edição de 19 de dezembro de 2016
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STORYTELLER<br />
Churchill,<br />
charuto e Ziraldo<br />
MF Ilustra<br />
Deixo claro que as histórias que contarei<br />
aqui, envolvendo gran<strong>de</strong>s momentos<br />
educacionais, são apenas registros<br />
LuLa Vieira<br />
Não sou expert em educação infantil e,<br />
não fossem as mães <strong>de</strong> meus filhos,<br />
creio que teria criado marginais <strong>de</strong>sajustados<br />
da pior espécie. O que, por sorte, milagre<br />
ou influência das mães, não ocorreu.<br />
Minha mulher, além <strong>de</strong> educadora, é autora<br />
<strong>de</strong> livros infantis e coor<strong>de</strong>na um dos projetos<br />
<strong>de</strong> educação mais importantes <strong>de</strong>ste<br />
país, reconhecido internacionalmente. Por<br />
isso, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já, <strong>de</strong>ixo claro que as histórias<br />
que contarei aqui, envolvendo gran<strong>de</strong>s momentos<br />
educacionais, são apenas registros,<br />
aos quais me abstenho <strong>de</strong> qualquer comentário,<br />
para os quais abro ouvidos e mente.<br />
Vamos ao primeiro caso.<br />
Com o sucesso arrasador <strong>de</strong> The Crown<br />
e dos três livros sobre Winston Churchill<br />
bombando nas livrarias, me lembrei <strong>de</strong> um<br />
episódio que raramente é mencionado nas<br />
biografias do gran<strong>de</strong> estadista, mas que é<br />
um exemplo magnífico <strong>de</strong> relacionamento<br />
com crianças. Como se sabe, nosso primeiro<br />
Lor<strong>de</strong> do Almirantado não gostava<br />
<strong>de</strong>sses pequenos seres. Também não era<br />
chegado muito a mulheres, mas digressiono,<br />
já que o tema é educação infantil. Pois<br />
bem, durante os bombar<strong>de</strong>ios <strong>de</strong> Londres,<br />
Churchill, para dar apoio à população, tão<br />
logo os aviões alemães se afastavam, percorria<br />
a cida<strong>de</strong>, falando aos <strong>de</strong>sabrigados,<br />
dando-lhes apoio moral, incentivando-os à<br />
resistência.<br />
Numa <strong>de</strong>ssas ocasiões, discursando sobre<br />
uma pilha <strong>de</strong> escombros on<strong>de</strong> antes<br />
eram casas, uma criança chorava <strong>de</strong>sesperadamente<br />
no colo da mãe, atrapalhando a<br />
fala <strong>de</strong> Churchill e, <strong>de</strong> certa forma, tirando<br />
toda a solenida<strong>de</strong> heroica <strong>de</strong> suas palavras.<br />
Por mais do que os pais tentassem, o<br />
pequeno berrava com toda a força. Vai daí<br />
que, para surpresa <strong>de</strong> todos, principalmente<br />
dos assessores, Churchill pega o garoto<br />
(era um garoto <strong>de</strong> uns seis anos) no colo e<br />
murmura <strong>de</strong>licadamente alguma coisa em<br />
seus ouvidos.<br />
A criança para imediatamente <strong>de</strong> chorar<br />
e ele a <strong>de</strong>volve para os pais e encerra<br />
o discurso, brilhante como sempre. Virou<br />
lenda e todos se perguntavam: o que teria<br />
dito sir Winston para comover tanto o menino<br />
a ponto <strong>de</strong> silenciá-lo? Levaram anos<br />
para que se soubesse que maravilhosas<br />
palavras tinham sido aquelas capazes <strong>de</strong><br />
causar aquela reação. Pouco antes <strong>de</strong> morrer,<br />
o Gran<strong>de</strong> Homem <strong>de</strong>sfez o mistério. Ele<br />
simplesmente mostrou o charuto que tinha<br />
entre os <strong>de</strong>dos e disse: “está vendo este<br />
charuto? Eu enfio ele inteirinho no teu cu<br />
se você não calar essa boca agora!”<br />
A história não registra o que aconteceu<br />
mais tar<strong>de</strong> com a criança, mas os secretários<br />
garantem que Churchill afirmava que<br />
o uso da psicologia sempre foi fundamental<br />
ao se dirigir às massas. O outro episódio<br />
ocorreu há exatamente uma semana, na<br />
noite <strong>de</strong> autógrafos do Ziraldo que, como<br />
sempre, pop star que é, lotava uma livraria<br />
para que menininhos e menininhas vissem<br />
<strong>de</strong> perto o gran<strong>de</strong> ídolo, o maior autor infantil<br />
brasileiro, e ganhassem um autógrafo<br />
<strong>de</strong>le.<br />
Um pentelho, aliás, filho <strong>de</strong> um amigo,<br />
resolveu levar Ziraldo à loucura e não <strong>de</strong>ixou<br />
ninguém em paz na livraria. Furou fila,<br />
bateu em outras crianças, <strong>de</strong>rrubou prateleiras,<br />
fez tudo que tinha direito para justificar<br />
um infanticídio. Até que olhou para o<br />
Ziraldo e, reparando seus cabelos e sobrancelhas<br />
branquérrimos, concluiu: “mas tu tá<br />
muito velho, né ô cara!” Ao que o querido<br />
escritor <strong>de</strong> Menino Maluquinho; Flicts; Jeremias,<br />
o Bom e tantas outras obras-primas,<br />
respon<strong>de</strong>u candidamente: “velho é a puta<br />
que te pariu!”. Pois não é que o carinha<br />
compreen<strong>de</strong>u, pegou seu autógrafo calmamente<br />
e ainda agra<strong>de</strong>ceu?<br />
Tivesse minha neta um pouco mais <strong>de</strong><br />
ida<strong>de</strong> (tem só um mês) eu iria utilizar a sábia<br />
lição <strong>de</strong> mestre Zira. Criança que não sabe<br />
se comportar vai à putaqueopariu. Com<br />
todo respeito às mamães, é claro. Putaqueopariu<br />
é aquele lugar imaginário on<strong>de</strong> <strong>de</strong>viam<br />
estar políticos corruptos e crianças<br />
que não sabem se comportar. Feliz Natal!<br />
Lula Vieira é publicitário, diretor da<br />
Mesa Consultoria <strong>de</strong> Comunicação,<br />
radialista, escritor, editor e professor<br />
lulavieira@grupomesa.com.br<br />
36 <strong>19</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> <strong>2016</strong> - jornal propmark