Eça <strong>de</strong> Queirós e Eduardo Pradoção, perversa forma <strong>de</strong> agitação, a estabilida<strong>de</strong> que é própria da instituição.No Brasil, a nação inteira ouviu, no dia 15 <strong>de</strong> março <strong>de</strong>1984, o presi<strong>de</strong>nte da República, João Baptista <strong>de</strong> Oliveira Figueiredo,repetir que, ao assumir o governo, jurou fazer <strong>de</strong>ste país uma <strong>de</strong>mocracia,isto cem anos <strong>de</strong>pois da <strong>de</strong>posição da genuína <strong>de</strong>mocraciacoroada <strong>de</strong> D. Pedro II. Todos os <strong>de</strong>mais países da América estãonas mesmas condições. Quando, pois, Eduardo Prado fez as consi<strong>de</strong>raçõesacima sobre a cópia servil das instituições americanas pelosrepublicanos históricos, estava indigitando o gran<strong>de</strong> mal <strong>de</strong> que vimossofrendo, <strong>de</strong> sua época aos nossos dias. O regime criado pelosPais Fundadores alcançou êxito nos Estados Unidos, para os quaisfoi concebido. Mas não <strong>de</strong>veria ter sido exportado. É a tese <strong>de</strong> HaroldJ. Laski, em seu estudo sobre a <strong>de</strong>mocracia americana. 14Eça admirava em Eduardo sua luci<strong>de</strong>z, a capacida<strong>de</strong> excepcional<strong>de</strong> perscrutar os dias vindouros e <strong>de</strong> fazer, com precisão, o diagnósticosobre o Brasil e o seu futuro. Entraríamos numa fase turbulenta.Sem recorrermos às teses conhecidas sobre o Estado patrimonial, diremosque prevalecia no Brasil o regime do Pai, caro à psicanálise, integradona longa tradição luso-espanhola, católica, hierárquica, moralmenteassentada sobre o princípio da autorida<strong>de</strong>. Eduardo não seconformou, até a morte, prematura, aos 41 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, com ogolpe revolucionário que, numa agitada manhã <strong>de</strong> novembro, <strong>de</strong>rrubouo trono e o substituiu por uma república, subservientemente copiadados Estados Unidos, inclusive na improprieda<strong>de</strong> da nova <strong>de</strong>nominação.Gozando <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência econômica, moral e intelectual,passou a <strong>de</strong>sferir contra a situação a que foi jogado o Brasil osraios <strong>de</strong> sua ira. Pagou caro. Teve <strong>de</strong> fugir dos esbirros da ditadura,que suce<strong>de</strong>u ao monarca liberal. Mas não se dobrou. Implacável nacrítica aos abusos do po<strong>de</strong>r, <strong>de</strong>nunciou-os com veemência. Flor dopatriciado paulista, preferiu à comodida<strong>de</strong> do sibaritismo gratuito apolêmica, e vergastou, quanto pô<strong>de</strong>, o novo regime. Esse, o Eduardo14 Harold J.Laki, TheAmerican<strong>de</strong>mocracy.Londres,George Allenand Unween,1953, passim.83
João <strong>de</strong> ScantimburgoPrado que Eça cultivou e por quem se ligou numa amiza<strong>de</strong> sólida e,mesmo, exaltada.Eduardo era um estupendo exemplar da tradição viva e atuante.Não se tratava <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sses mitos que se adoram inconscientemente,mas <strong>de</strong> convicção firme <strong>de</strong> quem aceitava, nesse princípio, a viacerta para manter coesa a nação e projetá-la no tempo e no espaço,portanto na História, mas com a sua personalida<strong>de</strong> soberanamenteassegurada. Eça admirou o amigo querido por ter com ele profundaafinida<strong>de</strong> espiritual, profunda simpatia, no sentido atrás referido.Eça vinha sofrendo com a <strong>de</strong>vastação política, que tanto abalavaPortugal, e Eduardo, com o que abalava o Brasil, ambos, portanto,i<strong>de</strong>ntificados na mesma paixão, queimando no fogo do mesmo patriotismo.Só se admira por i<strong>de</strong>ntificação. Não se admiram os contrários.O belo ensaio, <strong>de</strong>dicado por Eça a Antero <strong>de</strong> Quental, inspirou-sena mesma fonte. O gran<strong>de</strong> e angustiado poeta, um dos maioresem qualquer língua, <strong>de</strong>safiou Deus, <strong>de</strong> relógio na mão – atitu<strong>de</strong>pueril e perdoável num <strong>de</strong>sesperado –, mas era um <strong>de</strong>sses estupendosexemplares que a civilização portuguesa gerou, para a a<strong>de</strong>são entusiástica<strong>de</strong> quem o conheceu. Antero foi, a rigor, um místico leigo,ou um místico falhado. Daí não ter encontrado outra resposta para asua ansieda<strong>de</strong> em face dos pecados do mundo, senão se entregando à15 Antero <strong>de</strong>Quental, <strong>Prosa</strong>sescolhidas. Rio <strong>de</strong>Janeiro, Livro<strong>de</strong> Portugal,1942, passim,seleção eprefácio <strong>de</strong>Fi<strong>de</strong>lino <strong>de</strong>Figueiredo.Funérea Beatriz <strong>de</strong> mão gelada,Mas única Beatriz consoladora.Isto é, a morte por suas próprias mãos. Quando Eça confessouque ficou, sempre, aos seus pés, cultuando-o, via no poeta do pessimismoe da aflição um ser humano com longos, extensos vínculosno passado.O autor da conferência sobre as “Causas da Decadência dos PovosPeninsulares”, 15 “atraente mas <strong>de</strong>masiado simplista”, como <strong>de</strong>la84
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