Posse de drogas para consumo pessoal: novas regras ... - BuscaLegis
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<strong>Posse</strong> <strong>de</strong> <strong>drogas</strong> <strong>para</strong> <strong>consumo</strong> <strong>pessoal</strong>: <strong>novas</strong> <strong>regras</strong> <strong>para</strong> a<br />
transação penal<br />
Eduardo Luiz Santos Cabette*<br />
A Lei 11.343/06 alterou o tratamento atribuído ao usuário ou <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />
<strong>drogas</strong>. Doravante, <strong>de</strong> acordo com a dicção <strong>de</strong> seu artigo 28, incisos I, II e<br />
III, aquele que tem a posse <strong>de</strong> <strong>drogas</strong> <strong>para</strong> <strong>consumo</strong> <strong>pessoal</strong> não mais estará<br />
sujeito, em qualquer circunstância, ao encarceramento. Foi <strong>de</strong>finitivamente<br />
abolida a pena <strong>de</strong> prisão como reação estatal a essa conduta.<br />
Trata-se <strong>de</strong> medida coerente com a adoção <strong>de</strong> um novo mo<strong>de</strong>lo<br />
"terapêutico" em substituição à antiga postura "repressiva" em relação ao<br />
usuário ou <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte.<br />
Como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, o legislador estabeleceu no artigo<br />
48, § 1º., da Lei 11.343/06, a aplicação do procedimento da Lei 9099/95<br />
<strong>para</strong> o processo e julgamento das infrações ao artigo 28 do primeiro diploma<br />
mencionado.<br />
No entanto, uma dúvida emerge quanto ao direito do autor do fato à<br />
transação penal: estaria a proposta, nos casos do artigo 28, condicionada ao<br />
fato <strong>de</strong> que o autor não tenha sido ainda beneficiado no prazo <strong>de</strong> cinco anos,<br />
conforme regra disposta no artigo 76, § 2º., II, da Lei 9099/95?
Luiz Flávio Gomes manifesta-se pioneiramente sobre o tema,<br />
afirmando que a regra do artigo 76, § 2º., II, da Lei dos Juizados Especiais<br />
Criminais não se aplica aos casos do artigo 28 da Lei 11.343/06. Eis o texto:<br />
"(...) no âmbito dos juizados, feita uma transação<br />
penal, outra não po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>ferida no lapso <strong>de</strong> cinco anos.<br />
Isso não existe na ‘lex nova’. Não há nenhum impedimento<br />
<strong>para</strong> uma nova transação". [01]<br />
A afirmação acima transcrita po<strong>de</strong> gerar certo espanto, vez que a Lei<br />
11.343/06 não estabelece expressamente alguma exceção e simplesmente<br />
<strong>de</strong>termina a aplicação do procedimento dos artigos 60 e seguintes da Lei<br />
9099/95 aos casos do artigo 28. Não há <strong>de</strong>claração expressa <strong>de</strong> revogação<br />
(<strong>de</strong>rrogação) e nem a Lei <strong>de</strong> Drogas trata inteiramente da matéria, inclusive<br />
remetendo o aplicador à sistemática da Lei 9099/95.<br />
Nesse quadro, o que po<strong>de</strong>ria levar o intérprete à surpreen<strong>de</strong>nte<br />
conclusão <strong>de</strong> que a transação penal nos casos do artigo 28 da Lei 11.343/06<br />
não estaria condicionada ao lapso impeditivo <strong>de</strong> cinco anos?<br />
A resposta encontra-se no artigo 2º., § 1º., da Lei <strong>de</strong> Introdução ao<br />
Código Civil (Decreto – Lei 4.657/42):<br />
"A lei posterior revoga a anterior quando<br />
expressamente a <strong>de</strong>clare, quando seja com ela incompatível<br />
ou quando regule inteiramente a matéria <strong>de</strong> que tratava a lei<br />
anterior".<br />
Como já <strong>de</strong>stacado, é nítido que a Lei 11.343/06 não <strong>de</strong>clara<br />
expressamente qualquer alteração sobre o tema em discussão. Também não<br />
seria uma boa trilha interpretativa concluir-se que o silêncio da lei nova<br />
implicaria em abolição da exigência da lei anterior, mormente quando a
própria Lei <strong>de</strong> Drogas <strong>de</strong>termina a aplicação dos procedimentos previstos na<br />
Lei 9099/95.<br />
Portanto, restou apenas a questão da incompatibilida<strong>de</strong> da disciplina<br />
do artigo 28 da Lei 11.343/06 com o regramento estabelecido no artigo 76, §<br />
2º., II, da Lei 9099/95. Eis aqui o que parece ser o verda<strong>de</strong>iro <strong>de</strong>sate do nó<br />
górdio da questão, a conferir razão à conclusão doutrinária anteriormente<br />
mencionada.<br />
O fundamento do impedimento <strong>de</strong> transações penais sucessivas,<br />
estabelecendo-se um lapso temporal legal <strong>de</strong> cinco anos, encontra-se no<br />
intento <strong>de</strong> evitar a sensação <strong>de</strong> impunida<strong>de</strong>, mediante a constatação <strong>de</strong> que<br />
as penas privativas <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> estampadas nos preceitos secundários dos<br />
tipos penais não passariam <strong>de</strong> formalida<strong>de</strong>s, símbolos estéreis jamais<br />
aplicados na prática.<br />
Este é o pensamento <strong>de</strong> Grinover, Gomes Filho, Scarance Fernan<strong>de</strong>s<br />
e Gomes ao asseverarem:<br />
"A lei quer beneficiar o autor <strong>de</strong> fatos enquadráveis<br />
nas infrações penais <strong>de</strong> menor potencial ofensivo, mas não<br />
incentivar sua impunida<strong>de</strong>. Por isso, o ‘agente’ que já tiver<br />
sido beneficiado da aplicação consensual <strong>de</strong> pena não<br />
privativa <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>, nos termos da Lei 9099/95, não po<strong>de</strong>rá<br />
gozar <strong>de</strong> novo benefício, pelo prazo <strong>de</strong> cinco anos". [02]<br />
No mesmo diapasão manifesta-se Mirabete:<br />
"Também é inadmissível a proposta <strong>de</strong> conciliação<br />
quando o agente foi beneficiado anteriormente, no prazo <strong>de</strong><br />
cinco anos, pela aplicação <strong>de</strong> pena restritiva <strong>de</strong> direitos ou<br />
multa em transação anterior (art. 76, § 2º., II). Evita-se que a
mesma pessoa seja beneficiada duas vezes nesse lapso<br />
temporal <strong>para</strong> não incentivar a sensação <strong>de</strong> impunida<strong>de</strong>". [03]<br />
Tendo em consi<strong>de</strong>ração o fundamento da proibição estabelecida no<br />
artigo 76, § 2º., II, da Lei 9099/95, nos casos do artigo 28 da Lei 11.343/06<br />
ocorre um verda<strong>de</strong>iro <strong>de</strong>smoronamento da razão <strong>de</strong> ser do impedimento ali<br />
<strong>de</strong>terminado. Isso porque não há hipótese alguma <strong>de</strong> aplicação <strong>de</strong> pena<br />
privativa <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>, bem como não conta o dispositivo em <strong>de</strong>staque com<br />
carga repressivo – punitiva. Bem ao reverso, surge o artigo 28 da nova Lei<br />
<strong>de</strong> Drogas como marco <strong>de</strong> uma guinada <strong>de</strong> um sistema repressivo <strong>para</strong> outro<br />
<strong>de</strong> índole claramente terapêutica, a qual inclusive, não se coaduna com um<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> justiça conflitivo – impositivo, mas sim com um <strong>para</strong>digma<br />
"consensuado", no qual a a<strong>de</strong>são do próprio autor do fato às medidas<br />
adotadas emerge como requisito imprescindível à sua eficácia prática.<br />
Também é importante recordar que os próprios princípios que regem<br />
a Lei 9099/95 indicam <strong>para</strong> tal solução, pois que não haveria razão plausível<br />
<strong>para</strong> que se chegasse, ao final <strong>de</strong> todo um processo, à imposição das mesmas<br />
medidas que po<strong>de</strong>riam ter sido obtidas consensualmente e <strong>de</strong> imediato, uma<br />
vez que neste caso não há hipótese <strong>de</strong> outras modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> penas. Tal<br />
caminhar em círculos <strong>para</strong> chegar ao mesmo ponto iria chocar-se<br />
frontalmente com princípios preconizados na Lei 9099/95, tais como os da<br />
celerida<strong>de</strong>, informalida<strong>de</strong> e economia processual (inteligência do artigo 62<br />
da Lei 9099/95).<br />
Dessa forma, conclui-se que realmente o impedimento <strong>de</strong> nova<br />
transação penal por cinco anos após um primeiro acordo não se aplica aos<br />
casos do artigo 28 da Lei 11.343/06, por tratar-se <strong>de</strong> disposição incompatível<br />
com sua natureza e disciplina e consi<strong>de</strong>rando os próprios princípios reitores<br />
da Lei dos Juizados Especiais Criminais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
GOMES, Luiz Flávio, et al. (coord.). Nova Lei <strong>de</strong> Drogas<br />
Comentada. São Paulo: RT, 2006.<br />
GRINOVER, Ada Pellegrini, et al. Juizados Especiais Criminais. 4ª.<br />
ed. São Paulo: RT, 2002.<br />
MIRABETE, Julio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais. 5ª. ed.<br />
São Paulo: Atlas, 2002.<br />
NOTAS<br />
01 GOMES, Luiz Flávio, et al. (coord.). Nova Lei <strong>de</strong> Drogas<br />
Comentada. São Paulo: RT, 2006, p. 126.<br />
02 GRINOVER, Ada Pellegrini, et al. Juizados Especiais Criminais. 4ª.<br />
ed. São Paulo: RT, 2002, p. 151.<br />
03 MIRABETE, Julio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais. 5ª. ed.<br />
São Paulo: Atlas, 2002, p. 145.<br />
* <strong>de</strong>legado <strong>de</strong> polícia, mestre em Direito Social, pós-graduado com especialização em<br />
Direito Penal e Criminologia, professor da graduação e da pós-graduação da Unisal.<br />
Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10020