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Revista de Abril 20182

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O TESOURO DOS INCONFIDENTES<br />

Inácio Muzzi - Jornalista e Diretor da Companhia <strong>de</strong> Notícias em Brasília<br />

A Inconfidência Mineira foi , supostamente,<br />

financiada por agentes externos, assim há<br />

uma lenda que sustenta que existe um<br />

Tesouro dos Inconfi<strong>de</strong>ntes, e que na<br />

Fazenda da Vargem do Itacolomi - na<br />

localida<strong>de</strong> da Vargem - em Mariana este<br />

tesouro estaria enterrado. Este assunto<br />

apareceu em um artigo do gran<strong>de</strong> historiador<br />

Salomão <strong>de</strong> Vasconcelos , no Jornal <strong>de</strong><br />

Minas em 1944 ( página 14). Abaixo texto do<br />

Inácio Muzzi sobre o assunto.<br />

“Aqui, além, pelo mundo, ossos, nomes,<br />

letras, poeira... On<strong>de</strong>, os rostos? On<strong>de</strong>, as<br />

almas? Nem os her<strong>de</strong>iros recordam rastro<br />

nenhum pelo chão”. Na quarta estrofe da<br />

“ F a l a I n i c i a l ” d o R o m a n c e i r o d a<br />

Inconfidência (1953), Cecília Meireles revela<br />

frustração no estudo <strong>de</strong> ambiente que fez<br />

para compor seu inspirado poema <strong>de</strong> 80<br />

cantos. Nas suas viagens a Ouro Preto e<br />

Mariana, no início dos anos 1950, encontrou<br />

apenas “os gran<strong>de</strong>s muros sem eco”, o<br />

“bater dos sinos”, o “roçar das rezas”, a<br />

“negra masmorra”, “as plácidas colinas”, as<br />

“silenciosas vertentes” – tal como se<br />

apresentavam no distante 1789, ano em que<br />

a Coroa portuguesa <strong>de</strong>sbaratou os<br />

inconfi<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> Minas Gerais. Faltou à<br />

poeta encontrar <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes dos<br />

personagens envolvidos naquela antiga<br />

trama. Os <strong>de</strong> posse mudaram‐se. Os<br />

<strong>de</strong>mais, sem instrução, sem informação da<br />

saga familiar, per<strong>de</strong>ram‐se da história. Antes<br />

disso, na primeira década do século XX, meu<br />

tio‐bisavô, o historiador Diogo <strong>de</strong><br />

Vasconcellos, autor <strong>de</strong> História Antiga (1904)<br />

e História Média <strong>de</strong> Minas Gerais (1918),<br />

pesquisava a <strong>de</strong>scendência da filha ilegítima<br />

<strong>de</strong> Tira<strong>de</strong>ntes e teve a curiosida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>spertada por outra “bastardia”: a do poeta<br />

Cláudio Manoel da Costa, igualmente<br />

revelada nos Autos da <strong>de</strong>vassa, que reúnem<br />

o s d e p o i m e n t o s p r e s t a d o s p e l o s<br />

inconfi<strong>de</strong>ntes às autorida<strong>de</strong>s portuguesas. O<br />

poeta, como se sabe, apareceu morto na<br />

prisão – um cubículo <strong>de</strong>baixo da escada da<br />

Casa do Real Contrato das Entradas, atual<br />

Casa dos Contos – em 4 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1789,<br />

dois dias após ser submetido a severo<br />

interrogatório. Os carcereiros disseram que<br />

foi suicídio, mas os rumores falavam <strong>de</strong><br />

assassinato – versão admitida até mesmo<br />

pela Igreja, que permitiu a celebração <strong>de</strong><br />

missas pela sua alma. Cláudio Manoel da<br />

Costa seria um Vladimir Herzog avant la<br />

lettre.<br />

O poeta morreu aos 60 anos, solteiro,<br />

<strong>de</strong>ixando duas filhas “bastardas”, como se<br />

dizia, fruto <strong>de</strong> relação que manteve com<br />

Francisca Cardosa, escrava <strong>de</strong> um vizinho<br />

cuja alforria comprou. Eram elas: Francisca,<br />

que na época da Inconfidência vivia com o<br />

marido e filhos no sítio da Vargem, <strong>de</strong><br />

proprieda<strong>de</strong> do poeta‐ inconfi<strong>de</strong>nte, e Maria,<br />

<strong>de</strong> onze anos, que morava em companhia da<br />

mãe em Vila Rica, antiga <strong>de</strong>nominação <strong>de</strong><br />

Ouro Preto. Nascido no Brasil, nesse mesmo<br />

sítio da Vargem, Cláudio Manoel da Costa<br />

era filho <strong>de</strong> um lavrador e dizia‐se<br />

<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte dos antigos ban<strong>de</strong>irantes<br />

paulistas. Estudou na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Coimbra, e na volta à Colônia exerceu as<br />

funções <strong>de</strong> advogado, juiz e secretário <strong>de</strong><br />

dois governos, tornando‐se rico e influente.<br />

A qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua poesia lírica é<br />

reconhecida pela crítica contemporânea.<br />

Com o pseudônimo <strong>de</strong> Glauceste, Cláudio<br />

freqüentava o grupo dos chamados poetas<br />

árca<strong>de</strong>s, no momento em que “a literatura<br />

brasileira alcançou o seu primeiro período<br />

i<strong>de</strong>ologicamente articulado”, na visão do<br />

crítico José Guilherme Merquior. No canto<br />

VIII <strong>de</strong> seu mais famoso poema, “Vila Rica”,<br />

publicado postumamente, ao falar das<br />

pedras preciosas, o poeta vaticina: “...Os<br />

tesouros que oculta e guarda a terra (Tristes<br />

causas do mal, causas da guerra!)”. Guerra<br />

não houve, mas o envolvimento do poeta na<br />

conspiração levou a Coroa portuguesa a<br />

arrestar todos os seus bens: fazendas,<br />

casas, lavras, escravos, ouro em pó,<br />

prataria, móveis, roupas e 406 livros,<br />

<strong>de</strong>clarando ainda infames seus filhos e<br />

netos.<br />

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