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Breve história econômica do Equador - Funag

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<strong>Breve</strong> <strong>história</strong> <strong>econômica</strong><strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>rlivro.pmd 126/9/2005, 13:26


Coleção América <strong>do</strong> SulPor iniciativa <strong>do</strong> Ministério das Relações Exteriores, o Instituto de Pesquisade Relações Internacionais, parte integrante da Fundação Alexandre de Gusmão,inicia, no corrente ano, a publicação de uma nova coleção - a Coleção América <strong>do</strong>Sul.A grande prioridade da política externa <strong>do</strong> governo <strong>do</strong> presidente LuizInácio Lula da Silva é a construção de uma América <strong>do</strong> Sul politicamente estável,próspera e unida, com base em ideais democráticos e de justiça social. Nessascircunstâncias, julgou-se oportuno que o IPRI pudesse contribuir para talobjetivo, ao colocar à disposição <strong>do</strong> leitor brasileiro obras fundamentais paraconhecimento <strong>do</strong>s países da América <strong>do</strong> Sul, de autoria de conheci<strong>do</strong>s erespeita<strong>do</strong>s escritores sul-americanos, traduzidas para o português.Com efeito, a integração da região sul-americana, em que está empenha<strong>do</strong>o Governo, repousa, não só sobre aspectos econômicos e comerciais, mastambém sobre aspectos políticos, sociais e culturais. Nesse senti<strong>do</strong>, um melhorconhecimento <strong>do</strong>s países da região, de sua <strong>história</strong> e de suas sociedades é condiçãoimportante para que suas populações aprendam a compreender e a estimar asdiferentes culturas e a diversidade de estruturas sociais incluídas no espaço sulamericano.A Coleção América <strong>do</strong> Sul procura, justamente, estimular no leitorbrasileiro o interesse pela região e o senti<strong>do</strong> de pertencer a uma área que vaialém das fronteiras <strong>do</strong> Brasil.A nova coleção inicia-se, assim, com a publicação de A Argentina, História<strong>do</strong> País e de seu Povo, de María Sáenz Quesada; Classes, Esta<strong>do</strong> e Nação no Peru, deJulio Cotler; <strong>Breve</strong> História Econômica <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, de Alberto Acosta; IdeologiaAutoritária, de Gui<strong>do</strong> Rodríguez Alcalá, relativo ao Paraguai; Os Mitos Profun<strong>do</strong>sda Bolívia, de Guillermo Francovich; Sociedade de Fronteira: uma análise social da<strong>história</strong> <strong>do</strong> Suriname, de R. A .J. Van Lier. Acadêmicos e autoridades sul-americanas,nacionais de cada um <strong>do</strong>s países em questão e, também, de conheci<strong>do</strong>sespecialistas brasileiros contribuirão, em certos casos, pequenos prefácios eintroduções.livro.pmd 226/9/2005, 13:26


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SumárioPrefácio ..................................................................................................... 9Introdução ............................................................................................... 13Uma reflexão inicial ............................................................................. 191. Os resíduos <strong>do</strong> modelo colonial ................................................ 23A herança da Colônia e das guerras da Independência ......... 28A fazenda como um eixo da acumulação ................................ 34A lenta configuração <strong>do</strong> modelo agro-exporta<strong>do</strong>r ................ 40Consolidação <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> oligárquico ........................................ 43As bases para o posterior apogeu cacaueiro ........................... 46As primeiras e inúteis renegociações da dívida externa ........ 512. O modelo de exportação de produtos primários ................. 57Incorporação definitiva <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r no merca<strong>do</strong> mundial .. 60Como o sucre acelerou a modernização ................................. 63Um corte na “dívida górdia”....................................................... 68A Estrada de Ferro, a grande obra da mudança <strong>do</strong> século ... 69livro.pmd 526/9/2005, 13:26


Alguns traços da visão estratégica de Alfaro .......................... 73Do fim da bonança cacaueira à crise prolongada .................. 79O fim <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio plutocrático e a Missão Kemmerer ......... 83Parênteses: a Segunda Guerra Mundial .................................... 90A chegada das grandes companhias estrangeiras .................. 92A banana impulsiona e integra o país ...................................... 95O boom da bananicultura e a renegociação da dívida externa ... 101O Fun<strong>do</strong> Monetário Internacional ............................................ 1033. O modelo de industrialização pela substituiçãode importações ............................................................................... 105Uma primeira tentativa séria de industrialização ................... 107De pobretão vende<strong>do</strong>r de banana a novo-rico petroleiro .. 114Quan<strong>do</strong> o petróleo nos levou às portas <strong>do</strong> paraíso ............. 121O Esta<strong>do</strong> petroleiro a serviço <strong>do</strong> setor priva<strong>do</strong> ................... 124O fim da euforia <strong>do</strong> petróleo .................................................... 129Como a dívida externa foi inflada e explorada ..................... 1354. Rumo a uma nova forma modernizada de exportaçãode produtos primarios ................................................................... 147O alcance <strong>do</strong> Consenso de Washington .................................. 149Os primeiros passos <strong>do</strong> ajuste neo-liberal .............................. 152Principais características de um ajuste tortuoso .................... 158A investida neo-liberal .................................................................. 170Causas e características da crise da virada <strong>do</strong> século ........... 182Principais resulta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> ajuste estrutural ................................ 188livro.pmd 626/9/2005, 13:26


5. O equa<strong>do</strong>r na armadilha da <strong>do</strong>larização .................................. 219A decisão: os interesses e atribulações que a provocaram .. 221Os riscos da <strong>do</strong>larização .............................................................. 224A título de prólogo à <strong>história</strong> futura ....................................... 232Cronologia ...................................................................................... 245Chefes de Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r .................................................. 251Tabelas ............................................................................................. 255Bibliografialivro.pmd 726/9/2005, 13:26


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PrefácioPaulo Nogueira Batista Jr. 1É muito oportuna a iniciativa <strong>do</strong> Instituto de Pesquisa de RelaçõesInternacionais e da Fundação Alexandre Gusmão de publicar a traduçãopara o português deste livro de Alberto Acosta sobre a economia <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r. O Brasil está se aproximan<strong>do</strong> cada vez mais, politica eeconomicamente, <strong>do</strong>s demais países da América <strong>do</strong> Sul. Essa aproximaçãoganhou ímpeto com a formação <strong>do</strong> Mercosul. A aliança Argentina-Brasilvem se fortalecen<strong>do</strong>. Nos anos recentes, Bolívia, Chile, Peru e Venezuelatornaram-se Esta<strong>do</strong>s Associa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Mercosul. Está em negociação umaárea de livre comércio entre a Comunidade Andina de Nações (Bolívia,Colômbia, Equa<strong>do</strong>r, Peru e Venezuela) e o Mercosul. A conclusão dessesentendimentos poderá desembocar na formação de uma Área de LivreComércio da América <strong>do</strong> Sul.Os brasileiros precisam, porém, conhecer melhor a situação e a<strong>história</strong> <strong>econômica</strong> e política das outras nações sul-americanas. A verdadeé que o nosso conhecimento <strong>do</strong>s países vizinhos é ainda muito rarefeito.Como todas as nações de proporções continentais, o Brasil tende a umacerta introversão. Quan<strong>do</strong> olha para fora, prefere voltar a sua atençãopara os países desenvolvi<strong>do</strong>s, especialmente os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s.O livro de Alberto Acosta será de inegável utilidade. Embora escritopor um economista equatoriano para leitores equatorianos, ele éperfeitamente acessível a estrangeiros. O autor pretende dirigir-se a umpúblico amplo, sem sacrificar o rigor argumentativo. A<strong>do</strong>ta, assim, umalinguagem clara e simples. Preparou, também, um glossário de termos1Economista e professor da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo.9livro.pmd 926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAbásicos, o que contribui para facilitar a compreensão <strong>do</strong> texto por leitoresnão-especializa<strong>do</strong>s.A finalidade de Acosta nesta obra é apresentar uma visão panorâmicada <strong>história</strong> <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r desde a independência em 1830. Aeconomia é vista por ele como uma ciência social, que não pode despojarse<strong>do</strong> seu conteú<strong>do</strong> histórico. A sua preferência por uma abordagemhistórica não o leva, entretanto, a evitar a discussão <strong>do</strong>s problemascontemporâneos, como fazem certos historia<strong>do</strong>res sob a alegação de faltade distanciamento temporal. Acosta traz a discussão até os dias atuais,concluin<strong>do</strong> com uma discussão da <strong>do</strong>larização oficial da economiaequatoriana, implantada em 2000.Como não poderia deixar de ser, o desfecho da obra é algomelancólico. O Equa<strong>do</strong>r é o único país sul-americano a ter cometi<strong>do</strong> odesatino de aban<strong>do</strong>nar uma instituição fundamental: a moeda nacional.Em janeiro de 2000, o governo equatoriano anunciou que fixaria a taxa decâmbio e eliminaria o sucre, transforman<strong>do</strong> o dólar <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>sna moeda de curso legal. Antes <strong>do</strong> fim <strong>do</strong> ano, o Banco Central retirou decirculação os sucres, utilizan<strong>do</strong> as suas reservas de dólares. Foi uma decisãolamentável, que o autor deste livro condena em termos vigorosos. ParaAcosta, a <strong>do</strong>larização resultou da “mediocridade das elites governantes”.A crítica veemente à <strong>do</strong>larização é justificada. Os problemasacarreta<strong>do</strong>s por essa decisão são, de fato, extremamente graves. Ela permitealcançar certa estabilidade <strong>do</strong> nível geral de preços, mas o preço que sepaga é exorbitante. Não por acaso, são raras as experiências de <strong>do</strong>larizaçãooficial. Há outras formas, menos custosas, de combater a inflação. Váriospaíses, inclusive alguns que enfrentaram crises inflacionárias mais sérias<strong>do</strong> que a <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, conseguiram enfrentar o problema sem abdicar dasoberania monetária.Com a eliminação da moeda nacional, perde-se a receita desenhoriagem, isto é, os recursos que o governo obtém com a emissãomonetária. Essa receita não desaparece, evidentemente. É transferida parao país emissor da moeda estrangeira a<strong>do</strong>tada. Como observou em 1999 o10livro.pmd 1026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORentão secretário <strong>do</strong> Tesouro <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, Lawrence Summers,em depoimento ao Sena<strong>do</strong> daquele país, os países que se <strong>do</strong>larizamunilateralmente concedem um “empréstimo sem juros aos Esta<strong>do</strong>sUni<strong>do</strong>s” 2 .Com a <strong>do</strong>larização, perde-se, também, o empresta<strong>do</strong>r de últimainstância, elemento central <strong>do</strong>s sistemas financeiros modernos. Como sesabe, países que contam com bancos centrais e moedas nacionais (ou quefazem parte de uniões monetárias como a européia) podem valer-se daemissão de moeda primária para socorrer o sistema financeiro emmomentos de grande instabilidade e risco de corrida bancária. Esse é uminstrumento utiliza<strong>do</strong> sempre que as instituições financeiras de um paísse defrontam com crises de caráter sistêmico.O problema central, ressalta<strong>do</strong> por Acosta, é que a supressão damoeda nacional implica a supressão das políticas monetária e cambial,que constituem aspectos centrais da política <strong>econômica</strong> de qualquer país.Ao tomar essa decisão, o Equa<strong>do</strong>r converteu-se em uma provínciamonetária <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. A economia <strong>do</strong> país passou a ficardiretamente submetida às decisões <strong>do</strong> Federal Reserve, que ao tomá-lasnão considerará, obviamente, os seus efeitos sobre o Equa<strong>do</strong>r. Asflutuações monetárias e cambiais passaram a ser regidas por fatores fora<strong>do</strong> controle <strong>do</strong> governo equatoriano. A <strong>do</strong>larização conduziu, portanto, aum aprofundamento da dependência externa.O Equa<strong>do</strong>r tem hoje uma inflação semelhante à que se observa nosEsta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. No entanto, como seria de esperar, a convergência dainflação equatoriana ao nível da norte-americana foi relativamente lenta.O aumento <strong>do</strong>s preços ao consumi<strong>do</strong>r (dezembro/dezembro) chegou a91% em 2000, 22,4% em 2001, 9,4% em 2002 e 6,5% em 2003 3 . Só em2004 é que a inflação equatoriana se equiparou à <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s.2Lawrence Summers, “Hearing on Official Dollarization in Emerging-Market Countries”, SenateBanking, Housing and Urban Affairs Committee, 22 de abril de 1999 (www.senate.gov).3Comisión Económica para América Latina y el Caribe, Balance Preliminar de las Economías deAmérica Latina y el Caribe 2003, quadro A-23.11livro.pmd 1126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTANos primeiros anos da <strong>do</strong>larização, o Equa<strong>do</strong>r acumulou, portanto,considerável perda de competitividade internacional 4 . Apesar da elevação<strong>do</strong> preço <strong>do</strong> petróleo, seu principal produto de exportação, a economiaequatoriana tem registra<strong>do</strong> déficits expressivos no balanço de pagamentosem transações correntes e, conseqüentemente, ampliação contínua <strong>do</strong> seuendividamento externo. O crescimento da economia tem si<strong>do</strong> modesto eas taxas de desemprego mantêm-se em níveis eleva<strong>do</strong>s 5 .Em termos internacionais, a situação monetária equatoriana é umaaberração. A maior parte das economias <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, como comenta Acosta,a<strong>do</strong>ta a flutuação cambial ou regimes relativamente flexíveis. Essa tambémtem si<strong>do</strong> a tendência pre<strong>do</strong>minante na América <strong>do</strong> Sul. A Argentina, queestava com a economia semi<strong>do</strong>larizada em um regime de currency board,restaurou com sucesso a moeda nacional e a<strong>do</strong>tou um regime de flutuaçãoda taxa cambial. Diversos outros países <strong>do</strong> continente, inclusive o Brasil,aban<strong>do</strong>naram a ancoragem cambial e deixaram suas moedas flutuarem.Ao submeter-se à <strong>do</strong>larização, o Equa<strong>do</strong>r distanciou-se <strong>do</strong>s demais paísessul-americanos.Muitos equatorianos estão convenci<strong>do</strong>s de que a <strong>do</strong>larização foium erro e desejam restabelecer a moeda nacional. Infelizmente, a<strong>do</strong>larização é difícil de desfazer. Essa é, aliás, uma das principais razõespara evitá-la. Não é um caminho sem volta, mas a experiência mostra quea des<strong>do</strong>larização costuma ser um processo traumático. Os governos só seanimam a tentá-la em meio a crises <strong>econômica</strong>s profundas, a exemplo <strong>do</strong>que aconteceu recentemente na Argentina.De qualquer maneira, são tão graves os problemas provoca<strong>do</strong>s pela<strong>do</strong>larização que o Equa<strong>do</strong>r poderá ser leva<strong>do</strong>, em algum momento, a optarpela restauração da moeda nacional. Se essa decisão vier a ser tomada, oBrasil e os demais países da América Sul devem estar prontos a apoiá-la.4Paul Beckerman, “External Debt, Oil Dependence and a Nation´s Currency: Why and HowEcua<strong>do</strong>r Dollarized”, mimeo.,versão preliminar, 15 abril de 2004.5Comisión Económica para América Latina y el Caribe, op. cit., quadros A-2, A-6, A-18 e A-23.12livro.pmd 1226/9/2005, 13:26


Introdução“A <strong>história</strong> ensina o futuro:ignorar os tempos passa<strong>do</strong>s é não estar apto a viver os vin<strong>do</strong>uros.”Juan Montalvo (1880-1)Não se pode entender a economia como ciência sem o seu conteú<strong>do</strong>histórico, e os acontecimentos presentes também não são legíveis sem acompreensão <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>. Tanto é assim que na economia a <strong>história</strong> faz opapel da água na navegação, como dizia o economista argentino PedroPaz. Por isso é desnecessário ressaltar a importância de uma abordagemhistórica para compreender a evolução <strong>econômica</strong> da República <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r, pois não há <strong>história</strong> sem economia.Devemos lembrar também que a economia é uma ciência social eque a <strong>história</strong> estuda a realidade social ao longo <strong>do</strong> tempo; assim, uma<strong>história</strong> <strong>econômica</strong> deve levar em conta as exigências sociais <strong>do</strong> presente.É o que se tenta fazer com este texto: examinar a evolução da sociedadeequatoriana, com ênfase nos aspectos econômicos.Nesta ordem de idéias, o livro apresenta uma breve visãointerpretativa das modalidades de acumulação e das relações sociais<strong>do</strong>minantes em to<strong>do</strong> o perío<strong>do</strong> republicano, determinadas em últimainstância pela dinâmica <strong>do</strong> capitalismo metropolitano. Desta perspectiva,procura-se compreender as tendências básicas de um processo social empermanente transformação, e não narrar simplesmente os acontecimentos,ou enumerar personagens históricas.Devi<strong>do</strong> à própria complexidade da sociedade, não é possível assumir,sem o benefício de um inventário, as diversas leis e os modelos econômicoscom os quais se acredita poder expressar as regularidades <strong>do</strong> processo.Embora úteis para a análise, esses modelos e teorias têm uma aplicabilidade13livro.pmd 1326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTArelativa na conjuntura, e mais limitada ainda no tempo. Além disso, não sepode esquecer que as teorias entram e saem de moda conforme sirvamaos interesses mais poderosos no momento.Nestas condições, escrever uma <strong>história</strong> da economia republicana étarefa complexa. Em primeiro lugar, sua periodização pode ser arbitrária,pois é difícil distinguir claramente os cortes entre as diferentes formas deacumulação. Por outro la<strong>do</strong>, a priorização <strong>do</strong> nexo externo minimiza outroselementos próprios da rica estrutura regional <strong>do</strong> país, por vezescontraditória. Não obstante, esta opção não é inteiramente equivocada, seconsideramos que o vai-vem da economia <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r coincide de formabastante nítida com as diversas ondas cíclicas <strong>do</strong> capitalismo mundial.Mais ainda, porque o comércio exterior tem representa<strong>do</strong> uma espécie devela para o navio que representa a economia nacional, tal como esboçouGermánico Salga<strong>do</strong>, um <strong>do</strong>s economistas mais destaca<strong>do</strong>s da segundametade <strong>do</strong> século XX.Por essas razões, reforçan<strong>do</strong> o caráter social da economia, esta éuma interpretação comprometida da evolução <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r,desde a sua independência até a claudicação da sua política monetária ecambial, com a <strong>do</strong>larização oficial. Depois de repassar nos três primeiroscapítulos a evolução da economia no século XIX e em grande parte <strong>do</strong>século XX, um quarto capítulo é dedica<strong>do</strong> especialmente a analisar a etapa<strong>do</strong> ajuste neo-liberal, por considerarmos que a sua influência é decisivapara o futuro <strong>do</strong> país.Assim, esta é uma <strong>história</strong> com opinião, escrita com paixão — esse“sustento <strong>do</strong> pensamento e da ação, sem o qual nada na vida merece oesforço de ser realiza<strong>do</strong>”, conforme recomendava Alfre<strong>do</strong> ParejaDiezcanseco, amigo queri<strong>do</strong> cuja influência é decisiva na minhapreocupação com a <strong>história</strong>. Este é um esforço para interpretar a <strong>história</strong>,não apenas para contá-la; é um exercício para tentar desvendar a verdade,não para ocultá-la.É impossível isolar-se da angústia humana para demonstrarobjetividade, como acontece hoje com freqüência. Menos ainda se em14livro.pmd 1426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORum país como o Equa<strong>do</strong>r, com um acervo notável e varia<strong>do</strong> de recursosnaturais, em to<strong>do</strong> o perío<strong>do</strong> analisa<strong>do</strong> a maioria da população tem vivi<strong>do</strong> econtinua a viver na pobreza, enquanto há uma minoria cada vez mais rica.Isto é lamentável se considerarmos que com uma efetivaredistribuição da riqueza, e a criação de um projeto nacional de longoprazo, para participar de forma ativa e inteligente no merca<strong>do</strong> mundial,teria si<strong>do</strong> viável a construção democrática de bases sólidas para odesenvolvimento e a satisfação adequada das necessidades básicas de to<strong>do</strong>sos equatorianos. Nestas condições, o desafio não tem si<strong>do</strong> simplesmenteeconômico, mas pelo contrário representou sempre um repto político.Esta realidade requer uma explicação histórica, e não apenas umadescrição mais ou menos cronológica <strong>do</strong>s acontecimentos, querepresentaria na prática uma posição de cumplicidade. Por isso nãosalientamos a ação isolada de pessoas, como se fossem só elas a fazer edesfazer políticas, mas procuraremos compreender o processo social,destacan<strong>do</strong> seus problemas e seus sucessos.Além de tu<strong>do</strong>, este trabalho se destina a um público amplo, emborao rigor investigativo não tenha si<strong>do</strong> sacrifica<strong>do</strong>. A linguagem simples nãoé um sintoma de deficiência, como podem pensar muitos especialistascomprometi<strong>do</strong>s com o sistema <strong>do</strong>minante. Pelo contrário, esta é a formaadequada para evitar que o estu<strong>do</strong> da economia se torne um aborrecimento,e para superar os artifícios e sofismas que ocultam explicações queimpedem a compreender as desigualdades e injustiças. Uma linguagemfácil, que torna inteligível o que é complexo, é por assim dizer uma espéciede chave mestra para abrir essa “caixa preta” onde são deposita<strong>do</strong>s muitasvezes os principais temas econômicos e onde se ocultam numerososatropelos e formas variadas de corrupção, bem como as cumplicidadesentre os <strong>do</strong>gmas vigentes e interesses particulares.Em suma, esta é uma <strong>história</strong> sucinta que permite começar aentender melhor o Equa<strong>do</strong>r. É um livro dedica<strong>do</strong> às professoras e aosprofessores deste país, mas escrito ten<strong>do</strong> em vista os jovens, <strong>do</strong>nos <strong>do</strong>futuro e sujeitos às mudanças <strong>do</strong> presente. Juventude que se forma em15livro.pmd 1526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAgrande parte com textos prepara<strong>do</strong>s nos países “desenvolvi<strong>do</strong>s”, e quetende a pensar que a teoria <strong>econômica</strong> importada tem um valor universal.Sem negar a importância desses textos, ou a lucidez <strong>do</strong>s tratadistasestrangeiros, é preciso reconhecer que as suas contribuições simplesmentenão têm si<strong>do</strong> muito relevantes para a América Latina, de mo<strong>do</strong> geral, epara o Equa<strong>do</strong>r em particular. São obras ajustadas a realidades alheias àsque vivemos nas nossas latitudes; reflexões sobre esquemas basea<strong>do</strong>s empressupostos distantes <strong>do</strong>s equatorianos, e que não recolhem nem agravidade da crise que o país atravessou nem propõem alternativasapropriadas à sua realidade. Até mesmo livros recentes, que abordam asituação <strong>do</strong>s países latino-americanos, são contribuições de expertosforasteiros, os quais não contribuem com opções diferentes; em sua maioria(salvo algumas exceções) se limitam a um enfoque exclusivo, consolidan<strong>do</strong>assim o chama<strong>do</strong> “pensamento único” que tantos danos causa na práticaaos países em desenvolvimento, inibin<strong>do</strong> a capacidade de resposta dassuas sociedades.Não podemos concluir esta introdução sem antes insistir nanecessidade de aprofundar o estu<strong>do</strong> da <strong>história</strong> <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r.Conhecer a <strong>história</strong> <strong>do</strong> país, discuti-la e compreendê-la, pode ser umprimeiro passo para a criação de uma teoria própria. Se os novoseconomistas precisam aprender a criar uma teoria <strong>econômica</strong>, devemtambém a<strong>do</strong>tar uma atitude crítica com relação às teorias e os instrumentos“exóticos”, para a partir desse ponto, em um processo dialético de debatee aprendizagem contínua, propor soluções. O que só será possívelconhecen<strong>do</strong> a <strong>história</strong> <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, da região e <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.Como se observou inicialmente, a análise deste livro parte <strong>do</strong> estu<strong>do</strong>das diversos modelos de acumulação existentes. Naturalmente, estaabordagem não nega outras perspectivas e outros enfoques, que poderiamser considera<strong>do</strong>s: a discussão das políticas <strong>econômica</strong>s a<strong>do</strong>tadas no país,no quadro das sucessivas escolas de pensamento <strong>do</strong>minantes; a evoluçãomacro-<strong>econômica</strong> e o desenvolvimento, muitas vezes conflitivo, das váriasregiões; a influência <strong>do</strong> FMI na economia e na sociedade, a partir das16livro.pmd 1626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORcondições impostas ao país, conforme as várias Cartas de Intençãoassinadas; um estu<strong>do</strong> comparativo das diferentes políticas monetáriasaplicadas nas crises experimentadas no século XX; uma releitura daeconomia republicana à luz da sustentabilidade ecológica; a vinculaçãocomercial e financeira <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r com o merca<strong>do</strong> mundial, diferencian<strong>do</strong>apor continentes e regiões; a inter-relação das formas de produçãocapitalistas e comunitárias; entre muitos outros temas.Finalmente, registro que muitas pessoas merecem meusagradecimentos, não necessariamente pela sua contribuição direta napreparação deste trabalho mas pela contribuição permanente que deramà trajetória nunca concluída de aprender e reaprender a realidadeequatoriana.Nesta oportunidade agradeço pelo aporte trazi<strong>do</strong> à primeira versãodeste texto, concluída em 1995: a Enrique Ayala Mora por suas valiosassugestões; a Juan Falconi Morales pelo seu valioso apoio na revisão <strong>do</strong>glossário básico; a María Dolores Gómez de la Torre pelos inteligentesconselhos para melhorar a apresentação didática <strong>do</strong> livro; a María CaridadAraujo pela sua colaboração entusiástica para completar os quadrosestatísticos e o glossário destina<strong>do</strong> a facilitar a leitura.Para esta segunda edição foram valiosas as contribuições de JuanPaz y Miño, assim como de David Villamar, que revisou e atualizou osquadros estatísticos, o glossário e a cronologia. Uma vez mais, destaco ainfluência permanente de Jürgen Schuldt, mestre, companheiro e sobretu<strong>do</strong>amigo.Alberto Acosta(setembro de 2001)17livro.pmd 1726/9/2005, 13:26


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Uma reflexão inicialComo to<strong>do</strong>s os outros países latino-americanos o Equa<strong>do</strong>r passoupor várias modalidades de acumulação.Cada um desses modelos estava intimamente relaciona<strong>do</strong> com certasalianças hegemônicas <strong>do</strong>s grupos <strong>do</strong>minantes, com uma estrutura própriade Esta<strong>do</strong> e uma configuração especial da política <strong>econômica</strong>. Por outrola<strong>do</strong>, essas diferentes modalidades criaram formas particulares derelacionamento entre as distintas regiões <strong>do</strong> país, e, em especial, formaspeculiares de articulação com o merca<strong>do</strong> mundial.Assim, desde as suas origens o Equa<strong>do</strong>r atravessou toda uma sériede perío<strong>do</strong>s de apogeu e de crise, refletin<strong>do</strong> de perto os ciclos daseconomias capitalistas centrais. É um vínculo que não se limita às relações<strong>econômica</strong>s, mas se completa com to<strong>do</strong>s os elementos — políticos, sociais,culturais — que configuram o poder mundial; um processo complexoque ganhou força à medida que se consolidava e difundia o sistemacapitalista, e que a economia equatoriana se integrava ao comércio mundial.Por isso tem muita razão André A. Hofman quan<strong>do</strong> assinala que asfases de desenvolvimento <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r “por tratar-se de um país muitoreceptivo, coincidem de forma muito nítida com as flutuações daconjuntura mundial.” Em especial, as crises <strong>do</strong> capitalismo equatorianoforam produzidas como conseqüência das crises <strong>do</strong> capitalismo norteamericano.Situação que explica, em larga medida, as atuais limitaçõesdesse capitalismo; o que de nenhum mo<strong>do</strong> pode levar-nos a sobredimensionara influência externa na evolução <strong>econômica</strong> nacional.Além disso, sem retirar importância à consideração anterior, estarelação com o merca<strong>do</strong> internacional não terá sempre as mesmasrepercussões na economia <strong>do</strong> país que as ocorridas em outros países daregião, devi<strong>do</strong> a suas características particulares.19livro.pmd 1926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTANeste breve tratamento da <strong>história</strong> <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r vamosdividi-la em quatro perío<strong>do</strong>s, com limites não claramente delinea<strong>do</strong>s notempo mas que, ao contrário, apresentam mais de uma sobreposição oumesmo saltos temporários.Recorde-se que depois de superada uma fase prejudicada pelosresíduos coloniais (1), o país assumiu com vigor o modelo de exportaçãoprimária (2). Mais tarde <strong>do</strong> que os demais países latino-americanos, oEqua<strong>do</strong>r tentou avançar para a modalidade da industrialização por meioda substituição de importações (3), até chegar, no fim <strong>do</strong> século XX, aoque se poderia definir como um processo de transição rumo a um retornoà segunda fase, devidamente modernizada: o ajuste neo-liberal (4).Esta caracterização, que recolhe vários aspectos próprios à realidadeequatoriana, está inspirada na proposta de Jürgen Schuldt de analisar asmodalidades de acumulação capitalista nos países latino-americanos. Adiferença principal com relação ao esquema que propõe é a incorporaçãode um ponto adicional: os resíduos <strong>do</strong> modelo colonial, devi<strong>do</strong> acaracterísticas peculiares que explicaremos mais adiante.Portanto, a transferência de uma modalidade de acumulação paraoutra é determinada pela dinâmica socio-política interna, sob a influênciadas modificações <strong>do</strong> capitalismo no plano mundial.Seguin<strong>do</strong> a mesma linha de reflexão, cada estrutura <strong>econômica</strong> temsua contrapartida na estrutura social, sen<strong>do</strong> necessário identificar nosistema econômico e político, em cada caso, as frações da classe <strong>do</strong>minante,as camadas em ascenção, os grupos subordina<strong>do</strong>s e os estratos“marginaliza<strong>do</strong>s”. O objetivo é distinguir as contradições socio-políticasinerentes a cada regime social ou modelo de acumulação, centralizan<strong>do</strong> aanálise na geração de novos grupos sociais e configurações sociais epolíticas que questionam o modelo de acumulação em vigor.Por isso é muito importante entender adequadamente o processode transição entre as diferentes modalidades de acumulação, assim comoa dinâmica socio-política implícita em cada uma delas, o que significaconsiderar corretamente a mediação complexa entre o econômico, o social20livro.pmd 2026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORe o político. Em outras palavras, a interação entre a estrutura <strong>econômica</strong>,as classes sociais e o Esta<strong>do</strong>.21livro.pmd 2126/9/2005, 13:26


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1Os resíduos <strong>do</strong> modelo coloniallivro.pmd 2326/9/2005, 13:26


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1Os resíduos <strong>do</strong> modelo colonialAs dificuldades registradas durante o século XVIII, provocadasespecialmente pela ruína da economia obrajera, baseada no trabalhoindígena, e pela contratação da atividade mineira que sustentava aexportação de metais preciosos, incidiram na estrutura <strong>do</strong> poder colonial.A isto se acrescentaram as reformas <strong>do</strong>s Bourbons, que criaram uma sériede reações <strong>econômica</strong>s e políticas, algumas delas violentas: por exemplo,a instituição de tributos, o monopólio <strong>do</strong> aguardente que levou a “rebelião<strong>do</strong>s bairros”, em Quito, no ano de 1765.Além disso, tiveram sua influência vários acontecimentos nocontinente europeu que debilitaram a posição da Espanha, sobretu<strong>do</strong> coma invasão napoleônica da península ibérica, que transcendeu o campopuramente militar. Para entender as mudanças ocorridas nessa época épreciso levar em conta também o crescimento <strong>do</strong> poder comercial britânico,empenha<strong>do</strong> em disputar espaço com a coroa espanhola.Nessas condições, na administração <strong>econômica</strong> das colôniasamericanas os representantes diretos da metrópole perderam terreno, eos grupos de proprietários criollos, ou seja, nacionais, se consolidaram,especialmente a base <strong>do</strong> sistema latifundiário que recrutou, através <strong>do</strong>concertaje, a força de trabalho indígena liberada.Foi o que aconteceu até que chegou o momento em que oslatifundiários locais, em torno <strong>do</strong>s quais o poder econômico colonialcomeçou a se reestruturar, decidiram assumir o poder político para ampliarseus horizontes comerciais e financeiros. Por esse motivo o movimentoda independência encontraria nesses grupos a sua força inicial, contan<strong>do</strong>depois com a adesão de outros setores urbanos, que aos poucos foramvencen<strong>do</strong> sua natural resistência a participar da luta.25livro.pmd 2526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTANesse contexto, as massas indígenas, protagonistas de diversasrebeliões e protestos, episódios da vida colonial, mantiveram uma posiçãobastante passiva, uma vez que “havia consciência de quais seriam osbeneficiários da autonomia: justamente os fazendeiros que tinhamcontribuí<strong>do</strong> para a repressão sangrenta daquelas revoltas” (Ayala 1993,p. 56).Nessas condições, “a principal experiência comum que os diferentesgrupos <strong>do</strong>minantes regionais da República equatoriana começam a partilharem 1830 é a administração <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, na qual incorporaram a suaexperiência anterior (em vários aspectos não houve um rompimento radicalcom o passa<strong>do</strong> colonial) e aprendem a enfrentar a nova situação política.Nesse processo, e nessa experiência, se vão homogeneizan<strong>do</strong> como classe<strong>do</strong>minante <strong>do</strong> conjunto da formação social equatoriana — a classe quemanifesta esse Esta<strong>do</strong>. O que não acontecerá abruptamente, mas comlutas, avanços e retrocessos.” (Vega 1991, p. 12-3).Em sua tese sobre “A Revolta pela Independência na AméricaHispânica”, o historia<strong>do</strong>r Heraclio Bonilla observa com lucidez que aindependência não alterou as condições <strong>do</strong>s indígenas, pois “300 anostranscorreram em vão (...) o desmantelamento <strong>do</strong> sistema político denenhum mo<strong>do</strong> significou a erradicação completa das bases <strong>econômica</strong>s esociais que garantiram a manutenção <strong>do</strong> sistema imperial, sobretu<strong>do</strong> nospaíses com uma população nativa densa e cuja importância para a Espanhahavia determina<strong>do</strong> o maior aprofundamento das instituições. (...) Assimcomo a Espanha soube aproveitar os mecanismos e instituições préhispânicaspara firmar o seu governo, a partir da independência asoligarquias criollas souberam utilizar os mecanismos coloniais para garantire sobretu<strong>do</strong> para sacralizar o seu <strong>do</strong>mínio.”Neste ponto é preciso resgatar a vinculação <strong>do</strong> que Aníbal Quijanoentende como “colonialidade <strong>do</strong> poder” com o desenvolvimento. Comovimos, no princípio da República os herdeiros diretos <strong>do</strong>s coloniza<strong>do</strong>resse apossaram <strong>do</strong> poder colonial, situação que, sem qualquer ingerência daCoroa, lhes facilitou inclusive fortalecer o seu poder.26livro.pmd 2626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORNão só se estruturou sobre as bases coloniais um renova<strong>do</strong> <strong>do</strong>míniopolítico e econômico (cujo significa<strong>do</strong> merece ser estuda<strong>do</strong> maisdetidamente, assim como os elementos constituintes das economiasindígenas, sobretu<strong>do</strong> seus traços comunitários, que persistem ainda noinício <strong>do</strong> século XXI). O aspecto cultural (étnico e racial) desse complexoperío<strong>do</strong> de transição, que se projeta a partir <strong>do</strong> início <strong>do</strong> terceiro milênio,desempenha igualmente um papel fundamental para entender a evolução<strong>do</strong>s primeiros tempos pós-coloniais, e também para compreender a faltade raízes sólidas das elites, ao longo de to<strong>do</strong>s os anos de vida republicana.Vale lembrar que no Equa<strong>do</strong>r os protagonistas <strong>do</strong> processo deindependência foram latifundiários poderosos, que provocaram aderrubada das autoridades coloniais da Real Audiência de Quito no dia 10de agosto de 1809. Em 2 de agosto de 1810, em Quito, muitos líderes darevolta contra o poder colonial, juntamente com alguns intelectuaisprocedentes das classes médias, foram massacra<strong>do</strong>s por tropas realistas,destruin<strong>do</strong> o que poderia ter si<strong>do</strong> um núcleo dirigente mais homogêneo.Houve assim um desencontro entre “a originalidade e o caráterespecífico da experiência histórica denominada ‘América Latina’ e aconfiguração eurocentrista da perspectiva <strong>do</strong>minante”, que se impôs, eque, neste princípio <strong>do</strong> século XXI “continua procuran<strong>do</strong> ‘ler’ essarealidade [a realidade nacional] como se fosse a Europa” ou como se fosseos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s: a realidade modernizada <strong>do</strong>s setores <strong>do</strong>minantes. Poroutro la<strong>do</strong>, como elemento da mesma complexidade, mantém-se até agoraa “vício insanável da percepção eurocêntrica <strong>do</strong> <strong>do</strong>minante sobre o<strong>do</strong>mina<strong>do</strong>, que bloqueia a admissão desse <strong>do</strong>mina<strong>do</strong> como outro sujeito”(Quijano 1994).A <strong>do</strong>larização talvez seja uma das manifestações mais radicais dessa“colonialidade”, pois se trata de a<strong>do</strong>tar uma moeda estrangeira, o dólar,renuncian<strong>do</strong> à moeda nacional, o sucre, com todas as seqüelas que issoimplica.Assim, a colonialidade perdurou nestes países como base <strong>do</strong> poder,e ao mesmo tempo como causa da debilidade estrutural. O que explica27livro.pmd 2726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTApor que a sorte <strong>do</strong>s <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>s só chega a preocupar realmente os<strong>do</strong>minantes quan<strong>do</strong> pode afetar os seus interesses. Situação que “boqueia,to<strong>do</strong> o tempo, a possibilidade efetiva da modernidade estrutural e globaldessas sociedades” (Quijano 1994).Isto torna essas sociedades espaços de confronto, radicais e muitoconflitivos, refletin<strong>do</strong> a falta de estabilidade e a fragilidade <strong>do</strong>s processoseconômicos. E esclarece também a debilidade estrutural de todas as elites,em particular as <strong>econômica</strong>s — concretamente, <strong>do</strong>s empresários — quan<strong>do</strong>se trata de conceber um projeto nacional que beneficie toda a população,mesmo com as diferenças e contradições existentes no sistema capitalista.A herança da colônia e das guerras da independênciaÉ preciso levar em conta que o Equa<strong>do</strong>r se tornou uma repúblicaindependente, em 1830, a partir <strong>do</strong> que havia si<strong>do</strong> o antigo Reino deQuito, e depois a Real Audiência de Quito, em plena crise <strong>econômica</strong> <strong>do</strong>sistema capitalista europeu, herdan<strong>do</strong> os pesa<strong>do</strong>s encargos da Colônia etambém de muitos anos das onerosas guerras da Independência.Neste ponto vale a pena assinalar que o perío<strong>do</strong> parentético da GrãColômbia, de transição entre a Colônia e a República Equatoriana, foi marca<strong>do</strong>pelas guerras da Independência e sobretu<strong>do</strong> pelo enorme esforço bélicorealiza<strong>do</strong> pelo Departamento <strong>do</strong> Sul, ou <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, transforma<strong>do</strong> em umgrande acampamento destina<strong>do</strong> a reunir e preparar os recursos necessáriospara a guerra contra os espanhóis no Peru e na Bolívia (Luna Tobar 1986).Na prática a influência da Grã Colômbia em termos de construção deuma identidade nacional e de definição de um espírito estatal realmentelibertário foi limitada. Salvo talvez algumas ordenações bolivarianas quemarcaram tendências básicas, como por exemplo o Regulamento sobre Minas,expedi<strong>do</strong> por Simón Bolívar em Quito em 24 de outubro de 1829, no qual semanifestava que “as minas de qualquer tipo correspondem à República.”No perío<strong>do</strong> bolivariano o primeiro nexo com a economia mundialfoi cria<strong>do</strong> pelas necessidades bélicas, que obrigaram à contratação de28livro.pmd 2826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORempréstimos no exterior para a compra de armamentos. Portanto, a dívidaexterna foi um <strong>do</strong>s mecanismos primordiais que serviu organicamente osinteresses <strong>do</strong> capital internacional que nessa época começava a funcionarcom uma lógica mais totaliza<strong>do</strong>ra.Paralelamente, com base nas suas exportações de produtos primários(o cacau já era conheci<strong>do</strong> no comércio colonial) o Equa<strong>do</strong>r começou aintegrar-se ao comércio mundial, sob a influência pre<strong>do</strong>minante da GrãBretanha. Bem mais tarde receberia o fluxo de alguns capitais de poucosinvesti<strong>do</strong>res britânicos, franceses e alemães, aos quais se somariam depoisos norte-americanos.Neste contexto, depois da separação da Espanha a economiaequatoriana pouco variou, incorporada a reprodução internacional <strong>do</strong>capital pela penetração, expansão e competição <strong>do</strong>s diferentes interessesmercantis e financeiros determina<strong>do</strong>s pelas potências capitalistas deprincípios <strong>do</strong> século XIX.Conforme observou em 1896 Emilio María Terán, um general liberal,a primeira fase da República foi maculada pelos vícios da Colônia, asarbitrariedades <strong>do</strong> “militarismo prepotente” e <strong>do</strong> “sacerdócio sacrílego”,uma ‘depravação” que, segun<strong>do</strong> Luis Robalino Dávila, historia<strong>do</strong>r de ín<strong>do</strong>leconserva<strong>do</strong>ra, duraria pelo menos as primeiras três décadas republicanas.Além disso, não podem ser ignoradas todas as dificuldades sofridas, devi<strong>do</strong>às guerras da Independência, por grandes áreas <strong>do</strong> país, que já tinhamestruturas <strong>econômica</strong>s marcadas pelo caráter heterogêneo, com forçasprodutivas refreadas.Assim, com a independência política subiu ao poder no Equa<strong>do</strong>ruma aliança da oligarquia latifundiária e importa<strong>do</strong>ra, com apoio <strong>do</strong>s restos<strong>do</strong> militarismo grã-colombiano e <strong>do</strong> clero, que usaram em seu benefíciogrande parte <strong>do</strong> aparato colonial herda<strong>do</strong>. Essa aliança procurariainstrumentalizar “seu próprio projeto nacional”, ou seja, “o projeto estatallatifundiário”. Desta forma, segun<strong>do</strong> Silvia Vega, que apresenta argumentosinteressantes com outras interpretações <strong>do</strong>s primeiros anos da República,a partir de 1835 teria havi<strong>do</strong> “uma tentativa lúcida e consciente da classe29livro.pmd 2926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAlatifundiária de adquirir coesão nacional, partin<strong>do</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> central paraabranger toda a sociedade, subordinan<strong>do</strong> e funcionalizan<strong>do</strong> os podereslocais assim como o poder de certas corporações, como a Igreja e oExército, sob a direção política estatal” (Vega 1991, p. 18).Esse cenário estava prejudica<strong>do</strong> por uma marcante debilidade<strong>econômica</strong>, o despotismo e a anarquia, que não modificaram o sistemaanterior de <strong>do</strong>mínio e servidão. Sistema que foi recria<strong>do</strong> em instânciasregionais, com diferentes características e sujeito a interesses varia<strong>do</strong>s, masmanten<strong>do</strong> inalterada a recusa colonial de admitir a cidadania <strong>do</strong>s indígenas.A isto se somam “as repercussões da vinculação à Grã Colômbia,[que] podem ser sentidas ainda no primeiro lustro (1830-5), particularmentepela indefinição territorial, a expectativa da Confederação com NovaGranada, que subsiste até 1832, porque as alianças e confrontações depoder no Norte se refletem nos acontecimentos políticos <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r”(Vega 1991, p. 21).Essa configuração de interesses complexos e até mesmocontraditórios se consolidaria paulatinamente durante as primeiras décadasda vida republicana, constituin<strong>do</strong> para o Esta<strong>do</strong> uma base bastante débil.Situação que se conjugaria em um modelo dependente da acumulaçãomediante as exportações de produtos primários, ou seja, de “crescimentopara fora”, sustenta<strong>do</strong> pela estrutura colonial, que permitiu aos setoreshegemônicos reforçar seu <strong>do</strong>mínio em escala nacional e regional.A difusão <strong>do</strong>s problemas regionais foi outro <strong>do</strong>s mecanismos através<strong>do</strong>s quais as dificuldades <strong>econômica</strong>s de uma região eram compensadas coma prosperidade de outra, fenômeno que continuou ao longo de to<strong>do</strong> o perío<strong>do</strong>republicano. Da mesma forma, foi importante o inter-relacionamento dasdiversas regiões <strong>do</strong> país com áreas próximas <strong>do</strong> Peru e da Colômbia, com asquais, nesse longo e complica<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> de transição entre a Colônia e aRepública, foram cria<strong>do</strong>s vínculos de produção e comércio.Neste contexto, apesar da liberalidade formal <strong>do</strong> sistema econômicoe da debilidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, não se pode ocultar a presença de uma estruturaestatal a serviço <strong>do</strong>s interesses da aliança oligárquica. Surgiu um embrião30livro.pmd 3026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORde Esta<strong>do</strong> oligárquico e patrimonial, cujo papel foi determinante nesseperío<strong>do</strong> inicial de consolidação <strong>do</strong> país, tanto em termos políticos comoeconômicos, representan<strong>do</strong> um instrumento de coesão na formação social.Não obstante, nessas condições não se formou um Esta<strong>do</strong> nacional, pelaprópria exclusão das massas e a inexistência de uma <strong>história</strong> comum entreos grupos indígenas e mestiços com as novas elites ligadas ao mecanismode acumulação colonial.Por outro la<strong>do</strong>, a presença <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> se nutriu e se debilitouparalelamente às numerosas guerras intestinas através das quais se decantouo poder interno — melhor diríamos, os múltiplos poderes regionais de umespaço delimita<strong>do</strong> artificialmente e batiza<strong>do</strong> como “República <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r”.Concretamente, a formação <strong>do</strong> país se deu no meio de um crescente conflitosocial e político entre os interesses <strong>do</strong>s setores <strong>do</strong>minantes da Serra e daCosta, em especial a partir de 1842 e 1843, quan<strong>do</strong> terminou uma primeiraexpansão cacaueira, e a epidemia de febre amarela “causou a morte de pelomenos cinco mil habitantes da antiga província de Guayaquil e de três mil equinhentos manabitas.” (Chiriboga 1980, p. 21). Crise que explodiu com a“Revolução de Março” de 1845, quan<strong>do</strong> o governo <strong>do</strong> Presidente Floresfoi derruba<strong>do</strong>, e que limitou a vigência <strong>do</strong> projeto estatal encarna<strong>do</strong> pelos<strong>do</strong>is primeiros Presidentes, Juan José Flores e Vicente Rocafuerte, que decerto mo<strong>do</strong> demonstraram “uma habilidade concilia<strong>do</strong>ra consciente <strong>do</strong>sinteresses <strong>do</strong>minantes” (Vega 1991, p. 11).Leve-se em conta também que esse conflito regional chegou muitasvezes a público exclusivamente como um problema geográfico, quan<strong>do</strong>“o regional é um fenômeno político, e como tal não pode ser reduzi<strong>do</strong> deforma mecânica a ‘interesse local’ ou ‘interesse econômico diferencia<strong>do</strong>’”(Maiguashca 1992, p. 180-1). Um fenômeno que, além de tu<strong>do</strong>, provocoudiversas interpretações da evolução histórica <strong>do</strong> país, dependen<strong>do</strong> dediferentes posições e interesses regionais, como as distintas interpretaçõesda revolução de julho de 1925, para citar um exemplo.Não se deve esquecer que os atores das três regiões históricas comque nasceu a República — Quito, Guayaquil e a Cuenca —”tomaram31livro.pmd 3126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAconsciência de si mesmos durante o processo da Independência, quan<strong>do</strong>surgiu a possibilidade de desfazer-se <strong>do</strong> poder metropolitano para controlaro seu próprio destino” (Maiguashca 1992, p. 181). Situação acentuadacom o Esta<strong>do</strong> centralista grã-colombiano, e que de forma recorrentedeterminou conflitivamente a convivência <strong>do</strong> nacional (ou central) e oregional (ou periférico). Conflito que, segun<strong>do</strong> Juan Maiguashca (1992,p.182) “foi o principal fenômeno político na <strong>história</strong> equatoriana ao longode to<strong>do</strong> o século XIX e até os nossos dias”, e que, para aceitar a suareflexão, se denomina “questão regional”. Essa questão adquiriu novaimportância no princípio <strong>do</strong> século XXI, projetan<strong>do</strong>-se como um tema quecontempla não só conflitos de diferente ín<strong>do</strong>le mas também potencialidadesainda não identificadas com clareza, e que têm encontra<strong>do</strong> interessantesrespostas locais na gestão de vários municípios em to<strong>do</strong> o país.A questão regional foi uma dimensão fundamental da economianesses primeiros anos da República; ela nasceu com o fim da Colônia e semantém no tempo. Assim, a Serra centro-setentrional, ten<strong>do</strong> Quito comonúcleo, se sustentou no regime <strong>do</strong>s latifundiários e aglutinou a maioria dapopulação. A Costa, especialmente a zona de influência de Guayaquil,encontrou seu eixo no latifúndio vincula<strong>do</strong> ao comércio exterior, comuma clara redução da pequena propriedade agrícola. A terceira região, aSerra meridional, ten<strong>do</strong> Cuenca como centro, apresentou um pre<strong>do</strong>mínioda pequena propriedade agrícola e da artesania. Essas regiões, que poderiamser subdivididas para uma melhor compreensão de certas evoluçõeshistóricas, não formavam um merca<strong>do</strong> nacional que as articulassem. Emalguns casos suas relações eram muito mais estreitas com outras regiõesfora <strong>do</strong> país: o Sul da Colômbia com a Serra centro-setentrional; o Norte<strong>do</strong> Peru e a costa pacífica para os habitantes da Costa e também para os<strong>do</strong> Sul. Não se deve esquecer que a viagem de Guayaquil a Lima era maisfácil e tomava menos tempo <strong>do</strong> que o trajeto entre Guayaquil e Quito,para não mencionar as relações entre outras cidades. As vinculações decomércio e produção dessa época foram estudada por vários especialistas,entre os quais se destaca a contribuição da historia<strong>do</strong>ra Christiana Borchart32livro.pmd 3226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORde Moreno, uma das pessoas que mais estu<strong>do</strong>u esta etapa que antecedeu aRepública independente.Sobre este ponto é interessante “destacar que, a despeito de qualqueraparência dualista, o Equa<strong>do</strong>r tem uma só estrutura produtiva, que recolhe earticula, conforme as necessidades de acumulação <strong>do</strong> capital e de fornecimentode mão de obra, as diferentes formas não produtivas, como as políticas eideológicas. Neste senti<strong>do</strong> devem ser interpretadas as relações entre a Serra ea Costa. Ligadas funcionalmente pelas exigências <strong>do</strong> sistema, vão desempenharpapéis diferentes porém articula<strong>do</strong>s pela mesma lógica da acumulação. Nasfases de crise as fissuras se acentuarão, visualizan<strong>do</strong>-se a imagem de <strong>do</strong>ismun<strong>do</strong>s opostos; no entanto, nas épocas de apogeu permitirão retornar,inclusive de forma aparente, o caráter estrutural integra<strong>do</strong>.”“Neste esquema, a Serra cumpre sua função em <strong>do</strong>is níveis.Primeiramente, em termos de uma divisão interna <strong>do</strong> trabalho, oabastecimento de alimentos para o merca<strong>do</strong> nacional. Em segun<strong>do</strong> lugar,se constituiu no reservatório de mão de obra ligada aos latifúndios pormeio de formas feudais. Deste mo<strong>do</strong> eliminou-se fundamentalmente apossibilidade de expressão política dessas massas, através de elementosideológicos semi-feudais. Por outro la<strong>do</strong>, havia vastos contingentes à esperada conjuntura internacional que permitisse a monetarização da mais-valiaque dela poderia ser extraída; e tu<strong>do</strong> isso em condições de produção queasseguravam à classe latifundiária uma total rentabilidade” (Velasco 1973).Se o econômico é determinante, sobretu<strong>do</strong> pelo problema daatribuição de recursos a diversas regiões, o político teve uma influênciafundamental <strong>do</strong> la<strong>do</strong> <strong>do</strong> controle territorial e social, no qual se sintetizavamos aspectos ideológicos <strong>do</strong> conflito permanente entre <strong>do</strong>minaçãooligárquica e participação cidadã, assim como entre poder central e poderesregionais. Adicionalmente, é preciso considerar aspectos culturais ereligiosos, que influíram na “questão regional”, e também o fator étnico,outro complica<strong>do</strong>r.Parece significativo fazer finca-pé neste aspecto: o controle <strong>do</strong>sindígenas e <strong>do</strong>s afro-equatorianos, que sintetiza a colonialidade <strong>do</strong> poder.33livro.pmd 3326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAUma posição de “desprezo e humilhação, ou seja, os sentimentos quesublimam e compensam um profun<strong>do</strong> temor social com respeito àpopulação subjugada” (Bonilla 1994, p. 282). Essa percepção eurocentristae prepotente <strong>do</strong> <strong>do</strong>minante sobre o <strong>do</strong>mina<strong>do</strong> “separou o mun<strong>do</strong>hispaniza<strong>do</strong> branco-mestiço <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> indígena”, conforme analisaMaiguashca, que identificou um problema ainda não resolvi<strong>do</strong>: “Osindígenas podiam pertencer ao novo organismo social sempre e quan<strong>do</strong>cruzassem essa fronteira <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> hispaniza<strong>do</strong>, e se identificassem comele. De outro mo<strong>do</strong> não só seriam excluí<strong>do</strong>s mas, por constituirem o‘outro”, ou seja, os que não podiam nem deviam ser assimiláveis,precisavam ser extintos” (Maiguashca 1992, p. 187). Uma percepção quede várias formas se projeta ao longo de toda a <strong>história</strong> republicana.E se as classes proprietárias buscavam o apoio popular “não era emfunção de um projeto solidário, mas como manipulação, com a promessapaternal e incerta de felicidade futura.” Seguin<strong>do</strong> a reflexão de Bonilla nocaso <strong>do</strong> Peru, nada havia no Equa<strong>do</strong>r que pudesse ligar um comerciantede Guayaquil ou um latifundiário de Quito com “um índio mergulha<strong>do</strong>na miséria: nem sua <strong>história</strong>, nem seus valores, nem seus ideais” (Bonilla1994, p. 282-3).Esses diferentes eixos da “questão regional” explicam em grandeparte a atual ordem fragmentada e polarizada, carente de uma verdadeiraidentidade nacional, de um Esta<strong>do</strong> vigoroso e de um projeto que somassede forma construtiva todas as diferenças regionais mencionadas; que, emsuma, desse ao país a potência da sua diversidade.A fazenda como um eixo da acumulaçãoHá outro elemento importante relaciona<strong>do</strong> com a existência paralelae até mesmo inter-relacionada de diversas relações de produção, quecombinava ou pelo menos permitia a convivência das práticas coloniaiscom práticas indígenas. A maioria da população, sobretu<strong>do</strong> os camponesesindígenas, estava presa à terra pelo chama<strong>do</strong> concertaje — um sistema34livro.pmd 3426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORcomplexo e perverso de endividamento eterno. Outros grupos dependiamda pequena propriedade agrícola e de diversas formas de relação précapitalistaconhecidas como precária, as quais se projetaram até a segundametade <strong>do</strong> século XX: hasipungueros, yanaperos, arrendatários, parceiros,partidários, huasicamas. Na Costa e em algumas zonas da Serra não faltaramnúcleos de escravos, que só iriam conseguir sua libertação (em troca deindenização aos <strong>do</strong>nos) em 1851, durante o governo <strong>do</strong> General JoséMaría Urbina. E as cidades se concentravam artesãos e pequenoscomerciantes, assim como a cúpula das classes proprietárias: latifundiários,sacer<strong>do</strong>tes, militares e burocratas.Como se manifestou inicialmente, com a constituição da República,desapareceram os restos das obrajes e foram limitadas todas as possibilidadesde consolidar os débeis esforços industriais e mineiros que havia até então,constituin<strong>do</strong> a agricultura o eixo da acumulação. Mas é preciso diferenciara unidade agrícola serrana da costeira.Na Serra, os latifundiários desenvolveram um sistema de concertajepara reter a força de trabalho, o qual tinha origem em uma determinaçãoreal de 1601, que permitia aos índios negociar “livremente” o seu trabalhopor semana ou por dia. Com o tempo, os índios sem terras assumiramrelações praticamente vitalícias, que terminavam por envolver toda asua família em trabalho na lavoura ou no serviço <strong>do</strong>méstico <strong>do</strong>slatifundiários.Pelo usofruto de um pedaço de terra, e “aprisiona<strong>do</strong>s pelas dívidas”geradas pelos chama<strong>do</strong>s supli<strong>do</strong>s (adiantamentos), necessários para mantera sua precária existência, importantes grupos indígenas da Serra se virampresos pelo concertaje, que na realidade era uma forma de escravidão. Tantoassim que na Assembléia Constituinte de 1896 Eloy Alfaro referiu-se aosíndios sob concertaje como “escravos dissimula<strong>do</strong>s”. De fato, tratava-se deum relacionamento basea<strong>do</strong> em extrema exploração, que só foi suprimi<strong>do</strong>em 1918.Era uma situação que empobreceu os índios mas não os proletarizou,de mo<strong>do</strong> que essa massa de indígenas pobres e sem raízes terminaram35livro.pmd 3526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAreunin<strong>do</strong>-se nas fazendas da Serra ou emigran<strong>do</strong> para a Costa, que osatraía devi<strong>do</strong> ao apogeu da produção cacaueira. Começou assim a aparecernessa época a tensão pelo controle da força de trabalho, que se manteriapor toda a vida republicana.Especialmente os grandes latifúndios da Costa começaram a exigiruma participação crescente de mão de obra barata, obtida graças aos níveisda precariedade e de exploração <strong>do</strong> tipo colonial que persistiam na Serra.Essa tensão alcançaria maior profundidade com as disputas pela criaçãode esquemas protecionistas para a produção têxtil serrana, que se chocavamfrontalmente com os interesses comerciais de Guayaquil, especialmentedas casas importa<strong>do</strong>ras.Enquanto a fazenda serrana se sustentava com um sistema deexploração de estilo colonial, na Costa consolidava-se a grande propriedade,concentrada em poucas famílias (Aspiazu, Seminario, Puga, Burgos, Cerro,Morla, Parodi, Madiniyá, Rosales), base para a extração não capitalista darenda em mãos das classes proprietárias costeñas ligadas à exportação decacau. “Ao monopolizar a terra apropriada para produzir o cacau, ou paraoutras atividades agro-pecuárias, o planta<strong>do</strong>r, fazendeiro “moderno”,obrigou ao mesmo tempo o camponês sem terras e o imigrante serranoou de Manabi a vender sua força de trabalho. Essa grande propriedade e aconcentração em poucas famílias proprietárias foram “o vínculo utiliza<strong>do</strong>pela acumulação original para expropriar o trabalha<strong>do</strong>r rural, e também abase espacial sobre a qual se desenvolveu a produção cacaueira” (Chiriboga1980, p. 176-8).Este processo maciço de exploração <strong>do</strong> trabalho, para sustentar aprodução de cacau, não levou à formação de um proletaria<strong>do</strong>, crian<strong>do</strong>“uma matriz local de acumulação capitalista determinada pela produçãonão capitalista de renda e pela divisão de trabalho <strong>do</strong> capitalismo mundial.O desenvolvimento capitalista no mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> século XIX impôs ao Equa<strong>do</strong>ressa matriz neo-colonial que levou a um desenvolvimento capitalistabloquea<strong>do</strong>, carente de autonomia na formação social.” Conforme afirmacom muita razão Andrés Guerrero (1980, p. 93-4), esta é a “raiz profunda”36livro.pmd 3626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR<strong>do</strong> que se definiu como sub-desenvolvimento.Parece importante insistir neste fenômeno descrito por Guerrero,que permitiu a existência de uma forma de produção que não conduziuao proletaria<strong>do</strong> “mas a uma modalidade de estrutura camponesa (...) cujareprodução se insere igualmente, em certa medida, nas relações decirculação e distribuição capitalistas.” Essa “reprodução ampliada <strong>do</strong>processo de produção da fazenda de cacau” não exigiu um processo deacumulação de capital como mecanismo de incorporação <strong>do</strong> progressoendógeno, mas baseou-se de um la<strong>do</strong> na extensão da cultura cacaueira, deoutro na sujeição à grande propriedade de um número maior de gruposcamponeses da Costa, ou indígenas da Serra. O que se percebe na formade trabalho <strong>do</strong> semea<strong>do</strong>r (o camponês encarrega<strong>do</strong> de plantar os pés decacau e de cuidar deles até que pudessem ser explora<strong>do</strong>s pelo fazendeiro)é que representa uma forma de inversão não capitalista. Em alguns casos,essa fazendas ampliaram sua extensão aproprian<strong>do</strong>-se das terras <strong>do</strong>scamponeses <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>s pelos latifundiários. Assim, o que houve foi umaexploração e não uma proletarização (Guerrrero 1980, p. 44-8).“Esta situação aparentemente para<strong>do</strong>xal se explica porque arealização da mais-valia, como a captação <strong>do</strong>s excedentes, são funçõesque o capitalismo pode desempenhar independentemente <strong>do</strong>s mo<strong>do</strong>s deprodução com que se articule. Para isso basta a ampliação da produçãomercantil e uma monetarização mais ampla da economia”, como odemonstrou Heraclio Bonilla no caso <strong>do</strong> Peru. Anos mais tarde, devi<strong>do</strong>às “novas necessidades de acumulação <strong>do</strong> capitalismo internacional[tornou-se] indispensável estabelecer relações capitalistas e de produçãonas áreas periféricas” (Bonilla 1994, p. 280) Em suma, para a inserção nomerca<strong>do</strong> mundial não foi necessário alterar as estruturas coloniais enquantoo capital internacional não emitiu sinais nesse senti<strong>do</strong>.Isso explica também “a natureza ambígua” (Guerrero 1980, p. 47)<strong>do</strong>s grupos <strong>do</strong>minantes que surgiram na Costa equatoriana, semelhante àde outros países da América Latina. Nasceu uma burguesia intermediáriaem suas relações com o exterior, exporta<strong>do</strong>ra e importa<strong>do</strong>ra, produzin<strong>do</strong>37livro.pmd 3726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAcacau para os merca<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s países centrais e consumin<strong>do</strong> bens delesimporta<strong>do</strong>s. Uma classe “rentista e parasitária” que não podia ser a basepara uma burguesia “nacional” que reivindicasse <strong>econômica</strong> e politicamenteos seus interesses em função de um capitalismo mais autônomo.Paralelamente, os fazendeiros e banqueiros exporta<strong>do</strong>res de cacau,inclusive os comerciantes, instituíram uma relação orgânica que explicavareciprocamente a sua existência. Nesse cenário emergiu o que Guerrerodefine como “oligarquia agro-financeira-comercial (exporta<strong>do</strong>ra eimporta<strong>do</strong>ra)”, ou seja, “um pequeno grupo de famílias forma<strong>do</strong> pelanata da burguesia e a classe latifundiária, cujos sobrenomes aparecemrepetidamente em várias instituições financeiras, em empresas, fábricas etambém nas mais diferentes instituições, como a Câmara de Comércio, aJunta de Beneficência, a Sociedade Filantrópica <strong>do</strong> Guayas ou a Câmarade Guayaquil” (Guerrero 1980, p. 82-3), situação que se mantém até hojecom características semelhantes.Desse sistema de interesses agrícolas, comerciais e bancáriosconsolida<strong>do</strong>s por uniões pessoais e familiares surgiram os poderososgrupos financeiros que determinaram a vida <strong>econômica</strong> e mesmo sociopolítica<strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r republicano.No entanto, diga-se claramente, esses grupos financeiros não podemser confundi<strong>do</strong>s simplesmente com um certo padrão de financiamentoou com o sistema financeiro e bancário propriamente dito. O que nosinteressa aqui é compreender a natureza e a dinâmica desses grupos (nostermos em que Ru<strong>do</strong>lf Hilferding os entendia em 1910 como capitalfinanceiro) que se caracterizam pelo mo<strong>do</strong> de controle de amplossegmentos combina<strong>do</strong>s da economia. Ou seja, o méto<strong>do</strong> para obterfinanciamento e consolidar naturalmente o seu poder de monopólio.Por outro la<strong>do</strong>, também não se deve perder de vista que esses gruposse desenvolveram e enriqueceram com base nas complexas relaçõescomerciais com o merca<strong>do</strong> mundial e com a presença <strong>do</strong> capital financeirointernacional (investimentos produtivos ou créditos externos); por isso asua evolução e influência não podem ser entendidas de forma mecânica38livro.pmd 3826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORou linear, e menos ainda como um problema exclusivamente local.Deste mo<strong>do</strong>, levan<strong>do</strong> em conta todas as condições mencionadas, épossível compreender mais facilmente as dificuldades inerentes a essa etapade criação da República, em um território fragmenta<strong>do</strong> e desintegra<strong>do</strong>pelos problemas econômicos e pelo próprio esforço independentista, alémde assola<strong>do</strong> por uma série de incursões de piratas. Christiana Borhart deMoreno assinala, ao destacar a participação feminina (tradicionalmenteignorada) que “sua grande capacidade de adaptação lhe permitia enfrentarcircunstâncias adversas”. Essa capacidade de resposta e de resistência,desenvolvida na sociedade colonial, tornou possível a cristalização de umprojeto quase inviável: a República independente <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r.Definitivamente, conforme já observamos, a oligarquia conquistoue chegou a ampliar os privilégios <strong>do</strong> modelo colonial naquela oportunidade,e já sem qualquer interferência da Coroa espanhola no referente à “proteção<strong>do</strong>s índios” e <strong>do</strong>s outros grupos <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>s, especialmente de negros emestiços. Não devemos esquecer que no longo perío<strong>do</strong> colonial apopulação indígena demonstrou, além de tu<strong>do</strong>, uma extraordináriacapacidade de “interiorizar, na defesa <strong>do</strong>s seus interesses, a legislaçãoimposta pelo adversário”, como lembra Heraclio Bonilla. Na apresentaçãode um livro sobre esse tema o autor salienta, com respeito ao caso equatoriano, “a flexibilidade <strong>do</strong> sistema colonial para absorver as suastensões e assim impedir rupturas abruptas. Uma dessas instituições foiprecisamente o ‘protetor <strong>do</strong>s naturais’, função confiada a princípio aosfrades, com a noção que comparava os indígenas aos menores de idade,requeren<strong>do</strong> assim ‘proteção’ por parte das autoridades.”Como aconteceu muitas vezes na <strong>história</strong> republicana, esses grupos<strong>do</strong>minantes não conseguiram nem pretenderam articular um modelonacional que lhes permitisse, por exemplo, promover conscientementeum modelo de inserção no merca<strong>do</strong> mundial, auto-centra<strong>do</strong> inicialmenteno merca<strong>do</strong> interno. Além disso, não havia uma total coincidência deinteresses por parte das forças latifundiárias serranas, apoiadas ideológica,política e até economicamente pela Igreja, e as classes proprietárias da39livro.pmd 3926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTACosta. Manten<strong>do</strong> relações entre si, pelas necessidades de acumulação <strong>do</strong>capital e o abastecimento de mão de obra, essas forças mantiveram suahegemonia na primeira fase republicana, que era instrumentada pelomilitarismo, herdeiro das ações bélicas da Independência.Portanto, “a República nascente surgiu apoiada na base da exploração<strong>econômica</strong>, social e étnica <strong>do</strong>s indígenas” (Ayala 1993, p. 70). A manutenção<strong>do</strong> tributo pago pelos índios representou a continuação <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio colonial,através da estrutura impositiva. As invasões abertas de terras e os novosmecanismos destina<strong>do</strong>s a submeter os índios aos fazendeiros, por parte <strong>do</strong>s“caciques” latifundiários da Serra, foram instrumentos que facilitaram aacumulação original. Uma situação que aprofun<strong>do</strong>u as diferenças<strong>econômica</strong>s, sociais e até mesmo culturais existentes nos dias da Colônia, eque provocou vários levantes indígenas, reprimi<strong>do</strong>s de forma sangrenta.A lenta configuraçao <strong>do</strong> modelo agro-exporta<strong>do</strong>rA maioria <strong>do</strong>s habitantes da República nascente viviam na região daSerra. Segun<strong>do</strong> estimativas referentes a 1825, isto é, cinco anos antes daseparação da Grã Colômbia, no Departamento <strong>do</strong> Sul ou de Quito haviaumas 488 mil pessoas, das quais 82% nas terras altas. Em 1840, quan<strong>do</strong> aRepública tinha completa<strong>do</strong> os dez primeiros anos de existência, suapopulação era de cerca de 617 mil pessoas, das quais 85% na Serra; e em1858, <strong>do</strong>s 747 mil habitantes <strong>do</strong> país, ainda 82% ocupavam aquela região.Essa concentração mudaria paulatinamente com a crescente integração daeconomia nacional no merca<strong>do</strong> mundial, sustentada por plantações eatividades comerciais, além de manufaturas, que se iam localizan<strong>do</strong> na Costa.Já nesse primeiro perío<strong>do</strong> da vida <strong>econômica</strong> republicana seconsolidaram as bases <strong>do</strong> modelo de acumulação primária exporta<strong>do</strong>ra,próprio <strong>do</strong>s países periféricos, caracteriza<strong>do</strong> pela combinação daexportação de recursos naturais e a importação de insumos e algumasmáquinas, além de objetos de luxo destina<strong>do</strong>s aos setores da aliançaoligárquica.40livro.pmd 4026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORNas primeiras décadas da sua existência como República o Equa<strong>do</strong>rcriou as bases que iriam convertê-lo no principal supri<strong>do</strong>r de cacau emnível mundial, especialmente para o merca<strong>do</strong> da Inglaterra, potência<strong>do</strong>minante cuja expansão <strong>econômica</strong> melhorou o nível de renda <strong>do</strong>s seushabitantes, estimulan<strong>do</strong> a demanda de produtos importa<strong>do</strong>s.Nesses anos, já sem o estorvo representa<strong>do</strong> pelo Império espanhol,os ingleses começaram a firmar sua presença comercial, garantin<strong>do</strong> a livrenavegação marítima e fluvial para ter acesso aos merca<strong>do</strong>s e negocian<strong>do</strong> aimposição da cláusula de nação mais favorecida para aproveitar todas asvantagens comerciais que permitissem a exploração das riquezas das novasrepúblicas latino-americanas.Embora ainda não tivesse defini<strong>do</strong> a fragmentada economiaequatoriana, essa situação consoli<strong>do</strong>u as bases para a sua crescente inserçãona divisão internacional de trabalho como supri<strong>do</strong>ra de matérias primas, eparticularmente de alimentos, que foram por muitas décadas o motor <strong>do</strong>seu crescimento econômico.Esta relação de produtor e exporta<strong>do</strong>r de bens primários sereproduziu em to<strong>do</strong>s os países da América Latina, assim como em outrasregiões <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> dependente. Foi uma relação que permitiu reduzir oscustos da industrialização <strong>do</strong>s países centrais, mediante a importação apreços baixos de alimentos para a massa crescente de trabalha<strong>do</strong>resemprega<strong>do</strong>s na indústria e de insumos para as suas fábricas.Devi<strong>do</strong> aos reduzi<strong>do</strong>s efeitos multiplica<strong>do</strong>res e aos limita<strong>do</strong>scruzamentos produtivos para trás e para frente, esta forma de inserção nomerca<strong>do</strong> mundial criou economias de “enclave”, produzin<strong>do</strong> poucos vínculosentre as diversas regiões <strong>do</strong> país. Nesse perío<strong>do</strong>, o setor pré-capitalistaforneceu alguns produtos manufatura<strong>do</strong>s baratos, especialmente têxteis ealimentos processa<strong>do</strong>s, para os trabalha<strong>do</strong>res <strong>do</strong> setor de exportação primária.No entanto, a forma passiva de participar no merca<strong>do</strong> internacional provocouo desmantelamento de várias atividades manufatureiras e artesanais,desenvolvidas à sombra <strong>do</strong> sistema monopolístico de controle <strong>do</strong> comércioexterior por parte <strong>do</strong> Império espanhol.41livro.pmd 4126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAForam anos de uma incipiente economia exporta<strong>do</strong>ra, com poucavinculação entre as diferentes regiões naturais <strong>do</strong> país e reduzida pressão fiscal.Desta forma, o Esta<strong>do</strong> político, mais <strong>do</strong> que o econômico, foi osustentáculo da débil relação prevalecente em uma economia fragmentada,e da relativa integração das diferentes formações sociais regionais. Alémdisso, os poucos recursos que ingressavam no tesouro fiscal, procedentessobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong> tributo indígena, <strong>do</strong>s monopólios, dízimos e da dívida interna,assim como das alfândegas, se destinavam a manter o clero e uma onerosaforça militar. A estrutura burocrática era ainda incipiente, embora carapara a época.Merece menção especial o problema da dívida interna produzidapela penúria fiscal, e que representaria “uma alavanca para o enriquecimentoe aumento <strong>do</strong> poder <strong>do</strong>s comerciantes de Guayaquil”. Esse mecanismode financiamento fiscal foi não só o caminho “mais fácil de enriquecimentopara os comerciantes agiotas”, mas conspirou contra o fortalecimento <strong>do</strong>Esta<strong>do</strong>, “pois seu maior endividamento tinha uma relação direta com omaior enriquecimento priva<strong>do</strong>, e finalmente com uma maior dependência<strong>econômica</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, enquanto representante <strong>do</strong>s interesses gerais, emcontraste com os grupos particulares possui<strong>do</strong>res de dinheiro” (Vega 1991,p. 32-3). Assim, esta situação, que passou a ser um círculo vicioso, pesoupermanentemente na economia equatoriana, em particular nas suasfinanças públicas, que, como analisa Sílvia Vega, desde as suas origensdependeram de interesses particulares poderosos, a princípio decomerciantes, depois de banqueiros que, direta ou indiretamente, influíramna vida política <strong>do</strong> país. Situação que, no dizer de Sílvia Vega, demonstrariapara<strong>do</strong>xalmente a existência <strong>do</strong> “projeto nacional” <strong>do</strong>s setores <strong>do</strong>minantesno início da República (Vega 1991, p. 66).Da mesma forma, já nessa primeira etapa da vida <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r surgemcontradições, devi<strong>do</strong> às pretensões protecionistas <strong>do</strong>s latifundiáriosserranos, proprietários da indústria de têxteis e bebidas destiladas, quedepois beneficiariam indiretamente os comerciantes de Guayaquil. Noentanto, essas contradições irão sen<strong>do</strong> resolvidas ou acomodadas através42livro.pmd 4226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORde múltiplas inter-relações e acor<strong>do</strong>s mais ou menos formais: uma mostraconvincente da habilidade das classes proprietárias da Serra e da Costaem conciliar seus interesses. A proibição <strong>do</strong> ingresso de alguns produtos(teci<strong>do</strong>s, telas, bebidas destiladas, charutos, por exemplo), em favor dasmanufaturas serranas, não afetava o ingresso desses mesmos produtospelo porto de Guayaquil. Além disso, os comerciantes daquela cidade foramcompensa<strong>do</strong>s com a supressão ou redução de alguns impostos. Essasituação privilegiada <strong>do</strong> principal porto equatoriano explica também asrazões pelas quais seus representantes se opunham à abertura de outrosportos no litoral <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r (Vega 1991, p. 38).Em to<strong>do</strong>s esses anos, a errática política <strong>econômica</strong> foipreponderantemente liberal ou livre-cambista. A abertura às importaçõesdas economias centrais, já sem o controle colonial e sem que se tivesseformula<strong>do</strong> uma proposta nacional de desenvolvimento, foi na práticageneralizada: o tipo de câmbio e as taxas de juros flutuarão livremente, apolítica monetária reagiu às transações necessárias da economia (comperío<strong>do</strong>s de vigência <strong>do</strong> padrão ouro ou bimetálico ouro-prata) emconcordância com a teoria quantitativa da moeda. To<strong>do</strong>s os outros preços,desde os <strong>do</strong> crédito até os vigentes nos merca<strong>do</strong>s de bens e serviços, seregeram pelo esquema livre-cambista próprio de uma estrutura oligárquica,ou seja, autoritária e excludente. O preço da mão de obra dependia dasrelações de produção capitalistas e mais ainda pré-capitalistas, a que estavasujeita a maioria da população.Consolidação <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> oligárquicoNo fim <strong>do</strong>s anos 1850 essa escassa vinculação nacional <strong>do</strong>sprimeiros anos da República quase leva à ruptura <strong>do</strong> país. Em 1859 aestrutura estatal se fragmentou em quatro governos: Quito (um triunviratolidera<strong>do</strong> por García Moreno), Guayaquil (General Guillermo Franco),Cuenca (Jerónimo Carrión) e Loja (Manuel Carrión Pinzano, Chefe civil emilitar <strong>do</strong> Distrito Federal lojano). O país se encontrava à beira <strong>do</strong> abismo,43livro.pmd 4326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAsoman<strong>do</strong>-se a essa divisão interna as pretensões territoriais <strong>do</strong>s paísesvizinhos.A situação mu<strong>do</strong>u quan<strong>do</strong> o Esta<strong>do</strong> consoli<strong>do</strong>u seu poder no nívelnacional. Para isso foi importante a influência de Gabriel García Moreno,entre 1860 e 1875. Este personagem, que a princípio teve uma atuaçãoobscura na crise de 1859, ao firmar um pacto com Ramón Castilla,Presidente <strong>do</strong> Peru, aglutinou em termos históricos os principais interessesdas classes proprietárias e impulsionou a unidade nacional em torno davinculação definitiva da economia com o merca<strong>do</strong> mundial.Não obstante, esta vinculação não eliminou as contradições entre aoligarquia latifundiária apoiada pela Igreja Católica, que lutava porconservar o seu poder, e as crescentes pretensões hegemônicas <strong>do</strong>s grandesexporta<strong>do</strong>res, banqueiros e comerciantes. E também não implicou odesaparecimento das relações de produção pré-capitalistas, com distintascaracterísticas regionais.Foi uma época de modernização institucional <strong>do</strong> aparato financeiro,com a criação de bancos e caixas de poupança. Pela sua importância deveser destacada a instituição <strong>do</strong> Banco <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, em 1868, um ano antesde começar o endividamento <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> com os bancos particulares:processo cada vez mais rápi<strong>do</strong>, que marcaria profundamente a economianacional, pelo menos até 1925. Nesse momento surge o “capital financeirocomercial” (Guerrero 1980, p. 62), que abrangia banqueiros individuais ebanqueiros exporta<strong>do</strong>res, assim como comerciantes volta<strong>do</strong>s para aimportação.Para compreender as complexas vinculações <strong>do</strong> pequeno grupo de“<strong>do</strong>nos <strong>do</strong> país” é preciso lembrar que em 1873 os mesmos sócios e amigos<strong>do</strong> Banco <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r estabeleceram o Banco de Crédito Hipotecário eformaram a Companhia Nacional de Vapores Guayas. Eram as mesmaspessoas que já haviam apoia<strong>do</strong> em 1859-1860 a organização da CasaLuzárraga. “A Casa”, como era conhecida, foi dirigida por Manuel Antoniode Luzárraga, que durante muito tempo foi o único importa<strong>do</strong>r eexporta<strong>do</strong>r, além de comerciante, arma<strong>do</strong>r e banqueiro. Suas finanças44livro.pmd 4426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORalimentavam a agricultura e também a fazenda pública, e essa entidade foiautorizada a emitir notas (o chama<strong>do</strong> “peso feble” de oito reais, comounidade monetária), com lastro bi-metálico, respalda<strong>do</strong> por ouro e prata.Durante a época <strong>do</strong> Presidente Gabriel García Moreno foram cria<strong>do</strong>soutros bancos: em 1862 o Banco Particular de Descontos e Circulação;em Cuenca as Caixas de Poupança e Crédito e em Quito o Banco deQuito (em 1868); anos mais tarde, em 1885, abriu suas portas um segun<strong>do</strong>banco emissor, o Banco Internacional, <strong>do</strong> qual surgiria o influente BancoComercial e Agrícola (em 1894). Nas duas décadas seguintes surgiriamoutros bancos importantes: o Banco de Pichincha (1906), a Caixa deEmpréstimos e Depósitos A Filantropia, criada em 1908 para promover apoupança e apoiar a formação de oficinas artesanais (o nome mu<strong>do</strong>u em1939 para A Filantrópica e em 1976 para Filanbanco) e em 1913 o Banco<strong>do</strong> Azuay.A primeira Lei Bancária data de 1871, e seguiram-se outras leis, em1878 e 1897. Vale lembrar que a situação bancária e monetária devia sercomplexa, pois só em 1884 passou a haver uma moeda nacionalpropriamente dita; até então, inexistia um instituto emissor <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, ecabia ao sistema bancário priva<strong>do</strong> emitir dinheiro.O Banco <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, que chegaria a ser o banco mais importante<strong>do</strong> século XIX, foi o eixo <strong>do</strong> processo de modernização no campofinanceiro e mercantil na época de García Moreno. Perío<strong>do</strong> de apogeuque tornou possível o aumento das receitas fiscais, devi<strong>do</strong> também àcobrança mais intensa, com a introdução de um novo sistema decontabilidade que melhorou o controle de cada uma das rendas, e tambémgraças à luta contra a evasão. Assim, no segun<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> presidencial deGarcia Moreno o Esta<strong>do</strong> conseguiu duplicar a arrecadação fiscal.Na mesma época começou a construção de importantes obraspúblicas, assim como de vias de comunicação que dinamizaram o comércio,a agricultura e a artesania, permitin<strong>do</strong> também uma maior coesão<strong>econômica</strong> e administrativa <strong>do</strong> país. O Equa<strong>do</strong>r não só melhorou suascomunicações e organização como registrou além disso uma elevação45livro.pmd 4526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAapreciável <strong>do</strong>s níveis de educação, com a criação da Escola Politécnica e achegada de notáveis professores europeus, especialmente alemães. Foramanos de mudanças profundas, no meio de duras condições de repressão,sustentadas por uma ideologia centraliza<strong>do</strong>ra e teocrática, que procuravadisciplinar a sociedade.As bases para o posterior apogeu cacaueiroA expansão <strong>econômica</strong> de fins <strong>do</strong> século XIX não teria si<strong>do</strong> possívelsem as exportações de cacau, que começaram a crescer de mo<strong>do</strong> significativona década de 1860, fazen<strong>do</strong> com que seu montante total superasse pelaprimeira vez a cifra de cinco milhões de dólares em 1866. A recuperaçãoexperimentada desde então sofreria um severo retrocesso em 1873, emconseqüência da crise internacional. Além disso, entre as exportaçõessurgiram outros produtos primários: marfim vegetal, café, couros e borracha.Como dissemos, a demanda de cacau e de outros produtos tropicaisno merca<strong>do</strong> mundial foi possível devi<strong>do</strong> ao aumento da renda de amplossetores da população da Europa, e mais tarde <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. Esseaumento da demanda pôde ser atendi<strong>do</strong> graças às condições naturaispropícias a essas produções, assim como pela disponibilidade de mão deobra barata, especialmente a procedente da Serra. Por outro la<strong>do</strong>, ofornecimento de alimentos também baratos nos locais da produçãocacaueira e nas cidades litorâneas favoreceu muito essas atividades —conjuntura aproveitada pelas classes proprietárias da Costa.Não se pode deixar de registrar porém a vulnerabilidade daeconomia, devi<strong>do</strong> a esta forma de participação no merca<strong>do</strong> mundial. Aprodução extensiva de cacau, apoiada na mão de obra barata e semexigências importantes de capital, não representava um esforço maior emtermos de tecnologia e produtividade. Por outro la<strong>do</strong>, a riqueza <strong>do</strong> solo ea qualidade <strong>do</strong> produto garantiram ao Equa<strong>do</strong>r uma posição preponderanteem nível internacional, mas limitaram por sua vez uma inter-relaçãodinâmica com o resto da economia.46livro.pmd 4626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORDe qualquer forma, essa realidade vivida por peões assalaria<strong>do</strong>s esemea<strong>do</strong>res em condições pré-capitalistas facilitou a geração de umimportante diferencial de renda, que pela sua forma de geração edistribuição — <strong>do</strong>is elementos inseparáveis <strong>do</strong> processo produtivo —obrigou à concentração da riqueza em poucas mãos, impedin<strong>do</strong> assim seuaproveitamento no quadro de um processo de dinamização e modernizaçãoda economia.Muitas vezes “a posse de recursos naturais abundantes ediversifica<strong>do</strong>s tem si<strong>do</strong> considerada uma bênção. No entanto,historicamente, em matéria de comércio exterior os países ricos em recursosnaturais (matérias primas), em comparação com os que não as têm emabundância, geralmente sucumbem (ou são força<strong>do</strong>s) a uma especializaçãoprodutiva interna desigual, precisamente pelas grandes riquezas naturaisde que estão <strong>do</strong>ta<strong>do</strong>s”, lembra Jürgen Schuldt (1994b, p. 44). É justamenteo caso <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r.O peso insuportável da renda diferencial gera uma série de efeitosperniciosos nas estruturas <strong>econômica</strong>s e sociais, “configuran<strong>do</strong> relaçõessociais verticais e uma estrutura de comunicação política quepara<strong>do</strong>xalmente impede que os conflitos sociais (institucionaliza<strong>do</strong>s) levema um crescimento econômico sustenta<strong>do</strong> e a um progresso técnicoimpulsiona<strong>do</strong> de forma endógena” (Schuldt), enquanto asheterogeneidades sociais e <strong>econômica</strong>s se consolidam.Esta realidade tem como reflexo o pouco interesse em investir nomerca<strong>do</strong> interno, o que resulta, além de tu<strong>do</strong>, em uma integração limitadaentre a produção nacional e o setor exporta<strong>do</strong>r. Não existem incentivosque permitam o desenvolvimento e a diversificação da produção interna,vinculan<strong>do</strong>-a aos processos exporta<strong>do</strong>res, nos quais os recursos naturaisdeveriam transformar-se em bens de maior valor agrega<strong>do</strong>.Assim, isso explicaria “a tragédia contraditória <strong>do</strong>s países ricos emmatérias primas, nos quais, na prática, a massa da população estáempobrecida.” O que se pode explicar pelo relativamente fácil que éaproveitar-se da natureza generosa e da mão de obra barata.47livro.pmd 4726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAA isso se soma a concentração maciça dessas rendas em poucosgrupos oligopolizantes, que não encontravam incentivos para investir naeconomia interna e que, como aconteceu especialmente na época <strong>do</strong> cacau,guardaram fora <strong>do</strong> país o que ganhavam com a exportação, e consumiambens importa<strong>do</strong>s. Não se sentem estimula<strong>do</strong>s a investir sua renda naspróprias atividades exporta<strong>do</strong>ras, pois sua vantagem comparativa está narenda da natureza e não no esforço inova<strong>do</strong>r <strong>do</strong> ser humano, pois oemprego da mão de obra mal paga é muito pouco intensivo. Sua reaçãofoi expandir a fronteira agrícola, provocan<strong>do</strong> maior concentração da terrae da renda. A expansão das plantações de cacau foi favorecida pela perda<strong>do</strong>s controles ideológicos <strong>do</strong>s fazendeiros serranos e pela abolição daconcertaje em 1918, que provocaram uma utilização cada vez mais intensada mão de obra barata existente na Serra.Schuldt recorda que “a miséria de grandes massas da populaçãopareceria ser, portanto, consubstancial à presença de grandes quantidadesde recursos naturais (outra vez, com alto diferencial de renda). Esse modelode acumulação não exige merca<strong>do</strong> interno, e na verdade funciona comsalários decrescentes. Não há pressão social que obrigue a reinvestir emmelhoria da produtividade. O próprio beneficiário da renda determina aatividade produtiva e certamente as outras relações sociais.”Esse diferencial de renda, que desestimula o progresso e as inovaçõestecnológicas, explica, por outro la<strong>do</strong>, grande parte <strong>do</strong>s sucessoseconômicos, em função da sua realização no merca<strong>do</strong> mundial.“O valor de retorno gera<strong>do</strong> pelo cacau (pelo seu diferencial de renda)para a economia equatoriana deve ter si<strong>do</strong> considerável, ten<strong>do</strong> em vista ainsignificância <strong>do</strong> capital estrangeiro aplica<strong>do</strong> à produção e comercialização<strong>do</strong> produto, embora sua distribuição fosse muito desigual, devi<strong>do</strong> à altaconcentração da propriedade e da comercialização” (Bonilla 1994, p. 307).Não obstante, “os laços estabeleci<strong>do</strong>s ao longo da circulação interna darenda cacaueira” – ponto fundamental para Heraclio Bonilla, contribuírampara configurar “setores muito modernos da economia, cujofuncionamento obedecia a claras regras capitalistas, e que no entanto48livro.pmd 4826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORestavam assenta<strong>do</strong>s em normas de produção pré-capitalistas não menosclaras.” Para o mesmo Bonilla, era um caso de “modernismo e arcaísmocombina<strong>do</strong>s de forma eficiente”. De maneira perversa o autor caracterizanão só esses anos da República mas outros perío<strong>do</strong>s também, nos quaissupostamente houve processos de modernização ...Com este tipo de produção, sem uma proposta que integrasse essasatividades de exportação primária ao resto da economia e da sociedade, oaparelho produtivo ficou sujeito às vicissitudes <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> mundial. Emespecial, ficou vulnerável à competição de outros países em condiçõessemelhantes, muitos <strong>do</strong>s quais eram colônias européias que procuravamsustentar sua renda sem preocupar-se muito com uma administração maisadequada <strong>do</strong>s preços. O que se manifestava com um incremento daprodução nos momentos de crise, com os resulta<strong>do</strong>s espera<strong>do</strong>s pelos paísescentrais: um maior fornecimento de matérias primas e alimentos a preçosmais baixos.Nesse cenário, o controle efetivo das exportações equatorianos estavanas mãos <strong>do</strong>s países centrais, mesmo quan<strong>do</strong> não se registravam inversõesestrangeiras importantes nas fazendas produtoras. A lógica dessa produção,motivada por demanda externa, incorporou o país ao merca<strong>do</strong> mundial,tardia e passivamente, atan<strong>do</strong>-o as flutuações <strong>do</strong> preço <strong>do</strong> cacau: pontosfundamentais para compreender o caráter periférico e dependente <strong>do</strong>capitalismo em países como o Equa<strong>do</strong>r.Em suma, em vez de propiciar um processo de acumulação de capitalpara desenvolver outras atividades produtivas, as rendas obtidas eram dirigidaspara o aumento da mesma produção rudimentar <strong>do</strong> cacau, ao financiamentodas importações suntuárias das elites e a avolumar a fuga de capitais.Os ganhos provenientes <strong>do</strong> cacau, relativamente fáceis, geraram talnível de rentabilidade que desestimularam a diversificação da estruturaprodutiva, que além de tu<strong>do</strong> não encontrava estímulos no pequeno merca<strong>do</strong>interno. Não havia uma transferência real <strong>do</strong>s exporta<strong>do</strong>res para osprodutores nacionais. Com efeito, não houve qualquer encadeamento ouvinculação que pudesse potencializar a prosperidade cacaueira. Em termos49livro.pmd 4926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAatuais dir-se-ia que não houve desenvolvimento <strong>do</strong>s conglomera<strong>do</strong>sprodutivos (clusters), como também não houve melhor distribuição da rendaou a receita fiscal necessária. Esse modelo de acumulação fortaleceu umesquema cultural de dependência, que por sua vez aprofun<strong>do</strong>u o caminhoda “abertura”.Décadas mais tarde, a consolidação desse modelo de desenvolvimentovolta<strong>do</strong> para fora, que seria impulsiona<strong>do</strong> decididamente pela RevoluçãoLiberal, encontraria sustentação nas mudanças havidas na época de GarciaMoreno. Foram anos em que aumentou de forma notável o poder <strong>do</strong>sfazendeiros e <strong>do</strong>s exporta<strong>do</strong>res de cacau, assim como <strong>do</strong>s banqueiros e<strong>do</strong>s comerciantes em geral.Um paralelismo da gestão alardeada pelos governos das duas figurasprincipais <strong>do</strong> conserva<strong>do</strong>rismo e <strong>do</strong> liberalismo permite reconhecersemelhanças no campo da economia, mas não no político. O modelopolítico de García Moreno difere <strong>do</strong> de Eloy Alfaro, figuras representativas<strong>do</strong> longo enfrentamento ideológico e religioso da época.As bases ideológicas <strong>do</strong> liberalismo contemplava como seus pontosfundamentais os chama<strong>do</strong>s “decretos de mãos mortas” para expropriar aIgreja latifundiária, para a supressão de alguns mosteiros e conventosconsidera<strong>do</strong>s como centros <strong>do</strong> poder ideológico conserva<strong>do</strong>r-clerical, aintrodução <strong>do</strong> ensino laico e estatal obrigatório, a liberação <strong>do</strong>s indígenase a abolição da concertaje, a secularização <strong>do</strong> clero e a abolição da Concordatacom o Vaticano. Em suma, o programa ideológico <strong>do</strong> liberalismo podiaser resumi<strong>do</strong> em larga medida no anti-clericalismo e no laicismo, paragolpear o centro <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio ideológico latifundiário, particularmente naSerra, que até o ano de 1895 manteve uma posição de hegemoniaideológica, embora não mais <strong>econômica</strong> (Moreano 1976, p. 143).Não obstante, em suas políticas <strong>econômica</strong>s visan<strong>do</strong> uma maior“abertura”, conserva<strong>do</strong>res e liberais não apresentavam grandes diferenças.Mais ainda: o liberalismo plutocrático voltaria a ajustar o “modelo”econômico ao interesse oligárquico. Conforme afirma Juan Paz y Miño,um <strong>do</strong>s maiores conhece<strong>do</strong>res dessa época, com a Revolução de Julho se50livro.pmd 5026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORiniciaria um processo de relativo comprometimento <strong>do</strong> poder oligárquicotradicional, ceden<strong>do</strong> lugar ao intervencionismo estatal (que continuaráem círculos, da esfera da “circulação” para a da “produção”),institucionalizan<strong>do</strong> no Esta<strong>do</strong> a “questão social”.Com a consolidação <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de García Moreno, extremamenterepressivo, não só se impôs a lei e a ordem como foi possível “romper ofracionamento da economia e permitir um fluxo mais livre <strong>do</strong>s fatores deprodução, para facilitar um certo crescimento econômico e um melhoraproveitamento das oportunidades oferecidas pela conjunturainternacional. Implicava, finalmente, em estabelecer mecanismos queassegurassem relações estáveis com os centros europeus, pólos dinâmicosda nova ordem internacional que definitivamente se consolidava” (Velasco1981, p. 137).Segun<strong>do</strong> Fernan<strong>do</strong> Velasco, destaca<strong>do</strong> intelectual faleci<strong>do</strong>prematuramente em 1978, “O papel desempenha<strong>do</strong> por García Morenoé absolutamente estratégico e fundamental, independentemente de quaistenham si<strong>do</strong> as suas intenções pessoais.” Ele organizou o país, “tornan<strong>do</strong>possível a consolidação definitiva, poucos anos mais tarde, <strong>do</strong> modelo dedesenvolvimento volta<strong>do</strong> para fora” (Velasco 1981, p. 142).Então, de forma paulatina, Guayaquil passou a ser o eixo agroexporta<strong>do</strong>re importa<strong>do</strong>r, que foi subordinan<strong>do</strong> a economia nacional àsexigências <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> mundial. E o setor agro-exporta<strong>do</strong>r se fortaleceu.As primeiras e inúteis renegociações da dívida externaPara conseguir sua independência da Espanha, os povos latinoamericanostiveram que adquirir equipamentos militares no exterior,com recursos contrata<strong>do</strong>s na Europa. Esses empréstimos eramconcedi<strong>do</strong>s por países como a Grã Bretanha, interessada em debilitara presença espanhola na América, situação para a qual não se conseguirao apoio <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, que se haviam torna<strong>do</strong> independentesem 1776.51livro.pmd 5126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTASegun<strong>do</strong> James Monroe, os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s “se encontravam empaz com a Espanha e, por ocasião da luta que ela mantém com suasdiferentes colônias, não podiam dar nenhum passo que comprometa asua neutralidade ...” (Ver em Pividal 1983, p. 55). Os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s nãosó se negaram a apoiar a emancipação das colônias <strong>do</strong> Sul <strong>do</strong> continentecomo procuraram atrasá-la, comprometen<strong>do</strong>-se a fazer fornecimentos aosespanhóis enquanto com o seu poder pudessem competir com o ImpérioBritânico. Já em 1781, Thomas Jefferson antecipou essa estratégia norteamericanaao dizer que “é necessário postergá-la [a emancipação] até queos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s possam beneficiar-se com ela, e não a Inglaterra”(Rodríguez Acosta s.d., p. 114). Deste mo<strong>do</strong>, o Presidente Jefferson edepois o Presidente James Madison subordinaram sua posição frente àscolônias espanholas a seus problemas com a Grã Bretanha, de cujo <strong>do</strong>míniose tinham liberta<strong>do</strong> em 1776.Isso explica claramente os motivos que causaram a demora dequase <strong>do</strong>ze anos no reconhecimento oficial <strong>do</strong>s primeirosrepresentantes da emancipação hispano-americana. Reconhecimentoque só aconteceu em março de 1822, embora a Junta Suprema deCaracas o tivesse solicita<strong>do</strong> em junho de 1810. Atitude que se refletiutambém na posição contrária à figura de Simón Bolívar, sobretu<strong>do</strong>quan<strong>do</strong> a Grã Colômbia já alcançara a sua independência, pois a suaexistência representava um obstáculo aos sonhos imperiais <strong>do</strong> vizinhosetentrional (Sobre estas relações complexas pode-se consultar Trías1975 e Medina Castro 1980).Nessas condições, a dívida então assumida, com a qual a Grã Colômbiase vinculou à economia mundial, transformou-se em um processo perniciosode renegociações e moratórias que perdurava no início <strong>do</strong> século XXI(consulte-se a <strong>história</strong> dessa “dívida eterna” em Acosta 1994).Já em 1826, quan<strong>do</strong> ainda existia o Esta<strong>do</strong> bolivariano, deixou-sede servir a dívida externa em conseqüência da quebra da casa B. A.Goldschmidt e Cia., na qual haviam si<strong>do</strong> deposita<strong>do</strong>s valores destina<strong>do</strong>s aesse pagamento.52livro.pmd 5226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORAnos depois, em outubro de 1834, pouco depois de o Equa<strong>do</strong>r seseparar da Grã Colômbia, o governo de Flores não enviou representanteà reunião celebrada em Bogotá para discutir os termos da divisão da dívida.O General Juan José Flores se encontrava envolvi<strong>do</strong> nas complicaçõesresultantes da repressão e homicídio <strong>do</strong>s redatores de El Quiteño Libre, eenfrentava além disso a revolta <strong>do</strong>s “chihuahuas”. Assim, sem qualquerparticipação de delega<strong>do</strong>s equatorianos, coube ao país assumir 21,5% dadívida total de 6.625.950 libras esterlinas, ou seja, 1.424.579 libras e 5shillings. Valor ratifica<strong>do</strong> em 1837 pelo Congresso Nacional e o governode Vicente Rocafuerte.Desde então, os contínuos ajustes e renegociações, e as múltiplassuspensões de pagamento, dada a escassez permanente de recursos financeirosprovocada pelo próprio serviço da dívida, e pelas condições impostas aosdeve<strong>do</strong>res, tornaram a dívida externa um escolho quase permanente na vida<strong>econômica</strong> e política <strong>do</strong> país. E a partir dessa época remota, os renegocia<strong>do</strong>resda dívida — tratada sempre de forma misteriosa e muitas vezes à margem daopinião pública — , salvo em raras ocasiões, foram insensíveis à busca desoluções que privilegiasse o interesse nacional em contraste com as pretensões<strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res ou aos seus próprios desejos, pon<strong>do</strong> em risco não só o crescimentoeconômico <strong>do</strong> país como a sua própria existência.Embora haja um compromisso de honra na origem da dívida inglesa,não se pode desconhecer as suas deficiências quanto ao destino final <strong>do</strong>srecursos contrata<strong>do</strong>s, as condições usurárias em que esses empréstimosforam negocia<strong>do</strong>s, os preços exagera<strong>do</strong>s pagos pelos equipamentosmilitares e a própria distribuição <strong>do</strong> ônus da dívida grã-colombiana.Ten<strong>do</strong> em vista as necessidades financeiras <strong>do</strong> país e as pressõesexercidas pelos cre<strong>do</strong>res, em 1843 a Convenção ordenou que essespagamentos fossem feitos com valores obti<strong>do</strong>s com a venda ouarrendamento de terras públicas baldias. O General Flores, eleito Presidentepela terceira vez, propôs um acor<strong>do</strong> que determinava o pagamento detaxa de juros adicional por um número determina<strong>do</strong> de colonos europeusque viessem povoar os territórios que se queria entregar aos cre<strong>do</strong>res.53livro.pmd 5326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAOs detentores desses títulos não aceitaram essa proposta, insistin<strong>do</strong>em taxas de juros mais elevadas e na emissão de bonds adicionais paracobrir os juros capitaliza<strong>do</strong>s, e com isso a negociação se entorpeceu. Oscre<strong>do</strong>res enviaram um negocia<strong>do</strong>r depois <strong>do</strong> outro para tentar um acor<strong>do</strong>:emissários que, ressalvadas a distância no tempo, lembram as missões <strong>do</strong>FMI e <strong>do</strong> Banco Mundial, da segunda metade <strong>do</strong> século XX. Esse empenho<strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res encontrou campo propício nos governantes, nos seusrepresentantes na negociação e até mesmo nos seus familiares, dispostosao peculato e ao tráfico de influência.Em 1848, sob a Presidência de Vicente Ramón Roca, com a maisabsoluta reserva o governo levou a cabo uma negociação com PedroConroy, o representante <strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res, para que a dívida fosse amortizadacom um oitavo <strong>do</strong>s direitos cobra<strong>do</strong>s pelas alfândegas. Tentou-se assimsurpreender o Congresso, procuran<strong>do</strong> evitar a sua intervenção, objetivoque não foi alcança<strong>do</strong>.Alguns anos mais tarde, em 1852, chegou ao país um novorepresentante <strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res, Elías Mocatta, que conseguiria um primeiroacor<strong>do</strong>, basea<strong>do</strong> na entrega de terras desocupadas — depois de mais devinte anos de moratória. Adicionalmente, foi paga a parte da receita públicacorrespondente às concessões mineiras e taxas de pedágio. Pouco depois,em novembro de 1854, venci<strong>do</strong> pela inteligência e a eloqüência <strong>do</strong> GeneralJosé María Urbina, o Congresso aprovou o convênio Espinel-Mocatta,como se não houvessem antecedentes.A concessão, para fins de colonização e exploração, de um milhãode quadras às margens <strong>do</strong> rio Zamora e de outro milhão às margens <strong>do</strong>Bomboná, na região de Canelos, motivou protesto <strong>do</strong> governo peruano,que reclamava como suas enormes extensões na Amazônia. O Perusustentou sua reivindicação com base na cédula real de 15 de julho de1802, e diante desse conflito limítrofe os cre<strong>do</strong>res suspenderam o acor<strong>do</strong>.As forças conserva<strong>do</strong>ras se aproveitaram da situação e encetaramuma luta feroz contra o Presidente Francisco Robles. Como já dissemos,García Moreno aliou-se com o mandatário peruano, Marechal Ramón54livro.pmd 5426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORCastilla, com quem retornou ao país. A armada peruana bloqueou o golfode Guayaquil, fato que precipitou as ações bélicas. Meses depois, quan<strong>do</strong>se deu conta da manobra peruana, e aproveitan<strong>do</strong>-se <strong>do</strong> caos reinante,García Moreno assumiu o poder. Como se viu, sua ação foi indispensávelpara consolidar a unidade <strong>do</strong> país: em duas oportunidades, ainda durantea crise e depois dela superada, procurou-se fazer com que o Equa<strong>do</strong>r setransformasse em um protetora<strong>do</strong> francês.Com García Moreno foram mantidas as condições básicas <strong>do</strong>sconvênios assina<strong>do</strong>s. No entanto, a despeito de to<strong>do</strong>s os esforços feitospara cumprir os confusos compromissos assumi<strong>do</strong>s, em março de 1862 oseu governo teve que suspender temporariamente o serviço da dívida.Nessa oportunidade, o negocia<strong>do</strong>r foi Antonio Flores Jijón, quechegaria mais tarde à Presidência. No princípio de 1865 ele apresentou umprojeto para alienar as ilhas Galápagos em favor <strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res, comopagamento da dívida consolidada. Em maio de 1869, o regime de García seviu obriga<strong>do</strong> a dar início a uma nova moratória, com o apoio <strong>do</strong> Legislativo.Com essa moratória as dificuldades não foram superadas, massuspendeu-se um pagamento oneroso, exclusivamente de juros, e apesardas limitações financeiras e da dificuldade em conseguir novos créditosexternos, o país fechou a década com notável recuperação <strong>econômica</strong>.Mais tarde se chegaria a considerar esse perío<strong>do</strong> como “o mais brilhanteda economia nacional” (Banco <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, 1977, p. 50) — o que talveztenha si<strong>do</strong> possível devi<strong>do</strong> à moratória, que evitou uma pesada sangria derecursos.Depois da morte de García Moreno teve início um longo perío<strong>do</strong>de crise política e até moral, com o governo <strong>do</strong> General Ignacio deVeintemilla, que derrubou o primeiro presidente a suceder García, AntonioBorrero. Assim, a tarefa moderniza<strong>do</strong>ra de García Moreno ficou truncada.Cessaram as obras públicas, foi reduzi<strong>do</strong> o investimento na educação e nasaúde, os fun<strong>do</strong>s públicos foram desperdiça<strong>do</strong>s, aumentou-seirresponsavelmente os gastos militares e a corrupção se estendeu por to<strong>do</strong>o país.55livro.pmd 5526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAA título de comparação, para entendermos a complexa lógica <strong>do</strong>capital financeiro internacional durante esse século, enquanto o Equa<strong>do</strong>rnão progredia na renegociação da sua dívida externa, seu vizinho <strong>do</strong> Sul,o Peru, conseguiu uma dezena de importantes créditos internacionaisgraças aos depósitos de guano, produto muito demanda<strong>do</strong> no merca<strong>do</strong>mundial.Embora o cacau seja comparável ao guano, no Equa<strong>do</strong>r aspossibilidades de conseguir créditos externos foram menores enquanto aprodução e comercialização <strong>do</strong> cacau estavam em mãos de equatorianos,e não de investi<strong>do</strong>res estrangeiros, como acontecia no Peru. O quecontribuiu para gerar desestímulos muito mais significativos e profun<strong>do</strong>s<strong>do</strong> que no caso <strong>do</strong> guano (Bonilla 1994, p. 324). Enquanto isso, no Peru orendimento <strong>do</strong> guano, controla<strong>do</strong> em grande parte por investi<strong>do</strong>resestrangeiros, alia<strong>do</strong>s a grupos hegemônicos locais, financiava o aparelhoestatal e ao mesmo tempo garantia a contratação de empréstimos noexterior, tal como ocorreria muito depois no Equa<strong>do</strong>r produtor de petróleo.56livro.pmd 5626/9/2005, 13:26


2O modelo de exportação deprodutos primárioslivro.pmd 5726/9/2005, 13:26


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2O modelo de exportaçãode produtos primáriosNo fim <strong>do</strong> século XIX o mun<strong>do</strong> enfrentou uma série de mudançase processos cada vez mais profun<strong>do</strong>s e vertiginosos. A presença <strong>do</strong>sEsta<strong>do</strong>s imperialistas começou a ser matizada e complementada pelaintervenção de grandes empresas — as transnacionais — que cruzan<strong>do</strong>as fronteiras <strong>do</strong>s países se projetavam internacionalmente em busca dematérias primas baratas ou não disponíveis nos países de origem, de mãode obra abundante e de baixo custo, assim como de merca<strong>do</strong>s potenciaispara os seus produtos industriais.Essas mudanças facilitaram a difusão das teorias livre-cambistas,confirman<strong>do</strong> assim a observação de que as teorias <strong>econômica</strong>s entram esaem de moda conforme os interesses de acumulação de capital mais fortesem cada momento. Por sua vez, os progressos tecnológicos, especialmenteo transporte oceânico em vapores e a comunicação através <strong>do</strong> telégrafoencurtaram as distâncias, permitin<strong>do</strong> um relacionamento comercial maisintenso.Nessas condições, ao atingir o ponto mais alto <strong>do</strong> seudesenvolvimento, o capitalismo da livre competição passou a serimperialismo capitalista. Algumas das suas propriedades fundamentaiscomeçaram a se converter na sua antítese: por exemplo, a substituição dalivre competição pelos monopólios. Essa manifestação <strong>do</strong> capitalismo secaracteriza por um processo cíclico de recuperação, apogeu, recessão edepressão, devi<strong>do</strong> à sua vitalidade e instabilidade, com longas ondasperiódicas, refletidas na Tabela 29. Em conclusão, esse sistema aprofundaas diferenças existentes e cria outras mais, tendência aliás característica <strong>do</strong>capitalismo, “um sistema de valores, um modelo de existência, uma59livro.pmd 5926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAcivilização: a civilização da desigualdade”, nas palavras <strong>do</strong> economistaaustríaco Joseph Schumpeter. Sistema a que correspondem diversas formasde organização social e controle político.A incorporação definitiva <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r aoMerca<strong>do</strong> MundialO notável apogeu da fase cacaueira, que teve início quan<strong>do</strong> terminavao século XIX, foi o passo definitivo para inscrever o país na divisãointernacional <strong>do</strong> trabalho. Em 1888 as exportações ultrapassaram pelaprimeira vez a marca <strong>do</strong>s 9 milhões de dólares, manten<strong>do</strong> um nível superiora 7 milhões até pouco antes da Revolução Liberal. Supera<strong>do</strong>s os principaisproblemas próprios à transformação “alfarista”, as exportações voltarama aumentar, como se pode ver na Tabela 1.Deste mo<strong>do</strong>, o cacau, que desde a fase colonial estava associa<strong>do</strong> à<strong>história</strong> social e <strong>econômica</strong> da Costa, foi o motor da recuperação <strong>econômica</strong>e de uma integração mais profunda com o merca<strong>do</strong> mundial. Nessascondições, mudaram os processos de produção e circulação, a estruturadas classes sociais, as formas de articulação estatal, regional e nacional,assim como as relações inter-regionais.O aumento da demanda externa nos países industrializa<strong>do</strong>s, quetinham alcança<strong>do</strong> um nível considerável de desenvolvimento, deu umimpulso ainda maior ao apogeu <strong>do</strong> cacau no Equa<strong>do</strong>r, que dispunhade condições favoráveis à produção da “pepa de oro”, a “semente deouro”.Nessa época as terras altas atravessavam uma depressão que favoreciaa emigração da mão de obra para o litoral. E a estrutura repressiva <strong>do</strong><strong>do</strong>mínio <strong>do</strong>s senhores da Serra, que respondia com violência aos conflitose levantes contínuos, teve igualmente um papel importante.Como já dissemos, a exploração e produção cacaueira era feita deforma extensiva, com poucas exigências de capital e tecnologia, e poucopoder de irradiação na economia nacional. Esta se ajustou às flutuações60livro.pmd 6026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORda demanda internacional, que determinava os preços e a comercialização<strong>do</strong> cacau, enquanto a etapa da produção se mantinha em mãos equatorianas.A influência <strong>do</strong> “progressivismo”, o perío<strong>do</strong> compreendi<strong>do</strong> entre1884 e 1895, foi determinante para essa inserção na economia mundial,ao favorecer a rápida adaptação <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r à cambiante demanda externa.A mobilização de recursos se ampliou com a substituição <strong>do</strong> dízimopago à Igreja por um imposto de 0,3 por cento sobre a propriedade, paracompensar o clero. Ao terminar o século, o dízimo correspondia a cercade 40 por cento da receita fiscal.O dízimo era um imposto cobra<strong>do</strong> pelo Esta<strong>do</strong> para a Igreja, cria<strong>do</strong>na época colonial e herda<strong>do</strong> pelos governos republicanos. Da sua receita,um terço ficava com o governo, e <strong>do</strong>is terços com a Igreja. Era um ônuspara a produção agrícola e sua aplicação representava mais um mecanismode repressão e abuso. O governo delegava a sua cobrança a particulares,que podiam voltar a delegá-la, “terceirizan<strong>do</strong>-a” e crian<strong>do</strong> assim um sistemacomplexo e até mesmo corrupto.Com a sua eliminação, os produtores, e especialmente osexporta<strong>do</strong>res, conheci<strong>do</strong>s como “gran cacao”, garantiram o controle sobremaiores lucros e conseguiram terminar com o que consideravam umobstáculo à competitividade <strong>do</strong>s produtos equatorianos no merca<strong>do</strong>mundial. Conforme reconhece Manuel Chiriboga, a supressão desseimposto “significou um impulso poderoso ao aumento da produçãocacaueira”. No entanto, como já dissemos, não criou nenhum estímulopara desenvolver o merca<strong>do</strong> interno.A eliminação <strong>do</strong> dízimo foi o resulta<strong>do</strong> de dura luta <strong>do</strong>s defensoresda abertura (o “aperturismo”) contra os fazendeiros latifundiários, que emboraonera<strong>do</strong>s pelo tributo, exerciam com ele um certo controle das atividadesbeneficentes, o que lhes permitia aumentar o poder exerci<strong>do</strong> sobre a massaindígena. Por outro la<strong>do</strong>, preferiam ser tributa<strong>do</strong>s sobre a produção a pagarum imposto que fosse cobra<strong>do</strong> sobre suas extensas propriedades.Essa disputa não foi apenas ideológica, não se efetivou no nível dasuper-estrutura, mas tinham claras raízes materiais. O que, por outro la<strong>do</strong>,61livro.pmd 6126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAnão nos deve levar a exagerar o determinismo econômico, pois é preciso“dar ao problema o tratamento correto, na sua totalidade.” (Ortiz 1990, p.264).Durante esse perío<strong>do</strong>, a Serra não era um conjunto homogêneo. Aregião central buscou uma maior vinculação com a economia da Costa,enquanto o Sul conseguiu uma certa articulação comercial com o exterior,devi<strong>do</strong> à produção de chapéus de palha toquilla. De mo<strong>do</strong> geral, a Serrafornecia à Costa produtos agrícolas para consumo interno, além de mãode obra — tu<strong>do</strong> a preços muito baixos.É preciso assinalar que o relacionamento da Serra com a agriculturade exportação da Costa variou notavelmente entre as diversas províncias.Assim, Tungurahua e em menor grau Chimborazo se articularam com aeconomia da Costa antes das outras regiões. Nesta análise salta à vista amarginalização da parte meridional da Serra, que continuou até bemavança<strong>do</strong> o século XX.Uni<strong>do</strong>s pela exportação de cacau, não necessariamente integra<strong>do</strong>saos proprietários rurais, comerciantes e banqueiros se transformaram naburguesia comercial que liderou as transformações liberais no campo daeconomia. No entanto, isso não eliminou totalmente a fragmentação <strong>do</strong>país, e também não fez com que desaparecessem as diversas relações deprodução pré-capitalistas.É nessa burguesia, principal protagonista <strong>do</strong> processo, que arevolução liberal encontraria seus limites, e ela propiciaria a queda e oassassinato <strong>do</strong> próprio Alfaro. Uma revolução que “estava determinadapelos interesses da burguesia, que nem precisava investir contra a estruturalatifundiária da Serra, nem podia abolir o poder regional latifundiário”(Ayala 1993, p.88). Sua luta garantiu o controle burguês <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> epermitiu criar condições favoráveis a uma articulação mais estreita <strong>do</strong>smerca<strong>do</strong>s regionais e <strong>do</strong> conjunto da economia nacional com a economiainternacional.A carência de uma vinculação dinâmica entre a produção cacaueirae o resto da economia impôs um sistema produtivo atrofia<strong>do</strong> e vulnerável.62livro.pmd 6226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORSeus excedentes eram drena<strong>do</strong>s continuamente para os paísesindustrializa<strong>do</strong>s, através da deterioração <strong>do</strong>s termos de intercâmbio, opagamento de lucros e as regalias <strong>do</strong>s poucos investimentos estrangeiros,o serviço da dívida externa e especialmente a fuga de capitais, assim como,naturalmente, as importações de bens suntuários destina<strong>do</strong>s ao setores<strong>do</strong>minantes. Tu<strong>do</strong> isso contribuiu para limitar as possibilidades dereprodução nacional <strong>do</strong> capital. Havia poucas indústrias, com pouquíssimasvinculações com a agricultura ou outros setores da produção.De qualquer forma, essa foi uma época de fastígio para o país,que apresentou o maior crescimento desde 1830, em particular noperío<strong>do</strong> entre 1908 e 1914, fase culminante <strong>do</strong> auge cacaueiro. Comuma população estimada em torno de 1,3 milhões de habitantes em1900, o Equa<strong>do</strong>r conseguiu um crescimento <strong>do</strong> PIB per capita estima<strong>do</strong>em 2,5%, taxa mais elevada <strong>do</strong> que a de outros países da América Latina:Argentina, Brasil, Chile., Colômbia, México, Venezuela, que tiveram umataxa média de 1,9% no perío<strong>do</strong> 1900-13. Como se pode observar naTabela 26, o crescimento equatoriano foi também superior ao <strong>do</strong>sEsta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s (2%), assim como ao de outras nações <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Ospaíses desenvolvi<strong>do</strong>s (França, Alemanha, Japão, Países baixos, ReinoUni<strong>do</strong> e Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s) cresceram em média 1,2%; os países ibéricos(Espanha e Portugal), 1,1%; os países asiáticos (Coréia, Formosa,Tailândia, 0,5% (Hofman, 1992).Como o sucre acelerou a modernizaçãoNessa época o sucre foi introduzi<strong>do</strong> como moeda nacional,denominação dada em honra <strong>do</strong> Marechal Antonio José de Sucre (1795-1830), que coman<strong>do</strong>u a batalha de Pichincha em 24 de maio de 1822, coma qual se consoli<strong>do</strong>u a independência <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r. Sucre foi assassina<strong>do</strong>nas selvas de Berruecos no dia 4 de junho de 1830. Quanto à moedanacional, foi sacrificada oficialmente em 9 de janeiro de 2000, ceden<strong>do</strong>lugar à plena <strong>do</strong>larização da economia.63livro.pmd 6326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAVale lembrar que a Casa da Moeda de Quito foi criada por SimónBolívar em 1823, e começou a funcionar em 1831, quan<strong>do</strong>, regida pelaprimeira Lei de Moedas, cunhou <strong>do</strong>brões de ouro, denomina<strong>do</strong>s escu<strong>do</strong>s,bem como pesetas, que eram moedas de <strong>do</strong>is reais, medios e cuartillos, deprata.Essa evolução, registrada na Historia Numismática del Ecua<strong>do</strong>r, deCarlos Ortuño, começou muito antes. Os espanhóis introduziram nacolônia o seu sistema monetário — ouro e prata — deslocan<strong>do</strong> as “monedasde hachas” <strong>do</strong>s indígenas, feitas de cobre.Em 1836, desvanecida a esperança de reunificação da Grã Colômbia,foi cunhada a primeira moeda que trazia a inscrição da República <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r. Até 1843 houve uma variedade de moedas, dentre as quais meiopesos ou moedas de quatro reais. Foi nesse ano que se publicou a segundaLei de Moedas, que autorizou fossem cunhadas moedas fracionárias —um quarto de real ou cuartillos, conheci<strong>do</strong>s como calés, feitos de prata e decobre, para assim superar as dificuldades ocasionadas ao comércio internopelo valor eleva<strong>do</strong> das moedas de ouro e prata.Em certas ocasiões, quan<strong>do</strong> não era possível arre<strong>do</strong>ndar as contas,chegou-se a aceitar o pagamento com produtos — pão ou ovos — einventou-se vales feitos de lata, chumbo ou cobre, quan<strong>do</strong> os lojistas nãopodiam fazer as contas <strong>do</strong>s seus clientes. Vale lembrar também as moedasde couro e papel que circularam no princípio <strong>do</strong> século XX na ilha de SanCristóbal, no arquipélago de Galápagos, postas em circulação nos <strong>do</strong>míniosde Manuel J. Cobos, o “Impera<strong>do</strong>r de Galápagos” (Latorre 1991).Muitas décadas mais tarde surgiriam moedas alternativas ou sociais,em plena fase neo-liberal, como acontece em várias regiões <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.Por exemplo, os Ithaca-Hours nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, os talentos na Suíça, osLET no Canadá e na Grã Bretanha, os bonos de Salta e os patacones naArgentina (neste caso emiti<strong>do</strong>s por governos locais, na época daconversibilidade e como sua conseqüência), entre muitos outros projetosde dinheiro alternativo. No Equa<strong>do</strong>r vale ressaltar a experiência <strong>do</strong> Sistemade Intercâmbio e Transações Locais (SINTRAL), patrocina<strong>do</strong> pela64livro.pmd 6426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORFundação Pestalozzi, que mereceu interesse inusita<strong>do</strong> devi<strong>do</strong> à <strong>do</strong>larizaçãooficial.Em 1846 foi produzida a melhor moeda de prata, o “peso forte”,resposta destinada a restabelecer o crédito monetário, afeta<strong>do</strong>especialmente pela quantidade de moeda existente, as falsificações e acompetição de moedas estrangeiras. Nesse ano entrou em vigor tambéma terceira Lei de Moedas, determinan<strong>do</strong> a cunhagem de moedas de onça,meia onça, <strong>do</strong>brões e escu<strong>do</strong>s. Vinte anos depois seria fechada a Casa daMoeda, e o governo autorizou o Banco Particular de Guayaquil a assumira tarefa de emitir moeda: os cuños.Foram anos complica<strong>do</strong>s, perío<strong>do</strong> em que a economia secaracterizava por grande confusão. Os créditos internos para financiar aadministração pública determinavam um excesso de meio circulante, coma conseqüente depreciação <strong>do</strong>s cuños, o que terminaria por provocar ofechamento <strong>do</strong> banco emissor. A partir de 1868 circularam moedas decobre ou platina, como os centavos feitos de níquel.Nessas condições nasceu o sucre, com toda uma família de moedas:o duplo con<strong>do</strong>r (20 sucres), o con<strong>do</strong>r (10 sucres), o quinto de con<strong>do</strong>r (2sucres), o décimo de con<strong>do</strong>r (1 sucre). Havia também o sucre de prata(100 centavos), o meio sucre (50 centavos), os <strong>do</strong>is décimos (20 centavos)e o décimo (10 centavos), meio décimo (5 centavos); em cobre e níquelcirculou também o meio décimo de níquel assim como o centavo e omeio centavo.Vale a pena recordar que o sucre, que entrou em circulação emprimeiro de janeiro de 1895, foi bem recebi<strong>do</strong> em um país penaliza<strong>do</strong>pela escassez de meio circulante e a invasão de moedas falsas. Essa decisãoserviu para encetar um processo de paulatina racionalização da políticamonetária nacional, e por fim de modernização das relações <strong>econômica</strong>s.“To<strong>do</strong>s saudaram com excitação o recém nasci<strong>do</strong>, pois era convicção geralde que havia a necessidade de uma unidade monetária que permitisse aatividade <strong>econômica</strong> interna, inclusive as transações cada vez maisnumerosas vinculadas ao comércio exterior” (Ortiz 2000, p. 62).65livro.pmd 6526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTANão obstante, os esforços iniciais para sanear a economia, livran<strong>do</strong>ade toda uma série de moedas indesejáveis, não surtiram logo os resulta<strong>do</strong>sdeseja<strong>do</strong>s. Essa tarefa, assumida pelos bancos priva<strong>do</strong>s, em troca de umaboa comissão, foi executada especialmente através <strong>do</strong> Banco Internacional,de Guayaquil, que importou 400 mil sucres cunha<strong>do</strong>s em Birmingham,providência que contu<strong>do</strong> não resolveu o problema. O papel moeda semlastro que tinha si<strong>do</strong> posto em circulação por outros bancos, como a CasaLuzárraga, derrubou a intenção de aban<strong>do</strong>nar o antigo “peso feble” (pesofraco), e a desordem monetária só fez aumentar.Passada a etapa crítica da luta contra a ditadura de Ignacio deVeintemilla, o Banco Internacional e o Banco <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r assumiram atarefa de eliminar a moeda “chimba”. Voltou-se a encomendar a cunhagemde moeda no exterior, e o Congresso autorizou o Poder Executivo a contrataruma nova encomenda de trezentos mil sucres. O Banco Comercial e Agrícolafoi também autoriza<strong>do</strong> a emitir duzentos mil sucres. Estima-se assim queaté 1897 tenham si<strong>do</strong> produzi<strong>do</strong>s quase 4,8 milhões de sucres.Pouco antes, em 14 de agosto de 1890, o governo de Antonio FloresJijón decretou que a única moeda de circulação nacional era o sucre (quecompletara seis anos <strong>do</strong> seu lançamento). Surgiram novas moedas de ouro,denominadas con<strong>do</strong>r equatoriano (10 sucres); de prata (1 sucre), o quinto(20 centavos), o décimo (10 centavos) e o vigésimo (5 centavos); e moedasde cobre de um e <strong>do</strong>is centavos.Entre 1890 e 1897 houve a crise internacional da prata, e prosperoua tentativa de introduzir o padrão ouro. Os exporta<strong>do</strong>res lucravam com aqueda de valor da prata, mas o mesmo não acontecia com os importa<strong>do</strong>res.A crise não permitia divisar com clareza a situação, e por isso a solução foiadiada por vários anos. Finalmente, em 1897 foi decidi<strong>do</strong> que os bancosnão emitiriam notas no valor total que excedesse o <strong>do</strong>bro <strong>do</strong> seu capitalreal, para evitar a depreciação excessiva <strong>do</strong> papel moeda. Por iniciativa deAlfaro, o padrão ouro foi introduzi<strong>do</strong> em 1898.Nessa ocasião as moedas de con<strong>do</strong>r, de 10 sucres, foram cunhadasna Inglaterra, por intermédio <strong>do</strong>s bancos Comercial e Agrícola e <strong>do</strong>66livro.pmd 6626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOREqua<strong>do</strong>r. Complementarmente foi instituída a circulação de moedasfracionárias, de prata, que durante os governos de Pláci<strong>do</strong> Caamaño(interino) e Eloy Alfaro coexistiram com o con<strong>do</strong>r de ouro. O esforçopara modernizar a administração da moeda provocou uma crise, com oassassinato de Alfaro.Começa então uma das fases mais fraudulentas da vida nacional. A“bancocracia” — coligação de banqueiros e cre<strong>do</strong>res — passou a <strong>do</strong>minara vida política e <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> país.No ano de 1914, no início da Primeira Guerra Mundial, e com o conflito,passou a ser difícil vender cacau ao merca<strong>do</strong> europeu, e surgiram as primeirasdificuldades monetárias. Em 31 de agosto daquele ano foi posta em vigor aLei da Inconversibilidade Metálica das notas bancárias, conhecida como “Leida Moratória”, que suspendeu a troca <strong>do</strong> sucre por ouro.Supostamente o objetivo dessa lei era proteger as reservas de ouroda nação, mas ela serviu para ajudar a salvar a situação de alguns bancosemissores, como o Banco Comercial e Agrícola, que na hipótese de umacorrida bancária não teriam podi<strong>do</strong> resgatar em ouro as notas emitidas.Essa disposição, a princípio limitada, e depois prorrogada indefinidamente,criou condições para as emissões inorgânicas ou fraudulentas de moeda.Nesse contexto, quan<strong>do</strong> o Equa<strong>do</strong>r se via afeta<strong>do</strong> pela crise daprodução e exportação de cacau, a situação era <strong>do</strong>minada pelo BancoComercial e Agrícola, que começou a articular seu poder com osempréstimos concedi<strong>do</strong>s ao regime <strong>do</strong> General Leonidas Plaza Gutiérrez,em 1913 e 1914, da mesma forma como antes, em 1910, havia abertocréditos ao governo de Alfaro.Aquele banco expandiu a sua capacidade <strong>econômica</strong> até transformarseem um verdadeiro centro <strong>do</strong> poder político, na primeira metade dadécada de 1920. Havia uma vinculação orgânica entre os gruposeconômicos que propugnavam pela integração da economia <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>rao merca<strong>do</strong> internacional: de um la<strong>do</strong> os grandes exporta<strong>do</strong>res de produtosprimários e representantes <strong>do</strong> capital financeiro e comercial, de outro ogoverno liberal.67livro.pmd 6726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTACom a criação <strong>do</strong> Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, em 1927, foramassentadas as bases para ordenar a situação monetária <strong>do</strong> país, e começariauma fase de maior estabilidade da moeda. A criação <strong>do</strong> Banco Central foiacompanhada por nova Lei de Moedas, que seria reformada em 1937,parte de um processo de modernização <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> que vamos analisarmais adiante.Um corte na “Dívida Górdia”Antes de terminar o século começaram a reativar-se os interessescomprometi<strong>do</strong>s com a solução <strong>do</strong> problema da dívida externa, paraassegurar uma adequada inserção <strong>do</strong> país na economia internacional e,paralelamente, para receber recursos que permitissem construir a estradade ferro. A dívida externa e a ferrovia eram temas prioritários, o primeirocomo problema a ser resolvi<strong>do</strong>, o segun<strong>do</strong> como um instrumento paraalcançar esse fim.O segun<strong>do</strong> Presidente “progressista”, Antonio Flores Jijón, começouo seu mandato em plena moratória. Ten<strong>do</strong> alcança<strong>do</strong> o poder supremo,esse experiente renegocia<strong>do</strong>r da dívida externa convocou em 1888 umCongresso extraordinário par analisar a situação <strong>do</strong> endividamento e osmecanismos para conseguir novos empréstimos, ten<strong>do</strong> em vistaespecialmente o prosseguimento da obra da estrada de ferro. No entanto,em uma atitude curiosa, o próprio Flores Jijón anunciou publicamente ointeresse <strong>do</strong> seu governo em retomar conversações sobre o pagamentoda dívida, o que bastou para elevar o preço <strong>do</strong>s títulos equatorianos.Com a gestão de Flores Jijón o país deu passos importantes para asua reincorporação ao merca<strong>do</strong> internacional, e o governo seguinte, deLuís Cordero, procurou ser pontual nos pagamentos dessa dívida, mesmoàs custas de qualquer sacrifício. No entanto, os ajustes negocia<strong>do</strong>s nãotiveram o resulta<strong>do</strong> espera<strong>do</strong>. Pouco antes da Revolução Liberal, em 29de julho de 1894, o Congresso Nacional se viu obriga<strong>do</strong> a suspender maisuma vez esses pagamentos.68livro.pmd 6826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORNo Equa<strong>do</strong>r vigorava de fato o padrão prata, que foi seriamenteafeta<strong>do</strong> pela perda de valor desse metal, o que modificou o valor daconversão <strong>do</strong> papel moeda em moedas de prata. O sucre, introduzi<strong>do</strong> naeconomia nacional em 1884, em lugar <strong>do</strong> peso, foi desvaloriza<strong>do</strong> em cempor cento, estabilizan<strong>do</strong>-se por fim na faixa de 10 sucres por libra e 2,05sucres por dólar. Mais tarde, em 1898, se introduziria no Equa<strong>do</strong>r oprimeiro padrão ouro.A oposição liberal incluiu a dívida externa entre os pontos maisimportantes <strong>do</strong> seu programa, batizada por Alfaro, em um folheto quepublicou no exterior, de “dívida górdia”, por ser tão difícil de desfazer,aludin<strong>do</strong> ao mítico “nó górdio” que Alexandre Magno cortaria com umgolpe da sua espada.De forma coerente com a sua posição, pouco depois de conquistaro poder a Revolução Alfarista, cuja marcha vitoriosa foi encetada em 5 dejunho de 1895, no ano seguinte teve uma base sólida para impor as suasidéias sobre a dívida externa. Na condição de Chefe Supremo da República,Eloy Alfaro decretou em 14 de março de 1896 a suspensão “<strong>do</strong> pagamentoda dívida externa, até que se chegue a um acor<strong>do</strong> equitativo e honrosocom os porta<strong>do</strong>res de títulos.”Diferentemente das moratórias anteriores e das que a sucederiam, estanova suspensão de pagamentos da dívida se enquadrava em uma posiçãoprogramática clara, concebida para encontrar melhores condições derenegociação, sen<strong>do</strong> mais <strong>do</strong> que o simples reconhecimento da impossibilidadede manter o serviço da dívida. Resultou da vontade política e em certa medida<strong>do</strong> compromisso de uma luta em prol de transformações profundas.A estrada de ferro, a grande obra da mudança <strong>do</strong> séculoA construção da Estrada de Ferro <strong>do</strong> Sul foi uma tarefa iniciada naépoca de García Moreno. Quan<strong>do</strong> a obra foi encetada, na segundapresidência de García Moreno, uma década havia transcorri<strong>do</strong> desde aautorização dada para o início da construção dessa ferrovia.69livro.pmd 6926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAEm 1875 a estrada a partir de Quito tinha 273 quilômetrosconcluí<strong>do</strong>s. Uma parte <strong>do</strong> trajeto se fazia por via fluvial, e o restante pelalinha férrea, em cerca de 30 quilômetros. Nos anos seguintes a construçãoavançou lentamente. Borrero ampliou a linha em 14 quilômetros, atéBarraganetal. Veintemilla chegou a Chimbo, 5 quilômetros adiante. A partirde Chimbo Flores Jijón, continuou a obra por 12 quilômetros. Com Alfaro,tratava-se de uma construção praticamente inexistente, por ser uma ferroviaestreita, não a que se fazia necessária.Antes da estrada de ferro, a mula e os “guan<strong>do</strong>s”, índios que levavamas cargas mais pesadas, eram a base <strong>do</strong> transporte entre a Serra e a Costa.Situação que contribuiu para manter desagregada a sociedade equatoriana,e que incidia sobretu<strong>do</strong> na falta de articulação entre essas duas regiões,para não mencionar a Amazônia.A Revolução Liberal, liderada por Alfaro, se empenhou noempreendimento, enfrentan<strong>do</strong> porém a escassez de recursos <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> ea impossibilidade de obter novos créditos externos enquanto não sesolucionasse o problema da “dívida inglesa”. Além disso, a The Guayaquiland Quito Railway Company, empresa constituída para esse fim em NewJersey, nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, não tinha podi<strong>do</strong> levantar os recursos financeirosnecessários.Nessas condições, Eloy Alfaro propôs a extinção <strong>do</strong>s bônus da dívida daIndependência, para que os novos títulos pudessem ser cota<strong>do</strong>s na Bolsa deLondres, e desta forma a ferrovia fosse financiada. Deste esforço participouativamente o empresário norte-americano Archer Harman, que dirigiu aconversão da dívida e depois, com o seu irmão, a construção da estrada de ferro.Aproveitan<strong>do</strong> o fato de que os bônus estavam desvaloriza<strong>do</strong>s nosmerca<strong>do</strong>s financeiros internacionais (valen<strong>do</strong> só 35% <strong>do</strong> valor nominal, oque o próprio Alfaro considerava excessivo, dadas as condições impostasà dívida da Independência e as renegociações posteriores), em 1898procedeu-se à sua compra, em parte à vista, em parte contra a emissão detítulos da ferrovia, e assim foi possível redimir gradualmente a chamada“dívida inglesa”.70livro.pmd 7026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORA obra foi iniciada em 10 de julho de 1899, com grande entusiasmo,mas progrediu lentamente. Houve uma série de desmoronamentos,particularmente nas faldas da cordilheira, anulan<strong>do</strong> o trabalho realiza<strong>do</strong>.Algumas vezes foi preciso refazer a terraplanagem e retificar o rumo <strong>do</strong>strilhos, além das limitações financeiras. As rochas <strong>do</strong> “nariz e da orelha <strong>do</strong>diabo” e a obstinação <strong>do</strong>s conserva<strong>do</strong>res e <strong>do</strong> clero dificultavam o seudesenvolvimento. Depois de esforços titânicos, feitos por índios e negros,muitos trazi<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Caribe, com numerosas vítimas, conseguiu-se que aslocomotivas subissem a cordilheira, mas quan<strong>do</strong> chegaram a Guamote osrecursos financeiros estavam esgota<strong>do</strong>s. Diante <strong>do</strong> desastre humano efinanceiro foi preciso consolidar uma vez mais parte <strong>do</strong>s bônus da dívida.No entanto, a chegada <strong>do</strong>s trilhos a Guamote levantou o prestígio <strong>do</strong>sresponsáveis pelo projeto e renovou a confiança na obra. Naquele momento,Alfaro impulsionava pessoalmente a construção, mas já não era Presidente,e o governante era Leônidas Plaza, de quem ele se havia distancia<strong>do</strong>.Cabe notar que a obra não tinha o apoio da legislatura, onde a alaalfarista e a ferrovia enfrentavam uma maioria adversa. Por outro la<strong>do</strong>,durante to<strong>do</strong> esse tempo não faltaram críticas até mesmo <strong>do</strong>s seuspartidários, sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong> grupo liberal chama<strong>do</strong> de “chistero”, que seopunha à ala “machetera” <strong>do</strong> parti<strong>do</strong>.Havia também a ironia <strong>do</strong>s proprietários de títulos que, depois daconversão da dívida, reclamavam uma estátua igual à de Alfaro, porque“fomos nós que proporcionamos o dinheiro para a obra”. Angustia<strong>do</strong>scom os progressos da ferrovia, os conserva<strong>do</strong>res qualificavam a obra de“negociata judaica”, produto das “recomendações da maçonariainternacional”. E não faltou um bispo que se juntasse à campanhaultramontana, garantin<strong>do</strong> que a estrada de ferro era “o caminho <strong>do</strong>sdemônios”.Depois de satisfeito o custo da exploração e manutenção da empresa,o produto da operação ferroviária devia ser destina<strong>do</strong> inicialmente aoserviço da dívida externa, e só o excedente seria entregue aos proprietáriosde ações preferenciais e comuns, a título de lucro.71livro.pmd 7126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAPouco depois, quan<strong>do</strong> a “obra redentora” ainda não estava concluídae o Esta<strong>do</strong> precisou cobrir com seus próprios meios o pagamento <strong>do</strong>sbônus, voltou a ser necessário recorrer a recursos externos para financiaro prosseguimento <strong>do</strong>s trabalhos. O governo liberal solicitava apoio, e areação clerical acusava: “isto não é liberalismo, mas comunismo”. Em1905 os trilhos chegaram a Ambato, aproximan<strong>do</strong>-se de Latacunga, masvoltou a faltar dinheiro.Os projetos para fornecer energia hidroelétrica à estrada de ferroforam também boicota<strong>do</strong>s pela agitação <strong>do</strong>s conserva<strong>do</strong>res quemobilizaram os proprietários de terras convencen<strong>do</strong>-os de que correriamo risco de perder a água. A idéia de extrair carvão de pedra também nãofoi adiante. Apesar desses problemas, Alfaro prosseguiu com a construção,“com a arma na mão, no meio <strong>do</strong> fragor da guerra civil, enfrentan<strong>do</strong>insultos e a difamação” — como ele próprio reconhece, no seu relato da<strong>história</strong> da ferrovia.O custo da obra excedia o orçamento, e Alfaro, pela segunda vez nopoder, fazia manobras financeiras de to<strong>do</strong> tipo para conseguir os recursosnecessários, nem sempre respeitan<strong>do</strong> a rigidez das normas legais. Em junhode 1907 os trilhos chegaram a Latacunga. Era impossível cumprir o cronogramafixa<strong>do</strong>, e a construção continuava exigin<strong>do</strong> mais dinheiro, especialmente devi<strong>do</strong>às dificuldades enfrentadas no último trecho. Mas o grande sacrifício e o esforço<strong>do</strong>s técnicos, trabalha<strong>do</strong>res e peões, como também a tenacidade de Alfaro,tornaram possível a sua continuação e permitiram vencer o desalento e adesconfiança que às vezes despontavam entre os financia<strong>do</strong>res, construtorese os próprios funcionários <strong>do</strong> governo. Foi notável o esforço desenvolvi<strong>do</strong>para vencer as grandes dificuldades levantadas pela geografia, que têm si<strong>do</strong>um desafio permanente à sociedade equatoriana.Em 25 de junho de 1908 a estrada de ferro se transformou emrealidade, quan<strong>do</strong> a primeira locomotiva entrou em Quito, no meio <strong>do</strong>entusiasmo popular.A contribuição da ferrovia para o desenvolvimento e a integração<strong>do</strong> país é inegável. Uma contribuição que precisa ser avaliada adequadamente,72livro.pmd 7226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORapesar de to<strong>do</strong>s os problemas surgi<strong>do</strong>s na sua administração e na posteriorcompra das ações fornecidas pelo Esta<strong>do</strong> à companhia estrangeira, quemotivou inclusive pressão oficial norte-americana para garantir a proteção<strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s seus acionistas.Alguns traços da visão estratégica de AlfaroCom a ligação ferroviária entre a Costa e a Serra houve umadiferenciação entre as fazendas tradicionais e as modernas, pelas novasoportunidades surgidas no país. Além disso, este processo ampliou naSerra as relações de trabalho de tipo salarial, e contribuiu para melhorar onível tecnológico <strong>do</strong> campo, pelo menos nas zonas de influência da estradade ferro. Isto porém não pode justificar conclusões equivocadas: comefeito, sobreviveram os latifúndios e minifúndios, ao la<strong>do</strong> de formas deprodução pré-capitalistas. Por outro la<strong>do</strong>, nessa época já se desenvolvia odebate sobre o grau de proteção e abertura conveniente ao país, quan<strong>do</strong>menos para certas atividades produtivas.Vale acentuar, por exemplo, a proteção dada à produção açucareira,que permitiu a instalação de cinco engenhos e a multiplicação das plantações.Em 1897 Alfaro, personagem que nessa época gravita na vidanacional, se havia declara<strong>do</strong> “partidário <strong>do</strong> livre câmbio na sua acepçãomais elevada, pois enquanto dure a infância <strong>do</strong> nosso desenvolvimentoindustrial penso que devemos amparar judiciosamente os setores quenecessitem de leis protetoras, assim como proporcionar-lhes auxíliosrazoáveis <strong>do</strong> Tesouro Nacional.”Na primeira década <strong>do</strong> século XX Alfaro quebrou lanças em favorda proteção da indústria <strong>do</strong> açúcar, ao observar que a Lei de Víveres,aprovada pela Legislatura em 1906, não atingia o objetivo proposto, queera a redução <strong>do</strong> preço <strong>do</strong>s bens de primeira necessidade, permitin<strong>do</strong>importações desse produto vital.Dirigin<strong>do</strong>-se aos parlamentares, o Presidente declarou que “o açúcaré um <strong>do</strong>s artigos que, sen<strong>do</strong> de primeira necessidade, deve ocupar a vossa73livro.pmd 7326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAatenção, para que possa ser forneci<strong>do</strong> ao povo em condições equitativas;no entanto, como também é um artigo de produção nacional, que empregaum número considerável de pessoas, cuja vida depende da subsistênciadessa produção, forçar a baixa <strong>do</strong> seu preço, mediante uma competiçãoque não seria possível sustentar, equivale a destruir por completo essaindústria equatoriana. E a perda <strong>do</strong> trabalho para todas essas pessoas nãopoderia deixar de afetar gravemente o preço da diária recebida em geralpelos trabalha<strong>do</strong>res; com efeito, esses cinco mil trabalha<strong>do</strong>res teriam queoferecer seus serviços por menor preço, o que faria com que toda a classetrabalha<strong>do</strong>ra perdesse vinte ou trinta centavos diários, em lugar daeconomia que se quer instituir, de <strong>do</strong>is ou três centavos por libra de açúcar.Se tememos o abuso por parte <strong>do</strong>s produtores nacionais, em prejuízo <strong>do</strong>povo, nada mais fácil <strong>do</strong> que tomar uma medida que torne impossívelesse abuso e garanta a economia <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r”. Assim concluía suaspalavras o “viejo lucha<strong>do</strong>r”.A preocupação demonstrada por Alfaro é interessante. Ele aceitavaa necessidade de “buscar meios de aliviar a condição da classe pobre,visan<strong>do</strong> economias no consumo <strong>do</strong>s artigos de primeira necessidade.”No entanto, “esses meios não devem em qualquer hipótese feririnconsideradamente outros interesses — os interesses <strong>do</strong>s industriais — ,que tanto quanto o próprio povo são igualmente cre<strong>do</strong>res da proteçãodas leis e <strong>do</strong> governo” (ver esses textos de Alfaro em Espinoza 1995).Surpreende também a lucidez de Alfaro, que já antecipava anecessidade de defender o consumi<strong>do</strong>r.Nessa época, em conseqüência da rigidez cambial, estan<strong>do</strong> vigenteo padrão ouro, a produção de açúcar devia ter um problema decompetitividade, mais <strong>do</strong> que de produtividade: reflexão que ganha forçaem uma economia <strong>do</strong>larizada, pois é possível ser eficiente porém nãonecessariamente competitivo.São interessantes as reflexões de Alfaro, antecipan<strong>do</strong> o que décadasdepois serviria de base teórica para as propostas <strong>do</strong> economista argentinoRaúl Prebisch (1901-1986) e da CEPAL, criada em 1948, a partir da qual74livro.pmd 7426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORse difundiria a estratégia orientada para uma industrialização via substituiçãode importações, induzida e protegida temporariamente. Esta propostaresumia a experiência <strong>do</strong>s processos de industrialização da Argentina,Brasil, Colômbia, Chile e México nos anos 1930 e 1940, em conseqüênciada Grande Depressão e das limitações posteriores provocadas pela SegundaGuerra Mundial (1939-45).Tais proposições teóricas haviam si<strong>do</strong> desenvolvidas na primeirametade <strong>do</strong> século XIX pelo alemão Friedrich List (1789-1846), eorientariam o desenvolvimento industrial da Alemanha. Em um livropublica<strong>do</strong> em 1840, List focalizou sua atenção na necessidade de superaro “subdesenvolvimento” <strong>do</strong> seu país com relação à Grã-Bretanha.A posição desenvolvida por List contestava as visões“globaliza<strong>do</strong>ras” da sua época (advogadas pelos economistas clássicos:Adam Smith, Jean Baptiste Say e David Ricar<strong>do</strong>), com grande êxito prático,como se veria mais tarde pelo notável desenvolvimento da Alemanha.Êxito que ele contu<strong>do</strong> não pôde testemunhar, porque persegui<strong>do</strong> por umasérie de problemas e frustrações, terminou por se suicidar.Mesmo no século XXI suas idéias nos sugerem reflexões valiosaspara forjar respostas alternativas. A crítica que fazia buscava contestar as“verdades” indiscutidas criadas em torno <strong>do</strong> livre comércio mundial e da<strong>do</strong>utrina das vantagens comparativas. Sem fechar a porta à inserção daAlemanha no merca<strong>do</strong> internacional — como Alfaro e Prebisch tambémnão recomendavam — seu ponto de partida era a recuperação <strong>do</strong> espaçonacional para um desenvolvimento auto-centra<strong>do</strong>, a partir da estratégiade “dissociação” seletiva. Estratégia que, de uma forma ou de outra, explicao sucesso <strong>do</strong>s países industrializa<strong>do</strong>s.Mais ainda: nos países que se desenvolveram com base na exportaçãode produtos primários (Dinamarca, Suécia, Finlândia, Canadá ou Austrália)foi crucial a capacidade de gerar inovações e novas tecnologias (de ponta,intermediárias ou tradicionais) adaptadas às condições locais. Nesses países,ao expandir-se o setor exporta<strong>do</strong>r e as atividades conexas, à medida queaumentavam os salários foi-se crian<strong>do</strong> com o tempo uma pujante demanda75livro.pmd 7526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAinterna de bens de consumo simples, que se foram sofistican<strong>do</strong> em paralelocom o aumento da renda média das massas populares. Desta formaampliou-se a rentabilidade das inversões, atrain<strong>do</strong>-as para a produção local,em substituição das importações, e estimulan<strong>do</strong> o encadeamento <strong>do</strong>consumo. Pouco a pouco surgiram fábricas de equipamentos, máquinas eoutros insumos para alimentar a demanda das indústrias produtoras debens de consumo e as necessidades da infra-estrutura de produção(encadeamento de investimentos).Mantida essa estratégia por algumas décadas, aquelas economiasalcançaram um nível de “maturidade”, entendi<strong>do</strong> como maiordiversificação e interação entre os setores, com a utilização crescente daseconomias de escala e desenvolven<strong>do</strong> vantagens comparativas dinâmicas.A economia dual, e concretamente os enclaves exporta<strong>do</strong>res, foramadquirin<strong>do</strong> coerência interna, o que levou a uma economia integrada emâmbito nacional, sobre bases genuínas de uma competição sistêmica, cujodesenvolvimento dinâmico provinha de ímpeto interno, endógeno aodesenvolvimento das suas próprias forças produtivas, e da expansão <strong>do</strong>merca<strong>do</strong> interno de massa. O que contrasta com as economiassubdesenvolvidas de monocultura, assim como com as economiassustentadas pela exploração crescente <strong>do</strong>s recursos minerais — porexemplo, as economias baseadas no petróleo.List propunha uma ampla integração <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> interno,incorporan<strong>do</strong> a massa da população nas atividades industriais, com oconseqüente aumento <strong>do</strong> seu poder aquisitivo, de mo<strong>do</strong> a dinamizar ademanda de bens de consumo em massa e de equipamentos, tanto agrícolascomo manufatura<strong>do</strong>s, bem como a demanda pela prestação de serviçospúblicos e priva<strong>do</strong>s em nível local. Esse esforço exigia proteção programadae uma estreita vinculação entre a ação governamental e as iniciativas <strong>do</strong>setor produtivo priva<strong>do</strong>. Propostas que foram aplicadas na Alemanha aopé da letra, com os resulta<strong>do</strong>s que já mostramos.A ênfase foi posta no desenvolvimento <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> interno para asmassas, ou seja, na produção de artigos de primeira necessidade. A76livro.pmd 7626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORprodução maciça (“indústria de massa”) precisa satisfazer uma demandatambém maciça, com produtos ao alcance dessas massas e ajusta<strong>do</strong>s àsuas expectativas. Assim, a indústria era a base <strong>do</strong> progresso.Diferentemente <strong>do</strong>s economistas clássicos, que consideravampossível saltar da esfera individual para o nível internacional, Listconcentrou sua atenção no desenvolvimento nacional, embora nãoquestionasse o merca<strong>do</strong> mundial. Distinguia entre a “economiacosmopolita e a economia nacional” — entre o global e o nacional, diríamoshoje.O interessante da sua colocação é a interpretação <strong>do</strong> desenvolvimentocomo um processo, através <strong>do</strong> qual é preciso preparar a transposição deum país <strong>do</strong> âmbito nacional para o internacional. Transposição que nãose pode improvisar, deixan<strong>do</strong> em liberdade as forças <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>. Ocaminho adequa<strong>do</strong> não tem si<strong>do</strong> nem a orientação exclusiva para o merca<strong>do</strong>interno nem a abertura ingênua (esta, menos ainda).Nas palavras de List, esse processo de desenvolvimento reflete a“missão da economia política (...): levar a cabo a educação <strong>econômica</strong> danação e prepará-la para o ingresso na sociedade universal <strong>do</strong> futuro.”Uma conclusão importante e atual. Com efeito, o caminho <strong>do</strong>desenvolvimento não está fora <strong>do</strong> país. Sem um desenvolvimento internoadequa<strong>do</strong> não há como intervir com êxito no nível mundial. Este poderiaser o reca<strong>do</strong> de List neste princípio <strong>do</strong> século XXI. E da mesma forma, seo desenvolvimento não está fora <strong>do</strong> país, fora estão os problemas <strong>do</strong>subdesenvolvimento. Mas esta última afirmativa não minimiza aimportância de que se reveste, no século XXI, a teoria da dependência,com influência tão marcante nas fases de “globalização”, quan<strong>do</strong> o FMI eo Banco Mundial elaboram a orientação e até mesmo a concepção dapolítica <strong>econômica</strong> de países como o Equa<strong>do</strong>r, em função <strong>do</strong>s interesses<strong>do</strong> capital financeiro transnacional.As palavras de Alfaro, além de demonstrar a sua visão como estadista,constituem um exemplo sugestivo <strong>do</strong> choque entre o protecionismo elivre-cambismo naqueles anos de bonança cacaueira. Alfaro não era77livro.pmd 7726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAfavorável a uma inserção ingênua <strong>do</strong> país no merca<strong>do</strong> mundial; buscavauma saída criativa que combinasse o externo com o interno, o que serefletiu no gerenciamento da dívida externa e na construção da estrada deferro para ligar as duas principais cidades equatorianas: Guayaquil e Quito.Esse conflito, que mostra o contraste de interesses <strong>do</strong>s grupos<strong>do</strong>minantes, não marcou uma concepção estratégica global. O apoiopúblico à produção de açúcar não provocou qualquer encadeamentoprodutivo digno de menção, nem foi parte de uma proposta com a qual oEqua<strong>do</strong>r pudesse ter processa<strong>do</strong> outra forma de inserção no merca<strong>do</strong>mundial. Enquanto se protegia a indústria açucareira, facilitou-se em certosperío<strong>do</strong>s a importação de to<strong>do</strong> tipo de produtos agrícolas: trigo, milho,ervilhas, feijão, cevada, grão de bico, banha e farinha. A própria ferroviafacilitava o fluxo desses produtos importa<strong>do</strong>s até os merca<strong>do</strong>s da Serra,até então “protegi<strong>do</strong>s” pela geografia.De qualquer forma, apesar <strong>do</strong> país não dispor de uma propostanacional para integrar-se com inteligência e planificadamente na economiainternacional, a Revolução Liberal, com a estrada de ferro e muitas obraspúblicas, bem como uma série de transformações políticas e sociais, atingiuem grande parte os seus objetivos e o seu compromisso histórico. Oliberalismo permitiu criar e garantir “as bases políticas e ideológicasnecessárias para o desenvolvimento <strong>do</strong> capitalismo equatoriano,” — umcapitalismo periférico — “no quadro da progressiva expansão <strong>do</strong>capitalismo monopolista internacional” (Moreano 1976, p. 138).Nesse cenário, “o apogeu <strong>do</strong> cacau configurou uma matriz defuncionamento da economia e da sociedade equatorianas de longa duração:agro-exporta<strong>do</strong>ra e periférica com relação ao sistema capitalista mundial.Embora a crise <strong>econômica</strong> tenha permiti<strong>do</strong> o surgimento de outros setoreseconômicos e sociais, que geraram uma dinâmica regional de tipo diferente,permaneceram subordina<strong>do</strong>s a essa matriz <strong>econômica</strong> mais ampla”(Chiriboga 1988, p. 109).Neste ponto não se pode também deixar de mencionar a influênciapositiva que teve a abertura <strong>do</strong> Canal <strong>do</strong> Panamá, no princípio <strong>do</strong> século78livro.pmd 7826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORXX. Essa obra facilitou a vinculação <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r com os merca<strong>do</strong>s maisimportantes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Vale lembrar que grande parte da carga comercial<strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, exportações e importações, precisava seguir para a Europaou a costa Leste <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s bordejan<strong>do</strong> o litoral Sul da América,ou então atravessar por terra o istmo centro-americano, depois de viagemmarítima até o Panamá. Por isso, o Equa<strong>do</strong>r era um <strong>do</strong>s países mais isola<strong>do</strong>sda América <strong>do</strong> Sul.Do fim da bonança cacaueira à crise prolongadaOs primeiros sintomas da crise <strong>do</strong> cacau foram senti<strong>do</strong>s em 1914.O porto de Hamburgo, por onde entrava na Europa uma parte importante<strong>do</strong> cacau equatoriano, encerrou suas operações logo no começo da PrimeiraGuerra Mundial. Ao mesmo tempo, caíam os preços <strong>do</strong> produto.Nesse mesmo ano o governo proibiu a exportação de váriasmerca<strong>do</strong>rias destinadas ao merca<strong>do</strong> interno, para impedir a sua falta, nomeio da guerra, geran<strong>do</strong> problemas de desabastecimento. Dessa formagarantia a reprodução da força de trabalho em condições vantajosas paraos grupos <strong>do</strong>minantes. Por outro la<strong>do</strong>, a proibição da importação deoutros tantos artigos dinamizou de algum mo<strong>do</strong> a atividade produtivalocal. De qualquer forma, as compras no exterior foram prejudicadas pelaconflagração internacional. A isso se acrescentou a drástica queda havidano financiamento <strong>do</strong> comércio exterior <strong>do</strong>s países da América Latinadurante o conflito mundial.Os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s saíram fortaleci<strong>do</strong>s da guerra, e embora nãointerviessem ativamente na política internacional <strong>do</strong> pós-guerra, a<strong>do</strong>tan<strong>do</strong>uma postura isolacionista, começaram a ter um papel econômicoprotagônico, enquanto a presença da Grã-Bretanha era afastada em algumasregiões <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, como a América Latina. Presente na região havia anos,o capital norte-americano começou a ocupar a posição <strong>do</strong>s investimentose empréstimos ingleses e de outros países europeus. O eixo capitalistamundial se deslocava de Londres para Nova York, e a dependência79livro.pmd 7926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAequatoriana acentuou sua vulnerabilidade externa, ao concentrarnovamente o seu comércio, mais <strong>do</strong> que antes, em um único país: osEsta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s.Posteriormente, entre 1920 e 1921, registrou-se outra fase críticana região, com duração muito maior no Equa<strong>do</strong>r, afeta<strong>do</strong> por problemassérios na produção e exportação de cacau.A crise <strong>econômica</strong> que se iniciava com os estragos causa<strong>do</strong>s pelaguerra e o levante arma<strong>do</strong> de quase quatro anos em Esmeraldas e Manabi,lidera<strong>do</strong> por Carlos Concha, porta-estandarte das idéias alfaristas, criou ascondições para que a economia fosse inundada por notas sem lastro, dan<strong>do</strong>início a um processo inflacionário crescente. Enquanto isso o Esta<strong>do</strong>aumentava sua dependência creditícia, e também política, das entidadesfinanceiras.Firmada a paz na Europa, a situação <strong>do</strong> cacau equatoriano secomplicou mais ainda com o surgimento de novos países exporta<strong>do</strong>res,ou seja, de mais competi<strong>do</strong>res. Essa maior competição provocou umexcesso de oferta que reduziu notavelmente os preços, com a conseqüentedeterioração <strong>do</strong>s termos de intercâmbio diante <strong>do</strong> incremento <strong>do</strong>s preçosde produtos importa<strong>do</strong>s.No começo da década de 1920 a receita da exportação de cacaucaiu drasticamente: em 1920, o preço <strong>do</strong> produto no merca<strong>do</strong> de NovaYork baixou de 26,76 para 12,00 dólares o quintal, chegan<strong>do</strong> a 5,75 dólaresem 1921. Além da queda <strong>do</strong> preço, desde 1917 a produção equatorianafoi afetada pela praga da monilla e pela vassoura de bruxa, ainda maisdevasta<strong>do</strong>ra.Problemas ambientais têm acompanha<strong>do</strong> sistematicamente as crisesequatorianas: inundações, estiagens, contaminações e pragas derivadas damonocultura, além de outras causas naturais, como terremotos. Veja-se,por exemplo, o que ocorreu na crise dessa época e, posteriormente, em1982-3, 1987 e 1997-9 (vide evolução <strong>do</strong> PIB na Tabela 8).Em 1923 as exportações de cacau somaram 643 mil quintais; em1924, 663 mil; em 1925, 702 mil; em 1926, 447 mil — queda ainda mais80livro.pmd 8026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORdramática se a compararmos com as vendas totais de cacau no merca<strong>do</strong>internacional naquele ano: 1.079.252 quintais. Quan<strong>do</strong> começou arecuperação <strong>do</strong>s preços, em 1924, o Equa<strong>do</strong>r perdera a capacidade derecuperar o terreno perdi<strong>do</strong>, devi<strong>do</strong> às pragas que afetavam a produção.O valor global das exportações, que em 1920 tinha supera<strong>do</strong> pelaprimeira vez os 20 milhões de dólares, no ano seguinte foi de apenaspouco mais de 9 milhões, e após uma breve reação voltou a cair para 7,5milhões em 1923. A participação <strong>do</strong> cacau nas vendas externas <strong>do</strong> paísdiminuiu de 77,3% em 1914 para 40,4% em 1918, subin<strong>do</strong> depois a 71,3%em 1920, para tornar a cair, atingin<strong>do</strong> 29% em 1930.Como era natural, para completar esse quadro econômico de criseo dólar disparou de 2,25 sucres em 1920 para 5,40 em novembro de 1923:uma desvalorização da moeda nacional de 140%; em 1924 seu valor médiofoi de 5,03 sucres (vide Tabela 2). Essa desvalorização permitiu sustentara competitividade das exportações equatorianas, pelo menostemporariamente, aumentan<strong>do</strong> a rentabilidade <strong>do</strong>s exporta<strong>do</strong>res. Duranteesses anos, a administração <strong>econômica</strong> transferiu o ônus <strong>do</strong> ajuste daeconomia para os setores majoritários, como aconteceu mais de uma vezao longo da <strong>história</strong> republicana.A desvalorização <strong>do</strong> sucre se explica também pelas pressões fiscaisresultantes <strong>do</strong> serviço da dívida pública.Assim, o fim <strong>do</strong> apogeu cacaueiro foi resulta<strong>do</strong> da evolução <strong>do</strong>merca<strong>do</strong> mundial, e o mesmo aconteceria nos anos 1950 e 1960 com abanana e nos anos 1980 e 1990 com o petróleo. No entanto, a crise dadécada de 1920 provocou o perío<strong>do</strong> mais longo de instabilidade política,além de uma recessão quase crônica, sem comparação nas outras fases davida da nação.O capital acumula<strong>do</strong> com o boom <strong>do</strong> cacau não serviu para diversificara estrutura produtiva, mas quase exclusivamente para ampliar amonocultura e sustentar o consumo suntuário de artigos importa<strong>do</strong>s. Estaaliás é outra das manifestações características das épocas de bonança: bastapensar nos anos <strong>do</strong> apogeu petrolífero, na década de 1970.81livro.pmd 8126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAO Relatório Anual de 1923 apresenta<strong>do</strong> ao Congresso peloMinistério da Fazenda já reconhecia essa situação: “a causa primária deto<strong>do</strong>s esses fenômenos decorre <strong>do</strong> fato de que produzimos muito poucasmerca<strong>do</strong>rias suscetíveis de demanda externa, e por outro la<strong>do</strong> consumimosmuitos produtos estrangeiros” (vide Moreano 1976, p. 160). Essaapreciação poderia ser completada com o reconhecimento de que não sehavia promovi<strong>do</strong> a produção interna para satisfazer as necessidades damaioria <strong>do</strong>s equatorianos, pois também não havia a intenção de desenvolvero merca<strong>do</strong> interno como ponto de partida para uma efetiva estratégianacional de participação na economia mundial.Um <strong>do</strong>s primeiros efeitos da crise <strong>do</strong> cacau foi o desemprego e oressurgimento de formas precárias de produção, como o cultivo de arrozmediante parceria, cujo resulta<strong>do</strong> imediato foi o aumento da pobreza. Emseguida, a miséria das massas provocou protestos crescentes, com amobilização de vários grupos que queriam reivindicar os seus direitos eexpressar as suas aspirações. As reclamações de trabalha<strong>do</strong>res, artesãos ecamponeses se sucediam em to<strong>do</strong> o país, desembocan<strong>do</strong> na greve geral eno massacre de 15 de novembro de 1922, em Guayaquil. Enquanto nomaior porto <strong>do</strong> país havia “o batismo de sangue da classe operária”, naSerra os levantes indígenas eram castiga<strong>do</strong>s com severidade.Uma das reivindicações <strong>do</strong>s setores populares era a baixa <strong>do</strong> dólar,e um esquema de controle cambial, a ser assumi<strong>do</strong> pelo governo, que seviu assim obriga<strong>do</strong> a a<strong>do</strong>tar uma série de leis para regular a economia,como a <strong>do</strong> embargo à transferência de fun<strong>do</strong>s, abolida em 1924, enquantopromovia um acor<strong>do</strong> inter-bancário para impedir que o meio circulantecontinuasse diminuin<strong>do</strong>.Para enfrentar os primeiros choques da crise havia-se instituí<strong>do</strong>igualmente uma Associação de Agricultores, que em 1917 e 1919 contratoucréditos com o Mercantile Bank of the Americas. Nessa época o gerenciamentoda política <strong>econômica</strong>, particularmente <strong>do</strong>s aspectos monetários efinanceiros, ainda recaía nos bancos particulares, muitos <strong>do</strong>s quais tinhama faculdade de emitir papel moeda.82livro.pmd 8226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORA hegemonia <strong>do</strong> “placismo” (posição <strong>do</strong>s partidários <strong>do</strong> GeneralLeônidas Plaza Gutiérrez), que cristalizou grande parte das transformaçõesliberais voltadas para o enfraquecimento <strong>do</strong> poder econômico e políticoda Igreja latifundiária, consoli<strong>do</strong>u o acor<strong>do</strong> alcança<strong>do</strong> entre os exporta<strong>do</strong>resda Costa e os ruralistas da Serra. Em conseqüência, muitas transformaçõesliberais não passaram de mudanças no papel, incapazes de influir nosmecanismos de produção da Serra.Em pleno governo <strong>do</strong> General Plaza Gutiérrez, o Gerente <strong>do</strong> BancoComercial e Agrícola, Francisco Urbina Ja<strong>do</strong> (conheci<strong>do</strong> como “o grandeeleitor”, devi<strong>do</strong> à sua influência), já controlava, direta ou indiretamente, asnomeações de presidentes, ministros, legisla<strong>do</strong>res, e decidia muitas dasmedidas <strong>econômica</strong>s a<strong>do</strong>tadas na ocasião: vivia-se a “hora Urbinaja<strong>do</strong>”. Assim,as eleições presidenciais eram feitas simplesmente por “imposição e fraude”.A liberdade cambial e financeira então existente no Equa<strong>do</strong>r eraquase total. O governo central dependia <strong>do</strong>s créditos das entidadesfinanceiras privadas, que por sua vez controlavam o poder político; e aburguesia agro-exporta<strong>do</strong>ra e financeira, ou seja, a bancocracia, detentoradesse poder político, procurava reajustar a política <strong>econômica</strong>, com oobjetivo de amoldar a economia às novas circunstâncias, sem alterar oprocesso de reprodução <strong>do</strong> capital. Em outras palavras, transferin<strong>do</strong> asperdas para a maioria da população.O fim <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio plutocrático e a missão KemmererNessas circunstâncias, ao inaugurar-se um perío<strong>do</strong> de depressão<strong>econômica</strong> prolongada, agravada pela imoralidade <strong>do</strong> governo, odescontentamento social foi canaliza<strong>do</strong> pelo Exército, que provocou atransformação de 9 de julho de 1925: movimento inspira<strong>do</strong> pela oficialidadejovem, com o apoio de setores da classe média, mas que terminaria porharmonizar seus interesses com os grupos tradicionais.Passa<strong>do</strong>s os primeiros momentos desse levante, chegou a hora <strong>do</strong>s“caciques” políticos da Serra recuperarem sua posição, em um ambiente83livro.pmd 8326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAem que outros grupos lutavam também por um espaço no cambiantecenário nacional. Não se pode esquecer que o setor industrial da Serra era<strong>do</strong>mina<strong>do</strong> por algumas empresas têxteis, uma espécie de prolongamento<strong>do</strong>s latifúndios e <strong>do</strong>s obrajes, com várias características <strong>do</strong> sistema deexploração colonial. Por outro la<strong>do</strong>, grupos artesanais em decomposiçãopovoavam os subúrbios das grandes cidades, em especial Guayaquil, ondeas propostas populistas encontrariam um terreno fértil — em particular ovelasquismo, nova expressão da aliança <strong>do</strong>minante, que a partir de 1934passou a influir de forma decisiva na vida <strong>do</strong> país.Em novembro de 1925, como parte <strong>do</strong> incipiente projeto deindustrialização da Revolução de Julho, promulgou-se uma Lei de Proteçãodas Indústrias Nacionais, e em seguida a Lei de Tarifas e Taxas Aduaneiraspara proteger a indústria têxtil. Em 1921 já tinha havi<strong>do</strong> a Lei de Fomentoao Desenvolvimento das Indústrias, como parte das medidas <strong>econômica</strong>spara enfrentar a crise, e antes disso, em 1906, a Lei de Proteção Industrial.Com tarifas mais altas pretendia-se aumentar a rentabilidade <strong>do</strong>s industriais.No entanto, esses esforços protecionistas, que provocaram uma reação<strong>do</strong>s importa<strong>do</strong>res da Costa, não podem ser vistos como parte de umapolítica global de industrialização mediante a substituição de importações,que viria bem mais adiante.Nestas primeiras décadas <strong>do</strong> século XX, além das decisões tomadaspara proteger a indústria <strong>do</strong> açúcar, houve outros esforços destina<strong>do</strong>s asubstituir as importações de óleos e graxas. Outras manufaturas protegidasforam os curtumes, as fábricas de sapatos, as cervejarias, a fábrica defósforos e outras unidades da indústria de alimentos.Como aconteceu com a “revolución juliana”, e mais tarde com a“gloriosa” de maio de 1944, novas alianças de várias classes — precisamenteas que discrepavam <strong>do</strong> modelo de exportação primária — tentaramconquistar o poder para modificar o processo de acumulação em vigor.No entanto, essas tentativas não conseguiram consolidar um novo processode acumulação que produzisse internamente o que antes era importa<strong>do</strong>— o modelo de acumulação basea<strong>do</strong> na industrialização substitutiva das84livro.pmd 8426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORimportações que precedeu de muito a criação da CEPAL, no fim <strong>do</strong>s anos1940 — como aconteceu em outros países da América Latina. A despeitoda crise externa, o setor exporta<strong>do</strong>r equatoriano manteve sempre o controlepre<strong>do</strong>minante <strong>do</strong> país em termos econômicos e também políticos.De qualquer forma, nesses anos mudaram as alianças sociais e osconflitos de poder, assim como o papel <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, e de certa formatambém o tipo de política <strong>econômica</strong>, precisamente para favorecer deforma sistemática os novos grupos <strong>do</strong>minantes. Configurou-se um Esta<strong>do</strong>regula<strong>do</strong>r, desenvolvi<strong>do</strong> lentamente no meio de uma crise ampla ecomplexa. Força<strong>do</strong> pelos problemas <strong>do</strong> cacau, e suas seqüelas, e não porqualquer ação estatizante, o Esta<strong>do</strong> começou a intervir mais ativamentena vida <strong>econômica</strong>, assumin<strong>do</strong> função modera<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> sistema deacumulação capitalista.Com base nas recomendações da missão Kemmerer foram cria<strong>do</strong>suma série de instrumentos governamentais: o Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r,a Superintendência de Bancos, a Controla<strong>do</strong>ria Geral <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, a Caixade Pensões, a Diretoria Geral das Alfândegas, a Diretoria Geral <strong>do</strong> Tesouro,a Diretoria Geral de Receitas, a Diretoria Geral <strong>do</strong> Orçamento, a DiretoriaGeral de Obras Públicas, entre outras entidades, as quais, embora comoutros nomes, constituem ainda, neste início <strong>do</strong> século XXI, eixosimportantes <strong>do</strong> aparelho diretor <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> na área <strong>econômica</strong>. Ao mesmotempo, essa missão promoveu uma série de leis e regulamentos monetáriose fiscais.Com a criação <strong>do</strong> Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, em 4 de março de1927, o Esta<strong>do</strong> assumiu o monopólio da emissão de moeda, que até entãoestava em mãos <strong>do</strong> sistema bancário priva<strong>do</strong>. E desde então o BancoCentral passou a ocupar um lugar destaca<strong>do</strong> na vida <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> país.A ação dessa missão e as políticas que inspirou serviram paraconsolidar o sistema econômico e permitiram uma relativa reformulação<strong>do</strong> vínculo <strong>do</strong> país com a divisão internacional <strong>do</strong> trabalho, nas mesmasbases <strong>do</strong> estilo de crescimento volta<strong>do</strong> para fora, porém com maiorparticipação estatal.85livro.pmd 8526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAPor outro la<strong>do</strong>, a reordenação financeira impulsionada pela missãoKemmerer levou à a<strong>do</strong>ção de uma administração deflacionista daeconomia, visan<strong>do</strong> criar a ansiada estabilidade monetária. Houve uma queda<strong>do</strong>s preços, contrastan<strong>do</strong> com a tendência inflacionária pre<strong>do</strong>minante nosanos anteriores, quan<strong>do</strong> as despesas fiscais eram financiadas com certafacilidade, mediante créditos <strong>do</strong>s bancos priva<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> o BancoComercial e Agrícola o principal prestamista.Em 1927 a<strong>do</strong>tou-se pela segunda vez o padrão ouro, que sópermaneceu em vigor durante quatro anos e meio. Nesse perío<strong>do</strong>, porém,quan<strong>do</strong> a crise internacional se difundia pelo mun<strong>do</strong> em círculosconcêntricos, e o pânico financeiro destruía as bases <strong>do</strong> comérciointernacional, não foram tomadas as medidas apropriadas para enfrentara “sangria áurea”, como Víctor Emilio Estrada definiu a evasão maciça deouro. Em troca de 5 sucres se conseguia um dólar em ouro, com valormuito maior no merca<strong>do</strong> internacional. Essa fuga de capitais piorou aindamais a depressão, crian<strong>do</strong> um ambiente em que a sobrevalorização <strong>do</strong>sucre estimulava as importações e não as exportações: fenômeno registra<strong>do</strong>toda vez que se procurou manter forçosamente um tipo de câmbio rígi<strong>do</strong>.Foi contrata<strong>do</strong> um crédito com a companhia sueca de Ivan Kreugerno valor de <strong>do</strong>is milhões de dólares, em troca de um monopólio de 25anos para importar e fabricar fósforos no país, o qual iria ter sériasrepercussões na economia e na vida política <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r. Com essesrecursos foi funda<strong>do</strong> o Banco Hipotecário <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, para apoiar aagricultura, entidade que colocou cinco milhões de sucres em ações noexterior. A entrega <strong>do</strong> monopólio a uma empresa estrangeira provocouprotestos e oposição generalizada, sobretu<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> se soube da quebrafraudulenta da companhia sueca. O assunto contribuiria assim para a queda<strong>do</strong> Presidente Isidro Ayora.Em 1931 ainda se pagou à empresa sueca, mas no ano seguinteesses pagamentos foram suspensos, como aconteceu também em váriospaíses da América Latina e de outras regiões. Nessa oportunidade, noEqua<strong>do</strong>r a suspensão <strong>do</strong>s pagamentos foi forçada pelos protestos gerais;86livro.pmd 8626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORa opinião pública via com angústia a diminuição <strong>do</strong>s recursos <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>devi<strong>do</strong> ao serviço da dívida externa.A sobrevalorização <strong>do</strong> sucre chegou ao fim em 8 de fevereiro de1932, depois que o presidente <strong>do</strong> Sena<strong>do</strong> Alfre<strong>do</strong> Baquerizo Moreno,encarrega<strong>do</strong> <strong>do</strong> Poder, na mensagem ao Congresso Nacional de 1931declarou que “a moeda está sã mas tu<strong>do</strong> o mais está <strong>do</strong>ente”. Essepresidente interino, que já tinha si<strong>do</strong> presidente constitucional, teve quedecretar a inconversibilidade <strong>do</strong> sucre e, um pouco mais tarde, o embargodas transferências de fun<strong>do</strong>s. Concretamente, era uma nova desvalorização,materializada em fins de 1933.Nessa ocasião o governo solicitou ao Banco Central o primeirocrédito, o que provocou um conflito, resolvi<strong>do</strong> pela mediação de um grupode cidadãos, que obteve o apoio <strong>do</strong> Presidente eleito Neptalí Bonifaz.Essa personagem, representante <strong>do</strong>s grandes latifundiários e que, comoprimeiro Presidente <strong>do</strong> Banco Central chegou a propor a entrega das ilhasGalápagos aos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, em troca da dívida externa, nunca chegoua tomar posse da Presidência. Foi questiona<strong>do</strong> pela sua origem peruana, oque provocou em Quito a chamada “guerra <strong>do</strong>s quatro dias”, de 27 deagosto a primeiro de setembro de 1932.Neste ponto cabe recordar que a missão Kemmerer, contratada efinanciada pelo governo nacional, teve o beneplácito <strong>do</strong> Departamentode Esta<strong>do</strong> norte-americano, interessa<strong>do</strong> em modernizar o sistemamonetário e fiscal de muitos países. Um <strong>do</strong>s seus objetivos era procurarmelhorar as relações diplomáticas e promover a reabilitação <strong>do</strong> créditoexterno <strong>do</strong>s países assessora<strong>do</strong>s.Os trabalhos da Comissão tiveram amplo apoio social e político,atribuin<strong>do</strong>-se a eles muitas das reformas destinadas a modernizar o Esta<strong>do</strong>.No entanto, não faltaram críticas, como a de José Peralta, de Cuenca, ogrande ideólogo liberal. Ele argumentava que:“Assim, os meios preferi<strong>do</strong>s por esse temível conquista<strong>do</strong>r [osEsta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s] não são nem exércitos numerosos nem formidáveis87livro.pmd 8726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAesquadras: elementos de ordem e destruição que costuma ostentar adterrorem, reserva para quan<strong>do</strong> seja imprescindível apoiar com o canhão suapolítica astuta, reforçar com a espada as redes em que envolvem os paísesconquistáveis. A vanguarda ianque é o dólar, em suas múltiplas fases,infinitas combinações, suas diversas formas de laço, hipócrita e certeiro,estendi<strong>do</strong> com habilidade em torno das vítimas cobiçadas.“E os sapa<strong>do</strong>res a serviço <strong>do</strong> dólar são as missões financeiras, grupossapientes de malabaristas que lhes oferecem maravilhas e prodígios àsmultidões ignaras. São os expertos em bancos e alfândegas, oscontrola<strong>do</strong>res e assessores técnicos que os ianquizantes cegos e imbecisalugam e pagam esplendidamente para que escravizem o seu país; são osprestamistas filântropos que entregam os seus milhões a governos ladrõesou esfaimantes, sobre a prenda preciosa que é a independência nacional”(Peralta 1983, p. 13).”Apesar da missão Kemmerer, ou talvez por sua culpa — dan<strong>do</strong>razão às críticas frontais de Peralta — o Equa<strong>do</strong>r viveu nesses anos umperío<strong>do</strong> difícil.Aprofundada pela Grande Depressão, a crise <strong>do</strong> cacau deixou opaís sem capitais para fazer a reconversão da estrutura produtiva para aindústria, ou para promover maior tecnificação agrícola. Somou-se a issoa inexistência de um grupo empresarial dinâmico e inova<strong>do</strong>r, que superasseo “facilitário” da produção agrícola extensiva baseada no sistema de grandesfazendas, viável pelas características nacionais e pela possibilidade decontratar trabalha<strong>do</strong>res com salários miseráveis. Tu<strong>do</strong> isso no quadro dainexistência de um merca<strong>do</strong> nacional dinâmico, cujo desenvolvimentoprecisaria passar pela redução <strong>do</strong> poder <strong>do</strong>s latifundiários e a melhoriadas condições de vida <strong>do</strong>s camponeses.Com este ambiente, não surpreende que naquela época a exportaçãovoltasse a cair: em 1928 ela se aproximara <strong>do</strong>s 15 milhões de dólares, parachegar a 4,2 milhões em 1933, em uma curva de queda contínua. Essa88livro.pmd 8826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORtendência recessiva coincidia com o que estava acontecen<strong>do</strong> em nívelmundial, e agravava muito mais a situação <strong>econômica</strong> já crítica em que seencontrava o país desde a crise da produção e das vendas externas <strong>do</strong>cacau. Os principais produtos de exportação eram agrícolas: algodão, arroz,açúcar, cacau, café e o marfim vegetal (tagua), juntamente com produtosminerais, especialmente o ouro e um pouco de petróleo.Curiosamente, nessa fase a indústria têxtil da Serra foi a menosafetada, e conseguiu ajustar-se com relativa rapidez às condiçõescambiantes, o que tornou ainda mais sérias as controvérsias com osimporta<strong>do</strong>res da Costa. Esses industriais foram mais protegi<strong>do</strong>s pelosefeitos da crise internacional <strong>do</strong> que por qualquer política governamentalefetiva de apoio. Não havia ainda o modelo de substituição de importações,que surgiria mais tarde — concretamente, a partir de 1965, se aceitamos aindicação de Carlos Larrea, um <strong>do</strong>s principais pesquisa<strong>do</strong>res dessa época.A despeito de todas as tentativas <strong>do</strong> governo para promover umareintrodução <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r na economia internacional em condições maisadequadas, e naturalmente para assegurar o pagamento das obrigaçõesexternas contratadas — requisito para a concessão de novos créditos —,não foi possível resolver os problemas existentes: o déficit fiscal, ocrescimento anormal <strong>do</strong> meio circulante, o protecionismo no merca<strong>do</strong>internacional, a falta de confiança <strong>do</strong>s investi<strong>do</strong>res, a incerteza e a falta dediretrizes pre<strong>do</strong>minantes no país, a inexistência de uma proteção social e<strong>econômica</strong> da agricultura, a realização de um “plano integral ingênuo esimultâneo de obras públicas”, financia<strong>do</strong> com novos impostos ou asimples emissão de papel moeda, entre outros fatores negativos.Victor Emilio Estrada, um <strong>do</strong>s primeiros e mais destaca<strong>do</strong>s ministrosda economia das primeiras horas <strong>do</strong> “velasquismo”, considerava tambéma evasão de capitais como um <strong>do</strong>s fatos mais preocupantes, que agravavaa crise. Estimava-se então que os capitais equatorianos no exterior (saí<strong>do</strong>s<strong>do</strong> país de diversas formas e com as justificativas mais variadas) superavammetade <strong>do</strong> ouro deposita<strong>do</strong> no Banco Central. “Era uma morbidezcoletiva”, comentaria Estrada (1931, p. 209).89livro.pmd 8926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAVale a pena comparar essa evolução com o contexto internacional.A Grande Depressão afetou to<strong>do</strong>s os países da América Latina. Entre1929 e 1938 o Brasil cresceu 2,5% per capita, a Colômbia 2,1%, a Argentinae o Chile registraram taxas negativas (vide Tabela 27). O Equa<strong>do</strong>r, que em1930 tinha cerca de 2,16 milhões de habitantes, experimentou umestancamento da sua economia, que havia cresci<strong>do</strong> 1,6% entre 1913 e1929 (Hofman, 1992, p. 5).Parênteses: a Segunda Guerra MundialA Segunda Guerra Mundial (1939-45) proporcionou um certo alívioà crise, pelo aumento das exportações, embora tenha limita<strong>do</strong> o fluxo dasimportações.Uma maior demanda de produtos agrícolas se refletiu no país compreços mais altos e maior receita. As exportações <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, que seencontravam em fase de baixa, foram revitalizadas sobretu<strong>do</strong> pelas vendasde madeira de balsa, borracha e chapéus de palha. Outros produtosimportantes eram café, cascarilha, marfim vegetal, arroz, e em menormedida o petróleo e o ouro, o que explica os diferentes impactos regionais,próprios da desarticulação da economia. Em 1946 o arroz passaria a ser oprincipal ítem de exportação.Os produtos tradicionais, como o cacau, mantiveram sua base naCosta. Os chapéus de palha (conheci<strong>do</strong>s como “chapéus panamá”)vincularam alguns grupos de Cañar e Azuay ao merca<strong>do</strong> mundial, atravésda Serra meridional, pois há alguns anos a produção desses chapéus seexpandira de Manabi para o Sul. A Amazônia começou a exportar ouro,balsa e borracha.O cacau chegou a representar menos da metade das exportações, eo restante foi coberto pelos produtos menciona<strong>do</strong>s, sem que se possadizer que isso resultasse de uma autêntica estratégia de diversificação.Adicionalmente, houve um certo retorno daqueles capitais que procuravamum ambiente mais seguro <strong>do</strong> que os da Europa convulsionada.90livro.pmd 9026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORDe qualquer forma, pre<strong>do</strong>minou o modelo da acumulação com basenas exportações primárias. E também não havia condições para desenvolvera indústria, com em alguns países vizinhos, onde as manufaturas locaiscompensaram a redução das importações provocada pela GrandeDepressão e depois pela guerra. Inexistiam no país capitais suficientes, eestes eram em parte desperdiça<strong>do</strong>s com importações suntuárias. Alémdisso, a burguesia equatoriana era incapaz de promover e consolidar ummodelo de acumulação basea<strong>do</strong> na industrialização mediante a substituiçãode importações. No entanto, nessa época começaram a ser tomadasalgumas medidas destinadas a instrumentar uma solução para os problemasenfrenta<strong>do</strong>s pelo país, e a busca de uma moeda estável era uma dasprincipais metas da política <strong>econômica</strong>.No entanto, a recuperação <strong>econômica</strong> da década de 1940 foi relativa.“Enquanto a maioria da população vivia em condições muito precárias, aselites tinham uma renda muito elevada. ... Para as pessoas <strong>do</strong> povo deviaser um choque observar o enriquecimento <strong>do</strong>s comerciantes, banqueirose latifundiários, enquanto as condições em que elas viviam continuavam ase deteriorar”, lembra Carlos de la Torre Espinosa em uma análise profundadessa época (1993, p. 80).A explosiva situação social, política e <strong>econômica</strong> vivida pelo Equa<strong>do</strong>rexplica em larga medida “a gloriosa”, o levante militar e popular de 1944que pôs fim ao regime de Carlos Alberto Arroyo del Río, levan<strong>do</strong> aopoder Velasco Ibarra, pela segunda vez.As pessoas se indignavam com a corrupção, em um ambiente defrustração crescente devi<strong>do</strong> à mutilação <strong>do</strong> território nacional em função<strong>do</strong> Protocolo <strong>do</strong> Rio de Janeiro, de janeiro de 1942, quan<strong>do</strong> tropas peruanasinvadiram a província de El Oro. A derrota de 1941 foi um acontecimentotraumático para toda a sociedade, que identificou o governo liberal comoo principal responsável.Convém recordar aqui que a antiga pendência territorial foicrescen<strong>do</strong> gradualmente desde o início da República, em particular pelafraqueza e incapacidade das oligarquias, que não souberam estruturar um91livro.pmd 9126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAprojeto nacional. E não se pode ignorar também a atitude <strong>do</strong> governonorte-americano, que não só não interveio para impedir a agressão como,apoia<strong>do</strong> pelos outros participantes <strong>do</strong> grupo de quatro países “garantes”(Argentina, Brasil, Chile e Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s) impôs os termos <strong>do</strong> Protocolo<strong>do</strong> Rio, argumentan<strong>do</strong> com a necessidade de manter a unidade <strong>do</strong>continente contra a agressão japonesa em Pearl Harbor.Nessa mesma ocasião, sem contar com a aprovação <strong>do</strong> governoequatoriano os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s instalaram bases militares na península deSanta Elena e em uma das ilhas Galápagos, em nome da defesa continental.Situação que se repetiria no fim <strong>do</strong> século, quan<strong>do</strong>, dan<strong>do</strong> as costas para asociedade equatoriana, os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s obtiveram para suas tropas umabase militar em Manta, esgrimin<strong>do</strong> o pretexto de combater o narcotráfico,quan<strong>do</strong> na verdade sua intenção era garantir um local estratégico paraintervir na luta contra a guerrilha colombiana, ao la<strong>do</strong> das forças armadasdaquele país.Por mais breve que seja, uma <strong>história</strong> <strong>econômica</strong> da República noséculo XX não estaria completa se não mencionasse essas relaçõescomplexas com a maior potência mundial, país que em repetidasoportunidades impôs ao Equa<strong>do</strong>r suas condições, e não apenas por via dapressão diplomática.A chegada das grandes companhias estrangeirasNessa época o Equa<strong>do</strong>r ainda atraia um fluxo pouco significativode inversões estrangeiras. A exceção era algumas empresas que procuramexplorar os recursos petrolíferos, e os investimentos pre<strong>do</strong>minantes eramos norte-americanos, que em 1930 chegavam a quase 21 milhões de sucres.No entanto, é preciso registrar a chegada, desde os primeiros anos<strong>do</strong> século XX, de alguns capitais que começaram a explorar as riquezasnacionais e em alguns casos deram início a projetos relativamenteambiciosos de exploração mineral ou agrícola. Na década de 1930 já tinhamsi<strong>do</strong> firma<strong>do</strong>s vários contratos de mineração e exploração de petróleo.92livro.pmd 9226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORNa península de Santa Elena surgiam os logotipos de vários gruposinternacionais: Anglo Ecua<strong>do</strong>rian Oilfields Ltd., Ecua<strong>do</strong>r Oilfields Ltd., CarolinaOil Company, International Petroleum Company, Concepción Ecua<strong>do</strong>rian OilfieldsLtd. e Petropolis Oil Company.Esses grupos demonstraram oportunamente o seu interesse pelasriquezas petrolíferas da região amazônica, mas só no fim da décadapuderam concretizá-lo. Com base em contrato de agosto de 1937, a AngloSaxon Petroleum Company Ltd., filial da Royal Dutch Shell, deu início a seustrabalhos, para aban<strong>do</strong>ná-los alguns anos depois por não haver encontra<strong>do</strong>petróleo, segun<strong>do</strong> a sua versão.Embora limitada, a atividade petrolífera provocou uma crise nosmecanismos de produção de certos setores que monopolizavam a mão deobra indígena na Amazônia. Nessa região, sobretu<strong>do</strong> nos anos da SegundaGuerra Mundial, além das companhias de petróleo trabalhavam empresasvinculadas ao merca<strong>do</strong> nacional, e ainda não ao internacional, dedicadas àprodução de borracha, balsa e ouro, assim como grupos de missionáriosevangélicos.Outra das mais importantes empresas estrangeiras era a SouthAmerican Development Company, subsidiária da Vanderbilt. Conhecidasimplesmente como SADCO, explorava ouro em Portovelo, província deEl Oro, à qual haviam retorna<strong>do</strong> os minera<strong>do</strong>res ingleses, franceses,americanos e nacionais, depois de uma certa queda nessa atividade, noprincípio da República. A partir <strong>do</strong>s primeiros anos <strong>do</strong> século XX osamericanos se instalaram na região com a SADCO. Na década de 1930,após uma exploração centenária, as minas ainda produziam diariamentecerca de 450 toneladas de quartzo de alto rendimento metalúrgico.Um caso digno de menção é o da Empresa Eléctrica del Ecua<strong>do</strong>r(EMELEC), instalada logo depois da transformação política de julho de1925, quan<strong>do</strong> um grupo de jovens oficiais acabou com o <strong>do</strong>mínioplutocrático. Para a produção, transmissão e distribuição de eletricidade aMunicipalidade de Guayaquil outorgou uma concessão a grupo deinvesti<strong>do</strong>res norte-americanos dispostos a “arriscar” seus capitais durante93livro.pmd 9326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAsessenta anos, em troca de 2% <strong>do</strong> rendimento bruto <strong>do</strong> fornecimento deenergia elétrica. Além disso, foram beneficia<strong>do</strong>s com o uso gratuito deterrenos, estradas, ruas, praças e locais públicos, bem como com ocompromisso de que nenhuma outra entidade lhe cobraria impostos,contribuições ou ônus de qualquer tipo.Durante 41 anos essa empresa “correu o risco” de fornecer energiaelétrica nas condições <strong>do</strong> contrato inicial, até que, em 1966, quan<strong>do</strong> jáagonizava o triunvirato militar, foi assina<strong>do</strong> um decreto garantin<strong>do</strong>-lheadicionalmente o rendimento líqüi<strong>do</strong> mínimo de 9,5% sobre o capitalinvesti<strong>do</strong> em dólares. Porcentagem que não podia ser reduzida por qualquerrazão, mesmo tributária. No anos 1970, durante o governo “revolucionárioe nacionalista” das Forças Armadas, a EMELEC conseguiu incluir essascondições excepcionais na Lei Básica de Eletrificação de 1974, livran<strong>do</strong>seassim <strong>do</strong> pagamento <strong>do</strong> imposto sobre transações mercantis e serviços,para manter a porcentagem fixada de rentabilidade mínima.Em 1985 esgotou-se o contrato de sessenta anos, mas a EMELECcontinuou a “arriscar” seu capital como empresa estrangeira, e desde 1993como inversão nacional. Um esquema paternalista, com o qual o Esta<strong>do</strong>assumiu o encargo de pagar as dívidas da empresa, incluin<strong>do</strong> as queacumulara com CEPE/Petroecua<strong>do</strong>r, pela fornecimento de combustível;com o Ministério da Fazenda e com outros cre<strong>do</strong>res.As empresas estrangeiras tiveram no Equa<strong>do</strong>r um tratamentofavorável e, em não poucas oportunidades, seus representantes seincrustaram no âmbito governamental, incumbin<strong>do</strong>-se não só de que oseu investimento ingressasse no país mas sobretu<strong>do</strong> de zelar pela obtençãode reformas da legislação que as favorecessem. Essa intromissão ocorreu,por exemplo, no setor <strong>do</strong> petróleo, em que as próprias instâncias de controleestatal chegaram a ser dirigidas pelos próprios diretores da Anglo. E voltariaa acontecer de forma perversa, quan<strong>do</strong> a direção das empresas estatais foiassumida por personalidades claramente interessadas na sua privatização,ou por pessoas desconhece<strong>do</strong>ras <strong>do</strong> seu campo de atividade, com o que oseu funcionamento decaiu quase que de forma planejada.94livro.pmd 9426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORA banana impulsiona e integra o paísAo terminar os anos 1940, e com mais força ainda na décadaseguinte, a produção e exportação de banana (produto originário da Ásia,como o arroz) resgatou o país de uma fase depressiva. Começou assimuma nova expansão da economia, que alentou as relações externas <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r. Diferentemente <strong>do</strong> que aconteceu com o cacau, a ampliação dafronteira agrícola com pequenos e médios produtores viabilizou a ascençãode outros grupos sociais, e até mesmo o surgimento de novos centrosurbanos.No entanto, mais uma vez o impulso vinha de fora: foi a demandaexterna que promoveu a cultura da banana, que incidiria profundamentena economia e na sociedade equatorianas. Embora já tivesse havi<strong>do</strong> algumascompras de terra para o cultivo da banana por parte de empresasestrangeiras, nos anos 1930, e desde 1944 houvesse um certo apoiogovernamental a essa produção, seus efeitos estimulantes só seriam senti<strong>do</strong>spela economia nos últimos anos da década de 1940.Como acontecera antes com o cacau, o país dispunha de várioselementos favoráveis à produção da fruta. No entanto, eles não eramsuficientes para promover o apogeu da cultura e exportação da banana.Finda a Segunda Guerra Mundial, aumentaram as exportações debanana, aproveitan<strong>do</strong> uma série de elementos conjunturais e estruturaisque melhoraram substancialmente as vantagens comparativas <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r.Na América Central houve problemas com a cultura dessa fruta, devi<strong>do</strong> à<strong>do</strong>ença conhecida como “mal <strong>do</strong> Panamá” e a “sigatoka”, o que fez comque as empresas transnacionais interessadas buscassem novas fontes deabastecimento. A demanda aumentara de forma significativa, especialmentenos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e na Europa, e entre 1948 e 1952 a companhia UnitedFruit se ofereceu para assessorar o governo <strong>do</strong> Presidente Galo Plaza. Emconseqüência foi a<strong>do</strong>tada uma política que aproveitou a existência deamplas zonas para plantar banana, com mão de obra barata e apoiogovernamental para a instalação de infra-estrutura.95livro.pmd 9526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTASimultaneamente com algumas transformações que permitiramrecuperar o nível das exportações, deprimi<strong>do</strong> desde a crise <strong>do</strong> cacau, houvetambém algumas mudanças qualitativas, refletin<strong>do</strong>-se no fortalecimento<strong>do</strong>s setores comercial e financeiro vincula<strong>do</strong>s às exportações agrícolas.Além disso, em 1950 foi decretada uma nova desvalorização, na tentativade melhorar a competitividade das exportações e, naturalmente, os lucros<strong>do</strong>s exporta<strong>do</strong>res. Com a participação <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, parte <strong>do</strong>s excedentesagrícolas foram transferi<strong>do</strong>s para outras áreas da economia, não vinculadasdiretamente à agro-exportação. Além disso, houve um aumento <strong>do</strong>sinvestimentos governamentais em obras públicas, para apoiar a incipienteindustrialização.O impacto da banana na economia equatoriana foi muito maior emtermos nacionais <strong>do</strong> que o gera<strong>do</strong> pelo cacau, décadas antes. A fronteiraagrícola foi ampliada, abrin<strong>do</strong>-se novas áreas de cultivo na Costa, a redeviária se expandiu notavelmente e aumentou a migração da Serra para aCosta, com um desenvolvimento acelera<strong>do</strong> das cidades e um certofortalecimento <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> interno, basea<strong>do</strong> na expansão <strong>do</strong> número deassalaria<strong>do</strong>s, o aumento das obras públicas e a diversificação da economia,dada a não monopolização da atividade produtiva, como aconteceu noapogeu <strong>do</strong> cacau.Nisso deve ter influí<strong>do</strong> também o componente tecnológico maisimportante incorpora<strong>do</strong> à produção bananeira, em contraste com asgrandes plantações de cacau, embora a contribuição <strong>do</strong> capital e datecnologia tenha si<strong>do</strong> sempre modesta, e por isso o Equa<strong>do</strong>r manteveuma produtividade muito baixa, em comparação com a América Central.Foi a renda generosa oferecida pela natureza que levou o país a ser omaior exporta<strong>do</strong>r mundial de banana.Diferentemente <strong>do</strong> que acontecia com as plantações centroamericanas,no Equa<strong>do</strong>r “pre<strong>do</strong>minaram as propriedades de colonos cujaorigem social, vinculada a certos estratos médios urbanos, diferia <strong>do</strong>slatifundiários tradicionais planta<strong>do</strong>res de cacau.” Assim, em 1964 haviaumas três mil propriedades produtoras, com a extensão média de 6496livro.pmd 9626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORhectares. A contribuição das grandes plantações não era determinante. Ejá nos primeiros anos o salário <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res nesse setor alcançaramníveis superiores aos de qualquer outra atividade agrícola no litoral.Embora a renda <strong>do</strong>s produtores fosse limitada, sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong> la<strong>do</strong><strong>do</strong>s exporta<strong>do</strong>res, pelas diversas etapas intermediárias no caminho da frutada plantação até o porto, essa intermediação fazia com que houvesse umamaior apropriação da renda bananeira por parte de outros grupos. O que,lamentavelmente, não foi aproveita<strong>do</strong> para criar incentivos que teriampodi<strong>do</strong> inter-relacionar de forma sistêmica o aparelho produtivo orienta<strong>do</strong>para satisfazer a demanda interna com o setor exporta<strong>do</strong>r.Nesse cenário não faltaram os conflitos, sobretu<strong>do</strong> entre produtorese exporta<strong>do</strong>res, os quais provocariam um importante movimentocamponês de caráter regional.Os exporta<strong>do</strong>res ficavam com o grosso da renda da bananicultura,enquanto trabalha<strong>do</strong>res e produtores recebiam, em conjunto, pouco maisda metade <strong>do</strong> valor agrega<strong>do</strong> nacional. O que fez com que uma parte <strong>do</strong>srecursos gera<strong>do</strong>s fosse investida fora <strong>do</strong> país; paralelamente, os setorescomercial e financeiro de Guayaquil aumentaram sua capacidade deapropriação e reinversão <strong>do</strong> excedente.Essa concentração das exportações é uma característica que semanteve desde então: em 1964 a United Fruit, a Standard Fruit, norteamericanas,e a Exporta<strong>do</strong>ra Bananera Noboa, de propriedade de um <strong>do</strong>smaiores capitalistas equatorianos, concentravam mais da metade dasexportações da fruta, e 90% estava em mãos de apenas oito empresas(Larrea 1991, p. 106).No princípio <strong>do</strong>s anos 1990, quan<strong>do</strong> surgiram dificuldades nasbarreiras alfandegárias da Comunidade Européia, discriminan<strong>do</strong> contra abanana da América Latina em favor <strong>do</strong> produto procedente das ex-colôniase territórios de ultramar da Europa, os “senhores da banana”, aquelescinco <strong>do</strong>nos <strong>do</strong> destino bananeiro <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, controlavam 87% dasexportações (Noboa, 44,1%; Standard Fruit, 17,2%; Chiquita, 13,7%; DelMonte, 7,8%; Banacol, 4,2%).97livro.pmd 9726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTADurante to<strong>do</strong> esse perío<strong>do</strong>, estes exporta<strong>do</strong>res estiveramrelativamente protegi<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s riscos externos com a fruta proveniente <strong>do</strong>spequenos e médios produtores, que respondiam ao crescimento dademanda de banana, e eram os que assumiam a responsabilidade pelasperdas quan<strong>do</strong> o merca<strong>do</strong> estava deprimi<strong>do</strong>. Por isso os exporta<strong>do</strong>res nãose preocupavam demais com a baixa produtividade, viável perversamentepelos baixos salários e pela produção extensiva da fruta, garantida pelamão de obra abundante e a existência de terras “não colonizadas”. Alémdisso, sempre que surgem dificuldades no merca<strong>do</strong> externo esses “senhoresda banana” resistem a sustentar os preços fixa<strong>do</strong>s para os produtores, etambém não distribuem a renda adicional quan<strong>do</strong> os preços sobem.A estrutura agrária da exportação, muitas vezes de enclave, temresumi<strong>do</strong> a complexa evolução histórica <strong>do</strong> país, cada vez mais vincula<strong>do</strong>ao merca<strong>do</strong> mundial, e que depende das conjunturas de apogeu e criseinternacionais.Nos anos <strong>do</strong> boom da banana, para o fortalecimento das classesmédias foi importante a contribuição <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> como planifica<strong>do</strong>r econstrutor de obras de infra-estrutura. Isto não significou, contu<strong>do</strong>, odesaparecimento da hegemonia da burguesia agro-exporta<strong>do</strong>ra, quecontinuou a mostrar agilidade e capacidade de ação no aproveitamento daconjuntura cambiante, e na influência direta ou indireta sobre aadministração da coisa pública.Durante o apogeu da banana, o Esta<strong>do</strong> aumentou notavelmentesuas despesas e investimentos, em especial na construção de estradas quepermitiram uma melhor integração nacional. Vale lembrara a primeiraestada asfaltada Latacunga-Queve<strong>do</strong>-Manta, construída no terceiro perío<strong>do</strong>de Velasques, seguida por uma série de obras importantes na Costa e naSerra., assim como outras entre essas duas regiões, separadas porformidáveis maciços montanhosos. Não se pode esquecer também osprojetos ferroviários executa<strong>do</strong>s, até Bahia de Caráquez, a Cuenca (ondeo trem chegou cinqüenta anos depois de Quito), e em 1957 a ferroviaIbarra-San Lorenzo. Portos também foram construí<strong>do</strong>s, para facilitar o98livro.pmd 9826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORcomércio, merecen<strong>do</strong> especial relevância o novo porto de Guayaquil, quecentralizou grande parte das atividades comerciais. Outros portosmoderniza<strong>do</strong>s no século XX foram os de Manta, Esmeraldas e PortoBolívar, ten<strong>do</strong> perdi<strong>do</strong> importância o porto de Bahia de Caráquez. Osistema financeiro foi igualmente reforça<strong>do</strong>, para facilitar as exportaçõese as atividades da produção bananeira.É preciso reconhecer que foram desenvolvidas políticas visan<strong>do</strong>uma participação mais ativa <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r na economia internacional,amplian<strong>do</strong> exportações e importações, de mo<strong>do</strong> a garantir a renda <strong>do</strong>sinvesti<strong>do</strong>res diretos estrangeiros. No entanto, lamentavelmente não seconcebeu e muito menos se aplicou uma proposta estratégica consensuale de largo prazo que tivesse permiti<strong>do</strong> melhores resulta<strong>do</strong>s.Paralelamente à ampliação das relações capitalistas na atividadebananeira, na Costa subsistiram no campo outras formas não capitalistasde produção, vinculadas a exportações importantes: o cacau e o café. Coisasemelhante aconteceu com o arroz.Um fator de maior integração nacional foi a dinamização da atividadeagro-pecuária na Serra, onde a fazenda tradicional se manteve como oeixo particular mais importante. O Esta<strong>do</strong> desenvolveu políticas de apoiotécnico, fornecimento de fertilizantes, projetos de irrigação, e introduziumelhoria nas raças bovinas. No entanto, como aconteceu durante toda a<strong>história</strong> republicana, o grosso da oferta agrícola orientada para o merca<strong>do</strong>internacional provinha <strong>do</strong>s camponeses, sustentada em grande parte poruma reprodução ampliada de relações não-capitalistas, muitas delas debase comunitária (vale lembrar as diversas instituições de produção eintercâmbio indígenas: minga, maquipurarina, maquimañachina, ranti-ranti,uniguilla, uyanza, chucchina, etc., cujas conotações e vigência deveriam seranalisadas, e até mesmo recuperadas).A indústria têxtil também tirou parti<strong>do</strong> dessa situação, através daimportação de máquinas modernas.Ao terminar a década de 1950, surgiram alguns problemas nomerca<strong>do</strong> internacional da banana, cujos termos de intercâmbio tinham99livro.pmd 9926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAcomeça<strong>do</strong> a declinar em 1955. Essas dificuldades alcançaram seu nívelmais crítico em 1964 e 1965. Assim, a partir de 1964 e até 1971o balançocomercial voltaria a ser deficitário.Nesses anos, as empresas transnacionais, que controlavam uma parteimportante da comercialização da banana (mas não a sua produção),voltaram a concentrar seu interesse nos países da América Central. Suasprincipais plantações registraram uma recuperação notável devi<strong>do</strong> àintrodução de uma nova variedade da fruta, mais resistente: a bananaequatoriana Gross Michel foi deslocada pela centro-americana Cavendish(Chiquita).A localização <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r voltou a pesar negativamente no acesso àcosta atlântica <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e à Europa. Embora o canal de Panamápermitisse encurtar as distâncias, pela capacidade limitada e o custo <strong>do</strong>trânsito representa ainda um problema para o comércio exteriorequatoriano.Com to<strong>do</strong>s esses elementos históricos, é fácil compreender as razões<strong>do</strong> processo de migração rumo à Costa. Da população <strong>do</strong> campo serranoseguia fluin<strong>do</strong> o grosso da migração para as plantações de banana; enquantonesses anos começou a emigração de trabalha<strong>do</strong>res da região de Azuaypara os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, especialmente depois da crise da produção <strong>do</strong>schapéus de palha.Em 1950, quan<strong>do</strong> se realizou o primeiro censo da população, 40,5%<strong>do</strong>s 3,2 milhões de equatorianos habitavam a planície costeira, onde ficavamas principais plantações voltadas para a exportação. Em 1962, quan<strong>do</strong>começou a diminuir a exportação da banana, a população <strong>do</strong> país tinhacresci<strong>do</strong> a um ritmo médio anual de 2,95% no primeiro perío<strong>do</strong> entrecensos, desde 1950, chegan<strong>do</strong> a um número perto de 4,5 milhões dehabitantes, <strong>do</strong>s quais 476.5% concentra<strong>do</strong>s na Costa (vide Tabelas 23, 24e 25).É muito interessante constatar o ritmo de urbanização <strong>do</strong> país apartir de 1950. A maior concentração ocorreu nas duas maiores cidades:Guayaquil e Quito, acompanhada <strong>do</strong> surgimento vigoroso de certas cidades100livro.pmd 10026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORmédias da Costa: Machala, Queve<strong>do</strong>, Huaquillas e Santo Domingo de losColora<strong>do</strong>s. Se em 1950 só cinco centros cantonais, <strong>do</strong>s 86 existentes,tinham mais de 20 mil habitantes (4 na Serra e um na Costa), em 1990 <strong>do</strong>s169 cantões existentes esse número aumentou para 31 cidades (12 naSerra e 19 na Costa), que além de tu<strong>do</strong> reuniam quase a metade dapopulação nacional.Esses movimentos de população rumo às cidades podem serexplica<strong>do</strong>s pelas pressões demográficas em certas zonas mais atrasadas<strong>do</strong> país, e naturalmente pelo incremento das taxas de fecundidade,acompanhadas pelo declínio das taxas de mortalidade, devi<strong>do</strong> aos esforços<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> para melhorar as condições sanitárias e de saúde pública.O boom da bananicultura e a renegociação da dívida externaEm 1953, contan<strong>do</strong> com recursos relativamente abundantes, gera<strong>do</strong>spelas exportações de banana, o Equa<strong>do</strong>r pôde iniciar um processo derenegociação da dívida externa.No fim da década de 1950 a dívida externa crescera a 68,3 milhõesde dólares (pouco mais de 16 dólares por habitante) — um aumento aindamodera<strong>do</strong>, que continuava adequa<strong>do</strong> à limitada capacidade de pagamento<strong>do</strong> país e aos poucos atrativos ofereci<strong>do</strong>s pela economia equatoriana aocapital transnacional.Nessa época tinham começa<strong>do</strong> a se materializar os “créditos desupri<strong>do</strong>res”, abertos particularmente pelos países europeus, recupera<strong>do</strong>s<strong>do</strong>s efeitos da guerra, que procuravam colocar seus bens e serviçosgarantin<strong>do</strong> linhas de financiamento aos países da América Latina. Houvetambém algumas inversões estrangeiras no setor financeiro: em 1959 oBanco Holandês Uni<strong>do</strong> e o First National City Bank. Vinte e três anosantes havia si<strong>do</strong> autoriza<strong>do</strong> o funcionamento <strong>do</strong> Banco de Londres e daAmérica <strong>do</strong> Sul.Ao terminar os anos 1950 a estrutura <strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res mostrava oEximbank e o governo norte-americano como cre<strong>do</strong>res <strong>do</strong> grosso da dívida,101livro.pmd 10126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAcom notável aumento <strong>do</strong>s créditos <strong>do</strong> Banco Mundial e <strong>do</strong> BID, a partirda sua criação, em 1960. Mais tarde entrou em cena, com grande vigor, aAgência de Desenvolvimento Internacional (USAID), dependência <strong>do</strong>Departamento de Esta<strong>do</strong> norte-americano. As dívidas antigas aindapesavam, mas com participação decrescente na dívida total.Em agosto de 1955 o Equa<strong>do</strong>r assinou com o governo norteamericanoum acor<strong>do</strong> pelo qual comprava excedentes de produtosagrícolas, cuja produção nacional era insuficiente para atender a demanda.O valor dessas importações devia ser deposita<strong>do</strong> em sucres em uma “conta<strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s no Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r”, e além de apoiar apromoção <strong>do</strong> desenvolvimento <strong>do</strong> pais serviria “para ajudar odesenvolvimento de novos merca<strong>do</strong>s de produtos agrícolas <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>sUni<strong>do</strong>s, para financiar atividades internacionais de intercâmbio educacionalno Equa<strong>do</strong>r e outras despesas <strong>do</strong>s Estra<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s no Equa<strong>do</strong>r.” Emoutras palavras, “para custear gastos da Embaixada <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>sno Equa<strong>do</strong>r”.Com esse Acor<strong>do</strong> sobre Excedentes Agrícolas, que foi sen<strong>do</strong>renova<strong>do</strong> nos anos subseqüentes, criou-se um canal para que o Equa<strong>do</strong>rcomprasse algodão, fumo, azeite de semente de algodão, azeite de soja esobretu<strong>do</strong> trigo. Anos depois a importação desses produtos começou aser paga em divisas, em termos comerciais normais, mas no intervalo oEqua<strong>do</strong>r tinha aumenta<strong>do</strong> sua dependência da importação de trigo,enquanto deixava de la<strong>do</strong> possíveis produtos substitutivos ou alternativos,e não desenvolveu sua própria produção de trigo, que não tinha condiçõesde competir com o trigo importa<strong>do</strong>. Finalmente, com base no novoimpulso <strong>do</strong> FMI desde 1982, em 1988 se suprimiu definitivamente osubsídio concedi<strong>do</strong> ao trigo, e portanto à farinha e seus deriva<strong>do</strong>s.Situação semelhante aconteceu no início <strong>do</strong> terceiro milênio com aajuda alimentar, quan<strong>do</strong> com o ingresso da soja transgênica no Equa<strong>do</strong>r, como argumento de que era preciso satisfazer as necessidades alimentares <strong>do</strong>ssetores mais desprotegi<strong>do</strong>s, debilita-se mais ainda os pequenos e médiosfazendeiros, ao mesmo tempo em que se afeta a segurança alimentar <strong>do</strong> país.102livro.pmd 10226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORNa década de 1950 a contratação <strong>do</strong>s créditos continuava <strong>do</strong>minadapelo governo central, e outras entidades públicas. O endividamento externo<strong>do</strong> setor priva<strong>do</strong> ainda era relativamente baixo.Nessa época atribuía-se prioridade aos investimentos na infraestrutura,que costumam ter um perío<strong>do</strong> de repagamento mais longo, eque foram crian<strong>do</strong> problemas posteriores para o pagamento da dívida.Devi<strong>do</strong> às necessidades de um país como o Equa<strong>do</strong>r era preciso fazerinvestimentos em obras básicas que, direta ou indiretamente, beneficiavamtambém o modelo existente de acumulação e concentração, ao mesmotempo em que promovia efeitos externos favoráveis à rentabilidade privada.O fun<strong>do</strong> monetário internacionalNo início <strong>do</strong>s anos 1960, outra vez o Equa<strong>do</strong>r sentiu asconseqüências da sua dependência <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> mundial. Um sinal foi aqueda <strong>do</strong>s preços internacionais <strong>do</strong> cacau e <strong>do</strong> café, causan<strong>do</strong> perdaestimada em 40,7 milhões de dólares em 1961, que atingiu 28 milhões em1962 — cifras muito superiores às entradas de créditos externos. A isso seacrescentou o declínio <strong>do</strong> boom da banana.A piora da situação <strong>econômica</strong> agravou também os problemassociais. Os setores populares foram os primeiros a sofrer o impacto dacrise, com greves e reinvindicações, culminan<strong>do</strong> com o massacre ocorri<strong>do</strong>em Guayaquil em junho de 1959, durante o primeiro governo social cristão.Os mesmos governantes que se empenhavam em manter a fachada deprogresso e democracia formal, usan<strong>do</strong> os mesmos argumentos tantasvezes emprega<strong>do</strong>s para justificar a aplicação de medidas <strong>econômica</strong>s antipopulares.Nessas circunstâncias, para poder equilibrar os déficits externos e,como se dizia então, “para consolidar o sistema constitucional” erampedi<strong>do</strong>s empréstimos internacionais. Na realidade o que se pretendia eraaproveitar a crescente disponibilidade financeira internacional paraenfrentar os desafios levanta<strong>do</strong>s pelas demandas da sociedade sem ter103livro.pmd 10326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAque aplicar medidas corretivas, que afetariam necessariamente a estruturada propriedade na agricultura e a indústria ainda nascente, bem comooutras áreas da economia.Em 1958 o país se viu obriga<strong>do</strong> a recorrer ao FMI. Desde então, àmedida que se aprofundava a crise <strong>econômica</strong>, com a resultanteinstabilidade política, o Equa<strong>do</strong>r recorreu algumas vezes à assistênciafinanceira <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong>, contratan<strong>do</strong> nove créditos de stand by: em junho de1961, junho de 1962, julho de 1963, julho de 1964, julho de 1965, julho de1966, abril de 1969, setembro de 1970 e julho de 1972. O últimoempréstimo desta série foi toma<strong>do</strong> poucos dias antes de que começassemas exportações de petróleo, e só dez anos mais tarde, em 1982, quan<strong>do</strong> opaís mergulhou em nova crise externa, voltou-se a recorrer ao FMI.Não será demais assinalar que após longos anos de estabilidadecambial, que coincidiram com um perío<strong>do</strong> relativamente longo de respeitoà ordem constitucional, a desvalorização <strong>do</strong> sucre — que, de acor<strong>do</strong> como FMI, devia ter si<strong>do</strong> feita pelo governo de Camilo Ponce Enríquez(Presidente, 1956-60) — contribuiu para a perda de estabilidade <strong>do</strong>governo de José María Velasco Ibarra, que foi derruba<strong>do</strong>. E a partir dessemomento viveríamos uma fase prolongada de instabilidade política.104livro.pmd 10426/9/2005, 13:26


3O modelo de industrializaçãopela substituição deimportaçõeslivro.pmd 10526/9/2005, 13:26


livro.pmd 10626/9/2005, 13:26


O modelo de industrializaçãopela substituição de importaçõesA longa crise <strong>do</strong> cacau, que se somou à Grande Depressão, foisuperada no Equa<strong>do</strong>r por um novo perío<strong>do</strong> de intensa exportação: acomercialização da banana, que abriu a porta para toda uma série demudanças há muito esperadas pela sociedade equatoriana. Tanto as aliançassociais e os conflitos de poder como o papel <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e o tipo de política<strong>econômica</strong> se modificaram, precisamente para favorecer os novos grupos<strong>do</strong>minantes, que viam com preocupação a forma como o Equa<strong>do</strong>r estavaatrasa<strong>do</strong> no seu desenvolvimento econômico e na aplicação de políticasvisan<strong>do</strong> solucionar os problemas <strong>do</strong> sub-desenvolvimento.Uma primeira tentativa séria de industrializaçãoO aumento da receita externa aju<strong>do</strong>u a configurar aos poucos umEsta<strong>do</strong> desenvolvimentista, que desde 1954 começou a planejar suas ações,com a criação da Junta Nacional de Planejamento (que em 1979 mudariao seu nome para Conselho Nacional de Desenvolvimento, CONADE).No entanto, o Esta<strong>do</strong> não articulou o atendimento das crescentesdemandas sociais, nem favoreceu um desenvolvimento mais autônomo.Não podia fazê-lo porque no fun<strong>do</strong> se tinha converti<strong>do</strong> na base de apoioa uma nova aliança, entre os antigos grupos <strong>do</strong>minantes e uma burguesiamodernizante, com uma certa participação de alguns setores da classemédia, especialmente o tecnocrático.Com o objetivo de promover outro modelo de acumulação,especialmente depois <strong>do</strong> enfraquecimento da exportação de banana, opeso político <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> foi decisivo para manipular os preços relativosbásicos da economia e impulsionar a atividade industrial.107livro.pmd 10726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTACom os baixos preços <strong>do</strong>s produtos agrícolas, procurou-se favorecerde forma sistemática uma nova aliança <strong>do</strong>minante, em especial a burguesiaindustrial. Embora os “empresários rentistas” <strong>do</strong> setor das manufaturastambém se tenham beneficia<strong>do</strong>, no caso <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r eles nunca romperamabruptamente com os exporta<strong>do</strong>res ou com os latifundiários. Esses grupostiveram a capacidade de ajustar-se, diversifican<strong>do</strong> seus interesses no campoindustrial e naturalmente no financeiro, sem descuidar das atividadescomerciais. E outros grupos, nasci<strong>do</strong>s da indústria ou <strong>do</strong> comércio,souberam garantir sua base de acumulação e naturalmente o seu status,fazen<strong>do</strong> investimentos na agricultura.Além disso, durante a fase áurea da banana, o Esta<strong>do</strong> tinhaaumenta<strong>do</strong> suas despesas e investimentos, crian<strong>do</strong> postos de trabalho naestrutura governamental.Da mesma forma começaram a aparecer empresas públicas emdiversos campos, tanto pela exigências <strong>do</strong> modelo de acumulação comopela inexistência de uma massa crítica de empresários capitalistasinova<strong>do</strong>res, que pudessem levar a seu termo o processo em andamento.Mais tarde houve outras intervenções estatais em áreas consideradasestratégicas <strong>do</strong> setor de exportações primárias, especialmente o petróleo.Por meio desses mecanismos explícitos ou implícitos, nessa épocao Esta<strong>do</strong> transferiu excedentes, maciçamente, para as burguesias urbanasoligopolistas. Foram feitas transferências importantes <strong>do</strong> campo para acidade, da agricultura para a indústria, <strong>do</strong>s exporta<strong>do</strong>res para osimporta<strong>do</strong>res industriais, <strong>do</strong>s poupa<strong>do</strong>res para os cre<strong>do</strong>res da indústria,<strong>do</strong>s que pagavam impostos indiretos para os que deveriam pagar impostossobre a renda, sobre os lucros, etc.Os eixos dessas transferências foram sobretu<strong>do</strong> um tipo de câmbiosobrevaloriza<strong>do</strong> (e tarifas pesadas sobre os bens finais), os controles <strong>do</strong>spreços <strong>do</strong>s produtos agrícolas e os respectivos subsídios, o sistema tributárioregressivo, as baixas tarifas públicas, as taxas de juros reais negativas e aemissão primária de dinheiro sem lastro (que a população pagava com o“imposto inflacionário”). Até mesmo a reforma agrária insuficiente pode108livro.pmd 10826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORser vista como um mecanismo para reduzir o preço das matérias primasusadas pela agro-indústria e <strong>do</strong>s alimentos consumi<strong>do</strong>s pela populaçãourbana. Tu<strong>do</strong> isso com o objetivo de induzir o processo de industrialização.No meio da crise da banana o Equa<strong>do</strong>r viveu nova fase deinstabilidade política, e surgiram outras propostas de modernização. Asucessão regular de três governos constitucionais — Galo Plaza Lasso,José María Velasco Ibarra e Camilo Ponce Enríquez — foi interrompidaem novembro de 1961, quan<strong>do</strong> Velasco Ibarra ocupava a Presidência (pelaquarta vez) havia pouco mais de um ano. Mais <strong>do</strong>is anos de continuidadeconstitucional, sob a presidência de Carlos Julio Arosemena Monroy, Vice-Presidente <strong>do</strong> caudilho populista, e em 1963 há nova intervenção militar.A Junta Militar resultante durou até 1966, quase como uma“vanguarda da burguesia industrial” (Velasco 1981, p. 208), e quismodernizar o sistema capitalista imperante. A luta <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>scontra a revolução cubana abriu o caminho para a chamada “Aliança parao progresso”, sob cuja sombra algumas propostas modernizantes foramintroduzidas, provocan<strong>do</strong> um exercício limita<strong>do</strong> de mudança estrutural.Nessa época ficaram claros os limites da reprodução ampliada nasfazendas tradicionais, o que deu força à necessidade da reforma agráriapara introduzir inovações tecnológicas e aumentar a produtividade,reduzin<strong>do</strong> ao mesmo tempo a demanda de mão de obra, o que facilitou oprocesso pelo apoio relativo recebi<strong>do</strong> <strong>do</strong>s fazendeiros e da Igreja Católica,que tomou a dianteira dividin<strong>do</strong> algumas das fazendas que ainda possuía.O desaparecimento <strong>do</strong> huasipungo (1964) — a concessão temporáriade terra aos camponeses contrata<strong>do</strong>s, como parte <strong>do</strong> seu pagamento porserviços presta<strong>do</strong>s — não obedecia a um processo real de redistribuiçãoque buscasse ampliar e dinamizar o merca<strong>do</strong> interno, mas sim à pressãoderivada <strong>do</strong> próprio processo de reordenação <strong>do</strong> capital latifundiário quequeria concentrar-se em atividades mais lucrativas (a indústria de laticínios,por exemplo), e procurava conseguir uma maior mobilidade para penetrarem outros setores da economia, como o comércio, a construção civil e atémesmo a indústria.109livro.pmd 10926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAA reforma agrária <strong>do</strong>s anos 1960 (1964) foi complementada poruma reforma adicional nos anos setenta (1973), ambas realizadas emperío<strong>do</strong>s de ditadura militar. Além disso, durante o quinto governovelasquista, em 1970, foi aboli<strong>do</strong> o trabalho precário na agricultura(decretos 373 e 1001), o que beneficiou imediatamente a produção agrícola,em especial o cultivo <strong>do</strong> arroz.“Esse processo [complexo e sinuoso] não foi um objetivosinistro <strong>do</strong>s iânques, de comunistas, burocratas ou demagogos, comose diz levianamente, mas o resulta<strong>do</strong> necessário da pressão que haviano Equa<strong>do</strong>r para a sua modernização, e para romper os laços <strong>do</strong>sistema semi-feudal em que vivia. Com todas as suas falhas, esseprocesso tem um mérito maior, que o redime: converteu em pessoas,ou seja, em indivíduos independentes, os indígenas, que até entãoeram, para to<strong>do</strong>s os efeitos práticos, propriedade indiscutível <strong>do</strong>sfazendeiros” (Ortiz 2000, p. 74-5).Na década de 1960 fez-se também uma profunda reforma tributária,que eliminou 1.215 impostos provinciais e cantonais. Houve umacentralização tributária, e os governos locais perderam o poder de criartributos, que formavam uma nuvem complexa de impostos e taxas emto<strong>do</strong> o país. 807 desses impostos eram cobra<strong>do</strong>s na Costa, 352 na Serra e54 na Amazônia. As províncias com maior número de impostos eramManabi, com 412; Guayas, com 138; e Loja, com 106. Desde 1963, quan<strong>do</strong>foi aprova<strong>do</strong> um novo regime para o imposto de renda, teve início umlongo caminho de reformas até 1971, quan<strong>do</strong> se instaurou o Impostosobre Transações Mercantis, em substituição ao Imposto sobre as Vendas.Nesse perío<strong>do</strong> foram unifica<strong>do</strong>s vários tributos nacionais e locais, comoos que incidiam sobre o consumo da cerveja, das bebidas gasosas e águamineral, sobre exportações e importações (Vega e Mancero, 2001). Nessaépoca pretendia-se centralizar a modernizar o funcionamento <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>,visto como um ator importante <strong>do</strong> processo de desenvolvimento.110livro.pmd 11026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORNesse contexto, a política de substituição de importações que<strong>do</strong>minava o cenário latino-americano, e que permitiu forçar aindustrialização <strong>do</strong> país, e também atenuar os efeitos da crise da banana,não alcançou os resulta<strong>do</strong>s espera<strong>do</strong>s. Em primeiro lugar, pela incapacidadedas elites de criar condições propícias à sua cristalização. O merca<strong>do</strong> internonão se transformou de forma dinâmica, nem houve uma redistribuição,ou se garantiu o fluxo adequa<strong>do</strong> de capital para o reajuste <strong>do</strong> aparatoprodutivo, de forma a superar a sua heterogeneidade estrutural. Não houveuma concentração efetiva de esforços priva<strong>do</strong>s e governamentais paracriar a infra-estrutura necessária, nem se concebeu (e muito menos seaplicou) uma autêntica política aduaneira que protegesse de forma ativa aindústria nascente, até que ela alcançasse níveis prudentes decompetitividade internacional.Essa tentativa de industrialização não modificou o padrão tradicionalda acumulação primário-exporta<strong>do</strong>ra. Foi um esforço associa<strong>do</strong> esubordina<strong>do</strong> à lógica <strong>do</strong> capital externo, que orientou o sistema produtivopara satisfazer as necessidades de grupos minoritários da população,favorecen<strong>do</strong> a produção de bens de consumo para atender a esses grupos,em lugar de orientar-se para bens de capital e intermediários. Um <strong>do</strong>sobstáculos à mudança foram os hábitos de consumo das camadas altas emédias, refletin<strong>do</strong> realidades concentra<strong>do</strong>ras e regionalmente distintas, oque influiu sobre as importações e a produção industrial local.Nesse cenário surgiu um número crescente de empresas vinculadasaos serviços públicos: telefone, eletricidade, com o que se apoiou o esforçoindustrial. Em Guayaquil, a indústria superou a atividade industrial daSerra.Como tem aconteci<strong>do</strong> ao longo de quase toda a <strong>história</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r,nesse perío<strong>do</strong> a importação de capitais foi menor <strong>do</strong> que a contribuiçãoda poupança interna. No entanto, o capital estrangeiro foi <strong>do</strong>minante nasua penetração, o que se compreende pela fragilidade e dependênciatecnológica da estrutura produtiva equatoriana, assim como pelamediocridade <strong>do</strong>s grupos empresariais, submissos <strong>econômica</strong> e111livro.pmd 11126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAculturalmente aos centros <strong>do</strong> poder mundial. Deste mo<strong>do</strong>, a lógica daindustrialização tinha um componente externo determinante, e por issolimitava qualquer projeto nacional.Juntamente com os outros países andinos (Bolívia, Chile, Colômbia,Peru e Venezuela), em 1969 o Equa<strong>do</strong>r subscreveu o Acor<strong>do</strong> de Cartagena,conheci<strong>do</strong> mais tarde simplesmente como Pacto Andino, depoistransforma<strong>do</strong> em Comunidade Andina de Nações. Foi um esforço deintegração que mediante a criação paulatina de um merca<strong>do</strong> comum <strong>do</strong>spaíses membros procurava recuperar as taxas de crescimento, amplian<strong>do</strong>a toda a região as políticas nacionais protecionistas próprias <strong>do</strong> modelobasea<strong>do</strong> na substituição de importações e na promoção seletiva dasexportações.Com o passar <strong>do</strong>s anos esse projeto perdeu interesse político, efracassou devi<strong>do</strong> à sua rigidez, e mais ainda por não contar com umaparticipação social ampla e por haver limita<strong>do</strong> seu interesse a temaseconômicos, sobretu<strong>do</strong> comerciais, e em menor medida industriais, a cargode representantes <strong>do</strong>s setores interessa<strong>do</strong>s. Vinte anos depois o projetose revitalizaria, embora com uma concepção muito diferente da original.O objetivo seria uma integração transnacional muito mais <strong>do</strong> que andina,de acor<strong>do</strong> com a corrente que buscava uma “reprimarização” modernizadadas nossas economias.Ao terminar a década de 1960, com a perspectiva da exportação depetróleo, antecipou-se o crescimento desproporcional <strong>do</strong>s pagamentosda dívida como um fator que limitaria a economia e a própria capacidadede endividamento. A queda das exportações, a crise <strong>econômica</strong>, os créditoscontingentes <strong>do</strong> FMI e suas receitas de política <strong>econômica</strong> começaram amarcar a vida <strong>do</strong> país de forma recorrente, desestabilizan<strong>do</strong> continuamenteo precário esquema constitucional.Para conseguir novos créditos o Equa<strong>do</strong>r teve que aceitar asrecomendações <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong> Monetário Internacional e adequá-las à suapolítica <strong>econômica</strong>, procuran<strong>do</strong> enfrentar os desequilíbrios externosenquanto se buscava reintegrar o país no merca<strong>do</strong> mundial. Mas até que o112livro.pmd 11226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORpetróleo surgisse em cena, as diversas políticas <strong>econômica</strong>s seguidas nesseperío<strong>do</strong> não lograram superar a situação de crise.Entre 1964 e 1972 a balança comercial mostrou um déficit crônico,devi<strong>do</strong> sobretu<strong>do</strong> ao aumento acelera<strong>do</strong> das importações e à deterioraçãopermanente das exportações de banana. As compras externas passaramde 100 milhões de dólares, em 1954, a cerca de 250 milhões no fim <strong>do</strong>sanos 1960, o que equivalia a um aumento de 150% (vide Tabela 1).Na década de 1960, sobretu<strong>do</strong> nos últimos anos, devi<strong>do</strong> ao petróleoo investimento direto estrangeiro teve um crescimento acelera<strong>do</strong>. Em 1971o seu valor superou os 162 milhões de dólares, ou seja, a maior relaçãocom o PIB de toda a <strong>história</strong>: 10,12% (vide a Tabela 19). Até 1969, ocapital estrangeiro chegara sobretu<strong>do</strong> sob a forma de créditos.A despeito de to<strong>do</strong>s os problemas havi<strong>do</strong>s desde mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos1960 até o princípio da década seguinte, o fato é que entre 1950 e 1973 opaís cresceu a um ritmo anual de 2,9%, superior à média de um grupo deseis países da América Latina (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Méxicoe Venezuela), que nesse perío<strong>do</strong> cresceram 2,5% ao ano. Desses países, sóo Brasil e o México tiveram taxas mais altas: 3,9 e 3,2%, respectivamente.O ritmo de crescimento <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r foi mais alto também <strong>do</strong> que o <strong>do</strong>sEsta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s: 2,2%. Nesse perío<strong>do</strong>, que ficou conheci<strong>do</strong> como os anos<strong>do</strong> boom Kennedy-Johnson, caracteriza<strong>do</strong> pelo maior dinamismo daseconomias centrais e naturalmente <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> mundial, os países asiáticos(Coréia, Taiwan e Tailândia) já tinham inicia<strong>do</strong> sua marcha ascendente,com 4,8%; os países ibéricos (Espanha e Portugal) cresceram 5,3% e osoutros países desenvolvi<strong>do</strong>s (Alemanha, Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, França, Japão,Países Baixos e Reino Uni<strong>do</strong>) em 4,7% (vide Tabelas 26 e 27).Outro da<strong>do</strong> interessante é o fato de que em 1950 a renda per capitada América Latina era três vezes a <strong>do</strong>s países asiáticos cita<strong>do</strong>s, superan<strong>do</strong>também a <strong>do</strong>s países ibéricos. O mesmo não se podia dizer <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r,situa<strong>do</strong> em nível muito inferior ao latino-americano. No entanto,comparada com os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, a renda per capita <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>rrepresentava 16%; a <strong>do</strong>s países asiáticos, só 9% (Hofman 1992).113livro.pmd 11326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTADe pobretão vende<strong>do</strong>r de banana a novo-rico petroleiroNa década de 1960 o potencial <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r como produtor depetróleo voltou a interessar os consórcios transnacionais que começavama buscar em to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong> outras alternativas de suprimento, paradiversificar as regiões produtoras e aumentar a oferta. Esta já dava sinaisde que em alguns anos seria insuficiente para atender à demandainternacional, se novas reservas não fossem descobertas e se o ritmoeleva<strong>do</strong> <strong>do</strong> consumo fosse manti<strong>do</strong>. Assim, mais uma vez a exploração<strong>do</strong>s recursos naturais <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r seria decidida em função de necessidadesexternas, e não só por razões nacionais.É interessante destacar que no início <strong>do</strong>s anos 1970 o Equa<strong>do</strong>rrecebeu o nível mais alto de investimentos estrangeiros, chegan<strong>do</strong> a 162,1milhões de dólares em 1971. Desde então, o investimento estrangeiro nãovoltou a superar a média <strong>do</strong>s 100 milhões de dólares anuais. De 1968 e1971, além <strong>do</strong> ano 1975, o recebimento líqüi<strong>do</strong> de divisas, através deinversões estrangeiras, foi positivo. Ou seja: o sal<strong>do</strong> <strong>do</strong>s investimentosfeitos, deduzi<strong>do</strong>s os pagamentos, não foi negativo, como aconteceu emto<strong>do</strong>s os outros anos, desde 1950 até o princípio <strong>do</strong> terceiro milênio.Durante to<strong>do</strong> esse longo perío<strong>do</strong> a proporção média entre remessascambiais e investimentos feitos foi de três dólares remeti<strong>do</strong>s ao exteriorpara cada dólar investi<strong>do</strong>.Em linguagem clara, os investi<strong>do</strong>res estrangeiros receberam mais<strong>do</strong> que trouxeram para a capitalização <strong>do</strong> país. Naturalmente, para poderavaliar sua contribuição real seria preciso considerar sua contribuiçãopotencial às exportações, a geração de postos de trabalho e a transferênciade tecnologia. Embora esses fatores não tenham si<strong>do</strong> estuda<strong>do</strong>s emprofundidade, pode-se afirmar que a contribuição <strong>do</strong>s investimentos nessescampos também não foi significativa.Entre 1970 e 1976 os investimentos estrangeiros superaram omontante <strong>do</strong> endividamento, situação que não voltaria a se repetir, devi<strong>do</strong>ao endividamento agressivo contraí<strong>do</strong> desde então. O capital financeiro114livro.pmd 11426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORinternacional encontrava melhores perspectivas de reprodução naexploração de petróleo.Na década de 1970 o Equa<strong>do</strong>r entrou em cheio no merca<strong>do</strong> mundial,como poucas vezes na sua <strong>história</strong> — não porque tivesse havi<strong>do</strong> umamudança qualitativa na sua condição de exporta<strong>do</strong>r de produtos primários:banana, cacau, café, etc., mas pelo aumento da receita da exportação depetróleo. A exploração <strong>do</strong> óleo cru revitalizou a economia <strong>do</strong> país. Valelembrar que a exportação total cresceu de menos de 190 milhões de dólaresem 1970 para 2.500 milhões em 1981, um aumento de mais de treze vezes.Desse mo<strong>do</strong> ganhou força a participação <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r dentro da lógicaglobalizante <strong>do</strong> capitalismo internacional: o país se tornou mais atraente paraos investi<strong>do</strong>res e especialmente para os bancos estrangeiros, precisamentepela sua riqueza petrolífera, que lhe dava a imagem de “novo rico”.Antes, a economia equatoriana tivera importância relativamentemarginal para os capitais estrangeiros, conforme pudemos ver ao longodesta rápida revisão histórica. Sua participação comercial e financeirano merca<strong>do</strong> mundial, sustentáculo tradicional <strong>do</strong> crescimento econômicointerno, não teve maior transcendência em termos internacionais. Nadécada de 1960, contu<strong>do</strong>, foram redescobertas reservas significativas depetróleo na Amazônia (o óleo conheci<strong>do</strong> como “cru Oriente” nomerca<strong>do</strong> internacional). Essas reservas tinham si<strong>do</strong> desprezadas pelascompanhias internacionais no princípio <strong>do</strong>s anos 1950, época em queera mais fácil e rentável explorar petróleo na Arábia Saudita ou naVenezuela, por exemplo.Depois de pouco mais de um ano de exportação de petróleo, quecomeçou a chegar ao merca<strong>do</strong> mundial em agosto de 1972, houve umprimeiro reajuste significativo no preço <strong>do</strong> produto, devi<strong>do</strong> à quarta guerraentre Israel e os países árabes, que impuseram um bloqueio ao fornecimentode petróleo a alguns países desenvolvi<strong>do</strong>s. Assim, a cotação <strong>do</strong> “cru Oriente”passou de 3,83 dólares o barril em 1973 para 13,4 dólares em 1974, o queampliou de forma notável o fluxo de recursos financeiros, facilitan<strong>do</strong> ocrescimento acelera<strong>do</strong> da economia equatoriana (vide Tabela 19).115livro.pmd 11526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuan<strong>do</strong> teve início o apogeu <strong>do</strong> petróleo, em 1974, a população <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r se aproximava <strong>do</strong>s 6,5 milhões, <strong>do</strong>s quais uma maioria relativa(48,8%) vivia na Costa. A Serra, que perdera a sua hegemonia demográfica,representava 48,2% da população. Entre 1962 e 1974 registrou-se a maiortaxa anual de crescimento demográfico: 3,27% (vide Tabelas 24 e 25).Tal como ocorre na vida normal, onde é mais fácil para um rico <strong>do</strong>que para um pobre conseguir um empréstimo, o Equa<strong>do</strong>r petroleiroconseguiu os créditos que haviam si<strong>do</strong> nega<strong>do</strong>s ao exporta<strong>do</strong>r de banana,e mais ainda ao exporta<strong>do</strong>r de cacau. Mas a riqueza petrolífera não foi oúnico fator <strong>do</strong> aumento da dívida externa, mas a existência de volumesimportantes de recursos financeiros no merca<strong>do</strong> mundial, que nãoencontravam aplicação interessante nas economias industrializadas, as quaisse encontravam em fase recessiva.Em outras palavras, os créditos eram atraí<strong>do</strong>s não só porque a receita<strong>do</strong> petróleo representava uma garantia importante, mas também porquehavia as condições apropriadas a uma nova fase de expansão financeiramundial: explicação fundamental para entender o processo acelera<strong>do</strong> deendividamento dessa época. Não se deve esquecer que a mobilidade <strong>do</strong>capital estrangeiro — dívida externa ou investimentos diretos — édeterminada pelo diferencial de rentabilidade. Esse capital não dematerializa simplesmente pela ação de um governo interessa<strong>do</strong>; emboraeste possa aumentar a margem de lucro, não tem condições de determinarpor si só a contratação de um empréstimo. A dívida externa e osinvestimentos estrangeiros estão associa<strong>do</strong>s aos ciclos <strong>do</strong> sistema capitalista,e portanto às necessidades de acumulação de capital, cuja origem principalestá nos países centrais.Assim, o valor da dívida externa equatoriana cresceu em quase 22vezes entre 1971 e 1981 (vide Tabela 11), passan<strong>do</strong> de 206,8 milhões dedólares no fim de 1971 a 5.868,2 milhões ao concluir o ano de 1981. Essadívida passou de 16% <strong>do</strong> Produto Interno Bruto em 1971 para 42% em1981. É preciso dizer que nesse mesmo perío<strong>do</strong> o serviço da dívida externaexperimentou uma elevação também espetacular: em 1971 comprometia116livro.pmd 11626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR15 de cada 100 dólares exporta<strong>do</strong>s; dez anos depois essa proporção passoua 71%.O apogeu <strong>do</strong> petróleo e o endividamento externo maciçoprovocaram uma série de transformações. No entanto, não se pode aceitarque esses foram os <strong>do</strong>is únicos fatores determinantes. Atuaram tambémum conjunto de fatores sustenta<strong>do</strong>s na “dissolução das relações nãocapitalistas no campo, sobretu<strong>do</strong> na Serra, a crise da atividade agroexporta<strong>do</strong>ra,o crescimento da indústria e o desenvolvimento dasexportações de petróleo, [que] repercutiu em mudanças sociaissignificativas, na complexidade e expansão <strong>do</strong> papel <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, em umnovo processo de urbanização e no surgimento de novos mecanismos deaprofundamento das desigualdades sociais e regionais”. Na obra de CarlosLarrea (1991) encontraremos uma visão ampla dessa época de bonança ea posterior “crise da dívida externa”.Essas mudanças não afetaram substancialmente as relações sócio<strong>econômica</strong>sexistentes, nem mudaram os padrões de produção dependentes<strong>do</strong> exterior. Não se alterou o processo de acumulação vincula<strong>do</strong> àexportação de produtos primários, e menos ainda se transformou aestrutura da propriedade, caracterizada por níveis de elevada concentração,tanto nos setores agrário e industrial como no comercial e bancário. Maisainda: duas décadas depois de iniciada a vertigem <strong>do</strong> petróleo, quan<strong>do</strong> opais entrou plenamente em uma nova “crise da dívida externa”, a pobrezae a miséria se estenderam por toda a sociedade.Com efeito, o país não seguiu um rumo próprio.O que é lamentável se considerarmos a grande disponibilidade dedivisas existente nos anos 1970, a qual, com uma redistribuição efetiva dariqueza, teria viabiliza<strong>do</strong> a criação de bases sólidas para umdesenvolvimento mais autônomo, que teria permiti<strong>do</strong> intervir de formadinâmica no merca<strong>do</strong> mundial, sobretu<strong>do</strong> para a satisfação adequada dasnecessidades básicas de to<strong>do</strong>s os equatorianos. Nessas condições, comtantos e tão diversos recursos humanos e naturais existentes no Equa<strong>do</strong>r,com um potencial econômico capaz de atender as necessidades vitais de117livro.pmd 11726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAto<strong>do</strong>s, o problema não é apenas econômico, mas, pelo contrário, continuasen<strong>do</strong> um desafio político.Os da<strong>do</strong>s sobre a evolução setorial nesses anos evidenciaminsuficiências no emprego produtivo, bem como diferenças notáveis noritmo de produção <strong>do</strong>s diferentes setores, em particular o contraste entrea indústria e a agricultura. Não obstante, a ampla disponibilidade derecursos, em especial de divisas provenientes da exportação de petróleo,assim como de créditos externos, permitiu a criação de esquema defomento industrial — por exemplo, através de políticas de crédito comtaxas de juros muito baixas. Isto facilitou o crescimento da indústria mas,devi<strong>do</strong> à inexistência de políticas de longo prazo, provocou igualmenteuma série de distorções na distribuição de recursos, que repercutiramnegativamente no resto da estrutura produtiva, em particular na agricultura.Os grupos urbanos liga<strong>do</strong>s à indústria, ao comércio e às finançasregistraram um forte dinamismo, particularmente nas duas maiores cidades,Guayaquil e Quito, pólos de um bicentralismo absorvente, que conformeMarco Antonio Guzman (1944) concentraram grande parte da riqueza dessesanos, aumentan<strong>do</strong> seus atrativos como núcleos de atração para a imigração.Nessas condições, não surpreende que os setores tradicionais tenhamcresci<strong>do</strong> muito pouco, ou nada, como aconteceu com a produção dealimentos para o merca<strong>do</strong> interno — produção que, como vimos, provinhaem larga medida <strong>do</strong>s camponeses. Por outro la<strong>do</strong>, o número <strong>do</strong>sassalaria<strong>do</strong>s se reduziu, em relação com os trabalha<strong>do</strong>res informais,expon<strong>do</strong> assim a natureza das relações de trabalho, justamente no perío<strong>do</strong>de maior crescimento em toda a <strong>história</strong> republicana.Embora possa parecer um para<strong>do</strong>xo, se considerarmos o enormefluxo de recursos financeiros, o setor moderno da economia (ou seja,capitalista) não teve a capacidade necessária para absorver o crescimentoda força de trabalho. A concepção de um processo de industrializaçãobasea<strong>do</strong> em atividades intensivas de capital, orientadas para satisfazer ademanda de pequenos grupos, terminou causan<strong>do</strong> a baixa capacidade deintegração produtiva e social desse processo.118livro.pmd 11826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORPor esse motivo um número de pessoas cada vez maior se deslocoupara outras atividades informais, pouco estáveis e de produtividade muitobaixa. O apogeu <strong>do</strong> petróleo teve “um caráter desigual e excludente daperspectiva setorial, regional e social” (Larrea 1991, p. 9): fato queaumentou o caráter heterogêneo da estrutura produtiva. Além disso, oaumento da renda <strong>do</strong> petróleo e a contratação maciça de créditosestrangeiros provocou uma grande expansão da despesa fiscal (em largamedida através de um sistema complexo de subsídios explícitos e implícitosque beneficiavam os produtores priva<strong>do</strong>s), diminuiu ainda mais a já fracapressão tributária e erodiu a capacidade de captação da poupança internapor parte <strong>do</strong> sistema financeiro, enquanto eram mantidas taxas de jurosnegativas em termos reais (Larrea 1992, p. 290).A bonança motivada pelo petróleo, trazen<strong>do</strong> a maior quantidade de divisasjá recebida pelo país até aquele momento, surgida de forma maciça e relativamenteinesperada, acumulou-se sobre as estruturas existentes e reproduziu, em maiorescala, grande parte das antigas diferenças sociais e <strong>econômica</strong>s. O salto qualitativolevou o Equa<strong>do</strong>r a outro nível de crescimento econômico mas, como não houveuma transformação qualitativa correspondente, em pouco tempo se cristalizouno “mito <strong>do</strong> desenvolvimento”.Este tipo de processo desequilibra<strong>do</strong> e desequilibra<strong>do</strong>r provoca<strong>do</strong>por uma expansão das exportações primárias, é conheci<strong>do</strong> na literatura<strong>econômica</strong> como a “<strong>do</strong>ença holandesa”. A distorção se materializa emuma deterioração acelerada da produção daqueles bens que não sebeneficiam com o boom exporta<strong>do</strong>r. Depois, superada a melhor fase, osprocessos de ajuste são muito complexos e <strong>do</strong>lorosos, devi<strong>do</strong> à rigidez narevisão de preços e salários: outro sintoma da enfermidade.Essa realidade se manifestou não apenas no desperdício de umaoportunidade histórica para assentar o desenvolvimento <strong>do</strong> país em basessólidas como gerou um clima permissivo com relação ao endividamentoexterno, o que é muito importante levar em conta. E justamente a dívidaexterna constituiria, alguns anos mais tarde, o cenário (melhor diria, opretexto) para as políticas de estabilização e ajuste inspiradas no FMI.119livro.pmd 11926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAO perío<strong>do</strong> petrolífero se caracterizou pelo crescimento marcanteda demanda interna, ou seja, <strong>do</strong> consumo nacional, assim como pelaformação bruta de capital fixo com, a disponibilidade de equipamentos,máquinas e outros instrumentos de produção. Nesses anos foramconstruídas obras importantes de infra-estrutura. No setor <strong>do</strong> petróleo, oOleoduto Trans-equatoriano, a Refinaria Estatal de Esmeraldas, o PolidutoEsmeraldas-Quito-Ambato, o Poliduto Shushufindi-Quito, estações dearmazenagem e emissão. No setor da geração elétrica, as represas de Paute,Pisayambo e Agoyan. Deveríamos incluir também nessas obras os grandesreservatórios hídricos de Poza Honda e La Esperanza. Mais tarde, quasevinte anos depois <strong>do</strong> apogeu <strong>do</strong> petróleo, seria concluída a construção darepresa Daule-Peripa.Não obstante, embora o país tenha cresci<strong>do</strong> em termos econômicose progredi<strong>do</strong> na sua estrutura básica, muitos problemas ficaram semsolução, e outros se agravaram devi<strong>do</strong> ao mesmo “facilismo” financeiroreinante na época. Por exemplo: os grandes excedentes de recursos emmãos <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> contribuíram para atrasar as mudanças necessárias naestrutura tributária, cuja pressão continuou sen<strong>do</strong> muito fraca.Graças à bonança <strong>do</strong> petróleo, entre 1972 e 1981 o PIB cresceu auma taxa média anual de 8%, com índices espetaculares em alguns anos.A taxa média anual de expansão da indústria foi de 10%, enquanto oproduto por habitante aumentou de 260 dólares em 1970 para 1.668 em1981.Entre 1973 e 1980 o Equa<strong>do</strong>r registrou um crescimento per capitade 3,3%, o maior em to<strong>do</strong> o século XX, novamente superior à média <strong>do</strong>grupo de países latino-americanos menciona<strong>do</strong>s anteriormente (2,3%),ao crescimento <strong>do</strong>s países ibéricos (1,4%), <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s (1,0%) e<strong>do</strong>s países desenvolvi<strong>do</strong>s em geral (1,8%). O Brasil superou a taxa <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r, alcançan<strong>do</strong> 4,6%, embora o seu crescimento tenha si<strong>do</strong> inferiorao <strong>do</strong>s três países asiáticos indica<strong>do</strong>s (5,4%) (Hofman, 1992).Outro da<strong>do</strong> importante foi o declínio <strong>do</strong> ritmo de crescimentodemográfico, que caiu de 3,27% em 1962-74 para 2,52% em 1974-82.120livro.pmd 12026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORNeste último ano, ao chegar a oito milhões a população <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r haviaquase duplica<strong>do</strong> em comparação com 1962, concentran<strong>do</strong>-se na Costa:49% (Serra: 47,2%) e com uma urbanização cada vez maior (vide Tabelas23 e 24).Uma característica significativa é o grau de mobilidade registra<strong>do</strong>desde o princípio <strong>do</strong> século XX. Seja por problemas sociais ou naturaisnos lugares de origem, pela carência de uma solução adequada ao problemadas terras ou a atração exercida pelos principais pólos de crescimento, umnúmero importante de pessoas se deslocou nesses anos através <strong>do</strong> país,em especial a partir das províncias de Loja e Manabi. Nas últimas décadas<strong>do</strong> século XX, essa mobilidade aumentou notavelmente rumo ao exterior,em particular aos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, onde o número de equatorianos temcresci<strong>do</strong>.Quan<strong>do</strong> o petróleo nos levou às portas <strong>do</strong> paraísoO gerenciamento da riqueza petrolífera esteve inicialmente a cargo<strong>do</strong>s governos militares que chegaram ao poder em 1972, no meio de umanova crise hegemônica entre os grupos mais poderosos, e quan<strong>do</strong>começavam as exportações de petróleo. Embora ainda não beneficiadaspelos aumentos <strong>do</strong> preço internacional <strong>do</strong> produto, a partir de fins de1973, as exportações de petróleo representavam um potencial econômicointeressante, que despertou o apetite de alguns capitalistas nacionais,representan<strong>do</strong> as empresas trans-nacionais ou servin<strong>do</strong>-lhes deintermediários.Essa relativa abundância de recursos financeiros permitiu umapolítica de certa tolerância em pleno ambiente ditatorial, que foi possívelenquanto houve um fluxo considerável de dólares proveniente <strong>do</strong> exterior,situação que facilitava o adiamento e até mesmo a superação de certosconflitos. Em outras palavras, havia uma receita externa suficiente paraevitar o recurso a mudanças dentro <strong>do</strong> país. Não era preciso, por exemplo,aumentar o preço da gasolina para diminuir o hiato fiscal. Mais ainda:121livro.pmd 12126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAquan<strong>do</strong> a receita <strong>do</strong> petróleo era conjunturalmente insuficiente, isto sefazia recorren<strong>do</strong> a créditos externos.Possivelmente um <strong>do</strong>s pontos mais lucrativos para determina<strong>do</strong>ssetores da sociedade foi a política cambial estável. A fixação <strong>do</strong> valor <strong>do</strong>dólar norte-americano em 25 sucres contribuiu para o processo deacumulação, através da importação barata de bens de capital e insumosindustriais, como também para o consumo suntuário, em especial oimporta<strong>do</strong>, nos setores da classe alta e média com propensão elevada aesse tipo de gasto. Por outro la<strong>do</strong>, os que dispunham de recursos podiamadquirir dólares para gastar ou investir no exterior. Assim, essa políticaatuou como importante alavanca para a fuga de capitais.Quanto ao consumo suntuário, este se manifestou não só naimportação de bens como no acesso direto, no exterior. Embora possaparecer para<strong>do</strong>xal, para os que dispunham de recursos era mais barato emais confortável veranear na Flórida, incluin<strong>do</strong> o preço <strong>do</strong>s bilhetes aéreos,<strong>do</strong> que fazê-lo no litoral <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r. Além disso, era mais interessante <strong>do</strong>ponto de vista da sociedade local, no ambiente satura<strong>do</strong> de mensagensconsumistas que se difundiam de forma incisiva e maciçamente pelos meiosde comunicação <strong>do</strong> país. Os jornais publicavam com freqüência páginasinteiras e até mesmo suplementos completos promoven<strong>do</strong> negóciospotenciais, lojas e restaurantes norte-americanos.Os grupos acomoda<strong>do</strong>s também se beneficiavam com os subsídiosobti<strong>do</strong>s por outros equatorianos, pois isso lhes permitia manter baixa aremuneração <strong>do</strong>s seus trabalha<strong>do</strong>res. É o que sucedia com a despesa públicacom saúde e educação, por exemplo. Além disso, certos subsídios, comoo da gasolina, eram altamente regressivos, trazen<strong>do</strong> mais proveito aossegmentos altos e intermediários da população, que eram os que maisenergia consumiam.De qualquer forma, viveu-se anos de bonança, de enormes ganhospara os “<strong>do</strong>nos <strong>do</strong> país”, de melhoria relativa para amplos gruposintermediários, com a construção de obras públicas de envergadura e certasvantagens para alguns setores majoritários. Embora estes últimos só122livro.pmd 12226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORrecebessem migalhas <strong>do</strong> banquete <strong>do</strong> petróleo, nos meios de comunicação<strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r pre<strong>do</strong>minava a sensação generalizada de que se havia chega<strong>do</strong>às portas <strong>do</strong> paraíso, e que em pouco tempo seriam supera<strong>do</strong>s os gravesproblemas <strong>do</strong> sub-desenvolvimento.É preciso por em relevo esta percepção, que como afirmamacertadamente Francisco Thoumi e Merilee Grindle (1992, p. 23), “levouo público em geral e as elites <strong>econômica</strong>s em particular a esperar e exigir[um] tratamento favorável especial por parte <strong>do</strong> governo.” Muitosequatorianos pensavam que o desenvolvimento estava <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> daesquina, e alguns sonhavam com o El Dora<strong>do</strong> petrolífero. Isso explicará,mais adiante, os motivos por que talvez os mesmos grupos de pressãonão tenham podi<strong>do</strong> chegar a um acor<strong>do</strong> para apoiar desde o princípio aestratégia de ajuste neo-liberal, que quase sempre lhes trouxe uma série debenefícios, embora lhes exigisse alguns esforços, de acor<strong>do</strong> com astransformações internacionais.No entanto, muitos equatorianos — por exemplo os camponeses ea população indígena — só percebiam a bonança petrolífera através dapoeira deixada pelas centenas de veículos recém importa<strong>do</strong>s. Por outrola<strong>do</strong>, a riqueza crescente de uns poucos, entre os quais alguns setores daclasse média, era chocante, e até mesmo insultuosa em relação àsnecessidades insatisfeitas <strong>do</strong> resto da população, no meio de umconsumismo que exacerbava as diferenças <strong>econômica</strong>s e convidava paraum festim <strong>do</strong> qual na verdade só participava um grupo relativamentepequeno. Isto, soma<strong>do</strong> à crescente organização de grupos sindicais e dealguns setores populares, provocou reivindicações que nem sempre podiamser satisfeitas pelo Esta<strong>do</strong>, e que também não iam ser concedidas pelaselites, que viviam muito bem mas esperavam e exigiam outras facilidades ...Essa disputa pela riqueza <strong>do</strong> petróleo, não só entre os gruposhegemônicos, levou, a partir de 1976, ao aumento da repressão, ativadapara frear e controlar o movimento social, e que teve a sua maior expressãono massacre <strong>do</strong>s operários de Aztra, no dia 18 de outubro de 1977. Tu<strong>do</strong>isso se passou na medida em que perdiam força as posições iniciais <strong>do</strong>123livro.pmd 12326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAmovimento militar de 1972, e quan<strong>do</strong> os setores oligárquicos pressionavampara aumentar a sua participação na renda <strong>do</strong> petróleo.O esta<strong>do</strong> petroleiro a serviço <strong>do</strong> setor priva<strong>do</strong>Não podemos esquecer que, particularmente enquanto durou oapogeu <strong>do</strong> petróleo, o Esta<strong>do</strong> foi pela primeira vez o ator principal noprocesso de desenvolvimento. O que, por outro la<strong>do</strong>, não deve levar ainterpretações errôneas: em nenhum momento se instaurou umaadministração publica antagônica aos empresários priva<strong>do</strong>s.Mais ainda: dentro <strong>do</strong> sistema capitalista não existe a contradiçãoradical entre Esta<strong>do</strong> e setor priva<strong>do</strong>, que muitas vezes a mensagem neoliberalquer apresentar, na medida em que o primeiro, pela sua composiçãosocial, reflete a correlação das forças prevalecentes na sociedade. Por issonão podemos ignorar as relações existentes no Esta<strong>do</strong>, em cujo seio semanifestam tendências variadas.Não se pode esquecer que o Esta<strong>do</strong> equatoriano, como reconheceuo Banco Mundial, garantiu “um sistema complexo de subsídios implícitose pouco transparentes” à tão socorrida “eficiência privada”. Por outrola<strong>do</strong>, o Esta<strong>do</strong> investiu em diversos projetos que, pela sua baixarentabilidade a curto prazo, e as enormes exigências de capital, não podiamser assumi<strong>do</strong>s pelo empresaria<strong>do</strong> priva<strong>do</strong>. Por exemplo, a construção <strong>do</strong>Hotel Quito, na capital, no fim <strong>do</strong>s anos 1950, que ilustra esta afirmativa.Em outras oportunidades, a ação governamental socorreu empresáriosque tinham leva<strong>do</strong> suas empresas à falência.Sem negar a presença, muitas vezes maciça e indignante, daineficiência e <strong>do</strong> excesso de burocracia no aparato estatal, faltou ao Equa<strong>do</strong>ruma experiência estatizante no campo da produção, como aconteceu emoutros países latino-americanos — por exemplo no México, Argentina,Peru ou Bolívia. Além disso, a presença estatal em muitas empresas eatividades produtivas teve muitas vezes a motivação deliberada de apoioao processo de acumulação privada, atuan<strong>do</strong> em não poucos casos, como124livro.pmd 12426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR125um esforço de reparação das falhas <strong>do</strong> sistema capitalista. Justamente nosanos 1970 houve <strong>do</strong>is casos notáveis: a Ecuatoriana de Aviación e o Banco LaPrevisora; outras intervenções foram no Ingenio Azucarero del Norte, AzucareraTropical Americana, Empresa de Leche Cotopaxi, Empresa Nacional de Semen,Fertilizantes Ecuatorianos, a companhia de economia mista Semillas Certificadas,Ecuatoriana de Artefactos, Ecuatoriana de Cardamono, Desarrollo Agropecuario,etc. Situação que ocorrera antes, em 1925, quan<strong>do</strong> o Esta<strong>do</strong> assumiu asferrovias pagan<strong>do</strong> 75% <strong>do</strong> valor das suas ações, em plena depressão daeconomia equatoriana.Nessa oportunidade, o Esta<strong>do</strong> concebeu uma série de mecanismosdestina<strong>do</strong>s a subsidiar o setor priva<strong>do</strong>, através <strong>do</strong> congelamento de preçose tarifas <strong>do</strong>s bens e serviços das empresas estatais — como foi o caso daenergia — ou então mediante tarifas reduzidas, como no transporte apreços baixos para os alimentos. Houve igualmente isenções tributárias eexoneração aduaneira para facilitar a importação de bens de capital e acriação de indústrias. Não há dúvida de que essa política beneficiouimportantes segmentos intermediários da população.Por outro la<strong>do</strong>, apesar de não terem controle direto da riquezapetrolífera, os tradicionais grupos de poder recebiam também a sua parte,à base <strong>do</strong> aumento da despesa fiscal e <strong>do</strong>s investimentos governamentais,assim como créditos preferenciais para a indústria, barreiras alfandegáriasque protegiam da competição externa; e alguns deles participavamativamente, de forma direta ou indireta, da corrupção e <strong>do</strong> desperdício dariqueza <strong>do</strong> petróleo.Poderíamos citar um ponto adicional: os créditos subsidiários e oCertifica<strong>do</strong> de Compensação Tributária, outorga<strong>do</strong> pelo Esta<strong>do</strong> às vendasexternas com valor agrega<strong>do</strong> significativo, ou seja, às exportações deprodutos fabrica<strong>do</strong>s com alto coeficiente de mão de obra nacional.Complementarmente, é preciso reconhecer que a intervenção <strong>do</strong>Esta<strong>do</strong> na política <strong>econômica</strong> foi estimulada de fora <strong>do</strong> país, e há muitosanos, pelas teorias de John Maynard Keynes, em conseqüência da crise dadécada de 1930, devi<strong>do</strong> aos excessos <strong>do</strong> livre-cambismo (ou neolivro.pmd12526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAliberalismo, para usar a terminologia atual). Presença ativa, que contouposteriormente com a bênção <strong>do</strong>s organismos financeiros internacionais(Banco Mundial, BID, FMI) — que depois passaram a atacar a intervençãoestatal ...O Esta<strong>do</strong> assumiu um número crescente de tarefas, em benefício<strong>do</strong>s grupos monopolistas e oligopolistas, quan<strong>do</strong> eles usufruíam negóciosfáceis e inespera<strong>do</strong>s durante o apogeu <strong>do</strong> petróleo. E mais tarde, quan<strong>do</strong>o petróleo perdeu a sua força, o Esta<strong>do</strong> instaurou vários esquemas deapoio a esses mesmos grupos, enquanto as pequenas e médias empresasofriam toda a dureza <strong>do</strong> ajuste econômico.Ilustran<strong>do</strong> essa situação, a estrutura aduaneira criada era caótica,resulta<strong>do</strong> das diversas relações de força e <strong>do</strong>s conluios que se sucediamcom freqüência no Ministério das Indústrias, sem integrar um esquemade desenvolvimento industrial programa<strong>do</strong>. Se nesse Ministério semanifestavam os interesses <strong>do</strong>s principais grupos industriais, na JuntaMonetária estavam representadas diretamente as grandes câmaras deempresários e <strong>do</strong> sistema bancário priva<strong>do</strong>.De nenhum mo<strong>do</strong> se pode atribuir a culpa <strong>do</strong>s problemas cria<strong>do</strong>snesse perío<strong>do</strong>, de forma abstrata, a uma política de substituição deimportações, pois essa política não se inscrevia em um autêntico projetonacional. Era mais o resulta<strong>do</strong> de um conjunto desordena<strong>do</strong> e até mesmocontraditório de decisões e ações que obedeciam aos mais varia<strong>do</strong>sinteresses <strong>do</strong>s grupos hegemônicos da sociedade.Por essa razão a tentativa de modernizar o país através da indústrianão tar<strong>do</strong>u a encontrar os seus limites. As condições indicadasaprofundaram o conteú<strong>do</strong> de renda da estrutura produtiva nacional, afetadapela ineficiência e inflexibilidade, que motivavam o aumento permanentedas necessidades de importação de insumos e bens de capital indispensáveispara o seu funcionamento.Assim, a ação estatal em um merca<strong>do</strong> fecha<strong>do</strong> e muito estreito foium instrumento apropria<strong>do</strong> para a acumulação capitalista, que se efetivouna base de uma concepção rentista, e portanto oligárquica e especulativa.126livro.pmd 12626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORCom isso criou-se um sistema complexo de rendas não diretamenteassociadas à atividade empresarial, muitas das quais subsistem no princípio<strong>do</strong> século XXI:· rendas provenientes <strong>do</strong>s diversos esquemas aduaneiros efinanceiros de subsídio e fomento;· rendas geradas pela política cambial que subsidiava as importaçõese promovia a evasão de capitais;· rendas da corrupção, como a evasão sistemática de impostos e ocontraban<strong>do</strong>;· rendas provenientes da estrutura monopolista e oligopolista quecaracterizava grande parte da economia.Um assunto que não se pode descuidar é o fato certo de que nopaís nunca houve um empresaria<strong>do</strong> caracteriza<strong>do</strong> pela capacidade deinovação (em termos de Schumpeter) e pela austeridade (em termos deWeber), e por isso o Esta<strong>do</strong>, pressiona<strong>do</strong> pelos grupos empresariais maisfortes — verdadeiros caça<strong>do</strong>res de rendas — precisou preencher essevazio com sua atuação protetora e financeira, muitas vezes corrupta eautoritária. Situação que ocorreu — para lembrar outra vez a certeiraapreciação de Oswal<strong>do</strong> Dávila Andrade (1990, p. 2) porque era notória “afalta de uma burguesia nacional autêntica, substituída por um criollismosem raízes”, que desde a formação da República se manifestou pelavinculação exagerada e submissa às metrópoles.Assim, em lugar de consolidar-se no país um empresaria<strong>do</strong> ágil einova<strong>do</strong>r, os agentes econômicos mais importantes desenvolveram a cultura<strong>econômica</strong> característica <strong>do</strong>s enclaves, que <strong>do</strong>minou a economia latinoamericana:“ uma oligarquia ociosa, orientada para aproveitar os recursosnaturais e humanos através da exploração extensiva” (Schmidt 1992, p.28). Atividade que exigia a proteção <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, o que deu lugar àdenominação de “burguesia lumpen” por parte <strong>do</strong> economista André GunderFrank. Oligarquia que delegou de fato a tarefa <strong>do</strong> desenvolvimento à lógica127livro.pmd 12726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA<strong>do</strong> capital estrangeiro, outro <strong>do</strong>s produtos de um processo histórico dedependência.Sen<strong>do</strong> assim as coisas, não surpreende que muitos dessesempresários tenham si<strong>do</strong> e sejam ainda “empre-sáurios”: “mais <strong>do</strong> queempresários, são partidários da maximização <strong>do</strong>s lucros: querem um Esta<strong>do</strong>que esteja a seu serviço, forte nesses termos e débil na ação regula<strong>do</strong>raque pode exercer sobre eles e o conjunto da sociedade” (Marchán eSchubert 1992, p. 23). Em síntese, o Esta<strong>do</strong> equatoriano não ésimplesmente obra <strong>do</strong>s burocratas e <strong>do</strong>s seus sindicatos, como agora seusprincipais beneficiários pretendem demonstrar, a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> atitude de grandecinismo.Em termos gerais pode-se dizer que muitos <strong>do</strong>s problemasacumula<strong>do</strong>s pelo Esta<strong>do</strong> equatoriano são conseqüência das ações eomissões das próprias classes proprietárias, que o foram modelan<strong>do</strong>, diretaou indiretamente, de acor<strong>do</strong> com os seus desejos e necessidades. Por issoa sua atuação e estrutura não podem ser indiferentes aos interessescontraditórios daqueles que efetivamente o controlam e administram.Quem ficou com a parte <strong>do</strong> leão não foram os pequenos e médiosempresários, mas os grandes grupos monopolistas. Situação tambémexplicável pela falta de transparência nas intervenções estatais quebeneficiaram os poderosos, o que, aliás, era a meta de muitas das políticasgovernamentais concebidas e aplicadas pelos representantes desses grupos.Fica claro igualmente que a política de substituição de importaçõesnão foi obra da “burocracia perversa”, inimiga da iniciativa privada, masum mecanismo destina<strong>do</strong> a proteger a industrialização <strong>do</strong> país, que setinha converti<strong>do</strong> no eixo da proposta de desenvolvimento. Coisa diferenteé o fato de que essa política tenha si<strong>do</strong> desvirtuada e leva<strong>do</strong> à proteção deredutos da ineficiência, o que por sua vez facilitou a maior concentraçãoda riqueza em poucas mãos. É preciso assinalar que esta concentraçãoexcessiva foi uma das características quase crônicas da sociedadeequatoriana, considerada como uma das de menor eqüidade na AméricaLatina e no “Terceiro Mun<strong>do</strong>” em geral.128livro.pmd 12826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORNeste contexto, a política de industrialização substitutiva e a existênciade um tipo de câmbio congela<strong>do</strong> não nos podem levar a afirmaringenuamente que se tenha promovi<strong>do</strong> uma política contrária às exportações.O que faltou foi uma política adequada para fortalecer estruturalmente acapacidade competitiva <strong>do</strong> país e planejar a sua inserção no merca<strong>do</strong> mundial.O fim da euforia <strong>do</strong> petróleoGraças a suas vantagens comparativas naturais e ao baixo custo damão de obra, o Equa<strong>do</strong>r não perdeu terreno no merca<strong>do</strong> mundial nosanos <strong>do</strong> boom <strong>do</strong> petróleo. Basta citar as cifras das outras exportações, quecresceram de forma significativa: a banana passou de 88,2 milhões dedólares em 1971 para 212,8 milhões em 1981; o café, de 36,1 a 102,4milhões (em 1978 este produto alcançou o ponto mais alto no perío<strong>do</strong>:265,7 milhões); o cacau, de 24,3 para 39,5 milhões (o ponto mais alto foialcança<strong>do</strong> em 1974, com 106,6 milhões); os camarões, de 4,4 para 92,8milhões (vide a Tabela 4).Vale destacar, neste particular, que no fim <strong>do</strong>s anos 1970 e noprincípio da década seguinte as exportações de camarão adquiriram umdinamismo crescente, até converter-se em um <strong>do</strong>s cinco produtos deexportação mais importantes. Essa atividade, motivada também pelascondições <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> mundial e favorecida pelas características naturais<strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, ocasionaria depois problemas ecológicos imprevistos, devi<strong>do</strong>à destruição maciça <strong>do</strong> habitat desse crustáceo.Esses problemas ambientais adquiriram uma dimensão perigosa,destacan<strong>do</strong>-se os da Amazônia, provoca<strong>do</strong>s pela ação irresponsável dascompanhias petrolíferas, começan<strong>do</strong> pela Texaco e a Gulf, e continuan<strong>do</strong>com a CEPE/Equa<strong>do</strong>r. Ação que abriu a porta para um fluxo intenso eincontrolável de colonos, procedentes de outras regiões <strong>do</strong> país, devi<strong>do</strong> àpressão demográfica e a falta de atendimento à demanda de terra.Essa deterioração ambiental tem si<strong>do</strong> uma das causas de crises gravese repetidas. A incorporação <strong>do</strong> desafio ecológico é urgente, se realmente129livro.pmd 12926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAse quer encontrar soluções sustentáveis para uma série de problemas cadavez mais agu<strong>do</strong>s, e que já começaram a receber respostas por parte dasociedade (vide Varea 1997).Por outro la<strong>do</strong>, a existência de uma política <strong>econômica</strong> expansiva,orientada claramente para fortalecer o processo de acumulação privada esustentada por muitos subsídios, apoiava a atividade exporta<strong>do</strong>ra, deven<strong>do</strong>sedestacar o ítem “produtos manufatura<strong>do</strong>s”, cujo valor passou de 28,7para 500,5 milhões de dólares no perío<strong>do</strong> menciona<strong>do</strong>. Deve-se registrar,porém, que o melhor ano para essas exportações foi 1980, com 626 milhõesde dólares — um quarto <strong>do</strong> valor total exporta<strong>do</strong>. A partir desse ano caiuessa exportação de produtos industriais. No entanto, em sua maior parteessas exportações estavam compostas de produtos de tecnologia maissimples, com poucas vinculações com outros setores da economia eincluin<strong>do</strong> um alto componente de recursos naturais: madeira, tabaco,alimentos, etc.A partir de 1982, devi<strong>do</strong> à queda <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> petróleo e a reversão<strong>do</strong> fluxo de empréstimos aos países <strong>do</strong> “Terceiro Mun<strong>do</strong>”, interrompeusea orgia petroleira. Já no ano anterior tinham ocorri<strong>do</strong> as primeiras <strong>do</strong>resde cabeça na economia, em função <strong>do</strong> estrangulamento fiscal que o conflitofronteiriço com o Peru tornou mais agu<strong>do</strong>.O preço <strong>do</strong> óleo cru Oriente, que passara de 2,4 dólares por barrilem 1972 para mais de 30 dólares no princípio da década de 1980 (35,2dólares em 1980 e 34,4 em 1981), caiu para 32,5 em 1982, e começou aexperimentar uma deterioração sustentada. Em março de 1983, pelaprimeira vez a OPEP reduziu oficialmente em 5 dólares o valor <strong>do</strong> óleocru de referência: foi um perío<strong>do</strong> crítico. Desde então, o preço <strong>do</strong> petróleomanteve uma tendência descendente, até precipitar-se vertiginosamente amenos de 9 dólares por barril em julho de 1986 (vide Tabela 19).Como parte da estratégia de reordenamento <strong>do</strong> poder mundial, ospreços <strong>do</strong> petróleo e de outras matérias primas no merca<strong>do</strong> internacionalcomeçaram a enfraquecer, e a isso se somavam as tendências neoprotecionistasque afetavam o resto das exportações. Com a ajuda das130livro.pmd 13026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORtransnacionais petrolíferas, as ações da Agência Internacional de Energia, criadaem 1974 como resposta política à OPEP, se integraram em um grande esforçopara reduzir a dependência energética <strong>do</strong>s países capitalistas industrializa<strong>do</strong>s,particularmente no caso <strong>do</strong> petróleo. Concretamente, buscava-se reduzir ocusto das importações de petróleo procedentes <strong>do</strong> Sul, como contribuiçãopara diminuir os déficits comerciais <strong>do</strong>s países centrais.Nessa ocasião, teve um grande impacto a nova política <strong>econômica</strong><strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, a “reaganomics”, que provocou o encarecimento <strong>do</strong>crédito e uma diminuição <strong>do</strong>s empréstimos disponíveis para os países daAmérica Latina.Não há dúvida de que essa estratégia fortaleceu o sistema capitalistano nível mundial, impon<strong>do</strong> mudanças na política <strong>do</strong>s países pobres, paraque se reajustassem às novas exigências <strong>do</strong>s países <strong>do</strong> Norte, em especialos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. Ao ultrapassar as fronteiras <strong>do</strong> econômico, essaconcepção adquiriu a força de uma ideologia totalizante, apropriada paragarantir a projeção <strong>do</strong> poder norte-americano na América Latina.A fase precedente de crescimento econômico, coberta por uma“bolha” financeira e especulativa, terminou abruptamente, e com ela apossibilidade de formular com relativa facilidade correções para a política<strong>econômica</strong>, que teriam si<strong>do</strong> indispensáveis para o aproveitamento estruturalda enorme disponibilidade de divisas.Neste cenário, não surpreende que os primeiros esforços de ajusteda economia tenham si<strong>do</strong> extremamente complexos e confusos. Asociedade equatoriana não tinha consciência <strong>do</strong> problema que seavizinhava, manten<strong>do</strong> as expectativas da época da riqueza petrolífera.Além disso, como se entendia das mensagens recebidas <strong>do</strong>sorganismos financeiros internacionais, repetidas quase como um eco pelosgovernantes, a crise diante <strong>do</strong> país parecia ser produzida por uma falta deliqüidez passageira, sen<strong>do</strong> assim conjuntural e de fácil solução, enquantose aguardava uma pronta recuperação da economia norte-americana, agrande locomotiva que deveria voltar a por em movimento os seus vagões— a economia da América Latina. Mas não foi o que aconteceu.131livro.pmd 13126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAInterrompi<strong>do</strong> o sonho <strong>do</strong> petróleo no princípio da década de 1980,a economia <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r se vinculou cada vez mais ao merca<strong>do</strong> mundial.No campo internacional havia começa<strong>do</strong> um movimento de reordenação<strong>do</strong> poder: os grandes países industrializa<strong>do</strong>s, ten<strong>do</strong> á testa os Esta<strong>do</strong>sUni<strong>do</strong>s, e suas empresas transnacionais estavam agora empenha<strong>do</strong>s emreorganizar o mun<strong>do</strong> para adequá-lo às mudanças exigidas pela novarevolução tecnológica em andamento, isto naturalmente em seu benefício.Em síntese, os anos de apogeu <strong>do</strong> petróleo foram de inusita<strong>do</strong>crescimento econômico, que transformou a economia nacional,especialmente em termos quantitativos. Mas pelas razões que descrevemosé fácil entender por que a sociedade equatoriana não conseguiu firmas asbases para o seu desenvolvimento.O sistema de rendas se aprofun<strong>do</strong>u de forma complexa, enquantocrescia a capacidade de consumo internacional e nacional <strong>do</strong>s grupos demelhor situação <strong>econômica</strong>; no entanto, não cresceu na mesma proporçãoa capacidade produtiva <strong>do</strong> país, para satisfazer a demanda das massas. Oque criou uma maior demanda de recursos financeiros, obti<strong>do</strong>s com asvendas de petróleo e o endividamento externo; assim, quan<strong>do</strong> essa receitade origem externa começou a diminuir, a economia nacional fez água porto<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s. Quase se poderia afirmar que a crise havia si<strong>do</strong> programadapela administração anterior da economia, e que o seu aparecimento sódependera da duração <strong>do</strong> fluxo de recursos externos.O “esgotamento” dessa industrialização “tardia e crescentementesubordinada” (Báez 1980, p. 32), que encontrou sua base estratégica noprocesso de substituição de importações para o consumo das classes altae média, sem a criação paralela e a consolidação <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> interno parauma produção de massa, tem a sua explicação em vários fatores:. a concentração oligopolística <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>s industriais;. a estrutura segmentada da demanda de merca<strong>do</strong>rias;. o chama<strong>do</strong> “desborde popular” (conseqüência não só da imigraçãomaciça <strong>do</strong> campo para as cidades, mas sobretu<strong>do</strong> da organização132livro.pmd 13226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORsindical e <strong>do</strong>s movimentos populares) diante da capacidade limitada<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de motivar e processar mudanças mais profundas; e. as marchas e contra-marchas da política <strong>econômica</strong>, devi<strong>do</strong> àscomplicadas e seguidas alianças entre industriais e exporta<strong>do</strong>res,cujos efeitos foram a perda de eficiência da economia e a volatilidadepolítica; paralelamente surgiram novos interesses, aglutina<strong>do</strong>s emtorno <strong>do</strong> capital financeiro, pretenden<strong>do</strong> beneficiar-se com uma novamodalidade de acumulação, mais aberta.Por outro la<strong>do</strong>, nos anos de abundância de recursos as forças políticasnacionais passaram por uma série de transformações e reajustes, no meiode uma luta notória <strong>do</strong>s vários setores hegemônicos interessa<strong>do</strong>s em captaruma parte cada vez maior da renda <strong>do</strong> petróleo e, se possível, administrare distribuir diretamente essa renda.Nesse processo logo surgiram fissuras dentro das Forças Armadas,o que enfraqueceu a sua presença no Poder e, como se disse antes,juntamente com o efeito hipnótico dessa enorme massa de recursosfinanceiros disponíveis, pôs fim ao desejo inicial de instaurar uma mudança“revolucionária e nacionalista” na sociedade equatoriana.A partir de agosto de 1979, com um novo regime político e o iníciode uma nova etapa constitucional, o modelo econômico não registrouqualquer mudança substantiva, mas apenas algumas variações na conduçãopolítica e na dinâmica governamental.As demandas sociais represadas nos anos da ditadura e aspossibilidades de organização e mobilização abertas desde agosto de 1979reduziram as margens de manobra no nível político, sem no entanto criarum problema agu<strong>do</strong> enquanto o país dispunha de fontes de financiamentopara sustentar a expansão <strong>econômica</strong>. Dois anos depois, com oaprofundamento da crise, as contradições herdadas pelo governo civilforam agravadas por uma série de elementos próprios de umaadministração prejudicada pelas diferenças na sua conformação econcepção política.133livro.pmd 13326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAPor um la<strong>do</strong>, tornou-se evidente a força vigorosa de um populismopolítico (não confundível com o que alegremente se define como“populismo” no gerenciamento da economia), presente havia várias décadasno cenário político, que abria caminho para reivindicações de uma maiorparticipação popular na riqueza nacional, sem afetar contu<strong>do</strong> as estruturasde poder, por permitir a adaptação das elites à situação externa cambiante.De outro la<strong>do</strong>, começou a emergir a força renovada de grupos relativamentepequenos mas influentes, interessa<strong>do</strong>s em idéias “modernizantes” eaparentemente mais racionais para a administrar o sistema, assedia<strong>do</strong> pelostradicionais grupos <strong>do</strong>minantes, interessa<strong>do</strong>s em recuperar o controle político<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e aumentar sua ingerência nas atividades governamentais.Nestas condições, apareceram paulatinamente os limites <strong>do</strong> sistemaconstitucional e da administração civil populista. Havia problemas antigosnão resolvi<strong>do</strong>s e também uma série de novas esperanças gestadas no meioda euforia <strong>do</strong> petróleo. A economia não só precisou enfrentar esses limites,resulta<strong>do</strong> da sua rigidez e desequilíbrios estruturais, como também aintensificação da luta entre as diversas forças políticas e sociais, disputan<strong>do</strong>uma melhor parte na distribuição da renda <strong>do</strong> petróleo, e depois evitan<strong>do</strong>carregar o ônus da crise.Entrementes, um segmento cada vez maior <strong>do</strong>s créditos externoseram dirigi<strong>do</strong>s para cobrir o serviço <strong>do</strong>s empréstimos precedentes. Osrecursos financeiros continuavam disponíveis, graças à disponibilidade decréditos e a elevação <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> petróleo, mas esses preços eleva<strong>do</strong>socultavam os desequilíbrios externos e fiscais de uma crise que teria explodi<strong>do</strong>antes, quan<strong>do</strong> o peso <strong>do</strong> endividamento chegou a níveis que seriaminsustentáveis sem o aumento da receita <strong>do</strong> petróleo e sem a estratégiaperversa da contratação de novos empréstimos para manter o serviço dadívida: cada vez abria-se um buraco para tapar outro, e assim sucessivamente.Ao começar 1981 a necessidade crescente de importações paraviabilizar a produção, que encontrava suas primeiras dificuldades noaumento <strong>do</strong> custo <strong>do</strong>s créditos no merca<strong>do</strong>s financeiro internacionalsomou-se ao conflito fronteiriço com o Peru, na cordilheira <strong>do</strong> Con<strong>do</strong>r,134livro.pmd 13426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORque obrigou o governo a re<strong>do</strong>brar esforços para adquirir equipamentosmilitares, muito dispendiosos. Com isso desapareceu rapidamente boa partedas reservas em divisas, que atingira o seu ponto mais alto em 1980, com863 milhões de dólares, e depois começou a cair, atingin<strong>do</strong> 567 milhõesem 1981 e 210 milhões em 1982 (vide Tabela 19).A agricultura passou a ser, mais uma vez, um instrumento parasubvencionar parte <strong>do</strong> desenvolvimento industrial e o crescimento urbanoacelera<strong>do</strong>, o que comprometeu o ritmo de expansão da economia. Nessemomento surgiram novas dificuldades financeiras e fiscais, que obrigarama alguns ajustes iniciais na estratégia <strong>econômica</strong>, coincidentes com oproblema de fronteira de 1981, que representou uma espécie de alarmepolítico da crise que se aproximava. Pretendeu-se então, de forma tíbia,diminuir certos desequilíbrios macro-econômicos fundamentais,particularmente os que começavam a se evidenciar no setor externo e naeconomia fiscal.Assim, o processo de reordenamento constitucional surgiu no meiode problemas econômicos que excediam as expectativas da população.Não se deve esquecer também que esta nova fase política nasceu comuma série de limitações devi<strong>do</strong> à forma como se levou a cabo o próprioprocesso de retorno ao esta<strong>do</strong> de direito, concebi<strong>do</strong> e impulsiona<strong>do</strong> pelascúpulas militar e civil da sociedade, sem uma autêntica participação popular.Foi justamente nesta época, quan<strong>do</strong> na grande maioria <strong>do</strong>s paísesda região o esgotamento <strong>do</strong> esquema de acumulação basea<strong>do</strong> nasubstituição de importações levou ao retorno a um esquema liberal,rebatiza<strong>do</strong> como “neo-liberal”. A partir desse momento se pretenderia“modernizar” o modelo de exportação de produtos primários implanta<strong>do</strong>no Equa<strong>do</strong>r em fins <strong>do</strong> século XIX.Como a dívida externa foi inflada e exploradaO processo de endividamento externo vivi<strong>do</strong> pelo Equa<strong>do</strong>r duranteo apogeu <strong>do</strong> petróleo foi experimenta<strong>do</strong> igualmente pelo resto da região,135livro.pmd 13526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAapresentan<strong>do</strong> características próprias em cada país. É preciso observarporém que o tipo de política <strong>econômica</strong> a<strong>do</strong>tada foi irrelevante.Independentemente da maior ou menor orientação para o merca<strong>do</strong>mundial nos diferentes países latino-americanos, to<strong>do</strong>s eles afundaramno meio da voragem <strong>do</strong> endividamento externo, cuja origem tinha si<strong>do</strong> aalegre disposição <strong>do</strong>s países centrais ao endividamento acelera<strong>do</strong> <strong>do</strong>s paísessub-desenvolvi<strong>do</strong>s.Isto contradiz a afirmativa de que essa dívida externa teve sua origemem um problema exclusivo da América Latina, e <strong>do</strong>s outros países <strong>do</strong> “TerceiroMun<strong>do</strong>”, como resulta<strong>do</strong> direto das “políticas populistas expansivas”provocadas por despesas públicas exageradas e irresponsáveis desses governos.Definitivamente, os que proclamam essa interpretação partem <strong>do</strong> princípiode que as dificuldades surgiram exclusivamente em conseqüência das máspolíticas a<strong>do</strong>tadas pelos países latino-americanos. Ignoram conscientementequalquer outra vinculação, em especial as inter-relações <strong>do</strong>s países subdesenvolvi<strong>do</strong>scom o sistema capitalista e o merca<strong>do</strong> mundial.Vale recordar aqui que a década de 1970 marcou um momento deruptura no sistema mundial, com o surgimento de novas formas derelacionamento na divisão internacional <strong>do</strong> trabalho, quan<strong>do</strong> se consoli<strong>do</strong>ua mundialização <strong>do</strong> capitalismo. Os centros <strong>do</strong> sistema começaram aintegrar-se em grandes blocos econômicos, cada vez mais poderosos einterliga<strong>do</strong>s, sem que desse concerto participassem de forma ativa os paísesempobreci<strong>do</strong>s, que continuaram a ter um papel secundário, e que alémdisso, em to<strong>do</strong>s esses anos de crise da dívida não pretenderam (ou puderam)a<strong>do</strong>tar uma estratégia própria de desenvolvimento.Nessas condições, durante a década de 1970 o fluxo crescente derecursos financeiros destina<strong>do</strong>s ao mun<strong>do</strong> sub-desenvolvi<strong>do</strong> teve comopano de fun<strong>do</strong> o aumento sem precedentes da liqüidez internacional, assimcomo a recessão <strong>do</strong>s países centrais, no fim <strong>do</strong>s anos 1960 e princípio dadécada seguinte.Para entender essa evolução é preciso levar em conta que emdeterminadas épocas os capitais se expandem, buscam novos merca<strong>do</strong>s,136livro.pmd 13626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORassumin<strong>do</strong> a forma de créditos baratos e abundantes quan<strong>do</strong> não podemser investi<strong>do</strong>s nas economias <strong>do</strong>minantes. Foi a situação que vivemos nosanos 1970. Da noite para o dia os países <strong>do</strong> chama<strong>do</strong> “Terceiro Mun<strong>do</strong>”descobriram que era muito fácil endividar-se. Os créditos, antes tãoesquivos, eram consegui<strong>do</strong>s rapidamente, com relativa facilidade.Deste ponto de vista, a demanda de crédito não é a única razão daexistência <strong>do</strong> endividamento externo, e a má utilização desse créditotambém não é a única explicação da crise, que se originou na oferta derecursos financeiros por parte <strong>do</strong>s países desenvolvi<strong>do</strong>s, especialmenteos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s.Em lugar de corrigir os desequilíbrios <strong>do</strong> balanço de pagamentosnorte-americano, mediante reformas internas, o governo de Washingtonviolentou as regras básicas <strong>do</strong> sistema monetário internacional, e no dia15 de agosto de 1971, de forma unilateral, sem rubores ou complexo deculpa, o Presidente Nixon anunciou que o dólar deixaria de ser conversívelem ouro.Assim, os dólares existentes no mun<strong>do</strong>, acumula<strong>do</strong>s pelas garantiasoferecidas pelo governo <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s desde os acor<strong>do</strong>s de BrettonWoods, perderam valor praticamente, converten<strong>do</strong>-se na grande dívidaflutuante norte-americana, adjudicada e distribuída compulsivamente por to<strong>do</strong>o mun<strong>do</strong>. A partir desse momento, a oferta <strong>do</strong> dólar, e o que ela representavano âmbito financeiro e monetário mundial, era limitada, essencialmente, pelasdecisões de política <strong>econômica</strong> <strong>do</strong>s próprios Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s.A expansão das disponibilidades financeiras internacionaisencontrou seu ponto de partida real no impacto econômico da guerra <strong>do</strong>Vietnã e na disputa comercial entre as grandes potências. Segun<strong>do</strong> Al<strong>do</strong>Ferrer, foram os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s que originaram a primeira fase <strong>do</strong>processo de endividamento, a dança <strong>do</strong>s milhões: eles “tiveram o privilégiode financiar o seu desequilíbrio ‘exportan<strong>do</strong>’ a moeda nacional. A liqüidezse foi acumulan<strong>do</strong> nos bancos centrais e filtrou-se progressivamente paraos bancos priva<strong>do</strong>s, aumentan<strong>do</strong> a sua capacidade de emprestar” (GarcíaMenéndez 1989, p. 342).137livro.pmd 13726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTADepois o montante de recursos disponíveis aumentou com ospetrodólares, os quais, não encontran<strong>do</strong> aplicação produtiva no Norte,foram canaliza<strong>do</strong>s alegremente para o Sul, tradicionalmente marginaliza<strong>do</strong>nos merca<strong>do</strong>s financeiros internacionais. Os cre<strong>do</strong>res não levaram emconta a futura capacidade de pagamento <strong>do</strong>s deve<strong>do</strong>res; o que secompreende, pois o negócio <strong>do</strong>s financistas consiste em emprestar, nãoem guardar dinheiro. Além disso, as baixas taxas de juros, inferiores àinflação, eram um convite para o endividamento.Não se pode aceitar o mito de que a grande liqüidez internacionalda década de 1970 surgiu simplesmente como conseqüência da elevação<strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> petróleo. Por outro la<strong>do</strong>, a simples expressão dasnecessidades financeiras <strong>do</strong>s países sub-desenvolvi<strong>do</strong>s, latentes há décadas,não foi nem seria motivo suficiente para mobilizar o fluxo <strong>do</strong>s recursosexternos necessários.Esta situação obrigou o sistema financeiro internacional, através<strong>do</strong>s seus bancos, a aplicar os excedentes na periferia, estimula<strong>do</strong> não sópelo montante <strong>do</strong>s recursos disponíveis e a possibilidade relativamentemenor de reprodução nos países centrais, mas pela redução <strong>do</strong>s controlese uma avaliação positiva das possibilidade de pagamento desses países.Nessas circunstâncias, diminuiu o rigor na concessão de empréstimos,dan<strong>do</strong>-se prioridade aos esquemas financeiros e comerciais em comparaçãocom os de produção, o que se refletiu no incremento gradual das atividadesespeculativas.Juntamente com os bancos numerosas empresas estrangeiras, muitastransnacionais, participavam ativamente da “dança <strong>do</strong>s milhões”, venden<strong>do</strong>tecnologias obsoletas ou construin<strong>do</strong> obras que, pelos seus erros deplanejamento constituem verdadeiros monumentos à ineficiência.Há casos paradigmáticos de empresas que, para vender seus produtospropiciavam qualquer loucura: a construção de uma usina termo-nuclearno valor de 2.500 milhões de dólares nas Filipinas, erigida sobre terrenosísmico e que não funciona; a fábrica de papel de Santiago de Cao, noPeru, que não pode operar pela falta de água suficiente; o trem elétrico de138livro.pmd 13826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORLima, inconcluso; a refinaria de estanho de Karachipampa, na Bolívia,que por estar situada a 4.000 metros de altitude não tem bastante oxigêniopara funcionar; a usina de processamento de lixo de Guayaquil, adquiridae paga mas que nunca foi instalada, e cujos restos se incendiaram; alaminação de aço ACEPAR, no Paraguai, que praticamente não funcionadesde sua conclusão, em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1980; a gráfica <strong>do</strong> Ministérioda Educação, em Quito, instalada em 1991, <strong>do</strong>ze anos depois de adquirida(e que ainda não funciona), quan<strong>do</strong> o país de origem <strong>do</strong> equipamento, aRepública Democrática Alemã, deixara de existir.Outro caso digno de menção pode ser a compra de barcos pesqueirosnoruegueses por parte de empresários equatorianos, no fim da década de1970. Construí<strong>do</strong>s com subsídios <strong>do</strong> governo norueguês, interessa<strong>do</strong> emapoiar seus debilita<strong>do</strong>s estaleiros, esses barcos foram compra<strong>do</strong>s comfinanciamento da Noruega. No entanto, pouco tempo depois, como onegócio não caminhava de acor<strong>do</strong> com as expectativas iniciais, os barcosforam vendi<strong>do</strong>s ao Esta<strong>do</strong> equatoriano, que assumiu a dívida contraídacom a Noruega, de cerca de 150 milhões de dólares, e cujo pagamento foisuspenso a partir de 1995; no entanto, ao começar o novo milênio, emboraseja uma dívida impagável e de duvi<strong>do</strong>sa legitimidade, pretende-setransformá-la em inversões sociais ...Esses e muitos outros projetos que terminaram sen<strong>do</strong> improdutivos,apesar de contarem com a onerosa assessoria de consultores e empresasestrangeiras, e com a supervisão <strong>do</strong>s novos organismos multilaterais,permanecem como um passivo a ser pago pelos países pobres. Em outrosprojetos o custo final foi muito superior ao inicialmente orçamenta<strong>do</strong>. Avenda de armamentos, muitas vezes financiada com créditos externos, éoutro exemplo da cumplicidade e co-responsabilidade <strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res.Um lugar destaca<strong>do</strong> cabe às instituições financeiras multilaterais: oBanco Mundial, o FMI e o BID, controla<strong>do</strong>s pelos países mais ricos.Durante o festim creditício, esses organismos fizeram empréstimos liberaispara o mun<strong>do</strong> subdesenvolvi<strong>do</strong>, ou ajudaram a sua contratação, inclusivepelas empresas estatais, que agora tanto criticam. Transferir para o Sul a139livro.pmd 13926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAenorme massa de recursos financeiros excedentes no Norte era a melhorsaída diante da recessão que atingia os países centrais.Não há dúvida de que o Banco Mundial e o FMI são atoresimportantes nas transformações registradas nas últimas décadas no mun<strong>do</strong>subdesenvolvi<strong>do</strong>. No caso da América Latina, não podemos esquecertambém o BID, sócio menor <strong>do</strong>s primeiros. São organismos que hábastante tempo têm atua<strong>do</strong> ativamente planejan<strong>do</strong> e recomendan<strong>do</strong>políticas <strong>econômica</strong>s, e por isso é enorme a sua responsabilidade por boaparte <strong>do</strong> que aconteceu e ainda acontece nos países pobres.Além disso, enquanto estimulavam a contratação de créditosexternos, esses organismos não se precaviam — nem mesmo nos anos1980, quan<strong>do</strong> a crise da dívida já era um fato — contra as mudançassubstanciais no merca<strong>do</strong> <strong>do</strong> petróleo, para mencionar um aspectoimportante na época. Os efeitos desse clima permissivo fomenta<strong>do</strong> pelosorganismos internacionais, tanto para os países importa<strong>do</strong>res como paraos exporta<strong>do</strong>res de petróleo, levavam necessariamente à continuação <strong>do</strong>processo de endividamento. Para os importa<strong>do</strong>res, a saída para a expectativade um aumento sustenta<strong>do</strong> <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> óleo bruto era endividar-separa diversificar a oferta energética e reduzir a dependência <strong>do</strong> petróleo.No entanto, da revisão <strong>do</strong> endividamento desses países é fácil concluirque a elevação <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> petróleo não foi o único detona<strong>do</strong>r dessademanda maciça de créditos, ocorrida dentro de contexto sistêmico. Paraos segun<strong>do</strong>s, o lógico, em termos financeiros, era continuar assumin<strong>do</strong>empréstimos, que no momento não representavam um grande ônus, parapagá-los depois com o espera<strong>do</strong> aumento da receita <strong>do</strong> petróleo.O BID, por exemplo, afirmava em 1981 que “dada a elasticidade dereceita da demanda de energia, tanto a curto como a longo prazo, e asprováveis mudanças na estrutura da economia, a aceleração da taxa decrescimento da atividade <strong>econômica</strong> levará a uma maior demanda, emparticular de petróleo, pelo menos durante os próximos dez anos.”Mesmo quan<strong>do</strong> o preço <strong>do</strong> óleo cru já havia caí<strong>do</strong>, a partir da segundametade <strong>do</strong> ano de 1982, dan<strong>do</strong> sinais de um enfraquecimento de tipo140livro.pmd 14026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORestrutural que levaria, em 1986, ao seu valor mais baixo, em 1985 o BancoMundial ainda garantia: “é provável que [esses preços]voltem a aumentarem termos reais durante o presente decênio.” Neste contexto havia cenárioscom preços crescentes <strong>do</strong> petróleo, que flutuaram entre 30 e 48 dólarespor barril em mea<strong>do</strong>s da década de 1980, e entre 30 e 78 dólares emmea<strong>do</strong>s da década seguinte (em valores constantes de 1980). Esses errosde previsão no campo petrolífero foram repeti<strong>do</strong>s com relação a muitosoutros produtos primários na década de 1980. Com respeito ao petróleo,o erro foi de 150 a 160 por cento; para os minerais metálicos chegou a62%; para óleos e azeites vegetais, a 180%; para outros produtos agrícolasnão alimentícios, 10%; e assim por diante.Posteriormente, já em plena crise, esses organismos internacionais(com funcionários subsidia<strong>do</strong>s de to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s) assumiram o papel decobra<strong>do</strong>res e ajusta<strong>do</strong>res das economias que tinham contribuí<strong>do</strong> aendividar. Some-se a isso o papel que tiveram como causa<strong>do</strong>res diretos daperda de disciplina <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> ao propiciar muitas vezes medidas quesignificaram a assunção <strong>do</strong>s riscos <strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res e deve<strong>do</strong>res priva<strong>do</strong>s.Sem dúvida alguma os anos 1970 foram um perío<strong>do</strong> propício paraconseguir empréstimos fáceis; a sua destinação quase não interessava, ecom créditos externos podia-se até mesmo pagar os salários <strong>do</strong>s burocratas.Neste processo, os bancos ofereciam e chegavam a obrigar os paísessubdesenvolvi<strong>do</strong>s, direta ou indiretamente, a aceitar empréstimos que nãose ajustavam às condições normais, muitos <strong>do</strong>s quais não eramindispensáveis ou superavam o valor solicita<strong>do</strong> inicialmente. E os bancosnão deixavam de conseguir sempre grandes lucros com essas operações.Naquela ocasião, o endividamento externo <strong>do</strong>s países latinoamericanosdeve ser visto como uma reação aos interesses e necessidades<strong>do</strong> sistema bancário internacional, especificamente <strong>do</strong> capital financeiro,mais <strong>do</strong> exclusivamente das necessidades desses recursos e a suaadministração pelos países endivida<strong>do</strong>s.Apesar da importância de que se reveste a lógica <strong>do</strong> capital financeirointernacional na vida <strong>do</strong>s nossos países, não se pode acreditar que essa141livro.pmd 14126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAlógica seja exclusivamente <strong>econômica</strong> e financeira. É preciso levar emconta outros elementos constitutivos <strong>do</strong> poder mundial, como por exemploa influência da “colonialidade <strong>do</strong> poder” que mencionamos no princípiodeste livro.Nesse ambiente de facilidade financeira, as elites terceiro-mundistasencontraram a oportunidade para satisfazer, ainda que só em parte, seudéficit crônico de financiamento. Processo que se transformou em umalegre e exagera<strong>do</strong> endividamento <strong>do</strong> “Terceiro Mun<strong>do</strong>”, que além detu<strong>do</strong> não levou a uma utilização adequada <strong>do</strong>s recursos contrata<strong>do</strong>s; eassim se gerou uma nova crise da dívida externa. Em outras palavras, ogrande crescimento da economia equatoriana atraiu um fluxo importantede créditos externos, sem que paralelamente fossem feitas mudançasestruturais que tivessem permiti<strong>do</strong> criar para ela bases mais firmes, eterminou por torná-la mais vulnerável. No fim empréstimos eramcontrata<strong>do</strong>s para cumprir com obrigações creditícias assumidasanteriormente ...Neste ponto cabe lembrar, além de tu<strong>do</strong>, as pressões norteamericanas,financeiras e comerciais, sofridas pelo Equa<strong>do</strong>r na década de1970, por ser membro da Organização <strong>do</strong>s Países Exporta<strong>do</strong>res de Petróleo(OPEP). Pressões que contribuíram para forçar o endividamento externocom bancos priva<strong>do</strong>s.É preciso completar a <strong>história</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, especialmente no séculoXX, com a crescente ingerência <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s nos seus assuntosinternos, o que em algumas ocasiões provocou conflitos como a “guerra<strong>do</strong> atum”, iniciada na década de 1950 e agravada nas duas décadas seguintes,com a qual o governo norte-americano impôs ao país uma série de sançõesaduaneiras e comerciais, pela decisão equatoriana de defender o seu marterritorial, apresan<strong>do</strong> barcos pesqueiros americanos dentro da zona deduzentas milhas <strong>do</strong> mar territorial reclama<strong>do</strong> pelo país.Pressões diplomáticas e até mesmo aduaneiras que se repetiriamdurante os anos 1980 e 1990 com ameaças feitas pela Embaixada <strong>do</strong>sEsta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s em Quito, na defesa de um grupo de investi<strong>do</strong>res ianques142livro.pmd 14226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORque tinham negócios em Guayaquil com a empresa de eletricidadeEMELEC: durante décadas uma companhia privada que gozou deproteção estatal e que se beneficiava com uma garantia de lucro mínimoem dólares.No entanto, a despeito de to<strong>do</strong>s esses elementos de origem externa,não se pode ocultar, em absoluto, que a crise teve origem também dentro<strong>do</strong> país, onde várias causas sistêmicas aprofundaram o endividamento eexplicam não só o montante eleva<strong>do</strong> da dívida mas também sua precáriautilização.No caso <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r os seguintes aspectos poderiam ser salienta<strong>do</strong>s:. investimentos sobre-dimensiona<strong>do</strong>s de muitos projetos inicia<strong>do</strong>snos anos <strong>do</strong> petróleo;. estabelecimento e consolidação de padrões de vida consumistasem pequenos grupos da população;. compras maciças de armas;. corrupção;. transferência para o exterior de recursos financeiros (evasão decapitais);. remessas de lucros das empresas estrangeiras;. pagamento crescente de juros e amortização <strong>do</strong>s créditosconcedi<strong>do</strong>s pelo bancos internacionais.Além disso, é preciso reconhecer que em mais de uma oportunidadeos governantes <strong>do</strong>s países subdesenvolvi<strong>do</strong>s defenderam os interesses deinvesti<strong>do</strong>res, comerciantes e banqueiros <strong>do</strong>s países <strong>do</strong> Norte, sejamvende<strong>do</strong>res de armas ou agiotas internacionais, para mencionar apenasduas categorias.No princípio da década de 1980 as dificuldades <strong>econômica</strong>sinternacionais começaram a se agravar, à medida que os déficits daeconomia norte-americana pressionavam as relações comerciais efinanceiras mundiais. Esses desequilíbrios obrigaram a um reajuste da143livro.pmd 14326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAeconomia norte-americana, o que motivou a elevação das taxas de juros ea redução <strong>do</strong>s créditos disponíveis para os países sub-desenvolvi<strong>do</strong>s.Portanto, outra vez o elemento que detonou a crise latino-americanaestava nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s: foi a instauração da política <strong>econômica</strong>conhecida como “reaganomics”, a partir de 1981, a qual fez com que adívida externa <strong>do</strong> Terceiro Mun<strong>do</strong> se tornasse completamenteinadministrável. A política a<strong>do</strong>tada pelo Presidente Reagan procuroureduzir os enormes déficits da economia norte-americana para reafirmara superioridade militar <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s sobre a União Soviética e asua liderança sobre as outras economias ocidentais; provocou um aumentomaciço da despesa com armamentos, que não podia ser compensada coma restrição <strong>do</strong>s gastos nas áreas sociais. Como corolário, seus déficitscontinuaram crescen<strong>do</strong> e os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s passaram a ser a maioreconomia deve<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, com um merca<strong>do</strong> insaciável de créditos,reorientan<strong>do</strong> os fluxos financeiros <strong>do</strong> Sul para o Norte.Com a “reaganomics” se experimentou um processo de recuperaçãode capitais por parte <strong>do</strong>s países desenvolvi<strong>do</strong>s, com base em um incrementosustenta<strong>do</strong> das taxas de juros. Essas taxas, que tinham flutua<strong>do</strong> entre 4 e6% ao ano, disparam para o nível de 20%. A elevação repentina e arbitráriadas taxas de juros causou um refluxo maciço de capitais: endivida<strong>do</strong>s, ospaíses pobres foram “amarra<strong>do</strong>s à pesada roda <strong>do</strong>s juros compostos”.Com taxas de juros altas, os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s atraíam capitais latinoamericanos.Assim, a América Latina exportou capital para financiar asgrandes transformações tecnológicas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> desenvolvi<strong>do</strong>, sobretu<strong>do</strong>nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, e a dívida externa voltou a ser sentida como umproblema. Teve início uma nova crise da dívida, como em épocas anteriores,o que se fez acompanhar por uma redução da demanda as matérias primas,com a conseqüente queda <strong>do</strong>s seus preços.Nessa época de crise, desde 1980 até 1990, houve na América Latinauma transferência líqüida negativa de 238 mil milhões de dólares em favor<strong>do</strong>s seus cre<strong>do</strong>res, sobretu<strong>do</strong> nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. Transferência que sepode estimar soman<strong>do</strong> os novos empréstimos ao total da dívida existente144livro.pmd 14426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORem 1980: 228 mil milhões de dólares, e diminuin<strong>do</strong> o pagamento <strong>do</strong>principal e especialmente o serviço de juros. No ano 1990, a dívida externa,como por um passe mágico, alcançou 442 mil milhões de dólares. Foipaga, em termos líqui<strong>do</strong>s, uma soma enorme: 238 mil milhões. Nãoobstante, a dívida externa adquiriu vida própria, e cresceu em quase 220mil milhões. Instaurou-se assim a loucura financeira, a luxúria especulativa,a sem-razão <strong>do</strong>s juros usurários cobra<strong>do</strong>s sobre juros atrasa<strong>do</strong>s, e a dívidase tornou impagável.Para termos uma idéia da magnitude envolvida, o valor totaltransferi<strong>do</strong> aos cre<strong>do</strong>res representa três vezes o valor <strong>do</strong> Plano Marshall,com o qual os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s financiaram a reconstrução da Europa,entre 1948 e 1953. Assim, a América Latina financiou a recuperação daseconomias desenvolvidas, em particular a norte-americana. Eric Toussaint,um especialista belga nos temas da dívida externa, garante que o serviçoda dívida por to<strong>do</strong>s os países empobreci<strong>do</strong>s, no perío<strong>do</strong> entre 1980 e2000 (sem levar em conta novos desembolsos), representou o equivalentea 43 vezes o Plano Marshall, e que a quantia paga por esses paísesanualmente como serviço da dívida representa o equivalente a 3 vezes oPlano Marshall. Esta realidade desmente a mensagem tantas vezes repetidacom que se quer convencer os deve<strong>do</strong>res de que precisam saldar a dívidapara poder receber novos investimento, pois na prática em termos líqüi<strong>do</strong>sos fluxos financeiros se dirigem <strong>do</strong> Sul para o Norte.Do ponto de vista matemático, a dívida da América Latina já estariapaga, e o mesmo se pode dizer com respeito especificamente à dívida <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r. Com efeito, de 1982 a 2000 o Equa<strong>do</strong>r desembolsou comopagamento de capital e juros o total de 75.908,2 milhões de dólares, e nomesmo perío<strong>do</strong> recebeu novos desembolsos totalizan<strong>do</strong> 65.678,8 milhões:uma transferência líqüida negativa de 10.229,4 milhões. Não obstante, ovalor da dívida aumentou em 6.931,7 milhões, passan<strong>do</strong> de 6.633 milhõespara 13.564,5 milhões no perío<strong>do</strong> menciona<strong>do</strong>. Cabe mencionar que coma conversão <strong>do</strong>s títulos Brady em bônus Global, a dívida se reduziu em2.717,8 milhões no ano 2000 (vide Tabela 11). Assim, o Equa<strong>do</strong>r deve ter145livro.pmd 14526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAfinancia<strong>do</strong> quase um décimo <strong>do</strong> “Plano Marshall” com que os latinoamericanossocorreram os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s …A esta sangria crônica se poderia acrescentar o que significou atransferência de recursos pela deterioração <strong>do</strong>s termos de intercâmbio, aevasão de capitais, a perda de capital humano pela emigração, e até mesmoo negócio <strong>do</strong> narcotráfico, realiza<strong>do</strong> em sua maior parte nos Esta<strong>do</strong>sUni<strong>do</strong>s. Ao que se saiba os países ricos nunca opuseram obstáculos aesses fluxos financeiros provenientes <strong>do</strong>s países <strong>do</strong> Sul, que desde a épocacolonial foram muito vantajoso para eles. E cabe lembrar, finalmente, queé difícil, se não impossível, recuperar os depósitos bancários <strong>do</strong>s dita<strong>do</strong>res,escondi<strong>do</strong>s nos países ricos.Por tu<strong>do</strong> isso não se pode afirmar que a crise tenha si<strong>do</strong> provocadapela dívida, pois esta é na verdade apenas uma outra manifestação dacrise, que tem uma série de elementos próprios, além de outros que jáocorreram em épocas anteriores: mea<strong>do</strong>s da década de 1820, princípio<strong>do</strong>s anos 1870 e nos anos noventa <strong>do</strong> século XIX, assim como natristemente célebre depressão <strong>do</strong>s anos trinta <strong>do</strong> século XX.146livro.pmd 14626/9/2005, 13:26


4Rumo a um novo modelomoderniza<strong>do</strong> de exportaçãode produtos primárioslivro.pmd 14726/9/2005, 13:26


livro.pmd 14826/9/2005, 13:26


Rumo a um novo modelo moderniza<strong>do</strong>de exportação de produtos primáriosAntes de entrar na análise desta última fase da <strong>história</strong> <strong>econômica</strong><strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, convém assinalar que poucas vezes no mun<strong>do</strong> uma propostaideológica alcançou o nível de globalidade <strong>do</strong> neo-liberalismo: umaideologia, e não simplesmente uma teoria <strong>econômica</strong>. Como “retorno <strong>do</strong>neo-liberalismo”, conforme a definiu Raúl Prebisch no princípio <strong>do</strong>s anos1980, essa ideologia se transformou em “pensamento único”. Emconseqüência dessa posição totalitária, a mensagem <strong>do</strong>minante asseguraque “não há alternativa”. E dessa perspectiva o ajuste estrutural se difundepelo mun<strong>do</strong>, em um claro exercício de poder global.O alcance <strong>do</strong> consenso de WashingtonAs propostas <strong>econômica</strong>s vigentes, que configuram a lógica e aprática <strong>do</strong>s ajustes neo-liberais, são conhecidas como “Consenso deWashington”, tal como no princípio da década de 1990 John Williamsonas denominou, engenhosamente. Essa receita recolhe as medidas orto<strong>do</strong>xas<strong>do</strong> FMI, <strong>do</strong> Banco Mundial e <strong>do</strong>s outros organismos multilaterais de crédito(BID, etc.), assim como a posição <strong>do</strong> governo norte-americano e <strong>do</strong>sconglomera<strong>do</strong>s transnacionais de maior influência mundial, sobretu<strong>do</strong> osnorte-americanos.Sem pretender aprofundar os detalhes <strong>do</strong> Consenso, vale a penaindicar dez componentes básicos dessa receita:. Austeridade e disciplina fiscal.. Reestruturação da despesa pública.. Reforma tributária.149livro.pmd 14926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA. Privatização das empresas públicas.. Administração de um câmbio competitivo.. Liberalização comercial.. Desregulamentação <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> financeiro e abertura da contade capitais.. Abertura sem restrições aos investimentos diretos estrangeiros.. Flexibilização das relações <strong>econômica</strong>s e trabalhistas.. Garantia e cumprimento <strong>do</strong>s direitos de propriedade privada.Não contam apenas as medidas monetaristas de curto prazo. Sãoposições que fazem parte de uma estratégia global para re-estruturar aeconomia, dentro da racionalidade <strong>do</strong> sistema capitalista. Com essa receita seprocura criar um “contexto apropria<strong>do</strong>” para garantir a participação <strong>do</strong>s paísessub-desenvolvi<strong>do</strong>s na nova divisão internacional <strong>do</strong> trabalho: a “globalização”,apresentada de forma simplória como se fosse um processo novo, quan<strong>do</strong> narealidade é apenas uma fase <strong>do</strong> processo de mundialização <strong>do</strong> capitalismo.Embora o tratamento da dívida externa não apareça explicitamenteno “cardápio” exposto, a aplicação dessa receita tem por objetivo garantiro serviço da dívida, cuja renegociação se transformou em alavanca eficazpara impor o Consenso de Washington, que em um ambiente democráticonão se sustenta.As instituições financeiras internacionais, ten<strong>do</strong> à frente o FMI e oBanco Mundial, têm si<strong>do</strong> e são atores fundamentais deste processo. Suascondicionalidades cruzadas são determinantes para a fixação das políticas<strong>econômica</strong>s. Sem a “aprovação” dessas instituições dificilmente um paísreceberá empréstimos e investimentos estrangeiros; essa aprovação passoua ser uma espécie de “selo de garantia” para os investi<strong>do</strong>res. A atuação <strong>do</strong>FMI e <strong>do</strong> Banco Mundial é complementada pelo Clube de Paris, com oqual são re-estruturadas as dívidas bilaterais — desde que elas contemcom tal garantia.A estabilização e o ajuste não visam simplesmente reduzir a inflaçãoou assegurar o crescimento econômico de longo prazo para os países150livro.pmd 15026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORperiféricos. São mecanismos destina<strong>do</strong>s a transformar a economia mundial,e que, em primeiro instância, garantem os merca<strong>do</strong>s para os produtos <strong>do</strong>spaíses centrais. O aumento das exportações desses países serviu para sanearseu balanço de pagamentos e para suavizar a recessão e as altas taxas dedesemprego, ao mesmo tempo em que se beneficia da oferta a baixospreços de produtos agrícolas e minerais provenientes <strong>do</strong>s paísesempobreci<strong>do</strong>s.Em suma, como resulta<strong>do</strong> das mudanças ocorridas nos últimos anos,o merca<strong>do</strong> mundial tornou-se mais favorável às exportações <strong>do</strong>s paísesindustrializa<strong>do</strong>s, em comparação com as <strong>do</strong>s países subdesenvolvi<strong>do</strong>s;exportações que, como as agrícolas, são protegidas por enormes subsídios(mais de 360 mil milhões de dólares por ano). Além disso, a transferênciade recursos a partir <strong>do</strong>s países latino-americanos, incluin<strong>do</strong> a amortizaçãoda dívida externa, serviu para financiar a revolução tecnológica eorganizacional em curso nos países industrializa<strong>do</strong>s.Como veremos adiante, durante to<strong>do</strong>s esses anos, e independentemente<strong>do</strong>s diferentes graus de coerência entre a teoria e a prática, aplican<strong>do</strong> sempreas mesmas políticas e sem se preocupar com a sua irracionalidade, oEqua<strong>do</strong>r se manteve dentro <strong>do</strong> movimento de reordenação lidera<strong>do</strong> pelocapital financeiro internacional.Ao aban<strong>do</strong>nar uma opção nacional (melhor dito: uma potencialopção nacional), o Equa<strong>do</strong>r se integrou no funcionamento da economiainternacional dentro de um esquema passivo que precipita e consolida atrans-nacionalização. Como algum espírito ingênuo poderia crer, o motordesse fenômeno não é o simples resulta<strong>do</strong> de uma confabulaçãointernacional empenhada em subjugar as nações mais fracas, mas se explicapela lógica objetiva <strong>do</strong> sistema capitalista, que processa atualmente umanova forma de reorganização política e <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.Para conseguir essa reinserção se aceitou na prática a necessidadede tornar competitiva a mão de obra nacional, mediante a depreciaçãoprogramada <strong>do</strong> poder aquisitivo <strong>do</strong>s salários e a maior flexibilização daclasse trabalha<strong>do</strong>ra. Aceitou-se assim a “reprimarização” da economia,151livro.pmd 15126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAvoltan<strong>do</strong>-se a explorar as vantagens comparativas naturais, aproveitan<strong>do</strong>sua renda elevada, excluin<strong>do</strong> a possibilidade de instaurar pelo menos umesquema de longo prazo para consolidar aqueles setores produtivos nosquais o país poderia tornar-se competitivo no longo prazo. São consolidadasatividades de baixo perfil tecnológico, em caráter definitivo, com muitopouca ou nenhuma incidência internacional.Da mesma forma se progride no desmantelamento <strong>do</strong>gmático <strong>do</strong>Esta<strong>do</strong>, esgrimin<strong>do</strong> a espada da sua ineficiência estrutural, quan<strong>do</strong> o queestá realmente em jogo , além <strong>do</strong>s bons negócios ofereci<strong>do</strong>s pelasprivatizações, é a eliminação de uma forma de Esta<strong>do</strong> que possa converterseem um <strong>do</strong>s eixos <strong>do</strong> processo nacional de desenvolvimento. Dessaperspectiva chegou-se à satanização <strong>do</strong> papel <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, apresenta<strong>do</strong> comouma instituição que, flutuan<strong>do</strong> acima das divisões de classe, interesse eestrutura <strong>econômica</strong>, teria goza<strong>do</strong> de uma autonomia que provocou acrise vivida pelo país desde os anos 1980. Algo distante da verdade, comotivemos a oportunidade de ver nestas páginas.Assim, a partir de uma crítica da modalidade fracassada deindustrialização, abre-se a porta a uma nova modalidade de acumulaçãoprimário-exporta<strong>do</strong>ra moderna, acompanhada evidentemente de um novoEsta<strong>do</strong>, de outra política <strong>econômica</strong> e diferentes alianças <strong>do</strong>minantes:elementos que serão trata<strong>do</strong>s mais adiante.Os primeiros passos <strong>do</strong> ajuste neo-liberalInterrompi<strong>do</strong> o processo de acumulação sustenta<strong>do</strong> por recursosfinanceiros “fáceis e abundantes”, sem as reformas estruturais que seriamindispensáveis, os governo civis precisaram enfrentar a busca <strong>do</strong>sequilíbrios macro-econômicos, procuran<strong>do</strong> manter com vida o espaçoconstitucional, que respondia às necessidades da renovada estratégiainternacional <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s.Além da queda <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> petróleo (que durante 1981 chegarama mais de 40 dólares por barril no merca<strong>do</strong> ocasional, conheci<strong>do</strong> como152livro.pmd 15226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORspot), o Equa<strong>do</strong>r teve que enfrentar as inundações <strong>do</strong> inverno de 1982 e1983, causadas pelo fenômeno El Niño, que afetaram a produção agrícolae a economia de mo<strong>do</strong> geral. Desde então, o Equa<strong>do</strong>r, que até 1981 vinhaconviven<strong>do</strong> com aparente facilidade com o impacto <strong>do</strong>s problemaseconômicos internacionais, começou a sentir em cheio os seus sintomas;mas não exclusivamente por causa das razões naturais já citadas, ou pelaqueda <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> óleo cru, mas também por uma série de fatoresestruturais externos e internos que mencionamos no curso <strong>do</strong>s capítulosprecedentes.Pouco depois da suspensão <strong>do</strong>s pagamentos externos pelo México,em agosto de 1982, o governo equatoriano ingressou na ronda dasnegociações contínuas da dívida externa com os cre<strong>do</strong>res internacionais,incorporan<strong>do</strong> sempre com maior profundidade as recomendações econdicionalidades <strong>do</strong> capital financeiro internacional, formuladas epressionadas pelo FMI e o Banco Mundial. Surgiram então, de formacrua, os problemas que a fase <strong>do</strong> petróleo mantivera relativamente ocultos.O governo presidi<strong>do</strong> por Osval<strong>do</strong> Hurta<strong>do</strong> Larrea, que herdara opoder político depois <strong>do</strong> trágico falecimento <strong>do</strong> Presidente Jaime RoldósAguilera, em 24 de maio de 1981, deu início a uma marcha tortuosa deintermináveis ajustes e desajustes.Desde então tentou-se enfrentar o problema da inflação aplican<strong>do</strong>um esquema recessivo visan<strong>do</strong> reduzir os índices de consumo einvestimento, e garantin<strong>do</strong> os processos de acumulação de capital. Situaçãoque só era viável na medida em que os salários eram deprimi<strong>do</strong>s. Emconseqüência, a participação <strong>do</strong> fator trabalho na renda nacional caiu de32% em 1980 para 12,7% em 1990 e 1991, seguin<strong>do</strong>-se uma ligeirarecuperação em 1997, para 13,9%, pouco antes da severa crise <strong>do</strong> fim <strong>do</strong>século XX. Os trabalha<strong>do</strong>res, assim como a maioria <strong>do</strong>s servi<strong>do</strong>respúblicos, especialmente os professores, sofreram os efeitos mas duros darepressão salarial.To<strong>do</strong>s esses elementos, no contexto da chamada “flexibilizaçãotrabalhista”, comprimiram ainda mais o já limita<strong>do</strong> merca<strong>do</strong> interno, que153livro.pmd 15326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAsofreu também com o desemprego crescente e o enfraquecimentosistemático da organização sindical. Desde que foram introduzidas algumasreformas no campo da contratação compartilhada, a chamada maquila e aszonas francas com claras limitações à atividade sindical, a partir <strong>do</strong> governode Rodrigo Borja Cevallos, em 1988, não faltaram as pressões para ampliarainda mais a flexibilização trabalhista.Uma descrição <strong>do</strong> que foi o ajuste no Equa<strong>do</strong>r estaria incompletase não considerasse as dificuldades exógenas enfrentadas pela economia,soman<strong>do</strong>-se às antigas e enraizadas restrições <strong>do</strong> sub-desenvolvimento.Entre as primeiras pode-se destacar inundações (1982-3, 1997-8), secas,terremoto (1987), queda <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> petróleo (1982-3, 1986, 1997-8),conflito bélico (1981, 1995), crise financeira internacional (1997-8). Estaanálise deveria incorporar os problemas estruturais existentes,característicos <strong>do</strong> capitalismo dependente, já que não se pode aceitar queas condições prevalecentes antes <strong>do</strong> ajuste eram ótimas e estáveis, ou quea causa <strong>do</strong>s problemas <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r é exclusivamente a política de inspiraçãoneoliberal.Uma primeira abordagem <strong>do</strong> tema exige repassar rapidamente aevolução <strong>do</strong> ajuste desde a sua instituição política.Depois <strong>do</strong> início relativamente tími<strong>do</strong> da reforma, sobretu<strong>do</strong> nocampo da estabilização macro-<strong>econômica</strong>, devi<strong>do</strong> principalmente aosefeitos da crise da dívida externa, no governo de Osval<strong>do</strong> Hurta<strong>do</strong> Larrea(1981-4), o ajuste experimentou uma transição descontínua e confusadurante o regime social-cristão de León Febres Cordero (1984-8); a despeitodas suas declarações e ações em favor de uma maior abertura e liberalização“‘neo-liberalismo’ com uma gramática populista’, diria posteriormente ocientista político César Montufar — a economia evoluiu para umadesordem generalizada, com crescente mal-estar da cidadania, revoltadacontra um governo autoritário.As expectativas levantadas pelo social-democrata Rodrigo BorjaCevallos (1998-1992), contrário publicamente às teses neo-liberais, durarampouco: além de certas intenções de mudança e de algumas reformas154livro.pmd 15426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORimportantes, o seu governo se manteve em grande medida na senda <strong>do</strong>ajuste, e tramitou uma série de transformações (por exemplo, no campotrabalhista e de abertura comercial) que viriam a facilitar posteriormenteo aprofundamento <strong>do</strong> esquema neo-liberal.No perío<strong>do</strong> <strong>do</strong> conserva<strong>do</strong>r Sixto Durán Ballén (1992-6), o discursoneo-liberal coincidiu com em boa medida com a prática governamental: oajuste deu passos acelera<strong>do</strong>s, embora alguns deles fossem trunca<strong>do</strong>s peloprotesto social que derrotou as reformas neo-liberais que o regime quisintroduzir em fins de 1995, via consulta popular, quan<strong>do</strong> falhou a manobracorrupta <strong>do</strong> Vice-Presidente Alberto Dahik Garzosi, que reconheceu osuborno pratica<strong>do</strong> com deputa<strong>do</strong>s para acelerar as privatizações. Pelomenos até o ano de 1999 se sentiu a herança da política <strong>econômica</strong> <strong>do</strong>Vice-Presidente Dahik e da sua equipe <strong>econômica</strong>, chefiada por Ana LuciaArmijos, Augusto de la Torre e Fidel Jaramillo Buendía (equipe que“reinou” desde então até o governo de Mahuad).Em seguida o populista Abdalá Bucaram Ortiz chegou à Presidência(1996-7), apresentan<strong>do</strong>-se como “o Presidente <strong>do</strong>s pobres”, e tentouimpulsionar a economia equatoriana para uma fase superior <strong>do</strong> neoliberalismo:sua proposta de conversibilidade seria instrumental para forçara aprovação de uma longa lista de reformas neo-liberais, acelerar asprivatizações e radicalizar a flexibilidade trabalhista.Mais adiante, depois de complica<strong>do</strong> e confuso acor<strong>do</strong> político pararesolver a crise de fevereiro de 1997, quan<strong>do</strong> Bucaram Ortiz se viu força<strong>do</strong>a deixar o Poder, foi instaura<strong>do</strong> um governo interino, à frente <strong>do</strong> qualesteve o conserva<strong>do</strong>r-populista Fabián Alarcón Rivera, em 1997-8. Apesarde uma gestão caótica, o seu governo se manteve no caminho <strong>do</strong> ajuste,no meio de crise que se ampliava com rapidez, ao mesmo tempo em quese desperdiçava uma oportunidade histórica para fazer uma reforma políticaprofunda, tão reclamada pela sociedade depois da queda de Bucaram Ortiz.Com Jamil Mahuad Witt (1998-2000), democrata cristãoestreitamente vincula<strong>do</strong> aos grandes bancos, o país enfrentou uma daspriores crises <strong>econômica</strong>s da sua <strong>história</strong>, agravada pela imposição, em 9155livro.pmd 15526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAde janeiro de 2000, de um esquema de <strong>do</strong>larização oficial da economia.Dolarização ratificada pelo Vice-Presidente de Mahuad, Gustavo NoboaBejarano, que chegou à Presidência em 22 de janeiro de 2000, quan<strong>do</strong>fracassou uma tentativa de assalto <strong>do</strong> Poder por um grupo de importantesatores sociais, sobretu<strong>do</strong> indígenas, apoia<strong>do</strong>s por oficiais da forçaterrestre.Entre os responsáveis pelo ajuste, além <strong>do</strong>s governo sucessivos quecitamos, teríamos que mencionar os organismos multilaterais, verdadeirosgestores da política <strong>econômica</strong> equatoriana, cujo poder e crescenteinfluência, fora de qualquer controle democrático, são indiscutíveis.Desde 1983 o Equa<strong>do</strong>r assinou uma dezena de “Cartas de Intenção”com o FMI, a última em abril de 2000. Com isso o governo garantiu aconcessão de oito créditos stand by, em julho de 1983, março de 1985,agosto de 1986, janeiro de 1988, setembro de 1989, dezembro de 1991,maio de 1994 e abril de 2000.Vale lembrar que durante a crise da banana, nos anos 1960 e 1970,o Equa<strong>do</strong>r recorreu também ao FMI, e obteve outros nove créditos standby: só com as exportações de petróleo o país pôde livrar-se <strong>do</strong> controleestreito <strong>do</strong> FMI, cujas políticas contu<strong>do</strong> não o ajudaram a superar a crise.O poder <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong> Monetário Internacional não está no montante<strong>do</strong>s seus créditos, mas: 1) na posição de “cre<strong>do</strong>r preferencial”, na medidaem que os seus créditos devem ser pagos prioritariamente; 2) nas suascondições creditícias determinantes na administração <strong>econômica</strong> <strong>do</strong>s paísesdeve<strong>do</strong>res; 3) e na sua capacidade de mobilizar recursos de outras fontespara os bons discípulos das suas políticas. Sem o acor<strong>do</strong> <strong>do</strong> FMI, porexemplo, não é possível negociar com o Clube de Paris, e também não épossível avançar nas conversações com os cre<strong>do</strong>res priva<strong>do</strong>s ou conseguirum empréstimo <strong>do</strong> Banco Mundial ou <strong>do</strong> BID.O Equa<strong>do</strong>r sempre recorreu, em várias oportunidades, aofinanciamento <strong>do</strong> Banco Mundial, cujos empréstimos para “ajusteestrutural” e “ajuste setorial” foram instrumentos poderosos de promoção<strong>do</strong> neoliberalismo, agravan<strong>do</strong> até mesmo os seus efeitos.156livro.pmd 15626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORLeve-se em conta a responsabilidade que têm essas entidades nacrise financeira a que chegou o país como resulta<strong>do</strong> da liberalizaçãopromovida pelo FMI e que se agravou com a criação da Agência deGarantia de Depósitos, por pressão <strong>do</strong> Banco Mundial. Outro <strong>do</strong>scondicionamentos impostos pelo FMI foi a última capitalização <strong>do</strong>Filanbanco, no valor de trezentos milhões de dólares, quan<strong>do</strong> esse banco,que literalmente havia quebra<strong>do</strong> em mãos privadas, no fim de 1998, foiliqüida<strong>do</strong> pelo Esta<strong>do</strong>.Um fator de distorsão quase permanente foram as pressõescontínuas <strong>do</strong>s grupos de poder partidários <strong>do</strong> ajuste mas que não secansavam de recorrer ao paternalismo estatal. Isto se explica pelo caráterrentista desse grupos, interessa<strong>do</strong>s em privatizar e aumentar suas prebendasmas não em uma modernização genuína <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, ou em reformas quefizessem funcionar efetivamente um merca<strong>do</strong> competitivo, crian<strong>do</strong> averdadeira cidadania.Sem querer pagar impostos e cumprir suas obrigações com asociedade, esses grupos procuraram defender seus interesses e privilégiospolitizan<strong>do</strong> as importantes câmaras empresariais, suas associações. Assimse avançou no caminho da “modernização”, que oculta grandesineficiências e uma ausência marcante de responsabilidade social por partedas empresas. Por isso, ressalvadas algumas exceções, não se pode encontrarmaiores diferenças com as antigas práticas “empresariais” <strong>do</strong>s latifundiáriosda Serra e da Costa.Os expoentes “naturais” <strong>do</strong> neoliberalismo — os grupos de podere seus parti<strong>do</strong>s políticos — não conseguiram consolidar uma posiçãohomogênea como projeto hegemônico pela sua falta de visão, suamediocridade e contradições internas.As medidas a<strong>do</strong>tadas inicialmente teriam que ser respaldadas poroutras, mais adiante, pois as pressões empresariais e os protestos sociaistornavam mais difícil manter o ritmo de ajuste. E sem chegar aos extremosautoritários <strong>do</strong> Cone Sul, no Equa<strong>do</strong>r o ajuste foi acompanha<strong>do</strong> por umcrescente déficit democrático, enquanto com um discurso de tonalidade157livro.pmd 15726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAprogressista o governo procurou conseguir apoio aos esquemas de ajustesocialmente custosos.Nas condições descritas, esse processo de ajuste/desajuste neoliberalresultou conflitivo; foi um processo tortuoso e interminável, agrava<strong>do</strong> pelapresença e pelo recrudescimento <strong>do</strong>s ônus ancestrais <strong>do</strong> subdesenvolvimento.Tu<strong>do</strong> isso no meio de um ambiente marca<strong>do</strong> pela corrupção, comomostram os casos <strong>do</strong> Vice-Presidente Dahik e <strong>do</strong> Presidente Bucaram,que se refugiaram no exterior. Alarcón, ex-responsável pelo Poder, ficoupreso durante alguns meses em 1999, por atos <strong>do</strong>losos que havia pratica<strong>do</strong>diretamente quan<strong>do</strong> Presidente <strong>do</strong> Congresso Nacional e por meio <strong>do</strong>seu Ministro César Verduga, acusa<strong>do</strong> de mal uso de fun<strong>do</strong>s reserva<strong>do</strong>s(também deti<strong>do</strong> temporariamente no México), a pedi<strong>do</strong> da Justiça <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r. Sobre a Jamil Mahuad Witt e parte da sua equipe <strong>econômica</strong> —alguns deles foragi<strong>do</strong>s — pesa ordem de prisão relacionada com aintervenção bancária.Principais características de um ajuste tortuosoPara entender melhor a evolução <strong>do</strong> ajuste convém examinar melhoralguns <strong>do</strong>s fatos mais importantes, relaciona<strong>do</strong>s com os vários governos<strong>do</strong> perío<strong>do</strong>.OSVALDO HURTADO LARREAQuan<strong>do</strong> Hurta<strong>do</strong> Larrea começou sua gestão arquivou as propostasde mudança de Roldós-Hurta<strong>do</strong> e não fez qualquer tentativa de esboçaruma estratégia alternativa. Pelo contrário: antes mesmo de recorrer àsnegociações com os bancos internacionais, sem qualquer pressão o governoaceitou aplicar políticas inspiradas no FMI, como o reconheceriam depoisseus antigos funcionários.Com um punha<strong>do</strong> de colabora<strong>do</strong>res, Hurta<strong>do</strong> assumiu a posiçãode “proprietário da verdade”, como ponta de lança <strong>do</strong>s ajustes neoliberais.158livro.pmd 15826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORTodas as decisões foram tomadas em um contexto em que a discussãodemocrática e o consenso eram inexistentes, prática que continuou semqualquer alteração. Anos depois o próprio Hurta<strong>do</strong> reconheceria que “nósquatro tomamos todas as decisões. Não discutimos os problemas comninguém, e não consultamos ninguém …não consultamos nem osministros, nem os parti<strong>do</strong>s, nem, os deputa<strong>do</strong>s. Para manter o caráterconfidencial as medidas que iam ser tomadas eram informadas horas antes<strong>do</strong> seu anúncio” (Thoumi e Grindle 1992, p. 40).Apesar <strong>do</strong>s problemas econômicos, o governo da democraciacristã se destacou pelo respeito à ordem constituída. A alternância nopoder foi uma das suas metas; objetivo importante, pois como noslembramos o país tinha acaba<strong>do</strong> de superar o perío<strong>do</strong> ditatorial maislongo da sua <strong>história</strong>: 1970-9. Não obstante, e apesar <strong>do</strong> desejo demanter a continuidade democrática, a aplicação das políticas de ajustee os programas de estabilização debilitaram a frágil democraciaequatoriana.Devi<strong>do</strong> à sua origem e composição, o Esta<strong>do</strong> se converteu noelemento determinante para a aplicação da nova estratégia <strong>econômica</strong>.De um la<strong>do</strong>, moderou as crescentes aspirações sociais surgidas com o fimda ditadura, enquanto a riqueza petrolífera permitia uma saída que nãoafetasse as modalidades de acumulação existentes. Por outro la<strong>do</strong>, favoreceuos grupos econômicos, por exemplo com a “sucretização” da divida externaprivada equatoriana.Com essa “sucretização” o que se fez foi converter em dólares asdívidas <strong>do</strong>s agentes econômicos priva<strong>do</strong>s, livremente contratadas fora <strong>do</strong>país em dívidas denominadas em sucres, frente ao Banco Central, emcondições vantajosas. Ao mesmo tempo, o Banco assumia o compromissode pagar em dólares os cre<strong>do</strong>res internacionais.Essa medida beneficiou pessoas destacadas na vida nacional, atoresde primeira linha em um processo complexo e já antigo de “privatização”<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, transforma<strong>do</strong> em fonte de grandes prebendas para diversosgrupos oligárquicos vincula<strong>do</strong>s ao grande capital.159livro.pmd 15926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAA transformação de dívidas privadas em públicas não resultou deuma idéia das autoridades equatorianas: foi uma condição imposta pelaFMI e o Banco Mundial, com o argumento (utiliza<strong>do</strong> não só no casoequatoriano) que o Esta<strong>do</strong> é o melhor garante para responder por essescréditos.Pressiona<strong>do</strong> também pela situação <strong>econômica</strong> e os grupos de poder,o governo de Hurta<strong>do</strong> Larrea, que não contava com um sóli<strong>do</strong> apoiopolítico, aceitou que o Esta<strong>do</strong> assumisse a dívida <strong>do</strong> setor priva<strong>do</strong>,estatizan<strong>do</strong> seus créditos externos diante <strong>do</strong>s bancos internacionais. Naprática, foi uma garantia de crédito dada em favor <strong>do</strong>s cre<strong>do</strong>res externos,e uma garantia de câmbio para os deve<strong>do</strong>res em moeda estrangeira.De acor<strong>do</strong> com essa “sucretização” a partir de 1983 a quasetotalidade da dívida externa <strong>do</strong> setor priva<strong>do</strong> se converteria de formaindiscriminada em dívida <strong>do</strong> setor público — com uma <strong>do</strong>se significativade engenho e generosidade, segun<strong>do</strong> León Roldós Aguilera, que foi eleitopelo Congresso como Vice-Presidente de Hurta<strong>do</strong> Larrea.Nesse procedimento não se analisou a situação de cada um <strong>do</strong>sdeve<strong>do</strong>res, suas disponibilidades de recursos em depósitos no exterior, aexistência de garantias ou a destinação real <strong>do</strong>s fun<strong>do</strong>s. Também não foramprevistos mecanismos para saber se as dívidas declaradas estavam pagas:os registros <strong>do</strong> Banco Central só consideravam seu ingresso, e não o seupagamento, e as dívidas não registradas não precisavam pagar impostos.Assim, não seria de surpreender que mais de um crédito fictício possa tersi<strong>do</strong> “sucretiza<strong>do</strong>”, assim como créditos de outro mo<strong>do</strong> irrecuperáveis,como chegaria a afirmar mais tarde o economista Abelar<strong>do</strong> Pachano, queera gerente <strong>do</strong> Banco Central quan<strong>do</strong> Hurta<strong>do</strong> Larrea tomou essa medidacontroversa.Mesmo se considerarmos possíveis justificativas, pode-se concluirque os créditos de estabilização permitiram que um grande número depoderosos atores econômicos nacionais, e até mesmo internacionais,obtivessem benefícios importantes. Atores que teriam dificuldade emargumentar a impossibilidade de conseguir dólares para pagar o que deviam…160livro.pmd 16026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORFoi um mecanismo para salvar os “amantes <strong>do</strong> risco, agressivos nacaptação de uma maior parcela <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, inclina<strong>do</strong>s a intermediar commoeda estrangeira e pouco cuida<strong>do</strong>sos com a seleção da sua carteira deaplicações”, conforme Pachano caracterizaria depois os diversos agenteseconômicos que se beneficiaram com a “sucretização”.Existem fortes argumentos para demonstrar o que o advoga<strong>do</strong>Roldós qualificou de “natureza fraudulenta” da “sucretização”. O queseria justificável com respeito a certas atividades produtivas “se converteuem um mecanismo de vantagem impudica para dezenas de pessoas, dadaa falta de controle <strong>do</strong> Banco Central quan<strong>do</strong> se procedeu à sua aplicação”.A despeito da posição <strong>do</strong> governo de Hurta<strong>do</strong> Larrea, quetransformou outra vez o Esta<strong>do</strong> em empresa de reparação <strong>do</strong>s gruposeconômicos mais poderosos, as elites <strong>do</strong>minantes não confiavam nele.Por outro la<strong>do</strong>, aqueles setores que tinham si<strong>do</strong> convida<strong>do</strong>s marginaispara o banquete <strong>do</strong> petróleo, ou dele não tinham participa<strong>do</strong>, resistiamcom razão a carregar o peso <strong>do</strong>s ajustes.Em síntese, o ajuste consistiu na redução <strong>do</strong> déficit fiscal através dadiminuição das despesas públicas, particularmente aquelas destinadas a atividadessociais, assim como <strong>do</strong> subsídio a determina<strong>do</strong>s bens e serviços de amploconsumo. Além disso, a receita fiscal foi ampliada, com novos impostos ou aelevação <strong>do</strong> preços <strong>do</strong>s bens e serviços <strong>do</strong> setor público, como os combustíveisderiva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> petróleo. Esforço dirigi<strong>do</strong> para sustentar o serviço da dívida externa.LEÓN FEBRES CORDEROO governo social-cristão, que chegou ao poder em 1984, declaran<strong>do</strong>sepublicamente segui<strong>do</strong>r da ideologia da abertura e liberaliza<strong>do</strong>ra, nãoaprofun<strong>do</strong>u, como era de esperar, o esquema neo-liberal e a administraçãomonetarista da economia. Isto , contu<strong>do</strong>, não significa que tenha desisti<strong>do</strong>de prosseguir no caminho neo-liberal prevalecente na época.Para entender a profundidade moderada <strong>do</strong> ajuste nesta fase é precisolevar em conta a estabilização e relativa recuperação da economia alcançadas161livro.pmd 16126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAno fim <strong>do</strong> governo de Hurta<strong>do</strong> Larrea. Graças à ordenação passageira dadívida externa e a superação <strong>do</strong>s problemas surgi<strong>do</strong>s com as inundaçõesprovocadas por “El Niño”, em 1984 a economia voltou a crescer. Da mesmaforma, o aumento da produção agrícola permitiu controlar a inflação, quehavia atingi<strong>do</strong> um nível até então desconheci<strong>do</strong>: 63% em setembro de1983. No entanto, essa recuperação não trouxe um alívio real para a situaçãodeteriorada da maioria da população, que precisava ajustar-se a uma piorasistemática das condições de vida.A orientação básica da política <strong>econômica</strong> não mu<strong>do</strong>u de rumo:com as desvalorizações aumentou a receita <strong>do</strong>s exporta<strong>do</strong>res; com aaplicação paulatina de uma política de “preços reais” procurou-se um maiorrealismo econômico através das forças <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, garantin<strong>do</strong>-se maioreslucros aos grande empresários. Uma vez mais a propaganda eleitoral foidesnudada: recordemos que com um amplo movimento de direita, a“Frente de Reconstrução Nacional”, chegou ao poder Febres Cordero,oferecen<strong>do</strong> “pão, teto e emprego” — necessidades genuínas para a maioria<strong>do</strong>s equatorianos, as quais, como era fácil antecipar, não foram satisfeitas.No começo <strong>do</strong> seu governo, Febres Cordero ampliou ainda mais ascondições vantajosas de pagamento da dívida externa “sucretizada”,concedidas pela administração anterior. Os prazos de pagamento foramestendi<strong>do</strong>s de 3 para 7 anos; a princípio as amortizações deveriam começarem 1985 e terminar em 1987, mas o novo governo postergou o iníciodesses pagamentos para 1988. Da mesma forma, congelou-se a taxa dejuros em 16 por cento, quan<strong>do</strong> as taxas comerciais já superavam 28 porcento. Por fim, anulou-se a comissão de risco cambial, congelan<strong>do</strong> o tipode câmbio em 100 sucres por dólar, e aumentou-se o perío<strong>do</strong> de graça de18 para 54 meses (4 anos e meio).O governo da democracia cristã não considerou a extensão <strong>do</strong>perío<strong>do</strong> de pagamento um problema legal, e não por falta de vontade,como se pode apreciar no projeto de decreto envia<strong>do</strong> pelo <strong>do</strong>utor Hurta<strong>do</strong>Larrea, em 5 de julho de 1983, ao Presidente da Câmara Nacional deRepresentantes, o qual tem notável semelhança com o Decreto-lei urgente162livro.pmd 16226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORno. 1 <strong>do</strong> Engenheiro León Febres Cordero, que introduziu as mencionadasreformas.A “sucretização” de quase 1.500 milhões de dólares da dívida externarepresentou um subsídio ao setor priva<strong>do</strong> de mais de 1.300.000.000.000de sucres, ou seja, 1.300 milhões de dólares, ao câmbio de mil sucres pordólar como média para o perío<strong>do</strong> de pagamento, se considerarmos só oefeito <strong>do</strong> diferencial de câmbio: uma das maiores subvenções da <strong>história</strong>republicana, que seria superada anos depois com a intervenção bancáriarealizada pelo governo democrata cristão de Mahuad Witt.Neste ponto convém recordar que em outros países não se pôs emvigor uma garantia cambial com câmbio congela<strong>do</strong> para evitar adeterioração <strong>do</strong>s créditos devi<strong>do</strong> à desvalorização. E que, no que se refereao risco de crédito, a decisão foi também questionável; e improcedente selevarmos em conta que não tinha si<strong>do</strong> o Banco Central a qualificar ossujeitos de crédito.Sem nos perdermos em maior discussão sobre como se produziu osubsídio, e qual o seu montante, a verdade é que o Esta<strong>do</strong>, como sucedeuoutras vezes nas últimas décadas, atuou como “empresa de reparação” <strong>do</strong>sistema capitalista, ao assumir (socializar) as perdas e problemas <strong>do</strong> setorpriva<strong>do</strong>. A “sucretização” gerou novas pressões inflacionárias, e esseaumento de preços se converteu em um mecanismo de reação à dívidaexterna privada, transformada em obrigações denominadas em sucres.Outro mecanismo vantajosos para os grupos poderosos foi a“compra de contas especiais em divisas”. Partin<strong>do</strong> <strong>do</strong> princípio básico <strong>do</strong>merca<strong>do</strong> secundário, ou seja, <strong>do</strong> desconto que ele promovia, o governode Febres Cordero, com a bênção <strong>do</strong>s organismos multilaterais, promoveua aquisição de títulos da dívida externa. Essas operações foram muitoimportantes para alguns bancos, que atravessavam sérias dificuldades. Porexemplo, o Banco <strong>do</strong> Pacífico, outro <strong>do</strong>s grandes beneficiários da“sucretização”.A princípio, o sistema de conversão da dívida em inversão foi postoem vigor no Equa<strong>do</strong>r desde agosto de 1986 até mea<strong>do</strong>s de 1987, quan<strong>do</strong>163livro.pmd 16326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAfoi suspenso pela pressão cambial que agravou o processo inflacionário.Depois, em dezembro <strong>do</strong> mesmo ano, ele foi reativa<strong>do</strong> até agosto de 1988,mas com certas restrições que, no entanto, não impediram a formação deum mecanismo de subsídio maciço ao sistema financeiro.As 140 operações de conversão da dívida realizadas no triênio 1986-8, através da “compra de contas especiais em divisas” permitiram reduzira dívida em 435 milhões de dólares (47 milhões em 1986, 127 milhões em1987 e 261 milhões em 1988). Um montante diminuto diante <strong>do</strong> volumealcança<strong>do</strong> pelo endividamento externo em 1988, quan<strong>do</strong> ele já tinhasupera<strong>do</strong> os dez mil milhões de dólares, mas trouxe grandes benefícios aosetor empresarial.Os ganhos provoca<strong>do</strong>s por este mecanismo podem ser estima<strong>do</strong>sentre 260 e 300 milhões de dólares, se calcularmos que os títulos da dívidateriam si<strong>do</strong> adquiri<strong>do</strong>s com um desconto médio que pode ter oscila<strong>do</strong>entre 60 e 70 por cento. Com esse mecanismo de conversão da dívidaforam aprova<strong>do</strong>s <strong>do</strong>is sistemas de utilização <strong>do</strong>s recursos: capitalização ecompensação de passivos. Para viabilizar a compensação de passivos, naprática os recursos foram quase na sua totalidade proporciona<strong>do</strong>s peloBanco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r … Com o produto dessa operação foramcobertos sobre-saques <strong>do</strong> banco, desencaixes, pagamentos de carteira vencidae de juros antecipa<strong>do</strong>s, como o pre-pagamento de redescontos no BancoCentral. Permitiu-se também o pagamento de multas à Superintendência deBancos e, em alguns casos, diz-se que chegou a sobrar dinheiro.Em 1986 a economia se viu afetada por uma queda maciça <strong>do</strong>spreços <strong>do</strong> petróleo. Em junho o governo perdeu um plebiscito, convoca<strong>do</strong>com o suposto interesse de permitir uma maior participação <strong>do</strong>s cidadãos“independentes” na vida política nacional, quan<strong>do</strong> na verdade se buscavaapoio para ratificar a ação política autoritária <strong>do</strong> governo. Não se deveesquecer que, em mais de uma oportunidade, essa administração entrouem conflito com a Constituição, aplican<strong>do</strong>-lhe toda uma gama de restrições,atropelan<strong>do</strong>-a repetidamente, e chegan<strong>do</strong> a por em perigo a democracia.Assim, essa posição <strong>do</strong> governo não pode ser entendida simplesmente164livro.pmd 16426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORcomo uma conseqüência <strong>do</strong> caráter intolerante <strong>do</strong> Presidente, masmanifestava o desejo de impor à nação o esquema neo-liberal.Neste ambiente, caracteriza<strong>do</strong> por um governo debilita<strong>do</strong>politicamente, no dia 11 de agosto de 1986 Febres Cordero, contan<strong>do</strong>com a inspiração de Dahik, aprofun<strong>do</strong>u radicalmente a sua política<strong>econômica</strong>. O governo decidiu a liberação <strong>do</strong> embargo e a flutuação dasdivisas, assim como das taxas de juros. Deixou livres as divisas provenientesdas exportações de petróleo, para pagar a dívida externa. No entanto, emjaneiro de 1987 essa estratégia mostrou seus limites, e o serviço da dívidajunto aos bancos internacionais priva<strong>do</strong>s teve que ser suspenso; só forammanti<strong>do</strong>s, com grande dificuldade e alguns atrasos, os pagamentos aosorganismos financeiros internacionais e aos chama<strong>do</strong>s “países amigos”— a dívida bilateral.Para dar sustentação à experiência de agosto o governo contratouuma “facilidade petroleira”, em nome da Corporação Estatal PetroleiraEquatoriana (CEPE), no valor de 220 milhões de dólares. O pagamentodesses recursos, destina<strong>do</strong>s a dar sustentação à RMI, e o tipo de câmbio,foram assumi<strong>do</strong>s pela CEPE. Essa prática foi empregada por vários paísesda América Latina: endividava-se as empresa estatais para sustentar oprocesso de acumulação de grupos financeiros poderosos, e depois, coma alegação que essas empresas são ineficientes e geram perdas, procedeuseà sua privatização. A Argentina foi o país onde mais se forçou esseprocedimento para a deterioração programada da atividade empresarial<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, o qual, por sua vez, assumia as dívidas externas das empresasprivadas, como aconteceu no Equa<strong>do</strong>r com a “sucretização”.Os problemas se agravaram com o terremoto de março de 1987,que destruiu o oleoduto trans-equatoriano e obrigou a suspender aprodução de petróleo durante cerca de seis meses. Mais uma vez o Equa<strong>do</strong>rsofria o impacto da dependência excessiva de um bem primário deexportação.Em março de 1988 o governo foi obriga<strong>do</strong> a voltar atrás na liberação<strong>do</strong> embargo e na liberalização ampla <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> de divisas, crian<strong>do</strong> um165livro.pmd 16526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAmecanismo de controle com a participação <strong>do</strong>s próprios bancos priva<strong>do</strong>s.Essa administração desordenada, agravada pelos excessos de liberação eabertura, deteriorou ainda mais o nível de vida da população, geran<strong>do</strong>aumento crescente <strong>do</strong> desemprego e taxas ascendentes de inflação.É preciso aqui por em evidência o marcante desconcerto econômicocom que o governo social cristão concluiu o seu mandato, em agosto de1988: moratória com os bancos priva<strong>do</strong>s internacionais, corrupção emto<strong>do</strong>s os níveis e uma sensação de insegurança em amplos setores dasociedade. Seu lega<strong>do</strong> econômico foi pesa<strong>do</strong>: a reserva monetáriainternacional era negativa em 330 milhões de dólares (realidade que foiocultada pelas autoridades <strong>do</strong> governo de Febres Cordero), a inflação emagosto de 1988 foi de cerca de 6%, corresponden<strong>do</strong> a 63% anuais, e suaprojeção parecia incontrolável. A miséria se expandia na sociedade.Nos seus últimos momentos, esse governo ampliou desmedidamentea despesa pública, procuran<strong>do</strong> garantir seu futuro político ( o “efeitomonumento”), o que lhe renderia frutos eleitorais sobretu<strong>do</strong> na cidade deGuayaquil e em grande parte da Costa.RODRIGO BORJA CEVALLOSForam grandes as expectativas geradas pelo governo socialdemocrático. A opinião geral era que o novo governo se enquadraria emum projeto reformista, com os limites e o alcance que isso poderia implicarjustamente na hora <strong>do</strong> apogeu neo-liberal em to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>, coincidin<strong>do</strong>com o desastre <strong>do</strong> “socialismo real”. Não obstante, esta expectativa nãotar<strong>do</strong>u a se desvanecer. Salvo raras exceções, o novo regime limitou-se aemitir sinais de que ia entrar à esquerda para em seguida voltar-seconstantemente rumo à direita.Quase nada <strong>do</strong> espera<strong>do</strong> aconteceu. Desde o princípio a equipefinanceira e monetária <strong>do</strong> governo, <strong>do</strong>mina<strong>do</strong> por pessoas vinculadas aoscírculos <strong>do</strong> grande capital, e que em alguns casos já tinham ti<strong>do</strong> umaatuação destacada durante o governo da democracia cristã, voltou a transitar166livro.pmd 16626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORpelos caminhos impostos pela política de ajuste no estilo neoliberal. Issoratificou a concepção pre<strong>do</strong>minante de que, por sua essência concentra<strong>do</strong>rae excludente, o novo governo manteve ausentes os setores majoritáriosnos processos de definição das grandes decisões nacionais.Diante da gravidade <strong>do</strong>s problemas, muitos deles exacerba<strong>do</strong>s quaseplanejadamente pelo governo anterior (o “efeito funerário”), a reação estatalse orientou inicialmente por uma estratégia de curto prazo, visan<strong>do</strong> superaros desequilíbrios macro-econômicos. Complementarmente, o governopromoveu sua estratégia de abertura e liberalização em torno <strong>do</strong> processorenova<strong>do</strong> de integração andina, influencia<strong>do</strong> pelos ventos trans-nacionais.Enquanto buscava apoio para a sua política <strong>econômica</strong>, os governantesfalavam de uma concertação para acelerar o processo de abertura, masnunca a buscaram na sua prática, exceto em uma parte da reforma tributária.Alcançar o equilíbrio macro-econômico quase chegou a se converterem um substituto <strong>do</strong> desenvolvimento econômico e social, ao qual sedeveria chegar mais tarde, de forma espontânea (segun<strong>do</strong> o argumentoneo-liberal), como resulta<strong>do</strong> da própria estabilização. Nesses anos, aspolíticas monetária e cambial, pela sua flexibilidade e rapidez de resulta<strong>do</strong>s,foram as ferramentas mais importantes sobre as quais recaiu grande parte<strong>do</strong> peso da tarefa de equilibrar a economia, e mesmo para eliminar qualquerelemento de distorção externa.Por outro la<strong>do</strong>, apesar da inesperada disponibilidade de recursos(pelo menos duzentos milhões de dólares) resultantes das notáveisaumentos <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> petróleo, devi<strong>do</strong> à guerra <strong>do</strong> Golfo Pérsico, ogoverno não conseguiu reativar a economia.Não surpreende portanto que embora este governo tenhaconsegui<strong>do</strong> controlar algumas variáveis macro desajustadas pelos excessos<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> de Febres Cordero, as dificuldades <strong>econômica</strong>s das massas seagravaram e a inflação não foi controlada. Os níveis de miséria, indigência,desnutrição e desemprego pioraram. Uma análise da evolução <strong>do</strong>s saláriosdesde janeiro de 1980 a julho de 1993 leva à conclusão de que o governoque mais comprimiu os salários reais foi o <strong>do</strong> Dr. Rodrigo Borja” (Maya167livro.pmd 16726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA1993, p. 83). Posteriormente, desde 1995 a queda da renda real seriasustentada, como se pode observar na Tabela 18.Os esforços realiza<strong>do</strong>s no campo social, dentro <strong>do</strong> que se qualificoupomposamente como “pagamento da dívida social” não chegaram a afetaro centro <strong>do</strong> problema: a aplicação das conhecidas políticas <strong>econômica</strong>sprogramadas para incrementar as taxas de lucratividade <strong>do</strong> capital, combase em maiores índices de exploração da mão de obra, procuran<strong>do</strong> mantera relação existente com o capital financeiro internacional.Nessas condições, a focalização <strong>do</strong>s serviços sociais para atenderos mais necessita<strong>do</strong>s converteu-se a partir de então em um novo elementoda estratégia neoliberal, a que se chegou depois de algumas reflexões feitaspelo próprio Banco Mundial. Até aquele momento, o alto custo socialimplica<strong>do</strong> no ajuste era visto quase como inevitável, embora se procurassedisfarçá-lo, apresentan<strong>do</strong>-o como temporário, dentro <strong>do</strong> discurso sobre a“questão social” vigente durante grande parte <strong>do</strong> século XX.Da Revolução de Julho até o início <strong>do</strong> ajuste houve uma certapreocupação com “a questão social”. A título de compensação omovimento operário e o camponês se desenvolveram, embora não oindígena, Não só se promulgou o Código <strong>do</strong> Trabalho (1938) mas foramfeitos esforços para melhorar as políticas de bem-estar e de seguridade social(especialmente durante as ditaduras militares). Mas com o ajuste, o trabalhoe o direito trabalhista foram “flexibiliza<strong>do</strong>s”, e ao mesmo tempo osinvestimentos sociais perderam terreno diante <strong>do</strong> serviço da dívida externa.É interessante notar que nesta época, enquanto o movimento sindicalrecuava (ten<strong>do</strong> conta<strong>do</strong> como fator de poder até a década de 1980), omovimento indígena ganhava força, e a partir <strong>do</strong>s anos 1990 setransformaria em um ator importante da vida nacional; movimento queconta com a adesão <strong>do</strong>s setores médios urbanos, <strong>do</strong>s camponeses nãoindígenas, pequenos empresários, operários, trabalha<strong>do</strong>res informais e atémesmo migrantes.A dívida foi outra das grandes preocupações <strong>do</strong> governo de BorjaCevallos. Durante to<strong>do</strong> o tempo se pensou na retomada das negociações.168livro.pmd 16826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORDiante <strong>do</strong> anúncio de um novo esquema para a administração da dívida,formula<strong>do</strong> pelo governo norte-americano em 1989 (o chama<strong>do</strong> “PlanoBrady”), o governo social democrata promoveu uma ação concertada ten<strong>do</strong>por objetivo ser considera<strong>do</strong> como beneficiário. A “Iniciativa para asAméricas”, apresentada pelo Presidente George Bush (Senior) em fins dejunho de 1990, foi recebida também com entusiasmo pelos setores<strong>do</strong>minantes, como acontecera em 1985 com o Plano Baker. Borja Cevallosfoi o primeiro mandatário a visitar Washington para apoiar a propostanorte-americana, e o seu governo se encarregou de promovê-la em umfolheto distribuí<strong>do</strong> pela Chancelaria equatoriana.Nesse ambiente, não houve suficiente autonomia e bastantedignidade para enfrentar os abusos <strong>do</strong>s bancos cre<strong>do</strong>res. O governo <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r praticamente não reagiu quan<strong>do</strong>, em maio de 1989, o Citibankembargou o acesso a oitenta milhões de dólares que tinham si<strong>do</strong> poupa<strong>do</strong>spara reiniciar os pagamentos simbólicos. Meses mais tarde, as autoridadesmonetárias, empenhadas em disfarçar o descontentamento nacional,chegaram a falar em uma solução para o assunto — o que depois severificou que não passava de um equívoco.Por maiores que fossem os esforços feitos e por maiscondescendente a posição <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r com respeito aos cre<strong>do</strong>res, a ansiadarenegociação da dívida externa não prosperou.Durante o governo de Borja Cevallos, assim como na fase dademocracia cristã, não faltaram certas posições vergonhosas ocultas portrás de reflexões aparentemente progressistas, manifestan<strong>do</strong>-se em umdiscurso que pretendia negar o caráter neo-liberal da sua política <strong>econômica</strong>:discurso com o qual se procurava demonstrar até mesmo o contrário.Para concluir a análise deste perío<strong>do</strong> de ajustes sinuosos eincompletos, talvez seja conveniente concentrar-nos outra vez em umacomparação internacional, sobretu<strong>do</strong> porque ao começar a década de 1990o Equa<strong>do</strong>r alcançou uma posição destacada, mas agora figuran<strong>do</strong> entre aspiores. Entre 1980 e 1989 a taxa média anual de “crescimento” foi de –0,7%, a pior <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, em termos médios. Em conjunto, os países da169livro.pmd 16926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAAmérica Latina “cresceram” (ou seja, se empobreceram) – 0,6%; osasiáticos, + 5,9%; os ibéricos, + 1,9%; os países desenvolvi<strong>do</strong>s, +2,1%; osEsta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s da América, +2,2%. A relação entre a renda per capita <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r e a <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s caiu de 22% (o valor mais eleva<strong>do</strong>,alcança<strong>do</strong> em 1980) para 17% em 1989, inferior em <strong>do</strong>is pontos ao de1973 e superior em apenas um ponto ao de 1950 (Hofman 1992).Em 1990 a população <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r se aproximava <strong>do</strong>s dez milhões:havia 9,6 milhões de equatorianos, <strong>do</strong>s quais 50% viviam na Costa. Entre1982 e 1990 o ritmo de crescimento da população baixara à media anualde 2,2%, devi<strong>do</strong> a uma redução importante na taxa de natalidade.A investida neo-liberalSIXTO DURÁN BALLÉNO governo conserva<strong>do</strong>r de Sixto Durán Ballén começou em agostode 1992. O ponto de partida da sua política <strong>econômica</strong> foi um esquemade estabilização quase orto<strong>do</strong>xo (ou quase hetero<strong>do</strong>xo?) basea<strong>do</strong> norepresamento <strong>do</strong> câmbio (a âncora <strong>do</strong> modelo) sustenta<strong>do</strong> por taxas dejuros flexíveis, que alcançavam valores reais, superan<strong>do</strong> a inflação, paraatrair capitais externos, estimula<strong>do</strong>s também pelo baixo rendimentofinanceiro pre<strong>do</strong>minante nos países centrais. Nessas condições, em 1994o ritmo inflacionário se reduziu a 25%.Ao congelamento inicial <strong>do</strong> câmbio seguiu-se, em fins de 1992, umesquema de desvalorizações controladas, dentro de bandas, que até oprincípio de 1999 foram reajustadas sucessivamente.Ao mesmo tempo, o governo de Durán Ballén procurou promovera “modernização <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>”, como parte de um processo destina<strong>do</strong> areformular o papel <strong>do</strong> aparelho estatal na economia, e, em especial, aprivatizar áreas consideradas estratégicas, além de vender as ações deempresas que contavam com investimentos governamentais. Essa posiçãoaprofun<strong>do</strong>u ainda mais o processo de ajuste da economia nacional, para170livro.pmd 17026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORadequá-la às condições exigida pelos cre<strong>do</strong>res, de mo<strong>do</strong> a se reiniciar oserviço da dívida externa.Como elo adicional dessa longa e pesada cadeia de ajustes, em janeirode 1994 o governo aprovou um <strong>do</strong>s maiores aumentos <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong>scombustíveis deriva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> petróleo — a gasolina extra aumentou em 71%—e determinou ao mesmo tempo a “flutuação” desses preços, com baseem um regulamento complexo e contraditório que ratificou o intuitofiscalista desses preços, para angariar de forma automática recursosnecessários ao serviço da dívida. Instrumentada essa condição, impostapelo FMI para que a sua Diretoria Executiva aprovasse um créditocontigente ao Equa<strong>do</strong>r, em março de 1994 o governo apresentou ao Fun<strong>do</strong>uma nova “carta de intenção”.Essa “carta” foi além <strong>do</strong>s tradicionais objetivos de curto prazo. Nelao governo revelou o conteú<strong>do</strong> real da “modernização” <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, aopropor a privatização das telecomunicações, <strong>do</strong> petróleo e <strong>do</strong> setor elétrico,assim como a reforma <strong>do</strong> sistema de seguridade social, <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> detrabalho e das leis trabalhistas, comprometen<strong>do</strong>-se ainda a modificar algunsaspectos da lei que regulamentava o regime monetário, pon<strong>do</strong> em vigor alei que liberalizava a ação das entidades financeiras.Desta forma, em 1994 o governo conseguiu renegociar a dívidaexterna, no quadro <strong>do</strong> Plano Brady. Segun<strong>do</strong> Abelar<strong>do</strong> Pachano,experimenta<strong>do</strong> negocia<strong>do</strong>r da dívida e alto funcionário <strong>do</strong>s governosdemocrata cristão e social democrata, a equipe governamental “dançouconforme a música tocada pelos bancos”. Em outras palavras, osrenegocia<strong>do</strong>res da dívida externa não conseguiram obter nenhumavantagem, ten<strong>do</strong> em vista as difíceis condições da economia equatoriana,e também não conseguiram o reconhecimento <strong>do</strong>s esforços feitos pelopaís para procurar cumprir os compromissos assumi<strong>do</strong>s junto aos bancosinternacionais. Concretamente, o Plano Brady, recebi<strong>do</strong> com aplausosestron<strong>do</strong>sos pelos meios de comunicação, e que devia ser executa<strong>do</strong> aolongo de três décadas, fracassou cinco anos depois de cria<strong>do</strong> ... umdesenlace que foi anuncia<strong>do</strong> oportunamente.171livro.pmd 17126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAEntre outros detalhes desse esquema havia um ítem curioso, quecausou indignação: um abono de 190 milhões de dólares, a ser pago emdez anos, sem perío<strong>do</strong> de graça, com o qual (embora pareça mentira) oEqua<strong>do</strong>r compensaria o Citibank e os outros cre<strong>do</strong>res por não ter pagojuros sobre o débito abusivo de 80 milhões de dólares efetua<strong>do</strong> por aquelebanco em maio de 1989 ...Neste ponto é preciso mencionar o tropeção sofri<strong>do</strong> pelo neoliberalismono México, no fim de 1994 — situação traumática para osdefensores dessa ideologia. Foi um sinal de advertência a respeito dainevitabilidade de um modelo tão promovi<strong>do</strong> internacionalmente mas quena realidade não foi ouvi<strong>do</strong>, embora tenha si<strong>do</strong> senti<strong>do</strong> duramente naArgentina e em quase todas as economias da região.Neste contexto deveríamos incluir também o impacto <strong>do</strong> conflitobélico em Cenepa, em 1995, cujo custo foi estima<strong>do</strong> em 360 milhões dedólares. Nesse mesmo ano houve novos racionamentos da energia elétrica,provoca<strong>do</strong>s pelo <strong>do</strong>gmatismo <strong>do</strong> governo, causan<strong>do</strong> perdas acumuladasque quase <strong>do</strong>bram o custo da guerra, imputáveis, pelo menos desde 1992,à gestão <strong>do</strong> Vice-Presidente Dahik, através de Galo Abril, Secretário <strong>do</strong>CONADE, que vetou o caráter de urgência da construção das usinastérmicas programadas, a serem instaladas pelo governo através <strong>do</strong>INECEL. Por outro la<strong>do</strong>, a economia equatoriana foi afetada igualmentepela fuga <strong>do</strong> então Vice-Presidente Dahik, envolvi<strong>do</strong> no uso indevi<strong>do</strong> derecursos reserva<strong>do</strong>s, um verdadeiro “delito de brancos”, nas palavras deDiego Cornejo Menacho (1996).O fim <strong>do</strong> regime de Durán Ballén se caracterizou pela repetiçãofatigada da receita monetarista, e pelas primeiras escaramuças <strong>do</strong> que nãotardaria a ser o maior desastre <strong>do</strong> sistema financeiro, quan<strong>do</strong> o mesmogoverno que tinha liberaliza<strong>do</strong> esse sistema interveio no Banco Central,devi<strong>do</strong> às ligações pessoais <strong>do</strong> Presidente, contrarian<strong>do</strong> assim frontalmentea sua ideologia liberal.Ao terminar o governo de Durán Ballén já era possível anteciparparte <strong>do</strong>s problemas que viriam. A essência da política <strong>econômica</strong> seguida172livro.pmd 17226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORdesde setembro de 1992 semeou as sementes da crise <strong>econômica</strong>,favorecen<strong>do</strong> o investimento financeiro especulativo, em lugar da produção.Tratava-se, portanto, da “crônica de uma crise anunciada”.ABDALÁ BUCARAM ORTIZEm 10 de agosto de 1996 a “loucura” se instalou no país, ritmadapelo novo Presidente, que embora já tivesse ganho a eleição pareciainclina<strong>do</strong> a continuar a sua campanha eleitoral. No entanto, embora afanfarronada e o autoritarismo tenham si<strong>do</strong> características da sua curtagestão, este Presidente não foi muito diferente <strong>do</strong>s outros mandatários <strong>do</strong>perío<strong>do</strong>: com efeito, mesmo durante a campanha se tinha declara<strong>do</strong>partidário da abertura e da liberalização ampla.Seu plano econômico, centra<strong>do</strong> na convertibilidade, era uma apostacujo resulta<strong>do</strong> seria tu<strong>do</strong> ou nada, e com a qual procurou radicalizar oajuste neoliberal. Embora Bucaram Ortiz não tenha assina<strong>do</strong> nenhumaCarta de Intenção ao FMI, porque não teve tempo para isso, é igualmentecerto que suas intenções e posições eram neoliberais. Para esse governoas reformas inspiradas no FMI eram ainda mais importantes <strong>do</strong> que aprópria convertibilidade, como o manifestou algumas vezes o GerenteGeral <strong>do</strong> Banco Central, Augusto de la Torre Endara.Para preparar seu plano de convertibilidade e para tranqüilizar osgrandes investi<strong>do</strong>res, Bucaram convocou Domingo Cavallo, ex-Ministrode Economia <strong>do</strong> Presidente argentino Carlos Menem. Este foi outro <strong>do</strong>sepisódios pitorescos, tão característicos das nossas classes <strong>do</strong>minantes,presas da “colonialidade <strong>do</strong> poder”. Como mostramos neste livro em váriasoportunidades, esses “<strong>do</strong>nos <strong>do</strong> país” precisam ratificar as suas decisõescom algum critério externo, de tal forma preferem o “made em qualquerparte” que não seja o Equa<strong>do</strong>r.Além da convertibilidade, entre as metas de Bucaram Ortiz estavama flexibilidade trabalhista e as privatizações, assim como o desmantelamento<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, que já sofrera um enfraquecimento marcante no governo173livro.pmd 17326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAprecedente. Com essa medida monetária pretendia-se também disciplinaras despesas públicas e, incidentalmente, o Presidente “populista”.Embora o Presidente enchesse a boca com palavras de defesa <strong>do</strong>povo, o seu governo representava também os interesses de determina<strong>do</strong>sgrupos de poder, das antigas oligarquias. Basta ver como alguns <strong>do</strong>srepresentantes mais conspícuos desses grupos ocuparam funçõesimportantes no governo de Bucaram Ortiz: Roberto Isaías, um <strong>do</strong>s <strong>do</strong>nos<strong>do</strong> Filanbanco, era um <strong>do</strong>s assessores mais próximos <strong>do</strong> Presidente; ÁlvaroNoboa Pontón, o homem mais rico <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, era Presidente da JuntaMonetária. No entanto, algumas frações da oligarquia se opunham aogoverno, preocupadas talvez com a possibilidade de não seremcontempladas com a privatização.Durante o pouco tempo que teve para desenvolver a sua gestão<strong>econômica</strong>, Bucaram Ortiz aplicou um <strong>do</strong>s “pacotes” de ajuste mais duros,para preparar a convertibilidade. As tarifas <strong>do</strong> serviços públicos foramaumentadas, desapareceu o subsídio ao gás <strong>do</strong>méstico, os hospitaispopulares passaram a cobrar pelos seus serviços, continuaram os aumentos<strong>do</strong>s deriva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> petróleo, inclusive da gasolina e <strong>do</strong> óleo diesel. Para darum exemplo, durante esse governo o preço da energia elétrica subiu em460 e 552% para quem consumia de 0 a 50 Kwh/mês e de 51 a 200 Kwh/mês, respectivamente.Mais tarde, às vésperas da sua queda, em questão de horas oPresidente derrubou suas medidas fiscais, através de três cadeias nacionais.Mas era tarde demais. Com a Greve Cívica Nacional maciça de 5 defevereiro de 1997 foi derruba<strong>do</strong> um governo marca<strong>do</strong> também por sériasdenúncias de corrupção.FABIÁN ALARCÓN RIVERADepois de uma série de visitas, “livro de cheques na mão”, e desubir em palanques, no melhor estilo populista, para garantir sua ratificaçãono cargo de Presidente, na inútil consulta popular de 25 de maio de 1997,174livro.pmd 17426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORAlarcón Rivera precisou enfrentar os desafios da economia, especialmenteo déficit fiscal. Fez algumas manobras administrativas pretensamente paracobrar as dívidas antigas da EMELEC e propôs uma revisão das margensde lucro das empresas comercializa<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>s combustíveis, para continuarpelo caminho <strong>do</strong> ajuste tradicional.Este político, que conquistou o poder mediante um golpe de Esta<strong>do</strong>complexo, se deixou aprisionar pela conjuntura difícil e suas ambiçõesdesmedidas. Conheci<strong>do</strong> pela habilidade com as acomodações de curto prazo,não esteve à altura das circunstâncias, fraudan<strong>do</strong> as expectativas políticas derenovação levantadas na sociedade depois da queda de Abadalá Bucaram;perdeu assim a possibilidade de realizar com tranqüilidade uma reformapolítica profunda, porque até o fim não deixou de manipular a AssembléiaNacional Constituinte reunida na primeira metade <strong>do</strong> ano de 1998.Sob o aspecto econômico, não a<strong>do</strong>tou as medidas exigidas pelagravidade da situação: o fenômeno “El Niño” e a crise asiáticarepresentavam golpes abaixo da linha de flutuação da economia. Além deaplicar algumas medidas orto<strong>do</strong>xas, procuran<strong>do</strong> ajustar-se ao FMI, suatábua de salvação foi aumentar o endividamento interno e externo. Em1997 lançou nos merca<strong>do</strong>s internacionais duas emissões de eurobonos:405 milhões de dólares (Euro02) e 173 milhões de dólares (Euro03). Apesarde to<strong>do</strong>s os desatinos cometi<strong>do</strong>s, a administração da economia estavaadequada à lógica neo-liberal.O governo de Alarcón Rivera criou as bases para o aprofundamento<strong>do</strong>s problemas que deveriam explodir pouco depois, anda que osindica<strong>do</strong>res conjunturais pudessem dar alguns sinais de estabilidade, poração e também por omissão. Jamil Mahuad Witt, o Presidente seguinterecebeu “uma bomba com o pavio aceso”.JAMIL MAHUAD WITTDomina<strong>do</strong> pela “bancocracia”, o governo de Mahuad Witt não tevea capacidade de desativar a crise que desde 1992 se via chegar ao país. Nas175livro.pmd 17526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAsuas ações preferiu atender às demandas <strong>do</strong> grande capital, marginalizan<strong>do</strong>,mais uma vez, a maioria da população. E enquanto se concentrava nasolução <strong>do</strong> litígio ancestral com o Peru, deixou que germinasse a crise atéalcançar um nível desastroso.Assim, enquanto para a intervenção feita para assistir o Filanbanco,pertencente a uma única família, o governo entregava 416 milhões dedólares (quase sem garantias), em 1998, para reabilitar o Banco de Fomento,encarrega<strong>do</strong> <strong>do</strong> crédito agrícola, o governo destinava apenas 20 milhõesdólares, exigin<strong>do</strong> toda uma série de garantias. Nessa mesma linha dedesigualdade, criou-se um sistema destina<strong>do</strong> a proteger os banqueirosineficientes, que encontraria a sua cristalização na AGD, e para os maispobres se criou um abono “solidário” de cem mil sucres ao mês (quantiaque nesse momento valia menos de 20 dólares), destina<strong>do</strong> a um milhãode pessoas, ao mesmo tempo em que eram elimina<strong>do</strong>s os subsídios ao gásde uso <strong>do</strong>méstico e à energia elétrica ...Da mesma forma foi nociva para a estabilidade macro-<strong>econômica</strong> aaprovação <strong>do</strong> orçamento para 1999, decidida pelo Executivo e o Congresso,<strong>do</strong>mina<strong>do</strong> por um “trator” legislativo composta pela aliança <strong>do</strong> Parti<strong>do</strong>Democracia Popular (democracia cristã, parti<strong>do</strong> <strong>do</strong> Presidente) com oParti<strong>do</strong> Social Cristão. Esse orçamento foi apresenta<strong>do</strong> pelo próprioPresidente como um trabalho excelente, elabora<strong>do</strong> em tempo recorde,mas tinha um problema: um déficit estima<strong>do</strong> em 7% <strong>do</strong> PIB.A crise foi exacerbada pela eliminação <strong>do</strong> imposto sobre a renda e aintrodução <strong>do</strong> imposto de 1% sobre a circulação de capitais, aprova<strong>do</strong>pelo mesmo “trator” legislativo. O novo tributo fez com que aumentassemas pressões especulativas, e na expectativa da sua aprovação, muitos agenteseconômicos optaram por comprar dólares e retirá-los <strong>do</strong> país, justamenteem um momento crítico para a economia. Além disso, esse novo impostoestimulou a desintermediação financeira, com forte impacto sobre o jádebilita<strong>do</strong> sistema bancário. E ainda por cima provocou a oposição <strong>do</strong>FMI, crian<strong>do</strong> problemas nas fileiras da administração pública, cujainspiração era justamente o pensamento <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong>...176livro.pmd 17626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORCom essa decisão houve uma redução substancial da carga tributária<strong>do</strong>s contribuintes de melhor nível econômico, as grandes empresasnacionais e estrangeiras, transferin<strong>do</strong> esse ônus para os setores médios epobres, por meio de vários mecanismos, como o aumento <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong>sderiva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> petróleo, das tarifas de telefone e energia elétrica, assim como <strong>do</strong> IVA, que passou de 10 a 12%.Nefasta também para a estabilização foi a flutuação cambial a<strong>do</strong>tadapelo Banco Central no princípio de 1999. A incapacidade <strong>do</strong> governoficou ainda mais visível quan<strong>do</strong> o Presidente anunciou a contratação deauditorias internacionais para resolver os problemas das finanças públicas,pois a Superintendência <strong>do</strong>s Bancos, responsável por essa tarefa, estavacomprometida por interesses vincula<strong>do</strong>s aos grandes bancos em crise.Exemplo disso foi a atuação como Superintendente <strong>do</strong>s Bancos,especialmente durante a gestão de Mahuad, de Jorge Egas Peña, que foiadvoga<strong>do</strong> de Fernan<strong>do</strong> Aspiazu Seminario, <strong>do</strong>no <strong>do</strong> Banco <strong>do</strong> Progresso.Nomeações “vinculadas” desse tipo haviam si<strong>do</strong> feitas também em outrosgovernos: Sixto Durán Ballén, Abdalá Bucaram, Fabián Alarcón, etc. Um<strong>do</strong>s casos mas escandalosos foi possivelmente a nomeação de GustavoOrtega Trujillo, co-proprietário <strong>do</strong> Banco Continental, que comoSuperintendente participou ativamente nas reformas legais para aliberalização <strong>do</strong> sistema financeiro. Na época de Abdalá Bucaram eranotório o poder que adquiriu a família de outro banqueiro, AlejandroPeñafiel, proprietário <strong>do</strong> Banco de Empréstimos e representante de grandesinteresses <strong>do</strong> petróleo, haven<strong>do</strong> sua irmã assumi<strong>do</strong> uma Subsecretaria <strong>do</strong>Ministério da Energia.Viven<strong>do</strong> a economia uma situação difícil, o feria<strong>do</strong> bancário inicia<strong>do</strong>na segunda-feira, 8 de março de 1999, agravou as tensões. A salvação <strong>do</strong>Banco <strong>do</strong> Progresso, cujo <strong>do</strong>no financiara com 3,1 milhões de dólares acampanha eleitoral de Mahuad e o seu parti<strong>do</strong>, contaminou ainda mais osistema financeiro. Poucos dias mais tarde, na segunda-feira 15 de março,os depósitos bancários em sucres e dólares — contas de poupança, contascorrentes e depósitos a prazo de particulares — amanheceram congela<strong>do</strong>s.177livro.pmd 17726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAEsses recursos foram reti<strong>do</strong>s com taxas de juros diferenciadas, sempremais baixas <strong>do</strong> que as <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, caracterizan<strong>do</strong> assim o caráterconfiscatório <strong>do</strong> embargo.Diante da magnitude <strong>do</strong> ajuste/desajuste, com todas as suas seqüelassociais, o protesto não se fez esperar, e em março e julho de 1999 o governoenfrentou momentos críticos com os levantamentos populares e indígenas,pon<strong>do</strong> em jogo a sua própria estabilidade. A ação <strong>do</strong>s taxistas, quebloquearam as ruas das principais cidades, sobretu<strong>do</strong> a capital, sacudiu opaís e estimulou ações paralelas de outros grupos sociais.Esse vigoroso movimento de rejeição obrigou o Presidente Mahuada recuar. Em março, diante da rebeldia da população, que começou a subirde tom, geran<strong>do</strong> distúrbios e saques em alguns lugares, o governo chegoua um acor<strong>do</strong> com o Congresso, entre os parti<strong>do</strong>s governistas e os decentro-esquerda. Algumas das propostas <strong>do</strong>s setores sociais e <strong>do</strong>srepresentantes da centro-esquerda foram aceitas: voltou o imposto sobrea renda, manten<strong>do</strong>-se complementarmente o imposto sobre a circulaçãode capitais; foram eliminadas algumas exceções ao IVA; reduziu-se o preço<strong>do</strong>s combustíveis; foram instituídas punições contra os faltosos, entreoutras coisas.Em agosto de 1999, com o apoio <strong>do</strong> FMI e <strong>do</strong> Departamento <strong>do</strong>Tesouro <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, o governo resolveu declarar a moratória dadívida externa, depois <strong>do</strong>s repeti<strong>do</strong>s reajustes da economia para tentarmanter o seu serviço, ten<strong>do</strong> inclusive deixa<strong>do</strong> sem salários, durante váriosmeses, professores, médicos, enfermeiras e membros das forças desegurança.Nessas circunstâncias, arma<strong>do</strong> da reforma tributária (obtida comos votos da centro-esquerda), bem como de um vergonhoso voto contraCuba, e com a autorização para instalar uma base norte-americana emManta — dan<strong>do</strong> as costas para a sociedade equatoriana e sem a aprovação<strong>do</strong> Congresso —, Mahuad bateu repetidamente às portas <strong>do</strong> FMI.A despeito da predisposição de Mahuad para manter o país na trilhaneo-liberal, o seu governo não contou com o apoio firme <strong>do</strong>s principais178livro.pmd 17826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORgrupos de poder. Nesse cenário, a partir de Guayaquil o Parti<strong>do</strong> SocialCristão e as câmaras empresariais radicalizaram sua oposição à cobrançade tributos, levantan<strong>do</strong> a bandeira da descentralização: tema que surgiucom força com o desaparecimento <strong>do</strong> “inimigo externo” comum, depoisda assinatura <strong>do</strong>s trata<strong>do</strong>s de limites com o Peru. O lastro indiscutível <strong>do</strong>centralismo se exacerbou com os efeitos centrífugos da “globalização”,além <strong>do</strong> descui<strong>do</strong> manifesta<strong>do</strong> pelo governo central no socorro às pessoasprejudicadas pelo “El Niño”, em sua maior parte habitantes <strong>do</strong> litoral.Em conseqüência das tensões sociais e políticas, assim como (eprincipalmente) das decisões <strong>econômica</strong>s que foram tomadas, Mahuadcaminhou decididamente para o abismo. E em desespero, tentan<strong>do</strong> salvaro seu governo, decidiu dar um salto no vazio e sem qualquer preparaçãooptou pela <strong>do</strong>larização integral da economia.GUSTAVO NOBOA BEJARANOO Presidente Noboa Bejarano, que tinha forma<strong>do</strong> uma dupla comMahuad, inaugurou a sua gestão ratifican<strong>do</strong> a <strong>do</strong>larização. Assimdesapareceu o sucre, que durante 115 anos tinha si<strong>do</strong> a moeda <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r,eixo da política monetária e cambial <strong>do</strong> país. O sucre, que nasceu guardan<strong>do</strong>paridade com o dólar norte-americano, ao desaparecer valia 400 milésimos<strong>do</strong> dólar.Complementan<strong>do</strong> o aban<strong>do</strong>no <strong>do</strong> sucre, o novo governo propôsuma série de reformas <strong>econômica</strong>s para acelerar o ajuste. O objetivo era aprivatização das empresas públicas e <strong>do</strong> sistema de seguridade social, assimcomo novas flexibilizações. Essas posições contavam com o apoio <strong>do</strong>sorganismos multilaterais, especialmente o FMI.Mas a reação desses organismos diante da <strong>do</strong>larização oficial refletiude certo mo<strong>do</strong> a lógica ambivalente <strong>do</strong> governo de Washington. No FMIe no Banco Mundial não havia uma posição oficial sobre o tema, masdiante <strong>do</strong> que havia si<strong>do</strong> feito a <strong>do</strong>larização equatoriana foi aprovada. Nomesmo ano (2000) foi imposta a <strong>do</strong>larização a Timor Oriental, liberta<strong>do</strong>179livro.pmd 17926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA<strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio in<strong>do</strong>nésio. Assim, após certa resistência inicial, mais aparente<strong>do</strong> que de fun<strong>do</strong>, os representantes <strong>do</strong> Consenso de Washington apoiaramo governo equatoriano para que, com a <strong>do</strong>larização improvisada, acelerasseo ajuste estrutural.Complementarmente, pode-se salientar o papel que teve o FMIatravés <strong>do</strong> empréstimo contingente concedi<strong>do</strong> ao Equa<strong>do</strong>r em abril de2000. Antes desse empréstimo, o Equa<strong>do</strong>r, já no regime da <strong>do</strong>larização, seviu obriga<strong>do</strong> a introduzir através <strong>do</strong> Parlamento uma série de reformaslegais no contexto da Lei Fundamental para a Transformação Econômica<strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r (“Ley Trole 1”). Poucas horas depois de aprovada essa lei, oFMI obrigou à introdução de emendas, incluin<strong>do</strong> medidas destinadas areestruturar o sistema financeiro.A Ley Trole 1 aprovou a <strong>do</strong>larização oficial e instituiu reformas paraflexibilizar ainda mais o merca<strong>do</strong> de trabalho, esquemas de privatizaçãodas telecomunicações e das empresas gera<strong>do</strong>ras e distribui<strong>do</strong>ras deeletricidade, a concessão de novos oleodutos por parte de empresasprivadas, assim como uma reforma adicional <strong>do</strong> setor financeiro. Entre oscritérios impostos pelo FMI estava a obrigação de superar logo que possívela moratória da dívida externa bilateral e comercial, assim como a elevação<strong>do</strong>s preços <strong>do</strong>s combustíveis deriva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> petróleo, inclusive o gás<strong>do</strong>méstico. Entre os indica<strong>do</strong>res estruturais se destaca a reforma tributária,em especial a elevação <strong>do</strong> IVA, a redução <strong>do</strong> imposto sobre a renda assimcomo a criação de novos sobre os combustíveis.Complementan<strong>do</strong> as condições <strong>do</strong> FMI, o Banco Mundialacrescentou uma série de restrições e recomendações no quadro de umempréstimo para o ajuste estrutural da economia, sem ocultar medidaspunitivas na hipótese de o país não cumprir com o acorda<strong>do</strong>. A primeiracondição imposta pelo Banco Mundial era de seguir não só a sua orientaçãomas também a <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong> Monetário Internacional.Nesse contexto, uma das tarefas derivadas da transformaçãomonetária foi a renegociação da dívida externa — gestão sem qualquercriatividade. Não se considerou a capacidade de pagamento da economia180livro.pmd 18026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORnacional; não foram a<strong>do</strong>tadas cláusulas de contingência preven<strong>do</strong> a queda<strong>do</strong> PIB, a elevação desmedida da taxa de juros no merca<strong>do</strong> internacional,uma redução <strong>do</strong> preço <strong>do</strong> petróleo ou ainda um novo desastre causa<strong>do</strong>pelo fenômeno “El Niño”; não se pensou em um perío<strong>do</strong> de graça, até arecuperação da economia equatoriana, que teve uma queda importanteem 1999; também não se incorporou outros temas, tais como a questãoda legalidade da dívida. Por outro la<strong>do</strong>, como em tantas ocasiões anteriores,foram concedi<strong>do</strong>s amplos benefícios aos cre<strong>do</strong>res.Em suma, apegan<strong>do</strong>-se à lógica <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> financeiro internacional,pretendeu-se recuperar a imagem da credibilidade externa para voltar acontratar dívidas naquele merca<strong>do</strong>. O que, como é fácil prever, provocaráem pouco tempo novas dificuldades.Além de processar to<strong>do</strong> o complexo processo de reformas leaisque acompanharam o desaparecimento <strong>do</strong> sucre, o governo de NoboaBejarano her<strong>do</strong>u o problema bancário. No entanto, longe de encontraruma solução adequada, este governo foi um herdeiro legítimo <strong>do</strong> governoprecedente, <strong>do</strong>mina<strong>do</strong> pela “bancocracia”: de um la<strong>do</strong> não se recuperouo dinheiro entregue aos antigos <strong>do</strong>nos <strong>do</strong>s bancos que haviam sofri<strong>do</strong>uma intervenção, através de créditos vincula<strong>do</strong>s; de outro, não se cobroua carteira vencida aos grandes clientes <strong>do</strong>s bancos estatiza<strong>do</strong>s.Neste contexto vale lembrar que o governo de Noboa Bejaranocontinuou entregan<strong>do</strong> recursos ingentes ao sistema bancário, em particularo Filanbanco, que no total obteve mais de 1.400 milhões de dólares,incluin<strong>do</strong> os 414 milhões recebi<strong>do</strong>s em 1998, quan<strong>do</strong> ainda se encontravaem mãos privadas.Apesar da importância <strong>do</strong> subsídio concedi<strong>do</strong>, em julho de 2001esse banco fechou finalmente as suas portas, depois de receber, dias antes,uma nova injeção de títulos governamentais no valor de 300 milhões dedólares. Triste epílogo para uma entidade quase centenária (1908-2001),que foi à falência em 1998, em mãos privadas, com perdas estimadas em654 milhões de dólares, voltan<strong>do</strong> a quebrar em mãos <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, emprocesso confuso e improvisa<strong>do</strong>, no qual se recorreu à prática <strong>do</strong> “feria<strong>do</strong>181livro.pmd 18126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAbancário” e <strong>do</strong> congelamento de depósitos, expressamente proibi<strong>do</strong>s porlei desde o ano 2000.Neste contexto, conforme se viu nestas páginas, o ajuste foicaracteriza<strong>do</strong> por avanços e retrocessos, fases de gradualismo e outras desaltos, assim como por contradições e fundamentalismo, por instabilidadepolítica marcante e persistente resistência social, provocada pelos seusaspectos de exclusão e concentração.No entanto, reconhecen<strong>do</strong>-se embora a tortuosidade e intermitência<strong>do</strong> processo, o que conta é que ele caracterizou e orientou a administraçãoda economia e da sociedade equatorianas. O cenário nacional foi <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>pelo discurso <strong>do</strong> “livro jogo das forças <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>”; com efeito, mesmono meio de uma série de contradições, este foi o eixo das políticas<strong>econômica</strong>s então a<strong>do</strong>tadas.Causas e características da crise da virada <strong>do</strong> séculoDeste ponto de vista, os elementos desta política <strong>econômica</strong> orto<strong>do</strong>xa,configurada em torno <strong>do</strong> ajuste, explicam a gravidade da crise. Nestas condições,em conseqüência de to<strong>do</strong>s os problemas menciona<strong>do</strong>s, não surpreende que aeconomia equatoriana tenha atravessa<strong>do</strong> uma situação dramática, única em to<strong>do</strong>o século XX, pelo menos em termos de redução <strong>do</strong> PIB.De fato, em termos reais a queda <strong>do</strong> PIB em 1999 foi de 7,3%,medida em sucres, e de mais 30% quan<strong>do</strong> avaliada em dólares. Em 1933,durante a Grande Depressão, e em conseqüência da crise <strong>do</strong> cacau, aeconomia decresceu 4,2%; em 1983, com a crise da dívida externa, a queda<strong>do</strong> preço <strong>do</strong> petróleo e os efeitos <strong>do</strong> “El Niño”, a queda foi de 2,8%; em1987, com a nova redução <strong>do</strong> preço <strong>do</strong> petróleo e o rompimento <strong>do</strong>oleoduto, a contração <strong>do</strong> PIB foi de 6,0%.Na verdade, em 1999 o Equa<strong>do</strong>r sofreu o retrocesso econômicomais severo da América Latina.Avalia<strong>do</strong> em dólares, o PIB caiu 31% entre 1998 e 2000, passan<strong>do</strong>de 19.710 milhões a 13.649 milhões, ten<strong>do</strong> chega<strong>do</strong> a 13.770 milhões em182livro.pmd 18226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR1999. O PIB per capita caiu 33% entre 1998 e 2000, passan<strong>do</strong> de 1.619dólares para 1.079 (vide a Tabela 1). Em 1999 a política <strong>econômica</strong>provocou uma desvalorização de 216%, uma inflação de 52%, uma quedade 23% no salário real e uma evasão de capitais priva<strong>do</strong>s da ordem de15% <strong>do</strong> PIB.Segun<strong>do</strong> a UNICEF, o Equa<strong>do</strong>r sofreu o empobrecimento maisacelera<strong>do</strong> na <strong>história</strong> da América Latina.Entre 1995 e 2000, o número de pobres duplicou, de 3,9 a 9,1milhões, crescen<strong>do</strong> em termos percentuais de 34% para 71%. A pobrezaextrema também <strong>do</strong>brou, de 2,1 para 4,5 milhões de pessoas: em termospercentuais, um sal<strong>do</strong> de 12% para 35%. A porcentagem de criançasviven<strong>do</strong> em lares atingi<strong>do</strong>s pela pobreza aumentou de 37% para 75%. Adespesa social per capita diminuiu em cerca de 22% na educação e 26% nasaúde.Na virada <strong>do</strong> século houve uma emigração maciça de equatorianos,estimada em cerca de trezentas mil pessoas (há quem fale em quinhentasmil), fato que incidirá profundamente na vida <strong>econômica</strong>, social e política<strong>do</strong> país. Basta pensar, por exemplo, nos problemas ocasiona<strong>do</strong>s peladesagregação familiar ou a perda de mão de obra qualificada, assim comonas potencialidades <strong>do</strong> intercâmbio familiar ou na capitalização daeconomia popular. Essa emigração explica em parte a redução <strong>do</strong>desemprego havida em 2001, quan<strong>do</strong> ele caiu para 10% em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>ano, embora tenha subi<strong>do</strong> para 17% entre outubro de 1999 e fevereiro de2000. Essa tendência se observa com mais clareza nas regiões de ondesaem o maior número de emigrantes, como o Sul. Outro <strong>do</strong>s gravesproblemas nacionais é sem dúvida o sub-emprego, que aumentou nestesúltimos anos, atingin<strong>do</strong> cerca de 60% da população economicamente ativa.Tu<strong>do</strong> isso se refletiu em uma maior concentração da riqueza:enquanto em 1990 os 20% mais pobres recebiam 4,6% da renda (4,1%em 1995, 2,46% em 1999), os 20% mais ricos recebiam 52% (54,9% em1995, 61,2% em 1999), segun<strong>do</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> SIISE (Sistema Integra<strong>do</strong> deIndica<strong>do</strong>res Sociais <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r), com base na Pesquisa Urbana de183livro.pmd 18326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAEmprego de 1999. Assim, os mais ricos aumentaram em dez pontospercentuais a sua participação na renda nacional (vide Tabela 22).Em termos concretos, em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1990, antes da gravecrise <strong>do</strong>s anos 1998-2000, seis mil pessoas controlavam 90% <strong>do</strong> capitaldas empresas mercantis sujeitas à vigilância da Superintendência deCompanhias, e apenas duzentas pessoas <strong>do</strong>minavam to<strong>do</strong> o sistemabancário priva<strong>do</strong>, no qual cinco bancos concentravam a metade dasoperações ativas e passivas. E se medirmos a iniqüidade <strong>do</strong>s salários, veremosque no princípio <strong>do</strong> século XXI 64,4% <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res recebiam menosde 1,5 salários mínimos por mês; 20,4% ganhavam entre 1,5 e 5 saláriosmínimos, e só 3% recebiam mais de 5 salários (um salário mínimo = 117,6dólares). Assim, se em julho de 2001 uma família com 1,6 pessoas empregadasrecebia um total de 201 dólares, essa quantia só cobria 69% da cesta básica,que valia 291 dólares. Vale lembrar que entre novembro de 1999 e maio de2000, os anos mais duros da crise, esse déficit chegou a 57%.Seria necessário considerar os problemas setor por setor. Comoexemplo poderíamos mencionar a situação crítica <strong>do</strong>s aposenta<strong>do</strong>s, umgrupo estruturalmente marginal com pensões com a média de 40 dólares.A situação <strong>do</strong>s indígenas é também calamitosa. E de mo<strong>do</strong> geral asmulheres e os jovens sofreram relativamente mais os efeitos <strong>do</strong>s problemascausa<strong>do</strong>s pelo ajuste/desajuste neo-liberal.Os números menciona<strong>do</strong>s demonstram a gravidade da criseexperimentada pelo Equa<strong>do</strong>r entre os anos 1998 e 2000, cujas causasprocuraremos resumir em seguida.Elementos conjunturais da criseSão muitos os motivos pelos quais chegamos a esta situaçãodesesperada. Destacamos aqui só três deles, de origem externa:. Os estragos <strong>do</strong> “El Niño”, que segun<strong>do</strong> um estu<strong>do</strong> da CEPALcausou perdas estimadas em 2.869 milhões de dólares.184livro.pmd 18426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR. Os diferentes efeitos da crise financeira internacional, que provocouuma deterioração <strong>do</strong> balanço de pagamentos, tanto pelo la<strong>do</strong>comercial como na conta de capitais.. Em particular a tremenda queda <strong>do</strong> preço <strong>do</strong> petróleo no merca<strong>do</strong>mundial, em 1998.O serviço da dívida externa é um <strong>do</strong>s fatores que explicam a evoluçãodescrita, por ter impedi<strong>do</strong> o financiamento <strong>do</strong> desenvolvimento e força<strong>do</strong>a novas dívidas para viabilizar as obrigações: trata-se de um círculo infernal:são dívidas que obrigam a contrair dívidas. 51 por cento <strong>do</strong> Orçamentode 2001 foi destina<strong>do</strong> ao serviço total da dívida pública, e 33% ao serviçoda dívida externa, comprometen<strong>do</strong> assim a receita de exportação.A essa sangria permanente de recursos (vide Tabela 11) se acrescentaa intervenção nos bancos, que tem representa<strong>do</strong> um custo enorme,provocan<strong>do</strong> séria deterioração da confiança da sociedade no sistemafinanceiro <strong>do</strong> país.Em parte as grandes dificuldades vividas pelo Equa<strong>do</strong>r podem seratribuídas a problemas exógenos, conseqüência de fenômenos naturais eflutuações da economia mundial. Algumas dessas dificuldades, contu<strong>do</strong>,poderiam ser controladas ou minoradas mediante a modificação da estratégiade desenvolvimento e a a<strong>do</strong>ção de uma política <strong>econômica</strong> adequada aosdesafios desses choques externos. Esta reflexão se aplica a uma série deproblemas ambientais, provoca<strong>do</strong>s pelas agressões contínuas praticadas contraa natureza, os quais, como se disse, têm esta<strong>do</strong> na base das grandes crises.Aos processos conjunturais que descrevemos pode-se acrescentarvários fatores endógenos, e particularmente a própria política <strong>econômica</strong>praticada entre 1992 e 1999, núcleo de boa parte <strong>do</strong>s problemas nacionais.Some-se a isso as custosas políticas de intervenção salva<strong>do</strong>ra embancos priva<strong>do</strong>s, e as mencionadas aberrações fiscais. Por fim, teríamosque mencionar o efeito da <strong>do</strong>larização da economia, feita de improviso esem consultas, que contribuiu para exacerbar as pressões inflacionárias ea instabilidade política <strong>do</strong> país.185livro.pmd 18526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAAlém <strong>do</strong>s problemas conjunturais devemos mencionar alguns <strong>do</strong>saspectos estruturais mais importantes, relaciona<strong>do</strong>s entre si, potencializa<strong>do</strong>spelos problemas que citamos:· A debilidade e fragilidade <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> interno, devi<strong>do</strong> às enormesdesigualdades na distribuição da riqueza, ao baixo poder aquisitivodas massas (a pobreza) e a concentração crescente da renda e <strong>do</strong>sativos em poucas mãos, concentração que motiva também o aumentoda pobreza.· A presença de sistemas de produção atrasa<strong>do</strong>s (com baixaprodutividade da força de trabalho, mas alta produtividade <strong>do</strong>capital), caracterizan<strong>do</strong> a heterogeneidade da estrutura produtiva,que explicam a pouca capacidade de absorção da força de trabalhoe a desigualdade existente na distribuição da renda e <strong>do</strong>s ativos.· Os altos níveis de desemprego (aberto e oculto) e de sub-emprego,bem como a inexistência de políticas voltadas para a criação deempregos estáveis e qualifica<strong>do</strong>s.· A carência de uma integração adequada das diferentes regiões <strong>do</strong>país, assim como o pouco desenvolvimento das cidades de tamanhomédio ou pequeno, prejudicadas por diversas manifestações <strong>do</strong>centralismo governamental e da concentração da riqueza.· As limitadas conexões fiscais, produtivas e de consumo, bem comoa deficiente vinculação entre os setores, especialmente da agriculturacom a indústria, e das atividades de exportação com o restante daeconomia.· A alta propensão marginal a importar (não só máquinas eequipamento mas também matérias primas e bens de consumo,duráveis e não duráveis: conseqüência da costumeira dependênciaexterna, em particular tecnológica e cultural.· A má administração <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, a marcante arbitrariedadeburocrática e um grande número de ineficiências acumuladas aolongo da <strong>história</strong>.186livro.pmd 18626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR· O desrespeito quase permanente à democracia institucional e àprópria Constituição, fator que contribuiu para agravar a instabilidadepolítica e a deterioração da imagem internacional <strong>do</strong> país.· As ineficiências maciças <strong>do</strong> setor priva<strong>do</strong>, assim como a falta deempenho e de capacidade de inovação <strong>do</strong> empresaria<strong>do</strong>, infecta<strong>do</strong>pela inércia <strong>do</strong> rentismo e clientelismo <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>.· A existência de oligopólios e mesmo de monopólios, que caracterizaos merca<strong>do</strong>s.· A corrupção generalizada em toda a sociedade, e não só no setorpúblico.Além <strong>do</strong> bloqueio sistemático da reprodução <strong>econômica</strong>, nos últimosanos, é preciso levar em conta a natureza heterogênea da produção. Podesedizer que a economia equatoriana está composta por cinco estratosbásicos: 1) o petrolífero (petróleo e mineração); 2) o urbano moderno(energia elétrica, água e finanças; parte da indústria, construção, comércio,transporte e comunicações); 3) rural moderno (agro-pecuária, pesca); 4)urbano tradicional (parte da indústria, construção, comércio, transporte,serviço <strong>do</strong>méstico); e 5) rural tradicional (agro-pecuária, pesca). Dentrodessa grande divisão teríamos ainda que diferenciar a situação dentro decada segmento, na medida que apresentam produtividade e comportamentoheterogêneos, com relações de produção das mais variadas.Não se pode afirmar que no Equa<strong>do</strong>r as relações de produção semifeudaisou não capitalistas tenham si<strong>do</strong> totalmente superadas. Além disso,esses segmentos produtivos guardam entre si uma relação estreita e umadependência que deveriam também ser consideradas detidamente. Poroutro la<strong>do</strong>, seria preciso integrar esta análise em termos <strong>do</strong> que JuanMaiguashca define como “a questão regional”.Esta heterogeneidade leva ao que é aparentemente um beco semsaída”: os setores marginais, que têm maior produtividade de capital <strong>do</strong>que os modernos, não podem acumular porque não têm os recursosnecessários para investir; e os setores modernos, onde a produtividade da187livro.pmd 18726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAmão de obra é mais elevada, não investem porque não dispõem demerca<strong>do</strong>s internos que lhes assegurem uma rentabilidade atraente. Istopor sua vez agrava a disponibilidade de recursos técnicos, de força detrabalho qualificada, de infra-estrutura e de divisas, o que, por outro la<strong>do</strong>,desestimula a ação <strong>do</strong>s investi<strong>do</strong>res. E assim por diante.Deste mo<strong>do</strong> o Equa<strong>do</strong>r não pode ser visto simplesmente comovítima <strong>do</strong>s problemas exógenos, mas é um país que também gera ereproduz internamente os seus próprios problemas, em um processo de“causação circular cumulativa”, processo descrito pelo economista suecoGunnar Myrdal, Prêmio Nobel de Economia de 1974.Principais resulta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> ajuste estruturalApesar de seguir em grande parte as receitas <strong>do</strong> Consenso deWashington, o Equa<strong>do</strong>r tem si<strong>do</strong> considera<strong>do</strong> como um país que resisteao ajuste econômico, e as instituições financeiras internacionais oincluíram na sua lista das nações faltosas. Naturalmente, os quepromovem esse ajuste no país, ecoan<strong>do</strong> tais afirmativas, têm pressiona<strong>do</strong>para aprofundá-lo.As sucessivas reações sociais e a falta de coerência das elites<strong>do</strong>minantes, que limitaram uma aplicação ainda mais completa e rigorosa<strong>do</strong> modelo neo-liberal, poderiam explicar essa avaliação. No entanto, adespeito dessa visão (muitas vezes interessada e tendenciosa), a economiaequatoriana, como a de outros países da região, aplicou e sofreu a receita<strong>do</strong> ajuste. Mais ainda: como vamos demonstrar mais adiante, em algunsaspectos o ajuste ultrapassou a média latino-americana.De fato, com diversos graus de coerência e intensidade, desde oinício da década de 1980 o Equa<strong>do</strong>r a<strong>do</strong>tou uma filosofia de favorável àabertura e à liberalização inspirada no FMI e no Banco Mundial, impostapor muitos mecanismos e até mesmo com chantagens externas e internas.A recuperação <strong>do</strong> equilíbrio macro-econômico, para retomar de formaespontânea o caminho <strong>do</strong> crescimento e a distribuição <strong>do</strong>s frutos <strong>do</strong>188livro.pmd 18826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORprogresso foi o Leitmotiv da administração <strong>econômica</strong>, enquanto seintroduziam mudanças estruturais na economia.Peça fundamental deste processo foi a ação sistemática <strong>do</strong> FMI e<strong>do</strong> Banco Mundial, apoiada em uma propaganda habili<strong>do</strong>sa e não menosperversa. Ponto essencial dessa propaganda era a visão combinada dainevitabilidade e <strong>do</strong> atraso que teria o Equa<strong>do</strong>r em comparação com osoutros países da América Latina, negan<strong>do</strong> a existência de alternativas.Neste contexto não faltaram vozes ignoran<strong>do</strong> o ajuste feito peloEqua<strong>do</strong>r, ou que, mesmo sem negá-lo, consideran<strong>do</strong>-o insuficiente, o queteria provoca<strong>do</strong> mais resulta<strong>do</strong>s negativos <strong>do</strong> que positivos. Assim, chegousea afirmar que sem o tratamento neo-liberal as condições <strong>do</strong> país teriamsi<strong>do</strong> piores, pois o remédio aplica<strong>do</strong>, por mais <strong>do</strong>loroso, seria o únicodisponível. E se a realidade não confirmava a teoria, como aconteceumuitas vezes, a expectativa <strong>do</strong>s neo-liberais é que a realidade se ajuste àteoria...Essas visões fundamentalistas se complementam com uma formade masoquismo bastante generaliza<strong>do</strong>, pois se as medidas a<strong>do</strong>tadas nãosão extremas, o ajuste é considera<strong>do</strong> tíbio ou insuficiente; e se há umahesitação ou um retrocesso, não faltam as advertências sobre o desastreque se aproxima. Masoquismo compartilha<strong>do</strong> por muitos grupos sociaise empresariais, e até mesmo pelos mais claramente afeta<strong>do</strong>s pela aplicaçãodessas políticas.Como corolário quase lógico para a imposição da ideologia neoliberalnão faltou o “terrorismo econômico”: uma das suas manifestações maisnotáveis foi a campanha em favor da <strong>do</strong>larização oficial da economia, impostapelo governo em janeiro de 2000, em um momento de desespero, como amelhor e única alternativa para enfrentar uma suposta hiper-inflação (quenaturalmente não existia), que tornaria a agir como fantasma devora<strong>do</strong>r daeconomia se a opção fosse aban<strong>do</strong>nar o dólar ... O mesmo fantasma usa<strong>do</strong>para justificar o congelamento bancário em março de 1999.To<strong>do</strong> esse esforço sustentou uma política <strong>econômica</strong> que, “em nomeda ciência <strong>econômica</strong>”, levou à aceitação de uma lógica que adequou o189livro.pmd 18926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTApaís às necessidades <strong>do</strong> capitalismo mundializa<strong>do</strong>, desequilibran<strong>do</strong>-o emtermos <strong>do</strong> que podia ter si<strong>do</strong> um desenvolvimento mais equilibra<strong>do</strong>.Embora tenha colhi<strong>do</strong> “aplausos” internacionais, o ajuste promovi<strong>do</strong>no Equa<strong>do</strong>r não pode ser qualifica<strong>do</strong> simplesmente como uma experiênciaque falhou por incompleta, e menos ainda por inexistente. Sem pretenderesgotar o tema, confrontan<strong>do</strong> a realidade desse ajuste com as posições <strong>do</strong>Consenso de Washington, resumimos adiante alguns aspectos à luz <strong>do</strong>sobjetivos explícitos e implícitos <strong>do</strong> ajuste:Liberalização comercialA evolução da abertura comercial <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r acompanhou aocorrida na América Latina, chegan<strong>do</strong> a superar em alguns pontos a médiaregional. Esse “progresso” pode ser explica<strong>do</strong> pela abertura histórica daeconomia equatoriana, assim como pelos esforços limita<strong>do</strong>s desenvolvi<strong>do</strong>spara construir um merca<strong>do</strong> interno durante o perío<strong>do</strong> em que se promoveua industrialização através da substituição de importações. A evolução <strong>do</strong>índice de abertura da economia (soma das exportações com importaçõesdividida pelo PIB) superou 40% na década de 1970 e, salvo em duasocasiões, se manteve nesse nível, e também em 50%: indubitavelmenteum <strong>do</strong>s maiores índices de abertura de toda a região.Abertura que foi ampliada pela desgravação aduaneira iniciada nogoverno de León Febres Cordero, e radicalizada por Rodrigo BorjaCevallos. Desta forma o país chegou a uma situação comprável à <strong>do</strong>s 17países da região analisa<strong>do</strong>s por Samuel A. Morley, Roberto Macha<strong>do</strong> eStefano Pettinato, cujo índice leva em conta em grande parte as reflexõesque faremos em seguida (o estu<strong>do</strong> menciona<strong>do</strong> abrange Argentina, Bolívia,Brasil, Colômbia, Costa Rica, Chile, Equa<strong>do</strong>r, El Salva<strong>do</strong>r, Guatemala,Honduras, Jamaica, México, Paraguai, Peru, República Dominicana,Uruguai e Venezuela).Em 1995 o índice de abertura comercial <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r era 0,953,superior à média regional de 0,946. A partir de 1991 o país superou a190livro.pmd 19026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORmédia latino-americana, da qual se afastara até então. Esta tendência seacelerou desde 1989, e em 1995 o índice de abertura <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r erasuperior ao da Argentina, Brasil, Colômbia, Peru e Venezuela, sen<strong>do</strong>supera<strong>do</strong> apenas pela Bolívia, Chile e México.Com sua vinculação à Organização Mundial <strong>do</strong> Comércio (OMC),desde 1996 o Equa<strong>do</strong>r eliminou quase to<strong>do</strong> tipo de restrição comercial,excetuadas apenas algumas salvaguardas aduaneiras introduzidas sobretu<strong>do</strong>por razões fiscais de curto prazo. Isto nos permite afirmar que a partir de1995 a abertura de fato se ampliou embora as tendências protecionistas eregionalistas sejam cada vez mais notórias na economia mundial, de ondese deduz que o merca<strong>do</strong> é administra<strong>do</strong> e não livre, como apregoam osdefensores <strong>do</strong> <strong>do</strong>gma neo-liberal. Exemplo dessa realidade são asdificuldades encontradas pela banana <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r para ingressar nomerca<strong>do</strong> europeu ou os enormes subsídios recebi<strong>do</strong>s pela agricultura nosEsta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e na União Européia.Em termos de promoção das exportações esse esforço rendeu algunsfrutos quantitativos: as exportações passaram de 2.237 milhões de dólaresem 1982 a 5.264 milhões em 1997; no entanto, devi<strong>do</strong> à crise internacionale aos efeitos <strong>do</strong> “El Niño”, caíram a 4.203 milhões em 1998, voltan<strong>do</strong> asubir para 4.926 milhões em 2000. Não obstante, é importante constatarque essa variação foi constatada sobretu<strong>do</strong> nos produtos primários.Além <strong>do</strong>s produtos de base tradicionais (petróleo, banana, camarão,café e cacau), registrou-se um dinamismo crescente em outros produtosprimários não tradicionais: em particular flores e frutas exóticas, assimcomo produtos ligeiramente elabora<strong>do</strong>s. Parte destacada <strong>do</strong> esforço deexportação dessa época ocorreu na região da Serra, tradicionalmenteorientada para o merca<strong>do</strong> interno, que experimentou novas mudanças naestrutura de propriedade da terra e na demanda de mão de obra, devi<strong>do</strong> aessas novas atividades.A lista de produtos exporta<strong>do</strong>s cresceu de forma vertiginosa: águamineral, aguardente, artigos de confeitaria, achiote (bija, usada como tinturaou refresco), alimento para cães, aveia especial, bambu, caolim, charutos,191livro.pmd 19126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAcondimentos, pêssegos, fécula, extrato de malva, farinha de banana,cogumelos, abacaxi, quínua, molho de tomate, fumo negro, etc. No entanto,a receita de exportação (e mais ainda sua importância tecnológica) élimitada.Adicionalmente, o aumento de certas exportações adicionais foiquantitativo, tornan<strong>do</strong> possível compensar a redução <strong>do</strong> preço. Houve,portanto, uma deterioração <strong>do</strong>s termos de intercâmbio de vários produtosequatorianos.Da mesma forma, a dependência <strong>do</strong> petróleo não foi superada. Pelocontrário, para sustentar a <strong>do</strong>larização oficial da economia, e a continuidade<strong>do</strong> ajuste, quer-se incrementar a exportação de óleo cru, confian<strong>do</strong>-se emum novo boom petrolífero para resolver os problemas acumula<strong>do</strong>s nestaépoca de ajuste, aplica<strong>do</strong> para resolver dificuldades não resolvidas duranteo boom <strong>do</strong> petróleo da década de 1970 ...Vemos claramente na economia equatoriana a tendência de retornoà ênfase nos produtos primários, promovida pelo ajuste, enquanto adesindustrialização da estrutura produtiva é relativamente limitada pelopouco desenvolvimento industrial anterior, sobretu<strong>do</strong> em termos deincorporação tecnológica aos processos de fabricação.A <strong>do</strong>larização imposta à economia em janeiro de 2000 antecipaefeitos crescentes no setor exporta<strong>do</strong>r para aumentar e mais ainda paraincrementar o nível de competitividade, em especial naquelas atividadesque não se sustentam com a renda da natureza e com o recurso da mão deobra barata e flexível.Para completar o quadro <strong>do</strong> comércio exterior é preciso levar emconta a evolução da importação. Inicialmente a exportação caiu de 2.187milhões de dólares em 1982 para 1.474 milhões em 1983, em conseqüência<strong>do</strong> primeiro ajuste provoca<strong>do</strong> pela grave crise da dívida externa. Em seguidaregistrou-se uma recuperação paulatina, até 1987, ano <strong>do</strong> terremoto,quan<strong>do</strong> a importação caiu em 300 milhões de dólares. Desde então aimportação voltou a crescer, especialmente no setor de bens de consumo,chegan<strong>do</strong> ao nível mais alto em 1998: 5.576 milhões de dólares, recorde192livro.pmd 19226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORexplicável pela compra de alimentos em função <strong>do</strong> “El Niño”, e em partepelo ingresso de produtos asiáticos mais baratos, sobretu<strong>do</strong> veículos, depoisda desvalorização maciça havida nessa parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Em 1999 asimportações caíram para 3.017 milhões de dólares, devi<strong>do</strong> à depressão,começan<strong>do</strong> a recuperar-se em 2000, para alcançar 3.721,2 milhões dedólares, com uma clara tendência ascendente.A estrutura das importações demonstra o alto grau de dependênciaexterna da indústria nacional, setor que aglutina as compras de bens decapital e matérias primas (vide Tabela 5). Apesar da debilitação industrial,devi<strong>do</strong> à suspensão <strong>do</strong> esquema tardio de substituição de importações, naprática muitas empresas industriais orientadas para o merca<strong>do</strong> interno, ouna melhor das hipóteses voltadas para o merca<strong>do</strong> andino, como ocolombiano, continuaram a a<strong>do</strong>tar a lógica da montagem de peçasimportadas, devi<strong>do</strong> ao relançamento da integração andina a partir de 1989.É interessante notar que as empresas transnacionais monta<strong>do</strong>ras deautomóveis dividiram o merca<strong>do</strong> entre si em termos semelhantes aos <strong>do</strong>Pacto Andino nos anos 1970.Isto demonstra também o fracasso <strong>do</strong> mo<strong>do</strong> como se aplicou oprotecionismo, que não induziu melhorias qualitativas na estruturaindustrial. O que não se pode confundir, ingenuamente, com a inutilidadede uma política protecionista em geral, porque se tratava de uma atitudebaseada em relações pessoais e de grupo, afetada por incoerências einconsistências – que é o que aconteceu no Equa<strong>do</strong>r.Na lista de clientes de produtos equatorianos, durante o perío<strong>do</strong>que estamos analisan<strong>do</strong>, não houve uma diversificação digna de nota. OEqua<strong>do</strong>r continuou firmemente na órbita <strong>do</strong> dólar: é o que se vê comclareza nas exportações para os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, que em 2000representaram 38% <strong>do</strong> total (em 1992: 42%), enquanto as importaçõesdesse país continuaram a ocupar um lugar preponderante, chegan<strong>do</strong> a25% no ano 2000 (em 1992: 34%) (Vide as Tabelas 6 e 7).Essa situação precisa ser comparada com as mudanças ocorridasnos países centrais, onde se está crian<strong>do</strong> uma estrutura produtiva ágil,193livro.pmd 19326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAflexível e de impacto em larga escala, dependen<strong>do</strong> cada vez menos dasimportações da periferia e que cada vez mais se sustenta com base noconhecimento.Desregulamentação <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> financeiroO sistema financeiro foi liberaliza<strong>do</strong> e flexibiliza<strong>do</strong> em especialdepois de 1992, sen<strong>do</strong> eliminadas ao mesmo tempo as estruturaspreferenciais das taxas de juros e a ação de fomento <strong>do</strong> banco estatal. OBanco Central assumiu exclusivamente funções monetárias e cambiais.Os bancos de desenvolvimento (Corporação Financeira Nacional e BancoNacional de Fomento, transformada a primeira em banco de segun<strong>do</strong>nível) facilitaram o livre acesso ao sistema bancário comercial. Só faltariaque o banco internacional pudesse captar a poupança <strong>do</strong>s equatorianosde forma direta.Embora o Equa<strong>do</strong>r estivesse “atrasa<strong>do</strong>” em relação à média latinoamericanaem termos de flexibilidade financeira interna, com as reformasintroduzidas no governo de Durán Ballén chegou-se a ultrapassar essamédia, atingin<strong>do</strong> quase o nível <strong>do</strong> Chile, considera<strong>do</strong> um modelo <strong>do</strong> ajusteneoliberal. Basta ver os índices em ordem decrescente para um grupo <strong>do</strong>spaíses estuda<strong>do</strong>s: Argentina 0,986; Chile 0,983; Equa<strong>do</strong>r 0,980, Bolívia0,973, Colômbia 0,950, média da América Latina: 0,927.No entanto, a “vantagem” que o país poderia ter ti<strong>do</strong> com a sualiberalização financeira “tardia” não foi aproveitada para criar mecanismosadequa<strong>do</strong>s de controle e regulagem da economia. Pelo contrário, asdeficiências próprias dessas reformas, manifestadas dramaticamente nascrises <strong>do</strong>s países asiáticos, se complicaram ainda mais devi<strong>do</strong> àmediocridade e o <strong>do</strong>gmatismo <strong>do</strong>s seus promotores, fato a que se soma aadministração corrupta <strong>do</strong> sistema bancário.Embora desde 1986, nos governos de Febres Cordero e BorjaCevallos, a fixação das taxas de juros tenha si<strong>do</strong> flexibilizada, o ponto departida para uma liberalização financeira maciça foi a aprovação da Lei194livro.pmd 19426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORGeral de Instituições <strong>do</strong> Sistema Financeiro, de 1994, que permitiu aosbanqueiros ampliar suas atividades e diversificar os seus negócios,aumentan<strong>do</strong> a possibilidade de obter mais crédito para as suas empresas,sob a forma de créditos vincula<strong>do</strong>s. Essa liberalização se transformouem uma verdadeira libertinagem, devi<strong>do</strong> à redução da capacidade (evontade) de controle por parte da Superintendência de Bancos.Adicionalmente, houve uma série de reformas legais, com a a<strong>do</strong>ção denovas normas, como a Lei de Merca<strong>do</strong> de Valores, a Lei de Modernização<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e, particularmente, a Lei Geral de Instituições <strong>do</strong> SistemaFinanceiro.Um fator adicional foi a desregulamentação <strong>do</strong>s depósitos manti<strong>do</strong>sfora <strong>do</strong> país (off-shore), em sucursais <strong>do</strong>s bancos nacionais no exterior, quenão só não atraiu investimentos estrangeiros como canalizou recursosequatorianos para o exterior, para serem administra<strong>do</strong>s extraterritorialmente,em um ambiente caracteriza<strong>do</strong> por cada vez menoscontroles. Este seria outros <strong>do</strong>s elementos que contribuíram para acelerara <strong>do</strong>larização espontânea da economia, já que esse esquema off-shore serviupara promover e ocultar a poupança em dólares, não para atrair a poupançaexterna, como rezava a explicação oficial.A <strong>do</strong>larização espontânea foi crescen<strong>do</strong> a partir de 1994, comoresulta<strong>do</strong> da política a<strong>do</strong>tada. Assim, <strong>do</strong> total de depósitos bancários, aporcentagem denominada em dólares passou de 15,4% em 1994 para47,3% em 1999; no que se refere às aplicações, o aumento foi de 19,9%para 66,5% no mesmo perío<strong>do</strong>. Os maiores aumentos, nos <strong>do</strong>is casos,foram registra<strong>do</strong>s entre 1997 e 1999, os anos da maior crise <strong>econômica</strong>(vide Tabela 20).Essas reformas transformaram o sistema bancário restrito erelativamente controla<strong>do</strong> em um sistema liberaliza<strong>do</strong>, com o qual, naprática, aumentou o risco das operações. Permitiu-se também a colocaçãode novos produtos bancários, adequa<strong>do</strong>s ao ambiente especulativointernacional. Os bancos canalizaram para a economia nacional um massade recursos externos, sem a<strong>do</strong>tar critérios de seletividade da produção e195livro.pmd 19526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAsem tomar as precauções devidas: recursos que não tardaram a escapar <strong>do</strong>país com os primeiros sintomas da crise ...Com este esquema de banco universal, ou múltiplo, os bancosprovinciais e regionais ficaram debilita<strong>do</strong>s, aumentan<strong>do</strong> a transferênciaassimétrica e a concentração de capitais característica <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, poispoucas províncias (Guayas, Pichincha, Los Ríos e El Oro) captavam ogrosso da poupança privada, extraída das outras províncias. O sal<strong>do</strong> decréditos e depósitos em Guayaquil e Quito se aproximava <strong>do</strong>s 70% <strong>do</strong>total nacional.Nesse ambiente permissivo se consolidaram as condições para ouso ineficiente e até mesmo corrupto <strong>do</strong>s créditos, o que, juntamentecom os problemas macro-econômicos que mencionamos e as dificuldadesexógenas, permitiram aflorassem os desequilíbrios financeiros, refleti<strong>do</strong>sem deficiências de carteira, concentração excessiva <strong>do</strong> crédito, enormidadede créditos vincula<strong>do</strong>s, ausência de instrumentos adequa<strong>do</strong>s de controle,ineficiência geral, desperdício de recursos (campanhas publicitárias multimilionárias,escritórios luxuosos, muitas barganhas oferecidas aos clientes,destinadas a ocultar a debilidade <strong>do</strong>s bancos), além naturalmente de umcanibalismo bancário explicável pela disputa de um merca<strong>do</strong> que secontraía, e oculto também por trás da “questão regional” exacerbada nosúltimos anos <strong>do</strong> século XX.O fechamento <strong>do</strong> Banco <strong>do</strong> Progresso, decidi<strong>do</strong> pelo seuproprietário, Fernan<strong>do</strong> Aspiazu, é um exemplo <strong>do</strong> que dissemos noparágrafo precedente. Aspiazu tinha financia<strong>do</strong> a campanha eleitoral deJamil Mahuad Witt, e apoian<strong>do</strong>-se nos seus meios de comunicação levantouparte da cidade de Guayaquil em defesa <strong>do</strong> seu banco: capitalistas epequenos poupa<strong>do</strong>res, oligarcas e o povo marcharam juntos pelas ruaspara salvar um banco priva<strong>do</strong>, que os tinha prejudica<strong>do</strong> ... e o próprioPrefeito, León Febres Cordero, prometeu sacrificar-se por ele.Sabemos que muitos presidentes conquistam o poder político coma cooperação <strong>do</strong> poder econômico, que termina por submetê-los. Muitasvezes os grupos <strong>do</strong>minantes, em algumas ocasiões chefia<strong>do</strong>s por196livro.pmd 19626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORbanqueiros, controlaram o poder político com mãos alheias. Um <strong>do</strong>s casosmais conheci<strong>do</strong>s foi o de Francisco Urbina Ja<strong>do</strong>, no princípio <strong>do</strong> séculoXX. Em 1998, junto a Aspiazu, que financiara 27% <strong>do</strong>s custos da campanhapresidencial de Mahuad, e representava os interesses de uma empresa comoa EMELEC, desde 1985 afetada por sua complexa relação com o Esta<strong>do</strong>,outros banqueiros de peso financiaram a campanha da democracia cristã.Essa vinculação bancária se tornou evidente com a nomeação dessesbanqueiros para cargos de importância no governo: Guillermo Lasso (<strong>do</strong>Banco de Guayaquil0, para Governa<strong>do</strong>r de Guayas e super-ministro daeconomia); Álvaro Guerrero (<strong>do</strong> Banco la Previsora) para Presidente <strong>do</strong>CONAM; Medar<strong>do</strong> Cevallos Balda (<strong>do</strong> Bancomex), como Embaixa<strong>do</strong>rno México), entre outros; assim como de importantes dirigentes daAssociação de Bancos Priva<strong>do</strong>s: Ana Lucía Armijos, para Ministra deGoverno e Finanças e Embaixa<strong>do</strong>ra na Espanha; Carlos Larreátegui, comosuper-Ministro de Desenvolvimento Social.Contrarian<strong>do</strong> o discurso sobre o merca<strong>do</strong> livre, não faltaramintervenções <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> em favor <strong>do</strong>s bancos que se encontravam emsituação crítica, a começar com a intervenção no Banco Continental,durante o governo de Durán Ballén. O problema se tornou mais agu<strong>do</strong>quan<strong>do</strong>, em fins de 1998, o governo de Mahuad criou a AGD (Agência deGarantia de Depósitos), por recomendação <strong>do</strong> Banco Mundial, paragarantir to<strong>do</strong>s os depósitos bancários, quase sem limites, enquanto naprática os banqueiros não eram obriga<strong>do</strong>s a dar garantias adequadas paraos empréstimos recebi<strong>do</strong>s. Essa “invenção” descabelada era consistentecom as tradicionais práticas rentistas. É interessante observar que grandeparte das reformas feitas nessa época, como a proposta de criação daAGD, foram obra <strong>do</strong>s parti<strong>do</strong>s Social Cristão, Democrático Popular eConserva<strong>do</strong>r, com a adesão, em alguns casos, <strong>do</strong> FRA e <strong>do</strong> PRE — parti<strong>do</strong>sque formavam o governo no perío<strong>do</strong> <strong>do</strong> ajuste econômico.Como créditos líqüi<strong>do</strong>s o governo entregou aos bancos cerca de900 milhões de dólares entre agosto de 1998 e março de 1999; outros1.400 milhões em títulos da AGD, a partir de dezembro de 1998. Em197livro.pmd 19726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAmarço de 1999 congelou os depósitos em to<strong>do</strong> o sistema bancário, novalor total de cerca de 3.800 milhões (em parte restituí<strong>do</strong>s, mas sem jurose menos ainda indenização por lucros cessantes, ou a perda de poderaquisitivo devi<strong>do</strong> à macro-desvalorização). A esses valores se somam maisde 2.300 milhões transferi<strong>do</strong>s, com diferentes justificativas (incluída aconversão de dívida em capital em favor <strong>do</strong> Filanbanco), no ano 2000. Emais os 300 milhões de novos bonos para o Filanbanco e quase 100 milhõesde capitalização <strong>do</strong> Banco <strong>do</strong> Pacífico, recursos entregues em 2001 paraque esses bancos cumprissem as exigências legais de 9% <strong>do</strong> patrimôniotécnico sobre ativos e contingentes sujeitos a risco.O discurso liberal foi posto à margem quan<strong>do</strong> o Esta<strong>do</strong> interveiopara salvar bancos em situação difícil, pon<strong>do</strong> em evidência uma das facetascaracterísticas da estrutura autoritária e paternalista da sociedadeequatoriana, <strong>do</strong> neoliberalismo real. Essas intervenções salva<strong>do</strong>rasrepresentaram o dispêndio de milhares de milhões de dólares na assunçãopelo Esta<strong>do</strong>, de diferentes mo<strong>do</strong>s, <strong>do</strong>s seguintes bancos: Banco Continental(em 1995); Solbanco, Préstamos, Filanbanco, Tungurahua (1998);Filancorp, Finagro, Azuay, Ocidente, Progresso, Bancomex, Creditício,Bancounión, Popular, Previsora, Pacífico (1999). Como parte dessasintervenções foram autorizadas a fusão <strong>do</strong> Banco La Previsora com oFilanbanco, e <strong>do</strong> Banco Continental com o Banco <strong>do</strong> Pacífico – tentativasdesesperadas e inúteis de salvar essas instituições.Deste mo<strong>do</strong> o Esta<strong>do</strong> chegou a controlar 70% <strong>do</strong> patrimônio e60% <strong>do</strong>s ativos bancários. As intervenções sanea<strong>do</strong>ras no sistema bancáriochegaram a representar, só em 1999, quase 30% <strong>do</strong> PIB, uma das maiorescifras registradas em to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong> com esse tipo de operação: 15% noSudeste Asiático, em 1995-7, enquanto na América Latina o dispêndiomédio foi de 8,3%. Esta é uma das explicações para o aumento da pobrezae da miséria, pois esse ônus foi passa<strong>do</strong> à sociedade, enquanto em suamaioria os banqueiros salvaram suas inversões e propriedades.Neste ponto a salvação <strong>do</strong> Filanbanco, que entre 1998 e 2001 recebeumais de 1.200 milhões de dólares (mais <strong>do</strong> <strong>do</strong>bro <strong>do</strong>s gastos <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>198livro.pmd 19826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORcom a saúde pública, no mesmo perío<strong>do</strong>) é paradigmática, na medida emque os seus antigos proprietários quiseram negar a falência da instituição,quan<strong>do</strong> ela foi transferida para o Esta<strong>do</strong>, e exigiram a restituição de algumasgarantias entregues.Nessa oportunidade, mais uma vez a Superintendência de Bancosbrilhou pela ausência. O fracasso da sua gestão ficou claro quan<strong>do</strong> ela nãoconseguiu sequer produzir uma lista atualizada <strong>do</strong>s deve<strong>do</strong>res em atraso<strong>do</strong> Filanbanco, entidade que era impenetrável ao controle estatal: em julhode 2001 Gustavo Noboa, o próprio Presidente da República, chegou areconhecer que lhe viam oculta<strong>do</strong> informações pertinentes ... Não hádúvida, assim, de que o seu governo foi um herdeiro digno <strong>do</strong> regimebancocrático de Jamil Mahuad.Além <strong>do</strong>s problemas deriva<strong>do</strong>s da liberalização financeira e dapolítica <strong>econômica</strong> a<strong>do</strong>tada desde 1992, assim como <strong>do</strong>s problemasexógenos, muitos bancos, como o Filanbanco, contribuíram com razõesparticulares para o seu fracasso. Seus <strong>do</strong>nos não eram só banqueiros, comrecomenda a lógica bancária e a ética empresarial. Utilizan<strong>do</strong> os depósitos<strong>do</strong>s clientes e talvez até mesmo as informações que eles forneciam, essesbanqueiros expandiram seu <strong>do</strong>mínio: meios de comunicação (rádio eespecialmente a televisão), serviço telefônico, gráficas, agro-indústria,empresas de criação de ga<strong>do</strong> e produção de leite, de açúcar (o engenho LaTroncal foi adquiri<strong>do</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> por 100 mil dólares, 60 vezes menos <strong>do</strong>que o valor estima<strong>do</strong> das suas máquinas), produção e exportação de banana,indústria têxtil, empresas de seguros, financeiras especializadas, empresasde construção, imobiliárias, importa<strong>do</strong>ras, clubes esportivos, fábricas deembalagens, cervejarias, empresas de mineração e petrolíferas. É precisoregistrar também que, pouco antes de entregar o Filanbanco ao Esta<strong>do</strong>,os seus <strong>do</strong>nos reprogramaram seus créditos vincula<strong>do</strong>s, muitos deles emcondições extremamente vantajosas: sem juros, sete anos de prazo maisum de graça. Vantagens ainda maiores porque se tratava de operações emsucre, moeda que perdeu o valor com a desvalorização maciça ocorridaentre fins de 1998 e janeiro de 2000.199livro.pmd 19926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTANeste contexto, como conseqüência direta da liberalização da contade capitais, e afeta<strong>do</strong> também pela crise, o sistema financeiro se beneficioucom um ambiente mais favorável à especulação <strong>do</strong> que à produção,terminan<strong>do</strong> por transformar-se em obstáculo ao desenvolvimento.A abertura e os capitaisOutro aspecto que é preciso analisar é a abertura havida na contade capitais. O “progresso” <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r nesse campo é notável. Desde1980 o país supera amplamente a média regional de 0,848, e até mesmo a<strong>do</strong> Chile, que curiosamente é inferior à latino-americana: Argentina 0,896;Bolívia 0,887; Equa<strong>do</strong>r 0,860; Chile 0,745; Colômbia 0,726.Assim como em outros países latino-americanos, entre 1993 e 1994a economia equatoriana se beneficiou, embora em menor medida, <strong>do</strong>refluxo líqüi<strong>do</strong> de recursos externos. O capital especulativo ingressou nopaís em busca de rendimentos mais atraentes <strong>do</strong> que os ofereci<strong>do</strong>s nosmerca<strong>do</strong>s de origem, atraí<strong>do</strong> especialmente pelo esquema de estabilizaçãobasea<strong>do</strong> em âncora cambial que exigia taxas de juros muito altas, assimcomo por outras reformas introduzidas nesses anos. Esse refluxo se explicatambém pela queda <strong>do</strong>s rendimentos financeiros nos principais merca<strong>do</strong>sinternacionais.O desejo de receber inversões estrangeiras se refletiu em uma sériede concessões a esse capital, que salvo poucas exceções recebia o mesmotratamento dispensa<strong>do</strong> ao capital nacional. Desde 1993, por exemplo,permitiu-se a livre remessa de lucros e os procedimentos de registro foramsimplifica<strong>do</strong>s. Mais ainda: a clara predisposição <strong>do</strong>s governos parabeneficiar os investi<strong>do</strong>res estrangeiros levou-os a oferecer vantagens semqualquer racionalidade <strong>econômica</strong>, contrarian<strong>do</strong> até mesmo dispositivoslegais: basta mencionar as diversas formas de subsídio às empresaspetrolíferas transnacionais, com vários exemplos de violação das leis,ocasionan<strong>do</strong> prejuízos à sociedade, assim como o lucro mínimo garanti<strong>do</strong>de fato a empresas privadas no setor da energia elétrica.200livro.pmd 20026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORMesmo assim, há grupos que reclamam maiores vantagens para o capitaltransnacional, esperan<strong>do</strong> cristalizá-las com novas reformas legais no campodas privatizações promovidas pela <strong>do</strong>larização, uma alavanca importante paraacelerar a venda de ativos e de serviços <strong>do</strong> setor público. Veja-se, por exemplo,o conteú<strong>do</strong> das Leis Trole, especialmente a Trole 2: Lei para a TransformaçãoEconômica e Lei para a Promoção <strong>do</strong> Investimento e da Participação Cidadã.Nestes anos, como resulta<strong>do</strong> da política macro-<strong>econômica</strong> a<strong>do</strong>tada,que estimulava a inversão financeira, registrou-se um aumento <strong>do</strong> investimentoestrangeiro em termos líqüi<strong>do</strong>s (vide Tabela 19). Este, por sua vez, nutriu-sede capitais destina<strong>do</strong>s ao setor <strong>do</strong> petróleo – o campo mais atraente para ascompanhias internacionais. De qualquer forma, as vantagens oferecidas aosinvesti<strong>do</strong>res estrangeiros não provocaram o espera<strong>do</strong> ingresso de capitais paraatividades produtivas, talvez devi<strong>do</strong> à própria instabilidade criada pelo ajusteeconômico tortuoso e a administração pouco transparente da coisa pública,fatores limitativos das expectativas de estabilidade e confiança no Equa<strong>do</strong>r.Contrastava com o recebimento limita<strong>do</strong> de capitais estrangeiros aevasão de capital por parte <strong>do</strong>s agentes econômicos equatorianos, estimadaem valores que se aproximavam ou mesmo superavam o montante total<strong>do</strong> endividamento externo. Valeria mencionar que somente no ano de1999 a fuga de capitais superior os 2.000 milhões de dólares: fuga decapitais estimulada pela crise, a instabilidade política, a insegurança cidadã,a corrupção e o sistema legal imprevisível.Portanto, o sal<strong>do</strong> dessa abertura foi o aumento das dificuldades para fazerfuncionar adequadamente a política monetária, e o aumento da volatilidade <strong>do</strong>setor externo, em especial devi<strong>do</strong> ao fluxo de capitais especulativos e a evasão dapoupança interna, assim como a crescente dependência <strong>do</strong> endividamento externo.As privatizações e a “modernização” <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>Este é um assunto sujeito a controvérsia, pelos “progressos”supostamente limita<strong>do</strong>s, o que alimenta os argumentos <strong>do</strong>s que afirmamque no Equa<strong>do</strong>r não teria havi<strong>do</strong> efetivamente um ajuste econômico.201livro.pmd 20126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTANão obstante, para viabilizar uma maior influência das forças <strong>do</strong>merca<strong>do</strong> sobre a gestão estatal, como recomenda a ideologia pre<strong>do</strong>minante,a estrutura estatal equatoriana foi minimizada de forma sistemática. Bastaver a redução relativa da presença <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> na economia, através <strong>do</strong>consumo <strong>do</strong> setor público dentro <strong>do</strong> consumo global ou a participação<strong>do</strong>s investimentos públicos na formação bruta de capital fixo.A diminuição <strong>do</strong> número de funcionários públicos foi paulatina,apesar da campanha encetada durante o governo de Sixto Durán Ballén.Isto se deve também ao fato de que o número <strong>do</strong>s burocratas passíveis dedemissão não é tão grande como afirma a propaganda anti-estatal e antisindical.Além disso, é interessante notar que, segun<strong>do</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> BancoMundial (Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial, Washington, 1997), emtermos <strong>do</strong> montante das despesas públicas como proporção <strong>do</strong> PIB, otamanho <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> equatoriano não era maior <strong>do</strong> que o <strong>do</strong>s paísesvizinhos: Colômbia 11,9%; Equa<strong>do</strong>r 12,4%; Peru 15,8%; Chile 16,2%;Venezuela 16,3%; Bolívia 18,7%; Panamá 25,45%; Costa Rica 26%;Uruguai 29,2%.Movi<strong>do</strong> pelo empenho em reduzir o tamanho <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, econtinuan<strong>do</strong> o que tinham feito os governos precedentes, o governo deJamil Mahuad Witt decidiu extinguir uma dúzia de entidades <strong>do</strong> setorpúblico, além de privatizar outras, muitas delas não deficitárias, como erao caso da Empresa Nacional de Correios.Para<strong>do</strong>xalmente, segun<strong>do</strong> informações <strong>do</strong> Ministério das Finanças,em seu conjunto as empresas <strong>do</strong> setor público não representavam umônus fiscal, pois de forma permanente apresentavam um superávitoperativo, que em alguns anos chegou a ultrapassar 3% <strong>do</strong> PIB. Superávitque não pode ocultar suas limitações, ineficiência e, naturalmente, suasistemática descapitalização, pois esse excedente era devora<strong>do</strong> pelademanda fiscal. Cabe mencionar aqui a facilidade petrolífera atribuída àcompanhia estatal CEPE, que, como aconteceu muitas vezes com quasetodas as empresas públicas, teve administrações medíocres ou abertamente202livro.pmd 20226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORprejudiciais à sua gestão. Para justificar seu impulso privatiza<strong>do</strong>r, osgovernos como que programavam a deterioração dessas empresas.O resulta<strong>do</strong> desse desmantelamento foi piorar o funcionamento <strong>do</strong>governo. A eficiência <strong>do</strong>s serviços sociais, assim como o padrão dehonestidade são cada vez mais deploráveis, o que representou uma formasui generis de reduzir a presença <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> como fator de desenvolvimento:objetivo <strong>do</strong> ajuste neoliberal e <strong>do</strong>s interesses transnacionais.Segun<strong>do</strong> o índice de Morley, Macha<strong>do</strong> e Pettinato, desde 1984 oEqua<strong>do</strong>r esteve em situação inferior à média regional no campo dasprivatizações. Em 1995, seu índice era de 0,663, e a média <strong>do</strong>s 17 paíseslatino-americanos figurava com 0,782. Na verdade, o Equa<strong>do</strong>r só superavaBolívia, Venezuela e Jamaica.Dentro da meto<strong>do</strong>logia utilizada, esse índice reflete uma relaçãodas empresas públicas com o PIB não agrícola, que nesses anos mostrouuma queda, de forma que a participação <strong>do</strong> setor público deveria teraumenta<strong>do</strong>, e não exibir um processo de re-estatização. Outro fator foi opeso da empresa estatal de petróleo, tal como aconteceu com a Pemex(petróleo) no México ou a Codelco (cobre) no Chile.Diferentemente <strong>do</strong>s outros países da região, no Equa<strong>do</strong>r nuncahouve muitas empresas públicas. No Chile, por exemplo, havia nos anos1970 mais de 500 dessas empresas; no México, na década de 1980, cercade 1.200; na Argentina, no princípio da década de 1990, mais de 600. Aoter início o processo de privatização, na Bolívia havia cerca de 660companhias estatais, e no Peru cerca de 400. No Equa<strong>do</strong>r, porém, aatividade empresarial <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> foi sempre pequena, mesmo incluin<strong>do</strong> asempresas pertencentes às Forças Armadas e aos municípios. Em mea<strong>do</strong>s<strong>do</strong>s anos 1990 estimava-se que o número total dessas empresas era 170,sen<strong>do</strong> mais da metade empresas mistas, muitas delas com a maioria decapital priva<strong>do</strong>.Isto se explica porque várias empresas <strong>do</strong> setor priva<strong>do</strong> sebeneficiaram <strong>do</strong> apoio governamental, ou por receber ajuda governamentalsob a forma de capitalização ou por não pagarem dívidas contraídas com203livro.pmd 20326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAentidades estatais ou com a previdência social, ou ainda por terem si<strong>do</strong>assumidas simplesmente pelo Esta<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> praticamente falidas em mãosprivadas, como aconteceu com o Banco La Previsora (resgata<strong>do</strong> pelogoverno em 1977; reprivatiza<strong>do</strong> em 1986; sujeito a nova intervenção em1999, quan<strong>do</strong> se fundiu com o Filanbanco) ou com a Equatoriana deAviação, agora reprivatizada – aliás, um bom exemplo de como não sedeveria privatizar.Por outro la<strong>do</strong>, cabe observar que a venda das companhiastelefônicas (Andinatel e Pacifictel, originárias <strong>do</strong> EMETEL, que antes sechamava IETEL) fracassou em duas oportunidades, devi<strong>do</strong> à concepção<strong>do</strong>gmática a<strong>do</strong>tada para o processo de privatização, bem como pelavoracidade de certos grupos econômicos que, marginaliza<strong>do</strong>s <strong>do</strong>procedimento, decidiram torpedeá-lo.É preciso mencionar também outros problemas surgi<strong>do</strong>s por efeito<strong>do</strong> fanatismo privatiza<strong>do</strong>r. Por exemplo: o Esta<strong>do</strong> não assumiu aconstrução das usinas hidrelétricas planejadas e autorizadas pelo próprioPresidente Sixto Durán Ballén para enfrentar os contínuos e custososracionamentos de energia elétrica, experimenta<strong>do</strong>s anualmente de 1992até 1997. Obras que também não foram executadas pelo setor priva<strong>do</strong>,que, contrarian<strong>do</strong> o discurso liberaliza<strong>do</strong>r, se beneficia com subsídiosgovernamentais para manter várias usinas de geração térmica, algo inauditoem um país de enorme potencial hidrelétrico.Por outro la<strong>do</strong>, no setor <strong>do</strong> petróleo, onde está centraliza<strong>do</strong> ointeresse privatiza<strong>do</strong>r, o capital priva<strong>do</strong> esteve presente, desde alguns anos,em quase todas as fases da sua expansão, benefician<strong>do</strong>-se muitas vezes decontratos preferenciais, como acontece no setor da geração hidrelétrica.E sempre com uma forma de gerenciamento que provocou uma série dedenúncias de corrupção.A mistura de óleo cru pesa<strong>do</strong> das trans-nacionais com o óleo cruleve da Petroequa<strong>do</strong>r ocasiona perdas para o Esta<strong>do</strong> de 3,5 a 4 dólarespor barril no merca<strong>do</strong>. Essa mistura reduz a capacidade de transporte <strong>do</strong>oleoduto em cerca de 25%, e diminui o rendimento da refinaria de204livro.pmd 20426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOREsmeraldas em gasolina e diesel, sub-produtos que precisam serimporta<strong>do</strong>s. Diesel que, aliás, é consumi<strong>do</strong> pelas usinas térmicas privadassubsidiadas pelo Esta<strong>do</strong>.Como exemplo, vale lembrar igualmente a situação da EMELEC,empresa que desde 1965 gozou um subsídio <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, que lhe garante umlucro mínimo de 9,5% sobre os seus ativos fixos, pagável em dólar.Tratamento análogo é concedi<strong>do</strong> à ELECTROWER ou ELECTROQUIL,que, com mecanismos diferentes, recebem também uma garantia derentabilidade. No caso das empresas de telefonia, não há perspectiva de quese procure a<strong>do</strong>tar um esquema competitivo. Ao mesmo tempo, consolidamseas práticas oligopolísticas, como por exemplo a elevação das tarifas datelefonia celular como reação à proibição <strong>do</strong> “arre<strong>do</strong>ndamento”.Neste contexto, especialmente depois de imposta a <strong>do</strong>larizaçãooficial da economia, procura-se criar um quadro legal de abrangência ampla,as chamadas Leis Trole, para acelerar o processo de privatização comnovas e maiores vantagens concedidas ao capital externo.Essas privatizações marcam a esperança de conseguir recursos parao serviço da dívida externa, como aconteceu nos outros países da região.A reforma tributáriaA reforma tributária começou com um esforço quase permanentepara superar os desequilíbrios fiscais provoca<strong>do</strong>s pela pressão <strong>do</strong> serviçoda dívida externa. Fato que no entanto não tem si<strong>do</strong> reconheci<strong>do</strong> comocausa primordial <strong>do</strong> desajuste fiscal. Pelo contrário, os problemas fiscaissão atribuí<strong>do</strong>s ao tamanho excessivo <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e da despesa pública,provoca<strong>do</strong> pela burocracia, os sindicatos, os contratos coletivos de trabalho,etc. E a procura <strong>do</strong> equilíbrio nas contas públicas se centralizou quaseexclusivamente na eliminação de subsídios, assim como no aumento detributos, em particular o IVA.O ponto de partida foi a eliminação <strong>do</strong>s controles de preços, duranteo governo de Osval<strong>do</strong> Hurta<strong>do</strong> Larrea (1981-4), que deu os primeiros205livro.pmd 20526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTApassos para a liberação de vários produtos de consumo popular, e eliminoucertos subsídios. Foi nesse perío<strong>do</strong> que começou o processo de elevação<strong>do</strong>s preços e das tarifas <strong>do</strong>s bens e serviços públicos, caracteriza<strong>do</strong> porfases de gradualismo e outras de choque, assim por congelamentosforça<strong>do</strong>s devi<strong>do</strong> à resistência popular, provocan<strong>do</strong> retrocessos em termos<strong>do</strong>s valores reais.Devi<strong>do</strong> a essas pressões fiscais, especialmente a partir <strong>do</strong> governode Durán Ballén os preços e tarifas de vários bens e serviços públicossuperaram os níveis existentes no exterior. A gasolina, por exemplo, chegoua custar muito mais <strong>do</strong> que nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, com a introdução de umesquema automático de ajustes mensais, em função da desvalorização,justifica<strong>do</strong> exclusivamente pela necessidade fiscal. Isto explica a evoluçãocaótica havida, resulta<strong>do</strong> de um gerenciamento irracional em termoseconômicos, sociais e mesmo energéticos.Um <strong>do</strong>s poucos ítens de ampla demanda popular ainda subsidia<strong>do</strong>é o transporte público, porque em termos práticos foi suspenso o subsídioda eletricidade para os lares de classe média. A situação <strong>do</strong> gás <strong>do</strong>méstico(GLP) mostra igualmente uma evolução complexa, com altas econgelamentos, por tratar-se de um produto de grande significa<strong>do</strong> político.Nesta matéria veio à superfície o <strong>do</strong>gmatismo <strong>do</strong>s governantesempenha<strong>do</strong>s em eliminar totalmente os subsídios, sem achar soluçõescriativas para racionalizar o desperdício parcial <strong>do</strong>s subsídios existentes,que beneficiam indevidamente setores acomoda<strong>do</strong>s da sociedade.Esta eliminação <strong>do</strong>s subsídios de cunho social contrasta com amanutenção de uma série de vantagens e subsídios concedi<strong>do</strong>s a muitasatividades empresariais.Em termos de reforma tributária, é preciso lembrar a contribuição<strong>do</strong> governo de Rodrigo Borja Cevallos, que realizou uma transformaçãosignificativa com o objetivo de modernizar o sistema impositivo. Noentanto, essa reforma foi desvirtuada por uma série de exceçõesintroduzidas pelos mesmos grupos de poder, que provocaram umaverdadeira contra-reforma tributária.206livro.pmd 20626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORAlém <strong>do</strong>s muitos remen<strong>do</strong>s introduzi<strong>do</strong>s nesse perío<strong>do</strong>, um errocrucial foi a criação <strong>do</strong> imposto de 1% sobre a circulação de capitais e aeliminação <strong>do</strong> imposto de renda, originada em uma proposta feita durantea campanha eleitoral <strong>do</strong> Parti<strong>do</strong> Social Cristão. Essa medida exacerbou acrise e o mal-estar de amplos setores da sociedade, assim como <strong>do</strong> FMI, eterminou revertida depois <strong>do</strong>s protestos públicos de março <strong>do</strong> mesmoano, quan<strong>do</strong> o Congresso reintroduziu o imposto de renda, mas manteveo imposto sobre a circulação de capitais, com a incidência de 0,8%.Episódio semelhante aconteceu com a elevação <strong>do</strong> IVA de 12% para 14%,em 2001, que precisou ser revista por ter si<strong>do</strong> feita de formainconstitucional.O índice elabora<strong>do</strong> com da<strong>do</strong>s de Morley, Macha<strong>do</strong> e Pettinatomostra que a despeito das limitações e contradições havidas na reformatributária, durante esse perío<strong>do</strong> o Equa<strong>do</strong>r se manteve pouco abaixo damédia da América Latina, com 0,551 (na região o índice foi de 0,573; noChile, 0,663; Colômbia, 0,520; Bolívia, 0,678).Não obstante, são importantes as áreas onde se deveria realizar umareforma tributária integral:1) Em termos de carga tributária o Equa<strong>do</strong>r ocupa uma situaçãointermediária na região: o Chile tinha uma carga de 19,4%, semconsiderar a contribuição para a seguridade social; a Argentina17,4%; Bolívia 16,6%; Costa Rica 16%; Brasil 12,9%; Peru 12,7%;Equa<strong>do</strong>r 12,7%; México 11,9%; Venezuela 11,5%; Colômbia 10,8%;Guatemala 9,6%; Paraguai 9,3%. Os da<strong>do</strong>s para a maioria <strong>do</strong>s paísessão de 1998, salvo para a Argentina (1997), Costa Rica (1996), Brasil(1994), México (1997), Colômbia (1997) e Paraguai (1993) (VideVega e Mancero 2001).2) A qualidade das receitas é precária. O grosso <strong>do</strong> financiamentoprovém <strong>do</strong> petróleo e <strong>do</strong> endividamento externo, embora em boaparte este último represente um jogo contábil, pois uma proporçãoimportante da dívida serviu apenas para financiar dívidas vencidas207livro.pmd 20726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAou para garantir o pagamento <strong>do</strong>s próximos vencimentos: abre-seum buraco para preencher outro.3) Os impostos representam só 40% <strong>do</strong> total. O que preocupa éque o peso <strong>do</strong>s impostos indiretos, regressivos (como o IVA) subiuaceleradamente em comparação com os tributos diretos, de caráterprogressivo (como o imposto de renda). Dentro da proposta liberal,pretende-se aumentar a carga tributária através <strong>do</strong>s impostosindiretos.4) Apesar <strong>do</strong>s esforços <strong>do</strong> Serviço de Rendas Internas (SRI), asmargens de evasão tributária e aduaneira ainda são grandes.5) Do la<strong>do</strong> das receitas, a situação também é preocupante, tantopela ineficiência da gestão social como pelas iniqüidades implicadas:os 20% mais ricos da população concentram 26% <strong>do</strong> investimentoem educação (os 40% em melhor situação recebem 53%), enquantoos 20% mais pobres recebem só cerca de 11%. No campo da saúdea relação é de 37% para 8% (os 40% em melhor situação recebem61%; só no abono solidário há uma distribuição relativamente maisequitativa, de 6% a 28%, e os 40% em melhor situação recebem20%).6) Igualmente desequilibra<strong>do</strong> é o montante das prédestinaçõesorçamentárias, rigidez que tirou a flexibilidadeda administração fiscal, particularmente pelo serviço eleva<strong>do</strong>da dívida pública.7) Finalmente, não se pode esquecer o gerenciamento muitas vezesclientelístico e populista da política social “focalizada”.Estes seriam alguns <strong>do</strong>s assuntos a resolver em uma reformafiscal profunda, que não buscasse simplesmente o equilíbrio fiscal paragarantir o ajuste das contas públicas e a manutenção <strong>do</strong> serviço dadívida externa. Seria preciso uma reforma que incorporasse critériosde equidade, de produção e ambientais, o que não se pode esperar dalógica neo-liberal.208livro.pmd 20826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORReformas na política cambial e monetáriaNo terreno da política cambial a complexidade é maior. Depois detentar vários esquemas, a partir de um sistema de câmbio fixo e comapropriação de divisas, no princípio da década de 1980, foram a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong>ssucessivamente uma série de sistemas distintos. Em agosto de 1986 e emfevereiro de 1999 houve tentativas de liberalização cambial, chegan<strong>do</strong>-seem janeiro de 2002 a um fracasso total da administração da moeda e <strong>do</strong>câmbio, com a <strong>do</strong>larização oficial da economia.Esse processo complexo incluiu desvalorizações, minidesvalorizaçõesprogramadas, âncora cambial, banda cambial com leilãode divisas, flutuação controlada e, em duas oportunidades, livre flutuação,assim como a eliminação <strong>do</strong> sucre como moeda nacional. Nesses anos deajuste neo-liberal só faltou o elabora<strong>do</strong> programa monetário deconvertibilidade de Bucaram, que em suas conseqüências teria si<strong>do</strong>semelhante à <strong>do</strong>larização.Pelos efeitos perversos que teve, vale a pena rever o significa<strong>do</strong> daadministração cambial entre 1992 e 1999. A âncora cambial, como eixoda estabilização <strong>do</strong>s preços, foi sustentada com taxas de juros elevadas evoláteis, de forma que a estrutura resultante de preços relativos favoreceuos negócios financeiros, em prejuízo das atividades propriamenteprodutivas. Essas taxas de juros elevadas no merca<strong>do</strong> interno, e o tipo decâmbio relativamente estável (e controla<strong>do</strong>) convidaram a uma nova ondade endividamento externo agressivo por parte <strong>do</strong>s agentes econômicospriva<strong>do</strong>s. Tendência facilitada pela abertura da conta de capitais e estimuladapelo fluxo de capitais internacionais que se dirigiam para a América Latina.Os créditos externos foram utiliza<strong>do</strong>s pelo sistema bancário priva<strong>do</strong>para expandir suas aplicações internas, favorecen<strong>do</strong> assim uma crescente<strong>do</strong>larização espontânea da economia (apoiada em uma série de reformaslegais que permitiam a livre utilização da moeda norte-americana), queem conseqüência tornou o sucre mais vulnerável diante de qualquer“corrida” de capitais. Dolarização espontânea acelerada pela crise, quan<strong>do</strong>209livro.pmd 20926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAparte significativa <strong>do</strong>s depósitos bancários e <strong>do</strong>s ativos financeiros seconverteram em dólar, haven<strong>do</strong> também a <strong>do</strong>larização <strong>do</strong>s preços de muitosbens e serviços, sobretu<strong>do</strong> nos segmentos <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> com mais acessopor parte <strong>do</strong>s setores acomoda<strong>do</strong>s da população (vide a Tabela 20).Se a abertura da conta de capitais e a <strong>do</strong>larização espontânea daeconomia limitaram o campo de aplicação da política monetária, por outrola<strong>do</strong> o peso eleva<strong>do</strong> <strong>do</strong> serviço da dívida tornou a política fiscal menosflexível. A despesa pública deixou de ser um instrumento dinâmico, situaçãoagravada, além de tu<strong>do</strong>, pelas pré-destinações orçamentárias,transforman<strong>do</strong>-se em variável endógena. Essa despesa passou a dependerem forma inversa da dívida, e diretamente da atividade <strong>econômica</strong>,enquanto o serviço da dívida estava liga<strong>do</strong> a variações <strong>do</strong> câmbio real,assim como, naturalmente, a flutuações das taxas de juros no merca<strong>do</strong>financeiro internacional. Assim, qualquer alteração externa afetava o setorpúblico, que perdeu o seu potencial contra-cíclico.Desta forma, nos últimos anos, caracteriza<strong>do</strong>s por uma economiarecessiva, a administração fiscal foi pró-cíclica, o que levou a uma redução realdas despesas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> em investimentos sociais e obras públicas, pois o crescentegasto fiscal era motiva<strong>do</strong> em especial pelo aumento sustenta<strong>do</strong> <strong>do</strong> serviço dadívida pública, externa e interna. Neste cenário, incapazes de fazer uma reformafiscal profunda e de frear a evasão tributária, os governos de Durán Ballén,Bucaram Ortiz, Alarcón Rivera e Jamil Mahuad Witt recorreram cada vez maisà contração da dívida interna, que é outro <strong>do</strong>s graves problemas a resolver.Com a <strong>do</strong>larização oficial da economia torna-se cada vez maisurgente recuperar a capacidade de gestão fiscal, das receitas e despesas <strong>do</strong>setor público, pois este é um <strong>do</strong>s poucos instrumentos disponíveis paraorientar a economia.O serviço da dívida externaAo longo de to<strong>do</strong> este perío<strong>do</strong> o Equa<strong>do</strong>r fez esforços intensospara manter um relacionamento harmonioso com o sistema financeiro210livro.pmd 21026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORinternacional. Vale lembrar que os programas de estabilização e ajusteestavam orienta<strong>do</strong>s para garantir o serviço da dívida. Juntamente comesse objetivo explícito havia o deseja<strong>do</strong> reordenamento da economia, noquadro <strong>do</strong> Consenso de Washington.Em sete oportunidades o Equa<strong>do</strong>r renegociou sua dívida com oClube de Paris, e o sétimo round de renegociação foi uma conseqüênciada <strong>do</strong>larização. A renegociação com os bancos comerciais foi repetidaem outras ocasiões, viven<strong>do</strong>-se um longo perío<strong>do</strong> de moratória, desdejaneiro de 1987 até se conseguir, em 1994, um arranjo <strong>do</strong> tipo Brady.No entanto, como dissemos acima, a partir de agosto de 1999, diante daclara incapacidade de fazer esses pagamentos, o país se viu obriga<strong>do</strong> adeclarar a moratória <strong>do</strong>s bônus Brady e <strong>do</strong>s Eurobônus, com acumplicidade <strong>do</strong> FMI e <strong>do</strong> Departamento <strong>do</strong> Tesouro <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>sUni<strong>do</strong>s. O país saiu dessa situação com uma nova fórmula de acor<strong>do</strong>,através <strong>do</strong> qual garantia uma ampla gama de benefícios aos porta<strong>do</strong>res<strong>do</strong>s novos Bônus Global.Há um da<strong>do</strong> curioso: nos anos mais críticos, entre 1997 e 1999, osorganismos internacionais, como o FMI, nunca deixaram de pressionarpara que o Equa<strong>do</strong>r aplicasse a receita <strong>do</strong> Consenso de Washington, oque fizeram repetidamente, mas sem concretizar a ajuda prometida, queteria servi<strong>do</strong> pelo menos para aliviar a situação.O objetivo da renegociação de 2000, reconheci<strong>do</strong> expressamentepelo governo, era “encaminhar o Equa<strong>do</strong>r para a abertura <strong>do</strong> acesso aosmerca<strong>do</strong>s internacionais (manten<strong>do</strong> em dia o pagamento das obrigaçõesinternacionais).” Necessidade urgente para o esquema <strong>do</strong>lariza<strong>do</strong>.Incidentalmente procurava-se aliviar a situação fiscal, pelo menos no curtoprazo, melhoran<strong>do</strong> de forma temporária a sustentabilidade da dívida. Alémdisso, como mais um <strong>do</strong>s sub-produtos dessa decisão, havia a possibilidadede financiar investimentos sociais utilizan<strong>do</strong> recursos libera<strong>do</strong>s pelo menorserviço da dívida, e desvian<strong>do</strong>-os para o campo social.Certos da<strong>do</strong>s permitem compreender melhor a magnitude da sangriacausada pelo serviço da dívida externa. Como observamos no capítulo211livro.pmd 21126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAanterior, entre 1982 e 2000 o Equa<strong>do</strong>r procedeu a uma transferência netanegativa de 10.229,4 milhões de dólares.A administração dessa dívida também não esteve isenta <strong>do</strong>favoritismo estatal. Vale lembrar, mais uma vez, a “sucretização” da dívidaexterna privada, promovida pelos governos de Hurta<strong>do</strong> Larrea e FebresCordero. A “compra de contas especiais em divisas”, ou seja, a utilização<strong>do</strong> merca<strong>do</strong> secundário para a conversão da dívida em recursos foi outroinstrumento para fortalecer o sistema financeiro e alguns gruposeconômicos vincula<strong>do</strong>s ao governo de Febres Cordero (1986-8), assimcomo para financiar um pequeno número de projetos sociais e ecológicosno regime de Borja Cevallos. (1986-92), em valores muito abaixo <strong>do</strong>sautoriza<strong>do</strong>s para o setor priva<strong>do</strong>, e sem uma estratégia social definida.A influência <strong>do</strong>s organismos internacionais no processo derenegociação da dívida e de estruturação <strong>do</strong> ajuste foi determinante paramanter a direção deste, a despeito da instabilidade reinante. Por isso em2000, uma vez mais, a aposta oficial foi no senti<strong>do</strong> de assinar um acor<strong>do</strong>com o Fun<strong>do</strong> Monetário Internacional como ponto de referência parasustentar o esquema de abertura e liberalização, assim como para retomaras conversações com os cre<strong>do</strong>res internacionais.Em suma, a dívida é um <strong>do</strong>s pontos fundamentais <strong>do</strong> ajuste quefoi feito, e dela deriva toda uma série de problemas que afetaram opróprio ajuste, embora suas renegociações sucessivas tenham si<strong>do</strong> umaalavanca recorrente para forçar mais ainda esse ajuste, porque o queestava em jogo era não só o serviço da dívida como o reordenamentoda economia.O sal<strong>do</strong> <strong>do</strong> ajuste estrutural no Equa<strong>do</strong>rDo exposto até aqui pode-se concluir que o Equa<strong>do</strong>r experimentouum ajuste tortuoso mas real.Deve-se ter em mente que nunca se consegue aplicar totalmentequalquer modelo econômico. O que conta é a tendência, e esta, no caso212livro.pmd 21226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR<strong>do</strong> tortuoso ajuste equatoriano, é insofismável: o país tem caminha<strong>do</strong> eainda caminha pela estrada <strong>do</strong> ajuste neoliberal.A OIT formula essa realidade de maneira precisa: “Embora se notemdiferenças importantes no conteú<strong>do</strong>, na implementação e no calendáriodas reformas feitas em vários países [andinos], to<strong>do</strong>s compartilharam umamesma orientação, baseada na abertura <strong>econômica</strong>, no papel pre<strong>do</strong>minante<strong>do</strong> merca<strong>do</strong> na aplicação de recursos e nas exportações como motor <strong>do</strong>crescimento”. São esses os elementos que configuram, em grandes traços,o núcleo <strong>do</strong> modelo liberal. E os resulta<strong>do</strong>s, como vimos até aqui, sãovisíveis.Embora tivesse um “atraso” no processo de privatização, o Equa<strong>do</strong>rnão se atrasou no conjunto das reformas. Assim, enquanto em 1995 oíndice regional chegou a 0,821, o <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r era 0,801, enquanto outrospaíses da região apresentavam os seguintes resulta<strong>do</strong>s: Argentina 0,888;Bolívia 0,816; Brasil 0,805; Chile 0,843; Colômbia 0,792. Esses da<strong>do</strong>sdesmentem o argumento <strong>do</strong> “atraso” global <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r.Outro da<strong>do</strong> interessante é que em nenhum país e em nenhum setoro processo de ajuste tem si<strong>do</strong> uniforme através <strong>do</strong> tempo. Por outro la<strong>do</strong>,não deixamos de perceber que o “progresso” nessas reformas nãodemonstra o nível de bem-estar alcança<strong>do</strong> pela sociedade. Basta ver acrítica situação socio-<strong>econômica</strong> da Argentina, o país que mais perseguiua meta <strong>do</strong> ajuste neo-liberal, desde o fim <strong>do</strong> século XX.Inicia<strong>do</strong> com a crise da dívida, o ajuste se concentrou na estabilizaçãomacro-<strong>econômica</strong>, e foi adquirin<strong>do</strong> crescente profundidade ecomplexidade. Hoje fala-se em “reformas de primeira geração” (sobretu<strong>do</strong>a liberação <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> interno, a abertura externa da economia, asprivatizações e a flexibilização trabalhista), “de segunda geração” (políticassociais focalizadas) e “de terceira geração” (concessão de serviços públicos,autonomia <strong>do</strong> poder judiciário e descentralização).Assim, por exemplo, uma primeira onda de reformas liberaliza<strong>do</strong>rasfoi experimentada nos anos 1970 com as ditaduras implantadas nos países<strong>do</strong> Cone Sul, tendência que se difundiu pelo resto da região devi<strong>do</strong> à crise213livro.pmd 21326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAda divida externa em 1982-5. As reformas comerciais e financeirasestiveram entre os primeiros componentes <strong>do</strong> ajuste, ten<strong>do</strong> alcança<strong>do</strong> osseus níveis mais altos no princípio da década de 1990. Logo viriam asreformas no campo da abertura da conta de capitais, enquanto o processode privatização variou em cada caso.Deste mo<strong>do</strong>, pode-se apresentar assim alguns resulta<strong>do</strong>s econclusões <strong>do</strong> que foi o ajuste no Equa<strong>do</strong>r:1) Em suas tendências de longo prazo, o ajuste promove aconsolidação <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> no gerenciamento da economia, com amenor número possível de intervenções por parte <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Naprática a lógica internacional se impôs sobre a lógica nacional, e apolítica social foi transformada em um esforço complementar daadministração <strong>econômica</strong>. O que não quer dizer que tenha havi<strong>do</strong>antes no Equa<strong>do</strong>r uma administração <strong>econômica</strong> estatizante, umapolítica <strong>econômica</strong> de costas voltadas para o merca<strong>do</strong> mundial ouuma intervenção social de acor<strong>do</strong> com as demandas da sociedade.Nada disso. No entanto, o ajuste implantou em amplos setores dapopulação a ideologia neo-liberal, vista como conveniente ouinconveniente.2) O ajuste promoveu ainda mais a produção primária com basenas vantagens comparativas naturais, orientan<strong>do</strong>-a para o exterior,sem a preocupação de acrescentar-lhe valor. É a reprimarização,meta básica ou conseqüência automática <strong>do</strong> ajuste, que se fezacompanhar de uma deterioração da indústria - a desindustrialização– e <strong>do</strong>s setores volta<strong>do</strong>s para satisfazer a demanda interna, capazesde gerar empregos adequa<strong>do</strong>s, de pagar salários decentes e de reduzira pobreza de forma consistente. Por outro la<strong>do</strong>, essa reprimarizaçãotem provoca<strong>do</strong> danos ao meio ambiente, já que atribui prioridadeaos rendimentos de curto prazo, acima de qualquer consideraçãode longo prazo. Como exemplo pode-se citar a situação <strong>do</strong> camarão,afeta<strong>do</strong> pela destruição sistemática <strong>do</strong> seu habitat e pelo empregoindiscrimina<strong>do</strong> de produtos químicos nas plantações de banana, que214livro.pmd 21426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORprovocou uma série de efeitos nefastos, como a “síndrome de Taura”e a “mancha branca”.3) A estratégia orientada para a exportação primária acentuou astendências excludentes e concentra<strong>do</strong>ras. Apesar <strong>do</strong> aumento dasexportações, até 1997 não houve um impulso no crescimento, comoaconteceu em outras fases da <strong>história</strong> <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r.Isola<strong>do</strong> e sem o apoio <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, o setor priva<strong>do</strong> tem perdi<strong>do</strong> odinamismo de épocas anteriores. Atualmente o Esta<strong>do</strong> funciona aocontrário: antes servia para melhorar relativamente os níveis dedistribuição de renda, favorecen<strong>do</strong> as camadas de renda mais baixa,e em particular as camadas intermediárias; agora favorece os maisacomoda<strong>do</strong>s, em prejuízo <strong>do</strong>s outros grupos sociais. Aliás, é umasituação registrada em várias parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, onde encontramos ocrescimento econômico sem conteú<strong>do</strong> social: a economia e asexportações crescem mas o desemprego aumenta, como se o navioimagina<strong>do</strong> na década de 1970 por Germânico Salga<strong>do</strong> se tivesseparti<strong>do</strong>. Um segmento da sociedade, onde estão as velas, podeprogredir, enquanto o resto sofre uma exclusão quase estrutural.4) Durante to<strong>do</strong> este perío<strong>do</strong> houve uma concentração marcanteda renda e da riqueza, como opção buscada pela lógica <strong>do</strong> ajustepara poder financiar novas inversões, sobretu<strong>do</strong> após a bonançapetrolífera e ao cessar o fluxo maciço de créditos externos, a partirde 1982. Nesses anos de crise, os ganhos <strong>do</strong>s principais gruposeconômicos aumentaram, em vez de diminuir. Além disso, os padrõesde consumo <strong>do</strong>s setores mais acomoda<strong>do</strong>s e da classe média seorientam cada vez mais por valores trans-nacionais. Como inversãoda pobreza crescente, a concentração da riqueza nunca foi tão notória.E como se isso não bastasse, os grupos econômicos que controlam opoder político estão empenha<strong>do</strong>s em garantir para si maior riqueza,com a privatização das empresas e <strong>do</strong>s serviços <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.5) Um ponto especial merece atenção: a deterioração qualitativadas atividades e inversões sociais, sobretu<strong>do</strong> no setor da educação,215livro.pmd 21526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAdevi<strong>do</strong> também à menor disponibilidade fiscal. Situação que podeser explicada pela exigência crescente <strong>do</strong> serviço da dívida, que levouà diminuição da despesa social. Dentro <strong>do</strong> orçamento estatal elacaiu em quase 50% em 1980, e em 15% em 2000, enquanto nomesmo perío<strong>do</strong> o serviço da dívida aumentou de 18% para mais de50%. Cabe citar aqui a política especial focalizada na pobrezaextrema, de que um <strong>do</strong>s exemplos mais conheci<strong>do</strong>s no Equa<strong>do</strong>r é oabono solidário ou de pobreza. Assim, o ajuste afetou as condiçõese a qualidade de to<strong>do</strong>s os serviços públicos.6) A estabilização é um <strong>do</strong>s problemas cuja solução mais custouao Equa<strong>do</strong>r, embora tenha si<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s objetivos persegui<strong>do</strong>scom mais empenho nos últimos anos. Em 2000 o país sofreu ainflação mais elevada em toda a América Latina, com quase 97%(ponto mais alto, em outubro desse ano: 107,9%), exacerbadapela própria <strong>do</strong>larização: vale lembrar que em 1999 a inflaçãoanual foi de 52%. No entanto, essa inflação quase crônica nãodeve ser atribuída simplesmente à despesa pública avultada, da<strong>do</strong>o tamanho excessivo <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, ou às demandas <strong>do</strong>s sindicatosde servi<strong>do</strong>res públicos, como reza o discurso oficial. As quantiascada vez maiores exigidas pelo serviço da dívida concentravamo grosso das despesas fiscais, assim como os recursos que eramdestina<strong>do</strong>s repetidamente para a solução <strong>do</strong>s problemasenfrenta<strong>do</strong>s pelos importantes grupos monopolistas, como nocaso das intervenções bancárias. Assim, contrarian<strong>do</strong> ainterpretação orto<strong>do</strong>xa, no Equa<strong>do</strong>r a crise fiscal foi umaconseqüência da dívida pública, agravada pelo peso inflacionário<strong>do</strong>s subsídios maciços concedi<strong>do</strong>s ao setor priva<strong>do</strong>. De qualquermo<strong>do</strong>, é preciso reconhecer que, depois de internacionaliza<strong>do</strong>smuitos preços e tarifas (mas não os salários), a economia<strong>do</strong>larizada permitiria níveis mais baixos de inflação. O importanteera a eliminação da expectativa de desvalorização contínua, queexacerbava o aumento <strong>do</strong>s preços.216livro.pmd 21626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR7) Em to<strong>do</strong> esse perío<strong>do</strong> o crescimento da economia foi pequeno einstável. Com a exceção isolada de <strong>do</strong>is anos, a economia cresceuem ritmo inferior ou igual ao da expansão demográfica (2,3%), paracair estrepitosamente em 1999. A tão esperada reativação daeconomia prometida sempre nos sucessivos programas deestabilização e ajuste, foi uma quimera, pelo menos naqueles setoresprodutivos não vincula<strong>do</strong>s ao merca<strong>do</strong> externo. A quebra deempresas pequenas e médias foi uma constante em to<strong>do</strong> esseperío<strong>do</strong>, com variações mais ou menos importantes nos anosespecialmente críticos, como 1995 e 1998-2000. O fracasso <strong>do</strong> ajustepara conseguir melhorar as condições de vida fica evidente quan<strong>do</strong>se analisa a evolução da produção por habitante, indica<strong>do</strong>r que,embora não seja qualitativo, nos mostra que o objetivo <strong>do</strong>crescimento não foi alcança<strong>do</strong>: em termos de renda por habitante,o nível de 2000 é comparável ao de 1978.8) O caráter tortuoso <strong>do</strong> ajuste pode ser visto também comoresulta<strong>do</strong> e parte de uma estrutura institucional baseada nopaternalismo, o rentismo, a corrupção e a impunidade. Paternalismomanifesta<strong>do</strong> no apoio governamental sistemático para facilitar oajuste no caso <strong>do</strong>s grupos de poder econômico e político,controla<strong>do</strong>res e preda<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Rentismo explora<strong>do</strong>r da mãode obra, da natureza e da moeda nacional, o sucre. Corrupção eimpunidade refletidas em vários episódios de interferência naeconomia, com a conivência de quase to<strong>do</strong>s os governantes, desde1992...9) O ajuste tortuoso e a sua continuação <strong>do</strong>larizada têm outracaracterística em comum: o autoritarismo. O discurso <strong>do</strong> consensofoi exigi<strong>do</strong> como um argumento de propaganda e não como umaopção para construir uma ordem democrática. Os objetivos finais<strong>do</strong> ajuste não eram discuti<strong>do</strong>s, e seus resulta<strong>do</strong>s são o produto daassociação entre os funcionários das instituições financeirasinternacionais (que têm quase sempre a palavra decisiva), membros217livro.pmd 21726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAda equipe <strong>econômica</strong> <strong>do</strong> governo nacional e os representantes <strong>do</strong>sprincipais grupos econômicos (as câmaras da produção). Gestõesque, além de tu<strong>do</strong>, são promovidas muitas vezes sem qualquertransparência. Assim, em muitas ocasiões os instrumentos práticose os procedimentos aplica<strong>do</strong>s violentavam as leis, a começar pelaprópria Constituição, como aconteceu com a <strong>do</strong>larização oficial.Outra característica dessa administração inconstitucional e autoritáriafoi o pouco tempo reserva<strong>do</strong> para a discussão de textos legaisextensos e complexos. Desde o governo de Febres Cordero o abuso<strong>do</strong>s projetos de urgência <strong>econômica</strong> tem si<strong>do</strong> quase uma norma.10) Outro aspecto que se deveria incorporar à compreensão <strong>do</strong>ajuste é a reação <strong>do</strong>s diferentes grupos sociais, em particular devi<strong>do</strong>ao surgimento e consolidação de novos atores sociais e políticos,que viabilizam o que poderia ser um novo bloco histórico porta<strong>do</strong>rda resistência e gestor potencial de propostas alternativas. Alémdisso, diferentemente <strong>do</strong> que aconteceu em outros países da região,no Equa<strong>do</strong>r não se conseguiu fragmentar, alienar e <strong>do</strong>mesticar ascamadas populares, o movimento indígena, o movimento camponêse as reclamações regionais, como também não se alienou osindicalismo, embora ele se enfraquecesse no contexto <strong>do</strong> ajuste. Esão precisamente esses segmentos da população, “obstáculos aodesenvolvimento”, conforme a visão <strong>do</strong> grande capital e <strong>do</strong>paradigma liberal, que poderiam desenvolver propostas conducentesa um desenvolvimento sustenta<strong>do</strong> e sustentável, inclusivo e autodependente,solidário e democrático.218livro.pmd 21826/9/2005, 13:26


5O equa<strong>do</strong>r na armadilhada <strong>do</strong>larizaçãolivro.pmd 21926/9/2005, 13:26


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O equa<strong>do</strong>r na armadilha da <strong>do</strong>larizaçãoEm janeiro de 2000 o Equa<strong>do</strong>r surpreendeu o mun<strong>do</strong>. Com a<strong>do</strong>larização plena da sua economia foi o primeiro país da América Latinaa sacrificar oficialmente a moeda nacional, introduzin<strong>do</strong> uma moedaestrangeira com curso legal completo. Com essa decisão o Equa<strong>do</strong>r, cujaeconomia atravessava uma depressão sem termo de comparação na sua<strong>história</strong>, que levara à falência o seu sistema financeiro, e que se encontravaem situação de moratória da dívida externa, juntou-se ao grupo de 26colônias ou territórios que naquele momento utilizavam uma moedaestrangeira - 11 deles o dólar norte-americano.Até então o Panamá era o maior país, e o único latinoamericano,a assumir o dólar. O Panamá a<strong>do</strong>tou a <strong>do</strong>larização pouco depoisda sua separação da Colômbia, em 1903, forçada pelo governo deWashington, interessa<strong>do</strong> em assumir o controle <strong>do</strong> canal inter-oceânico.No princípio <strong>do</strong> terceiro milênio, um ano depois <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, <strong>do</strong>is paísescentro-americanos, El Salva<strong>do</strong>r e Guatemala, se encaminhavam para a<strong>do</strong>larização plena das suas economias.A decisão: os interesses e atribulações que a provocaramPara tomar essa decisão transcendental, o Presidente democratacristão Jamil Mahuad Witt, que poucos dias antes de anunciar a medida sepronunciara publicamente contra ela, esperou chegar à beira <strong>do</strong> abismopolítico para dar o que considerava, textualmente, “um salto no vazio”.No momento em que o seu governo se encontrava politicamentedesestabiliza<strong>do</strong>, sem qualquer preparação técnica, e contra a opinião demuitos profissionais dentro <strong>do</strong> próprio governo, ou próximos, Mahuadassumiu essa decisão, que poucos dias depois foi ratificada pelo seu Vice-221livro.pmd 22126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAPresidente, Gustavo Noboa Bejarano, quan<strong>do</strong> assumiu o poder, em 22 dejaneiro de 2000, em conseqüência da rebelião <strong>do</strong>s indígenas e militares.A decisão final não foi o resulta<strong>do</strong> de desígnios da razão, nem foi“imposta ao governo pelo povo equatoriano”, como conclusão <strong>do</strong> processode <strong>do</strong>larização espontânea. Não foi o anúncio de um novo modeloeconômico, à margem <strong>do</strong> neo-liberalismo e <strong>do</strong> próprio Fun<strong>do</strong> MonetárioInternacional. Menos ainda significa que o Equa<strong>do</strong>r <strong>do</strong>lariza<strong>do</strong> “já temum pé no primeiro mun<strong>do</strong>”, como afirmaram alguns <strong>do</strong>s seus promotores.A decisão de <strong>do</strong>larizar a economia respondeu à dinâmica <strong>do</strong>sinteresses políticos hegemônicos e à lógica <strong>do</strong> capital internacional, emvinculação estreita com grande parte <strong>do</strong>s grupos <strong>do</strong>minantes <strong>do</strong> país. Foimais o resulta<strong>do</strong> de decisões e angústias políticas <strong>do</strong> que a conseqüênciade reflexões técnicas. Para falar francamente, foi o resulta<strong>do</strong> damediocridade da elite governante.Para entender a <strong>do</strong>larização não basta situar-nos no campo daeconomia. É preciso ver essa decisão como um instrumento de usomúltiplo, explicável por várias razões internas, às quais precisamosacrescentar os interesses norte-americanos e, com certeza, a estratégia<strong>do</strong>s organismos multilaterais. A <strong>do</strong>larização não pode ser analisada novazio da política <strong>econômica</strong>. O seu entendimento precisa incorporarreflexões próprias da economia política. Como se sabe, não há decisão<strong>econômica</strong> que seja tomada em um contexto despi<strong>do</strong> de interesses, e quebeneficie a to<strong>do</strong>s igualmente.Com o dólar foi substituída a moeda nacional, o sucre, que perdeusuas três funções essenciais: reserva de valor, unidade de conta e meio depagamento. Para complementar o dólar nas transações comerciais de poucamonta, e para “enganar” a Constituição, tal como acontece com o balboano Panamá, foram cunhadas moedas sem nome, equiparadas às moedasde dólar. E em conseqüência <strong>do</strong> desaparecimento da moeda nacional,sacrificou-se a política monetária e cambial.Com a <strong>do</strong>larização se pretende chegar a uma etapa superior <strong>do</strong>modelo neo-liberal, inspira<strong>do</strong> no Consenso de Washington. Ela não muda222livro.pmd 22226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORo rumo, mas acelera o ritmo, e pretende ser uma âncora para garantir acontinuidade <strong>do</strong> processo neo-liberal independentemente de quem governeo país: é o sonho tecnocrático de despolitizar a economia. Para issogolpeou-se a institucionalidade democrática, com a violação daConstituição (artigos 261 e 264), como o fizeram as leis dela derivadas,conhecidas como “Leis Trole”.Sem deixar de reconhecer a gravidade da crise <strong>econômica</strong>equatoriana, a conclusão a que se pode chegar é que a <strong>do</strong>larização foi umamedida extrema mas não necessariamente convincente.E não era a única opção para combater uma inflação como aexistente. Em janeiro de 2000 não havia hiper-inflação ou as condiçõessócio-<strong>econômica</strong>s para que ela se concretizasse. E existiam outros caminhospara conter o caos reinante: basta mencionar os programas hetero<strong>do</strong>xosaplica<strong>do</strong>s em Israel e no México na década de 1980; o programa deestabilização boliviano, aceito da perspectiva neo-liberal; o Plano Realbrasileiro, que permitiu reduzir a inflação sem recair na armadilha daconvertibilidade, como aconteceu na Argentina. Com tais antecedentes, epropostas como a concebida pelo presente autor para o caso equatoriano,juntamente com Jürgen Schuldt, semanas antes da <strong>do</strong>larização, ficadesmentida a suposta inexistência de outras opções (vide o livro La Horade la Reactivación: El Mito de la Falta de Alternativas, Guayaquil, ESPOL,novembro de 1999).Em suma, a renúncia à política monetária e cambial refletida nosegun<strong>do</strong> assassinato <strong>do</strong> sucre, a moeda nacional, é resulta<strong>do</strong> da incapacidadeda elite. Não é uma vitória, mas uma grande derrota. A economiaequatoriana foi <strong>do</strong>larizada pela incapacidade <strong>do</strong>s grupos <strong>do</strong>minantes deconceber e aplicar políticas <strong>econômica</strong>s relativamente autônomas, assimcomo pelo seu desespero para completar inteiramente o processo de neoliberalização.Tinha razão o economista brasileiro Paulo Nogueira Batista Jr., noseu artigo intitula<strong>do</strong> “Suicídio monetário <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r”, quan<strong>do</strong> afirmouque “no Equa<strong>do</strong>r, um governo de quinta categoria acaba de anunciar a223livro.pmd 22326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAintenção de cometer suicídio monetário e <strong>do</strong>larizar a economia <strong>do</strong> país.Incapaz de enfrentar uma crise <strong>econômica</strong> séria, e ameaça<strong>do</strong> de destituição,o presidente equatoriano, Jamil Mahuad, que visivelmente não temcapacidade nem mesmo para ser síndico de um edifício ou presidente deuma associação de bairro, entrou em desespero e optou por humilhar oseu país, desistin<strong>do</strong> de um <strong>do</strong>s elementos centrais da soberania.” (Folha deS. Paulo, o jornal de maior circulação no Brasil, 13-1-2000).Os riscos da <strong>do</strong>larizaçãoPara assegurar um tipo de câmbio fixo e a livre movimentação decapitais, dentro das limitações derivadas <strong>do</strong> que em teoria <strong>econômica</strong> seconhece como “trilema macro-econômico”, algumas economias têmsacrifica<strong>do</strong> sua política monetária: é o caso <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r.Segun<strong>do</strong> esse “trilema”, especialmente nas economias abertas e pequenascomo a equatoriana, só podem coexistir duas das três variáveis seguintes:1) livre movimentação <strong>do</strong>s capitais;2) tipo de câmbio fixo;3) política monetária independente.A resolução desse problema exige uma das seguintes combinações:· 1 + 2 , com sacrifício da política monetária. Ex: padrão ouro (1870-1932) e globalização (?);· 2 + 3: sacrifício da livre mobilidade <strong>do</strong>s capitais. Ex: sistema deBretton Woods.· 1 + 3: sacrifício <strong>do</strong> controle cambial. Ex: regimes com tipo decâmbio livre (1971- ...).Cada uma dessas hipóteses, ajustadas às necessidades <strong>do</strong>s centros<strong>do</strong>minantes, tem seus riscos e potencialidades. A rigidez cambial a<strong>do</strong>tada224livro.pmd 22426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORpelo Equa<strong>do</strong>r, enquanto em sua maioria as economias de to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>(sobretu<strong>do</strong> a <strong>do</strong>s seus principais parceiros comerciais) usam esquemascambiais mais ou menos flexíveis, levanta dificuldades adicionais, queresumimos adiante.Estabilidade macro-<strong>econômica</strong> fictíciaA <strong>do</strong>larização não garante o equilíbrio macro-econômico, porquemesmo quan<strong>do</strong> se consegue estabilizar os preços, com a rigidez <strong>do</strong> câmbio,essa estabilidade não é real. Um bom exemplo é a Argentina na mudança<strong>do</strong> século: prisioneira da convertibilidade (uma quase <strong>do</strong>larização), tinhazero de inflação e uma recessão profunda.Precisamos distinguir aqui entre estabilidade de preços e estabilidade real.Esta última significa uma evolução da economia real sem grandesflutuações, e para isso uma administração flexível <strong>do</strong> câmbio é melhor <strong>do</strong>que o câmbio fixo, sobretu<strong>do</strong> se este é muito rígi<strong>do</strong>: sua expressão máximaé justamente a <strong>do</strong>larização.Com a <strong>do</strong>larização, um ingresso significativo de capitais tende aaumentar internamente o crédito e a demanda, promoven<strong>do</strong> a atividade<strong>econômica</strong> e incrementan<strong>do</strong> os passivos externos. Por outro la<strong>do</strong>, diantede um déficit em conta corrente ou uma evasão de capitais, a defesa da<strong>do</strong>larização implica a elevação da taxa de juros, e portanto a conseqüenteredução da atividade <strong>econômica</strong>, para conter a saída de capitais e contrairas importações. A estabilidade macro-<strong>econômica</strong> real, sem um tipo decâmbio tão rígi<strong>do</strong>, é naturalmente o que se deveria buscar no caso daestrutura produtiva equatoriana, que depende (e conforme os planosoficiais dependerá ainda mais) de uma exportação petrolífera flutuante.Seguin<strong>do</strong> a teoria seqüencial <strong>do</strong> pensamento neo-liberal, uma vezassegurada a estabilidade de preços poder-se-ia esperar a reativação daatividade <strong>econômica</strong>, e só então, bem mais adiante (quan<strong>do</strong>?) viria adistribuição <strong>do</strong>s frutos <strong>do</strong> progresso. No entanto, sabemos que da teoriaà realidade a distância é muito grande. Mais ainda: com esses esquemas225livro.pmd 22526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAmonetários rígi<strong>do</strong>s, e sobretu<strong>do</strong> com uma política neo-liberal, aprofundasea tendência concentra<strong>do</strong>ra e excludente. Basta ver o que acontece noPanamá, onde a diferença entre ricos e pobres é enorme; hiato que naArgentina cresceu vertiginosamente com a convertibilidade.A eliminação da especulação cambial também não é suficiente parafazer com que desapareça a especulação financeira. É certo que deixariade haver pressão especulativa sobre o câmbio, mas é um equívoco esperarque a especulação em geral fosse erradicada, pois ela não é um produtoexclusivo da administração <strong>econômica</strong> equatoriana, e não ocorre apenasem função <strong>do</strong> vai-vem cambial repeti<strong>do</strong>. Os especula<strong>do</strong>res se nutrem nomerca<strong>do</strong> financeiro internacional, e no Equa<strong>do</strong>r, como vemos diariamente,ela se reproduz sob a forma de caricatura.Por outro la<strong>do</strong>, com a <strong>do</strong>larização o risco das corridas bancáriastambém não vai desaparecer.A perda de competitividadeMesmo levan<strong>do</strong> em conta o potencial estabiliza<strong>do</strong>r da <strong>do</strong>larização,para reduzir a inflação e aumentar a previsibilidade das decisões de investire consumir, não se pode ignorar os muitos custos sociais que ela traz, e osgraves riscos implica<strong>do</strong>s para a estrutura produtiva, devi<strong>do</strong> à sua rigidez.Para garantir a estabilidade o país porá em perigo os objetivos daprodução e <strong>do</strong> pleno emprego. Sobretu<strong>do</strong> no caso de impactos externos,os ajustes serão ainda mais duros; situação que poderia repetir-se com osdesastres naturais, como os fenômenos “El Niño”. Suas repercussões nãoserão por via inflacionária, pois as mudanças de preços serão mínimas,mas em termos de montantes totais: salários, emprego, produção.Também não se poderá garantir o equilíbrio fiscal meramente coma renúncia da emissão de moeda. O financiamento <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, que já nãocontará com seu empresta<strong>do</strong>r de última instância, o Banco Central,precisará garantir-se com maiores tributos e tarifas crescentes <strong>do</strong>s serviçospúblicos, aumentos que além de tu<strong>do</strong> são necessários para viabilizar as226livro.pmd 22626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORprivatizações. Do la<strong>do</strong> da despesa pública aumentarão as pressões paraeliminar os subsídios, e para redistribuir as verbas em função <strong>do</strong> peso quetêm os diversos grupos beneficia<strong>do</strong>s. Nesse contexto, o orçamento públicoconsolidará sua posição como o campo de confrontação por excelência,com o que as pressões políticas poderão refletir-se sob a forma deinstabilidade fiscal.Uma fonte para o aumento imediato <strong>do</strong>s ingressos fiscais serão asprivatizações. Como é fácil de compreender os ingressos que elas produzamnão serão permanentes, pois não será uma surpresa se o país em poucotempo volte a sofrer um processo acelera<strong>do</strong> e contínuo de endividamentoexterno. A Argentina é um exemplo digno de considerar. Ali, depois deuma primeira redução da dívida externa, esta cresceu de forma sustentada,multiplican<strong>do</strong>-se pelo menos por 3.Se alguém acredita que em uma situação de crise se pode recorrercontinuamente a empréstimos <strong>do</strong>s bancos internacionais, precisa saberque os presta<strong>do</strong>res potenciais dão valor à capacidade de pagamento <strong>do</strong>sclientes, ou seja, à garantia <strong>do</strong> serviço da dívida, que pouco ou nada tem aver com o esquema cambial.Se o serviço da dívida subir em um futuro previsível, o país poderáoptar novamente pela forma tradicional de postergar o problema, medianterefinanciamentos sucessivos. De imediato, há a expectativa de diminuir oônus desses pagamentos com os recursos deriva<strong>do</strong>s das privatizações ecom parte da futura exploração petrolífera, para a recompra <strong>do</strong>s papéis dadívida, como aconteceu na Argentina quan<strong>do</strong> foi instituída aconvertibilidade.Um complemento urgente dessa operação financeira destinada aconstruir uma base para a <strong>do</strong>larização é a construção <strong>do</strong> Oleoduto deCrus Pesa<strong>do</strong>s (OCP), para transportar uma maior quantidade de petróleo.Dessa forma o Equa<strong>do</strong>r, desespera<strong>do</strong> para ampliar a oferta de dólares,caminhará no senti<strong>do</strong> de uma petro-<strong>do</strong>larização com o perigoso aumento<strong>do</strong>s riscos ambientais, assim como das tensões políticas. Com efeito, quempuder controlar diretamente a riqueza petrolífera terá um poder de fato227livro.pmd 22726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAsobre o Esta<strong>do</strong>, que na prática se transformará em totalitário, ainda quemantenha formalmente a aparência democrática. Transformação queparece indispensável para sustentar o neo-liberalismo e suas seqüelas.O mais importante contu<strong>do</strong>, de uma perspectiva <strong>econômica</strong>, é que asexportações perderão qualquer apoio conjuntural através da variação cambial,que leva a um processo de apreciação relativa da avaliação internacional <strong>do</strong>sseus bens e serviços. Um país cujos preços são muito altos, em comparaçãocom outro país, pode ajustar essa relação modifican<strong>do</strong> o valor da sua moeda,o que sem dúvida será menos complexo e traumático <strong>do</strong> que efetuar milharesde mudanças nos preços <strong>do</strong>s produtos, um por um.Em 1999 o Ministro da Economia Jorge Gallar<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> aindanão participava <strong>do</strong> governo <strong>do</strong>lariza<strong>do</strong>r de Gustavo Noboa, pouco antes<strong>do</strong> aban<strong>do</strong>no da moeda nacional previu o que aconteceria como umadecisão desse tipo: ela “transformaria a economia <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r em umaeconomia de alto risco, já que estaria exposta a choques externos aosquais não poderia reagir de forma independente. Além disso, seriaintroduzida uma tendência anti-exportação similar à que prevaleceu naera da substituição de importações, afetan<strong>do</strong> o dinamismo <strong>do</strong> setorexporta<strong>do</strong>r priva<strong>do</strong>.”Para uma economia como a equatoriana, pequena e produtora debens primários, dependente em larga escala das exportações de petróleo, avigência de um câmbio muito rígi<strong>do</strong> passa a ser um assunto que exige to<strong>do</strong>cuida<strong>do</strong>. Assim, por exemplo, o país poderia sofrer repercussões traumáticascom a queda <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> petróleo. E mais: uma simples desvalorizaçãona Colômbia, para dar um exemplo, tornaria ainda mais baratos os produtosdesse país, com o consequente encarecimento relativo <strong>do</strong>s produtos <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r. Isto é: uma vantagem para os consumi<strong>do</strong>res equatorianos comcapacidade de compra, grave deterioração da competitividade da estruturaprodutiva nacional. O que, por sua vez, provocaria pressões recessivas.A produção nacional perderá compra<strong>do</strong>res no exterior, e a produçãode outros países deslocará produtos equatorianos <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>s externose até mesmo <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> nacional.228livro.pmd 22826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORIsto antecipa um déficit comercial preocupante na economia<strong>do</strong>larizada, caracterizada por déficit crônico <strong>do</strong> balanço de serviços,provoca<strong>do</strong> particularmente pela sangria da dívida externa, cujo serviçocrescerá ainda mais devi<strong>do</strong> à insustentabilidade <strong>do</strong> acor<strong>do</strong> negocia<strong>do</strong> em2000. O que deixaria o país com uma conta corrente deficitária, a serfinanciada pelos emigrantes, e com dívida externa maior.Um impacto exógeno provocaria pressões sobre os preços e salários,forçan<strong>do</strong> a sua baixa. A inexistência de suficiente flexibilidade financeiraou trabalhista teria como resulta<strong>do</strong> mais desemprego, menor utilização dacapacidade instalada e até mesmo a falência de algumas empresas. Assim,os exporta<strong>do</strong>res se verão obriga<strong>do</strong>s a melhorar a competitividade das suasempresas forçan<strong>do</strong> a qualquer custo a renda da natureza, despedin<strong>do</strong>emprega<strong>do</strong>s ou reduzin<strong>do</strong> salários. Neste particular, a flexibilidade <strong>do</strong>trabalho faria parte das funções da política cambial.Portanto, o petróleo aparece como a fonte de divisas necessária paraminorar as tensões criadas na conta <strong>do</strong> comércio exterior (fora <strong>do</strong> petróleo)por um déficit comercial quase crônico. Outras fontes de divisas são asremessas <strong>do</strong>s emigrantes equatorianos, com renda superior aos recursosofereci<strong>do</strong>s pelos organismos multilaterais de crédito, além <strong>do</strong>s narco-dólares,dadas as mesmas facilidades trazidas pelo aban<strong>do</strong>no da moeda nacional.É indiscutível a importância que têm as remessas <strong>do</strong>s emigrantes.Em 2000 elas chegaram a 1.330 milhões de dólares, ou seja, 20% <strong>do</strong>consumo nacional. Valor superior à soma das exportações de banana,café, cacau e camarão naquele ano. Essas remessas representaram 9,74%<strong>do</strong> PIB daquele ano, enquanto as vendas de banana corresponderam a6,02%. Em 1990 essa comparação era amplamente favorável à banana,cuja exportação representava 6,24% <strong>do</strong> PIB, enquanto as remessas <strong>do</strong>semigrantes só chegavam a 0,95%. Pelo menos no futuro imediato, acontribuição dessas remessas será uma fonte fundamental de dólares, comomostra a tendência <strong>do</strong>s últimos anos (Vide Tabela 21).De qualquer forma, de pouco serve melhorar o balanço depagamentos, determina<strong>do</strong> automaticamente pela oferta de dólares, se a229livro.pmd 22926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAeconomia interna se deteriora. Uma melhoria <strong>do</strong> balanço de comércionão se refletiria necessariamente na recuperação efetiva da estruturaprodutiva <strong>do</strong> país. Por que? Se aumentar a produção e subirem os preços<strong>do</strong> petróleo, por exemplo, haverá maior disponibilidade de divisas,estimulan<strong>do</strong> a propensão a importar sem contribuir para a melhoria dasituação da estrutura de produção, que, pelo contrário poderia serprejudicada por essas importações.Um aumento maciço da oferta de dólares provocará umaexpansão <strong>do</strong> consumo principalmente das classes alta e média;situação provocada pelo mesmo fluxo de dólares resultante decréditos para financiar aquisições. O maior endividamento externopriva<strong>do</strong> sustentará o consumismo e a demanda de artigos importa<strong>do</strong>spelas elites, enquanto a parte substantiva da estrutura produtivaperderá força.Aqui é preciso levar em conta a difusão <strong>do</strong>s padrões de consumotransnacionais em amplos setores da população, mesmo entre os que nãodispõem de recursos para satisfazê-los. Um problema complexo, na medidaem que as elites <strong>do</strong>minantes perseguem, equivocadamente, esquemas deconsumo comparáveis aos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> industrializa<strong>do</strong>, impossíveis de a<strong>do</strong>tarem larga escala no mun<strong>do</strong> empobreci<strong>do</strong>, por razões ecológicas, sociais eculturais.A utilidade potencial da <strong>do</strong>larização reside na baixa das taxas dejuros, por não haver risco de desvalorização da moeda. O que se espera éque essa baixa fomente os investimentos, em um contexto de maiorprevisibilidade. Não obstante, as taxas de juros não atingirão facilmenteos níveis internacionais, porque ao se <strong>do</strong>larizar o Equa<strong>do</strong>r não afastouto<strong>do</strong>s os ricos existentes no país. Em certas circunstâncias taxas maisaltas poderiam ser necessárias para atrair os capitais estrangeirosindispensáveis para o funcionamento <strong>do</strong> esquema da <strong>do</strong>larização.As taxas de juros mais baixas e estáveis devem gerar mais confiança,o que vai tender a aproximar os preços, tendencialmente, das condiçõesinternacionais, mas não o rendimento <strong>do</strong>s assalaria<strong>do</strong>s.230livro.pmd 23026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORRelações internacionais assimétricasEmbora o Equa<strong>do</strong>r tenha dependi<strong>do</strong> <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> mundial, e emparticular <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> norte-americano, com a <strong>do</strong>larização se inclinaráainda mais para a economia <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. Ficará cada vez maispreso aos ciclos econômicos norte-americanos, com menor possibilidadede a<strong>do</strong>tar as necessárias políticas contra-cíclicas. É uma situaçãopreocupante, pois a economia equatoriana difere da norte-americanaespecialmente em <strong>do</strong>is aspectos: sua especialização e sua produtividade.Além disso, com esta incorporação ao universo monetário <strong>do</strong>sEsta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, o Equa<strong>do</strong>r reduziu unilateralmente a possibilidade denegociar termos de integração mais adequa<strong>do</strong>s (se esta fosse uma opção aseguir), pois de fato já aban<strong>do</strong>nou, sem obter nada em troca, uma parteimportante da soberania <strong>econômica</strong>: a política monetária e cambial.Outro efeito colateral nocivo é o distanciamento real <strong>do</strong>s outrospaíses andinos e latino-americanos. A aceitação unilateral e submissa <strong>do</strong>dólar será um duro golpe à integração, dentro da qual a a<strong>do</strong>ção de umaunidade monetária comum deveria processar-se de forma simétrica eharmônica.A maior heterogeneidade estruturalFinalmente, como resulta<strong>do</strong> de todas essas mudanças, aumentará atendência para aprofundar a heterogeneidade da estrutura de produção,pois a melhoria da produtividade de determina<strong>do</strong>s segmentos econômicos,na sua maioria considera<strong>do</strong>s “modernos”, aumentará com a importaçãointensiva de equipamento poupa<strong>do</strong>r de mão de obra e com a incorporaçãode novas tecnologias, em detrimento <strong>do</strong>s setores tradicionais, caracteriza<strong>do</strong>spela oferta de empregos precários, de baixa qualificação e salários reduzi<strong>do</strong>s.Com efeito, aumentarão assim as diferenças de produtividade entre ossegmentos moderno e tradicional, aprofundan<strong>do</strong> as raízes <strong>do</strong> subdesenvolvimento.231livro.pmd 23126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAEmbora possa ser desejável superar os atuais sistemas tradicionaisde produção, a verdade é que não se alcança competitividade de um diapara outro, por maior que seja a estabilidade de preços. Ela é o resulta<strong>do</strong>de longo processo compartilha<strong>do</strong> de gestão empresarial, capacitação <strong>do</strong>strabalha<strong>do</strong>res, construção da infra-estrutura básica, consolidação <strong>do</strong>merca<strong>do</strong> interno, desenvolvimento tecnológico, reforma educacional,transferência de recursos <strong>do</strong> setor moderno para o tradicional; de umaação intensa <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, de crescente eqüidade produtiva e cultural.Mais <strong>do</strong> que a simples redução <strong>do</strong> custo <strong>do</strong> dinheiro, para reativar a produçãoé preciso contar com uma série de fatores básicos, que incidam sobre as expectativas<strong>do</strong>s investi<strong>do</strong>res: segurança jurídica, qualificação da mão de obra, infra-estrutura eserviços produtivos, tranqüilidade social, estabilidade política, diminuição daviolência e da delinqüência, políticas agrícolas e industriais adequadas, esquemasde geração de emprego, assim como um esquema macro-econômico que favoreçaa produção. E é preciso que haja também um merca<strong>do</strong> interno com capacidadede expansão, que justifique novos e maiores investimentos, o que, por sua vez,implica melhoria substantiva em termos de eqüidade social.Portanto, a introdução <strong>do</strong> dólar na economia não vai garantir, emtermos macro, melhores condições de crescimento, de poupança, de inversãoe também de fundamentos sóli<strong>do</strong>s para a economia. A <strong>do</strong>larização foi umadecisão artificial e autoritária que reduzirá ainda mais a limitada capacidadede manobra <strong>do</strong> país. Coisa distinta teria si<strong>do</strong> a<strong>do</strong>tar um esquema cambialrígi<strong>do</strong>, já que as moedas <strong>do</strong>s principais parceiros comerciais <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>rtinham uma situação desse tipo; coisa completamente diferente foi <strong>do</strong>larizarem um mun<strong>do</strong> em que essas moedas flutuam, umas com relação as outras.A título de prólogo à <strong>história</strong> futuraO ponto de partidaNão se pode concluir este breve resumo da <strong>história</strong> <strong>econômica</strong> <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r sem assinalar que seria um erro acreditar que o processo de232livro.pmd 23226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORajuste estrutural foi inútil, e suas conseqüências foram indesejadas. Comotambém não se pode presumir que as décadas de 1980 e 1990 foram“décadas perdidas”, o que seria uma simplificação excessiva da realidade.Por outro la<strong>do</strong>, não podemos igualmente encerrar esta apresentação semapontar alguns desafios futuros.Nestes anos de dificuldades crescentes para a maioria da população,os grupos poderosos conseguiram aumentar sua riqueza e, certamente,sua participação na renda nacional, alcançan<strong>do</strong> ao mesmo tempo maiorpoder político. Seus interesses se diversificaram, abrangen<strong>do</strong> várias regiões<strong>do</strong> país, to<strong>do</strong>s os setores da economia nacional e mesmo fora dela. Suaimbricação com o capital externo é cada vez maior, e há indícios de umacerta modernização.A reprimarização e a desindustrialização da estrutura produtivanacional não podem ser entendidas como um fracasso da política aplicada.Muito pelo contrário, a economia equatoriana caminhou para a abertura ea liberalização, embora possivelmente não na medida esperada pelosdefensores <strong>do</strong> neo-liberalismo. Da mesma forma como a riqueza seconcentrou, foram atingi<strong>do</strong>s objetivos econômicos básicos desse modelode reprimarização modernizada.Importantes setores de nível médio, que passaram por uma importanterevitalização nos anos da bonança, sofreram no meio da crise um processoacelera<strong>do</strong> de empobrecimento - em termos relativos talvez muito maisagu<strong>do</strong> <strong>do</strong> que as camadas populares. No entanto, embora onera<strong>do</strong>s comum peso relativamente maior <strong>do</strong> ajuste, esses mesmos setores (e tambémsetores populares) mantêm padrões consumistas e respostas individualistas,assim como sucede com alguns setores populares urbanos.Embora possa parecer uma consideração cínica, no final das contastiveram sucesso com o ajuste econômico as condições <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> mundial,as exigências <strong>do</strong> capital internacional e a lógica <strong>do</strong>s representantes <strong>do</strong>capital financeiro <strong>do</strong>méstico, sem levar em conta o alto custo social eeconômico implica<strong>do</strong>. E são eles que hoje aspiram a aprofundar e enraizarsuas conseqüências, através da <strong>do</strong>larização. XXX233livro.pmd 23326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAPrincipais expectativas da produçãoO que interessa é identificar as novas funções atribuídas ao Equa<strong>do</strong>rpelo capital financeiro internacional, por meio da abertura e da liberalização.A revolução tecnológica em curso configura uma nova divisão internacional<strong>do</strong> trabalho, conhecida vulgarmente como “globalização”. Nela poderiacaber ao Equa<strong>do</strong>r o papel de:· exporta<strong>do</strong>r de produtos primários, função tradicional <strong>do</strong> país quecontinua sen<strong>do</strong> importante para to<strong>do</strong>s os países periféricos;· sub-contratista para a elaboração de certos bens de consumo, compouco conteú<strong>do</strong> tecnológico, destina<strong>do</strong>s ao merca<strong>do</strong> local e, emmenor medida, ao internacional;· fabricante de peças e componentes <strong>do</strong> produto ou processo deprodução, para as indústrias trans-nacionais; peças que são montadasno quadro <strong>do</strong>s conheci<strong>do</strong>s “cachos tecnológicos”, controla<strong>do</strong>s porempresas transnacionais. A maior “contribuição local” seria feitaem termos de força de trabalho barata e flexível, além de matériasprimas;· plataforma de exportação, sustentada comumente em operaçõesde “maquila”.Neste processo, cabe ao Equa<strong>do</strong>r, como resulta<strong>do</strong> “natural” da suamarcha no senti<strong>do</strong> de uma economia “livre”, o retorno a uma economiabaseada na exportação de produtos primários, e “maquila<strong>do</strong>ra”. Naturalmente,deveríamos acrescentar um lugar importante para o turismo, desde que asatividades exporta<strong>do</strong>ras não afetem de forma importante o ambiente natural,como acontece com as plantações de flores, os tanques de criação de camarões,a exploração <strong>do</strong> petróleo, a derrubada das florestas ... Além disso, pode serque as “forças <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>” reservem ao Equa<strong>do</strong>r outras funções: receptorde indústrias intensamente polui<strong>do</strong>ras, lixeira de material contaminante, pontode lavagem de narco-dólares e talvez mesmo produtor de coca e seus deriva<strong>do</strong>s.234livro.pmd 23426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOREmbora tenham diminuí<strong>do</strong> as formas de exploração baseadas nasrelações de produção não capitalistas, elas não desapareceram. Vale lembrarque durante o perío<strong>do</strong> de ajuste surgiram novas formas de economiasolidária ou <strong>do</strong> trabalho, premidas pelas mesmas pressões centrífugas ouexcludentes <strong>do</strong> modelo econômico, e sobreviveram práticas ancestraisbaseadas na economia comunitária.Diante dessas expectativas, a pergunta que se faz é se será possívelresolver os graves problemas existentes simplesmente racionalizan<strong>do</strong> o atualesquema de ajuste e firman<strong>do</strong>-o com propostas consensuais. A resposta énegativa, como o demonstram as experiências nacionais e internacionais.Elementos para a construção de uma <strong>história</strong> diferenteÉ uma infelicidade, mas hoje em dia to<strong>do</strong>s parecem convenci<strong>do</strong>s deque há uma única opção para participar no merca<strong>do</strong> mundial: a neo-liberal.Opção que dá frutos quan<strong>do</strong> se resolve a equação da “governabilidade”,entendida como um esquema político que facilite a consolidação <strong>do</strong> novoregime social de acumulação sustenta<strong>do</strong> com uma orientação pre<strong>do</strong>minantepara o merca<strong>do</strong> mundial e com menor participação de propostas deinspiração nacional.Como mostra a experiência das últimas décadas, esta visão neoliberalexige uma concentração crescente da riqueza, com vistas a promovera poupança para financiar novas inversões e oferecer novas vantagens egarantias ao capital externo. Para isso se exige uma maior flexibilização <strong>do</strong>trabalho e um menor peso da organização sindical e social. É uma realidadeque provoca o fortalecimento <strong>do</strong> grande empresaria<strong>do</strong> priva<strong>do</strong> (nacionale trans-nacional), em detrimento da pequena e média empresa, assim como<strong>do</strong>s espaços empresariais comunitários. Tu<strong>do</strong> isso leva ao aumento <strong>do</strong>poder concentra<strong>do</strong> em mãos de poucas pessoas, viável sobre bases decrescente autoritarismo e debilitação da democracia.Assim, o desafio consiste em criar um mo<strong>do</strong> social diferente deacumulação e produção. Um esquema que permita ao Equa<strong>do</strong>r participar235livro.pmd 23526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAda economia mundial de forma ativa e inteligente, com o desenvolvimentodas suas capacidades internas, entre as quais está o merca<strong>do</strong> nacional e oenorme potencial representa<strong>do</strong> pela sua diversidade cultural.É preciso um esforço que não tenha como meta final o aumentodas exportações, mas a satisfação das necessidades da maioria <strong>do</strong> povoequatoriano.Portanto, essas transformações devem estar orientadas para:1) Explorar o potencial sub-utiliza<strong>do</strong> <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> e os recursosinternos. O que implica uma transformação da produção que tendaa equilibrar as diferenças estruturais com base em uma transferênciade excedentes <strong>do</strong>s setores modernos para os tradicionais, de mo<strong>do</strong>a homogeneizar tendencialmente a economia, imprimin<strong>do</strong>-lhe maiordinamismo interno. Da mesma forma, a população teria quemodificar seus padrões de consumo, hoje muito influencia<strong>do</strong>s pelospadrões aceitos no exterior.2) Redistribuir renda e ativos, reorientar e descentralizar o capital,reforçan<strong>do</strong> a pequena e média propriedade, o que exige reformasagrária e urbana para reverter de forma positiva a concentraçãoexcessiva da propriedade.3) Estimular a poupança interna (pública e privada), assim como aexterna (mas sem confiar exclusivamente nela), procuran<strong>do</strong> instituirfinanciamento para os programas fundamentais de desenvolvimento,mais <strong>do</strong> que para o serviço da dívida externa, a repatriação de lucrose o pagamento de regalias. Isto implica reorientar os fluxos deinversão para utilizar plenamente os recursos produtivos,convencionais ou não, e para criar uma articulação dinâmica entreos setores produtivos (agrícolas e industriais), incorporan<strong>do</strong> ossegmentos rural e urbano tradicionais para reforçar o efeitomultiplica<strong>do</strong>r e acelera<strong>do</strong>r <strong>do</strong> investimento.4) Propor uma política de reordenamento espacial, que integreprogramas de habitação e geração de emprego, transporte e236livro.pmd 23626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORfornecimento de energia, sistemas de comunicação e relocação deempresas em diversas regiões <strong>do</strong> país, e não prioritariamente nos<strong>do</strong>is grandes pólos de concentração produtiva existentes, com baseem Quito e Guayaquil. Neste esforço será preciso re-estruturar eusar racionalmente as fontes de energia, particularmente asrenováveis. Urge uma política ativa de preços da energia, que nãoseja concebida exclusivamente com critérios fiscalistas.5) Fortalecer o sistema educacional e potencializar a capacidadecientífica para poder a<strong>do</strong>tar uma composição adequada detecnologias, aumenta<strong>do</strong> a produtividade <strong>do</strong>s fatores de produçãoem harmonia com a natureza.6) Conter o poder <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, e em especial <strong>do</strong>s grandes gruposeconômicos priva<strong>do</strong>s (que controlam o Esta<strong>do</strong>), estimulan<strong>do</strong> maiscompetição dentro <strong>do</strong>s setores produtivos, com uma participaçãoativa e informada da “sociedade civil”, sobretu<strong>do</strong> através demecanismos adequa<strong>do</strong>s de controle e a criação de poderescompensatórios. Neste ponto as organizações de consumi<strong>do</strong>res eas cooperativas de pequenos e médios produtores desempenhamum papel importante.7) Desestimular a emigração <strong>do</strong> campo e das aldeias para as grandescidades e o exterior (especialmente <strong>do</strong>s jovens), privilegian<strong>do</strong> odesenvolvimento das cidades pequenas e médias, e dan<strong>do</strong> soluçõesconcretas aos problemas rurais, que não se limitam aos temaspropriamente agrários. Caberia aqui priorizar a elaboração deprodutos primários in situ, antes <strong>do</strong> seu transporte. E também a<strong>do</strong>tarpolíticas que estimulem o retorno e os investimentos produtivospor parte <strong>do</strong>s emigrantes.8) Propor com empenho crescente uma revisão integral da questão<strong>do</strong> meio ambiente, para garantir o suprimento adequa<strong>do</strong> de recursose materiais, e também enfrentar o tema <strong>do</strong>s resíduos de mo<strong>do</strong> nãocontaminante, dentro de uma análise inter-geracional e que não deixede levar em conta a existência de outras espécies além <strong>do</strong> homem.237livro.pmd 23726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTATu<strong>do</strong> isso em um ambiente de internacionalização cada vez maiordas externalidades ambientais, que deve levar a uma política ativa<strong>do</strong> país no contexto mundial.9) Rever a situação <strong>do</strong> endividamento externo (e interno), querepresenta um peso insustentável para as finanças públicas. Istoimplica a elaboração de uma estratégia ativa e criativa, destinada asuspender ou pelo menos reduzir drasticamente o serviço da dívida,e que, além de tu<strong>do</strong>, inclua propostas para a administração e contrataçãode novos créditos externos. Como complemento <strong>do</strong> tratamento dadívida (financeira) externa, cabe incorporar as exigências da “dívidaecológica”, da qual os países subdesenvolvi<strong>do</strong>s são cre<strong>do</strong>res. Eseguramente será preciso apoiar as pretensões de um tratamento justoe transparente, que conduza a um sistema internacional de arbitragemno quadro de um código financeiro internacional.10) Superar a corrupção generalizada e suas complexas seqüelas. Aabordagem simplesmente moral e jurídica <strong>do</strong> problema não ésuficiente. É preciso descobrir e caracterizar, em toda a sociedade,as práticas corruptas que dependem de mecanismos que lhesgarantam não só a necessária funcionalidade como o ocultamento,e a temida impunidade. É preciso reforçar a idéia de que, à medidaque se fortaleça a transparência e a participação da cidadania, ampliaseo espaço de combate à corrupção.A busca de um novo regime social de acumulação é essencial paraenfrentar os problemas que afetam a maioria <strong>do</strong>s equatorianos, o que levaa conceber uma estratégia de participação no merca<strong>do</strong> mundial como parte<strong>do</strong> processo nacional e local de desenvolvimento. É uma abordagem queexige a incorporação de considerações <strong>econômica</strong>s, como também sociaise culturais. Deve ser uma programação que oriente e proponha uma sériede critérios para o curto, o médio e o longo prazos.Para isso, essa estratégia precisará ser suficientemente flexível, deforma a poder enfrentar as turbulências <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> mundial, as238livro.pmd 23826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORtransformações derivadas da nova revolução tecnológica, a complexidadecrescente <strong>do</strong>s fenômenos geopolíticos mundiais, assim como oscomplica<strong>do</strong>s desafios internos. Para isso cabe aproveitar toda a capacidadedisponível, e desenvolver vantagens comparativas dinâmicas; especialmentese se leva em conta o conjunto de limitações e dificuldades derivadas deuma “globalização” que exclui de forma sistemática a maior parte dapopulação mundial, com um crescente antagonismo entre os interesses<strong>do</strong> Sul e os <strong>do</strong> Norte: antagonismo reproduzi<strong>do</strong> mesmo dentro <strong>do</strong>s paísesem desenvolvimento. Isso ocorre em um ambiente onde afloram asintromissões imperiais e transnacionais, de mo<strong>do</strong> aberto ou disfarça<strong>do</strong>.A reformulação <strong>do</strong> processo de integração sub-regional e mesmoregional em andamento é cada vez mais premente, para que se possa ampliaro campo de ação <strong>do</strong>s aparelhos produtivos a partir de profundas reformasinternas que potencializem os merca<strong>do</strong>s internos e permitam uma atuaçãomais inteligente no concerto internacional.Já é hora de pensar na possibilidade de suprimir pacificamente asmoedas nacionais, e de a<strong>do</strong>tar uma abordagem real das políticas<strong>econômica</strong>s, como acontece na Europa, como parte de uma estratégiabaseada na cessão voluntária de parte das soberanias nacionais, em trocada construção de uma soberania mais ampla e eficaz — a andina oulatino-americana. Neste senti<strong>do</strong> o Equa<strong>do</strong>r deveria promover ades<strong>do</strong>larização ordenada da sua economia.É preciso viabilizar a instituição e a vigência de esquemas deacumulação e reprodução que se sustentem com uma maior participaçãoda cidadania, e que excluam os regimes autoritários e repressivos, superan<strong>do</strong>os <strong>do</strong>gmas e as contradições neo-liberais. Para isso será preciso progredirnas transformações <strong>econômica</strong>s, sociais e políticas que cada sociedaderequer.O importante é ressaltar a viabilidade (uma vez que a sua necessidadeé mais <strong>do</strong> que óbvia) de uma alternativa específica para as atuais políticas<strong>econômica</strong>s orto<strong>do</strong>xas, procuran<strong>do</strong> ao mesmo tempo uma participaçãoativa e criativa nos ricos e complexos processos de transformação universal.239livro.pmd 23926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAUm <strong>do</strong>s problemas mais críticos <strong>do</strong>s últimos anos é a perda crescentede soberania, em termos de política <strong>econômica</strong>. Situação explicável pelainternacionalização <strong>do</strong>s fluxos e das decisões <strong>econômica</strong>s, que se complicouainda mais com a aplicação <strong>do</strong>s esquemas de ajuste neo-liberal, inspira<strong>do</strong>sno Consenso de Washington: situação que alcançou sua expressão máximana <strong>do</strong>larização oficial.Isto obriga a repensar o instrumento da política <strong>econômica</strong>, e arecuperar espaços de soberania para o seu funcionamento, com o objetivode ampliar a faixa de definição, decisão e gestão.As mudanças necessárias para promover o desenvolvimento nãosurgirão com a simples introdução <strong>do</strong> dólar em lugar da moeda nacional,e também não exclusivamente por um processo de des<strong>do</strong>larização semtraumas (que aliás é possível e indispensável). O desafio consiste emconceber uma proposta de política <strong>econômica</strong> diferente a partir da própriaarmadilha <strong>do</strong> dólar, da qual não é possível escapar simplesmente pelaqualidade de uma proposta alternativa, mas sim com a pressão política deuma sociedade consciente das limitações impostas pela <strong>do</strong>larização e oneo-liberalismo.A luta por mais eqüidade, liberdade e democraciaNeste ponto surge a eqüidade como um <strong>do</strong>s desafios fundamentais.Não se deve esperar mais que a “magia” <strong>do</strong> progresso provoque algoimpossível: a redistribuição automática <strong>do</strong>s seus frutos. A eqüidade deveresultar de um processo que reduza as diferenças existentes, de formadinâmica e solidária. Não só se propicia a redistribuição pela redistribuiçãomas se deve transformar a eqüidade em um sustentáculo <strong>do</strong> aparelhoprodutor e em um revitaliza<strong>do</strong>r cultural da sociedade.Se não há um espaço para o desenvolvimento com eqüidade, tambémnão o haverá para o desenvolvimento democrático. E por isso será impossívelavançar sem ela na busca permanente da liberdade social; e sem esta, tambémnão haverá lugar para a eqüidade – é preciso reconhecer francamente.240livro.pmd 24026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORAs reformas básicas institucionais e estruturais devem estarorientadas especialmente para melhorar a distribuição da renda e <strong>do</strong>s ativos,sem perder de vista o financiamento, para assim potencializar ainda maisa formação <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>s internos. Esta é uma tarefa que leva a merca<strong>do</strong>smais competitivos, eficientes e transparentes, enquanto incorpora umamassa crescente de consumi<strong>do</strong>res e contribui para uma melhor distribuição<strong>do</strong>s lucros, até agora excessivos.Com uma participação crescente da sociedade civil, o Esta<strong>do</strong>reforma<strong>do</strong> será um <strong>do</strong>s responsáveis pela busca da distribuição mais amplapossível <strong>do</strong> patrimônio, e pela consolidação quantitativa e qualitativa <strong>do</strong>sserviços sociais: educação, saúde, seguridade social e habitação -incorporan<strong>do</strong> critérios de eqüidade <strong>econômica</strong>, social, cultural, ecológicae, naturalmente, geográfica. Como é natural, nesses serviços básicos nãopodem ser introduzidas exclusivamente a lógica <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>, nemdesarma<strong>do</strong>s os critérios de solidariedade.Com a reforma <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> seriam criadas condições para reformara sociedade. No entanto, não é o Esta<strong>do</strong> que determina o papel dasociedade e <strong>do</strong>s seus órgãos, mas são estes que devem definir o papel <strong>do</strong>Esta<strong>do</strong>. As soluções não devem vir de cima ou de fora. Todas essastransformações devem ser processadas com enfoques de gênero, étnicose culturais, pois urgem propostas que respeitem as diferenças existentes,propiciem a igualdade de oportunidades e promovam ações positivas parasuperar o machismo, a discriminação, o abuso, o racismo e a sujeição dasmaiorias.Esse esforço para impulsionar a eqüidade deverá ser complementa<strong>do</strong>por respostas políticas que gerem espaços e formas de participaçãoigualitária <strong>do</strong>s segmentos da população atualmente marginaliza<strong>do</strong>s nasdiversas instâncias de poder político e econômico, público e priva<strong>do</strong>.Seguin<strong>do</strong> uma estratégia de desenvolvimento deste tipo, um país pequenocomo é o Equa<strong>do</strong>r poderá ter condições de propor um esquema diferentede acumulação, ajusta<strong>do</strong> às suas necessidades e condições específicas, etu<strong>do</strong> isso como parte de um processo basea<strong>do</strong> em decisões democráticas.241livro.pmd 24126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAA ênfase não é tanto no que as pessoas possam ter como no quepossam ser e fazer. É preciso dar novos valores às coisas, para priorizar amaneira de atuar. A preocupação fundamental deve basear-se no que aspessoas e as comunidades podem fazer em um ambiente de crescenteliberdade. É necessário potencializar conscientemente as capacidades edireitos <strong>do</strong>s indivíduos e das comunidades, sem a imposição <strong>do</strong>gmáticade um modelo pré-determina<strong>do</strong>.Visto desta perspectiva, o desenvolvimento implica a expansão daspotencialidades individuais e coletivas, que é preciso descobrir e fomentar.Não se deve desenvolver as pessoas, mas elas precisam desenvolver-se. Paraisso, qualquer pessoa deve ter a mesma possibilidade de escolha, ainda quenão disponha <strong>do</strong>s mesmos meios. E se o desenvolvimento exige a eqüidade,esta só será possível com a democracia: não apenas com um simples ritoeleitoral, e menos ainda com práticas clientelísticas. E com a liberdade deexpressão, garantias verdadeiras de eficiência <strong>econômica</strong> e bem-estar.A necessidade de propostas e ações globaisNo contexto de uma economia e sociedade <strong>do</strong>larizadas, construiruma alternativa como a esboçada nos parágrafos precedentes será aindamais complexa, e implica um esforço de longo fôlego, e de transformaçõesprofundas, com conotações que vão adquirir características cada vez maisduras, à medida que a disciplina <strong>do</strong>lariza<strong>do</strong>ra afogue os espaços democráticose amplie os hiatos sociais.Indubitavelmente o desafio será maior. Será preciso oferecer aantigos desafios respostas renovadas, que sejam viáveis enquantobeneficiem as maiorias, com a participação ativa dessas mesmas maiorias.Porque o desenvolvimento implica um esforço de longo fôlego e detransformações profundas, no qual será preciso afinal rever o estilo devida vigente.A partir desta situação complexa será preciso voltar a proporrespostas integrais, alianças amplas no campo político e social, ten<strong>do</strong> em242livro.pmd 24226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORvista construir democraticamente um verdadeiro poder contrahegemônico,o que implica ir crian<strong>do</strong> espaços de poder real a partir <strong>do</strong>local, regional e nacional.Uma proposta alternativa deve integrar e apoiar mo<strong>do</strong>s de vidadiferentes, valorizan<strong>do</strong> a diversidade cultural e o pluralismo político, sempermitir que qualquer minoria viva à custa das maiorias, sem tolerar que umpequeno grupo de países imponha condições ao resto da humanidade. Semesquecer também de algo tão fundamental como a defesa ativa <strong>do</strong> direito àvida, como o respeito à honra alheia e à participação <strong>do</strong> contrário naconvivência nacional.O ponto de partida para repensar o Equa<strong>do</strong>r e o próprio mun<strong>do</strong>devem ser os direitos humanos, tanto civis como socio-econômicos eecológicos. Dada a importância intrínseca <strong>do</strong>s direitos humanos, é precisodefender a sua vigência, ainda que a custo de qualquer preço econômico eem uma perspectiva mundial.Vistas assim as coisas, quan<strong>do</strong> as desigualdades no mun<strong>do</strong> se ampliamde forma acelerada, só resta propor o desenvolvimento como uma perspectivauniversal. Mesmo os países considera<strong>do</strong>s desenvolvi<strong>do</strong>s precisarão resolverseus crescentes problemas de iniqüidade e, em especial, incorporar critériosde suficiência antes de tentar sustentar a lógica da eficiência, entendida comoa acumulação material permanente, sacrifican<strong>do</strong> o restante da humanidade.Esses países precisam mudar seu estilo de vida, que põe em risco oequilíbrio ecológico mundial, já que desta perspectiva são também“subdesenvolvi<strong>do</strong>s”. Por outro la<strong>do</strong>, os países empobreci<strong>do</strong>s eestruturalmente excluí<strong>do</strong>s deverão procurar opções de vida digna esustentável, que não representem uma re-edição caricatural (e impossível)<strong>do</strong> estilo de vida ocidental.O que vimos até aqui implica um questionamento consciente <strong>do</strong>desenvolvimento pela recuperação ou a imitação, enquanto opção quasemágica para a solução <strong>do</strong>s problemas mundiais.Desta perspectiva, se o desenvolvimento é uma preocupação global,as propostas e sobretu<strong>do</strong> as ações precisarão também ser globais. A <strong>história</strong>243livro.pmd 24326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAfutura <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r deverá assim incorporar mudanças profundas parasuperar a pobreza e a marginalidade, projetan<strong>do</strong>-se no contexto andino,latino-americano e mundial.244livro.pmd 24426/9/2005, 13:26


Cronologia (a partir de 1900)livro.pmd 24526/9/2005, 13:26


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Cronologia(a partir de 1900)1900 - Entra em vigor o padrão ouro. Instalação da telefonia em Quito1904 - Pela primeira vez as exportações somam 10 milhões de dólares1908 - Inauguração da ferrovia Guayaquil-Quito1910 - Rejeitada a proposta norte-americana de arrendamento por 99 anosdas ilhas Galápagos1912 - Assassinato de Eloy Alfaro, após perío<strong>do</strong> de grande instabilidade1914 - Início da crise <strong>do</strong> cacau. Moratória, com a suspensão daconvertibilidade <strong>do</strong> sucre em ouro1918 - Campanha de erradicação da febre amarela1920 - As exportações alcançam 20 milhões de dólares1921 - Levantes indígenas1922 - Repressão violenta de greve em Guayaquil1925 - Revolução de julho. Rompimento das relações diplomáticas com aColômbia1926 - Missão Kemmerer247livro.pmd 24726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA1927 - Reforma <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, com a criação <strong>do</strong> Banco Central. Nova a<strong>do</strong>ção<strong>do</strong> padrão ouro1929 - Aprovada a décima-terceira Constituição <strong>do</strong> país, que consagra ohabeas corpus e o voto feminino. O presidente <strong>do</strong> Banco Central propõe aentrega das ilhas Galápagos aos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, em troca da dívida externa1930 - Reflexos da crise <strong>econômica</strong> mundial1931 - Início da produção de banana em larga escala1932 - Suspensão <strong>do</strong> serviço da dívida externa. Supressão <strong>do</strong> padrão ouro.Sublevação militar1940 - Imposição de controle cambial e <strong>do</strong> comércio exterior1941 - Tropas peruanas invadem o Equa<strong>do</strong>r. Mediação da Argentina, Brasile EUA. Desembarque de tropas americanas1942 - Trata<strong>do</strong> de Limites <strong>do</strong> Rio de Janeiro, com o Peru1944 - Rebelião popular “La Gloriosa”1949 - Terremoto em Ambato1950 - A população <strong>do</strong> país excede 3 milhões1955 - Reinício <strong>do</strong> serviço da dívida externa1961 - Primeira Carta de Intenção ao FMI1962 - Ingresso <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r na ALALC248livro.pmd 24826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR1969 - “Guerra <strong>do</strong> Atum” contra barcos pesqueiros norte-americanos1971 -Nova desvalorização da moeda1972 - Início da exportação de petróleo1973 - Ingresso na OPEP1979 - Criação <strong>do</strong> Banco Equatoriano de Desenvolvimento1981 - Incidentes fronteiriços com o Peru. Adesão <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r aos Não-Alinha<strong>do</strong>s1982 - Ajuste econômico, com a desvalorização da moeda,provocan<strong>do</strong> distúrbios. Inundações. A população <strong>do</strong> país ultrapassa8 milhões1983 - Décima Carta de Intenção ao FMI. Acor<strong>do</strong> com o Clube de Paris1986 - Crise causada pela queda <strong>do</strong>s preços <strong>do</strong> petróleo1987 - Nova suspensão <strong>do</strong> serviço da dívida externa. Terremoto provocadanos importantes1990 - Rebelião indígena1994 - Vários escândalos pela corrupção no processo de modernizaçãoda economia. Renegociação da dívida externa comercial (Plano Brady)1995 - Conflito arma<strong>do</strong> com o Peru1997 - Destituição <strong>do</strong> Presidente Abdalá Bucaram Ortiz249livro.pmd 24926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA1998-9 - Intervenção estatal em vários bancos. Prossegue o ajusteeconômico2000 - A crise <strong>econômica</strong> leva à <strong>do</strong>larização250livro.pmd 25026/9/2005, 13:26


Chefes de Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r(a partir de 1960)livro.pmd 25126/9/2005, 13:26


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Chefes de Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r(a partir de 1960)Camilo Ponce Enríquez 1956-1960José María Velasco Ibarra 1960-1Carlos Julio Arosemena Monroy 1961-3Junta Militar – 1963-6Clemente Yerovi Indaburo 1966Otto Arosemena Gómez 1966-8José María Velasco Ibarra 1968-72Guillermo Rodríguez Lara 1972-6Conselho Supremo 1976-9Jaime Roldós Aguilera 1979-81Osval<strong>do</strong> Hurta<strong>do</strong> Larrea 1981-4León Febres Cordero 1984-8Rodrigo Borja Cevallos 1988-92253livro.pmd 25326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTASixto Durán Ballén 1992-96Abdalá Bucaram Ortiz 1996-7Fabián Alarcón Rivera 1997-8(Rosalía Arteaga 1997)Jamil Mahuad Witt 1998-2001Gustavo Noboa Bejarano 2001-254livro.pmd 25426/9/2005, 13:26


Tabelaslivro.pmd 25526/9/2005, 13:26


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Quadro 11. BALANÇA COMERCIAL, PIB E DÍVIDA EXTERNA1852-2000(milhões de dólares)ANO PIB EXPORTAÇÕES IMPORTAÇÕES BALANÇACOMERCIALDÍVIDA EXTERNAALDO FINAL * SERVIÇO**257livro.pmd 25726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAANO PIB EXPORTAÇÕES IMPORTAÇÕES BALANÇACOMERCIALDÍVIDA EXTERNAALDO FINAL * SERVIÇO**258livro.pmd 25826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORANO PIB EXPORTAÇÕES IMPORTAÇÕES BALANÇACOMERCIALDÍVIDA EXTERNAALDO FINAL * SERVIÇO**259livro.pmd 25926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAANO PIB EXPORTAÇÕES IMPORTAÇÕES BALANÇACOMERCIALDÍVIDA EXTERNAALDO FINAL*SERVIÇO**260livro.pmd 26026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORANO PIB EXPORTAÇÕES IMPORTAÇÕES BALANÇACOMERCIALDÍVIDA EXTERNAALDO FINAL* SERVIÇO*** Sal<strong>do</strong> final = sal<strong>do</strong> inicial + desembolsos + ajustes por variação <strong>do</strong> tipo de câmbio – amortizações.** Inclui amortizações e juros efetivos.Fontes: Luis Alberto Carbo, Historia Monetaria y Cambiaria del Ecua<strong>do</strong>r, Quito, 1978Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r: de 1948 a 1993Desde 1991: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual, n. 1793, Quito, julho de2000.Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-1997, Quito, 1997.Notas: Até 1947 foi toma<strong>do</strong> o valor declara<strong>do</strong> das exportações e o valor declara<strong>do</strong> FOB das importações.A partir de 1948 tomou-se o valor FOB das exportações e o valor CIF das importações.Os da<strong>do</strong>s da dívida externa de 1938 a 1950 são só informativos, e não constituem fonte de comparaçãocom os movimentos totais da dívida externa.261livro.pmd 26126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 2COTAÇÃO DO DÓLAR NORTE-AMERICANO 1910-2000(em sucres por dólar)ANOMÉDIA ANUALCOMPRA-VENDAANOMÉDIA ANUALCOMPRA-VENDAANOMÉDIA ANUALCOMPRA-VENDAFontes: María Almeida A., “Oscilaciones del dólar norteamericano en el merca<strong>do</strong> nacional durante 78años”, em Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Revista Ecuatoriana de História Económica, 4, Quito, 1988.Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-1997, Quito, 1997.Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual (vários números), Quito, 1996-2000.262livro.pmd 26226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 3COTAÇÕES DO DÓLAR NORTE-AMERICANO 1970-2000(médias anuais, em sucres)ANO MERCADO LIVRE (1)compraExport. FOBMERCADO OFICIALDE INTERVENÇÃOcompra vendaExport. FOBMERCADO LIVRE(priva<strong>do</strong>)compra vendaTIPO DECÂMBIOVENDAimport. FOB263livro.pmd 26326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAANOMERCADO LIVRE(1)compraExport. FOBMERCADO OFICIALDE INTERVENÇÃOcompra vendaExport. FOBMERCADO LIVRE(priva<strong>do</strong>)compra vendaTIPO DECÂMBIOVENDAimport. FOB(1)Corresponde à média ponderada <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> oficial até 1981; daí em diante à média entre o merca<strong>do</strong>oficial e de intervenção.Fonte: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r264livro.pmd 26426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 4 - EXPORTAÇÃO POR GRUPO DE PRODUTOS, 1927-2000(Porcentagens <strong>do</strong> total)ANO TOTAL (a) PETROLÍFERANÃO PETROLÍFERAtotal petróleo deriva<strong>do</strong>stotal tradicionais outrastotal banana café camarão cacau peixe265livro.pmd 26526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 4 - EXPORTAÇÃO POR GRUPO DE PRODUTOS, 1927-2000(Porcentagens <strong>do</strong> total)ANO TOTAL (a) PETROLÍFERANÃO PETROLÍFERAtotal petróleo deriva<strong>do</strong>stotal tradicionais outrastotal banana café camarão cacau peixe266livro.pmd 26626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 4 - EXPORTAÇÃO POR GRUPO DE PRODUTOS, 1927-2000(Porcentagens <strong>do</strong> total)ANO TOTAL (a) PETROLÍFERANÃO PETROLÍFERAtotal petróleo deriva<strong>do</strong>stotal tradicionais outrastotal banana café camarão cacau peixe267livro.pmd 26726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 4 - EXPORTAÇÃO POR GRUPO DE PRODUTOS, 1927-2000(Porcentagens <strong>do</strong> total)ANO TOTAL (a) PETROLÍFERANÃO PETROLÍFERAtotal petróleo deriva<strong>do</strong>stotal tradicionais outrastotal banana café camarão cacau peixe268livro.pmd 26826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 4 - EXPORTAÇÃO POR GRUPO DE PRODUTOS, 1927-2000(Porcentagens <strong>do</strong> total)ANO TOTAL (a) PETROLÍFERANÃO PETROLÍFERAtotal petróleo deriva<strong>do</strong>stotal tradicionais outrastotal banana café camarão cacau peixe(a) milhares de dólares FOBFonte: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-1997, Quito, 1997Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual 1793 Quito, julho de 2001269livro.pmd 26926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 5EVOLUÇÃO DA ESTRUTURA DAS IMPORTAÇÕES POR TIPO DE BEM,1957-2000 (%)ANO BENS DECONSUMOCOMBUS-TÍVEISE LUBRIFI-CANTESMATÉRIASPRIMASBENS DECAPITALDIVERSOSTOTAL IMPORT.(us$ mil)270livro.pmd 27026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORANO BENS DECONSUMOCOMBUS-TÍVEISE LUBRIFI-CANTESMATÉRIASPRIMASBENS DECAPITALDIVERSOSTOTAL IMPORT.(us$ mil)Fontes:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Boletin Anuario, vários números, Quito, 1970-1985.Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual, vários números, Quito, 1996-2000.Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-1997, Quito, 1997271livro.pmd 27126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 6 - ESTRUTURA DAS EXPORTAÇÕES EQUATORIANAS POR DESTINO GEOGRÁFICO, 1980-2000(em % e os totais em milhões de dólares FOB)ANO TOTAL AMÉRICA EUA AMÉRICA ALADI GRUPO RESTO EUROPA UNIÃO RESTODAÁSIA ÁFRICA OCEANIA OUTROSFontes:1970-1990: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-19971991-2000: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual, 1793.272livro.pmd 27226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 7 - ESTRUTURA DAS IMPORTAÇÕES EQUATORIANAS POR DESTINO GEOGRÁFICO , 1980-2000(em % e os totais em milhões de dólares CIF)ANO TOTAL AMÉRICA EUA AMÉRICACENTRALALADI GRUPOANDINORESTOAMÉRICAEUROPA UNIÃOEUROP.RESTODAEUROPAÁSIA ÁFRICA OCEANIA OUTROSPAÍSESFontes:1970-1990: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-1997.1991-2000: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual, 1793.273livro.pmd 27326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 8TAXA DE VARIAÇÃO DA INFLAÇÃO (IPCU) E TAXADE CRESCIMENTO DO PIB REAL, 1928-2000 (em %)ANOINFLAÇÃO MÉDIAANUALPIB MÉDIA ANUALP/ANOINFLAÇÃO MÉDIAANUALPIB MÉDIA ANUALFontes:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-1997, Quito, 1997Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (INEC), Índices de Precios al Consumi<strong>do</strong>r Urbano,vários númerosBanco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Cuentas Nacionales del Ecua<strong>do</strong>r, 1969-1992, 16, 1993Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual, vários números, Quito, 1996-2000274livro.pmd 27426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORFonte:INECQuadro 9. EVOLUÇÃO DA INFLAÇÃO 1980-2001(% da variação mensal <strong>do</strong> índice de preços)275livro.pmd 27526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAFonte:INECQuadro 10. EVOLUÇÃO DA INFLAÇÃO 1981-2001(% da variação anual <strong>do</strong> índice de preços)276livro.pmd 27626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 11TRANSFERÊNCIA LÍQÜIDA GERADAPELA DÍVIDA EXTERNA(desembolsos menos serviço da dívida, 1970-2000, em milhões de dólares)ANODESEMBOLSO TOTALAMORTIZAÇÃOTOTALSALDO FINAL + RECEITATOTAL TOTAL JUROS JUROS EMATRASOANO DESEMBOLSO AMORTIZAÇÃO TOTAL DE SALDO FINAL + RECEITATOTAL TOTAL JUROS JUROS EMATRASOFONTE:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información 277 Estadística Mensual, 1793, QuitoBanco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-livro.pmd 27726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 12PESO DA DÍVIDA EXTERNAFonte:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Movimiento de la Deuda Externa Pública y Privada, Operaciones delSector Público no Financiero.Quadro 13PAGAMENTOS DO GOVERNO CENTRAL(serviço da dívida e outros setores, em % <strong>do</strong> PIB)EDUCAÇÃOE CULTURASAÚDE E DESENVOLVIMENTOSERVIÇODESENVOLVIMENTOAGRO-PECUÁRIODA DÍVIDAFonte:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r278livro.pmd 27826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 14DÍVIDA E EXPORTAÇÃOEM MILHARES DE DÓLARESSERVIÇO DÍVIDAEXTERNA PÚBLICAEM PORCENTAGEMSERVIÇO DÍVIDA TOTAL EXPORTAÇÃO X SERVIÇO DA DÍVIDAPÚBLICA/ XSERVIÇO DADÍVIDA TOTAL/ XFonte:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Boletines anuarios, vários númerosBanco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual, 1793, Quito, julho de 2001.279livro.pmd 27926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 15RENEGOCIAÇÃO DA DÍVIDA EXTERNA EQUATORIANAAcor<strong>do</strong>s com o FMIDATA GOVERNO MONTANTE (us$)UTILIZAÇÃO(%)Acor<strong>do</strong>s com os bancos internacionaisDATA1983, outubro1984, agosto1985, agostoTIPO DE ACORDONovos recursos (US$431 milhões) e re-estruturação <strong>do</strong>s pagamentos (1982-3).Reorganização de obrigações vencidas em 1984.Novos recursos (US$200 milhões).1985, dezembroAcor<strong>do</strong> pluri-anual de financiamento <strong>do</strong>s vencimentos comprometi<strong>do</strong>sentre dezembro de 1984 e dezembro de 1989.Plano Brady, criação de bonos Brady.1994, outubro2000Desaparecem os bonos Brady e os Eurobonos, crian<strong>do</strong>-se em seu lugarbonos Global.280livro.pmd 28026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORAcor<strong>do</strong>s com o Clube de Paris(data de corte: 1º de janeiro de 1983)DATAPERÍODO DECONSOLIDAÇÃO(meses)MONTANTECONSOLIDAÇÃO(US$ milhões)VENCIMENTOANO/MÊSPERÍODO DEGRAÇA ANO/MÊSFonte:Worldbank, World Debt Tables; comunica<strong>do</strong> <strong>do</strong> Clube de Paris281livro.pmd 28126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 16EVOLUÇÃO DO PIB, DA EXPORTAÇÃO E DA DÍVIDA EXTERNA(totais e per capita, 1970-2000)ANO PIB (a) EXP. fob (a) DÍVIDA]EXTERNA (a), (b)PIB p. cap. (c) EXP. p. cap. (c) DÍVIDA p. cap. (c)(a) US$ milhões(b) Sal<strong>do</strong> final da dívida + juros atrasa<strong>do</strong>s(c) DólaresFontes:Banco Centraal <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, INEC, Encuestas urbanas de EmpleoBanco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Quincenal, vários números, 1988-1993Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística 1927-1997, Quito, 1997Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual, vários números, Quito, 1996-2001282livro.pmd 28226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 17RECEITA PETROLÍFERA: PARTICIPAÇÃO NOORÇAMENTO GERAL DO ESTADO, 1970-2000 (%)ANO % ANO %Fonte:1970-1990: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística 1927-1997,Quito, 19971991-2000: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual, 1793, Quito, julhode 2001283livro.pmd 28326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 18EVOLUÇÃO DO SALÁRIO NOMINAL E REAL, 1980-2000(em sucres)ANO SALÁRIO MENSAL MÍNIMO REMUNERAÇÃO TOTAL * IPC **REMUNERAÇÃOREAL*Inclui rendimentos complementares**Base: setembro 1994-agosto de 1995 = 100Fonte:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, IIE-UCBanco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-1997,Quito, 1997.284livro.pmd 28426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 19ALGUNS INDICADORES BÁSICOS DA ECONOMIA, 1970-2000ANORMI (a) PREÇO DO PIB (c) PIB perINVERSÃO ESTRANGEIRA DIRETA (C)PETRÓLEO (b)capitalíqüida% <strong>do</strong> PIB(a) sal<strong>do</strong>s cf. paridade oficial a 31 de dezembro(b) preço de exportação FOB (US$ por barril)285livro.pmd 28526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA(c) milhões de dólares(d) dólaresFonte:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>rQuadro 20GRAU DE DOLARIZAÇÃO ESPONTÂNEA DO EQUADOR(1994-1999)DEPÓSITOS EM US$ MILHÕES% DO TOTAL DE DEPÓSITOSAPLICAÇÕES EM US$ MILHÕES% DO TOTAL DAS APLICAÇÕESFontes:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r286livro.pmd 28626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 21EVOLUÇÃO DAS REMESSA DE EMIGRANTES, EXPORTAÇÕES DEPETRÓLEO E DE BANANA(em US$ milhões)ANOEMIGRANTES BANANAPETRÓLEO(em % <strong>do</strong> PIB)ANOEMIGRANTES BANANAPETRÓLEO287livro.pmd 28726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAÍndicesBase: 1991 = 100ANO EMIGRANTES BANANAPETRÓLEOGráfico <strong>do</strong>s Índices____ Emigrantes……. Petróleox x x x BananaNota: Remessas estimadas com base em pesquisa de campoFonte: Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Setenta Años de Información Estadística, 1927-1997, Quito, 1997. Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información EstadísticaMensual, 1793, Quito, 2001.288livro.pmd 28826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR22 QuadroINDICADORES DA DISTRIBUIÇÃO DE RENDAE NÍVEIS DE POBREZAANO PIB (US$ MILHÕES) PIB PER CAPITA (US$)Participação na renda total (%)ANO 20% MAIS POBRES 20% MAIS RICOSEvolução da pobreza(milhões de pobres)ANO POBREZA POBREZAEXTREMAEvolução da pobreza(%)ANO POBREZA POBREZA EXTREMA CRIANÇAS EM LARES POBRESFonte:Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r, Información Estadística Mensual, 1793, Quito, 2001.INEC289livro.pmd 28926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 23POPULAÇÃO TOTAL DO EQUADOR, POR REGIÃOE PROVÍNCIA, 1950-2000REGIÕES EPROVÍNCIAS1950 1962 1974 1982 1990 2000Fontes:INEC, Censos de PoblaciónSISE, Consultas Territoriales Múltiples290livro.pmd 29026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORQuadro 24DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO DO EQUADORPOR REGIÃO, 1950-2000 (em %)REGIÃO 1950 1962 1974 1982 1990 2000SIERRACOSTAAMAZÔNIAILHASNÃO DELIMITADATOTALFontes: SISE, Consultas Territoriales MúltiplesINEC, Censos de Población291livro.pmd 29126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 25TAXAS DE CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO TOTALDO EQUADOR, URBANA E RURAL, ENTRE OS CENSOS(1950-1962-1974-1982-1990)ANO TOTAL SIERRA COSTA ORIENTE GALÁPAGOSPOPULAÇÃOTOTALPOPULAÇÃOURBANAPOPULAÇÃORURALFontes: Nueva Historia del Ecua<strong>do</strong>r, vol. 12, Quito, Corporación Editora Nacional, Grijalbo, p.144-65.292livro.pmd 29226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORANOSQuadro 26EVOLUÇÃO DO PIB PER CAPITA DO EQUADOR E DE UM GRUPOSELECIONADO DE PAÍSES DO MUNDO1900-1989 (taxa média anual)EQUADORMÉDIAS:AMÉRICA LATINAPAÍSES ASIÁTICOSPAÍSES IBÉRICOSPAÍSES DESENVOLVIDOSESTADOS UNIDOSNota: Incluí<strong>do</strong>s os seguintes países: Argentina, Brasil, Colômbia, Chile, México e Venezuela (AméricaLatina); Coréia, Formosa, Tailândia (Ásia); Espanha e Portugal (península ibérica); Alemanha(antes da reunificação), Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, França, Japão, Países Baixos, Reino Uni<strong>do</strong> (paísesdesenvolvi<strong>do</strong>s).Fonte: André Hofman, Ecua<strong>do</strong>r: Desarrollo Económico en el Siglo 20, 1992.Quadro 27EVOLUÇÃO DO PIB PER CAPITA DO EQUADOR E DEUM GRUPO SELECIONADO DE PAÍSES DA AMÉRICA LATINA1900-1989 ( taxa média anual)PERÍODOEqua<strong>do</strong>rArgentinaBrasilChileColômbiaMéxicoVenezuelaFonte:André Hofman, Ecua<strong>do</strong>r: Desarrollo Económico en el Siglo 20, 1992.293livro.pmd 29326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTAQuadro 28COMPARAÇÃO DO PIB PER CAPITA DO EQUADOR COM UMGRUPO DE PAÍSES SELECIONADOS DO MUNDO, 1900-1990(EUA = 100)EQUADORMÉDIAS:AMÉRICA LATINAPAÍSES ASIÁTICOSPAÍSES IBÉRICOSPAÍSES DESENVOLVIDOSESTADOS UNIDOSNota: Incluí<strong>do</strong>s os seguintes países: Argentina, Brasil, Colômbia, Chile, México e Venezuela (AméricaLatina); Coréia, Formosa, Tailândia (Ásia); Espanha e Portugal (península ibérica); Alemanha (antesda reunificação), Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, França, Japão, Países Baixos, Reino Uni<strong>do</strong> (países desenvolvi<strong>do</strong>s).Fonte: André Hofman, Ecua<strong>do</strong>r: Desarrollo Económico en el Siglo 20, 1992.Quadro 29PERIODIZAÇÃO DAS ONDAS LONGAS DO CAPITALISMO REVOLUÇÃOANOS ONDA LONGA RECUPERAÇÃO AUGE RECESSÃO DEPRESSÃOTECNOLÓGICAPRIMEIRASEGUNDATERCEIRAQUARTAQUINTAFonte: Jürgen Schuldt, “Revolución tecnológica, relaciones Norte-Sur y desarrollo”, emvários autores, América Latina: Opciones Estratégicas de Desarrollo, Caracas, ALOP e EditorialNueva Sociedad, 1992, p. 25.294livro.pmd 29426/9/2005, 13:26


Bibliografialivro.pmd 29526/9/2005, 13:26


livro.pmd 29626/9/2005, 13:26


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BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORBANCO CENTRAL DO EQUADOR1948-1989 Memorias Anuales del Gerente General del Banco Central del Ecua<strong>do</strong>rdesde el año 1948 a 1989, Quito.1988 Estadísticas Económicas Históricas 1948-1983, Quito1990 Cartas de Intención Suscritas por el Gobierno del Ecua<strong>do</strong>r con el Fon<strong>do</strong> MonetarioInternacional, Quito1992 Deuda Externa del Ecua<strong>do</strong>r 1970-1991, boletim n. 1, QuitoBANCO DEL ECUADOR1977 Crónica Comercial e Industrial de Guayaquil en el Primer Siglo de laIndependencia 1820-1920, Faculdade de Economia, Universidade deGuayaquilBENALCAZÁR R. René1989 Análisis del Desarrollo Económico del Ecua<strong>do</strong>r, Quito, Banco Central <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r.BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO1981 Análisis del Desarrollo Económico del Ecua<strong>do</strong>r, Quito, Banco Central <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>rBOCCO, Arnal<strong>do</strong> M.1987 Auge Petrolero, Modernización y Subdesarrollo: El Ecua<strong>do</strong>r de los Años Setenta,Quito, FLACSO e Corporación Editora Nacional301livro.pmd 30126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTABONILLA, Heraclio1990 La Revuelta por la Independencia en Hispanoamérica, Quito1992 Apresentação <strong>do</strong> livro de Diana Bonnett, El Protector de Naturales enla Audiencia de Quito: Siglos XVII y XVIII, Quito, FLACSO1994 Guano y Burguesia en el Perú, Quito, FLACSOBORCHART DE MORENO, Christiana1993 “Circulación y producción en Quito: de la Colonia a la República”, em SigloXIX Revista de Historia, México, Universidade Autônoma de Nuevo LeónCARBO, Luis Alberto1978 Historia Monetaria y Cambiaria del Ecua<strong>do</strong>r, Quito, Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>rCÁRDENAS, José Corsino1995 Ensayo Histórico de la Economía Ecuatoriana, Quito, Banco Central <strong>do</strong>Eqcua<strong>do</strong>r.CARDOSO, Ciro F. S.; PÉREZ BRIGNOLI, Héctor1987 Historia Económica de América Latina: 2. Economías de Exportación yDesarrollo Capitalista, Barcelona, Ed. CríticaCARRASCO, V., Carlos Marx1998 Ecua<strong>do</strong>r y el Consenso de Washington, Universidade de Cuenca.S/ data Dolarización: Un Camino de Espinas y Espejismos, Universidade de Cuenca.302livro.pmd 30226/9/2005, 13:26


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ALBERTO ACOSTAESTRADA, Víctor Emilio1931 La Posición Económica del Ecua<strong>do</strong>r en 1930, Quito1934 El problema Económico del Ecua<strong>do</strong>r en 1934: Algunos Fundamentos para suSolución, Guayaquil, Jouvin1948 El Problema Vital del Ecua<strong>do</strong>r “Fuertes o Esclavos”, Guayaquil, 2 a . ed.FALCONI MORALES, Juan (ed.)1996 El Ecua<strong>do</strong>r Frente a la Organización Mundial del Comercio (OMC), Quito,Banco Central <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r.FISCHER, Sabine1983 Esta<strong>do</strong>, Clases e Industria, Quito, El ConejoFLORES JIJON, Antonio1890 La Conversion de la Deuda Anglo-Ecuatoriana, 2 a . ed., Quito, Imprentadel GobiernoFUENTEALBA, Gerar<strong>do</strong>1990 “La sociedad indígena en las primeras décadas de la república: continuidadescoloniales y cambios republicanos”, em Nueva Historia del Ecua<strong>do</strong>r, vol. 8, Quito,Corporación Editora NacionalGALLARDO, Jorge1993 “Deuda externa: rondas de negociaciones”, em vários autores, Deuda Externa306livro.pmd 30626/9/2005, 13:26


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ALBERTO ACOSTAHistoria del Ecua<strong>do</strong>r, vol. 10, Quito, Corporación Editora NacionalMONCADA SÁNCHEZ, José1975 El Desarrollo Económico y la Distribución del Ingreso en el Caso Ecuatoriano1976 Evolución y Situación Actual del Capitalismo Ecuatoriano yPerspectivas de Desarrollo Socialista, Quito, Universidade Central <strong>do</strong>Equa<strong>do</strong>r1982 Capitalismo y Subdesarrollo Ecuatoriano en el Siglo XX, Quito, UniversidadeCentral <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r1983 Capitalismo, Burguesía y Crisis en el Ecua<strong>do</strong>r, Quito, Universidade Central<strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r1988 Dos Decenios se Van, Una crisis se Queda, Quito, Corporación EditoraNacional e CIPAD1995 Desigualdad y Estructura Productiva en el Ecua<strong>do</strong>r, Quito, CorporaciónEditora Nacional e Colégio <strong>do</strong>s Economistas de QuitoMONCAYO ANDRADE, Abelar<strong>do</strong>1981 Pensamiento Económico de Abelar<strong>do</strong> Moncayo Andrade, Guayaquil, BancoCentral <strong>do</strong> Equa<strong>do</strong>r e Universidade de GuayaquilMONTÚFAR, César2000 La Reconstrucción Neoliberal: Febres Cordero o la Estatización delNeoliberalismo en el Ecua<strong>do</strong>r 1984-1988, Quito, Universidade Simón Bolívare Abuya-Yala312livro.pmd 31226/9/2005, 13:26


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ALBERTO ACOSTA1997 Políticas Financieras y de Convertibilidad, Quito, EdidacST. GEOURS, Ives1990 “Economía y sociedad. La Sierra Centro-Norte (1830-1875)”, em NuevaHistoria del Ecua<strong>do</strong>r, vol. 7, Quito, Corporación Editora NacionalTERÁN, Emílio María1896 Informe al Jefe Supremo, General Eloy Alfaro, sobre la Deuda Anglo-Ecuatoriana, Quito, Imprenta NacionalTHORP, Rosemary1998 Progress, Poverty and Exclusion: An Economic History of Latin America inthe 20 th . Century, Washington, BIDTHORP, R. et al.1991 Las Crisis en el Ecua<strong>do</strong>r: Los Treinta y Ochenta, Quito, CorporaciónEditoral Nacional, Oxford University St. Antony’s Latin AmericanCentreTHOUMI, Francisco; GRINDLE, Merilee1992 La Política de la Economía del Ajuste: La Actual Experiencia Ecuatoriana,Quito, FLACSOTRIAS, Vivian1975 Historia del Imperialismo Norteamericano, tomos I-III, Buenos Aires, A.Peña Lillo Editor.320livro.pmd 32026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORUGARTECHE, Oscar1986 El Esta<strong>do</strong> Deu<strong>do</strong>r: Economía Política de la Deuda: Perú y Bolivia 1968-1984, Lima, Instituto de Estu<strong>do</strong>s PeruanosVALLEJO, Raúl1984 “1999: Luna de miel entre Mahuad y Aspiazu”, em vários autores, Bancosy Banqueros, Quito, El ConejoVAREA, Anamaría (coordena<strong>do</strong>ra)1997 Ecologismo Ecuatorial (1); Conflictos Socioambientales en las Ciudades (2);Desarrollo Eco-Ilógico (3), Quito, Abya-Yala e CEDEPVÁRIOS AUTORES1989 La Economía Ecuatoriana al Momento y sus Proyecciones, Guayaquil, Colégiode Economistas de GuayaquilVEGA UGALDE, Silvia1991 Ecua<strong>do</strong>r: Crisis Políticas y Esta<strong>do</strong> en los Inicios de la República, Quito,FLACSO e Abya-Yala.VEGA U., Esteban; MANCERO, Piedad2001 Sostenibilidad Fiscal y Descentralización. Quito, CORDES e FundaçãoKonrad AdenauerVELASCO ABAD, Fernan<strong>do</strong>321livro.pmd 32126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA1973 El Modelo Agroexporta<strong>do</strong>r Ecuatoriano, Guayaquil, folheto da Faculdadede Ciências Econômicas, Universidade de Guayaquil1981 Ecua<strong>do</strong>r: Subdesarrollo y Dependencia, Quito, Editorial El ConejoVICUÑA IZQUIERDO, Leonar<strong>do</strong>1986 Economia Ecuatoriana 1984-85: El Fracaso de la Reconstrucción Neoliberal,Guayaquil, Universidade de Guayaquil1988 1986-87 Economía Ecuatoriana: Crisis, Violencia, Miseria, Guayaquil,Universidade de Guayaquil1993 “El modelo tradicional de crecimiento primario exporta<strong>do</strong>r”, em vários autores,Economía Ecuatoriana, Guayaquil, Universidade de Guayaquil1998 Economía Ecuatoriana: Recursos, Características y Problemas, Guayaquil,Universidade de Guayaquil1998 Economía Ecuatoriana: Crisis y Políticas, Guayaquil, Universidade deGuayaquilVILLACRÉS MOSCOSO, Jorge W.1982 Historia Diplomática de la República del Ecua<strong>do</strong>r, Guayaquil, Universidadede GuayaquilVILLALOBOS, Fabio1990 “El proceso de industrialización hasta los años cincuenta”, em Nueva Historiadel Ecua<strong>do</strong>r, vol. 10, Quito, Corporación Editora Nacional322livro.pmd 32226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADORVIVANCO MENDIETA, Jorge1999 “Crisis bancaria oprobiosamente calculada”, em vários autores, Bancos yBanqueros, Quito, El ConejoVOS, Ros; VELASCO, Margarita; DE LABASTIDA, Edgar1999 Economic and Social Effects of El Niño in Ecua<strong>do</strong>r 1997-1998, Washington,BIDYCAZA, Patrício1983 Historia del Movimiento Obrero Ecuatoriano, Quito, Casa da CulturaEquatoriana1991 Historia del Movimiento Obrero Ecuatoriano, Quito, CEDIME e CIUDADZEVALLOS, I., José Vicente1981 El Esta<strong>do</strong> Ecuatoriano y las Transnacionales Petroleras: Ocho Años de Alianzay Conflictos 1972-1979, Quito, Universidade Católica323livro.pmd 32326/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA324livro.pmd 32426/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR325livro.pmd 32526/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA326livro.pmd 32626/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR327livro.pmd 32726/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA328livro.pmd 32826/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR329livro.pmd 32926/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA330livro.pmd 33026/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR331livro.pmd 33126/9/2005, 13:26


ALBERTO ACOSTA332livro.pmd 33226/9/2005, 13:26


BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO EQUADOR333livro.pmd 33326/9/2005, 13:26

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