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Boletim_A4_4páginas_ENAE_Asa_Seu Brasil

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Muitas sementes são também estocadas em garrafas pets, mas não são em todas as garrafas que ele guarda, pois nas<br />

de Coca-Cola o conservante que vem dentro da garrafa, é muito forte e torra a semente.<br />

“ Eu tenho muito cuidado para guardar<br />

as sementes nas garrafas petes,<br />

primeiro eu dou um banho com água, detergente e areia,<br />

depois coloco para secar e ai eu guardo as sementes”!<br />

Conta seu <strong>Brasil</strong>.<br />

CANINDÉ DE SÃO FRANCISCO/SE<br />

A HISTÓRIA DA FAMÍLIA<br />

GUARDIÃ DE SEMENTES<br />

A comunidade Pelado II fica distante a 40 km da sede do município de Canindé do São Francisco, no Alto Sertão<br />

Sergipano. É neste local que mora essa família resistente, que mesmo diante das desigualdades sociais da época,<br />

como a falta de água, energia elétrica e políticas públicas, continuou na crença e na perseverança da convivência com<br />

o Semiárido, onde dali pudesse viver na harmonia e tirar o seu alimento. E é nessa comunidade que habita da família<br />

do senhor Manoel Dantas da Silva, conhecido pelo apelido de “<strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong>”, de 68 anos de idade. <strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong> chegou à a<br />

comunidade aos 28 anos, onde conheceu sua esposa, Luzinete de Oliveira Silva, conhecida como “Dona Nete de<br />

<strong>Brasil</strong>”, 59 anos. Casados há 40 anos, desta união nasceram 9 filhos, 5 destes estão vivos, que são: Maria de Oliveira<br />

Silva, 39 anos, Lindinete de Oliveira Silva, 37 anos, Ivanete de Oliveira Silva, 36 anos, Moises de Oliveira Silva, 33 anos,<br />

e Marta de Oliveira Silva, 19 anos.<br />

“Comecei a trabalhar na roça com a idade de 08 anos na companhia da minha mãe, a vida não era mole”, diz <strong>Seu</strong><br />

<strong>Brasil</strong>.<br />

Casa de sementes da família<br />

A falta de uma assistência técnica voltada para a convivência com o semiárido deixa a família sem acompanhamento<br />

para o gerenciamento das sementes para os plantios e a organizar um pedaço do terreno para centralizar os plantios<br />

de forma consorciada, um outro fator, são os longos anos de estiagens no Sertão tem trazido consequências que leva a<br />

perda de algumas variedades. “Lavoura quando perde uma, lucra outra, eu tenho isso comigo”, diz <strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong>. Mas<br />

como o sertanejo não desiste do seu torrão, a família vive na esperança por dias melhores, com chuvas certinhas para<br />

molhar a terra e “ver nascer à plantação”. O engajamento e a força de vontade nos filhos do seu <strong>Brasil</strong> em trabalhar<br />

com a terra e continuar com as experiências da guarda das sementes, renova as esperanças de que essa tradição seja<br />

perpetuada por longas gerações.<br />

Família de <strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong>


A propriedade foi adquirida pelo casal através da doação de 20 tarefas pelo pai de Dona Nete. Após o<br />

casamento, seu <strong>Brasil</strong> deixou a esposa e filhos trabalhando na terra e saiu para trabalhar em diversas<br />

firmas. “Conheci diversos Estados e cidade, conheci a Bahia, Minas Gerais e o Piauí”, porém com o salário<br />

que ganhava nos retornos para casa, foi empregando as economias na compra de mais terras, ampliando<br />

assim para 38,8 hectares (115 tarefas). No ano de 1992, ele retornou por completo às suas atividades da<br />

roça, ao lado da família. Atualmente, na propriedade, foram construídas as casas dos 4 filhos mais velhos<br />

que são casados, que moram e trabalham na propriedade. Mesmo diante das dificuldades financeiras,<br />

acreditaram que é possível viver com dignidade no pedaço de chão que pertence à família, e não saíram<br />

em busca de sobrevivência nas grandes capitais. A família cria ainda algumas cabeças de gado, ovelhas,<br />

porcos e aves.<br />

A busca pela água trazia muito sofrimento. “Naquele tempo, mãe de família sofria muito, a gente andava<br />

mais de duas léguas (12 km) para pegar água nos tanques, trazia em potes e em latas na cabeça, quem tinha<br />

um jumento era rico!”, diz Dona Nete. O sofrimento pela a busca do líquido precioso, a água, foi<br />

amenizada, após a construção de uma cisterna do programa “chapéu de couro”, do governo do Estado nos<br />

anos 80. “Aí as coisas foram melhorando, pois a família já podia contar com um reservatório para<br />

armazenar a água das chuvas e nos tempos das estiagens colocavam as águas dos carros pipas”.<br />

“Há 18 anos chovia bastante,<br />

dava para plantar mandioca, hoje,<br />

os fazendeiros desmataram tudo, a<br />

chuva foi embora.” conta dona<br />

Nete.<br />

Na propriedade, existe uma área de plantio de palma consorciada, (plantio com duas ou mais espécies de<br />

plantas diferentes) com árvores nativas, o local é bastante arejado, com terra fértil e propícia ao plantio. A<br />

palma é utilizada para alimentação animal e conservação das sementes.<br />

Dono de um invejável saber popular, <strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong> não utiliza defensivos químicos na propriedade. Todo o<br />

plantio é cuidado com defensivos naturais, que são produzidos a partir de ingredientes, como soro, urina<br />

de gado, cinza com água, que são utilizados para matar as lêndeas da palma, e no combate às pragas das<br />

hortaliças. Já o esterco do gado, a família utiliza como adubação na terra. Segundo <strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong>, “O pessoal<br />

acha que sou doido, mais eu aprendi essa experiência com o meu pai”.<br />

A tradição de guardar as sementes foi passada por seu pai que faleceu há 26 anos, e deixou-lhe a herança<br />

da preservação da semente do milho Hiba, que infelizmente esse patrimônio foi quase dizimado pelas<br />

grandes estiagens, conforme ele mesmo conta:<br />

“A gente fica na esperança e torcendo pela chegada das chuvas, e quando cai, eu começo a plantar”.<br />

Hoje a família de <strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong> é guardiã de uma grande variedade de sementes. Podemos destacar o milho<br />

Hiba e Catingueiro, Feijão Andu e cachinho, gergelim branco e preto, abobora jerimum e lagarteira ( leite ),<br />

girassol , soja, quiabo, sorgo, coentro, tomate cereja e pera, moringa, melancia chinchi, melancia comum,<br />

catingueira, ameixa, baraúna, facheiro, xiquexique, mandacaru, palma, amendoim, capim buffel, repolho,<br />

melão de gomo, frade, fava Paraná e castro, algodão e aroeira, pereiro, baraúna.<br />

<strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong> revelando o seu saber popular<br />

através das sementes crioulas<br />

Hoje, os recursos hídricos conquistados na propriedade de seu <strong>Brasil</strong> são uma cisterna de polietileno<br />

para o consumo humano, financiada pelo Ministério da Integração Social - Programa gerenciado pela<br />

CODEVASF; Cisterna calçadão de 52 mil litros para produção de alimentos do programa P1+2 da ASA<br />

(Articulação Semiárido <strong>Brasil</strong>eiro), financiada pelo Ministério de Desenvolvimento Social-MDS; e 02<br />

tanques barreiros adquiridos com recursos próprios. Já os filhos conquistaram as cisternas de 16 mil<br />

litros para o consumo humano e cisternas com capacidade de armazenar 52 mil litros de água do<br />

programa P1+2. Visando a segurança alimentar, a família se dedica há dez anos no plantio de hortas e,<br />

segundo <strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong>, colhem muitas verduras, tomate, pimentão, quiabo, coentro, couve, alface, repolho e<br />

a sobra dos produtos são vendidos para as famílias da comunidade, complementando assim, a renda<br />

familiar.<br />

Diversidade de sementes da família<br />

Para registrar a história das suas sementes, <strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong> faz um relato da idade das mais antigas, como por<br />

exemplo, as sementes de abóboras guardadas há 20 anos, a de tomate 16 anos, o melão e coentro 15 anos,<br />

milho catingueiro, 10 anos, feijão andu, 4 anos, a melancia caatingueira, 15 anos, as poucas sementes do<br />

milho hiba, 26 anos.<br />

<strong>Seu</strong> <strong>Brasil</strong> não tem um lugar grande para armazenar as sementes. O espaço é um pequeno quarto estreito,<br />

onde comportam algumas estantes de aços, silos de plásticos e uma balança que servem para a pesagem<br />

das sementes. Esses objetos foram conquistados pela família junto ao P1+2 (Programa Uma Terra e Duas<br />

Águas – Projeto da Articulação do Semiárido <strong>Brasil</strong>eiro) voltado ao apoio de bancos de sementes nas<br />

comunidades.

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