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É <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância um livro como este,<br />
que aborda <strong>de</strong> forma coerente a militarização da<br />
vida cotidiana das populações mais pobres do<br />
país e, principalmente, das que moram nas<br />
favelas e periferias do <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> <strong>Janeiro</strong>.<br />
Em 2014 e 2015, tive que conviver, ou melhor,<br />
sobreviver à presença <strong>de</strong> tanques <strong>de</strong> guerra<br />
pelas ruas da favela em que moro. Naquele a<strong>no</strong><br />
da chegada da Copa do Mundo, o conjunto <strong>de</strong><br />
Favelas da Maré, formado por 16 favelas e com<br />
mais <strong>de</strong> 140 mil moradores, foi invadido pelo<br />
Exército brasileiro.<br />
Nosso cotidia<strong>no</strong> foi completamente interrompido.<br />
Nossa festa <strong>de</strong> rua foi criminalizada. Nossa<br />
música não podia ser mais tocada nem <strong>no</strong> bar,<br />
nem nas rádios comunitárias, nem nas <strong>no</strong>ssas<br />
casas. A comunicação comunitária foi<br />
silenciada, censurada. As comunicadoras comunitárias<br />
foram procuradas, perseguidas,<br />
expostas, ameaçadas. Os trabalhadores —<br />
feirantes, mototaxistas, motoristas <strong>de</strong> kombis,<br />
do<strong>no</strong>s <strong>de</strong> bares, ambulantes — não pu<strong>de</strong>ram<br />
exercer o seu direito <strong>de</strong> trabalhar, mesmo nas<br />
suas funções já precarizadas.<br />
Eram revistas, fichamentos, <strong>no</strong>ssos celulares<br />
eram abertos pelos soldados, liam <strong>no</strong>ssas<br />
mensagens, viam os ví<strong>de</strong>os, olhavam as fotos.<br />
Em certo momento, até éramos proibidos <strong>de</strong><br />
andarmos com os celulares nas ruas. Os tiros<br />
certeiros eram constantes. Os tanques e jipes<br />
passavam sem querer saber se havia idosos,<br />
crianças ou grávidas pelas ruas. Eles passavam<br />
na maior velocida<strong>de</strong>, atropelavam e até<br />
matavam pessoas, principalmente, idosos.<br />
As escolas passaram mais tempo fechadas do<br />
que abertas durante o tempo que o Exército<br />
esteve na minha favela. Os soldados passaram a<br />
substituir professores em sala <strong>de</strong> aula, eles<br />
invadiam as salas e distribuíam a revistinha “O<br />
Recrutinha”. Esta revista tinha tanque <strong>de</strong> guerra<br />
para as crianças pintarem e recortarem.