RCIA - ED. 111 - OUTUBRO 2014
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HOMENAGEM<br />
Eternamente, o<br />
da Cantina do<br />
Benedito Brandão da<br />
Silva, o Escurinho<br />
A emergente cidade dos anos 60<br />
parecia mergulhada em querer<br />
descobrir as novidades. Tempos<br />
em que os gaúchos começavam<br />
a vir para montar churrascarias;<br />
as raras pizzarias habitavam o<br />
centro; bares e lanchonetes se<br />
diluíam envolvidas pela tradição<br />
brasileira e há quem apostava<br />
na tendência das cantinas. Foi o<br />
que fez o querido “Escurinho”.<br />
Reportagem: Jean Cazellotto<br />
E lá vamos nós, poucos dias antes daquele<br />
Natal de 1967, para a Cantina do Nhô Bento.<br />
O “Escurinho está na porta a nos esperar,<br />
guarda-chuva aberto aparando os pingos que<br />
caíam no começo da noite: “A festa tem hora<br />
pra começar, não tem hora pra acabar”, disse<br />
ele com imenso sorriso que se estendia de<br />
canto a canto da boca. Sorrir era seu jeito trigueiro<br />
(cor do trigo maduro; moreno, escuro),<br />
uma característica em sua vida toda.<br />
Benedito Brandão da Silva, o seu nome,<br />
que ninguém o conhecia assim, mas chamá-lo<br />
de “Escurinho”, era imaginar um ser humano<br />
bondoso, camarada, animado ao ouvir no rádio<br />
as vozes de Antônio Carlos Araújo e Wilson<br />
Luiz, gritando sem parar, os gols da Ferroviária<br />
nas noites de quarta-feira, ecoando pela cantina.<br />
Nascido em Santa Adélia, Escurinho se<br />
mudou com os pais para Araraquara com<br />
apenas três anos, por volta de 1935. Sua vida<br />
hoje pode ser contada em detalhes pelo filho<br />
Marcos Brandão da Silva, ou melhor, o Buíra.<br />
“O apelido foi dado ao meu pai quando trabalhava<br />
no Hotel Português, próximo ao Terminal<br />
Rodoviário (Integração). Quando as pessoas<br />
iam perguntar por ele, o dono do hotel dizia:<br />
“procure por um escurinho no portão de trás”,<br />
e foi assim que meu pai ficou conhecido”, conta<br />
o filho, que atualmente tem um quiosque<br />
de lanches na Praça Santa Cruz.<br />
Logo depois de trabalhar no hotel,<br />
Seo Freitas como era conhecido, ofereceu-<br />
lhe um emprego em seu bar, que<br />
ficava do outro lado da rua do hotel. No<br />
bar, permaneceu por dez anos, fazendo<br />
lanches, principalmente Bauru, e servindo<br />
Neste ponto nos anos 50, funcionava o Hotel<br />
do Português, um dos primeiros empregos do<br />
Escurinho<br />
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café aos clientes.<br />
Em uma oferta irrecusável, foi chamado para<br />
ser sócio de uma churrascaria na esquina da Avenida<br />
São Paulo com a Rua 1, a Nhô Bento. “Sem<br />
pensar duas vezes, ele aceitou a proposta e ficou<br />
por lá durante alguns anos”, lembra Buíra.<br />
Em meados da década de 1970, Escurinho<br />
viu a queda dos clientes no restaurante<br />
em que servia seus lanches e bebidas. “Então,<br />
começou a ir até o Hotel Uirapuru para<br />
servir o café da manhã nos quartos. Ele era<br />
de confiança do proprietário, o falecido Vicente<br />
Michetti. Apenas meu pai tinha autorização<br />
para entrar nos quartos de pessoas famosas.<br />
Ele serviu o café da manhã da Gretchen, em<br />
seu auge, além do Rei Roberto Carlos, Sérgio<br />
Reis e outros”.<br />
Não durou nem um ano e, em 1976, Escurinho<br />
terminou a sociedade no Nhô Bento<br />
e foi trabalhar na lanchonete do Uirapuru.<br />
Pouco tempo depois, Michetti surpreendeu o<br />
“faz-tudo” do local. “Ele disse ao meu pai: abra<br />
uma empresa em seu nome, porque agora a<br />
lanchonete é sua. Foi a partir daí que a nossa<br />
vida começou a mudar. Conseguimos melhorar<br />
nossa condição financeira por conta do<br />
Vicente. Tudo o que ele colocava a mão, virava<br />
ouro”, relata Buíra.<br />
No local, a família atendia pessoas importantes<br />
que desciam até o térreo do hotel<br />
para desfrutar da lanchonete. Escurinho ficou<br />
à frente da lanchonete até 1989, quando se<br />
aposentou e dedicou essa fase da vida aos filhos<br />
e esposa. Segundo Buíra, “quando ele se<br />
aposentou, passou o negócio para outra pessoa<br />
e decidiu curtir mais a família. Na época,<br />
eu tinha o Frango’s Grill, na Alameda e também<br />
Escurinho com Clotildes<br />
e o neto Ruhan, hoje<br />
com 9 anos