Acesso a Justica - Mauro Cappelletti
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3. Tempo<br />
Em muitos países, as partes que buscam uma solução judicial precisam esperar dois ou três anos, ou mais,<br />
por uma decisão exequível. Os efeitos dessa delonga, especialmente se considerados os índices de inflação, podem<br />
ser devastadores. Ela aumenta os custos para as partes e pressiona os economicamente fracos a abandonar suas<br />
causas, ou a aceitar acordos por valores muito inferiores àqueles a que teriam direito. A Convenção Europeia para<br />
Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais reconhece explicitamente, no artigo 69, parágrafo 19<br />
que a Justiça que não cumpre suas funções dentro de um prazo razoável.<br />
B. Possibilidades das partes<br />
As “possibilidades das partes” como ficou demonstrado por uma recente linha de pesquisa, de crescente<br />
importância, é ponto central quando se cogita da denegação ou da garantia de acesso efetivo.<br />
Essa expressão, utilizada pelo Prof. Marc Galanter, repousa na “noção de que algumas espécies de litigantes<br />
gozam de uma gama de vantagens estratégicas”. Devemos reconhecer que o estudo das vantagens e desvantagens<br />
estratégicas está apenas começando e é difícil avaliá-las com precisão. No entanto, podemos não só isolar algumas<br />
das vantagens e desvantagens básicas para determinados litigantes, senão também, aventurar algumas hipóteses<br />
com base em pesquisas sociológicas recentes e altamente sugestivas.<br />
1. Recursos Financeiros<br />
Pessoas ou organizações que possuam recursos financeiros consideráveis a serem utilizados têm vantagens<br />
óbvias ao propor ou defender demandas. Em primeiro lugar, elas podem pagar para litigar.<br />
Podem, além disso, suportar as delongas do litígio. Cada uma dessas capacidades, em mãos de uma única das<br />
partes, pode ser uma arma poderosa; a ameaça de litígio torna-se tanto plausível quanto efetiva. De modo similar,<br />
uma das partes pode ser capaz de fazer gastos maiores que a outra e, como resultado, apresentar seus argumentos<br />
de maneira mais eficiente. Julgadores passivos, apesar de suas outras e mais admiráveis características, exacerbam<br />
claramente esse problema, por deixarem às partes a tarefa de obter e apresentar as provas, desenvolver e discutir a<br />
causa dentro de “um prazo razoável” é, para muitas pessoas, uma Justiça inacessível.<br />
2. Aptidão para Reconhecer um Direito e propor urna Ação ou Sua Defesa<br />
A “capacidade jurídica” pessoal, se se relaciona com as vantagens de recursos financeiros e diferenças de<br />
educação, meio e status social, é um conceito muito mais rico, e de crucial importância na determinação da<br />
acessibilidade da justiça. Ele enfoca as inúmeras barreiras que precisam ser pessoalmente superadas, antes que um<br />
direito possa ser efetivamente reivindicado através de nosso aparelho judiciário. Muitas (senão a maior parte) das<br />
pessoas comuns não podem — ou, ao menos, não conseguem — superar essas barreiras na maioria dos tipos de<br />
processos.<br />
Num primeiro nível está a questão de reconhecer a existência de direito juridicamente exigível. Essa barreira<br />
fundamental é especialmente séria para os despossuídos, mas não afeta apenas os pobres. Ela diz respeito a toda<br />
a população em muitos tipos de conflitos que envolvem direitos. Observou recentemente o professor Leon<br />
Mayhew: “Existe um conjunto de interesses e problemas potenciais; alguns são bem compreendidos pelos<br />
membros da população, enquanto outros são percebidos de forma pouco clara, ou de todo despercebidos”.<br />
Mesmo consumidores bem informados, por exemplo, só raramente se dão conta de que sua assinatura num<br />
contrato não significa que precisem, obrigatoriamente, sujeitar-se a seus termos, em quaisquer circunstâncias.<br />
Falta-lhes o conhecimento jurídico básico não apenas para fazer objeção a esses contratos, mas até mesmo para<br />
perceber que sejam passíveis de objeção.<br />
Ademais, as pessoas têm limitados conhecimentos a respeito da maneira de ajuizar uma demanda. O<br />
principal estudo empírico inglês a respeito desse assunto concluiu:<br />
“Na medida em que o conhecimento daquilo que está disponív el constitui pré-requisito da solução do problema da<br />
necessidade jurídica não atendida, é preciso f azer muito mais para aumentar o grau de conhecimento do público a respeito