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O TESOURO DOS INCONFIDENTES<br />
Inácio Muzzi - Jornalista e Diretor da Companhia <strong>de</strong> Notícias em Brasília<br />
A Inconfidência Mineira foi , supostamente,<br />
financiada por agentes externos, assim há<br />
uma lenda que sustenta que existe um<br />
Tesouro dos Inconfi<strong>de</strong>ntes, e que na<br />
Fazenda da Vargem do Itacolomi - na<br />
localida<strong>de</strong> da Vargem - em Mariana este<br />
tesouro estaria enterrado. Este assunto<br />
apareceu em um artigo do gran<strong>de</strong> historiador<br />
Salomão <strong>de</strong> Vasconcelos , no Jornal <strong>de</strong><br />
Minas em 1944 ( página 14). Abaixo texto do<br />
Inácio Muzzi sobre o assunto.<br />
“Aqui, além, pelo mundo, ossos, nomes,<br />
letras, poeira... On<strong>de</strong>, os rostos? On<strong>de</strong>, as<br />
almas? Nem os her<strong>de</strong>iros recordam rastro<br />
nenhum pelo chão”. Na quarta estrofe da<br />
“ F a l a I n i c i a l ” d o R o m a n c e i r o d a<br />
Inconfidência (1953), Cecília Meireles revela<br />
frustração no estudo <strong>de</strong> ambiente que fez<br />
para compor seu inspirado poema <strong>de</strong> 80<br />
cantos. Nas suas viagens a Ouro Preto e<br />
Mariana, no início dos anos 1950, encontrou<br />
apenas “os gran<strong>de</strong>s muros sem eco”, o<br />
“bater dos sinos”, o “roçar das rezas”, a<br />
“negra masmorra”, “as plácidas colinas”, as<br />
“silenciosas vertentes” – tal como se<br />
apresentavam no distante 1789, ano em que<br />
a Coroa portuguesa <strong>de</strong>sbaratou os<br />
inconfi<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> Minas Gerais. Faltou à<br />
poeta encontrar <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes dos<br />
personagens envolvidos naquela antiga<br />
trama. Os <strong>de</strong> posse mudaram‐se. Os<br />
<strong>de</strong>mais, sem instrução, sem informação da<br />
saga familiar, per<strong>de</strong>ram‐se da história. Antes<br />
disso, na primeira década do século XX, meu<br />
tio‐bisavô, o historiador Diogo <strong>de</strong><br />
Vasconcellos, autor <strong>de</strong> História Antiga (1904)<br />
e História Média <strong>de</strong> Minas Gerais (1918),<br />
pesquisava a <strong>de</strong>scendência da filha ilegítima<br />
<strong>de</strong> Tira<strong>de</strong>ntes e teve a curiosida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>spertada por outra “bastardia”: a do poeta<br />
Cláudio Manoel da Costa, igualmente<br />
revelada nos Autos da <strong>de</strong>vassa, que reúnem<br />
o s d e p o i m e n t o s p r e s t a d o s p e l o s<br />
inconfi<strong>de</strong>ntes às autorida<strong>de</strong>s portuguesas. O<br />
poeta, como se sabe, apareceu morto na<br />
prisão – um cubículo <strong>de</strong>baixo da escada da<br />
Casa do Real Contrato das Entradas, atual<br />
Casa dos Contos – em 4 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1789,<br />
dois dias após ser submetido a severo<br />
interrogatório. Os carcereiros disseram que<br />
foi suicídio, mas os rumores falavam <strong>de</strong><br />
assassinato – versão admitida até mesmo<br />
pela Igreja, que permitiu a celebração <strong>de</strong><br />
missas pela sua alma. Cláudio Manoel da<br />
Costa seria um Vladimir Herzog avant la<br />
lettre.<br />
O poeta morreu aos 60 anos, solteiro,<br />
<strong>de</strong>ixando duas filhas “bastardas”, como se<br />
dizia, fruto <strong>de</strong> relação que manteve com<br />
Francisca Cardosa, escrava <strong>de</strong> um vizinho<br />
cuja alforria comprou. Eram elas: Francisca,<br />
que na época da Inconfidência vivia com o<br />
marido e filhos no sítio da Vargem, <strong>de</strong><br />
proprieda<strong>de</strong> do poeta‐ inconfi<strong>de</strong>nte, e Maria,<br />
<strong>de</strong> onze anos, que morava em companhia da<br />
mãe em Vila Rica, antiga <strong>de</strong>nominação <strong>de</strong><br />
Ouro Preto. Nascido no Brasil, nesse mesmo<br />
sítio da Vargem, Cláudio Manoel da Costa<br />
era filho <strong>de</strong> um lavrador e dizia‐se<br />
<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte dos antigos ban<strong>de</strong>irantes<br />
paulistas. Estudou na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Coimbra, e na volta à Colônia exerceu as<br />
funções <strong>de</strong> advogado, juiz e secretário <strong>de</strong><br />
dois governos, tornando‐se rico e influente.<br />
A qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua poesia lírica é<br />
reconhecida pela crítica contemporânea.<br />
Com o pseudônimo <strong>de</strong> Glauceste, Cláudio<br />
freqüentava o grupo dos chamados poetas<br />
árca<strong>de</strong>s, no momento em que “a literatura<br />
brasileira alcançou o seu primeiro período<br />
i<strong>de</strong>ologicamente articulado”, na visão do<br />
crítico José Guilherme Merquior. No canto<br />
VIII <strong>de</strong> seu mais famoso poema, “Vila Rica”,<br />
publicado postumamente, ao falar das<br />
pedras preciosas, o poeta vaticina: “...Os<br />
tesouros que oculta e guarda a terra (Tristes<br />
causas do mal, causas da guerra!)”. Guerra<br />
não houve, mas o envolvimento do poeta na<br />
conspiração levou a Coroa portuguesa a<br />
arrestar todos os seus bens: fazendas,<br />
casas, lavras, escravos, ouro em pó,<br />
prataria, móveis, roupas e 406 livros,<br />
<strong>de</strong>clarando ainda infames seus filhos e<br />
netos.<br />
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