Desvairadas: histórias de pessoas LGBT em Florianópolis, capital de Santa Catarina (2014)
Este livro-reportagem foi produzido de maneira independente e apresentado como TCC do curso de Jornalismo da UFSC em 2014, com o intuito de oferecer narrativas jornalísticas sobre pessoas LGBT que fujam do olhar de exotificação e patologização habitualmente encontrado em reportagens dos meios de comunicação hegemônicos. Por esse motivo, a reprodução deste material é livre e fortemente estimulada.
Este livro-reportagem foi produzido de maneira independente e apresentado como TCC do curso de Jornalismo da UFSC em 2014, com o intuito de oferecer narrativas jornalísticas sobre pessoas LGBT que fujam do olhar de exotificação e patologização habitualmente encontrado em reportagens dos meios de comunicação hegemônicos. Por esse motivo, a reprodução deste material é livre e fortemente estimulada.
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
entrou pela primeira vez em uma boate para Gays, Lésbicas
e Simpatizantes (GLS), no bairro Estreito. Fazia o estilo de
boate inferninho, meio escondida, e só entrava quem fosse
amigo ou chegado no negócio. Guilhermina pertencia ao último
grupo. Tinha o hábito constante de ler, lia de tudo – o
filósofo francês Jean-Paul Sartre era um dos preferidos –, lia
tanto que acabou se deparando com algo chamado naquela
época de “desvio sexual”.
Por desvio sexual, ou perversões, entendiam-se então as
“anormalidades” no comportamento sexual humano, como
aquelas em que o indivíduo obtém prazer a partir de fantasias
ou desejos sexuais com objetos, humilhação, animais, crianças
ou pessoas que não consentem com o ato. Estavam equiparadas,
em uma mesma categoria, a pedofilia, a zoofilia e a
homossexualidade – sendo que esta essa última só deixou de
ser considerada um desvio sexual pelo Conselho Federal de
Psicologia (CFP) em 1985. Em 1990, foi a vez da Organização
Mundial da Saúde (OMS) retirar a homossexualidade da
lista de doenças mentais.
Até então, pouco se falava sobre os homossexuais no cotidiano
de Florianópolis. Guilhermina só foi saber que mulher
podia gostar de mulher quando conversou com a prima,
que morava em Porto Alegre, e que dizia estar apaixonada por
uma amiga. Logo tudo encaixou: devia ser lésbica também.
Assumiu-se para a família aos 16 anos, e a mãe foi logo dizendo:
“Espero que tu não te arrependas disso”. Guilhermina
foi categórica na resposta: “Se eu me arrepender, o que é que
pode acontecer? Vou me casar, ficar grávida e ter um monte
de filhinhos”.
Não demorou para encontrar mais gente como ela. Em
1986, no mandato do prefeito Edison Andrino, foi realizado
um Campeonato Municipal de Futebol Feminino nas quadras
sobre o Aterro Baía Sul, onde hoje é a passarela Nego Quirido.
“Se tem futebol, tem sapatão”, Guilhermina concluiu, e foi lá
ver de perto. Fazia um dia úmido, gelado, e as arquibancadas
30