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LEAL, Victor Nunes. Coronelismo Enxada e Voto

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título atual, sugerido por Emil Farhat, pela Forense), que vem nessa edição também reproduzido. Contra<br />

a incompreensão, rearmou, na resposta mencionada, que para ele o conceito de coronelismo<br />

incorporava, sim, traços de mandonismo local, mas era mais que isso, fazia parte de um sistema, de uma<br />

trama que ligava coronéis (mandões), governadores e presidente da República. Insistiu no ponto: era a<br />

ideia de sistema que distinguia seu conceito e lhe conferia originalidade. Em suas palavras: “O coronel<br />

entrou na análise por ser parte do sistema, mas o que mais me preocupava era o sistema, a estrutura e a<br />

maneira pela qual as relações de poder se desenvolviam na Primeira República, a partir do município”.<br />

A diculdade que críticos e admiradores encontraram, e ainda encontram, em compreender a<br />

novidade do livro, exposta, aliás, com clareza meridiana, marca registrada de tudo que ele escrevia,<br />

lembra o episódio vericado durante a defesa da tese na antiga Faculdade Nacional de Filosoa, em<br />

1947, e comunicado por ele em carta a Alberto Venâncio Filho. O episódio é saboroso e, mesmo que o<br />

destinatário da carta já o tenha registrado no prefácio à terceira edição, feita pela Nova Fronteira em<br />

1997, merece ser relembrado. Pedro Calmon, um dos examinadores, no melhor estilo bacharelesco da<br />

época, recorreu a uma das muitas fórmulas usadas para humilhar os candidatos aos concursos. Citando<br />

Capistrano de Abreu, sentenciou, provocando gargalhadas, que ninguém poderia ignorar completamente<br />

o que fosse coronelismo sem ter lido a tese de <strong>Victor</strong> <strong>Nunes</strong>. Apesar da extrema modéstia, a vítima, que<br />

se preparara cuidadosamente para o certame, não se deixou intimidar. Retrucou, duplicando as<br />

gargalhadas, que ninguém poderia ignorar completamente o que fosse sua tese sem ter ouvido a arguição<br />

do professor Pedro Calmon.<br />

Sinto-me a salvo do risco de merecer a resposta dada a Pedro Calmon, uma vez que, na mesma<br />

resposta, <strong>Victor</strong> <strong>Nunes</strong> considerou correta minha interpretação de seu livro. Mas, diante da diculdade<br />

que muitos ainda parecem ter na compreensão ou aceitação da novidade conceitual trazida por<br />

<strong>Coronelismo</strong>, e, sobretudo, diante da absoluta necessidade de frisar sua relevância para a história de<br />

nossa produção intelectual, creio valer a pena, mesmo passados tantos anos da primeira edição, retomar<br />

o debate. Procederei da seguinte maneira: primeiro, mostrarei a novidade da obra; depois, buscarei, na<br />

formação de <strong>Victor</strong> <strong>Nunes</strong> e no contexto em que trabalhou, possíveis explicações para a natureza<br />

inovadora dela; finalmente, comentarei o que resta de <strong>Coronelismo</strong> nos dias de hoje.<br />

ORIGINALIDADES DE CORONELISMO<br />

Não foi uma, foram várias as originalidades do livro. Para apontá-las, retomo alguns comentários<br />

que z na saudação a <strong>Victor</strong> <strong>Nunes</strong> por ocasião da homenagem que lhe foi prestada pelo Iuperj. A<br />

primeira, a mais importante e menos compreendida, já foi comentada. Tem a ver com o enfoque do<br />

coronelismo como sistema, como caracterização da rede nacional de poder desenvolvida no período<br />

histórico que correspondeu à primeira experiência do federalismo. O coronelismo, nessa visão, não é<br />

simplesmente um fenômeno da política local, não é mandonismo. Tem a ver com a conexão entre<br />

município, Estado e União, entre coronéis, governadores e presidente, num jogo de coerção e cooptação<br />

exercido nacionalmente.<br />

Outra inovação importante foi romper com o estilo dicotômico de analisar a política e a vida

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