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Publicação Mensal Ano XIV - Nº 160 Julho de 2011
Contemplando a História
e os planos de Deus
Santo Inácio de
Loyola - Coleção
particular (cópia
do original de
Cláudio Coelho -
Madrid, Espanha).
G. Kralj
O
grande Santo Inácio, fundador da Companhia
de Jesus, à qual se deve a primeira e talvez
a mais gloriosa e mais eficaz das Contra-
-Revoluções, que é a Contra-Reforma, tornou-se famoso
pelo seu espírito pugnaz, pela sua penetração política,
sua psicologia finíssima e pela capacidade que possuía
de pregar extraordinários exercícios espirituais.
Homem capaz de guardar segredo, de fazer no silêncio
uma longa, complexa e subtil trama política,
dotado de um espírito de autoridade invulgar, Santo
Inácio exercia sobre os seus religiosos um mando total,
que fez da Companhia de Jesus o próprio símbolo
da obediência.
Entretanto, esse mando que Santo Inácio exercia sobre
os outros, ele começou por praticar sobre si mesmo:
é um homem que tem o completo domínio sobre si.
Ao contemplar sua fisionomia, tem-se a impressão
de que se estourasse uma bomba nas proximidades, ele
não se assustaria.
Se tivesse que pegar uma espada para combater, ele
não mostraria sanha, mas deveria ser um combatente
excelente. Entretanto, ele possuía não o hábito de esgrimir
com a espada, mas sim com argumentos. E,
por nobre que seja esgrimir com espadas, é mais nobre
ainda esgrimir com argumentos.
(Extraído de conferência de 17/1/1986)
2
Sumário
Publicação Mensal Ano XIV - Nº 160 Julho de 2011
Ano XIV - Nº 160 Julho de 2011
Contemplando a História
e os planos de Deus
Na capa,
Dr. Plinio em 1993.
Foto: M. Shinoda
As matérias extraídas
de exposições verbais de Dr. Plinio
— designadas por “conferências” —
são adaptadas para a linguagem
escrita, sem revisão do autor
Dr. Plinio
Revista mensal de cultura católica, de
propriedade da Editora Retornarei Ltda.
CNPJ - 02.389.379/0001-07
INSC. - 115.227.674.110
Diretor:
Antonio Augusto Lisbôa Miranda
Editorial
4 O Império Eterno
Datas na vida de um cruzado
5 Julho de 1935: Um Ano depois…
Dona Lucilia
6 As carruagens douradas
Conselho Consultivo:
Antonio Rodrigues Ferreira
Carlos Augusto G. Picanço
Jorge Eduardo G. Koury
Redação e Administração:
Rua Santo Egídio, 418
02461-010 S. Paulo - SP
Tel: (11) 2236-1027
E-mail: editora_retornarei@yahoo.com.br
Impressão e acabamento:
Pavagraf Editora Gráfica Ltda.
Rua Barão do Serro Largo, 296
03335-000 S. Paulo - SP
Tel: (11) 2606-2409
Hagiografia
12 Santo Henrique, Imperador
O elevado olhar teológico de Dr. Plinio
16 A História do Universo
e sua interpretação doutrinária - II
Perspectiva pliniana da história
22 O Império Romano nos planos de Deus
Calendário dos Santos
28 Santos de Julho
Preços da
assinatura anual
Comum .............. R$ 101,00
Colaborador .......... R$ 130,00
Propulsor ............. R$ 260,00
Grande Propulsor ...... R$ 430,00
Exemplar avulso ....... R$ 13,00
Serviço de Atendimento
ao Assinante
Tel./Fax: (11) 2236-1027
Luzes da Civilização Cristã
30 Na encruzilhada da História…
Última página
36 A poderosa intercessão de Maria
3
Editorial
O Império Eterno
Q
uem contempla a arte romana pode apalpar algo do aroma de grandeza do povo que maior
influência teve sobre a cultura ocidental. Roma é eterna em seus mosaicos dourados, nas
suas portentosas ruínas e nas estátuas de mármore onde se contemplam personagens hieráticos
que demonstram uma capacidade humana invejável. Lógica, autodomínio e desejo de grandeza
são predicados salientes naquelas fisionomias que parecem mais voltadas à eternidade.
As representações dos antigos patrícios parecem mitificar o romano como um herói acima da própria
natureza, não como mera utopia, mas com o empenho de refletir algo da alta concepção de plenitude
humana admirada pelo povo que conquistou reinos e impérios, que fez do Mediterrâneo uma
propriedade exclusiva, o Mare Nostrum.
Durante cerca de oito séculos, o Velho Mundo viveu sob a influência imediata das águias latinas
pendentes em seu vitorioso estandarte. Ainda hoje esta civilização é admirada em sua engenhosa arquitetura,
em suas técnicas militares, em sua arte de governar os conquistados, na ordem admirável
do seu Direito, na sua arte secular e na riqueza da literatura.
A perenidade da cultura romana é vista, por exemplo, no latim, o idioma da cultura. Durante séculos
foi usado nas universidades para transmitir o conhecimento humano. Inclusive após as invasões,
quando as províncias cederam lugar aos reinos germânicos, a língua de Cícero espalhou-se por toda a
Europa e se manteve pelos séculos através do inegável contributo da Igreja.
Os povos latinos, legítimos e imediatos herdeiros de Roma, espalharam as línguas românicas por
todos os continentes. Cerca de metade da população mundial usa o alfabeto latino, e quase um terço
da superfície terrestre é habitado por povos que têm por idioma uma das línguas românicas.
Roma é eterna. Entretanto, esta grandiosa perenidade do Império abrigou dois modos de conceber
o espírito romano. Duas cidades disputavam abertamente a herança dos gloriosos antepassados
do Lácio: Roma e Bizâncio. Ambas reluzem qualidades específicas nas expressões artísticas, nas formas
de governo e na mentalidade de cada cidadão.
Com o decorrer dos séculos, esta diferença foi se solidificando até o momento no qual, com a divisão
do Império em 395, a parte oriental passou a ser conhecida como Bizantina. Púrpura, cerimônia
e esplendor lhe eram palavras correlatas. A erudição, a inteligência e a diplomacia de Bizâncio procuravam
afirmá-la como única herdeira da cultura helênica e da grandeza latina.
Roma ou Bizâncio, quem haverá herdado a totalidade do espírito do Império? Como a Teologia
da História poderia definir a diferença psicológica dos romanos orientais e dos ocidentais? Qual era,
em última análise, o desígnio de Deus a respeito dessa maravilha de lógica, esplendor e grandeza vivida
com matizes diversos, porém harmônicos, pelas duas capitais?
No artigo deste mês, O Império Romano nos planos de Deus, Dr. Plinio discorre sobre a vocação de
uma das maiores civilizações da História. Para ele, as glórias de Roma e de Constantinopla serão objeto
de contemplação inclusive no Céu, pois somente na ultravida poder-se-á atingir a plena concepção
da grandeza deste Império que desde seus primórdios estava consciente de que nascera para ser
eterno.
Declaração: Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontífice Urbano VIII, de 13 de março de 1625 e
de 5 de junho de 1631, declaramos não querer antecipar o juízo da Santa Igreja no emprego de palavras ou
na apreciação dos fatos edificantes publicados nesta revista. Em nossa intenção, os títulos elogiosos não têm
outro sentido senão o ordinário, e em tudo nos submetemos, com filial amor, às decisões da Santa Igreja.
4
Datas na vida de um cruzado
Julho de 1935
Um Ano depois…
Um ano após a solene promulgação da
Constituição Federal, na qual Dr. Plinio
trabalhara assiduamente pelos interesses
da Igreja, as emendas católicas, entretanto, continuavam
em tese… Ficaria ele calado após tantas
lutas e esforços?
Enquanto se festeja ruidosamente o primeiro
aniversário da Constituição — e “O Legionário”
se associa de todo o coração a tais festejos,
pois que a Constituição Federal foi realmente
uma conquista — não será mau que os católicos
examinem o fruto que tiraram das emendas
que, tão laboriosamente, foram introduzidas em
nossa magna carta.
Quem escreve estas linhas lembra-se perfeitamente
de uma afirmação de Tristão de Athayde,
feita pouco depois de 16 de julho, e que lhe
causou profunda impressão, pois que encerra
uma verdade grave e evidente: “Até ontem — dizia
ele — podíamos atribuir à imperfeição das
leis vigentes o estado calamitoso em que se encontra
o Brasil sob o ponto de vista moral. Hoje,
porém, temos uma Constituição ideal, e de hoje
em diante a imperfeição das leis não mais poderá
servir de escusa à nossa situação, que passará
a ser fruto exclusivo da indolência e da inércia
dos católicos.” Quem ousará contestar afirmação
tão evidentemente verdadeira?
Pois já lá vão três centenas de dias que nossa
Constituição foi promulgada, e ainda nos encontramos
quase no mesmo estado em que estávamos
antes de 16 de julho.
Não foi regulamentado o casamento religioso.
Não foram introduzidas capelanias nas Forças
Armadas. Não sabemos de nenhuma alteração
no regime das relações entre a Igreja e o Es-
tado, a despeito da “colaboração recíproca” permitida
pela Constituição. A única conquista que
foi aproveitada foi o ensino religioso. E, assim
mesmo, em alguns Estados ainda não foi efetuado,
em outros começa apenas a ser posto em
execução e, finalmente, no nosso São Paulo, um
decreto matreiro o concedeu nas vésperas das
eleições, e outro decreto, mais matreiro ainda, o
regulamentou quando já estavam fora de perigo
certos interesses, depois do prélio eleitoral, estatuindo
que tal ensino apenas seria ministrado
durante meia hora por semana!
E por que isto? Porque os católicos, que souberam
apresentar-se coordenados e disciplinados
em 1932; deixaram-se empolgar, em 1934,
por ideais políticos febrilmente absorventes, que
deixaram em segunda plana as preocupações de
ordem religiosa.
Por que razão não foram ainda regulamentadas
nossas conquistas? Porque a atual Câmara,
que conta em seu seio com elementos de dedicação
à Igreja, compõe-se, através da maioria dos
seus representantes, de indiferentes. E estes indiferentes
nenhum compromisso particular têm,
em via de regra, com a consciência católica porque,
antes da eleição, o eleitorado católico não
lhes perguntou quais eram suas convicções religiosas,
mas apenas quais seriam suas paixões políticas.
E aí está o resultado: a grande maioria de
nossas conquistas é, até a presente data, inoperante.
Congratulem-se por esta bela situação os
católicos que puseram o facciosismo acima da
Religião.
(Extraído de “O Legionário”
de 7/7/1935)
5
Dona Lucilia
As histórias narradas
por Dona Lucilia
Em tudo, até mesmo na narração de uma simples história,
Dona Lucilia encontrava meios para cumprir o mais importante
dever materno: ensinar aos filhos os mais altos princípios,
conduzindo-os, assim, pelas sendas da salvação eterna.
Embora não ministrasse aulas
— não lhe cabia este dever
—, Dona Lucilia correspondeu
inteiramente ao papel de
mestra.
O papel de uma mãe consiste em
rezar pelo filho, desejar sua salvação,
fazer de tudo para ele ser inteiramente
de Nossa Senhora, amando
os princípios que são conformes
à Doutrina Católica e à razão. Isto
Mamãe fez profundamente, sendo
uma mãe exemplaríssima.
Como ela o fez?
Por exemplo, o modo de ela contar
histórias era muito especial.
Narrações imbuídas de
profunda seriedade
As várias histórias por ela narradas
tinham como principal intenção
a formação de minha alma, assim como
a de minha irmã e de uma primazinha
que era educada conosco.
De que modo ela contava essas
histórias?
Ela as contava com uma profunda
seriedade, mesmo porque ela não
narrava contos engraçados, pois ela
nem sabia fazer graças. Se bem que,
às vezes, para nos entreter, ela procurasse
dizer alguma coisa engraçada,
sua pessoa não se prestava a fazer
rir. Pelo contrário, eu tinha vontade
de admirar profundamente as
coisas sérias, afetuosas, amáveis e
cheias de sentido que ela dizia.
Desta forma, uma das histórias
que ela nos contava era a do “Gato
de Botas e o Marquês de Carabás”,
a qual me deixava simplesmente entusiasmado.
Um arquetípico Marquês
Como era a história?
Há tantos anos que eu a ouvi, que
eu me lembro dela apenas de modo
vago. Recordo-me de haver um gato
que usava botas colossais, as quais
lhe proporcionavam a possibilidade
de andar muito depressa, pois o
grande tamanho destas fazia os passos
do gato serem muito grandes, locomovendo-se,
por isso, muito rapidamente.
Eu me perguntava seriamente por
que Mamãe não mandava fazer sapatos
muito grandes para mim. Pois,
com minha monumental preguiça de
andar 1 , se eu tomasse calçados grandes
como os do “gato de botas”, com
poucos passos eu poderia transpor
distâncias consideráveis, o que para
mim seria uma solução de primeira
ordem.
O “gato de botas” era um felino
muito singular: Ele falava, podendo
assim entrar em contato com os homens
e fazer boas ações; mas, às vezes,
fazia também alguma malandragem,
constituindo o exemplo do espertalhão.
Por outro lado, ele era um
bom diplomata, pois sabia arranjar
bem as coisas.
Nas narrações de Mamãe, o enredo
da história girava em torno do
Marquês de Carabás, em cujas terras
vivia o gato. Esse Marquês era descrito
por ela como sendo um homem
muito rico, possuidor de um belo
castelo localizado no meio de um
trigal, inteiramente dourado, muito
bonito e abundante. Dito campo
era ceifado pelos colonos que viviam
a serviço do Marquês, e o trigo era
depois vendido, rendendo-lhe assim
muito dinheiro.
Sendo muito rico, o Marquês possuía
uma carruagem esplêndida,
dourada, com janelas de cristal, forrada
de seda. Na parte dianteira do
coche vinham os postilhões, e atrás,
os dois lacaios, que iam em pé numa
espécie de terracinho.
Quando o carro parava por ordem
do Marquês, os dois empregados
de trás pulavam depressa, e cada
um numa porta colocava um degrau
para auxiliá-lo a descer, pois as carruagens
eram bastante altas.
O Marquês de Carabás estava
sempre muito bem vestido, trajado
de seda e portando um chapéu de
6
três bicos com plumas brancas; seus
sapatos possuíam saltos vermelhos
que constituíam privilégio dos nobres;
e, do lado pendia-lhe uma espada
com a qual duelava, de vez em
quando, contra os que atentavam
contra o respeito a ele devido.
Não me lembro bem das razões
pelas quais, certa vez, o “gato de botas”
andou metendo-se com o Marquês
de Carabás, o qual, furioso,
mas com muita destreza, foi de espada
em cima do gato para matá-lo,
mas este, com seus calçados muito
grandes, saiu correndo.
Interesse por tudo
quanto dizia respeito
ao Marquês
Não me recordo do enredo da história,
mas quando Mamãe começava
a descrever o ambiente que cercava
o Marquês de Carabás — o qual me
interessava muito mais do que o “gato
de botas”—, eu começava a perguntar
como era a roupa do Marquês;
como eram suas botas e sua espada;
qual seria a soma de dinheiro
contida na bolsa que ele trazia consigo,
pois, sendo ele tão rico, deveria
levar muito dinheiro, ou, então,
apenas uma pequena quantia devido
ao medo de que lhe roubassem;
se ele tinha guardas para o acompanharem,
uma vez que era um homem
tão importante.
Eu também questionava a respeito
do trigal, se era todo o ano bonito
dourado, ou se havia épocas em que
o trigo era ceifado e a fazenda ficava
sem-graça. “O que fazia o Marquês
quando a fazenda ficava sem-graça,
como é que ele se divertia?”
Vê-se que eu estava muito mais interessado
pela instituição nobiliárquica
do que pelo “gato de botas”.
Dona Lucilia,
pouco antes de seu
casamento, em 1906.
Formação pelos exemplos
Eu perguntava toda espécie de
pormenores para Mamãe, e ela ia
7
Dona Lucilia
prevendo, com muito senso psicológico,
como eu gostaria que fossem
as coisas, e assim as descrevia. Desta
maneira, eu ficava encantado, porque
tanto o Marquês quanto o gato
eram sempre como eu queria.
No meio disso tudo entravam episódios
que constituíam a parte moralizadora
da história. Em certo momento,
por exemplo, o Marquês pregava
uma mentira. Então, Mamãe
mudava de fisionomia e ficava muito
séria. Nessas horas os olhos dela,
que eram de um castanho comum
aqui no Brasil, passavam a ser castanho-escuros.
Ela descrevia com muita censura
como o Marquês tinha mentido:
“Onde é que se viu isso, um homem
como o Marquês! Já um menino não
deve mentir — este quando mente
anda muito mal e merece um castigo
dos pais —, mas um homem já formado
que mente é uma coisa horrorosa!
O Marquês mentia porque desde
pequeno já se tinha habituado a
mentir, e quando ficou homem tornou-se
um mentiroso. Talvez tenha
faltado quem explicasse ao Marquês
que nunca se deve mentir.”
Percebe-se ser a narração calculada
para que eu, ouvindo-a, ficasse
com horror à mentira, e compreendesse
que se, já naquela idade,
me habituasse com a mentira, poderia
depois tornar-me um homem
mentiroso, sem palavra nem critério.
Ela ainda acrescentava outros casos
de castigos que recebiam os homens
que mentiam.
A loucura da mentira
Lembro-me, por exemplo, ouvi-
-la contar o caso de um parente dela
— assim nós saíamos do mundo dos
contos de fada para passar à realidade
— que estudava em São Paulo,
numa escola superior. Certa ocasião,
havendo uma greve em sua escola,
ele, homem de cabeça muito
quente e irritadiço, tomou parte na
greve, tornando-se um dos chefes
desta. Quando a greve chegou ao
auge, os dirigentes da escola acharam
que era preciso fazer algumas
concessões aos alunos. E, de fato,
isso fez com que os ânimos se acalmassem.
Os líderes diziam entre si:
— Vamos acabar essa greve? Eles
estão cedendo, vamos ceder alguma
coisa nós também.
Então, este parente colocou-se no
meio de todos e disse:
— Se vocês acabarem com essa
greve, eu a continuo sozinho. E se
eu ceder, vocês podem se considerar
no direito de, sempre que me encontrarem,
me cuspir no rosto. Pois,
eu sou um homem que tenho palavra
e não volto atrás, não sou um sujeito
sem palavra como vocês. Vocês
se incumbiram de fazer a greve e de
levá-la até o fim, agora não têm
coragem.
É uma atitude desparatada,
pois ele não tinha de fato
aquela convicção, e mentiu ao
afirmar aquilo.
O resultado foi que ele ficou
com o curso interrompido. Porque
se ele aparecesse na faculdade
iam cuspir nele, e, como ele não podia
tolerar aquilo, ele abandonou o
curso e não se formou.
Mamãe então dizia:
— Está vendo a loucura de
quem mente? Ele mentiu e
a mentira colou nele, e o impediu
de se formar. Era um
homem inteligente, mas
não teve curso superior. Por
quê? Porque mentiu. Você se
lembra ontem que você mentiu
a tal hora assim, e que ficou
uma coisa feia? Mamãe
falou com você.
Eu ficava muito impressionado
e envergonhado com
aqueles exemplos dela, e dizia:
— Sim, senhora, me lembro.
Ela aproveitava e dizia:
— Você se arrependeu, ou ainda
não está arrependido?
— Estou arrependido, sim, e peço
perdão à senhora.
Ela me beijava, me abraçava com
muito afeto e dizia:
— Então vamos voltar ao Marquês
de Carabás…
E eu já tinha as perguntas preparadas
para o resto da história.
O despretensioso desejo
de contemplar as
coisas mais elevadas
Quando Mamãe iniciou a descrição
da carruagem do Marquês de
Carabás, sem notar que eu estava
fazendo uma relação com as carruagens
dos reis de França vistas por
O Gato de Botas
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mim anos antes, e achando que todas
as carruagens eram iguais, comecei
a perguntar sobre os pormenores,
segundo as carruagens que
eu contemplara em Versailles. E ela,
com paciência e bondade enormes,
dizia:
— Não, a carruagem do Marquês
era assim...
No dia seguinte, eu acrescentava:
— Mamãe, eu estive pensando
bem. A carruagem não tinha pedras
preciosas do lado de fora?
Ela sorria com enorme amabilidade
e dizia:
— Ah! é verdade, tinha, sim.
Ela o fazia com indizível carinho
e afeto, com alegria de poder dar-
-me a certeza de que essa carruagem
imaginária era como eu pensava. No
fundo, ela estava alimentando o meu
desejo de contemplar o mais perfeito.
Tudo isso constituía um mundo de
maravilhoso e seriedade, mas também
um mundo de carinho e adaptação
à minha personalidade e a meu
modo de ser. Desta maneira, nos
queríamos inteiramente bem.
O casamento de
D. Pedro II
Além dessas histórias, ela contava
também coisas do passado da família,
apanhando o que havia de maravilhoso
no tempo dos avós dela.
Ela me contava, por exemplo,
que o Imperador D. Pedro II,
quando ainda jovem, foi o único
membro da Família Imperial a ficar
no Brasil. D. Pedro I tinha ido
para a Europa levando consigo sua
segunda esposa — a primeira havia
morrido —, Da. Amélia de Leuchtenberg,
e então D. Pedro II acabou
ficando sozinho aqui com José
Bonifácio de Andrada e Silva —
o homem da Independência —, tomando
conta dele.
Quando ficou mocinho, D. Pedro
deveria casar-se, e como naquele
tempo não havia fotografia, o modo
usado pelo Imperador para encontrar
alguém com quem se casar
foi mandar um diplomata à Europa
para percorrer as principais cortes e
trazer pinturas sobre marfim das várias
princesas que tinha encontrado.
Chegando de volta ao Brasil, este
lhe mostraria, acrescentando: “Essa
tem tal qualidade; essa tem tal outra.”
Nomearam para essa função um
Conde de Alcejur, o qual percorreu
a Europa, enviando pinturas para D.
Pedro II. Porém, este não achava nenhuma
que tivesse uma apresentação
de seu agrado. Afinal, veio do
Reino das duas Sicílias a pintura de
uma princesa muito bonita, distinta
e leve, da qual o Imperador gostou.
Um histórico e familiar
exemplo de caridade
Tendo a Imperatriz chegado ao
Brasil, houve um pomposo baile no
palácio imperial. Enquanto todos
dançavam, meu bisavô 2 — que era
deputado e membro do parlamento
— passou por uma sala contígua
à sala de baile e encontrou a Imperatriz
sozinha, sentada. Enquanto isso,
ao lado, todos dançavam alegremente.
Ele se aproximou dela, apresentou-se
e perguntou como ela ia passando.
Ao que ela respondeu:
— O senhor me pergunta como
eu vou? Não percebe que eu estou
aqui sozinha, sendo a Imperatriz, e
que ninguém está junto a mim? Isso
se deve ao fato de eu não dançar,
além de não ser bonita… Não atraio
a atenção de ninguém, e por isso sou
uma infeliz…
De fato, já quando a Imperatriz
chegara ao Brasil, Dom Pedro percebeu
que a pintura a ele enviada era
falha, pois ela era muito feia, além
de ser gravemente manca.
O meu bisavô ficou com pena dela
e disse:
— Vossa Majestade me permite
uma liberdade?
— Pode dizer.
— Eu estive estudando seu modo
de mancar. Se Vossa Majestade pisar
de tal modo assim, e depois assim,
ninguém percebe, e Vossa Majestade
pode andar de um modo normal,
e até mesmo dançar.
Então, a Imperatriz levantou-se, e
ele disse:
— Experimente, ande assim —
ensinando-a a dançar.
— Bem, já que o senhor foi tão
amável, eu o convido para dançar
comigo; vamos entrar no salão dançando
juntos. Vai ser uma surpresa
para todos do baile, além de uma
grande alegria para o Imperador.
Aquilo foi uma sensação no baile
e a alegria do Imperador.
Esta historieta, verdadeira, era
contada por Dona Lucilia com o intuito
de despertar em mim os sentimentos
bons, a pena das pessoas que
não andam bem, que claudicam, que
têm algum defeito, às quais é preciso
ajudar.
Isto era contado por ela de um
modo tão agradável, que eu ficava
suspenso nos lábios dela durante
todo o tempo da narração. No
dia seguinte eu chegava junto dela
e dizia:
— Mãezinha, eu quero mais uma
história.
— Qual?
Eu, às vezes, dizia:
— A história de vovô Gabriel com
a Imperatriz — e ela então repetia a
história.
Assim meu espírito foi amadurecendo.
v
(Extraído de conferência
de 7/8/1993)
1) Desde menino, Dr. Plinio possuía um
desvio na coluna, o qual lhe tornava o
andar muito penoso.
2) Dr. Gabriel José Rodrigues dos Santos.
9
Dona Lucilia
As carruagens douradas
Oponto alto de nosso passeio
a Versailles foi a visita aos
coches da família real, considerados
como as carruagens mais
lindas do mundo, as quais estavam
num edifício separado do palácio.
Eram altas, com rodas grandes e
estribos de dois degraus. Algumas
eram douradas, com pinturas delicadas
e plumas nos ângulos do teto, o
que me pareceu a perfeição da beleza.
Fiquei pasmo de admiração! Era
assim que eu imaginava a carruagem
do Marquês de Carabás, da história
do Gato de Botas! Parei diante de
uma carruagem linda, especialmente
ornada: era para o uso do rei e da
rainha, toda feita de madeira dourada
e cristal ligeiramente bombeado,
como uma bombonnière. O que
mais me atraiu foram os reflexos e
jogos de luz magníficos que aquilo
produzia! Senti-me arrebatado por
ver aquela maravilha; foi, para mim,
quase um êxtase!
Do lado de fora da porta desta
carruagem, entre o vidro e o piso, havia
uma cena de cores muito suaves,
representando um pastor e uma pastora,
com cordeirinhos, numa paisagem
de aurora, rósea e azul, com uns
rios de fundo. Aquela natureza mirífica
me parecia tão amiga dos pastores;
o verniz martel que cobria a cena
dava-lhe um aspecto tão belo, que
tive uma impressão de delicadeza de
todas as coisas, fascinando-me como
sendo o ambiente e a pátria de minha
alma.
Para minha felicidade, a porta estava
aberta e era possível ver a carruagem
por dentro, iluminada. Era
uma maravilha! As paredes eram
acolchoadas com tecidos magníficos.
Havia cordões para os viajantes
segurarem-se, com pingentes muito
bonitos; assentos revestidos de uma
seda de primeira categoria, cuja cor
estava entre o cinza quase prateado
e o azul muito claro; tapetes...
Dava-me a impressão de um pequeno
palácio ambulante! Então,
vendo que o interior era conforme
à parte externa, tive uma sensação
de autenticidade, como uma criança
que dá uma mordida num bonito
bombom e o acha delicioso. Essa
nota acentuou ainda mais o valor
que eu sentia na carruagem e
não consegui resistir! Entrei correndo
e comecei a passar a mão sobre
aqueles tecidos, pois embora eu tivesse
ótima vista, a minha tendência
era sempre tocar. Enquanto não
tocasse as coisas, parecia-me que
não as conhecera inteiramente! Porém,
quando tocava, às vezes quebrava...
E isso se prestava a protestos
de certas pessoas. Uma tia disse-
-me então:
— Monsieur Touche-à-tout, não
pegue nisso.
Eu respondi:
— Madame Remarque-tout, pense
em outra coisa!
Mamãe não gostou da minha resposta,
mas eu a achei saborosa. Senti-me
muito bem servido com a réplica
que dei! Entretanto, meu pai interveio:
— Não pode entrar! Tem de olhar
a carruagem de fora. Dê-me aqui sua
mão! Quem vai tomar conta de você
sou eu.
Ele receava que minha mãe não
tivesse força para me segurar... Eu
me senti derrotado,
fiquei quieto e continuei
analisando o
coche, entusiasmado,
pensando: “Quanta
doçura tem aqui!
Quanto Jesus Cristo está
presente nisto!”
Regalei-me com a carruagem;
mas não pela ideia de que
seria gostoso entrar nela e passear.
Sentia que, em si mesma considerada,
ela era delicada, harmoniosa
e fina, possuindo uma categoria em
função da qual minha alma se sentia
“em casa”... Em nenhum momento
passou-me pela mente a ideia de
possuir a carruagem. Eu queria vê-la
e dar graças a Deus por aquilo existir
com tanta pompa! E desejava que
todos os homens vissem e dessem
glória a Deus. A ideia de desejar alguma
daquelas maravilhas para mim
me pareceria tão louca quanto olhar
o céu durante a noite e querer possuir
uma estrela.
Seria um absurdo! Do mesmo
modo, eu não queria as grandezas
da Terra que não fossem proporcionadas
a mim, senão para admirá-las.
E este meu pensamento era exatamente
este: “Vou comprar Versailles
com a minha libra esterlina, para
poder admirá-lo!” Não me lembro
de um panorama no mundo que
me tenha deixado tão encantado como
aquele coche.
Chegou a hora de sair. Percebendo
que eu estava demorando demais
junto à carruagem, Mamãe disse várias
vezes:
— Meu filho, é preciso ir andando.
Vamos embora.
10
Mas eu não ouvia. Ela ter-me-ia
deixado permanecer ali o dia inteiro,
se eu quisesse, mas os familiares
fizeram certa pressão; ela então pediu
a meu pai, que estava um tanto
distraído:
— João Paulo, traga o Plinio.
Recordo-me de que ele estava
usando capote. Puxou-me pela mão
— sem brutalidade, pois era um homem
muito pacífico — e disse:
— Plinio, nós agora vamos! Chegou
o momento de sair.
Eu não disse nada, mas permaneci
onde estava. Ele me puxou um
pouquinho mais, dizendo:
— Plinio, vamos!
Eu respondi:
— Não! Nós não vamos.
Ele não esperava essa resposta e
disse:
— O quê? Venha logo, estou mandando.
Você vai ter de ir embora!
— Não! Vou provar que não vou!
Escapei da sua mão, agarrei-me
com ambos os braços aos raios de
uma das rodas da carruagem e disse:
— Agora quero ver!
Ele possuía um temperamento
muito calmo e indulgente, mas não
ia perder tempo com um menino de
quatro anos... Lembro-me dele, disfarçando
um sorriso e fingindo estar
zangado.
Tomou-me pelo braço e disse com
afeto:
— Você vai ou não vai? Porque
senão eu te levo.
— Eu não vou. Daqui eu não saio.
Vou ficar aqui, olhando.
— Você vai ver.
Ele ia resolver isso de modo paterno
— ou seja, com um safanão
— mas, nesse momento, Mamãe se
aproximou e perguntou:
— O que há?
Eu disse:
— Mamãe, diga-me uma coisa:
qual é o preço deste castelo?
— Meu filho, há certas coisas no
mundo que valem tanto, que ninguém
possui dinheiro para
comprá-las. Este castelo não
tem preço.
Mas continuei, tirando
do bolso a minha libra
esterlina:
— Não, isso não é
tanto assim! Meu tio
me deu ontem uma moeda!
Quem sabe se, entregando
isto, posso ficar
dono de Versailles e morar
aqui? Vamos falar com o gerente
e compramos o palácio!
— Hii, meu filho! Não dá nem para
comprar uma pedra do caminho
do castelo!
— Mas é de ouro...
Ela sorriu com muita amenidade
e explicou-me que, mesmo assim,
era impossível. Eu não fiquei muito
persuadido, mas tive de aceitar. Foi
o primeiro cálculo financeiro que fiz
em minha vida e, desde então, nunca
consegui bom resultado nas finanças...
Então meu pai me suspendeu
pelo tronco, tirou os meus braços
de lá e levou-me para o táxi, no
qual fomos até a estação. Aquilo me
deixou profundamente inconformado
e muito saudoso da carruagem. O
automóvel não me causava o menor
interesse, mas tive de ceder diante
da força. Comecei a aprender que os
acontecimentos da vida nem sempre
transcorrem como desejamos...
(Extraído da obra
“Notas Autobiográficas”,
de Plinio Corrêa de Oliveira)
11
Hagiografia
Santo Henrique,
Imperador
Fotos: S. Hollmann; Wikipedia.
Comentando Santo Henrique, Dr. Plinio
procura mostrar o contraste entre a figura
deturpada que se formou da santidade,
e a personalidade varonil, sagaz, guerreira,
humilde e combativa deste santo imperador.
Em geral, as pessoas têm a
respeito da santidade uma
ideia unilateral. Pensam
que a santidade consiste apenas em
sorrir, em estar de acordo com tudo
e a tudo perdoar. Porém, muitos não
têm ideia do vulto completo e da fisionomia
geral da santidade.
Isso se deve, em parte, às imagens
que se produziram nos últimos vinte
anos, ou nos últimos trinta anos,
em que apresentam os santos com
umas carinhas lisinhas e um olharzinho
meigo, quando, na realidade, se
trata de santos que tiveram uma extraordinária
personalidade, a ponto
de marcar a sua época.
A verdadeira face
da santidade
Quando eu estive na Itália, em
Pádua, há alguns anos atrás, fui visitar
o famoso santuário de Santo
Antônio, onde se encontra o corpo
do santo. Lá eu vi uma obra de um
grande pintor, quase contemporâneo
deste santo, chamado Giotto.
É a imagem mais próxima da fisionomia
de Santo Antônio que se
conhece: homem alto, possante, com
fisionomia severa e com uma atitude
hercúlea.
Eu comprei uma fotografia desse
quadro e depois fui para a sacristia.
Na sacristia vendiam ao povo santinhos
representando Santo Antônio:
um rapaz sem nada de varonil, imberbe,
coradinho, dando a impressão
que tinha usado carmim, sua fisionomia
era a de quem diz: “Eu estou
com medo”…
Quer dizer, apresenta-se o santo
sem personalidade, um ente sem arrojo
e privado do conjunto das virtudes,
sem as quais ninguém é santo. O
santo é declarado herói nas três virtudes
teologais e nas quatro virtudes
cardeais. Virtudes teologais: fé, esperança,
caridade. Virtudes cardeais:
justiça, fortaleza, temperança,
prudência. Uma das virtudes sem a
qual ninguém é santo é, portanto, a
virtude da fortaleza.
No que consiste a virtude da fortaleza?
Consiste em ser capaz de empregar
toda a força necessária nas lutas
que neste mundo devemos travar contra
nós mesmos, contra os inimigos da
fé e contra os inimigos da Igreja.
É preciso restaurar, aos olhos das
pessoas, a verdadeira fisionomia da
santidade, que inclui exatamente essa
coragem. E por essa razão escolhi,
para comentar na reunião de hoje,
um modelo de coragem masculina:
Santo Henrique,
Imperador - Catedral de
Estrasburgo, Alsácia.
12
Santo Henrique, Imperador do Sacro
Império Romano Alemão.
Vida repleta de
fatos memoráveis
Santo Henrique colocou seu exército
sob as bênçãos especiais de Deus,
valendo-se da proteção dos grandes
santos preferidos do seu povo. Elegeu
dentre eles Santo Adriano, oficial
mártir, cuja espada se guardava ciosamente,
como relíquia, desde antigos
tempos, em Valbach.
Assim armado, organizou um exército
para reprimir as invasões bárbaras
dos povos do Norte, vencendo-os na
Polônia e na Boêmia. Quando defrontaram
os eslavônios, muito superiores
em força, Santo Henrique determinou
preces coletivas e a comunhão geral do
exército. Ao se apresentarem as primeiras
tropas para o combate, verificou-
-se pânico súbito entre os inimigos que,
desorganizados, fugiam em debandada.
Os anjos combateram e derrotaram
os eslavônios. Os inimigos se submeteram,
ficando Boêmia, Morávia e Polônia
tributárias do Sacro Império.
Promoveu, a seguir, uma reunião
de bispos em Frankfurt, com o objetivo
de fomentar a disciplina eclesiástica
nos seus estados.
Por duas vezes teve que subjugar os
lombardos, que ameaçavam os Estados
Pontifícios. Na primeira vez, após submetê-los,
foi coroado, em Pavia, Rei da
Lombardia, cingindo a célebre coroa de
ferro desse reino. Numa segunda vez,
sua atuação foi além da pacificação
dos lombardos, pois graves problemas
afligiam a Igreja: o antipapa Gregório
movia disputa contra o legítimo Papa
Bento VIII. Por esses dias do ano de
1014, em plena Idade Média, portanto,
recebeu ele e a Imperatriz uma das
maiores homenagens de suas vidas: visitando
o Papa, foram solenemente coroados
Imperadores dos Romanos.
O Pontífice presenteou o santo com
um globo de ouro cravejado de pérolas,
encimado de uma cruz, emblema de
dignidade imperial. O monarca, dignificado
por tantas honras e para perpetuar
a lembrança dessas homenagens,
transferiu o globo e a coroa às mãos de
Santo Odilon para dotar o célebre mosteiro
de Cluny, do qual este era abade.
Outra oportunidade teve ainda o
monarca de concorrer para o bem da
Cristandade. Aproximou-se de Estevão,
Rei da Hungria, príncipe ainda
pagão e que carecia vir com seu povo
ao grêmio das nações cristãs. Santo
Henrique ofereceu-lhe aliança e sua
piedosa irmã, Gisela, por esposa. Ganhou
ele um Santo Estêvão, cuja conversão
foi maravilhosa, um grande rei
para a Igreja e um santo para o Céu.
Teve de empenhar-se novamente
em campanhas na Itália. Enquanto
consolidava os estados no interior,
e assegurava a paz com os vizinhos de
Leste, os lombardos, associados aos
gregos e normandos, assolavam as
províncias da Itália. O monarca preparou-se
para castigá-los. Derrotou-
-os em várias batalhas, repelindo uns e
subjugando outros. Reintegrou a Igreja
na posse das terras invadidas, ocupou
Nápoles, Salerno e Benevento e
restabeleceu a paz na península.
Ao voltar para a Alemanha, teve com
Ricardo, o Bom, Rei dos franceses, a
célebre entrevista do rio Mosa na qual
se entenderam amistosamente os dois
príncipes acerca dos grandes problemas
cristãos e políticos da Europa. Dispunha
o cerimonial que o encontro se desse
no meio do rio, cada um em seu barco.
Santo Henrique, em atenção às virtudes
do príncipe francês, resolveu quebrar
os rigores do protocolo: atravessou
o Mosa com seu séquito e foi saudar o
Rei da França na margem oposta. 1
Invasão dos bárbaros
e início da Idade Média
A ficha é um pouco longa, pois a
vida desse santo é tão cheia de atos
memoráveis, que dela não se poderia
ter uma ideia sem que vários elementos
de sua biografia fossem mencionados.
Para compreendermos bem o
conjunto desses fatos, é preciso situá-
-los em seu contexto histórico: plena
Idade Média, no ano de 1014.
Como é sabido, a Idade Média se
iniciou com a queda do Império Romano
do Ocidente. O Império Romano
foi invadido por uma quantidade
incalculável de bárbaros, completamente
selvagens, os quais, estabelecendo-se
no território do Império,
sujeitaram os romanos ao seu
domínio.
Aos poucos, toda a antiga população
romana foi caindo na barbárie
também. Então, as estradas não
tinham mais quem delas cuidasse; os
aquedutos que levavam água às cidades
se rompiam; as cidades afundavam
na sujeira; os palácios eram agora
habitados por bárbaros selvagens
que se degradavam completamente;
as obras de arte eram quebradas nas
ruas. Em suma, tudo o que pudesse
representar civilização e cultura era
miseravelmente liquidado.
Aos poucos, sob o bafejo da Igreja
— a única organização que continuou
a existir depois que tudo se dissolveu
—, a Europa foi sendo reconduzida
ao estado de civilização. Os
bárbaros se converteram e, então,
foram progredindo, à semelhança de
uma tribo selvagem aonde chega um
missionário.
Desta maneira — por mais que
ainda estivesse abaixo do que ela estaria
duzentos ou trezentos anos depois
—, por volta do ano 1000 a civilização
já se encontrava bastante
adiantada no que diz respeito ao estado
originário dos bárbaros. Ou seja,
trata-se de um estado semibárbaro.
Ademais, alguns povos eram mais
civilizados do que outros, havendo,
portanto, dentro do continente europeu,
ilhas de Cristandade, ilhas de Civilização
Católica incipiente no meio
de conglomerados de povos que, sendo
bárbaros pagãos, estavam sempre
atacando e lutando de maneira a tornar
a vida dos católicos dificílima.
13
Hagiografia
Formação do Sacro
Império Romano Alemão
O povo germânico, que ocupava
mais ou menos o território onde hoje
se situa a Alemanha, a Áustria, parte
da Tchecoslováquia e a Suíça, foi um
dos primeiros a se converter. Após se
civilizarem, os germanos constituíram
uma entidade política chamada o Sacro
Império Romano Alemão.
No fundo, tratava-se de uma liga
dos povos cristãos contra a barbárie.
E, como essa liga abrangia uma extensão
grande de território, chamavam-
-na Império; Romano, por ser uma reminiscência
do antigo Império Romano,
que tinha abrangido toda a Terra;
e, por fim, Alemão, pois o núcleo do
Império eram as nações alemãs. Porém,
acima de tudo, era um Sacro Império,
pois sua principal finalidade
consistia em defender a Religião Católica
contra a agressão dos pagãos.
Deus é quem dá a vitória
Santo Henrique foi eleito Imperador
do Sacro Império Romano Alemão,
sendo colocado numa situação
onde nem sempre a hagiografia popular
mostra os santos. Ele estava à
testa de toda a organização política
da Europa de seu tempo, era o homem
mais poderoso do continente.
Mas, ao mesmo tempo, ele tinha a
obrigação de ser o melhor político e
o melhor filho da Igreja.
Ele era, por excelência, o filho da
Igreja, aquele que devia protegê-la
em suas necessidades contra a barbárie.
E como acontece sempre com
os santos, ele desempenhou magnificamente
suas funções.
Havendo hordas bárbaras que continuamente
agrediam o seu povo, o
santo monarca armou-se de força,
constituiu um exército e o conduziu à
guerra. Porém, por ser um herói católico,
um homem de fé, ele sabia que
não bastava lutar fazendo uso das forças
humanas e naturais, mas era preciso
contar com os recursos sobrenaturais.
Por isso, ele pedia a Deus que lhe
desse a força necessária para vencer.
Então, para mostrar ao santo
quanto suas orações Lhe eram gratas,
em certa ocasião, Deus fez um
grande milagre: no momento em
que as tropas dos eslavônios, mais
numerosas do que as germânicas, estavam
prontas para o combate e os
Santo Henrique
estava à testa de
toda a organização
política da Europa
de seu tempo, era o
homem mais poderoso
do continente. Mas,
ao mesmo tempo ele
tinha a obrigação de
ser o melhor
político e o melhor
filho da Igreja.
exércitos postos frente a frente, vê-
-se que os pagãos começam a fugir
em debandada: os anjos haviam lhes
aparecido, incutindo-lhes terror.
Desse modo, Deus dava a entender
como Ele considerava a oração:
pela prece de Santo Henrique, Deus
dispensou seus heróis do combate.
Assim, a pressão pagã foi quebrada
e uma das garras do paganismo, contra
os católicos, liquidada.
Reconhecimento
pontifício dos
serviços prestados
Entre os inimigos da fé, havia também
os lombardos, os quais tinham
sua capital na cidade de Milão, hoje
Itália, onde formavam um reino de
hereges. Eles não eram propriamente
pagãos, mas sim hereges arianos.
Santo Henrique desceu, então,
pela Lombardia, atacou os lombardos,
quebrou-lhes o poder e foi depois
até Roma, a fim de visitar o Papa.
Foi nessa ocasião que o Romano
Pontífice coroou-o, junto com sua
esposa, Imperador do Sacro Império
Romano Alemão, numa cerimônia
realizada com grande esplendor.
Deu-lhe também de presente uma
Coroação Imperial de Santo Henrique.
14
esfera de ouro, cravejada de pérolas,
representando seu poder sobre
toda a Terra.
Mas, para provar seu amor à
Igreja, Santo Henrique não ficou
com o tesouro: deu-o a Santo
Odilon, Abade de Cluny, chefe
da maior Ordem Religiosa da Europa
naquele tempo.
Voltando para a Alemanha,
Santo Henrique derrotou novamente
os lombardos, quebrando
definitivamente seu poder.
Insigne ato de
apostolado e esplêndida
manobra política
Sendo um tão grande batalhador,
Santo Henrique mostrou-se
também um hábil político.
Na Hungria, havia um rei que,
apesar de ser pagão, era famoso por
sua virtude. Compreendendo que,
por demonstrar ser virtuoso, tal rei
poderia ser atraído para a Religião
Católica, ao invés de atacá-lo, Santo
Henrique mandou pedir uma entrevista
com ele, e ofereceu em casamento
sua irmã, Gisela, de grande
formosura e muito virtuosa.
O Rei da Hungria, chamado Estêvão,
aceitou. Gisela cumpriu a tal
ponto sua missão de converter o rei
que este se tornou um santo da Igreja
Católica, o qual converteu toda a
Hungria.
Com isso, por uma manobra diplomática
inteligente e muito bem
sucedida, o Imperador estendeu os
limites da Cristandade até além do
Danúbio, conquistando um amigo
onde ele tinha anteriormente apenas
inimigos.
Grande por ser católico
Já naquele tempo havia uma secular
rivalidade entre alemães e franceses:
povos com índole e temperamento
diferentes, e com questões de
fronteira complicadas de resolver.
Wikipedia
Santo Estêvão, Rei da Hungria, e sua esposa
Rainha Gisela - Fontevraud, França.
Para o bem da
Cristandade, Santo
Henrique aproximouse
de Estêvão, Rei da
Hungria, príncipe
ainda pagão e que
carecia vir com seu
povo ao grêmio das
nações cristãs.
Mas, nesse tempo, a França era
governada por um muito bom rei, e
o Sacro Império Romano Alemão
por um santo imperador. Pelo que,
um acordo entre ambos não foi difícil.
Santo Henrique, muito bom diplomata,
quis ter um encontro com
esse rei para ajustarem todos os problemas
políticos da Europa, porque
os dois principais países da Europa
cristã eram a Alemanha e a França.
Então, foram encontrar-se junto ao
rio Mosa.
O protocolo mandava que, por serem
dois soberanos importantes, nenhum
fosse à terra do outro, pois
aquele que fosse à terra do outro,
por assim dizer, prestava homenagem
à importância do outro. Então,
deveria ser feito um encontro
no meio do rio, em duas barcas.
Trata-se de um rio de curso de
água tranquilo, onde esse encontro
comodamente podia ser feito. Preparou-se
a barca do Imperador, assim
como a do Rei da França.
O Imperador, sendo mais importante
que o Rei da França, embora
esse fosse muito importante
também, podia pretender que
o rei fosse ao seu território. Mas
sendo um homem cheio de espírito
católico, e bom diplomata, Santo
Henrique fez o contrário: entrou
na barca e preparou uma surpresa
ao Rei da França, atravessou
o rio e desembarcou. Quer dizer,
o que era mais foi prestar homenagem
ao que era menos, fazendo sentir
pela sua atitude cordial que ele estava
cheio de boas disposições, de boas
intenções. De fato, realizaram-se então
conversações muito cordiais, que
concorreram para a paz dos dois países
e para regular todos os problemas
da Europa daquele tempo.
Essa é a história de Santo Henrique:
Um grande católico e um grande
santo, que por ser católico, foi
grande rei, grande militar, grande
guerreiro, grande diplomata, grande
político, morrendo aureolado de toda
espécie de êxitos e sucessos. v
(Extraído de conferência
de 14/1/1970)
1) Não possuímos referência da ficha comentada
por Dr. Plinio nessa ocasião.
Errata: Por um erro na transcrição da
conferência feita por Dr. Plinio em
25/6/1976, no artigo desta seção do
mês passado (junho), registrou-se,
nas páginas 10 e 11, o termo “hermetismo”
ao invés de “eremismo”, o
qual representa um neologismo criado
por Dr. Plinio para significar a vida
enclausurada, religiosa, eremítica.
15
O elevado olhar teológico de Dr. Plinio
A História do Universo
e sua interpretação
doutrinária - II
Após discorrer acerca do fim último da Obra da Criação,
Dr. Plinio continua sua exposição explanando os meios estabelecidos
pelo Criador para que esse fim fosse realizado, e qual
o uso que deles suas criaturas fizeram.
Por que se deu a queda dos
anjos?
Logo após criá-los, Deus
queria que eles Lhe dessem a glória devida.
Porém, aconteceu que Ele criou
os anjos como seres livres — e tinha
que criá‐los como seres livres —, e uma
parte dos anjos, induzida por Satanás,
recusou a homenagem devida a Deus.
S. Hollmann.
A prova dos anjos
A felicidade deles era de uma natureza
completa, perfeita, sem defeito
e alcançando seu fim; não era a visão
beatífica, mas um conhecimento
intelectivo altíssimo de Deus.
A prova dos anjos deu-se porque
Deus lhes revelou a Encarnação
do Verbo; e mostrou que a Segunda
Pessoa da Santíssima Trindade haveria
de se unir hipostaticamente, não a
um anjo, mas a um homem; e eles deveriam
adorar esse Homem‐Deus. 1
Compreendemos que isso é uma
coisa muito mortificante para o orgulho
deles.
Imaginem, por exemplo, Satanás
— o maior, o mais magnífico de todos
— que ouve dizer:
Anunciação - Catedral de Manresa, Espanha.
16
S. Miyazaki
— Deus vai constituir uma união
hipostática!
Ele pensa: “Me voilà! Sou eu.”
Mas ele fica sabendo que não será
ele o escolhido. Sua reação: “Como?
Que anjo Ele escolheu?”
— Nenhum anjo. Vai haver homens
e vai ser um homem. E a este
homem você vai ter que adorar.
Podemos imaginar a constrição revoltada,
imunda, mas autêntica, explicável
— explicável à maneira de
defeito — de Satanás diante do fato:
“Então, todo o meu brilho, todo
o meu talento, toda a minha sabedoria,
todo o meu charme, toda a
preeminência que eu tenho sobre todos
os espíritos angélicos, isso é nada?
Na hora da melhor predileção,
da maior honra, da preferência mais
excelsa, lá vai um homem?
Entretanto, para Satanás o pior
foi a seguinte revelação:
— Não só Ele — que, afinal, é
Homem‐Deus —, mas a Mãe d’Ele,
Maria Santíssima, que é pura criatura,
recebe tal honra em ser Mãe
d’Ele que vai ser Rainha de todos
vocês. E um bater de sobrancelhas
d’Ela moverá todos os anjos.
Evidentemente, eles foram tentados
internamente. Até há um problema
de Filosofia curioso: como, sendo
Dr. Plinio na década de 1990.
puros espíritos e sem nenhum defeito,
eles puderam sofrer a tentação? Se
neles não havia defeitos, como é que
de dentro deles surgiu o mal? É um
problema interessante para ser estudado.
O que, aliás, levaria muito tempo,
e não é o caso de analisar aqui.
Não é, portanto, uma tentação
que lhes veio de fora para dentro,
mas veio de dentro para fora. E
diante da ordem sobrenatural, eles
recusaram.
Então, o demônio recusou a homenagem
devida a Deus.
Resultado da revolta: Proelium
magnum factum est in caelo! —
Fez‐se nos Céus uma grande luta!
São Miguel colocou as coisas nos termos
em que deveriam ser colocadas.
Então, os tronos dos anjos nos
Céus ficaram vazios: os anjos que caíram
desfalcaram a coleção.
Como preencher
os vazios?
A Humanidade não foi, propriamente,
feita para preencher as clareiras
deixadas entre os anjos pela queda
de Satanás. Pode‐se admitir que,
embora os anjos não tivessem pecado,
Deus criasse os homens. Seria muito
bonito que Deus quisesse tomar
um esquema de todas as possibilidades
da Criação e realizá‐lo: realizando
o puro espírito, o animal com espírito,
o animal sem espírito, a planta e
a matéria; é uma espécie de esquema
das possibilidades de uma Criação. E
é possível que Ele fizesse isso, ainda
que os anjos não tivessem caído.
Mas, uma vez que os anjos caíram,
pôs‐se o problema: como remediar
a queda dos anjos? E o remédio
estava nos homens.
Com a queda dos anjos, foi conforme
a sua Sabedoria constituir um
plano segundo, no qual os homens
fossem ocupar os tronos dos anjos
e completar as harmonias que ficariam
deficientes no Céu.
Era como quem, perdendo alguns
músicos de uma orquestra, chama
outra orquestra para fazer um novo
conjunto. E surge a vocação do homem
para preencher os lugares dos
anjos no Céu e formar com os anjos
uma só imagem de Deus para cantar
uma só glória de Deus.
Deus criou os homens
no Paraíso
Deus, então, criou os homens.
Qual era o papel dos homens para
realizar a glória de Deus?
Deus criou os homens no lugar
mais magnífico de todo o universo:
o Paraíso Terrestre. A intenção d’Ele
era que os homens, vivendo no Paraíso,
tivessem já a vida da graça; que
eles vivessem nesta Terra ainda sem
a visão beatífica, embora Deus falasse
com eles com frequência, se manifestasse
a eles com frequência, e que
quando eles chegassem ao fim da vida
fossem levados vivos para o Céu.
Convém não ter uma visão do Paraíso
à maneira do mundo de Walt
Disney. É impossível ter uma visão
mais primitiva e mais boba do que
essa, que não é nem um pouco o que
ensina a Teologia.
Os homens no Paraíso deveriam,
pelo seu talento, fazer cultura, civiliza-
17
O elevado olhar teológico de Dr. Plinio
S. Hollmann
com tintas desta Terra, mas com uma
tinta feita com uma flor azul do Paraíso.
Que azul ele obteria? O que
seria, no Paraíso, um quadro de Fra
Angelico? Não se pode imaginar!
Compreende-se, assim, qual era o
chamado do homem no Paraíso.
Pois bem, esse plano ruiu por causa
do pecado original!
Castigos devidos ao
pecado original
ção, sistemas artísticos, literatura; tudo
aquilo que o homem faz aqui, ele deveria
fazer lá. Mas ele o deveria fazer de
um modo muito mais magnífico do que
aqui; acrescido pelo fato de que o homem,
pelos dons sobrenaturais que tinha,
possuía uma ciência enorme.
Diante de Adão desfilaram todos
os bichos, e ele deu a cada bicho o
nome de acordo com sua natureza.
Quer dizer, ele era um zoologista fabuloso
e um linguista extraordinário.
Ele encontrou logo a palavra para
chamar cada bicho por seu nome,
pela sua nota distintiva natural.
Imaginemos dois, cinco, dez bilhões
de homens vivendo durante
dezenas ou centenas de séculos
no Paraíso, acumulando tudo isso: o
que poderia ser o Paraíso?
Nós não podemos ter ideia do que
poderia ter sido a civilização humana
no Paraíso e a glória que teria dado
a Deus.
O plano de Deus
para com os homens
no Paraíso
Mas, nós devemos reter daqui alguns
pontos fundamentais para compreendermos
o resto.
Catedral de Notre Dame - Paris, França.
Essa obra de glorificação de Deus
deveria ser executada pelos homens
vivendo juntos, quer dizer, influenciando‐se
uns aos outros, colaborando
uns com os outros.
No Paraíso, todas as pessoas boas
ficariam melhores vendo as outras, e
vendo o conjunto dos homens, que
era ótimo, melhor do que cada homem
particular. Com isso os homens
iam se santificando.
Por outro lado, não só os homens,
mas toda a cultura e toda a civilização
dominantes no Paraíso seriam
um instrumento para a santificação
dos homens.
Em síntese, os homens deveriam
viver juntos para santificarem‐se; deveriam,
para se santificar, viver numa
ordem temporal perfeita; deveriam
atuar sobre a natureza, tornando‐a
muito mais semelhante a eles
mesmos e a Deus.
Dante chama as obras do homem
“netas de Deus”, porque o homem é
filho de Deus e a obra de arte é filha
do homem, logo, é neta de Deus.
Então, o Paraíso ainda ficaria inconcebivelmente
mais belo com a presença
das obras dos homens.
Imaginemos, por exemplo, Fra
Angelico pintando no Paraíso, não
O homem foi expulso do Paraíso,
perdeu os dons sobrenaturais e preternaturais
que possuía. E, pelo pecado,
foi sujeito a apetências desregradas,
sua inteligência se obnubilou,
sua vontade se enfraqueceu.
Não imaginemos que no Paraíso
as pessoas seriam como são agora
na Terra. No Paraíso seria uma
coisa horrenda um indivíduo deitar
uma lágrima, a menos que fosse
uma destilação sublime, de uma cor
magnífica, de um perfume incomparável;
e não resultante da dor, mas
apenas da plenitude de uma emoção
de alegria. Essas nossas lágrimas
torvas, salgadas, feitas ao longo
de uma careta em que a pessoa chora,
para o Paraíso seria uma verdadeira
degradação.
A sociedade deve
construir um estado,
uma cultura, uma
civilização como
meio de santificação;
os homens devem
produzir obras de arte
e de cultura de toda
ordem, não só para
seu serviço, mas para
embelezar a natureza
feita por Deus.
18
Tudo era ultralindo, ultraperfeito,
inteiramente superior. Nós não temos
ideia de como era.
O plano de Deus
após o homem ser
expulso do Paraíso
Mas, após o pecado começou a vida
nesta Terra.
Entretanto, mesmo fora do Paraíso
o plano de Deus continuou o mesmo,
porque a natureza humana continuou
fundamentalmente a mesma.
E esse plano consiste essencialmente
no seguinte:
Primeiro: os homens devem santificar‐se
juntos, formando uma sociedade.
Segundo: essa sociedade deve construir
um estado, uma cultura, uma civilização
como meio de santificação.
Em terceiro lugar: os homens devem
produzir as obras de arte e de
cultura de toda ordem, não só para
seu serviço, mas para embelezar a
natureza feita por Deus.
Consideremos, por exemplo, a
Sainte Chapelle, ou Notre‐Dame. São
sacrossantas, e indicam bem como
o homem pode tornar mais belas as
coisas de Deus.
Temos esplêndido elemento de meditação
na observação da Catedral de
Notre‐Dame vista pela parte de trás:
o Sena, na ilha a abside de Notre‐Dame,
e, de ambos os lados, plantadas
com mão de francês, trepadeiras e árvores
que vegetaram e se desenvolveram
em ar francês, e deram plantas de
francês. Coisas positivamente lindas!
O rio Sena do tempo dos selvagens
devia ser “poca”, mas entrando a mão
do católico, entrando o sobrenatural,
as coisas tomaram outro jeito; e aquela
mesma água está lindíssima.
Veneza! Os senhores sabem que
era um pântano, uma charneca de lo
último com, de vez em quando, umas
ilhas; mas ilha no meio de lodo não é
senão sujeira mais dura no meio da
sujeira mais mole. Era um lugar horrendo.
Eu posso imaginar os maus
cheiros, as umidades antes de Veneza
ser Veneza; talvez infestada até
por alguns demônios, porque eles
gostam de habitar lugares desses. Os
venezianos ocuparam aquilo, drenaram,
separaram a água e saiu Veneza;
tudo esvoaçou e levantou‐se a catedral,
bimbalhando com seus sinos
a glória de São Marcos por cima da
glória de Veneza.
São exemplos do que faz o homem
acrescendo a glória de Deus
nesta Terra.
Na História da Humanidade, nota-se
o seguinte: Deus está sempre
induzindo os homens a desenvolver
uma ordem perfeita, e os homens
sempre estão fugindo de fazê-lo; e
Deus então passa para o plano B, para
o plano C, para o plano D... E cada
vez que Ele passa para outro plano,
inaugura uma maravilha maior.
O plano de Deus na
Era Patriarcal
Por exemplo, na Era Patriarcal, os
descendentes de Adão conheciam a
religião verdadeira e tinham a possibilidade
de criar uma ordem patriarcal
boa. E Deus lhes dava graças para
isso.
Já antes do pecado original, a graça
era dada na previsão dos méritos
infinitamente preciosos de Nosso
Senhor Jesus Cristo. De maneira
que eles podiam construir uma
ordem correta, embora esta ordem
não tivesse a magnificência que teria
quando Nosso Senhor viesse.
Os Reis Magos exprimem isso de
alguma maneira: são reis de zonas
onde talvez houvesse certa virtude
natural, e que vieram adorar o Messias.
Imaginem que tivessem vindo,
por exemplo, mil reis adorar o Messias,
em vez de três, representando
estados que praticavam a Lei Natural
e que tinham restos de Revela-
F. Boulay; V. Toniolo
Aspectos de Veneza, Itália.
19
O elevado olhar teológico de Dr. Plinio
F. Lecaros
Construção da Torre de Babel - Museu da Catedral de Pisa, Itália.
ção. O que teria sido a noite na gruta
de Belém?
Mas, na Era Patriarcal, os homens
pecaram, criando uma ordem errada.
Essa desordem traz como consequência
que Deus a castiga, destruindo-a.
Vem o Dilúvio. No Dilúvio,
não foram apenas mortos os homens
que não prestavam, mas foi
destruída uma ordem de coisas.
Nós temos, então, um primeiro
movimento de Deus; depois, a
constituição de uma ordem de coisas,
a qual foi seguida de uma recusa;
e, por fim, a destruição dessa
ordem.
Mas Ele separa o resto: é o residuum
revertetur 2 . Resta Noé e sua família,
e, em favor de Noé, para continuar
a realização do plano d’Ele,
Deus faz maravilhas mais belas do
que aquilo que Ele destruiu.
Esse episódio dá uma beleza
maior à História do homem do que
se não tivesse existido.
A Torre de Babel,
como que um segundo
pecado original
Então, tudo recomeça, mas os homens
pecam de novo.
Eles pecam no seu interior e sob a
influência do pecado introduzem novamente
a desordem, que os leva a
pecar ainda mais. A expressão mais
aguda dessa desordem é a Torre de
Babel.
Com a Torre de Babel, vem o castigo:
a dispersão dos povos.
Quase que se poderia dizer que
o pecado da Torre de Babel foi
um segundo pecado original. Porque
houve uma baixa no homem e
ele passou a sofrer da confusão
das línguas. A confusão das línguas
supõe um enfraquecimento
do intelecto, porque a palavra é
o termo normal e final do pensamento,
e onde qualquer coisa
amoleceu na ordem da palavra,
algo amoleceu na ordem do pensamento.
Eu não posso garantir que antes
da dispersão não houvesse
uma língua diversificada em muitos
dialetos. Uma coisa é a diversificação
das línguas, outra coisa é
a confusão das línguas.
Que houvesse uma diversificação
harmoniosa, por onde uns entendessem
as línguas dos outros,
seria uma coisa bonita e teria certa
riqueza. Mas, o mal está nas
línguas herméticas. Porque assim
como qualquer um pode saber falar
mais de uma língua, poderia
ser que todas as línguas fossem
tão harmônicas que nós soubéssemos
todas, e houvesse uma clave
por onde elas fossem entendidas.
Elas estariam umas para as outras
como os diversos instrumentos de
uma orquestra, e não como a cacofonia
de nossos dias, que é confusão
e não se entende.
Deus escolhe um
povo para Si
Depois da confusão das línguas,
em vez de se corrigirem, os povos
dispersos constituem a gentilidade,
formando as nações pagãs.
Então, Deus constitui um povo
para Si, para por meio desse povo
construir essa ordem. E Ele suscita
o povo hebraico e opera uma maravilha
maior do que a anterior: nesse
povo nascerá o Messias, nesse povo
nascerá Nossa Senhora.
Há, então, toda a História narrada
no Antigo Testamento.
Pelo menos um povo na Terra conhecia
a Lei e prestava a Deus o verdadeiro
culto
20
Porém, várias vezes, esse povo
viola essa ordem, revolta‐se contra
Deus, e vem numa decadência contínua
até o momento do nascimento
de Nosso Senhor.
Portanto, outra vez o plano não se
realiza.
Deus revida. De que maneira?
Ele castiga e dispersa o povo hebraico;
mas Ele se serve dos restos fiéis
do povo hebraico para fundar a verdadeira
Igreja.
O nascimento da
Santa Igreja
Aparece, então, a obra-prima das
obras-primas da Criação, excetuando
Nosso Senhor e Nossa Senhora:
nasce a Santa Igreja Católica, Apostólica
e Romana. Como uma espécie
de vingança de Deus, a Igreja estende‐se
a todos os povos gentios, os tira
da gentilidade e remedeia todos
os males até então existentes. É um
novo lance, uma nova vitória. É de
uma beleza magnífica!
A Igreja Católica, em certo momento,
dá origem à Idade Média:
começa a construção da ordem perfeita!
Mas aparece a Revolução…
O revide de Deus: o
Reino de Maria
Quando aparece a Revolução,
Deus vai aprimorando a Igreja através
da Contra‐Revolução.
Deus vai requintando sua obra, e
ao mesmo tempo se dão os seguintes
fatos: a Igreja, hoje em dia, anuncia
o Evangelho a todos os povos; antes
da História encerrar-se, é preciso
que o plano de Deus se realize inteiramente,
e se realize em condições
de durabilidade. É preciso que em
determinado momento fique provado
que o Reino de Deus existe,
e existe porque a máxima força de
Deus vai ser empregada. Essa máxima
força é Nossa Senhora.
Exatamente a glória de Nossa Senhora
será de dar durabilidade e
consistência ao que até agora foram
tentativas precursoras.
Teremos, então, o Reino de Maria
previsto por São Luís Maria Grignion
de Montfort.
A plenitude da perfeição
Mas, depois da duração devida,
também virão a revolta última e o Anticristo.
Então, estará tudo acabado.
Quando tudo
recomeçava, o homem
pecou novamente
construindo a Torre
de Babel. Como
castigo, deu-se a
confusão das línguas e
a dispersão dos povos.
Mas ainda há uma maravilha. Os
últimos fiéis vão ser incomparáveis,
tão fiéis e tão bons que neles a Igreja
terá realizado a plenitude de sua
perfeição. Eles serão a própria beleza
plena da Igreja.
Na Igreja, como numa espécie de
trepadeira que dá rosas no pior da
tempestade e em plena meia‐noite,
florescem essas almas fiéis. E, nessa
morte aparente, a Igreja chegará ao
apogeu de sua beleza, ao apogeu de
sua perseguição e na totalidade da
tempestade.
Porém, uma beleza incomparável
vai se somar a isso, e esta não tem
nomes, não tem palavras, não tem
expressão. Deveríamos prostrar‐nos
em terra para dizê‐lo: o próprio Filho
de Deus virá em sua pompa e
majestade, de um modo visível, colher
essas últimas rosas da Igreja para
levá‐las consigo para o Céu. De
maneira tal que haverá um ósculo
de Nosso Senhor na Igreja Militan-
te expirante, que se transforma em
um elemento a mais e na maior beleza
da Igreja Gloriosa.
E com isso o plano terá acabado.
E, durante esse sucessivo decorrer
da História, os homens foram se salvando,
de maneira que, quando tudo
estiver terminado, o número de tronos
celestes deixados pelos anjos decaídos
estará preenchido. A sinfonia
celeste estará completa, e a História
da Criação, terminada.
A majestade divina
no Juízo Final
Segundo diz o Pe. Arminjon 3 ,
quando houver o Juízo Final, os corpos
gloriosos vão estar em torno do
Vale de Josafá, pairando pelo céu
em quantidades enormes; todos os
anjos vão aparecer; Nossa Senhora
estará presente com uma irradiação
da qual não se pode ter ideia.
Enquanto isso, um incêndio lavra
na Terra, destrói tudo quanto na Terra
é capaz de morrer, e a morte desaparece
da face da Terra.
Os réprobos caem no Inferno.
E nós estaremos, pelo favor de
Nossa Senhora, no Paraíso Celeste,
um lugar físico e material incomparavelmente
mais bonito do que o Paraíso
Terrestre; e ali as nossas almas
verão Deus face a face.
Assim, o plano revelado a Satanás
se terá realizado, sem ele e contra
ele.
v
(Extraído de conferência
de 17/1/1967)
1) Segundo afirmam Tertuliano, São Cipriano,
São Basílio, São Bernardo e
outros santos, a prova que decidiu o
destino eterno dos espíritos angélicos
foi, de fato, o anúncio da Encarnação
do Verbo, Jesus Cristo, verdadeiro
Deus e verdadeiro Homem, o qual
haveria de nascer da Virgem Maria.
2) O resto que voltará.
3) Padre Charles Arminjon (1824-1885).
21
Perspectiva pliniana da história
O Império Romano
nos planos de Deus
A Grécia deixou de ser uma simples nação subjugada pelas
garras da Roma pagã, para tornar-se a capital oriental
do Império. Seja pela influência de sua cultura, seja pela
grandeza de sua civilização, Bizâncio representava uma
espécie de síntese do esplendor imperial.
G. Kralj
22
T
odas as coisas, em seu estado
inicial, dão a Deus uma glória
especial, diversa daquela que
lhe propiciam em sua etapa final.
A origem de algo sempre apresenta
uma forma de beleza própria,
a qual, em geral, é caracterizada pela
simplicidade, candura e pelo evidente
esplendor da bondade, que transparecem
no “sorriso primeiro” das
coisas, e raramente podem ser igualmente
percebidos no auge de seu desenvolvimento.
Tal princípio pode ser comprovado,
por exemplo, com as flores. Observando
um botão de rosa, verifica-
-se que ele possui neste estado inicial
certa forma de esplendor que supera
o da flor inteiramente desabrochada.
Arco de Séptimo Severo
- Forum Romano.
Até certo ponto, essa regra se
aplica também à Igreja, a qual —
apesar de sua imortalidade, que não
lhe permite passar nem por mortes
aparentes — tem também fases de
aurora, de meio-dia e de certas formas
de ocaso.
A Igreja no tempo
das catacumbas
Pode-se dizer que a Igreja em seu
estado inicial teve aspectos de pulcritude
ímpares. Nota-se, por exemplo,
no tempo das catacumbas, uma presença
sensível da divindade de Nosso
Senhor Jesus Cristo, como depois não
mais se viu. Ao tomar contato com escritos
e outras coisas desta época, tem-
-se a impressão de que a presença do
Redentor ainda ecoa neles.
Nesta fase primitiva da História
da Igreja, pelo frescor da pregação
dos Apóstolos, pela tradição deixada
por aqueles que tinham conhecido
Nosso Senhor, bem como pelas
graças dadas para corroborar tudo
quanto a respeito de Jesus se dizia,
por tudo isso se sente uma manifestação
de simplicidade, candura e beleza
que são próprias ao estado embrionário.
Assim, apesar da feiúra
e do negrume das catacumbas, sente-se
nelas muito vivamente defluir
uma plenitude de vida, na qual está
contido tudo quanto se verá nas outras
fases da Igreja.
Na organização canônica, no desenvolvimento
doutrinário, nas formas
litúrgicas, em cada aspecto da
Igreja no tempo das catacumbas resplandecia
um esplendor magnífico.
Creio não exagerar em supor que nos
diversos grupinhos de cristãos, apesar
das improbabilidades de êxito, o calor
e a beleza da presença do Divino Salvador
neles se faziam mais intensos
do que quando a Igreja se desenvolveu
e atingiu sua plena estatura.
Recordo-me ter visto numa catacumba
uma capela, a qual não podia
ser mais simples. No entanto, as pinturas,
a decoração e, sobretudo, o conjunto
que ela formava, davam a impressão
de que Nosso Senhor há pouco tempo
ali estivera. Por aquele conjunto, podia-se
sentir o incomparável encanto
da Religião Católica ao desabrochar de
dentro das brumas do paganismo, manifestando
uma magnificência como
em nenhuma outra fase o teve.
A era das catacumbas poderia ser
subdividida em fases internas, nas
quais este mesmo processo em escala
menor se verificou. Deixemos, porém,
este período, a fim de analisar a
História da Igreja no tempo do Império
Romano.
Bizâncio e Roma
O Império do Oriente, sobretudo
Bizâncio, parece-me ter sido chamado
a realizar o ideal do Império uno
e cristão, católico, mais do que Roma
e o Império do Ocidente, o qual
já estava em decadência e não tinha
mais o brilho do Império do Oriente.
Em meio às corrupções e horrores,
Bizâncio teve uma indiscutível
grandeza, herança do Império Romano,
com sua força, lógica e espírito
de organização acrescidos da
graça do batismo. E por isso com
um pulchrum próprio, que não chegava
a ser o de uma sociedade orgânica
perfeita; esta deveria ter essa
grandeza natural, porém aprimorada
pela graça que, sendo amiga da
natureza, pousa sobre ela e a sacraliza,
dando-lhe fulgores próprios, os
quais não excluem a glória natural
que, de acordo com um desígnio da
Providência, se tenha acumulado.
O Império Cristão do Ocidente
parece-me ter sido chamado a representar
mais a força enquanto vencendo.
E o do Oriente, a força já vitoriosa
que se inclina sobre os escombros
daquilo que ele havia derrotado
e, não mais com temor, mas
com amor, vai selecionando de dentro
deles coisas para adornar a sua
própria glória. De maneira que há
23
Perspectiva pliniana da história
S. Miyazaki
Dr. Plinio durante uma conferência, na década de 1980.
mas dominadas por ele até o momento
das invasões dos bárbaros; tinha, portanto,
uma estrutura cultural mais unitária.
E o do Oriente trabalhava com
povos podres, caindo aos pedaços, mas
numerosos e com algum poder.
O melhor de tudo isso era o estado
de alma que essas várias justaposições
criavam, recompondo, unindo todos
esses passados gloriosos, salvando-os,
numa tentativa de introduzi-los
na Igreja e de irmaná-los. De algum
modo, portanto, restabelecendo uma
ordem legal mais próxima do feudalismo:
protetorados, povos com relativas
independências, com seus governos
próprios e muito mais autônomos.
Cartago e Alexandria
um quê de síntese no Império Romano
do Oriente.
Influência
da cultura grega
A Roma pagã mantinha a Grécia
debaixo de suas garras, como nação
escrava. De tanto admirar a cultura
grega, Roma acaba transferindo parte
do seu diadema para a Grécia. E o
Império do Oriente seria uma espécie
de Império grego; a cultura grega
dominava e — isso tem certa importância
histórica — o povo grego
já não era um povo escravo, mas inteiramente
colocado no frontispício.
Pode-se dizer que a Igreja libertou
os gregos. Entrou então um pouco
de um sábio ecletismo católico,
algo do velho espírito clássico, já não
temendo o adversário e indo procurar
nos escombros o que aproveitar
para enfeitar o seu próprio palácio.
A Basílica de Santa Sofia é inteiramente
característica. Nela existe
uma nota evidente de helenismo
e também de uma Grécia que já não
desdenhava o Oriente como outrora,
mas estava meio aberta a orientalizar-se.
De maneira que eram sucessivos
vencedores coletando tesouros
Se o Império
Bizantino tivesse sido
ortodoxo; se o irmão
mais rico, mais forte,
tivesse reconhecido
a primogenitura do
irmão mais pobre,
mais fraco, entretanto
mais espiritual, que
era o Império do
Ocidente — seriam
como um Esaú bom e
um Jacó bom —, isso
seria o encanto do
universo.
nos escombros dos vencidos, e assim
honrando-os, reabilitando-os, incorporando-os
a um todo. É um trabalho
que — a ser levado sem heterodoxia
— poderia ter sido de uma beleza
difícil de imaginar.
É preciso ponderar ainda que as situações
dos dois impérios eram diferentes.
O Império do Ocidente tratava
com vastidões europeias “caipirosas”,
Wikipedia
Exemplo característico é a diferença
do estatuto da maior cidade
vencida, pertencente ao Império Romano
do Ocidente, que era Cartago,
e as do Império do Oriente. Cartago
passou a ser uma província romana;
ela estava para Roma como Santos,
Campinas ou Ribeirão Preto 1 estão
para a capital paulista. Todo o Norte
da África, chegando até o Egito, passou
a pertencer ao Império Romano
do Ocidente.
À esquerda, ruínas do Anfiteatro
24
Alexandria pertencia ao Egito,
que já não era o Egito dos faraós,
mas era uma grande coisa. Houve ali
uma transição entre as duas faixas, a
ser vista mais como helenizante, do
que ligada com as pirâmides. O caso
de Alexandria mostra como o Império
Romano do Ocidente possuía
uma zona, o Egito, que tinha as condições
da Ásia e não as da caipirada
da Europa e do Norte da África.
A ideia de dividir o Império em
dois subimpérios — impérios irmãos,
unitários, mas diferentes e parecidos
entre si como os dois lados da face;
não idênticos, pois ficariam monstruosos
— já mostrava certa composição
da velha tradição unitária romana
com condições novas, que impeliam
sair daquela camisa de força da
unidade primitiva da época heroica
das conquistas, mas sem perder o sonho
de unidade, o desejo de um todo.
Um Esaú bom e um Jacó
romano de Cartago (Tunísia); à direita, Teatro romano de Alexandria.
Se o Império Bizantino tivesse sido
ortodoxo, submetendo-se à velha
Roma em qualquer de suas fases; se
o irmão mais rico, mais forte, tivesse
reconhecido a primogenitura do
irmão mais pobre, mais fraco, entretanto
mais espiritual, que era o Império
do Ocidente — seriam como
um Esaú bom e um Jacó bom —, isso
seria o encanto do universo.
Dessa forma se teriam afirmado
reciprocidades de espírito, estilos
de vida, enfim, todo um colorido
da alma humana do qual não temos
ideia, mas que era uma possibilidade
da natureza e da Igreja Católica. De
algum modo isso veio a lume, apresentando
uma continuidade com a
Igreja das catacumbas, que salta aos
olhos, mas com uma diferença: nessa
espécie de fogo de artifício, que se
abre em leque, há tudo menos certo
encanto da coisa primeira no seu reluzimento
inicial. Tudo isso se conservaria
muito mais se tivesse havido
uma soma das idades.
Devemos então imaginar uma
forma de vida espiritual católica que
fosse a inserção dentro da vida da
graça do gosto do imperial, do monumental,
do magnífico, do unitário,
mas reluzente de variedades unas,
de ecletismos sadios, de aproveitamentos
e de composições infatigáveis.
Tudo isso feito sem muito plano
prévio, porém guiado por aquilo que
vale mais do que qualquer plano: o
senso por onde, como uma flor desabrocha
e tende para o Sol, isso tenderia
para a plenitude de si mesmo;
o senso e o plano se juntando como
dois trilhos para a continuidade de
uma mesma estrada.
Esplendor superior ao
das pirâmides
Teríamos assim uma beleza magnífica.
O esplendor humano que daí
deveria nascer, eu considero, sob vários
aspectos, superior ao das pirâmides.
Fazer uma obra destas, na ordem
do espírito, vale muito mais do
que as pirâmides. E ainda que se pudesse
provar que as pirâmides eram
deslocadas por enigmáticas forças
mentais não diabólicas, elas valeriam
menos do que essa construção.
O Sacro Império teria sido filho
dessa obra.
E tudo constituindo uma espécie de
síntese, onde também entraria um lado
que não vejo ter sido muito aproveitado
na Antiguidade: o panorama.
Roma, por exemplo, não tem panorama.
Se não fosse Constantino, mas um
homem de hoje, em vez de Constantinopla
ele pensaria em restaurar Atenas,
em reconstruir a Acrópole ou fazer
desta um museu monumental da
cidade. E teria feito outras estultices
do gênero, que absolutamente não
atormentaram Constantino. Eles estavam
tão certos da sua continuidade
com Roma e a Grécia, que não se
preocuparam muito com aquelas ruínas;
aquilo tudo foi aproveitado como
o senso faz e o plano não faz.
Não sou contrário ao plano, quando
este não é senão a florada magnífica
das premissas dadas pelo senso.
Nesse caso, sou muito favorável
ao plano.
Agrada-me saudar tudo isso, como
formando um conjunto no qual a graça
punha qualquer coisa que a Basílica
de Santa Sofia ainda hoje exprime.
É preciso reconhecê-lo. E os minaretes
acrescentam algo. Dir-se-ia
que faltava à Santa Sofia alguma coi-
25
Perspectiva pliniana da história
sa à maneira da graça do minarete
que nasceria. Isso proporcionou
um conjunto que deveria
ter dado glória a Nossa Senhora
e a Nosso Senhor Jesus Cristo.
Os “Confiteor”
capazes de encher
os desertos
G. Kralj
Essa glória tinha um preço: o
equilíbrio que todas essas coisas
devem possuir. Eu vejo na formação
dos grandes solitários,
no povoamento dos desertos,
nas macerações, nas penitências
fenomenais, na vida mística,
nos milagres, alimento para
o outro aspecto.
Para que pudesse haver o outro
lado em toda a retidão, apesar
da miséria humana concebida
no pecado original, deveriam
existir os eremitas monumentais,
capazes dos sofrimentos inenarráveis,
também dos isolamentos sem
nome, dos areais de uma secura sem
palavras, mas nos quais ocorriam milagres
que prenunciavam os fioretti:
um corvo que vem todo dia trazer
um pão para um eremita, uns sorrisos
pré-Fra Angelico luzindo naqueles
desertos, no meio de tragédias dilacerantes
que fazem quase pressentir
a Espanha.
E conversões de pessoas como
Santa Maria Egipcíaca. Contou-me
um antigo padre de São Paulo que
há um livro sobre a vida de Santa
Maria Egipcíaca, mandado escrever
ou escrito por um velho bispo de São
Paulo, que relata penitências tais
dessa santa que os bispos posteriores
reputaram que podia arrepiar os fiéis
e fazer mal a sua vida espiritual.
Então, tiraram o livro de circulação.
À beleza espiritual dessa época
se integram, como em todas as eras
da Igreja, manifestações de virgindade
e castidade — as virgens de Deus
consagradas em Bizâncio, Roma e
outros lugares. Mas o grande traço
Santa Maria Egipcíaca - Catedral de Lima, Peru.
A cultura bizantina
conservaria à
vista simplicidades
maiores, para fazer
entender a glória que
ela possuía por ser
nascida diretamente
do Estado patriarcal,
primitivo, com o qual
não tinha perdido
ligações.
eram as penitências lancinantes, os
“Confiteor” capazes de encher desertos,
as tristezas desoladas de ter
pecado, os pedidos de perdão do indigno,
do miserável que de repente
começa a resplandecer como um
querubim. Isso era próprio a uma
humanidade pecadora que ia entrando
para o seio da verdadeira Igreja, e
precisava se arrepender dos desbordamentos
do passado. A Igreja herdava
os esplendores, expurgava
o mundo das demasias e ia formando
as pessoas rumo à ordem
perfeita. Assim, com penitências
monumentais, ela limpava
o que o paganismo tinha
trazido de ruim.
A História da Igreja
fará um unum
com a História da
civilização cristã
Aliás, é preciso dizer que
a população do Império do
Oriente contribuiu muito mais
para isso do que a do Império
Romano. Os romanos fizeram
algo, mas de um modo incompleto.
Em determinado momento
um gongo toca na História
e Deus decreta: “É o fim.”
Por exemplo, o Império Romano
do Oriente ficou imóvel, depois
começou a apodrecer por dentro,
conservando o aspecto externo de
beleza, de ordenação; posteriormente,
no exterior começam as rugas, os
sinais de podridão e vem o fim. Os
sarracenos terminam a destruição.
A Igreja engendrou esse ideal,
tornando possível às almas fiéis reconstituírem-no
e, assim, compreenderem
o plano de Nosso Senhor.
E entenderem uma potencialidade
que a Igreja tem e fica registrada na
História; e, debaixo de certo ponto
de vista, consignada como âmago da
história d’Ele.
Deus queria que os bizantinos
e os romanos do Ocidente refletissem
a santidade, a perfeição d’Ele,
enquanto Criador, enquanto motor
imóvel.
E isso, que não foi feito, Nossa
Senhora e Nosso Senhor de algum
modo completam. Porque, como o
Redentor e a Igreja formam um só,
a intenção d’Ele, como cabeça do
Corpo Místico, de ter feito isso fica
válida em nome do Corpo Místico.
26
G. Kralj
E fundamentalmente, na última radicalidade
dos fatos, Nosso Senhor
emitiu aquele raio de luz, o qual Ele
queria que o Padre Eterno visse. E,
sob este aspecto, a Igreja deu a Deus
essa glória, embora não tão perfeitamente.
E um católico do Reino de Maria,
um católico dos últimos tempos, deve
ser capaz de ver isto. A História
da Igreja, que deveria fazer em certa
altura um unum com a História da
civilização cristã, precisaria refletir
isto.
Tudo isso formaria um conjunto,
com o qual o homem conversaria como
se pode conversar com as ideias.
E o sentido dos museus, da conservação
das coisas, é para que nos deem
a ideia, antes de tudo, desse passado,
desses planos.
E a Igreja Latina, muito poeticamente,
deixa restos dessas coisas
subsistirem. Por exemplo, há um
templo do rito grego em Roma, desde
o tempo dos bizantinos, que a
Igreja manteve como uma raridade,
um tesouro. Pertencia a monges que
falavam o grego e moravam na Cidade
Eterna, ou numa ilha do Tibre, e
continuaram na obediência aos Papas.
E nessa igreja se segue a liturgia
grega, com todo o seu pulchrum
natural.
A Igreja conservou os ritos
orientais, como quem se adorna e
diz: “Em determinado momento
de minha vida, meu Bem-Amado
quis que eu tivesse essa face.” Quase
se poderiam aplicar aqui expressões
do Cântico dos Cânticos, sobre
a atitude de Nosso Senhor Jesus
Cristo quanto a essas várias faces
que a Igreja sucessivamente foi
tendo, como um pai amoroso que
vai escolhendo joias diferentes para
as várias idades da filha. E a filha
gosta de, às vezes, usar as joias deste
ou daquele tempo; e algumas ela
usa a vida inteira. É natural, é direito,
é bonito.
Bizâncio e França
Gostaria de fazer agora uma comparação
entre Bizâncio e França.
Bizâncio tinha que trazer, apesar
de tudo, algo meio primitivo e inacabado
que o acabado do Ocidente,
especialmente a França, veria de
outra maneira. Por exemplo, as pedras
preciosas inteiramente lapidadas
não ficariam bem na joia bizantina;
mas sim o cabochon, com suas
formas especiais de luzes.
A cultura bizantina conservaria
à vista simplicidades maiores, para
fazer entender a glória que ela possuía
por ser nascida diretamente do
Estado patriarcal, primitivo, com
o qual não tinha perdido ligações.
Por exemplo, os calçados: os sapatos
franceses de verniz, com fivelas
de ouro, brilhantes, com salto vermelho
— todos sabem como eu gosto
disso —; o calçado bizantino tinha
qualquer coisa de mais elementar,
semelhante à sandália, mais forte e
um pouco mais bruto, que não poderia
ter dado no precioso francês. Aliás,
gosto do precioso francês, mas é
necessário pôr cada coisa no seu devido
lugar.
Os nobres da época de Luís XIV
usavam sapatos com saltos vermelhos,
o que tinha o interessante de
uma reconstituição, mas não o pulchrum
de uma continuidade. Nas
coisas bizantinas havia o sentido de
continuidade. Certas continuidades
gloriosas têm algo que nada pode
apagar. Por exemplo, os Papas em
Roma andavam de mula. Compreendo
a beleza do cavalo, mas acaba
sendo que para o Vigário de Cristo
era melhor a mula. Depois que Nosso
Senhor andou de mula, esta é o
cavalo da glória para o Papa!
Essas continuidades esplendorosas
existem, não em virtude de uma
ordem para permanecerem, mas naturalmente
elas ficam. E assim elas
são bonitas. Em certo momento, nos
damos conta e dizemos: “Aquilo é
uma continuidade. Não mexam!” v
Jesus abençoando - Pórtico
da Sainte Chapelle, França.
Continua no próximo número…
(Extraído de conferência
de 8/9/1982)
1) Cidades do interior do Estado de São
Paulo.
27
Calendário dos Santos –––––––––
1. Solenidade do Sagrado Coração
de Jesus.
Beato João Nepomuceno Chrzan,
Sacerdote da Arquidiocese de
Gniezno, Polônia. Martirizado por
ódio à Fé, no campo de concentração
nazista de Dachau, em 1º de julho
de 1942.
2. Imaculado Coração de Maria.
São Bernardino Realino, Presbítero
(†1616). Entrou para a Companhia
de Jesus aos 34 anos, em
Lecce (Itália). Foi pregador, diretor
espiritual e confessor. Cuidou dos
pobres e enfermos.
3. Solenidade de São Pedro e São
Paulo, Apóstolos (transferida do
dia 29 de junho).
São Tomé, Apóstolo.
4. Beato Bonifácio de Saboia,
Bispo e Monge (†1270). De família
nobre francesa, foi monge cartuxo
e Bispo de Belley, na França
e depois Arcebispo de Cantuária,
Inglaterra.
5. Santa Ciprila (ou Cirila),
Mártir (†séc. IV). Libanesa de Cirene,
martirizada no tempo da perseguição
de Diocleciano.
6. Beata Nazária de Santa Teresa
March Mesa, Virgem (†1943).
Nascida em Madri (Espanha), foi
com sua família para o México. Tornou-se
religiosa e seguiu para a Bolívia,
onde fundou o Instituto das
Missionárias Cruzadas da Igreja.
Depois foi para a Argentina, onde
deu vida a muitas instituições, falecendo
em Buenos Aires.
7. São Marco Ji Tianxiang, Mártir
(†1900). Foi martirizado em Hebei
Jixiam (China) por defender a
Fé Católica.
São Tiago Maior, Apóstolo - Basílica
de Compostela, Espanha.
8. Beato Eugênio III, Papa
(†1153). Após conhecer São Bernardo
de Claraval, fez-se cisterciense.
Eleito Papa, defendeu a Igreja
contra o ataque dos infiéis e a governou
por oito anos e cinco meses.
Presidiu quatro Concílios.
9. Santo Agostinho Zhao Rong,
Presbítero, e companheiros, Mártires
(†1815). Por haver pregado
o Evangelho com suas palavras e
obras e confessado a Fé Católica,
foram perseguidos e martirizados
em distintos lugares da China.
10. XV Domingo do Tempo Comum.
São Canuto IV, Mártir (†1086).
Rei da Dinamarca, promoveu o estado
clerical e assentou solidamente
as igrejas de Lund e Odense, sendo
finalmente assassinado por uns
revoltosos.
11. São Bento, Abade (†547).
12. Beata Marta do Bom Anjo
(Marie Cluse) e 31 companheiras,
Mártires em Orange, durante a Revolução
Francesa (†1794).
São Clemente Inácio Delgado
Cebrián, Bispo e Mártir (†1838).
Após pregar o Evangelho por 50
anos em Nam Dinh,Vietnã, convertendo
pagãos, ordenando sacerdotes
muitos indígenas e construindo
muitas casas religiosas, foi preso e
morreu após muitos sofrimentos.
13. Beato Tomás Tunstal, Presbítero
e Mártir (†1616). Beneditino
condenado à morte pelo Rei Jaime
I, em Norwich, Inglaterra, simplesmente
por haver entrado no país,
sendo sacerdote.
14. São Francisco Solano, Presbítero
(†1610). Espanhol franciscano,
foi escalado para missões na América
Latina. Percorreu desde o Peru
até a Argentina, pregando e fazendo
milagres a índios e colonizadores.
São Camilo de Lélis, Presbítero
(†1614).
15. São Boaventura, Religioso
franciscano, Bispo, Cardeal e Doutor
da Igreja. Chamado “Doutor
Seráfico” (†1274).
São José de Tessalônica, Bispo
(†832). Durante sua vida de monge,
compôs hinos e promoveu o episcopado.
Por defender a disciplina
eclesiástica e as sagradas imagens,
sofreu muito. Morreu em Tesália,
na Grécia.
16. Nossa Senhora do Carmo.
No Monte Carmelo teve o Profeta
Elias a visão da nuvenzinha que
simbolizava a futura Mãe de Deus.
Em 16 de julho de 1251, São Simão
Stock, Geral dos Carmelitas, recebeu
o Escapulário das mãos da Santíssima
Virgem.
28
––––––––––––––––––– * Julho * ––––
17. XVI Domingo do Tempo Comum.
Bem-aventurado Inácio de Azevedo,
Presbítero, e companheiros,
Mártires (†1570).
18. Beato João Batista de Bruxelas,
Presbítero e Mártir (†1794).
Presbítero de Limoges. Durante a
Revolução Francesa foi colocado
em um navio destinado ao transporte
de escravos, onde morreu na
miséria, atacado pela peste.
19. São João Plessington, Presbítero
e Mártir (†1679).
Santa Macrina, a Jovem. Primogênita
de uma família querida por
Deus. Foram seus irmãos São Basílio
Magno, São Gregório de Nissa
— Padres da Igreja — e São Pedro
de Sebaste. Seu lar foi um pequeno
mosteiro de contemplação. Morreu
assistida por São Gregório (séc. IV).
20. Santo Elias, Profeta do Antigo
Testamento. Padroeiro da Ordem
do Carmo (séc. IX a.C).
São Paulo de Córdoba, Diácono
e Mártir (†851). Instruído pelas palavras
e exemplos de São Sisenando,
não temeu mostrar aos mouros
a falsidade de seu culto e por isso
foi martirizado.
21. Beato Gabriel Pergaud, Presbítero
e Mártir (†1794). Durante a Revolução
Francesa foi tirado de sua
abadia e preso num navio em condições
desumanas, nas costas de Rochefort
(França), onde morreu em consequência
de uma doença contagiosa.
22. Santa Maria Madalena.
São Felipe Evans e São João
Lloyd, Sacerdotes jesuítas e Mártires,
em Cardiff, no País de Gales,
sob a perseguição religiosa em
1679.
23. Santa Brígida de Suécia,
Fundadora da Ordem do Santíssimo
Salvador (séc. XIV).
24. XVII Domingo do Tempo Comum.
São Charbel Makhlouf, Presbítero
(†1898).
25. São Tiago Maior, Apóstolo.
Beato Antônio Lucci, Bispo
(†1752). Membro da Ordem dos
Frades Menores Conventuais, foi
Bispo de Bovino em Apúlia (Itália).
O estudo, a oração, a pregação e a
formação dos alunos foram os pilares
de sua vida.
26. São Joaquim e Sant’Ana,
pais de Maria Santíssima.
Beato Tito Brandsma, Presbítero
(†1942). Holandês de nascimento,
carmelita, martirizado no campo de
concentração de Dachau (Alemanha)
por não permitir propagandas
nazistas nos jornais católicos de seu
país.
27. São Pantaleão, Mártir. Médico
da Nicomédia, morreu na perseguição
do Imperador Maximiniano.
Todos os anos, às vésperas da sua
festa, o seu sangue se liquefaz, no
Mosteiro da Encarnação, de Madri
(†séc. IV).
28. São Jaime Hilário Barbal
Cosán, Religioso e Mártir (†1937).
Membro dos Irmãos das Escolas
Cristãs (Lassalistas), foi martirizado
em Tarragona, Espanha, por
ser religioso. Suas últimas palavras:
“Rapazes, morrer por Cristo é viver.”
29. Santa Marta. Irmã de Lázaro,
acolheu Nosso Senhor mais de
uma vez em sua casa, em Betânia
(séc. I).
Beato Urbano II, Papa (†1099).
Defendeu a liberdade da Igreja, lutou
contra os clérigos simoníacos
e indignos, e no Concílio de Clermont
convocou os soldados para
uma Cruzada para libertar seus irmãos
cristãos da opressão dos infiéis
e recuperar o Santo Sepulcro.
30. São Pedro Crisólogo, Bispo
de Ravenna (Itália) e Doutor da
Igreja (380-450).
31. XVIII Domingo do Tempo
Comum.
Santo Inácio de Loyola, Sacerdote.
Fundador da Companhia de
Jesus (1491-1556).
São Fábio de Cesareia, Mártir
(†303/304). Por recusar carregar a
bandeira do governador em um desfile
pagão, na Mauritânia (Argélia),
foi preso e condenado à morte, permanecendo
fiel à Fé Católica.
São Bento, Abade - Subiaco, Itália.
29
Luzes da Civilização Cristã
Na encruzilhada
Fotos: G. Kralj; S. Hollmann; Wikipedia; F. Lecaros.
da História…
O Preciosíssimo Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo
fez com que, do estado de barbárie, a humanidade
rumasse para um auge de esplendor. Assim, na Idade
Média e no Ancien Régime surgiram edifícios simbólicos
que deixaram perpetuados para a posteridade a
grandeza e a magnificência daqueles períodos históricos.
30
V
ersailles foi construído numa
situação que poderia
ser, sob certo ponto de vista,
denominada uma encruzilhada
da História.
O ponto de partida da Idade Média
foi a invasão dos bárbaros no Império
Romano e a mistura destes com
os europeus decadentes daquele império.
Mergulhados numa espécie de
situação caótica, esses povos começam
a sentir a influência da Igreja; assim,
da podridão e selvageria misturadas,
rumou-se para um efeito conjunto
tão diferente desses dois fatores.
Percebe-se claramente que entrou
em jogo um terceiro fator: o Sangue
infinitamente precioso de Nosso Senhor
Jesus Cristo, isto é, a Santa Igreja
Católica Apostólica Romana.
Pela influência
católica, da barbárie
se rumou para o
auge da civilização
O curso progressivo das coisas se
dá no sentido de sair da decadência
e da podridão, como da barbárie, e ir
edificando uma nova ordem de coisas
sob a influência construtiva que
a orientava e impulsionava: a ascendência
católica.
Então, sobre situações naturais
totalmente negativas há uma influência
inteiramente positiva — o predomínio
católico — que encontra
possibilidade, pela correspondência
que esses filhos de podres e de bárbaros
acabaram dando à graça, de
construir uma ordem nova; a partir
da barbárie rumaram para o auge da
civilização.
Neste sentido, se compararmos a
Idade Média da encantadora e magnífica
Sainte Chapelle, do Louvre de
São Luís ou de seu Palais de Justice,
com Versailles, veremos que o caminho
percorrido foi colossal. Apesar
de os costumes no tempo de São Luís
não terem mais nada de bárbaro,
eram até quintessenciados; possuíam,
porém, muito de completável,
aprimorável, eram capazes de chegar
a um estado de esplendor maior,
digamos numa palavra: de ainda “esplendorável”.
Creio que esta palavra
não figura em nosso vocabulário
português, mas serve muito à nossa
linguagem: que poderia renascer reluzente
de esplendor.
Jardim de Versailles. À esquerda, fachada da Basílica Vaticana e detalhe
do Santíssimo Cristo da sede (Sevilha, Espanha).
31
Luzes da Civilização Cristã
A partir de Luís XIV,
surge misteriosa
saturação do esplendor
Essa caminhada desde o fundo do
cadinho, onde podridão e barbárie
se misturavam, deu-se até o ápice —
sempre na linha da cultura, do gosto,
das maneiras distintas, do espírito
polido e requintado, do esplendor
da vida — que foi Luís XIV. Este
marcou o auge para si e para a Europa,
tendo fixado um determinado
padrão.
A partir do momento em que se
fixou esse padrão, começa uma decadência,
a qual se caracterizou por
uma misteriosa saturação do esplendor,
da beleza, da ordenação solene
e majestosa das coisas, do perpétuo
convívio com a grandeza. Saturação
que se acentua progressivamente
com Luís XV, Luís XVI e deságua
numa neobarbárie.
Verifica-se, então, que no fim do
Ancien Régime havia novamente uma
situação em que muitos elementos
apodrecidos entraram em contato
ou choque com elementos demagógicos,
os quais também, em muitos
de seus aspectos, estavam rebarbarizados.
Dá-se então outro choque,
outra fusão, de bárbaros com podres
que, por carência da influência católica
— bem menor por uma série de
circunstâncias —, acaba desaguando
no que temos hoje.
Esta seria uma visão muito resumida
da História, dentro da qual é
mais fácil situar Luís XIV, Versailles
e seu mundo.
O luiscatorzianismo representou
algo da Idade Média que, com Luís
XIV, chegou ao seu ápice.
Considerações a respeito
de um palácio real
Antes de analisarmos Versailles,
vejamos qual é o papel de um castelo
ou de um palácio na vida mental
de um povo.
Um castelo ou palácio real tem
como finalidade abrigar o soberano
— ele precisa morar em algum lugar
—, com o esplendor que corresponda
à sua alta categoria. Ali ele recebe
visitas e embaixadores com suas
credenciais, oferece banquetes, dá
recepções, tem seus apartamentos
privados onde leva a sua vida particular.
Tudo adequado ao supremo
degrau por ele ocupado, em correlação
à etimologia da palavra majestade:
stat majus, o estado que é maior,
máximo, mais que todos os outros.
Mas esse é o aspecto interior do
palácio. Precisamos perguntar que
importância tem para a vida de um
povo seu exterior. Nele mora o homem
que é o rei, o número um da
nação. Então, pergunta-se como é a
habitação número um. Qual é o esplendor
número um? Qual é a segurança
número um? Qual é a beleza
número um? Qual é o charme número
um do país onde mora o homem
número um? De maneira que o castelo
ou palácio real — talvez valha a
pena fazer uma diferença, não muito
segura, entre castelo e palácio reais
— é uma espécie de padrão do que
há de melhor em habitação.
Filósofos da arte pretendem —
mas não estou inteiramente certo
que tenham toda a razão, embora
sinta uma forte propensão para
pensar como eles
32
— que a arte número um não é nem
a pintura, nem a música, nem a escultura,
mas a arquitetura, na qual
todas as artes se inserem. Pelo fato
de ser arquitetônica e reunir todos
os elementos de beleza, ela é uma
espécie de suprema escultura ou de
suprema pintura, um quadro máximo,
uma realização máxima de um
ideal de beleza máximo e de um estado
de espírito número um.
Nesse sentido, um palácio é um
compêndio de moral, porque deve
ensinar o mais alto grau de virtude,
que compete ao supremo magistrado
de um país. Então, como é a força
do rei? Como é sua sabedoria, sua
paciência, ou sua impaciência? Como
é seu charme, sua gravidade e seriedade,
sua cólera? As mais altas dimensões
do espírito humano, atribuídas
ao monarca, se exprimem na fisionomia
do seu palácio.
Palácio e castelo
Nunca encontrei uma definição
inteiramente demarcatória entre os
conceitos de palácio e castelo. Mas,
de um modo muito geral, já tenho
ouvido de aqui, lá e acolá, que o palácio
é a residência de grande porte
de um rei ou de uma pessoa que participa
de algum modo da casa real:
um príncipe de uma casa real; ou um
príncipe tão elevado que, não sendo
da casa real, toca nela; ou, então, um
alto dignitário da Igreja, Cardeal,
Bispo; ou de um alto poder do Estado:
o Palácio da Justiça, o Palácio do
Legislativo; são palácios porque se
erguem na cidade.
No campo, se ergueria o castelo,
de origem medieval, preparado para
a guerra, e que, antes de tudo, é uma
fortaleza, mas onde mora o rei ou,
pelo menos, é a sua residência fortificada.
Tudo isto é sujeito a contradições,
porque em muitos lugares se construíram
castelos, em torno dos quais
se formaram as cidades. O castelo
ficou uma construção urbana
pela força das circunstâncias,
e continuou a ser chamado
castelo. Assim, as coisas
se misturaram… Mas,
enfim, falamos do palácio
ou castelo real, que é, deste
modo, um monumento.
Diversos aspectos
de Versailles.
Se compararmos a Idade
Média da encantadora e
magnífica Sainte Chapelle,
do Louvre de São Luís
ou de seu Palais de
Justice, com Versailles,
veremos que o caminho
percorrido foi colossal.
33
Luzes da Civilização Cristã
Grandes prédios
Os antigos tinham a ideia de que,
sempre que se construía um prédio
grande, esse devia ser um grande
prédio. Um prédio não tinha o direito
de ser grande sem, ao mesmo
tempo, ser um grande prédio.
Os caixotões da Quinta Avenida
1 ainda procuravam ser enfeitados;
mas com o advento do miserabilismo
aparecem os prédios de cimento
aparente, que é a decadência,
um passo para a volta à barbárie. Cimento
aparente é uma sepultura vista
por dentro. Não é ambiente humano,
não tem propósito nenhum!
A ideia, então, era a de que todo
prédio grande deveria ser um grande
prédio. Certa vez, Monsenhor
Gastão Liberal Pinto, Vigário-Geral
Os antigos tinham a
ideia de que, um prédio
não tinha o direito
de ser grande sem,
ao mesmo tempo, ser
um grande prédio.
da Arquidiocese de São Paulo, com
quem tive durante algum tempo relações
muito próximas, mostrou-me
uma planta ou uma fotografia de
um estabelecimento que foi levantado,
se não me engano, em frente
aos fundos do Jardim da Luz. Destinava-se
a uma obra de caridade, que
ele não confessou, por humildade,
mas desconfio que era inteiramente
mantida por sua família, a qual era
bem rica. Distribuía leite e realizava
outras ajudas às criancinhas na primeira
idade. Uma obra católica boa,
louvável.
Disse-me ele:
— Olhe aqui, eu vou mostrar a
planta do lactário.
— Pois não!
Vi que havia uma preocupação decorativa
muito grande. Tiveram o intuito
de fazer um prédio bonito. Manifestei
certa surpresa, afirmando:
— Um prédio tão bonito para um
estabelecimento de caridade, num
bairro tão proletarizado?!
— Mas, é assim. Se o prédio é
grande, tem que ser bonito!
Percebi que era um respingo de
tradição que estava ali. Tinha razão:
nada tem o direito de chamar muito
a atenção, sem ao mesmo tempo fazer
bem para a alma.
Não se tem, por exemplo, o direito
de se erguer uma torre feia. E
nem mesmo uma torre que não seja
bonita e, tanto quanto possível,
uma obra de arte, maior ou menor,
de acordo com as possibilidades do
lugar.
Então, vem daí a ideia de que a
casa do rei deve ser de beleza máxima.
Quarenta ou cinquenta anos depois,
eu ainda me lembro do que me
disse esse Monsenhor meu amigo,
em determinado momento da vida, e
me serve de instrumento de comunicação
e de pensamento com este auditório
cheio.
Luís XIV e o absolutismo
No fim da Idade Média, em que
certas virtualidades andaram debandadas,
produziu-se uma situação de
caos na qual os grandes senhores
feudais, em geral príncipes da casa
reinante, governando terras com
certa autonomia em relação ao rei,
tenderam a se revoltar contra os monarcas.
Não para proclamar uma república
aristocrática, mas a fim de
reduzir o poder real.
Os reis trataram de resistir. E os
nobres — muitos situados no píncaro
da nobreza —, culposamente, se
levantaram contra aquele em relação
ao qual deviam fidelidade,
vassalagem e obediência.
Pátio interno de Versailles;
em destaque, estátua
equestre de Luís XIV.
34
Não tiveram remédio senão apoiar-
-se na plebe, na classe mais poderosa
desta, que era a burguesia, para
resistir e não serem submersos.
E, sobretudo na época de Luís
XIV, houve uma espécie de horror
da volta ao feudalismo; e um mau
horror, porque, infundadamente,
identificava feudalismo com caos;
por isso, queriam absolutismo com
ordem.
O erro de Luís XIV foi confundir
absolutismo com ordem. Ele visualizava
o problema assim: se esses nobres
não precisam do rei para viver
em seus feudos, têm direitos próprios
que o monarca não pode eliminar,
são hereditários, e podem transmitir
seus feudos para os filhos, não há nenhuma
força que os obrigue à obediência.
E para obrigá-los à obediência,
sem os destruir completamente, essa
força precisa ser hercúlea. Caminharemos,
ou para a monarquia hercúlea
ou para a raquítica.
Ora, como a unidade da nação
provém da força do monarca, ou ela
se desagrega ou seu unum tem que
ser fortíssimo. Por causa disso precisa
ser hercúleo, ou, no caso, absoluto:
pode tudo, onipotente.
Um precursor da
Revolução Francesa
Luís XIV pensava em estabelecer
a ordem no reino
por onde a ordem não estava:
uma nobreza toda intoxicada
pelos princípios de
uma Cristandade decadente.
De uma nobreza
nessas condições, não podia deixar
de sair toda espécie de mal. Porque
não estava presente ali, na totalidade
de seu poder, Cristo-Rei, fazendo
o nobre amar seu dever de lealdade,
sua submissão ao rei, como tinham
sido tantos e tantos senhores feudais
no passado. Sem um vínculo moral,
o poder não resolve nada.
Acontece que o poder, assim, para
manter a ordem se transforma
em tirânico. E, à força de ser tirânico,
ele acaba explodindo. Explica-se,
dessa forma, a Revolução Francesa.
Por causa disso, Luís XIV, que,
sob certos aspectos, simboliza o contrário
da Revolução Francesa, e ao
qual esta odiou com todo o seu ódio,
foi ele próprio um precursor dessa
Revolução.
O rei-sol não tinha uma
concepção sacral da vida
Ele foi o Rei Católico, cometeu
pecados muito grandes, teve também
lados muito bons em seu reinado,
mas que não vêm ao caso porque
ele não tinha uma concepção sacral
da vida. Não sabia ver os problemas
temporais embebidos da problemática
espiritual. De qualquer maneira,
ele deveria ter prestigiado os elementos
da Igreja que reagiam contra
os erros, para, a partir da Igreja, ter
mudado essa situação.
Nas memórias que deixou a seu
filho, ele reconhece que, nas querelas
religiosas de seu tempo, não interveio
porque ignorava inteiramente
os problemas de caráter religioso.
Não era apto a ser rei.
Com Luís XIV, a arte, a cultura, a
civilização chegam ao seu auge. Ele
procura construir o palácio esplendoroso
do rei absoluto, que representa
a glória da nação, seu luxo, seu
fausto, seu poder. É o monarca absoluto
que brilha como um sol, e na
presença do qual as estrelas desaparecem.
Não é o rei feudal que ilumina
as estrelas, mas não as devora.
Pelo que se diz, Luís XIV era baixo.
Uma grande estatura, hercúlea
ou leonina, o teria avantajado muito.
Entretanto, com essa estatura não
alta impunha uma distância, sabendo
serrar de cima com tal majestade
que, dizem os entusiastas dele — ou,
segundo outros, seus bajuladores;
em regime de monarquia absoluta
essas coisas se confundem —, começaram
a chamá-lo de Apolo. Apolo
era o deus do Sol. Ele era “le roi
Apolon”, o Sol no meio dos homens:
“le roi Soleil”. E Versailles, o palácio-Soleil,
o palácio-Sol; ele é todo
ensolarado, magnífico, brilhante. É
dentro desse palácio que brilha a figura
de Luís XIV.
v
(Extraído de conferência de
14/4/1989)
1) A Quinta Avenida (Fifth Avenue) é
uma das mais movimentadas de Manhattan,
Nova Iorque, Estados Unidos.
Devido às históricas mansões nela
edificadas, ela tornou-se um símbolo
de riqueza de Nova Iorque.
35
A poderosa
intercessão
de Maria
N
ossa Senhora nos quer tão bem
que tudo quanto Lhe peçamos,
certamente obteremos. Por pouco que
valham nossas orações, Maria Santíssima recolhe
nossas preces e, com os méritos d’Ela, torna-as
magníficas.
São Luís Grignion de Montfort faz uma
comparação muito bonita. Ele fala de um
camponês que queria oferecer uma homenagem a
um rei, mas a única coisa que ele possuía era uma
maçã. Então, ele procurou a mãe do rei e lhe disse:
— Senhora, esta maçã não vale nada, mas se vós
a oferecerdes ao rei, ele sorrirá e a comerá. Eu vos
peço, oferecei ao rei esta pobre maçã. Apresentada
por vós, ele lhe dará valor e a aceitará.
A rainha o fez, e o rei ficou muito contente:
comeu a maçã porque sua mãe lhe havia dado.
Assim são nossas orações; entretanto, devemos
oferecê-las a Nossa Senhora, dizendo:
— Mãe nossa, nossas orações valem muito pouco,
mas, por favor, oferecei-as a Deus, porque por vosso
intermédio elas serão muito bem recebidas.
Por causa disso, deveremos sempre rezar com
muita confiança de que seremos atendidos. A Mãe
de Deus nos tirará de nossos erros, de nossas faltas
e obterá perdão para nossas culpas.
(Extraído de conferência de 1/2/1991)
A Virgem e o
Menino - Sainte
Chapelle, Paris.
G. Kralj