Revista HUGV 2010 - Hospital Universitário Getúlio Vargas - Ufam
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evistahugv<br />
<strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
The Journal of Getulio <strong>Vargas</strong> University <strong>Hospital</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS<br />
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS<br />
Rua Apurinã nº 04 – Praça 14 de Janeiro, Cep: 69020-170 Manaus - AM<br />
Fones: (092) 3305-4782/4719 E-mail: revistahugv@ufam.edu.br<br />
FUNDADORES<br />
Ricardo Torres Santana<br />
Jorge Alberto Mendonça<br />
LISTA DO CONSELHO EDITORIAL DA REVISTA <strong>HUGV</strong><br />
EDITOR-CHEFE<br />
Fernando Luiz Westphal<br />
Maria Augusta Bessa Rebelo<br />
Rosane Dias da Rosa<br />
Kathya Augusta Thomé Lopes<br />
Maria Lizete Guimarães Dabela<br />
LISTA DO CONSELHO CONSULTIVO DA REVISTA <strong>HUGV</strong><br />
Aluísio Miranda Leão<br />
Ângela Delfina B. Garrido<br />
Antonio Carlos Duarte Cardoso<br />
Célia Regina Simoneti Barbalho<br />
Cláudio Chaves<br />
Clemencio Cezar Campos Cortez<br />
Cristina de Melo Rocha<br />
Dagmar Keisslich<br />
David Lopes Neto<br />
Domingos Sávio Nunes de Lima<br />
Edson de Oliveira Andrade<br />
Edson Sarkis Gonçalves<br />
Ermerson Silva<br />
Eucides Batista da Silva<br />
Eurico Manoel Azevedo<br />
Fernando César Façanha Fonseca<br />
Fernando Luiz Westphal<br />
Gerson Suguyama Nakajima<br />
Ione Rodrigues Brum<br />
Ivan da Costa Tramujás<br />
Jacob Cohen<br />
João Bosco L. Botelho<br />
José Correa Lima Netto<br />
Julio Mario de Melo e Lima<br />
Kathya Augusta Thomé Lopes<br />
Lourivaldo Rodrigues de Souza<br />
Luís Carlos de Lima<br />
Luiz Carlos de Lima Ferreira<br />
Luiz Fernando Passos<br />
Maria Augusta Bessa Rebelo<br />
Maria do Socorro L. Cardoso<br />
Maria Fulgência Costa L. Bandeira<br />
Maria Lizete Guimarães Dabela<br />
Mariano Brasil Terrazas<br />
Massanobu Takatani<br />
Miharu Magnória Matsuura Matos<br />
Neila Falcone Bonfim<br />
Nelson Abrahim Fraiji<br />
Nikeila Chacon de O. Conde<br />
Osvaldo Antônio Palhares<br />
Ricardo Torres Santana<br />
Rosana Cristina Pereira Parente<br />
Rosane Dias da Rosa<br />
Rubem Alves da Silva Júnior<br />
Wilson Bulbol
evistahugv<br />
<strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
The Journal of Getulio <strong>Vargas</strong> University <strong>Hospital</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA<br />
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS<br />
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS<br />
Copyright© 2009 Universidade Federal do Amazonas/<strong>HUGV</strong><br />
REITORA DA UFAM<br />
Prof.ª Dra. Márcia Perales Mendes Silva<br />
DIRETOR DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS<br />
Prof. Dr. Lourivaldo Rodrigues de Souza<br />
PRODUÇÃO GRÁFICA-EDITORIAL<br />
Wagner Alencar<br />
ORGANIZAÇÃO<br />
Thaís Borges Viana<br />
DIRETORA DA EDUA<br />
Prof.ª Dra. Iraildes Caldas Torres<br />
DIRETORA DA REVISTA<br />
Profª Dayse Enne Botelho<br />
REVISÃO (LÍNGUA PORTUGUESA)<br />
Sergio Luiz Pereira<br />
CAPA<br />
Serviço de Ergodesign<br />
TIRAGEM 300 EXEMPLARES<br />
FICHA CATALOGRÁFICA<br />
Ycaro Verçosa dos Santos – CRB-11 287<br />
CDU 61(051)<br />
R454 <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>.<br />
<strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Getúlio <strong>Vargas</strong>. V. 9, n. 1-2 (<strong>2010</strong>) / Manaus: Editora da Universidade<br />
Federal do Amazonas, <strong>2010</strong><br />
91 p.<br />
Semestral<br />
Título da revista em português inglês<br />
ISSN – 1677-9169<br />
1. Medicina-Periódico I. <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> II. Universidade Federal do Amazonas.<br />
CDU 61(051)
Sumário<br />
Editorial<br />
10<br />
1. Perfil clínico e laboratorial de pacientes com Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES)<br />
2. Câncer de pulmão no Estado do Amazonas – Um estudo epidemiológico com base<br />
hospitalar<br />
3. Prevalência de síndrome metabólica em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico<br />
na Amazônia Ocidental<br />
4. Uso do Questionário de Avaliação do Zumbido (Tinnitus Handicap Inventory) adaptado<br />
para o português para avaliação da qualidade de vida dos pacientes com queixa de<br />
zumbido atendidos no Ambulatório Araújo Lima<br />
5. Análise da qualidade de vida de pacientes submetidos à correção cirúrgica de<br />
deformidades na parede torácica anterior<br />
6. Amiloidose Sistêmica. Relato De Caso<br />
7. Insuficiência Renal Aguda na Hemoglobinúria Paroxística Noturna - Relato de Caso<br />
8. Melanoma Primário de Mucosa Nasal<br />
9. Anemia pela infecção por parvovírus b19 em paciente de transplante renal<br />
10. Adenoma de Paratireoide Intratorácico: Relato de Caso<br />
11. Correção Cirúrgica de Hérnia Diafragmática de Morgani - Relato de Caso<br />
12. Evolução de Pacientes com Nefrite Lúpica Tratados com Ciclofosfamida<br />
13. Paraganglioma Jugular: Relato de Caso<br />
14. Estenose Laríngea Causada por Tuberculose<br />
15. Fissura Labiopalatina Completa: Relato de Dois Casos<br />
12<br />
18<br />
25<br />
34<br />
42<br />
49<br />
54<br />
58<br />
63<br />
65<br />
68<br />
73<br />
80<br />
84<br />
87<br />
Resumo de Tese TRAUMA DE PÂNCREAS: ANÁLISE RETROSPECTIVA DE CINCO ANOS<br />
92
Contents<br />
Editorial<br />
10<br />
Clinical and laboratorial profile of patients with systemic lupus erythematosus (sle)<br />
Lung Cancer din the State of Amazonas an Epidemilogical study based on hospital<br />
The prevalence of metabolic syndrome in patients with systemic lupus erythematosus in<br />
the ocidental amazonia<br />
Use of tinnitus handicap inventory adapted to portuguese for assessment of quality of<br />
life of patients with tinnitus attended in the araújo lima clinic<br />
Analysis of quality of life of patients undergoing surgical correction of deformities in the<br />
anterior chest wall<br />
Light-chain amyloidosis. Case report<br />
Acute renal failure in paroxysmal nocturnal haemoglobinuria. Case report<br />
Primary melanoma of the nasal mucosa<br />
Anemy due parvovirus b19 infection in kidney transplanted patient<br />
Parathyroid adenoma intra-thoracic: case report<br />
Surgical repair of morgani diaphragmatic hernia: case report<br />
Evolution of patients with lupus nephritis treated with cyclophosphamide<br />
Paraganglioma jugular: case report<br />
Laryngeal stenosis caused by tuberculosis<br />
Cleft lip and palate: report of two cases<br />
12<br />
18<br />
25<br />
34<br />
42<br />
49<br />
54<br />
58<br />
63<br />
65<br />
68<br />
73<br />
80<br />
84<br />
87<br />
Sumary of thesis on pancreatic trauma: a restropective analysis of five years<br />
92
Editorial<br />
A R<strong>HUGV</strong> e a Residência Médica<br />
A R<strong>HUGV</strong> está em plena evolução com um número crescente de artigos apresentados para a<br />
avaliação do Conselho Editorial. A maioria destes artigos foi apresentada pelos Serviços dos respectivos<br />
Programas de Residência Médica como uma forma de substituir a Monografia clássica por um trabalho<br />
científico, alteração estatutária realizada na gestão do Prof. Msc. Juscimar Carneiro frente a Comissão<br />
de Residência Médica do <strong>HUGV</strong>.<br />
A produção intelectual do médico residente encontra-se diretamente associado ao Serviço<br />
a que está vinculado, sendo que se o residente está cursando a um Programa de Residência Médica<br />
com preceptores direcionados e estimulados a produção científica, provavelmente este residente será<br />
inserido a um projeto de pesquisa em desenvolvimento e conseguirá realizar um artigo ao final do curso.<br />
De outra forma, os serviços sem esta tendência a produção intelectual determinam aos seus residentes<br />
um caminho mais árduo até alcançar a publicação de um trabalho científico.<br />
É extremamente importante para o <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> e para a Universidade<br />
Federal do Amazonas ter um periódico com publicação regular. Além de contemplar uma das bases da<br />
Universidade que é a pesquisa, podemos criar a memória de um Serviço por meio da publicação da<br />
prática médica diária executada por seus pares.<br />
A excelência de um Programa de Residência Médica está atrelada ao seu produto final que é a<br />
formação do residente, mas teoricamente a chance de uma boa formação médica passa pela oportunidade<br />
oferecida aos seus alunos e, com certeza, este objetivo será alcançado mais facilmente se o discente é<br />
colocado diante um grupo de preceptores preocupados com a contextualização da prática diária.<br />
O discente geralmente aspira dentro de sua realidade ter as mesmas titulações de seus preceptores,<br />
remetendo a sua pratica diária o exemplo adquirido durante a pós-graduação, sendo sob esta ótica<br />
extremamente importante o Chefe de Serviço estar emparelhado em seus pensamentos com a academia<br />
e a produção científica, principalmente em se tratahndo de um Serviço sediado dentro de uma Instituição<br />
de Ensino Superior.<br />
Fernado Luiz Westphal.<br />
Editor da <strong>Revista</strong><br />
9<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Kelly Simone Castro dos Santos, Maíra Fernandes de Almeida,<br />
Thamara Karoline Perrone Maciel, Domingos Sávio Nunes de Lima<br />
PERFIL CLÍNICO E LABORATORIAL DE PACIENTES<br />
COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)<br />
CLINICAL AND LABORATORIAL PROFILE OF PATIENTS WITH<br />
SYSTEMIC LUPUS ERYTHEMATOSUS (SLE)<br />
Kelly Simone Castro dos Santos*, Maíra Fernandes de Almeida*,<br />
Thamara Karoline Perrone Maciel**, Domingos Sávio Nunes de Lima***<br />
RESUMO<br />
O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica de natureza autoimune e com<br />
apresentação clínica polimórfica. Seu estudo é de interesse multidisciplinar, no entanto não existem dados<br />
sobre o seu comportamento no Amazonas. OBJETIVO: Investigar o perfil demográfico, clínico e laboratorial<br />
dos pacientes com LES acompanhados regularmente no Serviço de Reumatologia do Ambulatório Araújo<br />
Lima da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Amazonas (<strong>Ufam</strong>). METODOLOGIA: Estudo<br />
descritivo, de caráter retrospectivo, baseado na análise de prontuários, avaliando população com o<br />
diagnóstico de LES que tenham quatro ou mais critérios do Colégio Americano de Reumatologia (ACR). As<br />
informações foram registradas em um banco de dados, sendo utilizado o programa Epi-Info para descrição<br />
estatística simples. RESULTADOS: Foram revisados 130 prontuários, predominando pacientes do sexo<br />
feminino (93,1%), com média de idade 36 ± 12 anos, sendo 79,2% da raça não branca. A média de idade<br />
do início da doença foi de 28 ± 10 anos. Os critérios de classificação mais frequentemente observados<br />
foram FAN (91,5%) e artrite (90%). Foram encontrados 120 (93%) pacientes com pelo menos um fator de<br />
risco para doença arterial coronariana (DAC), sendo o sedentarismo (59,7%) e a dislipidemia (53,8%) os<br />
mais comumente verificados. Quanto ao tratamento, todos os pacientes haviam usado costicosteroides<br />
em algum momento. CONCLUSÃO: Esta pesquisa propicia uma visão parcial das características do LES na<br />
amostra estudada, onde se pode observar semelhança com outras séries da literatura. Estes dados podem<br />
ser usados para melhor planejamento das ações em saúde voltadas ao Lúpus.<br />
DESCRITORES: Lúpus; colagenose; doença autoimune.<br />
ABSTRACT<br />
Systemic lupus erythematosus (SLE) is a chronic inflammatory disease of autoimmune nature and with<br />
heterogeneous clinical presentation. This study is of interest multidisciplinary, however, no data on their<br />
behavior in the Amazon. OBJECTIVE: To investigate the demographic, clinical and laboratory evidence<br />
of SLE patients followed regularly in the service of rheumatology outpatients Araújo Lima School of<br />
Medicine, Federal University of Amazonas (<strong>Ufam</strong>). METHODOLOGY: A descriptive, retrospective study,<br />
based on analysis of medical records, assessing the population with the diagnosis of SLE who have four<br />
* Médica Residente de Clínica Médica do <strong>HUGV</strong>-<strong>Ufam</strong><br />
** Médica<br />
*** Médico Reumatologista/Doutor em Medicina/Professor da <strong>Ufam</strong><br />
11<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
PERFIL CLÍNICO E LABORATORIAL DE PACIENTES COM<br />
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)<br />
or more criteria of the American College of Rheumatology (ACR). The information was recorded in a<br />
database, and using Epi-Info for simple statistical description. RESULTS: We reviewed 130 medical<br />
records, predominantly female patients (93.1%), mean age 36 ± 12 years, 79.2% were non-white. The<br />
average age of onset was 28 ± 10 years. Criteria for the classification most commonly observed were FAN<br />
(91.5%) and arthritis (90%). Found 120 (93%) patients with at least one risk factor for coronary artery<br />
disease (CAD) and sedentary lifestyle (59.7%) and dyslipidemia (53.8%) the most commonly observed.<br />
Regarding treatment, all patients had used steroids at some moment. CONCLUSION: This study provides<br />
a partial view of the characteristics of SLE in the study sample, where one can see similarity with other<br />
published series. These data can be used for better planning of health actions Lupus.<br />
Word-key: Lupus; collagenous; autoimmune illness.<br />
INTRODUÇÃO<br />
O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) é uma<br />
doença inflamatória crônica multissistêmica, de<br />
natureza autoimune. Sua etiologia permanece<br />
obscura e sua fisiopatologia possivelmente<br />
representa o resultado da interação de múltiplos<br />
fatores, destacando-se a ação dos fatores ambientais<br />
1, 2, 3<br />
em indivíduos geneticamente predispostos.<br />
Embora afete ambos os sexos, atinge<br />
predominantemente jovens do sexo feminino,<br />
numa proporção de 9 a 10 mulheres para 1 homem,<br />
em idade reprodutiva, com pico de incidência entre<br />
15 e 40 anos de idade. 4 Na população geral, o LES<br />
afeta aproximadamente 1 caso em 2.000 a 10.000<br />
habitantes. Sua distribuição é universal, porém a<br />
doença tende a ser mais comum e mais severa em<br />
pessoas de raças não caucasoides. 1, 2<br />
Seu estudo é de interesse multidisciplinar;<br />
entretanto, no Brasil, são poucos os trabalhos que<br />
descrevem como se dá o comportamento clínico do LES<br />
com estatísticas regionais. Além disso, há necessidade<br />
de maiores estudos sobre as manifestações clínicas<br />
e laboratoriais em regiões equatoriais, onde a alta<br />
incidência de raios ultravioleta favorece “surtos<br />
epidêmicos” da doença. 5, 6<br />
O presente trabalho aborda aspectos<br />
epidemiológicos de pacientes lúpicos, acompanhados<br />
regularmente num serviço de reumatologia,<br />
correlacionado suas manifestações clínicas iniciais,<br />
evolutivas, alterações laboratoriais, comorbidades e<br />
terapêutica, refletindo o espectro de apresentações<br />
clínicas dessa patologia no Estado do Amazonas.<br />
MÉTODO<br />
A coleta de dados foi realizada no Serviço<br />
de Reumatologia do Ambulatório Araújo Lima<br />
(AAL), <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
(<strong>HUGV</strong>), da Universidade Federal do Amazonas<br />
(<strong>Ufam</strong>), após análise e aprovação pela Comissão<br />
de Ética em Pesquisa da <strong>Ufam</strong>.<br />
Trata-se de um estudo descritivo, de caráter<br />
retrospectivo, onde foram selecionados 130<br />
prontuários de pacientes com diagnóstico de Lúpus<br />
Eritematoso Sistêmico definido de acordo com o<br />
proposto pelo Colégio Americano de Reumatologia<br />
(ACR). 7 Avaliou-se população de ambos os sexos,<br />
de todas as faixas etárias, com o diagnóstico de<br />
LES em acompanhamento regular no Serviço de<br />
Reumatologia do AAL, a fim de identificar seu<br />
perfil demográfico, clínico e laboratorial. Dentre<br />
os dados analisados têm-se: local de nascimento,<br />
procedência, raça, sexo, idade de início da doença,<br />
tempo de evolução, critérios diagnósticos do lúpus,<br />
presença de fatores de risco para doença arterial<br />
coronariana (DAC), comorbidades, alterações<br />
laboratoriais, além de tratamento medicamentoso.<br />
12<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Kelly Simone Castro dos Santos, Maíra Fernandes de Almeida,<br />
Thamara Karoline Perrone Maciel, Domingos Sávio Nunes de Lima<br />
As informações foram registradas em um<br />
banco de dados, sendo utilizado o programa Epi-<br />
Info para descrição estatística simples. Análises<br />
estatísticas foram conduzidas utilizando-se<br />
testes do qui-quadrado e t de Student para testar<br />
diferenças entre variáveis categóricas e contínuas,<br />
respectivamente. Métodos e padrões de análise<br />
para estudos descritivos foram realizados. A<br />
análise dos dados foi iniciada com descrição<br />
estatística simples, IC 95% e testes de significância<br />
foram empregados para validar essas proporções<br />
encontradas. Foram calculadas médias IC 95% e<br />
testes de significância para variáveis numéricas.<br />
RESULTADOS<br />
Foram revisados 130 prontuários onde<br />
predominam pacientes do sexo feminino (93,1%),<br />
com média de idade de 36 ± 12 anos [variando de<br />
13 a 74], sendo 79,2% da raça não branca.<br />
Sobre o aspecto socioeconômico, observase<br />
que a renda mensal por família varia de 0 a 20<br />
salários, com média de 2 salários/mês. O número<br />
de coabitantes é de 4 pessoas [variando de 1 a 10<br />
pessoas] por domicílio. Seis famílias (5,8%) não<br />
possuem emprego, vivendo da ajuda de familiares<br />
ou amigos. Aproximadamente 27% vivem com menos<br />
de um salário mínimo por mês, 30% com menos de<br />
dois salários e apenas 3% possuía renda superior a<br />
três salários mínimos. Quanto à procedência, 96%<br />
dos pacientes acompanhados residem no Amazonas,<br />
sendo 83,8% da capital Manaus e 12,3% do interior do<br />
Estado. Residem em outros Estados 3,8% da amostra,<br />
destacando-se entre eles o Estado do Pará. Nasceram<br />
no Amazonas 77,7% dessa população (sendo 38,4% na<br />
capital), e 22,3% nasceram em outros Estados.<br />
A média de idade ao início da doença foi de 28<br />
± 10 anos [variando de 2 a 51]. A mediana do tempo<br />
de diagnóstico foi de 65 meses, variando de 4 a 483<br />
meses. A idade atual, idade de início da doença,<br />
tempo de diagnóstico e tempo de acompanhamento<br />
dos pacientes são mostrados na Tabela 1.<br />
Média±DP<br />
Mediana [limites]<br />
Idade atual (anos) 36 ± 12 36 [13-74]<br />
Idade de início da doença (anos) 28 ± 10 28 [02-51]<br />
Tempo de diagnóstico (meses) 80 ± 70 65 [4-483]<br />
Tempo de acompanhamento (meses) 66 ± 46 59 [1-276]<br />
Tabela 1 – Idade atual, idade de início da doença, tempo de diagnóstico e tempo de<br />
acompanhamento dos 130 pacientes com LES.<br />
Os pacientes apresentaram uma média de 5 dos<br />
11 critérios de classificação [variando de 4 a 10];<br />
os mais frequentemente encontrados foram FAN<br />
(91,5%) e artrite (90%), ilustrado na Tabela 2.<br />
O FAN foi positivo em 119 dos pacientes em<br />
acompanhamento, sendo o padrão homogêneo<br />
o mais frequentemente observado (35,5%),<br />
seguido pelo padrão pontilhado.<br />
13<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
PERFIL CLÍNICO E LABORATORIAL DE PACIENTES COM<br />
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)<br />
Critério do ACR para LES Frequência Porcentagem<br />
FAN 119 91,5<br />
Artrite 117 90<br />
Fotossensibilidade 101 77,7<br />
Rash malar 94 72,3<br />
Lesão discóide 15 11,5<br />
Úlcera oral 37 28,5<br />
Alteração hematológica 68 52,3<br />
Sorológico 68 52,3<br />
Comprometimento renal 54 41,5<br />
Serosite 43 33,1<br />
Envolvimento neurológico 15 11,5<br />
Tabela 2– Frequência e porcentagem dos critérios de classificação do<br />
Colégio Americano de Reumatologia (ACR) nos 130 pacientes do estudo.<br />
O comprometimento osteoarticular (artrite) e<br />
cutaneomucoso (fotossensibilidade, rash malar, lesão<br />
discoide e úlcera oral) foram as manifestações clínicas<br />
mais frequentes. As alterações dermatológicas são<br />
frequentemente observadas durante a evolução<br />
da doença. Lesões típicas como exantema em<br />
vespertílio aparecem em 72,3% e lesões do tipo<br />
discoide ocorrem em 11,5%. Fotossensibilidade é<br />
verificada em 77,7% dos pacientes.<br />
O comprometimento hematológico foi<br />
observado em 52,3% pacientes, em algum momento<br />
da evolução clínica. Destes, 60% apresentaram<br />
linfopenia, 31,5% leucopenia, 20,8% apresentaram<br />
anemia hemolítica autoimune e 8,5% plaquetopenia.<br />
As alterações hematológicas foram frequentes no<br />
início da doença, exceto linfopenia que apresentou<br />
aumento de incidência ao longo da evolução clínica.<br />
Alterações do sedimento urinário foram<br />
observadas em 41,5% dos pacientes. Dos pacientes<br />
com alterações renais, 19,4% apresentaram<br />
proteinúria maior que 500 mg/dia em algum<br />
momento ao longo da doença, sendo 68% observada<br />
no início. Neste estudo, 20,2% pacientes realizaram<br />
biópsia renal e destes 44% tiveram classificação<br />
histológica renal IV.<br />
O comprometimento do Sistema Nervoso<br />
Central ocorreu em 11,5% dos pacientes, incluindo<br />
convulsão, psicose e quadros cerebrais localizados.<br />
No Sistema Nervoso Periférico encontramos relato<br />
de neuropatia periférica em 5,38% dos pacientes.<br />
Neste estudo, observou-se fenômeno de<br />
Raynaud em 12,3%, vasculite em 14,7% e livedo em<br />
6,2% pacientes.<br />
A presença de comorbidade foi identificada<br />
em 88,5% dos pacientes, sendo: dislipidemia<br />
53,8%, hipertensão 40,8%, fibromialgia 12,3%,<br />
púrpura trombocitopênica idopática (PTI) 7% e<br />
herpes zoster e trombose venosa profunda (TVP)<br />
4,7%; osteoporose foi encontrada em 9,2%, sendo a<br />
coluna o local mais acometido (75%) e osteopenia<br />
em 28,46% dos pacientes, estando o fêmur e a<br />
coluna frequentemente acometidos (43,2%).<br />
O índice de massa corpórea (IMC) foi utilizado<br />
para classificação de pacientes nos biótipos normal,<br />
magro, com sobrepeso, obeso e obeso mórbido,<br />
segundo a classificação da OMS, sendo mostrado na<br />
Tabela 3.8 Considerou-se o IMC ideal de 18,4 a 24,9<br />
kg/m2. As pessoas com IMC de 25 a 29,9 kg/m2 estão<br />
acima do peso (sobrepeso) e com IMC acima de 30<br />
kg/m2 são obesas. Valores acima de 40 kg/m2 são<br />
considerados como obesidade mórbida. A obesidade<br />
foi encontrada em 18,9% pacientes do estudo<br />
14<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Kelly Simone Castro dos Santos, Maíra Fernandes de Almeida,<br />
Thamara Karoline Perrone Maciel, Domingos Sávio Nunes de Lima<br />
BIÓTIPO N.o de pacientes Porcentagem<br />
Magro 7 5,5<br />
Normal 52 40,9<br />
Sobrepeso 44 34,6<br />
Obeso 22 17,3<br />
Obeso mórbido 2 1,6<br />
Tabela 3– Frequência e porcentagem do biótipo conforme o IMC<br />
encontrado nos pacientes em estudo.<br />
Na amostra estudada foram encontrados 93%<br />
dos pacientes com fatores de risco para DAC, sendo<br />
que os mais frequentemente encontrados foram<br />
sedentarismo, dislipidemia e hipertensão arterial.<br />
Dos 120 pacientes com fatores de risco para DAC, a<br />
média foi de 2, variando de 1 a 6 fatores. A frequência<br />
e porcentagem dos fatores de risco para DAC são<br />
mostradas na Tabela 4.<br />
FATOR DE RISCO PARA DAC N.o de pacientes Porcentagem<br />
Sedentarismo 77 59,7<br />
Dislipidemia 70 53,8<br />
Hipertensão arterial 53 40,8<br />
Obesidade 24 18,9<br />
DAC familiar 18 13,8<br />
Tabagismo 5 3,8<br />
Diabetes 3 2,3<br />
Tabela 4 – Frequência e porcentagem de fatores de risco para DAC nos<br />
pacientes com LES.<br />
Considerou-se o estilo de vida sedentário como<br />
sendo a prática de atividade física em uma frequência<br />
inferior a 2 vezes por semana, de baixa intensidade e<br />
com duração menor que 30 minutos por dia.<br />
Neste estudo, 70 (53,8%) pacientes<br />
apresentaram dislipidemia, todos receberam<br />
tratamento não medicamentoso (dieta e exercício<br />
físico), e 27,1% desses pacientes receberam<br />
tratamento medicamentoso. Observamos ainda<br />
que o controle da dislipidemia só foi possível<br />
em 11 (15,7%) pacientes. Em 31 (44,3%), que<br />
não apresentaram dislipidemia inicialmente,<br />
desenvolveram ao longo da evolução clínica. Vinte<br />
e oito (40%) dos pacientes mantiveram o perfil<br />
lipídico alterado ao longo de toda evolução clínica<br />
a despeito do tratamento clínico.<br />
Quanto ao tratamento, todos os pacientes<br />
haviam usado corticosteroides em algum momento do<br />
tratamento. Dos pacientes analisados, 85,9% estão em<br />
uso regular de prednisona. A dose média de prednisona<br />
foi de 10 mg/dia, variando de 2,5 a 60 mg/dia.<br />
Em relação ao uso de antimaláricos, 83,8%<br />
utilizaram em algum momento e 61,5% dos pacientes<br />
estão usando difosfato de cloroquina. O tempo<br />
médio de uso foi de 36 meses, variando de 3 a 126<br />
meses. Aproximadamente 78 pacientes realizaram<br />
fundoscopia, sendo observada impregnação por<br />
cloroquina em 10,3%.<br />
15<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
PERFIL CLÍNICO E LABORATORIAL DE PACIENTES COM<br />
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES)<br />
Sobre os imunossupressores, 30,7% dos<br />
pacientes estavam usando ciclosporina, azatioprina<br />
ou metotrexato no momento do estudo. O<br />
imunossupressor mais usado é a azatioprina. No<br />
momento da coleta de dados, 64,1% dos usuários<br />
de imunossupressor usavam azatioprina e 23,1%<br />
usavam também metotrexato.<br />
Foi observado que 16,2% dos pacientes<br />
realizaram pulso de metilprednisolona, sendo<br />
nefrite a indicação isolada mais frequente (72,2%).<br />
Aproximadamente 25,4% dos pacientes realizaram<br />
pulsoterapia com ciclofosfamida, sendo também a<br />
nefrite a indicação isolada mais frequente (76,7%).<br />
DISCUSSÃO<br />
O LES é uma doença de marcada predileção<br />
pelo sexo feminino, em uma proporção 9:1, afetando<br />
principalmente mulheres no seu período de vida<br />
reprodutivo. 1, 2, 3 O grande predomínio da raça não<br />
branca reflete a descendência étnica da Região<br />
Norte que, embora de colonização portuguesa e<br />
espanhola, sofreu grande incentivo à miscigenação<br />
com os povos indígenas no período colonial.<br />
Percebe-se uma população pobre, cujo poder<br />
aquisitivo não permite a compra de medicamentos<br />
sendo fundamental o bom funcionamento do<br />
Sistema Único de Saúde.<br />
Dentre os critérios de classificação do ACR para<br />
o lúpus, o mais encontrado foi o FAN. A pesquisa do<br />
FAN tem particular importância para o diagnóstico<br />
de lúpus. A positividade desse teste, embora não<br />
específico para o diagnóstico de LES, serve como<br />
triagem em função de sua alta sensibilidade (maior<br />
que 99%) e alto valor preditivo negativo. 8<br />
Em conformidade com outras estatísticas<br />
brasileiras, as manifestações cutâneas e articulares<br />
foram as mais frequentemente encontradas. 3,<br />
8<br />
A fotossensibilidade é uma manifestação que<br />
sabidamente aumenta com a incidência dos raios<br />
solares. 9, 10 Em pacientes com lúpus, há uma<br />
relação entre exposição à radiação ultravioleta,<br />
autoanticorpos, genética e outros fatores no<br />
desenvolvimento da fotossensibilidade. Os<br />
mecanismos podem incluir: modulação de<br />
autoanticorpos, efeitos citotóxicos, apoptose<br />
com expressão de autoantígenos, upregulation de<br />
moléculas de adesão e citocinas, indução de óxidonítrico<br />
sintase e DNA antigênico gerado por raios UV. 6<br />
Em um estudo avaliando 164 pacientes em região de<br />
clima equatorial, rash malar, fotossensibilidade e<br />
lúpus discoide foram encontrados em 60,4%, 66,5%<br />
e 34,8%, respectivamente. 11 No presente estudo, a<br />
porcentagem de acometimento dermatológico foi<br />
mais frequente que em outras séries, à exceção do<br />
1, 5, 8, 10, 11<br />
lúpus discoide.<br />
Os demais achados clínicos foram<br />
semelhantes ao descrito na literatura. 1, 8, 9, 11, 12, 13 O<br />
comprometimento vascular ocorre em 30 a 40% na<br />
fase ativa e ao longo da evolução. 1 Neste estudo,<br />
observou-se fenômeno de Raynaud em 12,3%,<br />
vasculite em 14,7% e livedo em 6,2% dos pacientes.<br />
Alterações renais foram encontradas em 41,5% dos<br />
pacientes, em conformidade com a literatura. 13<br />
Diferentes mecanismos, atuando isolados<br />
ou em conjunto, parecem estar implicados na<br />
patogênese da doença arterial coronariana (DAC)<br />
de pacientes com LES. 14 Os fatores de risco para<br />
doença coronariana na população em geral incluem<br />
estilo de vida sedentário, tabagismo, obesidade,<br />
dislipidemia (alteração do perfil lipídico), diabetes<br />
melito, história familiar de DAC prematura<br />
(mulheres com menos de 65 anos e homens com<br />
menos de 55 anos) e hipertensão. 14, 15 Pacientes<br />
com LES apresentam maior prevalência de fatores<br />
de risco reconhecidos para aterosclerose. 16, 17 Neste<br />
estudo, 93% da população apresenta pelo menos<br />
um fator de risco cardiovascular, sendo que mais<br />
da metade apresentam dislipidemia, sobrepeso/<br />
obesidade e sedentarismo, tendo destaque também<br />
a HAS com 40,8% de prevalência.<br />
Vários estudos em mulheres têm enfatizado<br />
o perfil lipídico como importante fator causal da<br />
doença coronária aterosclerótica. É consensual que<br />
o aumento dos níveis séricos de colesterol total, LDLcolesterol,<br />
triglicerídeos são fatores de risco para<br />
DAC, enquanto os níveis elevados de HDL-colesterol<br />
são protetores. 18 Alterações no perfil lipídico são um<br />
16<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Kelly Simone Castro dos Santos, Maíra Fernandes de Almeida,<br />
Thamara Karoline Perrone Maciel, Domingos Sávio Nunes de Lima<br />
dos mais frequentes fatores de risco para DAC em<br />
pacientes com LES. 17 Em 1992, um estudo mostrou<br />
que 56% das pacientes estudadas apresentaram<br />
alteração no perfil lipídico em algum momento da<br />
doença 17 e outro estudo relatou dislipidemia em<br />
46% dos pacientes. 19 Em nosso estudo, 70 (53,8%)<br />
pacientes apresentaram dislipidemia, todos<br />
receberam tratamento não medicamentoso (dieta e<br />
exercício físico) e 27,1% desses pacientes receberam<br />
tratamento medicamentoso. Observamos ainda que o<br />
controle da dislipidemia só foi possível em 11 (15,7%)<br />
pacientes. Em 31 (44,3%), que não apresentaram<br />
dislipidemia inicialmente, desenvolveram ao longo<br />
da evolução clínica. Vinte e oito (40%) dos pacientes<br />
mantiveram o perfil lipídico alterado ao longo de<br />
toda evolução clínica a despeito do tratamento<br />
clínico.<br />
Quanto ao tratamento, todos os pacientes<br />
haviam usado corticoide em algum momento da<br />
evolução. Os corticoides podem causar muitos<br />
efeitos colaterais a longo prazo. Os principais<br />
são: aumento da susceptibilidade a infecções,<br />
descompensação diabética, hipertensão arterial,<br />
necrose asséptica, síndrome de Cushing,<br />
17, 20<br />
osteoporose e aterosclerose.<br />
Independente do órgão ou sistema afetado,<br />
o uso contínuo de antimaláricos (difosfato<br />
de cloroquina: 4 mg/kg/dia ou sulfato de<br />
hidroxicloroquina: 6 mg/kg/dia) é indicado com a<br />
finalidade de reduzir a atividade da doença e tentar<br />
poupar corticoide em todos os pacientes com LES. 22,<br />
23<br />
Melhora do perfil lipídico e redução do risco de<br />
trombose são benefícios adicionais atribuídos ao<br />
uso de antimaláricos. 21, 22 Dos pesquisados, 83,8%<br />
dos pacientes utilizaram em algum momento e<br />
61,5% dos pacientes estão usando difosfato de<br />
cloroquina. O tempo médio de uso foi de 36 meses,<br />
variando de 3 a 126 meses.<br />
Em pacientes com tratamento refratário<br />
à corticoterapia, está indicado o uso de<br />
imunossupressores. Os imunossupressores<br />
mais usados foram a azatioprina seguida pelo<br />
metotrexate. Pulsoterapias com metilprednisolona<br />
e ciclofosfamida tiveram como indicação mais<br />
frequente a nefrite lúpica.<br />
CONCLUSÃO<br />
Em conclusão, dentro da variedade de<br />
manifestações clínicas encontradas no LES, estudouse<br />
o comportamento dessa patologia nos pacientes<br />
de um serviço de referência para tratamento de<br />
doenças do colágeno no Amazonas, mostrando uma<br />
visão preliminar das características dessa doença no<br />
Estado. A população em seguimento é constituída<br />
principalmente de pacientes jovens, do sexo<br />
feminino, não brancas e procedentes da capital<br />
e interior do Estado. A situação socioeconômica é<br />
desfavorável, muitas vezes necessitando do auxíliodoença<br />
ou da ajuda de familiares ou amigos para o<br />
sustento. As características clínicas, laboratoriais e<br />
história natural da doença se comportam de forma<br />
semelhante a outras séries da literatura, à exceção<br />
do comprometimento cutaneomucoso mais<br />
frequente neste trabalho. Na amostra analisada<br />
a presença de comorbidades é frequente, tendo<br />
quase toda a população algum fator de risco<br />
clássico para DAC. A terapêutica aplicada encontrase<br />
de acordo com as drogas padrão utilizadas no<br />
tratamento do LES.<br />
17<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
CÂNCER DE PULMÃO NO ESTADO DO AMAZONAS –<br />
UM ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO COM BASE HOSPITALAR<br />
CÂNCER DE PULMÃO NO ESTADO DO AMAZONAS –<br />
UM ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO COM BASE HOSPITALAR<br />
LUNG CANCER DIN THE STATE OF AMAZONAS AN<br />
EPIDEMILOGICAL STUDY BASED ON HOSPITAL<br />
Fernando Luiz Westphal*, Luiz Carlos Lima**, Maria do Socorro Lucena Cardoso***, José Corrêa Lima Netto****,<br />
Edson Oliveira Andrade*****, Andrey Salvione da Silva******, Rodrigo Padilha*******, Danielle Cristine Westphal*******<br />
RESUMO<br />
OBJETIVO: Analisar as características epidemiológicas do câncer de pulmão na cidade de Manaus.<br />
Este estudo avalia o quadro clínico predominante, prevalência de tabagismo, a carga tabágica, o meio<br />
diagnóstico mais utilizado e o tipo histológico encontrado. MÉTODOS: É um estudo retrospectivo de casos<br />
de câncer de pulmão, de janeiro de 1993 até dezembro de 2002. Os pacientes foram atendidos no <strong>Hospital</strong><br />
Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>, na Sociedade Beneficente Portuguesa e na Fundação Centro de Controle<br />
de Oncologia, em Manaus (Amazonas – Brasil). Os dados foram coletados dos prontuários, localizados<br />
nos arquivos médicos de cada localidade, incluindo o perfil epidemiológico, estado clínico, tabagismo,<br />
localização, meio diagnóstico e o tipo histológico. RESULTADOS: 441 pacientes se enquadraram no<br />
critério da amostra, dos quais 75,0% eram homens e 25,0% mulheres; com idade média de 61 anos; 53,3%<br />
tinham história de tabagismo; dentre os quais a carga tabágica foi 44,1 maços/ano; o tumor localizavase<br />
no pulmão direito em 57% dos casos e 43% no esquerdo; 48,1% dos pacientes apresentavam sintomas<br />
de tosse e 41,6% dores torácicas; a broncoscopia foi usada em 57,7% dos casos, e aspiração por agulha<br />
fina em 10,6% como diagnóstico; em relação ao tipo histológico, 63,7% dos casos foram encontrados<br />
carcinoma de células escamosas, e 24,0% adenocarcinoma. CONCLUSÃO: Na cidade de Manaus, o câncer<br />
de pulmão ocorre mais em homens, em idades avançadas; a maioria dos pacientes fuma e tem uma alta<br />
carga tabágica; tosse e dor torácica são os sintomas mais frequentes; carcinoma de células não pequenas<br />
(especialmente o carcinoma escamocelular) é a forma mais comum.<br />
Termos: Câncer, câncer de pulmão, neoplasias, epidemiologia, saúde pública.<br />
ABSTRACT<br />
OBJECTIVE: To analyze the epidemiological features of lung cancer in the city of Manaus. This study<br />
aims to evaluate the predominant clinical picture, smoking prevalence, tobacco smoking load, the<br />
diagnostic procedure, and the encountered histological type. METHODS: This is a retrospective study of<br />
lung cancer from January 1993 to December 2002. The patients were seen at Getúlio <strong>Vargas</strong> University<br />
<strong>Hospital</strong>, the Portuguese Beneficent Society, and the Oncology Control Center Foundation, in Manaus<br />
* Cirurgião Torácico, Doutor, Chefe da Divisão de Cirurgia Torácica da Universidade Federal do Amazonas<br />
** Cirurgião Torácico, Ph.D. Membro do Departamento de Cirurgia Torácica da Universidade Federal do Amazonas <strong>HUGV</strong> – Manaus,<br />
Brasil<br />
*** Professora, Doutora da faculdade de Medicina da UFAM.<br />
**** Cirurgião Torácico. Membro do Departamento de Cirurgia Torácica da Universidade Federal do Amazonas <strong>HUGV</strong>.<br />
***** Professor, Doutor da faculdade de Medicina da UFAM.<br />
****** Residente de Cirurgia Geral da Universidade Federal do Amazonas <strong>HUGV</strong><br />
******* Estudante de Medicina da Universidade Federal do Amazonas.<br />
******* Estudante de Medicina da Universidade Federal do Amazonas<br />
18<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Fernando Luiz Westphal, Luiz Carlos Lima, Maria do Socorro Lucena Cardoso, José Corrêa Lima Netto,<br />
Edson Oliveira Andrade, Andrey Salvione da Silva, Rodrigo Padilha, Danielle Cristine Westphal<br />
(Amazonas – Brazil). The data were collected from the charts, located in the medical file, including the<br />
epidemiological profile, clinical state, and the use of tobacco products, location, diagnostic procedure<br />
used and histological type. RESULTS: 441 patients were observed, of whom 75.0% were male and 25.0%<br />
female; with median age of 61 years; 53.3% had a history of tobacco use; among which, the smoking<br />
load was 44.1 packs/year; the tumor was located in the right lung in 57% and in the left in 43%; 48.1% of<br />
patients presented coughing and 41.6% chest pains; bronchoscopy was used in 57.5% of the cases, and<br />
fine needle aspiration in 10.6% as diagnostic procedure; in relation to the histological type, 63.7% of the<br />
cases were found to have squamous cell carcinoma, and 24.0% adenocarcinoma. CONCLUSION: In the<br />
city of Manaus, lung cancer occurs more frequently among men, in older age groups; most of the patients<br />
smoke and have high tobacco smoking load; cough and chest pain are the most frequent symptoms; nonsmall<br />
cell carcinoma (especially squamous cell carcinoma) is the most common form.<br />
MeSH terms: Cancer, lung cancer, neoplasm, epidemiology, public health.<br />
INTRODUÇÃO<br />
O câncer de pulmão é reconhecido como<br />
uma das neoplasias mais frequentes no mundo e<br />
aquele com a maior taxa de mortalidade. 1 No Brasil,<br />
é considerado o segundo câncer mais frequente<br />
entre homens e o quarto entre as mulheres. De<br />
acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca),<br />
foram estimados 27.170 novos casos, dos quais 990<br />
ocorrem no Estado do Amazonas. 2<br />
Entre essas pessoas, os homens representam<br />
65,7% dos casos e as mulheres 34,3%, mostrando que<br />
esse tumor acomete homens com mais frequência, na<br />
proporção de 1.91:1. 2 Em 2003, o Inca estimou 16.230<br />
óbitos por câncer de pulmão, e observaram que entres<br />
os cânceres está em primeiro lugar entre as causas de<br />
morte em homens e a segunda entre as mulheres (atrás<br />
apenas do câncer de mama), no Brasil. No Amazonas,<br />
a diferença ocorre apenas no sexo feminino, no qual<br />
ele ocupa o terceiro lugar entre as causas de morte<br />
por câncer, atrás do câncer de mama e de útero. 3<br />
A causa do câncer de pulmão está diretamente<br />
relacionada à exposição a determinadas substâncias<br />
cancerígenas conhecidas, como o tabaco, o principal<br />
agente cancerígeno, arsênico e amianto. 1 O risco de<br />
desenvolver câncer de pulmão entre os fumantes<br />
está diretamente relacionada à duração do hábito<br />
de fumar e de carga tabágica. 4 No passado, o<br />
tipo histológico mais comum era o carcinoma<br />
espinocelular; no entanto, desde os anos 70, houve<br />
um aumento nos casos de adenocarcinoma, que<br />
se tornou o tipo histológico de maior incidência.<br />
Acredita-se que esse fato ocorreu por conta da<br />
mudança nas características dos cigarros e do padrão<br />
de deposição de agentes cancerígenos no pulmão. 4<br />
Apesar disso, há países na Europa onde o carcinoma<br />
de células escamosas entre os homens é o mais<br />
comum. 5 Mais de 90% dos pacientes com câncer de<br />
pulmão apresentam alguns sintomas no início da<br />
doença; no entanto, a suspeita só surge geralmente<br />
após uma radiografia de tórax modificado. 6<br />
A Pesquisa disponível atualmente relata<br />
algumas características importantes em algumas<br />
séries na literatura, 7-10 tais como sinais e sintomas<br />
iniciais, alterações radiológicas, o hábito tabágico<br />
e os tipos histológicos mais frequentes. O<br />
objetivo deste estudo, portanto, foi obter dados<br />
epidemiológicos de pacientes submetidos ao<br />
tratamento da neoplasia pulmonar de acordo com<br />
os centros de referência para doenças do tórax, na<br />
cidade de Manaus.<br />
MATERIAL E MÉTODOS<br />
Os critérios de inclusão<br />
Os prontuários dos pacientes diagnosticados<br />
19<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
CÂNCER DE PULMÃO NO ESTADO DO AMAZONAS –<br />
UM ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO COM BASE HOSPITALAR<br />
com câncer de pulmão admitidos no <strong>Hospital</strong><br />
Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>, Sociedade<br />
Portuguesa Beneficente do Amazonas e Fundação<br />
Centro de Controle de Oncologia do Amazonas,<br />
na cidade de Manaus/Brasil, de janeiro de 1993 a<br />
dezembro de 2002 foram revisados. Este projeto<br />
foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética<br />
da Fundação Centro de Controle de Oncologia do<br />
Estado do Amazonas (FCECON). Todos os pacientes<br />
com diagnóstico histopatológico específico<br />
de câncer de pulmão primário realizado pela<br />
análise de material obtido por meio de biópsias<br />
ou de ressecção foram incluídos. A classificação<br />
histopatológica do câncer de pulmão utilizado foi<br />
o da Organização Mundial da Saúde. 11<br />
Os dados dos pacientes foram coletados<br />
por meio de um protocolo, incluindo o perfil<br />
epidemiológico, hábitos de tabagismo e carga<br />
tabágica, aspectos clínicos, radiológicos com<br />
a medida do maior diâmetro da massa em<br />
centímetros, localização, métodos de diagnóstico<br />
e tipos histológicos. Quanto ao quadro clínico,<br />
os itens analisados foram: tosse, dispneia, dor<br />
torácica, febre, hemoptise e fraqueza, como<br />
sinais e sintomas relacionados ao tumor primário;<br />
rouquidão, disfasia, síndrome da veia cava superior<br />
e síndrome de Horner como manifestações de<br />
propagação extratorácica do tumor.<br />
Análise Estatística<br />
Os dados foram analisados pelos testes<br />
de Fisher e do qui-quadrado com intervalo de<br />
confiança de 95%, utilizando o programa Epi-info<br />
para computadores. O teste do qui-quadrado de<br />
Pearson foi utilizado para avaliar a associação<br />
entre variáveis categóricas e o teste de t-Student<br />
foi utilizado para a comparação das médias.<br />
RESULTADOS<br />
Perfil epidemiológico<br />
Entre os pacientes com suspeita de câncer<br />
de pulmão, 441 preencheram os critérios de<br />
inclusão, dos quais 327 eram homens e 114<br />
mulheres. A faixa etária esteve entre 9 e 86 anos<br />
(média de 61 anos). A média de idade em homens<br />
e mulheres foi de 59 e 62 anos, respectivamente.<br />
= 13,35, p = 0,0097). A comparação das médias<br />
de idade entre os sexos (Gráfico 1) pelo teste de<br />
t-Student mostrou uma diferença estatisticamente<br />
significativa (χ 2 = 13,35, p = 0,0097).<br />
O Gráfico 2 mostra que a incidência de<br />
câncer de pulmão em ambos os sexos tende a ser<br />
igual, ao longo do tempo.<br />
Gráfico 1 – Distribuição dos gêneros e intervalos de idade.<br />
20<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Fernando Luiz Westphal, Luiz Carlos Lima, Maria do Socorro Lucena Cardoso, José Corrêa Lima Netto,<br />
Edson Oliveira Andrade, Andrey Salvione da Silva, Rodrigo Padilha, Danielle Cristine Westphal<br />
Gráfico 2 – Distribuição anual: a incidência de câncer de pulmão entre gêneros.<br />
Sinais e sintomas<br />
Os sinais e sintomas mais comuns causados<br />
pelo tumor primário foram: (214) dor torácica,<br />
(185) fraqueza (147), dispneia (133), hemoptise<br />
(128), tosse e febre (61). Nos setenta pacientes<br />
com problemas relacionados com a invasão<br />
intratorácica, os principais sintomas encontrados<br />
no momento do diagnóstico foram mediastinais<br />
em 64, e da abertura torácica superior em 6,<br />
rouquidão em 37 pacientes e síndrome da veia<br />
cava superior em 23.<br />
O hábito de fumar<br />
Houve evidências relacionadas ao hábito de<br />
fumar em 244 casos de câncer de pulmão, entre os<br />
quais 237 eram fumantes e 7 negaram tal hábito.<br />
A carga tabágica (em 112 casos) média foi de 44,1<br />
maços/ano, variando de 5,3-126. Nos homens,<br />
a média foi de 45,2 maços/ano, enquanto nas<br />
mulheres foi de 37,1; no entanto, não foi observada<br />
diferença significativa entre ambos (p = 0,2350).<br />
Aspectos radiológicos<br />
Dos 121 pacientes da amostra com aspecto<br />
radiográfico descrito no gráfico, os tumores estavam<br />
presentes como uma massa sólida em 26 casos, 21<br />
como uma consolidação, em 20 como atelectasias<br />
e nódulo em cada um, e 16 de derrame pleural. O<br />
tamanho do tumor, em 108 pacientes, na sua maior<br />
dimensão, teve uma média de 6,2 cm, variando de<br />
1,8 a 15 cm. O aspecto do tumor na tomografia<br />
foi descrita em 184 pacientes, como uma massa e<br />
atelectasia sendo os principais tipos encontrados,<br />
com 90 e 36 casos, respectivamente.<br />
Os procedimentos de diagnóstico<br />
Os métodos mais utilizados do diagnóstico<br />
de câncer de pulmão foram broncoscopia em<br />
256 pacientes, aspiração por agulha fina em 47,<br />
histopatologia pós-operatória em 28, a biópsia<br />
do linfonodo em 22, a biópsia por congelação<br />
em 11, biópsia pulmonar por toracotomia em 11,<br />
citologia do derrame pleural em 9, biópsia pleura<br />
em 8, mediastinoscopia em 5, e em 8 casos vários<br />
métodos foram utilizados.<br />
Tipos histológicos<br />
Entre os tipos histológicos, o carcinoma de<br />
células escamosas foi o mais frequente, observado em<br />
281 (63,7%) pacientes, seguido do adenocarcinoma,<br />
em 106 casos (24,0%) (9 carcinomas de células<br />
alveolares). Carcinoma de pequenas células foi<br />
descrito em 39 (8,9%), carcinoma de grandes<br />
células em 15 (3,4%). A incidência do carcinoma<br />
espinocelular vem reduzindo ao longo do tempo,<br />
enquanto o adenocarcinoma manteve-se constante<br />
(Gráfico 3), ao contrário do que tem sido observada<br />
no carcinoma de células pequenas, no qual tem<br />
havido um aumento no número de casos.<br />
21<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
CÂNCER DE PULMÃO NO ESTADO DO AMAZONAS –<br />
UM ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO COM BASE HOSPITALAR<br />
Por meio da análise da distribuição por sexo versus tipos histológicos, uma diferença significativa<br />
da amostra pelo teste de Kruskal-Wallis (χ 2 = 13,333, p = 0,003) foi observada (Tabela 1).<br />
Gráfico 3 – Série anual da incidência dos tipos histológicos.<br />
Local do tumor<br />
GÊNERO<br />
Tipos Histológicos Feminino Masculino TOTAL<br />
Células escamosas 53 228 281 (63,7%)<br />
Adenocarcinoma 49 57 106 (24,0%)<br />
Pequenas células 9 30 39 (8,9%)<br />
Grandes células 3 12 15 (3,4%)<br />
Tabela 3– Tipo histológico versus gênero (n = 441).<br />
Dos 337 pacientes avaliados, a distribuição<br />
entre os pulmões foi de 192 casos no lado direito<br />
e 145 no lado esquerdo. Entre estas, o câncer<br />
foi localizado no lóbulo superior direito em 81<br />
pacientes, lóbulo superior esquerdo em 62, lobo<br />
inferior direito em 39, lóbulo inferior esquerdo em<br />
25 e lobo médio em oito pacientes.<br />
DISCUSSÃO<br />
O câncer de pulmão é mais comum no sexo<br />
masculino. O predomínio no sexo masculino tem<br />
sido relatado em uma proporção de 2:1, na maioria<br />
dos países europeus, similar ao nosso estudo.<br />
No México, uma relação de 1,6:1 foi observada,<br />
que é considerado inferior à de muitos países das<br />
Américas. 10, 12 Em nosso estudo, encontramos uma<br />
relação de 2,8:1, quase igual ao observado por<br />
outros autores, 13 de 2,7:1, em pacientes atendidos<br />
em São Paulo. Tem sido afirmado que a doença<br />
afeta principalmente os idosos, 10 nos quais a maior<br />
22<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Fernando Luiz Westphal, Luiz Carlos Lima, Maria do Socorro Lucena Cardoso, José Corrêa Lima Netto,<br />
Edson Oliveira Andrade, Andrey Salvione da Silva, Rodrigo Padilha, Danielle Cristine Westphal<br />
incidência está entre 50 e 70 anos observada em<br />
carcinoma de não pequenas células 7, 14 similar<br />
ao observado em nossa pesquisa.<br />
Em estudos<br />
realizados por uma análise baseada em registro<br />
de 97.281 pacientes com câncer de pulmão<br />
diagnosticados na Dinamarca de 1943 a 1994, 8 e<br />
um estudo prospectivo de material total de câncer<br />
do pulmão de um condado da Suécia de 1997 a<br />
1999, todos os dados sobre os gêneros, sintomas,<br />
fases e tabagismo também foram semelhantes aos<br />
nossos. 9 Houve uma diferença significativa entre<br />
as médias de idade entre os sexos, que também foi<br />
observado no presente estudo.<br />
Desde 1960, a incidência entre as mulheres<br />
foi aumentando gradualmente acompanhando<br />
o movimento de emancipação feminina e da<br />
globalização.<br />
Ao mesmo tempo, um aumento<br />
gradual da mortalidade tem sido observado,<br />
superando o câncer de mama. 4 Essa tendência tem<br />
sido observada na série anual de nossos pacientes,<br />
indicando um aumento previsto do número de<br />
5, 13<br />
mulheres fumantes.<br />
No momento do diagnóstico, o paciente<br />
raramente é assintomático. Nos pacientes com<br />
câncer de pulmão, foi comprovado que apenas<br />
7% 9 e 11%, 15 respectivamente, apresentaram<br />
uma queixa no diagnóstico. Deve ser considerado<br />
que, nesses estudos, 36% e 19,7% dos pacientes,<br />
respectivamente, foram diagnosticados em<br />
estágios iniciais. Em nossa amostra, apenas 1%<br />
estava assintomática, conflitantes com os estudos<br />
anteriores. Tosse foi a queixa mais comum, também<br />
9, 13-15<br />
confirmado por esses e outros autores.<br />
A exposição à fumaça do tabaco está<br />
diretamente relacionada ao desenvolvimento de<br />
câncer de pulmão. Essa situação é evidenciada<br />
por muitos estudos que demonstram a incidência<br />
entre 67% e 92%. 10, 15-18 Na nossa amostra, também<br />
foi detectado que 237 (97,1%) casos estavam<br />
ligados ao hábito de fumar. Nos homens, esse<br />
9, 12<br />
hábito é mais comum do que nas mulheres.<br />
Estes autores referem uma incidência de 92%<br />
no sexo masculino e 79% no sexo feminino. A<br />
incidência observada em nosso estudo foi a de<br />
98,6% nos homens e 86,8% nas mulheres.<br />
O estudo prospectivo foi realizado em<br />
pacientes diagnosticados com câncer de pulmão<br />
de 1997 a 2000, no Departamento de Doenças<br />
Respiratórias do <strong>Hospital</strong> Universitário de Rouen,<br />
França. 19 Em relação ao tabagismo, exposição ao<br />
amianto e localização do câncer de pulmão, é<br />
importante notar uma carga tabágica média de<br />
42,3 maços/ano, que é análogo ao nosso estudo.<br />
Apesar da diferença de carga de tabagismo<br />
entre os sexos, este não mostrou significância,<br />
fato relatado anteriormente, 13 que também foi<br />
observado em nosso estudo.<br />
O pulmão direito foi o mais frequentemente<br />
afetado. Há um relatório de uma frequência de<br />
63,2%, 9 fato também observado em nosso estudo<br />
em 57% dos pacientes. Esses mesmos autores<br />
identificaram os lóbulos superiores dos pulmões<br />
como os lugares em que o câncer se desenvolve mais<br />
comumente, perto de 42% dos casos. Um índice<br />
similar de 46% foi relatado, 20 e em nossa pesquisa<br />
lobos superiores foram acometidos em 63%.<br />
Em mulheres francesas, de acordo com<br />
Grivaux et al., 21 broncoscopia seguido por<br />
aspiração com agulha fina foram identificados<br />
como os procedimentos de diagnóstico utilizados<br />
mais comumente para o câncer de pulmão. Em<br />
nosso estudo, esse fato também é verdadeiro,<br />
mostrando que a broncoscopia é um procedimento<br />
diagnóstico valioso, principalmente em lesões<br />
22, 23<br />
centrais da árvore brônquica.<br />
Como frequentemente em países<br />
desenvolvidos, como Dinamarca, 8 como nas<br />
nações em desenvolvimento, como no México, 10<br />
o adenocarcinoma foi identificado como o tipo<br />
histológico mais comum entre as mulheres,<br />
enquanto nos homens foi o carcinoma de células<br />
escamosas predominantes na maioria dos países<br />
europeus. 5 No Brasil, muitos estudos têm mostrado<br />
que o carcinoma espinocelular é o mais frequente,<br />
7, 14, 20, 23, 24<br />
com médias que variam de 47% a 60,3%.<br />
No Estado do Amazonas, o carcinoma epidermoide é<br />
também o mais comum entre os homens, bem como<br />
em mulheres. Por outro lado, há outra pesquisa, na<br />
Suécia, que mostra mulheres com adenocarcinoma<br />
como o mais comum. 9 Em uma análise da incidência<br />
do tipo histológico de câncer de pulmão ao longo<br />
do tempo, uma redução no número de casos de<br />
23<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
CÂNCER DE PULMÃO NO ESTADO DO AMAZONAS –<br />
UM ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO COM BASE HOSPITALAR<br />
carcinoma de células escamosas e um aumento no<br />
adenocarcinoma foram observados, fatos relatados<br />
por alguns autores. 4, 5, 14 Apesar da incidência<br />
de adenocarcinoma, em nossa pesquisa, que se<br />
manteve estável ao longo do tempo, o declínio<br />
no número de casos de carcinoma de células<br />
escamosas foi comprovado. Isto pode ser por conta<br />
da aplicação de filtros de cigarros, o que obriga os<br />
fumantes a fazer inalações mais profundas e de<br />
reter mais o fumo, pela pequena quantidade de<br />
nicotina inalada. Assim, o depósito das substâncias<br />
cancerígenas começa nas regiões distais da árvore<br />
brônquica, onde o adenocarcinoma se desenvolve<br />
na maioria dos casos. 5<br />
Tendo em conta as limitações da<br />
investigação deste estudo retrospectivo, por meio<br />
dos prontuários de pacientes como a fonte de<br />
obtenção de dados, não foi possível realizar uma<br />
análise completa de algumas variáveis incluídas no<br />
protocolo do estudo.<br />
Em conclusão, os pacientes submetidos ao<br />
tratamento de câncer de pulmão na cidade de<br />
Manaus são homens, com idade média de 60 anos,<br />
fumantes, com carcinoma espinocelular como<br />
o tipo histológico principal, que geralmente são<br />
sintomáticos no momento do diagnóstico.<br />
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25.<br />
26.<br />
24<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Sileno de Queiroz Fortes Filho, Ana Carolina Quincó Muerza, Maíra Fernandes de Almeida, Luiz Fernando de<br />
Souza Passos, Domingos Sávio Nunes<br />
PREVALÊNCIA DE SÍNDROME METABÓLICA EM<br />
PACIENTES COM LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO NA<br />
AMAZÔNIA OCIDENTAL<br />
THE PREVALENCE OF METABOLIC SYNDROME IN PATIENTS WITH SYSTEMIC LUPUS<br />
ERYTHEMATOSUS IN THE OCIDENTAL AMAZONIA<br />
Sileno de Queiroz Fortes Filho*, Ana Carolina Quincó Muerza*,<br />
Maíra Fernandes de Almeida**, Luiz Fernando de Souza Passos***, Domingos Sávio Nunes****<br />
RESUMO<br />
OBJETIVO: Analisar a prevalência de síndrome metabólica (SM), conjunto de fatores de risco cardiovascular<br />
usualmente relacionados à deposição central de gordura e à resistência insulínica, em pacientes com<br />
Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) e correlacionar com dados demográficos, clínicos, terapêuticos e<br />
outros fatores de risco cardiovascular. MÉTODOS: Participaram da pesquisa 125 mulheres, maiores de 18<br />
anos, com idade média de 34,5 ± 10,2 anos, com diagnóstico de LES há no mínimo um ano. O diagnóstico<br />
da SM foi definido segundo os critérios de 2002 do National Cholesterol Education Program (NCEP).<br />
As variáveis analisadas foram idade, idade de início da doença, tempo de doença, critérios de 1997<br />
do American College of Rheumatology (ACR) preenchidos, tabagismo, menopausa, sedentarismo, LDLcolesterol,<br />
uso de antimaláricos e dose acumulada de corticoesteroides. RESULTADOS: Das 125 pacientes<br />
estudadas, 60 (48%) apresentaram SM. A presença de SM foi significativamente associada ao acometimento<br />
renal (p
PREVALÊNCIA DE SÍNDROME METABÓLICA EM PACIENTES COM LÚPUS<br />
ERITEMATOSO SISTÊMICO NA AMAZÔNIA OCIDENTAL<br />
presence of MS was significantly associated with renal injury (p
Sileno de Queiroz Fortes Filho, Ana Carolina Quincó Muerza, Maíra Fernandes de Almeida, Luiz Fernando de<br />
Souza Passos, Domingos Sávio Nunes<br />
Após assinar o termo de consentimento livre<br />
e esclarecido, as pacientes foram submetidas à<br />
anamnese e exame físico direcionados para a<br />
pesquisa. A medida da circunferência abdominal<br />
foi realizada com fita métrica simples, na metade<br />
da distância entre a crista ilíaca e o rebordo<br />
costal inferior. 11 A pressão arterial foi aferida na<br />
posição sentada, após dez minutos de repouso.<br />
O diagnóstico de síndrome metabólica foi<br />
realizado pela presença de 3 ou mais dos critérios<br />
propostos pelo National Cholesterol Education<br />
Program III (NCEP-ATP III) 17 também utilizados<br />
pela I Diretriz Brasileira de Síndrome Metabólica: 11<br />
circunferência abdominal > 88 cm, triglicerídeos<br />
≥150 mg/dL, HDL-colesterol < 50 mg/dL, pressão<br />
arterial sistólica ≥ 130 mmHg ou diastólica ≥ 85<br />
mmHg e glicemia de jejum ≥ 110 mg/dL. Para os<br />
componentes pressão arterial e triglicerídeos, o uso<br />
de medicação anti-hipertensiva ou hipolipemiante<br />
foi considerado suficiente para o preenchimento<br />
do critério de inclusão respectivo, 11 assim como o<br />
diagnóstico prévio autorrelatado de diabetes.<br />
As características demográficas e clínicas<br />
pesquisadas foram: idade em anos, idade do início<br />
do LES em anos, o tempo de evolução da doença<br />
estimado em meses e o número de critérios<br />
diagnósticos para o LES segundo o ACR (mínimo de<br />
quatro e máximo de onze).<br />
Outros tradicionais fatores de risco<br />
cardiovasculares também foram analisados:<br />
lipoproteína de baixa densidade (LDL-colesterol)<br />
alterada quando superior ou igual a 100 mg/dL,<br />
presença de tabagismo, sedentarismo e menopausa.<br />
Para tabagismo foi considerado o fumo atual ou nos<br />
últimos seis meses, sedentarismo para aquelas que<br />
não realizam atividade física no mínimo três vezes<br />
por semana por trinta minutos e menopausa para<br />
aquelas que não menstruam há um ano ou mais.<br />
Com relação às medicações utilizadas, foram<br />
pesquisados antimaláricos e corticoesteroides. Os<br />
antimaláricos foram avaliados pelo uso nos últimos<br />
cinco anos de tratamento e os corticoesteroides<br />
pelo uso nos últimos 12 meses, ambos de maneira<br />
contínua ou fragmentada. Para aquelas que<br />
utilizavam corticoesteroides, foram descritas as<br />
doses acumuladas de um ano anterior à pesquisa.<br />
Análise Estatística<br />
Frequências absolutas e relativas para os<br />
dados qualitativos foram obtidas por contagem<br />
direta; média e desvio-padrão (DP) foram utilizados<br />
para descrição dos dados quantitativos.<br />
Para analisar a associação entre as variáveis<br />
categóricas utilizou-se o teste do Qui-quadrado<br />
de Pearson, e quando não satisfeitas as condições<br />
para aplicação do teste de Pearson, utilizouse<br />
o teste com correção de Yates. Foi aplicada<br />
regressão logística e intervalo de confiança ao<br />
nível de 95% (IC95%) para cálculo do odds ratio<br />
associado às variáveis consideradas. Na análise<br />
de comparação das médias utilizou-se o teste<br />
t de Student quando os dados encontravam-se<br />
Figura 1 – Distribuição dos critérios nas pacientes com síndrome metabólica e lúpus<br />
eritematoso sistêmico (n=60)<br />
27<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
PREVALÊNCIA DE SÍNDROME METABÓLICA EM PACIENTES COM LÚPUS<br />
ERITEMATOSO SISTÊMICO NA AMAZÔNIA OCIDENTAL<br />
normalmente distribuídos e o teste de Mann-Whitney quando rejeitada a hipótese de normalidade.<br />
O software utilizado para a construção do banco de dados e análise foi o programa Epi-Info versão 3.3 e o<br />
nível de significância utilizado nos testes foi de 5%.<br />
RESULTADOS<br />
Figura 2 – Distribuição do número de critérios da síndrome metabólica em<br />
pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (n=125).<br />
Dos 125 pacientes, 60 apresentaram a SM, configurando uma taxa de 48%. Os critérios mais<br />
Síndrome metabólica<br />
Sim (n = 60) Não (n = 65) P<br />
Média de idade (em anos) 35,7 ± 9,6 33,4 ± 10,6 0,208(*)<br />
Média de idade de início da doença (em anos) 28,2 ± 10,1 27,2 ± 9,5 0,570(*)<br />
Tempo de doença (em meses) 87,8 ± 61,2 74,0 ± 53,8 0,183(*)<br />
Rash malar [n(%)] 44 (73,3) 51 (78,5) 0,502(*)<br />
Úlcera oral [n(%)] 16 (25,0) 15 (24,6) 0,906(*)<br />
Lesão discoide [n(%)] 4 (6,7) 5 (7,7) 0,900(†)<br />
Fotossensibilidade [n(%)] 46 (76,7) 57 (87,7) 0,105(*)<br />
Artrite não erosiva [n(%)] 57 (95,0) 58 (89,2) 0,390(†)<br />
Serosite [n(%)] 23 (38,3) 17 (26,2) 0,145(*)<br />
Critério hematológico n(%)] 29 (48,3) 35 (53,8) 0,538(*)<br />
Critério renal [n(%)] 28 (46,7) 10 (15,4) < 0,001(*)<br />
Critério sorológico [n(%)] 32 (53,3) 29 (44,6) 0,323(*)<br />
Critério neurológico [n(%)] 8 (13,3) 5 (7,7) 0,302(*)<br />
Anticorpo antinuclear [n(%)] 55 (91,7) 61 (93,8) 0,900(†)<br />
Tabagismo [n(%)] 1 (1,7) 2 (3,1) 0,944(†)<br />
Menopausa [n(%)] 8 (52,6) 11 (47,4) 0,576(*)<br />
LDL-c ≥ 100mg/dL n(%)] 44 (73,3) 41 (63,1) 0,141(*)<br />
Sedentarismo n(%)] 42 (70,0) 39 (60,0) 9<br />
Tabela 1 – Dados comparativos das pacientes com lúpus eritematoso sistêmico com e sem síndrome<br />
metabólica atendidas no Ambulatório Araújo Lima, Manaus-AM.<br />
(*) – Teste do Qui-quadrado de Pearson (†) – Teste do Qui-quadrado de Yates<br />
28<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Sileno de Queiroz Fortes Filho, Ana Carolina Quincó Muerza, Maíra Fernandes de Almeida, Luiz Fernando de<br />
Souza Passos, Domingos Sávio Nunes<br />
prevalentes em ordem decrescente foram:<br />
HDL baixo (91,7%), circunferência abdominal<br />
aumentada (83,3%), hipertensão arterial (78,3%),<br />
hipertrigliceridemia (70,0%) e glicemia de jejum<br />
alterada (6,7%) (Figura 1).<br />
Quanto ao número de critérios para a SM<br />
entre todas as mulheres estudadas, 7 (5,6%) não<br />
apresentavam nenhum critério, 22 (17,6%) um<br />
critério, 36 (28,8%) dois critérios, 39 (31,2%) três<br />
critérios e 21 (16,8%) quatro critérios. Nenhuma<br />
paciente apresentou cinco critérios (Figura 2).<br />
A população estudada apresentava idade<br />
média de 34,5 ± 10,2 anos, idade média do início de<br />
doença de 27,7 ± 9,8 anos e tempo de doença médio<br />
de 80,6 ± 50,7 meses com mediana de 72 meses. Não<br />
foi encontrada diferença estatística da idade, idade<br />
do início da doença e tempo de doença em meses em<br />
relação à presença de síndrome metabólica ao nível<br />
de 5% de significância (Tabela 1).<br />
Em relação ao número de critérios do ACR para<br />
o diagnóstico de LES, observou-se média de 5,7 ± 1,5<br />
critérios nas pacientes com síndrome metabólica,<br />
que foi estatisticamente igual às pacientes sem a<br />
síndrome, com média de 5,3 ± 1.1 (p=0,309).<br />
A frequência dos critérios do ACR para o lúpus<br />
nas 125 pacientes estudadas foi: eritema malar<br />
Síndrome<br />
metabólica<br />
Sim<br />
Não<br />
N % N<br />
%<br />
Antimaláricos(†) 27 50,0 36 69,2 0,044(*)<br />
Corticoestoroides(†) 46 85,2 49 94,2 0,126(*)<br />
Dose cumulativa média<br />
de corticoestoróides(‡)<br />
5733,15 ±<br />
3276,20<br />
3909,33<br />
±<br />
3135,89<br />
p<br />
0,007(*)<br />
Tabela 2 – Antimaláricos e corticoesteroides das pacientes com<br />
lúpus eritematoso sistêmico com e sem síndrome metabólica<br />
atendidas no Ambulatório Araújo Lima, Manaus-AM.<br />
(*) – Teste do Qui-quadrado de Pearson<br />
(†) - Das 125 pacientes estudadas, 106 tinham esses dados disponíveis (54 com síndrome metabólica e 52 sem síndrome<br />
metabólica)<br />
(‡) - Dose cumulativa média de prednisona nos últimos 5 anos das pacientes que faziam uso de corticoesteroides (46 com<br />
síndrome metabólica e 49 sem síndrome metabólica)<br />
(76%), úlcera oral (24,8%), lesão discoide (7,2%),<br />
fotossensibilidade (82,4%), artrite não erosiva (92%),<br />
serosite (32%), critério hematológico (51,2%), critério<br />
renal (30,4%), critério sorológico (48,8%), critério<br />
neurológico (10,4%) e anticorpo antinuclear (92,8%).<br />
O acometimento renal foi o único critério<br />
que apresentou prevalência superior entre as<br />
pacientes com síndrome metabólica, 73,7% com<br />
SM e 26,3% sem SM (p
PREVALÊNCIA DE SÍNDROME METABÓLICA EM PACIENTES COM LÚPUS<br />
ERITEMATOSO SISTÊMICO NA AMAZÔNIA OCIDENTAL<br />
um odds ratio de 0,44 com IC95% (0,20-0,98).<br />
Quanto ao uso de corticoesteroides, a dose média<br />
acumulada de prednisona ou equivalente nos últimos<br />
12 meses nas pacientes com síndrome metabólica foi<br />
significativamente superior à dose média daquelas<br />
sem SM (5733,15 mg ± 3276,20 contra 3909,32<br />
mg ± 3135,88 [p=0,007]) (Tabela 2). O uso de<br />
corticoesteroides foi, portanto, um fator contribuinte<br />
para a presença da síndrome metabólica.<br />
DISCUSSÃO<br />
A síndrome metabólica apresentou<br />
alta prevalência – em torno de 50% – entre<br />
as mulheres portadoras de lúpus eritematoso<br />
sistêmico acompanhadas no Ambulatório Araújo<br />
Lima da Universidade Federal do Amazonas, em<br />
Manaus. Poucos trabalhos na literatura reportam<br />
dados sobre síndrome metabólica em populações<br />
lúpicas, apontando prevalências entre 16 e 32%. 18-<br />
22<br />
Em um estudo casos e controles envolvendo<br />
102 pacientes nos Estados Unidos encontrouse<br />
significância estatística apenas quando<br />
utilizados os critérios da OMS para SM – 32,4%<br />
em pacientes com LES e 10,9% nos controles.<br />
Já com os critérios do ATP-III a frequência entre<br />
os dois grupos foi considerada similar, 29,4% e<br />
19,8%, respectivamente. Neste mesmo trabalho,<br />
a resistência insulínica, base da síndrome<br />
metabólica juntamente com a obesidade central,<br />
foi associada a níveis aumentados de marcadores<br />
inflamatórios, proteína C reativa e velocidade de<br />
hemossedimentação, em pacientes com LES. 21<br />
No único trabalho brasileiro do gênero, Telles et<br />
al. 22 relataram a prevalência de 28,4% de SM em<br />
pacientes lúpicas do Estado de Minas Gerais.<br />
Países classificados como em desenvolvimento<br />
possuem uma alta prevalência de SM em sua<br />
população geral. 23, 24, 25 Estudos epidemiológicos<br />
em mulheres turcas, 23 indianas 24 e mexicanas 25<br />
relatam a presença de SM em 39,1%, 39,9% e 59,9%,<br />
respectivamente. No Brasil, a síndrome metabólica<br />
chega a 36% em mulheres de classe econômica<br />
menos favorecida, 26 apesar de não termos<br />
avaliado o perfil socioeconômico, a população<br />
estudada provavelmente possui baixo poder<br />
aquisitivo. Dessa forma, consideramos plausível<br />
a alta prevalência de SM entre as pacientes com<br />
LES residentes na região amazônica, constituindose<br />
em um importante fator de risco para doença<br />
cardiovascular nessa população.<br />
A obesidade entre as pacientes com LES é<br />
pouco prevalente; a média do índice de massa<br />
corporal não ultrapassa 30 kg/cm 2 em trabalhos<br />
que avaliam os tradicionais fatores de risco neste<br />
grupo. 8, 22, 27-29 Apenas 20,6% de 172 pacientes eram<br />
obesas em uma coorte brasileira. 22 Já a deposição<br />
central de gordura apresenta frequência maior que<br />
45% nesta população. 21, 22, 29 Em nosso estudo, das<br />
125 pacientes avaliadas, 48% tinham circunferência<br />
abdominal aumentada e entre as mulheres com SM<br />
foi o segundo critério mais presente, 83,3%.<br />
A maioria das pacientes no presente estudo<br />
tinha dislipidemia. O HDL-colesterol estava<br />
alterado em 75,2% das mulheres estudadas, o<br />
LDL-colesterol em 68% e os triglicerídeos em<br />
49,6%. Quando analisadas apenas as mulheres<br />
com SM, estes percentuais subiam para 91,7%,<br />
73,3% e 70,0%, respectivamente. A dislipidemia no<br />
LES é descrita em todos os trabalhos referentes<br />
a fatores de risco cardiovascular. 8, 9, 22, 27-30 A<br />
resposta inflamatória no lúpus é considerada uma<br />
das responsáveis pelo perfil lipídico aterogênico,<br />
correlacionando-se com aumento do VLDLcolesterol,<br />
do LDL-colesterol e dos triglicerídeos<br />
e diminuição do HDL-colesterol. 31 Um fator ainda<br />
mais grave nas alterações lipídicas dos pacientes<br />
com LES é a presença em maiores níveis de<br />
partículas pequenas e densas de LDL-colesterol,<br />
consideradas mais danosas pelo maior potencial<br />
de oxidação e indução de resposta inflamatória na<br />
placa aterogênica. 9 Logo, a recomendação atual é<br />
considerar níveis ideais de LDL-colesterol abaixo<br />
de 100 mg/dL para esse grupo de pacientes. 32<br />
Estudos casos e controles são unânimes<br />
em revelar maior prevalência de hipertensão em<br />
pessoas com LES. 8, 28, 30, 33 Trabalhos que utilizam<br />
exames de imagem para relatar a maior presença<br />
de aterosclerose subclínica também confirmam<br />
30<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Sileno de Queiroz Fortes Filho, Ana Carolina Quincó Muerza, Maíra Fernandes de Almeida, Luiz Fernando de<br />
Souza Passos, Domingos Sávio Nunes<br />
este dado. 27, 29, 34 Em nosso trabalho, a pressão<br />
arterial sistêmica esteve aumentada em 55,6% das<br />
125 pacientes e em 78,3% daquelas com SM.<br />
Com relação à intolerância à glicose em<br />
jejum, apenas 7 (5,6%) de todas as mulheres<br />
estudadas apresentaram tal critério; destas, 4<br />
possuíam SM. O número total, porém, aumenta para<br />
18 (14,5%) quando se considera alterado valores de<br />
glicemia acima de 100 mg/dL, dado não descrito<br />
nos resultados. Bruce e colaboradores relatam<br />
que entre 5 e 7% das pacientes com LES tornamse<br />
diabéticas e aquelas em uso de altas doses de<br />
corticoesteroides são as mais vulneráveis. 35<br />
A idade elevada e o maior tempo de evolução<br />
da doença são fatores agravantes para eventos<br />
coronarianos ou acidentes vasculares cerebrais. 36,<br />
37<br />
Em dois trabalhos, um deles realizado no Brasil,<br />
que avaliaram eventos secundários entre os quais<br />
a aterosclerose em pacientes com LES, a média<br />
de idade superava os 40 anos e o tempo médio de<br />
evolução da doença era maior que dez anos. 36, 37 A<br />
idade avançada ao diagnóstico também é descrita<br />
como fator de risco para doenças cardiovasculares. 3<br />
Em nosso estudo não houve diferença estatística<br />
para a presença de síndrome metabólica em<br />
relação à idade, idade ao diagnóstico e tempo de<br />
evolução da doença.<br />
O sedentarismo foi relatado em 64,8%<br />
das pacientes estudadas. Mulheres com LES têm<br />
um estilo de vida mais sedentário que mulheres<br />
saudáveis. 8 Petri et al., 38 em uma grande coorte,<br />
descreveram a falta de atividade física como um dos<br />
fatores de risco mais prevalentes (70%) para doença<br />
arterial coronariana entre as pacientes com LES.<br />
A menopausa precoce também contribui<br />
para a doença ateroscleróstica por conta da<br />
perda de produção de estrogênio. 39 No presente<br />
trabalho, em que apenas 15,6% das mulheres eram<br />
menopausadas, não houve diferença estatística<br />
em relação a SM. Mulheres com LES atingem a<br />
menopausa em torno de 45 anos de idade, em<br />
média quatro anos antes da maioria das mulheres, 8<br />
e é justamente nesse período que ocorre o<br />
primeiro evento cardiovascular consequente à<br />
aterosclerose provocada pela doença. 8 O uso da<br />
terapia de reposição hormonal, que teoricamente<br />
poderia diminuir o risco cardiovascular destas<br />
pacientes, não trouxe benefício para as mulheres<br />
da população em geral. 40<br />
O acometimento renal foi significantemente<br />
mais prevalente entre as pacientes com síndrome<br />
metabólica, dado que é reforçado pela maior<br />
indicação de biópsia renal neste grupo. Bultink et.<br />
al. 18 descreveram a insuficiência renal como fator de<br />
risco independente para a SM. Níveis de colesterol<br />
total aumentados, maiores que 200 mg/dL, foram<br />
associados à maior injúria renal e mortalidade<br />
em pacientes com LES. 41 O risco de aterosclerose<br />
prematura esteve aumentado em pacientes com<br />
LES juvenil que possuem proteinúria em níveis<br />
nefróticos. 42 A presença do critério renal já descreve<br />
a severidade da doença. Desse modo, o controle da<br />
lesão renal pode diminuir o risco de mortalidade<br />
cardiovascular entre as pacientes com LES.<br />
O uso de antimaláricos entre as pacientes<br />
estudadas foi considerado fator protetor para<br />
síndrome metabólica, com um odds ratio de 0,44 com<br />
IC95% (0,20-0,98). O benefício da hidroxicloroquina<br />
no tratamento para o LES foi associado à melhora<br />
do perfil lipídico desses pacientes em alguns<br />
trabalhos. 43, 44, 45 Os pacientes com LES, que faziam<br />
uso de antimaláricos de forma isolada ou em<br />
associação com corticoesteroides, tiveram os níveis<br />
de VLDL-colesterol, LDL-colesterol e triglicerídeos<br />
reduzidos e os de HDL-colesterol aumentados em<br />
comparação com aqueles pacientes que faziam<br />
uso apenas de corticoesteroides. 44, 45 Há relatos<br />
de que os antimaláricos também contribuem para<br />
inibição da agregação plaquetária e ainda reduzam<br />
46, 47<br />
os níveis de glicemia de jejum.<br />
Os corticoesteroides, por conta de sua<br />
propriedade anti-inflamatória, são a base do<br />
tratamento para os períodos de exacerbação do LES.<br />
Por outro lado, a distribuição central de gordura,<br />
hipertensão arterial e a resistência insulínica são<br />
efeitos adversos que aumentam o risco de eventos<br />
cardiovasculares em pacientes que necessitam de<br />
doses maiores para o controle da doença. 48 Buckey<br />
e Robert relatam pela primeira vez, em 1975, a<br />
associação do uso de corticoesteroides por mais de<br />
31<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
PREVALÊNCIA DE SÍNDROME METABÓLICA EM PACIENTES COM LÚPUS<br />
ERITEMATOSO SISTÊMICO NA AMAZÔNIA OCIDENTAL<br />
um ano e a presença de aterosclerose em exames de<br />
necropsia. 49 Há, porém, ainda controvérsias sobre<br />
este assunto. Alguns trabalhos 50, 51 relacionaram o<br />
maior uso de esteroides ao aumento da espessura<br />
do espaço íntima-média da artéria carótida por<br />
ultrassonografia, já outros 27, 52 não encontraram tal<br />
correlação positiva.<br />
Pacientes com LES vítimas de eventos<br />
cardiovasculares recebiam doses cumulativas<br />
de corticoesteroides maiores que aqueles sem<br />
evento. 28 Em nosso trabalho, a média da dose<br />
cumulativa de prednisona utilizada pelas mulheres<br />
com síndrome metabólica foi superior àquelas sem<br />
a síndrome (p=0,007). Bultink et. al. 18 descreveram<br />
a associação da SM com doses intravenosas de<br />
metilprednisolona, ao contrário de Chung et.<br />
al. 21 que não observaram esse fato. O real papel<br />
dos corticoesteroides na gênese da aterosclerose<br />
prematura em pacientes com LES, seja ele<br />
independente ou modificando outros fatores de<br />
risco, ainda necessita de maiores estudos.<br />
CONCLUSÃO<br />
A descrição dos dados estatísticos no presente<br />
trabalho mostra que a síndrome metabólica<br />
apresentou alta prevalência entre as mulheres<br />
com lúpus eritematoso sistêmico acompanhadas<br />
num serviço de referência em Manaus, Estado do<br />
Amazonas. A presença deste conjunto de fatores<br />
de risco para eventos cardiovasculares reforça<br />
a importância da prevenção e do manejo de<br />
determinantes ateroscleróticos a fim de evitar<br />
mortalidade precoce neste grupo de pacientes.<br />
Neste estudo, a síndrome metabólica apresentou<br />
associação com a lesão renal e maior dose<br />
acumulada de corticoesteroides e teve como fator<br />
protetor o uso de antimaláricos.<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
USO DO QUESTIONÁRIO DE AVALIAÇÃO DO ZUMBIDO (TINNITUS HANDICAP INVENTORY) ADAPTADO PARA O PORTUGUÊS PARA<br />
AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES COM QUEIXA DE ZUMBIDO ATENDIDOS NO AMBULATÓRIO ARAÚJO LIMA<br />
USO DO QUESTIONÁRIO DE AVALIAÇÃO DO ZUMBIDO<br />
(TINNITUS HANDICAP INVENTORY) ADAPTADO PARA<br />
O PORTUGUÊS PARA AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE<br />
VIDA DOS PACIENTES COM QUEIXA DE ZUMBIDO<br />
ATENDIDOS NO AMBULATÓRIO ARAÚJO LIMA<br />
USE OF TINNITUS HANDICAP INVENTORY ADAPTED TO PORTUGUESE FOR ASSESSMENT OF<br />
QUALITY OF LIFE OF PATIENTS WITH TINNITUS ATTENDED IN THE ARAÚJO LIMA CLINIC<br />
Rafael Siqueira de Carvalho*, Renato Telles de Souza**,<br />
Márcia dos Santos da Silva***, Janaína Almeida de Souza***<br />
RESUMO<br />
OBJETIVO: Avaliar a qualidade de vida dos pacientes com a queixa de zumbido atendidos no Ambulatório<br />
Araújo Lima utilizando a versão em língua portuguesa do Tinnitus Handicap Inventory, um questionário<br />
autoaplicável que avalia a repercussão do zumbido na qualidade de vida do paciente. MÉTODOS: Neste<br />
estudo do tipo exploratório descritivo, de caráter prospectivo, o Questionário de Avaliação do Zumbido<br />
(Tinnitus Handicap Inventory) adaptado para o português foi aplicado a 13 pacientes com queixa de<br />
zumbido de origem otoneurológica atendidos no Ambulatório Araújo Lima durante o período de um ano.<br />
A confiabilidade do questionário foi medida pelo coeficiente alfa de Cronbach. RESULTADOS: Dentre<br />
os 13 pacientes que participaram da pesquisa, 84,6% eram do sexo feminino e a média de idade foi de<br />
51,92 anos. A duração média do sintoma foi de 26,38 meses. Quanto à gravidade do zumbido, 30,8%<br />
dos pacientes apresentavam sintoma de grau desprezível e 15,4% de grau leve, com qualidade de vida<br />
ótima e boa, respectivamente, enquanto 23,1% apresentavam sintoma moderado com qualidade de vida<br />
razoável. No outro extremo, 15,4% dos pacientes apresentavam grau severo e 15,4% grau catastrófico,<br />
com qualidade de vida ruim e péssima, respectivamente. A confiabilidade do questionário foi considerada<br />
satisfatória (α=0,920). CONCLUSÕES: A maioria dos pacientes apresenta um grau de incômodo desprezível<br />
ou leve e consegue se habituar a ele, sem grande interferência nas atividades rotineiras. Entretanto, é<br />
possível encontrar casos em que o sintoma é extremamente incômodo e incapacitante.<br />
Descritores: Zumbido, qualidade de vida, atividades cotidianas.<br />
ABSTRACT<br />
OBJECTIVE: Evaluate the quality of life of patients with tinnitus attended in the Araujo Lima Clinic using<br />
the Portuguese version of the Tinnitus Handicap Inventory, a self-applicable questionnaire which assesses<br />
* Médico Residente do Serviço de Otorrinolaringologia do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
** Mestre em Otorrinolaringologia. Professor-Adjunto da disciplina de Otorrinolaringologia da Universidade Federal do<br />
Amazonas e Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
*** Acadêmica do curso de Medicina da Universidade Federal do Amazonas<br />
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revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Rafael Siqueira de Carvalho, Renato Telles de Souza,<br />
Márcia dos Santos da Silva, Janaína Almeida de Souza<br />
tinnitus impact on patients’ life quality. METHODS: In this exploratory descriptive prospective study, the<br />
Tinnitus Handicap Inventory adapted to the Portuguese was applied to 13 patients with tinnitus with<br />
otoneurology origin attended in the Araújo Lima Clinic during a period of one year. The reliability of the<br />
questionnaire was measured using Cronbach’s alpha. RESULTS: Among the 13 patients that participated of<br />
this study 84,6% were female and the average age was 51.92 years. The average duration of symptoms was<br />
26.38 months. About the severity of tinnitus, 30.8% of patients had symptoms of negligible degree and 15.4%<br />
mild, with great and good quality of life, respectively, while 23.1% had moderate symptoms with reasonable<br />
quality of life. At the other extreme, 15.4% of patients had severe and 15.4% had catastrophic degree, with<br />
bad and terrible quality of life, respectively. The reliability of the questionnaire was considered satisfactory.<br />
CONCLUSIONS: Most of patients have a negligible or mild degree of discomfort and can get used to it<br />
without much interference in your routine activities. However, it’s possible to find cases which symptom is<br />
extremely uncomfortable and disabling.<br />
Keywords: Tinnitus, quality of life, activities of daily living.<br />
INTRODUÇÃO<br />
O zumbido pode ser entendido como uma<br />
sensação auditiva percebida nos ouvidos ou na cabeça,<br />
sem a presença de um estímulo externo. 1 É um sintoma<br />
bastante comum na prática otorrinolaringológica,<br />
tendo uma prevalência na população adulta em torno<br />
de 10 a 15%. 2, 3 No Brasil, estima-se que 28 milhões de<br />
pessoas sejam portadoras de zumbido. 4<br />
Estudos mostram que o zumbido pode se tornar<br />
uma condição incapacitante em até 5% dos casos,<br />
afetando a vida normal do paciente e sua qualidade<br />
de vida (QV). 5, 6 Dentre os prejuízos causados por este<br />
sintoma, podemos citar o repouso, a comunicação e o<br />
ambiente social, o que acaba por repercutir na esfera<br />
psíquica, causando irritação, ansiedade, insônia,<br />
depressão e outras alterações emocionais. 7, 8<br />
Tendo em vista o impacto do zumbido sobre<br />
a QV do paciente, tem-se observado um crescente<br />
interesse em adotar meios efetivos de avaliação<br />
das repercussões causadas por este sintoma.<br />
Métodos como emissões otoacústicas, audiometria<br />
tonal, a eletronistagmografia e a eletrococleografia<br />
auxiliam no diagnóstico, mas não são eficazes para<br />
demonstrar os prejuízos na qualidade de vida do<br />
paciente, pois trazem poucas informações quanto<br />
7, 9, 10<br />
à gravidade do zumbido.<br />
Em 1996, foi proposto um questionário<br />
contendo 25 perguntas, com um escore variando<br />
de 0 a 100, de acordo com a repercussão na QV<br />
do paciente. Por conta da facilidade de medida,<br />
aplicação e interpretação, o chamado Tinnitus<br />
Handcap Inventory (THI) vem sendo, desde então,<br />
amplamente utilizado na avaliação clínica do<br />
zumbido, quantificando o incômodo causado por<br />
este sintoma. 11 O questionário original, formulado<br />
em inglês, foi adaptado para estudos na Dinamarca<br />
e na Espanha, ambos com resultados satisfatórios<br />
que reforçam a viabilidade do THI. 7, 12 No Brasil, o<br />
THI já foi utilizado em alguns estudos e também<br />
apresentou viabilidade e aplicabilidade bastante<br />
favoráveis, estando apto a ser utilizado na rotina<br />
de avaliação clínica das repercussões na QV dos<br />
7, 13, 14<br />
pacientes com a queixa de zumbido.<br />
O objetivo deste trabalho é aplicar o THI<br />
traduzido para o português para avaliar a QV dos<br />
pacientes com queixa de zumbido de origem<br />
otoneurológica atendidos no Ambulatório Araújo Lima<br />
(AAL).<br />
MÉTODOS<br />
Trata-se de um estudo exploratóriodescritivo,<br />
prospectivo, com abordagem<br />
quantitativa e qualitativa.<br />
Foram selecionados 13 pacientes com queixa<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
USO DO QUESTIONÁRIO DE AVALIAÇÃO DO ZUMBIDO (TINNITUS HANDICAP INVENTORY) ADAPTADO PARA O PORTUGUÊS PARA<br />
AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES COM QUEIXA DE ZUMBIDO ATENDIDOS NO AMBULATÓRIO ARAÚJO LIMA<br />
de zumbido de origem otoneurológica, triados pelo<br />
Serviço de Otorrinolaringologia no Ambulatório<br />
Araújo Lima durante o período de 1.º de agosto<br />
de 2008 a 1.º de junho de 2009. Os indivíduos<br />
foram primeiramente atendidos pela equipe<br />
de residência em ORL no ambulatório geral e,<br />
aqueles que se enquadravam no perfil do estudo,<br />
foram encaminhados para a segunda consulta no<br />
ambulatório de zumbido, com a equipe responsável<br />
por este projeto de pesquisa. Os pacientes<br />
responderam ao protocolo padrão do serviço, pelo<br />
qual foram questionados diretamente a respeito da<br />
interferência do zumbido nos principais aspectos<br />
da vida, a saber: concentração, emocional,<br />
atividade social e sono. Em seguida, responderam<br />
à versão em língua portuguesa do THI.<br />
O THI é composto por 25 questões, divididas em<br />
três escalas: a funcional, a emocional e a catastrófica.<br />
São três as opções de resposta para cada uma das<br />
questões, pontuadas da seguinte maneira: para as<br />
respostas sim, 4 pontos, às vezes, 2 pontos e não,<br />
nenhum ponto. As respostas são pontuadas de zero<br />
quando o zumbido não interfere na vida do paciente,<br />
até 100 (pontos ou %) quando o grau de incômodo<br />
é grave. A somatória dos pontos resultantes das<br />
questões é categorizada em cinco grupos ou graus de<br />
Grau de Gravidade<br />
Qualidade de Vida<br />
0 – 16 Desprezível Ótima<br />
18 – 36 Leve Boa<br />
38 – 56 Moderado Razoável<br />
58 – 76 Severo Ruim<br />
78 – 100 Catastrófico Péssima<br />
Tabela 1 – Graus de gravidade do zumbido relacionados<br />
à pontuação do THI e sua correlação com a qualidade de<br />
vida do paciente.<br />
gravidade, demonstrados na Tabela 1.<br />
Para avaliar a qualidade dos pacientes, fez-se<br />
uma correlação com a pontuação obtida, de forma<br />
que, quanto mais próxima de 0 fosse a pontuação,<br />
melhor a qualidade de vida do paciente e quanto<br />
mais próxima de 100, pior a qualidade de vida. Assim,<br />
os pacientes classificados como grau desprezível ou<br />
leve de incômodo possuem qualidade de vida boa<br />
ou ótima, enquanto os que foram classificados como<br />
tendo o incômodo moderado possuem qualidade de<br />
vida razoável e os classificados com grau severo ou<br />
catastrófico apresentam qualidade de vida péssima<br />
ou ruim (Tabela 1).<br />
A versão do questionário utilizada para<br />
realização deste trabalho foi proposta por Letícia<br />
Petersen Schmidt e colaboradores, publicado em<br />
2006 pela <strong>Revista</strong> Brasileira de Otorrinolaringologia.<br />
Segundo a autora, foi desenvolvido um protocolo<br />
para tradução baseado em trabalhos que abordam<br />
a metodologia de tradução de questionários para<br />
outros idiomas, com ênfase na tradução conceitual.<br />
Primeiramente foi realizada a tradução do THI para<br />
a língua portuguesa e, posteriormente, a tradução<br />
da primeira versão em português novamente para a<br />
língua inglesa, na expectativa de tornar a tradução<br />
o mais fiel possível. Finalmente, o questionário foi<br />
novamente traduzido para o português, buscando<br />
utilizar termos mais fidedignos à cultura brasileira.<br />
A análise estatística foi feita por meio do<br />
software PASW Statistics 17.0, em inglês.<br />
O grau de gravidade do zumbido foi medido<br />
pela somatória de pontos ou porcentagem (score)<br />
e distribuído segundo a Tabela 1.<br />
Para medir a confiabilidade do questionário<br />
foi utilizado o coeficiente alfa de Cronbach (α),<br />
que mede a consistência interna (homogeneidade)<br />
de cada item. A consistência interna varia de 0 a<br />
1. Quanto mais próximo de 1, mais confiável é o<br />
questionário, sendo aceitáveis valores maiores que<br />
0,7.<br />
Trabalho aprovado pelo Comitê de Ética em<br />
Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas<br />
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Rafael Siqueira de Carvalho, Renato Telles de Souza,<br />
Márcia dos Santos da Silva, Janaína Almeida de Souza<br />
(CAAE 0069.0.115.000-08).<br />
RESULTADOS<br />
Dentre os pacientes selecionados, a maioria<br />
(84,6%) eram mulheres. A média de idade foi de<br />
51,92 anos e a média de duração do sintoma foi de<br />
26,38 meses.<br />
Foram descritos diferentes tipos de som,<br />
sendo os mais comumente descritos o zumbido<br />
em apito, semelhante ao barulho de cachoeira<br />
e em guizo de cigarra (15,4% cada um). Apesar<br />
dessa grande variedade de sons descritos, todos os<br />
pacientes referiam ouvir apenas um único tipo de<br />
som. Quanto à localização do zumbido, a maioria<br />
dos pacientes (38,5%) referia uma percepção<br />
bilateral. O segundo local mais referido foi o lado<br />
esquerdo (23,1%), juntamente com a percepção<br />
descrita como vinda da cabeça (23,1%). A maioria<br />
dos pacientes referia sintoma de início súbito<br />
(69,2%) e periodicidade intermitente (61,5%). A<br />
Tabela 1 apresenta as principais características da<br />
amostra estudada.<br />
Quando questionados a respeito da<br />
interferência do zumbido nos principais aspectos<br />
da vida, o item mais citado foi a concentração,<br />
prejudicada pelo zumbido em 30,8% dos pacientes<br />
seguido pelo campo emocional, citado por três<br />
pacientes (23,1%). Dentre o total da amostra<br />
estudada, três pacientes (23,1%) referiram<br />
interferência nos quatro aspectos abordados e seis<br />
Características Média Desvio-Padrão<br />
Idade 51,92 anos 15, 45 anos<br />
Tempo de Zumbido 26,38 meses 18,1 meses<br />
Frequência<br />
Sexo F = 11 (84,6%) M = 2 (15,4%)<br />
Tipo de Som Único = 13 (100%) Múltiplo = 0<br />
Descrição do Som Apito = 2 (15,4%)<br />
Cachoeira = 2 (15,4%)<br />
Guizo de cigarra = 2 (15,4%)<br />
Outros = 7 (53,8%)<br />
Localização OD = 1 (7,7%)<br />
OE = 3 (23,1%)<br />
Bilateral = 5 (38,5%)<br />
Cabeça = 3 (23,1%)<br />
Não soube informar = 1 (7,7%)<br />
Início Súbito = 9 (69,2%) Progressivo = 4 (30,8%)<br />
Periodicidade Constante = 5 (38,5%) Intermitente = 8 (61,5%)<br />
Doença Otológica Prévia Sim = 2 (15,4%) Não = 11 (84,6%)<br />
Doenças Atuais Apenas HAS = 4 (30,8%)<br />
Apenas dislipidemia = 1 (7,7%)<br />
HAS + Dislipidemia = 2 (15,4%)<br />
Distúrbios neurológicos = 1 (7,7%)<br />
Nenhuma doença atual = 5 (38,5%)<br />
Tabela 2 – Caracterização da Amostra Estudada.<br />
F=Feminino; M=Masculino; OD=Orelha direita; OE=Orelha esquerda; HAS=Hipertensão arterial sistêmica<br />
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USO DO QUESTIONÁRIO DE AVALIAÇÃO DO ZUMBIDO (TINNITUS HANDICAP INVENTORY) ADAPTADO PARA O PORTUGUÊS PARA<br />
AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES COM QUEIXA DE ZUMBIDO ATENDIDOS NO AMBULATÓRIO ARAÚJO LIMA<br />
(46,2%) afirmaram não haver interferência em nenhum desses aspectos. Os resultados estão expostos na<br />
Tabela 2.<br />
O grau de gravidade do zumbido e a QV medidos pelo THI estão expostos na Tabela 3.<br />
A confiabilidade do questionário, medido pelo coeficiente alfa de Cronbach, foi satisfatório para o<br />
questionário total (α = 0,920). Os valores encontrados para as subescalas foram: 0,900 para a funcional,<br />
0,803 para a emocional e 0,432 para a catastrófica. O baixo valor encontrado para a subescala catastrófica<br />
pode ser explicado pelo pequeno número de questões.<br />
Concentração<br />
Emocional<br />
Atividade Social<br />
Sono<br />
Sim = 4 (30,8%)<br />
Não = 9 (69,2%)<br />
Sim = 3 (23,1%)<br />
Não = 10 (76,9%)<br />
Sim = 2 (15,4%)<br />
Não = 11 (84,6%)<br />
Sim = 2 (15,4%)<br />
Não = 11 (84,6%)<br />
Grau de Gravidade N % Qualidade de Vida<br />
Desprezível 4 30,8 Ótima<br />
Leve 2 15,4 Boa<br />
Moderado 3 23,1 Razoável<br />
Tabela 3 – Principais aspectos que sofrem influência negativa<br />
pelo zumbido.<br />
Severo 2 15,4 Ruim<br />
DISCUSSÃO<br />
O zumbido é considerado o terceiro pior sintoma<br />
para o ser humano, sendo superado apenas pelas<br />
dores crônicas e tonturas intensas e intratáveis. 2 Suas<br />
características são extremamente variáveis, sendo<br />
os tipos de sons similares mais descritos aqueles em<br />
assovio, guizo de cigarra, apito, zumbido e jorrando.<br />
Pode ser na orelha direita, esquerda ou em ambas, ou<br />
percebida como vindo de dentro da cabeça, de alta<br />
ou baixa frequência, agudo ou crônico, constante<br />
ou intermitente, de causa patológica conhecida ou<br />
obscura, com diferentes níveis e padrões de estresse<br />
15, 16<br />
psicológico, associado ou não a perda auditiva.<br />
A mesma variedade de características foi observada<br />
neste estudo.<br />
Sabe-se que, em até 80% dos casos, o<br />
zumbido é leve e intermitente, de modo que os<br />
pacientes nem chegam a procurar auxílio médico.<br />
Apenas os 20% restantes apresentam repercussão<br />
importante ou até incapacitante na QV, interferindo<br />
com o sono, a concentração e as atividades<br />
sociais, além de provocar distúrbios emocionais. 17<br />
Um estudo realizado num centro de referência<br />
em otorrinolaringologia mostrou que 59,3%<br />
dos pacientes referem alterações no equilíbrio<br />
emocional, 50,3% no sono, 49,3% na concentração<br />
e 14,2% nas atividades sociais. 18 Em nosso estudo,<br />
também foi observado interferência do sintoma<br />
nestas quatro grandes áreas, com uma pequena<br />
inversão nas áreas mais afetadas, sendo que a mais<br />
afetada em nossos pacientes foi a concentração<br />
(30,8%), seguida pelo equilíbrio emocional (23,1%),<br />
atividade social e, finalmente, o sono (15,4% cada).<br />
Observa-se que, em nossa amostra, o prejuízo<br />
nesses setores parece ser menor que no estudo<br />
anteriormente citado, muito provavelmente<br />
por conta das características próprias de cada<br />
população. É possível, no entanto, notar a forte<br />
influência do zumbido na QV dos pacientes, pois<br />
o sintoma pode ser mais grave do que se percebe,<br />
sendo necessária uma investigação mais detalhada<br />
e muito além do exame otorrinolaringológico<br />
convencional.<br />
Na última década, houve um aumento<br />
significativo no número de instrumentos voltados<br />
para avaliação da QV na área da saúde. Como a<br />
maior parte desses instrumentos foi elaborada<br />
originalmente na língua inglesa, o crescente<br />
interesse em traduzir esses instrumentos trouxe à<br />
tona diversas controvérsias quanto aos métodos de<br />
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Rafael Siqueira de Carvalho, Renato Telles de Souza,<br />
Márcia dos Santos da Silva, Janaína Almeida de Souza<br />
tradução e adaptação cultural deles. Enquanto uns<br />
apontam que o conceito de QV está intimamente<br />
ligado à cultura, outros defendem a existência de<br />
um “universal cultural” e que, independente da<br />
cultura ou época, o importante é que o indivíduo<br />
se sinta bem psicologicamente, possua boas<br />
condições físicas, sinta-se integrado na sociedade<br />
e funcionalmente competente. 19<br />
A Organização Mundial de Saúde define<br />
QV como “a percepção do indivíduo sobre a sua<br />
posição na vida, no contexto da cultura e dos<br />
sistemas de valores nos quais ele vive, e em<br />
relação a seus objetivos, expectativas, padrões<br />
e preocupações”. 20 O termo tem significado<br />
eminentemente humano e reflete a capacidade de<br />
síntese cultural dos elementos que cada sociedade<br />
considera como padrão de conforto e bem-estar,<br />
refletindo o grau de satisfação de cada indivíduo<br />
com os mais diversos setores da vida familiar,<br />
amorosa, social e a própria existência. 21<br />
Quando utilizado no campo da saúde, o termo<br />
parece ter um grande número de significados, mas<br />
todos eles centrados na avaliação subjetiva do<br />
paciente, necessariamente ligados ao impacto do<br />
estado de saúde sobre a capacidade do indivíduo<br />
de viver plenamente. Sabe-se, no entanto, que esta<br />
expressão é muito mais ampla e inclui uma variedade<br />
de condições que podem afetar a percepção do<br />
indivíduo, seus sentimentos e seu comportamento,<br />
relacionados às suas funções diárias, incluindo,<br />
mas não se limitando, a sua condição de saúde e as<br />
intervenções médicas. 19 Num sentido mais restrito,<br />
o termo “qualidade de vida ligada à saúde” pode<br />
ser definido como o valor atribuído à vida, levandose<br />
em consideração as deteriorações funcionais,<br />
as percepções e condições sociais induzidas por<br />
doenças, agravos de saúde e tratamentos. 21<br />
Por intermédio de vários trabalhos de tradução<br />
e adaptação, o THI foi considerado o instrumento<br />
mais conceituado para avaliar a QV dos pacientes<br />
com zumbido. 10 Por meio dele é possível avaliar o<br />
impacto do sintoma nos diferentes aspectos da vida<br />
do paciente pelas subescalas funcional, emocional<br />
e catastrófica. Pela escala funcional, o THI permite<br />
avaliar a interferência do zumbido nas atividades<br />
cotidianas do indivíduo, entre elas concentração,<br />
percepção auditiva, atenção, sono e leitura, além de<br />
avaliar a interferência na vida social do paciente e a<br />
piora do sintoma em situações de estresse. Pela escala<br />
emocional, é possível avaliar as alterações no estado<br />
psíquico do paciente por intermédio de sentimentos<br />
como irritabilidade, frustração, indisposição,<br />
dificuldade de relacionamento com familiares e<br />
amigos, depressão, ansiedade e insegurança. A<br />
escala catastrófica questiona situações extremas e<br />
pensamentos negativistas. São avaliados sentimentos<br />
como desespero, incapacidade diante do sintoma e<br />
sensação de descontrole.<br />
Em nossa série, foi observada uma distribuição<br />
pouco heterogênea entre os níveis de gravidade<br />
e impacto na qualidade de vida. Enquanto seis<br />
(46,2%) pacientes apresentaram QV ótima ou boa,<br />
quatro (30,8%) se encontravam no outro extremo,<br />
com grande prejuízo emocional e social, sendo<br />
considerados como tendo QV ruim ou péssima. Estes<br />
resultados dependem muito mais da percepção que<br />
cada paciente tem do seu sintoma do que da presença<br />
do sintoma propriamente dito, uma vez que esse<br />
pode ser extremamente variável de indivíduo para<br />
indivíduo. Mesmo em nosso estudo, entretanto, que<br />
contou com poucos pacientes, é possível constatar a<br />
capacidade com a qual o zumbido tem de interferir<br />
de forma negativa na QV do paciente.<br />
CONCLUSÃO<br />
Pela sua subjetividade e grande variedade<br />
de apresentação, o zumbido é melhor avaliado por<br />
métodos que levem em consideração não apenas<br />
o indivíduo em si, mas também os fatores sociais,<br />
emocionais e ambientais que atuam no seu bemestar.<br />
Apesar das queixas serem constantes, a<br />
maioria dos pacientes é capaz de manter suas<br />
atividades habituais sem grandes interferências,<br />
mantendo uma QV aceitável. Apenas numa<br />
minoria de casos o zumbido se apresenta como<br />
um sintoma incapacitante.<br />
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AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES COM QUEIXA DE ZUMBIDO ATENDIDOS NO AMBULATÓRIO ARAÚJO LIMA<br />
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41<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Fernando Luiz Westphal, Luís Carlos de Lima, José Corrêa Lima Netto,<br />
Maria do Socorro de Lucena Cardoso, Rodrigo Augusto Monteiro Cardoso Talita Sampaio Carvalho<br />
ANÁLISE DA QUALIDADE DE VIDA DE PACIENTES<br />
SUBMETIDOS À CORREÇÃO CIRÚRGICA DE<br />
DEFORMIDADES NA PAREDE TORÁCICA ANTERIOR<br />
ANALYSIS OF QUALITY OF LIFE OF PATIENTS UNDERGOING SURGICAL CORRECTION<br />
OF DEFORMITIES IN THE ANTERIOR CHEST WALL<br />
Fernando Luiz Westphal*, Luís Carlos de Lima**, José Corrêa Lima Netto***,<br />
Maria do Socorro de Lucena Cardoso****, Rodrigo Augusto Monteiro Cardoso*****, Talita Sampaio Carvalho*****<br />
RESUMO<br />
INTRODUÇÃO: As deformidades Pectus Excavatum (PEX) e Pectus Carinatum (PC) acometem,<br />
aproximadamente, uma a cada trezentas pessoas e são, usualmente, assintomáticas, sendo a queixa<br />
principal de ordem estética. Os pacientes frequentemente tornam-se arredios, introvertidos e afastados<br />
do convívio social e de atividades físicas em que tenham de expor o tórax. O objetivo deste projeto foi<br />
avaliar os resultados obtidos após o procedimento cirúrgico, em geral, quanto à satisfação dos pacientes<br />
e ao nível de qualidade de vida após o procedimento, ocorrência de complicações e a relação delas com<br />
a técnica utilizada, aos índices de recidiva e de mortalidade cirúrgica. MÉTODOS: Estudo retrospectivo<br />
e prospectivo, com abordagem quantitativa e qualitativa. A coleta de informações foi feita por meio da<br />
análise de prontuários, nos Serviços de Cirurgia Torácica do <strong>HUGV</strong> e SBPA, e do preenchimento de protocolo<br />
de estudo pelo paciente que tenha realizado a cirurgia corretiva de PEX ou de PC. Os seguintes dados<br />
foram coletados nos prontuários: epidemiológicos, técnica utilizada e complicações pós-operatórias. As<br />
informações obtidas por meio da entrevista do paciente foram: o tipo de deformidade, o grau de satisfação<br />
com o procedimento cirúrgico e a cicatriz, as complicações pós-operatórias e a recidiva da deformidade.<br />
RESULTADOS: Foram analisados 18 pacientes com idade média de 13,94 anos, sendo 15 (83,33%) do sexo<br />
masculino e todos portadores da deformidade Pectus Excavatum. O grau de satisfação obtido foi relatado<br />
como Alto por 12 (66,67%) pacientes e Médio para 33,33%. Ocorreram complicações em 6 (33,33%) pacientes,<br />
dos quais 5 submetidos ao uso de técnica aberta. Recidivas discretas da deformidade foram relatadas<br />
por 6 (33,33%) dos entrevistados. O índice de mortalidade cirúrgica encontrado foi nulo. CONCLUSÃO: A<br />
maioria dos pacientes entrevistados mostrou-se muito satisfeita com os resultados obtidos após a correção<br />
cirúrgica de suas deformidades. Complicações pós-operatórias foram mais observadas em cirurgias por<br />
esternocondroplastia, ao contrário das cirurgias por videotoracoscopia, que apresentaram baixos níveis de<br />
complicações e mostraram-se mais seguras. Os índices de recidiva discreta da deformidade apresentaramse<br />
em valores elevados, correspondendo a um terço das cirurgias. Nenhum paciente veio a óbito durante os<br />
procedimentos cirúrgicos de correção da PEX.<br />
* Professor-Adjunto e Coordenador da disciplina de Cirurgia Torácica da Universidade Federal do Amazonas<br />
** Chefe do Serviço de Cirurgia Torácica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
*** Médico Assistente do Serviço de Cirurgia Torácica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
**** Professora-Adjunta da disciplina de Pneumologia da Universidade Federal do Amazonas<br />
***** Acadêmico do curso de Medicina da Universidade Federal do Amazonas.<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
ANÁLISE DA QUALIDADE DE VIDA DE PACIENTES SUBMETIDOS À CORREÇÃO CIRÚRGICA DE<br />
DEFORMIDADES NA PAREDE TORÁCICA ANTERIOR<br />
Palavras-chave: Deformidades, tórax, tratamento, resultados.<br />
ABSTRACT<br />
INTRODUCTION: The deformities Pectus Excavatum (PEX) and Pectus Carinatum (PC) commit,<br />
approximately, one in every three hundred people and are, usually, asymptomatic, being the main<br />
allegation of aesthetics nature. Patients often become aloof, introverted and withdraw from social<br />
and physical activities in which they expose the chest. The objective of this project was to evaluate<br />
the results after surgery, in general, as the patient satisfaction and level of quality of life after the<br />
procedure, occurrence of complications and their relation to the technique, the recurrence rates and<br />
surgical mortality. METHODS: Retrospective and prospective study with quantitative and qualitative<br />
approach. Data collection was done through analysis of medical records in the departments of Thoracic<br />
Surgery from <strong>HUGV</strong> and SPBA, and through the study protocol, completed by the patient. The following<br />
data were collected from medical records: epidemiological, technique and postoperative complications.<br />
Information collected through the protocol were: type of deformity, degree of satisfaction with the surgery<br />
and surgical scar, the postoperative complications and recurrence of deformity. RESULTS: We analyzed<br />
18 patients with mean age of 13.94 years, 15 (83.33%) were male and all patients with pectus excavatum<br />
deformity. The satisfaction obtained was reported as high for 12 (66.67%) patients and as mean for 6<br />
(33.33%) patients. Complications occurred in 6 (33.33%) patients, of whom 5 submitted to the use of open<br />
technique. Discrete recurrence of the deformity was reported by 6 (33.33%) respondents. The surgical<br />
mortality rate was considered zero. CONCLUSION: Most patients interviewed was very pleased with the<br />
results after surgical correction of their deformities. Postoperative complications were more frequent in<br />
sternochondroplasty surgery, unlike Thoracoscopic surgery who had low levels of complications and were<br />
more secure. The slight recurrence rates ocurred in high levels, accounting for one third of the surgeries.<br />
No patient has died during the surgical procedures for correction of PEX.<br />
Key-words: Deformities, thorax, treatment, results.<br />
INTRODUÇÃO<br />
Pectus Excavatum (PEX) e Pectus Carinatum (PC)<br />
são as deformidades congênitas de maior incidência da<br />
parede anterior do tórax. As deformidades torácicas<br />
podem ocorrer por depressão do esterno, PEX, ou pela<br />
protrusão anterior do osso, PC. 1<br />
PEX é a deformidade congênita de maior<br />
frequência na parede torácica anterior, acometendo<br />
três vezes mais o sexo masculino. 1 A prevalência de<br />
anomalias torácicas em escolares na cidade de Manaus<br />
é de 1,95%, a PEX aparece com 65,4% dos casos e a<br />
PC com 34,6%. 2 Diversas teorias tentam explicar a<br />
origem desse defeito, a hipótese mais aceita preconiza<br />
o desenvolvimento exagerado das cartilagens costais,<br />
gerando um deslocamento em sentido dorsal do<br />
esterno e consequente depressão da parede. 3<br />
As funções fisiológicas de órgãos intratorácicos<br />
são preservadas em portadores de PEX, entretanto<br />
o problema está relacionado ao constrangimento<br />
destes pacientes com a deformidade, visto que<br />
geralmente são pessoas introvertidas e com<br />
tendência ao isolamento social. 4<br />
Deformidades discretas em crianças e<br />
adolescentes podem ser atenuadas com a natação<br />
ou sessões de RPG (Reeducação Postural Global)<br />
visto que a estrutura óssea desses pacientes ainda se<br />
encontra em desenvolvimento e tem considerável<br />
maleabilidade. Pessoas cujas deformidades são<br />
acentuadas, principalmente adultos, cujos ossos<br />
encontram-se já consolidados, são recomendadas<br />
a realizar tratamento cirúrgico para que obtenham<br />
resultados efetivos. 5<br />
Existem duas técnicas cirúrgicas disponíveis<br />
para a correção de PEX: a esternocondroplastia<br />
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Fernando Luiz Westphal, Luís Carlos de Lima, José Corrêa Lima Netto,<br />
Maria do Socorro de Lucena Cardoso, Rodrigo Augusto Monteiro Cardoso Talita Sampaio Carvalho<br />
e a técnica de Nuss. Ravitch publicou, em<br />
1949, uma técnica para a correção de PEX por<br />
esternocondroplastia, ainda utilizada atualmente,<br />
acrescida de algumas modificações. 6 Em 1987,<br />
Nuss apresentou os princípios de uma nova<br />
técnica, minimamente invasiva e realizada a<br />
partir de pequenas incisões laterais no tórax, para<br />
a colocação de barra metálica retroesternal. 7<br />
PC é a deformidade menos frequente da<br />
parede torácica anterior, tendo uma prevalência<br />
de 15% entre as demais malformações torácicas. 1<br />
Em Manaus, entretanto, a prevalência verificada<br />
entre escolares foi de 34,6% entre os acometidos<br />
por deformidade na parede torácica. 2 Esse defeito<br />
congênito é caracterizado pela protrusão do esterno e<br />
das cartilagens costais, pelo excessivo crescimento das<br />
cartilagens em sentido anterior. 1 Os tratamentos mais<br />
utilizados na correção dessa deformidade são: o uso<br />
de órtese, preconizado por ortopedistas, e a cirurgia,<br />
4, 8, 9<br />
defendida por muitos cirurgiões torácicos.<br />
O objetivo deste estudo foi avaliar a<br />
qualidade de vida em pacientes submetidos à<br />
cirurgia corretiva das deformidades PEX e PC.<br />
MÉTODO<br />
O estudo consistiu em uma análise clínicocirúrgica<br />
de caráter retrospectivo e prospectivo, com<br />
abordagem qualitativa e quantitativa. A população do<br />
estudo foram os pacientes operados para a correção<br />
das deformidades PEX e PC, entre os anos de 1993 e<br />
2009, nos serviços de Cirurgia Torácica do <strong>Hospital</strong><br />
Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> (<strong>HUGV</strong>) e Sociedade<br />
Portuguesa Beneficente do Amazonas (BPBA), e que<br />
preencheram o Protocolo de Pesquisa. A realização<br />
da pesquisa foi autorizada pelo Comitê de Ética em<br />
Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas (<strong>Ufam</strong>).<br />
A partir dos prontuários, foram coletadas<br />
informações referentes: à idade do paciente<br />
no momento do procedimento, ao sexo, ao<br />
tipo de técnica utilizada e às complicações pósoperatórias<br />
ocorridas. O protocolo de estudo<br />
(Figura 1) encontra-se dividido em duas partes. A<br />
primeira parte aborda a coleta de dados gerais do<br />
paciente, entre eles: nome, idade, hospital em que<br />
foi realizada a cirurgia e o número de prontuário.<br />
A segunda parte se refere mais propriamente ao<br />
procedimento realizado, coletando as seguintes<br />
informações: o tipo de deformidade operada, o<br />
grau de satisfação com o procedimento cirúrgico,<br />
a ocorrência de possíveis melhorias de saúde e,<br />
se ocorridas, quais foram elas; opinião quanto à<br />
cicatriz cirúrgica, a ocorrência de complicações<br />
pós-operatória e o índice de recidiva.<br />
Os dados coletados foram analisados por<br />
meio de estatística descritiva para as variáveis. Para<br />
avaliar a associação entre as variáveis (qualitativas)<br />
foi utilizado o Teste Exato de Fisher. O sowtware<br />
usado para a análise descritiva foi Microsoft Office<br />
Excell 2007, e para a análise inferencial o software<br />
estatístico R.2.11. Foi utilizado um nível de 5% de<br />
significância com coeficiente de confiança de 95%.<br />
Parte 1 – Questionário<br />
1. Identificação<br />
<strong>Hospital</strong>:____________________________________ Número de registro:________<br />
Nome:_________________________________________________Idade: __________<br />
2. Qual deformidade você apresentava antes da cirurgia<br />
Pectus Excavatum Pectus Carinatum <br />
3. Qual o seu grau de satisfação com o procedimento cirúrgico de correção de sua deformidade<br />
Pequeno Médio Alto <br />
4. Houve alguma melhoria na sua saúde<br />
Não Sim <br />
Caso responda sim, o que melhorou<br />
Cansaço Falta de ar Palpitações Dor no peito <br />
Outra . Qual ________________<br />
5. Qual a sua opinião em relação à cicatriz cirúrgica<br />
Imperceptível Pouco perceptível Perceptível, incômoda <br />
Muito perceptível e incômoda <br />
6. Ocorreu alguma complicação pós-operatória<br />
Não Sim <br />
Caso responda sim, que complicação<br />
Respiratória Cardíaca Infecção <br />
Outras . Qual ________________<br />
7. Você percebeu o reaparecimento, mesmo que discreto, da deformidade<br />
Não Sim <br />
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ANÁLISE DA QUALIDADE DE VIDA DE PACIENTES SUBMETIDOS À CORREÇÃO CIRÚRGICA DE<br />
DEFORMIDADES NA PAREDE TORÁCICA ANTERIOR<br />
RESULTADOS<br />
O total de paciente encontrado foi de 26,<br />
entretanto apenas 18 foram contactados para o<br />
desenvolvimento do projeto, sendo 15 do sexo<br />
masculino e com idade média de 13,94 anos.<br />
A PEX foi a deformidade dominante entre<br />
as deformidades operadas, representando 100%<br />
dos casos. A técnica cirúrgica utilizada foi a<br />
esternocondroplastia em 11 (61,11%) das cirurgias<br />
realizadas e a videotoracoscopia com a colocação<br />
da placa de Nuss em 7 (31,89%).<br />
O grau de satisfação foi considerado elevado<br />
com o procedimento cirúrgico em 12 (66,67%)<br />
pacientes. Grau mediano de satisfação foi manifestado<br />
por 6 (33,33%) dos entrevistados (Tabela 1).<br />
Melhorias à qualidade de vida foram relatadas<br />
por 12 (66,67%) dos entrevistados. Entre os problemas<br />
de saúde atenuados pelo procedimento cirúrgico<br />
foram citados, de forma isolada ou combinada: o<br />
cansaço, a dispneia e a “dor no peito” (Tabela 1).<br />
A cicatriz cirúrgica foi classificada como pouco<br />
perceptível por 11 (61,11%) pacientes. Todavia,<br />
2 (11,11%) julgam-na muito perceptível e muito<br />
incômoda e pouco mais de 5 (27,78%) consideraram<br />
sua cicatriz perceptível e incômoda (Tabela 1).<br />
Complicações pós-operatórias foram<br />
relatadas por 6 (33,33%) pacientes. As complicações<br />
respiratórias isoladas foram predominantes;<br />
observou-se, em alguns casos, a associação<br />
delas à outra classe de complicações, que não as<br />
complicações cardíacas ou por infecção.<br />
O reaparecimento discreto da deformidade,<br />
após a realização do procedimento cirúrgico, foi<br />
relatado por 6 (33,33%) dos entrevistados, não<br />
podendo ser determinado o período de ocorrência<br />
da recidiva (Tabela 1).<br />
Variáveis f f(%)<br />
Grau de satisfação com a cirurgia<br />
Alto 12 66,67%<br />
Médio 6 33,33%<br />
Existência de melhoria na saúde após a cirurgia<br />
Sim 12 66,67%<br />
Não 6 33,33%<br />
Se sim, qual a melhoria ocorrida<br />
Cansaço 2 16,67%<br />
Cansaço e falta de ar 2 16,67%<br />
Cansaço, falta de ar e dor no peito 1 8,33%<br />
Cansaço, falta de ar e outra 3 25,00%<br />
Dor no peito 1 8,33%<br />
Falta de ar 1 8,33%<br />
Falta de ar, palpitação e dor no peito 1 8,33%<br />
Outra 1 8,33%<br />
Opinião quanto à cicatriz cirúrgica<br />
Muito perceptível e incômoda 2 11,11%<br />
Perceptível e incômoda 5 27,78%<br />
Pouco perceptível 11 61,11%<br />
Ocorrência pós-operatória<br />
Sim 6 33,33%<br />
Não 12 66,67%<br />
Complicação pós-operatória<br />
Outra 2 33,33%<br />
Respiratória 2 33,33%<br />
Respiratória e outra 2 33,33%<br />
Reaparecimento discreto da deformidade após a cirurgia<br />
Sim 6 33,33%<br />
Não 12 66,67%<br />
f: Frequência; f(%): Frequência Relativa<br />
Tabela 1– Resultados obtidos a partir do Protocolo de Pesquisa.<br />
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Fernando Luiz Westphal, Luís Carlos de Lima, José Corrêa Lima Netto,<br />
Maria do Socorro de Lucena Cardoso, Rodrigo Augusto Monteiro Cardoso Talita Sampaio Carvalho<br />
A correlação dos dados relativos à técnica<br />
utilizada e a ocorrência de recidivas revelaram o<br />
discreto reaparecimento da deformidade apenas<br />
em pacientes operados por cirurgia aberta, ou<br />
esternocondroplastia. Em 6 (54,55%) dos 11 pacientes<br />
operados com essa técnica houve uma parcial recidiva<br />
do Pectus, não ocorrendo, entretanto, um retorno<br />
ao estágio original da deformidade. Nenhum dos<br />
pacientes operados com a técnica de Nuss manifestou<br />
haver notado nenhum reaparecimento, mesmo que<br />
discreto, de sua deformidade (Tabela 2).<br />
A ocorrência de complicações pós-operatórias<br />
apresentou maior incidência em cirurgias com<br />
técnica tradicional (cirurgias abertas). As cirurgias por<br />
esternocondroplastia apresentaram complicações em<br />
6 (33,33%) pacientes, enquanto nos procedimentos<br />
realizados por videotoracoscopia (cirurgia por vídeo)<br />
foi observado apenas 1 (5,56%) caso (Tabela 2).<br />
Variáveis Tipo de Cirurgia P-valor<br />
Aberta Vídeo Total<br />
f f(%) F f(%) f f(%)<br />
Ocorrência de complicações pós-operatórias<br />
Sim 5 27,78% 1 5,56% 6 33,33% 0,31<br />
1<br />
Não 6 33,33% 6 33,33% 2 66,67%<br />
Reaparecimento discreto da deformidade<br />
Sim 6 33,33% 0 0,00% 6 33,33% 0,04<br />
1<br />
Não 5 27,78% 7 38,89% 2 66,67%<br />
Opinião quanto à cicatriz cirúrgica<br />
Muito perceptível e incômoda 0 0,00% 2 11,11% 2 11,11% 0,2223<br />
Perceptível e incômoda 4 22,22% 1 5,56% 5 27,78%<br />
Pouco perceptível 7 38,89% 4 22,22% 11 61,11%<br />
Tabela 2 – Correlação entre os tipos de cirurgia e variáveis relevantes ao sucesso da cirurgia.<br />
Um terceiro parâmetro, no comparativo<br />
das técnicas cirúrgicas utilizadas, é a opinião<br />
do pacientes quanto à cicatriz cirúrgica. Apenas<br />
pacientes operados por videotoracoscopia julgaram<br />
sua cicatriz muito perceptível e muito incômoda,<br />
correspondendo ao um total de 28,57% dos pacientes<br />
operados por essa técnica. A maior parte dos<br />
pacientes operados tanto por esternocondroplastia<br />
(63,64%) quanto pela técnica de Nuss (57,14%)<br />
manifestou achar sua cicatriz pouco perceptível.<br />
Perceptível e incômoda foi a classificação<br />
atribuída por 36,36% dos pacientes operados por<br />
cirurgia invasiva e 14,29% operados com técnica<br />
minimamente invasiva. Nenhum paciente operado<br />
por esternocondroplastia ou videotoracospia<br />
manifestou achar sua cicatriz imperceptível.<br />
Não foi encontrado nenhum óbito relacionado<br />
à realização do procedimento cirúrgico.<br />
DISCUSSÃO<br />
PEX e PC são deformidades congênitas da<br />
parede anterior do tórax que acometem 1:300<br />
pessoas. 1 Estudo realizado em 2009 constatou uma<br />
prevalência de Pectus entre escolares de Manaus, de<br />
1,95%, sendo 1,275% referentes à PEX e 0,675% à PC.<br />
Dos 26 escolares que apresentaram a deformidade,<br />
17 (65,4%) tinham PEX e 18 (69,2%) eram do sexo<br />
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ANÁLISE DA QUALIDADE DE VIDA DE PACIENTES SUBMETIDOS À CORREÇÃO CIRÚRGICA DE<br />
DEFORMIDADES NA PAREDE TORÁCICA ANTERIOR<br />
masculino. Em relação a problemas possivelmente<br />
associados à deformidade, 17 escolares (65,4%)<br />
relataram dor torácica, dispneia ou palpitações. 2<br />
Todos os pacientes participantes da presente<br />
pesquisa apresentaram apenas a deformidade<br />
Pectus Excavatum, sendo eles, predominantemente,<br />
do sexo masculino. Tal resultado demonstra a<br />
preponderância da PEX e a maior prevalência dela<br />
entre os homens, como já haviam observado os<br />
demais estudos sobre o assunto.<br />
Tem-se constatado que os maiores problemas<br />
ocasionados pela deformidade, ao paciente, são de<br />
ordem estética, refletindo-se no seu convívio social e<br />
qualidade de vida. Poucos prejuízos à saúde e função<br />
de órgãos torácicos têm sido notados. Entre cirurgiões<br />
torácicos, preconiza-se a correção cirúrgica como<br />
método mais eficaz para a solução dos defeitos. 1<br />
Um estudo realizado com 59 pacientes<br />
submetidos à correção cirúrgica de PEX, por<br />
esternocondroplastia (cirurgia aberta), o<br />
resultado estético obtido foi satisfatório para<br />
95,6% dos pacientes, 2,6% declararam-se não<br />
totalmente satisfeitos e 1,75% revelaram a<br />
recidiva da deformidade. 4 Neste estudo observouse<br />
um elevado grau de satisfação em 66,67% dos<br />
pacientes, a parte restante mostrou-se, ao menos,<br />
medianamente satisfeita.<br />
Os bons índices de opinião quanto à cicatriz<br />
cirúrgica corroboram a satisfação dos pacientes<br />
em relação aos benefícios estéticos alcançados<br />
com o procedimento, contribuindo para seu<br />
melhor convívio social, aumento da autoestima e<br />
qualidade de vida. Observou-se uma diminuição<br />
do grau de cansaço, dispneia e dor no peito.<br />
As correções cirúrgicas dessas deformidades<br />
são passíveis de recidiva e encontram-se descritas na<br />
literatura, como referida na pesquisa supracitada.<br />
Um estudo realizado em 2008 refere à ocorrência<br />
de reaparecimento da deformidade entre as<br />
complicaçãoes pós-operatórias ocorridas em 3 dos<br />
24 pacientes operados por esternocondroplastia<br />
para a correção de PEX. 8 Na presente pesquisa a<br />
ocorrência de discreta recidiva da deformidade<br />
foi constatada em 6 pacientes (33,33%). O estudo<br />
verificou a ocorrência de um número significativo de<br />
complicações pós-operatórias (33,33%), mas com<br />
baixo grau de gravidade, em sua maioria. Apenas<br />
uma complicação mais grave foi registrada, um<br />
caso de pneumotórax. Entre as demais, podemos<br />
citar: hiperalgesia pós-cirúrgica, deslocamento da<br />
barra e dificuldade de cicatrização.<br />
A correção cirúrgica da Pectus Excavatum<br />
pode ser realizada por meio de dois procedimentos<br />
cirúrgicos distintos: esternocondroplastia ou<br />
videotoracoscopia com colocação da placa de<br />
Nuss. 9 Nem todos os pacientes têm, entretanto, a<br />
opção de escolher pelo uso de uma técnica ou de<br />
outra, tendo em vista o custo bem mais elevado do<br />
último procedimento.<br />
A esternocondroplastia ou cirurgia aberta<br />
apresenta mais indicações cirúrgicas, para a<br />
correção de deformidades na parede torácica<br />
anterior, de que a cirurgia por videotoracoscopia. 4,<br />
9<br />
É importante ressaltar, portanto, que nem sempre<br />
será possível a correção da deformidade pela<br />
técnica de Nuss. Entre os 18 pacientes pesquisados,<br />
11 foram operados por esternocondroplastia.<br />
A preferência, quando possível, em se optar<br />
pela técnica de Nuss se deve à menor invasividade<br />
do procedimento e, consequentemente, aos<br />
menores riscos de complicações e maior discrição<br />
da cicatriz cirúrgica. 7 Entre as complicações<br />
verificadas na amostra do estudo, as ocorridas<br />
em decorrência dessa técnica foram três vezes<br />
menores, isso em valores absolutos, se comparadas<br />
àquelas ocorridas após a esternocondroplastia. A<br />
satisfação verificada quanto à cicatriz cirúrgica,<br />
entretanto, foi maior entre pacientes operados<br />
por técnica invasiva, mesmo tendo esse sofrido<br />
incisões maiores, se comparadas àquelas por<br />
videotoracoscopia. Outro dado significativo obtido<br />
pela pesquisa e pouco relatado na literatura foi a<br />
maior eficácia da técnica de Nuss na correção das<br />
deformidades, se considerarmos que apresentou<br />
índice de recidiva nulo, em comparação a um<br />
índice de mais de 50% de discreto reaparecimento<br />
do Pectus nas esternocondroplastias.<br />
As deformidades da parede torácica anterior<br />
vêm apresentando maior indicação cirúrgica a<br />
cada dia, amparada pela realização e resultados<br />
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Fernando Luiz Westphal, Luís Carlos de Lima, José Corrêa Lima Netto,<br />
Maria do Socorro de Lucena Cardoso, Rodrigo Augusto Monteiro Cardoso Talita Sampaio Carvalho<br />
de estudos como este. Altos índices de satisfação,<br />
a ocorrência de poucas complicações, em sua<br />
maioria, de pequena gravidade, e mortalidade<br />
cirúrgica praticamente nula são alguns dos<br />
parâmetros que corroboram a indicação da cirurgia<br />
como meio mais rápido e eficaz para a correção<br />
dessas deformidades.<br />
REFERÊNCIAS<br />
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terapêutica. Rev. Col. Bras. Cir. nov./dez. 2007; 34(6): 412-427.<br />
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AMILOIDOSE SISTÊMICA. RELATO DE CASO<br />
AMILOIDOSE SISTÊMICA. RELATO DE CASO<br />
LIGHT-CHAIN AMYLOIDOSIS. CASE REPORT<br />
Marina Valente Maia*, Mariela Conceição*, Riani Helenditi Camurça*,<br />
Ellysson Oliveira Abinader**, Juliana Matos***, Luiz Carlos Santana****<br />
RESUMO<br />
Amiloidose Sistêmica (AS) faz parte de um grupo de doenças que têm em comum a deposição extracelular<br />
patológica de proteínas insolúveis em órgãos ou tecidos. Amiloidose de cadeia leve é a forma mais comum<br />
de amiloidose sistêmica e é associada a várias alterações orgânicas, entre elas discrasia sanguínea. O<br />
objetivo deste estudo foi relatar o caso clínico de paciente portador de amiloidose sistêmica do tipo AS,<br />
diagnosticado no Serviço de Clínica Médica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>, Manaus-Amazonas.<br />
O tratamento é preocupante não somente dos resultados quanto na avaliação e evolução da eficácia.<br />
Muitos são propostos como combinações de VAD (vincristina, doxorrubicina, dexametasona); melfalan e<br />
prednisona; talidomida e prednisona e outros.<br />
Descritores: Amiloidose de cadeia leve, amiloidose sistêmica primária, síndrome nefrótica.<br />
ABSTRACT<br />
Amyloidosis is a condition inherent to a group of diseases, with exhibit the common feature of pathological<br />
extracellular deposition of insoluble proteins in organs or tissues. Light-chain (AL) amyloidosis is the most<br />
common form of systemic amyloidosis and is associated with an underlying plasma cell dyscrasia. The<br />
objective was relate a primary amyloidosis case report from Manaus-Amazonas witch diagnosis was made<br />
in Getulio <strong>Vargas</strong> University <strong>Hospital</strong>. The treatment of primary amyloidosis concerning not only the results<br />
but also the problems in evaluating its efficacy. Many treatments are proposed like combinations VAD<br />
(vincristine, doxorubicin and dexamethasone); melphalan and prednisone; talidomide and prednisone;<br />
others.<br />
Descritors: Light-chain amyloidosis, nephrotic<br />
syndrome, primary systemic amyloidosis.<br />
INTRODUÇÃO<br />
Há mais de 400 anos houve os relatos dos<br />
primeiros casos do que mais tarde Virchow, em<br />
1854, chamaria de amiloidose. A proteína amiloide<br />
possui propriedades ultraestruturais de definição<br />
aos raios-x e bioquímica exclusivas, compostas<br />
*<br />
Médica Residente de Clínica Médica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
**<br />
Médico Residente de Cirurgia Geral do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
***<br />
Médica Residente de Nefrologia do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
****<br />
Colaborador – Especialista em Clínica Médica. Universidade Federal do Amazonas. <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
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Marina Valente Maia, Mariela Conceição, Riani Helenditi Camurça,<br />
Ellysson Oliveira Abinader, Juliana Matos, Luiz Carlos Santana<br />
de fibrilas insolúveis de baixo peso molecular.<br />
Estas subunidades são derivadas de precursores<br />
solúveis que adotam uma conformação de folhas<br />
β pregueadas antiparalelas. A coloração vermelhocongo<br />
(demonstração de birrefrigência sob a<br />
luz polarizada à microscopia) foi introduzida<br />
desde 1920 para melhor demonstrar a substância<br />
amiloide nos tecidos e o uso da tioflavina<br />
T (produzindo intensa fluorescência verdeamarelada)<br />
foi popularizada em 1950. Em algumas<br />
instâncias, o tipo de amiloide pode ser definido<br />
por imuno-histologia (imunofluorescência ou<br />
técnicas imunoenzimáticas), ou por microscopia<br />
imunoeletrônica. As doenças amiloides podem ser<br />
divididas em sistêmicas ou localizadas, de acordo<br />
com a extensão do seu depósito, ou ainda em<br />
formas adquiridas ou hereditárias, de acordo com<br />
o caráter do depósito. Na Amiloidose Sistêmica (AS)<br />
os órgãos mais envolvidos são: coração, rins, fígado<br />
e nervos periféricos. Os sinais e sintomas gerais<br />
são inespecíficos ou podem estar relacionados ao<br />
órgão acometido. O paciente na maioria das vezes<br />
apresenta perda ponderal significativa e astenia.<br />
Assim, procura-se relatar um caso com várias<br />
manifestações, de evolução insidiosa e progressiva<br />
que desafiou o diagnóstico etiológico.<br />
RELATO DO CASO<br />
Paciente do sexo masculino, pardo, 47 anos,<br />
natural de Manacapuru, interior do Amazonas,<br />
procedente de Manaus, internado em duas<br />
ocasiões diferentes com queixas complementares<br />
e cumulativas. Em setembro de 2007 internou<br />
com diarreia havia um mês, três episódios/dia,<br />
com restos alimentares, sem sangue ou pus de<br />
moderado volume, com cólica abdominal, portanto<br />
de característica baixa, com episódios alternados<br />
de incontinência fecal, epigastralgia com irradiação<br />
para hipocôndrio direito com duração de 30 min a<br />
1 hora, com piora à alimentação, além de náuseas,<br />
vômitos e febre baixa. Em outubro, piora progressiva<br />
dos vômitos e da epigastralgia, acompanhado de<br />
parestesia de membros inferiores e perda ponderal<br />
importante, que até julho de 2008 já somavam 51 kg.<br />
Em seguida, apresentou dificuldade para deambular<br />
e alternância do hábito intestinal com constipação<br />
e diarreia. Em janeiro de 2008, associou-se ao<br />
quadro tontura, lipotímia e hipotensão ortostática.<br />
Em março de 2009, persistência da clínica e<br />
aparecimento de proteinúria em sedimento urinário<br />
e em julho piora da perda de peso agora com 60 kg<br />
a menos, anasarca, fraqueza intensa e hipotensão<br />
significativa que o impedia à mudança de decúbito.<br />
Ao exame físico encontrava-se anasarcado,<br />
desidratado, hipocorado, dispneico (frequência<br />
respiratória de 24 irpm), restrito ao leito e com<br />
manchas hipercrômicas em região plantar. Ausculta<br />
respiratória com murmúrio abolido em bases e<br />
hemitórax esquerdo até 1/3 médio, sem creptos.<br />
Ausculta cardíaca: RCR 2T com bulhas hipofonéticas<br />
sem sopros. Pressão arterial supina 100 x 70 mmHg,<br />
sentado 90 x 60 mmHg e ortostático 70 x 40 mmHg.<br />
Abdômen globoso, flácido, doloroso à palpação<br />
profunda em Hipocôndrio Direito (HD), fígado a 5 cm<br />
do rebordo costal direito, baço impalpável, piparote<br />
positivo. Reflexo aquileu abolido bilateralmente,<br />
patelar abolido à direita e sensibilidade diminuída<br />
nos membros inferiores (tipo bota), força muscular<br />
grau 4 nos membros inferiores e grau 5 nos<br />
superiores. Radiografia de tórax na internação:<br />
derrame pleural bilateral, com sinais de congestão.<br />
Eletrocardiograma (ECG): baixa voltagem em<br />
derivações periféricas, com desvio de eixo para<br />
esquerda (Figura 1). Ecocardiograma (ECO):<br />
hipertrofia moderada concêntrica de ventrículo<br />
direito (VD) e esquerdo (VE), disfunção diastólica<br />
de VE moderada, derrame pericárdico moderado,<br />
fração de ejeção 89% – Metodo de Teicholz (Figura<br />
2). Toracocentese: estudo do líquido pleural –<br />
transudato. Teste Tuberculínico (PPD): não reator.<br />
Hormônio da Tireoide (TSH): 2,9 e T4L: 1,6. Teste de<br />
Sífilis (VDRL) e Sorologias (vírus da imunodeficiência<br />
adquirida – HIV, hepatites B e C, TORCH):<br />
negativas. Colonoscopia: dentro dos padrões da<br />
normalidade. Tomografia Computadorizada (TC) de<br />
tórax: consolidação de contornos lobulados, com<br />
broncogramas de permeio e volumoso derrame<br />
pleural. TC de abdômen: espessamento difuso de<br />
adrenal esquerda. Proteinúria de 24h: 3,4 g/24h.<br />
50<br />
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AMILOIDOSE SISTÊMICA. RELATO DE CASO<br />
Eletroforese de proteínas: Gama 31,57% (VN: 14%-<br />
21%), albumina 41,19% (VN 53%-70%). Biópsia renal<br />
(Serviço de Patologia da Unifesp): amiloidose renal<br />
caracterizada por depósitos de substância amiloide<br />
em glomérulos, parede arterial e arteriolar,<br />
alterações degenerativas vacuolares em células<br />
tubulares; pinocitose tubular de IgA e C3 e traços<br />
glomerulares de IgM e C3, padrão de lesão não<br />
imune. O paciente foi tratado com associação de<br />
Talidomida e Prednisona, no entanto não houve<br />
melhora nem reversão dos sinais e sintomas.<br />
Figura 1 – Eletrocardiograma de baixa voltagem e desvio de eixo para esquerda.<br />
DISCUSSÃO<br />
Figura 2 – Ecocardiograma transtorácico: hipertrofia moderada<br />
concêntrica de VD e VE, disfunção diastólica de VE moderada, derrame<br />
pericárdico moderado sem sinais de restrição, fração de ejeção 89%<br />
(Teicholz).<br />
Na Amiloidose Sistêmica (AS), tipo<br />
apresentado pelo paciente, os sintomas iniciais<br />
são, frequentemente, fadiga e perda de peso.<br />
Já as manifestações órgão-específico envolvem<br />
principalmente rins e coração. O envolvimento<br />
renal manifesta-se com proteinúria e culmina com<br />
síndrome nefrótica com edema e hipoalbuminemia. 1<br />
Evidências de disfunção renal frequentemente são<br />
encontradas e raramente progressivas. A elevação<br />
de creatinina sérica, juntamente com hipertensão<br />
arterial sistêmica, também é incomum. 1, 2<br />
O envolvimento cardíaco manifesta-se com<br />
insuficiência cardíaca congestiva rapidamente<br />
progressiva e pode ser precedida de anormalidades<br />
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Marina Valente Maia, Mariela Conceição, Riani Helenditi Camurça,<br />
Ellysson Oliveira Abinader, Juliana Matos, Luiz Carlos Santana<br />
elétricas. Predominam as características de<br />
insuficiência ventricular direita associada à baixa<br />
voltagem, frequentemente ligada à insuficiência<br />
cardíaca na ausência de doença arterial. O<br />
ecocardiograma mostra aumento de pressão de<br />
enchimento do lado esquerdo, com pequena<br />
onda A, por conta da combinação de infiltração<br />
atrial e restrição do enchimento diastólico.<br />
A espessura miocárdica da parede livre do<br />
ventrículo esquerdo (VE) avaliada ao ECO não só<br />
é alteração diagnóstica, como se pode inferir que<br />
quanto mais espessa, pior a evolução. 8<br />
Pacientes com mais de 1,2 cm e menos<br />
que 1,5 cm de espessura miocárdica apresentam<br />
sobrevida de 1,3 ano e aqueles com mais de<br />
1,5 cm apresentam sobrevida de 0,4 ano.<br />
Novos marcadores estão sendo desenvolvidos.<br />
A captação de componente P de substância<br />
amiloide (SAP) marcado com iodo 123 tem se<br />
mostrado útil no diagnóstico da doença e na<br />
avaliação do prognóstico. 3 Em muitos casos,<br />
trombos no átrio podem estar presentes, mesmo<br />
que o ritmo cardíaco seja sinusal, e o surgimento<br />
de fibrilação atrial está associado com alto risco<br />
de tromboembolismo. 3, 4<br />
Ainda é comum o acometimento dos sistemas<br />
nervoso autônomo e periférico. A síndrome do<br />
Túnel do Carpo é frequentemente relatada, sendo<br />
a neuropatia motora rara. A neuropatia sensorial<br />
tem padrão distal para proximal e simétrica, e<br />
manifesta-se com quadro de dor. Já a disfunção<br />
do sistema nervoso autônomo é mais grave,<br />
resultando em hipotensão, impotência e distúrbios<br />
de motilidade gastrintestinais. Em complemento<br />
aos distúrbios autônomos gastrintestinais<br />
(saciedade precoce, constipação ou diarreia), o<br />
trato gastrintestinal é frequentemente infiltrado<br />
com depósitos amiloides, mas raramente é<br />
associado à má absorção ou pseudo-obstrução. 7<br />
Pela apresentação clínica insidiosa e de<br />
difícil diagnóstico, foram pedidos vários exames<br />
a fim de excluir outras doenças e comorbidades<br />
que correspondessem ao quadro. A amiloidose<br />
pode se manifestar de várias formas com<br />
derrames cavitários, mimetizando doenças<br />
imunodepressoras, endocrinológicas e infecciosas<br />
como tuberculose, síndrome da imunodeficiência<br />
humana, hipotireoidismo, deficiências enzimáticas<br />
associadas à má absorção e perda ponderal<br />
significativa.<br />
O comprometimento importante do sistema<br />
nervoso autônomo e periférico, representados<br />
por hipotensão significativa e incapacitante,<br />
além de parestesias em luva e bota, mostra a<br />
necessidade de excluir alguns diagnósticos como<br />
doenças de etiologia viral e bacteriana, como vírus<br />
hepatotrópicos e sífilis.<br />
A quimioterapia é o tratamento de escolha<br />
para esta condição. Baseado no Guidelines<br />
Working Group of UK Myeloma Fórum, a<br />
quimioterapia pode ser classificada em três<br />
grupos. O primeiro, de baixa dose, baseado no<br />
uso singular de melfalan ou ciclofosfamida, com<br />
ou sem o uso de prednisona. 6 O segundo grupo, de<br />
dose intermediária, é baseado num curso mensal<br />
de VAD (vincristina, adriamicina, dexametasona)<br />
ou dose intravenosa intermediária de melfalan (25<br />
mg/m 2 ), com ou sem dexametasona. E o terceiro<br />
grupo, o transplante autólogo de células-tronco<br />
(TACT), com o uso de melfalan intravenoso de 100-<br />
200 mg/m. 2, 5<br />
Verificam-se, em vários trabalhos,<br />
resultados ruins e insatisfatórios no tratamento<br />
com colchicina e que o esquema vincristina,<br />
adriamicina e dexametasona (VAD) deve ser<br />
considerado a primeira linha de tratamento para<br />
os pacientes com idade inferior a 70 anos que não<br />
têm sintomas de insuficiência cardíaca, neuropatia<br />
autonômica ou neuropatia periférica. Dose<br />
intermediária de melfalan pode ser considerada<br />
em pacientes que toleram terapia intravenosa,<br />
mas que o VAD tenha sido contraindicado ou<br />
tenha produzido uma resposta inadequada. Altas<br />
doses de Dexametasona apresentam resultados<br />
iniciais semelhantes ao VAD e deve ser instituída<br />
quando este apresenta alta toxicidade.<br />
O esquema escolhido para o nosso paciente<br />
foi associação de Talidomida e Dexametasona<br />
em doses altas com acompanhamento mensal da<br />
resposta, pela gravidade e avanço da doença,<br />
que foi descoberta tardiamente. O seguimento<br />
deste paciente foi realizado pelo Serviço de<br />
Hematologia do hospital e após isso encaminhado<br />
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AMILOIDOSE SISTÊMICA. RELATO DE CASO<br />
ao ambulatório da Fundação de Hematologia<br />
do Amazonas (Hemoam), uma vez que lá se<br />
encontravam especialistas com maior experiência<br />
no caso. Sabe-se que o esquema VAD apresenta<br />
inúmeras vantagens no tratamento da AS, na<br />
qual uma resposta rápida é desejada. Somase<br />
a isso o fato de esse esquema não depletar<br />
a reserva de célula-tronco, resguardando a<br />
possibilidade da utilização do TACT (transplante<br />
autólogo de células-tronco). O VAD foi o esquema<br />
que demonstrou maior média de sobrevida (50<br />
meses), com resposta de 50% dos pacientes. 5<br />
Como o paciente, no entanto, apresentava clínica<br />
exuberante e comprometimento cardíaco, sistema<br />
nervoso autonômico e neuropatia periférica, além<br />
de grandes possibilidades de toxicidade e não<br />
tolerância às drogas quimioterápicas, optou-se por<br />
esse esquema paliativo, na tentativa de melhorar<br />
a qualidade de vida dele.<br />
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Santos I, Lotufo PA, Benseñor IM, et al. Clínica Médica –<br />
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53<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Juliana da Costa Matos, Isabele Reis Araújo, Wilson Seffair Bulbol<br />
INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA NA<br />
HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA NOTURNA.<br />
RELATO DE CASO<br />
ACUTE RENAL FAILURE IN PAROXYSMAL NOCTURNAL HAEMOGLOBINURIA.<br />
CASE REPORT<br />
Juliana da Costa Matos*, Isabele Reis Araújo*, Wilson Seffair Bulbol**<br />
RESUMO<br />
Hemoglobinúria Paroxística Noturna (HPN) é uma doença clonal adquirida das células-tronco<br />
hematopoiéticas, caracterizada por hemólise intravascular, hemoglobinúria e trombose venosa. Ocorre<br />
por um defeito molecular da membrana dos eritrócitos com redução na expressão das proteínas CD59 e<br />
CD55. Relatamos um caso de HPN em paciente de 30 anos, sexo masculino, evoluindo insuficiência renal<br />
aguda dialítica. O paciente apresentou melhora da função renal, atingindo sua creatinina basal de 0,3<br />
mg/dl. IRA na HPN é associada com crises hemolíticas e pode resolver sem dano residual.<br />
Palavras-chave: Hemoglobinúria paroxística noturna, insuficiência renal aguda, hemodiálise.<br />
ABSTRACT<br />
Nocturnal paroxysmal hemoglobinuria (NPH) is an acquired clonal disorder of hematopoietic stem cells<br />
characterized by intravascular hemolysis, hemoglobinuria, and venous thrombosis. It occurs due to<br />
defective membrane molecules of erythrocytes with reduced expression of CD59 and CD55. We describe<br />
a case of NPH in a 30-year-old man who had one episode of dialytic acute renal failure. The patient renal<br />
function improved presenting a baseline creatinine of 0,3 mg/dL. Acute renal failure in NPH is associated<br />
with hemoglobinuric crises and may be resolved without residual damage.<br />
Keywords: Paroxysmal nocturnal hemoglobinuria, acute renal failure, hemodyalis.<br />
INTRODUÇÃO<br />
A hemoglobinúria paroxística noturna é<br />
uma enfermidade clonal adquirida da célulatronco<br />
hematopoiética, caracterizada por<br />
mutações somáticas do gene PIG-A, ligadas ao<br />
cromossomo X. O déficit da proteína glicosilfosfatidil-inositol<br />
(GPI) condiciona alterações<br />
nas proteínas reguladoras de membrana (CD55 e<br />
CD59) que acarretam uma sensibilidade anormal<br />
ao complemento. 1 Caracteriza-se por hemólise<br />
intravascular, hemoglobinúria, hemossiderinúria,<br />
anemia, trombocitopenia, hematopoese<br />
*<br />
Médico Residente, segundo ano em Nefrologia, <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
** Nefrologista, preceptor da residência médica em Nefrologia e Mestre em Nefrologia da Unifesp-EPM<br />
54<br />
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INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA NA HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA NOTURNA.<br />
RELATO DE CASO<br />
diminuída e tendência a fenômenos trombóticos,<br />
especialmente em veias abdominais. 2 Insuficiência<br />
renal aguda pode ocorrer em associação às<br />
crises hemolíticas. 3 Fatores precipitadores das<br />
crises hemolíticas incluem drogas, infecções,<br />
imunizações e exercícios, mas frequentemente a<br />
etiologia permanece desconhecida. 4 Atualmente,<br />
ainda não dispomos de tratamento que<br />
efetivamente reduza os episódios de hemólise<br />
intravascular ou melhore os sintomas da doença.<br />
Estratégias terapêuticas, utilizando anticorpos<br />
monoclonais humanizados (eculizumab) contra<br />
frações proteicas do complemento, têm sido<br />
tentadas recentemente, reduzindo a necessidade<br />
de transfusões e diminuindo a severidade dos<br />
fenômenos hemolíticos.<br />
Descrevemos um caso de hemoglobinúria<br />
paroxística noturna que se apresentou com<br />
insuficiência renal aguda após crises hemolíticas,<br />
necessitando de terapia substitutiva renal na ocasião<br />
e evoluindo com recuperação da função renal.<br />
revelaram: hemograma= 3.000 leucócitos/<br />
mm 3 , Ht=18,0%, Hb=6,2 g/dl, 90.000 plaquetas/<br />
mm 3 ; sódio= 135 mEq/L, potássio= 4,8 mEq/L,<br />
ureia=235 mg/dl, creatinina=12,4 mg/dl, parcial<br />
de urina: densidade=1,020, pH=6,0, proteínas (++),<br />
hemoglobina (+++), leucócitos 25/campo, hemácias<br />
15/campo, ausência de bactérias, ultrassonografia<br />
de vias urinárias com rins tópicos com aumento da<br />
ecogenicidade e dimensões aumentadas. Tratado<br />
com transfusão sanguínea, pulsoterapia corticoide<br />
e hemodiálise (quatro sessões).<br />
Submetido à biópsia renal que evidenciou<br />
hemossiderose maciça e alterações degenerativas<br />
tubulares.<br />
Evoluiu com aumento progressivo do volume<br />
urinário e queda nos níveis de ureia e creatinina,<br />
tendo alta hospitalar com creatinina de 1,7 mg/<br />
dl. Atualmente, dois anos após o episódio de<br />
insuficiência renal aguda, apresenta creatinina de<br />
0,3 mg/dl.<br />
RELATO DO CASO<br />
DISCUSSÃO<br />
Paciente de 30 anos, branco, sexo<br />
masculino, com diagnóstico de anemia havia 4<br />
anos em tratamento na Fundação Hemoam. Foi<br />
submetido à investigação para hemoglobinúria<br />
paroxística noturna, tendo realizado os testes<br />
imunofenotipagem CD55 e CD59, que confirmaram<br />
o diagnóstico. Tratado com hemoterapia, ácido<br />
fólico, prednisona.<br />
Fazia dois anos, admitido em crise hemolítica<br />
com história de astenia, palidez, urina avermelhada,<br />
febre, dor lombar, diminuição do volume urinário e<br />
dispneia. Refere início dos sintomas após quadro<br />
diarreico prévio.<br />
Ao exame físico consciente, taquipneico,<br />
ictérico (++/4+), palidez cutânea e mucosas +++/4+,<br />
PA= 130/90 mmHg, FC= 85bpm, desidratado<br />
+++/4+, edema MMII ++/4+ com cacifo. Auscultas<br />
cardíaca e pulmonar sem alterações, abdome<br />
doloroso com hepatomegalia de 5 cm abaixo do<br />
rebordo costal e traube livre. Exames laboratoriais<br />
A hemoglobinúria paroxística noturna (HPN)<br />
é uma rara doença clonal adquirida de células<br />
hematopoiéticas. 5 Ocorre predominantemente<br />
em adultos. Caracteriza-se por uma hematopoese<br />
insuficiente, resultante de um aumento da<br />
sensibilidade dos eritrócitos à hemólise intravascular<br />
mediada pelo complemento por deficiência da<br />
expressão de proteínas reguladoras de membrana<br />
CD55 e CD59. 6 Ocorrem mutações somáticas do<br />
gene PIG-A, ligadas ao cromossomo X. 7 O déficit da<br />
proteína glicosil-fosfatidil-inositol (GPI) condiciona<br />
alterações de membrana que são responsáveis pela<br />
hemólise. 3 Na população brasileira, a mutação<br />
no gene PIG-A foi descrita pela primeira vez por<br />
Carvalho e colaboradores. 8 Insuficiência renal<br />
aguda e crônica pode ocorrer em pacientes com<br />
HPN3, 5, 9 IRA é associada com crises hemolíticas<br />
e pode ocorrer recuperação sem dano residual, 10<br />
conforme observado neste paciente. Podem<br />
ocorrer: hemoglobinúria, hematúria, proteinúria,<br />
hipertensão, distúrbios de concentração urinária<br />
55<br />
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Juliana da Costa Matos, Isabele Reis Araújo, Wilson Seffair Bulbol<br />
e repetidos episódios de trombose em microvasos renais. 7, 9, 11 A IRA pode ser a primeira manifestação<br />
da doença. 5, 10 A ocorrência de IRA em grandes séries de HPN é muito rara 12 ou não é descrita. 13 Clark e<br />
colaboradores 8 descreveram 21 casos de HPN e somente um caso de azotemia leve. Em alguns pacientes,<br />
a IRA ocorre na HPN associada a choque hipovolêmico, sepse, gestação ou pielonefrite, 5 porém a principal<br />
causa de óbito é a trombose venosa e insuficiência medular. 14<br />
A causa comum de insuficiência renal aguda na HPN é necrose tubular aguda. Quando ocorre<br />
insuficiência renal crônica, entretanto, visualizamos mudanças túbulo-intersticiais com intensos depósitos<br />
de hemossiderina no túbulo proximal e nefroesclerose arterial. 15<br />
O exame histológico em casos de IRA na HPN tem demonstrado hemossiderose tubular proximal,<br />
sendo escassa em túbulo distal e glomérulo.<br />
É importante monitorar a função renal desses pacientes, principalmente durante as crises<br />
hemolíticas, além de tomar medidas para aumentar o volume urinário, como hidratação adequada, para<br />
evitar depleção do espaço extracelular e hipotensão arterial, que causam redução da perfusão renal e<br />
predispõem a quadros de IRA em situações de hemólise.<br />
Figura 1 – Biópsia renal revela depósitos de pigmento (setas) em células epiteliais tubulares,<br />
acompanhado por necrose tubular e degeneração. (Hematoxilina e eosina)<br />
Figura 2 – Azul da Prússia confirma como pigmentação depósitos de hemossiderina (setas).<br />
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INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA NA HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA NOTURNA.<br />
RELATO DE CASO<br />
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Alexandre Herculanno Ribera Marcião, Luiz Carlos Nadaf Lima<br />
Rafael Siqueira de Carvalho, Renato Telles de Sousa, Leandro Tavares Flaiban<br />
MELANOMA PRIMÁRIO DE MUCOSA NASAL<br />
PRIMARY MELANOMA OF THE NASAL MUCOSA<br />
Alexandre Herculanno Ribera Marcião* ,, Rafael Siqueira de Carvalho*,<br />
Luiz Carlos Nadaf Lima **, , Renato Telles de Sousa***, Leandro Tavares Flaiban****<br />
RESUMO<br />
O Melanoma primário de mucosa nasal é um tumor raro, de comportamento agressivo e prognóstico sombrio,<br />
correspondendo menos de 1% de todos os melanomas e menos de 4% dos tumores nasossinusais, diferente<br />
da pele do nariz que é o local mais comum de câncer de pele. Juntamente com a cavidade oral, são os<br />
principais locais de acometimento da mucosa aerodigestiva. Relatamos caso de um paciente idoso, na 7. a<br />
década de vida, com obstrução nasal progressiva e epistaxes recorrentes de tumor de concha nasal inferior<br />
em fossa nasal direita, com diagnóstico histopatológico de melanoma. Foi submetido à maxilectomia medial<br />
direita com remoção do septo nasal em contato e encaminhado à radioterapia pós-operatório.<br />
ABSTRACT<br />
The primary melanoma of the nasal mucosa is a rare tumor of dismal prognosis and aggressive behavior,<br />
with less than 1% of all melanomas and less than 4% of the tumors nasosinusal, unlike the skin of the<br />
nose is the most common site of cancer of the skin. Together with the oral cavity, are the main sites of<br />
involvement of the mucosa disgestive and airway. We report the case of an elderly patient, in the 7th<br />
decade of life with progressive nasal obstruction and recurrent epistaxis from inferior turbinate of tumor<br />
in right nasal cavity, with histopathologic diagnosis of melanoma. He was submitted to right medial<br />
maxillectomy with removal of nasal septum in touch and referred to radiotherapy after surgery.<br />
INTRODUÇÃO<br />
Os tumores malignos da cavidade nasal<br />
propriamente dita é uma entidade incomum, porém<br />
os tumores nasossinusais malignos são responsáveis<br />
por 3% dos tumores malignos aerodigestivos<br />
superiores. 3<br />
O melanoma primário de mucosa nasal é<br />
um tumor raro, de comportamento agressivo e<br />
prognóstico sombrio, correspondendo menos de 1%<br />
de todos os melanomas e menos de 4% dos tumores<br />
nasossinusais, 1, 5 diferente da pele do nariz que é o<br />
local mais comum de lesão cutânea. 4 Juntamente<br />
com a cavidade oral, são os principais locais.<br />
Esses tumores desenvolvem-se a partir<br />
de melanócitos na mucosa nasossinusal.<br />
Microscopicamente, seu aspecto é bastante<br />
variável em suas formas celulares, nucléolos muito<br />
*<br />
Médico Residente em ORL do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> (<strong>HUGV</strong>) – <strong>Ufam</strong><br />
**<br />
Médico Assistencial em ORL do <strong>HUGV</strong> – <strong>Ufam</strong>. Mestre em ORL pela Unifesp<br />
***<br />
Professor da disciplina de ORL do Curso de Medicina – <strong>Ufam</strong>. Mestre em ORL pela Unifesp. Chefe do Serviço de ORL do <strong>HUGV</strong><br />
– <strong>Ufam</strong><br />
****<br />
Médico Assistencial em ORL do <strong>HUGV</strong> – <strong>Ufam</strong><br />
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MELANOMA PRIMÁRIO DE MUCOSA NASAL<br />
evidentes, núcleos hipercromáticos e alto número<br />
de mitoses, com grânulos melanócitos evidentes. 1<br />
Macroscopicamente, podem apresentar forma<br />
polipoide ou ulcerado, e a cor varia de branco,<br />
róseo, vermelho a cinza, marrom ou preto. 2<br />
Seus sintomas são inespecíficos e tardios,<br />
representados por obstrução nasal e epistaxe,<br />
podendo confundir com doenças mais prevalentes<br />
como rinossinusites crônicas. 1, 2, 3 Além da sua<br />
dificuldade de diagnóstico por conta de sua<br />
localização, um terço das lesões podem ser<br />
amelanocíticas. 2<br />
Por conta de seu comportamento<br />
agressivo e clínica inespecífica, seu diagnóstico<br />
normalmente é tardio para uma lesão já<br />
avançada, o que piora substancialmente o<br />
prognóstico a curto prazo.<br />
RELATO DO CASO<br />
Paciente idoso, na 7. a década de vida,<br />
tabagista, foi atendindo pelo Serviço de<br />
Otorrinolaringologia do <strong>Hospital</strong> Universitário<br />
Getúlio <strong>Vargas</strong> (Universidade Federal do<br />
Amazonas – <strong>Ufam</strong>), queixando-se de obstrução<br />
nasal progressiva à direita, com piora nos<br />
últimos 3 meses, evoluindo com epistaxes<br />
recorrentes de pequeno volume. À rinoscopia<br />
anterior, observou-se massa de aspecto irregular,<br />
com manchas escuras e crostas hemáticas<br />
ocupando a fossa nasal direita. A Tomografia<br />
Computadorizada dos Seios da Face demonstrou<br />
material de partes moles preenchendo a metade<br />
inferior da fossa nasal direita em toda sua<br />
extensão, com comprometimento da parede<br />
medial do seio maxilar direito e do septo nasal<br />
(Figura 1 A e B). Após biópsia, conclui-se que<br />
o tumor tinha características histológicas de<br />
melanoma moderadamente diferenciado.<br />
Após discussão do caso em reunião<br />
clínica do Serviço de Otorrinolaringologia, foi<br />
programada ressecção cirúrgica com margens<br />
e radioterapia subsequente. Durante o ato<br />
cirúrgico, foi observada a lesão primária na<br />
concha nasal inferior direita com contato com<br />
a parede lateral, concha nasal média e septo<br />
nasal, sendo realizado Turbinectomia Total Média<br />
e Inferior direita, Maxilectomia medial direita e<br />
remoção do septo nasal em contato (Figura 2).<br />
Figura 1 A – TC de seios da face, corte axial, com<br />
imagem sugestiva de material de partes moles em<br />
fossa nasal direita.<br />
Figura 1 B – TC de seios da face, corte coronal,<br />
observando erosão de septo nasal e parede medial<br />
de seio maxilar direito.<br />
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Alexandre Herculanno Ribera Marcião, Luiz Carlos Nadaf Lima<br />
Rafael Siqueira de Carvalho, Renato Telles de Sousa, Leandro Tavares Flaiban<br />
Figura 2 – Lesão tumoral em conchas nasais média e<br />
inferior.<br />
DISCUSSÃO<br />
Os tumores malignos nasais apresentam como<br />
fatores de risco a exposição ao níquel, pó de madeira,<br />
solventes químicos e principalmente ao tabagismo. 4<br />
Os Melanomas Nasais, no entanto, não possuem<br />
uma etiologia certa e seus fatores de risco são<br />
desconhecidos, 3 não surgindo de lesões precursoras<br />
ao contrário dos melanomas malignos cutâneos. Há<br />
autores, no entanto, que sugerem que a exposição<br />
ao Formaldeído seria um dos fatores de risco. 5<br />
Ocorrem geralmente em pacientes de idade<br />
avançada, entre 50 e 70 anos de idade, com extremos<br />
que podem variar de 23 a 93 anos de idade, havendo<br />
discreto predomínio do sexo masculino, embora<br />
1, 3, 6, 7<br />
idade e sexo não influenciem o prognóstico.<br />
Seus sintomas são inespecíficos, obstrução<br />
nasal e a epistaxe, sejam isolados ou concomitantes,<br />
são os mais observados, os quais podem simular<br />
uma rinossinusite crônica. O aumento do volume<br />
nasal, a rinorreia, rinolalia, hiposmia, cefaleias<br />
fronto-orbiotárias, algias faciais, exoftalmia,<br />
diplopia nos casos com invasão de órbita. 1, 3, 6, 7 Uma<br />
das características mais notáveis dos melanomas<br />
mucosos é o seu curso clínico imprevisível. 3<br />
Existe uma divergência entre os autores quanto<br />
à prevalência dos locais, sendo os mais prevalentes a<br />
parede lateral, as conchas nasais inferiores e médias,<br />
1, 3, 5, 6, 7<br />
o septo nasal, seios maxilares e etmoidais,<br />
porém o sítio preciso de origem do tumor é muitas<br />
vezes difícil de se determinar por conta da extensão<br />
das lesões no momento do diagnóstico. Isso se torna<br />
ainda mais complicado pela presença de lesões<br />
satélites e pela existência de áreas de melanoma<br />
amelanótico concomitantes em muitos casos. 1<br />
Em aproximadamente 10 a 50% dos casos,<br />
os pacientes podem apresentar metástases<br />
ganglionares e em 40 a 76% metástases acometendo<br />
pulmão, fígado, cérebro, pele e órbita. 1<br />
O diagnóstico de melanoma pode ser<br />
confirmado histologicamente pela presença da<br />
melanina preto-castanho-claro por meio das<br />
colorações hematoxilina-eosina e prata de Fontana-<br />
Masson, pelo exame ultraestrutural, ou por estudos<br />
imuno-histoquímicos positivos para proteína S100,<br />
VIM e HMB45. 1, 6, 7 Os marcadores epiteliais (CEA,<br />
EMA, citoceratinas) são negativos. 1<br />
O tratamento cirúrgico com ressecção de<br />
amplas margens de segurança, envolvendo todas as<br />
estruturas ósseas adjacentes à neoplasia, é método<br />
de escolha. 1, 3, 5, 6, 7 A maioria dos autores considera<br />
que os resultados com a radioterapia, quimioterapia<br />
e a imunoterapia são decepcionantes, ou apenas<br />
paliativos naqueles pacientes com margens<br />
1, 3,<br />
irressecáveis ou com metástase a distância.<br />
6, 7<br />
A adição da radioterapia à cirurgia tende a<br />
diminuir a taxa de insucesso local, mas não melhora<br />
significativamente a sobrevida, por causa da alta<br />
taxa de metástases. 5<br />
O prognóstico do melanoma de fossas<br />
nasais é ruim por tratar-se de um tumor bastante<br />
agressivo, diagnosticado em formas avançadas<br />
pela sua característica intracavitária.<br />
Estudos mostram sobrevidas discretamente<br />
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MELANOMA PRIMÁRIO DE MUCOSA NASAL<br />
diferentes, porém todos concluem que seu<br />
prognóstico é sombrio, onde mais da metade dos<br />
pacientes morrem no período de 3 anos (7 a 65%) 1,5<br />
e apenas 22 a 36% apresentam 5 anos de sobrevida. 1,<br />
5, 6, 7<br />
Alguns pacientes morrem dentro de<br />
algumas semanas ou meses após a apresentação<br />
inicial dos sintomas, com rápida disseminação da<br />
doença apesar do tratamento cirúrgico. Outros<br />
permanecem um longo período de tempo sem<br />
a manifestação da doença até que algum fator<br />
prejudique o equilíbrio imunológico, o que permite<br />
uma recorrência agressiva a curto prazo. Outros<br />
sobrevivem por períodos maiores intercalados pelo<br />
surgimento de metástases locais e cervicais que<br />
podem ser controladas cirurgicamente. 1<br />
CONCLUSÃO<br />
Por se tratar de uma neoplasia de mucosa<br />
rara, com sintomas tardios, de comportamento<br />
agressivo e diagnóstico tardio, os estudos voltados<br />
para o melanoma de mucosa nasal no intuito de<br />
esclarecer seus fatores de risco, desenvolver<br />
métodos de diagnóstico precoces e modalidades<br />
terapêuticas mais eficazes são difíceis de serem<br />
desenvolvidos.<br />
Dessa forma, seus sintomas, que são<br />
inespecíficos, não devem ser menosprezados, uma<br />
vez que o único fator que melhora a sobrevida do<br />
paciente é seu diagnóstico precoce.<br />
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61<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Isabele Reis de Araújo, Juliana da Costa Matos, Junio Aguiar Azevedo<br />
ANEMIA PELA INFECÇÃO POR PARVOVÍRUS B19<br />
EM PACIENTE DE TRANSPLANTE RENAL<br />
ANEMY DUE PARVOVIRUS B19<br />
INFECTION IN KIDNEY TRANSPLANTED PATIENT<br />
Isabele Reis de Araújo*, Juliana da Costa Matos*, Junio Aguiar Azevedo**<br />
RESUMO<br />
Anemia é uma importante intercorrência no transplante renal. Dentre diversas causas, uma causa<br />
frequente é a infecção por Parvovírus B19, que ocorre em até 23% dos pacientes. Este relato descreve<br />
um caso de paciente transplantada renal com anemia crônica severa por infecção por Parvovírus B19.<br />
Descritores: Anemia, parvovírus B19, transplante renal.<br />
SUMMARY<br />
Anemia is an important complication in kidney<br />
transplant. Among various causes, a cause SUMARY<br />
Anemia is an important complication in kidney<br />
transplant. Among various causes, a cause frequent<br />
is Parvovirus B19 infection, which occurs in 23%<br />
of patients. .This case report describes a renaltransplant<br />
patient with severe chronic anemia due<br />
Parvovirus B19 infection.<br />
Keywords: Anemia, kidney transplantation,<br />
parvovirus B19.<br />
INTRODUÇÃO<br />
O Parvovírus humano B19 é a causa etiológica<br />
da “quinta doença” ou Eritema Infeccioso em<br />
crianças. É uma doença autolimitada em hospedeiros<br />
imunocompetentes. Em imunocomprometidos,<br />
causa infecção crônica, podendo levar à anemia<br />
O<br />
1, 2, 3<br />
grave por supressão da eritropoiese.<br />
objetivo deste estudo foi relatar o caso de<br />
transplantado renal evoluindo anemia crônica por<br />
infecção por Parvovírus B19 após o transplante renal<br />
em Serviço de Nefrologia no <strong>Hospital</strong> Universitário<br />
Getúlio <strong>Vargas</strong>.<br />
RELATO DO CASO<br />
Paciente do sexo feminino, 24 anos, branca,<br />
submetida a transplante renal de doador vivo<br />
(mãe, HLA haploidêntico), em dezembro de 2007,<br />
pela Insuficiência Renal Crônica por Nefrite Lúpica.<br />
Após o transplante, manteve o quadro de anemia<br />
sintomática com necessidade de transfusão de<br />
concentrado de hemácias lavadas. Realizado<br />
estudo da anemia. Os exames demonstravam:<br />
hemoglobina: 6,7 g/dL; hematócrito: 20%; VCM: 82;<br />
leucócitos: 5600; plaquetas: 301000; ferritina: 737;<br />
ferro sérico: 142; saturação de transferrina: 28%;<br />
creatinina: 1,0 mg/dL; coombs direto negativo;<br />
C3: 126; C4: 25; TSH: 0,35; T4 livre: 1,07; dosagem<br />
de vitamina B12: 316 (normal); dosagem de<br />
*<br />
Médico Residente segundo ano em Nefrologia, <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
** Recebido do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>, Serviço de Nefrologia.<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
ANEMIA PELA INFECÇÃO POR PARVOVÍRUS B19<br />
EM PACIENTE DE TRANSPLANTE RENAL<br />
folato > 20; pesquisa de hemácias fragmentadas:<br />
negativas; contagem de reticulócitos: 0,4%;<br />
dosagem de haptoglobina: 242. Sendo assim, feito<br />
diagnóstico de anemia normocrômica normocítica,<br />
sem evidências de hemólise, deficiência de ferro,<br />
vitamina B12 ou ácido fólico. Iniciado agente<br />
estimulante da eritropoietina (EPREX, 200UI/kg/<br />
sem), sem resposta laboratorial.<br />
A terapia imunossupressora estava sendo<br />
realizada com tacrolimo (8 mg/dia), micofenolato<br />
de sódio (1.440 mg/dia) e prednisona (7,5 mg/dia).<br />
Em abril de 2008, a paciente retornou com a<br />
equipe de Reumatologia do <strong>Hospital</strong> Universitário<br />
Getúlio <strong>Vargas</strong>, sendo realizado PCR e identificado<br />
Parvovírus B19. Realizado tratamento com<br />
imunoglobulina humana (400 mg/kg/dia por 5 dias),<br />
suspenso agente estimulante da eritropoietina e<br />
micofenolato de sódio e iniciado rapamicina (2<br />
mg/dia), tendo apresentado resposta laboratorial<br />
importante que se manteve por aproximadamente<br />
30 dias. Após, iniciou novo quadro de anemia<br />
(hemoglobina: 6,8 g/dL), sendo realizado mielograma<br />
que demonstrava medula hipocelular, eritropoiese<br />
ausente, visualizados elementos proeritrolastos e<br />
megaloblastos, 82% de granulócitos sem alterações<br />
de maturação, ferro 4+/4. Biópsia de medula óssea:<br />
discreto grau de hipocelularidade, hiperplasia reativa<br />
da série eritroide com micro e megablastos, série<br />
granulocítica com maturação preservada, moderado<br />
grau de eosinofilia, megacariócitos com morfologia<br />
e maturação preservada, hemossiderose moderada,<br />
preservação da trama retículo-óssea. Em maio de<br />
2008, realizado nova pulsoterapia com imunoglobulina,<br />
evoluindo com melhora clínica e laboratorial.<br />
Em fevereiro de 2009, a paciente é internada<br />
no Centro Integrado de Nefrologia do <strong>HUGV</strong>, com<br />
anemia sintomática, recebendo concentrado de<br />
hemácias lavadas, e realizando novo estudo da<br />
anemia, sem alterações. Realizada sorologia e PCR<br />
para parvovírus, ambos com resultado negativo.<br />
Nova biópsia de medula óssea é realizada<br />
com pan-hipocelularidade, megaloblastose,<br />
presença de megaloblastos anômalos, com<br />
frequentes intranucleares de aspecto viral,<br />
maturação preservada da série granulocítica,<br />
série megacariocítia preservada, discreta<br />
linfoplasmocitose de fundo, hemossiderose<br />
moderada, trama retículo-óssea preservada.<br />
Decidiu-se realizar tratamento com<br />
imunoglobulina (400 mg/kg/dia/ por 5 dias)<br />
durante três meses, substituído tacrolimus por<br />
ciclosporina (300 mg/dia) e diminuído dose de<br />
rapamicina (1 mg/dia). Paciente responde bem ao<br />
tratamento, mantendo níveis laboratoriais normais<br />
de hemoglobina (11,4 g/dL).<br />
DISCUSSÃO<br />
A anemia é uma complicação frequente<br />
do transplante renal. Sua causa é difícil de<br />
estabelecer pelos inúmeros fatores envolvidos.<br />
Pode ocorrer por: hemólise, sangramentos, efeito<br />
mielotóxico de fármacos, agentes infecciosos,<br />
deficiência de ferro, folato e vitamina B12,<br />
infecções por Parvovírus Humano B19 (B19V) em<br />
transplantados renais são comuns. A sua incidência<br />
varia de 0%-6,3%, porém é mais alta em pacientes<br />
que apresentam anemia, chegando a 23%. 6<br />
B19V é um vírus pequeno, com uma<br />
cadeia única de DNA descoberto em 1975. A sua<br />
patogênese pode ser explicada pelo seu tropismo<br />
e citotoxicidade direta contra células progenitoras<br />
eritroides. 6<br />
A manifestação clínica da infecção por B19V<br />
depende do estado imunológico do hospedeiro.<br />
Em pacientes imunocompetentes, a infecção pode<br />
ser assintomática ou autolimitada como Eritema<br />
Infeccioso em crianças ou artropatias em adultos.<br />
Em pacientes com anemia hemolítica<br />
crônica, a infecção pode resultar em crise aplástica<br />
transitória ou hidropsia fetal não imunológica em<br />
gestantes. Já pacientes imunocomprometidos,<br />
a infecção é mais grave e crônica, por conta<br />
da deficiência na produção de anticorpos<br />
neutralizantes. Anemia grave por supressão da<br />
eritropoiese pode ocorrer em imunocomprometidos<br />
com infecção crônica. 16<br />
Há alguns relatos de glomerulopatias e<br />
63<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Isabele Reis de Araújo, Juliana da Costa Matos, Junio Aguiar Azevedo<br />
disfunção do enxerto relacionado à infecção por<br />
parvovírus. 17 Em seu estudo, porém, Ki e col. não<br />
demonstraram nenhuma evidência de associação<br />
entre a infecção e alterações no enxerto. 16<br />
A transmissão ocorre por três maneiras: (1) pela<br />
via respiratória, meio mais comum; (2) transmissão<br />
vertical, no caso da gestante ser infectada durante<br />
as primeiras 20 semanas, o risco para o feto é maior;<br />
e (3) transmissão hematogênica.<br />
A suspeição ocorre em pacientes com anemia<br />
com reticulocitopenia grave. O diagnóstico é feito<br />
por meio da pesquisa de anticorpos anti-B19<br />
IgG e IgM em pacientes imunocompetentes. Em<br />
imunocomprometidos, PCR é o método de escolha,<br />
por não exibirem resposta humoral detectável.<br />
A biópsia óssea demonstrará uma hipoplasia<br />
da série eritroide, e uma alteração morfológica<br />
patognomônica que são os proeritroblastos gigantes<br />
com inclusões intranucleares proeminentes e<br />
vacúolos citoplasmáticos.<br />
Embora não exista terapêutica específica<br />
para esta infecção, imunoglobulina endovenosa<br />
parece ser benéfica, por conta dos altos títulos de<br />
15, 18<br />
anticorpos IgG específicos para Parvovírus B19.<br />
Esses efeitos benéficos, contudo, podem ser apenas<br />
temporários. Alguns estudos mostram melhora<br />
com infusões periódicas de imunoglobulina. A dose<br />
mais adotada é 400 mg/kg/dia por 5 dias ou 1 g/<br />
kg/dia por 2 a 3 dias. 19, 20 Este regime é curativo,<br />
na maioria das vezes, com melhora da viremia<br />
acompanhado de reticulocitose e aumento nos<br />
níveis de hemoglobina.<br />
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64<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
ADENOMA DE PARATIREOIDE INTRATORÁCICO: RELATO DE CASO<br />
ADENOMA DE PARATIREOIDE INTRATORÁCICO:<br />
RELATO DE CASO<br />
PARATHYROID ADENOMA INTRA-THORACIC: CASE REPORT<br />
Enio B. Carneiro*, Arteiro Menezes**,<br />
Tatiana Cattebeke***, Lubyanka F. Pereira***, Vanessa Cardoso****<br />
RESUMO<br />
Adenoma de paratireoide é a causa de hiperparatireoidismo primário em cerca de 80% dos casos, devendose<br />
suspeitar do diagnóstico em indivíduos com hipercalcemia ou com manifestações clínicas clássicas<br />
da doença. Metade dos adenomas possui localização intratorácica, mais precisamente no mediastino<br />
anterior. O tratamento cirúrgico dele é a opção de escolha nos casos em que o controle clínico dos níveis<br />
de calcemia e paratormônio sérico falharam.<br />
Palavras-chave: Adenoma, paratireoide, intratorácico, hiperparatireoidismo primário, hipercalcemia.<br />
ABSTRACT<br />
Parathyroid adenoma is the cause of primary hyperparathyroidism in about 80% of cases; the diagnosis<br />
should be suspected in individuals with hypercalcemia or with the classic clinical manifestations of disease.<br />
Half of the adenomas are located intra-thoracic, more specifically in the anterior mediastinum. Surgical<br />
treatment is chosen in cases where the clinical control of the levels of serum calcium and PTH failed.<br />
Keywords: Adenoma, parathyroid, intra-thoracic, primary hyperparathyroidism, hypercalcemia.<br />
INTRODUÇÃO<br />
de paratormônio por técnicas de radioimunoensaio<br />
recentemente desenvolvidas. 4, 5<br />
Adenoma de paratireoide é a causa de<br />
hiperparatireoidismo primário (HPTP) em cerca<br />
de 80% dos casos, devendo-se suspeitar do<br />
diagnóstico em indivíduos com hipercalcemia ou<br />
com manifestações clínicas clássicas da doença. 1, 2<br />
O HPTP é um distúrbio comum do<br />
metabolismo ósseo, envolvendo os íons e fósforo,<br />
causado pelo aumento nos níveis circulantes de<br />
paratormônio. 3<br />
A confirmação diagnóstica baseia-se<br />
atualmente na determinação de níveis elevados<br />
RELATO DO CASO<br />
Paciente de sexo masculino, 54 anos, natural e<br />
procedente de Manaus, capital do Amazonas. O<br />
paciente refere que desde meados de 2009 evoluiu<br />
com alteração urinária que se manifestava por cor<br />
esbranquiçada da urina e um “pó branco” precipitado<br />
quando ela se encontrava em estase. Associado<br />
ao quadro, apresentou perda ponderal de 10 kg,<br />
miastenia progressiva, incapacitando-o, inclusive,<br />
* Médico Residente de Cirurgia Geral do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
** Médico Especialista em Cirurgia Torácica; Professor do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal do Amazonas<br />
*** Médica Especialista em Cirurgia Torácica<br />
**** Médica Residente de Clínica Médica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Enio B. Carneiro, Arteiro Menezes,Tatiana Cattebeke,<br />
Lubyanka F. Pereira, Vanessa Cardoso<br />
a deambular. Após procurar atendimento médico, foi constatado por meio de exames complementares:<br />
Cálcio sérico 21,1 mg/dl (referência: 8,5 a 10,1), paratormônio 2.257 picograma/ml (referência: 11 a 67),<br />
nefrolitíase bilateral, sem, contudo, apresentar nenhum grau de insuficiência renal. E uma massa mediastinal<br />
localizada em topografia paratraqueal direita, desviando a traqueia para a esquerda. Com todos esses<br />
achados, foi solicitado cintilografia de paratireoide<br />
cuja conclusão foi sugestiva de adenoma (Figuras 1<br />
e 2).<br />
Figura 1 – Cintilografia de paratireoide alguns minutos após a<br />
administração do radiofármaco (Incidência para crânio).<br />
2h da administração do radiofármaco (Incidência para<br />
tórax).<br />
O paciente, após a semiologia inicial<br />
realizada pela endocrinologia, foi referenciado<br />
ao Serviço de Cirurgia Torácica do <strong>Hospital</strong><br />
Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>, sendo submetido<br />
à toracotomia mediana, em nível de manúbrio<br />
e exérese de massa em mediatino superior. O<br />
material foi enviado para estudo histopatológico no<br />
Laboratório de Anatomia Patológica da Faculdade<br />
de Medicina da Universidade Federal do Amazonas,<br />
obtendo o diagnóstico de adenoma de paratireoide<br />
intratorácico.<br />
O paciente evoluiu de forma satisfatória no<br />
pós-operatório, com melhora gradual da calcemia<br />
e dos níveis de paratormônio, assim como os<br />
sintomas apresentados durante sua admissão.<br />
Atualmente, encontra-se em seguimento<br />
ambulatorial pela endocrinologia e pela cirurgia<br />
torácica, gozando de boa saúde.<br />
DISCUSSÃO<br />
A maioria dos pacientes que apresentam<br />
hiperparatireoidismo primário tem como origem<br />
do quadro o adenoma solitário de paratireoide.<br />
Essa lesão é responsável pelos sintomas em até oito<br />
de cada dez pacientes. 6 Em estudo realizado por<br />
pesquisadores, foi demonstrado que metade dos<br />
adenomas se localizava em mediastino anterior. 7<br />
Não diferente do que fora mostrado na<br />
literatura mundial, o paciente descrito neste<br />
relato de caso apresentava adenoma, único, em<br />
paratireoide e de localização em mediastino.<br />
A ocorrência de adenomas de paratireoide<br />
mediastinais está estimada entre 11 a 22% nos<br />
pacientes com hiperparatireoidismo primário; no<br />
entanto, a proporção de pacientes com adenomas<br />
mediastinais é alta, aproximadamente 38% entre<br />
aqueles pacientes que necessitam ser reoperados<br />
para tratar o HPTP. 8, 9 No caso em questão, o paciente<br />
foi operado e após seguimento ambulatorial por seis<br />
meses, verificou-se a remissão completa dos sintomas,<br />
não sendo necessária a reintervenção cirúrgica.<br />
66<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
ADENOMA DE PARATIREOIDE INTRATORÁCICO: RELATO DE CASO<br />
Dessa forma, a exérese cirúrgica da lesão<br />
do modo que foi realizada, com completa remoção<br />
do tecido produtor de paratormônio, é curativa em<br />
mais de 95% dos pacientes com o distúrbio, fato<br />
este já observado nos estudos realizados por Iyer e<br />
colaboradores. 10<br />
De fato, a evidência de estabilização ou<br />
indução de regressão das complicações ósseas e<br />
renais do HPTP, após a paratiroidectomia, constitui<br />
o argumento central das recomendações finais da<br />
conferência de consenso do National Institute of<br />
Health, que preconizam a terapêutica cirúrgica em<br />
doentes com idade inferior a 50 anos, com evidência<br />
de hipercalcemia grave, nefrolitíase, hipercalciúria,<br />
insuficiência renal crônica ou com osteopenia.<br />
Essa parece ser, portanto, a melhor conduta<br />
para casos semelhantes ao apresentado neste relato.<br />
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67<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Fernando Luiz Westphal, Luís Carlos de Lima, José Corrêa Lima Netto,<br />
Rodrigo Augusto Monteiro Cardoso, Márcia dos Santos da Silva<br />
CORREÇÃO CIRÚRGICA DE HÉRNIA<br />
DIAFRAGMÁTICA DE MORGANI: RELATO DE CASO<br />
SURGICAL REPAIR OF MORGANI DIAPHRAGMATIC HERNIA: CASE REPORT<br />
Fernando Luiz Westphal*, Luís Carlos de Lima**, José Corrêa Lima Netto***,<br />
Rodrigo Augusto Monteiro Cardoso****, Márcia dos Santos da Silva****<br />
RESUMO<br />
A hérnia de Morgani é descrita como um defeito congênito do diafragma anterior, por onde ocorre a<br />
herniação de conteúdo abdominal para a cavidade torácica. Apresentamos um caso de paciente obeso<br />
mórbido, com sintomas respiratórios tipo dispneia a pequenos esforços, associados à ortopneia. Na<br />
investigação diagnóstica, a radiografia de tórax evidenciou a presença de uma hipotransparência no<br />
hemitórax direito e a Tomografia Computadorizada do tórax confirmou a presença da hérnia diafragmática<br />
de Morgani com compressão de estruturas mediastinais. A conduta realizada foi a correção cirúrgica por<br />
toracotomia lateral, visto que o paciente apresentava sintomas e houve herniação de um segmento do<br />
cólon, caso em que há grande risco de obstrução e perfuração intestinal. A evolução foi satisfatória, sem<br />
complicações e sem recidiva no segmento de 6 meses. Observou-se melhora importante da ortopneia.<br />
ABSTRACT<br />
Morgagni hernia is described as a congenital defect of the diaphragm, for which there is herniation of<br />
abdominal contents into the chest cavity. We report a case of morbidly obese patient with respiratory<br />
symptoms such small effort dyspnea, associated with orthopnea. Diagnostic investigation, chest X-ray<br />
revealed the presence of a hypointense right hemithorax and computed tomography confirmed the<br />
presence of Morgagni hernia with compression of mediastinal structures. The approach employed was<br />
the surgical correction by thoracotomy, since the patient has symptoms and there was herniation of<br />
a segment of colon, in which case there is a high risk of obstruction and intestinal perforation. The<br />
result was satisfactory, without complications and without recurrence in segment 6 months. There was<br />
significant improvement of orthopnea.<br />
* Professor-Adjunto e Coordenador da disciplina de Cirurgia Torácica da Universidade Federal do Amazonas<br />
** Chefe do Serviço de Cirurgia Torácica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
*** Médico Assistente do Serviço de Cirurgia Torácica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
**** Acadêmico do curso de Medicina da Universidade Federal do Amazonas<br />
68<br />
revistahugv - <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
CORREÇÃO CIRÚRGICA DE HÉRNIA<br />
DIAFRAGMÁTICA DE MORGANI: RELATO DE CASO<br />
INTRODUÇÃO<br />
RELATO DE CASO<br />
A hérnia diafragmática de Morgani ou<br />
de Larrey é uma má formação congênita rara<br />
e de diagnóstico pouco comum. 1 Esse defeito<br />
ocorre pela passagem de estruturas ou órgãos<br />
abdominais para a cavidade torácica por meio<br />
do trígono esternocostal, também denominado<br />
espaço de Larrey ou forame de Morgani,<br />
região de passagem para os vasos epigástricos<br />
superiores e alguns vasos linfáticos. 2<br />
A hérnia de Morgani (HM) é usualmente<br />
assintomática. 1 Sintomas podem ocorrer,<br />
ocasionalmente, em pacientes obesos ou<br />
traumatizados, por conta do aumento da pressão<br />
intra-abdominal, desencadeando disfunções<br />
respiratórias e, mais raramente, complicações<br />
intestinais. 3, 4<br />
A correção cirúrgica da má formação é, em<br />
geral, eletiva. Há, entretanto, casos relatados<br />
de intervenções urgentes pela ocorrência de<br />
episódios agudos de obstrução digestiva ou de<br />
torção gástrica. 5<br />
O objetivo deste trabalho é relatar um caso<br />
de hérnia de Morgani em paciente com obesidade<br />
mórbida, tratado cirurgicamente e revisar a<br />
literatura atual.<br />
Paciente do sexo masculino, 23 anos, branco,<br />
asmático e obeso mórbido (IMC = 48 kg/m²), foi<br />
encaminhado ao Serviço de Cirurgia Torácica<br />
do <strong>Hospital</strong> Sociedade Portuguesa Beneficente<br />
do Amazonas por referir dispneia a pequenos<br />
esforços, havia mais de um ano, e ortopneia. Ao<br />
exame físico, apresentou submacicez na metade<br />
do hemitórax direito, broncoespasmo moderado<br />
e redução dos sons. Os exames complementares<br />
apresentaram os resultados seguintes:<br />
a) Radiografia de tórax: obliteração do<br />
seio costofrênico direito e presença de tênues<br />
transparências em terço inferior do hemitórax<br />
direito;<br />
b) Tomografia Computadorizada (TC) de<br />
tórax: presença de volumosa hérnia diafragmática<br />
ocupando a região anterior do hemitórax direito<br />
desde o diafragma até o ápice, produzindo o desvio<br />
para a esquerda do mediastino com compressão do<br />
coração;<br />
c) Espirometria: CVF = 2,47 (38%),<br />
FEV1 = 1,81 (32%), Tiffenou = 0,76 (78%).<br />
Parâmetros compatíveis com distúrbio ventilatório<br />
obstrutivo acentuado.<br />
Figura 1 – Radiografia de tórax revelando imagem de hipotransparência em terço médio e inferior do hemitórax direito.<br />
69<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Fernando Luiz Westphal, Luís Carlos de Lima, José Corrêa Lima Netto,<br />
Rodrigo Augusto Monteiro Cardoso, Márcia dos Santos da Silva<br />
Figura 2 – Ressonância magnética ilustrando a presença<br />
de defeito do diafragma com herniação de conteúdo<br />
abdominal para a cavidade torácica. Observa-se<br />
compressão de estruturas do mediastino.<br />
Figura 3 – Tomografia Computadorizada de tórax demonstrando<br />
presença de hipotransparência em região anterolateral direita,<br />
com aeração de permeio compatível com conteúdo intestinal.<br />
Observa-se compressão das câmaras cardíacas direitas.<br />
Figura 4 – Radiografia de tórax, com 6 meses de pósoperatório,<br />
revelando obliteração do seio costofrênico<br />
direito e correção da hérnia diafragmática.<br />
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CORREÇÃO CIRÚRGICA DE HÉRNIA<br />
DIAFRAGMÁTICA DE MORGANI: RELATO DE CASO<br />
O paciente foi submetido à toracotomia<br />
lateral direita. O defeito diafragmático e o<br />
conteúdo abdominal na cavidade torácica foram<br />
identificados. O segmento intestinal herniado<br />
(flexura hepática do cólon) foi reduzido de volta<br />
à cavidade abdominal e parte do epíplon foi<br />
ressecada. O diafragma, no trígono esternocostal,<br />
recebeu sutura descontínua, em plano único e com<br />
fio inabsorvível, reforçados por tela de Marlex.<br />
Após a correção cirúrgica, o paciente<br />
apresentou significativa melhora em sua função<br />
respiratória, atestada por novo exame de<br />
espirometria cujos resultados foram: CVF: 3,68<br />
(57%), FEV1: 2,87 (51%), Tiffenou: 83% (0,83).<br />
DISCUSSÃO<br />
A ocorrência da hérnia de Morgani se deve a<br />
um defeito da fusão embrionária das partes costal e<br />
esternal do diafragma, anteriormente à linha média<br />
(posição retroesternal), originando, assim, o chamado<br />
forame de Morgani, no trígono esternocostal. 6 Os<br />
conteúdos herniários que podem ser encontrados,<br />
por ordem de frequência, são: epíplon, cólon<br />
(usualmente o transverso), estômago, fígado e<br />
intestino delgado. 7, 8 No caso relatado, observou-se a<br />
presença de epíplon e cólon transverso.<br />
Existem quatro tipos de herniações<br />
diafragmáticas congênitas (HDC): hérnia hiatal,<br />
hérnia paraesofágica, hérnia de Bochdalek e a hérnia<br />
de Morgani. Entre todos os tipos de HDC, a hérnia de<br />
Larrey ou de Morgani representa apenas 2 a 3% dos<br />
casos. 3, 4 A HDC pode estar associada a dificuldades<br />
respiratórias que ameaçam a vida, por conta da<br />
inibição do desenvolvimento e da insuflação dos<br />
pulmões, além de ser a principal causa de hipoplasia<br />
pulmonar. Existem relatos de que a região genômica<br />
afetada seria a do cromossomo 15q26. 9<br />
A hérnia de Morgani é usualmente<br />
assintomática e muitos pacientes descobrem o<br />
defeito acidentalmente, ao realizar exames da<br />
cavidade torácica com outras finalidades clínicas. 10<br />
A sintomatologia é manifestada, geralmente,<br />
por adultos, com maior prevalência para o sexo<br />
feminino, e em situações de aumento da pressão<br />
intra-abdominal. 11, 3, 4 As principais responsáveis<br />
por tal ocorrência são os traumas e a obesidade<br />
mórbida, 3, 4 como encontrada no relato desse caso.<br />
No exame radiográfico de tórax, os achados<br />
são inespecíficos e o saco herniário pode ser<br />
interpretado como possível pneumonia, neoplasia,<br />
entre outros. 11 Para a caracterização mais precisa<br />
do defeito é indicada a realização de Tomografia<br />
Computadorizada (TC) e/ou ressonância<br />
magnética. 12 Neste paciente, o diagnóstico foi<br />
confirmado após a realização de TC, que evidenciou<br />
saco herniário ocupando o hemitórax direito.<br />
O tratamento da hérnia de Morgani é indicado<br />
quando o cólon encontra-se dentro do saco herniário,<br />
tendo em vista o alto risco de obstrução. Para<br />
pequenas herniações apenas do omento, somente<br />
os adultos sintomáticos têm indicação cirúrgica. 12<br />
Em crianças, entretanto, alguns especialistas<br />
recomendam a correção cirúrgica, mesmo sem a<br />
manifestação de sintomas, para prevenir futuras<br />
complicações. 5, 12 No paciente relatado, a cirurgia<br />
tinha indicação por conta da herniação da flexura<br />
hepática do cólon e comprometimento da dinâmica<br />
respiratória.<br />
O procedimento visa reduzir o saco herniário e<br />
ocluir o forame de Morgani, existente no diafragma<br />
malformado. A abordagem cirúrgica pode ser torácica,<br />
por toracotomia ou videotoracoscopia, ou abdominal,<br />
por meio de laparotomia ou videolaparoscopia. 12,<br />
13<br />
O paciente referido submeteu-se à intervenção<br />
cirúrgica aberta e com acesso pelo tórax.<br />
A correção cirúrgica da hérnia de Morgani,<br />
como outros procedimentos, encontra-se sujeita<br />
a recidiva. Estudo retrospectivo realizado na<br />
Espanha, publicado em 2002, revelou um índice de<br />
reaparecimento da má formação de 21,4%, entre<br />
12 e 132 meses após a cirurgia. 5 Passados 13 meses<br />
da realização do procedimento relatado, a recidiva<br />
da deformidade não foi observada nos exames de<br />
controle do paciente.<br />
Em conclusão, enfatizamos a importância da<br />
realização de um diagnóstico preciso, observando<br />
atentamente a história do paciente e realizando<br />
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Fernando Luiz Westphal, Luís Carlos de Lima, José Corrêa Lima Netto,<br />
Rodrigo Augusto Monteiro Cardoso, Márcia dos Santos da Silva<br />
todos os exames necessários. A hérnia de Morgani é<br />
uma doença rara e que, muitas vezes, tarda a ser<br />
diagnosticada, submetendo o paciente a tratamentos<br />
incorretos e a perdas na qualidade de vida. O<br />
tratamento indicado, para casos sintomáticos e com<br />
risco de obstrução intestinal, é a cirurgia, tendo<br />
em vista a prevenção de possíveis complicações e<br />
a grande melhora da sintomatologia dos pacientes,<br />
entre os quais se inclui o caso aqui apresentado.<br />
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EVOLUÇÃO DE PACIENTES COM NEFRITE LÚPICA TRATADOS COM CICLOFOSFAMIDA<br />
EVOLUÇÃO DE PACIENTES COM NEFRITE LÚPICA<br />
TRATADOS COM CICLOFOSFAMIDA<br />
EVOLUTION OF PATIENTS WITH LUPUS NEPHRITIS TREATED WITH CYCLOPHOSPHAMIDE<br />
Kelly Simone Castro Santos*, Maíra Fernandes de almeida*, Domingos Sávio Nunes de Lima**,<br />
RESUMO<br />
A nefrite lúpica constitui importante marcador de atividade do lúpus eritematoso sistêmico (LES) e<br />
principal causa de morbi-mortalidade nessa afecção, em especial a evolução para insuficiência renal<br />
crônica e terminal. Até o momento, a ciclofosfamida é considerada a terapia mais efetiva para tratamento<br />
inicial da nefrite lúpica grave. OBJETIVO: Avaliar a evolução dos pacientes com nefrite lúpica submetidos<br />
à pulsoterapia com ciclofosfamida acompanhados no Serviço de Reumatologia do Ambulatório Araújo<br />
Lima da Universidade Federal do Amazonas (<strong>Ufam</strong>) e descrever características histológicas e clínicolaboratoriais<br />
dessa população. MÉTODOS: Estudo tranversal, retrospectivo, baseado na análise de<br />
prontuários de pacientes com LES definido segundo critérios do American College of Rheumathology<br />
(ACR), em seguimento regular no Serviço de Reumatologia da <strong>Ufam</strong> e que realizaram no mínimo seis<br />
pulsos de ciclofosfamida para tratamento da nefrite. O programa Epi-Info foi utilizado para descrição<br />
estatística simples. RESULTADOS: Foram revisados 294 prontuários de pacientes dos quais 106 (36%)<br />
apresentavam acometimento renal e 29 atendiam aos critérios de inclusão. Verificou-se que 86,2% dos<br />
pacientes eram mulheres jovens, cujos critérios do ACR mais prevalentes foram FAN (96,5%) e poliartrite<br />
(82,8%). Nefrite como manifestação inicial ocorreu em 69% dos pacientes. 82,8% realizaram biópsia renal<br />
e apresentavam-se 69,9% com a classe histológica IV. Os pacientes tratados com ciclofosfamida em altas<br />
doses apresentaram boa resposta com menor evolução para IRC (10,3%) e doença renal terminal (3,4%).<br />
CONCLUSÃO: Este estudo mostra um panorama parcial da resposta dos pacientes com nefrite lúpica ao<br />
tratamento padrão com ciclofosfamida, com melhora do quadro clínico-laboratorial em sua evolução.<br />
Descritores: Lúpus, nefrite lúpica, ciclofosfamida.<br />
ABSTRACT<br />
Lupus nephritis is an important marker of activity of systemic lupus erythematosus (SLE) and a leading<br />
cause of morbidity and mortality in this disease, in particular, the evolution to chronic renal failure and<br />
terminal. So far, cyclophosphamide is considered the most effective therapy for initial treatment of<br />
severe lupus nephritis. OBJECTIVE: To evaluate the outcome of patients with lupus nephritis underwent<br />
intravenous cyclophosphamide followed at the rheumatology service at the Clinic Araujo Lima, Federal<br />
* Médica Residente da Clínica Médica do <strong>HUGV</strong><br />
** Médico Reumatologista, Doutor em Medicina, Professor da UFAM<br />
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Kelly Simone Castro Santos, Maíra Fernandes de almeida, Domingos Sávio Nunes de Lima<br />
University of Amazonas (<strong>Ufam</strong>) and describe the histological and clinical and laboratory features of this<br />
population. METHODS: A transversal, retrospective, based on analysis of records of patients with SLE<br />
defined according to the American College of Rheumathology (ACR), regular follow-up in the rheumatology<br />
service of <strong>Ufam</strong> and who had at least six pulses of cyclophosphamide for treatment of nephritis. Epi Info<br />
was used for statistical description. RESULTS: Was reviewed medical records of 294 patients of whom 106<br />
(36%) had renal involvement and 29 met the inclusion criteria. It was found that 86.2% of patients were<br />
young women, whose ACR criteria were more prevalent FAN (96.5%) and polyarthritis (82.8%). Nephritis<br />
as initial manifestation occurred in 69% of patients. 82.8% underwent renal biopsy, showed a 69.9% with<br />
histological grade IV. Patients treated with cyclophosphamide in high doses had good response with less<br />
progression to CRF (10.3%) and ESRD (3.4%). CONCLUSION: This study shows a partial picture of the<br />
response of patients with lupus nephritis to treatment with cyclophosphamide, with improvement of<br />
clinical laboratory in its evolution.<br />
Word-key: Lupus, lupus nephritis, cyclophosphamide.<br />
INTRODUÇÃO<br />
O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma<br />
doença inflamatória multissistêmica, de natureza<br />
autoimune e evolução crônica, com apresentação<br />
heterogênea apresentando períodos de remissões<br />
e exacerbações. 1, 2<br />
O rim é um dos principais órgãos-alvo,<br />
podendo a nefrite lúpica apresentar-se como única<br />
manifestação clínica ou, mais comumente, como<br />
parte de um acometimento de múltiplos órgãos.<br />
O comprometimento renal em nível clínico e<br />
alterações do sedimento urinário e/ou proteinúria<br />
são observados em 29 a 65% dos pacientes. 3, 4 Dados<br />
da literatura mostram que até 60% dos pacientes<br />
adultos com lúpus apresentam envolvimento renal,<br />
sendo uma das mais importantes manifestações.<br />
A severidade da nefrite varia muito, indo desde<br />
lesões discretas com doença subclínica a formas<br />
proliferativas difusas, com potencial de progredir<br />
para insuficiência renal crônica (IRC) terminal<br />
em 45% dos casos. A progressão da nefrite lúpica<br />
para IRC terminal constitui a principal causa de<br />
morbidade e mortalidade nos pacientes portadores<br />
de LES e corresponde a 1 a 4% do total de<br />
pacientes em tratamento dialítico ou submetidos<br />
ao transplante renal. A nefrite deve ser tratada<br />
precoce e adequadamente para se evitar a perda<br />
5, 6, 7<br />
da função renal (insuficiência renal).<br />
A biópsia renal é um procedimento invasivo,<br />
ainda não facilmente disponível, realizada<br />
somente naqueles pacientes clinicamente mais<br />
graves ou na expectativa dos dados histológicos<br />
contribuírem para uma tomada de decisão.<br />
É necessário para que se faça um diagnóstico<br />
preciso da nefrite lúpica, mas a sua realização<br />
ainda é motivo de controvérsias. Mais importante,<br />
talvez, do que se conhecer isoladamente o padrão<br />
histológico da nefrite lúpica, seria identificar<br />
parâmetros clínicos, laboratoriais e histológicos<br />
que pudessem estar associados com o prognóstico.<br />
Os estudos mostram-se inconsistentes com relação<br />
aos fatores demográficos, clínicos e laboratoriais<br />
8, 9, 10, 11, 12, 13<br />
associados ao prognóstico.<br />
As alterações morfológicas na biópsia renal<br />
de um paciente com lúpus eritematoso sistêmico<br />
(LES) correspondem a um espectro de lesões<br />
vasculares, glomerulares e lesão tubulointersticial.<br />
A classificação histológica da nefrite lúpica está<br />
disposta a seguir: 8<br />
• Tipo I: normal<br />
• Tipo II: glomerulonefrite mesangial<br />
A) com depósito mesangial<br />
B) com hepercelularidade mesangial<br />
• Tipo III: glomerulonefrite proliferativa<br />
focal ou segmentar<br />
• Tipo IV: glomerulonefrite proliferativa difusa<br />
• Tipo IV: glomerulonefrite membranosa<br />
No tratamento das nefrites proliferativas<br />
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EVOLUÇÃO DE PACIENTES COM NEFRITE LÚPICA TRATADOS COM CICLOFOSFAMIDA<br />
está indicada uma fase de indução com agentes<br />
imunossupressores citostáticos (nos primeiros<br />
seis meses), particularmente a ciclofosfamida<br />
endovenosa, inicialmente sob a forma de pulsos<br />
mensais e, posteriormente, bimestrais ou trimestrais<br />
(fase de manutenção), até um ano após a remissão<br />
da nefrite. Na terapia de manutenção, na tentativa<br />
de diminuir os efeitos colaterais decorrentes do<br />
uso prolongado de ciclofosfamida, pode-se utilizar<br />
azatioprina ou micofenolato mofetil, após a indução<br />
da remissão da nefrite lúpica. 2<br />
O tratamento com corticosteroides e<br />
imunossupressores, embora tenha melhorado a<br />
sobrevida dos pacientes com nefrite lúpica, está<br />
associado a vários efeitos colaterais. É necessário,<br />
portanto, saber reconhecer os pacientes com maior<br />
risco para doença renal progressiva, para que possam<br />
ser tratados mais efetiva e rapidamente com o<br />
14, 15<br />
objetivo de se prevenir evoluções desfavoráveis.<br />
A demanda do Serviço de Reumatologia de<br />
Ambulatório Araújo Lima (AAL) da Universidade<br />
Federal do Amazonas (<strong>Ufam</strong>) pode ser considerada<br />
representativa dos casos de lúpus e nefrite lúpica<br />
em Manaus e, até mesmo, referência para outros<br />
municípios do Estado. A maioria dos pacientes com<br />
nefrite lúpica no Amazonas é encaminhada para<br />
tratamento especializado no AAL considerado<br />
como centro de referência para essa patologia.<br />
Este trabalho descreve características<br />
demográficas, clínico-laboratoriais e histológicas<br />
dos pacientes com nefrite lúpica acompanhados<br />
regularmente no Serviço de Reumatologia do AAL e<br />
a evolução destes após tratamento com pulsoterapia<br />
de ciclofosfamida, considerada tratamento padrão da<br />
nefrite lúpica em suas formas graves; estabelecendo<br />
assim um panorama parcial do comportamento dessa<br />
doença no Estado do Amazonas.<br />
MÉTODO<br />
Comissão de Ética em Pesquisa da <strong>Ufam</strong>.<br />
Trata-se de um estudo descritivo, de caráter<br />
retrospectivo, onde foram revisados os prontuários<br />
dos 294 pacientes com diagnóstico de LES definido<br />
de acordo com os critérios propostos pelo American<br />
College of Rheumatology (ACR) e acompanhados<br />
regularmente no AAL. 16 Avaliou-se população de<br />
ambos os sexos, de todas as faixas etárias com<br />
diagnóstico de LES em acompanhamento regular<br />
no Serviço de Reumatologia, sendo definidos<br />
como amostra os pacientes que apresentavam os<br />
seguintes critérios de inclusão: 1) acometimento<br />
renal definido segundo os critérios do ACR como<br />
proteinúria persistente maior que 0,5 g/dia ou<br />
mais que +++ (três cruzes) no sedimento urinário;<br />
cilindros celulares de hemácias, granulares,<br />
tubulares ou mistos; ou pacientes cujo exame de<br />
biópsia renal evidenciou nefrite; 16 2) pacientes que<br />
foram submetidos ao protocolo de ciclofosfamida<br />
recebendo no mínimo 6 (seis) pulsos.<br />
Foram excluídos os prontuários que não<br />
continham as informações básicas necessárias para<br />
avaliar a evolução clínica e laboratorial dos pacientes<br />
tratados com ciclofosfamida e os pacientes que<br />
realizaram menos de 6 (seis) pulsos de ciclofosfamida<br />
até o momento da coleta de dados do estudo.<br />
Dentre os dados analisados têm-se: idade,<br />
raça, sexo, critérios de classificação do lúpus,<br />
presença de comorbidades e classificação histológica<br />
renal, indicação de tratamento com ciclofosfamida,<br />
resposta terapêutica à ciclofosfamida, evolução<br />
clínico-laboratorial pós-tratamento.<br />
As informações foram registradas em um banco<br />
de dados sendo utilizado o programa Epi-Info para<br />
descrição estatística simples. Análises estatísticas<br />
foram conduzidas utilizando-se testes do quiquadrado<br />
e t de Student para testar diferenças entre<br />
variáveis categóricas e contínuas, respectivamente.<br />
Métodos padrões de análise para estudos descritivos<br />
foram conduzidos. A análise dos dados foi iniciada<br />
com descrição estatística simples.<br />
A coleta de dados foi realizada no Serviço de<br />
Reumatologia do AAL da Faculdade de Ciências da<br />
Saúde (FCS), <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />
(<strong>HUGV</strong>) – <strong>Ufam</strong>, após análise e aprovação pela<br />
RESULTADOS<br />
Foram revisados 294 prontuários de<br />
pacientes lúpicos dos quais 106 (36%) apresentaram<br />
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Kelly Simone Castro Santos, Maíra Fernandes de almeida, Domingos Sávio Nunes de Lima<br />
acometimento renal, de acordo com o critério de<br />
classificação do lúpus (proteinúria persistente maior<br />
que 500 mg/dia ou mais que +++ no sedimento<br />
urinário; cilindros celulares de hemácias, granulares,<br />
tubulares ou mistos). 16 Esses dados assemelhamse<br />
aos descritos por autores que afirmam que<br />
o comprometimento renal em nível clínico e<br />
alterações do sedimento urinário e/ou proteinúria<br />
são observados em 29 a 65% dos pacientes com LES. 3<br />
Dos 106 pacientes com comprometimento renal, 56<br />
realizaram pulsoterapia com ciclofosfamida para<br />
tratamento da nefrite, porém somente 37 (66%)<br />
destes pacientes receberam mais de cinco pulsos.<br />
Apenas 29 (27,35%) destes continham prontuários<br />
com as informações necessárias ao estudo,<br />
atendendo aos critérios de inclusão.<br />
Da amostra, 25 (86,2%) pacientes são do<br />
sexo feminino e 4 (13,8%) do sexo masculino.<br />
Quanto à cor da pele, a doença foi mais frequente<br />
entre pacientes não brancos (75,9%).<br />
Quatorze (48,3%) pacientes estavam<br />
trabalhando ou estudando no momento da coleta<br />
dos dados; desse modo, executando suas atividades<br />
laborativas a despeito do diagnóstico.<br />
A idade média atual dos pacientes é de 29 ±<br />
8, variando de 12 a 44 anos, sendo a idade média<br />
no início da doença de 22 ± 8, variando de 6 a<br />
39 anos. A mediana do tempo de diagnóstico foi<br />
de 86 meses, variando de 27 a 156 meses. A idade<br />
atual dos pacientes, idade no início da doença e<br />
tempo de diagnóstico são mostrados na Tabela<br />
1. Considera-se idade atual aquela registrada na<br />
última consulta (mais recente).<br />
Média ±DP<br />
Idade atual (anos) 29 ± 8<br />
Mediana [limites]<br />
31 [12-44]<br />
Idade de início da doença (anos) 22 ± 8 22 [6-39]<br />
Tempo de diagnóstico (meses) 85 ± 37 86 [27-156]<br />
Tabela 1 – Idade atual, idade de início da doença, tempo de<br />
diagnóstico e tempo de acompanhamento dos 29 pacientes.<br />
A nefrite clinicamente aparente pode ser<br />
a apresentação inicial em apenas 5 a 25% dos<br />
casos. 17 Neste estudo, porém, observou-se que 20<br />
(69%) pacientes apresentavam alterações renais<br />
no momento do diagnóstico de LES.<br />
quatro ou mais critérios de classificação. A média<br />
de critérios foi de 6 (seis), variando de 4 a 10, sendo<br />
os mais frequentes FAN e artrite. A frequência e<br />
porcentagem dos critérios de classificação nos<br />
pacientes do estudo são mostradas na Tabela 2.<br />
Os 29 pacientes do estudo apresentaram<br />
CRITÉRIOS FREQUÊNCIA %<br />
Comprometimento renal* 29 100<br />
FAN 28 96,5<br />
Artrite 24 82,8<br />
Fotossensibilidade 22 75,9<br />
Sorológico 21 72,4<br />
Rash malar 17 58,6<br />
Alteração hematológica 16 55,2<br />
Serosite 15 51,7<br />
Úlcera oral 12 41,4<br />
Envolvimento neurológico 7 24,1<br />
Lesão discoide 0 0<br />
Tabela 2 – Frequência e porcentagem dos critérios de classificação nos 29 pacientes do estudo.* critério de inclusão.<br />
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EVOLUÇÃO DE PACIENTES COM NEFRITE LÚPICA TRATADOS COM CICLOFOSFAMIDA<br />
Sobre comorbidades, a revisão dos 29<br />
prontuários mostrou que 11 (37,9%) pacientes<br />
eram sedentários, 20 (69%) tinham hipertensão<br />
arterial, 17 (58,6%) apresentavam dislipidemia,<br />
9 (31%) osteoporose, seis (20,7%) tinham história<br />
de infecção como tuberculose ou herpes zoster, e<br />
quatro (13,8%) trombose venosa profunda.<br />
No presente estudo, nove (31%) pacientes<br />
apresentaram insuficiência renal aguda (IRA)<br />
antes do tratamento e quatro (13,8%) após a<br />
pulsoterapia. Alterações no sedimento urinário<br />
(proteinúria, hematúria, cilindrúria) e elevação<br />
das escórias nitrogenadas (ureia e creatinina)<br />
foram mais expressivas antes da pulsoterapia.<br />
Alterações renais (IRA, ureia e creatinina elevadas,<br />
proteinúria, cilindrúria e hematúria) antes e após<br />
a pulsoterapia com ciclofosfamida são mostradas<br />
na Tabela 3.<br />
Frequência<br />
Porcentagem<br />
Antes Após Antes Após<br />
IRA 9 4 31 13,8<br />
Hematúria 22 9 75,9 31<br />
Cilindrúria 21 9 72,4 31<br />
Proteinúria 25 11 96,2 39,3<br />
↑ Creatinina 10 6 35,7 20,7<br />
↑Ureia 19 9 70,4 31<br />
Tabela 3 – Frequência e porcentagem das alterações<br />
no sedimento urinário e elevação das escórias<br />
nitrogenadas antes e após pulsoterapia nos 29<br />
pacientes do estudo.<br />
Enquanto alguns autores têm demonstrado<br />
que parâmetros clínico-laboratoriais são capazes<br />
de predizer com acurácia o prognóstico da nefrite<br />
lúpica, sem necessidade de biópsia renal, 13 outros<br />
advogam que os dados histológicos oferecem<br />
informações adicionais aos demais parâmetros. 18<br />
As principais indicações de biópsias renais<br />
no serviço em estudo foram: a) perda de função<br />
renal; b) proteinúria em níveis nefróticos; c) falha<br />
na resposta terapêutica; d) dúvidas com relação<br />
ao melhor esquema terapêutico. Situações com<br />
clínica exuberante e grave dispensam, no entanto,<br />
a realização de biópsia devendo-se iniciar a<br />
terapêutica o precocemente possível.<br />
Dos 29 pacientes estudados, 24 (82,8%)<br />
realizaram biópsia renal, sendo a classe histológica<br />
tipo IV a mais encontrada (69,2%), seguida dos<br />
tipos II (15,4%) e V (7,7%).<br />
A média da dose de prednisona usada<br />
antes da pulsoterapia foi de 42 ± 20 mg/dia,<br />
variando de 5 a 80 mg/dia e 19 (65,5%) pacientes<br />
usavam cloroquina. A dose de corticoide após a<br />
terapêutica foi de 14 ± 13 mg/dia, variando de 2,5<br />
a 60 mg/dia. 16 (55,2%) pacientes continuaram<br />
usando cloroquina. Doses menores de corticoide<br />
(prednisona) e cloroquina foram necessarias após<br />
a pulsoterapia. Quinze (51,7%) dos pacientes<br />
usaram azatioprina após a pulsoterapia, como<br />
tratamento de manutenção e dois (6,9%) fizeram<br />
uso do micofenolato de mofetil.<br />
Houve remissão da atividade renal em<br />
18 (62,1%) pacientes, esta definida como<br />
desaparecimento da proteinúria, hematúria e<br />
cilindrúria ou apenas presença de proteinúria<br />
inferior a 500 mg nas 24 horas, com função renal<br />
normal, creatinina ≤ 1,2 mg/dL; enquanto 11<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Kelly Simone Castro Santos, Maíra Fernandes de almeida, Domingos Sávio Nunes de Lima<br />
(37,9%) apresentaram má resposta ao tratamento<br />
administrado (falha terapêutica).<br />
A remissão da nefrite foi mantida em 12 (41,4%)<br />
dos pacientes que realizaram pulsoterapia. Recidiva<br />
da nefrite (reativação da doença renal) ocorreu<br />
em dois (6,9%) dos pacientes que inicialmente<br />
haviam apresentado remissão clínica; presença de<br />
sedimento urinário ativo (proteinúria, cilindrúria<br />
e hematúria), sem comprometimento da função<br />
renal, foi observado em 11 (37,9%) dos pacientes<br />
estudados; três (10,3%) evoluíram para insuficiência<br />
renal crônica (presença irreversível de creatinina<br />
maior ou igual a 1,5 mg/dL) e um (3,4%) para IRC<br />
terminal, necessitando de diálise definitivamente.<br />
DISCUSSÃO<br />
O presente estudo mostra semelhança com<br />
outras séries da literatura quando ressaltados<br />
aspectos demográficos, critérios de classificação<br />
do LES, comorbidades e classificações histológicas<br />
1, 3, 9, 17<br />
de pacientes portadores da nefrite lúpica.<br />
O curso clínico da nefrite lúpica é variável. Em<br />
casos leves as alterações se evidenciam apenas pela<br />
análise da urina. Anormalidades urinárias discretas<br />
podem normalizar-se durante o seguimento. Esse tipo<br />
de nefrite é muito comum e, geralmente, não requer<br />
tratamento especial. Em certos casos, contudo, as<br />
anormalidades urinárias persistem e podem piorar<br />
após algum tempo. Estes correm o risco de falência<br />
renal. 9 Um estudo que avaliou 150 pacientes<br />
portadores de LES, observou mortalidade de 53%,<br />
sendo insuficiência renal a causa mais frequente. 11<br />
Dessa forma, exames adicionais são selecionados<br />
para avaliar a extensão da doença e para determinar<br />
a melhor forma de tratamento a fim de previnir<br />
complicações, dentre eles a biópsia renal.<br />
A glomerulonefrite proliferativa difusa, classe<br />
histológica mais frequente na amostra em questão,<br />
tem potencial de progredir para insuficiência renal<br />
crônica (IRC) terminal em 45% dos casos quando não<br />
tratados. 5 Usualmente requer tratamento agressivo<br />
para induzir remissão e prevenir morbidade renal<br />
significante e mortalidade. 19<br />
A ciclofosfamida ainda é considerada a<br />
terapia mais efetiva para o tratamento inicial de<br />
nefrite lúpica grave. 5, 14, 15 Estudos clássicos mostram<br />
a superioridade da ciclofosfamida em relação ao<br />
uso isolado de corticoides, tanto no tratamento<br />
realizado por um período mais curto (6 meses),<br />
quanto o realizado por tempo mais prolongado,<br />
observando-se superioridade em relação a remissão<br />
mantida com o tratameto prolongado. 20, 21 Apesar<br />
da eficácia demonstrada, no entanto, a toxicidade<br />
cumulativa associada ao esquema terapêutico com<br />
ciclofosfamida endovenosa em altas doses não deve<br />
ser negligenciada. De fato, está bem demonstrado<br />
que a administração prolongada de ciclofosfamida<br />
se associa a um maior risco de falência gonadal<br />
(38 a 52% das mulheres em risco) e de infecções<br />
graves, sem ser completamente eficaz em controlar<br />
a nefrite lúpica em todos os casos. 22<br />
O trabalho constatou que, após o tratamento<br />
com ciclofosfamida endovenosa em altas doses<br />
por período prolongado, os pacientes tiveram boa<br />
resposta terapêutica (62,1%) com remissão clínica<br />
da nefrite em 41,4% e uma menor probabilidade<br />
de evoluir para IRC (10,3%) e terminal (3,4%).<br />
Conforme dados da literatura, 5% dos pacientes<br />
progridem para falência renal crônica, requerendo<br />
diálise ou transplante renal. 17<br />
A média de proteinúria após tratamento<br />
imunossupressor de indução foi de 96,2 para<br />
39,3%. Estudos demonstram que a característica<br />
mais marcante entre grupos de doentes que<br />
desenvolveram insuficiência renal e os que<br />
permaneceram com função renal preservada foi<br />
a redução da protenúria de 24 horas. Estes dados<br />
sugerem que o prognóstico renal a longo prazo<br />
poderia ser antecipado nos doentes com resposta<br />
inicial proteinúria à terapêutica imunossupressora<br />
e permitem identificar simultaneamente os grupos<br />
com risco mais elevado de desenvolver insuficiência<br />
renal crônica terminal. 22<br />
A reativação da doença renal ocorreu em<br />
apenas 6,9%. As recidivas renais ocorreram em<br />
aproximadamente 30% dos doentes, na maioria<br />
dos casos ainda durante a fase de tratamento<br />
imunossupressor. 22<br />
78<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
EVOLUÇÃO DE PACIENTES COM NEFRITE LÚPICA TRATADOS COM CICLOFOSFAMIDA<br />
Observou-se, ainda, que foi necessária<br />
menor dose de corticoide após a pulsoterapia com<br />
ciclofosfamida.<br />
A falha terapêutica se deu em 37,9% da amostra.<br />
Segundo alguns autores, perto de 20% dos pacientes<br />
não alcançarão remissão renal, utilizando-se os<br />
esquemas atualmente disponíveis. 5 A azatioprina foi<br />
o tratamento de manutenção mais utilizado (51,7%),<br />
seguida pelo micofenolato de mofetil (6,9%).<br />
CONCLUSÃO<br />
Observa-se, portanto, melhora no perfil clínico<br />
e laboratorial da maior parte dos pacientes que<br />
realizaram pulsoterapia para tratamento da nefrite<br />
lúpica grave, mostrando ser uma forma efetiva<br />
de alcançar remissão da atividade renal, prevenir<br />
reativações renais e prevenir ou interromper a<br />
perda crônica da função renal. Em razão de sua<br />
toxicidade e eventuais falhas terapêuticas, porém,<br />
novos esquemas terapêuticos devem ser avaliados.<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Renata Farias de Santana, Renato Telles de Souza, Luiz Carlos Nadaf de Lima,<br />
Rafael Siqueira de Carvalho, Marcos Antônio Fernandes, Luiz Eduardo Wawrick Fonseca<br />
PARAGANGLIOMA JUGULAR: RELATO DE CASO<br />
PARAGANGLIOMA JUGULAR: CASE REPORT<br />
Renata Farias de Santana,* Renato Telles de Souza,**<br />
Luiz Carlos Nadaf de Lima, *** Rafael Siqueira de Carvalho,*<br />
Marcos Antônio Fernandes,* Luiz Eduardo Wawrick Fonseca****<br />
RESUMO<br />
Paraganglioma é um tumor que tem origem em qualquer local do corpo que contenha células da crista<br />
neural embrionária, sendo composto por células não cromafins. Perto de 85% dos paragangliomas são<br />
formados no abdome, 12% são formados no tórax e 3% desenvolvem-se na região da cabeça e pescoço.<br />
Glomus timpânico e glomus jugular costumam se apresentar como uma massa que cresce em orelha<br />
média resultando em sintomas como zumbido (80%) e perda auditiva (60%). Os nervos cranianos que<br />
passam pelo forame jugular podem sofrer compressão resultando em dificuldade de engolir, ou fraqueza<br />
ipsilateral dos músculos do trapézio e esternocleidomastoideo. Apresenta-se, neste artigo, caso de<br />
paraganglioma jugular que foi removido por neurocirurgia há 31 anos e recidivou, evoluindo como uma<br />
massa retroauricular em continuidade com conduto auditivo externo.<br />
Palavras-chave: Tumor glômico, paraganglioma, glomus jugular.<br />
ABSTRACT<br />
Paragangliomas are tumor that may develop at various body sites, derived from embryonic neural crest<br />
formed by not cromafins cells. About 85% of paragangliomas develop in the abdomen; only 12% develop in<br />
the chest and 3% in the head and neck region. Glomus tympanicum and Glomus jugulare: Both commonly<br />
present as a middle ear mass resulting in tinnitus (in 80%) and hearing loss (in 60%). The cranial nerves<br />
of the jugular foramen may be compressed, resulting swallowing difficulty, or ipsilateral weakness of the<br />
upper trapezius and sternocleiodomastoid muscles. We will show in this article, one patient, who have<br />
jugulare paraganglioma that was removed by neurosurgery about 31 years ago and came grown up again<br />
as a retroauricular mass that continous into the external ear canal.<br />
Keywords: Glomus jugulare, paraganglioma, glomus tumor.<br />
* Médico Residente em Otorrinolaringologia do <strong>HUGV</strong><br />
** Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia e Residência Médica em Otorrinolaringologia do <strong>HUGV</strong><br />
*** Médico Assistente do Serviço de Otorrinolaringologia e Preceptor da Residência Médica em Otorrinolaringologia do <strong>HUGV</strong><br />
**** Estagiário do Serviço de Otorrinolaringologia do <strong>HUGV</strong><br />
80<br />
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PARAGANGLIOMA JUGULAR: RELATO DE CASO<br />
INTRODUÇÃO<br />
Paragangliomas são aglomerados de células<br />
neuroendócrinas dispersos por todo o organismo;<br />
alguns deles estão conectados ao sistema<br />
nervoso simpático, e outros ao sistema nervoso<br />
parassimpático. A maior coleção dessas células<br />
é encontrada na medula suprarrenal, onde dão<br />
origem aos feocromocitomas. Os tumores que<br />
surgem nos paragânglios extrassuprarrenais são<br />
descritos como paragangliomas. Os paragangliomas<br />
desenvolvem-se em duas localizações gerais:<br />
paragânglios paravertebrais, que possuem conexões<br />
simpáticas e são cromafins positivo – metade<br />
elabora catecolaminas (da mesma forma que os<br />
feocromocitomas); paragânglios relacionados<br />
com os grandes vasos da cabeça e pescoço,<br />
constituindo a cadeia aórtico-pulmonar, incluindo<br />
os corpos carotídeos, corpos aórticos, gânglios<br />
julgulotimpânicos, gânglio nodoso do nervo vago e<br />
agregados localizados em torno da cavidade oral,<br />
nariz, nasofaringe, laringe e órbita – são inervados<br />
pelo sistema nervoso parassimpático, não são<br />
1, 2, 3<br />
cromafins e raramente liberam catecolaminas.<br />
O objetivo deste artigo é relatar o caso de<br />
paciente portadora de paraganglioma jugular, o<br />
qual se destaca por constituir neoplasia incomum<br />
de osso temporal e apresentar grande extensão,<br />
chegando a projetar-se em conduto auditivo<br />
externo e região retroauricular.<br />
RELATO DO CASO<br />
Paciente feminino, 69 anos, branca,<br />
previamente hígida, apresentou-se ao Ambulatório<br />
de Otorrinolaringologia do <strong>Hospital</strong> Universitário<br />
Getúlio <strong>Vargas</strong>, queixando-se de massa retroauricular<br />
à direita, em continuidade com a parede posterior de<br />
conduto auditivo externo e sangramento (Figura 1).<br />
Refere que, aos 20 anos de idade, notou<br />
aparecimento de tumoração violácea em conduto<br />
auditivo externo (parede posterior), à direita,<br />
acompanhada apenas de vertigem. Aos 38 anos,<br />
procurou atendimento hospitalar e foi submetida<br />
à intervenção neurocirúrgica, sendo diagnosticado<br />
tumor glômico de jugular direito. No pós-operatório,<br />
evoluiu com paralisia em hemiface ipsilateral. Após<br />
14 anos, houve recidiva da lesão, com exteriorização<br />
do tumor em região retroauricular, em continuidade<br />
com a parede posterior de conduto auditivo externo.<br />
Negava qualquer sintoma sistêmico ou quadro<br />
semelhante na família.<br />
Figura 1 – Foto de região temporal direita, mostrando tumoração retroauricular,<br />
que se projeta para conduto auditivo externo direito.<br />
81<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
Renata Farias de Santana, Renato Telles de Souza, Luiz Carlos Nadaf de Lima,<br />
Rafael Siqueira de Carvalho, Marcos Antônio Fernandes, Luiz Eduardo Wawrick Fonseca<br />
Ao exame físico, observou-se tumoração<br />
violácea obliterando conduto auditivo externo,<br />
com extensão retroauricular, medindo cerca de 1<br />
x 1 cm, no conduto auditivo externo, e 2 x 1,5 cm,<br />
na região retroauricular, consistência fibroelástica,<br />
indolor à palpação, móvel, não pulsátil e sem<br />
alteração de seu volume com manobra de<br />
Valsalva. Ressonância nuclear magnética de crânio<br />
evidenciou formação expansiva heterogênea na<br />
projeção do osso temporal direito (Figura 2).<br />
Radioterapia paliativa foi indicada, neste<br />
caso, pela ausência de margem cirúrgica adequada<br />
para exérese da lesão.<br />
Figura 2 – RNM de crânio, corte axial, mostrando tumoração projetando-se em osso temporal direito.<br />
DISCUSSÃO<br />
Os paragangliomas são originados de células<br />
não cromafins derivadas da crista neural. Essas<br />
células, quando normais, funcionam como parte<br />
do sistema nervoso simpático, atuando como<br />
quimiorreceptores localizados ao longo dos vasos<br />
sanguíneos, principalmente no corpo carotídeo (na<br />
bifurcação da carótida comum) e no arco aórtico. 4<br />
A literatura refere o predomínio do sexo feminino,<br />
entre a quinta e sexta décadas de vida. 3 A paciente em<br />
questão iniciou quadro aos 20 anos de idade.<br />
Paraganglioma é um raro tumor<br />
neuroendócrino, que costuma desenvolver-se em<br />
vários lugares do corpo. Aproximadamente 97% são<br />
massas benignas, que são totalmente curáveis por<br />
remoção cirúrgica, embolização ou radioterapia.<br />
Os 3% restantes costumam ser malignos cursando,<br />
inclusive, com metástases, 75% ocorrem de forma<br />
esporádica e 25% são hereditários. 1, 2 No caso<br />
descrito, houve recidiva do tumor, a despeito da<br />
cirurgia inicial.<br />
A maioria deles é assintomática ou, em<br />
algumas situações, cursando com dor leve ou,<br />
dependendo da localização, com distúrbios<br />
compressivos. Apenas 1 a 3% costuma cursar com<br />
secreção de hormônios como as catecolaminas,<br />
causando sintomas como crises hipertensivas de<br />
difícil controle. Os feocromocitomas, no entanto,<br />
que são células cromafins positivas derivadas<br />
também da crista neural cursam, em mais de 90%,<br />
com secreção de catecolaminas. 3, 4 A paciente<br />
relatada não apresentava repercussões sistêmicas<br />
compatíveis com produção de substâncias tumorais.<br />
Aproximadamente 85% dos paragangliomas<br />
são formados no abdome, 12% são formados no<br />
tórax e 3% desenvolvem-se na região da cabeça e<br />
pescoço. 2 O caso abordado apresentava a lesão em<br />
região temporal direita.<br />
Paraganglioma carotídeo é o mais frequente<br />
de cabeça e pescoço, costuma cursar desde uma<br />
massa levemente dolorida no pescoço como<br />
paralisia de alguns nervos, principalmente o X e<br />
XII par. Glomus timpânico e glomus jugular estão<br />
presentes comumente no ouvido médio resultando<br />
em zumbido e perda auditiva, podem evoluir com<br />
sintomas compressivos na região do forame oval<br />
levando a disfagia, fraqueza ipsilateral do trapézio<br />
82<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
PARAGANGLIOMA JUGULAR: RELATO DE CASO<br />
e esternocleidomastoideo. Paraganglioma vagal é<br />
o menos comum da cabeça e pescoço, geralmente<br />
cursa como uma massa pouco dolorida, porém<br />
pode cursar em algumas situações com disfagia.<br />
Paraganglioma pulmonar, como o próprio nome<br />
refere, pode estar localizado no pulmão como um<br />
nódulo único ou múltiplo. Outras localizações são<br />
laringe, cavidade nasal, seios paranasais, tireoide,<br />
entre outras. 4 A paciente do caso relatado era<br />
portadora de paraganglioma jugular e referia<br />
apenas vertigem.<br />
Diante desses sintomas, faz-se obrigatória<br />
avaliação audiométrica, radiológica (de<br />
preferência a Tomografia Computadorizada ou<br />
ressonância nuclear magnética), lembrando-se<br />
de que as biópsias incisonais e as paracenteses<br />
estão completamente contraindicadas, por conta<br />
do alto índice de complicações proveniente do<br />
sangramento provocado. A cirurgia deve ser<br />
realizada em todos os pacientes com margem<br />
cirúrgica adequada, sempre com a confirmação do<br />
exame anatomopatológico, para descartar outros<br />
tumores. Radioterapia paliativa foi indicada, neste<br />
3, 5, 6<br />
caso, pela impossibilidade de exérese da lesão.<br />
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83<br />
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Márcia dos Santos da Silva, Cecília Mello Garcez,<br />
Marcello Amaral Nestor, Hamilton Ronald Pezo Venegas<br />
ESTENOSE LARÍNGEA CAUSADA POR TUBERCULOSE<br />
LARYNGEAL STENOSIS CAUSED BY TUBERCULOSIS<br />
Renato Telles de Souza*, Luiz Carlos Nadaf de Lima**,<br />
Rafael Siqueira de Carvalho***, Renata Farias de Santana***,<br />
Marcos Antônio Fernandes***, Luiz Eduardo Wawrick Fonseca****<br />
RESUMO<br />
A tuberculose é uma doença infecto-contagiosa de evolução crônica causada pelo Mycobacterium tuberculosis.<br />
O envolvimento da mucosa laríngea pode ser visto através da videolaringoscopia, onde podem ser observadas<br />
lesões nodulares, exofítica, com áreas de ulceração de mucosa, hiperemia, edema e monocordite. Pode haver<br />
acometimento de pregas vocais, pregas vestibulares, epiglote, pregas ariepiglóticas, região interaritenoidea,<br />
entre outras. O presente relato aborda caso de paciente portador de estenose laríngea por complicação de<br />
tuberculose nessa localização, necessitando de traqueostomia definitiva.<br />
Palavras-chave: Estenose, laringe, tuberculose.<br />
ABSTRACT<br />
Tuberculosis is an infectious disease of chronic evolution caused by Mycobacterium tuberculosis. The involvement<br />
of the laryngeal mucosa may be seen by laryngoscopy, which can be observed nodular lesions, exophytic, with<br />
areas of mucosal ulceration, hyperemia, edema and monocordite. It may affect the vocal cords, vestibular folds,<br />
epiglottis, aryepiglottic, interarytenoid region, among others. This report discusses the case of a patient with<br />
laryngeal stenosis due to complication of tuberculosis in this location, requiring definitive tracheostomy.<br />
Keywords: Stenosis, larynx, tuberculosis.<br />
INTRODUÇÃO<br />
A tuberculose é uma doença infectocontagiosa,<br />
de evolução crônica, causada pelo<br />
Mycobacterium tuberculosis, que se caracteriza pela<br />
presença de granulomas e necrose caseosa central. 1,<br />
2<br />
A forma laríngea pode desenvolver-se a<br />
partir da tuberculose pulmonar bacilífera, por<br />
inoculação direta na laringe por meio da secreção<br />
rica em bacilos originária dos pulmões. Através da<br />
videolaringoscopia, podem ser observadas lesões<br />
nodulares exofíticas, com áreas de ulceração de<br />
mucosa, hiperemia ou edema. 1, 3<br />
A estenose laríngea pode ocorrer em função da<br />
complicação de tuberculose nessa localização, levando<br />
o paciente a necessidade de traqueostomia definitiva. 4<br />
RELATO DO CASO<br />
Paciente do sexo masculino, 42 anos,<br />
* Professor Mestre / Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> – <strong>HUGV</strong><br />
** Professor Mestre / Preceptor da Residência Médica de Otorrinolaringologia do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> – <strong>HUGV</strong><br />
*** Médico Residente em Otorrinolaringologia do <strong>HUGV</strong><br />
**** Estagiário do Serviço de Otorrinolaringologia do <strong>HUGV</strong><br />
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ESTENOSE LARÍNGEA CAUSADA POR TUBERCULOSE<br />
natural e procedente de Manaus, Amazonas,<br />
recebeu atendimento médico, no Serviço de<br />
Otorrinolaringologia do <strong>Hospital</strong> Universitário<br />
Getúlio <strong>Vargas</strong>, onde referia que havia,<br />
aproximadamente, um ano, iniciou quadro<br />
de tosse produtiva com secreção amarelada,<br />
acompanhada de febre baixa, geralmente noturna,<br />
além de disfagia para sólidos. Foi submetido à<br />
videolaringoscopia, a qual evidenciou tumoração<br />
em laringe (Figura 1).<br />
Figura 1 – Primeira videolaringoscopia.<br />
Após um mês do início do quadro, foi<br />
internado com piora da disfagia e surgimento<br />
de dispneia em repouso. Submeteu-se à nova<br />
videolaringoscopia, não sendo possível visualização<br />
de laringe, pelo importante edema da região.<br />
Posteriormente, foi realizada biópsia da<br />
lesão, cujo resultado foi tuberculose laríngea,<br />
sendo, então, iniciado o tratamento para esta<br />
patologia. O paciente, entretanto, logo evoluiu com<br />
piora da dispneia e necessidade de traqueostomia<br />
definitiva.<br />
A última videolaringoscopia, realizada<br />
três meses após o término do tratamento para<br />
tuberculose, revelou ausência de epiglote e<br />
cartilagens aritenoides; bandas ventriculares e<br />
cordas vocais não visualizadas; reação cicatricial<br />
da região laríngea levando a obstrução respiratória<br />
(Figura 2).<br />
Figura 2 – Videolaringoscopia após tratamento para<br />
tuberculose.<br />
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Márcia dos Santos da Silva, Cecília Mello Garcez,<br />
Marcello Amaral Nestor, Hamilton Ronald Pezo Venegas<br />
DISCUSSÃO<br />
A tuberculose é a doença granulomatosa mais<br />
comum da laringe. É causada pelo Micobacterium<br />
tuberculosis, altamente patogênico em pacientes<br />
debilitados, sendo a via inalatória a forma de<br />
contaminação. 1, 5<br />
A laringoscopia não mostra uma forma<br />
típica de acometimento, sendo a lesão muitas<br />
vezes indistinguível de carcinoma ou laringite<br />
crônica. A epiglote e a subglote podem apresentar<br />
edema exuberante, em alguns casos necessitando<br />
de traqueostomia. O local mais comum de<br />
envolvimento laríngeo é a prega vocal, seguido<br />
pela banda ventricular, o restante pode envolver<br />
a epiglote, prega ariepiglótica, aritenoide,<br />
comissura posterior e subglote. 6<br />
O diagnóstico pode ser obtido pelo<br />
isolamento e cultura do M. tuberculosis. O melhor<br />
material para cultura é obtido por biópsia. A<br />
resposta à terapia antituberculosa é excelente e a<br />
maioria das lesões desaparece com tratamento. 6, 8<br />
A tuberculose continua sendo uma patologia<br />
de elevada prevalência na região amazônica. A<br />
forma extrapulmonar da doença, como a laríngea,<br />
deve ser cogitada e fazer parte do diagnóstico<br />
diferencial das etiologias de estenose de laringe.<br />
Afinal, o retardo em seu diagnóstico e tratamento<br />
pode tanto piorar o prognóstico do paciente quanto<br />
prolongar o período de infectividade da doença.<br />
REFERÊNCIAS<br />
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FISSURA LABIOPALATINA COMPLETA: RELATO DE DOIS CASOS<br />
FISSURA LABIOPALATINA COMPLETA:<br />
RELATO DE DOIS CASOS<br />
CLEFT LIP AND PALATE: REPORT OF TWO CASES<br />
Márcia dos Santos da Silva *, Cecília Mello Garcez *,<br />
Marcello Amaral Nestor **, Hamilton Ronald Pezo Venegas ***<br />
RESUMO<br />
As fissuras ou fendas faciais são uma das mais frequentes malformações congênitas, correspondendo a<br />
13% de todas elas, sendo as fissuras labiopalatinas o tipo mais comum. Crianças com fissura labiopalatina<br />
apresentam alterações anatômicas e funcionais que limitam seu desenvolvimento desde as primeiras horas<br />
de vida, necessitando de acompanhamento multidisciplinar por vários anos. Apesar de o diagnóstico poder ser<br />
realizado por meio da ultrassonografia durante o pré-natal, este nem sempre é realizado, o que acaba por<br />
postergar o adequado acompanhamento da família que irá receber a criança com deformidade. O objetivo<br />
deste trabalho é relatar dois casos de fissura labiopalatina completa, não diagnosticados durante o pré-natal.<br />
Palavras-chave: Fissura labial, fissura palatina, anormalidades congênitas.<br />
ABSTRACT<br />
Facial clefts are among the most common congenital malformations, accounting for 13% of them and the<br />
cleft lip and palate are the most common type. Children with cleft lip and palate have anatomical and<br />
functional changes that limit their development since the first hours of life, requiring multidisciplinary<br />
follow for many years. Although the diagnosis can be made by ultrasound during the prenatal period<br />
this is not always done, which contribute to delay the proper assistance of the family who will take the<br />
children with deformity. The aim of this paper is to report two cases of complete cleft lip and palate, not<br />
diagnosed during the prenatal period.<br />
Keywords: Cleft lip, cleft palate, congenital abnormalities.<br />
* Acadêmica do curso de Medicina da Universidade Federal do Amazonas<br />
** Médico Neonatologista da Maternidade Ana Braga. Preceptor voluntário do Estágio em Pediatria – submódulo de Neonatologia<br />
da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Amazonas<br />
*** Médico Neonatologista da Maternidade Ana Braga. Preceptor voluntário do Estágio em Pediatria – submódulo de Neonatologia<br />
da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Amazonas<br />
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Márcia dos Santos da Silva, Cecília Mello Garcez,<br />
Marcello Amaral Nestor, Hamilton Ronald Pezo Venegas<br />
INTRODUÇÃO<br />
Define-se como malformação ou defeito<br />
congênito toda anomalia funcional ou estrutural<br />
do desenvolvimento do feto decorrente de fator<br />
originado antes do nascimento, seja genético,<br />
ambiental ou desconhecido, mesmo quando o<br />
defeito não for aparente no recém-nascido e só<br />
manifestar-se mais tarde. 1<br />
De forma geral, perto de 5% dos nascidos<br />
apresentam alguma malformação, determinada,<br />
total ou parcialmente, por fatores genéticos. 2 As<br />
fendas ou fissuras faciais são uma das mais frequentes<br />
malformações congênitas, correspondendo a 13%<br />
de todas elas, com incidência que varia de 1:625<br />
a 1:1.000 nascidos vivos. 3 No Brasil, a prevalência<br />
estimada entre os anos de 1975 a 1994 foi de 0,19<br />
por 1.000 nascidos vivos. 4<br />
Crianças com fissura labiopalatina (FLP)<br />
apresentam diversos distúrbios decorrentes das<br />
alterações anatômicas e funcionais, necessitando<br />
de reabilitação que vai desde intervenção<br />
cirúrgica até orientação nutricional, odontológica,<br />
fonoaudiológica, médica e psicológica. Nesse<br />
contexto, o diagnóstico precoce é de fundamental<br />
importância não apenas para o planejamento<br />
terapêutico pós-natal, mas também para o<br />
aconselhamento dos pais, a fim de evitar a<br />
estigmatização da criança com deformidade. 5<br />
O objetivo deste trabalho é relatar dois<br />
casos de recém-nascidos com FLP completa não<br />
diagnosticada durante o pré-natal.<br />
RELATO DOS CASOS<br />
Caso 1<br />
Criança do sexo masculino, nascida de parto<br />
vaginal após 39 semanas de gestação, pesando<br />
3.520 gramas, com Apgar de 9 no primeiro<br />
minuto e 10 aos cinco minutos, sem dificuldades<br />
respiratórias ou necessidade de reanimação.<br />
Mãe previamente saudável, 20 anos de idade,<br />
primigesta e primípara, realizou 10 consultas de<br />
pré-natal, sem intercorrências durante a gestação<br />
e sorologias de primeiro trimestre negativas.<br />
Ao exame físico do recém-nascido foi<br />
observada fissura labial (foto 1) e fissura palatina,<br />
sem outras alterações.<br />
Figura 1 – Fissura labiopalatina em paciente do caso 1.<br />
O aleitamento materno foi estimulado<br />
já nas primeiras horas de vida e, por conta da<br />
dificuldade de amamentação por sucção débil,<br />
optou-se por complementar a dieta com 20 ml de<br />
leite humano ordenhado e pasteurizado, ofertado<br />
ao recém-nascido em copo, a cada 3h. Após as<br />
24h iniciais, houve melhora no padrão de sucção<br />
e o aleitamento materno passou a ser a única<br />
forma de alimentação. Não houve necessidade<br />
de alimentação por sonda nasogástrica.<br />
88<br />
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FISSURA LABIOPALATINA COMPLETA: RELATO DE DOIS CASOS<br />
Caso 2<br />
Criança do sexo feminino, nascida de parto<br />
vaginal após 39 semanas de gestação, pesando<br />
3.810 gramas, com Apgar de 8 no primeiro<br />
minuto e 10 aos cinco minutos, sem dificuldades<br />
respiratórias ou necessidade de reanimação.<br />
Mãe previamente saudável, 23 anos de<br />
idade, secundigesta, realizou duas consultas de<br />
pré-natal, sem intercorrências durante a gestação<br />
e sorologias de primeiro trimestre negativas.<br />
Ao exame físico do recém-nascido foi<br />
observada fissura labial (figura 2A) e fissura<br />
palatina, sem outras alterações.<br />
O aleitamento materno foi estimulado já nas<br />
primeiras horas de vida e, por conta da dificuldade<br />
de amamentação por sucção débil, optou-se por<br />
complementar a dieta com 30 ml de leite humano<br />
ordenhado e pasteurizado, ofertado ao bebê em<br />
copo, a cada 3h. Como, no entanto, o recém-nascido<br />
permanecia com dificuldade de alimentação e<br />
apresentava risco de aspiração, optou-se por ofertar<br />
o leite humano por sonda nasogástrica (Figura 2B).<br />
Após 48h do nascimento, houve melhora no padrão<br />
de sucção, porém se continuou a fazer uso de<br />
complemento alimentar ofertado em copo.<br />
Figura 2 – Fissura labiopalatina em paciente do caso 2 (A) e utilização de sonda nasogástrica para<br />
complementação alimentar no mesmo paciente (B).<br />
Em ambos os casos, mãe e criança receberam<br />
alta hospitalar em boas condições após 72h de<br />
internação, sendo encaminhadas à Fundação<br />
Centro de Controle de Oncologia do Estado do<br />
Amazonas – FCECON-AM, para acompanhamento<br />
e tratamento multidisciplinar das malformações<br />
observadas.<br />
DISCUSSÃO<br />
As fissuras labial e palatina são defeitos<br />
congênitos caracterizados pela descontinuidade<br />
das estruturas do lábio, palato, ou ambos, com<br />
lesões ocorrendo em diferentes locais e com<br />
extensão variável. 6 Os meninos são mais afetados<br />
em uma proporção de 3:2. As fissuras de lábio e<br />
palato juntas, além de ser o tipo mais comum,<br />
ocorrem duas vezes mais nos meninos que nas<br />
meninas, enquanto que as fissuras de palato<br />
isoladamente são mais comuns nas meninas.<br />
Três quartos das deformidades são unilaterais,<br />
sendo o lado esquerdo o mais prevalente. 7 Nos<br />
casos apresentados, a criança do sexo masculino<br />
apresentava fissura labial à esquerda e a do sexo<br />
feminino apresentava fissura labial à direita.<br />
A classificação das FLPs utiliza como<br />
referência o forame incisivo anterior, definindo três<br />
grupos principais de lesões: pré-forame incisivo<br />
ou fissural labial, que pode ser uni ou bilateral;<br />
pós-forame incisivo ou fissura palatina, sempre<br />
encontrada numa posição mediana, e transforame<br />
incisivo ou FLP, ocasionando a comunicação entre<br />
as cavidades nasal e oral. 8 No presente relato,<br />
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Márcia dos Santos da Silva, Cecília Mello Garcez,<br />
Marcello Amaral Nestor, Hamilton Ronald Pezo Venegas<br />
ambas as crianças apresentavam FLP completa ou<br />
transforame incisivo.<br />
A base embriológica da FLP é a falha na<br />
fusão dos processos maxilar e nasal medial,<br />
entre a 4.ª e a 9.ª semanas de desenvolvimento<br />
embrionário. O lábio superior é formado pela<br />
fusão das proeminências maxilares laterais com<br />
o processo nasal medial. A falha na fusão dessas<br />
estruturas resulta em fissura labial unilateral. A<br />
fissura labial bilateral resulta da falha na união das<br />
massas mesenquimais das proeminências maxilares<br />
com as proeminências nasais mediais fundidas.<br />
A fissura palatina decorre da falha de fusão das<br />
proeminências maxilares laterais entre si. 9<br />
A etiologia da FLP é considerada multifatorial<br />
e inclui fatores hereditários e ambientais.<br />
Os fatores ambientais mais frequentemente<br />
associados são as deficiências nutricionais, o uso de<br />
anti-inflamatórios durante a gestação, exposição à<br />
poluição e à radiação ionizante, exposição do pai a<br />
pesticidas, epilepsia e estresse maternos, infecções<br />
e tabagismo durante o período de formação fetal,<br />
além de idade materna avançada. 10, 11 Uma vez<br />
que os pais têm uma criança com FLP, o risco de a<br />
próxima criança ser afetada é de 2 a 5%. Mais da<br />
metade dos pacientes possuem familiares com a<br />
mesma malformação. 12 Neste trabalho, a mãe do<br />
paciente do caso 1 e o pai da paciente do caso 2<br />
também apresentaram FLP ao nascimento.<br />
A associação de outras malformações<br />
com a FLP é comum, apesar de não se saber<br />
ao certo a percentagem real desse achado.<br />
Podem ser encontradas em associação com FLP<br />
diversas síndromes genéticas, cromossomopatias<br />
e malformações múltiplas não sindrômicas. As<br />
malformações orgânicas mais associadas são as<br />
malformações esqueléticas, cardíacas, urogenitais<br />
e do sistema nervoso central. 13<br />
Crianças com FLP apresentam dificuldades<br />
para amamentação logo após o nascimento, pois<br />
embora o reflexo de sucção e deglutição sejam<br />
normais, há dificuldade em isolar a cavidade oral e<br />
exercer uma pressão suficientemente negativa para<br />
se obter a sucção adequada. Apesar de o aleitamento<br />
materno ser mais efetivo em crianças com fissuras<br />
labiais isoladas, não está contraindicado nas fissuras<br />
mais complexas. 5, 14 No presente trabalho, as duas<br />
crianças apresentaram sucção débil nas primeiras<br />
horas de vida, recebendo o leite humano por meio<br />
de copo, e uma precisou ser alimentada por sonda<br />
nasogástrica em função da persistência do déficit<br />
alimentar e risco de aspiração. Ambas evoluíram<br />
com melhora da sucção, passando ao aleitamento<br />
exclusivo em seio materno ainda nos primeiros dias<br />
de vida.<br />
A presença de FLP facilita o acúmulo de<br />
fluidos no ouvido médio, predispondo a otites de<br />
repetição e consequente perda auditiva. Também<br />
podem ocorrer distúrbios articulatórios e vocais,<br />
com atraso na aquisição da fala e da linguagem e<br />
problemas de aprendizagem. 15<br />
As FLPs se associam a diversas alterações<br />
dentárias. Podem ser encontrados desde dentes<br />
extranumerários até a ausência congênita de dentes.<br />
Os dentes supranumerários ocorrem com maior<br />
frequência, nas margens das fissuras e, se extraídos<br />
precocemente, o osso pode reabsorver e aumentar<br />
a extensão da fissura. Outras alterações incluem<br />
incisivos centrais superiores natais ou neonatais,<br />
microdontias, dentes em T, giroversões, fusões<br />
e hipoplasia de esmalte. Também pode ocorrer<br />
má oclusão dentária por conta das discrepâncias<br />
esqueléticas entre o tamanho, forma e posição<br />
dos maxilares. É comum o achado de prognatismo<br />
mandibular, causado mais pela retrusão da maxila<br />
que pela protrusão da mandíbula, sendo por isso<br />
um pseudoprognatismo. O retardo do crescimento<br />
do maxilar é, contudo, o maior responsável pela má<br />
oclusão. 12<br />
Em geral, o diagnóstico pré-natal das fendas<br />
faciais pode ser realizado pela ultrassonografia<br />
bidimensional; no entanto, esse método possui baixa<br />
sensibilidade para identificar as fissuras palatinas. A<br />
ultrassonografia tridimendisional parece ser o método<br />
mais adequado para essa finalidade, pois, além de<br />
apresentar maior acurácia na detecção das fendas<br />
faciais, permite avaliar sua localização e extensão. 3<br />
Quanto ao tratamento da FLP, o momento<br />
ideal para sua realização ainda é um tema<br />
controverso, pois parece haver um notável equilíbrio<br />
90<br />
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v.9. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2010</strong>
FISSURA LABIOPALATINA COMPLETA: RELATO DE DOIS CASOS<br />
entre os benefícios do desenvolvimento da boa<br />
fala contra os efeitos deletérios do crescimento da<br />
face média em função do traumatismo cirúrgico<br />
associado à cicatrização. Assim, a indicação para a<br />
cirurgia reparadora depende da avaliação da equipe<br />
multidisciplinar. As intervenções cirúrgicas podem ser<br />
iniciadas logo após o nascimento ou aos seis meses de<br />
vida, sendo o reparo da fissura labial a intervenção<br />
mais precoce. A palatoplastia é realizada por volta<br />
dos 18 meses de idade, desde que as condições<br />
7, 16<br />
ortopédicas e gerais do paciente sejam obtidas.<br />
Em conclusão, ressaltamos a importância<br />
do diagnóstico pré-natal das FLPs e a necessidade<br />
de investigação de outras malformações ou<br />
síndromes genéticas que possam estar associadas.<br />
O aconselhamento dos pais e o tratamento<br />
multidisciplinar são fundamentais na assistência a<br />
esses pacientes, evitando estigmas e preconceitos<br />
para com a criança portadora de deformidade,<br />
buscando sempre lhes proporcionar uma vida o<br />
mais próximo do normal quanto for possível.<br />
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TRAUMA DE PÂNCREAS:ANÁLISE RETROSPECTIVA DE CINCO ANOS<br />
TRAUMA DE PÂNCREAS:<br />
ANÁLISE RETROSPECTIVA DE CINCO ANOS<br />
SUMARY OF THESIS ON PANCREATIC TRAUMA:<br />
A RESTROPECTIVE ANALYSIS OF FIVE YEARS<br />
Rubem Alves da Silva Júnior<br />
Dissertação apresentada ao término do curso de Pós-Graduação Interinstitucional UFRJ/FUA, Nível de Mestrado,<br />
Área de Concentração Cirurgia Geral, Setor Abdominal, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de<br />
Janeiro, como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre.<br />
Orientador:<br />
Prof. Dr. José Eduardo Ferreira Manso<br />
Professor-Adjunto do Departamento de Cirurgia da FM-UFRJ<br />
RESUMO<br />
A lesão pancreática traumática constitui um desafio ao cirurgião, seja na tentativa de se estabelecer<br />
um diagnóstico precoce ou na adoção de tratamento adequado que minimize a morbi-mortalidade<br />
pós-operatória.<br />
Para analisarmos fatores que convergem a essa situação, realizamos um estudo retrospectivo<br />
entre 1995 e 1999 de pacientes com lesão pancreática operados em um centro de trauma da<br />
cidade de Manaus.<br />
Dos 58 casos estudados, 55 (94,8 %) eram homens e três (5,2 %) mulheres. A idade variou entre<br />
13 e 75 anos com uma média de 27 anos. Os traumatismos abertos foram os mais frequentes<br />
(86,2%) com os ferimentos por arma branca responsáveis por 72,0% dos casos. Cinquenta (86,2<br />
%) pacientes apresentavam lesões intraperitoneais associadas, com uma média de 1,3 lesão por<br />
paciente, sendo estômago (39,7 %) o órgão mais comumente atingido. Os procedimentos cirúrgicos<br />
mais executados foram suturas simples e desbridamentos acompanhados de drenagem externa.<br />
A lesão ductal esteve presente em quatro (6,9%) dos casos, sendo identificada como fator<br />
concorrente ao óbito. A taxa de mortalidade foi de 20,7% com as lesões de grau III e IV, apesar de<br />
menos frequente, apresentaram maior índice de mortalidade.<br />
Dentre as complicações gerais, os abscessos intraperitoniais (19,6%) foram as mais comuns, vindo<br />
a seguir as fístulas (8,9%), essas diretamente relacionadas à lesão pancreática específica.<br />
Esse estudo nos permitiu concluir que o aumento da morbi-mortalidade está relacionado ao grau de<br />
gravidade da lesão pancreática e do ducto de Wirsung, e não à presença das lesões associadas.<br />
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