PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
vai condicionar a posição da família e da mãe, sendo assim avaliada a<br />
forma como os valores foram transmitidos. Do mesmo modo, a honra do<br />
futuro marido e da família deste liga-se ao comportamento sexual da<br />
mulher, esperando-se que esta mantenha a virgindade até ao casamento.<br />
Como já foi possível observar anteriormente, a reinterpretação do<br />
discurso religioso é claramente mais visível entre as jovens de origem<br />
guineense e indiana do que entre as mulheres mais velhas, sendo possível<br />
observar, entre as primeiras, estratégias específicas de reconstrução<br />
de determinadas regras. O namoro constitui, assim, outra prática que<br />
conhece ajustamentos e transformações por parte destas jovens, embora<br />
persista um forte controlo familiar e social. Na medida em que não existe,<br />
de acordo com as tradições, um período de namoro sem a prévia oficialização<br />
do noivado, muitas destas jovens namoram às escondidas dos pais<br />
durante algum tempo, apresentando os parceiros à família apenas<br />
quando pretendem, de facto, casar-se, e ocultando o período de namoro<br />
precedente, sobretudo entre as indianas, envolvidas num contexto de<br />
maior controlo por parte da família e da comunidade co-étnica:<br />
“Ele interessou-se por mim. Telefonou-me a dizer que me queria<br />
conhecer e, depois, pronto, lá eu o fui conhecendo. Depois começámos<br />
a sair, e começámos a namorar. Continuámos a namorar<br />
durante quatro anos, sempre às escondidas, sem ninguém saber.<br />
Só eu e ele é que sabíamos. Tipo, inventava montes de desculpas<br />
à minha mãe, a dizer que tinha trabalhos na faculdade e coisas do<br />
género, só para estar com ele”. (Zayba, origem indiana, 23 anos,<br />
noiva de um jovem indiano muçulmano)<br />
A distinção entre guineenses e indianas encontra-se visível nos discursos<br />
das jovens que namoram. Enquanto Kumbá, de origem guineense, não<br />
esconde da mãe as relações que tem com jovens de diferentes origens,<br />
sendo estes aceites por aquela, Rafiah, de origem indiana, refere ter<br />
sentido por parte da mãe uma forte inquietação face à sua relação com<br />
um jovem de origem portuguesa, embora nunca tenham discutido<br />
abertamente o assunto:<br />
“Já namorei, mas supostamente não. (...) Comecei a namorar com<br />
um rapaz que não era muçulmano. O choque é tão grande, sabes<br />
Uma pessoa que tem uma cultura completamente diferente...<br />
A minha mãe ia ver o mundo dela, tipo, a acabar, percebes Ia ter<br />
um grande choque. Mas eu também sei jogar, porque eu sei aquilo<br />
que eu posso mostrar à minha mãe e aquilo que eu não posso”.<br />
(Rafiah, 21 anos, origem indiana, não namora actualmente)<br />
“Olha, isso é uma coisa... nunca namorei com nenhum muçulmano.<br />
Sempre foram católicos e, guineenses, foi o segundo, para<br />
Maria Abranches<br />
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