Chicos 59 - 22.12.2019
Chicos é uma publicação de literatura e ideias de Cataguases - MG - Brasil. Fale conosco em cataletras.chicos@gmail.com
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Chicos
Ronaldo Brito
Roque
Nasceu em Cataguases MG, é escritor, autor
entre outros do livro infantil A Menina do País
das Ruivas
Por um Brasil Global
Ultimamente tenho me sentido tão sozinho
que dá vontade de ir a qualquer lugar
onde haja mais de quatro pessoas, qualquer
muvuca que ofereça a remota possibilidade
de conhecer gente nova, trocar telefones,
fazer umas fotos maneiras.
Já fiz cursos de cerâmica e percussão. Já estive
em missas e em bailes-fanque. Já acompanhei
funerais de gente que eu não conhecia.
Tudo pelo desejo de trocar alguns olhares
e sorrisos, talvez palavras, sentir um
pouco de contato humano, de simpatia, de
remissão. Se alguém pedir meu telefone, talvez
eu chegue a ter um pequeno orgasmo.
Para evitar esse vexame, procuro não me
demorar em nenhum assunto. Tento dizer
tudo que penso em cinco ou seis palavras.
Ninguém me estranha. Afinal, vivemos num
mundo de cinco ou seis palavras. Mais que
isso é discurso, é tagarelice, é tese de mestrado.
Moro numa cidade grande que, como toda
cidade grande, está cheia de protestos e manifestações
populares. Um dia me toquei
que protestos são ótimos refúgios contra a
solidão. Você fica cercado de gente, grita as
mesmas frases, troca alguns olhares, depois
sempre rola um convite para um chope ou
para outro protesto, supostamente mais eficaz
e interessante.
Num protesto é mais fácil puxar assunto.
Você lê os cartazes e sabe mais ou menos o
que as pessoas querem que se diga. Assim
sobra menos chance para decepção. Protesto
é uma forma de codificar e ordenar o comportamento
humano, que, se deixado ao
acaso, acaba sendo apenas barulho, desentendimento,
caos, e o que pode ser pior: solidão.
Certo sábado me bateu aquela angústia enjoada,
e vasculhei a internet em busca de
um protesto para preencher o dia. Havia um
pelos direitos dos homossexuais, o que acho
súper legal, claro, dou a maior força, mas
acabei deixando passar, porque prefiro não
dar a impressão de ser um deles. Outro era
pelos direitos dos negros, o que também
acho muito justo, concordo, claro que
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