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C:\ARQUIVO DE TRABALHO 2011\EDI - Unama

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1<br />

REVISTA DO CENTRO <strong>DE</strong> CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLOGIA<br />

v. 12, n. 25 • junho de 2010<br />

TRAÇOS<br />

ISSN 1516-0025<br />

Belém v.12 n.25 p. 1-165 jun. 2010


2<br />

REVISTA DO CENTRO <strong>DE</strong> CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLOGIA<br />

C 2010, UNIVERSIDA<strong>DE</strong> DA AMAZÔNIA<br />

REITOR<br />

Antonio de Carvalho Vaz Pereira<br />

VICE-REITOR<br />

Henrique Guilherme Carlos Heidtmann Neto<br />

PRÓ-REITOR <strong>DE</strong> ENSINO<br />

Mário Francisco Guzzo<br />

PRÓ-REITORA <strong>DE</strong> PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO<br />

Núbia Maria de Vasconcelos Maciel<br />

DIRETOR DO CENTRO <strong>DE</strong> CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLOGIA E<br />

COOR<strong>DE</strong>NADOR DO CURSO <strong>DE</strong> ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL<br />

EVARISTO CLEMENTINO REZEN<strong>DE</strong> DOS SANTOS<br />

COOR<strong>DE</strong>NADOR DO CURSO <strong>DE</strong> ARQUITETURA E URBANISMO<br />

JOSÉ AKEL FARES FILHO<br />

COOR<strong>DE</strong>NADOR DO CURSO <strong>DE</strong> ENGENHARIA CIVIL<br />

SELÊNIO FEIO DA SILVA<br />

COOR<strong>DE</strong>NADOR DO CURSO <strong>DE</strong> ENGENHARIA <strong>DE</strong> PRODUÇÃO<br />

ANDRÉ CRISTIANO SILVA MELO<br />

COOR<strong>DE</strong>NADOR DO CURSO <strong>DE</strong> TECNOLOGIA EM PROCESSAMENTO <strong>DE</strong> DADOS<br />

CLÁUDIO OTÁVIO MENDONÇA <strong>DE</strong> LIMA<br />

COOR<strong>DE</strong>NADOR DO CURSO <strong>DE</strong> BACHARELADO EM CIÊNCIA DA COMPUTAÇÃO<br />

MAURO MARGALHO COUTINHO<br />

COOR<strong>DE</strong>NADORA DO CURSO <strong>DE</strong> ARTES VISUAIS E TECNOLOGIA DA IMAGEM<br />

ANA <strong>DE</strong>L TABOR VASCONCELOS MAGALHÃES<br />

COOR<strong>DE</strong>NADOR DO CURSO <strong>DE</strong> LICENCIATURA EM MATEMÁTICA<br />

MIGUEL CHAQUIAM<br />

EXPEDIENTE<br />

EDIÇÃO: Editora UNAMA<br />

RESPONSÁVEL: João Carlos Pereira<br />

SUPERVISÃO: Helder Leite<br />

NORMALIZAÇÃO: Maria Miranda<br />

FORMATAÇÃO GRÁFICA: Elailson Santos<br />

REVISÃO <strong>DE</strong> TEXTO: Luis F. Branco<br />

PROJETO DA CAPA: Fernanda Beliche<br />

ILUSTRAÇÃO DA CAPA: Fernando Navarro<br />

“Campus” Alcindo Cacela<br />

Av. Alcindo Cacela, 287<br />

66060-902 - Belém-Pará<br />

Fone geral: (91) 4009-3000<br />

Fax: (91) 3225-3909<br />

“Campus” BR<br />

Rod. BR-316, km3<br />

67113-901 - Ananindeua-Pa<br />

Fone: (91) 4009-9200<br />

Fax: (91) 4009-9308<br />

“Campus” Quintino<br />

Trav. Quintino Bocaiúva, 1808<br />

66035-190 - Belém-Pará<br />

Fone: (91) 4009-3300<br />

Fax: (91) 4009-0622<br />

“Campus” Senador Lemos<br />

Av. Senador Lemos, 2809<br />

66120-901 - Belém-Pará<br />

Fone: (91) 4009-7100<br />

Fax: (91) 4009-7153<br />

Catalogação na fonte<br />

www.unama.br<br />

T759t Traços: revista do Centro de Ciências Exatas e Tecnologia - Belém: UNAMA, v. 12, n. 25,<br />

2010.<br />

165 p.<br />

ISSN: 1516-0025<br />

1. Ciências exatas. 2. Ciências exatas - pesquisa. 3. Ciências exatas-estudos de caso.<br />

1. Periódicos.<br />

CDD: 507.2


3<br />

REVISTA DO CENTRO <strong>DE</strong> CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLOGIA<br />

v. 12 n. 25 2010<br />

EDITORIAL ......................................................................................................................................... 5<br />

ARTIGOS ............................................................................................................................................ 7<br />

AMAZÔNIA: BORRACHA X <strong>DE</strong>SENVOLVIMENTO ECONÔMICO ........................................................ 9<br />

AMAZON: RUBBER X ECONOMIC <strong>DE</strong>VELOPMENT<br />

Alexandre Martins de Lima<br />

ESTUDO PRELIMINAR SOBRE SISMICIDA<strong>DE</strong>:<br />

CLASSIFICAÇÃO, RECORRÊNCIA E ANÁLISE <strong>DE</strong> SEUS RISCOS ..........................................................29<br />

PRELIMINARY STUDY OF SEISMICITY: CLASSIFICATION,<br />

RECURRENCE AND ANALYSIS OF ITS RISKS<br />

Selênio Feio da Silva<br />

Evaristo Clementino Rezende dos Santos Junior<br />

Alexandre Andrade Brandão Soares<br />

Felipe Rodrigues Ribeiro<br />

Jeferson de Oliveira Bezerra<br />

CARACTERIZAÇÃO FÍSICA E MINERALÓGICA DO LODO DA ETA BOLONHA,<br />

ARGILAS GORDA E MAGRA PARA CONFECÇÃO DA MASSA CERÂMICA ......................................... 43<br />

(PHYSICAL AND MINERALOGICAL CHARACTERIZATION OF SLUDGE FROM ETA BOLONHA<br />

CLAY, FAT AND LEAN MASS FOR MAKING CERAMICS)<br />

Elzelis de Aguiar Muller<br />

Luiza Girard Teixeira Machad<br />

Alberto Carlos de Melo Lima<br />

AVALIAÇÃO HIDRÁULICA E <strong>DE</strong> POLUENTES DO AFLUENTE <strong>DE</strong> ESTAÇÃO <strong>DE</strong> TRATAMENTO<br />

<strong>DE</strong> ESGOTO (ETE) <strong>DE</strong> AEROPORTO <strong>DE</strong> GRAN<strong>DE</strong> PORTE ...................................................................55<br />

EVALUATION OF HYDRAULIC AND ORGANIC LOAD FROM THE AIRPORT OF ETE LARGE<br />

Adiel José Passos da Cunha Júnior<br />

Neyson Martins Mendonça<br />

Márcia Valéria Porto de Oliveira Cunha<br />

Luiza Carla Girard Texeira Machado<br />

Robson Costa da Costa<br />

TRAÇOS<br />

Belém v.12 n.25 p. 1-165 jun. 2010


4<br />

COMO ORÇAR OBRAS PÚBLICAS: <strong>DE</strong>SCOBRINDO O MITO DO BDI! ...............................................71<br />

HOW TO MEASURE PUBLIC BUILDING:<br />

FINDING OUT THE MYTH OF BIE (BENEFITS AND INDIRECT EXPENSES)!<br />

Irandir de Castro Diniz<br />

Renato Martins das Neves<br />

Rui Guilherme Cavaleiro de Macedo Alves<br />

PÓ REATIVO NAS OBRAS <strong>DE</strong> BELÉM: UMA NOVA TENDÊNCIA .......................................................85<br />

REACTIVE POW<strong>DE</strong>R IN CONSTRUCTIONS OF BELÉM: A NEW TREND<br />

José Zacarias Rodrigues da Silva Junior<br />

Mariana Domingues von Paumgartten<br />

ANÁLISE <strong>DE</strong> MÉTRICAS <strong>DE</strong> ROTEAMENTO UTILIZANDO VOIP E VÍ<strong>DE</strong>O<br />

EM RE<strong>DE</strong>S EM MALHA SEM FIO ....................................................................................................105<br />

ANALYSIS OF ROUTING METRICS USING VOIP AND<br />

VI<strong>DE</strong>O ON WIRELESS MESH NETWORKS<br />

André F. Riker<br />

Elisangela S. Aguiar<br />

ESTUDO SOBRE DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E SAZONAL DAS ESPÉCIES <strong>DE</strong><br />

BAGRES MARINHOS (SILURIFORMES: ARIIDAE) DO ESTUÁRIO AMAZÔNICO ...............................123<br />

STUDY ABOUT DISTRIBUTION SPACE AND SPATIAL THE SPECIES OH THE CATFISH<br />

(SILURIFORMES: ARIIDAE) OF THE AMAZON STUARY)<br />

Fabrício Lemos de Siqueira Mendes<br />

Ronaldo Borges Barthem<br />

<strong>DE</strong>TERMINAÇÃO E MO<strong>DE</strong>LAGEM DO VOLUME TOTAL <strong>DE</strong><br />

PINUS CARIBAEA VAR BAHAMENSIS: UMA ABORDAGEM MULTIVARIADA ..................................133<br />

<strong>DE</strong>TERMINATION AND MO<strong>DE</strong>LING OF THE TOTAL VOLUME OF PINUS CARIBAEA<br />

VAR BAHAMENSIS: A MULTIVARIATE APPROACH<br />

Mário Diego Rocha Valente<br />

João Guimarães Pinheiro<br />

Waldenei Travassos Queiroz<br />

FATORES FAMILIARES E ESCOLARES PREPON<strong>DE</strong>RANTES NO <strong>DE</strong>SEMPENHO<br />

ESCOLAR DOS ESTUDANTES DAS REGIÕES NORTE E SU<strong>DE</strong>STE ......................................................147<br />

FAMILY AND SCHOOL FACTORS PREPO<strong>DE</strong>RANT IN PERFORMANCE SCHOOL OF<br />

THE STU<strong>DE</strong>NTS OF REGIONS NORTH AND SOUTHEAST<br />

Diego Rafael Reis Duarte<br />

John Anthony da Conceição Pantoja<br />

Sérgio Castro Gomes


EDITORIAL5<br />

ARevista TRAÇOS completa este ano o seu décimo segundo ano de existência,<br />

contemplando a comunidade da região com um rol de artigos técnico-científicos,<br />

no momento em que o CCET – Centro de Ciências Exatas e Tecnologia da<br />

Universidade da Amazônia completa 30 anos de existência, iniciado com o saudoso<br />

professor David Mufarrej como Diretor.<br />

Os primeiros cursos iniciados em agosto de 1980 foram Arquitetura e Urbanismo,<br />

Engenharia Civil e Licenciatura em Matemática. Atualmente o CCET agrega, além dos<br />

cursos citados, os cursos de Artes Visuais e Tecnologia da Imagem, Ciência da Computação,<br />

Engenharia de Produção, Engenharia Sanitária e Ambiental, Rede de Computadores,<br />

Sistemas de Informação, Tecnologia em Design de Interiores e Tecnologia em<br />

Processamento de Dados. Além dos cursos de graduação, estão vinculados ao CCET<br />

diversos cursos de especialização e mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente<br />

Urbano.<br />

As questões relacionadas à nossa região estão presentes em todas as edições<br />

anteriores e mantida nesta também. Os trabalhos constantes neste número e nos<br />

anteriores têm contribuído efetivamente para o desenvolvimento da região e, por<br />

conseguinte, consolidação da missão da <strong>Unama</strong>, “Educação para o desenvolvimento da<br />

Amazônia”, abrangendo as áreas da Computação, Engenharia e Matemática<br />

A partir deste semestre passamos a disponibilizar a versão on-line desta Revista<br />

por meio do site www.unama.br/revistatracos, onde constam todos os exemplares<br />

anteriores. A publicação da Revista TRAÇOS on-line amplia sua circulação, facilitando a<br />

permuta para a versão impressa e cadastro de novas assinaturas. As publicações da<br />

Revista TRAÇOS, impressa e eletrônica, ganham maiores dimensões se levado em conta<br />

as transformações que passa o ensino superior no Brasil e, em particular, na <strong>Unama</strong>.<br />

A Revista TRAÇOS está aberta para publicações de trabalhos inéditos de autores<br />

brasileiros e estrangeiros, em forma de artigo científico, redigidos em português,<br />

espanhol ou inglês, desde que obedecidos o Regulamento e as Normas para publicação.<br />

Miguel Chaquiam<br />

Coordenador do Curso de Matemática


7<br />

REVISTA DO CENTRO <strong>DE</strong> CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLOGIA<br />

EDIÇÃO Nº 25<br />

CA<strong>DE</strong>RNO <strong>DE</strong> ARTIGOS<br />

TÉCNICOS E CIENTÍFICOS<br />

CONSELHO EDITORIAL:<br />

Alberto Carlos de Melo Lima<br />

Ana Del Tabor Vasconcelos Magalhães<br />

André Cristiano Silva Melo<br />

Antônio Erlindo Braga Júnior<br />

Cláudio Alex Jorge da Rocha<br />

Cláudio Otávio Mendonça de Lima<br />

Débora Bandeira Moraes Trindade (Secretária)<br />

Elzelis de Aguiar Müller<br />

Evaristo Clementino Rezende dos Santos<br />

(Presidente)<br />

Filomena Mata Vianna Longo<br />

Janice Shirley de Souza Lima<br />

José Akel Fares Filho<br />

José Augusto Furtado Real<br />

Miguel Chaquiam<br />

Natanael Freitas Cabral<br />

Selênio Feio da Silva<br />

COMITÊ CIENTÍFICO INTERNO:<br />

Benedito Coutinho Neto<br />

Elcione Maria Lobato de Moraes<br />

Fábio José da Costa Alves<br />

Hélio Raymundo Ferreira Filho<br />

Leonardo Augusto Oliveira Bello<br />

Marco Aurélio Arbage Lobo<br />

Marisa de Oliveira Mokarzel<br />

Mauro Margalho Coutinho<br />

Pedro Franco de Sá<br />

Ruy Guilherme de Castro Almeida<br />

Maisa Sales Gama Tobias<br />

Sérgio Castro Gomes<br />

COMITÊ CIENTÍFICO EXTERNO:<br />

Édison da Silva Farias - UFPA<br />

Eliane Gonçalves Gomes - EMBRAPA-DF<br />

Iran Abreu Mendes - UFRN<br />

Lindemberg Lima Fernandes - UFPA<br />

Marcelo Câmara dos Santos - UFPE<br />

Maria Seráfico Pinheiro - UFPA<br />

Simaia do Socorro Sales das Mercês - UFPA<br />

Thienne Mesquita Johnson - USP-SP


9<br />

AMAZÔNIA:<br />

BORRACHA X <strong>DE</strong>SENVOLVIMENTO ECONÔMICO<br />

Alexandre Martins de Lima *<br />

RESUMO<br />

A partir do processo de vulcanização descoberto por Goodyear em meados do século<br />

XIX, a borracha tornou-se matéria-prima indispensável para as grandes economias<br />

mundiais. O inegável monopólio da produção do látex na Amazônia era um constante<br />

foco de disputas internacionais, e sua importância crescente fez com que o seu<br />

controle evoluísse de uma questão comercial para um status de fator econômico<br />

vital no desenvolvimento de políticas nacionais em nações como Estados Unidos e<br />

Inglaterra. Ao abordar o ciclo da borracha na Amazônia através da teoria<br />

schumpeteriana do desenvolvimento econômico, observa-se que a tradição do<br />

modelo econômico extrativista da região não possibilitou o surgimento para<br />

atividades empreendedoras conforme preconizado pelo modelo schumpeteriano.<br />

Além disso, o monopólio amazônico não se constituiu em barreira de mercado que<br />

garantisse sua manutenção. Sob outro foco de análise, o modelo de desenvolvimento<br />

econômico de Schumpeter é mais claramente observado no mercado externo através<br />

dos ciclos econômicos de curta duração.<br />

Palavras-Chave: Desenvolvimento Econômico. Amazônia. Schumpeter.<br />

ABSTRACT<br />

AMAZON:<br />

RUBBER X ECONOMIC <strong>DE</strong>VELOPMENT<br />

From vulcanization process discovered by Goodyear in the mid-nineteenth century, rubber<br />

became an indispensable raw material for world economies. The undeniable amazonic<br />

monopoly of natural rubber production was a constant focus of international disputes,<br />

and its growing importance has made its control evolved from a commercial matter for a<br />

status of vital economic factor in the development of national policies in countries like the<br />

* Arquiteto e urbanista; professor da Universidade da Amazônia – UNAMA; mestre em Engenharia Civil; doutorando<br />

do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável no Trópico Úmido do Núcleo de Altos Estudos<br />

Amazônicos – NAEA/UFPA e bolsista da FI<strong>DE</strong>SA – Fundação Instituto para o Desenvolvimento da Amazônia.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 9-27, jun. 2010


10<br />

United States and England. Peering the amazonic rubber boom through Schumpeter’s<br />

Theory of Economic Development, this paper notes that traditional extractive economic<br />

model of the region did not allow entrepreneurial activities as recommended by the<br />

Schumpeterian model. Moreover, the amazonic didn’t act as a market barrier to guarantee<br />

its maintenance. By other focus of analysis, Schumpeter’s Theory of Economic Development<br />

is most clearly seen in the external market through economic cycles of short duration.<br />

Keywords: Economic Development. Amazonia. Schumpeter.<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

Em 21 de março de 1833, três anos antes de irromper a Revolução Cabana, Antônio<br />

Ladislau Monteiro Baena concluía o Ensaio Corográfico sobre a Província do Pará. Sua<br />

incumbência era reorganizar a composição estatística da província, atualizando antigas<br />

informações e buscando outras mais que pudessem compor uma imagem verossímil do<br />

Pará da década de 30 do século XIX. Em sua obra, Baena descreve com bastante riqueza<br />

de detalhes o meio físico, a população, os costumes, a fauna e a exuberante flora da<br />

província. Dentre as várias descrições da flora, tem-se:<br />

Seringueira: árvore de várzea, de que se tira a goma elástica pelo estilo aprendido<br />

dos Cambebas, que farão os primeiros, a quem virão fabricar esta resina.<br />

À época de Baena, alguns produtos fabricados com o látex já eram conhecidos,<br />

porém ainda não tinham alcançado um patamar de ampla utilização. Entre os anos de<br />

1837 a 1840, em pleno período da revolta cabana, o metodista Daniel Parish Kidder, que<br />

esteve em viagem pelo Brasil, chegando à província do Pará, também escreveu sobre a<br />

goma elástica retirada das árvores:<br />

O europeu aprendeu o uso da goma elástica ou borracha com os Omaguás,<br />

uma tribo de índios brasileiros. Com a borracha, os selvagens fabricavam<br />

diversas vasilhas semelhantes a garrafas e seringas. Era hábito desse povo<br />

presentear os convivas com tais utensílios, no início das suas festas.<br />

A despeito da controvérsia entre Baena e Kidder sobre a tribo da qual o europeu<br />

assimilou o uso da borracha, o fato é que as observações de Kidder, possivelmente<br />

motivadas pelas possibilidades de uso da goma elástica, vão mais além, chegando a<br />

citar os produtos feitos com o látex imprescindíveis ao mundo civilizado:<br />

Os colonizadores portugueses, do Pará, foram os primeiros a empregar a goma<br />

elástica para outros fins, fabricando com ela sapatos, botas, chapéus e roupas.<br />

A utilidade desse material ressaltou do fato de ser o país muito sujeito a chuvas<br />

e inundações. Entretanto, hoje em dia, o desenvolvimento dos processos de<br />

fabricação dilatou enormemente a aplicação da borracha, a ponto de se tornar<br />

artigo indispensável pra a saúde e conforto de todo mundo civilizado.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 9-27, jun. 2010


11<br />

Talvez inadvertidamente Kidder tenha vaticinado sobre o futuro promissor do<br />

látex amazônico. Contudo, neste período, a produção da borracha apresentava pouca<br />

agregação de valor, e os produtos confeccionados sofriam com as variações térmicas,<br />

tornando-se grudentos e pegajosos com o excesso de calor, ou quebradiços quando<br />

importados e submetidos ao frio. A falta de estabilidade da borracha era um problema<br />

particular para a exportação, mesmo quando in natura.<br />

Na década posterior, a Região Amazônica foi intensamente visitada por<br />

expedições naturalistas, dentre elas, a de Alfred Russel Wallace e Henry Walter Bates,<br />

em 1848. Em seus relatos sobre a região, Wallace também se impressiona com alguns<br />

espécimes das quais o nativo da região extraía o látex. Uma era a maçaranduba (Manilkara<br />

salzmannii), ou árvore do leite, cujo látex é comestível, a outra, a Siphonia elastica, cuja<br />

seiva era usada para o fabrico da borracha. Wallace e Bates atentaram para uma<br />

característica das seringueiras que se tornaria um condicionante fundamental para a<br />

extração do látex: as árvores de seringa encontravam-se dispersas em um amplo raio no<br />

meio da floresta, e a coleta, até então, era feita em trechos em que os numerosos<br />

cursos d’água ofereciam acesso rápido.<br />

A partir de 1870, a produção do látex amazônico foi afetada pro propósitos<br />

claramente econômicos. A demanda do mercado externo aumentou sobremaneira,<br />

gerando um consequente aumento na produção gomífera, que atinge seu ápice, e<br />

também seu ponto de inflexão, em 1910. Neste ano, outro viajante, Paul Walle,<br />

descreveria a economia gomífera na Amazônia da seguinte forma:<br />

Ninguém hoje ignora que o cautchu constitui a principal indústria dos estados<br />

amazônicos, Pará e Amazonas, aos quais temos de acrescentar o Território<br />

Federal do Acre. Trata-se do seu mais fecundo elemento de riqueza, o mais<br />

poderoso fator do enorme progresso comercial e material desses estados.<br />

Sua prosperidade presente resulta quase que exclusivamente da exploração e<br />

do rendimento deste produto. [...] O Brasil é incontestavelmente o maior<br />

produtor de cautchu do mundo.<br />

A Amazônia deteve, segundo Weinstein (1993), praticamente um monopólio da<br />

produção de látex, contudo, o contrabando de sementes de Hevea para a Ásia contribuiu,<br />

atesta Prado Jr (1985), para o declínio desta cultura no setentrião amazônico. A seu<br />

turno, Sarges (2002) observa que a partir de 1910 ocorre o solapar de uma fase de<br />

crescimento, quando a região amazônica começou a sofrer os impactos do descenso da<br />

economia da borracha causado pela forte concorrência asiática.<br />

O que a historiografia convencionou como boom da borracha, ou ciclo da borracha,<br />

na região Amazônica, já foi intensa e extensivamente explorado por autores do calado de<br />

Weinstein (1993), Pinto (1984), Oliveira Filho (1979) e Sarges (2002). Longe da pretensa<br />

intenção de desconsiderar os estudos já produzidos, e cônscios da possível impossibilidade<br />

de acrescentar novos dados aos mesmos, tencionamos com o presente artigo abordar o<br />

ciclo da borracha na Amazônia através da perspectiva das Teorias Econômicas, mais<br />

especificamente a Teoria do Desenvolvimento Econômico elaborada por Joseph Alois<br />

Schumpeter. Contudo, para tal, faz-se mister uma revisão da Teoria em questão.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 9-27, jun. 2010


12<br />

2 <strong>DE</strong>SENVOLVIMENTO<br />

2.1 TEORIA DO <strong>DE</strong>SENVOLVIMENTO ECONÔMICO <strong>DE</strong> SCHUMPETER<br />

Joseph Alois Schumpeter, nascido em Trieste, atual República Tcheca, em 1883,<br />

mesmo ano da morte de Karl Marx, estudou economia na Universidade de Viena. Sua<br />

brilhante capacidade de raciocínio permitiu que em 1911, aos 28 anos de idade,<br />

publicasse um clássico da literatura econômica: Teoria do desenvolvimento econômico<br />

(doravante denominada T<strong>DE</strong>). A despeito de T<strong>DE</strong> ser sua obra de maior reconhecimento,<br />

Costa (2006) esclarece que sua produção acadêmica foi bastante profícua, e dentre suas<br />

principais obras destacam-se A natureza e a essência da economia teórica, de 1908,<br />

Teoria do desenvolvimento econômico, de 1911, Imperialismo e classes sociais, de 1919,<br />

Business cycles, de 1939, Capitalismo, socialismo e democracia, de 1942, e História da<br />

análise econômica, obra póstuma, de 1954.<br />

O pensamento econômico de Schumpeter, segundo Moriochi e Gonçalves (1994),<br />

foi influenciado por Marx, bem como pelas descobertas científicas vivenciadas ao redor<br />

do mundo na virada do século XIX para o XX, e que marcaram sobremaneira a história da<br />

economia. Ainda que no campo ideológico-filosófico Schumpeter tenha adotado uma<br />

visão oposta à visão marxista, segundo os retromencionados autores, Schumpeter parece<br />

ter herdado de Karl Marx uma visão dinâmica do processo de desenvolvimento, já que<br />

este desenvolveu um modelo bastante abrangente, chegando mesmo a considerar neste<br />

modelo as manifestações culturais.<br />

No caso do modelo de desenvolvimento de Schumpeter, o mesmo não apresenta o<br />

nível de generalidades do modelo marxista, pois é um modelo construído para explicar o<br />

desenvolvimento da economia capitalista; contudo, a influência marxista no modelo de<br />

desenvolvimento schumpeteriano finda neste ponto, uma vez que para proceder a análise<br />

do processo econômico, Schumpeter parte de algumas premissas dos economistas<br />

neoclássicos, como a teoria do fluxo circular e a teoria do equilíbrio geral, de Léon Walras.<br />

Ainda que sua obra utilize conceitos da economia neoclássica, Schumpeter tem<br />

concepções próprias relativas a determinados pontos da análise econômica, porém o<br />

que mais o distingue dos neoclássicos, na visão de Moriochi e Gonçalves (1994), é seu<br />

aporte mais amplo do processo de desenvolvimento e por tentar desvendar o processo<br />

de variação econômica, dificilmente explicável sob a ótica estática das teorias<br />

neoclassicistas. Assim, com a intenção de aproximar-se dos movimentos da economia<br />

capitalista, Schumpeter constrói em T<strong>DE</strong> uma imagem mental, como se fosse um<br />

protótipo do mecanismo econômico:<br />

Para isso, pensemos primeiramente num Estado organizado comercialmente,<br />

no qual vigorem a propriedade privada, a divisão do trabalho e a livre<br />

concorrência.<br />

Partindo desta condição de contorno, o autor assume a existência de uma<br />

tendência ao equilíbrio geral entre os determinantes imediatos da produção de uma<br />

economia, que segundo os autores tradicionais, seriam a quantidade e qualidade de<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 9-27, jun. 2010


13<br />

força de trabalho, a quantidade e composição do estoque de capitais, a natureza das<br />

condições dos recursos naturais e o nível tecnológico. Sob esta perspectiva, a posição<br />

do estado ideal de equilíbrio muda em função do grau de utilização e das taxas de<br />

aumento desses elementos produtivos, porém tais mudanças assumem papéis<br />

meramente adaptativos, compatíveis com oscilações ocasionais, sazonais ou contínuas.<br />

Este sistema em equilíbrio estático é denominado fluxo circular, no qual o curso da<br />

economia transcorre de maneira monótona, “correndo pelos mesmos canais ano após<br />

ano”, fazendo com que a economia se apresente de maneira idêntica em sua essência,<br />

em um eterno continuum.<br />

Segundo Schumpeter, tal comportamento é designado meramente como<br />

crescimento, uma vez que seu conceito de desenvolvimento refere-se às mudanças da<br />

vida econômica que não lhe forem impostas de fora, mas que surjam de dentro por sua<br />

própria iniciativa. Desta forma, Schumpeter conclui:<br />

Se se concluir que não há tais mudanças emergindo da própria esfera econômica,<br />

e que o fenômeno que chamamos de desenvolvimento econômico é na<br />

prática baseado no fato de que os dados mudam e que a economia se adapta<br />

continuamente a eles, então diríamos que não há nenhum desenvolvimento<br />

econômico.<br />

O desenvolvimento econômico, no sentido adotado por Schumpeter, é um<br />

fenômeno distinto, completamente estranho ao que se pode observar no fluxo circular<br />

ou na tendência ao equilíbrio. É uma “mudança espontânea e descontínua nos canais de<br />

fluxo, perturbação do equilíbrio, que altera e desloca para sempre o estado de equilíbrio<br />

previamente existente”. Assim, com o deslocamento do ponto de equilíbrio, a nova<br />

condição econômica não poderá ser alcançada a partir de condições prévias.<br />

O modelo de desenvolvimento econômico de Schumpeter considera que a grande<br />

força motriz do processo de mudanças no fluxo circular são as inovações, cujos amplos<br />

efeitos não só conduzem a um realinhamento das atividades econômicas, como também<br />

garantem o aspecto instável e evolutivo da economia capitalista. As novidades, conforme<br />

o autor, não apareceriam no sistema econômico de uma maneira tal que primeiramente<br />

as novas necessidades surgem espontaneamente em função de demanda do mercado<br />

consumidor e então o aparato produtivo se modifica sob pressão de novas demandas.<br />

Em verdade, tais mudanças ocorrem na esfera da vida industrial e comercial, e não na<br />

esfera das necessidades dos consumidores e produtos finais, uma vez que estes dois<br />

últimos casos não oferecem outro problema a não ser uma mudança nos dados naturais.<br />

Desta forma, segundo o modelo schumpeteriano, a mudança econômica inicia<br />

com o produtor, e os consumidores são educados por ele, ou seja, são “ensinados” a<br />

querer coisas novas, ou que diferem daquelas que têm o hábito de usar ou consumir.<br />

Assim, é a partir desse ponto de análise que Schumpeter vincula o mecanismo da variação<br />

econômica a três conceitos: inovação, empresário e capital.<br />

As inovações, no sentido dado pela T<strong>DE</strong>, são caracterizadas pela introdução de<br />

novas combinações produtivas ou por mudanças nas funções de produção, e são<br />

classificadas segundo cinco modalidades distintas, quais sejam: com a introdução de<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 9-27, jun. 2010


14<br />

um novo bem de consumo ou através das mudanças qualitativas em determinado<br />

produto; com a introdução de modificações no método produtivo, ou de outra forma,<br />

através da introdução de um método produtivo ainda não experimentado em um<br />

determinado ramo produtivo; através da abertura de um novo mercado consumidor<br />

onde um determinado ramo produtivo ainda não tenha entrado; através da conquista<br />

de uma nova fonte de matéria-prima, e por fim, através do estabelecimento ou de<br />

ruptura de uma economia de monopólio. Cabe observar que no contexto do modelo<br />

schumpeteriano, as inovações no processo produtivo podem ou não ser decorrentes de<br />

descobertas científicas.<br />

Para que estas novas combinações possam ser implementadas e causar<br />

perturbações no fluxo circular da economia, é necessário visão ampla, sensível às<br />

mínimas oportunidades de mercado. É indispensável um comportamento<br />

empreendedor, diferente do comportamento do administrador, e tais características<br />

seriam encontradas no empresário, que para Schumpeter, é o grande responsável pela<br />

realização das novas combinações produtivas, ou inovações. Assim, o empresário é<br />

definido através de sua função no ambiente, e não pela posse do capital necessário<br />

para o novo arranjo do processo de produção.<br />

Até então a figura do empresário, segundo o próprio Schumpeter, era definida<br />

como quem recebe lucro. No entanto, o lucro é inexistente no fluxo circular, portanto,<br />

a tendência é que o empresário não tenha nenhum lucro, nem prejuízos, ou seja, ele<br />

não desempenha nenhuma função especial, simplesmente ele não existe. A concepção<br />

marshalliana do empresário, a seu turno, trata desta figura como um mero administrador,<br />

porém, para Schumpeter, o empresário é um elemento fundamental no cenário<br />

econômico, que se distingue na sociedade por apresentar considerável sinergia e<br />

capacidade de realizar coisas novas que não estejam presentes de maneira difundida<br />

entre a população. É alguém que tenha habilidade para implementar o novo.<br />

O empresário schumpeteriano não seria motivado pelo desejo do lucro. Antes disso,<br />

existe o desejo íntimo da realização, da conquista, o impulso de lutar e provar para si<br />

mesmo a sua superioridade, ter sucesso, não unicamente pelos frutos que porventura<br />

advenham dele, mas pelo sucesso em si mesmo. O empresário, na visão de Schumpeter,<br />

é movido pela alegria de criar, de realizar coisas, ou de simplesmente exercitar sua energia<br />

e engenhosidade. Ele não deve ser confundido com o tradicional capitalista que pertence<br />

à classe burguesa, embora se junte a ela ao ser bem-sucedido em sua empreitada. Em<br />

verdade, quando o seu sucesso econômico o eleva socialmente, ele, segundo Schumpeter,<br />

não tem nenhuma tradição cultural ou posição a recorrer, mas se move na sociedade<br />

como um novo-rico, cujas maneiras são alvo de frequentes risos.<br />

A despeito do fato, cada passo dado pelo empresário fora da rotina encontra<br />

dificuldades e envolve um elemento novo, que segundo o modelo schumpeteriano,<br />

seria a liderança. O autor enfoca estas dificuldades em alguns pontos básicos, a saber:<br />

fora dos canais habituais da economia, o indivíduo está desprovido de dados que<br />

norteiem suas decisões, bem como a sua conduta. Certamente que o empresário ainda<br />

deve prever e julgar conforme sua experiência, porém, para levar a cabo um plano novo<br />

e obter sucesso, tudo passa a depender de sua intuição, da capacidade de ver as coisas<br />

de uma forma que depois se prove como correto. Um outro ponto mencionado por<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 9-27, jun. 2010


15<br />

Schumpeter é a reação do meio social contra aquele que deseja fazer algo novo, que<br />

pode se manifestar através de impedimentos políticos ou legais, no ostracismo social,<br />

nas dificuldades para encontrar a cooperação necessária e finalmente na dificuldade de<br />

conquistar mercado consumidor. Por essas razões, além de outras mais, que a figura do<br />

empresário deve apresentar características invulgares.<br />

Cabe citar que o empresário não é o responsável por criar ou descobrir novas<br />

possibilidades. Segundo Schumpeter, “ele conduz os meios de produção para novos<br />

canais. Mas não faz isso convencendo as pessoas da conveniência da realização de seu<br />

plano ou criando confiança em sua liderança à maneira de um líder político – o único<br />

homem a quem tem que convencer ou impressionar é o banqueiro que deve financiálo”.<br />

Para Schumpeter, o empresário não é necessariamente capitalista, ou seja, não<br />

deve necessariamente dispor de capital de investimento.<br />

É neste ponto que o autor introduz a figura do capitalista, que ao lado do<br />

empreendedor, é mais um protagonista do mercado. Em verdade, através do apoio<br />

financeiro dos capitalistas, através de empréstimos, é que os empreendedores<br />

introduzem as novas combinações no processo produtivo em função de oportunidades<br />

de mercado que devem ser lucrativas para que então o sistema possa crescer e expandir.<br />

Conforme Moriochi e Gonçalves (1994), o capital não é o estoque de bens reais de<br />

uma comunidade, mas antes, uma reserva monetária que capacita o empresário a ter o<br />

controle dos fatores de produção; em outras palavras, é a soma dos meios de pagamento<br />

que está disponível a qualquer momento a ser transferido aos empresários. Segundo a<br />

análise dos referidos autores, o capital na economia schumpeteriana desempenha o<br />

mesmo papel que uma autoridade planificadora em uma economia centralizada: os<br />

recursos são desviados do emprego corrente para novas formas de utilização e na<br />

economia capitalista o crédito nas mãos dos empresários permite que o mesmo utilize<br />

para seus fins parte da riqueza do sistema.<br />

Somente após definir os conceitos de inovação, empresário e capital, é que<br />

Schumpeter propõe o mecanismo de variação econômica, cujo ponto de partida é a<br />

economia que se encontra em equilíbrio. Como já mencionado, tal economia se<br />

caracteriza por seu estado estacionário, ou seja, não apresenta nenhuma variação nos<br />

canais através dos quais o capital circula. Este sistema econômico, também denominado<br />

fluxo circular apresenta uma produção caracterizada por atividades rotineiras, pois as<br />

empresas produzem sempre os mesmos tipos de bens, e sempre na mesma quantidade.<br />

Os fatores de produção são sempre combinados da mesma forma.<br />

No momento em que o empreendedor, ou empresário, observa uma oportunidade<br />

no mercado para a introdução de inovações, ele recorre ao sistema bancário criador de<br />

crédito a fim de financiar as inovações e com estas provocar um desequilíbrio no fluxo<br />

circular da economia. Necessário observar que tal desequilíbrio surge no âmbito da<br />

produção, em função de uma nova combinação dos antigos fatores produtivos. Os<br />

empresários inovadores logo são seguidos por outros, e segundo análise de Moriochi e<br />

Gonçalves (1994), os preços e as rendas monetárias se elevam com o gasto empresarial<br />

se infiltrando no sistema econômico.<br />

Com o excesso de inovações introduzidas no mercado, surge o que Schumpeter<br />

denomina de destruição criadora, ou seja, quando as velhas empresas verificam que<br />

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16<br />

seus mercados foram reduzidos ou destruídos pelo aparecimento de bens competitivos,<br />

comercializados a preços menores. Neste contexto, as empresas têm poucas alternativas:<br />

ou vão à bancarrota ou são compelidas a aceitar uma posição de menor importância no<br />

mercado. Tal quadro é agravado com a tendência de recessão do mercado com o declínio<br />

da atividade inovadora, e tal recessão é potencializada pelos resgates dos empréstimos<br />

bancários, que segundo Moriochi e Gonçalves (1994), forçam os preços e a renda<br />

monetária a caírem, porém, o quadro não é capaz de provocar uma depressão econômica<br />

em larga escala.<br />

Conforme análise dos supracitados autores, a depressão em larga escala seria<br />

proporcionada pela cessação das atividades inovadoras da onda secundária. Em outros<br />

termos, quando os empreendedores injetam recursos na economia para a introdução<br />

de novas combinações, os preços apresentam tendência de elevação, o que encoraja as<br />

firmas antigas a também realizarem investimentos, na expectativa da elevação dos<br />

preços. No entanto, no momento em que a destruição criadora passa a conter a onda<br />

primária de investimentos, a segunda onda – dos investimentos imitativos – sofre um<br />

grande colapso, desencadeando desta maneira, um forte movimento descendente e<br />

acumulativo da atividade econômica, caracterizando assim a depressão em larga escala.<br />

Assim, com a introdução das inovações, o fluxo circular é perturbado, e dentro em<br />

pouco, a economia tende a voltar à sua posição de equilíbrio, e o cenário estaria apto para<br />

novas atividades empreendedoras. No entanto, segundo o modelo de Schumpeter, o<br />

novo ponto de equilíbrio encontra-se em uma posição mais elevada que aquela em que<br />

se encontrava anteriormente. Destarte, no modelo schumpeteriano é através de ciclos<br />

econômicos que o desenvolvimento se manifesta, aos “saltos”, através de deslocamentos<br />

irreversíveis para planos mais elevados. Contudo, tais ciclos apresentam periodicidades<br />

diferenciadas, influenciadas pela natureza da inovação. São eles: ciclo de ondas longas,<br />

ou de kondratieff, que apresenta período variável em torno de 54 a 60 anos; o segundo<br />

ciclo, de duração média, ou ciclo de juglar, apresenta duração em torno de 9 a 10 anos; o<br />

último ciclo, de curta duração, ou de kitchin, tem duração em torno de 40 meses.<br />

2.2 CRÍTICAS AO MO<strong>DE</strong>LO <strong>DE</strong> <strong>DE</strong>SENVOLVIMENTO ECONÔMICO <strong>DE</strong><br />

S C H U M P ETER<br />

Uma crítica precisa sobre a teoria schumpeteriana foi formulada por Celso Furtado,<br />

destacado intelectual do país durante o século XX e um dos maiores expoentes da<br />

economia brasileira, principalmente por seus aportes precisos sobre o desenvolvimento<br />

econômico na periferia do sistema capitalista, os quais divergiram consideravelmente<br />

das doutrinas econômicas dominantes em sua época. Comentam Moriochi e Gonçalves<br />

(1994) que, segundo a crítica furtadeana, existiria uma pretensa universalidade na teoria<br />

de Schumpeter, onde o espírito da empresa como categoria abstrata é desconsiderado,<br />

independente do tempo e de toda ordem institucional. Na teoria schumpeteriana, o<br />

empreendedor seria um fenômeno inerente a todas as organizações sociais, desde as<br />

tribais às socialistas, no entanto, o modelo de Schumpeter é circunscrito à sociedade<br />

capitalista, e esta é um fenômeno que apresenta suas características próprias e que a<br />

diferenciam de qualquer outra sociedade.<br />

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17<br />

A crítica vai além, e Furtado (1961) classifica a teoria de Schumpeter como uma<br />

teoria do lucro em vez de teoria do desenvolvimento econômico, uma vez que explica<br />

o aparecimento do lucro através do deslocamento do sistema de um plano para outro<br />

com a introdução de inovações; sua ideia de que o desenvolvimento econômico ocorre<br />

aos saltos, é vaga. Vago também, segundo a crítica furtadeana, é o conceito de novas<br />

combinações e inovações, mesmo tendo Schumpeter enumerado cinco formas distintas<br />

de se introduzir tais inovações.<br />

Como o modelo schumpeteriano considera a economia de monopólio como<br />

uma nova combinação, o conceito desta passa a não envolver necessariamente a<br />

ideia de redução de custos, aumento de produtividade, introdução de tecnologia<br />

de ponta. A crítica furtadeana segue, observando que o empresário do modelo<br />

schumpeteriano, ao contrário do que acontece com outros personagens que se<br />

beneficiam também de elevadas rendas, está sempre intimamente ligado ao<br />

processo produtivo, de maneira tal que toda sua vida é dependente da produção.<br />

Assim, se todas suas energias, inteligência e perspicácia estão canalizadas para a<br />

produção, seria perfeitamente factível, dentro da crítica furtadeana, partir da<br />

observação que mostrasse o empresário como um indivíduo que tem o lucro como<br />

perspectiva e não a satisfação pessoal em primeiro plano.<br />

As inovações do modelo de Schumpeter, segundo a crítica do autor em tela, não<br />

seria exclusivamente produto de um espírito empreendedor. De outra forma, as<br />

inovações poderiam ser o resultado dos esforços das empresas para encontrar aplicações<br />

para os recursos acumulados, como no caso em que dentro de determinadas condições<br />

de contorno, a produtividade sofrer um aumento em decorrência natural da acumulação<br />

de capital, e os custos serem reduzidos com o aumento da escala de produção. Nesse<br />

caso, não foi exigido nenhum espírito empresarial. Segundo comentam Moriochi e<br />

Gonçalves (1994), Celso Furtado reconhece o dinamismo das inovações schumpeterianas<br />

no fluxo econômico, porém, para este, o cerne do desenvolvimento não repousa nas<br />

inovações, mas antes na acumulação de capital.<br />

De todas as críticas ao modelo schumpeteriano de desenvolvimento, Moriochi e<br />

Gonçalves (1994) apontam as de Paul Sweezy como as mais concisas. Conforme Melo<br />

Neto e Oliveira (2004), Paul Marlor Sweezy foi um dos mais influentes economistas<br />

marxistas do século XX. Foi aluno e posteriormente assistente, em Harvard, de Joseph<br />

Schumpeter. Por ser profundo conhecedor do pensamento de seu antigo mestre, Sweezy<br />

direcionou suas observações no ponto de partida do processo de desenvolvimento<br />

econômico de Schumpeter: o fluxo circular.<br />

Na economia de fluxo circular o conceito de variabilidade é inexistente, bem<br />

como inexiste a classe capitalista. A sociedade seria dividida entre os donos da terra e<br />

os demais, e todos teriam acesso ao capital. Não havia acúmulo de riqueza, pois o que<br />

seria produzido seria consumido, nada restando para a acumulação. Se ninguém estaria<br />

interessado em poupar, então a ideia de Schumpeter de retirar do fluxo a acumulação<br />

seria factível. Desta maneira, o empreendedor de Schumpeter seria o maior responsável<br />

pela variação, e a acumulação de capital seria uma consequência.<br />

Sob um ponto de vista alternativo, Sweezy (1962) propõe um sistema econômico<br />

estacionário, mas que além dos donos da terra e trabalhadores, exista também a<br />

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18<br />

classe dos capitalistas, os quais controlariam os meios de produção. Seria então neste<br />

modelo de economia que seria lógico existir um forte motivo para a acumulação de<br />

riqueza em função da existência de excedentes. Assim, tanto a acumulação quanto os<br />

excedentes fariam uma pressão contínua no sentido da variação econômica. Desta<br />

maneira, Foster (s/d) observa que enquanto Schumpeter sustentou que a inovação<br />

deveria ser observada como estímulo ao lucro e a acumulação, Sweezy, a seu turno,<br />

preconizava que a inovação deveria ser vista como um elemento subordinado ao<br />

processo de acumulação.<br />

2.3 ECONOMIA GOMÍFERA AMAZÔNICA ATRAVÉS <strong>DE</strong> UMA ABORDAGEM<br />

SHUMPETERIANA<br />

Para efeito de análise do fenômeno gomífero na Amazônia, será considerado um<br />

recorte temporal que vai de 1870 até 1910. O recorte foi escolhido por alguns motivos:<br />

após a descoberta de vulcanização por Goodyear em 1839, o látex amazônico passa a<br />

sofrer uma forte pressão em função de uma demanda crescente do mercado externo;<br />

no entanto, foi somente em meados de 1870 que a demanda internacional pelo látex<br />

amazônida toma vultosas proporções, e tal demanda continuaria crescente até 1910,<br />

quando em função da concorrência asiática, a borracha cai de cotação no mercado.<br />

O látex amazônico foi largamente explorado, segundo atesta Pinto (1984), dentro<br />

de um sistema capitalista, e dentro desta condição de contorno é possível proceder a uma<br />

análise de seu uso como matéria-prima, e todo o mecanismo econômico a ele relacionado,<br />

através do pensamento schumpeteriano, uma vez que o mesmo foi desenvolvido segundo<br />

a dinâmica da economia capitalista. Observa Pinto (1984) que o látex, à época das grandes<br />

navegações e dos descobrimentos, era utilizado para a confecção de pequenos objetos<br />

de uso geral, mas a mesma lógica comercial-capitalista europeia que introduziu em larga<br />

escala produtos de origem vegetal até então desconhecidos ou comercializados em pouco<br />

volume no Velho Continente, deixou que o látex, bem como outros produtos de uso<br />

nativo, escapasse dos interesses comerciais mais imediatos.<br />

Dentre as possíveis hipóteses levantadas pelo retromencionado autor para<br />

justificar este fato, tem-se as dificuldades de processamento da goma elástica<br />

solidificada, fato este que até a sua estabilização através da vulcanização, parece ter<br />

contribuído de maneira decisiva para o desinteresse econômico por essa matéria-prima.<br />

O autor menciona que o intervalo de tempo transcorrido entre a primeira notícia<br />

europeia sobre a existência do látex até a o estabelecimento das grandes unidades<br />

fabris de artefatos vulcanizados, correspondeu a profundas transformações que<br />

revolucionaram o modelo de produção então existente, tornando a acumulação<br />

capitalista o objeto último da sociedade emergente.<br />

Comenta Pinto (1984) que foi nesta época que o progresso científico se transformou<br />

num instrumento para a consecução de uma crescente acumulação de capital. Tal<br />

assertiva encontra embasamento no modelo econômico de Schumpeter, uma vez que<br />

preconiza a acumulação de capital como oriundo da introdução de inovações pela ação<br />

do empresário. No entanto, é necessário observar que para Schumpeter, o progresso<br />

científico, personificado pelas inovações tecnológicas, por si só não têm valor econômico,<br />

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19<br />

assim, era papel do empreendedor tomar partido de tais elementos para produzir novas<br />

combinações na produção. A despeito da importância e das características intrínsecas<br />

da figura do empresário no modelo schumpeteriano, Pinto (1984) comenta que no<br />

momento histórico de maior impulso da exploração da borracha amazônica era frequente<br />

a fusão, em uma única pessoa, das figuras do comerciante, do inventor ou cientista, e a<br />

do industrial.<br />

A borracha amazônica só seria observada pelas nações estrangeiras sob perspectivas<br />

econômicas, embora ainda precárias, a partir do século XVIII, e o primeiro passo nesse<br />

sentido foi o relatório de Charles Marie de La Condamine, que de passagem pelo Peru,<br />

descreveu a coleta do látex, os objetos que com ele eram feitos, bem como sugerindo a<br />

aplicação numa diversidade de outros artefatos. Já não se tratava mais de uma mera<br />

notícia, como em princípios do século XVI, mas de uma possibilidade comercial, que<br />

segundo Pinto (1984), chegou numa Europa em pleno processo de transformações e ávida<br />

por oportunidades econômicas e por exploração de novos mercados.<br />

Esta conjuntura, dentro da lógica schumpeteriana, apresenta um quadro propício para<br />

a introdução de inovações: no mercado europeu, o látex era uma nova fonte de matériaprima,<br />

e suas oportunidades de exploração econômicas eram inúmeras, dentre elas, a<br />

melhoria de peças de vestuário através da aplicação do látex para impermeabilização, a<br />

fabricação de calçados impermeáveis, e a utilização da borracha para remover os traços de<br />

grafite sobre determinadas superfícies; em outros termos, a borracha proporcionou tanto a<br />

melhoria da qualidade de produtos já conhecidos quanto à introdução de novos. Além<br />

disto, a exploração de novos mercados consumidores, onde os novos produtos europeus<br />

manufaturados ainda não fossem conhecidos, de acordo com o pensamento de Schumpeter,<br />

também é configurada como uma modalidade de inovação.<br />

O acelerado processo de industrialização, observado principalmente na Inglaterra,<br />

também deu origem a novas técnicas e produtos que incorporavam a borracha em sua<br />

elaboração, e com isso, abria-se um novo ciclo de exploração do látex amazônida através<br />

de seu uso em produtos diversificados tanto no mercado europeu quanto norteamericano.<br />

Punha-se em marcha, conforme análise de Pinto (1984), um processo<br />

bilateral, onde em uma ponta ocasionaria um desenvolvimento acelerado da indústria<br />

de artefatos de borracha, e na outra, o surgimento na Região Amazônica de um monopólio<br />

de produção gomífera, mesmo com a precariedade de seus processos de produção.<br />

Com efeito, o grande impulso na indústria de artefatos de borracha iria esbarrar nas<br />

formas arcaicas de extração, e consequentemente, observa Weinstein (1993), na<br />

qualidade medíocre de seus produtos finais.<br />

Importante observar que a utilização em larga escala da borracha amazônica como<br />

matéria-prima para a indústria estrangeira não ocorreu de maneira rápida, tampouco<br />

foi este um processo contínuo e isento de barreiras a superar. Esclarece Pinto (1994) que<br />

é possível observar, com uma certa precariedade de limites, dois momentos do emprego<br />

da goma elástica brasileira na indústria. Na primeira fase, caracterizada pela produção<br />

de tecidos e vestes impermeabilizadas, botas e outros bens de consumo correlatos, a<br />

utilização do látex foi viabilizada pela adoção de novas técnicas de produção, como o<br />

uso da benzina como solvente, e pelo uso de calandras para moldagem da borracha.<br />

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20<br />

Analisando o contexto pela ótica do modelo schumpeteriano de desenvolvimento,<br />

a borracha amazônica é uma inovação por ter ocasionado um realinhamento das<br />

combinações dos elementos produtivos, por ser uma nova fonte de matéria-prima e<br />

principalmente por demandar profundas modificações na produção, uma vez que<br />

demandava tratamento específico de acordo com as características diferenciadas de tal<br />

insumo. De qualquer forma, observa-se que a industrialização da borracha, fato este<br />

que proporcionaria toda uma mudança no panorama econômico quase em escala<br />

mundial, não partiu de pressões de demanda do mercado consumidor.<br />

Em verdade, foi um processo que iniciou no setor produtivo, de conformidade<br />

com o a teoria de Schumpeter. O mercado consumidor passou a sofrer uma grande<br />

influência por parte dos produtores, sendo aqueles praticamente compelidos a consumir<br />

os novos bens de consumo produzidos com a borracha amazônica industrializada. No<br />

entanto, mesmo com um forte apoio de tratamentos físicos e químicos, os produtos<br />

dessa primeira fase de industrialização da borracha eram de qualidade sofrível, pois<br />

padeciam com a suscetibilidade a variações térmicas.<br />

Tais produtos só apresentariam um salto qualitativo em 1839, quando Charles<br />

Goodyear desenvolveu um processo de tratamento do látex que consistia numa mistura<br />

aquecida de borracha e enxofre. O processo, depois denominado vulcanização,<br />

proporcionaria aos produtos feitos de borracha maior resistência a quaisquer oscilações<br />

de temperatura. A descoberta de Goodyear configura-se como uma inovação, segundo<br />

o sentido dado ao termo por Schumpeter, pois não só modificou o processo de<br />

industrialização desse insumo, como também trouxe melhorias consideráveis nas<br />

características e na qualidade dos produtos à base de látex natural.<br />

No entanto, o advento de uma nova tecnologia, de uma descoberta, por si só, não<br />

apresenta capacidade de gerar riqueza, e as consequências do enorme salto qualitativo<br />

proporcionado pela vulcanização não foram reconhecidas de imediato. Goodyear tentou<br />

vender sua ideia nos Estados Unidos, porém, os revezes sofridos pelas primeiras<br />

indústrias de artefatos de borracha ainda eram nítidos. Foi assim que o inventor tentou<br />

vender a ideia na Europa e inadvertidamente contribuiu de forma positiva às pesquisas<br />

desenvolvidas por Thomas Hancock, que, apropriando-se da descoberta de Goodyear,<br />

antecipou-se a este e patenteou a vulcanização na Inglaterra oito semanas antes.<br />

De qualquer forma, observa-se que tanto Goodyear quanto Hancock, embora<br />

ligados diretamente à descoberta tecnológica, não foram capazes de introduzi-la no<br />

contexto produtivo. Não só por não deterem os meios de produção e o capital necessários<br />

para tal, mas também por seu próprio perfil. É neste sentido que Schumpeter introduz<br />

o conceito de empreendedor, ou empresário. É esta personagem que tem a capacidade<br />

de perceber as mínimas oportunidades de mercado, e através de novos arranjos nos<br />

elementos produtivos, incorporando aí as inovações tecnológicas, como no caso a<br />

vulcanização, produzem perturbações nos canais ordinários da economia e, como<br />

consequência, produzem lucro.<br />

É a partir deste momento, conforme análise de Pinto (1984), que se iniciou a<br />

segunda etapa da industria de artefatos de borracha, que na medida em que se<br />

consolidava, aumentava o processo de corrida às fontes supridoras de matéria-prima. A<br />

partir da segunda metade do século XIX, a indústria americana de artefatos de borracha<br />

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21<br />

sofre um considerável crescimento, suplantando as indústrias europeias, atingindo uma<br />

indiscutível liderança mundial no setor. Segundo a T<strong>DE</strong> de Schumpeter, é possível assumir<br />

que os lucros advindos da indústria de artefatos de borracha atraiu a atenção de outros<br />

empresários, encorajando-os a também realizar investimentos no setor. Assim, os<br />

produtos industrializados à base de borracha foram rapidamente copiados por outras<br />

indústrias, na expectativa de elevação dos preços e obtenção de lucro.<br />

Segundo esta análise, com o excesso de produtos de borracha no mercado, surge<br />

a destruição criadora de Schumpeter. Os produtores de borracha industrializada<br />

previamente estabelecidos verificaram que seus mercados foram reduzidos, ou mesmo<br />

destruídos pelo aparecimento de bens competitivos. Para manter a competitividade,<br />

tornou-se então necessário um rearranjo na produção das empresas mais antigas,<br />

caracterizando assim um quadro de constante inovação, seja pela diminuição dos custos<br />

de produção, pela busca constante de melhoria na qualidade dos produtos, ou pelo<br />

domínio das fontes de matéria-prima. Foram estas condições, em particular a última,<br />

que ocasionaram uma grande corrida às fontes abastecedoras de látex, gerando fortes<br />

pressões de demanda sobre a Amazônia.<br />

2.4 A DINÂMICA DA ECONOMIA GOMÍFERA NA AMAZÔNIA<br />

O cenário amazônico na primeira metade do século XIX era bastante desfavorável.<br />

Sua baixa densidade demográfica fazia com que fosse parcamente habitada; a economia<br />

era próxima do patamar da subsistência, e as dificuldades de transporte e comunicação<br />

faziam com que a região apresentasse modestos recursos econômicos. O cenário<br />

amazônico ainda foi abalado pela Cabanagem durante os anos de 1835 a 1840. Segundo<br />

observado por Weinstein (1993), a grande concentração de exploração da Hevea estava<br />

nos arredores de Belém e região das ilhas, o que fez desenvolver-se na capital um<br />

incipiente comércio de artefatos de borracha, inclusive para exportação.<br />

Além das dificuldades de acesso às áreas produtoras, o látex extraído não era<br />

suficiente para atender a crescente demanda externa, embora sua produção fosse<br />

crescente, como pode ser observado no gráfico 1. Contudo, tais dificuldades foram<br />

transpostas e a produção de borracha na Região Amazônica cresceu consideravelmente.<br />

Comenta Pinto (1984) que o crescimento vertiginoso da produção gomífera amazônica<br />

ocorreu não só em função da grande demanda do mercado consumidor externo, mas<br />

também por conta de políticas imperiais, que a seu turno, também sofreram enormes<br />

pressões diplomáticas norte-americanas e inglesas no sentido de facilitar tanto o acesso<br />

à região quanto o escoamento da produção, inicialmente através da concessão da<br />

navegação a vapor nas águas do Amazonas a Irineu Evangelista de Souza, o barão de<br />

Mauá, e posteriormente pela abertura do Grande Rio à navegação internacional.<br />

Assim, abria-se o canal através do qual se garantiria o domínio das regiões<br />

produtoras de borracha e, em última instância, a manutenção da competitividade da<br />

indústria que eventualmente conseguisse estabelecer o monopólio de exploração<br />

da produção do látex amazônico.<br />

Este crescimento acabou deslocando grande parte da mão-de-obra disponível na<br />

região para a extração do látex, o que desarticulou a produção local de alimentos e<br />

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22<br />

agravou sobremaneira o já existente problema de escassez de trabalhadores. No entanto,<br />

observou-se na região um intenso fluxo migratório a partir do terceiro quartel do século<br />

XIX, provocado, atesta Weinstein (1993), por um longo período de estiagem no Nordeste<br />

brasileiro, e que, em última instância, mitigou os problemas oriundos da falta de<br />

população economicamente ativa na região.<br />

Tanto o amazônida quanto o migrante nordestino foram aliciados pelos<br />

arregimentadores de mão-de-obra e atrelados à economia gomífera, formando a base do<br />

mastro totêmico das relações socioeconômicas que caracterizaram o negócio da borracha.<br />

Eram deslocados para as frentes de trabalho, na grande maioria das vezes, isolados de<br />

qualquer contato humano. Segundo observa Weinstein (1993), o isolamento nas frentes<br />

de trabalho era reflexo do crescimento natural da flora amazônica. Uma vez que as<br />

seringueiras encontravam-se dispersas na floresta, a coleta do látex acabou demandando<br />

uma população de produtores extremamente móvel e dispersa, cujas rotinas de trabalho<br />

dificilmente poderiam ser submetidas às formas comuns de organização.<br />

Gráfico 1: Produção de borracha na Amazônia.<br />

(Fonte: REIS apud PINTO, 1984)<br />

O isolamento, aliado à inexistência de ocupação econômica alternativa, obrigavam<br />

o seringueiro a depender quase exclusivamente do seringalista proprietário das terras<br />

que eram arrendadas aos seringueiros, ou do comerciante local, também denominado<br />

aviador, que mantinha o controle informal da produção e do comércio do látex na área,<br />

negociando a produção do seringueiro e mantendo o mesmo abastecido de ferramentas<br />

e víveres. Gêneros caros, aliados à baixa remuneração, mantinham o seringueiro em<br />

uma situação de eterna dívida, sendo assim obrigado a trabalhar por tempo indefinido.<br />

Comenta Pinto (1984) que desta condição poucos conseguiram escapar.<br />

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23<br />

Recebida a borracha, ela seguia para Belém ou Manaus, sendo levada diretamente<br />

para o armazém comercial do dito aviador. As casas aviadoras eram o elo comercial de<br />

maior importância na cadeia econômica da borracha, pois decidiam quando e a quem<br />

vender a produção, negociavam com as casas importadoras as mercadorias que a<br />

posteriori eram repassadas aos seringueiros a valores astronômicos, e encarregavamse<br />

de providenciar, através dos bancos locais, créditos adicionais ou empréstimos a<br />

curto prazo para financiar compras de maior monta, como barcos a vapor, ou instalações<br />

como embarcadouros.<br />

As casas aviadoras, sob certo prisma de análise, tinha a capacidade e a<br />

possibilidade de controle dos elementos da produção do látex na medida em que decidia<br />

para quem e quando vender, por transacionar os víveres que mantinham os seringueiros,<br />

e por também buscar financiamentos nos bancos para financiar a implementação de<br />

melhorias no sistema. Tais características permitem assumir que as casas aviadoras<br />

desempenhavam papel similar ao do empresário segundo o modelo schumpeteriano.<br />

Por fim, a borracha passava para as casas importadoras, que a transferia para o exterior,<br />

onde sem muitas delongas, eram conduzidas aos pátios das indústrias.<br />

Segundo Pinto (1984), consolidou-se na Amazônia uma rede comercial baseada<br />

numa extensa cadeia creditícia, e os principais canais de circulação do capital estavam<br />

no comércio exportador e importador, bem como nos serviços de transporte e<br />

financiamento de todas estas operações. A abertura de novos seringais se constituía no<br />

único investimento fixo de vulto, visando o aumento da produção na mesma proporção<br />

do aumento da demanda. Cabe observar que o sistema econômico que se estabeleceu<br />

na Amazônia em vez de destruir as relações de produção existentes, levantou-se sobre<br />

elas, consolidando modos tradicionais de extração e troca. Para Weinstein (1993), foi<br />

chocante o contraste entre a indústria de produtos de borracha, metropolitana e<br />

tecnologicamente avançada e o sistema primitivo de extração da borracha amazônica.<br />

Partindo do exposto, observa-se que o sistema econômico tradicional da região<br />

Amazônica, baseado nas relações de extração e troca não foi alterado pelas pressões do<br />

mercado externo. Em verdade, os condicionantes imediatos da produção, sejam eles a<br />

quantidade da força de trabalho, a quantidade e a composição do estoque de capitais<br />

sofreram modificações meramente adaptativas, compatíveis com a oscilação da demanda<br />

externa pela borracha. A escassez de trabalhadores a ser alocados nos seringais foi em<br />

parte mitigada pela intensa migração de nordestinos para a Amazônia e pela ação dos<br />

arregimentadores de mão-de-obra; em sendo a Amazônia, na época, uma região de<br />

tacanhos recursos financeiros, o capital alocado nestas atividades era basicamente<br />

estrangeiro, que direta ou indiretamente afluíram para a região em função da demanda<br />

crescente de borracha.<br />

Neste contexto, a natureza das condições dos recursos naturais e o nível tecnológico<br />

também devem ser também observados como variáveis do processo de produção. Sobre<br />

estas duas variáveis a própria Região Amazônica encarregou-se de atuar, em primeira<br />

instância, pelas dificuldades naturais para a obtenção do látex, oriundas não só<br />

das características de distribuição das seringueiras, mas também pelas relativas<br />

dificuldades de acesso às áreas de produção. Em segunda instância, a região<br />

exerceu enorme influência sobre as atitudes da população da região em relação à<br />

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exploração do látex, mantendo viva a arcaica cultura e frustrando esforços de inovação<br />

técnica e de racionalização da produção.<br />

Seguindo este fio condutor de análise, quando se observa que as mudanças não<br />

emergem da própria esfera econômica, mas antes são motivados por fatores externos<br />

que acarretam alterações no grau de utilização e das taxas de aumento dos<br />

retromencionados elementos produtivos, então, não é possível observar<br />

desenvolvimento no sentido atribuído ao termo pelo modelo schumpeteriano. Tal<br />

comportamento seria então definido apenas como crescimento, pois o desenvolvimento<br />

preconizado por Schumpeter refere-se às mudanças da vida econômica que não lhe<br />

forem impostas de fora, mas que surjam de dentro por sua própria iniciativa.<br />

Outra característica do desenvolvimento é a perturbação nos canais de fluxo que<br />

desloca o estado da economia existente, de modo tal que a nova condição econômica<br />

não poderá ser alcançada a partir das condições prévias. Tais características não foram<br />

observadas na Região Amazônica por conta da manutenção dos tradicionais modos de<br />

produção que atrelaram o novo momento econômico, caracterizado pela de maior<br />

exploração do látex, às características de extração e troca da economia preexistente.<br />

3 CONSI<strong>DE</strong>RAÇÕES FINAIS<br />

Na virada do século XIX para o XX a borracha se tornara uma matéria-prima<br />

indispensável para as economias industrializadas. O inegável monopólio da produção<br />

do látex na Amazônia era um constante foco de disputas internacionais, e sua importância<br />

crescente fez com que o seu controle evoluísse de uma questão comercial para um<br />

status de fator econômico vital no desenvolvimento de políticas nacionais em nações<br />

como Estados Unidos e Inglaterra.<br />

Neste contexto, desde a década de 1850, Thomas Hancock defendia o plantio<br />

sistemático dos espécimes produtoras da borracha nos domínios britânicos, o que além<br />

de outras facilidades, poria fim na dependência da indústria inglesa da produção<br />

monopolista amazônica. Contudo, esta empreitada encontrava uma série de barreiras,<br />

como o alto risco ocasionado pelo desconhecimento dos espécimes vegetais, pelos<br />

investimentos maciços demandados pelo longo prazo deste tipo de inversão. Por outro<br />

lado, esclarece Pinto (1984), os preços crescentes alcançados pela borracha no mercado<br />

europeu, especialmente o londrino, constituíam um enorme estímulo não só aos<br />

empresários europeus, mas também aos norte-americanos.<br />

O cenário econômico que então se descortinaria é explicado por Schumpeter<br />

através da T<strong>DE</strong>. Segundo o autor, o lucro a curto prazo advindo da introdução de uma<br />

inovação, neste caso, os produtos de borracha industrializada, chama a atenção de outros<br />

empresários, que infiltram capital de investimento no sistema econômico e cada vez<br />

mais bens no mercado.<br />

O excesso de inovações acaba gerando o declínio das atividades empreendedoras<br />

e causa a destruição criadora, e neste cenário, as empresas devem buscar aumentar a<br />

competitividade, caso contrário deverá se contentar com uma posição secundária no<br />

mercado, ou será fadada à bancarrota. Schumpeter ainda sustenta que tal quadro é<br />

agravado pelo resgate dos empréstimos bancários que foram necessários para a<br />

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25<br />

introdução das inovações no sistema econômico. Os preços e a renda são forçados para<br />

baixo, mas, passado certo tempo, o panorama torna-se novamente favorável para novas<br />

atividades empreendedoras.<br />

A indústria da borracha parece ter seguido tal lógica schumpeteriana. Isto se torna<br />

perceptível quando se procede a análise dos períodos de industrialização da borracha<br />

descritos por Pinto (1984). O primeiro ciclo compreendeu a fase inicial de<br />

industrialização, onde os produtos sofriam com a variação térmica, perpassando pela<br />

descoberta da vulcanização e consequente melhoria dos produtos. As primeiras<br />

indústrias que incorporaram a vulcanização na industrialização obtiveram lucros<br />

consideráveis que incentivaram outras indústrias a fazer o mesmo. Com o tempo, o<br />

mercado já estava relativamente saturado com os produtos produzidos – vestimentas<br />

impermeabilizadas, artefatos correlatos, mangueiras, produtos mecânicos em geral,<br />

dentre outros – e neste momento a indústria ganharia um novo impulso com o advento<br />

do subsetor de pneumáticos.<br />

Os pneumáticos foram inicialmente utilizados nas rodas das bicicletas, que se<br />

tornaram febre na Europa da virada do século XIX para o XX, e ganhou<br />

progressivamente o mercado dos veículos automotivos. Organizaram-se a partir<br />

daí, e em ritmo acelerado, um novo ciclo expansivo da economia capitalista. E a<br />

borracha continuaria a ser uma vital fonte de matéria-prima, principalmente pela<br />

intensificação da concorrência pela fonte produtora do látex, contudo, o monopólio<br />

amazônico, calcado em técnicas de extração arcaicas e em relações de comércio<br />

tradicionais, não apresentou barreiras de mercado eficientes a ponto de promover<br />

a perda de hegemonia no mercado internacional.<br />

Foi então dentro deste contexto que o governo britânico decidiu patrocinar<br />

pesquisas necessárias a uma eventual aclimatação de espécies produtoras de látex em<br />

seus domínios na Ásia. Foi assim que se originou um golpe dado por H. Wickham, que<br />

levou da Amazônia 70 mil sementes de Hevea, das quais duas mil germinaram no Jardim<br />

Botânico de Kew, em Londres. Wickham, no entanto, não fora o primeiro c contrabandear<br />

sementes de seringueira, mas por razões acidentais, foi o mais bem sucedido. No<br />

entanto, tal processo foi lento, gradativo. Conforme Weinstein (1993), passaram-se<br />

cerca de 30 anos desde o traslado de sementes e mudas de Hevea até as propriedades<br />

britânicas na Ásia, até o período de expansão da borracha asiática na Malásia em 1910,<br />

ocasionando um gigantesco aumento da produção gomífera.<br />

A infraestrutura agrícola malasiana aperfeiçoava-se e diferia-se cada vez mais da<br />

amazônica, a começar pelo acesso às árvores. A produção malasiana concentrava um<br />

grande numero de árvores produtoras de látex em grandes propriedades, enquanto a<br />

coleta do látex amazônida era dificultada pela grande distância entre elas. Além do<br />

que, a grande pressão dos seringalistas, aliadas às imensas dificuldades de vida e de<br />

trabalho dos seringueiros, foram alguns motivos que ocasionaram uma sensível<br />

depreciação na qualidade da borracha produzida, pois para obter uma maior margem de<br />

renda, os seringueiros adicionavam areia e pedras no látex durante o processo de<br />

defumação, o que aumentava o peso das pelotas, e segundo Weinstein (1993), tal prática<br />

só era descoberta quando as pelotas eram abertas nos portos de Belém e Manaus para<br />

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26<br />

enviá-las ao mercado externo. Esta prática deletéria acabou gerando uma sensível<br />

depreciação do látex amazônico em função de sua baixa qualidade, em contraponto do<br />

látex asiático, de qualidade superior.<br />

Observa Pinto (1984) que o caráter predominantemente mercantil da atividade<br />

extrativista, aliado à alta rentabilidade no período de 1870 a 1910, acabou transformando<br />

a economia da Região Amazônica em um imenso entreposto comercial. A maior parte<br />

dos investimentos e recursos da região foi aplicada no setor terciário, e o setor produtivo<br />

sofreu com o descuido. Contudo, uma das poucas tentativas de melhoramento na<br />

produção, especificamente no processo de defumação do látex, foi a introdução de<br />

uma nova técnica que reduzia o tempo de trabalho. Mesmo com o governo paraense<br />

tendo pagado um preço alto pela inovação, ela foi contida por uma sólida barreira cultural,<br />

que manteve as práticas primevas. No entanto, não eram somente as peculiaridades da<br />

atividade extrativista que criavam obstáculos à manutenção da competitividade<br />

amazônica num contexto de forte concorrência. Pesados encargos tributários oneravam<br />

a exportação da borracha em um quinto de seu valor.<br />

Aliado ao quadro tem-se a inércia do governo regional, que mesmo informado<br />

sobre as plantações asiáticas, nada fez no sentido de enfrentar essa concorrência. O<br />

setor privado, por sua vez, também foi ingênuo em não ter tomado iniciativa no<br />

período em que o látex amazônico alcançou o seu auge de rentabilidade. Assim,<br />

segundo análise de Pinto (1984), a prevalência dos interesses comerciais de curto<br />

prazo sobre o comprometimento de recursos a médio e longo termos eliminavam<br />

qualquer possibilidade de investimento em heveicultura. A administração pública,<br />

a seu turno, transformou a parcela do capital excedente sob a forma de receitas<br />

tributárias, consumindo avidamente as mesmas em edifícios públicos e<br />

melhoramentos urbanos com praticamente nenhum significado para a atividade<br />

produtiva. Assim, da fabulosa riqueza gerada na região, quase nada permaneceu<br />

nela sob a forma de inversões produtivas.<br />

A tradição do modelo econômico da região em nenhum momento deu espaço<br />

para as atividades empreendedoras prescritas pelo modelo schumpeteriano, e o<br />

monopólio amazônico não se constituiu em barreira de mercado que garantisse a sua<br />

manutenção. Por outro lado, o modelo de desenvolvimento econômico de Schumpeter<br />

é mais claramente observado no mercado externo através dos ciclos econômicos de<br />

curta duração – influenciados pela natureza da inovação – que caracterizaram as<br />

indústrias de artefatos à base de látex.<br />

Definiu-se a partir de então um quadro lentamente engendrado na região: de um<br />

lado, os grupos dominantes na Amazônia, comprometidos com a manutenção das arcaicas<br />

estruturas regionais e que insistiriam na viabilização do extrativismo, e por outro, o<br />

desinteresse da união em investir as somas que tais grupos necessitavam para tal. A<br />

peculiaridade, segundo Pinto (1984), residia no fato de que neste esquema de pressões<br />

não sobrava lugar para a heveicultura, nem para um programa realista de diversificações<br />

da economia regional. Este conjunto de pressões resultou de uma política gomífera<br />

ausente, e depois da desarticulação da produção da borracha silvestre, pouco ou quase<br />

nada se vez para orientá-la para a heveicultura ou atividades não extrativistas.<br />

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27<br />

REFERÊNCIAS<br />

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Brasília: Senado Federal, 2004.<br />

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Schumpeter. In: Cadernos IHU Idéias, São Leopoldo, ano 4, n.47, p. 1-15, 2006.<br />

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In: Monthly Review. Volume 56, number 5. Disponível em: http://<br />

www.monthlyreview.org/1004jbf.htm. Acesso em: 25 jun. 2007.<br />

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Brasil: compreendendo notícias históricas e geográficas do Império e das diversas<br />

províncias. Belo Horizonte: Itatiaia, 1980.<br />

MELO NETO, Antônio de Pádua; OLIVEIRA, Tiago. Paul Sweezy: grande cientista social,<br />

pioneiro da economia política da comunicação. In: Revista de Economía Política de las<br />

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MORIOCHI, Luis; GONÇALVES, José Sidney. Teoria do desenvolvimento econômico de<br />

Schumpeter: uma revisão crítica. In: Informações Econômicas, São Paulo, v. 24, n. 8, 1994<br />

OLIVEIRA FILHO, João Pacheco. O caboclo e o brabo: notas sobre duas modalidades de<br />

força de trabalho na expansão da fronteira amazônica no século XIX. In: Encontros com<br />

a Civilização Brasileira, v. 11. p. 101-140, 1979.<br />

PINTO, Nelson; Prado, Alves. Política da borracha no Brasil: a falência da borracha vegetal.<br />

São Paulo: Hucitec, 1984.<br />

PRADO JR., Caio. História econômica do Brasil, São Paulo, Brasiliense, 1985.<br />

SARGES, Maria de Nazaré. Belém - Riquezas produzindo a Belle Époque (1870-1912).<br />

Belém: Paka-Tatu, 2002.<br />

SCHUMPETER, J. A. Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre<br />

lucros, capital, crédito, juro e ciclo econômico. 3. ed. São Paulo: Nova Cultural,<br />

1988. p.10<br />

WALLACE, Alfred Russel. Viagens pelos rios Amazonas e Negro. Belo Horizonte: Ed.<br />

Itatiaia, 1979.<br />

WALLE, Paul. No Brasil, do Rio São Francisco ao Amazonas. Senado Federal. Conselho<br />

Editorial, 2006.<br />

WEINSTEIN, Bárbara. A borracha na Amazônia: expansão e decadência, 1850-<br />

1920. São Paulo, Hucitec, 1993.<br />

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29<br />

ESTUDO PRELIMINAR SOBRE SISMICIDA<strong>DE</strong>:<br />

CLASSIFICAÇÃO, RECORRÊNCIA E ANÁLISE <strong>DE</strong> SEUS RISCOS<br />

Selênio Feio da Silva *<br />

Evaristo Clementino Rezende dos Santos Junior **<br />

Alexandre Andrade Brandão Soares ***<br />

Felipe Rodrigues Ribeiro ****<br />

Jeferson de Oliveira Bezerra *****<br />

RESUMO<br />

Os abalos sísmicos naturais são fenômenos provocados pelos movimentos de placas<br />

litosféricas que produzem cargas dinâmicas que podem causar a vibração do solo, deslizamentos<br />

de terra, tsunamis, além de ser prejudicial à maioria das estruturas. Estudos<br />

sismológicos como, a análise de magnitude, intensidade e dos locais com atividade<br />

sísmica são importantes para melhor entender a complexibilidade do assunto devido<br />

ao fato de que os terremotos são apenas abordados após situações de catástrofes e,<br />

logo em seguida, o acontecimento é esquecido. No Brasil, por ser considerado um país<br />

assísmico devido sua localização geográfica e do tardio começo de registros sísmicos,<br />

este tema é de pouco conhecimento da população. Sendo assim, este trabalho visa<br />

difundir o tema, para que possa haver uma discussão mais aberta sobre o assunto que,<br />

atualmente, vem causando grande destruição pelo mundo.<br />

Palavras-Chave: Atividade Sísmica. Terremoto. Escalas Sismológicas. Placas Tectônicas.<br />

* Graduado em Engenharia Civil – UFPA; Mestrado em Estruturas – UnB; Doutorado em Estruturas e Construção<br />

Civil – UnB; Professor Titular – UNAMA; Pesquisador de Projeto de Pesquisa (FI<strong>DE</strong>SA/UNAMA).<br />

** Graduado em Engenharia Civil – UNAMA; Mestrado em Estruturas e Construção Civil – UnB; Professor nos<br />

Cursos de Graduação em Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo, Engenharia de Produção, Engenharia<br />

Sanitária e Ambiental – UNAMA; Pesquisador de Projeto de Pesquisa (FI<strong>DE</strong>SA/UNAMA).<br />

*** Acadêmico do Curso de Graduação em Engenharia Civil – UNAMA; Pesquisador de Projeto de Pesquisa (FI-<br />

<strong>DE</strong>SA/UNAMA).<br />

**** Acadêmico do Curso de Graduação em Engenharia Civil – UNAMA; Pesquisador de Projeto de Pesquisa (FI-<br />

<strong>DE</strong>SA/UNAMA).<br />

***** Acadêmico do Curso de Graduação em Engenharia Civil – UNAMA; Pesquisador de Projeto de Pesquisa (FI-<br />

<strong>DE</strong>SA/UNAMA).<br />

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30<br />

PRELIMINARY STUDY OF SEISMICITY:<br />

CLASSIFICATION, RECURRENCE AND ANALYSIS OF ITS RISKS<br />

ABSTRACT<br />

Earthquakes are a natural phenomenal caused by the movements of the lithospheric<br />

plates that produce dynamic loads that can cause vibration of the soil, landslides, tsunamis,<br />

and is harmful to most structures. As seismic studies, the analysis of magnitude and<br />

intensity of local seismic activity are important to better understand the complexity of the<br />

subject due to the fact that earthquakes are addressed only after disaster situations, and<br />

soon after, the event is forgotten. In Brazil, for being considered a country without earthquakes<br />

due to its geographical location and the late start of seismic records, this issue is<br />

of little knowledge of the population. Therefore, this study aims to spread knowledge, so<br />

that there may be a more open debate on the subject that currently is causing great<br />

destruction in the world.<br />

Keywords: Seismic Activity. Earthquake. Sismological Scales. Tectonic Plates.<br />

1 ATIVIDA<strong>DE</strong> SÍSMICA: GENERALIDA<strong>DE</strong>S<br />

A atividade sísmica mundial, através das concentrações dos epicentros delimita<br />

áreas da superfície terrestre como se fossem as peças de um quebra-cabeça. A distribuição<br />

dos sismos é uma das maiores evidências dos limites dessas peças, chamadas placas<br />

tectônicas.<br />

O restante da Terra é considerada como assísmica. Entretanto, nenhuma região da<br />

Terra pode ser considerada como completamente livre de terremotos. Cerca de 1% da<br />

sismicidade global é devida a terremotos intraplacas, os quais ocorrem longe das zonas<br />

sísmicas maiores [5].<br />

Até pouco tempo atrás o Brasil era considerado assísmico devido a dois fatos: a<br />

falta de registro e divulgação por estações sismográficas nacionais e por ele estar localizado<br />

no centro da placa Sul-Americana, consequentemente longe das atividades geológicas<br />

das bordas das placas.<br />

No início na década de 1960 o monitoramento sísmico brasileiro mostrou que,<br />

apesar de baixa, a sismicidade brasileira não pode ser desprezada, pois todos os dias<br />

pequenas movimentações são registradas pelos sismógrafos nacionais (figura 1) [9].<br />

Esses tremores que ocorrem em nosso país decorrem da existência de pequenas rachaduras<br />

causadas pelo desgaste da placa tectônica ou são reflexos de terremotos com<br />

epicentro em outros países da América Latina. Portanto, algumas obras de segurança<br />

nacional, como as barragens, se utilizam de estudos mais aprofundados que levam em<br />

consideração as tensões produzidas pela ação do sismo. Durante a análise, coeficientes<br />

de segurança como os de tombamento, flutuação e deslizamento podem ser determinados<br />

[13] a partir da aceleração do solo que um sismo produz.<br />

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31<br />

Figura 1: Mapa da sismicidade natural brasileira.<br />

Fonte: Observatório Sismológico – UnB.<br />

De acordo com dados topográficos e geológicos, as regiões que apresentam o maior<br />

número de falhas são o Sudeste e o Nordeste, seguidas pelo Norte e Centro-Oeste e, por<br />

último, o Sul. Mesmo assim, o maior abalo já registrado no país aconteceu em 1955, na<br />

Serra do Tombador, no Mato Grosso e atingiu 6,6 graus na escala Richter [14].<br />

1.1 CASO RECENTE<br />

No dia 12 de Janeiro de 2010, no Haiti, um forte tremor de magnitude 7 ocorreu a<br />

15 km da capital Porto Príncipe e devastou a região, deixando pelo menos 200 mil mortos,<br />

300 mil feridos e um milhão de desabrigados. [7].<br />

Segundo o Centro de Pesquisa Geológica Britânica (BGS, na sigla em inglês), o<br />

Haiti está localizado sobre uma falha geológica entre a placa tectônica do Caribe e da<br />

América do Norte. As duas placas estavam há 250 anos acumulando energia cada vez<br />

que passavam umas pelas outras e, era apenas uma questão de tempo para que liberasse<br />

toda essa energia [2]. O terremoto derrubou hospitais, escolas e até mesmo o palácio<br />

do governo (figura 2).<br />

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32<br />

Figura 2: Palácio do Governo haitiano após o terremoto.<br />

Fonte: O Globo online.<br />

Segundo o boletim da Agência de Pesquisas Geológicas dos Estados Unidos (USGS,<br />

na sigla em inglês) [18], 137 mil pessoas foram expostas ao nível X ou superior da escala<br />

Mercalli Modificada. No total, aproximadamente 17 milhões de pessoas sentiram o<br />

abalo, variando de uma “intensidade leve” a uma “intensidade extrema”.<br />

K: população vezes mil<br />

Figura 3: População estimada exposta ao terremoto.<br />

Fonte: Modificada de USGS.<br />

A figura 4 simula o tamanho da área que seria atingida caso o mesmo tremor<br />

atingisse a cidade de São Paulo. Nas zonas de tremor forte, as fundações dos prédios<br />

seriam danificadas, fendas no chão iriam se abrir, pontes cairiam e represas seriam<br />

atingidas.<br />

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33<br />

Nas regiões de tremor moderado, as pessoas poderiam acordar durante a noite,<br />

rebocos de paredes cair e as portas se abrir. Nas zonas de tremor leve, os lustres das<br />

casas balançariam e o tremor seria mais sentido em prédios altos.<br />

Figura 4: Simulação do terremoto do Haiti na cidade de São Paulo.<br />

2 ABALOS OU TREMORES <strong>DE</strong> TERRA<br />

Fonte: Último Segundo.<br />

Os terremotos ou sismos são vibrações na superfície terrestre que geram ondas<br />

sísmicas causadoras dos tremores superficiais. Esse fenômeno é resultado de movimentos<br />

subterrâneos de placas rochosas ou por deslocamentos de gases no interior da<br />

Terra. O movimento é causado pela liberação rápida de grandes quantidades de energia<br />

sob a forma de ondas sísmicas.<br />

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34<br />

Figura 5: Mecanismo de formação de ondas sísmicas.<br />

Fonte: Modificada da revista Época, 2010.<br />

A maior parte dos terremotos ocorre nas fronteiras entre placas tectônicas, ou em<br />

falhas entre dois blocos rochosos, podendo ainda ser induzido pelo homem.<br />

Entre os efeitos dos terremotos estão a vibração do solo, abertura de falhas, deslizamentos<br />

de terra, tsunamis, mudanças na rotação da Terra, além de efeitos deletérios<br />

em construções feitas pelo homem, resultando em perdas de vidas, ferimentos e<br />

altos prejuízos financeiros e sociais.<br />

Embora a palavra “terremoto” seja utilizada mais para os grandes eventos destrutivos,<br />

enquanto os menores geralmente são chamados de abalos ou tremores de terra,<br />

todos são resultados do mesmo processo geológico de acúmulo lento e liberação rápida<br />

de tensões. A diferença principal entre os grandes terremotos e os pequenos tremores<br />

é o tamanho da área de ruptura, o que determina a imensidade das vibrações emitidas.<br />

3 CLASSIFICAÇÃO DOS SISMOS<br />

Sismos de origem tectônicas, por ser mais comuns e geralmente mais devastadores,<br />

são vistos como de maior interesse de estudo.<br />

Sabe-se que a litosfera (que engloba a crosta e a parte superior do manto terrestre<br />

até cerca de 10 km de profundidade) está dividida em 6 (seis) placas rígidas chamadas<br />

de placas continentais (figura 6) ou placas tectônicas (África, América, Antártida,<br />

Austrália, Europa, e a placa do Pacífico) e 14 (catorze) placas subcontinentais (Nazca,<br />

Caribe etc) [15].<br />

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35<br />

Figura 6: Mapa das placas tectônicas.<br />

Fonte: Apollo 11.<br />

Essas placas se deslocam em movimentos horizontais. Esse fenômeno ocorre por<br />

que a litosfera é mais leve e fria, logo praticamente flutua no material mais quente e<br />

denso que fica localizado logo embaixo, chamado de astenosfera. São geradas nos primeiros<br />

200 km da astenosfera as correntes de convecção, supostamente o mecanismo<br />

que proporciona a movimentação das placas tectônicas [11].<br />

Os sismos tectônicos são justamente a consequência de um deslocamento súbito<br />

das placas ao longo das falhas, ou seja, o esforço vai se acumulando até superar a resistência<br />

das rochas (placas) que se deslocam na hora da ruptura. O evento é acompanhado<br />

por uma grande liberação de energia sob a forma de ondas elásticas que podem se<br />

propagar em todas as direções que cessam até as placas atingirem uma nova configuração<br />

de equilíbrio.<br />

Além de forças naturais certas ações do homem podem induzir pequenos tremores<br />

ou sismos de magnitude moderada a forte. Entre essas ações temos a atividade de<br />

mineração e pedreiras, injeção profunda de fluidos sob alta pressão, extração de líquidos,<br />

exploração subterrânea ou até mesmo por enchimentos de reservatórios na construção<br />

de barragens.<br />

Dentre elas a mais comum e menos entendida é a sismicidade induzida por reservatório<br />

(SIR). Ela se dá pelo fato do reservatório criar um peso adicional considerável<br />

que antes não existia causando assim um crescimento na tensão elástica. A água provoca<br />

também uma mudança do grau de saturação do solo que contribui para desestabilizálo,<br />

uma vez que lubrifica as falhas. O carregamento superficial produzido por cada me-<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 29-42, jun. 2010


36<br />

tro quadrado de água é de 10.000 N/m² ou cerca de 2.000.000 N/m² num reservatório do<br />

porte da Usina de Itaipu (com uma profundidade de 180m) [11].<br />

Com a criação do novo lago ocorre uma alteração nas condições estáticas das<br />

formações rochosas em termos da mecânica e do ponto de vista da hidráulica que causa<br />

infiltrações do fluido nas camadas rochosas profundas. Essas ações podem formar distúrbios<br />

tectônicos e, eventualmente, gerar um sismo.<br />

4 ESCALAS SISMOLÓGICAS<br />

4.1 MAGNITU<strong>DE</strong> <strong>DE</strong> UM ABALO SÍSMICO<br />

A força de um terremoto é estimada por sua magnitude, que está relacionada com<br />

a energia sísmica liberada no foco e também com a amplitude das ondas registradas<br />

pelos sismógrafos.<br />

A escala de medida de energia sísmica liberada por terremotos mais conhecida é<br />

a Richter, que surgiu em 1935, idealizada pelo sismólogo americano Charles F. Richter.<br />

Após recolher dados de inúmeras ondas sísmicas liberadas por terremotos, Richter criou<br />

um sistema para calcular as magnitudes dessas ondas [6].<br />

Richter definiu a magnitude zero como aquela que proporciona uma amplitude<br />

de onda de um micrômetro (10 -3 mm) de vibração a uma distância de 100 km do epicentro.<br />

A escala de Richter é formulada por mais de trinta maneiras diferentes, dependendo<br />

do tipo de onda sísmica, do período da onda, da profundidade do foco, da distância<br />

epicentral e do tipo de solo onde se encontra o sismógrafo. A equação 1 é uma das<br />

equações mais empregadas nesse caso, em que E representa a energia liberada por um<br />

sismo no seu epicentro medida em “erg”, que é a unidade de energia no sistema CGS<br />

(centímetro-grama-segundo) e M é correspondente à magnitude na escala, que por<br />

definição não tem unidade [16].<br />

M = 0,67LogE – 7,9 (1)<br />

Aplicando-se propriedades algébricas na equação 1, tem-se que:<br />

LogE = M + 7,9 (2)<br />

0,67<br />

E = 10<br />

Sabendo-se que 1 erg equivale à 10 -7 Joules, obtém-se a partir da equação 2:<br />

( )<br />

M + 7,9 – 7<br />

0,67<br />

(3)<br />

Esta escala foi idealizada como uma escala logarítmica decimal para cobrir todos<br />

os tamanhos de terremotos, desde os microtremores com magnitudes negativas, até os<br />

super-terremotos com magnitudes superiores a 8.0. O aumento de um ponto nes-<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 29-42, jun. 2010


37<br />

sa medição implica em um aumento de dez vezes na amplitude da onda sísmica. Por<br />

exemplo, um terremoto que mede 4.0 na escala Richter é 10 vezes maior que um que<br />

mede 3.0. Não existe limite inferior ou superior nesta escala. Entretanto, a mecânica<br />

das rochas parece criar limites naturais para magnitudes abaixo de -1 e acima de 9.5 [12].<br />

Por definição, a potência é descrita na equação seguinte:<br />

P = E (4)<br />

t<br />

Onde:<br />

• P: Potência em Watt (W);<br />

• E: Energia em Joule (J);<br />

• t: Tempo em segundo (s).<br />

Sabe-se que a Usina Hidroelétrica de Tucuruí tem uma potência aproximada de<br />

8370 MW [3]. Assim compõem-se a tabela 1, bem como a figura 7 que representam uma<br />

valiosa contribuição deste trabalho, uma vez que mostram uma relação entre a magnitude<br />

de um sismo na escala Richter (M), a energia liberada (E) e o tempo necessário para<br />

gerar tal energia, tomando como base a UHE de Tucuruí no estado do Pará, com a finalidade<br />

de se compreender a dimensão da quantidade de energia que “participa” durante<br />

o processo de acontecimento de um dado terremoto.<br />

Tabela 1: Relação Magnitude, Energia e Tempo.<br />

Fonte: Elaborada pelos autores.<br />

Ainda que cada terremoto tenha uma magnitude única, os efeitos de cada abalo<br />

sísmico variam bastante devido à distância, às condições do terreno e às condições das<br />

edificações. Mesmo assim, alguns danos podem ser relacionados ao grau de magnitude<br />

do sismo (figura 7).<br />

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38<br />

Figura 7: Equivalências entre as magnitudes, prováveis danos de um<br />

terremoto e quantidade de energia envolvida.<br />

Fonte: Modificado do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas – USP, 2009.<br />

4.2 INTENSIDA<strong>DE</strong> <strong>DE</strong> UM ABALO SÍSMICO<br />

A intensidade de um abalo sísmico é uma medida qualitativa dos efeitos produzidos<br />

pelo sismo em construções, pessoas, objetos e no meio ambiente. Não existe uma<br />

relação direta entre intensidade e magnitude.<br />

A classificação pela escala Richter nos dá apenas uma ideia superficial sobre o<br />

verdadeiro impacto de um terremoto. A extensão dos estragos é avaliada pela Escala<br />

Mercalli. Essa escala surgiu em 1902 e posteriormente foi modificada em 1931 com o<br />

sismólogo italiano Giuseppe Mercalli baseando-se em danos sentidos e percebidos em<br />

estruturas e objetos no solo e por pessoas que presenciaram os tremores de terra. Esta<br />

escala tem 12 graus identificados pelos números romanos que vão do I ao XII. Para<br />

estabelecer a intensidade, ele recorreu a uma revisão dos registros históricos e entrevistas<br />

testemunhais, noticiários públicos, jornais e personalidades. Esta escala é proporcional,<br />

de maneira que uma intensidade VI é o dobro de uma intensidade IV [16].<br />

Para poder tirar proveito da informação dada pela intensidade, foram feitos<br />

estudos que correlacionam as intensidades com as características dinâmicas que são<br />

relevantes para o emprego na engenharia civil. Trata-se de uma analogia que se baseia<br />

em extrapolações que tentam identificar quais acelerações do solo podem provocar<br />

os danos associados às diferentes intensidades [15]. Estes resultados estão<br />

descritos na tabela 2.<br />

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39<br />

Tabela 2: Escala de Intensidade – Mercalli Modificada.<br />

Grau Descrição dos Efeitos Aceleração (g)<br />

I<br />

II<br />

III<br />

IV<br />

V<br />

VI<br />

Não sentido. Leves efeitos de período longo de terremotos<br />

grandes e distantes.<br />

Sentido por poucas pessoas paradas, em andares superiores<br />

ou locais favoráveis. < 0,003<br />

Sentido dentro de casa. Alguns objetos pendurados oscilam.<br />

Vibração parecida à da passagem de um caminhão leve.<br />

Duração estimada*. Pode não ser reconhecido como um<br />

abalo sísmico. 0,004 – 0,008<br />

Objetos suspensos oscilam. Vibração parecida à da passagem<br />

de um caminhão pesado. Janelas, louças, portas fazem barulho.<br />

Paredes e estruturas de madeira rangem. 0,008 – 0,015<br />

Sentido fora de casa; direção estimada*. Pessoas acordam.<br />

Líquido em recipiente é perturbado. Objetos pequenos e<br />

instáveis são deslocados. Portas oscilam, fecham, abrem. 0,015 – 0,04<br />

Sentido por todos. Muitos se assustam e saem às ruas.<br />

Pessoas andam sem firmeza. Janelas, louças quebradas. Objetos<br />

e livros caem de prateleiras. Reboco fraco e construção de<br />

má qualidade racham. 0,04 – 0,08<br />

VII Difícil manter-se em pé. Objetos suspensos vibram. Móveis<br />

quebram. Danos em construção de má qualidade, algumas<br />

trincas em construção normal. Queda de reboco, ladrilhos ou<br />

tijolos mal assentados, telhas. Ondas em piscinas. Pequenos<br />

escorregamentos de barrancos arenosos. 0,08 – 0,15<br />

VIII<br />

IX<br />

Danos em construções normais com colapso parcial. Algum<br />

dano em construções reforçadas. Queda de estuque e alguns<br />

muros de alvenaria. Queda de chaminés, monumentos, torres<br />

e caixas d’água. Galhos quebram-se das árvores.<br />

Trincas no chão. 0,15 – 0,30<br />

Pânico geral. Construções comuns bastante danificadas,<br />

às vezes colapso total. Danos em construções reforçadas.<br />

Tubulação subterrânea quebrada. Rachaduras visíveis no solo. 0,30 – 0,60<br />

continua...<br />

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40<br />

continuação...<br />

X<br />

Maioria das construções destruídas até nas fundações.<br />

Danos sérios a barragens e diques. Grandes escorregamentos<br />

de terra. Água jogada nas margens de rios e canais. Trilhos<br />

levemente entortados. 0,60 – 1,0<br />

XI Trilhos bastante entortados. Tubulações subterrâneas<br />

completamente destruídas ~ 1 – 2<br />

XII Destruição quase total. Grandes blocos de rocha deslocados.<br />

Linhas de visada e níveis alterados. Objetos atirados ao ar. ~ 2<br />

Fonte: Assumpção e Neto, 2000 apud Ribeiro, 2006 [12]<br />

*Pode-se ter noção da duração ou da direção do abalo sísmico<br />

5 CONCLUSÕES<br />

A partir dos resultados comentados, apresentados em tabelas e ilustrados em figuras<br />

no presente trabalho, alguns comentários e conclusões podem ser evidenciados:<br />

Conforme visto, a análise das placas tectônicas torna-se importante para poder<br />

determinar onde possivelmente ocorrem com maior frequência os tremores de terra,<br />

sendo assim uma medida de prevenção contra possíveis catástrofes pois, na fronteira<br />

dessas placas (figura 6) é onde são detectados os maiores níveis de atividade sísmica.<br />

Entretanto, não só nessas localidades estão propícias à formação de sismos visto que,<br />

algumas atividades sísmicas já foram detectadas no interior das placas.<br />

Para melhor entendimento dos sismos, escalas de magnitude e intensidade auxiliam<br />

na quantificação e qualificação de possíveis danos que um terremoto pode causar.<br />

Na figura 7, observa-se a grandiosidade que um evento como esse pode atingir, sendo<br />

comparado inclusive à energia liberada de uma bomba atômica e o tempo que uma UHE<br />

necessitaria para gerar uma energia equivalente.<br />

Com esse embasamento, abalos como os que ocorreram recentemente no Haiti<br />

podem ser melhores entendidos. Um tremor com magnitude e/ou intensidade equivalente<br />

ocorrendo no Brasil, poderia ter destruído boa parte da região metropolitana de<br />

São Paulo, conforme simulação ilustrada na figura 4.<br />

Mesmo o Brasil sendo considerado um país assísmico, pequenos tremores e até<br />

alguns registros de magnitude elevada são identificados constantemente em algumas<br />

regiões do país.<br />

AGRA<strong>DE</strong>CIMENTO<br />

Os autores agradecem à FI<strong>DE</strong>SA-Pará/Brasil e à universidade da Amazônia -<br />

UNAMA pelos recursos materiais (equipamentos) e financeiros (bolsas) colocados<br />

à disposição desta pesquisa.<br />

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41<br />

REFERÊNCIAS<br />

[1] APOLLO 11. Mapa das placas tectônicas. Disponível em: . Acesso em: 10 dez. 2009.<br />

[2] BGS – British Geological Survey. Disponível em: . Acesso<br />

em: 3 fev. 2010.<br />

[3] ELETRONORTE. Tucuruí. Disponível em: . Acesso em: 3 dez. 2009.<br />

[4] MACHADO, J.; MASSON, C.; VERA, A.; RIBEIRO, A.; TURRER, R.; CID, T.; ARINI, J.; GUI-<br />

MARÃES, C. & FERNAN<strong>DE</strong>S, N. (2010) – Um país inteiro para reconstruir. Revista Época,<br />

Rio de Janeiro, n. 609, p. 62-79.<br />

[5] FILHO, M. S. D. Física da Terra e do universo para Licenciatura em Geociências. São<br />

Paulo. Disponível em: .<br />

Acesso em: 7 dez. 2009.<br />

[6] FOLHA ONLINE. Saiba mais sobre a escala Richter. Disponível em: . Acesso em: 1 dez. 2009.<br />

[7] GLOBO G1. Cobertura completa: terremoto no Haiti. Disponível em: . Acesso em: 3 fev. 2010.<br />

[8] IAG/USP, Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas. Cálculo da energia<br />

de um terremoto e de sua localização. Disponível em: . Acesso em: 1 dez. 2009.<br />

[9] MELO, C. A. E. & PEDROSO, L. J. (2005) – Estudo preliminar sobre sismicidade natural<br />

e sismicidade induzida por reservatórios. Relatório Técnico de Iniciação Científica (RTIC-<br />

CAEM01-03/05) – Universidade de Brasília, Brasília.<br />

[10] O GLOBO ONLINE – Prédios do governo e de organizações internacionais no Haiti<br />

não resistiram aos tremores. Disponível em: .<br />

Acesso em: 12 fev. 2010.<br />

[11] Observatório Sismológico. UnB. Disponível em: . Acesso<br />

em: 11 nov. 2009.<br />

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42<br />

[12] RIBEIRO, P. M. V. Uma metodologia analítica para a avaliação do campo de tensões<br />

em barragens gravidade de concreto durante terremotos. 162p. Dissertação (Mestrado<br />

em estruturas e construção civil) – Departamento de engenharia civil e ambiental, Universidade<br />

de Brasília, Brasília, 2006.<br />

[13] SILVA, S. F.; SANTOS JUNIOR, E. C. R.; SOARES, A. A. B.; RIBEIRO, F. R., Uma Modificação<br />

ao Método Pseudo-Estático Através de uma aproximação Analítica Proposta a Pressão<br />

Hidrodinâmica. Revista Traços, v.11, n. 24, 2010.<br />

[14] SOUZA, A. J. M. Avaliação preliminar da segurança sísmica de um perfil típico em<br />

barragem de concreto gravidade, estudo de caso barragem de Tucuruí. 67p. Trabalho<br />

de conclusão de curso (graduação em Engenharia Civil) – Universidade da Amazônia,<br />

Belém, 2009.<br />

[15] STOLOVAS, S. Dinâmica aplicada em estruturas de concreto. 283p. Curso TQS Informática.<br />

São Paulo, 2009.<br />

[16] Terremoto. Disponível em: . Acesso em: 2 dez. 2009.<br />

[17] ÚLTIMO SEGUNDO. Veja o que aconteceria se o terremoto tivesse sido em oito<br />

capitais do Brasil. Disponível em: .<br />

Acesso em: 27 jan. 2010.<br />

[18] USGS, United States Geological Survey. Pager M 7.0 Haiti Region. Disponível em:<br />

. Acesso<br />

em: 18 jan. 2010.<br />

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43<br />

CARACTERIZAÇÃO FÍSICA E MINERALÓGICA DO LODO<br />

DA ETA BOLONHA, ARGILAS GORDA E MAGRA<br />

PARA CONFECÇÃO DA MASSA CERÂMICA<br />

Elzelis de Aguiar Muller *<br />

Luiza Girard Teixeira Machado **<br />

Alberto Carlos de Melo Lima ***<br />

RESUMO<br />

Este trabalho apresenta as características do lodo da ETA Bolonha (Belém-Pará-Brasil) e<br />

das argilas gorda e magra utilizadas para confecção da massa cerâmica em industria<br />

cerâmica da região. Para tanto, foi necessário conhecer as características do resíduo<br />

(lodo) de ETA, pois os resíduos dependem dos sólidos suspensos presentes na água<br />

bruta e dos diferentes produtos químicos que são utilizados no tratamento da água.<br />

Para a caracterização físico e mineralógica do lodo de ETA foram utilizados amostras de<br />

lodo obtidas no decantador da ETA Bolonha. Foram determinados, teores de sólidos<br />

totais, de matéria orgânica e de umidade do lodo, e das argilas. A técnica de difratometria<br />

de raios-X foi empregada nas amostras de lodo e argila e tiveram como principais<br />

constituintes mineralógicos do lodo utilizado neste trabalho, a: caulinita (Al 2<br />

Si 2<br />

O5(OH) 4<br />

)<br />

e gibsita (Al(OH) 3<br />

). A argila gorda apresentou as seguintes fases cristalinas: caulinita,<br />

quartzo e muscovita.<br />

Palavras-Chave: Lodo de ETA. Argila gorda. Argila magra. Difratometria de Raios-X<br />

(PHYSICAL AND MINERALOGICAL CHARACTERIZATION OF SLUDGE FROM<br />

ETA BOLONHA CLAY, FAT AND LEAN MASS FOR MAKING CERAMICS)<br />

ABSTRACT<br />

This paper presents the characteristics of the sludge ETA Bolonha (Belém-Pará-Brazil) and<br />

the fat and lean clays used to make ceramic body in the ceramic industry in the region. To<br />

this end, it was necessary to know the characteristics of the residue (sludge) from ETA, as<br />

the waste depend on the suspended solids present in raw water and various chemicals that<br />

are used in water treatment. For the physical and mineralogical characterization of sludge<br />

* Mestre em Engenharia Civil (PPGEC-UFPA); professora adjunta da Universidade da Amazônia (UNAMA) e da<br />

Universidade do Estado do Pará (UEPA). E-mail: elzelis@oi.com.br<br />

** Doutora em Ciências: Desenvolvimento Sócio Ambiental (UFPA), professora adjunta da Faculdade de Engenharia<br />

Sanitária e Ambiental e do mestrado em Engenharia Civil da UFPA<br />

***Doutor em Hidráulica e Saneamento (EESC-USP); professor titular da Universidade da Amazônia (UNAMA); professor<br />

da Universidade do Estado do Pará (UEPA)<br />

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44<br />

ETA were used samples collected in the decanter ETA Bolonha. Were determined, total solids,<br />

organic matter and moisture from the mud, and clays. The technique of diffraction of X-<br />

ray was used in samples of mud and clay and had the main mineralogical constituents of<br />

the sludge used in this study, to: kaolinite (Al2Si2O5 (OH) 4) and gibbsite (Al (OH) 3). The clay<br />

content has made the following crystalline phases: kaolinite, quartz and muscovite.<br />

Keywords: Sludge ETA. Clay Content. Clay Body and Diffraction of X-Ray<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

O lodo gerado pelas estações de tratamento de água (ETAs) provenientes do<br />

processo de clarificação (decantadores e filtros), atualmente são, na maioria, lançados<br />

diretamente nos corpos d’água naturais (COR<strong>DE</strong>IRO, 1999 ), sendo esta prática enquadrada<br />

na categoria de crime ambiental (DIAS et al., 2008).<br />

Os danos ambientais causados pelo lançamento em grande quantidade desses<br />

resíduos são enormes, devido ao aumento na quantidade de sólidos em suspensão,<br />

assoreamento dos corpos hídricos, mudanças de cor, aumento das concentrações de<br />

alumínio, e ainda que incipiente, uma Demanda Química de Oxigênio (MORITA et<br />

al.,2002). Existe uma grande preocupação em torno desse assunto e diversas medidas<br />

foram tomadas com vistas a reduzir o lançamento desse resíduo nos rios e mananciais.<br />

Diversos trabalhos, como os de Tallini Júnior et al. (2006); Dias et al. (2008); Babatunde<br />

e Zhao (2007); Cosin et al. (2002); Magalhães (2003) e Teixeira et al. (2006), tratam sobre<br />

a possibilidade da incorporação do lodo como matéria-prima na indústria de cerâmica<br />

vermelha. Observa-se que o uso do lodo evita danos ao meio ambiente, particularmente,<br />

às bacias hidrográficas que incorporam estes cursos d’água, já que haverá menos<br />

lançamento de resíduos e consequentemente, o assoreamento e sua contaminação por<br />

poluentes presentes nos lodos. Desta forma, conhecer as características do lodo de<br />

ETAs para que se possa utilizá-los nas massas cerâmicas é de fundamental importância,<br />

visto que, os resíduos (lodo) variam com os sólidos suspensos presentes na água bruta<br />

e dos produtos químicos empregados no tratamento.<br />

2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA<br />

A ETA Bolonha, que abastece 65% da Região Metropolitana de Belém, tem como<br />

principais mananciais os lagos Água Preta e Bolonha e o rio Guamá. Machado (2003)<br />

comenta, em seu trabalho, que a produção de lodo gerado no processo de clarificação é<br />

de aproximadamente 105 toneladas de resíduos secos por mês, que são lançados diretamente<br />

em Igarapé, pela concessionária de serviços de abastecimento, Companhia de<br />

Saneamento do Pará - Cosanpa.<br />

Uma ETA convencional é constituída das seguintes etapas: coagulação, floculação,<br />

decantação, filtração, desinfecção, correção de pH e fluoretação. A coagulação é a desestabilização<br />

de partículas presentes na água bruta. Os principais coagulantes usados são:<br />

sulfato de alumínio, cloreto de polialumínio, sulfato férrico, sulfato ferroso clorado e<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 43-54, jun. 2010


45<br />

cloreto férrico. A floculação implica no encontro das partículas desestabilizadas, proporcionando<br />

a formação de agregados (flocos). Nos decantadores, os flocos formados são<br />

separados da água pela ação da gravidade. A etapa de filtração tem como objetivo reter as<br />

partículas sólidas que não ficaram retidas no decantador, ou leitos porosos como de carvão<br />

ativado, areia e cascalho. As ETAs são constituídas de filtros rápidos que funcionam<br />

sob a ação da gravidade e sob pressão e são lavados a contra-corrente (inversão de fluxo)<br />

com uma vazão que possa expandir, de forma segura, o meio filtrante. Este processo de<br />

lavagem dos filtros carreia muitos resíduos e são nocivos ao meio ambiente. A etapa final<br />

do processo de tratamento é a desinfecção, que inativa os microorganismos patogênicos<br />

presentes na água através de agentes físicos e/ou químicos.<br />

Dias et al, (2008) citaram que, devido ao baixo padrão de qualidade da água<br />

bruta captada, as ETAs sofrem algumas implicações internas como aumento do consumo<br />

de produtos químicos, particularmente do sulfato de alumínio e o aumento expressivo<br />

do volume de resíduos concentrados em suas unidades de decantação e filtração.<br />

Os autores ressaltaram que esses resíduos, aqui denominados de “lodo de ETA” são<br />

lançados nos mananciais superficiais sem qualquer tratamento e agredindo dessa forma<br />

o meio ambiente. Segundo a AWWA (1990) o resíduo (lodo) gerado nos decantadores<br />

e filtros das ETAs possui composição variada de acordo com a região onde ela está<br />

localizada, com o mês de coleta e com o coagulante usado.<br />

Cordeiro (1999), ao estudar o lodo de ETAs, ressalta que há grande carência de<br />

pesquisas científicas e tecnológicas sobre o tema e que os poucos dados que existem no<br />

Brasil estão dispersos, dificultando o trabalho neste campo, e falta a conscientização<br />

efetiva sobre a importância do assunto.<br />

Segundo Richter (2001) apud Andrade (2005), de acordo com o tipo de tratamento<br />

de água empregado, diferentes resíduos provenientes dos decantadores e dos filtros<br />

serão gerados, com características diversas, quando provenientes de ETAs convencionais<br />

ou de ETAs de abrandamento.<br />

Richter (2001), Dias et al. (2008) afirmaram que as características do lodo gerado<br />

nas ETAs variam de acordo com a natureza da água bruta, captada no processo, dos<br />

processos unitários, dos produtos químicos aplicados, tipo e forma de limpeza dos<br />

decantadores, entre outros fatores.<br />

Segundo Novaes (2005), as ETAs utilizam produtos químicos na chegada da<br />

água bruta, como por exemplo, carvão ativado em pó (CAP) para controle e sabor e<br />

odor de precursores de subprodutos da desinfecção; cal virgem ou hidratada para<br />

controle do pH do processo e oxidantes como peróxido de hidrogênio e permanganato<br />

de potássio, sendo que a adição desses produtos químicos também irá afetar a<br />

composição do lodo. Ainda segundo o autor, os hidróxidos dos sais de alumínio ou<br />

ferro, que são os coagulantes mais usados, são os principais constituintes do lodo,<br />

sendo que a água de hidratação presa aos flocos faz com que fique em forma de gel<br />

gelatinoso e volumoso de difícil desaguamento. Este lodo tem propriedades de<br />

fluido tixotrópico, ou seja, é gel em estado natural e fluido quando submetido a<br />

esforços cisalhantes e de difícil sedimentação ou flotação. Na tabela 2.1 são apresentados<br />

alguns materiais encontrados em lodos de ETAs.<br />

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46<br />

Tabela 2.1: Materiais encontrados em resíduos provenientes em<br />

processos de tratamento de água.<br />

Fonte: DOE (1990) apud Novaes (2005)<br />

Andrade (2005) enfatizou a necessidade de se conhecer as características do<br />

lodo a partir da determinação de parâmetros como: sólidos, pH, metais, nitrogênio,<br />

fósforo total, carbono orgânico total (COT) etc. A autora relacionou nas tabelas 2.2<br />

e 2.3 as características dos lodos de ETAs, segundo diversos autores.<br />

Tabela 2.2: Características dos lodos de estações de tratamento de água (parâmetros<br />

convencionais).<br />

LEGENDAS:<br />

(1) Síntese da caracterização de lodo de decantadores realizados<br />

por diversos autores<br />

(2) Resíduo de tratamento com sulfato de alumínio<br />

(3) Resíduo de tratamento comcloreto férrico<br />

(4) Resíduo do processo de abran damento por cal<br />

(5) Água de lavagem dos filtros<br />

Fonte: Adaptado de Andrade (2005).<br />

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47<br />

Tabela 2.3: Características dos lodos de estações de tratamento de água (parâmetros<br />

não convencionais).<br />

Fonte: Andrade (2005)<br />

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48<br />

Machado (2003) realizou um estudo sobre os resíduos gerados na ETA Bolonha,<br />

que é também o objeto de estudo deste trabalho. Os dados obtidos pela autora estão<br />

apresentados na tabela 2.4 e apresentam as características gerais dos resíduos produzidos<br />

na ETA Bolonha.<br />

Tabela 2.4 - Características gerais dos resíduos produzidos na ETA Bolonha.<br />

* Somente lodo dos decantadores<br />

Fonte: Adaptado de Machado (2003).<br />

Os dados apresentados na tabela 2.4 mostram que o volume dos resíduos gerados<br />

no processo de lavagem dos filtros é quase 6 vezes maior do que o retirado nos<br />

decantadores mensalmente. O inverso se observa em relação aos sólidos totais encontrados<br />

nos decantadores da ETA Bolonha, que produz mensalmente 3.424 mg/L em<br />

relação aos 504 mg/L encontrados na água de lavagem dos filtros. O pH em quase todos<br />

os trabalhos apresentados nas tabelas 2.2 a 2.4 ficou dentro dos limites de 5,0 a 8,0 para<br />

as ETAs que têm o alumínio como coagulante no processo de tratamento. Os dados<br />

apresentados nas tabelas 2.2 a 2.4 possuem valores distintos e são faixas amplas. Quando<br />

se compara, por exemplo, os valores encontrados para o alumínio em diferentes<br />

trabalhos e os apresentados na tabela 2.4, observa-se a necessidade de realizar uma<br />

caracterização completa para que se defina o tipo de tratamento e a disposição final.<br />

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49<br />

3 METODOLOGIA<br />

Para atingir o principal objetivo deste trabalho foram implantadas duas Unidades<br />

de Desaguamento do Lodo (UDL) em áreas próximas dos decantadores da ETA Bolonha,<br />

de acordo com a metodologia proposta por Cordeiro (2001), que desenvolveu uma<br />

proposta de um leito constituído de uma camada de brita nº 01 com 5cm e sobre ela a<br />

manta geotextil, com a camada de lodo atingindo até 50cm.<br />

As UDLs foram compostas de reservatórios cilíndricos com capacidades variadas<br />

(1000 litros e 500 litros), dotados de drenos de fundo e camada drenante, constituída de<br />

uma camada de seixo nº 01 com 5cm de espessura sob a manta Geotextil MT600.<br />

Os procedimentos dos ensaios de determinação do teror de umidade seguiu as<br />

normas da ABNT: NBR 6457. O ensaio de determinação da matéria orgânica foi realizado<br />

através do método do carbono orgânico e seguiu a metodologia da EMBRAPA/PA.<br />

No caso da análise por difração de raios-X, Dias et al (2008) comentaram, em<br />

seu trabalho sobre uso do lodo na fabricação de blocos, que esta técnica consiste em<br />

determinar as distâncias mantidas pelos íons ou átomos formadores dos cristais (distância<br />

interplanares), através do conhecimento do ângulo formado pelo feixe de raios-X<br />

incidente e o plano atômico e difrato, como também do conhecimento do comprimento<br />

de onda desses raios. Segundo os autores essa técnica tem sido muita utilizada<br />

na análise de inúmeros materiais cimentícios, rochas, solos e concretos, a fim de<br />

qualificar os minerais constituintes de cada material. Ressalta-se que, este último<br />

ensaio (difração de raios-X) consiste de um equipamento de raios-X (figura 3.1), com<br />

amostra em pó, cujo diagrama de refração é registrado graficamente por contador<br />

Geiger, chamado de difratograma de raios-X. O ensaio consiste em secar o resíduo em<br />

estufa e depois passar na peneira nº 100 e em seguida a amostra em pó é colocada em<br />

lâminas de vidro. Logo depois o aparelho de raios-X é acionado sobre a amostra e<br />

obtido o difratograma em contador.<br />

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50<br />

Figura 3.1: Difratômetro de raios-X da marca Philips PW 1730, com Goniômetro PW 1050,<br />

foco normal, e com tubo de raios-x de anodo de Cu (Ká11,540598 Å). A aquisição de<br />

dados foi obtida através de uma interface e software e tratamento dos dados com o<br />

software APD (Automated Powder Diffraction). Os registros foram realizados no intervalo<br />

de 10 a 60° 2è.<br />

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO<br />

Nas tabelas 4.1 e 4.2 são apresentados os teores de sólidos (iniciais e finais)<br />

determinados para o lodo após desaguamento na UDL, e os teores de carbono e matéria<br />

orgânica para os lodos desaguados e as argilas utilizadas na fabricação dos tijolos.<br />

Tabela 4.1: Teores de sólidos totais do lodo, antes e após o período de desaguamento.<br />

Tabela 4.2: Teores de matéria orgânica no lodo desaguado e argilas.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 43-54, jun. 2010


51<br />

Nas tabelas 4.3 e 4.4 são apresentados os resultados do teor de umidade do lodo<br />

da ETA Bolonha, das argilas magra e gorda, e da massa cerâmica no inicio do processo de<br />

produção dos tijolos cerâmicos.<br />

Tabela 4.3: Teor de umidade do lodo da ETA Bolonha, das argilas magra e gorda, e da<br />

massa cerâmica – UDL1.<br />

Tabela 4.4: Teor de umidade do lodo da ETA Bolonha, das argilas magra e gorda, e da<br />

massa cerâmica – UDL2.<br />

Os teores de umidade do lodo apresentados nas tabelas 4.3 e 4.4 diferem entre<br />

si em 4,42%. Essa diferença pode ser atribuída ao tempo de desaguamento do lodo da<br />

UDL1 que foi maior (23 dias) em relação à UDL2 (15 dias). O teor de sólidos encontrado<br />

nos lotes das UDL1 e UDL2 foram de 27,87% e 23,45%, respectivamente.<br />

As amostras de lodo da ETA Bolonha apresentaram comportamento físico diferenciado<br />

dos encontrados nos solos com constantes dificuldades de manuseio do mesmo<br />

na realização dos ensaios geotécnicos, fato também relatado por Nunes e Sartori<br />

(1997), que concluiram que a constituição e o comportamento da amostra do lodo dos<br />

leitos de secagem afastavam-se radicalmente do modelo utilizado na geotecnia, com<br />

forte presença de matéria de natureza orgânica, transferindo atributos químicos que<br />

determinaram um comportamento peculiar, tanto no estado úmido quanto seco, diferenciando-o<br />

bastante dos solos ainda que orgânicos, ou mesmo turfas. Tais observações<br />

foram constatadas durante a realização dos ensaios geotécnicos realizados nas amostras<br />

do lodo deste trabalho.<br />

Os resultados referentes à difratometria de raios-X tiveram como principais constituintes<br />

mineralógicos do lodo utilizado neste trabalho, determinados por DRXP, foram:<br />

caulinita (Al 2<br />

Si 2<br />

O5(OH) 4<br />

) e gibsita (Al(OH) 3<br />

). A argila gorda apresentou na análise de DRXP<br />

as seguintes fases cristalinas: caulinita, quartzo e muscovita. A indexação dos picos basais<br />

nos difratogramas (figura 4.1 a 4.3) obtidos a partir dos materiais preparados foi<br />

realizada por comparação com o padrão do banco de dados do programa da Philips<br />

(X-pert High Score), utilizando os padrões difratométricos do JCPDS-ICDD. Foi observado<br />

também que as duas amostras de lodo apresentaram predominância de fase amorfa.<br />

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52<br />

Figura 4.1: Difratograma de raios X - Lodo da UDL1.<br />

Figura 4.2: Difratograma de raios X - Lodo da UDL2.<br />

Figura 4.3: Difratograma de raios-X de argila gorda.<br />

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53<br />

5 CONCLUSÃO<br />

Os estudos sobre características de lodo de ETA Bolonha e das argilas, conduziram às<br />

seguintes conclusões:<br />

AGRA<strong>DE</strong>CIMENTOS<br />

• Os teores de sólidos da massa seca do lodo encontrado na UDL1 foi de<br />

27,9% e na UDL2 de 23,4%.<br />

• O lodo retirado da válvula de fundo do decantador, durante o processo<br />

de lavagem apresentou alto teor de sólidos totais (27,9%) em relação ao<br />

lodo coletado diretamente do fundo (23,4%).<br />

• A massa seca do lodo da ETA Bolonha apresentou um teor de carbono<br />

orgânico entre 2,35 e 2,45%.<br />

• As caracterizações mineralógicas das amostras do lodo da ETA Bolonha<br />

definiram como principais constituintes a caulinita e a gibsita. A argila<br />

gorda apresentou a caulinita, o quartzo e muscovita em sua composição<br />

mineralógica, com predominância de caulinita. O lodo e a argila gorda<br />

podem ser caracterizados como materiais plásticos.<br />

• O coagulante utilizado na ETA Bolonha (policloreto de alumínio) ocasionou<br />

uma coloração mais clara na massa cerâmica.<br />

Os autores agradecem à Cerâmica Brasília (Benevides-PA) pelo fornecimento das<br />

matérias-primas e toda a infraestrutura para a consecução deste trabalho. À Cosanpa que<br />

viabilizou as coletas. À UFPA, UNAMA, IFPA e à Embrapa/PA pelos laboratórios.<br />

REFERÊNCIAS<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Patrícia de Souza. Avaliação do impacto ambiental da utilização de resíduos<br />

de estações de tratamento de água em indústrias de cerâmica vermelha: estudo de<br />

caso. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo<br />

da Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2005.<br />

AWWA, American Water Works Association, 1990.<br />

BABATUN<strong>DE</strong> A. O. and ZHAO, Y. Q., Constructive Approaches Toward Water Treatment<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 43-54, jun. 2010


54<br />

Works Sludge Management: An International Review of Beneficial Reuses. Critical Reviews<br />

in Environmental Science and Technology, v. 37, p. 129-164, 2007.<br />

COSANPA, Companhia de Saneamento do Pará, Disponível em: Acesso em: 19 ago. 2008.<br />

COR<strong>DE</strong>IRO, J. S. Importância do tratamento e disposição adequada dos lodos de ETAs. In:<br />

Noções gerais de tratamento e disposição final de lodos de estações de tratamento de<br />

água. São Paulo, 1999. Cap 1, p.3.<br />

COSIN, S., KOZIEVITCH, F. J.; MORENO, M. T; SOUZA SANTOS, P. F. R.; VALENZUELA, Diaz.<br />

Estudos visando a incorporação de lodo de ETA em massas de cerâmica vermelha. Anais<br />

do 46º Congresso Brasileiro de Cerâmica, São Paulo, 2002.<br />

DIAS, L. M; BATALIONE, G; MORAIS, F. U; F. SOBRINHO, J; RIBEIRO, M. C; LISBOA, M. S.<br />

Alternativa de destinação final do lodo de estação de tratamento de água: fabricação de<br />

blocos cerâmicos.[s.l.:s.n., s.d.].<br />

MACHADO, L. G. T. Análise de Ciclo de Vida Aplicada ao Gerenciamento de Resíduos: o<br />

caso da ETA Bolonha. Tese de Doutorado apresentada à Universidade Federal do Pará.<br />

Belém, 2003.<br />

MAGALHÃES, P. F. Estudo de viabilidade de incorporação de lodo de estação de tratamento<br />

de água na produção de cerâmica vermelha. Dissertação (Mestrado) -Pontifícia<br />

Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Ciências dos Materiais e<br />

Metalurgia, Rio de Janeiro, 2003.<br />

MORITA, D. M; SAMPAIO, A. O.; MIKI, M. K.; DAVID, A. C. Incorporação de lodos de<br />

estações de tratamento de água em blocos cerâmicos. In: Simpósio Luso-Brasileiro de<br />

Engenharia Sanitária e Ambiental, 10, 2002. Anais Eletrônico. Braga, APESB, 2002, p 1-15.<br />

NOVAES, R. M. , Viabilidade técnica da incorporação de lodos das estações de tratamento<br />

de água do município de Campinas em blocos cerâmicos. Dissertação (Mestrado) -<br />

Universidade Estadual de Campinas, Campinas, São Paulo, 2005.<br />

TEIXEIRA, S. R., SOUZA, S. A de, SOUZA, N. R., ALÉSSIO, P., SANTOS, G. T. A., Efeito da<br />

adição de lodo de estação de tratamento de água (ETA) nas propriedades de material<br />

cerâmico estrutural. Revista Cerâmica, v. 52, p 215-220, 2006<br />

T. JUNIOR, V. M, MYMRINE, V.; RIBEIRO, R. A. C; PONTE, H. A. Utilização de lodo de ETA no<br />

desenvolvimento de novos compostos cerâmicos. In: Congresso Brasileiro de Engenharia<br />

e Ciências dos Materiais - 17º CBEC-Mat. nov. 2006.<br />

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55<br />

AVALIAÇÃO HIDRÁULICA E <strong>DE</strong> POLUENTES DO AFLUENTE<br />

<strong>DE</strong> ESTAÇÃO <strong>DE</strong> TRATAMENTO <strong>DE</strong> ESGOTO (ETE)<br />

<strong>DE</strong> AEROPORTO <strong>DE</strong> GRAN<strong>DE</strong> PORTE<br />

Adiel José Passos da Cunha Júnio *<br />

Neyson Martins Mendonça **<br />

Márcia Valéria Porto de Oliveira Cunha ***<br />

Luiza Carla Girard Texeira Machado ****<br />

Robson Costa da Costa *****<br />

RESUMO<br />

O trabalho consistiu na avaliação hidráulica e de poluentes da Estação de Tratamento de<br />

Esgoto - ETE do Aeroporto Internacional de Belém, que teve seu delineamento experimental<br />

dividido em duas etapas: a primeira caracterizou o esgoto bruto da ETE em<br />

termos de vazão, pH, DQO, SST, N-amonical, P e E-coli, durante os períodos seco e<br />

chuvoso nos anos de 2007 a 2008, obtendo-se informações relativas à carga hidráulica<br />

per capta (L/hab.dia) e carga per capta de poluentes (g/hab.dia). E a segunda simulouse<br />

dois sistemas de tratamento distintos propostos para o efluente da ETE AIB (L.A e<br />

UASB + L.A), de modo a se obter informações da produção de lodo (L/hab.dia), consumo<br />

energético (kw), demanda de área (m 2 /hab), eficiência de DQO (E DQO<br />

), e DQO efluente<br />

(DQO EFL<br />

.). Os resultados da primeira etapa, trabalhados estatisticamente através do<br />

teste de hipótese de Kruskall-Wallis, não apresentaram diferenças estatísticas entre o<br />

período chuvoso e seco (p> a=5%) em termos hidráulicos e orgânicos, o que permitiu<br />

concluir que o esgoto da ETE AIB tem características que independem do fluxo de passageiros<br />

e funcionários. Com relação à produção de lodo, demanda (energética e específica<br />

de área), concluiu-se que o sistema UASB+LA seria a melhor alternativa para o<br />

tratamento do esgoto sanitário da ETE AIB.<br />

Palavras-Chave: Aeroporto. Carga Hidráulica. Carga de Poluentes. Tratamento de Esgoto.<br />

* Engenheiro civil pela UFPA; mestre em Engenharia Civil, Recursos Hídricos e Saneamento, pela UFPA; professor<br />

do IFPA, Área Construção Civil. E-mail: ajpcunha@yahoo.com.br<br />

** Doutor em Hidráulica e Saneamento pela Escola de Engenharia de São Carlos; professor adjunto I do Instituto<br />

de Tecnologia da UFPA; professor do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da UFPA; coordenador<br />

do Grupo de Estudo em Gerenciamento de Água e Reuso de Efluentes – GESA.<br />

*** Engenheira sanitarista pela UFPA; mestre em Engenharia Civil, Recursos Hídricos e Saneamento, pela UFPA.<br />

Professora do IFPA, Área Meio Ambiente; Pesquisadora do GESA.<br />

**** Doutora em Ciências - Desenvolvimento Socioambiental pelo NAEA/UFPA; professora adjunta I do Instituto<br />

de Tecnologia da UFPA. Professora do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da UFPA; Pesquisadora<br />

do GESA.<br />

***** Técnico em Saneamento pelo IFPA. Estudante do Curso de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFPA.<br />

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56<br />

ABSTRACT<br />

EVALUATION OF HYDRAULIC AND ORGANIC LOAD FROM<br />

THE AIRPORT OF ETE LARGE<br />

This work aims the evaluation of the hydraulic and organic treatment of sewage (TEE) in<br />

the International Airport of Belém (IBA), which had its experimental design in two steps:<br />

first and second. The first step, it comprised to characterize the raw drainage of ETE in<br />

therms of flow, pH, COD, TSS, N-amonical, P and E-coli, during the dry and rainy periods<br />

in the Amazonian Region (2007 to 2008) with the objective of obtain information about<br />

the hydraulic load percapta (L / inhabitants.day) and load percapta of pollutants (g /<br />

inhabitants.day). And in the second phase, evaluation was conducted in two separate<br />

treatment systems (activated sludges and UASB-activated sludges), so to estimate the<br />

informations about the production of sludge (L / inhabitants.day), energy consumption<br />

(kw), demand for area (m 2 / inhabitants), efficiency of COD (E COD<br />

) and effluent COD (COD efl<br />

)<br />

In the first stage, the average results were: dry period ¾18,87±9,39 L / inhabitants.day;<br />

8.38 ± 5.95 gCOD / inhabitants.day; 2.92 ± 2.03 gSST / inhabitants.day; 1.85 ± 0.98 gNamoniacal<br />

/ inhabitants.day, and 0,12±0,06 gP / inhabitants.day, and rainy season<br />

23,67±7,41L / inhabitants.day; 10 ± 4.97 gCOD / inhabitants.day; 3.66 ± 1.70 gSST /<br />

inhabitants.day; 1.72 ± 1 gN-amoniacal/ inhabitants.day, and 0.14 ± 0.06 gp /<br />

inhabitants.day. These results, by applying the hypothesis test of Kruskal-Wallis, showed<br />

no statistical differences between the rainy season and dry season (p>a=5%) in hydraulic<br />

and organic terms, allowing the inference that the wastewater generated TEE in the IBA<br />

has characteristics independent of the flow of passengers + employees. In the second<br />

stage of this work, it obtained for the activated sludge’s system: Pequivalente: 1236<br />

inhabitants, sludge’s production of 1.97 L / inhabitants.day, consumption of energy for<br />

aeration of 0,744 kw, demand for 0,038 area of m 2 / inhabitants and E COD<br />

= 80% and COD efl<br />

.= 90 mg / L. and for UASB-activated sludges obtained P EQV<br />

: 1236 inhabitants, production<br />

of sludge of 1.97 L / inhabitants.day, consumption of energy for aeration of 0744 kw, 0038<br />

demand for area of m 2 / inhabitants and E COD<br />

= 80% and COD efl<br />

.= 90 mg / L. Evaluating the<br />

question generated sludge’s production, energy and specific area demand, it is clear that<br />

the adoption of the system UASB + LA is which represents the best alternative for the<br />

treatment of sewage from TEE of AIB, as that treats the same amount of sewage and the<br />

removal efficiency of COD equivalent to the system of LA smaller amount of sludge<br />

generated and energy consumption.<br />

Key words: Airport, treatment of sewage, hydraulic load , pollutants load<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

Especificamente na área de saneamento o registro da vazão assume papel de<br />

destaque para a solução de problemas relacionados ao abastecimento de água, drenagem<br />

urbana, análise da capacidade de recebimento de esgotos em corpos d’água, siste-<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


57<br />

mas de coleta e tratamento de esgoto (doméstico e industrial), entre outros. Baseado<br />

no parâmetro vazão são projetados os equipamentos de infraestrutura sanitária e ambiental,<br />

capazes de assegurar a qualidade de vida da população que será atendida.<br />

Contudo os projetistas e companhias de saneamento deparam-se, muitas vezes,<br />

com incertezas quanto à definição de variáveis envolvidas na concepção desses<br />

sistemas de infraestrutura sanitária e ambiental, haja vista, haver pouca disponibilidade<br />

de dados reais de vazão determinados por intermédio de medições efetivas.<br />

O reflexo na utilização de dados de vazão de pouca confiabilidade pode, por<br />

exemplo, comprometer o período de alcance do projeto de Estação de Tratamento de<br />

Água (ETA) ou Estação de Tratamento de Esgoto (ETE), tendo como consequência a saturação<br />

prematura do projeto (subestimado), ou a ocorrência de situação inversa, haver<br />

superestimado os dados de vazão que ocasionam investimentos iniciais desnecessários,<br />

desperdícios econômicos e financeiros na execução de uma dada obra.<br />

A investigação profunda na etapa de obtenção de dados verdadeiros para o dimensionamento<br />

de sistemas sanitários e ambientais mostra-se de fundamental importância,<br />

sob pena de incorrer-se em erros de projeto, algumas vezes grosseiros. Campos<br />

(1994) comenta que é essencial para se iniciar o levantamento de dados para elaboração<br />

de projeto de sistema de tratamento de esgotos determinar-se a qualidade e a quantidade<br />

dos esgotos que serão encaminhados à ETE para que seja possível o dimensionamento<br />

mais próximo da realidade local e não baseado em dados obtidos em literaturas.<br />

A caracterização qualitativa e quantitativa dos esgotos é essencial para a concepção<br />

de sistemas de coleta, tratamento e disposição. O amplo e perfeito conhecimento<br />

das características do esgoto permite decidir qual a melhor alternativa de tratamento<br />

a ser empregada e como será a operação do processo deste tratamento, e também<br />

dimensionar melhor o sistema, sem riscos de incertezas e com custos adequados.<br />

Além disso, o conhecimento da composição e da quantidade de esgoto é essencial<br />

também na avaliação da operação de uma estação de tratamento e na manutenção da<br />

qualidade do sistema de tratamento.<br />

Outros exemplos de obtenção de dados de vazão são mencionados por Magalhães<br />

(2000), no qual o monitoramento dessa variável pode ser visto como processo<br />

essencial à implementação de instrumentos de gestão das águas que permitam a obtenção<br />

de informações estratégicas, acompanhado das medidas efetivadas, atualizações<br />

dos bancos de dados e direcionamento das decisões.<br />

Diante de dados de vazão de sistemas, pode-se obter resultados que visam a<br />

sua otimização operacional e o alcance de ações de planejamento relacionadas à expansão<br />

do mesmo, readequações dos setores de distribuição, como por exemplo: operação<br />

(intervenção controlada para obtenção de níveis de eficiência desejáveis); controle<br />

de gastos com energia elétrica (deve-se ter em conta que grande parte da adução,<br />

distribuição e do próprio tratamento depende de equipamentos e instalações elétricas)<br />

e controle de produção (permitir medir os volumes e vazões aportadas durante<br />

determinado período de interesse. Tais elementos são essenciais para acompanhamento<br />

do sistema visando-se o estabelecimento de séries históricas necessárias a obtenção<br />

do desempenho do sistema); dosagem de produtos químicos (obtenção de graus<br />

de concentração pré-estabelecidos).<br />

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58<br />

O trabalho tem o intuito de avaliar a carga hidráulica e orgânica de ETE de Aeroporto<br />

de Grande Porte, analisando estatisticamente as variáveis trabalhadas e pré-dimensionar<br />

alternativas de tratamento baseado nas características do esgoto bruto.<br />

2 PROCEDIMENTOS E INSTALAÇÕES<br />

O delineamento experimental desse trabalho fora dividido em duas etapas: a<br />

primeira chamada de ETAPA I compreende a obtenção da vazão e as características físico-químicas<br />

e microbiológicas destinadas a se obter informações relativas à carga hidráulica<br />

(Litros/hab.dia) e carga orgânica (g/hab.dia) durante os períodos seco (junho a<br />

novembro) e chuvoso (dezembro a maio) que ocorreram na Região Amazônica referentes<br />

aos anos de 2007 e 2008. Para medição da vazão foi utilizado um medidor de vazão<br />

ultrassônico que foi instalado no canal de acesso à ETE sendo programado, para se obter<br />

dados coletados a cada 2 horas, com intervalos de leitura de 15 minutos, em perfis de 24<br />

horas, obtendo-se assim dados que foram armazenados no medidor e posteriormente<br />

transferidos ao computador.<br />

A obtenção dos valores de vazão fora realizada mediante a aplicação da equação<br />

de Thompson para vertedores triangulares, nos quais os valores de lâmina líquida de<br />

esgoto foram obtidas durante os perfis de 24 h com leituras intervaladas a cada 15<br />

minutos.<br />

Para caracterização da água residuária foram realizados perfis de amostragens<br />

do esgoto bruto durante 24 horas, com intervalos de coleta de 2 horas e frequência de<br />

duas vezes por mês para os períodos de chuva e estiagem durante 12 meses. As seguintes<br />

variáveis foram apuradas durante esta etapa: pH, SST, SD, DQO total, N-amoniacal,<br />

fósforo e coliformes termo tolerantes.<br />

As amostras do esgoto bruto da ETE AIB foram coletadas e armazenadas em<br />

frascos estéreis de polietileno com capacidade de 1L, devidamente identificados e<br />

mantidos sob refrigeração (< 10 °C), em caixas isotérmicas. Em seguida essas amostras<br />

foram encaminhadas para o Laboratório de Saneamento do Instituto Federal de Educação,<br />

Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA), que forneceu toda a infraestrutura laboratorial<br />

disponível para a determinação das variáveis.<br />

A partir das informações de vazão e características do esgoto bruto (DQO,SST,Namoniacal,<br />

Ptotal, E-coli), foram determinados a contribuição percapta de esgoto em<br />

termos hidráulicos e das variáveis ora mencionadas.<br />

As informações levantadas durante a execução das análises e exames microbiológicos<br />

realizados nesse trabalho foram tratadas de forma estatística (descritiva e analítica),<br />

para ser estudadas, avaliadas, e apresentadas sob forma gráfica, para que, ao final possa<br />

obter um diagnóstico das características do esgoto sanitário existente na ETE AIB.<br />

O procedimento estatístico analítico utilizou o teste de Kruskall-Wallis, que é<br />

um método não paramétrico. A razão principal da escolha deste método está relacionada<br />

ao tamanho das amostras e desconhecimento da distribuição de probabilidade dos<br />

dados (condição necessária para a utilização dos métodos paramétricos). O teste em<br />

questão utilizou o pacote estatístico MINITAB versão 15.0 for Windows.<br />

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59<br />

Na segunda etapa, a partir da característica de esgoto bruto da ETE AIB, realizouse<br />

a simulação de fluxograma de tratamento por sistemas de lodos ativados e UASB +<br />

lodos ativados, visando-se avaliar aspectos com relação à produção de lodo, consumo<br />

energético, demanda de área das unidades de tratamento envolvidas.<br />

O AIB ocupa uma área de 6.315.789,54 m² e é composto de dois sistemas de<br />

coletas e transporte das águas residuárias conforme representação esquemática exposta<br />

na figura 41. O primeiro sistema coleta as águas residuárias geradas nas dependências<br />

do INFRAERO e no terminal de passageiros, sendo destinadas para tubulações<br />

que transportam por gravidade até a Estação Elevatória de Esgoto Bruto (EEEB). O segundo<br />

sistema coleta as águas residuárias diretamente das aeronaves através do carro<br />

de drenagem que posteriormente serão lançadas na casa cloacal, seguindo por descarga<br />

hidráulica até a EEEB onde ocorre o recalque até a ETE.<br />

A operação de drenagem dos dejetos, acumulados no reservatório (tanque) das<br />

aeronaves, é realizada pelo carro de drenagem de dejetos, conhecido como Quick Toillet<br />

Unit – Unidade Rápida de Toillet (QTU). A casa cloacal é o local destinado a recebimento<br />

do esgoto oriundo das aeronaves. O esgotamento de dejetos na cloaca acontece<br />

após ter se esgotado a capacidade de armazenamento do tanque de dejetos na QTU.<br />

Após o despejo, os dejetos seguem por gravidade até a EEEB.<br />

Após a junção do efluente dos dois sistemas, estes seguem por gravidade para<br />

EEEB, que é composta de caixa de retenção de sólidos, poço úmido e poço seco. A EEEB<br />

tem como objetivo recalcar o esgoto produzido nas aeronaves e no aeroporto para a<br />

ETE, distante 515 m da EEEB, que tem a capacidade de tratar aproximadamente 360 m3/<br />

dia de esgoto, pelo processo de lodos ativados. Na figura 1 é mostrado um mapa de<br />

localização do sistema de esgotamento sanitário do AIB e na figura 2 é apresentada as<br />

unidades constituintes do sistema de esgotamento sanitário da ETE AIB.<br />

Figura 1: Mapa de localização do sistema de esgotamento sanitário da AIB<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


60<br />

Figura 2: Unidades constituintes do sistema de esgotamento sanitário - AIB<br />

A ETE AIB é composta por tratamento preliminar (grade, peneira estática, caixa<br />

de areia e vertedor triangular); um reator de mistura completa (tanque de aeração); um<br />

decantador secundário para a separação das fases sólido/líquido; calha coletora e um<br />

tanque de contato no qual ocorre a desinfecção do esgoto tratado com hipoclorito de<br />

sódio conforme fluxograma exposto na figura 3. Após tratamento, o esgoto é lançado<br />

no igarapé de Val-de-Cans.<br />

Figura 3: Fluxograma da fase líquida e sólida produzidas na ETE AIB<br />

Este trabalho é parte integrante do projeto de pesquisa intitulado Diagnóstico<br />

do Sistema de Esgotamento Sanitário do Aeroporto Internacional de Belém, visando a<br />

preservação do igarapé Val-de-Cans, referente ao edital Chamada Pública MCT/FINEP/<br />

CT-HIDRO Águas em Aeroportos 03/2005. Ressalta-se aqui, que a etapa 1 do presente<br />

trabalho fora realizada em conjunto com os discentes do curso de Engenharia Sanitária<br />

e Ambiental da Universidade Federal do Pará e do curso técnico de saneamento do<br />

Instituto Federal de Educação Ciência Tecnologia do Pará.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


61<br />

3 RESULTADOS<br />

Caracterização do esgoto bruto e obtenção das cargas hidráulicas e orgânicas<br />

Em razão do volume de informações obtidas nessa etapa experimental procurou-se<br />

apresentar as variáveis julgadas mais importantes para alcançar os objetivos<br />

traçados. Assim, as tabelas 1 e 2 apresentam as características do esgoto sanitário da ETE<br />

AIB nos períodos seco e chuvoso.<br />

Tabela 1: Características do Esgoto Sanitário da ETE AIB (Seco).<br />

Tabela 2: Características do esgoto sanitário da ETE AIB (Chuvoso).<br />

Na tabela 3 encontram-se os resultados do teste de Kruskall-Wallis para as<br />

características do esgoto bruto durante o período seco e chuvoso, considerando-se a de 5%.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


62<br />

Tabela 3: Teste de Kruskall-Wallis para pH, DQO, N-amoniacal,SST, SD e E-coli, para o<br />

período seco e chuvoso.<br />

Nas tabelas 4 e 5 respectivamente são apresentadas as características de esgoto<br />

quanto a concentração (valores médios) e de esgoto sanitário típico do município de<br />

Belém.<br />

Tabela 4: Características do esgoto sanitário quanto à concentração.<br />

Fonte: METCALF & EDDY (2003).<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


63<br />

Tabela 5: Características do esgoto sanitário da ETE-Sideral.Tapanã, Belém<br />

OBS: Dados avaliados durante o período de 20/09/2007 a 24/11/2008. * Considerado valor médio<br />

Fonte: Mendonça et al. (2008)<br />

Os resultados da tabela 4 tomados como referência indicam que a composição<br />

do esgoto sanitário da ETE AIB apresenta características de esgoto médio a forte considerando-se<br />

as variáveis de DQO, SST, N-amoniacal, P e E-coli enquadram-se respectivamente<br />

médio, médio, extra-forte, fraco e forte.<br />

Considerando-se os valores médios de DQO: N-amonacal: P (tabela 1 e 2) a<br />

relação para os períodos seco e chuvoso do esgoto sanitário da ETE AIB foram, respectivamente,<br />

100: 17,6:1,2 e 100: 22,9: 1,5. Avaliando-se as relações de DQO:N-amoniacal:P<br />

e considerando-se DQO»DBO e N-amoniacal»NTK , ao se comparar com a relação DBO/<br />

N/P de 100:5:1 para tratamento aeróbio constata-se que a mesma apresenta balanço<br />

nutricional adequado para esse tipo de tratamento.<br />

E no caso de tratamento anaeróbio a relação teórica citada na literatura especializada<br />

(CHERNICHARO, 2007) é de 350:5:1 para DQO:N:P, que quando comparado com<br />

os valores dessas variáveis para o esgoto da ETE AIB obtém-se em média as seguintes<br />

relações 350:61,6:4,2 (período seco) e de 350:80,1:5,2 (período chuvoso), denotando<br />

assim a possibilidade dessa água residuária em ser tratada por processo anaeróbio.<br />

Ainda pode-se verificar com relação a DQO:N-amoniacal:P do esgoto sanitário<br />

da ETE AIB que esses valores quando confrontados com os de esgoto sanitário da ETE<br />

Sideral (Tapanã-Belém) cuja voso de 100:20:1,5 (DQO:N:P), apresentam valores similares<br />

ao de esgoto sanitário gerado no bairro do Tapanã pertencente a Belém (PA).<br />

De acordo com os valores de p observados na tabela 3, cujos valores de p foram<br />

sempre maiores que , verifica-se que não há evidências para rejeição da hipótese nula<br />

(H0) com relação a N-amoniacal, P total, SST, SD, E-coli. Com base nessa avaliação podese<br />

concluir que as características do esgoto bruto que chega a ETE AIB não apresentam<br />

influências de contribuição de águas pluviais que ocorrem entre os períodos seco e<br />

chuvoso. Provavelmente, esse fato deva-se a existência de um sistema de esgotamento<br />

sanitário (rede coletora) com baixa contribuição de águas pluviais que no caso em<br />

questão fora determinado considerando L igual a 515 m, o qual resulta em taxa de<br />

infiltração de 0,0011 L/s.m, a qual é um dos fatores responsáveis pela alteração na<br />

qualidade de esgoto.<br />

Nas tabelas 6 e 7 é apresentado o resumo estatístico descritivo de carga hidráulica<br />

e carga específica de poluentes do esgoto sanitário da ETE AIB nos períodos seco e<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


64<br />

chuvoso. Na tabela 8 é apresentado o resumo estatístico analítico através do teste não<br />

paramétrico de Kruskall-Wallis para cargas hidráulicas e específicas de poluentes para<br />

os períodos seco e chuvoso.<br />

Tabela 6: Resumo Estatístico descritivo de carga hidráulica e específica de poluentes do<br />

Esgoto Sanitário da ETE AIB (Seco).<br />

Tabela 7: Resumo estatístico descritivo de carga hidráulica e específica de poluentes do<br />

esgoto sanitário da ETE AIB (Chuvoso).<br />

Tabela 8: Teste de Kruskall-Wallis para cargas hidráulicas e específicas de poluentes para<br />

o período seco e chuvoso.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


65<br />

Analisando os resultados da tabela 6 e 7 verifica-se com base na média da produção<br />

hidráulica específica que o período chuvoso (23,67 L/hab.dia) apresentou maior<br />

valor que o seco (18,87L/hab.dia). Ainda esses dados de produção hidráulica específica<br />

quando comparados ao da literatura técnica cujo valor é de 15L/hab.dia apresentam em<br />

média valores de 1,6 (chuvoso) e 1,3 (seco) vezes superiores a essa referência. Provavelmente<br />

a diferença com relação a essa variável deve-se a complexidade dos serviços<br />

oferecidos no aeroporto (número de passageiros, número de aeronaves, número de<br />

funcionários, serviços fastfood etc.).<br />

Com relação à carga específica de poluentes, os dados da tabela 6 e 7 indicam<br />

que em média os valores de gDQO/hab.dia, gSST/hab.dia e gP/hab.dia, foram maiores<br />

no período chuvoso que no período seco, ocorrendo situação inversa para o N-amoniacal.<br />

Esse fato está intimamente ligado à ocorrência do período de festas e férias que<br />

promove maior movimentação nas atividades do AIB.<br />

Realizando-se o teste de Kruskall-Wallis para os valores de carga hidráulica e<br />

específica de poluentes os valores de p observados na tabela 8, indicam valores de p<br />

maiores que a, o que resulta em aceitar a hipótese nula (H0) de não haver diferenças<br />

estatísticas entre o período chuvoso e o período seco para as variáveis g.DQO/hab.d,<br />

g.N-amoniacal/hab.d, g.SST/hab.d e g.P/hab.dia. Isso nos permite concluir que para o<br />

esgoto bruto gerado na ETE AIB a carga hidráulica e específica de poluentes independe<br />

do fluxo de passageiros + funcionários para o período estudado.<br />

Avaliação de dois sistemas de tratamento propostos distintos<br />

Na tabela 9 é apresentado o resumo comparativo de dois sistemas propostos de<br />

tratamento simulados para a ETE AIB.<br />

Tabela 9: Resumo comparativo dos sistemas propostos de tratamento para a ETE AIB.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


66<br />

Avaliando-se os dados da tabela 9 verificam-se as seguintes inferências sobre<br />

os sistemas de tratamento:<br />

• Com relação à produção de lodo foi obtido o valor de 1,97 L/hab.d para o sistema<br />

UASB+Lodo Ativado, cujo valor segundo Andreoli et al (2001),varia entre 0,5 a<br />

1,1 L/hab.d. E para o sistema de Lodos Ativados obteve-se para a ETE AIB valor de<br />

5,73 L/hab.d , que segundo a literatura especializada ora mencionada apresenta<br />

produção de lodo específica de 3,1 a 8,2 L/hab.d. Provavelmente o valor de 1,97<br />

L/hab.d. fora da faixa recomendada pela literatura especializada pode estar<br />

relacionado ao fato do dimensionamento de reator UASB ser realizado por meio<br />

do TDH e não do tempo retenção celular, bem como as características do esgoto<br />

bruto assumidas nesse dimensionamento. Ainda é possível verificar-se que a<br />

produção específica de lodo comparando-se aos sistemas UASB+Lodo Ativado e<br />

Lodo ativados apenas têm incremento de cerca de três vezes.<br />

• Com relação a demanda energética devido ao fornecimento de oxigênio apenas<br />

para remoção da matéria carbonácea obteve-se, respectivamente, para o sistema<br />

UASB+LA e LA , 0,744 e 3,145 kw, que representa um aumento de quatro vezes.<br />

Tal incremento na potência devido a aeração deve-se, sobretudo ao fato do<br />

sistema de LA ter que tratar toda a concentração de matéria orgânica (443 mg/L<br />

DQO) presente no esgoto, enquanto que o sistema UASB+LA, responsável apenas<br />

pelo polimento de matéria orgânica proveniente do reator UASB que apresenta<br />

concentração de DQO de 146 mg/L.<br />

• Para o requisito de demanda específica de área a tabela 31 apresenta os valores<br />

de 0,038m 2 /hab. para UASB+LA e 0,044 m 2 /hab. para LA, os quais são<br />

praticamente iguais para os dois sistemas de tratamento. Avaliando-se essa<br />

informação com a literatura especializada (CHERNICHARO et al, 2001) varia de<br />

0,03 a 0,1 m 2 /hab para ETE de Lodo Ativado convencional e ETE UASB + Lodo<br />

Ativado.<br />

• Avaliando-se as questões de produção de lodo gerado, demanda energética e<br />

demanda específica de área, verifica-se claramente que a adoção do sistema<br />

UASB+LA é a que representa a melhor alternativa para o tratamento do esgoto<br />

sanitário da ETE AIB, pois essa trata a mesma quantidade de esgoto e com<br />

eficiência de remoção de DQO equivalente ao do sistema de LA gerando menor<br />

quantidade de lodo e consumo energético.<br />

4 CONCLUSÃO<br />

Com base nos resultados desse trabalho foram obtidas as seguintes conclusões<br />

principais:<br />

• O esgoto sanitário produzido na ETE AIB apresenta características de esgoto médio<br />

a forte considerando-se as variáveis de DQO (443±173 a 367±122mg/L),<br />

SST(155±71 a 151±79mg/L), N-amoniacal(78±42 a 84±31mg/L), P(5,31±2,2 a<br />

5,45±1,5mg/L) e E-coli (2,52E06±4,9E06 a 1,7E07±2,1E06 NMP/100mL).<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


67<br />

• Com relação à tratabilidade o esgoto sanitário produzido na ETE AIB apresenta<br />

relação DQO/N-amoniacal/P com potencialidade de ser tratado tanto por<br />

processo anaeróbio (350: 61,6: 4,2 - período seco e de 350:80,1:5,2-período<br />

chuvoso como por processo aeróbio(100: 17,6:1,2-período seco e 100: 22,9: 1,5-<br />

período chuvoso).<br />

• Para a característica físico-química e bacteriológica (N-amoniacal, P total, SST, SD,<br />

E-coli.) ocorrida entre os períodos seco e chuvoso o tratamento dos dados por<br />

estatística analítica indicou não haver diferença na composição do esgoto bruto.<br />

• Para a carga hidráulica específica obteve-se maiores valor para o período chuvoso<br />

(23,67 L/hab.dia) que no período seco (18,87L/hab.dia). E essa quando comparada<br />

ao valor de referência de 15L/hab.dia foram 1,6 (chuvoso) e 1,3 (seco) vezes<br />

superior.<br />

• Em termos de carga específica de poluentes (gDQO/hab.dia, gSST/hab.dia e gP/<br />

hab.dia) o período chuvoso é o que apresenta maior valores quando comparado<br />

ao período seco, ocorrendo situação inversa para o N-amoniacal. Esse fato está<br />

intimamente ligado à ocorrência do período de festas e férias que promove<br />

maior movimentação nas atividades do AIB.<br />

• O tratamento estatístico pelo teste de Kruskall-Wallis indicou para os valores de<br />

carga hidráulica e específica de poluentes que o esgoto bruto gerado na ETE AIB<br />

independe do fluxo de passageiros + funcionários para o período estudado.<br />

• Para a simulação do fluxograma de tratamento por UASB + LA (1,97 L/hab.d)<br />

verificou-se que a produção de lodo seria de cerca de três vezes menor que a de<br />

LA (5,73 L/hab.d).<br />

• Para o sistema UASB+LA e LA a demanda de energia para aeração necessária à<br />

remoção de DQO teria valores de 0,744 e 3,145 kw, respectivamente, o qual<br />

representaria um aumento de quatro vezes quando comparamos os sistemas<br />

UASB+LA e LA.<br />

• Os dados simulados de produção de lodo gerado; demanda energética e demanda<br />

específica de área nos levam a concluir claramente que a adoção do sistema<br />

UASB+LA representaria a melhor alternativa de tratamento do esgoto sanitário<br />

da ETE AIB, pois seria possível tratar a mesma quantidade de esgoto e com<br />

eficiência de remoção de DQO equivalente ao do sistema de LA gerando menor<br />

quantidade de lodo e consumo energético.<br />

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Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 55-69, jun. 2010


71<br />

COMO ORÇAR OBRAS PÚBLICAS:<br />

<strong>DE</strong>SCOBRINDO O MITO DO BDI!<br />

Irandir de Castro Diniz *<br />

Renato Martins das Neves **<br />

Rui Guilherme Cavaleiro de Macedo Alves ****<br />

RESUMO<br />

As construtoras não apropriam seus consumos reais, não definem nem divulgam internamente<br />

seus parâmetros de custos. Cada orçamentista contratado tem seus próprios<br />

números e critérios, que são acumulados e guardados como segredo profissional e<br />

ético, entretanto com a evolução tecnológica e com a necessidade de redução de desperdícios<br />

na construção, os índices de consumo diminuem, implicando na variação de<br />

preço de construtora para construtora. Este artigo tem como objetivo, desenvolver um<br />

manual de como orçar obras públicas, através de levantamentos e análise das despesas<br />

diretas e indiretas, incluindo exemplo de composição de preço unitário, cálculo das leis<br />

sociais e composição da taxa do BDI (Benefícios e Despesas Indiretas).<br />

Palavras-Chave: Custo Direto. Custo Indireto. Benefícios e Despesas Indiretas – BDI. Leis<br />

Sociais e Impostos.<br />

ABSTRACT<br />

HOW TO MEASURE PUBLIC BUILDING:<br />

FINDING OUT THE MYTH OF BIE (BENEFITS AND INDIRECT EXPENSES)!<br />

The builders don’t adapt their real consumptions, they don’t define nor they publish their internally<br />

cost parameters. Each contracted estimator has their own numbers and criteria, that are<br />

accumulated and kept as professional and ethical secret, meantime with the technological<br />

evolution and with the necessity of reduction of wastes in the construction, the consumption<br />

indexes decrease, implicating in the variation of builder’s price for builder. This article as objective,<br />

develop a manual of how estimate public works, through risings and analysis of the direct<br />

and indirect expenses, including example of composition of unitary price, calculation of the<br />

social laws and composition of the tax of BIE (Benefits and Indirect Expenses).<br />

Keywords: Direct Cost. Indirect Cost. Benefits and Indirect Expenses - BIE. Social Laws and<br />

Imposed.<br />

*<br />

Engenheiro civil pela Universidade da Amazônia. Especialista em Gerenciamento e Gestão da Qualidade na<br />

Indústria da Construção Civil pela Universidade Federal do Pará; mestrando em Engenharia Civil (UFPA).<br />

**<br />

Professor doutor da Universidade Federal do Pará - UFPA<br />

***<br />

Professor doutor da Universidade Federal do Pará - UFPA<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 71-85, jun. 2010


72<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

Em um orçamento, para se chegar ao custo de execução de uma obra, devem-se<br />

prever todos os custos diretos e indiretos envolvidos, os quais englobam: materiais,<br />

equipamentos, mão de obra, encargos sociais, impostos e outras despesas necessárias<br />

à sua execução.<br />

Quando se tem os projetos bem definidos, e os materiais e equipamentos especificados<br />

de forma clara, através do planejamento da obra podem-se prever o tipo, a<br />

quantidade de operários e o tempo que se levará para executar os serviços. Baseado<br />

nessas informações pode-se levantar os custos diretos, através da elaboração das composições<br />

unitárias de preços, que incluem: material, equipamentos e mão de obra (inclusive,<br />

encargos sociais).<br />

Porém a realização de um empreendimento envolve outras despesas (custos indiretos),<br />

tais como: (a) as relacionadas à administração central – escritório da empresa e as<br />

da obra em questão – administração local da obra; (b) os impostos – federal, estadual e<br />

municipal; (c) a legalização da obra – licenças e taxas; e (d) o lucro sobre a empreitada.<br />

A cada um desses itens de despesas indiretas atribui-se um valor percentual,<br />

que, somados, passam a ser chamados de Benefícios e Despesas Indiretas (BDI).<br />

É costume ter-se a falsa impressão de que o BDI representa o lucro real da<br />

empresa. Dessa forma, quando numa proposta comercial é informado o seu valor percentual<br />

(na faixa de 25 a 40%), é comum discordar-se do valor e crer que a proposta está<br />

superfaturada. Há, portanto, a necessidade de que profissionais do ramo tenham conhecimento<br />

aprofundado do assunto para não cometer falhas na hora de elaborar e/ou<br />

analisar uma proposta.<br />

Levantar despesas indiretas varia de obra para obra, de empresa para empresa,<br />

de um local para outro, visto que as despesas dependem do porte da obra e da empresa,<br />

da distância da obra em relação ao seu escritório central, de prazos e condições contratuais<br />

e de outras peculiaridades e dificuldades que cada empreendimento oferece.<br />

Desta forma não se deve praticar o BDI de uma empresa como padrão, para todo tipo de<br />

obra que se queira executar, pois uma, de duas situações pode ocorrer: (a) o preço da<br />

proposta pode ser inexequível, e (b) o preço pode estar acima da realidade.<br />

2 OBJETIVOS<br />

Apresentar, de forma detalhada, todas as despesas diretas e indiretas, tais como:<br />

materiais, mão de obra, equipamentos, encargos sociais, taxas, impostos, seguros etc.,<br />

que compõem os custos das obras de engenharia e auxiliar na definição da taxa do BDI.<br />

Auxiliar de maneira clara, estudantes, técnicos e/ou profissionais liberais que<br />

trabalham em setor de orçamento, como melhor analisar e elaborar as composições<br />

unitárias de preços na construção civil e pesada, facilitando a elaboração de uma proposta<br />

comercial, quanto à definição da taxa do BDI que deve ser adotada para uma<br />

determinada obra.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 71-85, jun. 2010


73<br />

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA<br />

Cabem, inicialmente, algumas definições:<br />

– Orçamento: ato ou efeito de orçar; cálculo das receitas e despesas; cálculo dos gastos<br />

a fazer com uma obra projetada.<br />

– Tipos de orçamento: por preço unitário de serviço, por preço global da empreitada e<br />

por metro quadrado de construção.<br />

– Benefícios e Despesas Indiretas (BDI): taxa percentual aplicada sobre o custo direto,<br />

para cobrir todas as despesas indiretas, inclusive lucratividade da empresa.<br />

– Custos diretos: são todas as despesas vinculadas a determinados serviços que podem<br />

ser medidas por unidades determinadas e fixas sem variar com o tempo da obra.<br />

– Custos indiretos: são todas as despesas não vinculadas a uma unidade fixa. Variam de acordo<br />

com o porte da obra, o tempo de duração (atrasos, aditivos) e a metodologia de execução.<br />

– Custo Unitário Básico (CUB): o custo unitário básico de construção por m², é calculado<br />

conforme a Lei 4.591 de 16/12/1964 e o disposto na NBR 12721/1992 da ABNT, com os<br />

insumos ajustados nas condições locais para os projetos H16, H20 (quando for o caso).<br />

– Empregador: segundo a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é a pessoa física ou jurídica<br />

que emprega pessoas, assume as obrigações legais e os riscos do empreendimento.<br />

– Componentes do preço: segundo Mozart Bezerra da Silva, uma empresa construtora<br />

tem oito categorias de custos para executar uma empreitada: (1) o custo diretamente<br />

vinculado às unidades dos serviços produzidos no canteiro de obras e vendidos na<br />

planilha orçamentária do contrato; (2) o custo da estrutura técnico-administrativa<br />

montada no canteiro de obras para dar suporte aos operários; (3) o custo rateado da<br />

estrutura técnica e administrativa que dá apoio a todas as obras em andamento na<br />

sede da empresa; (4) o custo financeiro; (5) o custo decorrente dos fatores de risco e<br />

imprevistos; (6) o custo para o contratante referente ao lucro proposto pelo construtor;<br />

(7) o custo oriundo da carga tributária; e (8) o custo da representação comercial.<br />

A primeira categoria se destaca entre as demais. Denominada resumidamente<br />

de custo direto, tem a maior participação financeira no orçamento e exige uma metodologia<br />

rígida para sua definição. Engloba o cálculo do consumo de materiais e seus desperdícios,<br />

do consumo horário de equipamentos e do consumo de mão de obra com<br />

suas diversas produtividades. Todas as demais categorias de custos são orçadas separadamente.<br />

O somatório delas representa o preço do contrato. O orçamento de cada<br />

grupo é efetuado através de vinculação a grandezas apropriadas: o custo direto está<br />

vinculado à unidade e à quantidade dos serviços da obra; o custo administrativo está<br />

vinculado ao porte, complexidade e prazo de execução da obra, à distância entre o<br />

canteiro e a sede, e aos custos periódicos de salário, encargos sociais, comunicação,<br />

transporte e consumos diversos; o custo financeiro está amarrado ao fluxo de caixa do<br />

contrato; os impostos e a representação comercial são proporcionais ao preço final.<br />

A taxa do BDI, juntamente com outros coeficientes e proporções, constituem<br />

ferramentas de análise gerencial, e tomam como base de referência o montante do custo<br />

direto. São úteis para o dimensionamento empresarial do construtor e para a avaliação<br />

geral do contrato. A taxa do BDI ficou definida como o resultado do quociente do montan-<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 71-85, jun. 2010


74<br />

te do custo indireto pelo total do custo direto. O coeficiente do BDI ficou definido como o<br />

fator multiplicador que aplicado ao total do custo direto resulta no valor do contrato.<br />

Elaboração do orçamento<br />

A taxa de lucro, aplicada sobre o custo direto ou sobre os custos<br />

totais, compara o percentual de lucro almejado com níveis de produtividade<br />

ou desperdícios, reforçando a avaliação dos reflexos que o<br />

valor absoluto do lucro proposto provoca na taxa de retorno do contrato.<br />

(SILVA, 1994).<br />

As taxas indiretas da obra e da sede sinalizam equilíbrio técnico e<br />

financeiro das estruturas administrativas. As taxas indiretas de custo<br />

financeiro e risco indicam o grau de influência desses fatores no<br />

contrato.<br />

Deve-se em primeiro lugar analisar os projetos e especificações da obra e checar<br />

os quantitativos da planilha orçamentária fornecida, para que não haja nenhuma<br />

dúvida com relação aos serviços que serão realizados. Em segundo lugar é importante<br />

que as composições de preços de custos unitários estejam atualizadas, tanto os preços<br />

quanto os índices de consumo de todos os insumos, ou seja, devem ser cotados os<br />

preços de matérias, mão de obra, equipamentos e ferramentas que serão utilizados na<br />

obra; recomenda-se calcular a taxa das leis sociais; os índices de consumo de material<br />

também devem ser calculados, levando-se em consideração possíveis desperdícios. Em<br />

terceiro lugar, de posse da planilha orçamentária conferida e com os preços de custo<br />

unitário atualizado realiza-se o cálculo do custo direto da obra. Por fim, levantar e prever<br />

todas as despesas indiretas da empreitada, para através da fórmula BDI = 100 x {[(100<br />

+ A) / (100 – B)] -1} (1), calcular a taxa do BDI, e o fator multiplicador do custo direto,<br />

chegando-se ao custo final da obra.<br />

Onde: A = Todas as despesas administrativas, inclusive legalização da obra.<br />

B = Todas as despesas fiscais mais a lucratividade.<br />

De outra maneira, de posse do valor das despesas diretas e indiretas, aplicar a<br />

seguinte fórmula:<br />

BDI% = Custo Indireto X 100 (2)<br />

Custo direto<br />

Orçamento passo a passo<br />

1 De posse dos projetos, especificações e planilha orçamentária fornecida, checar os<br />

serviços descritos, para que não haja dúvida sobre o que está sendo orçado.<br />

2 As composições de preços unitários devem estar atualizadas. Os índices de consumo<br />

dos insumos, adotados pela empresa devem ser exatos e apresentar margem de<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 71-85, jun. 2010


75<br />

segurança equivalente a 3% (desperdício); os preços de material devem ser cotados<br />

em pelo menos três fornecedores, para que se possa ter certeza do menor preço de<br />

mercado; o preço de mão de obra de acordo com tabela do sindicato da categoria<br />

deve ser acrescido dos encargos sociais, que para a construção civil varia de 120 a<br />

130%. Recomendam-se calcular, para cada obra, os encargos sociais. (Atualmente as<br />

empresas utilizam programas de orçamento para manter as composições de preços<br />

unitários atualizadas, tornando mais prático e rápido atualizarem dados).<br />

Itens que compõem o cálculo das leis sociais: Os valores percentuais do grupo A,<br />

são índices estabelecidos pelos governos, enquanto que B, C e D são calculados.<br />

CÁLCULO DA TAXA <strong>DE</strong> ENCARGOS SOCIAIS E TRABALHISTAS<br />

Quadro I: GRUPO A<br />

A1- INSS 20,00%<br />

A2- FGTS 8,50%<br />

A3- SESI 1,50%<br />

A4- SENAI 1,00%<br />

A5- INCRA 0,20%<br />

A6- SALÁRIO EDUCAÇÃO 2,50%<br />

A7- SEGURO <strong>DE</strong> ACI<strong>DE</strong>NTE DO <strong>TRABALHO</strong> 3,00%<br />

A8- SEBRAE 0,60%<br />

SUBTOTAL A 37,30%<br />

Considerações:<br />

• ANO BASE: 2005<br />

• TOTAL <strong>DE</strong> FERIADOS: 12<br />

• DOMINGOS: 52<br />

• JORNADA <strong>DE</strong> <strong>TRABALHO</strong>: 7,333h / dia<br />

• ANO PRODUTIVO: 2.088,67 h / ano<br />

Quadro II: GRUPO B<br />

B1- REPOUSOS SEMANAIS REMUNERADOS E FERIADOS 22,47%<br />

B2- FÉRIAS 14,00%<br />

B3- 13º SALÁRIO 10,53%<br />

B4- AUXÍLIO ENFERMIDA<strong>DE</strong> 0,79%<br />

SUBTOTAL B 47,79%<br />

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76<br />

• Cálculo de B1:<br />

- 64 dias x 7,333h = 4,6933 x 100 : 2.088,67 = 22,47%<br />

• Cálculo de B2:<br />

- (30 dias x 7,333h x 100 : 2.088,67) x 1,33 = 14,00%<br />

• Cálculo de B3:<br />

- (30 dias x 7,333h x 100 : 2.088,67) = 10,53%<br />

• Cálculo de B4:<br />

- (15 dias x 7,333h x 100 x 0,15 : 2.088,67) = 0,79%<br />

Quadro III: GRUPO C<br />

C1- AVISO PRÉVIO 13,07%<br />

C2- RESCISÃO SEM JUSTA CAUSA (40%) (A2 + (B)) 8,31%<br />

SUBTOTAL C 21,38%<br />

• Cálculo de C1:<br />

- 30 dias x 7,333h x 100 : (2.088,67 x 9,67) : 12 = 13,07%<br />

• Cálculo de C2:<br />

- 50% x (A2) + (A2 x B)<br />

- 50% x (8,50) + (8,50 x 47,79%) = 8,31%<br />

Quadro IV: GRUPO D<br />

D1- REINCIDÊNCIA <strong>DE</strong> A SOBRE B 17,82%<br />

D2- REINCIDÊNCIA <strong>DE</strong> A . 2 SOBRE C . 1 1,11%<br />

SUBTOTAL D 18,93%<br />

• Cálculo de D1:<br />

- 37,30 x 47,79% = 17,82%<br />

• Cálculo de D2:<br />

- 8,50 x 13,07 % = 1,11%<br />

TOTAL FINAL (A+B+C+D) 125,40%<br />

3 De posse dos preços unitários atualizados dos serviços, realizar o cálculo da planilha<br />

para se chegar ao custo direto, ou seja, sem o BDI.<br />

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77<br />

Quadro V: Exemplo de composição de preço de custo unitário do aço.<br />

Unidade Índices/Quant Preço unitário Subtotal<br />

• Arame recozido kg 0,02 R$ 6,50 0,13<br />

• Aço CA 50 kg 1,03 R$ 3,50 3,71<br />

• Ferreiro h 0,08 R$ 2,39 0,20<br />

• Servente h 0,08 R$ 1,45 0,12<br />

• Leis Sociais % 125,40 R$ 0,32 0,40<br />

TOTAL<br />

R$ 4,56 / kg<br />

Observação: O preço de custo multiplicado pela Taxa do BDI% + 1 = Preço de Venda e 0,03<br />

kg no índice por quilo de aço, representa 3% de perda que são os desperdícios na hora<br />

do corte e dobra.<br />

4 Relacionar todas as despesas indiretas (do escritório central, com a administração local<br />

da obra, medicina e segurança do trabalho, seguros, despesas fiscais, lucratividades)<br />

para se chegar à taxa percentual do BDI, que é o fator multiplicador das despesas<br />

diretas, chegando-se ao custo final da obra. Assim, chega-se ao seguinte cálculo:<br />

Equação (2) da página 74, BDI (%) = Custo Indireto X 100<br />

Custo direto<br />

Observação: Os itens do grupo A são calculados, a lucratividade é adotada e as despesas<br />

fiscais são definidas pelos governos.<br />

4.1 Cálculo de A – As despesas administrativas, inclusive legalização da obra, estão<br />

descritas no quadro VI.<br />

Quadro VI: CÁLCULO <strong>DE</strong> A<br />

a) <strong>DE</strong>SPESAS ADMINISTRATIVAS E ADMINISTRAÇÃO LOCAL 62,84%<br />

b) ALOJAMENTO 2,00%<br />

c) REFEIÇÃO 5,62%<br />

d) TRANSPORTE 6,24%<br />

e) UNIFORME 1,30%<br />

f) MEDICINA E SEGURANÇA DO <strong>TRABALHO</strong> 3,47%<br />

g) LEGALIZAÇÃO DA OBRA 2,08%<br />

TOTAL <strong>DE</strong> A 83,55%<br />

4.2 Cálculo de B – Representa todas as despesas fiscais do quadro VII (11,31%) mais a<br />

lucratividade adotada (igual a 8%). Assim: B=11,31% + 8% = 19,31%.<br />

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78<br />

Quadro VII: Despesas fiscais<br />

ISS 5,00%<br />

IRPJ 1,20%<br />

CSLL 1,08%<br />

COFINS 3,00%<br />

PIS 0,65%<br />

TARIFAS BANCÁRIAS 0,38%<br />

TOTAL <strong>DE</strong> <strong>DE</strong>SPESAS FISCAIS 11,31%<br />

Lucratividade: 8%<br />

5 Calcular BDI – Usando-se a EQ. (1) da página 74, tem-se:<br />

BDI = 100 x {[(100 + A) : (100 – B)] -1}<br />

Onde: A = Todas as despesas administrativas, inclusive legalização da obra.<br />

B = Todas as despesas fiscais mais a lucratividade, conforme quadro.<br />

BDI = 100 x {[(100 + 83,55) : (100 – 19,31)] -1}<br />

BDI = 127,47 %<br />

Neste caso é notório que as despesas indiretas chegaram a ser superior às despesas<br />

diretas, por se tratar obviamente de única e pequena obra de uma empresa, resultando<br />

em BDI altíssimo. Matematicamente para um BDI = 127,47%, calcula-se o custo direto<br />

igual a R$ 7.208,83 e para custo indireto igual a R$ 9.189,10, que pode ser comprovado<br />

através da EQ. (2) da página 74.<br />

BDI% = Custo Indireto X 100 ,<br />

Custo direto<br />

BDI = R$ 9.189,10 X 100 = 127,47 %<br />

R$ 7.208,83<br />

6 CÁLCULO DO CUSTO TOTAL DA OBRA COM BDI<br />

Despesas indiretas = Custo direto X Taxa do BDI%, então:<br />

Despesas indiretas = R$ 7.208,83 X 127,47 % = R$ 9.189,10, logo:<br />

Custo total da obra = Despesa direta + despesas indiretas, então:<br />

Custo total da obra = R$ 7.208,83 + 9.189,10 = R$ 16.397,93 ou<br />

Custo total da obra = Custo direto X (1 + BDI %)<br />

100<br />

Custo total da obra = R$ 7.208,83 X (1 + 127,47%) = R$ 16.397,93<br />

100<br />

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79<br />

7 CÁLCULO DO FATOR MULTIPLICADOR DOS PREÇOS UNITÁROS <strong>DE</strong> CUSTO<br />

Fator multiplicador = (1 + 127,47%) = 2,2747<br />

100<br />

Fator multiplicador = Custo total<br />

Custo Direto<br />

ou<br />

Então, Fator multiplicador = R$ 16.397,93 / 7.208,83 = 2,2747<br />

8 CÁLCULO DOS PREÇOS UNITÁRIOS <strong>DE</strong> VENDA<br />

Para calcular os preços unitários de venda, basta multiplicar os preços unitários de custo<br />

pelo fator multiplicador encontrado. Pegando-se o exemplo da composição de preço<br />

unitário do aço.<br />

Então, preço de venda = preço de custo X fator multiplicador, logo:<br />

Preço de Venda = R$ 4,56 X 2,2747 = R$ 10,37.<br />

Verifica-se que nesse caso hipotético a taxa do BDI, chegou a um valor superior a 100%, o que<br />

representa mais da metade do valor da obra. Isso mostra claramente a variação que ocorre<br />

com a taxa do BDI, de obra para obra e que depende da estrutura da empresa, das condições<br />

de execução, do local da obra, do risco, enfim, das peculiaridades de cada contrato.<br />

Observa-se também que em uma obra pequena a taxa do BDI tende a ser alta, ao contrário<br />

de uma grande obra, que tende a ser mais baixa.<br />

FLOXOGRAMA DO ORÇAMENTO<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 71-85, jun. 2010


80<br />

9 ANÁLISE E DISCUSSÃO<br />

Aspectos que devem ser monitorados visando o estabelecimento da garantia de uma<br />

obra.<br />

A garantia da qualidade de uma obra se faz através do controle e planejamento em cada<br />

etapa:<br />

• Metodologia de execução: uso de equipamentos e tecnologia adequados.<br />

• Execução da obra: se as medições estão de acordo com o cronograma físicofinanceiro.<br />

• Materiais e fornecedores: quais os materiais a serem utilizados e se estão<br />

chegando a tempo, se atendem à qualidade e quantidade especificadas na obra.<br />

• Equipe de mão de obra: conferir em cada etapa realizada se foi executado de acordo<br />

com os projetos e antes de cada etapa avaliar sua capacidade de executá-la.<br />

• Financeiro: acompanhamento da relação receitas x despesas realizadas e avaliação<br />

das futuras receitas x despesas se atenderão às demandas da obra.<br />

Importância do estabelecimento de sistemas de acompanhamento e controle para as<br />

atividades de planejamento e orçamento na construção civil.<br />

Fornecer subsídios para obtenção de índices técnicos, através do monitoramento<br />

das atividades que estão sendo realizadas, permitindo com isso os ajustes necessários<br />

do que foi previsto com o executado e fornecer ao mesmo tempo um banco de dados<br />

muito importante para realização das futuras obras.<br />

Despesas consideradas indevidamente como Indiretas. Entretanto, são despesas<br />

decorrentes do desempenho financeiro no exercício do ano anterior, que na prática são<br />

pagas para garantir o equilíbrio fiscal da empresa.<br />

Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ e Contribuição Social Sobre Lucro –<br />

CSSL.<br />

“O imposto se torna devido em um dado exercício financeiro sobre a renda líquida<br />

percebida no ano civil imediatamente anterior. Por conseguinte, o fato gerador do imposto<br />

ocorre a 1º de cada ano (data inaugural do exercício financeiro) e sua base de cálculo é<br />

dada pela renda líquida auferida no período de 01/01 a 31/12 imediatamente anterior<br />

(rendimentos menos deduções e abatimentos verificados no ano civil precedente)”.<br />

O art. 44 do Código Tributário Nacional institui o imposto de renda das pessoas<br />

jurídicas e estabelece que a base de cálculo do imposto de renda é o lucro real, exceto<br />

nas hipóteses excepcionais de lucro arbitrado e presumido.<br />

Na legislação vigente, o lucro real é o lucro líquido ajustado pelas adições,<br />

exclusões ou compensações prescritas ou autorizadas pela legislação. Lucro presumido<br />

é uma forma simplificada para determinação da base de cálculo; é obtido mediante<br />

aplicação do percentual de 8% sobre o valor da receita bruta mensal. Lucro arbitrado é<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 71-85, jun. 2010


81<br />

determinado mediante aplicação, sobre o valor da receita bruta, do percentual do lucro<br />

presumido, acrescido de 20%.<br />

Com base no fato do imposto de renda incidir sobre o lucro líquido, ou seja, após<br />

todos os ajustes contábeis, estudo sobre BDI publicado pela Associação Brasiliense de<br />

Construtores (ASBRACO) conclui que o imposto de renda não integra o BDI.<br />

Da mesma forma, a Secretaria de Governo e Gestão Estratégica do Estado de São<br />

Paulo, ao definir a composição do BDI na contratação com órgãos da administração<br />

pública estadual, desconsiderou a taxa referente ao imposto de renda.<br />

Mostra-se bastante esta não inclusão do imposto de renda no BDI, já que por<br />

não ser um imposto que incide especificamente sobre o faturamento, não pode ser<br />

classificada como despesa indireta decorrente de execução de determinado serviço.<br />

Se a contratante concordar em pagar determinada taxa percentual do imposto<br />

de renda embutida no BDI, estará pagando um gasto que na verdade é imprevisível,<br />

podendo coincidir ou não com o valor pactuado como despesa indireta.<br />

Pode até ser que ao final do exercício o desempenho financeiro negativo de<br />

outras obras da contratada suplante o lucro obtido com a obra da contratante, e aquela,<br />

de acordo com atual legislação fiscal, não recolha imposto de renda. Assim teria sido<br />

ressarcido à contratada o valor de uma despesa que, na verdade, não se efetivara.<br />

No tocante à Contribuição Social Sobre Lucro – CSSL, esta foi instituída pela Lei<br />

nº 7.689, de 15/12/1988 e se destina ao financiamento da seguridade social. A base de<br />

cálculo da contribuição é o valor do resultado do exercício antes da provisão para o<br />

imposto de renda e a alíquota da contribuição é de 8%.<br />

Recentemente, a alíquota vem sendo majorada por Medida Provisória e, de<br />

acordo com a MP nº 1991 de 14/12/99, a alíquota, de 1º/5/99 a 31/1/00, deve ser acrescida<br />

de 4% e, de 1º/1/00 a 31/12/02, deve ser acrescida de 1%.<br />

Como a legislação que institui a CSSL determina que a incidência é sobre o lucro<br />

líquido do exercício, excluída a provisão para o imposto de renda, não se pode,<br />

contabilmente, definir este gasto como despesa indireta resultante da execução de<br />

alguma obra.<br />

Desta forma, assim como o IRPJ, não é adequado incluir a CSSL no BDI dos<br />

orçamentos da construção civil, já que ele não está atrelado ao faturamento decorrente<br />

da execução de determinado serviço, mas ao desempenho financeiro da empresa como<br />

um todo.<br />

Despesas indiretas que eventualmente ocorrem em determinadas obras e no escritório<br />

central.<br />

– Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre Circulação de<br />

Mercadorias e Serviços (ICMS) e fretes.<br />

Quando se compra materiais e/ou equipamentos de outro estado, a empresa é<br />

obrigada a pagar o IPI sobre o produto e ainda a diferença do ICMS de um estado com<br />

relação ao outro, visto que o valor cobrado do ICMS em um é diferente do outro, assim<br />

como transportar a mercadoria até seu local de utilização, aí é necessário contratar uma<br />

transportadora que lhe cobrará pelos serviços de frete.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 71-85, jun. 2010


82<br />

– Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e Taxa de Localização de Prédios em<br />

Logradouros (TLPL).<br />

Para o escritório de uma empresa funcionar em uma cidade é necessário que<br />

seja paga à prefeitura local a taxa de licença de funcionamento e o IPTU, todos os anos.<br />

Quando uma empresa vai participar de um processo licitatório, são solicitadas as certidões<br />

negativas de débitos, caso a empresa esteja em atraso em qualquer tributo, não poderá<br />

apresentar essa certidão sem antes recolher a taxa anual e desta forma estará<br />

impossibilitada de participar da licitação.<br />

– Anuidade da empresa e dos técnicos, junto ao Conselho Regional de Engenharia,<br />

Arquitetura e Agronomia (CREA).<br />

Para uma empresa de engenharia estar habilitada tecnicamente em licitações, é<br />

necessário que também apresente certidão do CREA, para isso é necessário pagamento<br />

da licença para exercício da profissão tanto da empresa como do quadro de técnicos da<br />

mesma; essa licença vale para o ano todo, por isso é chamada de anuidade.<br />

Os órgãos contratantes, em função do porte da obra, exigem acervo técnico da<br />

empresa e/ou profissionais do seu quadro. Esses acervos são certidões que o CREA<br />

expede em nome da empresa e dos profissionais, referente às obras já realizadas,<br />

como se fosse um currículo elaborado pelo órgão fiscalizador da profissão, o CREA cobra<br />

pelo serviço.<br />

– Outras certidões: Falência e Concordata (Tribunal de Justiça do Estado), comprovação<br />

do capital social da empresa (Junta Comercial do Estado), dívida ativa da União e<br />

tributos federais (Receita Federal).<br />

Diante do que foi apresentado, exemplificado e analisado é importante ressaltar<br />

a atenção para dois assuntos:<br />

1) A carga de responsabilidade fiscal e trabalhista do construtor ao assumir os riscos do<br />

empreendimento.<br />

2) O desafio de executar obras com qualidade conforme a ISO 9000. Construir com<br />

qualidade é dever de todo prestador de serviço, desta forma uma empresa de<br />

construção civil que presta serviço com qualidade, necessita de uma equipe técnica<br />

bem treinada e competente e isso gera também despesa indireta, refletindo<br />

diretamente na taxa do BDI, por isso que a questão preço é muito discutida, porém<br />

deve-se levar em consideração os benefícios de se construir com boa qualidade o<br />

que com certeza terá maior durabilidade, evitando-se com isso manutenções e<br />

reformas precoces.<br />

Observação: Quando uma empresa tem várias obras ao mesmo tempo a tendência é<br />

que as despesas com o escritório central sejam divididas proporcionalmente entre elas,<br />

como consequência, terá a redução da taxa do BDI.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 71-85, jun. 2010


83<br />

10 CONCLUSÃO<br />

Abrindo a caixa preta do BDI<br />

Considerando em uma análise minuciosa, de todas as despesas diretas e indiretas,<br />

dando ênfase principalmente às despesas indiretas tais como: impostos, lucratividade,<br />

suporte técnico e administrativo da empresa, da qualidade dos serviços prestados, do<br />

porte da obra, da disponibilidade de tecnologias, equipamentos e materiais mais<br />

avançados e da duração da obra, tudo isso torna o valor do BDI muito variável. O que nos<br />

permite afirmar que para cada obra devemos calcular o seu BDI e não simplesmente<br />

adotar o mesmo para todas.<br />

Conclui-se que para se obter uma objetiva e justa avaliação do BDI, devemos considerar,<br />

além de impostos e lucro da empresa, as despesas com administração central (escritório)<br />

e administração local (canteiro da obra), que apresentará grandes variações de obra<br />

para obra, pois, o BDI real só será conhecido após a conclusão da obra, visto que se trata<br />

de previsões de despesas que dependem de determinadas variáveis. Cabe então<br />

ressaltar ainda a grande importância do controle da obra, para que se possa comparar<br />

durante e no final da empreitada, tudo que se gastou com o que foi previsto gastar.<br />

REFERÊNCIAS<br />

ANDRIETA, A. J. Desvendando o Mito do BDI. In: Revista Construção, n. 2340, Editora<br />

Pini, São Paulo/SP, 1992.<br />

BRASIL. Lei nº 8.666/1993 – Lei das Licitações e Contratos 21/6/93 e alterações posteriores<br />

Lei 8.883 de 8/6/94. Dispõe sobre as licitações e contratos com a Administração Pública<br />

direta e indireta nas esferas de governo da União, estados, municípios e Distrito Federal.<br />

Brasília/DF, 1993.<br />

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em: http:// www.caixa.gov.br/. Acesso em: 9 set. 2008.<br />

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84<br />

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Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 71-85, jun. 2010


85<br />

PÓ REATIVO NAS OBRAS <strong>DE</strong> BELÉM:<br />

UMA NOVA TENDÊNCIA<br />

José Zacarias Rodrigues da Silva Junior *<br />

Mariana Domingues von Paumgartten **<br />

RESUMO<br />

Com o advento das novas tecnologias para o concreto, cresceu o número de processos<br />

construtivos utilizando o concreto de alta resistência para execução de elementos estruturais.<br />

O segredo dos concretos de alto desempenho está na redução da porosidade<br />

e na melhoria da zona de transição, que por conseqüência, conduz à produção de elementos<br />

que possuem o imprescindível trinômio resistência x durabilidade x economia.<br />

A redução da capacidade de lixiviação, redução da porosidade e densificação da matriz<br />

são propriedades dos concretos de pós reativos e estão diretamente ligadas às adições<br />

minerais na mistura. Neste trabalho, serão abordados o conceito do concreto de pós<br />

reativos e a necessidade da região de Belém utilizar essa nova tecnologia.<br />

Palavras-Chave: Pós reativos. Alta Resistência. Durabilidade.<br />

REACTIVE POW<strong>DE</strong>R IN CONSTRUCTIONS OF BELÉM: A NEW TREND<br />

ABSTRACT<br />

With the advent of new technologies for concrete, increased the number of construction<br />

processes using high-strength concrete for the implementation of structural elements.<br />

The secret of high performance concrete is the reduction of porosity and the<br />

improving of the transition zone, which consequently leads to the production of elements<br />

that have the essential triad resistance x durability x economy. The reduction of<br />

ability to leaching, reduction of porosity and densification of the matrix are the property<br />

of reactive powder concrete and are directly linked to mineral additions in the mix. In<br />

this study, will be discussed the concept of reactive powder concrete and the need of<br />

Belém use this new technology.<br />

Keywords: Reactive powder. Durability. Durability.<br />

* Professor M.Sc. da Universidade da Amazônia e Diretor Concreteste. Diretor Regional do IBRACON –<br />

zacajunior@unama.br<br />

** Aluna de Graduação do Curso de Engenharia Civil e Monitora da Universidade da Amazônia –<br />

mari.paumgartten@gmail.com<br />

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86<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

Segundo Juran apud Helene & Terzian (2004) o conceito de qualidade é a adequação<br />

a determinado uso. Este conceito mudou ao longo do tempo: entre as décadas<br />

de 50 e 60, qualidade era considerada um luxo e, a partir da década de 90, uma questão<br />

de competitividade e sobrevivência, que no âmbito da engenharia civil é entendida<br />

como ser uma estrutura resistente, funcional, durável, habitável e econômica.<br />

Dentre os vários meios de atingir este objetivo as construtoras investem na<br />

tecnologia. O controle rígido do processo construtivo e a qualidade dos materiais empregados<br />

é, sem dúvida, o melhor caminho para a qualidade.<br />

Para melhorar a resistência, qualidade e durabilidade de estruturas de concreto<br />

é comum o uso de aditivos e adições. Estes podem ser para conferir maior fluidez e<br />

trabalhabilidade, ou melhorar as características no estado endurecido, como diminuir a<br />

porosidade do concreto, tornando-o menos poroso e permeável a líquidos e gases que<br />

penetram (lei de Darcy) e causam corrosão das armaduras, ou ainda permitindo substituir<br />

percentagens de cimento por adições, diminuindo assim não só a utilização de<br />

recursos não renováveis como a poluição atmosférica durante a fabricação do cimento<br />

(MIRA e FONSECA, 2008).<br />

Apesar de ser o insumo de maior consumo na engenharia, os concretos sempre<br />

apresentaram como característica negativa baixa resistência. No decorrer dos anos pesquisas<br />

foram realizadas para chegar-se ao elevado desempenho com pastas cimentícias,<br />

principalmente após a 2º Guerra Mundial. Na década 60 resistências da ordem de 650<br />

MPa foram conseguidas acelerando-se a cura (VAN<strong>DE</strong>RLEI, 2004).<br />

A obtenção de resistências cada vez mais elevadas do concreto traz benefícios<br />

em diversas áreas da sociedade, como econômicos, ecológicos e até mesmo com melhor<br />

aproveitamento e utilização de espaço, uma vez que elementos estruturais com<br />

características mecânicas mais elevadas requerem menores dimensões para determinadas<br />

cargas.<br />

Para atingir elevada resistência mecânica, dentre outras características, uma<br />

das possibilidades é o elevado consumo de cimento. Contudo tal alternativa, além de<br />

consumir matérias-primas não renováveis (calcário e argila), e melhorar as propriedades<br />

no estado fresco, acaba se tornando uma desvantagem. A temperatura ambiente é<br />

um fator incontrolável e devido a reação exotérmica de hidratação do cimento ocorrem<br />

problemas como a retração plástica. Durante o processo de cura surgem fissuras patológicas,<br />

diminuindo assim, a vida útil da estrutura.<br />

Logo, o antigo concreto de baixo desempenho abriu espaço para o concreto de<br />

alta resistência, e posteriormente, para o concreto de alto desempenho, que atualmente<br />

desperta para uma tecnologia avançada que é o concreto de pós reativos – CPR,<br />

que tem como conceito básico os concretos em cuja formulação são usados partículas<br />

que possuam um diâmetro máximo menor que 2mm, e que estão sendo pesquisados<br />

para utilização em concretos estruturais (VAN<strong>DE</strong>RLEI, 2004). A mistura endurecida com<br />

esta formulação é caracterizada por apresentar elevadas resistências à compressão axial,<br />

tração, flexão e tenacidade quando forem adicionados materiais fibrosos.<br />

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87<br />

As propriedades mecânicas do CPR inserem-no como material cuja resistência<br />

está compreendida entre o aço e o concreto tendo em vista que estes concretos são<br />

produzidos com relações a/c da ordem de 0,15, fazendo com que os projetistas estruturais<br />

modifiquem seus critérios de dimensionamento, bem como permitem que os engenheiros<br />

e arquitetos usem a criatividade para executar peças estruturais com geometrias<br />

mais arrojadas (VAN<strong>DE</strong>RLEI, 2004). Um exemplo da aplicação do CPR em obras de<br />

arte foi a construção da Ponte de Sherbrooke, no Canadá, onde as armaduras passivas<br />

características do concreto armado, foram simplesmente substituídas pelas fibras de<br />

aço (AITCIN, 1998 ).<br />

Enquanto na região metropolitana de Belém a principal dificuldade para o desenvolvimento<br />

de concretos de alto desempenho são os agregados típicos: seixos de<br />

características friáveis e as areias muito finas, que demandam elevada relação água/<br />

cimento para obtenção da mistura, tornando-o assim permeável, mais suscetível a manifestações<br />

patológicas como corrosão da armadura, e por consequência pouco durável,<br />

a grande quantidade de indústrias de mineração e metalurgia, aliada à disponibilidade<br />

de materiais pozolânicos como sílica ativa e metacaulim propiciam o uso de concretos<br />

de alto desempenho (BARATA, 1998).<br />

2 FUNDAMENTOS DO CONCRETO <strong>DE</strong> PÓS REATIVOS<br />

2.1 CONCRETO <strong>DE</strong> ALTO <strong>DE</strong>SEMPENHO<br />

O termo concreto de alto desempenho surgiu na década de 90, como uma evolução<br />

natural do termo “concreto de alta resistência” que só enfocava as propriedades<br />

mecânicas do concreto. Hoje, as demais propriedades do concreto, destacando-se a<br />

durabilidade, são colocadas em pé de igualdade com as propriedades mecânicas.<br />

Este tipo de concreto é muito utilizado nas cidades litorâneas, onde a agressividade<br />

do meio faz com que seja necessário o uso de um concreto menos poroso, e por<br />

tanto, mais durável.<br />

Segundo Andrade (2005) qualquer concreto que permita que a estrutura resista<br />

à ação do meio, satisfatoriamente, ao longo de 50 anos, pode ser considerado de alto<br />

desempenho. Partindo deste princípio, qualquer concreto de apenas 20 MPa de fck<br />

pode ser considerado de alto desempenho, desde que atenda ao requisito de vida útil<br />

exigido para a estrutura, sendo ele empregado em regiões não litorâneas, de clima seco<br />

e sem poluição, o que nos dias de hoje, é quase impossível.<br />

Andrade (2005) afirma que um concreto para garantir a vida útil das estruturas<br />

em meios agressivos deve ter uma resistência acima de 40 MPa, e para isso necessita de<br />

adições minerais (pozolanas) de alta reatividade, como o metacaulim e a sílica ativa.<br />

Aïtcin (1998) define concreto de alto desempenho essencialmente como um<br />

concreto com relação água / aglomerante relativamente baixa, na ordem de 0,40, com<br />

uso de aditivos superplastificantes. Esse valor é próximo ao valor teórico que Powers<br />

(1968) sugeriu no passado para assegurar a completa hidratação do cimento Portland.<br />

A classificação completa para concretos de alto desempenho, segundo Aïtcin<br />

(1998), se dá em cinco categorias, conforme mostrado na tabela 1.<br />

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88<br />

Tabela 1: Classificação do concreto de alto desempenho (AÏTCIN, 1998).<br />

Classe de concreto de alto desempenho I II III IV V<br />

Resistência à compressão (MPa) 50 75 100 125 150<br />

Este alto desempenho é obtido através de um traço com alto teor de finos, além<br />

de aditivos superplastificantes e moderadores de viscosidade, que atribuem ao concreto<br />

viscosidade moderada e baixa tensão de escoamento, mesmo resultado obtido se<br />

fosse utilizado somente cimento, porém muito mais econômico (LOTURCO, 2007).<br />

2.2 CONCRETO <strong>DE</strong> PÓS REATIVOS<br />

Conceitualmente, concreto de pós reativo é aquele que, através da adição de<br />

finos, como por exemplo a micro sílica e o metacaulim, possui alto desempenho, ou<br />

seja, além de alta resistência, possui outras propriedades como elevadas trabalhabilidade<br />

e durabilidade. Vale ressaltar que o termo alta resistência é relativo, e varia em<br />

função da época e do local de produção, como citado anteriormente. (VAN<strong>DE</strong>RLEI, 2004).<br />

Possui diversas aplicações, podendo ser usado para diminuir dimensões da estrutura<br />

devido sua alta resistência, elementos pré fabricados sujeitos à protenção, tubos<br />

pré moldados de concreto para transporte de água e outros líquidos, e armazenamento<br />

de contâineres radioativos (VAN<strong>DE</strong>RLEI, 2004).<br />

Segundo Barata (2002), as construções na Amazônia são ineficazes tanto na durabilidade<br />

quanto na resistência, o que faz com mesmo com poucos anos de vida, a<br />

estrutura já necessite intervenção para combater manifestações patológicas. A recuperação<br />

de estruturas, além de possuir elevado custo, utiliza novamente materiais e recursos<br />

não renováveis e ainda geram desconforto ao usuário.<br />

A maior durabilidade nas estruturas é obtida através da ação dos finos, que diminuem<br />

o número de vazios agindo na pasta tanto física, quanto quimicamente, tornando a<br />

mistura menos permeável. Por conseguinte, impede ou diminui consideravelmente a<br />

penetração de agentes agressivos, que acabariam por danificar o concreto armado.<br />

A utilização das adições permite reduzir consideravelmente o consumo de cimento,<br />

diminuindo a permeabilidade e por consequência, aumentando a durabilidade<br />

da estrutura, o que faz do concreto de pós reativos, segundo Vanderlei (2004), um material<br />

com uma densidade elevada, e o mínimo de defeitos como porosidade e microfissuração,<br />

que incrementa alta resistência e elevada vida útil. Na atualidade, o grande<br />

interveniente na obtenção dos pós reativos é o controle de sua granulometria.<br />

Vanderlei (2004) ressalta que a principal diferença entre o concreto convencional<br />

e o de pós reativos é a homogeneidade da pasta, uma vez normalmente a heterogeneidade<br />

entre os agregados e a pasta apresentam diferentes valores de retração, coeficiente<br />

de expansão térmica e módulo de elasticidade. No CPR essa diferença é suprida<br />

através da substituição dos grãos graúdos por finos. O uso dos grãos finos ainda provoca<br />

redução das microfissuras de origem mecânicas, químicas e termo-mecânicas, já que o<br />

tamanho da fissura varia de acordo com a área de interface agregado/pasta.<br />

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89<br />

Atualmente nos centros de pesquisas desenvolvem-se duas linhas de pesquisa, a saber:<br />

Concreto com matriz de granulometria compacta (DSP: Densified System Containing<br />

ultra-fine particles), onde se usa um elevado teor de superplastificante e sílica ativa,<br />

incorporando agregados de alta resistência (bauxita calcinada ou granito) tendo como<br />

fundamento a redução da água de mistura.<br />

Pasta de polímero MDF (Macro – Defect Free). Esta matriz possui resistência à tração<br />

da ordem de 150 MPa, principalmente quando se usa o cimento aluminoso.<br />

Segundo Biz (2001), apud Cheyrezy (1999), o VPR foi desenvolvido para ser um<br />

produto com o mínimo de defeitos possíveis. Para isso o objetivo foi aumentar a compacidade<br />

e resistência dos materiais constituintes através da eliminação do agregado graúdo,<br />

aumentando assim a homogeneidade da mistura e diminuindo a zona de transição,<br />

além de consumos de água da ordem de 0,14 A/C.<br />

Este concreto torna-se mais denso devido à boa composição granulométrica, onde<br />

os espaços deixados pelos grãos maiores são ocupados pelos grãos menores, daí a importância<br />

da utilização de finos, aplicações de pressão antes e durante a concretagem que<br />

diminuem o ar incorporado e removem o excesso de água e tratamento térmico.<br />

Devido ao volume de finos, a baixa relação A/C torna obrigatório o uso de aditivos<br />

superplastificantes, densifica a zona de transição por ação física e química, produzindo<br />

uma microestrutura mais densa e homogênea.<br />

As adições de pozolanas no concreto apresentam bons resultados quanto à eliminação<br />

ou retardamento da reação álcali-agregado, aumento da resistência de águas<br />

sulfatadas, redução do calor de hidratação, aumento da resistência à tração, diminuição<br />

da permeabilidade e melhor reologia no estado fresco (SOUZA, 2003).<br />

Souza (2003) afirma que o uso de adições pozolânicas no estado fresco influencia<br />

no consumo de água, que tende a aumentar, ou a necessidade de aditivos superplastificantes,<br />

contudo, os formatos de esfera das pozolanas atuam como um rolamento,<br />

que se reflete em facilidade de bombeamento e lançamento do concreto. Quanto aos<br />

aspectos reológicos, há uma melhora devido ao aumento de pasta, diminuição de exsudação<br />

e segregação, além da diminuição do calor de hidratação e retração plástica.<br />

Quanto ao estado endurecido, o autor afirma a melhora na resistência á compressão,<br />

devido a estrutura interna fazendo com que a matriz ganhe resistência, resistência<br />

à tração, através da qual pode-se estimar a carga máxima pré fissura, módulo de<br />

elasticidade, responsável pelas deformações e coeficiente de Poisson.<br />

Bardella (2005), afirma que a durabilidade de estruturas é diretamente proporcional<br />

à impermeabilidade e ausência de poros do concreto, pois inibem a entrada de<br />

água e de agentes agressivos.<br />

2.3 MICROESTRUTURA<br />

O uso desta técnica implica na melhoria da zona de transição dos concretos.<br />

Segundo Mehta (1994) o conceito de zona de transição (ZT), é a interface existente<br />

entre as partículas grandes do agregado e a pasta. Ainda que seja constituída dos<br />

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90<br />

mesmos elementos que a pasta, a estrutura da zona de transição e suas propriedades<br />

diferem da matriz da pasta.<br />

A zona de transição na interface é considerada a limitante das propriedades<br />

do concreto. Por este motivo, o concreto rompe com resistências menores do que<br />

as existentes nos outros dois componentes principais. Não são necessários níveis<br />

muito altos de energia para aumentar as fissuras já existentes na zona de transição,<br />

onde, maiores incrementos de deformação podem ser obtidos por unidade de<br />

carga aplicada. Esse comportamento explica o fenômeno em que os componentes<br />

do concreto normalmente permanecem elásticos até a ruptura em um ensaio<br />

de compressão uniaxial, quanto o concreto em si apresenta comportamento inelástico.<br />

Nos concretos de alta resistência, espera-se uma ZT mais homogênea, assim<br />

permitindo a eficiência da transferência da carga entre o agregado graúdo e a argamassa.<br />

Assim, outras propriedades mecânicas do concreto e o alto módulo de elasticidade<br />

são diretamente ligadas à microestrutura do concreto.<br />

Figura 1: Micrografia concreto comum a 1 dia de idade – 1000x.<br />

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91<br />

Figura 2: Micrografia concreto de pós reativo a 1 dia de idade – 500x.<br />

3 PROPRIEDA<strong>DE</strong>S DO CONCRETO <strong>DE</strong> PÓS REATIVOS – CARACTERÍSTICAS PARA ESTRUTU-<br />

RAS <strong>DE</strong> BELÉM<br />

Segundo Vanderlei (2004), o CPR apresenta propriedades mecânicas elevadas,<br />

com resistência à compressão em torno de três a vinte vezes maior que o concreto de<br />

alto desempenho (CAD), e a resistência à tração dez vezes maior.<br />

Resistência à compressão é a propriedade mecânica que serve como subsídio<br />

para a avaliação de outras propriedades, tipos e qualidades do concreto. Para qualquer<br />

desempenho esperado ocorre um reflexo direto na resistência à compressão, portanto<br />

utilizamos esta propriedade para fazer a classificação do concreto.<br />

Um fator que influencia bastante a resistência à compressão é a densidade da<br />

mistura, onde tal densidade pode ser aumentada pela aplicação de pressão no concreto<br />

antes e durante a concretagem, provocando a redução do ar incorporado, remoção do<br />

excesso de água e compensação da retração química. De acordo com Richad & Cheyrezy<br />

(1995), este aumento de densidade afeta diretamente a resistência á compressão.<br />

Quanto à durabilidade, pode-se dizer que o CPR também apresenta desempenho<br />

elevado por ter uma estrutura particularmente densa da pasta de cimento hidratada, com<br />

baixíssima permeabilidade, possibilita ter alta resistência ao ataque de agente externos.<br />

3.1 LEI <strong>DE</strong> COMPORTAMENTO DO CONCRETO <strong>DE</strong> PÓS REATIVO<br />

Segundo Behloul (1995), nos seus estudos, foi analisada a propriedade de material,<br />

onde foram feitos ensaios de compressão direta, flexão em três e quatros pontos e<br />

tração direta. Na compressão o CPR apresentou comportamento em duas fases distintas.<br />

Uma escala linear com módulo de elasticidade.<br />

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92<br />

4 PROPRIEDA<strong>DE</strong>S DOS MATERIAIS DA REGIÃO <strong>DE</strong> BELÉM<br />

O resultado do desempenho superior do CPR é uma combinação de diversas<br />

propriedades:<br />

• Diminuição da porosidade pela utilização de uma distribuição de granulometria<br />

extensa, obtida pela combinação dos finos – cimento Portland, metacaulim, pó de<br />

quartzo e agregado miúdo;<br />

• Baixíssima relação água/cimento – em torno de 0,20 e 0,25; viabilizada devido ao<br />

uso de aditivo superplastificante;<br />

• Diminuição dos problemas de moldagem devido à característica autoadensável,<br />

obtida através da utilização do superplastificante;<br />

• Praticamente não há retração, o que o torna atrativo para uso em concreto protendido.<br />

A baixa relação água/cimento e diminuição da porosidade não deixam espaços<br />

vazios para a ocorrência das variações volumétricas.<br />

No presente estudo foram utilizados materiais disponíveis na região das proximidades<br />

de Belém, com características e propriedades semelhantes às apresentadas.<br />

As propriedades de cada material estão relacionadas a seguir:<br />

• Cimento Portland: foi utilizado o cimento Portland tipo CP II-F 32, fabricado pela<br />

CIPLAN, originário de Brasília. Este cimento contém adição de material pozolânico<br />

variável entre 6 a 14%, o que confere baixo índice de permeabilidade, sendo ideal<br />

principalmente com a presença de água, características que garantem aplicabilidade<br />

na região de Belém, uma vez que há grande incidência de chuvas e presença de<br />

cloretos e sulfatos na maior parte dos rios e bacias da região.<br />

Figura 3: Cimento do tipo CP II-F 32.<br />

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93<br />

• Aditivo superplastificante: foi utilizado o superplastificante Glenium 51, fabricado<br />

pela empresa BASF S/A. O manual do produto especifica que é um superplastificante<br />

de 3ª geração feito com base em uma cadeia de éter carboxílico modificado, ou<br />

policarboxilatos. É um líquido viscoso de cor marrom, isento de cloretos. Sua massa<br />

específica está entre 1,067 g/cm3 e 1,107g/cm3, pH de 5 a 7, viscosidade de 95 a 160<br />

cps a 20°C, e teor de sólidos entre 28,5% a 31,5%.<br />

Figura 4: Molécula de um policarboxilato.<br />

Figura 5: Ação do policarboxilato sobre as partículas de cimento.<br />

Figura 6: Manutenção da trabalhabilidade devido ao efeito esférico.<br />

• Brita nº 0: material com diâmetro máximo de 12,5mm, módulo de finura de 5,74 e<br />

abrasão Los Angeles de 42% de desgaste. Justifica-se o uso deste material devido a<br />

facilidade do seu manuseio e aplicação, sendo procedente de Marituba, fornecido<br />

pela DiBrita.<br />

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94<br />

Figura 7: Brita 0 fornecida pela DiBrita.<br />

• Pó de quartzo: o pó de quartzo utilizado foi fornecido pela Micro Service. O ensaio<br />

granulométrico mostrou que 90% dos grãos da amostra tinham diâmetros menores<br />

que 37,37µm, 50% possuíam diâmetro menores que 10,80µm, e 10% apresentaram<br />

diâmetros menores que 1,33µm.<br />

Figura 8: Pó de quartzo utilizado no experimento.<br />

• Metacaulim: o metacaulim é uma adição mineral de alta eficácia para concretos e<br />

produtos à base de cimento Portland, destinado a inúmeras aplicações na construção<br />

civil em geral, largamente utilizado na Europa, Estados Unidos e Ásia, conferindo<br />

inúmeras vantagens, como, por exemplo, aumento de resistência mecânica e durabilidade<br />

com redução de vazios estruturais.<br />

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95<br />

Figura 9: Metacaulim utilizado no experimento.<br />

• Areia: a areia utilizada é encontrada no município de Santa Bárbara – PA. É do tipo<br />

quartozita com grãos esféricos, é classificada como fina e possui densidade aparente<br />

de 1,61 kg/dm³.<br />

Figura 10: Areia utilizada no experimento.<br />

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96<br />

5 METODOLOGIA EXPERIMENTAL<br />

A metodologia adotada para desenvolver o estudo experimental compreendeu:<br />

- Dosagem utilizada;<br />

- Ensaio de compressão axial;<br />

- Ensaio de absorção capilar;<br />

- Instrumentação necessária para coletar os dados dos ensaios.<br />

5.1 PROGRAMA EXPERIMENTAL<br />

A resistência à compressão ao longo do tempo foi analisada por meio de ensaio<br />

de compressão axial. Para analisar a resistência à compressão, foram adotados parâmetros<br />

para as idades de 3, 7 e 14 dias.<br />

5.1.1 Ensaios de Compressão Axial<br />

Foram adotados modelos de acordo com a norma NBR 5739, que possuem forma<br />

cilíndrica, com dimensões de 10cm de diâmetro e 20cm de altura, conforme a figura 11.<br />

Figura 11: Molde para ensaio de compressão axial.<br />

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97<br />

5.1.2 Sistema de Aplicação de Força<br />

Os ensaios de compressão axial para análise da compressão ao longo do tempo<br />

foram realizados na prensa da marca EMIC do Laboratório de Materiais de Construção do<br />

CCET – UNAMA, que tem capacidade de carga de 100 ton.<br />

Os corpos de prova eram posicionados entre placas de aço, bem ao centro, para<br />

que as forças atuassem de forma centralizada. As bases dos corpos de prova foram<br />

posicionadas em placas de aço fixas, enquanto o topo ficava sob uma placa de aço<br />

vinculada a uma rótula, a fim de permitir uma atuação centrada.<br />

5.2 INSTRUMENTAÇÃO<br />

No ensaio de compressão axial de resistência ao longo do tempo, apenas a força<br />

máxima aplicada pela prensa foi monitorada, sendo esta a mesma que provocou a ruptura<br />

dos modelos.<br />

A prensa utilizada possuía células de carga com dispositivo automático onde o<br />

mesmo detectava o valor máximo, sendo o registro feito de forma digital e o deslocamento<br />

do atuador hidráulico tinha velocidade controlada.<br />

As leituras dos dados foram feitas por intermédio de um sistema de aquisição<br />

de dados digital, composto por um computador com um software de controle do MTESC.<br />

5.3 MATERIAIS UTILIZADOS E DOSAGEM ADOTADA<br />

Os materiais utilizados no concreto de pó reativo foram definidos no item 4. A<br />

dosagem utilizada pode ser vista na tabela a seguir:<br />

Tabela 2: Dosagem desenvolvida para o estudo do concreto de pós reativos.<br />

Material Relação (em peso) Consumo (kg/m³)<br />

Cimento 1 714<br />

Areia 1,5 1071<br />

Brita 0 0,625 446<br />

Pó de quartzo (5%) 0,050 36<br />

Metacaulim (8%) 0,080 57<br />

Superplastificante (5%) 0,050 36<br />

Água (a/c = 0,25) 0,250 179<br />

Na mistura, foi utilizada água de amassamento em temperatura ambiente e<br />

após a desmoldagem de 24 horas, os modelos eram levados à câmara úmida<br />

onde permaneciam até a data de ensaio.<br />

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98<br />

6 MOLDAGEM, A<strong>DE</strong>NSAMENTO E CURA DOS MO<strong>DE</strong>LOS<br />

6.1 MISTURA DOS MATERIAIS<br />

Inicialmente, o cimento e a areia foram misturados manualmente na padiola,<br />

até que se alcançasse uma boa homogeneidade.<br />

Em seguida, colocou-se a Brita 0 na betoneira juntamente com 50% da quantidade<br />

de água estabelecida no traço e deixou-se misturar por 1 minuto, como mostra a<br />

figura 12.<br />

Figura 12: Introdução da água junto à brita na betoneira.<br />

Após este tempo, acrescentou-se a mistura de cimento e areia, previamente<br />

homogeneizada. Com o restante da água de amassamento, foram adicionados o pó de<br />

quartzo, o metacaulim e o superplastificante, formando uma pasta fluida e coesa, onde<br />

esta foi introduzida na betoneira com o restante dos materiais e deixou-se bater por 3<br />

minutos até se obter a consistência desejada. As figuras 15 e 16 mostram a sequência do<br />

procedimento.<br />

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99<br />

Figura 13: Mistura de metacaulim, pó de<br />

quartzo superplastificante e água.<br />

Figura 14: Mistura sendo introduzida na<br />

betoneira.<br />

6.2 MOLDAGEM DOS CORPOS <strong>DE</strong> PROVA<br />

Após a mistura estar pronta, inicia-se a moldagem dos modelos. Para isso, utilizou-se<br />

uma colher de pedreiro para auxiliar na retirada do material.<br />

A moldagem dos modelos era feita em três camadas, onde, com auxílio de um<br />

soquete eram executados 24 golpes em cada camada até se fazer o preenchimento total<br />

do molde cilíndrico.<br />

Figura 15: Concreto homogêneo.<br />

Figura 16: Preparação do modelo.<br />

Ao finalizar o preenchimento das formas com o concreto, iniciou-se o acabamento<br />

da superfície dos modelos expostos ao ar livre. A finalidade deste acabamento<br />

era tornar a superfície exposta mais plana e lisa possível e era executado com auxílio da<br />

colher de pedreiro.<br />

6.3 CURA DOS CORPOS <strong>DE</strong> PROVA<br />

Após a moldagem, deixou-se os corpos de prova por 24 horas no molde e<br />

após este período, eram retirados do molde e levados à câmara úmida.<br />

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100<br />

Figura 17: Modelos imersos em água na câmara úmida.<br />

7 <strong>DE</strong>SCRIÇÃO DOS ENSAIOS REALIZADOS<br />

7.1 COMPRESSÃO AXIAL<br />

Foram ensaiados no total, 3 corpos de prova nas idades 3, 7 e 14 dias. Como já<br />

mencionado anteriormente, foram feitos modelos cilíndricos de 10cm x 20cm. A figura<br />

18 mostra a realização do ensaio.<br />

Figura 18: Corpo de prova sendo submetido à ensaio de compressão axial.<br />

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101<br />

7.2 ENSAIO <strong>DE</strong> ABSORÇÃO CAPILAR<br />

Foi ensaiado um corpo de prova de dimensões 10cm x 20cm com a idade de 7<br />

dias, onde deixou-se o mesmo na estufa durante 24 horas para sua secagem completa e<br />

retirado para seu resfriamento até que alcançasse a temperatura ambiente. Após este<br />

período, o modelo foi pesado para obter a massa do corpo-de-prova seco. Em seguida,<br />

o mesmo foi imerso em água a uma altura de 1 cm dentro de um recipiente e permaneceu<br />

durante 1 minuto. Novamente, o corpo-de-prova foi pesado para obter sua massa.<br />

Figura 19: Corpo de prova imerso. Figura 20: CP sendo pesado.<br />

8 ANÁLISE DOS RESULTADOS<br />

8.1 RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO<br />

Por ocasião da hidratação das partículas de cimento, que ocorre ao longo do<br />

tempo, a resistência à compressão do concreto aumenta com a idade. Para o concreto<br />

de pós reativos, que possui composição diferenciada dos concretos usuais, a resistência<br />

à compressão apresenta comportamento semelhante.<br />

A resistência à compressão do concreto de pós reativos aumenta com o tempo,<br />

independentemente do tipo de cura adotado ou da relação água/cimento estabelecida.<br />

Nos ensaios de compressão axial em corpos de prova cilíndricos de 10cm x 20cm,<br />

com controle de aplicação de força, analisou-se a variação da resistência à compressão<br />

do concreto de pós reativos dos 3 até os 14 dias, com cura úmida. Os resultados são<br />

mostrados na tabela abaixo:<br />

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102<br />

Tabela 3: Resultados dos ensaios de compressão axial.<br />

IDA<strong>DE</strong><br />

RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO (MPa)<br />

3 36,49<br />

7 52,31<br />

14 64,58<br />

8.2 ENSAIO <strong>DE</strong> ABSORÇÃO CAPILAR<br />

A propriedade que caracteriza a quantidade de água absorvida pelos vasos capilares<br />

do concreto é um fator que deve ser conhecido por quem o utiliza, pois define a<br />

possibilidade de umidade ascendente no concreto.<br />

O corpo de prova ensaiado possuía 7 dias de idade e apresentou uma absorção<br />

de água por capilaridade de 0,022 g/cm².<br />

9 OBRAS <strong>DE</strong> BELÉM<br />

Sendo nossa região possuidora de condições climáticas adversas, onde se criam<br />

sistematicamente e de forma intermitente gradientes térmicos que provocam deformações<br />

pelos esforços de tração de origem térmica, assim como também possui-se materiais<br />

agregados naturais potencialmente nativos já comprovados em ensaios realizados em<br />

laboratório da ABCP e L.A. Falcão Bauer, cuja reação álcali-agregado se processa na presença<br />

de água, e é minimizada ou inibida pela ação pozolânica na fixação de cal.<br />

O metacaulim e a sílica ativa funcionam como pozolanas altamente nativas, de<br />

sorte que a sua aplicação permite substituição do cimento, fazendo com que o calor de<br />

hidratação seja reduzido, a reação álcali-agregado seja inibida, as resistências sejam<br />

aumentadas e a porosidade reduzida. Isto conduz à execução de estruturas mais econômicas,<br />

mais duráveis e sustentáveis.<br />

Pelas características discutidas, espera-se que sua utilização pela construção<br />

civil paraense, seja o mais breve possível, para que as obras possam ter mais tempo de<br />

vida útil.<br />

10 CONSI<strong>DE</strong>RAÇÕES FINAIS<br />

• Demonstra-se que é viável executar CPR com materiais de Belém;<br />

• O uso de empacotamento granulométrico reduz substancialmente a porosidade do<br />

concreto;<br />

• Esta metodologia nos permite chegar a resistências nunca antes alcançadas na região;<br />

• O uso de superplastificantes permite produzir concretos plásticos, apesar da<br />

relação água/cimento da ordem de 0,25;<br />

• O uso das pozolanas é imprescindível para se obter um concreto altamente resistente,<br />

durável, econômico e sustentável.<br />

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103<br />

REFERÊNCIAS<br />

AÏTCIN, P. C. Hight – performance concrete London, New York: E. & f. n. Spon, 1998.<br />

ANDRA<strong>DE</strong> T. Concreto de alto desempenho. Revista O Construtor. 3. ed., ano:<br />

2005, disponível em: http://www.sindusconpe.com.br/aerQualidade/<br />

concreto%20%de20%alto%20<br />

BARATA, M. Concreto de alto desempenho no estado do Pará. UFRGS, 2002.<br />

HELENE, P; TERZIAN, P. Manual de dosagem e controle do concreto. São Paulo: Ed. Pini,<br />

2004.<br />

LOTURCO, B. Misturas plásticas. Revista Téchne. Ed. Pini. Ed. 125, ago. 2007.<br />

MEHTA, P.; MONTEIRO, P. Concreto: microestrutura, propriedades e materiais. São Paulo-SP:<br />

Ed. Ibracon, 2008.<br />

MIRA, M. A. S.; FONSECA, R. S. Aplicação de metacaulim em microconcreto de estacas<br />

moldadas in loco. UNAMA, 2008.<br />

VAN<strong>DE</strong>RLEI, R. Análise experimental do concreto de pós reativos: dosagem e propriedades<br />

mecânicas. USP, 2004.<br />

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104


105<br />

ANÁLISE <strong>DE</strong> MÉTRICAS <strong>DE</strong> ROTEAMENTO UTILIZANDO<br />

VOIP E VÍ<strong>DE</strong>O EM RE<strong>DE</strong>S EM MALHA SEM FIO<br />

André F. Riker *<br />

Elisangela S. Aguiar **<br />

RESUMO<br />

Este artigo apresenta um estudo comparativo de cinco protocolos de roteamento utilizados<br />

em redes em malha sem fio, também denominadas de Redes Mesh, sendo eles<br />

AODV (Ad Hoc On-Demand Distance Vector), OLSR (Optimized Link State Routing), OLSR-<br />

MD (OLSR – Minimum Delay), OLSR-ETX (OLSR – Expected Transmission Count) e OLSR-<br />

ML (OLSR – Minimum Loss). A análise foi feita com base em simulações realizadas no<br />

Network Simulator 2.33 levando em consideração um cenário urbano de população de<br />

baixa renda, e aspectos de qualidade de serviço e de experiência do usuário.<br />

Palavras-Chave: Redes em Malha Sem Fio. Protocolos de Roteamento. Qualidade de<br />

Experiência<br />

ABSTRACT<br />

ANALYSIS OF ROUTING METRICS USING VOIP AND<br />

VI<strong>DE</strong>O ON WIRELESS MESH NETWORKS<br />

This article presents a case study of five routing protocols used in Wireless Mesh Network,<br />

are they AODV (Ad Hoc On-Demand Distance Vector), OLSR (Optimized Link State<br />

Routing), OLSR-MD (OLSR - Minimum Delay), OLSR-ETX (OLSR - Expected Count Transmission)<br />

and OLSR-ML (OLSR - Minimum Loss). The analysis was based on performance<br />

simulation in Network Simulator 2.33 taking into account a scenario of urban low-income<br />

population, and aspects of quality of service and User Experience.<br />

Keywords: Wireless mesh network. Routing protocols. Quality of experience.<br />

* Formado em Ciência da Computação pela Universidade da Amazônia. Atualmente é graduando de Sistemas<br />

de Telecomunicações do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia e mestrando em Ciência da Computação<br />

pela Universidade Federal do Pará.<br />

** Doutoranda em Engenharia Elétrica, com êndase em computação aplicada pela Universidade Federal do<br />

Pará. Possui mestrado em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Pernambuco (2002) e graduação<br />

em Ciência da Computação pela Universidade Federal do Pará (1999). É professora adjunto I da Universidade<br />

da Amazônia e analista de redes do Serviço Federal de Processamento de Dados SERPRO.<br />

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106<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

As redes em malha sem fio (Wireless Mesh Network), conhecidas também como<br />

Redes Mesh, se apresentam como uma tecnologia de baixo custo por não necessitar<br />

tanto do uso de cabos como as redes Wi-Fi (Wireless Fidelity) infraestruturadas ou<br />

redes cabeadas. Isto se dá devido à formação do backbone sem fio que provê comunicação<br />

entre os nós da malha estabelecida.<br />

Decorrente deste atrativo econômico, pode-se citar o projeto ReMesh (2007)<br />

como um dos que utilizam-se deste tipo de rede para fornecer acesso à internet banda<br />

larga a estudantes universitários e a áreas residenciais.<br />

Segundo Ramanathan et al. (2002), em uma rede em malha sem fio os roteadores<br />

mesh, denominados de MR (Mesh Routers) estão fixos, ainda que suas localizações não<br />

sejam predeterminadas, e formam o backbone da malha sem fio. Albuquerque (2006)<br />

destaca que os clientes, denominados de MC (Mesh Clients) podem usufruir da infraestrutura<br />

estabelecida pelos MRs, enviando seus próprios pacotes, ou desempenhar o papel<br />

de encaminhamento de pacotes que não são seus para os demais nós da rede.<br />

Este trabalho colaborativo entre os nós da rede estende a cobertura de pontos<br />

de acesso sem ser necessário que procedimentos de configuração sejam realizados<br />

pelos usuários. Isto ocorre devido à característica de auto-organização e autoconfiguração<br />

das redes Mesh.<br />

Segundo Abelém et al. (2007) ao se propor a disponibilizar o acesso à internet<br />

em universidades, colégios, escolas, hospitais e áreas residenciais, as redes em malha<br />

sem fio podem além de ser um grande instrumento de inclusão digital, ser simultaneamente<br />

uma forma de reduzir custos em serviços de telefonia utilizando-se da tecnologia<br />

VoIP (Voice over Internet Protocol) ou facilitar a propagação e popularização da<br />

transmissão de videostreaming. Além disso, poderia ser um grande instrumento para a<br />

criação de cidades digitais.<br />

No entanto, é um grande desafio transmitir dados em tempo real, como voz ou<br />

vídeo, devido à sua alta sensibilidade ao atraso. Quando a aplicação VoIP é utilizada em<br />

um ambiente mesh aumenta-se ainda mais a probabilidade de que os pacotes sofram<br />

grande atraso e afetem a qualidade de transmissão da voz devido aos múltiplos saltos<br />

executados para encaminhar os dados entre remetente e destinatário.<br />

Neste contexto, surge o protocolo de roteamento, que segundo Kurose (2006),<br />

é o responsável por determinar as rotas e consequentemente os saltos que os pacotes<br />

devem percorrer em suas transmissões do nó origem ao nó destino. Assim, o protocolo<br />

de roteamento utilizado na rede exerce uma função crucial na qualidade de serviço<br />

(QoS – Quality of Service) requerida pelo usuário e/ou aplicação, bem como na qualidade<br />

de experiência (QoE – Quality of Experience) percebida pelo usuário.<br />

Devido às semelhanças entre as redes Mesh e as redes MANET (Mobile Ad hoc<br />

Network) alguns protocolos de roteamento originalmente projetados para cenários Ad<br />

Hoc são frequentemente acrescidos de extensões e otimizações para atuarem nas redes<br />

em malha sem fio e obter maior conformidade com as características Mesh e assim<br />

fornecer maior qualidade de serviço às aplicações de áudio e vídeo.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 105-121, jun. 2010


107<br />

Basicamente a tarefa de acrescentar extensão ou otimização a um protocolo de<br />

roteamento significa adaptar as métricas utilizadas pelo algoritmo de tal protocolo.<br />

Estas métricas consistem em parâmetros utilizados nos cálculos de roteamento para<br />

eleger qual a melhor rota para os dados serem transmitidos da origem até o destino. Um<br />

exemplo de métrica é eleger a melhor rota aquela que possuir menor número de saltos<br />

(hops) entre remetente e destinatário.<br />

Neste trabalho é realizada uma análise de qualidade de experiência. Esta é<br />

importante para comparar resultados de avaliação do ponto de vista da rede (QoS) e<br />

avaliação do ponto de vista do usuário (QoE). Tal comparação objetiva investigar como<br />

é refletido para o usuário o que uma métrica de roteamento se propõe a fazer. Este tipo<br />

de análise é relevante pois fornece uma visão prática da transmissão de vídeo no cenário<br />

proposto e isto é possível graças às ferramentas utilizadas que permitem reconstruir<br />

como seria o arquivo de vídeo recebido pelo usuário.<br />

As métricas de QoE podem ser divididas em qualitativas e quantitativas. As<br />

métricas qualitativas são de caráter subjetivo e são baseadas unicamente na opinião do<br />

usuário frente ao vídeo. A métrica qualitativa mais difundida é a Mean Option Score<br />

(MOS), onde os valores vão de 1 a 5, significando que quanto mais perto de 1 pior é a<br />

qualidade do vídeo e quanto mais perto de 5 melhor é a qualidade da aplicação, conforme<br />

é apresentado na tabela 1.<br />

As métricas quantitativas ou objetivas são métricas que utilizam cálculos matemáticos<br />

para analisar determinados parâmetros da aplicação e de posse desta análise é<br />

possível estimar a qualidade de um vídeo. Nesta etapa de estimativa, faz-se uso do<br />

processo de mapeamento de valores das métricas objetivas para as métricas qualitativas.<br />

As métricas objetivas utilizadas neste trabalho foram: Peak Signal to Noise Ratio<br />

(PSNR), Structural Similarity Index (SSIM) e Video Quality Metric (VQM).<br />

Lambrecht e Verscheure (1996) destacam que a métrica PSNR é baseada na<br />

métrica Mean Squared Error (MSE) de forma que as duas analisam frame por frame do<br />

vídeo recebido pelo usuário com o original. O PSNR é dado em dB (decibel) e pode ser<br />

mapeada para MOS segundo a tabela 1.<br />

Tabela 1: Mapeamento PSNR para MOS.<br />

PSNR MOS Qualidade<br />

< 20 1 Péssimo<br />

20 – 25 2 Pobre<br />

25 – 31 3 Regular<br />

31 – 37 4 Bom<br />

> 37 5 Excelente<br />

A métrica SSIM, segundo Takahashi et al. (2008), leva em consideração parâmetros<br />

que refletem com mais propriedade como o sistema de visão humana extrai informações<br />

das imagens ou vídeos. Os parâmetros levados em consideração para o cálculo<br />

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108<br />

do SSIM são: cor, luminosidade e estrutura. O valor de SSIM é dado em uma escala de 0<br />

a 1, sendo que quanto mais próximo de 1 maior é a qualidade do vídeo e quanto mais<br />

próximo de pior é a qualidade do vídeo.<br />

A métrica VQM busca avaliar um vídeo ou imagem com os seguintes parâmetros:<br />

distorção de cores, distorção de pixels, ruído, e nível de “embaçamento” do vídeo.<br />

Assim, esta métrica segundo (FERRUS, 2006) é a métrica que mais se aproxima da avaliação<br />

de imagens feita pelo sistema de visão humana. A VQM é dada em valores que vão<br />

de 0 a 5 sendo que quanto mais próximo de 0 melhor qualidade tem o vídeo e quanto<br />

mais próximo de 5 pior é a qualidade do vídeo.<br />

O restante do artigo encontra-se organizado da seguinte forma, no item 2 conceitos<br />

de protocolos e métricas são apresentados. O item 3 apresenta trabalhos relacionados.<br />

A caracterização do cenário simulado e estudado é apresentada no item 4. Os<br />

resultados obtidos na análise de QoS e de QoE são apresentados no item 5. Considerações<br />

finais são feitas no item 6.<br />

2 PROTOCOLOS E MÉTRICAS <strong>DE</strong> ROTEAMENTO<br />

Segundo Przybysz et al. (2007) os protocolos de roteamento podem ser divididos<br />

em: pró-ativos, reativos e híbridos.<br />

Os protocolos pró-ativos, também conhecidos como globais, são aqueles que<br />

possuem as tabelas de roteamento constantemente atualizadas contendo dados sobre<br />

a topologia da rede. Neste artigo serão considerados os protocolos OLSR (Optimized<br />

Link State Routing) proposto por Clausen et al. (2003) e seus variantes OLSR-MD (OLSR –<br />

Minimum Delay) sugerido por Cordeiro et al. (2007), OLSR-ETX (OLSR - Expected Transmission<br />

Count) proposto por De Couto et al. (2003) e OLSR-ML (OLSR - Minimum Loss)<br />

sugerido por Passos et al. (2006), todos pró-ativos.<br />

O protocolo OLSR e seus variantes, guardam informações dos enlaces, e para<br />

tanto, enviam periodicamente pacotes de estado de enlace a todos os outros nós da rede.<br />

A mensagem denominada hello, é transmitida via endereço broadcast e deve ser entendida<br />

pelos vizinhos que este nó encontra-se ativo. Além disso, na resposta do nó que<br />

recebeu o hello deve constar quais são os seus nós vizinhos e os enlaces aptos para uso.<br />

Przybysz et al. (2007) destaca que a mensagem TC (Topology Control) contém os<br />

estados de enlace do OLSR. Cada nó da rede seleciona um conjunto de MPRs (MultiPoint<br />

Relays) a fim de reduzir a sobrecarga da rede com estas mensagens de controle.<br />

Desta forma, quando um nó transmite uma mensagem broadcast, dentre todos os vizinhos<br />

deste nó, somente os seus MPRs devem encaminhar a mensagem. Outra característica<br />

importante é quando há difusão das listas de nós MPRs. Quando isto ocorre cada<br />

nó da rede reconhece por qual MPR um determinado nó pode ser alcançado.<br />

A métrica padrão do OLSR é o número de saltos, entretanto vendo a possibilidade<br />

de alcançar melhores resultados com outras métricas, surgiram variantes deste. Por<br />

exemplo, o OLSR-MD que como métrica principal para a escolha da melhor rota, escolhe<br />

o caminho que fornecer menores valores de atraso. Esta adaptação é muito útil quando<br />

se trata de transmissão de fluxos de dados em tempo real tendo em vista a sua sensibilidade<br />

ao atraso.<br />

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109<br />

A métrica ETX (Expected Transmission Count) escolhe caminhos com menores<br />

números de transmissões esperadas na transmissão de um pacote desde o nó origem<br />

até o nó destino. O cálculo ETX é feito com base na taxa de pacotes perdidos em ambos<br />

os sentidos de um enlace da rede. Segundo De Couto et al. (2003) o objetivo principal da<br />

métrica ETX é selecionar os enlaces com maiores valores de vazão.<br />

A métrica ML (Minimum Loss) utiliza a mesma técnica de medição de atraso<br />

(AdHoc Probe) que a métrica ETX, porém diferentemente da métrica ETX, para achar o<br />

menor número de pacotes descartados fim a fim, a métrica ML não utiliza a soma da taxa<br />

de descartados e sim realiza a multiplicação dos mesmos. Segundo Campista et al. (2008)<br />

a utilização da multiplicação faz com que a rede tenha menor número ou incidências de<br />

mudança de rotas.<br />

Segundo Przybysz et al. (2007) os protocolos reativos são caracterizados por<br />

possuírem o descobrimento de rotas sob demanda e atuam de forma descentralizada,<br />

ou seja, são implementados mecanismos dinâmicos para levar dados de um nó origem<br />

que não possua rota direta para um nó destino. Como representante da técnica reativa,<br />

o presente artigo analisará o protocolo AODV (Ad Hoc On-Demand Distance Vector).<br />

Neste protocolo, quando um nó necessita transmitir para um nó destino e este<br />

não está em sua tabela de rotas, inicia-se um processo de descobrimento de rota. Para<br />

isto é transmitido um pacote route request a todos os vizinhos, que por sua vez realizam<br />

o mesmo. As mensagens são transmitidas até que o nó destino seja alcançado.<br />

Uma mensagem route reply é emitida assim que a rota até o destinatário é<br />

conhecida. Existe um campo correspondente ao número de saltos na mensagem route<br />

reply que é incrementado à medida que um nó intermediário a recebe e a retransmite.<br />

A transmissão desta mensagem em questão só acaba quando a mesma chega na origem.<br />

A mensagem hello também está presente no protocolo AODV e possui a função<br />

de manter atualizados os vizinhos da existência ou não de uma determinada rota. Isto<br />

significa que quando determinado nó não recebe por determinado período de tempo<br />

uma mensagem hello, infere-se que algum enlace da rota em questão tornou-se inválido.<br />

Outra categoria de protocolos são os denominados híbridos. Estes unem as<br />

melhores características dos protocolos pró-ativos e dos reativos. Neste tipo de atuação<br />

existe um mecanismo responsável por determinar em cada situação qual tipo de algoritmo<br />

deve ser utilizado. A forma como esta alternância de algoritmos é feita varia<br />

conforme o tipo de resultados que se busca.<br />

3 <strong>TRABALHO</strong>S RELACIONADOS<br />

Broch et al. (1998) realiza um estudo comparativo entre os protocolos DSDV<br />

(Destination-Sequenced Distance-Vector Routing), TORA (Temporally Ordered Routing<br />

Algorith), DSR (Dynamic Source Routing) e AODV sob os aspectos: overhead, razão entre<br />

pacotes recebidos e pacotes enviados e menor caminho.<br />

Em Munaretto et al. (2003), encontra-se o funcionamento do protocolo QOLSR<br />

(QoS routing over OLSR) que se propõe escolher o menor caminho que possua maior<br />

largura de banda e menor atraso.<br />

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110<br />

Aguiar et al. (2007) se propõe a analisar comparativamente os protocolos AODV e<br />

OLSR no fornecimento de QoS para aplicações em tempo real como VoIP. Entretanto, diferentemente<br />

do que é apresentado em Aguiar et al. (2007), este estudo considera também<br />

os protocolos OLSR-MD, OLSR-ML e OLSR-ETX, um cenário diferente, incluindo a transmissão<br />

de vídeo, também considerando área de periferia, porém, além de QoS, avalia QoE.<br />

4 CENÁRIO AVALIADO<br />

Como é ilustrado na figura 1, o cenário avaliado está localizado aos arredores da<br />

Universidade da Amazônia (UNAMA). A configuração geográfica do local é formada basicamente<br />

por prédios, poucas árvores e um canal de saneamento.<br />

Figura 1: Cenário Avaliado<br />

A área é situada em meio a residências de baixa renda, escolas e hospitais<br />

públicos. Este estudo se propõe a analisar a viabilidade da implantação de uma rede em<br />

malha sem fio com objetivo de levar às populações carentes e aos prédios públicos do<br />

local acesso à internet sem fio e aplicações como VoIP e transmissões de vídeo.<br />

A aplicação VoIP é caracterizada por exigir parâmetros a serem atendidos para<br />

que o desempenho da aplicação seja satisfatório ao usuário. Os quatro parâmetros de<br />

desempenho da aplicação VoIP analisados neste trabalho são: vazão, atraso, probabilidade<br />

de bloqueio e jitter (variação do atraso).<br />

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111<br />

Nas simulações realizadas caracterizou-se a transmissão de voz no ambiente de<br />

simulação ns (Network Simulator), na sua versão 2.33, como sendo uma fonte constante<br />

de bits de transmissão (Contant Bit Rate - CBR) com 8Kbps, pois esta taxa corresponde<br />

ao codec G.729.<br />

Justifica-se o uso de tal codec pois segundo (CALLADO et al, 2007) este possui a<br />

característica de usar baixa largura de banda e boa qualidade de áudio devido à técnica<br />

de supressão do silêncio.<br />

Para que as simulações retratassem um cenário real, um tráfego de dados de<br />

background usando o protocolo de transporte TCP (Transmission Control Protocol) foi<br />

gerado simultaneamente às chamadas VoIP usando o protocolo de transporte UDP (User<br />

Datagram Protocol).<br />

Este tráfego paralelo é crucial para obtenção de resultados válidos, visto que<br />

sua função é deixar a rede congestionada. Caracterizou-se este fluxo de dados como<br />

uma aplicação FTP (File Transfer Protocol) de transmissão em rajadas e utilizou-se o<br />

modelo de Pareto conforme apresentado em NS (2006) com valores padrões.<br />

Nas simulações não foi utilizado nenhum tipo de técnica especial para entrega<br />

de pacotes VoIP. Assim simula-se o serviço de melhor esforço presente na Internet.<br />

Kurouse et al. (2006) destaca que o serviço de melhor esforço executa o processo de<br />

entrega de dados sem fazer nenhuma distinção entre os pacotes, ou seja, todos os<br />

dados devem ser transportados o mais rápido possível. Como os protocolos de transporte<br />

TCP e UDP executam sobre IP, nenhum desses protocolos oferece garantia contra<br />

atraso às aplicações requisitantes.<br />

Além dessas características, utilizou-se um intervalo de confiança de 95 % para<br />

análise dos resultados segundo Jain (1991). A tabela 2 apresenta as informações gerais<br />

das simulações.<br />

Tabela 2: Informações gerais<br />

continua...<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 105-121, jun. 2010


112<br />

continuação...<br />

Para que as simulações de transmissão de vídeo fossem possíveis foi necessário<br />

proceder modificações em alguns arquivos do NS. A partir das modificações implementadas<br />

foi possível utilizar a ferramenta Evalvid (2009). Esta ferramenta permite obter o<br />

vídeo recebido pelo usuário. De posse desse vídeo recebido em formato YUV, utilizouse<br />

para avaliação dos vídeos a ferramenta MSU Video Quality Measurement Tool Software<br />

(2009).<br />

5 RESULTADOS OBTIDOS<br />

5.1 ANÁLISE DA QUALIDA<strong>DE</strong> <strong>DE</strong> SERVIÇO (QOS) DO TRÁFEGO <strong>DE</strong> VOIP<br />

Na figura 2 são apresentados os valores de vazão média referentes às 4 ligações<br />

VoIP que compreendem 2 fluxos cada. Nota-se que não houve grandes diferenças entre<br />

os protocolos usados pois como em Aguiar et al. (2007) não foi aplicada nenhuma técnica<br />

de QoS para priorização do uso de largura de banda.<br />

Figura 2: Vazão média dos fluxos VoIP<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 105-121, jun. 2010


113<br />

A divisão da banda da rede que cada protocolo estudado promoveu pode ser<br />

observada na figura 3. Estes dados apontam a porcentagem de vazão que cada fluxo<br />

VoIP consumiu da banda total da rede. Este gráfico revela que, de modo geral todos<br />

promoveram uma divisão igualitária da rede, porém, isto é devido ao fato de que as<br />

distâncias entre origem e destino das chamadas serem semelhantes, visto que sabe-se<br />

que em cenários com chamadas de diferentes distâncias, a divisão de banda tende a ter<br />

valores maiores de banda para chamadas de menor distância e valores de menores<br />

banda para chamadas longas.<br />

Figura 3: Divisão de banda dos fluxos VoIP.<br />

A figura 4 revela que os valores de atraso do protocolo OLSR utilizando-se da<br />

métrica de mínimo atraso (Minimum Delay - MD) fornece melhoria comparados ao protocolo<br />

OLSR original que utiliza a métrica de menor número de saltos. OLSR-MD, neste<br />

cenário não apresentou grande melhoria quando comparado às demais métricas ou ao<br />

protocolo reativo AODV.<br />

A métrica ETX e a métrica ML apresentaram bons resultados, merecendo serem<br />

destacadas como as métricas que forneceram aos fluxos VoIP os menores valores de<br />

atraso na maioria dos casos. No geral os valores de atraso não foram superiores às<br />

recomendações de Walker et al. (2002) onde é estabelecido um limite de 150 ms de<br />

atraso fim a fim. Caso este limite seja ultrapassado começa-se a sentir perda.<br />

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114<br />

Figura 4: Atraso médio dos fluxos VoIP.<br />

Os valores percentuais de pacotes descartados (representada pela razão entre<br />

o número de pacotes descartados e o número de pacotes enviados) são apresentados<br />

na figura 5. Neste caso ou item, os protocolos com melhores resultados foram OLSR-<br />

MD, AODV e OLSR-ETX, por outro lado, os protocolos OLSR e OLSR-ML apresentaram<br />

casos de perdas acima de 10% dos dados enviados.<br />

Diversos fatores podem ser a causa para o descarte de pacotes de um fluxo,<br />

porém merece destaque o tipo de descarte ocasionado por congestionamento de fila.<br />

O nível de descarte na rede poderia ser melhorado caso os protocolos utilizassem mecanismos<br />

de balanceamento de carga, sendo priorizados caminhos que fornecessem<br />

menos congestionamento. No entanto, nenhuma das métricas avaliadas faz uso de tais<br />

mecanismos.<br />

Os valores de probabilidade de bloqueio ainda são muito altos em alguns casos,<br />

visto que, nos fluxos 2, 5 e 6, ultrapassam o limite máximo de 0,03 estabelecido por<br />

Walker et al. (2002) e ainda estão longe de atingir o valor ideal de 0,005. Esses valores<br />

ideais seriam necessários para uma transmissão de qualidade ótima.<br />

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115<br />

Figura 5: Porcentagem de pacotes descartados.<br />

Os dados obtidos de jitter podem ser observados na figura 6. O jitter é o parâmetro<br />

que reflete a variação do atraso. Os melhores valores de jitter para a aplicação<br />

VoIP seria por volta do zero, ou seja, para uma aplicação sensível a atraso, o ideal seria<br />

que o jitter fosse nulo, no entanto, algumas métricas ainda apresentam valores altos<br />

(negativos ou positivos).<br />

Neste item de avaliação as métricas ETX e ML foram bem sucedidas visto que<br />

tiveram os melhores valores de jitter, isto é, mais próximos de zero. Os demais protocolos<br />

obtiveram valores que revelam ainda grandes variações no atraso.<br />

Atualmente existem técnicas utilizadas para que os valores de jitter tenham<br />

menos efeito na qualidade de serviço. Uma dessas técnicas é a utilização de buffers, no<br />

entanto, mesmo com uso buffers os dados podem ser descartados caso o atraso for<br />

muito grande.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 105-121, jun. 2010


116<br />

Figura 6: Porcentagem de pacotes descartados.<br />

Portanto, de um modo geral, as métricas propostas MD, ML, ETX possuem melhores<br />

resultados do que o protocolo OLSR original por causa de sua capacidade de<br />

qualificar um enlace com maior propriedade.<br />

Quando comparado ao protocolo reativo AODV, este ainda apresenta bons resultados.<br />

Uma boa característica apresentada pelo protocolo AODV é o seu baixo valor<br />

de atraso e de perda de pacotes.<br />

Vale destacar que os valores de probabilidade de bloqueio, que consiste na<br />

razão entre o número de pacotes descartados e o número de pacotes enviados,<br />

ainda apresentaram-se muito acima do valor ideal esperado para transmissões VoIP<br />

de qualidade.<br />

Além disso, é possível notar que apenas melhorias nos protocolos de roteamento<br />

não são soluções suficientes para o problema da transmissão de dados multimídia.<br />

É preciso haver algum tipo de classificação dos serviços, onde os pacotes prioritários<br />

poderiam receber tratamento especial.<br />

Apenas com o serviço de melhor esforço, a rede ainda gera muita perda de<br />

dados e altos valores de atraso, tornando a qualidade do serviço usuário prejudicada.<br />

5.2 ANÁLISE DA QUALIDA<strong>DE</strong> <strong>DE</strong> EXPERIÊNCIA (QOE) DO TRÁFEGO <strong>DE</strong> VÍ<strong>DE</strong>O<br />

Segundo Klima et al. (2009) os sistemas envolvendo imagem e vídeo devem ser<br />

avaliados também por um observador humano a fim de os parâmetros avaliados possam<br />

refletir na qualidade subjetiva percebida pelo sistema de visão humano.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 105-121, jun. 2010


117<br />

Porém, os parâmetros de QoS, amplamente utilizados na avaliação de desempenho<br />

de aplicações multimídia de vídeo ou imagem, não incluem explicitamente um<br />

avaliador humano. Desta forma, os parâmetros de Qualidade de Experiência (QoE) surgiram<br />

baseados nas propriedades e atitudes relevantes que os seres humanos possuem<br />

ao explorar uma imagem.<br />

A principal função dos mecanismos de QoS é permitir as melhores formas de<br />

transferir os fluxos de tráfego pela rede. No entanto segundo Wang, et al. (2009), os<br />

usuários finais querem apenas assistir vídeos que sejam visualmente excelentes, não<br />

importando para este se os dados estão trafegando da melhor maneira possível. Para<br />

suprir esta necessidade, a qualidade de experiência visa medir parâmetros dos equipamentos<br />

da rede segundo o ponto de vista que o usuário possui.<br />

A tabela 3 apresenta os valores obtidos referente às métricas PSNR, SSIM e<br />

VQM. Os resultados apresentam melhor desempenho dos protocolos OLSR-ETX e OLSR-<br />

MD, sendo classificados com “excelente”. O protocolo AODV apresentou bons resultados<br />

e os protocolos OLSR e OLSR-ML foram classificados como “regular”.<br />

Estas classificações apresentadas na tabela 3 mostram que as métricas VQM e<br />

PSNR foram as que mais diferenciaram os protocolos, deixando mais claro quais protocolos<br />

receberiam melhores “notas” caso um usuário assistisse o vídeo recebido.<br />

Tabela 3: Resultados obtidos pelos protocolos avaliados.<br />

Protocolos VQM SSIM PSNR MOS<br />

AODV 0,76307 0,99253 36,81335 Bom<br />

OLSR 1,04347 0,98767 28.47799 Regular<br />

OLSR-ML 0,84399 0,81957 29,67611 Regular<br />

OLSR-MD 0,68084 0,99251 38,40144 Excelente<br />

OLSR-ETX 0,05546 0,99968 39,12806 Excelente<br />

A figura 7 apresenta frames do vídeo transmitido com os protocolos avaliados.<br />

Estes frames correspondem tempo de dois segundos da transmissão, a escolha do momento<br />

da captura dos frames é devido às dificuldades que a maioria dos protocolos<br />

apresentou nesse momento de transmissão.<br />

O frame original está ilustrado na figura 7.a e é a base das comparações visuais<br />

neste estudo. Esta análise de frames visa apenas dar maior respaldo as avaliações referentes<br />

às métricas de QoE utilizadas.<br />

A figura 7.b ilustra o frame referente à transmissão do protocolo OLSR e apresenta<br />

uma imagem com degradação de qualidade visual acentuada, visto que a imagem<br />

reflete bem a falha causada pelo movimento da pessoa. No entanto, a imagem ainda é<br />

passível de uma identificação visual do usuário.<br />

A figura 7.c é o resultado da utilização do protocolo OLSR-ML na transmissão do<br />

vídeo. Esta imagem apresenta uma forte degradação da qualidade visual tornando o<br />

vídeo quase imperceptível a um usuário. A imagem correspondente ao protocolo AODV<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 105-121, jun. 2010


118<br />

pode ser vista na figura 7.d e esta apresenta também falha de movimento, deixando a<br />

imagem composta por outras imagens de fundo.<br />

Os melhores resultados são apresentados na figura 7.e e 7.f e correspondem<br />

respectivamente às métricas de roteamento ETX e MD. No entanto, partes<br />

dos vídeos correspondentes a estes protocolos ainda apresentam alguns momentos<br />

de “travamento” e falha de movimentação.<br />

6 CONCLUSÃO<br />

Figura 7: Frames transmitidos pelos protocolos avaliados.<br />

O principal atrativo das redes em malha sem fio está no fornecimento de banda<br />

larga sem fio a baixo custo a comunidades carentes. Através desta tecnologia pode-se<br />

levar conectividade a áreas de difícil acesso, onde não seria viável altos investimentos<br />

em redes que necessitam de uma grande implantação de infraestrutura.<br />

A construção da rede Mesh pode representar uma boa alternativa para fornecimento<br />

de ligações VoIP e transmissão de vídeo em ambientes públicos à medida que<br />

novas métricas de roteamento e técnicas de QoS/QoE forem capazes de fornecer melhores<br />

desempenho dos parâmetros analisados neste estudo.<br />

AODV<br />

Muitos grupos de pesquisas estão atuando no desenvolvimento das redes em<br />

malha sem fio, principalmente pelas características de baixo custo de instalação e alta<br />

flexibilidade da malha, porém vale ressaltar que ainda é necessária a definição de uma<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 105-121, jun. 2010


119<br />

padronização quanto aos produtos pré-mesh que já são oferecidos por algumas empresas.<br />

E este é um fator determinante para que a tecnologia possa alcançar mercado e<br />

torne-se presente em áreas corporativas, empresariais, residenciais e governamentais.<br />

Análises comparativas utilizando-se outros modelos de propagação desenvolvidos<br />

especificamente para áreas urbanas podem ser feitos em trabalhos futuros. Outro<br />

estudo futuro possível é a comparação entre os protocolos reativos e pró-ativos em<br />

um cenário de maior escala com maior número de nós e fluxos de VoIP e vídeo.<br />

Outro ponto desafiante são as métricas utilizadas na quantificação de QoE, como<br />

é possível notar neste trabalho, as métricas utilizadas para medir QoE já conseguem<br />

expressar o que de fato usuário pensa a respeito de um vídeo, no entanto ainda é<br />

necessário avanços nas métricas de QoE.<br />

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122


123<br />

ESTUDO SOBRE DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E SAZONAL DAS<br />

ESPÉCIES <strong>DE</strong> BAGRES MARINHOS (SILURIFORMES:<br />

ARIIDAE) DO ESTUÁRIO AMAZÔNICO<br />

Fabrício Lemos de Siqueira Mendes *<br />

Ronaldo Borges Barthem **<br />

RESUMO<br />

Pertencente à ordem dos Siluriformes os bagres marinhos e estuarinos distribuem-se<br />

pelas costas de todos os continentes, habitando áreas costeiras de região tropical e<br />

subtropical, onde vivem em águas de pouca profundidade, com fundo arenoso ou lodoso.<br />

O objetivo deste estudo é identificar as distribuições espaciais e sazonais de bagres<br />

marinhos contribuindo deste modo ao conhecimento da ecologia dessas espécies. Os<br />

espécimes foram capturados com rede de fundo sem porta. A distribuição espacial<br />

constatou que Arius phrygiatus e Hexanematichthys couma ocupam preferencialmente<br />

profundidades entre 5 a 10m, as demais espécies (Hexanematichthys parkeri, Hexanematichthys<br />

proops, Notarius grandicassis, Aspitor quadriscutis e Arius rugispinis) estão<br />

mais presentes em profundidades entre 10 a 20m. A distribuição sazonal: as espécies<br />

são abundantes durante todo o ano, com exceção de Arius phrygiatus que está mais<br />

abundante durante a estação de inverno.<br />

Palavras-Chave: Distribuição. Sazonalidade. Estuário. Amazônia. Siluriformes.<br />

ABSTRACT<br />

STUDY ABOUT DISTRIBUTION SPACE AND SPATIAL<br />

THE SPECIES OH THE CATFISH (SILURIFORMES:<br />

ARIIDAE) OF THE AMAZON STUARY)<br />

The irder Siluriformes contains marine and estuarine catfishes distributed along the coasts<br />

of all the continents, inhabiting tropical and subtropical shores where they live in<br />

shallow waters with sandy or muddy bottoms. The aim of this study is to identify spatial<br />

distribution and seasonal distribution of the species of catfishes (Siluriformes) of the<br />

Amazon stuary. Specimens were captured with bottom nets without escape doors. Arius<br />

phrygiatus and Hexanematichthys couma are the most abundant in the 5-10m depth<br />

* Professor titular da Universidade da Amazônia (UNAMA) - E-mail: fabriciolsm@gmail.com<br />

** Pesquisador do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) - E-mail: barthem@museu-goeldi.com.br<br />

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124<br />

range (Hexanematichthys parkeri, Hexanematichthys proops, Notarius grandicassis,<br />

Aspitor quadriscutis e Arius rugispinis) in the 10-20m range. Arius phrygiatus is the only<br />

species that has a greater abundance during the rainy season, and the other species are<br />

present both in the dry as well as the rainy season.<br />

Keywords: Catfishes. Amazon River. Distribution. Siluriformes.<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

Segundo Nelson (1994) a ordem dos Siluriformes é representada por mais de 30<br />

famílias, aproximadamente 412 gêneros e mais de 2.400 espécies nominais, sendo a<br />

maioria dulciaquícola. Em algumas espécies da família os acúleos das nadadeiras dorsais<br />

e peitorais representam um tipo de defesa característico da família, pois possuem<br />

um veneno hemolítico e neurotóxico. A intoxicação se dá através da inoculação do<br />

veneno na pele do atacante, provocando dor intensa no local, sendo o ferimento de<br />

difícil cicatrização; esses animais são classificados como peixes ictioacantotóxicos. (AL-<br />

MEIDA; CHAO, 1984; NELSON, 1994; SANTOS, 1952; SOERENSE, 1990).<br />

Os siluriformes ariídeos são peixes conhecidos vulgarmente como bagres marinhos<br />

ou estuarinos, descendentes de espécies de água doce (BARLETTA; CORRÊA, 1992;<br />

PITCHER; HART, 1982; TILNEY; HECHT, 1990; TOMODA, 1973). Habitam áreas costeiras de<br />

regiões tropicais e subtropicais, onde vivem em áreas de pouca profundidade, fundo<br />

arenoso ou lodoso, desovando, geralmente, nas desembocaduras dos rios. Até o seu<br />

completo desenvolvimento, os ovos são incubados nas cavidades orofaríngeas (BAR-<br />

LETTA; CORRÊA, 1992; BURGESS, 1989; CHAVES, 1994; CERVIGÓN et al., 1992; FIGUEIRE-<br />

DO; MENEZES, 1978; HIGUCHI, 1982; HUERTA-CRAIG, 1980; MOYLE; CECH, 1982; NELSON,<br />

1994; RIMMER, 1985; SANTOS, 1952).<br />

Burgess (1989), afirma que a família Ariidae apresenta onze gêneros e 144 espécies<br />

nominais, sendo que 117 pertenceriam ao gênero Arius. Para Cervigón et al.(1992).<br />

No oceano Atlântico e na costa setentrional da América do Sul, a família Ariidae é formada<br />

por quatro gêneros e treze espécies. No estuário amazônico, esta família está<br />

representada por três espécies do gênero Hexanematichthys [H. parkeri (TRAILL, 1832);<br />

H. couma (VALENCIENNES, 1840) e H. proops (VALENCIENNES, 1840)] duas espécies do<br />

gênero Arius (A. RUGISPINIS Valenciennes, 1840 e A. phrygiatus Valenciennes, 1840),<br />

uma espécie do gênero Bagre (B. bagre), uma espécie do gênero Aspistor (A. quadriscutis<br />

(Valenciennes, 1840), uma espécie do gênero Notarius [N. grandicassis (VALENCIEN-<br />

NES, 1840)] e uma espécie do gênero Cathorops [C. spixii (AGASSIZ, 1829)] (JICA, 1998).<br />

Os bagres marinhos apresentam grande importância econômica para os mercados<br />

regionais brasileiros (ARAÚJO, 1984; CONAND et al., 1995; IHERING, 1968; MISHIMA;<br />

TANJI, 1981, 1982; SANTOS, 1952). Exemplo disso é o trabalho de Reis et al. (1994), na<br />

região Sul, entre 1960 e 1992, que capturou, pela pesca artesanal, cerca de 3.359 t/ano.<br />

Conforme Guedes e Vasconcelos (1980), em Pernambuco os bagres são objeto de salga,<br />

para serem levados às localidades mais distantes da região de Itamaracá. Algumas es-<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 123-132, jun. 2010


125<br />

pécies, como por exemplo, H. parkeri, além de terem um alto valor comercial pela sua<br />

carne, apresentam também valor pela sua bexiga natatória – subproduto que serve de<br />

matéria-prima de ictiocola (BARTHEM, 1985a; NOMURA, 1978; SANTOS, 1952; VERÍSSI-<br />

MO, 1970). No estuário amazônico, a família Ariidae representa mais de 80% da biomassa<br />

(JICA, 1998) e sua abundância é devido à dinâmica da mistura entre as águas continentais<br />

e oceânicas (BARTHEM, 1985a).<br />

Quanto à área de coleta, os rios Amazonas e Tocantins deságuam na costa do<br />

estado do Pará, onde formam a Foz Amazônica, na qual se dá a mistura de 20% de toda<br />

descarga dos rios do mundo com o oceano (MILLIMAN, MEAD, 1983). Apesar de o rio<br />

Amazonas ser o terceiro do mundo em volume de descargas de sedimentos, nesta<br />

região não se forma um verdadeiro delta, uma vez que a forte Corrente Equatorial, que<br />

passa pela costa NE da América do Sul, desvia a deposição dos sedimentos para a direção<br />

N-NO (MEA<strong>DE</strong> et al., 1979; SIOLI, 1966).<br />

No primeiro semestre do ano, na Foz Amazônica, ocorre um período chuvoso ou<br />

de inverno o qual é caracterizado pelo aumento da descarga dos rios, que afasta as<br />

águas marinhas da costa; e no segundo semestre ocorre o período de seca ou de verão<br />

que é caracterizado pelo inverso (BARTHEM, SCHWASSMANN, 1994; EGLER, SCHWASS-<br />

MANN, 1962).<br />

No entendimento de Sioli e Klinge (1972), a Foz Amazônica apresenta um delta<br />

interno com cerca de 380km de largura, cobrindo uma área triangular de aproximadamente<br />

85.500 km 2 , não incluindo as terras aluviais de ambos os lados e o estuário propriamente<br />

dito, com a mistura das águas dos rios Tocantins, Amazonas e do oceano<br />

Atlântico.<br />

Para Myers (1960), o estuário amazônico é formado pelas descargas dos rios<br />

Amazonas e Pará que deságuam na costa Nordeste da América do Sul, o qual é compreendido<br />

entre a foz do rio Orinoco, na Venezuela, e a baía de São Marcos, no Maranhão.<br />

O estuário amazônico abrange toda a costa dos estados do Pará e Amapá e forma um<br />

complexo ambiente aquático, de elevada produtividade biológica chegando a 385.000<br />

t/ano, que sustenta uma grande biomassa de peixes explorados comercialmente pelas<br />

frotas artesanais e industriais desses estados (BARTHEM, SCHWASSMANN, 1994; DIAS<br />

NETO, MESQUITA, 1988). Além das espécies de grande importância econômica para a<br />

região, o estuário amazônico e a vegetação circundante são considerados como um<br />

“berçário”, visto que abrigam e alimentam jovens de diversas espécies de peixes e<br />

crustáceos (BARTHEM, 1985b; DAY, JOHN, 1989; LOWE-Mc CONNELL, 1987; OLDINEZ-CO-<br />

LLART, 1987).<br />

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS<br />

Todo material utilizado neste trabalho e a metodologia de campo fez parte do<br />

projeto conjunto Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), Agência de Cooperação Internacional<br />

do Japão (JICA) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais<br />

Renováveis (IBAMA).<br />

O trabalho se desenvolveu no período de agosto a outubro de 1996 (estação de<br />

verão), de março a abril (estação de inverno) e agosto a outubro de 1997 (estação de<br />

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126<br />

verão). Cada período compreendeu três viagens de quinze dias, sendo que entre uma<br />

viagem e outra houve intervalos de cinco dias (tabela 1).<br />

Tabela 1: Cronograma de viagens das coletas realizadas durante o período da pesquisa.<br />

Verão 1996 Inverno 1997 Verão 1997<br />

Dia/Mês Dia/Mês<br />

Dia/Mês<br />

08 a 22/08 07 a 21/03 08 a 22/08<br />

28 a 31/08 27 a 31/03 28 a 31/08<br />

01 a 11/09 01 a 10/04 01 a 11/09<br />

17 a 30/09 16 a 30/04 17 a 30/09<br />

01/10 01/10<br />

A área de coleta abrangeu as latitudes 0º10’ S e 2º30’ N, e longitudes 47º50’ E a<br />

50º30’ W. Toda a área foi dividida em quadrados, que foram considerados como unidades<br />

amostrais. Cada quadrado compreendia três minutos de latitude e longitude, ou<br />

aproximadamente nove milhas náuticas de lado. A área total de estudo apresentava<br />

1.330 quadrados, ou aproximadamente 42.200 km 2 (tabela 2).<br />

Tabela 2: Área de coleta agrupada em categorias de estratos de profundidade (isóbatas)<br />

e quantidade de arrastos realizados durante o período de coleta.<br />

Esses quadrados foram agrupados em três categorias de estratos de profundidade:<br />

de cinco a dez metros, de 10 a 20m e de 20 a 50m. o Estrato mais raso agrupou 539<br />

quadrados ou uma área de aproximadamente 17.200 km 2 . O estrato de profundidade<br />

intermediário, de 10 a 20m, não é contínuo, tendo uma parte pertencente ao canal dos<br />

rios e outra distribuída ao longo da costa, ambas agrupam 504 quadrados e uma área de<br />

15.700 km 2 . O estrato mais profundo, de 20 a 50m, agrupou 287 quadrados e possuía em<br />

torno de 9.300 km 2 (tabela 2).<br />

As unidades amostrais foram sorteadas aleatoriamente por estratos de profundidade,<br />

sendo 55 quadrados para o estrato mais raso, 50 para o de profundidade intermediária<br />

e 15 o de maior profundidade. Em cada quadrado foi realizado apenas um<br />

arrasto e a locação deste foi determinada com auxílio de um GPS e de cartas náuticas,<br />

publicadas pela Marinha brasileira (cartas de n° 40, 200 e 300) (tabela 2).<br />

As espécies do gênero Arius coletadas foram identificadas e quantificadas nas<br />

embarcações. As coletas foram realizadas com duas embarcações da frota piramutabei-<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 123-132, jun. 2010


127<br />

ra do estuário amazônico que arrastaram uma rede de fundo sem porta que coletou os<br />

indivíduos. As embarcações CRUSTAMAR 5 e MARILU apresentavam como características<br />

o número de registro: 7153 e 7392; marca e capacidade do motor principal: CUMMINS<br />

375 HP E CUMMINS 350 HP; tonelagem total do barco: 99,364 e 74,988 tons; comprimento<br />

do barco: 22,00 e 22,45 metros; calado (profundidade): 2,28 e 2,30 metros; largura: 6,20<br />

e 6,15 metros; tripulação: 7 e 7 pessoas; área de viagem: Costa Norte e Costa Norte,<br />

respectivamente.<br />

A velocidade de arrasto foi fixada entre dois a três nós, sempre contra a correnteza,<br />

no intervalo do nascer e pôr-do-sol, durante trinta minutos para cada estação,<br />

contando a partir do momento em que a rede chegava ao fundo.<br />

A distribuição espacial e sazonal das espécies estudadas foi analisada comparando<br />

a abundância absoluta em relação aos fatores estrato (5-10m, 10-20m e 20-50m) e<br />

estação do ano (verão 1996, inverno de 1997 e verão 1997). Utilizou-se o teste não<br />

paramétrico de Kruskal-Wallis que compara a ordem das medianas (STATISTICA for Windows,<br />

1993).<br />

3 RESULTADOS<br />

4.1 COMPOSIÇÃO POR ESPÉCIE E TAMANHO DOS ESPÉCIMES COLETADOS<br />

Coletaram-se 30.819 indivíduos dos gêneros da família Ariidae entre o verão de<br />

1996 e o de 1997. A captura não foi homogênea para os períodos estudados, sendo que<br />

nos dois primeiros (verão de 1996 e inverno de 1997) capturou-se cerca de 50% deste<br />

total. Aspistor quadriscutis foi a espécie mais abundante, representada por cerca de<br />

42% da captura total, seguida de Notarius grandicassis e Arius rugispinis, com 23% cada<br />

uma. As espécies menos abundantes foram Hexanematichthys couma e Hexanematichthys<br />

proops, que representaram 1% cada da captura total (tabela 3).<br />

Tabela 3: Espécies com seus respectivos tamanhos em cm durante o período de coleta<br />

(Me: Médio, Mi: Mínimo e Ma: Máximo).<br />

A. couma<br />

N. grandicassis<br />

H. parkeri<br />

A. phrygiatus<br />

A. proops<br />

A. quadriscutis<br />

A. rugispinis<br />

TOTAL<br />

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128<br />

4.2 DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E SAZONAL<br />

A análise da distribuição espacial e sazonal das espécies no estuário amazônico foi<br />

feita pelo teste não paramétrico de Kruskal-Wallis em que comparou a abundância desses<br />

por arrasto e estações do ano. Este foi empregado devido à distribuição das capturas não<br />

ser normal, mesmo após transformação de seus valores para este fim (log (n+1)<br />

).<br />

O teste da mediana de Kruskal-Wallis não permite analisar dois fatores ao mesmo<br />

tempo. De modo que foi analisada primeiro a distribuição espacial e depois a sazonal<br />

de todas as capturas, não tendo sido possível detectar a interação desses dois fatores.<br />

A análise do fator estrato de profundidade foi significativa para todas as espécies e<br />

para o fator estação do ano somente para Arius prhrygiatus (P


129<br />

Aspistor quadriscutis e Arius rugispinis no estrato médio (10-20m). A análise da distribuição<br />

nas estações do ano mostrou que Arius phrygiatus ocorreu em maior abundância<br />

no inverno de 1997 e as demais espécies não demonstram diferença entre os períodos<br />

de captura.<br />

AGRA<strong>DE</strong>CIMENTOS<br />

Aos amigos Marcelo Torres, Rubens Maia, Katsushi Yoshikawa e Vitor Soares<br />

pela colaboração nas coletas e os pescadores Sr. Zé, Tio Bola, Meton e Francisco pelo<br />

conhecimento adquirido.<br />

Técnicos de laboratório senhores Raimundo Aragão e senhor Alberto Souza que<br />

sempre colocaram suas competências à minha disposição.<br />

Às bibliotecárias Ana Maria Oliveira pela revisão bibliográfica e a Graça Figueiredo<br />

e Fátima Teles pela aquisição do material bibliográfico.<br />

À UFPa, MPEG, IBAMA, JICA pela oportunidade e facilidade na elaboração do<br />

projeto inicial.<br />

À EDUEM (Editora da Universidade Estadual de Maringá) em nome de Marcus<br />

Sazzaka (editor-chefe) pela doação do livro Introdução à alimentação natural de peixes.<br />

À CAPES pela concessão da bolsa de pesquisa.<br />

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133<br />

<strong>DE</strong>TERMINAÇÃO E MO<strong>DE</strong>LAGEM DO VOLUME TOTAL <strong>DE</strong> PINUS<br />

CARIBAEA VAR BAHAMENSIS: UMA ABORDAGEM MULTIVARIADA<br />

Mário Diego Rocha Valente *<br />

João Guimarães Pinheiro **<br />

Waldenei Travassos Queiroz ***<br />

RESUMO<br />

Neste trabalho propôs-se um método para a construção de um modelo de regressão<br />

para determinar o volume de madeira total da espécie florestal Pinus caribaea var.<br />

bahamensis, em função de suas características tais como: (Índice de Área Foliar (IAF),<br />

Distribuição Angular da Folha (DAF), Diâmetro à Altura do Peito (DAP), Índice de Clareira<br />

(GAP), Idade e Altura a Área Basal (IAAB). O modelo foi determinado utilizando-se a<br />

técnica multivariada de Análise de Fatores, através do Método das Componentes Principais<br />

via Rotação Ortogonal do tipo Varimax para extração dos fatores, procurando<br />

eliminar o problema da multicolinearidade. Por fim, desenvolveu-se um modelo de<br />

Regressão Linear Múltipla com base nos Escores Fatoriais. O modelo determinado apresentou-se<br />

de fácil interpretação e utilização, usando-se dois fatores e proporcionando<br />

um bom ajuste (R²=0,91) aos dados e uma boa capacidade preditiva. Ele atendeu a todas<br />

as suposições teóricas para sua existência e utilização.<br />

Palavras-Chave: Modelo de Regressão. Volume Total de Pinus. Análise de Fatores.<br />

<strong>DE</strong>TERMINATION AND MO<strong>DE</strong>LING OF THE TOTAL VOLUME OF PINUS<br />

CARIBAEA VAR BAHAMENSIS: A MULTIVARIATE APPROACH<br />

ABSTRACT<br />

In this paper is proposed a method to build a regression model to determine the total<br />

volume of wood of the forest species Pinus caribaea var. bahamensis according its<br />

features such as: index of leaf area (IAF), angular distribution of the leaf (DAF), Diameter<br />

at breast height (DAP), index of clearing (GAP), age, height and the basal area. The<br />

model was determinated using the factors analysis multivariate technique trough method<br />

of Principal Component by Varimax orthogonal rotation to extraction of the factors<br />

eliminating the multicolinearity problem. Finally, it was developed a multiple linear<br />

* Estatístico, pós-graduando em Bioestatística pela Universidade Federal do Pará e técnico em Gestão de<br />

Infra-Estrutura de Trânsito no <strong>DE</strong>TRAN-PA.mario.valente@detran.pa.gov.br<br />

** Estatístico, pós-graduando em Ciências Florestais pela Universidade Federal Rural da Amazônia.<br />

Jgp111@yahoo.com.br<br />

*** Engenheiro agrônomo, doutor em Estatística e Experimentação Agronômica pela ESALQ-USP, professor titular<br />

da Universidade Federal Rural da Amazônia. Waldenei.queiroz@ufra.edu.br<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 133-146, jun. 2010


134<br />

regression model based on factorial scores. The determinated model presented of easy<br />

interpretation and use, working two factors and providing a good adjust (R²=0,91) to<br />

the data and a good predictive capacity, It answered to all of the theoretical assumptions<br />

to its existence and use.<br />

Keywords: Regression Model. Total Volume of Pinus. Factors Analysis.<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

A flora amazônica ainda é praticamente desconhecida, com uma fantástica diversidade<br />

de plantas. O vastíssimo mar verde amazônico tem um número incalculável<br />

de espécies. Sabe-se que a Amazônia tem um gigantesco potencial madeireiro, despertando<br />

um intenso comércio, nessa área, na região, mas e necessário que tais recursos<br />

sejam mantidos de forma renovável, pois o uso indiscriminado desses vegetais pode<br />

causar, dentre outros males, a desertiûcação da região. Dentre as muitas espécies amazônicas<br />

encontra-se o Pinus caribaea var. Bahamensis.<br />

Em virtude da redução da oferta de madeira de folhosas, notadamente nas regiões<br />

Sul e Sudeste do Brasil, tem se envidado esforços para implantar florestas para<br />

suprir as necessidades de consumo e abastecimento das indústrias florestais. Neste<br />

sentido, as espécies do gênero Pinus têm sido usadas amplamente em programas de<br />

reflorestamento e, dentre esses, os Pinus tropicais têm sido usados para reflorestamentos<br />

no Brasil, notadamente nas regiões mais quentes.<br />

Hoje os plantios de Pinus no Brasil ocupam extensas áreas que compõem aproximadamente<br />

1.800.000 hectares. Na região Sul, estima-se em 1.060.000 ha as áreas<br />

plantadas com Pinus, que muito vêm contribuindo com o desenvolvimento da economia<br />

brasileira, constituindo a base para a produção de celulose e papel, embalagens,<br />

aglomerados, compensados e chapas, entre outras atividades industriais (SBS, 1998).<br />

No estado de São Paulo e nas regiões subtropicais do Brasil, os pinheiros tropicais, tais<br />

como a espécie do tipo Pinus caribaea var. bahamensis, representam alto potencial para<br />

suprimento de madeira e de celulose de fibra longa.<br />

No setor florestal, o conhecimento sobre os recursos existentes se dá por meio<br />

da medição ou estimação de atributos das árvores e das florestas, além de muitas características<br />

das áreas sobre as quais as árvores estão crescendo, por meio de instrumentos<br />

e métodos apropriados (HUSCH et al., 1993)<br />

Existem três fatores que governam a escolha das medidas a ser realizadas nas<br />

árvores: a facilidade e a velocidade que as medidas podem ser realizadas; a exatidão<br />

com que podem ser feitas e a correlação entre as medidas e características às quais se<br />

desejam uma estimativa (SPURR, 1952).<br />

De acordo com Silva e Paula Neto (1979), as medidas podem ser classificadas como<br />

diretas e indiretas. Quando são realizadas medidas diretas, faz-se, na realidade, uma<br />

determinação, enquanto as indiretas se referem à estimação (medição aproximada).<br />

Como medidas diretas, têm-se os diâmetros e as circunferências dos fustes e<br />

dos galhos das árvores, os comprimentos das toras, a espessura da casca e as alturas das<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 133-146, jun. 2010


135<br />

árvores abatidas, entre outras. Como medidas indiretas, citam aquelas que estão fora<br />

do alcance direto do homem, sendo necessária, muitas vezes, a utilização de métodos<br />

óticos. Como exemplos dessas medidas, podem-se citar a altura e o volume das árvores<br />

em pé (SOARES et al, 2007).<br />

O conhecimento do volume total da árvore individual sobre casca é de enorme<br />

importância para o produtor florestal. Isso permite avaliar, com razoável rigor, o rendimento<br />

esperado quando um desbaste, do corte raso numa mata ou apenas de uma<br />

avaliação instantânea de existência. Uma vez que é uma variável de difícil medição<br />

direta, é necessário proceder-se à sua estimação. Para o efeito, procede-se geralmente<br />

à seleção de equações que estimem o volume da árvore em função de variáveis de mais<br />

fácil medição; é o caso do diâmetro à altura do peito e da altura total (GUIMARAES &<br />

LEITE, 1996).<br />

Diferentes condições de clima e de solo influenciam o crescimento e a relação<br />

entre as variáveis da árvore. Desta forma, a criação de modelos baseados em dados de<br />

um povoamento ou de uma região sujeita às condições uniformes de clima e de solo,<br />

permite o fornecimento aos produtores florestais de ferramentas que permitam a estimação<br />

mais exata das variáveis nesse povoamento ou região.<br />

Estudos envolvendo relações entre dados dendrométricos de dosséis florestais<br />

têm se tornado cada vez mais frequentes. Nesses estudos, é comum a aplicação de<br />

testes estatísticos com o objetivo de avaliar o grau de associação entre estes parâmetros<br />

por meio de abordagens que incluem a análise individual da ação de um parâmetro<br />

específico sobre outro (variável independente versus variável dependente) (SOUSA,<br />

1997; BERNAR<strong>DE</strong>S, 1998).<br />

Normalmente, são ajustados modelos entre parâmetros biofísicos, de forma<br />

que seja possível inferir sobre as características de um dossel florestal a partir de dados<br />

dendrométricos. Entretanto, quando da utilização de vários parâmetros simultaneamente,<br />

nem sempre os modelos são obtidos considerando-se todos os aspectos estatísticos<br />

necessários. Quando se dispõe de um grande número de variáveis, é importante<br />

entender como essas variáveis estão se comportando e como estão se relacionando.<br />

Neste contexto, as técnicas estatísticas surgem neste cenário como importantes<br />

fontes de produção de conhecimento, principalmente para estimação do volume comercial,<br />

onde o uso de equações de volume e relações hipsométricas em inventário<br />

florestal vem se constituindo operação rotineira para cálculo de volume de madeira em<br />

pé e estimativa da altura das árvores através da relação DAP e altura. Assim, o objetivo<br />

deste trabalho foi explorar os dados dendrométricos disponíveis e provenientes de<br />

plantios de Pinus carabea var Bahamensis, de modo a ilustrar a aplicabilidade e a importância<br />

do modelo de regressão em conjunto com a análise fatorial e tentar ajustar um<br />

modelo explicativo dos valores de volume de Pinus dessa região, a partir de um conjunto<br />

de variáveis biofísicas.<br />

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136<br />

2 MATERIAL E MÉTODOS<br />

2.1 CARACTERIZAÇÃO E LOCALIZAÇÃO DA ÁREA <strong>DE</strong> ESTUDO<br />

A área de estudo consiste em plantio de Pinus caribaea var bahamensis (PCB), de<br />

uma Fazenda da Duratex Florestal S\A situada na região sudoeste do estado de São Paulo,<br />

cujas idades variam de 9,5 a 13,2 anos, caracterizando talhões maduros. Essa região apresenta<br />

como características básicas, a periodicidade de chuvas, invernos secos com deficiência<br />

hídrica, precipitação anual entre 1100 e 1400 mm, geadas pouco frequentes, temperatura<br />

media entre 16 e 19ºC, clima subtropical moderado e úmido, vegetação do tipo<br />

floresta ombrófila pluvial e campos submontanos, e altitude de aproximadamente 900<br />

metros. A variável dependente foi o volume da madeira (Pinus). As variáveis independentes<br />

consideradas inicialmente e, em princípio, explicativas do volume, foram IAF (Índice<br />

de Área Foliar), DAF (Diâmetro Angular da Folha), DAP (Diâmetro à Altura do Peito),<br />

GAP (medida da clareira), idade, altura e área basal das árvores.<br />

2.2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA<br />

Em modelos de equação para estimar o volume de árvores em pé, utiliza-se<br />

constantemente uma técnica estatística chamada análise de regressão linear múltipla,<br />

na qual existe um frequente interesse com relação à natureza e significância das relações<br />

entre as variáveis independentes (altura, DAP, área basal, idade etc.) e a variável<br />

dependente (volume).<br />

Em muitas aplicações de administração, economia e principalmente nas ciências<br />

agrárias e florestais, frequentemente encontram-se variáveis independentes que<br />

estão correlacionadas entre elas mesmas e, também com outras variáveis que não estão<br />

incluídas no modelo, mas estão relacionadas às variáveis dependentes (NETER;<br />

WASSERMAN, 1974). O fato de muitas funções de regressões diferentes, proporcionar<br />

bons ajustes para um mesmo conjunto de dados é porque os coeficientes de regressão<br />

atendem várias amostras nas quais as variáveis independentes são altamente correlacionadas.<br />

Assim, os coeficientes de regressão estimados variam de uma amostra para<br />

outra quando as variáveis independentes estão altamente correlacionadas. Isso leva à<br />

informação imprecisa a respeito dos coeficientes verdadeiros, sendo esse fenômeno<br />

chamado de multicolinearidade (NETER; WASSERMAN, 1974).<br />

2.2.1 Multicolinearidade<br />

A multicolinearidade consiste em um problema comum em regressões, no qual<br />

as variáveis independentes possuem relações lineares exatas ou aproximadamente<br />

exatas. O índício mais claro da existência da multicolinearidade é quando o R² é bastante<br />

alto, mas nenhum dos coeficientes da regressão é estatisticamente siginificativo<br />

segundo o teste t convencional. As consequências da multicolinearidade em uma regressão<br />

são as de erros-padrão elevados no caso de multicolinearidade moderada ou<br />

severa e até mesmo a impossibilidade de qualquer estimação se a multicolinearidade<br />

for perfeita (GUJARATI, 2000).<br />

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137<br />

Quando as variáveis independentes são correlacionadas, o coeficiente de regressão<br />

de uma variável independente depende de qual outra variável independente é<br />

incluída no modelo, pois adicionada ou subtraída uma das variáveis independentes<br />

mudam-se os coeficientes de regressão. Assim, um coeficiente de regressão deixa de<br />

refletir os efeitos inerentes de uma particular variável independente sobre a variável<br />

dependente, mas reflete apenas um efeito parcial (GUJARATI, 2000).<br />

A existência de multicolinearidade detectada e considerada prejudicial indica<br />

que o pesquisador deve procurar soluções para suavizar seus efeitos ruins. Várias<br />

medidas corretivas têm sido propostas, das simples às mais complexas, para suavizar<br />

os efeitos provocados pela multicolinearidade, sendo as mais usadas e citadas na<br />

literatura a remoção de variáveis, ampliação do tamanho da amostra, ridge regression,<br />

método das componentes principais, análise fatorial, redes neurais etc. (ELIAN,<br />

1988; HAIR et. al, 2005).<br />

2.2.2 Modelo estatístico de regressão linear múltipla<br />

O modelo de regressão linear múltipla descreve uma variável dependente ou<br />

resposta (Y) como função de duas ou mais variáveis independentes ou explicativas. O<br />

modelo estatístico de uma regressão linear múltipla com k variáveis regressoras<br />

X , X ,..., X ) é dado por (GREENE, 1997):<br />

(<br />

2 k<br />

Onde<br />

Y i<br />

: representa as observações da chamada variável dependente, variável explicada ou<br />

variável resposta;<br />

X ik<br />

: são chamadas de variáveis independentes, variáveis explicativas, variáveis regressoras<br />

ou covariáveis (k=1, 2,..., p);<br />

: são os parâmetros da população;<br />

: são os escores aleatórios.<br />

2.3 ANÁLISE FATORIAL (AF)<br />

A análise de fatores ou análise fatorial (AF), de modo geral, é uma técnica estatística<br />

multivariada que tem como princípio analisar a estrutura das relações ou interrelações<br />

(correlações) entre um grande número de variáveis, ou seja, descrever a estrutura<br />

de dependência de um conjunto de variáveis através da criação de fatores, que são<br />

variáveis que, supostamente, medem aspectos comuns (HAIR et al, 2005). Com o emprego<br />

dessa técnica, inicialmente podem-se identificar as dimensões isoladas da estrutura<br />

dos dados e então determinar o grau em que cada variável é explicada por cada<br />

dimensão ou fator.<br />

(1)<br />

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138<br />

Para Barroso e Artes (2003), a AF é uma técnica que descreve a estrutura de<br />

dependência de um conjunto de variáveis, através da criação de fatores, que são variáveis<br />

que, supostamente, medem aspectos comuns. Reis (2001) descreve a AF como um<br />

conjunto de técnicas cuja finalidade é representar ou descrever um número de variáveis<br />

iniciais a partir de um menor número de variáveis hipotéticas. Trata-se de uma<br />

técnica estatística multivariada que, a partir da estrutura de dependência existente<br />

entre as variáveis de interesse (em geral representada pelas correlações ou covariâncias<br />

entre essas variáveis), permite a criação de um conjunto menor de variáveis (variáveis<br />

latentes ou fatores), obtidas a partir das originais.<br />

Segundo Mingoti (2005), a AF tem como objetivo principal descrever a variabilidade<br />

original do vetor aleatório X, em termos de um número menor M de variáveis<br />

aleatórias, chamadas de fatores comuns e que estão relacionadas com o vetor original X<br />

através de um modelo linear. Neste modelo, parte da variabilidade de X, é atribuída aos<br />

fatores comuns, sendo o restante da variabilidade de X atribuído às variáveis que não<br />

foram incluídas no modelo, ou seja, o erro aleatório.<br />

2.3.1 Modelo estatístico da análise fatorial<br />

O modelo estatístico usado na análise fatorial explica uma estrutura de correlação<br />

existente entre as características, diretamente observada por meio de combinação<br />

linear de variáveis, as quais não são diretamente observadas, denominados fatores<br />

comuns, acrescidas de componente residual. Um modelo de análise fatorial pode ser<br />

apresentado na forma matricial conforme (DILLON e GOLDSTEIN, 1984).<br />

Em que:<br />

Y = é o p-dimensional vetor transposto das variáveis observadas (características),<br />

denotados por, ;<br />

= é uma matriz (p, k) tal que cada elemento x ij<br />

expressa a correlação existente<br />

entre o volume y i<br />

e o fator f j<br />

, sendo denominado matriz de cargas fatoriais com o<br />

número k de fatores menor que o número p de variáveis;<br />

(2)<br />

x ij<br />

F = é o q-dimensional vetor transposto de variáveis não-observáveis ou variáveis<br />

latentes chamadas de fatores comuns, denotado por<br />

, sendo<br />

que k


139<br />

2.3.2 Método de estimação dos escores fatoriais<br />

Dillon e Goldstein (1984) comentam que, existem na literatura vários métodos<br />

de previsão dos escores fatoriais, tais como: o método dos mínimos quadrados ponderados,<br />

método de bartlett, método de Anderson Rubin e o método de regressão. Para a<br />

definição dos fatores, estimou-se através do método de componentes principais a matriz<br />

de escores fatoriais após a rotação ortogonal Varimax da estrutura fatorial inicial,<br />

usando especificamente o método de regressão. Para cada fator f<br />

j , o i-ésimo escore<br />

fatorial extraído é definido por F , expresso da seguinte forma:<br />

ij<br />

Em que:<br />

(3)<br />

b i<br />

: são os coeficientes de regressão estimados para os n escores fatoriais comuns;<br />

x ij<br />

: são as n observações das p variáveis observadas<br />

2.3.3 Análise da confiabilidade e viabilidade da análise de fatores<br />

Uma das premissas de uma análise fatorial é que exista uma estrutura de dependência<br />

clara entre as variáveis da matriz de covariância ou de correlação. A existência<br />

de tal estrutura implica que uma variável pode, dentro de certos limites, ser prevista<br />

pelas demais. Para verificar esse fato, podem-se calcular os coeficientes de correlação<br />

parcial entre os pares de variável eliminado o efeito das demais variáveis. Espera-se<br />

que os valores obtidos sejam baixos. Diante deste problema, foram feitos testes para<br />

aferir a adequação do método à amostra de dados. Os dois principais testes aplicados<br />

foram: teste de esfericidade de bartlett e o teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO).<br />

2.3.3.1 Teste de esfericidade de Bartlet<br />

Esse teste avalia a significância geral da matriz de correlação, ou seja, testa se<br />

todas as variáveis oriundas de diversos setores possuem uma possível relação em comum<br />

(DILLON; GOLDSTEIN, 1984; REIS, 2001).<br />

O teste de Bartlett testa as seguintes hipóteses nulas<br />

(4)<br />

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140<br />

Em que |R| é o determinante da matriz de correlação amostral, é a variância<br />

explicada por cada fator, n é o número de observações e p é o número de variáveis. A<br />

estatística tem uma distribuição assintótica de x 2<br />

com (0,5p(p-1)) graus de liberdade.<br />

2.3.3.2 Teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO)<br />

Esse teste é usado para compara as correlações parciais entre os pares de variáveis<br />

sem o efeito das demais, ou seja, testa de duas a duas variáveis e se possuem<br />

algum tipo de relação entre si (Kaiser, 1958; Reis, 2001).<br />

(5)<br />

Em que r ij<br />

é o coeficiente de correlação observado entre as variáveis i e j e a ij<br />

é<br />

o coeficiente de correlação parcial entre as mesmas variáveis que é, simultaneamente,<br />

uma estimativa das correlações entre os fatores, eliminado o efeito das demais variáveis.<br />

Os a ij<br />

deverão assumir valores próximos de zero, uma vez que se pressupõe que os<br />

fatores são ortogonais entre si.<br />

Conforme Kaiser e Rice, (1974), os valores do teste são classificados da seguinte<br />

forma:<br />

Tabela 1: Esquema geral de classificação do teste de KMO.<br />

KMO<br />

Classificação<br />

0,90 - 1,00 Excelente<br />

0,80 – 0,90 Ótimo<br />

0,70 – 0,80 Bom<br />

0,60 – 0,70 Regular<br />

0,50 – 0,60 Ruim<br />

0,00 – 0,50 Inadequado<br />

Valores do teste abaixo de 0,50 não são aceitáveis.<br />

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141<br />

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO<br />

Primeiramente observou-se a ordem de grandeza das variáveis, visando detectar<br />

discrepâncias que pudessem causar problemas na análise. Posteriormente, analisou-se a<br />

viabilidade da análise fatorial a partir da matriz de correlações. O primeiro passo é um<br />

exame visual das correlações, identificando as que são estatisticamente significantes,<br />

com isso, verificou-se que, existe um número substancial de correlações maiores que<br />

0,30 (GORSUCH, 1983), supondo-se possíveis inter-relações entre as variáveis.<br />

Tabela 2: Matriz de correlação referente aos dados dendrométricos da Empresa<br />

Duratex Florestal em 2005.<br />

De acordo com a tabela 2, verificou-se que as correlações das variáveis independentes<br />

(idade, DAP, altura e área basal) com a variável dependente (volume) são moderadas<br />

acima de 0,70, e a variável mais correlacionada com o volume de madeira é a<br />

altura (r = 0,89). Observaram-se ainda uma alta correlação inversa entre as variáveis<br />

independentes IAF e GAP (r= -0,94), esses resultados fazem sentido, pois IAF e GAP são<br />

variáveis radiométricas obtidas por meio de um instrumento (LAI-2000) e são por natureza<br />

inversamente proporcional.<br />

Foi ajustado um modelo de regressão linear múltiplo para o volume de Pinus, seguindo<br />

as noções de Campos et al (1990) e Soares et al (1996), que se utilizou de uma equação de<br />

regressão para estimar o volume das árvores em estudo, de acordo com a tabela 3.<br />

Tabela 3: Ajuste inicial do modelo de regressão linear múltiplo para determinação da equação<br />

de volume de Pinus caribaea var Bahamensis da empresa Duratex Florestal em 2005.<br />

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142<br />

Inicialmente, foi ajustado um modelo de regressão linear múltipla para o volume<br />

de madeira de Pinus. Contudo, observou-se a presença de multicolinearidade nos<br />

dados, ou seja, verificou-se que os coeficientes, tanto de correlação de Pearson (r =<br />

0,91) quanto de determinação (R²=0,82) foram substancialmente altos e apenas a variável<br />

altura foi estatisticamente significativa com p-valor menor que o nível de significância<br />

de 0,05% e utilizando o método de regressão linear múltiplo, também se confirmou<br />

que à medida que se introduzia uma variável por vez no modelo, a natureza das mesmas<br />

também mudava, por exemplo, quando se colocou a variável DAP no modelo esta mudou<br />

o sinal das outras variáveis, indicando assim uma forte multicolinearidade nos<br />

dados. Com isso, foi realizado primeiramente a análise de fatores com as variáveis<br />

originais, para obter fatores não correlacionados das variáveis, e assim contornar o<br />

problema da multicolinearidade.<br />

O próximo passo é avaliar a significância geral da matriz de correlação com o<br />

teste de esfericidade de Bartlett, neste caso, as correlações em geral são significantes<br />

ao nível de 1% (ver tabela 4). Entretanto, isso testa apenas a presença de correlações<br />

não nulas, e não o padrão dessas correlações, assim, para testar se todas as características<br />

oriundas de diversas árvores possuem uma possível relação em comum, utilizou-se<br />

o teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), ou seja, que vai testar as correlações parciais<br />

entre os pares de variáveis sem o efeito das demais, conforme tabela 2, verificou-se<br />

que, neste caso ocupa um intervalo aceitável (acima de 0,50) conforme Kaiser e Rice<br />

(1974), com um valor de 0,75 classificados como bom. Todas essas medidas indicam que<br />

o conjunto de variáveis é adequado à análise de fatores, e a análise pode prosseguir<br />

para os próximos estágios.<br />

Tabela 4: Medidas de avaliação da adequação da análise de fatores para os dados<br />

dendrométricos da Empresa Duratex Florestal em 2005.<br />

Estatísticas Coeficientes P-valor<br />

Teste de esfericidade de Bartlett 268,86 0, 0012<br />

Teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) 0,756 0, 0015<br />

Assim, aplicou-se a análise de fatores aos dados dendrométricos, utilizando-se<br />

o método das componentes principais para extração dos fatores via rotação ortogonal<br />

do tipo Varimax para obter melhores combinações e usando como critério para a escolha<br />

do número de fatores a extrair, o critério da raiz latente (HAIR et al., 2005; MINGOTI,<br />

2005; SANTANA, 2005).<br />

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143<br />

Tabela 5: Resultados dos autovalores para extração de fatores, componentes<br />

de variância total explicada pelos fatores para os dados dendrométricos da empresa<br />

Duratex Florestal em 2005.<br />

A tabela 5 mostra também, os autovalores, as percentagens das variâncias explicadas<br />

e acumuladas, calculadas pelo método não rotacionado e com rotação ortogonal,<br />

contendo as informações sobre os oito fatores possíveis e seu poder explanatório relativo,<br />

utilizou-se os valores para análise (após rotação ortogonal do tipo Varimax) nos<br />

dois primeiros fatores extraídos. Percebeu-se que um modelo com apenas dois fatores<br />

seria suficiente para representar a estrutura de covariância inicial, com 23,39% de perda<br />

de informações e que expliquem 76,61% da variabilidade total dos dados originais.<br />

Sendo que o primeiro fator explica 47,38% e o segundo fator explica 29,23% Com isso,<br />

buscou-se identificar as variáveis que mais influenciam em cada fator, ou seja, as que<br />

possuem maiores cargas fatoriais.<br />

Com os resultados obtidos na tabela 6, pode-se observar que o primeiro fator<br />

possui pesos mais altos nas variáveis: DAP, altura, idade e área basal, sendo identificado<br />

como estrutura volumar. O segundo fator possui cargas fatoriais mais altas nas variáveis:<br />

IAF, GAP e DAF, sendo identificado como localização volumar.<br />

Tabela 6: Matriz de cargas fatoriais (pesos) para os dados dendrométricos<br />

da empresa Duratex Florestal em 2005.<br />

Características Fator 1 Fator 2 Comunalidade<br />

Diâmetro à Altura do Peito (DAP) 0,93 0,02 0,95<br />

Idade 0,81 0,15 0,87<br />

Altura 0,95 0,04 0,90<br />

Área Basal 0,72 -0,47 0,72<br />

Índice de Área Foliar (IAF) 0,1 -0,93 0,87<br />

Distribuição Angular da Folha (DAF) 0,17 0,71 0,79<br />

Clareira (GAP) -0,04 0,97 0,79<br />

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144<br />

De acordo com a tabela 6, verificou-se que, a soma dos quadrados das cargas<br />

fatoriais para cada variável resulta num valor estimado da comunalidade, que é à parte<br />

da variância total explicada pelo primeiro fator, assim, o tamanho da comunalidade é<br />

um índice útil para avaliar o quanto de variância em uma dada variável é explicada pela<br />

solução fatorial, com isso, pode-se observar nesta tabela, que todas as variáveis são<br />

importantes na estrutura de covariância, pois as comunalidades são altas, acima de<br />

0,70, conforme (RENCHER, 2002).<br />

Em seguida, com a obtenção dos escores fatoriais, ou seja, medidas compostas<br />

de cada fator computado para cada indivíduo, substituindo-se as variáveis originais<br />

pelos escores fatoriais e realizou-se a regressão linear múltipla. Considerou-se como<br />

variável resposta o volume de Pinus e como variáveis explicativas os escores fatoriais<br />

referentes aos dois fatores extraídos.<br />

Ao ajustar-se um modelo com os escores fornecidos pelo primeiro fator, verificou-se<br />

que os mesmos foram significativamente importantes devido ao valor de p ser<br />

menor que o nível de significância de 5%, como mostra a tabela 7.<br />

Tabela 7: Ajuste do modelo de regressão linear simples para determinação da equação<br />

de volume de Pinus de dados dendrométricos da empresa Duratex Florestal em 2005.<br />

Variáveis Coeficientes Teste t Valor de p<br />

Constante 59,59 4,31 0,000<br />

Fator 1 242,61 11,85 0,000<br />

Fator 2 -11,39 -0,572 0,003<br />

Após analisar a significância individual de cada fator de acordo com o teste t e<br />

por meio do valor descritivo (valor de p), partiu-se para analisar a significância geral do<br />

modelo de regressão, aplicando-se a análise de variância (ANOVA) aos fatores.<br />

A análise de variância mostra que se rejeita a hipótese de não haver regressão,<br />

isto é, o modelo é significativo a um nível de significância de 5%, e conclui-se que pelo<br />

menos uma variável explanatória está relacionada com o valor de volume de madeira<br />

de Pinus, conforme a tabela 8.<br />

Tabela 8: Análise de variância para a significância da equação de volume de Pinus de<br />

dados dendrométricos da empresa Duratex Florestal em 2005.<br />

F.V G.L S.Q Q.M F Valor de p<br />

Regressão 2 115315,69 57657,850 70,49 0,0001<br />

Resíduo 33 26991,61 817,920<br />

Total 35<br />

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145<br />

Analisando-se as medidas de ajuste, observa-se que os valores do coeficiente<br />

de correlação múltiplo (R múltiplo), o coeficiente de determinação (R 2 ) e o coeficiente<br />

de determinação ajustado (R 2 ajustado), são consideravelmente altos, indicando alta<br />

correlação da variável dependente com as variáveis independentes, e alta explicação<br />

da variável dependente pelas variáveis independentes, indicando que o modelo ajustado<br />

explica bem a variabilidade do valor do volume de madeira de Pinus.<br />

Tabela 9: Medidas referentes ao ajuste da equação de volume de madeira de<br />

Pinus de dados dendrométricos da empresa Duratex Florestal em 2005.<br />

Medidas Estatísticas<br />

Valores<br />

Coeficiente de Correlação Múltiplo (R múltiplo) 0,90<br />

Coeficiente de Explicação (R²) 0,93<br />

Coeficiente de Explicação Ajustado (R² ajustado) 0,91<br />

Em suma, o coeficiente de determinação múltiplo, que representa a proporção<br />

da variação em Y (valor) que é explicada através do conjunto de variáveis explanatórias<br />

selecionadas, apresentou um valor igual a 91% da variação no volume pode ser explicado<br />

através da variação nas variáveis e 9% do volume são explicados por outras variáveis<br />

que não constam no modelo, conforme tabela 9.<br />

Portanto, a equação de regressão linear múltipla para os dados do volume de<br />

Pinus que descreve o relacionamento entre o valor de mercado e os dois fatores independentes<br />

é:<br />

VOLUME Pinus<br />

= 59,5978 + 242,6155*Escore do Fator 1 -10,3907*Escore do Fator 2.<br />

Sendo que o escore do fator 1 seria uma combinação linear entre as variáveis<br />

DAP, idade, altura e área basal e o escore do fator 2 por uma combinação das variáveis<br />

IAF, DAF e GAP obtidas por meio de um método de regressão linear múltipla, sendo<br />

desmembrado da seguinte forma.<br />

VOLUME Pinus<br />

= 59,5978+242,61*[(0,93*DAP)+(0,81*Idade)+(0,95*Altura)+(0,72*Área<br />

Basal)] -10,3907[(-0,93*IAF)+(0,71*DAF)+(0,97*GAP)]<br />

Assim, a equação estimada para o volume de Pinus em função de suas características<br />

pode ser usada para predizer o volume de outras árvores sem o problema da<br />

multicolinearidade.<br />

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146<br />

4 CONCLUSÃO<br />

Este trabalho teve como objetivo a aplicação conjunta das técnicas de análise<br />

multivariada, para determinação do volume de madeira de Pinus da empresa Duratex<br />

Florestal em 2005. A transformação e redução do número de variáveis pode ser obtida<br />

pelo método da análise de fatores, sem perda significativa de informações, e obtendose<br />

variáveis não correlacionadas, por meio de dois fatores. Com os resultados obtidos<br />

da análise fatorial partiu-se para a construção do modelo de regressão linear múltipla<br />

para o volume de Pinus, evitando-se o problema de multicolinearidade. No modelo<br />

ajustado obteve-se regressão com R² maior que 91%, o que garante a consistência da<br />

regressão para estimativa do volume de madeira de plantio de Pinus.<br />

REFERÊNCIAS<br />

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John Wiley & Son, 1984.<br />

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determinação de equação volumétrica para Eucalyptus grandis. Scientia forestalis. n.<br />

50, p. 37-42, dez., 1996.<br />

GORSUCH, R. L. Factor Analysis. New Jersey: Lawrence Erlbaum, 1983.<br />

HAIR JR, J.F., AN<strong>DE</strong>RSON, R.E., TATHAM, R.L., BLACK, W.C. Análise multivariada de dados.<br />

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KAISER, H. F. The Varimax criterion for analaytic rotation in factor anaysis. Psychometrika, 1958.<br />

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MALHOTRA, N. K. Marketing Research: an applied orientation. New Jersey: Prentice<br />

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Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 133-146, jun. 2010


147<br />

FATORES FAMILIARES E ESCOLARES PREPON<strong>DE</strong>RANTES NO<br />

<strong>DE</strong>SEMPENHO ESCOLAR DOS ESTUDANTES DAS<br />

REGIÕES NORTE E SU<strong>DE</strong>STE<br />

Diego Rafael Reis Duarte *<br />

John Anthony da Conceição Pantoja **<br />

Sérgio Castro Gomes ***<br />

RESUMO<br />

Este estudo identificou fatores determinantes da proficiência em matemática,<br />

relacionados à família e à escola, dos alunos da 4ª série do Ensino Fundamental, nas<br />

regiões Norte e Sudeste, com foco sobre a redução das desigualdades regionais. Foram<br />

utilizados um modelo de regressão múltipla e os microdados do SAEB-2005, sendo a<br />

proficiência em matemática a variável dependente e as características pessoais,<br />

familiares, e das escolas dos alunos as variáveis explicativas. Os resultados indicam que<br />

meninos com computador em casa, gostam de matemática, e fazem a lição, obtêm<br />

melhores notas em matemática. E ainda: que a reprovação e a quantidade de pessoas<br />

morando no domicílio pioram os desempenhos. Outros resultados interessantes são<br />

que à medida que a escolaridade do pai e o número de computadores na escola<br />

aumentam eleva-se o desempenho, e a existência de aparelho de vídeo e projeto<br />

pedagógico na escola melhora o desempenho.<br />

Palavras-Chave: Desempenho. Fatores Determinantes. Desigualdades.<br />

FAMILY AND SCHOOL FACTORS PREPO<strong>DE</strong>RANT IN PERFORMANCE<br />

SCHOOL OF THE STU<strong>DE</strong>NTS OF REGIONS NORTH AND SOUTHEAST<br />

ABSTRACT<br />

This study identified determinants of proficiency in mathematics, among the variables<br />

related to family and school, of the students in the 4th grade of elementary school, in the<br />

North and Southeast, with a focus on reducing regional inequalities. We used a multiple<br />

regression model and micro data SAEB-2005, with proficiency in mathematics the<br />

dependent variable and the personal characteristics, family and school students as<br />

* Licenciado em Matemática pela Universidade da Amazônia – <strong>Unama</strong>, diegoduarte.jj@gmail.com<br />

** Licenciado em Matemática pela Universidade da Amazônia – <strong>Unama</strong>, johnanthonydacp@hotmail.com<br />

*** Professor pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Socioeconomia da Universidade da Amazônia –<br />

<strong>Unama</strong>, scgomes@unama.br<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


148<br />

explanatory variables. The results indicate that boys with computer at home, like math,<br />

and make the lesson get better grades in math. And that failure, and the number of<br />

people living in worse performance. Other interesting findings are that as the father’s<br />

schooling and the number of computers in schools amounts to increase the performance<br />

and the existence of video equipment and teaching project at school improves<br />

performance.<br />

Keywords: Performance. Determinants. Inequalities.<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

A educação tem papel fundamental para o desenvolvimento econômico de um<br />

país, pois é um dos canais utilizados para reduzir as desigualdades sociais. No Brasil<br />

percebe-se acentuadas diferenças socioeconômicas e educacionais entre as regiões<br />

Norte e Nordeste e as demais regiões do país.<br />

Nos anos de 1990 observou-se uma ampliação do número de vagas ofertadas<br />

para o Ensino Fundamental e Médio nas quatro esferas administrativas do sistema<br />

educacional brasileiro. Segundo Luz (2006), nos anos de 1990 houve um aumento da<br />

média de escolaridade no Brasil e a ampliação do Ensino Fundamental alcançou 97,0%<br />

das crianças e 7 a 14 anos.<br />

No contexto dos estados da Amazônia Legal 1 , a média dos anos de escolaridade<br />

teve um crescimento de 22,6%, saindo de 4,69 anos, em 1990, para 5,75 anos, em 2004,<br />

registrando um crescimento absoluto de 1,06 ano. Em termos absolutos, o crescimento<br />

dos anos de escolaridade da Região Amazônica ficou 0,54 ano abaixo do registrado no<br />

Brasil (1,60 ano), para o período compreendido entre 1990 (4,8 anos) e 2004 (6,4 anos).<br />

Ao se comparar a média dos anos de estudos da Região Amazônica com a média<br />

observada na Região Sudeste e Brasil, tem-se que na Região Sudeste a média de<br />

escolaridade cresceu 29,5%, quando se compara a média de anos de estudo de 2004<br />

(6,94 anos) com a de 1990 (5,36 anos). Na Região Amazônica a média, em 1990, foi de<br />

4,69 anos, passando para 5,75 anos em 2004, crescendo 22,6%, enquanto no Brasil, o<br />

crescimento alcançou 32,8% no mesmo período. Essa situação sinaliza para o fato do<br />

crescimento nos anos de estudo ter ocorrido de forma desigual entre as várias regiões<br />

do Brasil, o que reforça as diferenças sociais, econômicas e educacionais resultando na<br />

redução do nível de oportunidades de inserção no mercado de trabalho dos jovens<br />

residentes nas regiões menos desenvolvidas do país como as Regiões Norte e Nordeste<br />

(GOMES, 2007).<br />

A partir de 1996, com a criação do Fundo de Manutenção do Desenvolvimento<br />

do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUN<strong>DE</strong>F) e a nova Lei de<br />

Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (LDB), tem-se a expansão do Ensino<br />

Fundamental, a interiorização do ensino superior, a ampliação das vagas nos cursos<br />

1<br />

Estados da Região Norte mais parte do território dos estados do Maranhão e Mato Grosso.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


149<br />

supletivos, além do surgimento de programas de alfabetização de adultos, o que<br />

contribui para a elevação dos anos de estudo na região (LOUREIRO, 2004).<br />

A taxa de escolarização de crianças entre 7 e 14 anos no Ensino Fundamental, na<br />

Região Amazônica, passou de 88%, em 1994, para 96%, em 2000, o que significa um<br />

elevado crescimento em um curto período de tempo, quase alcançando a meta de<br />

universalização do Ensino Fundamental (INEP, 2000).<br />

Um dos questionamentos feitos com base na ampliação do número de anos de<br />

estudos, e do número de vagas destinadas aos estudantes é sobre a qualidade desse<br />

ensino. Assim como, se a formação das habilidades e competências dos alunos atende<br />

às exigências do mercado de trabalho em que o aluno irá procurar emprego. Os<br />

resultados dos diversos testes aplicados pelo INEP indicam uma queda da pontuação<br />

nas provas de Língua Portuguesa e Matemática , isto é, apresentam evidências para o<br />

baixo nível da formação básica.<br />

Os resultados do Sistema de Avaliação do Ensino Básico (SAEB, 2005) que avalia<br />

o desempenho dos estudantes da 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e da 3ª série do<br />

Ensino Médio com base nos resultados dos testes de Matemática e língua portuguesa<br />

para a Região Norte mostram que, no período de 1995 a 2003, ocorreu uma queda na<br />

pontuação auferida pelos alunos das três séries investigadas, em ambas as disciplinas.<br />

Os resultados para a Região, em 2005, mostram que houve uma inversão na<br />

trajetória da média para a 4ª série do Ensino Fundamental nas provas de língua portuguesa<br />

e Matemática que ficaram acima da obtida nos anos anteriores. Para a 8ª e a 3ª do Ensino<br />

Médio a obtenção de valores inferiores aos dos anos anteriores continua, mostrando<br />

que o desempenho dessas séries permanece em uma trajetória declinante comparada<br />

à do Brasil e da Região Sudeste, só igualando-se, ou ficando melhor ao atingido por<br />

alguns estados da Região Nordeste (INEP, 2007).<br />

Essa queda também foi percebida em outras regiões do Brasil, porém, se comparada<br />

à Região Sudeste, a pontuação obtida pelos alunos da Região Norte, em 2005, fica abaixo<br />

desta em pelo menos 22 pontos, em termos absolutos (INEP, 2007; GOMES, 2007).<br />

As estatísticas obtidas para os anos de estudos e a nota de proficiência na<br />

disciplina Matemática para o Brasil e as várias regiões mostram haver evidências<br />

significativas da disparidade existente em relação ao desempenho escolar dos alunos<br />

na 4ª e 8ª série do Ensino Fundamental e 3ª série do Ensino Médio. Diante dessa<br />

constatação, o questionamento que se faz é com relação ao efeito dos fatores<br />

relacionados à família, à escola e ao professor que estão correlacionados com o sucesso<br />

escolar do aluno e que contribuem para reduzir as desigualdades de oportunidades<br />

entre os estudantes das duas regiões.<br />

As políticas públicas voltadas para a melhoria do desempenho dos alunos do<br />

ensino básico perpassam por várias ações focadas sobre a escola, docentes, diretores e<br />

indiretamente sobre as famílias que participam dos programas de renda mínima<br />

estabelecidos pelo governo federal, como o programa bolsa escola.<br />

O objetivo geral do presente artigo é o identificar os fatores determinantes da<br />

proficiência em Matemática na 4ª série do Ensino Fundamental referente aos aspectos<br />

relacionados à família, aos atributos escolares, e à formação dos professores nas Regiões<br />

Norte e Sudeste.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


150<br />

Em termos específicos pretende-se comparar o desempenho dos alunos das<br />

Regiões Norte e Sudeste, a partir da proficiência média em Matemática na 4ª série do<br />

Ensino Fundamental dos estudantes das duas regiões; avaliar se há diferenças<br />

significativas entre as regiões com relação aos resultados das proficiências médias em<br />

Matemática; calcular os níveis de proficiência média obtido pelos estados que compõem<br />

as regiões observadas, tomando-se como base de comparação o estado de São Paulo<br />

para a Região Sudeste e o estado do Pará para a Região Norte<br />

Por fim, os resultados do estudo contribuirão para o maior entendimento sobre<br />

as disparidades da qualidade da educação entre as regiões Norte e Sudeste e<br />

consequentemente diminuir as desigualdades socioeconômicas do país.<br />

O estudo está dividido em 5 seções, incluindo-se esta introdução. Na segunda<br />

seção, é feita uma pequena revisão da literatura sobre determinantes do desempenho<br />

escolar. Na terceira seção, será abordada a metodologia e a base de dados utilizada. Na<br />

quarta seção, serão apresentados os resultados mais importantes do estudo como as<br />

análises descritivas e de regressão da amostra. E na última seção, são dadas as<br />

considerações e conclusões finais do estudo.<br />

2 REVISÃO DA LITERATURA<br />

Os estudos sobre determinantes do desempenho escolar vêm se tornando cada<br />

vez mais comuns no cenário educacional brasileiro. Este fato decorre, em grande medida,<br />

da disponibilidade de levantamentos e avaliações estatísticas sobre escolas, alunos,<br />

professores, e diretores em todo o país, alguns dos quais podemos citar: Censo Escola;<br />

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica - SAEB; Exame Nacional do Ensino<br />

Médio – ENEM, entre outros.<br />

Segundo Soares (2002), a maioria dos estudos abordando os fatores associados<br />

ao sucesso escolar, no Brasil, pode ser dividido em duas categorias, de acordo com o<br />

foco adotado sobre os determinantes do desempenho.<br />

Uma destas categorias refere-se aos estudos denominados de qualitativos do<br />

desempenho. Estes focam a análise nas funções de qualidade da educação. Sendo a<br />

qualidade nesses estudos entendida como uma habilidade cognitiva de um aluno aferido<br />

através de testes padronizados de avaliação do conhecimento, como é o caso da avaliação<br />

realizada pelo SAEB que avalia o nível de conhecimento dos estudantes através da<br />

proficiência alcançada nos seus exames.<br />

Um exemplo de estudo qualitativo é o trabalho desenvolvido por Felício e Biondi<br />

(2007), que analisa os atributos escolares que possam ser alvos de políticas educacionais<br />

voltadas ao aumento da proficiência escolar. Sua maior contribuição ao tema é utilizar<br />

dados e metodologia ainda não utilizados para tal propósito.<br />

No estudo foi utilizado como amostra um painel de dados do SAEB, que<br />

possui informação de escolas que se repetem nos anos de 1999 a 2003, e também<br />

por dados do Censo Escola, que complementa as informações das escolas, ambos<br />

do INEP/MEC. Foram aplicados como metodologia de regressão e estimação, os<br />

métodos de Mínimos Quadrados Ordinários e de Efeitos Fixos. Este último tem a<br />

característica de controlar os efeitos sobre o desempenho das variáveis não<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


151<br />

observáveis que têm alguma relação com o desempenho, ou seja, controla-se o<br />

efeito daquelas variáveis não incluídas na regressão.<br />

Entre os efeitos mais robustos e significativos encontrados, tem-se que a<br />

ausência de rotatividade dos professores ao longo do ano letivo, a experiência média<br />

dos professores superior a dois anos em sala de aula e a existência na escola de conexão<br />

com a Internet afeta positivamente a proficiência média da escola. Outros resultados<br />

interessantes foram que a forma de escolha do diretor tem efeito positivo sobre o<br />

desempenho médio da escola. A existência na escola de laboratório de informática está<br />

negativamente relacionada com o desempenho, porém há evidências de que o uso de<br />

computadores para fins pedagógicos tem efeitos positivos sobre a proficiência.<br />

Em geral, nos estudos sobre determinantes do sucesso educacional, os autores<br />

dividem as variáveis explicativas do desempenho escolar em dois tipos: variáveis<br />

relativas ao aluno e suas características familiares; e as variáveis relativas à escola como<br />

professores, a infraestrutura escolar, entre outras.<br />

Segundo o Relatório Coleman (1966, apud LUZ, 2006), as características familiares<br />

e individuais do aluno são mais importantes que os fatores escolares na determinação<br />

do desempenho escolar. O relatório foi um estudo feito nos Estados Unidos em 1966,<br />

visando avaliar equidade e a qualidade educacional daquele país. Sua publicação foi<br />

precursora da enorme quantidade de estudos empíricos sobre a qualidade da educação,<br />

estimulando as discussões sobre a importância relativa dos fatores escolares para a<br />

proficiência educacional (G. NETO et al, 1994).<br />

Para César e Soares (2001), fatores escolares explicam uma porcentagem menor<br />

na formação das habilidades dos alunos, porém eles são preponderantes para provocar<br />

uma mudança na trajetória acadêmica do aluno.<br />

Segundo Barbosa e Fernandes (2001), o desempenho escolar do aluno não<br />

depende exclusivamente das suas características individuais. A escola tem a sua parcela<br />

de responsabilidade. A pesquisa avalia os fatores que marcam a diferença entre escolas<br />

e contribuem para a sua eficácia, controlando por nível socioeconômico. A pesquisa<br />

conclui que a motivação dos alunos, relação casa-escola, condições físicas da escola, e<br />

atributos associados aos professores são fatores importantes na explicação da<br />

proficiência em Matemática para os alunos da 4ª série no Brasil.<br />

A literatura sobre avaliação e desempenho escolar não é conclusiva sobre a<br />

responsabilidade da escola na proficiência dos alunos. A escola tem um impacto<br />

significante nos resultados escolares dos alunos (NUTTAL et al, 1989; MORTIMORE et al<br />

, 1988; MORTIMORE, 1993 apud LUZ, 2006).<br />

Outros autores levam em conta não só o efeito escola, mas também o efeito<br />

turma e sugerem que grande parte da dispersão dos resultados escolares até então<br />

atribuídos à escola (o efeito escola) são de fato atribuídos à turma, e que os professores<br />

é que fazem a diferença na aprendizagem (HILL E ROWE, 1994 apud LUZ, 2006).<br />

O presente artigo visa contribuir com o conjunto de pesquisas baseadas em modelos<br />

de regressão linear múltipla onde a variável dependente é o desempenho do aluno medido<br />

por sua nota de proficiência, e que tem como variáveis independentes ou explicativas fatores<br />

relacionados ao ambiente familiar, escolar e na formação e conduta dos professores, além<br />

de capturar o efeito da variável estado em cada uma das regiões em comparação.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


152<br />

3 METODOLOGIA<br />

As análises sobre o desempenho dos alunos em Matemática da 4ª série do Ensino<br />

Fundamental abrangerão os resultados obtidos pelo Sistema Nacional de Avaliação da<br />

Educação Básica (SAEB) para as Regiões Sudeste e Norte, no ano de 2005.<br />

O SAEB, é um sistema de avaliação concebido com o propósito de aferir o<br />

desempenho dos alunos da 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e da 3ª série do Ensino<br />

Médio nas disciplinas de Português e Matemática, de forma sistemática, o que possibilita<br />

verificar a eficácia, a eficiência e a efetividade das políticas públicas voltadas à educação.<br />

O resultado do SAEB além de monitorar a proficiência dos alunos contribui para<br />

dotar os órgãos educacionais, nas três esferas de governo, de informações necessárias<br />

ao planejamento e elaboração de políticas educacionais direcionadas à melhoria da<br />

qualidade e da equidade da oferta de serviços educacionais que consigam elevar o nível<br />

de formação dos indivíduos.<br />

A partir das informações do SAEB, o Ministério da Educação – MEC e as<br />

secretarias estaduais e municipais podem definir ações voltadas para a correção das<br />

distorções e debilidades identificadas e dirigir seu apoio técnico e financeiro para o<br />

desenvolvimento e a redução das desigualdades ainda existentes no sistema<br />

educacional brasileiro (INEP, 2007).<br />

Para efeito de comparação de sistemas de ensino foram escolhidas duas regiões<br />

geográficas, quais sejam: a Região Sudeste, que obteve índices elevados de desempenho<br />

médio na avaliação realizada pelo SAEB, em 2005, e a Região Norte.<br />

As variáveis selecionadas nos microdados do SAEB-2005 foram escolhidas com<br />

base na literatura qualitativa sobre determinantes do desempenho escolar, com vistas<br />

a proporcionar uma melhor discussão sobre o tema. Foram utilizadas variáveis relativas<br />

ao aluno, suas características pessoais, de motivação pelo estudo, e de suas famílias, e<br />

das variáveis relativas à escola que o aluno frequenta como a formação do professor, os<br />

equipamentos escolares, e a localização da escola (quadro 1).<br />

As características pessoais do aluno estão sendo observadas pelas variáveis<br />

sexo de aluno, sua cor ou raça, se possui computador em casa, se mora com a mãe e<br />

com o pai, quantas pessoas moram na casa do aluno, e ainda características de<br />

motivação como gosto pela Matemática, se o aluno faz a lição de casa, se ao aluno<br />

alguma vez já sofreu reprovação, e sua defasagem escolar ou distorção série-idade.<br />

As características da família do aluno foram representadas apenas pelas variáveis que<br />

analisam a escolaridade do pai.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


153<br />

Indica como o aluno se declara (branco,<br />

negro, pardo, mulato, indígena)<br />

médio<br />

série<br />

Indica a existência de antena parabólica<br />

na escola<br />

vídeo<br />

Quadro 1: Relação das variáveis selecionadas nos microdados do SAEB, descrição e<br />

referência<br />

Fonte: Elaborado pelos autores.<br />

(1) Alguns estudos analisam os equipamentos escolares como variável proxy da infraestrutura da escola.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


154<br />

Com relação às características escolares escolhemos as variáveis que analisam a<br />

formação professor, e a preocupação com seu aperfeiçoamento didático-pedagógico<br />

medido pela variável formação continuada. Foram ainda analisadas as variáveis relativas<br />

à infraestrutura da escola e seus equipamentos disponíveis como, a existência de projeto<br />

pedagógico na escola, o número de computadores, a existência de biblioteca, e dos<br />

seguintes aparelhos: televisão, aparelho de som, aparelho de vídeo, e antena parabólica.<br />

A etapa inicial de avaliação foi desenvolvida a partir dos resultados encontrados<br />

para as estatísticas descritivas de cada uma das variáveis utilizadas na pesquisa,<br />

envolvendo as seguintes medidas: menor valor, maior valor, média, quartil1, quartil3 e<br />

desvio padrão. Tabelas de distribuição de frequências da proficiência serão geradas<br />

como forma de comparar a distribuição das notas em cada região.<br />

Como forma de verificar se há diferenças significativas entre as médias obtidas<br />

para cada uma das regiões, aplica-se o teste estatístico t para testar a hipótese nula de<br />

que as médias são iguais,<br />

Para avaliar o efeito de cada um dos fatores ligados às diferentes dimensões do<br />

estudo, sobre o desempenho dos alunos, foi especificado o modelo de regressão linear<br />

múltipla abaixo:<br />

valores<br />

de X se referem às variáveis explicativas listadas no Quadro 1 e os parâmetros betas são<br />

os parâmetros a serem estimados.<br />

A equação de regressão acima será estimada utilizando-se o Método de Mínimos<br />

Quadrados ponderados, em decorrência da disponibilidade do peso de cada aluno na<br />

amostra disponível na base de dados do SAEB/2005.<br />

Para verificar se os coeficientes da regressão da proficiência, com base nos dados<br />

das subamostras referentes às regiões Sudeste e Norte, são estatisticamente diferentes<br />

aplicou-se o teste de Chow aos dados.<br />

4 RESULTADOS<br />

O resultado encontrado para o teste t de diferença das médias da proficiência<br />

de Matemática na 4ª série do Ensino Fundamental para as Regiões Norte e Sudeste<br />

mostra que há evidência estatística em nível de significância de 1,0% de probabilidade<br />

para rejeitar a hipótese de que as médias são iguais.<br />

Tais diferenças expressam as desigualdades existentes entre os sistemas de<br />

ensino nessas regiões cuja origem pode estar relacionada a fatores ligados ao<br />

desempenho escolar, como as variáveis listadas no quadro 1.<br />

Os resultados do SAEB para o ano de 2005 mostraram que a Região Sudeste<br />

apresentou proficiência média em Matemática superior à obtida pela Região Norte,<br />

207,71 e 175,88 pontos, respectivamente, para a 4ª série do Ensino Fundamental. Sendo<br />

a diferença absoluta da nota média entre as Regiões de 32,83 pontos (tabela 1).<br />

Dentre os estados da Região Sudeste, em 2005, Minas Gerais obteve a melhor<br />

nota, 218,24 pontos de proficiência média, maior que o observado para a própria Região<br />

Sudeste e inclusive para o estado São Paulo, que obteve média de 199,60 pontos, sendo<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


155<br />

esta a menor proficiência média da Região Sudeste. Os estados do Espírito Santo, e do Rio<br />

de Janeiro tiveram desempenhos médios, respectivamente, de 200,22 e 205,62 pontos.<br />

Tabela 1: Distribuição da proficiência em Matemática dos alunos da 4ª série do<br />

Ensino Fundamental para os estados das Regiões Norte e Sudeste, em 2005.<br />

Fonte: Inep<br />

Elaboração e cálculos: autores do trabalho<br />

Analisando-se os dados para a Região Norte, em 2005, Rondônia obteve a melhor<br />

nota, apresentando uma proficiência média de 181,39. Porém, a nota de Rondônia ficou<br />

abaixo da apresentada pelo estado de São Paulo. O estado do Amapá obteve o pior<br />

desempenho da Região Norte, pois apresentou uma média de 162,60 pontos de<br />

proficiência. O estado do Pará obteve proficiência média em Matemática de 178,19.<br />

A amplitude interquartílica para Região Norte foi de 56,45 pontos, abaixo da<br />

observada para a Região Sudeste de 76,57. Esse resultado mostra a dispersão das notas<br />

centrais. A amplitude total das notas para as Regiões Norte e Sudeste foi de 288,39 e<br />

303,84 pontos, respectivamente. Esses resultados mostram haver maior dispersão das<br />

notas na Região Sudeste, ou seja, menos equidade no resultado do teste, no entanto, a<br />

Região Norte apresenta menor dispersão para resultados abaixo dos encontrados para<br />

a Região Sudeste.<br />

As informações retiradas dos microdados do SAEB, em 2005, apontam que nas<br />

Regiões Norte e Sudeste a porcentagem de estudantes do sexo masculino e feminino é<br />

de aproximadamente 50% em ambas as Regiões (48,42% e 51,57%, respectivamente,<br />

nas Regiões Norte e Sudeste), já a porcentagem de estudantes que se declararam da cor<br />

ou raça branca é muito maior entre os estudantes da Região Sudeste, 42,84%, comparada<br />

à Região Norte, que apresenta um percentual de 29,25% de brancos (tabela 3).<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


156<br />

Tabela 3: Média e desvio padrão das variáveis relativas ao aluno e sua família dos<br />

estudantes da 4ª série do Ensino Fundamental avaliados em Matemática pelo<br />

SAEB para as Regiões Norte e Sudeste, em 2005.<br />

D. padrão<br />

Fonte: Inep.<br />

Elaboração e cálculos: autores do trabalho.<br />

A quantidade de alunos da 4ª série do Ensino Fundamental que possui<br />

computador em casa, e mora com mãe e pai ainda é maior na Região Sudeste, sendo<br />

41,07% a quantidade de alunos que possui computador em casa, e 68,91% dos alunos<br />

que moram com pai e mãe, na Região Norte estes percentuais caem, respectivamente,<br />

para 21,43% e 62,09%, vale ressaltar que a quantidade de estudantes da Região Sudeste<br />

que tem computador em casa é quase o dobro da Região Norte, demonstrando assim<br />

desigualdades socioeconômicas entre as regiões.<br />

O número de moradores no domicílio em que o aluno da 4ª série do Ensino<br />

Fundamental reside é em média de 4,6 pessoas para a Região Sudeste e de 5,05 pessoas<br />

para a Região Norte. Ou seja, o número de moradores por domicílio, em ambas as<br />

Regiões, é de 5 pessoas, aproximadamente.<br />

Há uma maior parcela de estudantes da Região Norte com o pai com Ensino<br />

Fundamental incompleto (24,06%); na Região Sudeste este percentual cai para 19, 53%.<br />

A maior parcela de estudantes na Região Sudeste tem o pai com ensino superior completo<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


157<br />

(21,62%), na Região Norte este percentual cai para 15,74%. O percentual de alunos com<br />

pai com Ensino Médio incompleto foi de 7,99% para a Região Norte e de 8,83% para a<br />

Região Sudeste. A proporção de alunos que tem o pai com ensino superior incompleto<br />

para a Região Norte e Sudeste foi, respectivamente, de 9,86% e 10,71%. Tal fato<br />

demonstra uma maior escolaridade dos pais na Região Sudeste.<br />

Há ainda uma grande proporção de alunos que declaram não saber a escolaridade<br />

dos pais em ambas as Regiões, 39,22% para a Região Norte, e 35,12% na Região Sudeste.<br />

Os estudantes da Região Sudeste estavam, em 2005, em média, com 0,56 anos<br />

acima da idade adequada para a 4ª série do Ensino Fundamental, que segundo o sistema<br />

de ensino escolar do país seria de 10 anos; na Região Norte essa média cai para 0,44 ano.<br />

Assim é evidente que a defasagem escolar é maior na Região Sudeste.<br />

O percentual de estudantes que declararam já ter sofrido pelo menos uma reprovação<br />

durante seu percurso escolar é bastante elevado na Região Norte comparado ao da Região<br />

Sudeste atingiu 31,94% e 19,15% dos estudantes, respectivamente, nas duas Regiões.<br />

Nas Regiões Norte e Sudeste a maior parcela dos estudantes da 4ª série do<br />

Ensino Fundamental declara gostar de estudar Matemática e faz a lição de casa<br />

regularmente, sendo estes percentuais na Região Norte de 87,96% e 95,24%, e na Região<br />

Sudeste de 91,67% e 96,38%.<br />

Tabela 4: Média e desvio Padrão das variáveis relativas à escola dos estudantes da 4ª<br />

série do Ensino Fundamental avaliados em Matemática pelo SAEB para as<br />

Regiões Norte e Sudeste, em 2005.<br />

= 1 professor com ensino<br />

= 1 professor com ensino<br />

superior<br />

= 1 professor participou<br />

de curso de aperfeiçoamento<br />

D. padrão<br />

Fonte: Inep.<br />

Elaboração e cálculos: autores do trabalho.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


158<br />

Os professores da Região Sudeste possuem melhor formação escolar, sendo<br />

que 79,23% deles possuem formação superior; na Região Norte este percentual cai para<br />

66,31%, sendo esta diferença de aproximadamente 12 pontos percentuais. O percentual<br />

de professores com Ensino Médio é muito maior na Região Norte (33,69%) comparado<br />

ao da região Sudeste (20,77%). Com relação a preocupação dos professores e dos gestores<br />

da educação quanto à qualificação didático-pedagógica no ensino da Matemática, 83,70%<br />

dos professores da Região Norte já fizeram algum tipo curso de aperfeiçoamento ou de<br />

formação continuada, na Região Sudeste este percentual eleva-se em 3,73%. Tais<br />

diferenças indicam uma melhor qualidade dos sistemas de ensino da Região Sudeste, e<br />

a deficiência dos sistemas de ensino da Região Norte, fato que pode estar levando à<br />

queda de desempenho entre as regiões (tabela 4).<br />

As escolas da Região Sudeste apresentam-se mais equipadas e estruturadas<br />

quando comparadas às escolas da Região Norte. A média de computadores por escola<br />

na Região Sudeste fica em torno de 9,87 computadores por escola, e ainda a proporção<br />

de escolas com biblioteca para utilização dos alunos alcança 86,35% delas. Na Região<br />

Norte esses valores diminuem consideravelmente, a média de computadores por escola<br />

diminui para 6,93, e a proporção de escolas com biblioteca diminui para 75,85%. Nas<br />

escolas da Região Sudeste 89,78% delas utiliza projeto pedagógico escolar, já na Região<br />

Norte 81,02% valem-se do projeto pedagógico, demonstrando considerável diferença<br />

de preocupação sobre a qualidade do ensino ministrado nessas duas regiões.<br />

O resultado do teste de Chow para avaliar se há diferença entre os coeficientes<br />

estimados pelas regressões para cada uma das regiões leva a conclusão de rejeição da<br />

hipótese nula de que os parâmetros das equações são iguais em ambas as regiões, com<br />

significância estatística de 1,0%. Assim, serão gera duas regressões, uma para cada região<br />

de análise.<br />

A tabela 5 apresenta a estimação dos coeficientes das variáveis explicativas da<br />

proficiência em Matemática dos alunos da 4ª série do Ensino Fundamental para as<br />

Regiões Norte e Sudeste. O coeficiente de determinação ou explicação do modelo (R 2<br />

Ajustado) é de 0,167 e 0,218 para as Regiões Norte e Sudeste, respectivamente.<br />

A variável sexo indica que estudantes do gênero masculino apresentam melhor<br />

proficiência em Matemática na 4ª série do Ensino Fundamental, cerca de 4 pontos acima<br />

dos estudantes do sexo feminino em ambas as regiões analisadas (tabela 5). Os estudos<br />

realizados por Luz (2006), Macedo (2004), Albernaz et al (2002) apresentam resultados<br />

semelhantes.<br />

A variável cor ou raça dentro da Região Norte não foi significativa para explicar a<br />

proficiência em Matemática, porém na Região Sudeste ela ganhou muito em significância<br />

(1%), indicando que os estudantes dessa região que se declararam da cor ou raça branca<br />

obtêm melhores desempenhos em Matemática, acima de 8 pontos de proficiência,<br />

comparados àqueles de outras raças (negros, pardos, mulatos, e indígenas). Isto pode<br />

significar na Região Norte que a variável raça não é tão importante na proficiência em<br />

Matemática dos alunos da 4ª série do Ensino Fundamental, como observado na Região<br />

Sudeste, talvez devido ao fato da dispersão das raças ser muito maior na Região Norte.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


159<br />

Tabela 5: Coeficientes estimados para as equações de proficiência em Matemática dos<br />

alunos da 4ª série do Ensino Fundamental para as Regiões Norte e Sudeste, em 2005.<br />

Fonte: Inep.<br />

Elaboração e cálculos: autores do trabalho.<br />

(*) significante ao nível de 1%.<br />

(**) significante ao nível de 5%.<br />

(***) significante ao nível de 10%.<br />

A existência de computador na casa do estudante está positivamente relacionada<br />

à proficiência em Matemática nas Regiões Norte e Sudeste, com grande significância<br />

estatística (1%), indicando outra variável de destaque que possui relação com a<br />

proficiência, sendo que o desempenho desses estudantes é consideravelmente<br />

elevado, de mais de 11 pontos acima daqueles estudantes não detentores de computador<br />

em casa, em ambas as regiões.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


160<br />

Na Região Norte, a possibilidade de o aluno morar com o pai e com a mãe não se<br />

mostrou significativa para explicar o desempenho dos estudantes, por outro lado, na<br />

Região Sudeste a mesma variável apresentou coeficiente positivo a 5% de significância,<br />

sendo que estes estudantes têm cerca 2,9 pontos de proficiência acima daqueles que<br />

moram apenas com o pai ou com mãe, ou ainda com outra pessoa responsável por esse<br />

estudante.<br />

Bíondi e Felício (2007) constatam que de acordo com Método de Mínimos<br />

Quadrados Ordinários (MQO), metodologia bastante utilizada nos estudos sobre o<br />

sucesso educacional, quanto maior a proporção de alunos brancos nas escolas melhor é<br />

a proficiência média em Matemática relativamente às escolas com menor proporção de<br />

alunos não brancos. Ainda de acordo com MQO quanto maior a proporção de alunos nas<br />

escolas com computador em casa, e que morem com a mãe e pai, melhor é o<br />

desempenho médio. Entretanto, neste estudo, essas mesmas variáveis não se<br />

mostraram significativas quando se aplica o método de efeitos fixos.<br />

A variável que mede o número de moradores no domicílio do aluno também se<br />

apresentou significante para explicar o desempenho em Matemática dos estudantes da<br />

4ª série do Ensino Fundamental nas Regiões Norte e Sudeste, porém está negativamente<br />

afetando a proficiência (-2,82 para a região Norte, e -5,96 para a Sudeste), ou seja,<br />

quanto maior o número de moradores residindo na casa dos alunos menor será sua<br />

proficiência em Matemática.<br />

A escolaridade do pai está positivamente e significativamente relacionada à<br />

proficiência em Matemática, em ambas regiões, a única exceção é a escolaridade do pai<br />

com Ensino Fundamental incompleto para a Região Norte, que não se mostrou<br />

significante. A proficiência dos estudantes aumenta à medida em que a escolaridade<br />

dos pais eleva-se, sendo que os estudantes com pai com Ensino Fundamental incompleto<br />

ficam 7 pontos acima daqueles com escolaridade mais baixa, tanto na Região Norte<br />

como na Região Sudeste; o mesmo ocorre entre os estudantes que possuem pai com<br />

ensino superior completo, onde essa proficiência eleva-se cerca de 20 pontos mais. Isto<br />

demonstra o alto poder de interferência da escolaridade do pai sobre a proficiência em<br />

Matemática dos alunos da 4ª série do Ensino Fundamental.<br />

A literatura que aborda a escolaridade do pai como determinante do<br />

desempenho não é conclusiva sobre o sentido e a significância desse desempenho,<br />

pois alguns estudos obtêm resultados totalmente diferentes (KASSOUF e BEZERRA,<br />

2006; MACEDO, 2004).<br />

Com relação às características de motivação dos alunos pelo estudo, todas as<br />

variáveis incluídas na regressão se mostraram significativas a 1% em ambas as regiões.<br />

Nas duas regiões a variável que apresenta maior poder de influência sobre a proficiência<br />

foi a reprovação que apresentou coeficiente negativo (-13,66 para a Região Norte, e -<br />

23,13 para a Sudeste), ou seja, um aluno que já sofreu reprovação no seu trajeto escolar<br />

obtém pior desempenho relativamente aos alunos que nunca sofreram reprovação.<br />

Segundo Macedo (2006) o fato de o aluno ter repetido o ano se reflete na perda de<br />

proficiência nos testes do SAEB, considerando também que quanto mais vezes se<br />

repetiu, mais forte é o efeito negativo sobre as notas. Resultados semelhantes também<br />

podem ser vistos em Luz (2006), Bezerra e Kassouf (2006), Pereira (2004).<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


161<br />

As variáveis que medem, o gosto do aluno pela Matemática e a frequência com<br />

que o aluno faz a lição de casa, estão positivamente relacionadas a proficiência, ou seja,<br />

o aluno gostar de Matemática e fazer a lição contribui para o aumento do desempenho,<br />

relativamente aos alunos que não gostam de Matemática e não fazem lição de casa.<br />

Estas variáveis elevam a proficiência em Matemática dos alunos da Região Norte em<br />

12,77 e 10,71 pontos, respectivamente. Na Região Norte os coeficientes elevam-se ainda<br />

mais alcançado 20,50 e 18,59 pontos de proficiência.<br />

Barbosa e Fernandes (2001) obtêm resultados semelhantes, constatando que<br />

quando se controla o nível socioeconômico dos alunos a infraestrutura e os equipamentos<br />

escolares e de formação dos professores, o gosto do aluno pela disciplina de Matemática<br />

interfere positivamente e significantemente na proficiência em Matemática.<br />

É interessante notar que a variável que mede a defasagem escolar se mostrou<br />

significativa e positiva ao explicar a proficiência em Matemática em ambas as regiões,<br />

contrariando a expressiva maioria dos estudos sobre desempenho que afirmam a<br />

defasagem escolar apresenta coeficiente negativo, como pode ser visto em Macedo<br />

(2006), Kassouf e Bezerra (2006).<br />

As variáveis referentes à formação dos professores não se mostraram<br />

significativas para explicar o desempenho dos estudantes, exceto o coeficiente do<br />

professor com ensino superior completo na região Norte, porém com coeficiente<br />

negativo contrariando a maior parte da literatura sobre o desempenho escolar. Segundo<br />

Albernaz, Ferreira, e Franco (2002) a maior escolaridade por parte dos professores torna<br />

a escola mais eficaz, entretanto aumenta o peso do nível socioeconômico do aluno<br />

sobre o desempenho, ou seja, professores mais escolarizados contribuem de uma forma<br />

mais elevada para o aumento do desempenho de alunos com maior nível socioeconômico,<br />

tornando a escola menos equitativa.<br />

A existência de um projeto pedagógico na escola está positivamente relacionada<br />

ao desempenho na Região Norte, com grande significância estatística. Na Região Sudeste<br />

o projeto pedagógico da escola também está positivamente ligada ao desempenho,<br />

porém com menor significância (10%), sendo de mais de 4 pontos o aumento da<br />

proficiência dos estudantes que estudam nestas escolas em ambas as regiões. Uma das<br />

possíveis explicações para essa queda de significância a existência de projeto pedagógico<br />

quase que na totalidade das escolas da região. Este resultado evidencia, ainda, de forma<br />

fraca a utilidade do projeto pedagógico sobre o desempenho escolar das duas regiões,<br />

contrariando o resultado apresentado por Franco, Mandarino e Ortigão (2002).<br />

A variável que mede a quantidade de computadores na escola mostrou-se<br />

significativa, tanto na Região Norte, como na Região Sudeste, sendo que nesta última<br />

perde-se em significância. Entretanto, esta variável quase não acrescenta pontos na<br />

proficiência em Matemática desses estudantes, visto que na Região Norte a<br />

proficiência eleva-se aproximadamente em 0,4 ponto, enquanto na Região Sudeste<br />

eleva-se de 0,14 ponto.<br />

A existência de televisão e aparelho de som na escola se mostrou significativa,<br />

apenas na Região Sudeste, sendo esta uma relação negativa, ou seja, o fato de a escola<br />

possuir televisão está afetando negativamente, e consideravelmente, a proficiência<br />

em Matemática (15 pontos). Tal informação pode estar indicando a má utilização desse<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


162<br />

recurso pela escola. Já a existência de aparelho de som afeta positivamente o<br />

desempenho em Matemática dos estudantes da Região Sudeste, elevando a proficiência<br />

4,23 pontos mais. A existência de antena parabólica na escola também não se mostrou<br />

significativa ao explicar o desempenho dos estudantes em Matemática, tanto na Região<br />

Norte como na Região Sudeste.<br />

A existência na escola de aparelhos de vídeo (DVD, vídeocassete) se mostrou<br />

significativa, e está positivamente relacionada à proficiência em Matemática dos alunos<br />

da 4ª série do Ensino Fundamental nas Regiões Norte e Sudeste. Na Região Norte tal<br />

fato eleva consideravelmente a proficiência em Matemática (10,89 pontos). Na Região<br />

Sudeste esse aumento atinge 12,51 pontos de proficiência.<br />

Barbosa e Fernandes (2001) constatam que, feito o controle do modelo por nível<br />

socioeconômico, as variáveis relativas à infraestrutura e equipamentos escolares,<br />

formado pelos fatores de conservação do prédio, condições de funcionamento dos<br />

espaços laboratoriais e de apoio, mobiliário e equipamentos, instalações, áreas externas<br />

e de recreação, tem forte impacto na proficiência dos alunos e explicam 54% das<br />

variações entre as escolas<br />

A existência na escola de biblioteca para utilização dos alunos foi bastante<br />

significante, ao nível de 1%, apenas na Região Sudeste, elevando a proficiência dos<br />

alunos que estudam em escolas com biblioteca em 4,23 pontos. Na Região Norte esta<br />

mesma variável ainda pode ser considerada significante, entretanto em nível de<br />

significância baixo (15%), e ainda pouco acrescentado à proficiência, 1,32 ponto a mais<br />

de proficiência em Matemática.<br />

Seria interessante constar nos questionários do SAEB uma pergunta a respeito<br />

da utilização da biblioteca pelo aluno, com intuito de verificar melhor a relação da<br />

existência de biblioteca na escola com o desempenho escolar. Biondi e Felício (2007)<br />

também obtêm evidências fracas sobre a relação da biblioteca com o desempenho em<br />

Matemática, sendo essa relação positiva e significativa apenas pelo Método de Mínimos<br />

Quadrados Ordinários.<br />

Com relação à localização da escola, o estado do Pará foi tomado como base de<br />

comparação entre os estados da Região Norte, e na Região Sudeste foi tomado como base<br />

de comparação o estado de São Paulo. Os resultados obtidos pelas equações de desempenho<br />

em Matemática para a Região Norte indicam, com significância de 10%, que os estudantes<br />

dos estados do Amazonas e do Acre elevam suas proficiências em cerca, respectivamente,<br />

de 1,95 e 3,37 pontos maior que no estado do Pará. O estado de Rondônia, com significância<br />

de 5%, eleva sua proficiência 3,64 pontos mais que no estado do Pará. Os estados do Amapá,<br />

Roraima e Tocantins apresentaram pouca significância em explicar o desempenho em<br />

Matemática dos alunos da 4ª série do Ensino Fundamental para a Região Norte.<br />

Os estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, e Minas Gerais apresentaram<br />

coeficientes positivos e elevados, ou seja, o aluno que estudar em um desses estados<br />

eleva consideravelmente sua proficiência quanto comparada com o estado de São Paulo;<br />

em termos absolutos os coeficientes de aumento do desempenho são de 11,3; 8,52;<br />

17,6 pontos, respectivamente, para os estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, e Minas<br />

Gerais. Fato esperado, pois o estado de São Paulo obteve a menor desempenho médio<br />

da Região Sudeste.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


163<br />

Kassouf e Bezerra (2006) analisando a variação do desempenho dos alunos da 4ª<br />

série do Ensino Fundamental avaliados pelo SAEB, em 2003, entre as regiões brasileiras<br />

percebe-se que a região onde a escola se localiza afeta a proficiência, demonstrando<br />

que o desempenho dos alunos é favorecido caso estudem nas regiões mais<br />

desenvolvidas, como Sudeste e Sul, em comparação com as demais regiões.<br />

As informações de localização indicam também as desigualdades existentes<br />

entre os sistemas de ensino dos estados de cada Região, sendo assim uma proposta de<br />

estudo poderia estar focada na comparação entre os estados.<br />

5 CONCLUSÃO<br />

O presente estudo teve como objetivo determinar os fatores determinantes do<br />

desempenho escolar dos alunos da 4ª série do Ensino Fundamental nas regiões Norte e<br />

Sudeste. Para tanto se utilizou um modelo de regressão linear múltipla onde a proficiência<br />

dos alunos, obtida através de exames padronizados aplicados pelo SAEB/2005, era a variável<br />

dependente do modelo. As características dos alunos e de suas famílias, bem como as<br />

características de infraestrutura escolar, como os equipamentos da escola, a formação dos<br />

professores, e a localização das escolas foram as variáveis explicativas do modelo.<br />

Entre os resultados, referentes às características do aluno mais significativos<br />

encontrados tem-se que o estudante ser do sexo masculino e possuir computador em<br />

casa afeta positivamente o desempenho, elevando a proficiência desses estudantes.<br />

Tem-se também que a quantidade de moradores no domicílio do aluno está<br />

negativamente relacionada ao desempenho, ou seja, quanto maior a quantidade de<br />

pessoas morando com o aluno menor será sua proficiência em Matemática. Estes<br />

resultados valem para ambas as regiões.<br />

Entre os resultados referentes às características familiares mais significativos<br />

tem-se a escolaridade do pai afetando positivamente o desempenho dos estudantes<br />

das regiões Norte e Sudeste. E ainda à medida que essa escolaridade aumenta a<br />

proficiência dos alunos também se eleva.<br />

Entre os resultados referentes às características de motivação do aluno mais<br />

significativos tem-se que o aluno gostar de matemática e sempre fazer a lição da escola<br />

afetam positivamente o desempenho dos estudantes das Regiões Norte e Sudeste.<br />

Outra variável de destaque sobre a motivação dos alunos e a repetência que tem<br />

relação negativa com a proficiência em Matemática, ou seja, os alunos que sofrem<br />

reprovação apresentam pior desempenho relativamente aos alunos que nunca repetiram.<br />

Entre os resultados referente às características da escola mais significativos temse<br />

que escolas com projeto pedagógico escolar e com aparelho de vídeo elevam o<br />

desempenho dos seus alunos, outra relação positiva com desempenho e o número de<br />

computadores na escola, ou seja, quanto mais computadores a escola possuir maior<br />

será o desempenho dos seus alunos. Essas relações valem para ambas as regiões.<br />

Obtivemos ainda alguns resultados significativos apenas para a Região Sudeste.<br />

O aluno morar com pai e mãe, as escolas com biblioteca e com aparelho de som foram<br />

positivas ao explicar o desempenho. A existência de televisão na escola está afetando<br />

negativamente a proficiência.<br />

Traços, Belém, v. 12, n. 25, p. 147-166, jun. 2010


164<br />

Diante dos resultados encontrados e como sugestão para melhorar a qualidade<br />

da educação no país sugere-se:<br />

• a implementação de políticas educacionais como programas educacionais para<br />

aumentar a escolaridade dos pais dos alunos;<br />

• programas que disponibilizem pequenos computadores portáteis para utilização<br />

dos alunos;<br />

• programas de recuperação dos alunos que venham a sofrer reprovações como<br />

forma de melhorar sua formação e autoestima;<br />

• melhorar a formação dos professores com cursos de formação continuada;<br />

• elaboração de um projeto pedagógico escolar que possibilite uma maior qualidade<br />

e equidade do ensino;<br />

• e ainda dotar as escolas de equipamentos que favoreçam o aprendizado e também<br />

capacitem os professores para uma melhor utilização dos recursos disponibilizados<br />

pela escola.<br />

Esperamos que o presente estudo sirva de base e de motivação para futuros<br />

estudos abordando a qualidade da educação na Região Norte, com vistas ao<br />

desenvolvimento educacional da região e consequentemente uma melhora na<br />

distribuição socioeconômica, culminando com a redução das desigualdades entre as<br />

regiões brasileiras.<br />

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