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Revista Dr Plinio 139

Outubro de 2009

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Publicação Mensal Ano XII - Nº <strong>139</strong> Outubro de 2009<br />

Lembranças de um convívio


Vida de epopéia<br />

Arespeito da devoção a Santa Teresinha,<br />

houve muita incompreensão, pois foi<br />

entendida num sentido contrário ao da<br />

epopéia: fazer os pequenos sacrifícios para evitar os<br />

grandes. E transformar a existência numa vidinha que,<br />

levada sempre com um sorrisinho, resultava numa saída<br />

muito cômoda para o caminho da cruz do católico.<br />

Sua espiritualidade é muito vasta, tendo<br />

ela defendido duas teses:<br />

Uma pessoa pode levar uma existência de epopéia,<br />

mesmo quando as circunstâncias não lhe<br />

proporcionem gestos de audácia, ou não<br />

exponha diretamente sua vida.<br />

E, mesmo para as almas fracas,<br />

a realização da epopéia é possível.<br />

Isso explica o fato de que ela — uma mulher,<br />

carmelita reclusa, vivendo numa França na<br />

qual não havia circunstâncias<br />

para reproduzir o feito de<br />

Santa Joana d’Arc — realizou<br />

tanto quanto esta última.<br />

Por essa razão, embora sendo uma<br />

alma não destinada a enfrentar<br />

grandes lances, ela transformou,<br />

pelo auxílio da graça, em grandes,<br />

os pequenos fatos da vida<br />

cotidiana. Levou uma existência<br />

de tão contínuos sacrifícios<br />

que, em seu conjunto,<br />

sob esse ponto de vista,<br />

foi uma epopéia.<br />

(Extraído de conferência de 10/7/72)<br />

S. Hollmann<br />

Santa Teresinha<br />

do Menino Jesus -<br />

Carmelitas de Barcelona.


Sumário<br />

Publicação Mensal Ano XII - Nº <strong>139</strong> Outubro de 2009<br />

Ano XII - Nº <strong>139</strong> Outubro de 2009<br />

Lembranças de um convívio<br />

Na capa, montagem<br />

com fotos de Dona<br />

Lucilia e <strong>Plinio</strong> em<br />

Paris no ano de 1912.<br />

As matérias extraídas<br />

de exposições verbais de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />

— designadas por “conferências” —<br />

são adaptadas para a linguagem<br />

escrita, sem revisão do autor<br />

<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />

<strong>Revista</strong> mensal de cultura católica, de<br />

propriedade da Editora Retornarei Ltda.<br />

CNPJ - 02.389.379/0001-07<br />

INSC. - 115.227.674.110<br />

Diretor:<br />

Antonio Augusto Lisbôa Miranda<br />

Conselho Consultivo:<br />

Antonio Rodrigues Ferreira<br />

Carlos Augusto G. Picanço<br />

Jorge Eduardo G. Koury<br />

Editorial<br />

4 Constante e sobrenatural auxílio<br />

Datas na vida de um cruzado<br />

5 1º de outubro de 1945:<br />

Horas de extrema aflição<br />

Dona Lucilia<br />

6 Lembranças de um convívio<br />

O Santo do mês<br />

10 O fundador dos cartuxos<br />

Redação e Administração:<br />

Rua Santo Egídio, 418<br />

02461-010 S. Paulo - SP<br />

Tel: (11) 2236-1027<br />

E-mail: editora_retornarei@yahoo.com.br<br />

Impressão e acabamento:<br />

Pavagraf Editora Gráfica Ltda.<br />

Rua Barão do Serro Largo, 296<br />

03335-000 S. Paulo - SP<br />

Tel: (11) 2606-2409<br />

16 Calendário dos Santos<br />

De Maria Nunquam Satis<br />

18 Misericórdia, a porta<br />

para a santidade<br />

<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />

24 A bandeira da vitória!<br />

Preços da<br />

assinatura anual<br />

Comum . . . . . . . . . . . . . . R$ 90,00<br />

Colaborador . . . . . . . . . . R$ 130,00<br />

Propulsor . . . . . . . . . . . . . R$ 260,00<br />

Grande Propulsor . . . . . . R$ 430,00<br />

Exemplar avulso . . . . . . . R$ 12,00<br />

Serviço de Atendimento<br />

ao Assinante<br />

Tel./Fax: (11) 2236-1027<br />

As metáforas de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />

30 Maria, Medianeira da Graça<br />

Luzes da Civilização Cristã<br />

32 A Igreja, mãe da formosura<br />

Última página<br />

36 Stella Matutina<br />

3


Editorial<br />

Constante e<br />

sobrenatural auxílio<br />

Desde menino, professava <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> particular devoção ao seu anjo da guarda, dirigindo-lhe diariamente,<br />

em alemão, a prece que lhe ensinara a Fräulein Mathilde Hellmann, sua governanta. Ao longo de<br />

sua vida, essa devoção não fez senão crescer, e, certa feita, aproveitando o ensejo da festa dos anjos<br />

custódios, ressaltou ele a insondável importância da missão desses protetores celestiais junto a cada indivíduo:<br />

“Creio não ser difícil compreender as razões pelas quais a solicitude divina nos destinou o auxílio dos anjos<br />

da guarda. Com efeito, a vida humana é tão precária, as dificuldades de toda ordem — espirituais e materiais<br />

— com que o homem luta, os riscos a que está sujeito, são de tal maneira diversos e numerosos, de um lado;<br />

e de outro, tão pequena sua capacidade de reação diante de tantos obstáculos, que ele não efetuaria a obra<br />

de sua santificação, nem consumaria sua missão neste mundo, se lhe faltasse a especial proteção de um anjo.<br />

“Em última análise, todo homem sustenta, mantém e realiza o que deve realizar, manter e sustentar, porque<br />

por ele vela um ser espiritual, destinado a ampará-lo e socorrê-lo particularmente. Caso contrário, o homem<br />

se desarticularia e nada lograria produzir. O que significa que, via de regra, o êxito da ação humana, máxime<br />

quando se trata do homem que faz o bem, deve-se ao fato de o assistir essa proteção sobrenatural.<br />

“Percebemos, assim, o imenso e contínuo papel do anjo custódio na existência de cada um de nós. Papel de<br />

cuja inteira importância apenas teremos noção ao ingressarmos na eternidade e ali nos ser revelado tudo quanto<br />

devemos ao auxílio do nosso guardião celeste: as graças que nos alcançou, os benefícios que nos prestou, os<br />

dons temporais que nos proporcionou, a saúde que nos preservou, e os perigos de que nos livrou, sejam os por<br />

nós conhecidos, sejam aqueles que nunca soubemos que nos cercavam. Na verdade, abismados ficaremos ao<br />

descobrirmos, então, as inúmeras dificuldades que o anjo da guarda subtraiu de nosso caminho!<br />

“Tal proteção bem nos salienta como sempre dependemos do sobrenatural. E quem fala em sobrenatural, fala<br />

em oração e, pois, do quanto devemos rezar, com afinco e constância, implorando o patrocínio de nosso anjo<br />

da guarda. Peçamos a ele nos dizer à alma o bom conselho que necessitamos, nos sugerir as idéias, os pensamentos<br />

e movimentos santos, nos aproximar da virtude e nos afastar do pecado. Recorramos continuamente à<br />

sua assistência, pois ele intercede por nós junto a Deus e implora em nosso favor os dons divinos. A todo instante<br />

apresenta ao Senhor as nossas boas ações, valorizando-as, ou, pelo contrário, suplica-Lhe que perdoe nossa<br />

má conduta.<br />

“Não nos esqueçamos, porém, de que sua missão intercessora passa antes pelas mãos de Maria Santíssima,<br />

Rainha dos Anjos e Medianeira de todas as graças. Nosso advogado angélico dirige a Ela os pedidos que faz<br />

por nós, e a Virgem Clemente se compraz em poder dizer a Nosso Senhor Jesus Cristo: ‘Meu Filho, vede esse<br />

espírito magnífico e belíssimo que pusestes na guarda daquele pobre homem. Esse anjo reza e pede pelo seu<br />

protegido, se o próprio não o faz. Em todo caso, quisestes constituir entre o coitado e Vós um medianeiro, que<br />

é este espírito puríssimo, e ele roga por quem não reza. Eu tomo as orações desse anjo da guarda, as enriqueço<br />

pela minha mediação e as apresento a Vós. Atendei-as, pois.’<br />

“Tal é a missão do anjo que nos foi dado por protetor e amparo. Missão de extrema beleza, que desvenda aos<br />

nossos olhos um rendilhado de circunstâncias maravilhosas, dispostas por Deus para estender ao homem sua<br />

misericórdia e seu perdão infinitos, dos quais, por nós mesmos, não somos merecedores.”<br />

(Extraído de conferência de 2/10/1971)<br />

Declaração: Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontífice Urbano VIII, de 13 de março de 1625 e<br />

de 5 de junho de 1631, declaramos não querer antecipar o juízo da Santa Igreja no emprego de palavras ou<br />

na apreciação dos fatos edificantes publicados nesta revista. Em nossa intenção, os títulos elogiosos não têm<br />

outro sentido senão o ordinário, e em tudo nos submetemos, com filial amor, às decisões da Santa Igreja.<br />

4


Datas na vida de um cruzado<br />

1º de outubro de 1945<br />

Horas de extrema aflição<br />

Arquivo revista<br />

Em 1º outubro de 1945, uma tragédia comoveu<br />

a capital paulista: tendo-se incendiado<br />

um ônibus, na avenida Angélica,<br />

morreram entre chamas inclementes muitos<br />

dos passageiros. O veículo era da linha “Avenida”,<br />

a mesma que <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> costumava utilizar<br />

para ir ao escritório de advocacia.<br />

Quando soube do pavoroso acidente, o primeiro<br />

pensamento de Dona Lucilia foi de que<br />

seu filho podia ter sido uma das vítimas.<br />

Após horas de extrema aflição para ela, <strong>Dr</strong>.<br />

<strong>Plinio</strong> retorna à sua casa e a encontra muito aflita,<br />

mas inteiramente em paz.<br />

“Nenhuma circunstância, por pior que fosse,<br />

conseguia abalar a paz de alma de Dona Lucilia.<br />

“Se para um coração materno nada há de mais<br />

confrangedor do que a perspectiva da morte de um<br />

filho, incalculável foi a angústia que tomou conta<br />

do espírito de Dona Lucilia. Mas acolheu-se confiante<br />

à proteção do Sagrado Coração de Jesus,<br />

diante de cuja imagem ficou rezando, à espera de<br />

alguma informação segura.<br />

“Dona Rosée, sempre muito expedita, começou<br />

logo a tentar localizar o irmão. Telefonou aos amigos<br />

dele a fim de averiguar se tinham notícias mais<br />

exatas, e lhes pediu que verificassem a identidade<br />

das vítimas.<br />

“Ora, justamente nesse dia, um dos amigos de<br />

<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> do ‘Grupo do Legionário’, José Gustavo<br />

de Souza Queirós, estava hospitalizado com<br />

uma grave doença, que acabaria por levá-lo desta<br />

vida, pouco tempo depois. <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> abreviara<br />

suas ocupações no centro da cidade para lhe fazer<br />

uma longa visita, porém, se esquecera de deixar<br />

aviso em casa.<br />

“Afinal, por volta das oito e meia da noite, chegou<br />

ele sem ter a menor idéia da situação reinante<br />

no lar. Ao dobrar a esquina da Rua Sergipe, avistou<br />

a sobrinha, Maria Alice, junto ao portão da<br />

casa, andando inquieta de um lado para outro.<br />

Ela e Dona Rosée foram a seu encontro e, ainda<br />

sobressaltadas, contaram-lhe o ocorrido.<br />

“Avaliando a angústia de Dona Lucilia, <strong>Dr</strong>.<br />

<strong>Plinio</strong> entrou apressadamente em casa. Encontrou-a<br />

aflita, mas tranqüila, sentada na cadeira de<br />

balanço. Ele a abraçou e osculou como de costume,<br />

e lhe perguntou como se sentia depois dessa<br />

atroz tribulação.<br />

“Com a suavidade de sempre, Dona Lucilia<br />

respondeu:<br />

“— Meu filho, que bom vê-lo novamente! Estava<br />

apreensiva, mas acreditava que nada lhe tivesse<br />

acontecido... Agora vou me recolher, porque a<br />

preocupação afetou-me o fígado e não estou passando<br />

bem.<br />

“Após um dia de tanto sofrimento, dos lábios de<br />

Dona Lucilia não partiu uma queixa sequer. Com<br />

a alma em paz, foi para seu quarto, dando graças<br />

a Deus por ter seu filho junto a si.” v<br />

(Transcrito da obra “Dona Lucilia”,<br />

de João S. Clá Dias)<br />

5


Dona Lucilia<br />

Lembranças de<br />

um convívio<br />

Recordando o relacionamento<br />

que tivera com sua mãe,<br />

principalmente no período<br />

da formação de sua<br />

mentalidade, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />

comenta, na presente<br />

conferência, o papel<br />

exercido pelo convívio<br />

com Dona Lucilia,<br />

sobretudo, em seu<br />

gosto pela reflexão.<br />

Fotos: Arquivo revista<br />

Jamais me esquecerei do<br />

olhar de mamãe. Em Dona<br />

Lucilia, voz e olhar faziam<br />

um todo só com o trato, mas o<br />

olhar era mais expressivo do que<br />

a palavra. Inúmeras vezes peregrinei<br />

dentro desse olhar e, no fim<br />

de sua vida, não havia recanto do<br />

olhar dela que, como bom peregrino,<br />

eu não tivesse conhecido.<br />

Seus olhos, nem bonitos nem<br />

feios, eram de um castanho tendente<br />

ao escuro. Quando ela<br />

olhava de um certo modo, aquele<br />

castanho dava a impressão de<br />

estar habitado por luzes, proporcionando-lhe<br />

um brilho que o le-<br />

6


vava quase ao castanho-claro. Era<br />

a expressão de um determinado estado<br />

de espírito. Outras vezes acontecia<br />

o contrário. Se ocorresse algo<br />

muito sério e grave, com muitas conseqüências,<br />

ela fixava a atenção de<br />

maneira tal que as meninas de seus<br />

olhos ficavam nitidamente pretas.<br />

Imaginem um cristal convexo com<br />

uma tonalidade “X”, através do qual<br />

se vê uma catedral. Tem-se a impressão<br />

de que tal tonalidade ilumina toda<br />

a catedral e a transforma em uma<br />

feeria com vários matizes dessa cor.<br />

Suponham que o cristal se torne<br />

côncavo; a luz brinca em sua concavidade,<br />

causando outras sensações.<br />

Esse é o olhar humano inocente. O<br />

olhar de mamãe era assim.<br />

Podemos julgar que o olhar profundo<br />

é aquele que olha para nós<br />

pensando em outra coisa. Isso na<br />

melhor das hipóteses é uma das<br />

profundidades do olhar. Há<br />

duas espécies de olhar profundo:<br />

um é o que vê, outro<br />

é aquele que dentro<br />

do qual se olha fundo.<br />

Em geral, naquele em<br />

que se olha fundo, vêse<br />

algo que olha profundo.<br />

Conforme as<br />

horas, as circunstâncias,<br />

o olhar<br />

de Dona Lucilia<br />

mudava,<br />

causando-me<br />

a impressão<br />

O olhar de<br />

Dona Lucilia dava<br />

a impressão de estar<br />

habitado por luzes,<br />

à maneira de<br />

um vitral iluminado<br />

pelo Sol.<br />

Dona Lucilia e <strong>Plinio</strong><br />

quando menino.<br />

de um vitral que passava de convexo<br />

a côncavo.<br />

Truculência e respeito<br />

Nosso relacionamento era mais<br />

ou menos análogo ao dos sons de um<br />

órgão e os ecos por este produzidos<br />

no templo. Ela era a música e eu o<br />

eco. Tudo quanto havia nela ecoava<br />

em mim de modo muito profundo,<br />

mas nem tudo que existe em mim<br />

ecoava nela. Não por discordância,<br />

7


Dona Lucilia<br />

mas em razão do número de gamas.<br />

Além da truculência, há uma série<br />

de outras coisas no meu modo de ser<br />

que não era o dela. Fui desenvolvendo<br />

tudo isso sem lhe dar explicações,<br />

mas ela ia vendo. Apenas em relação<br />

à minha truculência mamãe fazia observações,<br />

não censurando, mas ponderando.<br />

Quanto ao resto, ela foi observando,<br />

presenciando, sem nunca<br />

me dizer uma palavra.<br />

Dessa forma eu deduzia que<br />

ela, embora não fosse assim,<br />

compreendia que seu filho o<br />

devesse ser. Quanto à truculência,<br />

às vezes mamãe<br />

ficava um tanto alarmada<br />

com algumas coisas que<br />

eu dizia. Por exemplo,<br />

certo dia, ao sentar-me<br />

à mesa, provei a manteiga<br />

e notei que estava<br />

com gosto de sebo. Pela<br />

minha fisionomia, ela percebeu<br />

que eu não havia gostado.<br />

— Meu bem, não está boa<br />

a manteiga?<br />

Eu lhe respondi:<br />

— Está com gosto exato de<br />

graxa de trilhos!<br />

Ela ficou quietinha, como<br />

quem diz: “Meça as palavras...”<br />

E eu, ao mesmo tempo<br />

indignado com a manteiga<br />

e encantado com mamãe,<br />

apreciava sua reação que era<br />

de um tato exato. Ela não se<br />

zangava, nem procurava defender<br />

a manteiga. Então,<br />

com um tom mais baixo, eu<br />

disse:<br />

— Meu bem, é uma graxa<br />

perfeita...<br />

Mudei de assunto e pouco<br />

depois ela estava conversando<br />

alegre.<br />

Com freqüência, eu manifestava<br />

truculências — evidentemente<br />

sem nunca faltar com o respeito e o<br />

afeto para com ela.<br />

Seriedade<br />

que impressionava<br />

Dona Lucilia não era de maneira<br />

alguma uma mãe abobada, e sim coerente.<br />

Com ela “dois mais dois era<br />

igual a quatro”. Se não houvesse esta<br />

nota dominante, eu não gostaria dela<br />

como gosto.<br />

Lembro-me de que, quando eu<br />

era mocinho, na época de formação<br />

do caráter, mamãe me dizia o seguinte:<br />

“Os tempos são muito ruins e você<br />

ainda é moço. Ninguém sabe do<br />

que é capaz uma pessoa que se extravia.<br />

É bom você saber que eu preferiria<br />

vê-lo morto a desencaminhado.”<br />

Ela daria a vida para que eu não<br />

morresse, mas preferia ver-me morto<br />

a colocado numa situação de pecado<br />

mortal, em ruptura com a Igreja.<br />

É assim que se deve ser. A seriedade<br />

dela me impressionava profundamente.<br />

Isto me ajudava a refletir, pois,<br />

sendo muito lógico, eu apreciava o<br />

encadeamento do pensamento, chegando<br />

a cogitações como a seguinte:<br />

“É belo que ela seja intransigente e<br />

leve a intransigência até o fim do caminho!<br />

Esta atitude demonstra como<br />

ela é integra. E às pessoas que são íntegras<br />

deve-se querer inteiramente.”<br />

Dona Lucilia<br />

daria a vida para<br />

que seu filho não<br />

morresse. Entretanto,<br />

preferia vê-lo morto<br />

a desviado da virtude,<br />

ou em ruptura com<br />

a Igreja Católica.<br />

Esta posição<br />

demonstra sua<br />

integridade!<br />

8


Refletindo sobre<br />

a intransigência de<br />

sua mãe<br />

A partir disto eu fazia reflexões<br />

doutrinárias: “O que é a intransigência?<br />

Se nela é bela, também será<br />

em outros. Então, há algo intrínseco<br />

na intransigência que torna bela<br />

minha mãe. Logo, há algo para além<br />

dela que lhe dá a beleza e vale mais<br />

do que ela. Isso tem que ser definido<br />

doutrinariamente.” Porém, eu percebia<br />

não bastar definir a intransigência,<br />

pois, uma vez elaborado<br />

o conceito, ou essa qualidade<br />

existe de modo absoluto<br />

em uma outra ordem de coisas<br />

que não é a nossa, ou a<br />

definição nada significa. E<br />

pensava: “Para entender<br />

o que é, preciso ter união<br />

de alma com mamãe, a<br />

fim de ser intransigente<br />

como ela.”<br />

Ou seja, minha alma<br />

estava voltada para<br />

algo que eu não sabia<br />

ser o Céu e, portanto,<br />

Deus. Deus não<br />

corresponde a uma<br />

definição da virtude<br />

que existe fora d’Ele<br />

e com a qual procura<br />

se conformar. Ele é a<br />

personificação de todas<br />

as virtudes.<br />

Esse foi um grande<br />

dia de minha vida,<br />

em que descobri isso,<br />

a propósito de um<br />

exemplo tão simples<br />

como uma mãe dentro<br />

de casa, comentando<br />

uma manteiga,<br />

contando uma história<br />

de família ou tratando<br />

de algo doméstico.<br />

A vida de mamãe<br />

era marcada por um<br />

modo de ser que convidava<br />

à reflexão doutrinária e ao ato<br />

de Fé. Do mais profundo de minha alma,<br />

agradeço-lhe tudo que ela fez por<br />

mim.<br />

Com Dona Lucilia aprendi a fazer<br />

algumas reflexões e sobretudo a ter<br />

enorme gosto de passar da impressão<br />

para a reflexão. De maneira que<br />

não era preciso cortar a impressão<br />

para começar a refletir; a reflexão se<br />

evolava da impressão, como o perfume<br />

sai de uma flor. v<br />

(Extraído de conferência<br />

de 10/8/1980)<br />

9


O Santo do mês<br />

O fundador<br />

dos cartuxos<br />

Com profundo senso<br />

histórico, ao analisar<br />

a vida de São Bruno,<br />

<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> extrai<br />

valiosos ensinamentos<br />

acerca do espírito<br />

medieval, contrastando<br />

a Fé e os costumes<br />

daqueles tempos com<br />

os dos dias atuais.<br />

N<br />

o dia 6 de outubro, a<br />

Igreja celebra a memória<br />

de São Bruno, fundador<br />

da Grande Chartreuse. Nasceu<br />

ele na cidade de Colônia, junto<br />

ao Reno, na Alemanha 1 .<br />

Assim narra uma ficha com<br />

sua história:<br />

“Manassés, Arcebispo de<br />

Reims, o nomeou seu chanceler.<br />

Mas Manassés se deixava arrastar<br />

pela simonia. Bruno o acusou,<br />

o que lhe atraiu as perseguições<br />

do Arcebispo, que o<br />

privou de seus benefícios.”<br />

Chama-se simonia a<br />

venda de bens ou cargos<br />

eclesiás ticos, a qual é puni-<br />

Fotos: F. Lecaros / H. Grados / H. Goedert<br />

10


da pela Igreja com as maiores penalidades.<br />

São Bruno, sendo já clérigo<br />

e chanceler do Arcebispo, verificando<br />

que este praticava tal pecado,<br />

imediatamente o denunciou. Por<br />

causa disso, foi perseguido e privado<br />

de todos os benefícios.<br />

Idade Média, a era<br />

dos milagres<br />

“Entre os doutores da Universidade<br />

de Paris, Bruno tinha um grande amigo,<br />

muito estimado e tido como virtuoso<br />

e sábio. O amigo morreu e todos<br />

os membros da Universidade assistiram<br />

seus funerais. Durante o serviço<br />

fúnebre, enquanto um dos pequenos<br />

coroinhas começava a lição de Jó:<br />

‘Responde mihi, quantas iniquitates<br />

habes?’...”<br />

Fazia parte da liturgia esta pergunta:<br />

“Responde-me, quantas<br />

iniqüidades tu tens?”<br />

“...o corpo do defunto, que<br />

estava deitado no esquife, no<br />

meio da igreja, levantou a<br />

cabeça e disse com um<br />

tom de voz assustador:<br />

— Sou acusado<br />

por um justo julgamento<br />

de Deus.<br />

“E se deitou<br />

novamente no<br />

esquife.”<br />

São Bruno. Cartuxa da<br />

Serra São Bruno.<br />

É cena tipicamente medieval,<br />

pois a Idade Média foi a era dos milagres.<br />

Estes vão atrás dos que crêem<br />

e não dos incréus, embora pareça<br />

um paradoxo, pois se diria que<br />

milagre é para quem não tem Fé.<br />

Nas épocas de muita Fé, o milagre é<br />

abundante; nas de ceticismo, ele se<br />

torna raro. O único desmentido a isso<br />

ocorreu nos séculos XIX e XX,<br />

com os milagres quase contínuos de<br />

Lourdes.<br />

Precisamos tomar em consideração<br />

que o medieval era homem como<br />

nós; realidade sobre a qual, às<br />

vezes, não se tem inteira noção, dada<br />

a distância que as pessoas de hoje<br />

sentem em relação aos tempos antigos.<br />

Então, para compreendermos o<br />

realce desse fato na vida de São Bruno,<br />

devemos imaginar aqui perto, na<br />

Igreja do Coração de Maria 2 , um homem<br />

deitado no esquife e nós assistindo<br />

a cena. Em certo momento, o<br />

coro canta:<br />

— Responde mihi quantas iniquitates<br />

habes?<br />

O homem senta-se e diz:<br />

— Eu estou punido por um justo<br />

castigo de Deus.<br />

E de olhos fechados, com cara de<br />

cadáver, deita-se novamente.<br />

Já imaginaram o efeito disso numa<br />

igreja? E sobre cada um de nós<br />

concretamente? Creio que a respeito<br />

disso haveria comentários durante,<br />

pelo menos, quinze dias, ocasionando<br />

ruptura de silêncio, falta de<br />

distância psíquica 3 , etc. Pois bem,<br />

São Bruno teve a felicidade de assistir<br />

a esse episódio.<br />

“O terror causado por um acontecimento<br />

tão pouco comum fez com que<br />

se adiasse o enterro para o dia seguinte,<br />

para ver o que sucederia.”<br />

Hoje se enterraria na hora, para<br />

encerrar a história. Naquele tempo,<br />

havia Fé e as pessoas queriam verificar<br />

se aconteceria mais alguma coisa.<br />

Durante toda a noite, a igreja ficou<br />

cheia de povo, desejoso de ver<br />

o cadáver que falou, e esperando o<br />

momento no qual fosse lido aquele<br />

mesmo texto litúrgico.<br />

Em nossos dias, a cena seria perturbada<br />

pela presença de rádio, televisão,<br />

repórteres, etc. Ou talvez se fizesse<br />

N-A-N-E 4 e algum jornal noticiaria<br />

o fato com o título: “Estranhos<br />

episódios de auto-sugestão na Igreja<br />

do Coração de Maria”.<br />

“Durante o ofício, no dia seguinte,<br />

quando foi cantada a mesma lição, o<br />

cadáver exclamou com uma voz ainda<br />

mais horrível:<br />

— Eu estou julgado por um justo<br />

julgamento de Deus.”<br />

Aparente virtude<br />

desmascarada por Deus<br />

Isso significava uma bênção para<br />

aquele povo, pois equivale a um verdadeiro<br />

retiro espiritual. Deus vai<br />

obrigar o cadáver de um condenado<br />

a declarar que ele estava julgado por<br />

um justo juízo de Deus! Mais terrível,<br />

é que era um homem tido como<br />

bom. E mais ainda, tinha entre seus<br />

amigos São Bruno.<br />

“O povo ficou mais assustado ainda<br />

e decidiu enterrá-lo no outro dia.<br />

No terceiro dia, o cadáver levantou-se<br />

mais uma vez, exclamando com uma<br />

voz de estrondo terrível:<br />

— Eu estou condenado por um justo<br />

juízo de Deus.”<br />

Por que Deus quis, por essa forma,<br />

desmascarar a falta de virtude<br />

de um homem tido por todos como<br />

bom? Porque na Idade Média a virtude<br />

era incomparavelmente mais<br />

frequente do que em nossos dias. E<br />

os maus, muitas vezes, não ousavam<br />

apresentar-se na sua maldade, para<br />

terem livre trânsito entre os bons.<br />

Então, era preciso desmascarar a<br />

maldade e mostrar quantos homens<br />

falsos poderia haver sob aspecto<br />

virtuoso. Hoje é quase o contrário:<br />

é preciso desmascarar os bons, que<br />

se escondem tanto quanto possível,<br />

e os maus se mostram. Na Idade<br />

Média era necessário fazer com que<br />

11


O Santo do mês<br />

os bons fossem vigilantes e não seguissem<br />

os maus que se fingiam de<br />

bons. É uma admirável lição de vigilância.<br />

“O corpo do morto foi...”<br />

Muitos estarão pensando “enterrado”.<br />

Porém, o texto assim continua:<br />

“...jogado no lixo.”<br />

Conforme São Tomás de Aquino,<br />

quando vier o fim do mundo, toda<br />

matéria sórdida, lixo e outros detritos<br />

que não tenham sido queimados<br />

serão jogados dentro do inferno,<br />

porque é a lata de lixo do Universo,<br />

para onde vão todas as almas e matérias<br />

que não prestam.<br />

Fundação da Chartreuse<br />

A ficha apresenta outros fatos isolados<br />

da vida de nosso santo.<br />

“São Bruno se associou a seis companheiros.”<br />

Trata-se da fundação da Chartreuse.<br />

“Eles venderam todos os seus bens,<br />

depois foram à cidade de Grenoble.<br />

Lá havia um santo Bispo chamado<br />

Hugo. A visita de Deus precedeu<br />

de um modo admirável os sete companheiros,<br />

junto do santo Bispo. Este<br />

teve um sonho, no qual viu um imenso<br />

deserto onde Deus Padre construía<br />

para Si próprio uma casa para morar.<br />

Sete estrelas brilhantes, em forma de<br />

uma coroa elevada sobre a Terra —<br />

diferentes das estrelas do céu em situação,<br />

movimento e claridade — andavam<br />

diante dele como para lhe mostrar<br />

o caminho.”<br />

Através desse sonho poético e bonito,<br />

vemos como a Idade Média era<br />

cheia de contrastes. Acabamos de<br />

recordar uma cena terrível: um condenado<br />

ao inferno obrigado a manifestar<br />

a justiça de Deus. Agora é o<br />

contrário.<br />

Imaginemos o paço episcopal, onde<br />

um Bispo respeitável, venerável,<br />

santo, dorme tranquilamente o sono<br />

do justo, do homem sagrado e ungido<br />

por Deus. Consideremos a beleza<br />

do quadro: um deserto e o Pai Eterno.<br />

É digno ambiente para se manifestar<br />

o Pai Eterno um deserto onde<br />

São Bruno - Wurzburgo,<br />

Alemanha. Ao fundo, fachada<br />

da “Grande Chartreuse”.<br />

12


ninguém vai e somente a majestade<br />

de Deus paira, como antes de criar<br />

todas as outras coisas Seu Espírito<br />

pairava sobre as águas (cf. Gn 1, 2).<br />

É uma solidão digna de Deus.<br />

Depois o Bispo, no seu sonho, se vê<br />

caminhando rumo ao deserto com um<br />

bordão de peregrino, orientado por<br />

sete estrelas do céu, que formam uma<br />

coroa. Faz lembrar os reis magos seguindo<br />

a direção indicada pela estrela<br />

e indo para o Presépio de Belém. É<br />

uma coisa linda! Podemos imaginar<br />

a elevada expressão de fisionomia do<br />

santo, enquanto dorme, vendo essas<br />

estrelas que lhe aparecem.<br />

Tudo isso nos introduz no ambiente<br />

da Idade Média, tão cheio de<br />

contrastes e coloridos. Antes o terror<br />

e agora o admirável. Nessa época<br />

histórica encontramos pouco o banal,<br />

do qual estamos repletos atualmente.<br />

Continua a ficha:<br />

“Santo Hugo não sabia o que significava<br />

essa visão quando, no dia seguinte,<br />

sete peregrinos vieram se prosternar<br />

a seus pés, comunicando sua resolução<br />

e pedindo-lhe que os ajudasse.<br />

Santo Hugo julgou que os sete peregrinos<br />

seriam, na sua diocese, estrelas<br />

resplandecentes por suas virtudes e<br />

sua doutrina.”<br />

Não há nada mais belo<br />

que o encontro<br />

de almas santas<br />

Voltemos a imaginar, no palácio<br />

episcopal, o santo sentado numa<br />

espécie de trono de madeira lavrada<br />

— numa sala com um reposteiro,<br />

uns vitrais, chão de pedra, um<br />

tapete, constituindo um ambiente de<br />

recolhimento — e os sete jovens que<br />

chegam. São pessoas resplandecentes<br />

de saúde, de Fé, de vontade de<br />

servir a Deus. Ainda cobertos pela<br />

poeira do caminho, eles se ajoelham<br />

diante de Santo Hugo.<br />

Não há coisa mais bonita do que<br />

o encontro de almas santas: uma luz<br />

Do encontro de<br />

almas santas, nasce<br />

uma harmonia<br />

mais bela<br />

do que cada alma<br />

na sua<br />

individualidade.<br />

refletindo-se em outra e ambas se<br />

multiplicando. Daí nasce uma harmonia<br />

entre diversos seres, mais bonita<br />

do que um só ser. Uma nota do<br />

mais perfeito órgão tem menos pulcritude<br />

do que duas notas, ou três,<br />

formando um acorde. Assim esses<br />

santos formavam um acorde, uma<br />

harmonia de almas.<br />

O santo Bispo, embevecido, vendo<br />

aqueles jovens, os quais, levados<br />

por alguma comunicação celeste, sabiam<br />

que lhes mostraria para onde<br />

deveriam ir. Então, de joelhos, pediram<br />

que lhes indicasse o caminho.<br />

Essa cena daria para um vitral,<br />

uma iluminura, uma tapeçaria. Poderíamos<br />

julgar que essas formas artísticas<br />

medievais marcam fatos excepcionais<br />

da vida. Na verdade, elas<br />

reproduzem aspectos correntes da<br />

existência na Idade Média. Porém,<br />

tais aspectos tinham uma alta dignidade<br />

e mereceriam, portanto, ser<br />

retratados em matérias tão excelentes<br />

como a tapeçaria, o vitral, a iluminura.<br />

“O Bispo os recebeu com alegria,<br />

pois esses homens poderiam dar glória<br />

a Jesus Cristo. Ele os estimulou e<br />

confirmou nas suas santas resoluções.<br />

E deu-lhes como lugar para se fixarem<br />

uns montes horrendos, perto de<br />

Grenoble, montes esses chamados La<br />

Grande Chartreuse.”<br />

Lutavam contra a<br />

hostilidade da<br />

natureza cantando e<br />

glorificando a Deus<br />

Esses montes horríveis, posteriormente,<br />

pela presença de São Bruno<br />

e seus filhos, tornaram-se famosos.<br />

Realmente, depois de serem cultivadas<br />

e adaptadas pelos cartuxos,<br />

aquelas montanhas formaram um<br />

panorama lindo.<br />

Pode parecer estranho que o Bispo<br />

encaminhasse para um deserto<br />

horroroso almas tão eleitas. Mas fazia<br />

parte da vida monástica na Idade<br />

Média fixar os monges em pântanos,<br />

florestas, etc., porque ali eles<br />

lutavam contra os aspectos hostis da<br />

natureza pelo seu trabalho, enquanto<br />

cantavam e davam glória a Deus<br />

pela sua virtude. E as populações<br />

iam residir junto a eles, que constituíam<br />

a fina ponta do progresso. Época<br />

feliz, em que os povos devastavam<br />

os matos e entravam pelos desertos,<br />

não em busca do ouro mas da virtude.<br />

Como tudo mudou!<br />

Era uma espécie de bandeirismo<br />

de oração. Não se iam procurar esmeraldas<br />

e sim virtudes. Que beleza!<br />

Não censuro a busca de esmeraldas,<br />

mas admiro a das virtudes.<br />

“Eles construíram, no flanco da<br />

montanha, em honra da Santíssima<br />

Virgem, um oratório existente ainda<br />

hoje e que tem o nome de Santa Maria<br />

de Casalibus. É lá que São Bruno<br />

e seus companheiros iniciaram a vida<br />

de São João Batista.”<br />

“Vida de São João Batista”, quer<br />

dizer aqui, recolhidos completamente.<br />

Respeito à tradição<br />

Outra coisa linda da Europa é<br />

o respeito à tradição. Quer os mais<br />

antigos e imponentes monumentos,<br />

que iniciaram as grandes obras, quer<br />

os pequeninos, sem importância, são<br />

guardados com cuidado.<br />

13


O Santo do mês<br />

Trata-se aqui de uma<br />

capelinha em honra de<br />

Nossa Senhora, que foi<br />

o ponto de partida dessa<br />

instituição de fama<br />

mundial hoje em dia,<br />

uma ordem religiosa<br />

com uma longa tradição<br />

na Igreja: os cartuxos.<br />

Segundo o espírito<br />

moderno, essa capelinha<br />

poderia ser destruída<br />

porque está envelhecida<br />

e foram ali<br />

construídas igrejas muito<br />

mais bonitas. Não!<br />

Ela foi o início daquelas<br />

edificações, e toda<br />

origem é respeitada<br />

e venerada. Por causa<br />

disso a capelinha é cuidadosamente<br />

preservada,<br />

como manifestação<br />

do espírito de tradição.<br />

Na Rússia dos czares,<br />

havia uma coisa<br />

muito bonita. Em geral,<br />

as czarinas tinham seus<br />

filhos no Kremlin que,<br />

como se sabe, é um<br />

conjunto de palácios e<br />

fortalezas, num recinto<br />

fortificado. Em seu núcleo<br />

existia uma igrejinha<br />

com um sininho.<br />

Segundo a tradição, quando nascia<br />

o primogênito do czar, tocava-se<br />

primeiro esse sininho, depois<br />

os sinos do Kremlin, e por fim, os<br />

de todos os campanários da Rússia.<br />

De proche en proche, iam assim<br />

espalhando a notícia do nascimento<br />

do herdeiro do czar. Quando soava<br />

aquele sininho velhinho, rachadinho,<br />

mas carregado de história, era<br />

o sinal para os outros sinos tocarem.<br />

Este respeito à coisa veneranda,<br />

originária, primeira, empobrecida,<br />

encarquilhada pelo tempo — a qual,<br />

por isso mesmo, adquiria uma forma<br />

de beleza toda especial — caracterizava<br />

o espírito tradicional da Ida-<br />

<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> em uma fazenda na cidade de Amparo, onde<br />

costumava recolher-se para elaboração de algum trabalho.<br />

Os monges<br />

combatiam os aspectos<br />

hostis da natureza<br />

trabalhando,<br />

cantando e dando<br />

glória a Deus<br />

pela sua virtude.<br />

de Média. Assim são as grandes instituições,<br />

como a dos cartuxos, cujo<br />

exemplo nos proporciona tais ensinamentos.<br />

Em São Paulo há<br />

também nesse sentido<br />

algo interessante, no<br />

Parque do Ipiranga onde<br />

se proclamou a Independência<br />

nacional.<br />

No quadro de Pedro<br />

Américo — pintura<br />

princeps, que representa<br />

essa cena — figura<br />

uma casinha de caipira,<br />

a qual existe até hoje<br />

no meio do Parque,<br />

porque parece que naquele<br />

local se deu o ato<br />

famoso. É feita de taipa,<br />

sem nenhum valor<br />

arquitetônico, velhíssima;<br />

está disfarçada na<br />

vegetação porque ela<br />

não tem beleza, e pode<br />

ser visitada. Isso indica<br />

o respeito à coisa primeira,<br />

inicial. E assim,<br />

há outras coisas que se<br />

poderiam mostrar no<br />

Brasil e no mundo inteiro.<br />

“Santo Hugo não tinha<br />

consolação mais<br />

sensível do que ir muitas<br />

vezes à Chartreuse, para<br />

se edificar com a vida<br />

santa que levavam esses<br />

valentes solitários.<br />

“Urbano II foi discípulo de São<br />

Bruno.”<br />

É outra glória de São Bruno: ter<br />

sido o mestre do Papa bem-aventurado<br />

que deu o primeiro toque de sino<br />

das Cruzadas.<br />

Aparente contradição<br />

“Na solitude da Calábria, São Bruno<br />

escrevia a seu amigo Raul, para encorajá-lo<br />

a renunciar ao mundo: ‘Não<br />

me é possível vos pintar a agradável<br />

perspectiva que formam as colinas<br />

que se elevam sensivelmente, e o profundo<br />

dos vales e das fontes, dos riachos<br />

e dos rios que regam essa região,<br />

14


Relíquias de São Bruno na capela da “Cartuxa da Serra São Bruno”.<br />

e apresentam aos olhos os espetáculos<br />

mais encantadores.”<br />

Refere-se aqui a uma outra Cartuxa,<br />

fundada na Calábria, no Sul<br />

da Itália, a qual, por exceção, tinha<br />

um panorama atraente. Podese<br />

perguntar por que São Bruno dava<br />

esse argumento a fim de chamar<br />

alguém para ser cartuxo. Não parece<br />

uma coisa inteiramente extravagante<br />

dizer: “Venha observar silêncio<br />

perpétuo, castidade, pobreza,<br />

obediência, porque aqui há uns riozinhos<br />

bonitos e umas fontes agradáveis<br />

para você ver”?<br />

O argumento parece completamente<br />

desproporcionado com o sacrifício<br />

e refere-se ao mais estranho<br />

e disparatado dos turismos. Como<br />

explicar que São Bruno fizesse essa<br />

sugestão?<br />

Evidentemente, deve-se entendê-la<br />

no contexto, como quem diz<br />

a uma alma piedosa, que quer isolar-se:<br />

“Vem, porque aqui há muitas<br />

criaturas belas que nos servem para<br />

dar glória a Deus. O lugar é propício<br />

para a oração.”<br />

Ou seja, devemos nos elevar a<br />

Deus procurando nas coisas analogias<br />

com Ele, para glorificá-Lo.<br />

Vivendo numa cidade de asfalto e<br />

cimento armado, não se tem essas<br />

coisas senão raramente. De qualquer<br />

forma, há sempre algo para se<br />

dar glória a Deus, por exemplo, um<br />

bonito slide ou filme, um belo panorama.<br />

v<br />

(Extraído de conferência<br />

de 17/8/1973)<br />

1) São Bruno nasceu em Colônia, no<br />

ano de 1030, e faleceu na Calábria,<br />

em 1101.<br />

2) Situada em São Paulo, na Rua Jaguaribe,<br />

bairro de Santa Cecília.<br />

3) Cf. “<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>”, n. 106, janeiro de<br />

2007, p. 25.<br />

4) “Nada aprenderam, nada esqueceram”<br />

– Frase de Talleyrand, empregada<br />

por <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> para designar a<br />

mentalidade daqueles que julgam os<br />

fatos de hoje, exatamente com os critérios<br />

errôneos em voga há décadas<br />

atrás. Por exemplo, os N-A-N-E consideram<br />

todas as coisas sob o ângulo<br />

dos velhos princípios laicos, e não<br />

compreendem que o campo decisivo<br />

dos acontecimentos mundiais é a vida<br />

interna da Igreja (cf. “Folha de São<br />

Paulo”, 5/4/70 e 12/4/70).<br />

15


Calendário dos Santos<br />

1. Santa Teresa do Menino Jesus,<br />

virgem e Doutora da Igreja.<br />

Muito jovem ingressou no Carmelo<br />

de Lisieux. Pio XI a canonizou no<br />

ano de 1925 e dois anos mais tarde<br />

a proclamou, junto a São Francisco<br />

Xavier, Padroeira Universal<br />

das Missões. No centenário de sua<br />

morte, foi declarada por João Paulo<br />

II Doutora da Igreja. (+1897)<br />

2. São Beregiso, abade. Fundou<br />

um mosteiro de cônegos regulares<br />

na região de Ardennes (Bélgica).<br />

(+c. 725)<br />

3. São Cipriano, Bispo de Toulon,<br />

Gália. (+c. 543)<br />

4. XXVII Domingo do Tempo Comum.<br />

São Francisco de Assis, fundador.<br />

(+ 1226)<br />

5. Santa Flora, religiosa da Ordem<br />

de São João de Jerusalém. Dedicou<br />

sua vida ao cuidado dos doentes.<br />

(+1347)<br />

6. São Bruno, fundador (ver artigo<br />

na página 10).<br />

7. Nossa Senhora do Rosário.<br />

Memória.<br />

8. São Félix, Bispo de Como.<br />

Foi ordenado por Santo Ambrósio.<br />

(séc. IV)<br />

9. Santo Inocêncio da Imaculada,<br />

presbítero passionista, e oito<br />

companheiros mártires. Padeceram<br />

o suplício em Turón (Astúrias)<br />

durante a perseguição religiosa na<br />

Espanha. Foram canonizados em<br />

1999 por João Paulo II. (+ 1934)<br />

10. São Daniel Comboni, bispo<br />

e fundador. Nasceu em Limone sul<br />

Garda, Brescia (Itália), fundou o<br />

Instituto para as Missões da África.<br />

Primeiro Bispo da África Central.<br />

11. XXVIII Domingo do Tempo<br />

Comum.<br />

12. São Félix IV, Papa.<br />

(+530)<br />

F. Boulay - G. Kralj<br />

13. São Venâncio, abade.<br />

Apesar de casado, ingressou<br />

na vida monástica, com permissão<br />

da esposa. (séc. V)<br />

14. São Domingos Loricato.<br />

Seguindo o conselho<br />

de seu mestre, São Pedro<br />

Damiani, fundou a comunidade<br />

eremítica da Santíssima<br />

Trindade do monte San<br />

Vicino, Itália. (+1060)<br />

São Marcos.<br />

Catedral Maria<br />

Rainha do Mundo -<br />

Montreal, Canadá.<br />

15. Santa Tecla, abadessa.<br />

Imigrou de sua terra natal, Inglaterra,<br />

para a Alemanha, a fim de<br />

ajudar São Bonifácio em seu apostolado.<br />

Lá fundou os mosteiros de<br />

Ochsenfurt e Kitzingen. (+c. 790)<br />

16. Santa Margarida Maria Alacoque.<br />

Religiosa do convento de<br />

16


Paray-le-Monial (Ordem da Visitação),<br />

França. Recebeu revelações<br />

de Nosso Senhor para propagar a<br />

devoção ao Sagrado Coração de Jesus.<br />

(+1690)<br />

17. Santo Inácio de Antioquia,<br />

bispo e mártir. Discípulo de São<br />

João Evangelista, foi martirizado<br />

em Roma, sendo entregue às feras,<br />

durante o império de Trajano.<br />

(+107)<br />

18. XXIX Domingo do Tempo<br />

Comum.<br />

19. São Phillip Howard, mártir.<br />

Conde de Arundel, padeceu por<br />

professar a Fé católica, sob a perseguição<br />

de Elisabeth I.<br />

20. Santo André Calibita, monge<br />

cretense. Por defender o culto às<br />

imagens foi cruelmente torturado e<br />

depois lançado do alto de uma muralha.<br />

(+767)<br />

21. São Hilarião, abade. (+c.<br />

371)<br />

22. São Marcos, Bispo de Jerusalém<br />

(séc. II)<br />

23. São João, Bispo de Siracusa,<br />

Sicília (Itália) (+c. 601)<br />

24. São José Baldo, presbítero.<br />

Fundador das “Pequenas Filhas de<br />

São José”, as quais têm por missão<br />

atender anciãos e doentes, bem como<br />

educar os jovens. (+1915)<br />

25. XXX Domingo do Tempo Comum.<br />

26. São Fulco, Bispo de Pavia<br />

(Itália). (+1229)<br />

* Outubro *<br />

27. São Evaristo, Papa. Foi o<br />

quarto sucessor de São Pedro. Morreu<br />

mártir no tempo de Trajano<br />

(+c. 117)<br />

28. São Rodrigo Aguilar, presbítero.<br />

Martirizado durante a perseguição<br />

no México, em 1927.<br />

29. São Narciso, bispo e mártir.<br />

Exerceu seu ministério em Girona,<br />

(Espanha). (séc. IV)<br />

30. São Gerardo, Bispo de Potenza<br />

(Itália). (+ 1122)<br />

31. Santo Antonino, Bispo de<br />

Milão. Lutou denodadamente contra<br />

o arianismo. (+c. 661)<br />

S. Hollmann<br />

Santa Margarida Maria Alacoque. Gruta de Manresa - Espanha.<br />

17


De Maria nunquam satis<br />

Fotos: T. Ring / S. Hollmann / D. Iallorenzi / Arquivo <strong>Revista</strong><br />

18


Misericórdia,<br />

a porta<br />

para a santidade<br />

“A santidade de uma alma tem sua origem na misericórdia<br />

de Deus.” Partindo desta idéia, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta a história<br />

de Nossa Senhora de Coromoto e salienta que, quando a<br />

Virgem Santíssima manifesta claramente sua bondade, é<br />

impossível opor-Lhe qualquer obstáculo.<br />

Ahistória de Nossa Senhora de Coromoto 1 é sumamente<br />

edificante e, para que se compreenda todo<br />

o seu alcance, farei algumas considerações preliminares.<br />

Durante o Concílio, em 1962 2 , os membros de nosso<br />

Movimento que estavam em Roma receberam de um bispo<br />

da Venezuela, da Diocese de Guanare, onde está o<br />

Santuário Nacional desse país, estampas representando<br />

Nossa Senhora de Coromoto.<br />

A imagem chamou-me a atenção, porque — embora<br />

não tivesse grande valor artístico, no que diz respeito à<br />

execução material — seu porte e a expressão do olhar<br />

tinham uma elevação régia, uma majestade especial. E<br />

uma majestade com inteira consciência de sua grandeza,<br />

com muita dignidade; e ao mesmo tempo sem nada<br />

de apropriativo, de fruitivo, de como quem dissesse:<br />

“Aqui estou eu, sou extraordinária.” O olhar indica que<br />

seu pensamento está posto em seres de algum modo superiores<br />

a Ela, os anjos, no Céu ou no próprio Deus Nosso<br />

Senhor. É a imagem de uma Rainha, ao mesmo tempo<br />

contemplativa e mística de primeira categoria, e que considera<br />

todas as coisas da Terra através de altíssima luz.<br />

Por causa disso, pus a estampa em minha carteira, e dali<br />

nunca mais a retirei. Das imagens de Nossa Senhora por<br />

mim conhecidas, essa é talvez uma das que mais me falam<br />

à alma.<br />

Embora eu já tivesse ouvido falar várias vezes de Nossa<br />

Senhora de Coromoto, nunca soube dos detalhes de<br />

sua história. Só recentemente vim a conhecê-los, e tocou-me<br />

enormemente imaginar uma imagem tão majestosa<br />

sendo o veículo para tanta misericórdia. Através dela<br />

se tem a verdadeira idéia de majestade unida à misericórdia.<br />

É uma Rainha com fisionomia extremamente<br />

elevada e nobre, com porte muito digno e olhar pairando<br />

nas mais altas paragens do espírito, e ao mesmo tempo<br />

cheia de uma misericórdia inefável. A misericórdia não<br />

é demagógica, vulgar, uma condescendência com o pecado,<br />

uma afabilidade criminosa em relação ao mal, mas<br />

um ato de bondade generoso, gratuito, de quem converte<br />

e vence o mal, que vem muito de cima, mas entra a fundo<br />

e é capaz de toda espécie de regenerações.<br />

Há um sacrossanto contraste entre a majestade e a misericórdia.<br />

Não há verdadeira majestade sem misericórdia,<br />

nem verdadeira misericórdia sem majestade.<br />

19


De Maria nunquam satis<br />

A santidade de uma alma é<br />

conseqüência da misericórdia<br />

de Deus para com ela<br />

A história do índio Coromoto, ao qual<br />

apareceu a Santíssima Virgem, fez-me lembrar<br />

as aparições de Nossa Senhora a um<br />

índio em Guadalupe, no México. A Mãe de<br />

Deus tratou-o com uma ternura especial,<br />

uma bondade, como não se vê nas outras<br />

aparições — mesmo em Fátima, onde Ela<br />

se manifestou tão condescendente e bondosa.<br />

Esse índio sentia tanta liberdade para<br />

com Nossa Senhora que, em vez de chamála<br />

“minha Rainha”, tratava-A de “minha filhinha”.<br />

E a Santíssima Virgem tomou tão<br />

bem esse tratamento, que uma ampliação<br />

fotográfica recente da imagem de Guadalupe<br />

mostra que na pupila dos olhos de Nossa<br />

Senhora está a figura do índio, tornando-o<br />

imortalizado nos olhos d’Ela. Estar na<br />

menina dos olhos significa ser o centro da<br />

atenção, do cuidado, e isto realizou-se ao<br />

pé da letra.<br />

Tudo isso levou-me também a pensar a<br />

respeito do que disse Santo Antônio Maria<br />

Claret, após assistir as últimas sessões<br />

do Concílio Vaticano I, há cem anos atrás.<br />

Vendo, já naquela época, os sinais da desagregação<br />

da Europa, afirmou querer morar<br />

na América, porque aqui floresceriam santos<br />

maiores do que os surgidos na Europa. Essa afirmação<br />

me pareceu extraordinária.<br />

Há mais. Antes de ser confessor da Rainha da Espanha,<br />

Isabel II, Santo Antônio Maria Claret tinha sido Arcebispo<br />

de Santiago de Cuba, e saíra deste país por ser<br />

perseguido pelos inimigos da Igreja, apesar de seu apostolado<br />

com a população do lugar, em favor da qual ele<br />

praticara magníficos milagres. No navio que o conduzia,<br />

predisse o futuro próximo de Cuba, sua separação da Espanha<br />

e submissão aos Estados Unidos. E apresentava<br />

isso como uma série de apostasias e castigos. Naturalmente,<br />

uma apostasia causa outra, e por fim se chegou à<br />

atual e miserável situação de Cuba.<br />

Parecia-me curioso que ele, tendo falado de Cuba com<br />

tal energia e precisão, previra tanta santidade na América<br />

Latina. Isso significava a presença de um grande perdão<br />

e uma imensa misericórdia, ao lado do abismo representado<br />

pelo anúncio dessa severidade.<br />

E, afinal, como a santidade tem sua origem, sua causa<br />

primeira, numa misericórdia de Deus para conosco,<br />

eu achava muito razoável que houvesse esse nexo entre<br />

a profecia de Santo<br />

Antônio Maria Claret,<br />

de um lado, e de<br />

outro o fato de Maria<br />

Santíssima ter-Se manifestado<br />

tão carinhosa, condescendente,<br />

em relação a<br />

esse índio do México. Nossa<br />

Senhora de Guadalupe<br />

foi proclamada pela Santa<br />

Sé Patrona da América Latina<br />

e, evidentemente, esse<br />

índio representava, para o<br />

olhar d’Ela, a América Latina<br />

inteira, e todos nós somos<br />

simbolizados por esse índio.<br />

De certo modo, podese<br />

dizer que cada um de nós<br />

está na menina dos olhos da<br />

imagem de Nossa Senhora<br />

de Guadalupe.<br />

20


Uma ampliação fotográfica<br />

mostra que na pupila<br />

dos olhos de Nossa Senhora<br />

de Guadalupe<br />

está a figura do índio.<br />

Isto é muito simbólico.<br />

De certo modo, pode-se<br />

dizer que cada um<br />

de nós está na menina dos<br />

olhos de Nossa Senhora.<br />

À esquerda, Nossa Senhora<br />

de Guadalupe e Santo Antônio<br />

Maria Claret. À direita, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />

durante uma conversa.<br />

Apesar da extrema<br />

maldade do índio, Maria<br />

Santíssima manifesta sua<br />

inesgotável misericórdia<br />

Essas considerações estavam reunidas<br />

em meu espírito quando soube do<br />

fato ocorrido em Guanare, Venezuela,<br />

com o índio Coromoto, em seus detalhes.<br />

Através destes, se vê que é impossível a um homem<br />

levar mais longe a obstinação no mal, e inimaginável por<br />

nós que a Mãe de Deus chegasse a tal extremo sua “obstinação”<br />

em convertê-lo. Realmente é a última palavra<br />

em matéria de condescendência: depois de o índio ter<br />

querido flechar e golpear Nossa Senhora, Ela fez um milagre,<br />

deixando nas mãos dele um pergaminho com sua<br />

imagem, e depois o converteu! Não se pode excogitar misericórdia<br />

mais excelsa, mais excelente, do que essa.<br />

Alguém poderia observar que o pecado dos que mataram<br />

Nosso Senhor Jesus Cristo foi um pecado maior<br />

do que o desse índio, tentando agredir a Santíssima Virgem.<br />

É certo. Tudo quanto toca à Pessoa Divina de Nosso<br />

Senhor Jesus Cristo ultrapassa qualquer dimensão e<br />

não pode ser comparado com absolutamente nada. Porém<br />

é preciso considerar que em sua Paixão Jesus estava<br />

na prostração, na humilhação própria à sua natureza<br />

humana. Nossa Senhora, em Guanare, Se apresentou em<br />

visão, de forma esplendorosa, mostrando-Se superior a<br />

tudo quanto o índio conhecia, e de uma maneira evidente,<br />

como Nosso Senhor não fez com seus verdugos. Apesar<br />

disso, a maldade dele foi tão grande que tentou agredi-La.<br />

Não afirmo ter ser isso mais grave do que o deicídio,<br />

mas, sob certo aspecto, revela uma dureza de alma<br />

ainda maior. Pois bem, para esse homem, a Mãe de Deus<br />

manifestou tanta bondade e misericórdia.<br />

“À sua bondade soberana<br />

ninguém resiste”<br />

Que ensinamentos retiramos desse fato? Antes de tudo,<br />

para Nossa Senhora a maldade humana não consegue<br />

opor obstáculos decisivos. De um jeito ou de outro,<br />

se a Santíssima Virgem quer mesmo, e até o fim, Ela acaba<br />

vencendo a maldade humana. Portanto, se em determinado<br />

momento da História da Humanidade Nossa Senhora<br />

quiser praticar um ato de generosidade excelso em<br />

relação a um homem, ou a uma série de homens, Ela poderá<br />

fazê-lo e vencerá, porque à sua bondade soberana<br />

ninguém resiste.<br />

A Santíssima Virgem é soberana em tudo, inclusive<br />

em sua bondade. Querendo, Ela derruba todos os obstáculos,<br />

como Rainha cheia de suavidade, de tal maneira<br />

que uma pessoa, liberta dos grilhões do vício, dos apegos<br />

maus, realiza o verdadeiro livre arbítrio, o qual consiste<br />

em ser confiscado por Nossa Senhora. Trata-se de<br />

21


De Maria nunquam satis<br />

um verdadeiro confisco, porém a Mãe de Deus quando<br />

confisca, liberta. Ela não cobre o indivíduo de algemas,<br />

mas torna-se sua senhora, e ele torna-se senhor de suas<br />

más inclinações, de seus vícios, de seus pecados, de tudo<br />

quanto impede que sua alma voe para o bem. Essa é a<br />

própria substância da definição do livre arbítrio, segundo<br />

a Doutrina Católica.<br />

A misericórdia de Nossa Senhora<br />

se estende aos povos e às instituições<br />

Outra lição muito importante que decorre das aparições<br />

da Virgem Maria ao índio Coromoto é a seguinte:<br />

se Nossa Senhora fez isso com esse homem, não poderá<br />

realizá-lo com as pessoas de um continente, ou de uma<br />

parcela da Humanidade, especialmente suscitada para<br />

ser d’Ela, e para seu futuro reino? Maria Santíssima não<br />

tem o poder de provocar a conversão da América Latina?<br />

Pobre América Latina, tão endurecida, opaca e apagada<br />

na Fé que recebeu, na pureza e elevação dos costumes<br />

que já não possui; tão longe das esperanças dos santos<br />

e dos missionários que vieram cá, para fazer um novo<br />

reino de Deus, a fim de compensar, no balanço das coisas<br />

entre a Terra e o Céu, o que a Santa Igreja estava perdendo<br />

com a apostasia protestante! Essa conversão não<br />

ocorrerá de um momento para outro?<br />

Por fim, voltamos nossos olhos para<br />

nosso Movimento.<br />

Vendo as coisas bem de frente, tendo<br />

Nossa Senhora desígnios sobre<br />

nosso Movimento e sua atuação na<br />

América Latina, não é bem verdade<br />

que o episódio de Coromoto, a graça<br />

desse perdão, que dulcifica qualquer<br />

dureza e vence qualquer ingratidão,<br />

precisa começar dentro de casa?<br />

E que devemos pedí-lo para nós e<br />

para toda essa parte da Humanidade,<br />

aonde Nossa Senhora quis fazer esse<br />

milagre extraordinário? E não é verdade<br />

também que, apesar de todas as<br />

nossas fraquezas e infidelidades, temos<br />

razões especialíssimas para confiar,<br />

e nunca devemos consentir num<br />

pensamento de desespero, à vista de<br />

uma graça tão extraordinariamente<br />

grande?<br />

Aqui está o ponto central da meditação<br />

a respeito de Nossa Senhora<br />

de Coromoto, que visa mais especialmente<br />

nosso Movimento — porque<br />

tem uma missão muito em ordem a<br />

“Pobre América Latina!<br />

Tão endurecida, opaca<br />

e apagada na Fé que<br />

recebeu, na pureza e<br />

elevação dos costumes<br />

que já não possui...<br />

Maria Santíssima não<br />

tem o poder de provocar,<br />

de um momento para<br />

o outro, a conversão da<br />

América Latina?”<br />

<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> na década de 90. Acima,<br />

Nossa Senhora de Coromoto; à<br />

direita, Nossa Senhora de Fátima.<br />

22


isso — e, dentro dele, cada<br />

um de nós. Mas essa meditação<br />

deve também ter em<br />

vista a América Latina, como<br />

sendo especial protagonista<br />

do dia de amanhã, no<br />

Reino de Maria.<br />

Coromoto e<br />

Fátima: íntima<br />

relação<br />

Finalmente, podemos<br />

nos perguntar qual a relação<br />

de tudo isso com as<br />

profecias de Fátima. São os<br />

mistérios de Nossa Senhora...<br />

A realização das promessas<br />

da Virgem de Fátima<br />

purificará e preparará<br />

as almas para o Grand Retour<br />

3 . Quando ele vier, receberemos<br />

a graça da misericórdia,<br />

da conversão completa.<br />

Com esta visualização,<br />

temos um grande enriquecimento<br />

para o conjunto de<br />

nossas concepções sobre o<br />

futuro da História, isto é, a<br />

idéia do Grand Retour fundada<br />

num milagre extraordinário<br />

como foi o de Guanare.<br />

É um fato concreto<br />

que nos dá uma esperança especial e nos explica em algo<br />

como vai ser o Grand Retour.<br />

Poder-se-ia objetar que não foram apresentadas provas<br />

que demonstram a veracidade da história de Nossa<br />

Senhora de Coromoto. A prova é: em Guanare está<br />

o pergaminho contendo a imagem, com base na qual<br />

foi tirada essa estampa que estou comentando, colocada<br />

num belíssimo relicário de ouro. Todo o povo, desde<br />

quando ocorreu o milagre, vai venerá-lo, indicando assim<br />

que já naquele tempo se espalhou sua fama; foi, portanto,<br />

admitido por todos os que conheciam aquele índio<br />

e sua família, que os fatos relacionados à imagem e a eles<br />

eram reais. E essa versão e essa crença foram conservadas<br />

através das gerações.<br />

Mas, para mim, isso que poderia ser uma prova histórica<br />

muito boa é de pouca importância. O importante<br />

é saber que Nossa Senhora é assim, conforme nos ensina<br />

a Doutrina Católica. Portanto, ainda que as aparições<br />

de Nossa Senhora de Coromoto não tivessem acontecido,<br />

elas são reais na sua substância: a misericórdia de<br />

Maria Santíssima pode chegar até lá. Se pedirmos, seremos<br />

atendidos.<br />

E, para esse efeito, poderíamos fazer uso da seguinte<br />

jaculatória: “Nossa Senhora de Coromoto, cuja misericórdia<br />

a dureza de coração do índio pecador não conseguiu<br />

deter, tende pena de mim, entretanto tão pecador e<br />

tão endurecido.”<br />

v<br />

(Extraído de conferência de 16/7/72)<br />

1) Sobre a história de Nossa Senhora de Coromoto, ver<br />

“<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>”, nº 102, de Setembro de 2006, p. 27.<br />

2) De outubro a dezembro de 1962, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> e alguns integrantes<br />

do Movimento por ele fundado, estiveram em Roma,<br />

onde instalaram um escritório a fim de acompanhar os<br />

trabalhos do Concílio Vaticano II, o qual iniciou-se em 11<br />

de outubro de 1962.<br />

3) Ver “<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>”, nº 86, maio de 2005.<br />

23


<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />

A bandeira da vitória!<br />

Ignorada por alguns, pouco comentada por outros, a história do<br />

Santo Sudário demonstra como no expirar do século XIX<br />

Deus outorgou à Santa Igreja um verdadeiro pendão da ressurreição de<br />

Cristo. A seguir, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta o valor e o significado<br />

mais profundo deste impressionante milagre.<br />

Devido ao fato de a história<br />

do Sudário de Turim ser<br />

pouco conhecida, não se<br />

dá a esta relíquia toda a veneração<br />

merecida.<br />

Os tesouros de outrora<br />

Havia na Europa um pequeno ducado,<br />

chamado Sabóia, cuja capital<br />

era Turim. Os duques de Sabóia pertenciam<br />

a uma dinastia, senhora de<br />

dois Estados: Sabóia e Sardenha —<br />

uma ilha do Mediterrâneo — tinham<br />

os títulos de duques de Sabóia e reis<br />

da Sardenha.<br />

Sendo esta uma época de Fé, nela<br />

considerava-se tesouro não apenas<br />

os metais e pedras preciosas, mas<br />

principalmente aquilo que os homens<br />

prezavam mais do que tudo: as<br />

relíquias! Entre as que pertenciam<br />

a esta casa real, figurava um longo<br />

tecido trazido para o Ocidente, o<br />

qual constava ser o Sudário, ou seja,<br />

o pano mortuário no qual o Corpo<br />

Sacrossanto de Nosso Senhor Jesus<br />

Cristo foi envolvido a fim ser colocado<br />

na sepultura, onde ficou até<br />

o momento glorioso em que, por um<br />

ato de sua vontade, ressuscitou dentre<br />

os mortos.<br />

O Sudário será de<br />

fato autêntico?<br />

Qual a prova de autenticidade do<br />

Sudário?<br />

Os incrédulos levantavam inúmeras<br />

objeções quanto à autenticidade<br />

da relíquia.<br />

Por mais que seu percurso até ao<br />

Ocidente fosse conhecido, como, entretanto,<br />

teria ela passado a fazer<br />

parte dos tesouros da casa dos imperadores<br />

do Oriente? De que modo o<br />

Sudário fora transferido dos Apóstolos<br />

para eles? Esteve de fato em poder<br />

dos Apóstolos?<br />

24


Não havia provas, era uma tradição.<br />

A propensão legítima que possuíam<br />

os antigos para acreditar nas<br />

tradições, levou os imperadores de<br />

Constantinopla e os príncipes<br />

da Casa de Sabóia a prestar<br />

a devida homenagem<br />

e o devido culto<br />

ao Sudário, incorporando-o<br />

a seus<br />

tesouros.<br />

Por determinação<br />

dos duques<br />

de Sabóia,<br />

o Santo Sudário<br />

foi colocado numa<br />

capela entre o<br />

Palácio Real e a Catedral<br />

de Turim, em<br />

um monumento de<br />

mármore, no interior<br />

de uma magnífica<br />

caixa. De fato,<br />

trata-se de uma tão<br />

preciosa relíquia<br />

que todo o ouro<br />

e toda a prata da<br />

Terra não seriam<br />

dignos de<br />

contê-la.<br />

Acima: Santo Sudário de Turim;<br />

abaixo: Jesus é depositado no<br />

sepulcro - Cripta de<br />

Bürgersaal, Alemanha.<br />

Fotos: F. Lecaros / G. Kralj / Arquivo revista / Wikipédia / Shroudstory<br />

25


<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />

Cristo Rei - Caná, Israel.<br />

A fotografia revela a<br />

autenticidade do Sudário<br />

No decorrer do século XIX surgiu<br />

a fotografia.<br />

Pelo emprego de determinados<br />

sais de prata e diversos processos<br />

científicos, foi possível fixar sobre o<br />

papel diversas figuras das mais variadas<br />

coisas.<br />

Em certas ocasiões o Santo Sudário<br />

era exposto à veneração dos fiéis,<br />

e numa delas um fotógrafo<br />

experiente, que havia em Turim,<br />

deliberou fotografá-lo 1 .<br />

Naquele tempo, a revelação<br />

de fotografias era muito<br />

complicada e lenta, exigindo<br />

uma manipulação<br />

de certos líquidos,<br />

sais e diversos objetos,<br />

num ambiente iluminado<br />

por uma tênue<br />

luz vermelha.<br />

Quando o fotógrafo<br />

começou a revelar<br />

o negativo, verificou<br />

que havia um<br />

vulto no tecido, e por<br />

fim a fotografia demonstrou<br />

a existência<br />

dessa figura. Assim,<br />

ficou revelada a autenticidade<br />

do Santo<br />

Sudário.<br />

O mundo, a Cristandade<br />

e a Igreja<br />

chegaram a receber<br />

este legado verdadeiramente<br />

inestimável:<br />

uma fotografia<br />

de Nosso Senhor Jesus<br />

Cristo!<br />

As fotografias do<br />

Santo Sudário foram difundidas<br />

em todo o orbe,<br />

causando admiração geral<br />

e grande desapontamento<br />

nos incrédulos. Foi então<br />

possível observar a evidente<br />

analogia entre a Face do<br />

Santo Sudário e a das imagens<br />

correntes de Nosso Senhor Jesus<br />

Cristo. De dentro da fotografia<br />

salta uma verdade religiosa que destrói<br />

inúmeras incredulidades de uma<br />

só vez!<br />

O tecido da humilhação<br />

se transformou em<br />

bandeira da vitória!<br />

A impiedade, entretanto, tem artimanhas...<br />

A polêmica feneceu a<br />

partir de 1912, 1915. Não mais se punha<br />

em dúvida o milagre. Os ateus<br />

não queriam deduzir que Jesus Cristo<br />

provadamente existiu. Contudo já<br />

não o negavam.<br />

Por ser um argumento triunfante<br />

contra os incréus, o Sudário não era<br />

comentado. Com o passar do tempo,<br />

o tema foi sendo esquecido: vitória<br />

do Santo Sudário.<br />

Vitória tanto mais linda quando<br />

se considera o seguinte: José de<br />

Arimatéia e Nicodemos, acompanhados<br />

por São João Evangelista e<br />

as santas mulheres, adquiriram o tecido<br />

para depositar Nosso Senhor<br />

Jesus Cristo no sepulcro. Cobriram<br />

de ungüentos todas as suas feridas,<br />

segundo o ritual antigo. Foi grande<br />

a quantidade de ungüentos, pois<br />

— como diz a profecia a respeito de<br />

seus sofrimentos: “Do alto da cabeça<br />

à planta dos pés nada havia que<br />

estivesse são” — Ele estava completamente<br />

coberto de lesões, devido<br />

aos golpes desferidos pelos algozes.<br />

Envolvendo Nosso Senhor no<br />

tecido e levando-O para a sepultura,<br />

lacrando-a, imaginaram eles que<br />

aquele Sudário, muitos séculos depois,<br />

seria um triunfo sobre a impiedade?<br />

O que parecia ser o pano da humilhação<br />

e da derrota, da tristeza e<br />

da dor, do desconcerto e da aflição,<br />

foi transformado em bandeira de vitória!<br />

Isso eles não podiam imaginar.<br />

Tinham eles diante de si um fato<br />

concreto: Aquele Cristo Jesus, a<br />

26


“Aquele Cristo Jesus,<br />

o vencedor e Rei tão<br />

majestoso diante<br />

de quem qualquer<br />

rei da Terra não<br />

poderia tomar outra<br />

atitude senão tirar<br />

sua coroa, prostrar-se<br />

e pedir licença para<br />

tocar seus divinos pés,<br />

entrou nas sombras<br />

da morte.”<br />

Palácio Real - Turim, Itália<br />

Quem tinham adorado e continuavam<br />

a adorar — Ele, o Vencedor e<br />

Rei tão majestoso, diante de Quem<br />

qualquer rei da Terra não poderia<br />

tomar outra atitude senão tirar sua<br />

coroa, prostrar-se e pedir licença para<br />

tocar seus divinos pés com o diadema<br />

— havia morrido.<br />

Nas sombras da morte<br />

Como seria o convívio com este<br />

Varão, estando Ele vivo? Quem<br />

ousaria falar-Lhe “está frio o tempo...”?<br />

Antes de terminar a frase, já<br />

se sentiria que era uma bagatela que<br />

não poderia ser levada à presença<br />

d’Ele.<br />

Dever-se-ia então dizer-Lhe:<br />

“Senhor, falai porque vosso servo<br />

escuta! Fito vossos olhos divinos<br />

e vejo que aí está a Sabedoria infinita!<br />

Vós dizeis qualquer palavra e esta<br />

vale mais do que todo o ouro da<br />

Terra! Vós dais um passo à frente e<br />

percebo que sois Rei, pelo semblante<br />

com que avançais! Vós encontrais<br />

um pobre, um pecador, e Vos dirigis<br />

a ele para lhe fazer bem ao corpo e à<br />

alma! Noto tanta bondade em Vós,<br />

que me vejo de azinhavre em comparação<br />

convosco! Senhor, diante de<br />

Vós, quem pode subsistir? Sou feito<br />

para Vos olhar e para Vos adorar,<br />

por misericórdia vossa, pois não sou<br />

digno disso.”<br />

O Rei das nações — como se<br />

considerava a Nosso Senhor cuja<br />

genealogia régia indiscutivelmente<br />

chegava até David e Salomão,<br />

os dois grandes reis de Israel — estava<br />

ali morto entre dois ladrões,<br />

acompanhado pelo séquito da dor:<br />

uma Mãe em cuja alma não havia<br />

senão o sofrimento mais pungente<br />

que se possa imaginar. Fiel a Ele,<br />

somente um discípulo! Ele que tivera<br />

tantos! Dois homens que eram<br />

“criptodiscípulos” e não ousavam<br />

mostrarem-se em público como seguidores<br />

d’Ele: Nicodemos e José<br />

de Arimatéia.<br />

Santa Maria Madalena, vertendo<br />

copiosas lágrimas, e as santas mulheres<br />

carregam aquele Corpo Sagrado,<br />

após O terem embalsamado<br />

e envolvido no Sudário, e O depositam<br />

na sepultura. Era preciso andar<br />

depressa, pois em pouco tempo<br />

começaria a Páscoa, festa entre<br />

os judeus, não sendo permitido fazer<br />

enterros nem trabalhos manuais.<br />

Eles desejavam preparar tudo lentamente,<br />

tranqüilamente, elevando os<br />

olhos e a mente para o último olhar<br />

a Jesus. Entretanto, fizeram tudo<br />

com rapidez. Fecharam o sepulcro.<br />

E, excetuando Nossa Senhora, acreditavam<br />

que tudo havia terminado,<br />

pois não entendiam bem o que Ele<br />

tinha profetizado acerca de sua própria<br />

ressurreição.<br />

A morte e a sepultura O tragaram.<br />

Sonho maravilhoso... decepção<br />

cruel! Todos choravam. Portanto, sobre<br />

o Sudário caíram talvez as lágrimas<br />

deles... e possivelmente também<br />

as de Nossa Senhora. E esse pano<br />

entrou nas sombras da morte.<br />

Cristo, Tu venceste!<br />

Quando o século XIX estava no<br />

auge de seu orgulho, preparando-se<br />

para transmitir ao século XX muitos<br />

frutos da Civilização — infelizmente<br />

havia algo que tornava todos<br />

esses frutos podres: a impiedade<br />

triunfante —, surgiu o Santo Sudário<br />

como uma bandeira magnífica<br />

da ressurreição! Nosso Senhor morto<br />

foi envolvido naquele precioso<br />

tecido. Entretanto quem o guardou<br />

27


<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />

com tanta piedade, atravessando<br />

várias centúrias, não tinha conhecimento<br />

de que aquele invólucro continha<br />

também uma prova da ressurreição<br />

de Cristo.<br />

Seu Divino Corpo emanou sinais<br />

que marcaram o lençol e foram revelados<br />

pela fotografia! A Ciência ímpia<br />

dobrava os joelhos e dizia: Cristo,<br />

Tu venceste!<br />

Nota-se na figura de Nosso Senhor<br />

estampada no tecido os sinais,<br />

entre outros, da coroação de<br />

espinhos. O Santo Sudário é tal<br />

maravilha e tão grande prova da<br />

existência de Nosso Senhor Jesus<br />

Cristo e de sua ressurreição, comprovando<br />

nossa Fé, que em todos<br />

os ambientes religiosos se deveria<br />

falar dele. Porém, o homem contemporâneo<br />

dá as costas para o<br />

Santo Sudário.<br />

Os meios de pesquisa se desenvolveram<br />

enormemente, e os processos<br />

existentes para se verificar a autenticidade<br />

do Sudário chegaram ao inimaginável.<br />

Ora, os equipamentos científicos<br />

indicaram que o Santo Sudário tem<br />

restos de pólen de plantas da Ásia<br />

Menor, algumas das quais não existem<br />

no Ocidente, e na data precisa<br />

em que viveu Nosso Senhor. Foi<br />

mais uma confirmação de sua autenticidade,<br />

feita pela Ciência. Com<br />

o desenvolvimento dos microscópios<br />

e outros processos complementares,<br />

tornou-se possível colher em<br />

panos antigos fragmentos mínimos<br />

de restos de flores, e polens que voam<br />

pelos ares e impregnam os tecidos.<br />

Os do Santo Sudário são de flores<br />

da Ásia Menor, do tempo de Jesus<br />

Cristo.<br />

Uma fotografia detalhada dos<br />

olhos de Nosso Senhor revela que<br />

por sobre as pálpebras foram colocadas<br />

moedas, para mantê-las fechadas.<br />

Foi possível fotografar umas<br />

moedas cuja marca ficou no pano, e<br />

verificou-se que eram da época de<br />

Nosso Senhor.<br />

28


Verificamos assim que a própria<br />

Ciência comprova até à evidência a<br />

autenticidade desse tecido sagrado.<br />

Grandeza, poder<br />

e bondade de Deus<br />

Entre outras perguntas de ordem<br />

científica, surgiu a seguinte: o que<br />

marcou este pano da forma como está<br />

caracterizado? Foram apenas evaporações<br />

e transudações de um cadáver?<br />

Feita a análise, chegou-se à resposta:<br />

não! Houve, isto sim, outra<br />

força que marcou o pano e desenhou<br />

a figura.<br />

Qual é essa força? Sabemos ser<br />

a ação triunfante, onipotente, de<br />

Deus, que pousou sobre esse Cadáver<br />

e O fez ressuscitar. Por desígnios<br />

misteriosos, Deus desejou que essa<br />

ação delineasse aquela figura no pano.<br />

Ele quis, Ele fez! Cientistas estudaram-na,<br />

concluindo ter ela três dimensões.<br />

Relembrando nossas considerações<br />

anteriores, dizemos que o<br />

século XIX recebeu, ao expirar,<br />

enorme manifestação de grandeza,<br />

de poder e de bondade de<br />

Deus.<br />

O Santo Sudário é como um estandarte<br />

que afirma à Santa Igreja:<br />

Tu não morrerás!<br />

v<br />

(Extraído de conferência<br />

de 28/4/1984)<br />

1) O advogado Secondo Pia fotografou o<br />

Sudário em maio de 1898.<br />

“O mundo,<br />

a Cristandade<br />

e a Igreja<br />

receberam este<br />

legado<br />

verdadeiramente<br />

inestimável:<br />

uma fotografia<br />

de Nosso Senhor<br />

Jesus Cristo!”<br />

À esquerda, detalhe<br />

do Santo Sudário.<br />

À direita, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> no<br />

fim dos anos 80.<br />

29


Metáforas de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />

Maria, Medianeira<br />

Maria Santíssima exerce um papel preponderante na<br />

santificação de uma alma. Com efeito, Ela é a medianeira<br />

através de Quem recebemos as graças.<br />

Imaginemos uma cidade no Tirol, ao pé daquelas<br />

grandes montanhas, para as quais vão pessoas do<br />

mundo inteiro, a fim de praticarem alpinismo. Havia<br />

lá um moço impossibilitado de se mover. Porém, de<br />

manhã vinha à sua casa um médico<br />

que lhe dava um remédio misterioso,<br />

desconhecido por todos,<br />

sob a ação do qual ele<br />

se curava e subia as montanhas<br />

corajosamente.<br />

À noite, tendo voltado<br />

para sua residência,<br />

cessava o<br />

efeito do medicamento<br />

e o jovem voltava<br />

a ficar imóvel na<br />

cama.<br />

Esse moço não poderia<br />

dizer: “Eu sou um<br />

grande alpinista!” Ele<br />

poderia, isto sim, dizer:<br />

“Meu médico e eu somos<br />

grandes alpinistas!”<br />

Pois, na realidade,<br />

ele atingia o pico<br />

dos montes<br />

porque<br />

colaborava com o remédio fornecido pelo médico.<br />

Do contrário, permaneceria na imobilidade. Jovens que<br />

chegavam ao alto das montanhas, havia muitos. Médico<br />

que dava ao paralítico o meio de subi-las, existia somente<br />

um. De maneira que a ação do médico foi o principal<br />

fator do ato, embora o moço também tenha exercido seu<br />

papel: suou, segurou-se nas cordas, correu o risco de se<br />

espatifar no chão, teve o mérito do alpinismo. Mas apenas<br />

começou a mover-se a partir do momento em que o<br />

médico lhe deu aquele remédio.<br />

Suponhamos que certo dia o remédio atuou mais longamente,<br />

e o rapaz, regressando da montanha, descansou<br />

em sua casa e depois foi passear na cidade, vangloriando-se<br />

junto a seus companheiros. Em determinado<br />

momento, passou o médico que cumprimentou o jovem,<br />

o qual respondeu à saudação de modo desdenhoso. Perguntaram-lhe,<br />

então, seus amigos:<br />

– Quem é aquele senhor?<br />

– É um velhinho que conheço e, às vezes, de manhã<br />

me visita, respondeu o moço.<br />

O médico não teria o direito de ficar indignado com<br />

o rapaz? Afinal, se ele não fosse no dia seguinte à casa<br />

do jovem, este permaneceria na horizontal! Então, aquela<br />

vaidade é nada. O médico é quase tudo nos feitos do<br />

moço.<br />

Este conto não nos dá uma idéia inteiramente exata,<br />

mas sim próxima, da realidade; ajuda-nos a compreender<br />

alguns aspectos do problema da graça e, portanto, de<br />

sua ação em nós, ou seja, a virtude. Todo homem é completamente<br />

paralítico para a virtude. Porém, a partir do<br />

momento em que recebe a graça, ele se torna capaz<br />

de praticá-la.<br />

Quando temos vontade de adquirir virtudes<br />

que julgamos não estarem ao nos-<br />

30


da Graça<br />

so alcance, podemos dizer a Nossa Senhora:<br />

dai-nos. A devoção à Santíssima Virgem é<br />

fundamental elemento de nossa vida espiritual;<br />

aquilo que Lhe pedimos, Ela<br />

nos obtém.<br />

É claro ser necessária a nossa cooperação,<br />

pois Deus, que nos criou<br />

sem nosso auxílio, não nos salvará<br />

sem nossa colaboração.<br />

Embora indispensável, essa<br />

cooperação é secundária.<br />

O principal fator de<br />

nossa salvação é a<br />

atuação da graça<br />

em nós, a qual recebemos<br />

por meio<br />

de Nossa Senhora,<br />

Rainha e dispensadora<br />

de todos os<br />

dons divinos.<br />

Quando Nossa Senhora<br />

nos concede a graça,<br />

somos como o jovem cheio<br />

de disposição para subir as<br />

montanhas, mas se não a<br />

pedirmos, ficamos estendidos<br />

na cama, paralisados.<br />

Esse é o papel da Santíssima<br />

Virgem em nossa<br />

santificação. v<br />

Fotos: T. Ring / G. Kralj / Arquivo revista<br />

(Extraído de conferência<br />

de 5/5/73)<br />

31


Luzes da Civilização Cristã<br />

A Igreja, mãe<br />

Perante um mundo penetrado pela feiúra, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta<br />

o papel da beleza e da formosura na vida do homem e mostra<br />

como a Igreja elevou a arte ao seu píncaro de esplendor.<br />

Há um “ídolo” que começa a<br />

ser adorado na atual era histórica.<br />

Trata-se da funcionalidade,<br />

segundo a qual é necessário<br />

que todas as coisas existam em razão<br />

de sua função prática.<br />

O que quer dizer funcionalidade?<br />

É a acomodação de todas as formas<br />

de existência, costumes e mentalidades<br />

à preocupação dominante de<br />

que tudo deve ser fácil, simples, direto,<br />

sem gastos desnecessários nem<br />

Fotos: R. C. Branco / G. Kralj / P. Mikio / S. Hollmann<br />

32


da formosura<br />

33


Luzes da Civilização Cristã<br />

esforços para manter a formosura na<br />

vida.<br />

Opta-se assim pelo hediondo sob<br />

o pretexto da funcionalidade, como<br />

se as coisas não pudessem ser<br />

ao mesmo tempo belas e funcionais.<br />

Então, a era da funcionalidade eliminará<br />

a era da formosura.<br />

Forma-se assim um mundo fabricado<br />

pelo homem com a intenção de<br />

fazer abstração do seguinte princípio:<br />

Deus quer que as coisas sejam<br />

funcionais e formosas; se não o são,<br />

a alma humana fica exilada.<br />

Ora, a alma humana foi feita para<br />

a beleza que leva a Deus, e não para<br />

um mundo sem formosura, de inexorável<br />

feiúra, inexpressivo, onde qualquer<br />

coisa poderia servir para qualquer<br />

destino, qualquer povo e em<br />

qualquer lugar. E quando o mundo<br />

em que tudo o que existe é tão sem<br />

expressão, esse mundo é um horrível<br />

“A alma humana foi feita<br />

para a beleza que leva<br />

a Deus, e não para um<br />

mundo sem formosura e<br />

inexpressivo. Um mundo<br />

no qual tudo serve<br />

para qualquer destino,<br />

qualquer povo ou lugar<br />

é um verdadeiro cárcere<br />

para o espírito humano.”<br />

No centro: Cristo abençoando<br />

- pórtico da Saint Chapelle; à<br />

direita: Alcáçar de Segóvia -<br />

Espanha; abaixo: Banco Mundial<br />

de Washington - Estados Unidos.<br />

nada, um cárcere para o espírito humano.<br />

As criaturas são imagens e semelhança<br />

de Deus Nosso Senhor.<br />

Tudo que há de belo na vida é<br />

um reflexo do Criador. Todas<br />

as instituições, todas as almas<br />

segundo Deus são geradoras<br />

de formosura. Em sentido<br />

oposto, as contrárias a Ele<br />

são, a prazo maior ou menor,<br />

causadoras de hediondez.<br />

Um exemplo característico<br />

é a Santa Igreja<br />

de Deus, na qual existe<br />

ordem e formosura.<br />

Ela é o esplendor da<br />

ordem. Pelo contrário,<br />

a desordem é feia, hedionda,<br />

porque resulta das<br />

deformações da alma pelo pecado.<br />

34


A Igreja Católica, que é<br />

uma obra-prima de Deus,<br />

imediatamente depois de<br />

nascer começou a se adornar,<br />

se embelezar com a<br />

arte. Vêem-se formosas<br />

manifestações de arte nos<br />

primeiríssimos templos,<br />

inclusive nas catacumbas.<br />

Nestas, os católicos<br />

– entre o drama<br />

da manhã quando<br />

amigos foram devorados<br />

pelas feras,<br />

e o do dia seguinte<br />

em que<br />

outros amigos<br />

ou eles mesmos<br />

serão trucidados<br />

– pensavam<br />

em termos de religião.<br />

E por isso<br />

colocavam obras<br />

de arte, muitas<br />

de bom gosto,<br />

nas mesmas<br />

catacumbas tão<br />

obscuras e feias.<br />

Cada etapa<br />

da vida da Esposa<br />

de Cristo<br />

é marcada por<br />

um estilo artístico<br />

próprio, o<br />

qual reflete à sua<br />

maneira o espírito<br />

da Igreja, que<br />

é o Espírito Santo.<br />

Houve grandes<br />

Papas, bispos,<br />

fundadores<br />

de ordens religiosas,<br />

imperadores e<br />

reis, nobres, aristocratas,<br />

e até pessoas<br />

de condição humilde,<br />

que modelaram<br />

coisas formosíssimas<br />

sob o influxo do espírito<br />

católico.<br />

Nota-se isso, por<br />

exemplo, no Brasil e<br />

em quase toda a América do Sul. O<br />

Aleijadinho, grande artista católico<br />

brasileiro, era um homem do povo<br />

que nunca fizera estudos de caráter<br />

escolar, mas no terreno da escultura<br />

e da pintura produziu obras<br />

mestras, hoje notáveis no mundo<br />

inteiro.<br />

Ele só tratou de temas religiosos;<br />

sua alma cheia de Fé lhe inspirou o<br />

sentido da formosura.<br />

Tenho visto um álbum com fotografias<br />

de quadros feitos por pintores<br />

populares bolivianos, quase<br />

todos versando sobre assuntos religiosos.<br />

Que piedade, recolhimen-<br />

to, elevação de alma, arte, bom<br />

gosto!<br />

De onde vem isto?<br />

Não só de sua natureza, porque<br />

enquanto não eram católicos não haviam<br />

produzido tais coisas. O influxo<br />

da Religião Católica sobre suas aptidões,<br />

suas capacidades naturais, inspirou<br />

a tendência, a possibilidade de<br />

fazer aquelas obras de arte. Nota-se<br />

assim que por toda parte a Igreja, por<br />

uma propriedade que lhe é intrínseca,<br />

gera a arte e a formosura. v<br />

(Extraído de conferência de<br />

14/1/1974)<br />

35


Stella Matutina<br />

Aestrela da manhã aparece no<br />

período incerto, entre a noite<br />

ainda existente e o dia que<br />

timidamente vai nascendo. Simboliza a<br />

época em que vivemos, onde imperam as<br />

trevas da Revolução, porém já se pressente<br />

o triunfo do Sapiencial e Imaculado<br />

Coração de Maria, prometido por Nossa<br />

Senhora em Fátima.<br />

Portanto, a Maria enquanto “Stella<br />

matutina”, a Estrela que nos anuncia<br />

como iminente a aurora de seu reino,<br />

devemos recorrer nas dificuldades<br />

referentes à causa contra-revolucionária,<br />

em nosso apostolado e em todas as ocasiões<br />

nas quais a piedade nos sugira essa<br />

invocação.<br />

Ó Estrela da manhã, Vós fostes durante<br />

a noite da espera a nossa luz e a promessa<br />

do alvorecer; fazei com que desponte<br />

quanto antes o dia de vosso Reino!<br />

(Extraído de conferências de 29/11/1991 e 1/12/1991)<br />

Nossa Senhora<br />

de Fátima.<br />

T. Ring

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