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Revista Curinga Edição 22

Revista Laboratorial do Curso de Graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto.

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“Por Deus, pelos meus filhos, pela minha família,<br />

pelos militares de 1964 e os de agora”. Com<br />

esses porquês, a Câmara dos Deputados aprovou a<br />

admissibilidade do processo de impeachment contra<br />

a presidenta Dilma Rousseff, em abril de 2016. Motivos<br />

que representavam desejos pessoais como forma<br />

de culpabilizar quem não compactuava com os<br />

seus ideais. Escolher Dilma para exercer esse papel<br />

significa entender os contextos aos quais o Brasil e<br />

sua primeira presidenta se submeteram.<br />

Para o cientista político e professor da Universidade<br />

Federal de Ouro Preto (Ufop), Antônio Ferreira<br />

da Silva, os cenários políticos e econômicos<br />

são cruciais para entender o processo deste impeachment.<br />

Um detalhe percebido por ele é que Dilma<br />

possuía uma imagem considerada intransigente<br />

pelos parlamentares, ou seja, havia uma dificuldade<br />

em negociar com ela. “O que faz a Dilma Rousseff<br />

perder o poder é que ela não teve uma base<br />

parlamentar”, argumenta o cientista político.<br />

Essa falta de apoio à presidenta eleita em 2014,<br />

começa quatro anos antes. No seu primeiro mandato,<br />

ela já era conhecida por se opor a esquemas<br />

de corrupção. Dilma iniciou seu segundo governo à<br />

frente de uma crise política, criada por uma oposição<br />

apoiada pela maioria do congresso. Em um país<br />

onde vigora o “presidencialismo de coalizão”, um<br />

arranjo político-institucional baseado em acordos<br />

entre partidos políticos que visam objetivos específicos,<br />

perder apoio é sinônimo de perder a governabilidade.<br />

A insatisfação parlamentar era tanta que,<br />

em 2014, no dia do anúncio de sua vitória para um<br />

segundo mandato, o PSDB e suas coligações já deixavam<br />

claro que não a deixariam governar.<br />

Um “mero detalhe” que também explica a força<br />

que esse tipo de presidencialismo possui, é que<br />

Dilma foi acusada de cometer um crime de responsabilidade<br />

por acionar um ato comum na presidência.<br />

As pedaladas fiscais, praticadas também por<br />

Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da<br />

Silva, só se tornaram impróprias quando Rousseff<br />

as realizou. Logo após o impeachment voltaram a ser<br />

permitidas, tanto que atualmente, Temer as realiza.<br />

“O mesmo Congresso que aprovou os créditos<br />

da Dilma também fomentou a ideia de que era um<br />

crime, isso que é o mais interessante”, afirma Alexandre<br />

Melo Bahia, professor de Direito da Ufop.<br />

Segundo Bahia, as pedaladas fiscais acontecem<br />

para garantir o cumprimento de determinados programas<br />

sociais. Elas ocorrem em um momento que<br />

não há caixa para pagar as contas. Para não atrasar<br />

esses pagamentos, como quem paga esses benefícios<br />

são a Caixa Econômica Federal ou o Banco<br />

do Brasil, os bancos públicos adiantam o dinheiro,<br />

pagam a dívida e depois o governo cobre os gastos.<br />

Ele explica também que o Tribunal de Contas<br />

da União (TCU), órgão que autoriza todos esses<br />

gastos, aprovou todas as despesas relacionadas ao<br />

governo Dilma e ao atual governo Temer. Porém,<br />

naquele momento em que a ideia de impedimento<br />

estava sendo instaurada, o TCU mudou a lei como<br />

forma de legitimar o pedido de impeachment.<br />

O grande problema desse processo foi de caracterização<br />

da pedalada fiscal, pois, segundo o<br />

professor Alexandre, não há encaixes neste procedimento<br />

que caracterizem crimes de responsabilidade<br />

fiscal. “Eles fizeram uma coisa que, no<br />

Direito, se chama analogia. Pegaram uma hipótese<br />

prevista e uma não prevista e fizeram uma comparação”,<br />

afirmando ser ilegítimo. Como se não<br />

bastasse criar uma crise política, a crise econômica<br />

vem por consequência como forma de desestabilizar<br />

o governo Dilma. Na medida em que havia essa<br />

instabilidade, as empresas e o capital estrangeiro<br />

retiraram os investimentos no Brasil. “Ninguém<br />

investe em um país de crise de política”, complementa<br />

o professor Antônio da Silva.<br />

O golpe<br />

Coloca-se, então, uma questão: se não houve<br />

crime, o que significa retirar da Presidência da<br />

República alguém que teve 54,5 milhões de votos<br />

em um processo eleitoral transparente e legítimo?<br />

Para a professora de Jornalismo Econômico e Político<br />

da Ufop, Hila Rodrigues, “embora o processo<br />

do impeachment tenha sido aparentemente legal, foi<br />

O mesmo Congresso que<br />

aprovou os créditos da Dilma também<br />

fomentou a ideia de que era um<br />

crime, isso é que é o mais interessante<br />

Alexandre Melo Bahia<br />

CURINGA | EDIÇÃO <strong>22</strong><br />

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