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A presença africana na música popular brasileira

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Com a estruturação, <strong>na</strong> cidade do Rio de Janeiro, da comunidade baia<strong>na</strong> <strong>na</strong> região conhecidahistoricamente como “Peque<strong>na</strong> África” – espaço sóciocultural que se estendia da Pedra do Sal, nomorro da Conceição, <strong>na</strong>s cercanias da atual Praça Mauá, até a Cidade Nova, <strong>na</strong> vizinhança doSambódromo, hoje –, o samba começa a ganhar feição urba<strong>na</strong>. Nas festas dessa comunidade adiversão era geograficamente estratificada: <strong>na</strong> sala tocava o choro, o conjunto musical compostobasicamente de flauta, cavaquinho e violão; no quintal, acontecia o samba rural batido <strong>na</strong> palma damão, no pandeiro, no prato­e­faca e dançado à base de sapateados, peneiradas e umbigadas. Foiaí, então, que ocorreu, entre o samba rural baiano e outras formas musicais, a mistura que veio darorigem ao samba urbano carioca. E esse samba só começou a adquirir os contornos da formaatual ao chegar aos bairros do Estácio e de Osvaldo Cruz, aos morros, para onde foi empurrada apopulação de baixa renda quando, <strong>na</strong> década de 1910, o centro do Rio sofreu sua primeira grandeintervenção urbanística. Nesses núcleos, para institucio<strong>na</strong>lizar seu produto, então, foi que,organizando­o, legitimando­o e tor<strong>na</strong>ndo­o uma expressão de poder, as comunidades negrascariocas criaram as escolas de samba.Daí que, em conclusão, todos os ritmos e gêneros existentes <strong>na</strong> <strong>música</strong> <strong>popular</strong> <strong>brasileira</strong> deconsumo de massa, quando não são reprocessamento de formas estrangeiras, se origi<strong>na</strong>m dosamba ou são com ele aparentados.Afoxés e blocos afro: a matriz iorubáAs condições históricas da vinda maciça de iorubanos para o Brasil, do fim do século XVIII aosprimeiros anos da centúria seguinte, fizeram com que a língua desse povo se transformasse numaespécie de língua geral dos africanos <strong>na</strong> Bahia e seus costumes gozassem de franca hegemonia.Esse fato, aliado, posteriormente, ao trabalho de reorganização das comunidades jeje­<strong>na</strong>gôsempreendido principalmente pela ialorixá Mãe Aninha, Obá Biyi (1869­1938) e pelo babalaôMartiniano do Bonfim, Aji Mudá (1858­1943), <strong>na</strong> Bahia, em Recife e no Rio de Janeiro, fez com queos iorubás passassem a ser vistos como a principal referência no processo civilizatório da diáspora<strong>africa<strong>na</strong></strong> no Brasil. Mas mesmo antes das ações concretas daquelas duas grandes lideranças, astradições ioruba<strong>na</strong>s já faziam <strong>presença</strong> <strong>na</strong> <strong>música</strong>. Tanto assim que, a partir do car<strong>na</strong>val de 1897,saía às ruas de Salvador, ence<strong>na</strong>ndo, com canto, danças e alegorias, temas da tradição <strong>na</strong>gô, oclube Pândegos d’África, considerado o primeiro afoxé baiano.O afoxé, cordão car<strong>na</strong>valesco de adeptos da tradição dos orixás, e por isso outrora tambémchamado “candomblé de rua”, apresenta­se cantando cantigas em iorubá, em geral relacio<strong>na</strong>dasao universo do orixá Oxum. Esses cânticos são tradicio<strong>na</strong>lmente acompanhados por atabaques dotipo “ilu”, percutidos com as mãos, além de agogôs e xequerês, no ritmo conhecido como “ijexá”.Observe­se que a etimologia dos nomes dos instrumentos citados remete sempre ao iorubá (ìlu,agogo, sèkérè). Da mesma forma que o vocábulo “afoxé” se origi<strong>na</strong> em àfose (encantação; palavraeficaz, operante) e corresponde ao afro­cubano afoché, o qual significa “pó mágico”; enfeitiçar compó. E aí está a origem histórica do termo: os antigos afoxés procuravam “encantar” osconcorrentes.Os afoxés experimentam um período de vitalidade até o fi<strong>na</strong>l da década de 1890, para decli<strong>na</strong>rematé o término dos anos de 1920 e ressurgirem <strong>na</strong> década de 1940. O grande remanescente dessesgrupos é, hoje, o afoxé Filhos de Gandhi, fundado <strong>na</strong> cidade de Salvador em 18 de fevereiro de1948. Criado “para divulgação do culto <strong>na</strong>gô, como forma de afirmação étnica”, segundo seusestatutos, e origi<strong>na</strong>lmente constituído por estivadores, no fi<strong>na</strong>l da década de 1990, gozando dorespaldo oficial, reunia mais de 4 mil associados, entre os quais um grande número de pais­desanto.Em 12 de agosto de 1951 era fundado no Rio de Janeiro, no bairro da Saúde, seuhomônimo carioca.Nos anos de 1980, no bojo do movimento pelos direitos dos negros, surgem em Salvador osblocos afros, com o objetivo explícito de reafricanizar o car<strong>na</strong>val de rua da capital baia<strong>na</strong>. Usandotemas que buscam uma conexão direta com a África e a afirmação da negritude, essasagremiações criaram uma nova estética. Como acentua João José Reis, eles reinventaram as ricastradições da cultura negra local, “para exaltar publicamente a beleza da cor, celebrar os heróisafro­brasileiros e africanos, para contar a história dos países da África e das lutas negras no Brasil,

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