual a forma <strong>da</strong> participação comunitária<br />
junto ao aparelho de polícia no<br />
processo de construção <strong>da</strong> segurança<br />
pública?<br />
Quais os parâmetros de funcionamento<br />
frente aos outros atores públicos que<br />
atuam no sist<strong>em</strong>a de justiça criminal?<br />
A ausência de respostas institucionais<br />
para estas e outras questões adjacentes,<br />
apontam para a fragili<strong>da</strong>de<br />
dos princípios e práticas, para a ausência<br />
de sist<strong>em</strong>atização, para o assincronismo<br />
de procedimentos, enfim,<br />
indicam o vácuo de uma grande política<br />
pública que, no plano interno<br />
do aparato policial, privilegiasse o<br />
intercâmbio de saberes/práticas oficializa<strong>da</strong>s<br />
e homologa<strong>da</strong>s por instâncias<br />
formais que se fund<strong>em</strong> no ethos<br />
d<strong>em</strong>ocrático e na práxis científica.<br />
Uma modelag<strong>em</strong> que conseguisse<br />
homogenei<strong>da</strong>de entre as cúpulas e as<br />
bases, superando conflitos na caracterização<br />
de poderes internos. Enfim, um<br />
organismo interinstitucional capaz de<br />
reconstruir a identi<strong>da</strong>de e o papel <strong>da</strong><br />
tarefa policial, perdi<strong>da</strong> no t<strong>em</strong>po e <strong>em</strong><br />
nossas melhores intenções.<br />
Entendo que este vazio não se explica<br />
apenas pelos regimes autoritários <strong>da</strong><br />
nossa história, mas também por outros<br />
cenários políticos e to<strong>da</strong> uma tradição<br />
<strong>da</strong> cultura brasileira, onde se constata<br />
a negligência, para se dizer o mínimo,<br />
<strong>da</strong>s elites na construção de políticas<br />
sistêmicas para o setor. Não me refiro<br />
aqui somente às elites <strong>em</strong> posição de<br />
governo, mas também às de oposição e<br />
o encolhimento dos movimentos sociais<br />
com força para deflagrar processos<br />
44 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
de transformação no instrumental de<br />
estado, situação que v<strong>em</strong> se revertendo<br />
a partir dos anos 2000.<br />
Assim, o aparelho de polícia s<strong>em</strong>pre<br />
foi mantido como ativi<strong>da</strong>de menor,<br />
puramente edificado numa visão beligerante,<br />
criado para funcionar como<br />
mero aparato de resistência física,<br />
note-se b<strong>em</strong>, resistência física ao<br />
crime. Ain<strong>da</strong> que o mundo cont<strong>em</strong>porâneo<br />
tenha ativado o processo de<br />
profissionalização <strong>da</strong>s instituições policiais,<br />
a improvisação e práticas <strong>em</strong>píricas<br />
e, sobretudo a subserviência à<br />
política menor ain<strong>da</strong> é fator de amadorismo<br />
e permeabili<strong>da</strong>de a práticas<br />
ilegais ou ineficazes. No caso brasileiro,<br />
há o fenômeno do sério antagonismo<br />
entre uma concepção de inspiração<br />
militarista e outra de inspiração<br />
juridicista. Não aponto qualquer desvalor,<br />
<strong>em</strong> si mesmo, aos conceitos de<br />
um e outro, mas sim ao confronto,<br />
digamos, passional, que se verifica<br />
entre eles. Ao desacordo entre essas<br />
culturas. E no boicote espontâneo que<br />
esta oposição provoca contra a busca<br />
de uma cosmovisão própria do aparelho<br />
policial como um todo. Por isto,<br />
a larga tradição de dependência dos<br />
serviços policiais é página típica de<br />
uma mentali<strong>da</strong>de social, e particularmente<br />
governamental, restritiva <strong>da</strong><br />
<strong>em</strong>ancipação dos respectivos órgãos<br />
e seus servidores. Resulta <strong>da</strong>í, descontados<br />
alguns bons programas governamentais,<br />
o incr<strong>em</strong>ento <strong>da</strong> pesquisa<br />
científica sobre o campo policial e a<br />
militância de certos movimentos sociais,<br />
uma polícia ain<strong>da</strong> sujeita a certo<br />
aprisionamento institucional, desampara<strong>da</strong><br />
de um arcabouço normativo<br />
que lhe coloque <strong>em</strong> situação de promotora<br />
de liber<strong>da</strong>des públicas e protagonista<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia. É provavelmente<br />
por conta deste desamparo<br />
que as subculturas do universo policial<br />
se mantém, ganham força e ca<strong>em</strong><br />
na subjetivi<strong>da</strong>de casuística: muitos<br />
agentes - e subsist<strong>em</strong>as inteiros, às<br />
vezes - se val<strong>em</strong> desta situação para<br />
defesa social<br />
a tutela de interesses personalistas<br />
(campo <strong>da</strong> projeção pessoal e “privatização”<br />
dos serviços) e até criminosos<br />
(campo <strong>da</strong> corrupção e violência).<br />
Isto condicionou a existência<br />
de “grupos” internos, ver<strong>da</strong>deiras instâncias<br />
informais de poder, que se revezam<br />
no controle deste ou <strong>da</strong>quele<br />
espaço <strong>da</strong> organização – e, por extensão,<br />
do espaço público - sufocando<br />
o sentido técnico-profissional<br />
<strong>da</strong> missão policial.<br />
Polícia dependente é, portanto, o<br />
contrário de polícia prepara<strong>da</strong> para o<br />
des<strong>em</strong>penho deste complexo man<strong>da</strong>to<br />
público, que é o de dispor, legitimamente,<br />
<strong>da</strong> violência legal, a violência<br />
racionalmente concebi<strong>da</strong> como necessária<br />
para a manutenção dos padrões<br />
civilizados de convivência. Perceba-se<br />
aqui a quali<strong>da</strong>de dos paradigmas.<br />
De um lado, um paradigma restritivo<br />
<strong>da</strong>s potenciali<strong>da</strong>des dos ci<strong>da</strong>dãos<br />
que executam as funções policiais;<br />
de outro, um paradigma <strong>da</strong> profissionalização<br />
dos homens, que prioriza<br />
os investimentos numa mentali<strong>da</strong>de<br />
institucional basea<strong>da</strong> no método<br />
científico e nos valores próprios do<br />
estado d<strong>em</strong>ocrático de direito.<br />
É nesta linha, o do baixo investimento<br />
na edificação, manutenção e difusão<br />
de uma cultura ética e técnica própria<br />
do conjunto dos órgãos policiais, que<br />
nos acostumamos aos discursos <strong>em</strong><br />
que, in<strong>da</strong>gados sobre o como atuar<br />
pelo aperfeiçoamento <strong>da</strong> ação policial,<br />
governantes pouco escapam do lugar<br />
comum: comprar armas, automóveis,<br />
coletes e aumentar efetivos. Na<strong>da</strong><br />
mal que se pense no equipamento<br />
material dos órgãos policiais, mas<br />
ocorre que não se t<strong>em</strong> a dimensão do<br />
investimento no equipamento doutrinário,<br />
procedimental dos agentes e<br />
<strong>da</strong>s instituições policiais, se assim se<br />
puder dizer. Com efeito, o uso racional<br />
do equipamento material depende<br />
dos valores <strong>da</strong>s organizações que os<br />
mantém, vale dizer, depende de uma
defesa social<br />
CIAD (Centro Integrado de<br />
Atendimento e Despacho).<br />
clara sintonia com o plano normativo<br />
interno, onde se tenha o substrato<br />
técnico-científico <strong>da</strong>s múltiplas variáveis<br />
do ciclo completo <strong>da</strong> ação policial<br />
e, claro, abertura para o diálogo com a<br />
socie<strong>da</strong>de. Isto nos leva a concluir que<br />
antes de ser uma tarefa de números,<br />
vale dizer, grandes efetivos, grande<br />
potencial de armamentos, grande <strong>em</strong>prego<br />
de tecnologias, o fazer policial<br />
é uma tarefa de ordenação metodológica,<br />
ou seja, de compreensão profun<strong>da</strong><br />
do fenômeno <strong>da</strong> criminali<strong>da</strong>de,<br />
de técnicas de relacionamento entre<br />
os órgãos policiais, de parâmetros de<br />
relacionamento entre os órgãos policiais<br />
e outros órgãos governamentais<br />
e, de todos estes, com os atores <strong>da</strong><br />
socie<strong>da</strong>de civil organiza<strong>da</strong>. Em outras<br />
palavras: fazer polícia depende <strong>da</strong><br />
alta profissionalização do servidor e<br />
<strong>da</strong> sua inserção dentro de um sist<strong>em</strong>a<br />
rigi<strong>da</strong>mente regulado por valores<br />
éticos e técnicos.<br />
Estes valores éticos diz<strong>em</strong> respeito<br />
ao compromisso profissional dos<br />
policiais com a ord<strong>em</strong> d<strong>em</strong>ocrática,<br />
com os valores de proteção à pessoa<br />
humana e com a completa abstenção<br />
do uso de métodos ilegais <strong>em</strong> suas<br />
missões. Diz<strong>em</strong> respeito ao pano de<br />
fundo <strong>da</strong> ação policial, à constituição<br />
moral dos agentes de polícia, sejam<br />
de que graus hierárquicos for<strong>em</strong>.<br />
Implicam, pois, estes valores, na<br />
lineari<strong>da</strong>de <strong>da</strong> conduta policial, na<br />
efetiva consciência que ca<strong>da</strong> hom<strong>em</strong><br />
e mulher, <strong>em</strong>pregados nas diversas<br />
carreiras policiais, têm de seu papel<br />
como servidores públicos de elite, ou<br />
seja, de seu papel pe<strong>da</strong>gógico na li<strong>da</strong><br />
cotidiana com o conflito.<br />
Por outro lado, os valores técnicos<br />
integram, <strong>em</strong> tese, todo o plano<br />
normativo operacional dos órgãos,<br />
dizendo respeito à execução <strong>em</strong><br />
espécie <strong>da</strong>s rotinas de trabalho,<br />
do uso normalizado dos inúmeros<br />
procedimentos possíveis no campo <strong>da</strong><br />
prevenção e <strong>da</strong> repressão ao delito.<br />
Conquanto tenhamos um consagrado<br />
arcabouço de leis penais, substantivas<br />
e adjetivas, a ver<strong>da</strong>de é que, no nível<br />
estritamente policial, os respectivos<br />
protocolos de execução <strong>da</strong>s funções<br />
finalísticas, sejam as de polícia ostensiva,<br />
sejam as de polícia investigativa<br />
(judiciária), acontec<strong>em</strong> s<strong>em</strong> uma<br />
teoria geral de <strong>em</strong>prego, capaz de<br />
aglutinar todos os passos do sist<strong>em</strong>a<br />
policial, integrando, imbricando os<br />
ramos ostensivo e investigativo, nos<br />
seus complexos itinerários.<br />
É neste sentido, <strong>da</strong> ausência de uma<br />
teoria geral <strong>da</strong> ação policial, assumi<strong>da</strong><br />
como valor uniformizante e, pois, como<br />
projeto político de uma nação que<br />
precisa de serviços policiais praticados<br />
no binômio energia-promoção dos<br />
direitos humanos, que agora se<br />
descortina o cenário de reforma <strong>da</strong>s<br />
respectivas instituições. E é neste<br />
cenário que se pode buscar respostas<br />
para aquelas in<strong>da</strong>gações que formulei<br />
atrás, sobre o sentido <strong>da</strong> relação<br />
hom<strong>em</strong>/instituições policiais.<br />
Assim, se o nosso t<strong>em</strong>a é a formação<br />
de recursos humanos e se a nossa impressão<br />
é a de que esta formação precisa<br />
se compatibilizar com um modelo<br />
efetivamente produtivo e integrador, que<br />
represente com clareza as concepções<br />
de uma teoria geral <strong>da</strong> ação policial,<br />
a idéia é reconceituar antigas funções<br />
de ambos os segmentos - ostensivo e<br />
investigativo - realinhando-os de modo<br />
a alcançar<strong>em</strong> coerência e capaci<strong>da</strong>de<br />
de difusão de princípios e métodos,<br />
vale repetir, conceber e manter a ética<br />
e técnica policial de modo uniforme.<br />
Aqui, é oportuno refutar-se uma visão<br />
muito enraiza<strong>da</strong>, que apresenta os dois<br />
ramos sob um alinhamento meramente<br />
positivo, que os articula <strong>em</strong> dois t<strong>em</strong>pos<br />
distintos e subseqüentes, que se mov<strong>em</strong><br />
por lógicas próprias, pouco dizendo<br />
uma à outra. Na ver<strong>da</strong>de, entendo<br />
que os ramos se articulam por uma<br />
dialética <strong>da</strong> compl<strong>em</strong>entari<strong>da</strong>de, onde<br />
se pode trabalhar organicamente com<br />
os fluxos e refluxos <strong>da</strong>s ações ostensiva<br />
e investigativa. Isto se justifica mais<br />
ain<strong>da</strong> quando se pensa no campo <strong>da</strong><br />
doutrina e, especialmente, no campo<br />
<strong>da</strong> constituição de informações policiais<br />
e de segurança pública, facilitando, na<br />
reta final, o monitoramento <strong>da</strong>s ações<br />
de ponta.<br />
A meu juízo, as bases principiológicas<br />
do processo de integração praticado <strong>em</strong><br />
Minas Gerais a partir de 2003 têm esta<br />
dimensão e, portanto, constitu<strong>em</strong> uma<br />
promessa de <strong>em</strong>ancipação <strong>da</strong>s pessoas<br />
e instituições policiais mineiras.<br />
Jésus Trin<strong>da</strong>de Barreto Júnior - Delegado Geral de Polícia Civil de Minas Gerais; Mestrando <strong>em</strong><br />
Educação na UFMG.<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
45
Segurança Ci<strong>da</strong>dã: qual controle?<br />
Ellen Márcia L. S. de Carvalho<br />
As instituições policiais são capazes de exercer controles formais e informais, e à<br />
proporção que se fortalece o vínculo que se estabelece entre a polícia e a comuni<strong>da</strong>de,<br />
maior será a possibili<strong>da</strong>de de se construir uma segurança ci<strong>da</strong>dã. A Mediação de<br />
Conflitos e os recursos metodológicos de que se serve auxiliarão a polícia e a comuni<strong>da</strong>de<br />
no convívio com os contextos de desavenças, discórdias, controvérsias e violência. Tratase<br />
de uma forma eficaz que viabiliza o acesso a soluções rápi<strong>da</strong>s e criativas, sendo,<br />
portanto, um el<strong>em</strong>ento essencial para a concretização do Estado D<strong>em</strong>ocrático de Direito.<br />
Palavras-chaves: Segurança Ci<strong>da</strong>dã - Controle Social - Polícia Comunitária - Mediação de Conflitos<br />
Exist<strong>em</strong> controles formais e informais,<br />
sendo a polícia capaz de realizar estes<br />
dois tipos, uma vez que é responsável<br />
pelo cumprimento <strong>da</strong> lei e exerce ao<br />
mesmo t<strong>em</strong>po uma função social. O<br />
controle formal é constituído pelas<br />
normatizações, regras, leis, códigos,<br />
padronizações que são impostas<br />
ao ci<strong>da</strong>dão. O controle informal é<br />
exercido de forma proporcional ao<br />
vínculo vigente entre o sujeito e a<br />
A mediadora de conflitos atua para a<br />
<strong>em</strong>ancipação ci<strong>da</strong>dã.<br />
46 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
socie<strong>da</strong>de, sendo este fortalecido por<br />
uma relação social constituí<strong>da</strong>.<br />
Os mecanismos de controles formais<br />
se utilizam de agentes fiscalizadores,<br />
de meios legais e judiciais para agir<strong>em</strong>.<br />
O controle formal é fun<strong>da</strong>mentado,<br />
teórico, igualitário e impessoal. O controle<br />
informal é fun<strong>da</strong>dor, dinâmico,<br />
moral e reflexivo, ele é o poder que o<br />
meio, as relações familiares e sociais<br />
defesa social<br />
possu<strong>em</strong> para controlar as atitudes<br />
e comportamentos <strong>da</strong>s pessoas. A<br />
polícia t<strong>em</strong> função institucional de<br />
fazer controle formal, entretanto<br />
deve dimensionar o alcance social<br />
que atinge, para cumprir sua função<br />
informal e pe<strong>da</strong>gógica.<br />
A polícia ideal é aquela que t<strong>em</strong> pessoas<br />
b<strong>em</strong> capacita<strong>da</strong>s e motiva<strong>da</strong>s<br />
para servir a socie<strong>da</strong>de. As instituições<br />
policiais dev<strong>em</strong> oferecer uma boa organização<br />
do trabalho, que se preocupa<br />
com a saúde mental de seus servidores,<br />
que valoriza e estimula o policial.<br />
A polícia é capaz de evoluir, de se<br />
a<strong>da</strong>ptar às novas d<strong>em</strong>an<strong>da</strong>s <strong>da</strong><br />
função policial, de agir de forma sistêmica<br />
com a socie<strong>da</strong>de. Diante de tais<br />
pressupostos é inegável a importância<br />
<strong>da</strong> adoção de novas políticas institucionais<br />
com o enfoque na prevenção<br />
criminal, não deixando de lado a sua<br />
função repressora, porém exercendo<br />
esta, de forma legal e qualifica<strong>da</strong>. E é<br />
neste contexto que atua a Polícia Comunitária,<br />
que trabalha <strong>em</strong> conjunto<br />
com a socie<strong>da</strong>de que se serve, agindo<br />
de forma articula<strong>da</strong>, exercendo um
defesa social<br />
sentimento de pertencimento de sua<br />
comuni<strong>da</strong>de, fomentando a construção<br />
de uma segurança ci<strong>da</strong>dã,<br />
onde todos têm a responsabili<strong>da</strong>de de<br />
promover a paz social.<br />
A prática de Polícia Comunitária está<br />
fun<strong>da</strong><strong>da</strong> nos princípios do policial sujeito,<br />
reflexivo, que sabe ser ci<strong>da</strong>dão,<br />
e respeita a pessoa humana. Também<br />
é capaz de fazer uma leitura <strong>da</strong> abor<strong>da</strong>g<strong>em</strong><br />
sociológica do crime, uma vez<br />
que observa o contexto que envolve o<br />
fenômeno criminal, a forma sistêmica<br />
e histórica que se desencadeiam os<br />
conflitos sociais. Ele é agente de uma<br />
prática preventiva, que possibilita o<br />
estreitamento <strong>da</strong>s forças policiais e a<br />
comuni<strong>da</strong>de.<br />
Espera-se de um Policial Comunitário<br />
saber agir de forma a atender b<strong>em</strong><br />
a d<strong>em</strong>an<strong>da</strong> trazi<strong>da</strong> pela comuni<strong>da</strong>de,<br />
realizar encaminhamentos adequados<br />
para outras instâncias governamentais,<br />
saber trabalhar <strong>em</strong> rede, desenvolver<br />
estratégias de ação social,<br />
mobilizar a comuni<strong>da</strong>de <strong>em</strong> que está<br />
inserido para a maior autonomia e autogestão<br />
de seus conflitos e carências.<br />
A Mediação de Conflitos é um novo<br />
campo de ação social a ser utiliza<strong>da</strong><br />
pela Polícia Comunitária. Sua metodologia<br />
propõe a resolução pacífica dos<br />
conflitos por meio do diálogo e <strong>da</strong> intercessão<br />
do terceiro no dualismo do<br />
conflito. Este terceiro é um mediador<br />
ci<strong>da</strong>dão ou um técnico capacitado<br />
para li<strong>da</strong>r com as controvérsias e percepções<br />
que ca<strong>da</strong> parte envolvi<strong>da</strong> traz<br />
consigo. A mediação é utiliza<strong>da</strong> como<br />
intervenção de natureza preventiva e<br />
de controle social, ao buscar soluções<br />
“A Mediação de<br />
Conflitos é um novo<br />
campo de ação social<br />
a ser utiliza<strong>da</strong> pela<br />
Polícia Comunitária”<br />
para os probl<strong>em</strong>as que deterioram a<br />
quali<strong>da</strong>de de vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s comuni<strong>da</strong>des<br />
locais e ao envolver os ci<strong>da</strong>dãos nesse<br />
processo, a comuni<strong>da</strong>de poderia, com<br />
a cooperação de outros órgãos, contribuir<br />
para reforçar laços sociais, favorecer<br />
a população a gerir os seus<br />
próprios probl<strong>em</strong>as e por extensão,<br />
prevenir crimes, efetivando uma cultura<br />
de paz.<br />
A mediação de conflitos objetiva, acima<br />
de tudo, a prevenção criminal, e t<strong>em</strong><br />
como foco de trabalho as pessoas envolvi<strong>da</strong>s<br />
<strong>em</strong> crimes de menor potencial<br />
ofensivo, ou fatos atípicos. Tais conflitos<br />
correspond<strong>em</strong> a um grande montante<br />
de expedientes instaurados <strong>em</strong> uma<br />
delegacia, sendo fatos recorrentes que<br />
tend<strong>em</strong> a se agravar. Ao fortalecer a<br />
comuni<strong>da</strong>de, <strong>da</strong>ndo poder ao ci<strong>da</strong>dão,<br />
promove-se a constituição de capital social,<br />
que desencadeia desenvolvimento<br />
social, prevenção de crimes, por <strong>em</strong>ancipação,<br />
satisfação social na reali<strong>da</strong>de<br />
que se vive.<br />
A Polícia Ci<strong>da</strong>dã, que promove a autonomia<br />
<strong>da</strong>s partes envolvi<strong>da</strong>s <strong>em</strong> um<br />
conflito, que permite a <strong>em</strong>ancipação<br />
<strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de que se serve, uma<br />
vez que permite as apropriações de<br />
direitos, é aquela capaz de desconstruir<br />
uma triste história de autoritarismo e<br />
violência. Fortalece a d<strong>em</strong>ocracia e<br />
os direitos humanos, construindo de<br />
forma perseverante uma instituição<br />
capaz de promover a justiça e a paz<br />
social. Para que isso ocorra se faz<strong>em</strong><br />
necessários mecanismos de controles<br />
sociais adequados para a preservação<br />
<strong>da</strong> digni<strong>da</strong>de humana, manutenção<br />
de direitos sociais, civis e políticos. O<br />
ci<strong>da</strong>dão precisa ter a presença do Estado<br />
nas garantias sociais e civis, para<br />
que não seja excluído de direitos e<br />
participações sociais e incluído apenas<br />
no momento de ser penalizado.<br />
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Ellen Márcia L. S. de Carvalho - Psicóloga, gradua<strong>da</strong> na Universi<strong>da</strong>de Federal de Minas Gerais,<br />
Pós-gradua<strong>da</strong> <strong>em</strong> Segurança Pública e Direitos Humanos pela Escola Superior Dom Helder<br />
Câmara, Mediadora de Conflitos, capacita<strong>da</strong> pelo Programa Pólos de Ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia <strong>da</strong> Facul<strong>da</strong>de<br />
de Direito <strong>da</strong> UFMG.<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
47
Corpo de Bombeiros<br />
Militar de Minas Gerais<br />
Atuação <strong>em</strong> prol <strong>da</strong> Segurança Pública<br />
R<strong>em</strong>onta aos t<strong>em</strong>pos <strong>da</strong> construção<br />
<strong>da</strong> Capital a orig<strong>em</strong> do Corpo de Bombeiros<br />
Militar do Estado de Minas Gerais,<br />
que nasceu de uma simples Seção<br />
de Bombeiros Profissionais, no ano de<br />
1911, mais precisamente no dia 31 de<br />
agosto, quando o Presidente do Estado<br />
de Minas Gerais era Júlio Bueno<br />
Brandão. O efetivo para estruturar essa<br />
Seção de Bombeiros, composto por 54<br />
homens, foi retirado <strong>da</strong> Guar<strong>da</strong> Civil<br />
e incorporado à Força Pública. Sua<br />
formação foi conduzi<strong>da</strong> por um oficial<br />
instrutor do Corpo de Bombeiros do<br />
Rio de Janeiro, então Distrito Federal, e<br />
teve como primeiro coman<strong>da</strong>nte o Capitão<br />
Antônio Augusto de Oliveira. Até<br />
o ano de 1920, a Seção de Bombeiros<br />
ocupou as dependências do Quartel do<br />
1º Batalhão <strong>da</strong> Força Pública, sediado<br />
na Praça Floriano Peixoto, no Bairro<br />
Santa Efigênia, ano <strong>em</strong> que sua sede<br />
foi transferi<strong>da</strong> para a esquina <strong>da</strong> Rua<br />
Acidente com caminhão<br />
(Uberlândia/MG).<br />
48 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
Aimorés com Rio Grande do Norte.<br />
Em 4 de janeiro de 1934, a Seção de<br />
Bombeiros foi desliga<strong>da</strong> do quadro do<br />
pessoal <strong>da</strong> Força Pública, <strong>em</strong> cumprimento<br />
ao previsto no Decreto-Lei assinado<br />
pelo então Interventor Federal,<br />
Benedito Vala<strong>da</strong>res Ribeiro. Foi dessa<br />
norma que surgiu o nome: Corpo de<br />
Bombeiros de Minas Gerais. Porém,<br />
no dia 25 de agosto de 1966, o Corpo<br />
de Bombeiros foi reintegrado à PMMG<br />
(Polícia Militar de Minas Gerais) por intermédio<br />
de uma lei estadual, que deu<br />
também nova estrutura ao Corpo de<br />
Bombeiros e criou seus três primeiros<br />
batalhões.<br />
Após quase 33 anos, o Corpo de Bombeiros<br />
foi desvinculado novamente <strong>da</strong><br />
PMMG e recebeu o nome que hoje<br />
ostenta: Corpo de Bombeiros Militar<br />
de Minas Gerais, ou simplesmente<br />
CBMMG. Esse feito ocorreu com a<br />
José Honorato Ameno<br />
defesa social<br />
“O CBMMG desponta<br />
no cenário nacional<br />
não apenas pelas<br />
próprias ações, mas<br />
também graças ao<br />
trabalho conjunto do<br />
Poder Executivo<br />
e Legislativo”<br />
promulgação <strong>da</strong> Emen<strong>da</strong> à Constituição<br />
nº 39, de 2 de junho de 1999,<br />
que atribuiu à Corporação a competência<br />
de coordenar e executar ações<br />
de defesa civil, perícias de incêndio<br />
e estabelecimento de normas relativas<br />
à segurança contra incêndios<br />
ou qualquer tipo de catástrofe, além<br />
de executar as d<strong>em</strong>ais ativi<strong>da</strong>des de<br />
prevenção e combate a incêndios e<br />
busca e salvamento. O primeiro Coman<strong>da</strong>nte-Geral<br />
dessa nova fase do<br />
CBMMG foi o Coronel BM José Maria<br />
Gomes, <strong>em</strong>possado pelo Governador<br />
Itamar Augusto Cautiero Franco, <strong>em</strong><br />
ato solene realizado no Palácio <strong>da</strong><br />
Liber<strong>da</strong>de.<br />
A novi<strong>da</strong>de estabeleci<strong>da</strong> na Constituição<br />
Mineira trouxe a necessi<strong>da</strong>de<br />
de um novo espeque jurídico infraconstitucional,<br />
que propiciou nova<br />
estrutura à recém-nasci<strong>da</strong> Instituição,<br />
<strong>da</strong>ndo a ela o Comando Operacional<br />
<strong>da</strong>s Diretorias de Recursos Humanos,<br />
de Ativi<strong>da</strong>des Técnicas, de Apoio Logístico<br />
e de Contabili<strong>da</strong>de e Finanças.<br />
Criou também a Assessoria de Assistência<br />
à Saúde, b<strong>em</strong> como os Centros
defesa social<br />
de Ensino de Bombeiros, de Operações<br />
de Bombeiros, e o de Suprimento<br />
e Manutenção. Enfim, foi cria<strong>da</strong> to<strong>da</strong><br />
essa estrutura a fim de que o CBMMG<br />
pudesse enfrentar as reali<strong>da</strong>des e a<br />
d<strong>em</strong>an<strong>da</strong>s sociais ca<strong>da</strong> vez maiores.<br />
Conforme se pode observar com<br />
clareza, os avanços conquistados pelo<br />
Corpo de Bombeiros s<strong>em</strong>pre contaram<br />
com a efetiva e indispensável<br />
participação do Governo do Estado e<br />
<strong>da</strong> Ass<strong>em</strong>bléia Legislativa, o que possibilitou<br />
dentro de pequeno espaço<br />
de t<strong>em</strong>po um moderno ordenamento<br />
jurídico voltado para as ativi<strong>da</strong>des<br />
des<strong>em</strong>penha<strong>da</strong>s pelo CBMMG.<br />
Dentro desse novo ordenamento voltado<br />
para a reorganização <strong>da</strong> Instituição,<br />
destacamos algumas leis que<br />
foram fun<strong>da</strong>mentais para a estruturação,<br />
a melhoria e o avanço na<br />
quali<strong>da</strong>de e quanti<strong>da</strong>de dos serviços<br />
prestados pelo CBMMG. Nesse arcabouço<br />
jurídico, pod<strong>em</strong>os destacar<br />
as seguintes leis: Lei Compl<strong>em</strong>entar<br />
nº 54/99, que estabeleceu a Organização<br />
Básica do Corpo de Bombeiros;<br />
a Lei nº 16.307/06, que trouxe a nova<br />
previsão do efetivo para a Corporação;<br />
a Lei nº 14.130/01, que proporcionou<br />
modernas normas de prevenção<br />
ao povo mineiro; e a Lei nº<br />
14.938/03, que criou no Estado a Taxa<br />
de Incêndio. To<strong>da</strong>via, destaque especial<br />
deve ser <strong>da</strong>do para a Lei de Prevenção<br />
contra Incêndio e Pânico do<br />
Estado e também para a Lei <strong>da</strong> Taxa<br />
de Incêndio. A primeira, s<strong>em</strong> falsa modéstia,<br />
é hoje a mais moderna do País,<br />
e a segun<strong>da</strong> deu a redenção ao Corpo<br />
de Bombeiros, possibilitando a aquisição<br />
dos equipamentos mais específicos<br />
e viaturas mais modernas, que<br />
até esse momento ficavam limitados<br />
apenas aos sonhos dos “Sol<strong>da</strong>dos<br />
<strong>da</strong> Vi<strong>da</strong>”. Além destas quali<strong>da</strong>des, a<br />
Lei <strong>da</strong> Taxa proporcionou os recursos<br />
necessários para a manutenção adequa<strong>da</strong><br />
destes equipamentos, imóveis<br />
e viaturas. A partir <strong>da</strong> sanção destas<br />
Ação do CBMMG durante<br />
explosão de gás (Uberaba/MG).<br />
duas leis, a Instituição passou a receber<br />
dos Corpos de Bombeiros de<br />
outros Estados-m<strong>em</strong>bros constantes<br />
in<strong>da</strong>gações sobre o conteúdo estabelecido<br />
nessas normas, com a finali<strong>da</strong>de<br />
de levar para seus Estados essas<br />
novi<strong>da</strong>des. Assim é que o CBMMG<br />
desponta no cenário nacional não<br />
apenas pelas próprias ações, mas<br />
também graças ao trabalho conjunto<br />
do Poder Executivo e Legislativo.<br />
São inúmeras as conquistas <strong>da</strong> Instituição<br />
nesses quase nove anos <strong>da</strong><br />
desvinculação <strong>da</strong> PMMG e pod<strong>em</strong> ser<br />
destaca<strong>da</strong>s, dentre elas, a aquisição<br />
de um local para as instalações do<br />
Centro de Treinamento do Corpo de<br />
Bombeiros, um outro para as instalações<br />
do Centro de Suprimento e Manutenção<br />
e a instalação de 13 frações<br />
BM. Com a instalação dessas novas<br />
frações, o CBMMG passou a contar<br />
com Uni<strong>da</strong>des Operacionais <strong>em</strong> 58<br />
municípios, que correspond<strong>em</strong> a quase<br />
7% dos 853 municípios mineiros.<br />
Mas de todos os benefícios proporcionados<br />
pela desvinculação, s<strong>em</strong> dúvi<strong>da</strong><br />
alguma, o maior deles foi alcançado<br />
com as mu<strong>da</strong>nças no ensino e no<br />
treinamento dos talentos humanos. A<br />
formação, a instrução e o aperfeiçoamento<br />
dos oficiais e praças, que antes<br />
cont<strong>em</strong>plavam uma grande quanti<strong>da</strong>de<br />
de assuntos, passaram a se limitar ao<br />
conteúdo próprio <strong>da</strong> Proteção Pública,<br />
propiciando a especialização dos Bombeiros.<br />
Com essa mu<strong>da</strong>nça, o CBMMG<br />
passou a contar com profissionais mais<br />
especializados, e a população atendi<strong>da</strong>,<br />
a receber melhores resultados nas mais<br />
diversas mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des de ocorrências<br />
típicas para o atendimento dos “Sol<strong>da</strong>dos<br />
<strong>da</strong> Vi<strong>da</strong>”.<br />
Por outro lado, a Corporação v<strong>em</strong> se<br />
equipando ca<strong>da</strong> vez mais e melhor<br />
com viaturas e equipamentos para<br />
melhor socorrer e proteger os ci<strong>da</strong>dãos<br />
mineiros. Destaque especial<br />
pode ser <strong>da</strong>do nesse sentido com a<br />
aquisição de equipamentos mais especializados<br />
como é o caso <strong>da</strong> autobomba-plataforma-esca<strong>da</strong><br />
(ABPE) e<br />
“A Corporação v<strong>em</strong><br />
se equipando ca<strong>da</strong><br />
vez mais e melhor<br />
com viaturas e<br />
equipamentos para<br />
melhor socorrer e<br />
proteger os ci<strong>da</strong>dãos<br />
mineiros”<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
49
Treinamento no Rio <strong>da</strong>s Velhas<br />
(Belo Horizonte/MG).<br />
dois helicópteros, que foram adquiridos<br />
no ano de 2007. Estes dois tipos<br />
de equipamentos são utilizados tanto<br />
no salvamento de pessoas e bens<br />
quanto no combate a incêndios. Esta<br />
ABPE possui 54 metros de comprimento<br />
e pode alcançar uma altura<br />
correspondente a 19 pavimentos de<br />
edificações, possibilitando a retira<strong>da</strong><br />
de pessoas que porventura estejam<br />
necessitando de socorro e propicia,<br />
ain<strong>da</strong>, o lançamento de jatos de água<br />
para o combate a incêndios urbanos,<br />
<strong>em</strong> alturas mais eleva<strong>da</strong>s. Além desse<br />
<strong>em</strong>prego <strong>em</strong> alturas, o veículo pode<br />
trabalhar <strong>em</strong> situações que costumamos<br />
chamar de negativas, ou seja,<br />
abaixo do nível do solo, que no caso<br />
deste equipamento, atinge até 15<br />
metros. Os dois helicópteros também<br />
estão equipados para o seu <strong>em</strong>prego<br />
multifuncional e pod<strong>em</strong> ser usados<br />
tanto no combate a incêndios urbanos<br />
e rurais, quanto no salvamento. O seu<br />
maior <strong>em</strong>prego ocorre principalmente<br />
no transporte aeromédico, com resultados<br />
incomparáveis a outros tipos<br />
de transporte. Conforme já se sabe, o<br />
Bombeiro constant<strong>em</strong>ente corre contra<br />
o t<strong>em</strong>po no seu dia-a-dia operacional,<br />
quer seja no salvamento, quer<br />
seja no combate a incêndio. E a aeronave<br />
nos dá uma grande vantag<strong>em</strong>,<br />
principalmente por causa <strong>da</strong> rapidez e<br />
50 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
<strong>da</strong> segurança. Mas, além destas, não<br />
se pode olvi<strong>da</strong>r que a comodi<strong>da</strong>de e<br />
a estabili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> aeronave também<br />
são el<strong>em</strong>entos fun<strong>da</strong>mentais para o<br />
sucesso do salvamento.<br />
Além do que já foi citado, referente à<br />
sua missão, os componentes do Corpo<br />
de Bombeiros participam de diversos<br />
programas sociais, quais sejam:<br />
Projeto Golfinho, Bombeiro Amigo do<br />
Peito, Programa de Natação, Apoio<br />
aos Portadores de Necessi<strong>da</strong>de Especiais,<br />
Cinoterapia e Bombeiro-Mirim.<br />
A tônica desses programas é levar ao<br />
público participante informações básicas<br />
de prevenção contra sinistros de<br />
modo geral, por termos <strong>em</strong> mente que<br />
os acidentes, por menor que seja sua<br />
gravi<strong>da</strong>de, somente ocorr<strong>em</strong> quando<br />
as medi<strong>da</strong>s de prevenção deixam de<br />
ser observa<strong>da</strong>s. A Instituição não está<br />
fazendo ain<strong>da</strong> tudo o que é de sua<br />
competência por falta <strong>da</strong>s condições<br />
ideais, mas, v<strong>em</strong> se desdobrando ao<br />
máximo para alcançar sua plenitude<br />
<strong>em</strong> todo o território mineiro.<br />
É gratificante saber que nos últimos<br />
seis anos o Corpo de Bombeiros v<strong>em</strong><br />
ocupando o primeiro lugar no índice<br />
de credibili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> população quando<br />
comparado com os d<strong>em</strong>ais órgãos e<br />
instituições. No corrente ano, não foi<br />
defesa social<br />
diferente, e o percentual de aprovação<br />
dos serviços dos Bombeiros foi de<br />
97%. Estes <strong>da</strong>dos por um lado nos<br />
traz<strong>em</strong> a satisfação do reconhecimento<br />
do público, mas ao mesmo<br />
t<strong>em</strong>po aumentam a nossa responsabili<strong>da</strong>de<br />
e o nosso compromisso de<br />
manter pelo menos o elevado índice<br />
alcançado. Sab<strong>em</strong>os que manter esses<br />
níveis de confiança é mais difícil do<br />
que conquistá-los. Sab<strong>em</strong>os que essa<br />
conquista não é somente dos que<br />
estão conosco na ativa, mas também<br />
muito existe dos BM que muito lutaram<br />
e agora foram transferidos para<br />
a reserva ou reformaram. Sab<strong>em</strong>os<br />
ain<strong>da</strong> mais, que a confiança e a credibili<strong>da</strong>de<br />
não são conquistas feitas<br />
isola<strong>da</strong>mente, resultam de um ato<br />
continuado, exercido no quotidiano<br />
com muita luta e perseverança, e que<br />
estes são fatores fun<strong>da</strong>mentais para<br />
o alcance <strong>da</strong> excelência profissional.<br />
E este é o l<strong>em</strong>a que nos mantém<br />
prontos para atuar com diligência na<br />
segurança pública no seu sentido lato,<br />
a fim de que continu<strong>em</strong>os por todo o<br />
s<strong>em</strong>pre, a ser: “O amigo certo nas<br />
horas incertas”.<br />
“Nos últimos seis<br />
anos o Corpo de<br />
Bombeiros v<strong>em</strong><br />
ocupando o primeiro<br />
lugar no índice de<br />
credibili<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />
população”<br />
Cel BM José Honorato Ameno - Coman<strong>da</strong>nte-Geral<br />
do CBMMG desde 28 de set<strong>em</strong>bro<br />
de 2005. Nasceu <strong>em</strong> Pequi/MG, ingressou<br />
no CFO <strong>em</strong> 1978, é formado <strong>em</strong><br />
Direito, e, entre os cargos que exerceu na<br />
Corporação, destacam-se: Cmt do 1º Batalhão,<br />
Diretor de Recursos Humanos, de Contabili<strong>da</strong>de<br />
e Finanças, de Apoio Logístico,<br />
Cmt Operacional, Corregedor.
defesa social<br />
É possível, <strong>da</strong><strong>da</strong>s as atuais condições<br />
sociais e institucionais <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />
brasileira, reduzir a incidência <strong>da</strong><br />
criminali<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> violência para<br />
patamares mais razoáveis. A pobreza<br />
absoluta que vitimiza parcela expressiva<br />
<strong>da</strong> população como também o<br />
baixo grau de severi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> punição<br />
característica <strong>da</strong> legislação penal brasileira<br />
não são fatores suficientes para<br />
explicar os elevados níveis de roubos<br />
e homicídios que caracterizam nosso<br />
cotidiano.<br />
Uma parcela importante do<br />
probl<strong>em</strong>a reside na ausência<br />
de políticas públicas de controle<br />
<strong>da</strong> criminali<strong>da</strong>de consistentes,<br />
nos âmbitos<br />
federal, estadual e municipal.<br />
A elite política<br />
brasileira, salvo honrosas<br />
exceções, ain<strong>da</strong><br />
não compreendeu a<br />
especifici<strong>da</strong>de <strong>da</strong> política<br />
de segurança pública<br />
<strong>em</strong> relação às<br />
políticas sociais<br />
convencionais<br />
e às políticas<br />
penais basea<strong>da</strong>s<br />
no código<br />
criminal. Ain<strong>da</strong><br />
persiste a crença<br />
de que o probl<strong>em</strong>a<br />
será minimizado com<br />
a massificação de programas<br />
de distribuição<br />
de ren<strong>da</strong>, de <strong>em</strong>prego ou<br />
mesmo com a aplicação<br />
estrita do Código Penal.<br />
Segurança Pública<br />
no Brasil t<strong>em</strong> jeito!<br />
Uma característica comum perpassa<br />
as políticas federal e estadual de segurança<br />
pública na socie<strong>da</strong>de brasileira<br />
nos últimos 20 anos: a prevalência do<br />
gerenciamento de crises. A ausência<br />
de uma racionali<strong>da</strong>de<br />
gerencial mais<br />
sist<strong>em</strong>ática neste<br />
Luis Flavio Sapori<br />
âmbito <strong>da</strong>s políticas públicas é fator<br />
decisivo de ineficiência <strong>da</strong> atuação<br />
governamental e consequent<strong>em</strong>ente<br />
constitui-se <strong>em</strong> fator que potencializa<br />
o fenômeno <strong>da</strong> criminali<strong>da</strong>de.
Os governos d<strong>em</strong>ocráticos que sucederam<br />
os governos militares não lograram<br />
êxito na definição de uma<br />
agen<strong>da</strong> consistente de reformas institucionais<br />
e de avanços na gestão<br />
operacional do setor <strong>da</strong> segurança<br />
pública. Fatores diversos pod<strong>em</strong> explicar<br />
tal omissão e/ou incompetência<br />
dos governos d<strong>em</strong>ocráticos. A priori<strong>da</strong>de<br />
<strong>da</strong><strong>da</strong> na agen<strong>da</strong> política nacional<br />
ao retorno <strong>da</strong>s forças arma<strong>da</strong>s<br />
aos limites de sua competência constitucional<br />
é um aspecto a ser considerado<br />
ou mesmo a inexistência de um<br />
paradigma alternativo que pudesse<br />
instrumentalizar os decision makers<br />
para além <strong>da</strong> subordinação <strong>da</strong>s agências<br />
de justiça criminal às exigências<br />
do ideário dos direitos humanos cristalizado<br />
na nova Constituição.<br />
Não é casual, portanto, que a intervenção<br />
pública na provisão deste b<strong>em</strong><br />
coletivo t<strong>em</strong> sido pauta<strong>da</strong> ao longo de<br />
todo este período pela improvisação e<br />
pela falta de sist<strong>em</strong>atici<strong>da</strong>de. Referirse<br />
a uma história <strong>da</strong>s políticas de segurança<br />
pública na socie<strong>da</strong>de brasileira<br />
nas duas últimas déca<strong>da</strong>s, sob este<br />
ponto de vista, significa explicitar uma<br />
série de intervenções governamentais<br />
espasmódicas, meramente reativas,<br />
direciona<strong>da</strong>s para a solução imediata<br />
de crises que assolam periodicamente<br />
a ord<strong>em</strong> pública. E deve-se reconhecer<br />
que os meios de comunicação de<br />
massa, <strong>em</strong> especial rádios, jornais<br />
e TVs, des<strong>em</strong>penham papel decisivo<br />
na definição do que venha a ser<br />
uma crise <strong>da</strong> ord<strong>em</strong> pública como<br />
também <strong>da</strong> pauta política de priori<strong>da</strong>des<br />
<strong>em</strong> eventuais reformas legais e<br />
organizacionais.<br />
O controle eficaz <strong>da</strong> criminali<strong>da</strong>de, por<br />
sua vez, exige a adoção de medi<strong>da</strong>s<br />
que cont<strong>em</strong>pl<strong>em</strong> os fatores de risco<br />
do fenômeno e não propriamente as<br />
causas do fenômeno. Para tanto, a<br />
boa governança <strong>da</strong> política de segurança<br />
pública deve incluir ações que<br />
acentu<strong>em</strong> a operacionali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s<br />
polícias, <strong>da</strong> justiça e do sist<strong>em</strong>a prisional.<br />
Inser<strong>em</strong>-se aqui desde a melhoria<br />
<strong>da</strong>s condições de trabalho dos<br />
policiais até a ampliação de vagas nas<br />
uni<strong>da</strong>des prisionais e a profissionalização<br />
de sua gestão. Paralelamente, é<br />
imprescindível impl<strong>em</strong>entar projetos<br />
sociais que viabiliz<strong>em</strong> a inserção social<br />
de jovens residentes nas periferias<br />
urbanas, através <strong>da</strong> qualificação profissional<br />
e <strong>da</strong> valorização de suas manifestações<br />
culturais, como é o caso<br />
do Hip-Hop. O rap, a street <strong>da</strong>nce,<br />
defesa social<br />
o grafite são dotados de um potencial<br />
de prevenção social <strong>da</strong> violência<br />
muito maior que se imagina.<br />
É possível alcançar resultados muito<br />
mais expressivos do que aqueles<br />
que estão sendo alcançados até<br />
o momento. Vontade política é um<br />
bom começo para reverter o quadro.<br />
Acresce-se a ela uma boa pita<strong>da</strong><br />
de investimentos, <strong>da</strong>queles <strong>em</strong> que<br />
o orçamentário se transforma <strong>em</strong><br />
financeiro, s<strong>em</strong> contingenciamentos.<br />
A partir <strong>da</strong>í deve prevalecer uma<br />
racionali<strong>da</strong>de gerencial que privilegie<br />
a conquista de resultados, otimizando<br />
o gasto dos recursos disponíveis.<br />
Por fim, aprendendo com a lição<br />
dos mineiros, não tratar prevenção<br />
e repressão como ‘escolha de Sofia’.<br />
A boa política de segurança pública<br />
deve ser rigorosa no combate à impuni<strong>da</strong>de<br />
e humanista na valorização<br />
<strong>da</strong> participação comunitária e na<br />
inserção social de jovens pobres <strong>da</strong>s<br />
periferias urbanas. De resto é contar<br />
com a colaboração <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de civil,<br />
que se encontra muito mais ativa e<br />
participativa do que governantes e<br />
gestores públicos imaginam.<br />
Luis Flavio Sapori - Coordenador do Curso de Ciências Sociais <strong>da</strong> PUC Minas; pesquisador<br />
<strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção João Pinheiro.<br />
Tecnologia <strong>em</strong> Segurança eleTrônica.<br />
O mais nOvO lançamentO <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>çãO <strong>Guimarães</strong> rOsa.<br />
Mais segurança, proteção e b<strong>em</strong>-estar para clientes muito especiais.<br />
A Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> inova na gestão do ambiente tecnológico para oferecer<br />
às prefeituras municipais os serviços de planejamento, instalação e manutenção<br />
de sist<strong>em</strong>as de segurança eletrônica que inclu<strong>em</strong>: câmaras digitais, central de<br />
monitoramento de imagens, alarmes de alta tecnologia e, principalmente, pessoal<br />
treinado para exercer suas funções com quali<strong>da</strong>de superior. Tudo isso para garantir a<br />
segurança dos municípios, a proteção do patrimônio histórico e cultural, a tranqüili<strong>da</strong>de<br />
<strong>da</strong>s escolas e prédios públicos, com possibili<strong>da</strong>de de uso compartilhado pelas Polícias<br />
Civil e Militar, Guar<strong>da</strong>s Municipais e uni<strong>da</strong>des dos Bombeiros.<br />
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hotéis e pousa<strong>da</strong>s que permite a concessão de descontos, isenção de matrícula e facili<strong>da</strong>de<br />
no pagamento de mensali<strong>da</strong>des, s<strong>em</strong>estrali<strong>da</strong>des e hospe<strong>da</strong>g<strong>em</strong>.<br />
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e-mail: comsocial@fgr.org.br
defesa social<br />
Cultura de Paz pelo Desenvolvimento Humano:<br />
uma forma de combater a<br />
criminali<strong>da</strong>de e a violência na<br />
cont<strong>em</strong>poranei<strong>da</strong>de<br />
No final do século XX e início do século<br />
XXI, era comum ouvir e ler previsões<br />
para a chega<strong>da</strong> <strong>da</strong> nova era, a era<br />
<strong>da</strong> espirituali<strong>da</strong>de, do equilíbrio, <strong>da</strong><br />
paz, <strong>da</strong> harmonia. To<strong>da</strong>via, no Brasil,<br />
a violência, sobretudo a urbana, está<br />
na agen<strong>da</strong> do dia-a-dia e ocupa as<br />
manchetes dos jornais. Assim como a<br />
criminali<strong>da</strong>de, a violência é assunto de<br />
especiais para a televisão e, mais que<br />
tudo, assombra as consciências, sendo<br />
de tal forma ameaçadora, recorrente e<br />
geradora de um profundo sentimento<br />
de insegurança. Essa evolução é<br />
sintoma de uma desintegração social,<br />
de um mal-estar coletivo e de um desregramento<br />
<strong>da</strong>s instituições públicas.<br />
Há um debate cont<strong>em</strong>porâneo sobre<br />
a violência, mesmo porque hoje, mais<br />
que antes, ela é fato visto e sentido.<br />
Apesar dos inúmeros estudos sobre<br />
o assunto, alguns equívocos ain<strong>da</strong><br />
estão presentes na interpretação<br />
do cotidiano social. Em geral, estes<br />
equívocos surg<strong>em</strong> a partir de uma<br />
atitude reducionista frente à questão<br />
<strong>da</strong> violência. Um dos ex<strong>em</strong>plos que<br />
limitam a compreensão se refere ao<br />
fato de muitos situar<strong>em</strong>-na apenas no<br />
campo do crime.<br />
Os crimes, enquanto delitos cometidos<br />
contra a lei, concretamente revelam<br />
Álvaro Antônio Nicolau<br />
“Não se conseguirá muita coisa se a integração entre pessoas e organizações, para uma<br />
Segurança Pública coerente e visionaria, permanecer míope ou se tornar míope.”<br />
54 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
a existência <strong>da</strong> violência, uma vez<br />
que pod<strong>em</strong> comprometer a vi<strong>da</strong> de<br />
pessoas e de grupos, mas, por trás dos<br />
crimes, estão presentes outros tipos de<br />
violência que, necessariamente, não<br />
se articulam diretamente e que n<strong>em</strong><br />
s<strong>em</strong>pre são percebidos enquanto tais.<br />
Nos últimos anos, a violência, por causa<br />
de sua tendência ascendente, v<strong>em</strong><br />
sendo aponta<strong>da</strong> por diversos setores<br />
representativos <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de como<br />
sério e importante probl<strong>em</strong>a que aflige<br />
muitos paises, e o Brasil <strong>em</strong> especial.<br />
Nessa cont<strong>em</strong>poranei<strong>da</strong>de, é lastimável<br />
o imperativo <strong>da</strong> insensatez. Mata-se na<br />
cotidiani<strong>da</strong>de por quase na<strong>da</strong>: mata-se<br />
por um par de chinelos ou por alguns<br />
poucos trocados. O crime, a criminali<strong>da</strong>de<br />
e a violência imperam vitoriosos<br />
nos contextos sociais.<br />
Estudos diversos nos revelam que a<br />
socie<strong>da</strong>de está doente. As pessoas<br />
estão afeta<strong>da</strong>s pela cotidiani<strong>da</strong>de.<br />
Viv<strong>em</strong>os muitas enfermi<strong>da</strong>des, sejam<br />
físicas, sejam psicológicas e, às vezes,<br />
algumas decorrentes de outras. Por<br />
isso mesmo, na pós-moderni<strong>da</strong>de, é<br />
comum o ser humano fazer uma avaliação<br />
de si e do mundo. Percebe-se<br />
que as pessoas buscam um sentido<br />
para a vi<strong>da</strong>, mesmo porque a falta<br />
desse sentido está inseri<strong>da</strong> num contexto<br />
de sintoma cont<strong>em</strong>porâneo, presentes<br />
os diversos cenários contidos<br />
na relação entre desenvolvimento tecnológico<br />
capitalista cont<strong>em</strong>porâneo e<br />
desenvolvimento humano, pois estão<br />
longe de an<strong>da</strong>r lado a lado.<br />
O século XX, <strong>em</strong>bora tenha sido um<br />
dos mais sangrentos e devastados<br />
pelas guerras <strong>em</strong> to<strong>da</strong> história, conforme<br />
<strong>da</strong>dos <strong>da</strong> ONU (Organização<br />
<strong>da</strong>s Nações Uni<strong>da</strong>s), foi também<br />
aquele <strong>em</strong> que se obteve dramático<br />
progresso rumo ao estabelecimento<br />
de uma paz universal e duradoura.<br />
Tudo muito no nível do mundial. A<br />
mundialização como parte do contexto<br />
cont<strong>em</strong>porâneo.<br />
De certo, o desenvolvimento humano<br />
é ponto importante <strong>da</strong> abor<strong>da</strong>g<strong>em</strong>,<br />
tendo <strong>em</strong> vista buscar novas concepções<br />
para fazer o fortalecimento <strong>da</strong>s<br />
pessoas e seus relacionamentos na<br />
estrutura social. É nessa concepção<br />
do desenvolvimento humano que<br />
as Organizações dev<strong>em</strong> trabalhar,<br />
no sentido de tornar<strong>em</strong>-se ca<strong>da</strong> vez<br />
mais d<strong>em</strong>ocráticas e responsáveis<br />
na forma <strong>em</strong> que se organizam e<br />
operam, seja <strong>em</strong> nível local, regional,<br />
nacional ou internacional. Operar<br />
ver<strong>da</strong>deiramente e construtivamente
na ressignificação do sentido de serno-mundo.<br />
Trabalhar para tornar real<br />
a harmonia social <strong>em</strong> nossas comuni<strong>da</strong>des,<br />
fortalecendo o entendimento,<br />
o amor, a compaixão e o serviço ao<br />
próximo. Daí a necessária participação<br />
na mídia, na escola, no trabalho, na<br />
família e na esfera pública, que deve<br />
ser estimula<strong>da</strong> com o objetivo de<br />
fortalecer a concepção de uma paz<br />
social duradoura. Um apreço pela<br />
riqueza e importância <strong>da</strong> diversi<strong>da</strong>de<br />
sociocultural e religiosa do mundo<br />
deve ser nutrido, pois contribui com<br />
a integração social, justiça e uni<strong>da</strong>de.<br />
“Existir na<br />
cont<strong>em</strong>poranei<strong>da</strong>de<br />
é um grande desafio<br />
para as pessoas, por<br />
isso mesmo elas<br />
dev<strong>em</strong> promover o<br />
encontro, ou fazer<br />
um encontro consigo<br />
mesmas para produzir<br />
o desenvolvimento<br />
humano“<br />
Nossa visão é de um mundo centrado<br />
no ser humano e genuinamente d<strong>em</strong>ocrático,<br />
onde as pessoas são participantes<br />
e determinam seus próprios<br />
destinos. Nessa situação, somos uma<br />
família humana, com to<strong>da</strong> sua diversi<strong>da</strong>de,<br />
vivendo <strong>em</strong> um lar comum, com<br />
desejo de dividir um mundo justo,<br />
sustentável e pacífico, guiado por<br />
princípios de d<strong>em</strong>ocracia, igual<strong>da</strong>de,<br />
inclusão, voluntarismo, não-discriminação<br />
e participação <strong>da</strong>s pessoas,<br />
sejam homens ou mulheres, jovens ou<br />
adultos, independente de raça, credo,<br />
deficiências, orientação sexual, etnia<br />
ou nacionali<strong>da</strong>de. Esse é um mundo<br />
onde a paz e a segurança humana,<br />
como enfoca<strong>da</strong>s nos princípios <strong>da</strong><br />
Carta <strong>da</strong>s Nações Uni<strong>da</strong>s, tomam<br />
o lugar de armamentos, conflitos<br />
violentos e guerras, desencontros e divergências.<br />
É um mundo de pretensão,<br />
onde todos viv<strong>em</strong> <strong>em</strong> um ambiente<br />
decente com distribuição justa dos<br />
recursos <strong>da</strong> terra. Nesse sentido, nós,<br />
ci<strong>da</strong>dãos do mundo, dev<strong>em</strong>os incluir<br />
<strong>em</strong> nossa agen<strong>da</strong> um papel especial<br />
para acolher e ser sensibilizado, ou<br />
tocado, pelo dinamismo dos jovens e<br />
pela experiência dos idosos, além de<br />
reafirmar a universali<strong>da</strong>de, indivisibili<strong>da</strong>de<br />
e interdependência dos direitos<br />
humanos (civil, político, econômico,<br />
social e cultural).<br />
Mas, pode ser um sonho, permeado<br />
pela reali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong>des cont<strong>em</strong>porâneas.<br />
Antes disso, estamos<br />
tratando de necessi<strong>da</strong>des humanas<br />
e humanitárias. Mas a humani<strong>da</strong>de<br />
deve se encontrar com o humano<br />
como resultado <strong>da</strong>s vivencias no diaa-dia.<br />
Focar a existência.<br />
Existir na cont<strong>em</strong>poranei<strong>da</strong>de é um<br />
grande desafio para as pessoas, por<br />
isso mesmo elas dev<strong>em</strong> promover<br />
o encontro, ou fazer um encontro<br />
consigo mesmas para produzir o<br />
desenvolvimento humano.<br />
Tal desenvolvimento humano se encontra<br />
<strong>em</strong> uma conjuntura crítica na<br />
história, que clama por forte liderança<br />
moral e espiritual para aju<strong>da</strong>r a definir<br />
uma nova direção para a socie<strong>da</strong>de. É<br />
o caminho <strong>da</strong> ressignificação. Daí a<br />
necessi<strong>da</strong>de dos operadores <strong>da</strong> Segurança<br />
Pública reconhecer a especial<br />
responsabili<strong>da</strong>de para o b<strong>em</strong>-estar <strong>da</strong><br />
família humana e paz na Terra. Além<br />
disso, as lideranças políticas dev<strong>em</strong> se<br />
expressar pela necessi<strong>da</strong>de de guiar a<br />
humani<strong>da</strong>de, pelos contextos sociais,<br />
através <strong>da</strong> palavra e ação <strong>em</strong> um<br />
compromisso renovado por valores<br />
éticos e espirituais, os quais inclu<strong>em</strong><br />
um profundo senso de respeito pela,<br />
e por to<strong>da</strong> a vi<strong>da</strong>, como também pela<br />
digni<strong>da</strong>de inerente a ca<strong>da</strong> pessoa.<br />
defesa social<br />
Reafirma-se, aqui, o direito de viver<br />
<strong>em</strong> um mundo livre de violência.<br />
Violência de to<strong>da</strong> ord<strong>em</strong>. Também,<br />
despertar nos indivíduos e comuni<strong>da</strong>des<br />
um senso de responsabili<strong>da</strong>de<br />
compartilha<strong>da</strong> para o b<strong>em</strong>-estar <strong>da</strong><br />
família como um todo, e o reconhecimento<br />
de que todos os seres humanos<br />
têm o direito à educação, além <strong>da</strong><br />
oportuni<strong>da</strong>de de alcançar uma forma<br />
de vi<strong>da</strong> segura e sustentável.<br />
Dev<strong>em</strong>os proporcionar mu<strong>da</strong>nças nos<br />
conceitos que permeiam a socie<strong>da</strong>de.<br />
Sair de um contexto cartesiano por<br />
d<strong>em</strong>ais para um contexto de compartilhamento<br />
e envolvimento, de<br />
co-responsabili<strong>da</strong>de na transformação<br />
<strong>da</strong>s pessoas. Praticar e promover <strong>em</strong><br />
nossas comuni<strong>da</strong>des os valores de<br />
ver<strong>da</strong>deira dimensão de paz, incluindo,<br />
especialmente, estudo, oração, meditação,<br />
um senso de sagrado, humil<strong>da</strong>de,<br />
amor, compaixão, tolerância e espírito<br />
de serviço, que são fun<strong>da</strong>mentais para<br />
a criação de uma socie<strong>da</strong>de pacífica.<br />
Por que não...<br />
São necessários novos valores. Valores<br />
que deverão ser traduzidos e compartilhados<br />
<strong>em</strong> ações com base <strong>em</strong><br />
objetivos-chave. Estamos pensando e<br />
registrando questões como Paz, Segurança<br />
e Desarmamento, que dev<strong>em</strong> receber<br />
atribuições especiais. Assegurar<br />
o controle de armas e o desarmamento,<br />
b<strong>em</strong> como uma legislação humanitária<br />
e de direitos humanos, deve ser<br />
ponto de registro <strong>em</strong> nossa agen<strong>da</strong> do<br />
dia. Reforçar o respeito pelo cumprimento<br />
<strong>da</strong> lei, <strong>em</strong> todos os sentidos é<br />
outro ponto de fun<strong>da</strong>mentação.<br />
Penso que, nesse sentido, dev<strong>em</strong>os<br />
tornar as Organizações mais eficientes<br />
na manutenção <strong>da</strong> paz e <strong>da</strong> segurança,<br />
<strong>da</strong>ndo a elas recursos e ferramentas<br />
para que elabor<strong>em</strong> adequa<strong>da</strong>mente a<br />
prevenção de conflitos, resolução pacífica<br />
de disputas, pois a construção e<br />
a manutenção <strong>da</strong> paz dev<strong>em</strong> ser fun<strong>da</strong>mentos<br />
de ação. Aí talvez o maior<br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
55
defesa social<br />
desafio dos operadores de Segurança<br />
Pública na cont<strong>em</strong>poranei<strong>da</strong>de. Mas,<br />
na<strong>da</strong> funcionará se não for reforça<strong>da</strong><br />
a cooperação entre as organizações,<br />
quaisquer que sejam elas: publicas ou<br />
priva<strong>da</strong>s. Que o Estado, por ex<strong>em</strong>plo,<br />
fortaleça a integração <strong>da</strong>s forças de<br />
Segurança. Isso não significa os partícipes<br />
<strong>da</strong>s forças an<strong>da</strong>r<strong>em</strong> de braços<br />
<strong>da</strong>dos pelas ruas afora, muito menos<br />
o órgão máximo se perder nas ações<br />
do dia-a-dia <strong>da</strong> estrutura de não-ação<br />
e <strong>em</strong>perrar a funcionali<strong>da</strong>de, se esquecendo<br />
de trabalhar o conceito estratégico<br />
<strong>da</strong> mobilização.<br />
Se aprofun<strong>da</strong>rmos um pouco mais,<br />
pod<strong>em</strong>os encontrar desde a incompetência<br />
<strong>da</strong> liderança <strong>em</strong> fazer o encontro,<br />
até mesmo <strong>da</strong> irracionali<strong>da</strong>de<br />
e <strong>da</strong> vai<strong>da</strong>de do exercício do poder<br />
pelo poder. Esse exercício do poder,<br />
pelo poder, é um erro estratégico dos<br />
piores e, aí se instalando, a Direção<br />
persevera na sua própria incompetência.<br />
Incompetência de fato, e<br />
de direito. Não se descura para o<br />
combate à criminali<strong>da</strong>de e à violência<br />
que, na cont<strong>em</strong>poranei<strong>da</strong>de, não se<br />
conseguirá avanços s<strong>em</strong> o compartilhamento<br />
entre Estado e Município,<br />
com as lideranças fixando o apego às<br />
decisões. Há que se ter atitude.<br />
Não se conseguirá muita coisa se a<br />
integração entre pessoas e organizações,<br />
para uma Segurança Pública<br />
coerente e visionaria, permanecer<br />
míope ou se tornar míope.<br />
A Gestão Estratégica de Segurança<br />
passa, inexoravelmente, pelo envolvimento<br />
do Município, com forte apego<br />
às decisões. Falo aqui <strong>da</strong> contribuição<br />
e envolvimento do Estado, no caso de<br />
Minas Gerais, pelo envolvimento <strong>da</strong><br />
Secretaria de Estado de Defesa Social,<br />
através <strong>da</strong> Polícia Militar principalmente,<br />
mas envolvendo o Corpo de<br />
Bombeiros, a Polícia Civil, o Sist<strong>em</strong>a<br />
Penitenciário, também o Ministério<br />
Público e o Judiciário, e os Municípios.<br />
56 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
É grande equivoco a mesquinhez de<br />
coibir a relação individualiza<strong>da</strong> dos<br />
gestores de segurança <strong>em</strong> aplacar<br />
a angústia dos ci<strong>da</strong>dãos. Em assim<br />
ocorrendo, ou seja, o afastar-se do<br />
Município levará automaticamente à<br />
fuga do ambiente onde ocorr<strong>em</strong> os<br />
probl<strong>em</strong>as de Segurança Pública.<br />
Dev<strong>em</strong>os levar <strong>em</strong> conta que os probl<strong>em</strong>as<br />
de Segurança Pública são locais<br />
e localmente dev<strong>em</strong> ser resolvidos.<br />
Ou seja, as táticas e técnicas de<br />
atuação de Polícia Ostensiva são adequa<strong>da</strong>s<br />
às concepções locais. A Polícia<br />
Militar, especialmente a de Minas Gerais,<br />
entende e age magistralmente<br />
nesse contexto. Não há, portanto, sentido<br />
<strong>em</strong> fazer o afastamento do Município.<br />
E n<strong>em</strong> t<strong>em</strong> sentido buscar padrão<br />
de funcionali<strong>da</strong>de na Europa ou<br />
<strong>em</strong> um país qualquer <strong>da</strong>s Américas,<br />
mesmo porque exist<strong>em</strong> competências<br />
suficientes no Brasil para <strong>da</strong>r vazão a<br />
tais ativi<strong>da</strong>des. Também não faz sentido<br />
a não-divulgação <strong>da</strong>s estatísticas<br />
para que os estudiosos possam se debruçar<br />
nos números e oferecer uma<br />
análise independente e fugaz para<br />
corroborar atitudes por parte dos segmentos<br />
de polícia. O professor Sapori<br />
já alertou, <strong>em</strong> seu blog, sobre a nãodivulgação<br />
<strong>da</strong>s estatísticas por parte<br />
de qu<strong>em</strong> t<strong>em</strong> o poder-dever de se pronunciar<br />
a respeito <strong>em</strong> Minas Gerais, e<br />
tomamos a liber<strong>da</strong>de para fazer coro<br />
nesse ponto de vista. Ressignificar faz<br />
sentido. Ser resiliente pode não <strong>da</strong>r o<br />
significado mais adequado.<br />
Destarte, é hora de redefinir o conceito<br />
de segurança de modo a abranger as<br />
necessi<strong>da</strong>des humanas e as reali<strong>da</strong>des<br />
ecológicas, afora o redirecionamento<br />
dos diversos fundos existentes, inclusive<br />
o de armamento, para segurança<br />
do ser humano e desenvolvimento<br />
sustentável. Isso não ocorrerá s<strong>em</strong> o<br />
compartilhamento entre as diversas<br />
forças do Sist<strong>em</strong>a de Defesa Social<br />
e s<strong>em</strong> o envolvimento do Município,<br />
que levará à construção de uma nova<br />
ord<strong>em</strong> social, estimulando a segurança<br />
coletiva global.<br />
“É hora de redefinir o<br />
conceito de segurança<br />
de modo a abranger<br />
as necessi<strong>da</strong>des<br />
humanas e as<br />
reali<strong>da</strong>des<br />
ecológicas”<br />
Buscar e atingir uma cultura de paz<br />
que leve o ci<strong>da</strong>dão a desenvolver<br />
uma consciência global, adquirir<br />
habili<strong>da</strong>des para resolver conflitos e<br />
lutar por justiça s<strong>em</strong> violência, além<br />
de viver por padrões internacionais<br />
de direitos humanos e igual<strong>da</strong>de,<br />
está no caminho do possível.<br />
Enfim, ter <strong>em</strong> mente e apreciar a<br />
diversi<strong>da</strong>de cultural. Tal cultura só<br />
pode ser alcança<strong>da</strong> com a educação<br />
sist<strong>em</strong>ática para a paz e a ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia.<br />
Quali<strong>da</strong>des como amor, tolerância,<br />
paciência, mentali<strong>da</strong>de comunitária e<br />
não-agressão dev<strong>em</strong> ser planeja<strong>da</strong>s e<br />
aplica<strong>da</strong>s <strong>em</strong> todos os níveis.<br />
Mas, ao enfrentarmos as questões <strong>da</strong><br />
criminali<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> violência, como<br />
também seu avanço, perceb<strong>em</strong>os que<br />
tal crescimento <strong>da</strong> violência urbana<br />
<strong>em</strong> suas múltiplas mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des -<br />
crime comum, crime organizado, violência<br />
doméstica, violação de direitos<br />
humanos, corrupção e outros delitos -<br />
constitui-se uma <strong>da</strong>s maiores preocupações<br />
<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de brasileira<br />
cont<strong>em</strong>porânea nas duas últimas déca<strong>da</strong>s.<br />
O sentimento de medo e insegurança<br />
diante do crime exacerbouse<br />
entre os mais distintos grupos e<br />
classes sociais, como suger<strong>em</strong> não<br />
poucas son<strong>da</strong>gens de opinião pública.<br />
Trata-se de um probl<strong>em</strong>a social que,<br />
por um ângulo, promove ampla mobilização<br />
<strong>da</strong> opinião pública, o que<br />
se pode observar nas pesquisas de<br />
opinião, na insistente atenção que
lhe é conferi<strong>da</strong> pela mídia impressa<br />
e eletrônica e pela multiplicação de<br />
fóruns locais, regionais e nacionais;<br />
por outro, v<strong>em</strong> promovendo impacto<br />
sobre o sist<strong>em</strong>a de justiça criminal,<br />
influenciando a formulação e impl<strong>em</strong>entação<br />
de políticas públicas de segurança<br />
e justiça, também chama<strong>da</strong>s<br />
de políticas públicas penais. Nesse<br />
domínio, o sist<strong>em</strong>a de justiça criminal<br />
se mostra completamente ineficaz na<br />
contenção <strong>da</strong> violência no contexto<br />
do estado d<strong>em</strong>ocrático de direito. Probl<strong>em</strong>as<br />
relacionados à lei e à ord<strong>em</strong><br />
têm afetado a crença dos ci<strong>da</strong>dãos<br />
nas instituições de justiça, estimulando<br />
não raro soluções priva<strong>da</strong>s para<br />
conflitos nascidos nas relações sociais<br />
e nas relações intersubjetivas.<br />
É por isso que a Segurança Pública permeia<br />
as ro<strong>da</strong>s de discussões. Se, por um<br />
lado, a criminali<strong>da</strong>de entra <strong>em</strong> nossos<br />
lares pelos meios de comunicação, é<br />
senso comum que o crime e a violência<br />
estão <strong>em</strong> níveis assustadores. Ca<strong>da</strong><br />
vez mais, a delinqüência está ao nosso<br />
lado. Somos vítimas <strong>da</strong> falta de políticas<br />
públicas efetivas e continua<strong>da</strong>s,<br />
com parâmetros de sustentação para o<br />
vir-a-ser. É como se o crescer-crescendo<br />
cedesse lugar à estagnação, ao desespero<br />
do hom<strong>em</strong> para ter, que perdeu<br />
sentido, assim como o ver<strong>da</strong>deiro valor<br />
<strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, <strong>em</strong> face <strong>da</strong> morte iminente,<br />
logo ali na esquina, como possibili<strong>da</strong>de<br />
nesse mundo de faltas.<br />
O relatório <strong>da</strong> ONU, divulgado <strong>em</strong> 1º<br />
de outubro de 2007, destaca o aumento<br />
<strong>da</strong> violência no Brasil por ação<br />
de facções criminosas. Embora tenha<br />
0,17% <strong>da</strong> população mundial, a ci<strong>da</strong>de<br />
de São Paulo t<strong>em</strong> 1% dos homicídios<br />
de todo o mundo. Juntamente com o<br />
Rio de Janeiro, representa metade dos<br />
crimes violentos do Brasil, um país<br />
onde morr<strong>em</strong> 100 pessoas por dia.<br />
No Brasil, há o envolvimento de<br />
jovens de até 25 anos <strong>em</strong> 2/3 dos<br />
crimes, sendo que já se registra a<br />
participação de crianças de seis anos<br />
<strong>em</strong> quadrilhas, como olheiros, mulas,<br />
enfim “os condutores <strong>da</strong>s drogas”.<br />
Esse particular é b<strong>em</strong> real <strong>em</strong> Minas<br />
Gerais, principalmente na “Guerra<br />
de Gangues” <strong>em</strong> algumas vilas e favelas.<br />
Como resultado, o Brasil t<strong>em</strong><br />
uma <strong>da</strong>s maiores taxas de homicídios<br />
praticados por jovens, com 32,5 casos<br />
por 100 mil habitantes, sendo que a liderança<br />
ain<strong>da</strong> é <strong>da</strong> Colômbia, com 84<br />
homicídios para ca<strong>da</strong> 100 habitantes.<br />
O custo <strong>da</strong> insegurança no Brasil consome<br />
aproxima<strong>da</strong>mente 11% do PIB.<br />
Nosso Estado de Minas Gerais não<br />
foge à regra. O crime e a violência<br />
ultrapassam os limites do considerado<br />
“normal” preconizado pelas<br />
autori<strong>da</strong>des. Nesse mister é comum<br />
a participação dos “Especialistas <strong>em</strong><br />
Segurança Pública”, que passaram a<br />
ditar as soluções simplistas para uma<br />
questão tão complexa. Mas o que é<br />
normal <strong>em</strong> Segurança Pública? É difícil<br />
estabelecer até porque estará na subjetivi<strong>da</strong>de<br />
<strong>da</strong>s pessoas o “termômetro”<br />
<strong>da</strong> avaliação, <strong>em</strong>bora exista definição<br />
de índices de aceitação. To<strong>da</strong>via,<br />
parece-nos adequa<strong>da</strong> a afirmativa de<br />
que: ”os padrões dos crimes mu<strong>da</strong>ram<br />
e as taxas de criminali<strong>da</strong>de parec<strong>em</strong><br />
ter se elevado consideravelmente <strong>em</strong><br />
Minas Gerais.”<br />
O Estado de Minas Gerais apresenta<br />
bons ex<strong>em</strong>plos de políticas públicas<br />
na área de Segurança Pública. Combater<br />
o crime e a criminali<strong>da</strong>de, e por<br />
derradeiro a violência, passou a ser<br />
ponto de consenso na estrutura <strong>da</strong>s<br />
políticas estabeleci<strong>da</strong>s pelo Governo<br />
do Estado. O caminho traçado, e <strong>em</strong><br />
implantação, passa pela integração<br />
<strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des de Segurança Pública.<br />
Embora se resuma na integração entre<br />
as Polícias Militar e Civil, de forma<br />
tími<strong>da</strong> o Estado de Minas Gerais deu<br />
um passo importante, um pouco atrasado<br />
é ver<strong>da</strong>de, já que ocorreu após<br />
diversos Estados Brasileiros ter<strong>em</strong><br />
experimentado a iniciativa.<br />
defesa social<br />
Em Minas Gerais, coube à Secretaria<br />
Estadual de Defesa Social sist<strong>em</strong>atizar<br />
as mu<strong>da</strong>nças no contexto <strong>da</strong><br />
Segurança Pública, inicialmente pela<br />
integração <strong>da</strong>s Polícias. Cria<strong>da</strong> no<br />
Governo Aécio Neves, foi um dos<br />
marcos <strong>da</strong> ação <strong>em</strong> benefício dos<br />
ci<strong>da</strong>dãos mineiros, mesmo não sendo<br />
algo novo, uma vez que já estava na<br />
agen<strong>da</strong>, principalmente <strong>da</strong> Polícia<br />
Militar, como pensamento estratégico.<br />
A defesa dessa iniciativa constava de<br />
pauta e discursos dos Coman<strong>da</strong>ntes-<br />
Gerais <strong>da</strong> ultima geração, principalmente<br />
porque não se podia mais viver<br />
o desconforto de se deslocar 30, 40<br />
ou até 80 km para registrar uma ocorrência<br />
policial, pois as delegacias de<br />
alguns municípios não funcionavam<br />
nos finais de s<strong>em</strong>ana. Não era adequa<strong>da</strong>,<br />
também, uma viatura <strong>da</strong> PM,<br />
<strong>em</strong>penha<strong>da</strong> <strong>em</strong> Ven<strong>da</strong> Nova (bairro<br />
de Belo Horizonte), deslocar-se até a<br />
Gameleira (bairro de Belo Horizonte)<br />
para registrar uma ocorrência de<br />
“drogas”, deixando desguarnecido<br />
seu setor de trabalho. Qu<strong>em</strong> perdia?<br />
Certamente o ci<strong>da</strong>dão, e a PM tinha<br />
consciência disso. Não se debita aqui<br />
qualquer responsabili<strong>da</strong>de a Polícia<br />
Civil, mesmo porque trabalhava <strong>em</strong><br />
estado de extr<strong>em</strong>a carência e fazia o<br />
que podia para minorar a situação. Era<br />
uma questão de Estado. Era questão<br />
de Política Pública que não existia<br />
neste País, neste Estado e muito<br />
menos nos Municípios.<br />
Certamente que os descalabros eram<br />
muitos e fazia-se necessário ter atitude<br />
para estabelecer as mu<strong>da</strong>nças no Sist<strong>em</strong>a<br />
de Segurança Pública <strong>em</strong> Minas<br />
Gerais. E o Governo Aécio teve essa<br />
atitude. Ninguém pode negar isso.<br />
Para fazer a integração <strong>da</strong>s ações de<br />
Polícia é necessário avançar no respeito<br />
<strong>da</strong> história de ca<strong>da</strong> instituição<br />
que compõe o sist<strong>em</strong>a de Defesa Social,<br />
perseverando na independência<br />
operacional, e deixar livres as ações<br />
pertinentes para o bom an<strong>da</strong>mento <strong>da</strong><br />
<strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
57
defesa social<br />
“Precisamos, <strong>em</strong> Minas<br />
Gerais, que se avance<br />
na inteligência policial,<br />
nas comunicações,<br />
<strong>em</strong> unir forças e<br />
competência para<br />
combater e, até<br />
mesmo, subjugar a<br />
criminali<strong>da</strong>de e a<br />
violência”<br />
Polícia Ostensiva ou Investigativa, ou<br />
de Bombeiros ou..., tendo <strong>em</strong> vista um<br />
bom des<strong>em</strong>penho <strong>da</strong>s Políticas de Segurança<br />
Pública, strictu sensu o que ca<strong>da</strong><br />
Instituição faz, que é diferente para o<br />
segmento que traça as estratégias <strong>da</strong><br />
Integração, pois estabelece as Políticas<br />
Públicas de Segurança. Precisamos, <strong>em</strong><br />
Minas Gerais, que se avance na inteligência<br />
policial, nas comunicações, <strong>em</strong><br />
unir forças e competência para combater<br />
e, até mesmo, subjugar a criminali<strong>da</strong>de<br />
e a violência. Isso é bom para<br />
a socie<strong>da</strong>de, é bom para todos.<br />
Certamente que Políticas Públicas na<br />
área de Segurança implicam no maior<br />
envolvimento do Estado por meio<br />
de Programas e Projetos com foco<br />
definido. A referência internacional<br />
do “Programa Fica Vivo” é um bom<br />
ex<strong>em</strong>plo para o Estado de como as<br />
coisas pod<strong>em</strong> acontecer e aconteciam<br />
mesmo antes do próprio Estado acor<strong>da</strong>r<br />
para a questão. Ouvi o ilustríssimo vicegovernador<br />
dizer <strong>em</strong> uma palestra que<br />
o “Programa Fica Vivo” foi reconhecido<br />
pela ONU como ex<strong>em</strong>plo de ação na<br />
área <strong>da</strong> Segurança Pública. É ótimo!<br />
Que bom que isto tenha acontecido,<br />
pois o “Fica Vivo” e o “Olho Vivo” são<br />
programas nascidos dentro <strong>da</strong> Polícia<br />
Militar de Minas Gerais.<br />
O bom é que, de um lado, há o determinismo<br />
do Estado de Minas Gerais<br />
<strong>em</strong> combater o crime, a criminali<strong>da</strong>de<br />
58 <strong>FGR</strong> EM REVISTA<br />
e a violência, por ação de suas polícias<br />
com base nas políticas desenha<strong>da</strong>s.<br />
De outro, clama por uma integração<br />
que resulte <strong>em</strong> uma efetivi<strong>da</strong>de e<br />
compromisso com a comuni<strong>da</strong>de.<br />
As notícias diárias de assaltos, roubos,<br />
furtos, homicídios, estelionatos e outros<br />
crimes agrid<strong>em</strong> nossos olhos e<br />
ouvidos no cotidiano. Agrid<strong>em</strong> mais<br />
ain<strong>da</strong> as notícias dos desvios praticados<br />
por deputados, senadores, prefeitos,<br />
vereadores: os “sanguessugas”,<br />
os “cuecões”, o escân<strong>da</strong>lo <strong>da</strong>s ambulâncias<br />
e tantos ouros crimes praticados<br />
pelos políticos, nossos representantes.<br />
T<strong>em</strong>os que nos indignar sim.<br />
T<strong>em</strong>os que nos manifestar, mas, sobretudo,<br />
dev<strong>em</strong>os colocar na agen<strong>da</strong> do<br />
dia uma pauta que nos conduza nos<br />
propósitos de “Associar-se para a Paz”.<br />
Estar junto dos Órgãos de Defesa<br />
Social. Interagir. Manifestar apoio.<br />
Compor com as autori<strong>da</strong>des momentos<br />
mágicos para debelar essa síndrome<br />
que vasta o Brasil e, <strong>em</strong> especial, nosso<br />
Estado de Minas Gerais. Eis a questão.<br />
Também que os ver<strong>da</strong>deiros operadores<br />
de Segurança Pública, os mestres<br />
<strong>em</strong> Polícia Ostensiva, muitos<br />
deles fora <strong>da</strong> ativa de suas corporações,<br />
possam cooperar com o dia-adia<br />
operacional ofertando estudos,<br />
ofertando experiências, pois, de outra<br />
forma, os analistas de segurança, figuras<br />
que hoje viraram mo<strong>da</strong>, continuarão<br />
apresentando soluções acadêmicas,<br />
muitas delas produzi<strong>da</strong>s por<br />
nós mesmos, de nossos trabalhos, de<br />
nossos esforços, e dev<strong>em</strong>os ser críticos<br />
quanto a isso.<br />
Até a reestruturação do Sist<strong>em</strong>a de<br />
Segurança Pública <strong>em</strong> Minas Gerais,<br />
a Polícia Militar recebia uma carga<br />
de responsabili<strong>da</strong>de acima dos contextos<br />
próprios do sist<strong>em</strong>a. A PMMG<br />
procurava resolver seus probl<strong>em</strong>as,<br />
os <strong>da</strong> Segurança Pública e outros não<br />
pertinentes a ela, mas a socie<strong>da</strong>de<br />
era pr<strong>em</strong>i<strong>da</strong> pela desorganização dos<br />
órgãos públicos. Havia o auspício <strong>da</strong><br />
falácia de que era a única instituição<br />
que funcionava. E poderia ser mesmo!<br />
Um dos pontos significativos no<br />
desenvolvimento <strong>da</strong>s ações <strong>da</strong> PM<br />
foi, s<strong>em</strong> dúvi<strong>da</strong>, desvencilhar-se<br />
<strong>da</strong> maioria desses encargos, cujos<br />
responsáveis se eximiam deles. É<br />
muito importante que se separe<br />
Polícia Militar de Segurança Pública,<br />
mesmo porque esta está conti<strong>da</strong><br />
naquela e passa pelo fortalecimento<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia, pela participação ativa<br />
<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de na solução dos conflitos<br />
e pela correta percepção do papel <strong>da</strong>s<br />
diversas instituições coloca<strong>da</strong>s pelo<br />
Estado à sua disposição.<br />
Não obstante, precisamos estabelecer<br />
estratégias para uma redução significativa<br />
<strong>da</strong> violência e criminali<strong>da</strong>de<br />
<strong>em</strong> Minas Gerais. O mineiro está com<br />
medo. A violência está ca<strong>da</strong> vez mais<br />
próxima de ca<strong>da</strong> um de nós, t<strong>em</strong>os<br />
medo de sermos as próximas vitimas<br />
e de não sabermos como reagir.<br />
Finalmente, pod<strong>em</strong>os dizer que, <strong>em</strong>bora<br />
o controle do crime e <strong>da</strong> violência<br />
seja estatístico, está d<strong>em</strong>onstrado que<br />
o crime é um fenômeno causado por<br />
amplo número de fatores e estudos. As<br />
estatísticas disponíveis d<strong>em</strong>onstram<br />
que a vitimização, com sua alta taxa,<br />
além <strong>da</strong> prevalência <strong>da</strong> sensação de<br />
insegurança como fonte alimentadora<br />
<strong>da</strong> violência social, favorece ain<strong>da</strong> ao<br />
inusitado aparecimento e apoio de soluções<br />
populistas e ineficazes, muitas<br />
delas apresenta<strong>da</strong>s pelos “Especialistas<br />
de Segurança Pública”.<br />
Avaro Antônio Nicolau - Cel. QOR <strong>da</strong> PMMG,<br />
Especialista <strong>em</strong> Criminologia na Acad<strong>em</strong>ia de<br />
Polícia Civil/MG; Administração, com ênfase<br />
<strong>em</strong> Micro e Pequenas Empresas, com especialização<br />
na Universi<strong>da</strong>de Federal de Lavras/MG;<br />
Direito, pela Facul<strong>da</strong>de de Direito do Oeste de<br />
Minas Gerais - Divinópolis /MG; Psicologia,<br />
no Centro Universitário Newton de Paiva;<br />
Diretor de Segurança na Fun<strong>da</strong>mig e Parceiro<br />
Voluntário na Socie<strong>da</strong>de Cruz de Malta.
Nota Fiscal ElEtrôNica<br />
Uma solUção iNtEligENtE para a<br />
admiNistração pública<br />
NF- e<br />
As prefeituras de Minas Gerais já pod<strong>em</strong> contar com os serviços especializados <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong><br />
<strong>Rosa</strong> para implantação <strong>da</strong> Nota Fiscal Eletrônica: um sist<strong>em</strong>a ágil e moderno que substitui a nota fiscal<br />
<strong>em</strong> papel por um documento fiscal eletrônico com vali<strong>da</strong>de jurídica para todos os fins. Um avanço que vai<br />
facilitar a vi<strong>da</strong> do contribuinte, tornando to<strong>da</strong> a operação tributária mais econômica e confiável.<br />
A Fun<strong>da</strong>ção <strong>Guimarães</strong> <strong>Rosa</strong> garante segurança e atendimento à legislação na implantação <strong>da</strong> Nota Fiscal<br />
Eletrônica no seu município.<br />
MAIS INFORMAÇÕES: (31) 3263-1600 • www.fgr.org.br