PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
teriza as mulheres muçulmanas de origem indiana e guineense, sobretudo<br />
na dimensão familiar das sociabilidades, traduz-se, entre outros<br />
factores, em relações conjugais endogâmicas.<br />
O casamento muçulmano caracteriza-se por uma sucessão de etapas.<br />
Tradicionalmente, a escolha do cônjuge para uma jovem em idade de<br />
casar, a primeira fase do ritual do casamento, é da responsabilidade do<br />
pai, enquanto a mãe se ocupa posteriormente da organização da festa.<br />
A importância do casamento intra-religioso é extremamente forte e pesa<br />
sobretudo sobre as mulheres, que são, como já foi referido, o principal<br />
meio de garantia da coesão do grupo. De facto, seguindo a lógica<br />
patrilinear, uma criança deve pertencer à linha familiar do pai. Por essa<br />
razão, embora o casamento interreligioso não seja aconselhável para não<br />
comprometer a educação islâmica dos filhos, os homens muçulmanos<br />
dispõem de uma maior flexibilidade nas escolhas matrimoniais, sendo<br />
mais frequente encontrar homens casados com mulheres convertidas do<br />
que a situação contrária (Weibel, 2000).<br />
“Isto ainda é um grande tabu na minha família, sabes Na minha<br />
família e em 99% da comunidade, não é Se a rapariga casar com<br />
um branco, foge mesmo de casa, as coisas são muito… Se um<br />
indiano muçulmano casar com uma branca, a branca já é aceite<br />
por nós, não é” (Latifah, 27 anos, origem indiana, filha de Raja)<br />
“Tenho o meu tio, o irmão do meu pai, que está neste momento<br />
casado com uma brasileira. Se calhar, numa fase inicial, houve<br />
uma dificuldade da parte dos meus avós em aceitar, mas<br />
rapidamente se ultrapassa, porque é como te digo, é muito mais<br />
fácil serem filhos homens. Eles são quatro irmãos, dois homens e<br />
duas mulheres, e se a minha tia aparecesse com um cristão seria<br />
complicado”. (Nisa, 24 anos, origem indiana)<br />
Quase todos os casos de casamentos mistos existentes nas famílias das<br />
mulheres indianas entrevistadas são, com efeito, entre homens muçulmanos<br />
e mulheres de outras religiões, excepto a irmã de Hana, casada<br />
com um caboverdiano não convertido, e uma irmã de Inas e Ayra, casada<br />
com um homem de origem portuguesa, convertido ao Islão. A diferença<br />
surge, aqui, representada nas conversões. Enquanto o cunhado de Hana<br />
não se converteu, o marido da irmã de Inas e Ayssa foi obrigado a fazê-lo,<br />
como determina a religião muçulmana. De facto, de acordo com as<br />
normas religiosas, a conversão é obrigatória apenas para os homens não<br />
muçulmanos com quem as mulheres pretendam casar, enquanto, na<br />
situação inversa, a conversão já não é indispensável. O facto de o cunhado<br />
de Hana não se ter convertido exemplifica, uma vez mais, o maior afastamento<br />
entre as práticas e as representações religiosas na (re)construção<br />
Maria Abranches<br />
122