Gestão Hospitalar N.º 19 2020
Outcomes Research Lab: "leveraging evidence for better care" Conselhos de administração das unidades de saúde, a peça que falta na alavancagem da investigação clínica em Portugal? Ensaios clínicos: quão perto estamos da excelência? Inovação no SNS como forma de sustentabilidade Carla Nunes: Promover uma escola atual, inovadora e focada na sua missão "Mais Participação Melhor Saúde": um projeto que se saúda Relação entre os estilos de liderança e o empenho organizacional dos colaboradores Medicina doTrabalho nos estabelecimentos hospitalares do Serviço Nacional de Saúde: letra da Lei ou uma realidade observada? Reformular cuidados centrados na pessoa promovendo parcerias Proteção para o risco de gestão O equipamento médico nos hospitais públicos Estratégia Nacional para a Tele Saúde, apresentação do PENTS: uma festa Que futuro para as técnicas de transferência mitocondrial? 7a edição da Conferência de Valor da APAH Aldeias Humanitar: humanizar e estar no interior de Portugal A Excelência em diferentes manifestações Ouvir e envolver os cidadãos nas decisões de saúde tem retorno para a sociedade Resultados do "Índex Nacional do Acesso ao Medicamento Hospitalar" em debate Prémio distinguiu projetos inovadores em saúde APAH e Ordem dos Médicos apresentam proposta de "Agenda Estratégica para o Futuro da Medicina de Precisão em Portugal"
Outcomes Research Lab: "leveraging evidence for better care"
Conselhos de administração das unidades de saúde, a peça que falta na alavancagem da investigação clínica em Portugal?
Ensaios clínicos: quão perto estamos da excelência? Inovação no SNS como forma de sustentabilidade
Carla Nunes: Promover uma escola atual, inovadora e focada na sua missão
"Mais Participação Melhor Saúde": um projeto que se saúda
Relação entre os estilos de liderança e o empenho organizacional dos colaboradores
Medicina doTrabalho nos estabelecimentos hospitalares do Serviço Nacional de Saúde: letra da Lei ou uma realidade observada?
Reformular cuidados centrados na pessoa promovendo parcerias
Proteção para o risco de gestão
O equipamento médico nos hospitais públicos
Estratégia Nacional para a Tele Saúde, apresentação do PENTS: uma festa
Que futuro para as técnicas de transferência mitocondrial?
7a edição da Conferência de Valor da APAH
Aldeias Humanitar: humanizar e estar no interior de Portugal
A Excelência em diferentes manifestações
Ouvir e envolver os cidadãos nas decisões de saúde tem retorno para a sociedade
Resultados do "Índex Nacional do Acesso ao Medicamento Hospitalar" em debate
Prémio distinguiu projetos inovadores em saúde
APAH e Ordem dos Médicos apresentam proposta de "Agenda Estratégica para o Futuro da Medicina de Precisão em Portugal"
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OUTUBRO NOVEMBRO DEZEMBRO 2019
Edição Trimestral
Nº 19
GESTÃO
HOSPITALAR
DISTRIBUIÇÃO GRATUITA aSSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE ADMINISTRADORES HOSPITALARES
SOCIEDADE
Mais participação em saúde
COMUNIDADE
Aldeias Humanitar
(Prémio Healthcare
Excellence 2019)
ENVELHECIMENTO
Parcerias para
reformular cuidados
SNS
Investigação Clínica
Medicina do Trabalho
Telesaúde
Equipamento médico
GESTÃO
Liderança organizacional
Outcomes Research Lab
ENTREVISTA
carla
nunes
Estamos
todos juntos,
e juntos
venceremos
a Covid-19
Stop Covid-19
#fiqueemcasa
GH OPhghgh
GH SUMÁRIO
outubro novembrO dezembrO 2019
GESTÃO
HOSPITALAR
PROPRIEDADE
APAH − Associação Portuguesa
de Administradores Hospitalares
Parque de Saúde de Lisboa Edíficio, 11 - 1.º Andar
Av. do Brasil 53
1749-002 Lisboa
secretariado@apah.pt
www.apah.pt
DIRETOR
Alexandre Lourenço
DIRETORA-ADJUNTA
Bárbara Sofia de Carvalho
COORDENADORES
Catarina Baptista, Miguel Lopes
EDIÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO
Bleed - Sociedade Editorial e Organização
de Eventos, Ltda.
Av. das Forças Armadas 4 - 8B
1600 - 082 Lisboa
Tel.: 217 957 045
info@bleed.pt
www.bleed.pt
PROJETO GRÁFICO
Sara Henriques
DISTRIBUIÇÃO
Gratuita
PERIODICIDADE
Trimestral
DEPÓSITO LEGAL N.º
16288/97
ISSN N.º
0871–0767
TIRAGEM
2.000 exemplares
IMPRESSÃO
Grafisol, lda
Rua das Maçarocas
Abrunheira Business Center Nº3
2710-056 Sintra
Esta revista foi escrita segundo as novas regras
do Acordo Ortográfico
Estatuto Editorial disponível em www.apah.pt
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Editorial
Investimento em saúde é o pilar do desenvolvimento económico e social
Alexandre Lourenço
Value based-healthcare
Outcomes Research Lab: "leveraging evidence for better care"
Rui Henrique, Marta Soares, Emanuel Barros, Marina Borges, Patrícia Redondo,
Pedro Medeiros, João Gomes
Investigação Clínica
Conselhos de administração das unidades de saúde, a peça que falta na alavancagem
da investigação clínica em Portugal?
Emília Monteiro
Investigação Clínica
Ensaios clínicos: quão perto estamos da excelência? Inovação no SNS como forma
de sustentabilidade
Catarina Silva, Gisela Videira
Entrevista
Carla Nunes: Promover uma escola atual, inovadora e focada na sua missão
Participação em Saúde
"Mais Participação Melhor Saúde": um projeto que se saúda
Liderança
Relação entre os estilos de liderança e o empenho organizacional dos colaboradores
João Alexandre Reis
Saúde ocupacional
Medicina do Trabalho nos estabelecimentos hospitalares do Serviço Nacional de Saúde:
letra da Lei ou uma realidade observada?
Paulo Ferreira Gomes
Integração de cuidados
Reformular cuidados centrados na pessoa promovendo parcerias
Carina Dantas
Responsabilidade civil
Proteção para o risco de gestão
Luís Teixeira
Opinião
O equipamento médico nos hospitais públicos
Luís Lopes Pereira
Telesaúde
Estratégia Nacional para a Tele Saúde, apresentação do PENTS: uma festa
Fernando Mota
Direito Biomédico
Que futuro para as técnicas de transferência mitocondrial?
Eduardo António da Silva Figueiredo
Espaço ENSP
7ª edição da Conferência de Valor da APAH
Ana Damas, Luís Vales
Prémio Healthcare Excellence 2019
Aldeias Humanitar: humanizar e estar no interior de Portugal
Domingos Nascimento, Helena Dorinha, Mário Pinto
Iniciativa APAH
A Excelência em diferentes manifestações
Cristina Fiuza Branco, Luís Pombo
Iniciativa APAH | Conferências de Valor APAH 2019
Ouvir e envolver os cidadãos nas decisões de saúde tem retorno para a sociedade
Iniciativa APAH | Fórum do Medicamento 2019
Resultados do "Índex Nacional do Acesso ao Medicamento Hospitalar" em debate
Iniciativa APAH | Prémio Healthcare Excellence 2019
Prémio distinguiu projetos inovadores em saúde
Margarida França
Iniciativa APAH | Medicina de Precisão
APAH e Ordem dos Médicos apresentam proposta de "Agenda Estratégica para o Futuro
da Medicina de Precisão em Portugal"
APAH marca a agenda
3
GH editorial
Alexandre Lourenço
Presidente da APAH
Investimento em saúde é o
pilar do desenvolvimento
económico e social
Este editorial é escrito em circunstâncias
extraordinárias. A pandemia da
Covid-19 obrigou governos de vários
Países a implementar medidas que
quando iniciámos a elaboração desta
edição da GH seriam apenas imagináveis no cinema.
Esta edição pode parecer um pouco anacrónica face
às circunstâncias atuais. Mesmo sob pressão e com o
foco na atenção à Covid-19, os sistemas de saúde devem
simultaneamente assegurar as necessidades da
população. Assim que a tempestade passar - sim, ela
vai passar - novas avenidas se abrirão para a transformação
do sistema de saúde. Importa aprender com
esta pandemia e não esquecer que o investimento
em saúde é pilar do desenvolvimento económico e
social. Todos nós, com sentido de dever e renovada
energia, saberemos ultrapassar as dificuldades e construir
uma sociedade mais justa e próspera.
Um primeiro apontamento para o artigo sobre saúde
ocupacional da autoria de Paulo Ferreira Gomes. Nas
palavras do autor, a Medicina do Trabalho “ainda se
encontra pouco reconhecida em algumas instituições
do SNS”. No momento atual de enorme pressão sobre
os profissionais de saúde, uma das maiores preocupações
deve estar centrada no apoio aos profissionais.
É esta uma oportunidade para a gestão superior
das unidades de saúde dar um sinal claro de desenvolvimento
desta área, incluindo no apoio psicológico
e alívio da sobrecarga ou excesso de trabalho.
Uma segunda nota para a entrevista a Carla Nunes
- nova Diretora da Escola Nacional de Saúde Pública
(ENSP) - a ler com a devida atenção. Se dúvidas existissem,
a formação em saúde pública é essencial para
a gestão de serviços de saúde. Hoje, estamos melhor
preparados para responder a emergências
ou a transformar o sistema de saúde por termos uma
visão integrada gestão/saúde pública.
Um terceiro comentário para a entrevista às coor-
denadoras do "Mais Participação Melhor Saúde”. Falamos
da Lei da Participação Pública em Saúde. Responsabilidade
e Direitos. O sucesso da capacidade de resposta
do sistema de saúde sempre passará pela responsabilidade
dos cidadãos, sendo que esta é garantida
com maior envolvimento destes no processo de decisão.
Nas boas práticas ficam os artigos sobre o "Outcomes
Research Lab" do IPO do Porto, a integração de cuidados
com o setor social, e o Prémio Healthcare Excellence
2019.
Para o futuro hoje, falamos da Medicina de Precisão,
um projeto abrangente desenvolvido em parceria com
a Ordem dos Médicos e a EY. À semelhança de outras
iniciativas, também nesta matéria a APAH propõe medidas
concretas para a melhoria da organização e gestão
dos cuidados de saúde em Portugal. Publicamos ainda
os resultados do Index Nacional do Acesso ao Medicamento
Hospitalar, apresentado e discutido durante
o Fórum do Medicamento. Desta feita, uma parceria
com a Ordem dos Farmacêuticos e a Faculdade de
Farmácia da Universidade de Lisboa.
Nas sábias palavras dos Xutos & Pontapés:
Ele há coisas a acabar
Mas há tantas a começar
Ficar atento
Saber usar
Saber dar tempo
Tempo que não há p'ra dar
Ter ideias e sentir
Estar atento ao que vai vir
Se não perder a esperança
se souber aguentar
Se não perder
Serei eu capaz de dar
Estamos todos juntos, e juntos venceremos! Ã
4
'
Ç
Ç
GH Value based healthcare
OUTCOMES RESEARCH LAB:
"LEVERAGING EVIDENCE
FOR BETTER CARE"
QualiVida
E-deialab
Ç
RORENO
Ç
Ç
Ç
GDH
IPO
PORTO OASIS
VISION MEDVISION
ATLAS
Ç
Ç
ANAPAT
Rui Henrique
Presidente do Conselho
de Administração, IPO Porto
Marta Soares
Diretora Clínica,
IPO Porto
Emanuel Barros
Vogal Executivo do Conselho
de Administração, IPO Porto
Marina Borges
Diretora do Serviço de Planeamento
e Apoio à Gestão, Outcomes
Research Lab, IPO Porto
Figura 1: Sistemas de informação IPO Porto.
ARIA
OUTCOMES
Patrícia Redondo
Técnica Superior, Outcomes
Research Lab, IPO Porto
Pedro Medeiros
Técnico Superior, Serviço de Planeamento e Apoio
à Gestão, Outcomes Research Lab, IPO Porto
A
criação do Outcomes Research Lab
(ORLab) em 2016 foi assumida pelos
vários níveis da organização como
um objetivo estratégico, guiado
pela seguinte premissa Leveraging
Evidence for Better Care.
A criação desta unidade foi premente, indo de encontro
aos desafios de qualidade e sustentabilidade que
os sistemas de saúde enfrentam, envolvendo a medição
sistemática dos resultados em saúde e tendo como
missão produzir conhecimento nas seguintes áreas:
custo, segurança e efetividade das tecnologias de saúde,
assim como alavancar a investigação científica sobre
resultados em saúde no Instituto Português de
Oncologia do Porto FG, EPE (IPO Porto).
Em todo este processo não pode ser esquecida toda
uma conjugação de fatores favoráveis internos e externos
ao IPO Porto como o foram, a nível interno, as
várias alterações estruturais implementadas na última
João Oliveira Gomes
Investigador, Outcomes Research
Lab, IPO Porto
década. Desde a alteração da estrutura organizacional,
com a criação de 11 clínicas de patologia, à informatização
da instituição, passando pela prescrição eletrónica
e pela adoção de um processo clínico eletrónico.
No que se refere à conjuntura externa, era cada vez
mais consensual a implementação do paradigma Value
Based Healthcare (VBHC), o que implicava que as organizações
prestadoras de cuidados de saúde deviam
ser geridas e avaliadas pelos resultados em saúde para
os doentes, em conjugação com os custos dos cuidados
de saúde prestados. 1 Deste modo, era premente
dotar o IPO Porto das competências e recursos necessários
para produzir a informação imprescindível
para medir o valor criado.
Mais acresce, que fruto da prática clínica se basear na
evidência existente, gerada a partir dos ensaios clínicos,
era necessário complementar esta informação com evidência
produzida a partir de dados do "mundo real".
Conjugada a necessidade com a exequibilidade, foi assumido
pelos vários níveis da organização que a criação
do ORLab era um objetivo estratégico, o que se mantém
e se pretende potenciar como mais à frente teremos
oportunidade de especificar.
Apresentação do serviço
O ORLab foi criado com o propósito de dotar a gestão
e os profissionais clínicos de informação com base
em dados de vida real, que os auxilie na tomada
de decisão sobre os cuidados prestados aos doentes,
dando resposta à necessidade de produzir informação
e obter conhecimento na área da saúde. A implementação
de uma unidade desta natureza implica
uma abordagem multidisciplinar, tendo na sua orgânica
colaboradores das mais diversas áreas profissionais.
Para além de uma equipa multidisciplinar constituída
por economistas, gestores, engenheiros, entre outros,
as funções inerentes a esta unidade são desenvolvidas
em forte articulação com outros serviços, tais como o
Serviço de Epidemiologia, Unidade de Investigação Clínica,
direções de Serviços Assistenciais, médicos e enfermeiros.
Neste âmbito, com a criação do ORLab,
compete à unidade:
• Gerir o processo de recolha e sistematização de
informação relativa ao custo, segurança e efetividade
das tecnologias da saúde utilizadas no IPO Porto,
com particular ênfase nas inovadoras;
• Fazer o acompanhamento dos "Patient Access
Schemes", definidos aquando ou após autorização
de utilização do medicamento pelo INFARMED, que
incluam resultados;
• Produzir trabalhos científicos no âmbito de: avaliação
das tecnologias da saúde, VBHC e resultados em
saúde provenientes de estudos de Real World Evidence
(RWE);
• Estabelecer parcerias externas para alavancar a
investigação, incluindo a participação em estudos
observacionais de investigação clínica multicêntricos,
nacionais e internacionais;
• Projetar, implementar e acompanhar a execução de
tarefas no âmbito do sistema informático de Business
Intelligence e outros sistemas de bases de dados do
serviço;
• Coordenar e monitorizar o circuito de avaliação
de qualidade de vida relacionada com a saúde implementado
no IPO Porto;
• Implementar e desenvolver Clinical Pathways que
reflitam a evidência científica e a prática instituída e
promovam eficiência no tratamento da doença oncológica;
• Dar apoio técnico, quando solicitado, aos projetos
de investigação dos demais profissionais da Instituição,
desde que integrados no âmbito e missão do Serviço.
Ferramentas informáticas
Neste âmbito, com a implementação do serviço criaram-se
também duas ferramentas informáticas que
permitem realizar análises em tempo real e com base
na evidência clínica que é gerada diariamente na instituição:
o Vision e o MedVision. }
6 7
'
GH Value based healthcare
“
O MEDVISION SURGE COM
A INTENÇÃO DE CRIAR UMA VISÃO
HOLÍSTICA DO TRATAMENTO
PRESCRITO E A PRODUÇÃO
DE OUTCOMES NO ÂMBITO
DA AVALIAÇÃO DE TECNOLOGIAS
DE SAÚDE (SOBREVIVÊNCIA,
SEGURANÇA, QUALIDADE DE VIDA
E CUSTO DO TRATAMENTO).
”
Vision
O Vision é uma ferramenta informática, agregadora de
várias bases de dados da Instituição, que potencia e facilita
a realização de estudos prospetivos e retrospetivos,
numa perspetiva multidimensional de avaliação
de tecnologias de saúde. Uma das suas grandes vantagens
é a recolha de informação dos dados dos doentes
num contexto de real world data (RWD). A qualidade,
quantidade e rapidez na obtenção dos dados é
um dos pontos fortes desta aplicação.
O Vision ao funcionar como um agregador central
da informação, tem como principais benefícios para
a Instituição:
• Simplificação: compilação das várias bases de dados
da Instituição facilitando a sua consulta, análise e,
por conseguinte, o aperfeiçoamento dos protocolos
e práticas instituídas;
• Autonomia: a criação de uma única base de dados
passível de ser controlada pelo próprio hospital e que
não esteja dependente de stakeholders externos;
• Monitorização: acompanhamento em tempo real
das tecnologias de saúde envolvidas em todo o percurso
do doente, permitindo a produção sistemática
de resultados em saúde;
• Eficiência: melhoria e qualidade das dinâmicas e processos
de trabalho no dia-a-dia dos recursos envolvidos.
Esta base de dados está acessível aos colaboradores
do ORLab através da tecnologia MS Power BI que per-
mite a visualização dos dados sob a forma de tabelas,
gráficos ou mesmo dashboards complexos, realizados
internamente, à medida das necessidades, permitindo
assim responder a questões no âmbito da clínica e da
saúde das populações, desenvolver estratégias de RWE
e contribuir para um maior conhecimento e apoio
na tomada de decisão.
MedVision
O MedVision surge com a intenção de criar uma visão
holística do tratamento prescrito e a produção
de outcomes no âmbito da avaliação de tecnologias
de saúde (sobrevivência, segurança, qualidade de vida
e custo do tratamento).
Compreender o ciclo de introdução das novas terapêuticas
no IPO Porto é fundamental para a gestão
da despesa em produtos farmacêuticos. Assim,
esta ferramenta foi uma mais-valia para os estudos
observacionais em curso no ORLab, com os quais se
pretende sistematizar a informação relativa ao custo,
segurança e efetividade das tecnologias da saúde inovadoras
utilizadas no IPO Porto.
O MedVision não é mais que uma base de dados onde
é inserida toda a informação sobre o tratamento com
terapêuticas inovadoras, com toda a informação relevante
desde a baseline de tratamento até a sua conclusão,
com dados relativos a resposta à terapêutica,
motivos que levaram à suspensão ou adiamentos e
eventos adversos.
Do ponto de vista da gestão, ter esta informação sistematizada,
permite dar suporte à negociação dos contratos
de partilha de risco estabelecidos entre o IPO
Porto e a indústria farmacêutica ou outros.
Resultados obtidos
A prossecução dos estudos levados a cabo no ORLab
permite a produção de conhecimento sobre o percurso
do doente na Instituição, nomeadamente os tratamentos
prescritos e os custos despendidos com
determinadas tecnologias de saúde.
Desta forma, estão atualmente a decorrer no ORLab
74 estudos observacionais, respeitantes a 48 substâncias
ativas inovadoras, com 1561 doentes em
estudo, que geraram um gasto aproximado de 52
milhões euros (dados a 30/06/2019). Foram apresentados
onze posters/comunicações orais em sete
conferências internacionais (ISPOR Europe, EHMA,
ELCC, ICHOM, WCLC, EAPC, ISPOR) e três nacionais
(APIFARMA, CNES, APAH). Destacam-se ainda
os quatro artigos científicos publicados na revista
científica internacional "ecancermedicalscience". De
referir também a existência de contratos de partilha
de risco estabelecidos entre o IPO Porto e a indústria
farmacêutica, assim como a participação na Eu-
ropean Oncology Evidence Network (E-EON) - Rede
de Dados de Oncologia Europeia, no âmbito da qual
já estão em curso dois estudos científicos utilizando
dados da vida real na área do cancro do pulmão e do
cancro da mama.
Estabeleceram-se alguns protocolos de colaboração
para realização de estudos com entidades externas e
levaram-se a cabo várias candidaturas a apoio financeiro
para projetos de investigação e inovação, bem
como a prémios de reconhecimento de boas práticas
na área da saúde.
De seguida, focam-se três projetos ongoing que melhor
espelham a missão do IPO Porto na criação de
valor em saúde, medindo-se de forma efetiva os resultados
gerados e os custos associados, de modo a se
atingirem os objetivos de melhor atendimento ao doente,
maior experiência em saúde, melhor saúde da
população e cuidados mais acessíveis.
Projeto Farol
O projeto-piloto Farol surgiu da iniciativa 3F-Financiamento,
Fórmula para o Futuro, da APAH 2 , com o
apoio da Roche e desenvolvimento da IQVIA. Surge
com o intuito de obter Resultados em Saúde e na
Gestão Integrada da Doença, consistindo no desenvolvimento
de um modelo de financiamento centrado
na medição de resultados com incentivos associados
à qualidade.
Este projeto-piloto está ainda em desenvolvimento
no IPO Porto no âmbito da patologia do cancro do
pulmão e permitirá numa fase posterior medir os resultados
em saúde (clínicos e relativos à experiência
do doente) ao longo de todo o percurso do doente
e determinar o custo real de tratamento. Com este
projeto estão também a ser dados os primeiros pas- }
Figura 2: Dimensões resultantes da discussão de soluções do grupo de trabalho 3F 2 .
8
'
GH Value based healthcare
sos para a implementação de um modelo de Value
Based Healthcare em Portugal. O Farol permitirá determinar
a qualidade assistencial, comparar o custo real
de tratamento do doente com cancro do pulmão com
o preço compreensivo atribuído pela ACSS e testar
diferentes modelos de incentivos que premeiem as instituições
que apresentem melhores resultados.
No desenvolvimento deste projeto-piloto a medição
de resultados em saúde é essencial, bem como a identificação
dos custos associados a esta prestação de
cuidados de qualidade. Para isso, e sendo que o IPO
Porto tinha sido já selecionado para integrar o estudo
internacional Improving Value in Cancer Care, o projetopiloto
focou-se numa única patologia (cancro do pulmão)
e na medição do valor criado para os doentes. }
Standard-set ICHOM Cataratas
A existência de um conjunto de parâmetros de avaliação
de resultados em saúde (standard-sets) que permita
aos profissionais de saúde medir os resultados
e compará-los com os seus pares em todo o mundo
é um imperativo para qualquer Instituição. Este conjunto
de parâmetros de avaliação têm vindo a ser
elaborados pelo Internacional Consortium for Health
Outcomes Measurement (ICHOM) - organização sem
fins lucrativos com um propósito público de promover
a igualdade nos cuidados de saúde globalmente.
O IPO Porto, seguindo o standard-set do ICHOM 3 ,
implementou o projeto para medição de outcomes clínicos
em cirurgia da catarata, que permite caracterizar
diferentes aspetos relacionados com a qualidade de
vida e evolução dos doentes ao longo do tratamento.
Este standard-set inclui a avaliação das variáveis clínicas
e fatores de risco no pré-operatório, das variáveis relacionadas
com o tratamento (cirurgia) e das variáveis
referentes ao pós-operatório que acabam por se traduzir
nos outcomes do projeto. Paralelamente, é medida
a qualidade de vida do doente no pré e pós-
-operatório através do instrumento CATQUEST-9SF.
Adicionalmente, foram também recolhidos os dados
referentes aos custos. O custo médio de um episódio
Tabela 1: Acuidade visual e refração pré-operatória e pós-operatória.
de cirurgia de catarata foi calculado incluindo as consultas
pré-operatórias, a cirurgia (incluindo materiais
de consumo clinico; medicação; recursos humanos)
e as consultas do pós-operatório. Foram excluídos os
custos de complicações e custos indiretos.
Atualmente, o IPO Porto tem este standard-set implementado
na prática clínica do Serviço de Oftalmologia.
O projeto tem uma equipa multidisciplinar
definida, que analisa de forma integrada a informação
clínica e de gestão associada ao estudo.
Entre junho de 2017 e maio 2018, 268 doentes realizaram
cirurgia da catarata e completaram o período
de follow up. A informação destes doentes respeita
a 374 intervenções no globo ocular (235 mulheres,
139 homens) e a mediana da idade foi 73 anos. Foram
reportados ~5% casos com co morbilidades
oculares no olho operado. Cerca de 49% dos doentes
já tinham sido operados previamente a catarata
no outro olho e ~1% efetuado cirurgia refrativa corneana.
Menos de 1% dos casos tiveram complicações
durante a cirurgia. A acuidade visual e a refração atual
melhoram após cirurgia, conforme se verifica na Tabela
1. Aproximadamente 1% dos casos revelaram
complicações pós cirurgia (Tabela 2).
Cerca de 98% dos doentes reportaram melhorias
na sua qualidade de vida (Figura 3). Foi efetuado um
teste estatístico (paired sample t-test) que confirmou
que a cirurgia tem efeito significativo em todas as dimensões
da qualidade de vida avaliadas através do
questionário CATQUES9SF.
Variables
Return to operation theater
within 3 months (yes)
Endophthalmitis (yes) 0,3%
Corneal edema (yes) 0,5%
Other (yes) 1,3%
Tabela 2: Complicações pós cirurgia.
No. of cases
(eyes operated)
0,8%
Visual acuity Pre-Operative (mean) Post-Operative (mean) Paired Differences (mean) Sig.(2-tailed)
Best corrected right 0,4240 0,8868 -0,4627 0,000
Best corrected left 0,4325 0,8682 -0,4357 0,000
Refraction (target/actual) Pre-Operative (mean) Post-Operative (mean) Paired Differences (mean) Sig.(2-tailed)
Spherical right -0,3789 -0,3161 -0,0629 0,293
Spherical left -0,4104 -0,4156 0,0152 0,850
Cylinder right -0,3115 -1,0496 0,7382 0,000
Cylinder left -0,4123 -0,9844 0,5721 0,000
Figura 3: Qualidade de vida reportada pelos doentes antes e após cirurgia.
O custo médio de tratar cataratas (por olho) foi aproximadamente
500€, representando um custo total
para esta amostra de 187.000€.
Com a implementação deste standard-set é possível
fazer uma avaliação holística do valor realizado
no Serviço de Oftalmologia. Uma equipa altamente
motivada, a estreita comunicação entre todos e uma
implementação viável do standard-set na prática real,
de maneira que os procedimentos sejam facilmente
integrados nas rotinas diárias, são essenciais para o
sucesso dum projeto desta natureza. No contexto
de um hospital oncológico, que trata doentes com
comorbilidades específicas, a cirurgia de catarata está
associada à alta satisfação reportada pelo doente,
melhorando significativamente a sua qualidade de vida,
o que é particularmente relevante em doentes
com cancro. A implementação desta metodologia foi
uma boa oportunidade para se ganhar experiência
e aprender como reproduzir esta experiência noutras
patologias, principalmente oncológicas.
Qualidade de vida relacionada com a saúde
Perceber a qualidade de vida dos doentes do IPO
Porto desde a sua admissão na Instituição e durante
todo o seu percurso de tratamento é um imperativo
para a prestação de melhores cuidados de saúde.
No entanto, esta medição é muito subjetiva devido
à dificuldade que o indivíduo tem de relacionar a sua
disfunção com as várias dimensões da sua vida.
A qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) refere-se
à perceção que a pessoa tem sobre a sua condição
de saúde, bem como as consequências e os tratamentos
relativos a ela 4,5 . A medição da qualidade de
vida permite-nos perceber as alterações, em tempo real,
sentidas durante o processo de doença e o tratamento
do doente, permitindo aos profissionais de saúde:
• Alertar para as preocupações sentidas pelo doente;
• Intervir em tempo real;
• Comparar de forma objetiva os resultados da sua
qualidade de vida relativamente a diferentes tipos de
tratamento (cirurgia, quimioterapia, radioterapia);
• Contribuir para a melhoria dos cuidados prestados.
Cada vez mais, a prática clínica exige avaliar a qualidade
de vida do doente durante os ciclos de tratamento,
a fim de associar essa avaliação à medicação e ao
tipo de tratamento e deste modo, tentar entender
se os efeitos são nocivos/benéficos para o doente.
O IPO Porto, possui desde Outubro de 2015, uma
plataforma informática para registo de questionários
de qualidade de vida e um circuito que envolve a avaliação
da qualidade de vida dos doentes em tratamento
com medicamentos inovadores, através dos
questionários da EORTC (C30 + específico da patologia)
6 e do EQ-5D 7 .
A fim de melhorar continuamente este processo e es- }
10 11
'
GH Value based healthcare
“
OS OBJETIVOS DESTA INICIATIVA
NÃO SÃO APENAS OFERECER
O MELHOR TRATAMENTO PARA
CADA DOENTE, ORGANIZANDO
TODA A INSTITUIÇÃO EM TORNO
DOS DOENTES.
”
tender esta medição a todo o universo de doentes da
Instituição, está-se a automatizar ainda mais o processo
implementado, de modo a que os doentes respondam
aos questionários em momentos pré-definidos,
de acordo com o protocolo de tratamento. Encontrase
a ser desenvolvido um módulo relativo ao preenchimento
de questionários da qualidade de vida para integrar
na app Bem-me-Ker, a fim de promover o auto
preenchimento por parte dos próprios doentes, por
exemplo, via smartphone ou através de tablet (colocado
em local apropriado dentro do IPO Porto). Este
sistema destina-se a ser fácil de usar, intuitivo de preencher
e facilmente acessível.
Os objetivos desta iniciativa não são apenas oferecer
o melhor tratamento para cada doente, organizando
toda a Instituição em torno dos doentes e suas necessidades,
mas também levar a experiência do doente
a um novo nível, melhorando o acesso e a qualidade
dos cuidados; medindo sistematicamente o valor
criado (resultados e custos); e aproveitando a evidência
para melhorar o atendimento prestado.
Outcomes Research Lab - Prespetivas de futuro
Os primeiros quatros "anos de vida" do ORLab foram
cruciais para definir o papel desta unidade dentro do
IPO Porto e o seu posicionamento estratégico face às
entidades externas à instituição. A sua implementação
teve como premissa que esta unidade seria uma extensão
natural da atividade assistencial, dada a natureza
multidisciplinar da atividade a desenvolver e que a informação
a produzir deveria efetivamente representar
conhecimentos a aplicar na melhoria dos cuidados de
saúde prestados aos doentes. Deste modo, a unidade
foi dotada dos recursos humanos necessários para
desenvolver as ferramentas imprescindíveis ao seu
funcionamento e com as competências que à data
eram inexistentes ou escassas no IPO Porto. Assim, os
serviços assistenciais e não-assistenciais são envolvidos
mais precocemente nas várias tarefas, permitindo que
a informação produzida vá efetivamente de encontro
às reais necessidades dos decisores.
À data, é premente consolidar o que foi implementado
e os resultados obtidos, alargando a equipa e desenvolvendo
ainda mais as ferramentas informáticas
(Vision e MedVision). Ao nível interno, é nosso objetivo
alargar a avaliação da qualidade de vida a todos dos
doentes da instituição, assim como avaliar os percursos
clínicos por patologia dentro da instituição de modo
sistemático. É também nosso desiderato aumentar
as parcerias com entidades externas.
Assim, criar condições para um registo da qualidade de
vida de todos os doentes da instituição, em períodos
concretos do seu percurso no IPO Porto é um dos projetos
estruturais que se encontra já em curso, de modo
a permitir, numa fase subsequente, a disponibilização
e integração dessa informação na prática clínica.
Em simultâneo estamos focados no desenvolvimento
de Clinical Pathways que reflitam a evidência científica
e a prática instituída, que promovam a eficiência no
tratamento da doença oncológica.
Em jeito de conclusão, resta acrescentar que com base
nos vários projetos e objetivos que temos nesta
área, dos quais elencamos apenas alguns, pretende-
-se, num futuro próximo, que o ORLab seja considerado
um serviço de referência, não só a nível nacional
como também internacional, na área dos resultados
em saúde na patologia oncológica, assente num modelo
de VBHC. Promovendo assim, cada vez mais, a inovação
e contribuindo para o início de uma nova onda
de aprendizagem a partir da medição do valor criado
com a prestação de cuidados de saúde, sob a égide de
um novo paradigma - o da utilização efetiva na prática
clínica diária, ao serviço e em prol do doente. Ã
1. Porter ME, Teisberg EO. Redefining Health Care: Creating Value - Based
Competition on Results. Harvard Business Review Press, 2006: 50-59.
2. APAH: 3F - Financiamento, Fórmula para o Futuro. Outubro 2018. Disponível
em: https://apah.pt/portfolio/3f/.
3. ICHOM: Cataracts Data Collection Reference Guide, 2017. Disponível
em: https://ichom.org/files/medical-conditions/cataracts/cataracts-referenceguide.pdf.
4. Asadi-Lari, M., Tamburini, M. & Gray, D. Patients' needs, satisfaction, and
health related quality of life: Towards a comprehensive model. Health Qual
Life Outcomes 2, 32 (2004) doi:10.1186/1477-7525-2-32.
5. Bredart A, Bouleuc C, Dolbeault S. Doctor-patient communication and
satisfaction with care in oncology. Curr Opin Oncol. 2005;17:351–354. doi:
10.1097/01.cco.0000167734.26454.30.
6. EORTC: Quality of Life. Disponível em: https://qol.eortc.org/questionnaires/.
7. EQ-5D. Disponível em: https://euroqol.org/.
Better Health,
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Podemos sempre fazer mais para melhorar a vida das pessoas.
Impulsionados pela paixão de realizar este objetivo, a Takeda
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GH Investigação clínica
CONSELHOS DE ADMINISTRAÇÃO
DAS UNIDADES DE SAÚDE, A PEÇA
QUE FALTA NA ALAVANCAGEM
DA INVESTIGAÇÃO CLÍNICA
EM PORTUGAL?
Emília Monteiro
Faculdade de Ciências Médicas.
Universidade Nova de Lisboa
Na missão das unidades de saúde portuguesas
encontramos invariavelmente
a prestação de cuidados de saúde, segundo
as “melhores práticas”, a “atualização
face aos avanços da ciência”,
“altamente diferenciados em tecnologias e saberes”,
“de elevada qualidade e especialização”, “de excelência”,
“de competência e rigor” e “inovadores”. 1
O que talvez não seja tão evidente é que estes atributos
da prestação de cuidados de saúde só são
possíveis e verdadeiros porque as unidades de saúde
portuguesas vão incorporando na atividade assistencial,
a ritmos variáveis, mas equivalentes aos dos congéneres
do primeiro mundo, os avanços da ciência e
tecnologia. Fazem-no através do empenho dos seus
profissionais, das recomendações das sociedades
científicas e das autoridades (eg. DGS) mas também
através da pressão da sociedade e de quem comercializa
a inovação.
Sob o ponto de vista da maioria dos administradores
e de muitos profissionais de saúde este processo
corresponde ao expectável e poderá apenas ser
aperfeiçoado em termos de rapidez do acesso e da
implementação da inovação, e de uma maior eficiência.
Não é comum que nem a tutela nem a comunidade
exijam mais. Contudo, no contexto do desenvolvimento
e sustentabilidade de um serviço nacional
de saúde há uma questão que raramente emerge:
qual tem sido o contributo dos portugueses a trabalhar
nas unidades de saúde nacionais para o desenvolvimento
das tecnologias de saúde 2 atualmente
disponíveis? A resposta não é fácil, mas há indicadores
indiretos que não seriam difíceis de produzir.
Vejamos por exemplo os estudos clínicos que produzem
evidência de nível mais elevado e mais próximos
da inovação: os ensaios clínicos. Quantas indústrias
farmacêuticas têm portugueses nas equipes
de desenho dos estudos multicêntricos? Quantos
portugueses são coautores das publicações com origem
nos ensaios clínicos em que participaram? Num
estudo efetuado com as unidades de saúde que integravam
o consórcio PtCRIN 3 , das 1540 publicações
com autores portugueses referenciadas na PubMed
entre janeiro de 2014 e 31 de julho de 2015, apenas
2% (n=31) se referiam a ensaios clínicos 4 . Independentemente
das limitações do estudo e considerando
que entre 2009 e 2013 foram submetidos anualmente
em Portugal, uma média de 131 ensaios 5 ,
podemos concluir que a maioria dos médicos que
recruta doentes para os ensaios clínicos em Portugal
não participa da autoria da inovação. Teoricamente
isto acontece porque a maioria dos ensaios são propriedade
da indústria farmacêutica. Nos ensaios de
iniciativa académica esta questão não se coloca e é
expectável que todos os investigadores sejam coautores.
Contudo, os resultados de Portugal quando
nos referimos aos ensaios clínicos de iniciativa académica
também não são muito animadores. Até 31 de
julho de 2015 Portugal tinha registado na EudraCT
85 ensaios de iniciativa académica, enquanto no
mesmo período países de dimensões semelhantes
como a Holanda, Áustria, Bélgica e República Checa,
registaram, 1297, 836, 754 e 147, respetivamente 4 .
Num estudo mais recente, comparativo entre a República
Checa e Portugal, que compilou os ensaios
clínicos de iniciativa académica no total dos quatro
maiores registos mundiais entre 2004 e 2017, confirmou-se
a superioridade da República Checa quer no
número de ensaios (439 vs 328) quer no número de
publicações com fatores de impacto elevado (86% vs
15%) a que estes deram origem 6 .
O problema tem vindo a ser identificado, desde há
muito tempo, por sucessivos governos e instituições 7 :
a inovação em saúde tem subjacente uma investigação
clínica com infraestruturas próprias, oportunidades
de financiamento competitivo e com profissionais
capacitados em investigação clínica, disponíveis,
motivados e a trabalhar em ambiente internacional.
Felizmente iniciativas importantes têm surgido que
acabarão por dar os seus frutos, mas com um atraso
irreparável. Em abril de 2015, uma resolução do
Conselho de Ministros veio enfatizar que a “investigação
médica, particularmente a de índole clínica, é
uma atividade fundamental para o desenvolvimento
do conhecimento e inovação na saúde, contribuindo,
de forma estratégica, para a melhoria da saúde das
populações e do desempenho das unidades de saúde,
no domínio da qualidade dos cuidados de saúde
prestados, no domínio educacional e científico e no
domínio económico” e criou o Programa Integrado
de Promoção da Excelência em Investigação Médica
8 . O sucesso deste programa acabou por estar
praticamente circunscrito ao “Programa Avançado
de Treino em Investigação Clínicaˮ implementado
em colaboração com a Harvard Medical School e
que tem formado desde então e durante dois anos,
entre 30 a 35 internos da especialidade e jovens especialistas,
anualmente, a nível nacional 9 .
Um ano depois uma outra resolução do Conselho de
Ministros 10 reforçava que “para o sucesso de qual- }
14 15
GH Investigação clínica
quer instituição que tenha como objetivo desenvolver
cuidados médicos de elevada qualidade e diferenciação
é hoje indispensável a conjugação da atividade
assistencial, do ensino e da investigaçãoˮ. Através
dessa resolução, procedeu-se à criação de um Conselho
Nacional dos Centros Académicos Clínicos,
“com o objetivo de estimular e apoiar o desenvolvimento
coordenado da atividade dos Centros Académicos
Clínicos” (CACs) que foram surgindo a partir
de 2009. Já em 2018 é publicado o decreto-lei que
estabelece o regime jurídico aplicável aos centros
académicos clínicos, criando condições para o desenvolvimento,
de forma integrada, das atividades assistencial,
de ensino e de investigação clínica e de translação
11 . Contudo, as expectativas sobre o impacto
dos CACs têm sido tantas como as dúvidas sobre
a sua real implementação. Outra iniciativa, seguramente
estruturante embora ainda incipiente, foi a da
criação em 2018, mais uma vez por Resolução do
Conselho de Ministros, da AICIB - Agência de Investigação
Clínica e Inovação Biomédica 12 na sequência
de um grupo de trabalho estabelecido em 2016 por
resolução do Conselho de Ministros 13 . Já em 2019,
um despacho do Ministro da Ciência, Tecnologia
e Ensino Superior determina que a atualização do
Roteiro Nacional das Infraestruturas de Investigação
de Interesse Estratégico deve privilegiar as “infraestruturas
de apoio à investigação clínica, em estreita
colaboração com as unidades de cuidados de saúde
e Centros Académicos Clínicos” 14 .
Com tantas iniciativas nos últimos 5 anos poder-seia
admitir que a contribuição portuguesa para a investigação
clínica e inovação estava a mudar substancialmente.
Não há, contudo, dados objetivos de
que assim seja 7 . Estaremos no caminho certo, mas
provavelmente ainda a uma velocidade impercetível.
Nos parágrafos seguintes invocarei razões e principalmente
tentarei justificar porque é que os Administradores
Hospitalares podem ser a peça em falta
para uma alavancagem efetiva da investigação clínica
em Portugal.
Apesar das inúmeras resoluções dos Conselho de
Ministros a perceção e valorização do problema pode
estar ainda muito centrada na tutela da Ciência,
Tecnologia e Ensino Superior com obstáculos que
não pode controlar e com realidades muito específicas
da investigação clínica permanentemente diluída
e afogada na complexidade da organização dos
serviços e dos profissionais de saúde. A investigação
clínica continua a ser o parente remoto e esquecido
da tutela da Saúde. Contudo, não houve em nenhuma
parte do mundo desenvolvimento da investigação
clínica sem a liderança dos interlocutores da
saúde. Verdadeira liderança e não mera colaboração
em projetos comuns. A maioria das instituições de
saúde refere a investigação na sua missão e valores.
Pergunto-me, contudo, quantas são avaliadas e financiadas
tendo em conta os resultados de investigação.
Na maioria dos países desenvolvidos o paradigma
mudou não com políticos, nem com professores
mas sim com médicos-investigadores, ambiciosos,
líderes nas unidades de saúde que encontraram, juntamente
com os centros de investigação biomédica
e as faculdades de medicina, soluções arriscadas
que acabaram por convencer a tutela dos benefícios
financeiros de uma investigação clínica profissional.
Vejamos por exemplo o caso dos CACs. Já em 2011
numa reunião da rede das universidades em capitais
da europa (UNICA) 15 sobre centros académicos,
o professor Frans Jaspers explicava que em Groningen
(Holanda) começaram por implementar o conceito
de CACs na prática, sem legislação da tutela,
partindo da visão dos líderes do hospital, criando um
modelo de organização da investigação baseado na
confiança entre gestores das unidades de saúde, diretores
das faculdades de medicina e diretores dos
centros de investigação, com investimento partilhado
no projeto comum e liderados por alguém que
fez deste o projeto da sua vida. Continuavam a prestar
contas cada um à sua tutela e quando tiveram
resultados mensuráveis conseguiram o enquadramento
legal que lhes permitiu um desenvolvimento
sustentável. O modelo replicou-se nas várias cidades
holandesas e tornou-se imparável. Começaram por
alterar internamente na unidade de saúde as mentalidades
e as infraestruturas.
Em janeiro de 2019, no workshop organizado pela
APAH sobre “Estratégia para a profissionalização da
investigação clínica nas unidades de saúde em Portugal”
16 , o professor Antonio Portolés, Diretor do Instituto
de Investigación Sanitaria del Hospital Clínico San
Carlos 17 , na vizinha Madrid explicava como o hospital
público San Carlos, as Universidades Complutense
e Politécnia de Madrid, a Consejería de Sanidad de la
Comunidad de Madrid e a Fundación para la Investigación
Biomédica del Hospital Clínico San Carlos criaram
o instituto com um investimento individual de cerca
de uma dezena de milhar de euros e contribuições in
kind. O Instituto passou a centralizar a gestão de toda
a investigação do hospital (incluindo ensaios clínicos
promovidos pela indústria) e toda a investigação da
faculdade de medicina (incluindo os projetos de biomedicina
com financiamento competitivo) e a reinvestir
as receitas em capacitação e infraestruturas de
investigação. Em 2017 as receitas foram superiores
a 10 milhões de euros. Mais uma vez a liderança partiu
da unidade de saúde e estabeleceu-se na base da
visão e confiança no valor da investigação para a melhoria
da prática clínica.
Conscientes da importância dos administradores hospitalares
na mudança de paradigma que inclui a profissionalização
da investigação nas unidades de saúde,
a APAH tem promovido uma série de iniciativas.
O workshop de janeiro de 2019, constituiu a ação
de sensibilização inicial que teve continuidade em
dois cursos pós-graduados sobre a organização, boas
práticas e princípios de gestão dos centros de investigação,
que decorreram em março na Nova Medical
School. Estes foram dedicados a administradores
hospitalares e diretores de centros de investigação,
sem custos para as unidades de saúde. Foram iniciativas
de sucesso que estiveram limitadas a um número
restrito de participantes e se irão expandir em 2020
com o lançamento do PALIS - Programa em Administração
e Liderança da Investigação em Saúde, organizado
em módulos que decorrerão em diferentes
unidades de saúde nacionais.
O dinamismo da APAH é inspirador e augura que
estaremos próximos de ultrapassar um dos últimos
fatores limitantes para o desenvolvimento da investigação
clínica em Portugal: o desconhecimento e consequente
falta da valorização da investigação pelas
unidades de saúde e pela sua tutela.
Acreditamos que este conjunto de oportunidades
permitirá aos administradores consolidar os pilares
da mudança de atitude das unidades de saúde portugueses
relativamente à investigação e à inovação:
• Falar de investigação clínica com conhecimento de
causa;
• Acabar com a oposição entre investigação e trabalho
assistencial: a investigação melhora o trabalho
assistencial;
• Estar disposto a alterar a cultura institucional;
• Assumir que se a investigação é clínica não pode
ser realizada fora das unidades de saúde;
• Assumir uma gestão menos reativa e mais estratégica:
a investigação não resolve problemas imediatos;
• Organizar a gestão da investigação separada da
gestão da atividade assistencial;
• Capacitar profissionais e criar infraestruturas próprias;
• Gerir adequadamente os conflitos de interesse desde
os administradores aos profissionais de saúde, passando
pelos promotores;
• Financiar a investigação com receitas próprias. Reinvestir
os lucros em investigação;
• Gerir a investigação no espaço público com regras
públicas, mas também princípios de gestão privada;
• Assumir que a transparência não é uma opção;
• Utilizar a investigação para motivar os profissionais
desgastados pela rotina ou pela atividade assistencial
indiferenciada.
E principalmente admitir que não há razão nenhuma
para que os profissionais de saúde portugueses não
sejam contribuintes ativos para a inovação em saúde:
se não construirmos o nosso sonho alguém nos recrutará
para construir o deles. Ã
1. http://www.chlc.min-saude.pt/missao-visao-valores-e-objectivos/;
http://www.chlo.min-saude.pt/index.php/centro-hospitalar/missao-visao-e-valores;
http://www.chln.min-saude.pt/index.php/o-chln/missao-e-valores;
https://www.chuc.min-saude.pt/paginas/centro-hospitalar/missao-visao-e-valores.php;
https://www.chporto.pt/https://portal-chsj.min-saude.pt/pages/20;
http://www.josedemellosaude.pt/node/1558; https://www.luzsaude.pt/pt/
luz-saude/sobre/quem-somos-visao-missao-e-valores; https://www.hospitaldebraga.pt/hospital/sobre-nos.
2. A health technology is the application of organized knowledge and skills in
the form of devices, medicines, vaccines, procedures and systems developed to
solve a health problem and improve quality of lives. https://www.who.int/healthtechnology-assessment/about/healthtechnology/en/.
3. www.ptcrin.pt.
4. Madeira et al., (2016). Investigator-initiated clinical trials conducted by the Portuguese
Clinical Research Infrastructure Network (PtCRIN). Contemporary Clinical
Trials Communications 4 (2016) 141e148.
5. https://www.ceic.pt/web/ceic/indicadores-ceic.
6. Madeira et al., Investigator initiated clinical trials (IICTs): a systematic search in
registries comparing two European countries with and without a funding agency
specific for clinical research, submitted.
7. “Ensaios Clínicos em Portugal”, 2013 e 2019, APIFARMA e PwC, https://
www.apifarma.pt/publicacoes/siteestudos/Documents/PwC_APIFARMA_Relatorio_Ensaios_Clinicos_Fev2019.pdf.
8. Resolução do Conselho de Ministros nº 18/2015. Diário da República, 1. a
série - N .o 67 - 7 de abril de 2015.
9. https://postgraduateeducation.hms.harvard.edu/certificate-programs/custom-
-programs/portugal-clinical-scholars-research-training.
10. Resolução do Conselho de Ministros n.o 22/2016 . Diário da República, 1. a
série - n. o 70 -11 de abril de 2016.
11. Decreto-Lei n.º 61/2018. Diário da República, 1.ª série - n.º 149 - 3 de agosto
de 2018.
12. Resolução do Conselho de Ministros n.º 27/2018. Diário da República, 1.ª
série - n.º 49 - 9 de março de 2018.
13. Resolução do Conselho de Ministros nº 20/2016. Diário da República, 1. a
série - n. o 70 - 11 de abril de 2016.
14. Despacho n. o 4157/2019. Diário da República, 2. a série - n. o 75 - 16 de abril
de 2019.
15. UNICA Workshop 28-29 November 2011. King’s College London . UNI-
CA Network of Universities from the capitals of Europe http://www.unica-network.eu/.
16. Workshop Estratégia para a Profissionalização da Investigação Clínica nas
Unidades de Saúde em Portugal, 30 de janeiro de 2019 INFARMED, Edifício
Tomé Pires, Parque da Saúde de Lisboa.
17. http://www.idissc.org/.
16 17
GH Investigação clínica
ENSAIOS CLÍNICOS:
QUÃO PERTO ESTAMOS
DA EXCELÊNCIA?
INOVAÇÃO NO SNS COMO FORMA
DE SUSTENTABILIDADE
Catarina Silva
IQVIA Portugal
Gisela Videira
IQVIA Portugal
Os Ensaios Clínicos têm sido alvo de
discussão ao longo dos anos. Foram
criados grupos de trabalho, plataformas
de suporte, estudos sobre a
realidade em Portugal e publicados
consensos. Mas em que ponto podemos dizer que se
encontra a investigação clínica em Portugal? Quais os
constrangimentos encontrados? E o que tem levado
a uma inércia no desenvolvimento desta área, cuja
relevância é perfeitamente assumida?
As questões são, efetivamente, muitas e com o intuito
de encontrar pontes de comunicação sobre o estado
de arte dos Ensaios Clínicos e o futuro da Investigação
Clínica em Portugal, a IQVIA reuniu numa sessão
de Advisory Board um conjunto de stakeholders com
papel interventivo nesta área, tais como a Indústria
Farmacêutica, Hospitais, Parlamento, Instituições de
Ensino e CRO’s (Contract Research Organizations).
Industrialização da saúde: o doente no epicentro
Nos últimos anos instalou-se a discussão sobre a industrialização
da saúde e os novos desafios que esta
acarreta: overtreatment, aumento constante dos custos,
casos de fraude e, por inerência, a sustentabilidade
do SNS.
Com o doente no centro da retórica, a discussão está
instalada para que o SNS caminhe no sentido da sustentabilidade
pela inovação. Stakeholders, governos,
agências reguladoras, academia e outros players estão
hoje em sintonia: é preciso colocar os ensaios clínicos
como uma prioridade na agenda do SNS. Mas qual o
passo seguinte?
Envolver os decisores
Se a realização de ensaios clínicos assenta no envolvimento
e compromisso da Gestão Hospitalar, tanto
a Indústria Farmacêutica como as equipas de investigação
encontram logo aqui constrangimentos difíceis
de ultrapassar, questionando qual a melhor forma para
permitir que sejam considerados uma prioridade e
que seja visto neles a mais-valia que efetivamente são.
Surge, então, a necessidade de colocar este tema na
agenda governamental e passar a considerar-se os ensaios
clínicos como um objetivo estratégico para o desenvolvimento
do país.
A definição pela tutela de diretrizes e objetivos para
dinamização e implementação de ensaios clínicos
seria crucial para gerar uma maior responsabilização
da Gestão Hospitalar em criar condições para a sua
realização e no cumprimento de um plano previamente
estabelecido.
Na base da definição estratégica, estaria a criação de
uma agência interministerial liderada pelo Ministério
da Saúde: o Ministério da Saúde tem de dar o mote
para que outros ministérios possam valorizar esta
temática. Estando a ownership perfeitamente identificada,
seria mais profícuo cumprir um plano comum,
evitando que as administrações hospitalares tenham
de intervir caso a caso.
A tutela deverá dar orientações para a realização dos
ensaios; a concertação permitir-nos-á caminhar no
sentido de aumentar a rentabilidade das instituições e
otimizar os recursos.
Na constituição da agência interministerial estariam
o Ministério da Saúde, Economia, Negócios Estrangeiros,
Educação e Ciência, como forma de envolver
diferentes setores afetos à estratégia de promoção
da investigação clínica e desenvolvimento de inovação.
Sobre esta agência recairia a responsabilidade de
gerar condições favoráveis à realização de ensaios clínicos,
aumentar a rentabilidade das instituições e otimizar
os recursos. De igual forma, pedir-se-ia a sua a-
ção na promoção da visibilidade internacional para demonstrar
a capacidade e excelência do país nesta área. 1
Ensaios Clínicos: quão perto estamos
da excelência?
Portugal está numa competição acérrima com outros
países, mas temos menos meios e menos centros dis-
-poníveis. Segundo um dos convidados, “queríamos estar
nos países prioritários para receber ensaios clínicos
e temos os países da Europa de Leste a ganhar terreno
e a oferecer uma concorrência diferenciada.”
O enrollment de doentes, per si, constitui outro grande
desafio: estima-se que 25-30% dos centros não
são suficientemente ágeis a recrutar doentes, o que
ronda os $50.000 perdidos por centro, segundo fonte
de dados da IQVIA.
Adicionalmente, é fundamental garantir a previsibilidade
de execução, para evitar a derrapagem de prazos
- quer de aprovação, quer de execução - que penalizam
a credibilidade do país e contribuem para o desinvestimento.
Os prazos de aprovação são os que
constam na Lei n.º 21/2014 (Aprova a lei da investigação
clínica), sendo que não existem dados públicos
reais sobre os tempos de aprovação que nos permitam
elaborar um plano realista e suportado em dados
públicos. Os tempos de aprovação disponíveis não
contemplam processos de validação e/ou aprovação
de contrato pela CEIC, os quais podem chegar a ser
de 40 a 50 dias até ao momento da aprovação, quando
por Lei deveria ser obtida em 30 dias.
Para esta demora acentuada contribuem diferentes
fatores, tais como: a não existência de uma estrutura
única de centralização da gestão e promoção dos en- }
18 19
GH Investigação clínica
“
TEMOS DE ESCOLHER ONDE
QUEREMOS SER COMPETITIVOS
E ESPECIALIZARMO-NOS.
O FUTURO PASSA POR
IDENTIFICAR OS CENTROS
DE EXCELÊNCIA E DESENVOLVÊ-
-LOS. NÃO PODEMOS TER
A AMBIÇÃO DE SER EXCELENTES
EM TODAS AS ÁREAS.
E SE AMBICIONAMOS SER
OS MELHORES, O QUE SE TORNA
PREMENTE FAZER?
”
saios; os tempos de aprovação pelo Infarmed e pela
CEIC; o tempo de decisão dos Conselhos de Administração;
a não uniformização da documentação, como
é o caso dos contratos financeiros; e a demora no
recrutamento dos doentes e dos próprios investigadores.
Em Portugal, somos 21% mais lentos do que
a média europeia no arranque de ensaios clínicos
e 60% mais lentos no recrutamento dos investigadores.
A criação de algo semelhante à “Via Verde” nos
ensaios clínicos, como forma de reconhecimento da
sua importância pelos profissionais, poderia conduzir
a uma aprovação mais célere. Para a Vice-Presidente
da APIFARMA, “têm-se introduzido mudanças importantes
nos acordos da APIFARMA, por exemplo a dedução
do investimento em I&D (Investigação e Desenvolvimento)
no clawback (contribuição extraordinária
da Industria Farmacêutica), como forma de reconhecer
a importância de investir em I&D como pilar da
Inovação e do desenvolvimento do país”.
Se os benefícios da realização dos ensaios clínicos já
estão mais do que identificados e se é de conhecimento
geral que por cada euro investido há um retorno
de 1,98€, porque continuamos a encontrar barreiras
à realização dos mesmos? Porque não conseguimos
captar mais ensaios clínicos e competir com países de
igual dimensão?
O reconhecimento de que ainda há um longo caminho
a percorrer é um passo fundamental para o motor
da transformação.
Melhorar as infraestruturas
e a operacionalização
Também a nível organizacional são encontrados os
mais diversos constrangimentos. É preciso que os centros
funcionem em rede e só depois se poderá pensar
em competição. Em Portugal, não existem redes de
referenciação oficiais. A divulgação de Ensaios Clínicos
quer aos profissionais de saúde, quer aos doentes
poderia passar por ter um registo nacional funcional
(RNEC), com um motor de busca acessível. A divulgação
dos ensaios clínicos no site das Instituições também
seria uma opção. A maioria dos profissionais de
saúde não tem conhecimento dos estudos a decorrer
e, como tal, não referencia doentes.
Só criando infraestruturas e condições favoráveis à
operacionalização de ensaios clínicos poderemos ambicionar
ser bons nos ensaios que já realizamos, precisamos
de ser muito melhores nos ensaios de fase III
antes de pensar nos de fase I e II.
Existe igualmente a necessidade de proporcionar
condições a que se desenvolvam centros de investigação
de excelência, especializados nas áreas terapêuticas
onde possam captar mais estudos e recrutar
mais doentes, sendo o recrutamento suportado por
um processo de referenciação por parte dos cuidados
de saúde primários. Temos de escolher onde
queremos ser competitivos e especializarmo-nos.
O futuro passa por identificar os centros de excelência
e desenvolvê-los. Não podemos ter a ambição de
ser excelentes em todas as áreas.
E se ambicionamos ser os melhores, o que se torna
premente fazer? Tendo processos de decisão e operacionalização
agilizados e infraestruturas criadas, a capacitação
dos profissionais de saúde com valorização
da atividade de investigação e tempo protegido para
a mesma assim como a literacia do doente será mais
um passo a dar.
Identificamos também a necessidade das Instituições
criarem processos mais ágeis na aprovação de
contratos de ensaios clínicos. Deverão ter em conta
que existem organismos nacionais competentes para
a avaliação ética, não havendo necessidade desta avaliação
ser realizada a nível da instituição.
Capacitar os intervenientes
Face à importância dos ensaios clínicos, seria de esperar
que os profissionais de saúde tivessem uma carreira
associada à investigação, através da qual pudessem
progredir. No entanto, tal não ocorre: poucos são
os profissionais que podem dedicar-se a tempo exclusivo
a esta área e os incentivos para premiar a excelência
são diminutos.
Desta forma, os ensaios não são mais do que um adicional
às funções e os profissionais de saúde nem
sempre têm noção exata de qual o retorno do esforço
efetuado em conciliar a rotina diária com a investigação
clínica. Sem que haja incentivos (financeiros ou
outros) diretos à participação dos profissionais, os ensaios
clínicos acabam por não ser considerados uma
prioridade, ficando para segundo plano.
A academia tem também vindo a procurar ganhar relevo
neste campo. Geralmente, os investigadores continuam
a diferenciar os ensaios clínicos promovidos
pela Indústria Farmacêutica daqueles que são promovidos
pela academia, sendo que deveriam estar completamente
associados pois os ensaios clínicos da Indústria
Farmacêutica poderiam financiar os académicos.
Os ensaios clínicos que resultam da iniciativa do
investigador são apenas 10% e desses, nem sempre
é verdadeiramente por iniciativa do investigador.
Atualmente, nenhum centro académico tem uma estrutura
que lhe permita desenvolver ensaios. No limite,
é preciso entender que os requisitos de um ensaio
clínico não são para criar dificuldades aos investigadores
ou aos centros de investigação, mas para proteger
os doentes.
Hoje já temos um conjunto de condições que nos permite
dar o passo seguinte e a transparência dos dados
faz parte dos requisitos para quem vem fazer ensaios
clínicos em Portugal.
Gerar informação
Começámos por falar na industrialização da saúde,
sendo um dos principais fatores de análise desta o valor
da saúde: outcomes vs custos. Sabe-se hoje que os outcomes
são difíceis de medir, sobretudo devido à falta
de informação: faltam dados e robustez aos que já
existem para permitir pagar por resultados.
Na base de qualquer estratégia definida com o intuito }
20
GH Investigação clínica
“
O DOENTE ESTÁ NO CENTRO
DO DESAFIO, MAS É NECESSÁRIO
ALARGAR A DISCUSSÃO
E DEFINIR UMA ESTRATÉGIA
GLOBAL E CONCERTADA
QUE PERMITA REDEFINIR
OS PRESSUPOSTOS DA
INVESTIGAÇÃO CLINÍCA.
”
no centro do desafio, mas é necessário alargar a discussão
e definir uma estratégia global e concertada que
permita redefinir os pressupostos da investigação clínica
em Portugal e que a mesma seja implementada.
O envolvimento dos decisores será determinante para
que o compromisso dos quadros diretivos dos Hospitais
seja efetivo, mas também porque é necessário
um investimento estratégico na modernização das infraestruturas
que servem de base à investigação clínica.
A realidade de vanguarda tecnológica em que vivemos
exige que a operacionalização dos processos seja
mais célere, eficaz e com resultados mais próximos
da excelência.
Não é nova a discussão sobre a necessidade de reforma
do SNS Português, mas urge que a mudança seja
pensada de forma holística e que os Ensaios Clínicos
e a Investigação Clínica em Portugal sejam tidos como
uma prioridade. Mais do que um serviço nacional
de saúde universal e tendencialmente gratuito, os portugueses
precisam que a inovação chegue mais depressa
como forma de sustentabilidade a longo prazo. Ã
de desenvolver a investigação clínica em Portugal, deverá
estar uma robusta e fiável informação em saúde.
A determinação do potencial por área terapêutica é
de extrema relevância uma vez que os critérios de inclusão
e exclusão dos ensaios são cada vez mais exigentes
e a Indústria Farmacêutica tem vindo a focarse
em cohorts de doentes com doenças menos conhecidas
e com características muito específicas. Sem
a capacidade de definir previamente o potencial de
doentes elegíveis, as metas definidas não serão concordantes
com a realidade e continuaremos a ter ensaios
com centros de investigação sem recrutamento.
Para isto, é essencial que o país esteja dotado de sistemas
de informação articulados que permitam a rápida
estruturação dos dados de saúde e a identificação
célere dos doentes elegíveis.
Sem esta base estruturante, que sirva de suporte a decisões
futuras, poderemos continuar a ambicionar ser
melhores, mas não conseguiremos captar mais ensaios
clínicos nem conseguiremos alcançar a tão pretendida
excelência em investigação clínica.
Considerações finais
Como resultado da sessão de trabalho ficou claro que
as dificuldades sentidas e a necessidade de progresso
são transversais a todos os stakeholders. O doente está
Moderador do debate:
Pedro Silva Gomes, former Principal
Consulting, IQVIA
Participantes no Advisory Board:
Ana García Cebrian, former Diretora-Geral, Sanofi
Branca Barata, former Market Access
& External Affairs Director, Roche
Cristina Campos, Diretora-Geral, Novartis
Filipa Mota e Costa, Diretora-Geral, Janssen
Filomena Ribeiro dos Santos, Associate
Director, IQVIA Portugal
Hélder Mota Filipe, Faculdade de Farmácia
da Universidade de Lisboa
João Sayanda, Senior Director R&D, IQVIA
Mário Martins, General Manager, IQVIA Portugal
Óscar Fernandes, former Clinial Trials Unit
Manager, Centro Hospitlar Lisboa Central
Ricardo Baptista Leite, Assembleia
da República
Vítor Papão, Diretor-Geral, Gilead.
1. Em 2018, foi criada a Agência para a Investigação Clínica e Inovação Biomédica
(AICIB) com o intuito de promover e desenvolver a investigação
clínica em Portugal, carecendo esta, no entanto, de uma intervenção mais
efetiva no âmbito para a qual foi criada.
22
GH entrevista
CARLA NUNES
DIRETORA DA ESCOLA NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA (ENSP-NOVA)
PROMOVER UMA ESCOLA
ATUAL, INOVADORA
E FOCADA NA SUA MISSÃO
Professora na ENSP-NOVA desde 2005 e diretora desde agosto de 2019, Carla Nunes realça
o inquestionável legado da instituição ao longo dos seus 52 anos de história. No seu mandato,
assegura promover uma Escola atual, inovadora, mais viva e focada na sua missão: contribuir
para promover uma melhor saúde e para responder aos novos desafios da Saúde Pública.
É
diretora da Escola Nacional de Saúde
Pública (ENSP-NOVA) desde agosto
de 2019 e professora da mesma
casa desde 2005. O que a impeliu a
apresentar a candidatura à Direção da
ENSP? Quais são as marcas que distinguem a atual
Direção da ENSP-NOVA?
O que me motivou a apresentar a minha candidatura
a diretora foi acreditar profundamente na Escola Nacional
de Saúde Pública, principalmente na sua utilidade
pública e, simultaneamente, acreditar que posso contribuir
para o seu desenvolvimento. A Escola tem um legado
inquestionável e de que eu muito me orgulho e
que suporta a sua pertinência passada, atual e futura. A
atual direção, constituída por mim, pelo Professor Alexandre
Abrantes e pelo Professor Rui Santana, acredita
que a Escola pode e deve ter agora uma velocidade e
um movimento diferente, nas suas três áreas de atuação:
ensino, investigação e criação de valor. A pertinência
e utilidade de tudo o que fazemos é central à
nossa forma de estar e sempre que criamos ou repensamos
algo validamos o seu alinhamento com os objetivos
do desenvolvimento sustentável. Claro que o nº 3
é a nossa base (Assegurar uma vida saudável e promover
o bem-estar para todos, em todas as idades), mas
existem outros (senão todos) que são incontornáveis
na nossa missão: 1 - Acabar com a pobreza em to-
das as suas formas, em todos os lugares (maior determinante
da saúde), 4 - Educação de qualidade, 10 - Redução
das iniquidades, 13 - Alterações climáticas (que
traz novos desafios à Saúde Pública) e, claro, o 17 - o Estabelecimento
de parcerias para atingir estes objetivos.
Procuramos assim promover uma Escola atual, inovadora,
mais viva e focada na sua missão (contribuir para
promover uma melhor saúde e para melhorar os serviços
da saúde), aberta à sociedade e aos novos desafios
da Saúde Pública, muito presente, por exemplo, na elaboração
da agenda futura da Saúde Pública.
Há 25 anos na Universidade NOVA de Lisboa e com
mais de 50 anos de história, a ENSP-NOVA é uma
instituição dedicada ao ensino pós-graduado, à investigação
e à criação de valor para a sociedade na área
da Saúde Pública. Tendo em consideração este legado
quais são os pilares e prioridades que preconiza para
o futuro da instituição?
Este é realmente um ponto no tempo muito importante
na história da ENSP. Até agora, a nossa missão de Saúde
Pública tem sido cumprida metade no Ministério da
Saúde (entre 1967-1994) e a outra parte na Academia,
especificamente na NOVA, que muito nos orgulhamos.
De entre os nossos pilares e prioridades que
definimos no plano estratégico identifico aqui, apenas
para abrir o apetite, uma ação em cada uma das três }
24 25
GH entrevista
áreas: a) Ensino - criação de uma oferta formativa complementar
à existente, baseada em cursos de pequena
duração, com perfis distintos dos atuais, numa perspetiva
de ensino ao longo da vida, em temas específicos
e na aquisição de novas competências, para executivos
e para um público internacional; b) Investigação - temos
neste momento a nossa investigação baseada em
centros de investigação excelentes, um interno e outro
em parceria e onde coordenamos as áreas de Saúde
Pública (Centro de Investigação em Saúde Pública,
Comprehensive Health Research Centre). Assim temos
agora todas as condições para desenvolver projetos de
maior dimensão, com novas contratações de investigadores
de elevado nível e também robustecendo os gabinetes
de apoio à investigação; c) Criação de valor - estamos
a desenvolver diversas iniciativas direcionadas para
a comunidade, para aumentar a sensibilidade e conhecimento
da população dos grandes problemas de Saúde
Pública e promover o seu envolvimento em iniciativas
específicas. Esta sensibilização tem de começar em idades
jovens e de uma forma atual, com uma comunicação
adequada. A forma como se procura passar a informação
é essencial, tendo agora novos parceiros nessa área.
Como nota final, transversal às três áreas, temos um
grande desafio e prioridade: contratação de recursos
humanos de excelência, nomeadamente jovens talentos
da Saúde Pública, e de outras áreas, claro. São eles
que promoverão um dinamismo diferente e que ajudarão
a criar a agenda futura de Saúde Pública. Também
a criação da associação dos antigos alunos da ENSP,
considerando obviamente todas os cursos ministrados
pela ENSP desde sempre, procura criar uma comunidade
ENSP de grande dimensão com projetos e iniciativas
inovadores e integradores.
A ENSP-NOVA é uma das instituições de referência
nacional na oferta pós-graduada na área da saúde em
Portugal. Contudo num mercado em crescente dinamismo,
onde por um lado a competição e diversidade
de oferta de programas formativos se tem vindo
a acentuar, e por outro as expetativas dos formandos
é cada vez mais elevada, que soluções e alternativas
preconiza ao nível da oferta formativa da ENSP-
-NOVA que permita responder aos desafios dos
anos vindouros?
Desde sempre a nossa formação é reconhecida como
uma oferta exigente, de elevada qualidade e diferenciadora,
sendo líder na oferta formativa que oferece.
Diferenciadora no sentido em que existem conteúdos
que não são lecionados em mais sítio nenhum, principalmente
num contexto de Saúde Pública adequado.
Não procuramos oferecer formações per si, isoladas,
mas sim uma proposta de caminho profissional.
Claro que é necessário ir adaptando, atualizando, inovando
e criando ofertas complementares às nossas ofertas
formativas. Nesse sentido, estamos agora a desenvolver
novos produtos com diferentes formatos, mais curtos
e numa perspetiva de formação ao longo da vida, e
que correspondam às necessidades atuais.
Estas formações, com base em toda a nossa experiência,
são com certeza diferenciadoras de outras ofertas
com o mesmo formato de faculdades que têm com base
e como missão outras áreas. Temos obviamente conhecimento
das novas formações que têm surgido no
mercado, nem sempre alicerçadas na melhor preparação,
no contexto adequado e sem evidência científica.
Há muito ruído nas iniciativas que são oferecidas pelo
mercado, muitas vezes pouco consistentes e não reprodutivas.
Não nasceram na Saúde Pública, e para essas
outras iniciativas, a saúde é apenas uma nova área,
entre tantas outras, onde não têm experiência e conhecimento.
A especialização de um corpo docente e de investigação
robusto que permita um ensino específico
e diferenciado na área demora anos a ser formado. A
abertura de novas formações na ENSP não procura
acompanhar tendências mediáticas ou modas efémeras
que rapidamente se eclipsam, mas sim as reais necessidades,
identificadas junto das populações, dos parceiros,
dos serviços de saúde e da sociedade em geral. Procuramos
ensinar o estado de arte, pelo que a atualidade
dos nossos programas é uma realidade.
O que nos pode dizer sobre a qualidade, diferenciação
e atualidade dos programas lecionados na ENSP-
-NOVA, nomeadamente os de doutoramento, por
forma a responder às necessidades de uma Saúde Pública
globalizada e em constante mudança? Como se
articula a ENSP-NOVA com as restantes entidades da
Universidade NOVA de Lisboa e com a rede nacional
e internacional de entidades académicas e de investigação.
E como é feita a ponte com a sociedade civil?
O que nos distingue é termos nascido na saúde e trazemos
as outras áreas para servir a Saúde Pública. Por e-
xemplo, eu sou de estatística e já fui professora em outras
duas faculdades: é completamente diferente lecionar
aulas de estatística num departamento de Matemática/Estatística,
onde mostramos exemplos de engenharia,
de ambiente, de economia, e, por vezes, de saúde, a
ter o enquadramento da ENSP, onde o centro e o foco
é a Saúde Pública e os seus desafios e onde todas as áreas
contribuem para a Saúde Pública (direito, economia,
ambiente, gestão, sociologia, etc), com a investigação
também alinhada desta forma e em conjunto com professores
convidados que trabalham fora da academia e
que trazem a realidade e os desafios do dia a dia para
o ensino. O ensino de todas as matérias é assim centrado
na Saúde Pública, atual, produtivo e diferenciador.
Em relação especificamente aos doutoramentos, temos
atualmente três cursos de doutoramento; um exclusivo
da ENSP, outro em parceria com quatro faculdades (três
da NOVA) a nível nacional e outro internacional (tendo
a França e a Suécia como parceiros). Os dois últimos são
totalmente comparticipados (pela Fundação para a Ciência
e Tecnologia e pela União Europeia) e apenas aceitam
alunos a tempo integral. O primeiro, com cinco especialidades
distintas (Epidemiologia; Promoção da Saúde;
Política, Gestão e Administração da Saúde; Economia
da Saúde; Saúde Ambiental e Ocupacional) integra
maioritariamente estudantes-trabalhadores, muitas vezes
com posições já consolidadas em termos profissionais
e que procuram uma formação diferenciadora.
Assim, temos a este nível um leque variado, com parcerias
nacionais e internacionais, dentro e fora da NOVA.
Na última década doutoramos cerca de 70 alunos na
ENSP, com um padrão crescente notório, demonstrando
que a nossa investigação está cada vez mais robusta
e fortemente alinhada com o ensino. Recentemente tivemos
uma site visit da ASPHER que elogiou o trabalho
da ENSP enquanto Escola multidisciplinar, completa,
atualizada no que respeita à sua oferta formativa e com
um feedback excelente por parte dos seus alunos, dos
antigos alunos e dos parceiros.
Respondendo aos desafios e oportunidades atuais da
Saúde Pública, considera que existem atualmente profissionais
habilitados em número suficiente, sobretudo
no domínio da Saúde Pública, para responder aos
desafios tão exigentes como o que se vive atualmente
com o surto de pneumonia por novo Coronavírus
(2019-nCoV), num contexto em que urge atuar à escala
mundial?
A área da Saúde Pública foi durante muito tempo um
pouco marginalizada dentro das áreas de especialidade
da medicina e por vezes com funções pouco desafiadoras
para os profissionais de Saúde Pública e em especial,
atrevo-me a dizer, para os médicos de Saúde Pública.
Parece-me que atualmente temos um panorama e um
reconhecimento muito distinto: A Saúde Pública é notoriamente
algo central para as populações em todo o
mundo, com muitos desafios em comum e outros mais
locais. Poderia identificar muitas áreas importantes, mas
focando-me nas 5 major identificaria, não procurando
ordenar, o envelhecimento das populações (considerando
doenças crónicas, multimorbilidade e integração de
serviços), os cuidados de saúde primários, alterações climáticas
e, claro, as doenças infeciosas. Penso que temos
de investir mais nesta área (Saúde Pública), mas considero
que neste momento já estamos a fazer este caminho.
Temos muito bons profissionais, temos competências e
meios. A vigilância epidemiológica tem de ser reforçada
e tem de se atuar imediatamente, de uma forma articulada
e a nível mundial. Em conclusão, considero que não
temos ainda os meios que deveríamos ter, mas já é reconhecida
como uma prioridade e com um investimento
crescente. A academia deve ter um papel fundamen- }
26 27
GH entrevista
tal, promovendo-se uma investigação robusta, de uma
forma contínua e não apenas em momentos de crise.
A ENSP-NOVA desempenha também um papel fulcral
no âmbito da investigação em Saúde Pública e, em
particular, na gestão em saúde. Que linhas de investigação
são neste momento prioritárias para a ENSP-
-NOVA? Pode partilhar com os leitores da RGH como
se posiciona a ENSP-NOVA a nível europeu e
internacional no que concerne à produção de conhecimento
científico?
No âmbito da ENSP e dos centros de investigação que
já referi produzimos um volume de ciência (artigos, abstracts,
livros, etc) relevante e com um impacto também
bastante positivo e crescente face aos comparadores internacionais.
Temos neste momento quatro grandes á-
reas de investigação: Promoção da saúde, Políticas de saúde,
Serviços e sistemas de saúde, Saúde Ocupacional e
Ambiental e, dentro destas áreas, investigamos variados
temas. Exemplos: administração em saúde, iniquidades,
literacia, determinantes sociais e comportamentais, segurança
do doente, qualidade em saúde, exposição profissional
e ambiental, multimorbilidade, doenças crónicas,
sustentabilidade em diversas áreas, entre tantos outros
temas. Esta organização e temas não é algo fechado
e constante pois, tal como a Saúde Pública, está em constante
mutação e atualização, consoante as necessidades
da sociedade. Somos uma Escola multidisciplinar, obrigatória
numa escola de Saúde Pública, e isso reflete-se
em todas as nossas componentes: recursos humanos,
organização, ensino, investigação e criação de valor.
É também consensual que a ENSP-NOVA tem uma
importância indiscutível na construção do Serviço Nacional
de Saúde (SNS) e da administração hospitalar em
Portugal tendo contribuindo inclusive, ao longo dos
40 anos do SNS, com vários membros de Governo.
Acreditamos que este passado honra a história da
ENSP-NOVA, mas acrescenta ainda mais responsabilidade
para o futuro. Qual é a visão da nova direção para
o Curso de Especialização em Administração Hospitalar
(CEAH), que este ano assinala 50 edições? Está
prevista alguma revisão do plano curricular do CEAH?
Em que moldes considera deve a mesma ser realizada?
É verdade que o nosso passado representa uma enorme
responsabilidade. A história do CEAH funde-se com
a história da ENSP. O CEAH iniciou-se em 1970, está
agora na 49ª edição, com cerca de 1.130 alunos admitidos
e mais de 870 alunos diplomados. É um curso importante
para a ENSP e para o Sistema de Saúde Português.
Nos últimos anos temos também assistido a uma
crescente internacionalização das saídas profissionais dos
nossos alunos, com excelente resposta, o que também
demonstra a capacidade que os nossos alunos demonstram
em contextos não só nacionais como internacionais.
Obviamente que para mantermos a exigência e atualidade
que caracteriza a nossa formação, todos os cursos
na ENSP são periodicamente avaliados e revistos, tanto
internamente como externamente.
No caso específico do CEAH está agora a decorrer
uma reflexão interna sobre a necessidade de adequar/
atualizar alguns conteúdos assim como adicionar novas
matérias. Os nossos parceiros nacionais e internacionais,
nos quais neste contexto a APAH tem um papel muito
importante, irão brevemente ser ouvidos sobre esta reflexão.
Sabemos que o mundo está em constante adaptação,
cada vez mais rápido, por exemplo as novas tecnologias
em todas as áreas obrigam a um constante esforço
de atualização. O facto de muitos dos nossos professores
serem profissionais do serviço de saúde, a diversos
níveis, permite-nos ter a consciência imediata da necessidade
de atualização dos nossos planos curriculares. Também
os estágios são um ótimo veículo para garantir a coerência
da nossa formação. Não somos uma Escola fechada
na Academia e a nossa missão e motivação vem
de fora. É isso que nos diferencia.
A Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares
(APAH) está a trabalhar com a tutela na
revisão da carreira de Administração Hospitalar e
igualmente no Programa e de Desenvolvimento Profissional
suportado na formação contínua e avaliação
e certificação de competências. Qual é a disponibilidade
da ENSP-NOVA, e concretamente da coordenação
do CEAH, para uma colaboração com vista ao
desenvolvimento dum modelo desta natureza?
A ENSP tem total disponibilidade para participar na
avaliação e desenvolvimento desta iniciativa. Aliás, neste
caso concreto, vejo mais como um projeto conjunto e
não uma participação externa. Através da formação que
oferece, a ENSP pretende garantir que tenhamos os me-
lhores administradores hospitalares possíveis, preparando-os
para serem líderes nos novos desafios epidemiológicos,
globais e tecnológicos da Saúde Pública. Portanto,
a Escola está sempre disponível para refletir sobre todas
as iniciativas que possam contribuir para este objetivo.
O caso específico da formação continua é uma realidade
e um desafio para todas as formações. Não existem
formações para a vida, está tudo em constante mudança
e evolução.
A APAH e a ENSP-NOVA mantêm uma parceria e colaboração
profícua que tem sido crescente ao longo
dos últimos anos. Como avalia esta colaboração e de
que forma considera pode a mesma ser estimulada e
incrementada? Em que áreas considera pode a APAH
colaborar de forma mais estreita com a ENSP-NOVA?
Realmente é com grande prazer que verificamos que esta
colaboração tem vindo a aumentar. Nos últimos anos
podemos referir o Prémio Coriolano Ferreira, o Barómetro
da adoção da Telesaúde e Inteligência Artificial,
a participação no European Association of Hospital Managers
(congresso 2018 com a edição especial do Portuguese
Journal of Public Health), o Programa CONTIGOS, a
colaboração na Revista Gestão Hospitalar, as Bolsas para
alunos do CEAH nos eventos APAH, diversas participações
em painéis de peritos, entre outras.
Para além da continuidade dos exemplos referidos, é
óbvio o interesse de ambas as partes, penso eu, em que
a APAH seja envolvida na reflexão externa sobre o plano
curricular do CEAH, assim como a sua participação
ao nível de estágios e trabalhos de campo. A ligação entre
a APAH e o CEAH é tão forte, que penso que todos
queremos o mesmo, com partilha de deveres e responsabilidades:
contribuir para tornar o produto que diferencia
todos os seus associados, num produto cada vez
mais forte, diferenciador e reconhecido. Interessa identificar
bem o nosso objetivo, focar no nosso público alvo
e diferenciarmo-nos de outras iniciativas confundidoras.
Por parte da ENSP há total abertura para esta parceria,
num contexto de grande proximidade, sinergia e respeito
mútuo.
Que conselho daria a um recém-diplomado em Administração
Hospitalar em início de carreira?
O contexto da atual prática da Administração hospitalar
é complexo, no sistema de saúde com muitos desafios,
restrições a diversos níveis e em constante mudança. Os
nossos alunos continuam a ser valorizados no mercado
pela formação que realizam, que promove a sua capacidade
de fazer a diferença e que suporta o seu reconhecido
desempenho. As formações profissionalizantes, como
é o caso do CEAH, procuram ser próximas dos con-
textos reais de atuação. A realização de estágios e de trabalhos
de campo na estrutura do CEAH pretende alcançar
uma proximidade entre o ensino e a prática, pelo
que os alunos encontram-se capacitados para atuarem e
adaptarem-se a diferentes contextos profissionais.
O que proponho aos recém-diplomados em Administração
Hospitalar em início de carreira? Três mensagens
chave: 1) Procurem ter diferentes experiências no seu percurso,
ARS, hospitais, ACES, internacional, a visão global
da prática em diferentes organizações do sistema permite
um enriquecimento profissional; 2) Aproveitem a
prática tutelada entre pares, que é uma excelente forma
de aprender; 3) A formação em Administração Hospitalar
não poderá ser entendida como uma formação para
o resto da vida (como outra qualquer formação atualmente),
é necessária uma postura de formação constante
ao longo da vida. Por isso, voltem à vossa Escola e vejam
o que temos de novo para oferecer. Caso não encontrem
algo que identificaram como necessário, contactem-nos
e desenvolveremos juntos essa formação.
Daqui a uma década, como gostaria que os alunos a
recordassem?
Sou e serei sempre uma professora, que tem um grande
prazer na sua profissão. Gosto mesmo muito de lecionar,
de orientar alunos e de participar em projetos de investigação.
Isto é um bem sem valor, em termos profissionais.
Tenho momentos que não esqueço, uns por serem
muito bons e outros menos bons, claro! Gostaria que me
lembrassem como alguém muito competente, exigente,
dinâmica e, claro, simpática. Em termos de direção,
gostaria de ser lembrada como alguém justo e empenhado,
que imprimiu um cunho e uma velocidade diferente
à ENSP, cunho este suportado por um passado
honroso, um presente muito dinâmico, robusto e estratégico
e que promoveu um futuro ainda mais diferenciador
e inovador. Ã
28 29
GH Participação em Saúde
"MAIS PARTICIPAÇÃO
MELHOR SAÚDE" UMA
INICIATIVA QUE SE SAÚDA
“MAIS PARTICIPAÇÃO melhor saúde” é uma iniciativa colaborativa de investigação/ação
que surgiu, em 2015, com o objetivo de promover a participação e a capacitação
de representantes das pessoas com ou sem doença, no âmbito dos processos de tomada
de decisão em saúde, a nível político e institucional, em Portugal. A Revista Gestão
Hospitalar foi conhecer melhor este interessante projeto pela voz dos seus responsáveis.
Na vossa opinião, como se pode potenciar
a participação mais ativa do
cidadão na definição de políticas de
saúde pública?
Entendemos que as instituições de
saúde também têm de se virar para a comunidade de
forma mais estratégica, nomeadamente olhando para
os atores institucionais que já existem, e que também
têm funções e obrigações de promover esta articulação,
conversa e diálogo entre as várias instituições
locais, nomeadamente, as juntas de freguesia.
Estas são, eventualmente, o caminho relativamente
inovador que as instituições de saúde podem desenvolver
e promover, para que possam servir de via de
comunicação com a comunidade. Lançamos esse desafio
às instituições de saúde para promoverem, desenvolverem
e fortificarem aquilo que já está previsto
na legislação.
Acrescentaria só a questão da diversidade das formas
de participação, já que é muito importante procurar
formas diferentes, seja a nível político ou da
gestão e da organização dos serviços. Não há um
formato único, o formato online é bom, tem vantagens,
é fácil, rápido, mas tem a desvantagem de não
ter o contacto direto. É preciso perceber quais são
as expectativas de quem está do outro lado e como
é que preferem que essa participação seja definida.
Agora que o Conselho Nacional de Saúde já existe,
é uma mudança para quem está de fora e não se
apercebe bem das consequências, dos resultados,
mas quem está dentro do processo entende a diferença
que este Conselho tem causado, por exemplo,
nas relações entre os diversos atores, nomeadamente,
as ordens profissionais, nos representantes dos
prestadores e nas associações.
Também nos documentos que têm sido produzidos,
percebemos claramente a influência que as associações
de utentes têm tido na elaboração do texto final
da Carta para a Participação Pública em Saúde. Outro
exemplo foi a Lei de Bases da Saúde; no debate
realizado no Parlamento, nunca tinham sido chamadas
tantas associações da sociedade civil a um processo
legislativo. A própria Lei da Participação Pública
em Saúde, que acaba por instituir aquela Carta,
é em si mesmo um exemplo do envolvimento das
pessoas na política de saúde.
Nesta sequência, onde anteveem a intervenção do
gestor de serviços de saúde?
Os profissionais e os gestores de saúde têm uma
responsabilidade acrescida de promover estes processos
de envolvimento dos cidadãos. No entanto,
o facto de os próprios cidadãos quererem promover
processos, em que eles próprios estejam envolvidos,
não se torna possível em termos práticos.
Depois de desencadearem um processo de envolvimento
em que haja uma verdadeira partilha de poder,
delegação de tarefas e responsabilidades, no futuro
quem sabe se serão os próprios cidadãos os promotores
de processos participativos. Não é uma utopia,
é uma realidade e existe em vários países e várias áreas.
Neste momento, vemos o gestor de serviços de saúde
como principal promotor destes processos.
Os riscos acrescidos de instrumentalizar os cidadãos
a favor do sistema nos processos de tomada de decisão
são grandes e é preciso atender a esse risco quando
se promovem estes processos. É muito importante
que os seus promotores estejam abertos a serem
mais dinâmicos, ou seja, estarem disponíveis para
mudar, renovar ou inovar o processo, porque as realidades
e as pessoas são diferentes, logo é normal
que as soluções sejam diferentes.
A população portuguesa estará apta a adotar estas
responsabilidades? Pode afirmar-se que o caminho a
seguir será apostar efetivamente na literacia em saúde,
de modo a capacitar os cidadãos para a decisão?
Quem tem o poder de decisão, seja político ou ao
nível da gestão, fala sistematicamente na necessidade
de aprofundar a literacia em saúde, para que as
pessoas participem. Isso vai ao encontro daquilo que
tem a ver com uma retórica mais ou menos subtil
de resistência ao envolvimento dos cidadãos, que
é: quantos obstáculos existem ao envolvimento dos
cidadãos na tomada de decisão? Há, por exemplo,
a literacia em saúde. Não vejo que falta de conhecimento
uma pessoa tem, quando vive sistematicamente
com uma doença que a obriga a frequentar
centros de saúde com muita frequência. Não se pede
aos cidadãos que digam quais os melhores tratamentos
ou qual a melhor estratégia baseada na
teoria A que nos leva à solução B.
Todos temos perícias e conhecimentos diferentes, há
sim que encontrar e criar oportunidades para as poder
integrar. O que não pode continuar a acontecer
é que a política de saúde se faça excluindo um }
30 31
GH Participação em Saúde
“
A LITERACIA EM SAÚDE
TEM A VER COM SABER
ESCOLHER QUEM É O PROVEDOR
DO DOENTE, QUE CONSEGUE
FAZER MELHOR A PONTE
ENTRE AQUILO QUE É O USO
DO CIDADÃO E O QUE
É A ORGANIZAÇÃO DE SAÚDE.
”
segmento fundamental do conhecimento, que são
as pessoas que vivem com doenças. E esse conhecimento
não tem sido integrado na política de saúde.
Por exemplo, quando falamos em literacia em saúde,
foca-se muito na doença, logo a pessoa só é sensível
a receber essa informação e procurar esse conhecimento
quando está doente. Acho que esta discussão está
muito centrada nas escolhas corretas e literacia não é
isso. Deve-se sim dizer às pessoas que podem participar
e, quanto mais elas são envolvidas e chamadas a ter
um papel ativo, mais procuram esse conhecimento.
A literacia em saúde tem a ver com saber escolher
quem é o provedor do doente, que consegue fazer
melhor a ponte entre aquilo que é o uso do cidadão
e o que é a organização de saúde. Passa, fundamentalmente,
por reconhecer a competência da participação
construtiva.
Em que medida consideram que a partilha de responsabilidade
para a tomada de decisão “informada”
e outros mecanismos existentes de participação
pública conduzirão, na prática, a melhores resultados
em saúde?
Há que fazer estudos de avaliação da implementação
deste processo de partilha de poder na tomada de
decisão. No entanto, com base em alguma informação
que temos, há vários resultados positivos que decorrem
do envolvimento dos cidadãos e que estão
reconhecidos pela literatura, existindo uma evidência
científica que os comprovam. Se há melhorias ao
nível da saúde individual? Também não é bem isso
que se procura. Há sim evidência empírica em como
o envolvimento dos cidadãos leva necessariamente
a decisões de melhor qualidade, informação, eficácia
e mais duradouras. Leva também a uma maior adesão
daquele que é o público-alvo das decisões à própria
decisão e isso é fundamental para o sucesso dessas
decisões. Processos que envolvem as pessoas, que
são alvo dessas mesmas decisões, aquando da tomada
de decisão, são necessariamente processos mais eficazes,
melhor sucedidos, mais prolongados no tempo,
mais estáveis, que criam menos entropia e são menos
perturbáveis. Só vejo boas razões para implementar
processos de participação.
Assim sendo, consideram que mais processos participativos
dos cidadãos são sinónimo de uma maior
qualidade da gestão do sistema de saúde, minimizando
os riscos da eventual má utilização dos recursos
públicos? Podem exemplificar?
Primeiro que tudo, antes de evitar a minimização dos
riscos, acho que todos os dias os gestores hospitalares
desperdiçam imensas oportunidades de poupança
por não perguntarem às pessoas que circulam nos
serviços e nas consultas, onde é que elas acham que
estão os desperdícios.
Contrariamente a quem promove os inquéritos de
satisfação, penso que as pessoas não gostam de avaliar,
de classificar os melhores e os piores, até porque
depois não vêm qual o objetivo deles e que a sua
avaliação tem influência no resultado final. Se for uma
coisa mais simples, de conversa ou diálogo, é capaz
de funcionar melhor.
Estes tipos de dinâmicas identificam-se mais facilmente
se perguntarmos às pessoas; contarem, por
exemplo, a sua experiência de internamento, o que
funcionou bem, o que funcionou mal, que perceção
as pessoas têm. É um processo de melhoria contínua,
mas tem de haver oportunidades de integrar esses
contributos, para a melhoria dos próprios serviços
e dos resultados finais, com mais eficiência
e sustentabilidade. Em última análise, mesmo que não
traga mais eficiência, mas desde que deixe as pessoas
mais satisfeitas, isso já vale a pena! Ã
32
GH liderança
RELAÇÃO ENTRE OS ESTILOS
DE LIDERANÇA E O EMPENHO
ORGANIZACIONAL
DOS COLABORADORES
João Alexandre Reis
Enfermeiro Especialista no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia
e Espinho EPE (CHVNG/E EPE), Mestre em Cuidados Paliativos,
Pós-graduado em gestão e administração de serviços de saúde
No seio das organizações, a busca por
maior eficiência e diferenciação dos
bens e serviços assim como o sucesso
organizacional são objetivos e preocupações
que acompanham diariamente
os seus líderes e as direções. Face à competitividade
e à exigência dos mercados atuais, Tripathi
e Agrawal (2014) afirmam que a presença de trabalhadores
competentes é fundamental para a sobrevivência
e sucesso das empresas/ organizações.
Os líderes, de acordo com Wang e Hsieh (2013),
deverão ser capazes de criar relações que motivem
os seus colaboradores para que juntos, maximizarem
as suas capacidades e gerarem valor no seio das organizações.
O envolvimento dos colaboradores é, assim,
um importante fator para uma liderança mais eficaz
que se traduz numa maior satisfação e performance
organizacional. Desta forma, os autores afirmam que
o envolvimento no trabalho é tanto maior quanto
mais os trabalhadores se sentirem apoiados e tratados
com sinceridade. Rocha (2017) é também defensora
desta opinião e acrescenta que as perceções que
os trabalhadores têm sobre como são tratados pelos
líderes influenciam o seu envolvimento e a sua ligação
à organização, podendo ditar a sua permanência ou
não na mesma.
“
SÃO VÁRIAS AS DEFINIÇÕES
DE LIDERANÇA PELO QUE
PARA ESTE TRABALHO
IREMOS ANALISÁ-LAS
ENQUANTO CAPACIDADE
DE GERIR EQUIPAS E GRUPOS
PARA ALCANÇAR SUCESSO
ORGANIZACIONAL.
”
A investigação social defende a influência positiva que
a ética traz para as organizações, ao nível do comprometimento
afetivo, da confiança e, consequentemente,
da liderança: Matela (2016) correlaciona a satisfação
no trabalho com o ambiente ético; por sua
vez; Reed (2014) defende que a liderança ética se
materializa impulsionando a eficácia organizacional;
e, Jorge (2016) define-a como condutora ao sucesso
organizacional. Para estes autores, enquanto responsáveis
pela interação com os operacionais, os líderes
devem desenvolver ações e decisões éticas para
aumentar os níveis de desempenho, disponibilidade
e satisfação no trabalho.
Por sua vez, Ferreira (2011) defende que, por meio
da gestão de competências, os trabalhadores são
vistos pela organização como ativos preciosos geradores
de valor, diferenciando-a e sustentando-a pelo
aumento da produtividade. A gestão de competências
é uma estratégia sustentada pela relação entre
o conhecimento, as qualidades, as tarefas e o trabalho
desenvolvido (Tripathi & Agrawal, 2014). Enquanto
estratégia, Königová, Urbancová e Fejfar (2012) consideram
a gestão de competências uma causa-efeito
pois corresponde, segundo Yongliang e Guanzhong
(2010), aos benefícios que resultam para a empresa
do capital intelectual, reduzindo custos, investimentos
e tempos de trabalho. A satisfação, a qualidade
de vida e o empenho no trabalho dependem, assim,
de vários fatores, intrínsecos mas também extrínsecos,
a ter em conta por parte dos líderes: ambiente
organizacional; bem-estar do indivíduo; e, práticas organizacionais
(Rocha, 2017). Neste sentido, ao longo
deste trabalho será analisado o conceito de liderança,
os tipos de liderança existentes, quais os aspetos
mais e menos bons de cada um deles, bem como
o impacto que a liderança e os diferentes estilos têm
sobre os colaboradores.
A revisão bibliográfica identifica a liderança enquanto
ferramenta para o sucesso organizacional. Assim,
entende-se que esta é a capacidade de habilitação,
influência e motivação sobre os outros, ou seja, “a capacidade
de uma pessoa (o líder) levar outras pessoas
(os liderados) a fazerem algo” (Rocha, 2017).
Contudo, os resultados trazidos para a organização
resultantes da capacidade de liderança não dependem
apenas do líder mas também da aceitação por
parte do liderado em ser influenciado (Rocha, 2017).
Daí que a autora refira que tal só acontece se o líder
for capaz de comunicar, inspirando individualmente
cada trabalhador para a responsabilização das suas
ações e atividades enquanto equipa ou grupo: “um
“bom líder” ou um “líder efetivo” é aquele que inspira,
motiva e orienta as pessoas de modo a fazer
atingir os objetivos de grupo e/ou organizacionais”
(Rocha, 2017).
O líder desempenha, assim, um papel fundamental na
eficácia das equipas de trabalho e das organizações
pelo que a sua ação deverá combinar as necessidades
de trabalho atuais com a complexidade, a diversidade
cultural, a inovação e a mudança (Gil, Alcover,
Rico, & Sánchez-Manzanares, 2011). Diversos autores
consideram que os estilos de liderança deverão
enfatizar emoções, sentimentos e valores ideológicos
e morais. Além disso, Kesting, Ulhøi, Song e Niu
(2015) reforçam a importância que a liderança tem
na inovação pois acreditam que esta tem um papel
decisivo na performance da criatividade organizacional
que permite implementar, impulsionar e lançar
projetos inovadores que permitam fortalecer as empresas
e, consequentemente, superar a resistência.
São várias as definições de liderança pelo que para
este trabalho iremos analisá-las enquanto capacidade
de gerir equipas e grupos para alcançar sucesso
organizacional. Neste sentido, Rodrigues (2016)
afirma que o estilo de liderança é fundamental para
a cultura organizacional e, face à diversidade de definições
de liderança, vários são os estilos de liderança
existentes pelo que Gil et al. (2011) destacam: liderança
autêntica, aplica elementos da psicologia positiva,
como o bem-estar e o otimismo, à organização;
liderança compartilhada, interatividade entre todos
os elementos de uma equipa com o propósito de
alcançar os objetivos; liderança complexa; liderança
de equipa e compartilhada, recorre à formação em
grupo e aposta nas competências dos elementos de
cada equipa para aumentar a sua performance; liderança
remota, aplicável a equipas virtuais; e, liderança
transformacional, relaciona as variáveis individuais de
cada líder, como a ética e a inteligência emocional,
com os resultados organizacionais, como o rendimento
e a satisfação das equipas.
Os comportamentos humanos e as decisões fazem
parte do quotidiano das organizações pelo que, sendo
o líder quem influencia os liderados para o foco
e para a orientação das suas competências na missão
e objetivos da organização, um líder deve: reger-se
pelo bem-estar dos liderados e pelo propósito da
organização; ser humilde; misericordioso; preocupado
com os outros; e, rigoroso (Winston & Patterson,
2006). Daí que Saremi e Nezhad (2014) afirmem
que ações, decisões e responsabilidades no dia-a-dia
dos líderes envolvem aspetos éticos que deverão ser
tidos em consideração.
Entendendo-se a liderança como a capacidade de }
34 35
GH liderança
influência do líder sobre os liderados, Rodrigues
(2016), sublinha que o estilo de liderança corresponde
ao modo como essa influência se traduz na “vida
organizacional” enquanto comportamento do líder
face aos liderados. A par da diversidade de definições
de liderança, vários são os estilos de liderança
encontrados na literatura e cuja ordem cronológica
é apresentada abaixo:
¢ Até final dos anos 40 - Teoria dos traços
• Existem características inatas que conduzem à posição
de liderança e que possibilitam que a mesma
seja feita eficazmente;
• Qualidades intrínsecas da pessoa (físicas, intelectuais,
psicológicas e sociais) são fulcrais para a liderança;
• Líder é criativo, empático, estável, generoso, honesto,
impulsivo, inteligente, resistente ao stress, sensível
e tímido (Graça, 2016).
Estilo de liderança
Liderança autocrática
(Lašáková & Remišová, 2015)
Liderança construtiva
(Burns, 2017)
Liderança ética
(Elçi, Sener, Aksey e Alpkan, 2012)
Liderança liberal
(Lewin, 1985)
Quadro 1: Impacto dos estilos de liderança.
Impacto
Ansiedade
Baixa vitalidade
dos colaboradores
Insatisfação;
Níveis de stress ocupacional
Perda de confiança
nos líderes
Confiança
Esforço
Honestidade
Realização
Respeito
Bem-estar
Comprometimento
no trabalho
Confiança
Disponibilidade
para o trabalho
Eficácia organizacional
Empenho
Lealdade
Reduzidos níveis de stress
e de abandono da empresa
Satisfação
Autonomia
Confiança
Descentralização
das decisões
Falta de controlo
Individualismo
¢ Abordagem Comportamental
¢ Abordagem Contingencial ou Situacional
¢ A partir dos anos 80 - Liderança Transacional e
Transformacional
• Existem trocas entre líder e liderados por meio de
recompensas à obediência dos seus desejos;
• Líderes e liderados apoiam-se mutuamente para
alcançarem mais moral e motivação;
• “Líderes transformacionais motivam os funcionários
a fazer mais do que o que está implícito no contrato
de trabalho” (Rodrigues, 2016, p. 29).
£
Bastante similar ao estilo de liderança democrático.
• “Líderes transacionais têm a função de informar e
esclarecer aos seus funcionários sobre as tarefas que
devem ser realizadas e quais as suas responsabilidades,
recompensando os empregados que atingirem
os níveis de desempenho especificados e tomam
ações corretivas quando as prestações não estão
a alcançar os níveis de sucesso pretendido” (Rodrigues,
2016, p. 31).
£
Proporciona satisfação em situações de stress pois
oferece uma solução imediata;
£
Reduzida eficácia no curto-prazo.
Destacam-se, ainda, outros estilos de liderança como:
Liderança autocrática/ liderança autoritária
• O líder impõe as suas decisões e ideias ao grupo;
• O líder não ouve a opinião do grupo.
Liderança liberal
• As decisões são delegadas;
• O líder tem uma participação limitada.
Liderança democrática/ liderança participativa
• As decisões são tomadas em conjunto e após serem
debatidas;
• O líder promove a participação do grupo, despertando-lhes
a vontade de fazer.
Empenho organizacional dos colaboradores vs. estilos
de liderança
De acordo com o descrito é possível afirmar, tal como
sugerido por Rodrigues (2016), que o comportamento
dos liderados, o desempenho das organizações
e a performance das equipas é influenciado e afetado
pelo estilo de liderança. Apresentamos no quadro-resumo
ao lado alguns dos conceitos/ estilos de liderança
que se consideram mais atuais e as suas vantagens no
sentido de poderem influenciar positivamente o empenho
dos colaboradores.
Face ao apresentado e na senda do avançado anteriormente,
entende-se que o estilo de liderança a adotar
dependerá dos objetivos organizacionais e poderá
ser flexível em função dos mesmos. No âmbito do
empenho dos colaboradores, os efeitos de cada es-
tilo de liderança são também variáveis e, de acordo
com Rocha (2017), o objetivo será “proporcionar
um ambiente de trabalho que vá ao encontro da satisfação
das necessidades pessoais dos colaboradores”,
ajudando os mesmo a satisfazê-las, a maximizarem
as suas melhores habilidades e a serem melhores
cidadãos e pessoas. Ã
Elçi, M., Sener, I., Aksey, S., & Alpkan, L. (2012). The Impact of Ethical Leadership
and Leadership Effectiveness on Employees' Turnover Intention: The Mediating
Role of Work Related Stress. 8th International Strategic Management Conference
(pp. 289-297). Barcelona: Procedia-Social and Behavioral Sciences.
Gil, F., Alcover, C., Rico, R., & Sánchez-Manzanares, M. (2011). Nuevas formas
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Kesting, P., Ulhøi, J., Song, L., & Niu, H. (2015). The impact of leadership styles
on innovation management - a review and a synthesis. Journal of Innovation
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Jorge, C. (2016). A importância da liderança ética nas organizações: um
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Organizações. Lisboa, Portugal: Instituto Universitário de Lisboa.
Kesting, P., Ulhøi, J., Song, L., & Niu, H. (2015). The impact of leadership styles
on innovation management - a review and a synthesis. Journal of Innovation
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Königová, M., Urbancová, H., & Fejfar, J. (10 de março de 2012). Identification
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Competitiveness, pp. 129-142.
Lašáková, A., & Remišová, A. (2015). Unethical Leadership: Current Theoretical
Trends and Conceptualization. Business Economics and Management 2015
Conference, BEM2015 (pp. 319-328). Turkey: Procedia.
Lewin, K. (1951) Field theory in social science; selected theoretical papers. D.
Cartwright (ed.). New York: Harper & Row.
Matela, J. (2016). A influência da ética nas organizações: a mediação do
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Reed, G. (2014). Toxic Leadership, Unit Climate, and Organizational Effectiveness.
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Saremi, H., & nezhad, B. m. (2014). Role of ethics in management of organization.
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36
GH Saúde ocupacional
Medicina do Trabalho
nos estabelecimentos
hospitalares do Serviço
Nacional de Saúde: letra
da Lei ou uma realidade observada?
Paulo Ferreira Gomes
PhD, Inspetor da Inspeção-Geral
das Atividades em Saúde
A
preocupação do legislador em
assegurar a assistência na saúde
e bem-estar dos trabalhadores não
é algo recente. Já nos primórdios da
República, em 1913, se previa a assistência
clínica, medicamentos e indemnizações no
âmbito de acidentes de trabalho, por virtude do serviço
prestado e apenas durante o período em que
o prestavam 1 .
O assinalável crescimento das infraestruturas no país,
da atividade industrial e agrícola, a introdução de nova
maquinaria, por vezes, pesada e mais complexa, associada
a trabalhadores pouco preparados e pouco
experientes, ou pouco conscientes dos perigos decorrentes
do seu manuseamento, e fortemente dependentes
do trabalho, como sustento da família,
bem como de um patronato indiferente a direitos
dos trabalhadores e marcado pelo foco no lucro fácil,
de caráter de exploratório, estiveram certamente na
origem da necessidade do legislador regular a matéria
referente aos acidentes de trabalho crescentes
e de maior gravidade. Na altura, a matéria ainda era
tratada exclusivamente no âmbito da relação privada
de trabalho, não fazendo o legislador a referência ao
Estado como patrão ou empregador.
Tratava-se de uma legislação virada para o resultado
e não para a causa, ou seja, previam-se os direitos
do trabalhador, vítima de acidente de trabalho, e os
correspondentes deveres do patrão ou empregador,
portanto numa perspetiva de reparação de danos.
Nos finais dos anos 30 são criados os Hospitais do
Trabalho com uma finalidade complexa, em que as
necessidades do indivíduo ainda se sobrepunham às
da Nação 2 . Eram como que hospitais de guerra em
que cada vítima de um acidente de trabalho, cada
portador de moléstia profissional era um soldado
que abandonou o seu posto e que tinha que voltar
a ele rapidamente e em ótimas condições. Cada dia
de afastamento do seu lugar tinha um valor objetivo,
imediato e futuro. Não havia espaço para perdas,
desperdício ou desvalorização do trabalhador.
Em 1938, a criação, dentro dum hospital geral, dum
serviço de assistência a sinistrados, não resolveria a
questão da necessidade, conveniência ou indispensabilidade
de criar modalidades hospitalares diferentes
das que já havia por Lei. A capacidade dos hospitais
era inferior às necessidades do meio, e a assistência
ao trabalhador não era compatível com a palavra
“logo” ou “amanhã”. No entanto, protelar os outros
doentes em benefício dos trabalhadores, porque a
sua admissão era monetariamente remunerada, seria
negar os fundamentos do exercício da profissão
médica, para a qual os que sofrem devem ser atendidos,
e a quem compete cuidar do doente. Durante
anos, a existência de hospitais especiais de assistência
aos sinistrados do Trabalho, permitiram o conforto
moral prestado a todos os que a eles recorriam e
constituía um importante fator económico na vida
social do País 2 .
Os primeiros Serviços de Saúde Ocupacional, com
objetivos aproximados aos que conhecemos hoje,
fundamentalmente "serviços de saúde preventiva", em
Portugal, começam a surgir com a criação dos serviços
médicos da empresa para a prevenção da silicose,
em 1962, e dos serviços de medicina do trabalho, em
1967, acompanhados pela instituição do ensino regular
da medicina do trabalho a partir de 1963.
A partir de 1990, as alterações legislativas, e sobretudo
as grandes mudanças que se estão a operar não
só a nível da União Europeia e de cada um dos seus
Estados membros, mas a nível global, obrigam os serviços
de saúde ocupacional a seguir uma orientação
mais compreensiva da saúde dos trabalhadores, centrada
na promoção da saúde e na manutenção da capacidade
de trabalho. Em Portugal, esta fase é, definitivamente,
marcada pelo histórico acordo entre o
Governo e os parceiros sociais no domínio específico
da Saúde Higiene e Segurança no Trabalho, assinado
em 1991. Essa missão inicialmente estava consubstanciada
em dois diplomas fundamentais, um de
1991 e outro de 1994 3,4 , os quais atribuíam aos serviços
de Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho
(SHST) a dupla missão de: (i) prevenção dos riscos
profissionais; e (ii) promoção e vigilância da saúde
dos trabalhadores.
Com a entrada em vigor da Lei n.º 102/2009, de 10 de
setembro, os anteriores diplomas foram revogados
passando esta a regulamentar o regime jurídico da
promoção e prevenção da segurança e da saúde no
trabalho, de acordo com o previsto no artigo 284.º do
Código do Trabalho, no que respeita à prevenção 5 .
A saúde ocupacional é um conceito atual, prioritá- }
38 39
GH Saúde ocupacional
“
O MÉDICO DO TRABALHO
ASSUME UM PAPEL PREPONDERANTE
NA ORGANIZAÇÃO DO SERVIÇO,
NA FIXAÇÃO DE OBJETIVOS
A ATINGIR, SEM DESCURAR
A PRINCIPAL FUNÇÃO
DE PROMOVER E PROTEGER
A SAÚDE DOS TRABALHADORES.
”
rio e transversal que tem por finalidade promover
e proteger a saúde dos trabalhadores nos locais de
trabalho, contribuindo para a qualidade de vida
e bem-estar físico, mental e social dos mesmos, favorecendo
a produtividade e o desenvolvimento económico
sustentado 6.
O Serviço de Saúde Ocupacional (SSO) de cada
empresa deve assim possuir uma equipa de profissionais
que assegure as atividades do Serviço e a sua
gestão, designadamente estar dotado de um médico
do trabalho e de um enfermeiro do trabalho.
O Médico do Trabalho desenvolve as suas atividades
durante o número de horas necessário à realização
dos atos médicos, de rotina ou de emergência
e outros trabalhos que coordene, incluindo os de conhecimento
das componentes materiais do trabalho
para os quais deve reservar pelo menos ¼ do tempo
atribuído. Este profissional não poderá assegurar
a vigilância da saúde dos trabalhadores a que corresponda
mais de 150 horas de atividade por mês 5 .
O número de horas prestado pelo médico do trabalho
na vigilância dos trabalhadores não deve ser
inferior aos valores estabelecidos legalmente.
Por sua vez, o Enfermeiro do Trabalho deverá integrar
a Equipa de profissionais do SSO das empresas
que possuam mais de 250 trabalhadores e, obrigatoriamente,
das empresas prestadoras de Serviços Externos
de Saúde do Trabalho. O Enfermeiro deverá
prestar a atividade profissional durante o número de
horas necessárias ao trabalho de enfermagem de rotina
e de emergência, por um tempo não inferior ao
número de horas de trabalho do médico do trabalho.
O facto de os trabalhadores serem o principal elemento
da estrutura produtiva faz com que a saúde
ocupacional, reconhecida pela generalidade da comunidade
científica e por organismos internacionais
como a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a
Organização Internacional do Trabalho (OIT), represente
um conjunto de ferramentas fundamental
para garantir as adequadas condições de segurança
e saúde nos locais de trabalho. Como consequência,
a legislação de diversos Estados vem afirmando uma
cultura de responsabilização do empregador pela
promoção e manutenção da segurança e da saúde
no local de trabalho através da implementação de
boas práticas laborais, assim como pelo tratamento,
reabilitação e compensação dos trabalhadores vítimas
de acidentes e doenças profissionais. Por outro
lado, cabe também ao trabalhador zelar pela sua segurança
e saúde, cumprindo as prescrições de segurança
e de saúde no trabalho.
Ora, é precisamente nesta matéria que o Médico do
Trabalho assume um papel preponderante na organização
do Serviço, na fixação de objetivos a atingir,
sem descurar a principal função de promover e proteger
a saúde dos trabalhadores. Contudo, se é verdade
que o total empenho do Médico do Trabalho
é essencial para atingir tais metas, não é menos verdade
que a missão que lhe é cometida não poderá
ser levada a cabo, de forma eficaz e eficiente, se não
houver na base uma cultura de corresponsabilização
e de sensibilização.
A existência, por si só, de um serviço de saúde ocupacional
não garante que os fins, a que o Serviço se
propôs, sejam atingidos, pois exige um envolvimento
de toda a cadeia hierárquica e dos seus pares.
Centremo-nos no caso dos estabelecimentos hospitalares.
Não raras vezes, aqueles não atribuem à Saúde
Ocupacional idêntico valor ao dos restantes serviços
clínicos da instituição. As hierarquias, e até mesmo
os próprios pares, de alguma forma, atribuemlhe
menor relevância, porque não o associam à produção
hospitalar contratualizada, chegando a ser, as
mais das vezes, um Serviço desconhecido por alguns
trabalhadores da instituição. É consabido que na grande
maioria dos estabelecimentos hospitalares, os objetivos
fixados e o trabalho desenvolvido pelo Médico
do Trabalho são executados à custa de um grande
empenho para, desde logo, tentar dar a conhecer
a importância que o Serviço tem na missão cometida
ao estabelecimento, visto como um todo.
O sucesso do Serviço de Saúde Ocupacional (SSO)
não se compadece com a falta de comunicação e
articulação com os restantes serviços, que aparentemente
continuam a ver a sua existência apenas como
serviços que têm de prestar e garantir cuidados
de saúde à população.
Na verdade, de nada serve criar um regime jurídico
da promoção e prevenção da segurança e da saúde
no trabalho, se isso não passar de letra morta da Lei.
O Médico do Trabalho, muitas das vezes, enfrenta
um trabalho árduo de ter de chamar a si a colaboração
de todos os que tomam decisões de fundo.
Os dirigentes máximos, os dirigentes intermédios e,
naturalmente, os próprios trabalhadores, precisam
de estar e ser sensibilizados para a importância do
SSO, para o papel e importância que o Médico do
Trabalho assume para a instituição, porque, em última
instância, também eles são seus trabalhadores, e,
nesse aspeto, beneficiários do referido Serviço.
Contudo, o Médico do Trabalho, embora responda
clinicamente perante o Diretor Clínico, está na
dependência direta do Conselho de Administração
(CA), pelo que aquele órgão deve diligenciar no sentido
de assegurar os recursos humanos necessários e
condições físicas (instalações) condignas com a atividade
desenvolvida. Tratando-se de um Serviço que
deve assentar numa estrutura e organização bem
definida, em que cada um conhece o seu papel na
estrutura, exige uma articulação estreita com o vogal
do Conselho de Administração, responsável pelos
recursos humanos, com vista à sensibilização junto
dos mesmos, e, assim, à realização dos fins para que
o Serviço foi criado, ou seja, a prevenção e promoção
do bem-estar dos trabalhadores.
Ao CA, como um bom líder, compete dar o exemplo,
também como trabalhadores da organização,
promover o envolvimento dos restantes serviços
e dos seus Diretores, e, por inerência, de todos os
trabalhadores. Esta promoção poderá passar pela
fomentação da criação de grupos de trabalho, designadamente
com outros serviços clínicos, ou elaboração
de Protocolos com as outras especialidades,
assegurando que, por indicação do Médico do
Trabalho, o trabalhador seja observado num curto
espaço de tempo pela especialidade em causa, através
da criação de códigos de identificação, com vista
à salvaguarda do sigilo profissional. Ora, o sucesso da
atividade do médico do Trabalho implica a adoção
de uma cultura de saúde e de uma política de corresponsabilização
vertical e horizontal.
O envolvimento dos diferentes dirigentes e dos pares,
bem como a existência de uma colaboração estreita
e responsável pode contribuir de forma decisiva
para a promoção da saúde, bem-estar dos trabalhadores
e um ambiente saudável no trabalho. Assim,
a implementação de uma cultura de sensibilização da
importância da atividade desenvolvida pelo SSO poderá
contribuir para a baixar o número de ausências
ao trabalho, podendo mesmo o Médico do Trabalho
chamar a si algumas das competências do Médico
de Família, evitando o recurso imediato aos cuidados
de saúde primários, sem que antes recorram ao
SSO, potenciando uma relação de confiança entre
trabalhadores e Médico do Trabalho. A diminuição
de ausências ao trabalho poderá, assim, ser um fator
decisivo para o aumento da produtividade dos trabalhadores,
para a garantia da sua saúde e do seu valor
como membros ativos da organização.
Em conclusão, sublinha-se que a atividade do Médico
do Trabalho ainda se encontra pouco reconhecida
em algumas instituições do Serviço Nacional de Saúde
(SNS), eventualmente, pela necessidade de maior
envolvimento dos dirigentes máximos e intermédios,
bem como dos restantes médicos, das diversas especialidades,
que terão que encarar a Medicina do Trabalho
como mais uma especialidade, que contribui para a
produção contratualizada pela instituição.
Assim, impõe-se uma maior aposta numa cultura de
sensibilização, articulação e envolvimento de todos
que contribua para a prevenção e promoção da saúde
dos trabalhadores e, consequentemente, para o seu
bem-estar, bem como para a diminuição das ausências
ao trabalho e aumento da produtividade dos efetivos.
Se é certo que existe legislação, não podemos, ainda,
afirmar que o SSO, nos estabelecimentos hospitalares,
desenvolve a sua atividade com a dimensão e abrangência
que uma instituição prestadora de cuidados de saúde
diferenciados assim o exige. O caminho a percorrer
ainda é longo, e os entraves são uma realidade incontornável,
mas, certamente, não inultrapassável. Ã
1. Lei n. o 83. Diário da República, n. o 171, 24 de julho; 1913, p. 2754-5.
2. Primeiro Congresso Médico Nacional dos Desastres do Trabalho. In: Congresso
Médico Nacional dos Desastres do Trabalho. Lisboa: Imprensa Médica; 1938.
3. Decreto-Lei n. o 441/91, de 14 de novembro. Diário da República, I Série-A;
1991, p. 5826-33.
4. Decreto-Lei n. o 26/94, de 1 de fevereiro. Diário da República, I Série-A, n. o
26; 1994, p. 480-6.
5. Lei n. o 102/2009. Diário da República, 1. a Série, n. o 176, de 10 de setembro;
2009, p. 6167-92.
6. Lesage M. Definition of Work-Related Diseases and Occupational Diseases.
In: Encyclopedia of Occupational Health and Safety. 4 th . ILO, Geneva; 1998.
40 41
GH Integração de cuidados
REFORMULAR CUIDADOS
CENTRADOS NA PESSOA
PROMOVENDO PARCERIAS
Carina Dantas
Diretora do Departamento de Inovação
da Cáritas Diocesana de Coimbra
Nos últimos 20 anos, o envelhecimento
da população levou a um aumento de
doenças crónicas, condições de multimorbilidade
e dependência; essa mudança
foi acompanhada pelo contínuo
progresso no campo tecnológico e terapêutico, pelas
mudanças sociais e pela crescente absorção de recursos
no setor da saúde. Todos esses fenómenos, por um
lado, resultaram num crescimento incontrolável dos
gastos em saúde, sem um aumento correspondente no
nível de saúde da população e, por outro, na necessidade
cada vez mais imperativa de garantir a adequação,
os cuidados e os cenários de assistência adequados,
visando a melhoria da qualidade do atendimento.
O envelhecimento exige a mudança do tratamento
agudo para o tratamento de múltiplas doenças crónicas,
muitas vezes coexistentes, orientado para uma abordagem
pró-ativa e multidisciplinar que supera as fronteiras
do sistema de saúde. Essas opções levam tempo e
esforços aos níveis organizacional, funcional, profissional
e de prestação de serviços para alcançar uma transformação
estrutural. Abordagens isoladas comprometem
a evolução em direção a um sistema de saúde
integrado e de alta qualidade, que também seja sustentável,
eficiente e justo.
Essas dificuldades são maiores no apoio à população
idosa, que tem várias necessidades de saúde e acesso
menor a serviços, por razões muitas vezes não relacionadas
com as doenças (por exemplo, iliteracia digi-
tal ou falta de acesso às tecnologias, problemas de mobilidade,
residência em áreas rurais ou com baixa cobertura
de serviços, etc.).
Os sistemas de cuidados integrados têm sido propostos
como o modelo futuro para o sistema de saúde e
apoio social na Europa, representando uma mudança
fundamental e de longo alcance na forma como a Saúde
é abordada enquanto conceito, na sua organização
estrutural, política e de financiamento, e também na sua
relação com os parceiros externos.
No entanto, o percurso tem sido longo e Portugal está
ainda longe deste modelo.
A primeira questão que se coloca - o conceito de Saúde
para as estruturas do SNS - pode ajudar a perceber
os seus problemas na implementação.
Se lhe perguntassem, enquanto dirigente ou profissional
de saúde: “Onde começa o seu trabalho?
• Dentro do hospital;
• À porta do hospital;
• Junto de cada pessoa doente, onde quer que esteja;
• Junto de cada pessoa, como quer que esteja.”
O que responderia?
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS)
“saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental
e social, e não apenas a ausência de doenças.”
Porém, o que constatamos em Portugal é que os curtos
ciclos de decisão, as contenções orçamentais e as alterações
organizacionais têm sido razões (desculpas?)
para uma prestação de cuidados centrada no tratamento
ao invés da prevenção.
Mesmo que considerasse que deveria responder à questão
acima com a última opção, será que na verdade o seu
trabalho no terreno está a ir além da primeira opção?
Como alterar isto?
Em boa verdade, as alterações demográficas e a pressão
financeira sobre o sistema de saúde têm estimulado
as administrações hospitalares a procurar soluções
sistémicas mais sustentáveis, progredindo no desenvolvimento
de métodos de trabalho mais colaborativos
com as redes locais, provocando mudanças nos serviços,
particularmente fortalecendo a articulação com os
cuidados de saúde primários, iniciando equipas de
apoio integrado ou projetos-piloto de raiz comunitária.
Mas este processo tem envolvido os beneficiários
e outros atores de forma global?
A perceção que se pode obter de pacientes, familiares
ou organizações locais deve ser central para a administração
do sistema de saúde, já que pode:
• Apontar as prioridades para melhorar a qualidade
dos serviços, projetando caminhos com base nas experiências
e conhecimentos dos utilizadores.
• Planear serviços em torno da população e das necessidades
de cuidados e saúde de cada comunidade.
• Compreender o mapa de organizações de cada zona
geográfica e o percurso de cuidados, definindo o lugar
que a saúde desempenha no quotidiano de cada pessoa.
A mudança em direção à integração de cuidados leva
as organizações a trabalhar para além das suas fronteiras
internas, entendendo o que acontece aos pacientes
fora das interações individuais com os serviços. Tal
poderá ajudar a entender fatores críticos como altas
taxas de readmissão ou falhas na adesão à terapêutica 1 .
Com níveis crescentes de multimorbilidade, um indivíduo
pode ter mais do que meia dúzia de consultas
ou visitas de diferentes profissionais por semana. Isso
pode afetar a sua capacidade de sair de casa, de ver
amigos e familiares, ou de realizar outras tarefas, com
possível reflexo na sua saúde mental. As experiências
dos pacientes em cada serviço individual podem ser
positivas e medidas como tal pela organização individual.
No entanto, não há oportunidade de medir
como o paciente se sente em relação a seus cuidados
em geral. Somente entendendo toda a história se
podem redesenhar os serviços, para que sejam mais
eficientes e melhorem a vida dos pacientes.
O atendimento integrado é fundamentalmente sobre
o relacionamento que as organizações locais têm com
a sua população. Ter essa conversa em conjunto com
parceiros, pacientes e o público é a única forma de ser
bem-sucedido. Porém, a ambição de prestar mais cuidados
ao domicílio ou em serviços de base comunitária
não tem tido em consideração uma necessidade
fundamental: de diminuir o gap entre os níveis de financiamento
da Saúde e do Social.
Em dois ângulos, particularmente: a) os custos-dia estimados
entre estruturas hospitalares ou outras estruturas
de saúde e aqueles que são calculados quando
estes serviços são subcontratados, p. ex. a IPSSs, são
abruptamente díspares, apesar de ambos terem exigências
idênticas; b) as tabelas remuneratórias dos profissionais
que prestam serviços em organizações da
comunidade são severamente desfasadas das existentes
para a Função Pública, o que pode originar uma
“
HÁ UMA CRESCENTE
DESCONEXÃO ENTRE
A RETÓRICA DOS “CUIDADOS
MAIS PRÓXIMOS DE CASAˮ
E AS PRESSÕES QUE OS SERVIÇOS
DA COMUNIDADE ENFRENTAM,
NOMEADAMENTE AO NÍVEL
DO FINANCIAMENTO.
”
grave escassez de mão-de-obra. Apesar do papel vital
que estas organizações desempenham para ajudar as
pessoas a manter a sua independência, gerindo condições
de longo prazo, a ambição de fortalecer os serviços
comunitários e transferir os cuidados dos hospitais
para esses ambientes comunitários não se irá concretizar
se elas não receberam a prioridade, o financiamento
ou o apoio de que precisam e permanecerem
clivadas das restantes estruturas de saúde.
Há uma crescente desconexão entre a retórica dos
“cuidados mais próximos de casaˮ e as pressões que
os serviços da comunidade enfrentam, nomeadamente
ao nível do financiamento.
Embora seja difícil quantificar com precisão os gastos
com serviços de saúde da comunidade devido a lacunas
e inconsistências nos dados, os sinais apontam
para orçamentos em redução nos últimos anos. Em
simultâneo, todos sabemos que os pedidos têm aumentado
como consequência do crescimento e do
envelhecimento da população, dos níveis crescentes
de multimorbilidades e dos esforços para oferecer
mais cuidados perto de casa.
Num país com a tipologia de governança e organização
estrutural de Portugal, só um novo programa nacional
de serviços comunitários de saúde, numa reformulação
ambiciosa das tipologias atuais e do trabalho
em silos, poderá implementar as soluções necessárias.
No entanto, até lá, são as próprias estruturas e profissionais
que pressionam a mudança e forçam a altera- }
42 43
GH Integração de cuidados
ção de paradigmas. Com a convicção de que a execução
de projetos piloto bem-sucedidos poderá trazer
argumentos para a alteração de estruturas, assim os
profissionais e as administrações locais se substituem
ao papel do Estado na reescrita de políticas, por via
empírica e pontual.
Felizmente, cada vez mais cidades e regiões trabalham
em articulação num regime de hélice quádrupla, juntando
academia, indústria, instituições públicas e sociedade
civil na prossecução de objetivos comuns 2
- veja-se o caso do Ageing@Coimbra 3 , um sítio de
referência para o envelhecimento ativo e saudável reconhecido
com 4 estrelas pelo EIP-AHA.
Neste contexto, faz sentido apresentar o exemplo da
Unidade Integrada para o Envelhecimento Saudável e Ativo
(UnIESA), promovida pelo Centro Hospitalar e Universitário
de Coimbra, E.P.E., em parceria com o ACES
Baixo Mondego, ACES Pinhal Interior Norte e no qual
a Cáritas Diocesana de Coimbra também irá colaborar.
Percebendo que o modelo atual de atendimento não
era adequado ao envelhecimento populacional e partindo
das sinergias do consórcio Ageing@Coimbra, os
parceiros desta região tem-se dedicado a estudar formas
de melhorar a qualidade do atendimento à cres-
cente população idosa. Nesse sentido, foi desenvolvido
um caminho integrado para o paciente, projetado
explicitamente para pacientes acima de 65 anos
com multimorbilidade, identificada por qualquer profissional.
Este caminho integra grupos de centros de
saúde, uma unidade especializada para envelhecimento
ativo no Centro Hospitalar Universitário de Coimbra
(que inclui uma consulta de avaliação geriátrica,
uma unidade de tratamento agudo, um hospital-dia e
consultas ou unidades de internamento em subespecialidades
específicas), a rede de longo prazo e as instituições
de apoio social.
Tem como objetivo reduzir a carga de atendimento
(polimedicação e múltiplos contactos com o sistema
de saúde) e atendimento de emergência/agudo, através
da melhoria da qualidade de vida do paciente,
partilhando decisões em termos de tratamentos, prioridades
de saúde, estilo de vida e objetivos. Embora
o percurso clínico se inicie numa situação de deterioração
orgânica, as sinergias e os recursos criados
pelo caminho permitem o desenvolvimento de uma
resposta a montante, através da integração do atendimento
entre os prestadores.
Quando as necessidades do paciente levam à hospitalização,
um plano de assistência previamente projetado
é implementado por uma equipa especializada,
com um tempo médio de permanência de menos de
seis dias, evitando a perda de autonomia e reduzindo
as estadias prolongadas e as readmissões não planeadas.
Desde o primeiro dia, a alta é planeada em coordenação
com a família e os cuidadores informais, cuidados
de saúde primários e organizações de apoio social,
incluindo visitas domiciliárias anteriores para avaliar
as condições domésticas. É possível usar ferramentas
de monitorização remota, serviços de fisioterapia à
distância, serviços de saúde e apoio social em casa, ou
acompanhar o paciente no hospital e em ambulatório.
Além disso, a unidade especializada em envelhecimento
hospitalar é usada como referência para a formação
pré e pós-graduada em envelhecimento e estas
abordagens inovadoras criam um verdadeiro laboratório
vivo com os parceiros do Ageing@Coimbra.
Em 2020, a Cáritas Coimbra vai iniciar a sua colaboração
na implementação do percurso da UnIESA, colaborando
com:
• Diagnóstico social e encaminhamento: visita inicial
por Técnico de Serviço Social para avaliar necessidades
específicas decorrentes do internamento hospitalar.
• Linha de apoio por videochamada em caso de necessidade,
com contacto direto a um cuidador que articula
depois com os serviços de saúde se necessário.
• Estimulação cognitiva: treino inicial, adaptação e
possibilidade de videochamada com o cuidador para
apoio sempre que necessário.
• Reabilitação funcional: programa de treino funcional/
reabilitação básico através da criação de um pacote de
vídeos de treino funcional, adaptados a diferentes perfis
de idoso, que possam depois ser trabalhados remotamente
com o paciente para estimular a sua recuperação.
Para este efeito, a Cáritas Diocesana de Coimbra vai
partir dos resultados e experiência adquirida no âmbito
do seu projeto ReHab, cofinanciado no âmbito do
Programa BPI Seniores 2018.
Durante 2019, a Cáritas Coimbra promoveu a estimulação
cognitiva e a reabilitação funcional de pessoas
mais velhas, de forma individual e em grupo, em ambiente
assistido e ao domicílio, através de uma mala
com um kit multidimensional de tecnologias inovadoras
e materiais tradicionais.
Esta mala pode circular através das equipas de Serviço
de Apoio Domiciliário (SAD) com instrumentos que
vão desde jogos geriátricos a jogos de treino cognitivos
disponíveis num tablet, passando pela interação
com um avatar.
Os cuidadores da Cáritas prestam apoio remoto no
início de cada sessão através de ligação Skype e desenvolvem
também sessões de literacia digital para os
beneficiários do projeto.
Estes são exemplos de iniciativas para pessoas com
necessidades complexas, onde se estabeleceu um plano
de apoio acordado, um responsável pela coordenação
de cuidados e acesso a serviços de apoio remoto,
numa mudança implementada de forma progressiva
e com interações significativas e flexibilidade entre
todos os parceiros.
Porque não trabalhamos assim sempre?
Dá muito mais trabalho!
• Só traz ganhos a médio/longo prazo (ciclos políticos
curtos/nomeações);
• Não pode ser feito à secretária;
• Implica redes, parcerias, múltiplos atores, sair da zona
de conforto;
• Implica falar com as pessoas, recolher opiniões, fazer
estudos, articular;
• Por vezes destrói o ego do profissional;
• Implica conhecer políticas diversas, serviços, metodologias
e financiamento;
• Necessita de conhecimento multidisciplinar.
Mas os resultados valem a pena!
Em suma, é essencial:
• Rentabilizar recursos, ligando cuidados primários,
serviços de apoio social e centros hospitalares;
• Criar serviços integrados de partilha de informação
(EHR) atualizados em tempo real;
• Cruzar informação de vários cuidadores, profissionais
e ter o quadro clínico e social acessível para apoio
à tomada de decisão;
• Utilizar serviços de proximidade já existentes para
vigilância;
• Investir mais na prevenção, na literacia de saúde e literacia
digital;
• Criar modelos de governança baseados no cidadão
e nas suas necessidades;
• Investir seriamente e com equidade em modelos sustentáveis,
justos e de qualidade para todos os envolvidos.
É suficiente sermos Cidadãos para percebermos o
que as pessoas precisam. Ã
1. https://www.kingsfund.org.uk/
2. http://periodicos.pucminas.br/index.php/economiaegestao/article/view/
17645
3. https://ageingcoimbra.pt/
44 45
GH Responsabilidade civil
PROTEÇÃO PARA O RISCO
DE GESTÃO
Luís Teixeira
Aon Deputy Corporate Director
Em Portugal, e em todo o mundo, há
cada vez mais consciência por parte
dos gestores relativamente à complexidade
dos riscos que enfrentam no
desempenho das suas funções. Nas
empresas, o elevado escrutínio a que as equipas de
gestão se encontram sujeitas e a cultura de litigância
cada vez mais apurada reflete-se diretamente através
do aumento do número de reclamações de terceiros
lesados. Os administradores e gestores hospitalares não
são exceção e estão, mais do que nunca, sensibilizados
para as responsabilidades que enfrentam no decurso
do exercício das suas funções, muito por via da complexidade
e possíveis impactos das suas decisões, principalmente
à luz das exigentes pressões e constrangimentos
orçamentais que têm vindo a nortear a gestão das unidades
de prestação de cuidados de saúde e ao elevado
grau de escrutínio que terceiros - principalmente entidades
reguladoras - promovem junto do setor.
São vários os riscos a que estão expostas as organizações
na área da saúde. Em 2019, a Aon lançou a sétima
edição do seu Global Risk Management Survey -
estudo que foi projetado para fornecer às empresas
e organizações informações relevantes que possibilitem
a melhor gestão da volatilidade associada ao risco - que
identifica os seguintes fatores como os mais relevantes
na indústria da saúde em todo o mundo.
Os riscos mais relevantes na indústria da saúde certamente
que variam nas várias zonas geográficas do
mundo e serão, certamente, diferentes para os gestores
hospitalares em Portugal, no entanto torna bastante
clara a complexidade e diversidade de temas que um
gestor hospitalar tem de levar em consideração no seu
dia-a-dia. Neste contexto, em que os riscos são cada
vez mais e mais complexos, a escassez de recursos
que tem sido publicamente noticiada em Portugal para
a gestão hospitalar pública, evidenciará certamente a necessidade
de tranquilizar os gestores e administradores
hospitalares no processo de tomada de decisão em
atos de gestão.
No mundo empresarial, as reclamações ao abrigo de seguros
Directors & Officers são cada vez mais frequentes,
mais caras e mais complexas. Neste contexto, o seguro
de Directors & Officers é considerado como uma boa
prática de governance das empresas portuguesas, uma
vez que permite proteger o património pessoal dos
Administradores e Diretores, sendo uma ferramenta
imprescindível para estes exercerem funções com este
nível de responsabilidade e exposição a este risco.
Na gestão hospitalar, um dos maiores riscos a que as e-
quipas de gestão estão sujeitas incide na possibilidade do
seu património pessoal ser afetado por via dos pagamentos
de indemnizações a terceiros e do pagamento
de honorários a advogados que possam promover
uma defesa sólida no âmbito dos processos judiciais ou
administrativos em que se vejam envolvidos.
São vários os exemplos em que um apoio jurídico sólido
na contestação de multas, por exemplo, possibilitam
a reversão das mesmas em tribunal. O apoio de uma
equipa de advogados que dedique o seu tempo e conhecimento
na defesa de um processo de reclamação
de terceiros contra um administrador ou gestor pode
fazer a diferença entre a sua ilibação ou a necessidade
de indemnizar os reclamantes.
Nos casos em que os administradores ou gestores
hospitalares enfrentem uma ação cível é o seu património
pessoal que está em risco para suportar os
custos de defesa e eventuais indemnizações em caso
de condenação.
Noutra realidade, nas sociedades comerciais, os membros
dos órgãos sociais de todas as sociedades emitentes
de valores mobiliários já são obrigados por lei
a transferirem este risco para um contrato de seguro.
Nas restantes empresas, nas de maior dimensão, também
existe esta obrigatoriedade e nas restantes só pode
ser dispensada mediante decisão dos acionistas em
assembleia geral ou pelo conselho geral de supervisão.
Na gestão hospitalar pública, não estando definida por
lei esta obrigatoriedade, e face aos riscos cada vez mais
relevantes dos gestores e administradores hospitalares,
esta é cada vez mais uma boa prática de gestão de risco
e de salvaguarda do seu património pessoal.
Foi neste contexto que a Aon estabeleceu uma parceria
com a APAH para desenvolver uma solução especificamente
dedicada à proteção do património pessoal
dos membros das equipas de gestão das unidades de
prestação de cuidados de saúde, possibilitando o acesso
a seguros desenhados para esta realidade específica.
Conhecendo as limitações do mercado segurador em
aportar soluções de transferência de risco ajustadas à realidade
da indústria hospitalar em Portugal e o interesse
da APAH em encontrar uma solução para os gestores
hospitalares, a Aon desenhou uma solução de seguro
que dá resposta a esta crescente procura de uma proteção
para o risco de gestão.
A Aon é uma das maiores corretoras do mundo, apresentando
soluções para risco, reforma e saúde em 120
países através de 50 mil colaboradores. A AIG, seguradora
selecionada pela Aon, é uma organização mundial
líder em seguros e, principalmente, líder no segmento
da responsabilidade de administradores e diretores.
A APAH, a Aon e a AIG formaram assim uma parceria
que junta empresas líderes nas suas respetivas áreas trazendo
toda a sua capacidade e conhecimento para este
risco emergente. A solução de seguro que resulta desta
parceira visa garantir cobertura para a responsabilidade
civil decorrente de atos de gestão. É, assim, diferente
e complementar à responsabilidade civil profissional
inerente à prática de atos médicos, pelo que não se
trata de uma duplicação de cobertura para o seguro de
responsabilidade civil profissional.
Ao abrigo deste protocolo, existem vários níveis de
proteção que vão dos 50.000€ aos 250.000€ em caso
de indemnizações a terceiros e os 25.000€ e 75.000€
para os custos com honorários de advogados para
apoio jurídico. Mesmo considerando que, por imperativo
associado à Lei portuguesa, nenhum contrato de
seguro poderá ser utilizado para suportar os montantes
associados com coimas ou multas, os gastos de defesa
incorridos no decurso de um processo administrativo
poderão ser transferidos para a apólice, podendo ser
decisivos na qualidade da defesa e, consequentemente,
no desfecho do processo. Este seguro de responsabilidade
civil não evitará que os gestores e administradores
hospitalares sejam processados ou multados no entanto,
caso suceda, será uma ajuda imprescindível na gestão
dos mesmos, aproximando a gestão do risco por atos
de gestão, à realidade dos gestores de empresas comerciais.
Ações como as que temos assistido, continuarão a existir
e cada vez com mais frequência dado o aumento da
litigância por parte dos utentes, e monitorização dos reguladores
e tribunais. Os exemplos são bastante dispares,
desde os casos em que gestores enfrentam processos
administrativos por alegado uso indevido ou incorreto
de ativos, às reclamações laborais que resultam do
uso criativo dos escassos recursos disponíveis ou mesmo
multas impostas pelo tribunal de contas. A existência de
um seguro que permita utilizar recursos financeiros das
seguradoras para financiar honorários de advogados
dará aos gestores hospitalares a possibilidade de não
aceitarem ser responsabilizados por recearem os custos
e complexidade de iniciar uma defesa em que acreditam
e, sobretudo, terem a possibilidade de defender
a sua reputação. Também, ter uma garantia de indemnização
a terceiros por atos de gestão assegurará uma
maior tranquilidade na tomada de decisões, muitas vezes
em contexto complexo.
Estando estruturada a solução desenhada pela Aon e a
APAH, e atentando aos valores competitivos praticados,
certamente o investimento financeiro na contratação
destes seguros não será entrave para garantir uma proteção
jurídica mais robusta e tranquilizar os gestores hospitalares
no decorrer do exercício das suas funções. Ã
46 47
GH opinião
a tecnologia médica
nos hospitais públicos
Luís Lopes Pereira
Diretor Geral da Medtronic
Depois da profunda crise financeira
que avassalou o nosso País, parece
ser consensual que o setor mais
afetado terá sido o setor da saúde.
As análises políticas, técnicas e emocionais
levaram a considerar os Recursos Humanos
como a dimensão que mais requeria o esforço da afetação
de recursos. Mas se juntarmos os meios para que
esses Recursos Humanos possam trabalhar e continuar
a prestar os cuidados de saúde que os Portugueses
precisam, falamos em dimensões estratosféricas para
recuperar tudo o que se perdeu.
O facto é que se torna hercúleo recuperar dez anos
sem investimento num setor público que, entretanto,
abriu o flanco para o setor privado investir exatamente
onde ele não investiu durante esse tempo: edificações,
tecnologia e Recursos Humanos. Mas um setor
não substituiu o outro. Ou seja, o investimento privado
pretendeu aproveitar o que o investimento público
não cobriu em áreas terapêuticas que têm retorno
económico, como é natural na perspetiva do mercado
privado onde os pagadores são companhias de seguro
e subsistemas de saúde como a ADSE. Condições de
saúde crónicas cujo o investimento não é possível de
um ponto de vista privado só o Estado poderá cobrir
através da cobertura do SNS com receitas fiscais. E porque
a escala é necessária para manter hospitais abertos,
alguns acordos como o SIGIC, acordos de elaboração
de diagnósticos e outros vão sendo feitos e dando alguma
força ao Sistema de Saúde Português.
Sobrevoando a prestação de saúde em Portugal, poder-se-ia
dizer que entre privados e públicos poderíamos
ter meios para fazer face às necessidades de saúde
geral, bastando uma política integracionista de preços
que compensasse ambos os setores de uma forma
justa que visasse o equilíbrio de mercado. Mas creio
que este terreno ainda tem fronteiras ideológicas, embora,
na minha singela opinião, só consigamos financiar
a saúde em Portugal com um sistema misto em que as
empresas seriam chamadas a intervir, como muitas já
fazem, oferecendo a hipótese dos seus trabalhadores
terem seguros de saúde privados. Para que tal fosse
crescente e mais adotado o Estado deveria introduzir as
devidas compensações fiscais. Toda a prestação pública
poderia assim focar-se na excelência da ciência médica,
dedicando-se, numa perspetiva de salvamento, ao que
o setor privado não consegue dar resposta ou, numa
estratégia geográfica, competindo com o mesmo ou
ainda oferecendo serviços onde a escala não justifica
o investimento. O que acontece neste momento é que
a gestão hospitalar pública se vê obrigada a fazer omeletes
sem ovos e a sua qualidade não se pode analisar
apenas pelos resultados, nem é comparável a outros
setores, mesmo com os que também estão dedicados
à área da saúde. São realidades distintas que deveriam
ser mais próximas e comparáveis.
Falando em números possíveis, o Governo adianta que
já repôs mil e quatrocentos milhões do que foi retirado
ao SNS durante o período de intervenção do FMI. Naturalmente
neste campo apenas se pode operar ainda
como tapa buracos, correndo o risco de operar pouco
estrategicamente no que respeita a investimento, mesmo
que se tenha sentido estratégico na afetação de
recursos que são parcos, ou não fosse a economia chamada
à saúde. Estando ainda muita poeira a pousar, vão
sendo lançados alguns números que os cidadãos vão
tendo conhecimento e, com boa fé, vão acreditando
que são números fiáveis e calculados por quem sabe
da matéria. Há cerca de um ano, o Ministério da Saúde
anunciava que seriam necessários cerca de mil milhões
de investimento em equipamentos hospitalares dos
quais, resultante de uma análise profunda desse levantamento,
as prioridades cifravam-se nos quinhentos milhões
de euros a serem investidos em três anos, ou seja
2019, 2020 e 2021. Não encontrei a distribuição dessa
verba por cada área, mas creio que o valor incluía
equipamentos tecnológicos e também a parte da construção.
A lista de investimentos em equipamento hospitalar
que incluía alguma construção durante 2019, publicada
pelo gabinete do Ministério da Saúde, perfazia
cerca de noventa e um milhões de euros dos quais quase
um quarto eram financiados por fundos europeus e
só o restante estava incluído no Orçamento de Estado.
Mesmo considerando que os prioritários quinhentos milhões
não seriam completamente financiados pelo Estado,
teremos que encontrar em 2020 e em 2021 cerca de
duzentos milhões de euros anuais para cobrir as prioridades,
que são metade das necessidades anunciadas.
Entretanto, os fornecedores de tecnologia médica, de
todo o material clínico, têm inerente aos seus dispositivos
a necessidade de colocar equipamento de forma
a manter a atividade comercial que têm com os hospitais
públicos, além do apoio técnico sem o qual os
dispositivos não são utilizados nos diversos tratamentos
e procedimentos feitos diariamente nos nossos hospitais.
Não por culpa das administrações públicas, mas
porque a necessidade assim o determinou no tempo,
muitas empresas disponibilizam produtos em consignação
que só muito tempo depois de utilizados são encomendados
aos próprios, em procedimentos longos e
penosos para todos, agravados ainda mais pela incapacidade
financeira de pagar em tempo devido por parte
do Estado. Nos últimos anos, estas empresas têm feito
um serviço público fundamental de sustentabilidade do
SNS. Sem o reconhecer, cego na procura de financiamento,
o Estado pretende agora que elas contribuam
extraordinariamente para a sustentabilidade do SNS
para o qual as empresas já tanto contribuem. A taxa
incluída no orçamento de Estado sobre a faturação dessas
empresas vai ser insustentável para todos: as empresas
despedirão parte de quem dá suporte técnico,
baixando a qualidade do serviço prestado pelos hospitais
e tenderão em favorecer os privados na introdução
da inovação, ficando os cidadãos em geral privados no
seu acesso à melhor tecnologia no SNS. Esta medida vai
desequilibrar ainda mais a oferta dos hospitais públicos
e dos hospitais privados, o que é manifestamente contrário
à estratégia deste e de qualquer Governo.
Num momento em que se fala de investimento público
nos hospitais, falta saber que necessidades especificas
“
NO QUE TOCA AO INVESTIMENTO
NECESSÁRIO PARA REEQUIPAR
OS HOSPITAIS PÚBLICOS, ENTRE
O DEVE E O HAVER, ENQUANTO
A ÁGUA VAI E VEM, AS ADMINISTRAÇÕES
DOS HOSPITAIS PÚBLICOS
MERECEM UM GRANDE ELOGIO.
”
temos em termos de equipamento propriamente dito,
ou seja, ventiladores, aparelhos de imagiologia, monitores,
equipamento especifico de bloco operatório, de
Unidades de Cuidados Intensivos, equipamento de intensificação
de imagem, bombas infusoras, camas, navegadores
e muitos outros que, todos sabemos, ou pelo
menos desconfiamos, uma percentagem importante se
encontra em situação de falência técnica. As melhorias
deveriam trazer ganhos em qualidade e em custos para
o hospital. Por outro lado, seria importante saber que
tecnologias já não entram em Portugal por causa das
condições de mercado, da escolha demasiado baseada
no preço e das limitações orçamentais do país. Neste
capítulo ainda temos um longo período a percorrer.
No que toca ao investimento necessário para reequipar
os hospitais públicos, entre o deve e o haver, enquanto
a água vai e vem, as administrações dos hospitais públicos
merecem um grande elogio. Com as mãos atadas
com várias cordas, desde o centralismo da decisão à elevada
dependência que a saúde sofre do Ministério das Finanças,
os administradores hospitalares conseguem contorcer-se
em criatividade e levar alguma água ao seu moinho,
mantendo os hospitais a funcionar, com a parceria
dos fornecedores e com pessoal descontente que, mesmo
assim, vai dando o melhor que tem. No fundo, o mérito
chama-se boa vontade. A boa vontade dos administradores
e dos profissionais de saúde, a boa vontade
dos mecenas, a boa vontade dos parceiros fornecedores
que ajudam a manter os hospitais abertos e a boa
vontade dos doentes que se vão ajustando às listas de
espera, às falhas do equipamento e à falta de acesso.
No que toca à tecnologia médica, o reequipamento }
48 49
GH opinião
hospitalar e a atualização da inovação tecnológica poderá
ser mais prioritário do que podemos ser levados
a pensar. Atualmente a atividade médica depende em
muito desse equipamento, especialmente no meio hospitalar.
A existência de equipamento tecnológico atualizado
é fulcral para que os resultados da atividade hospitalar
ganhem eficácia e eficiência. Tratar um doente
com uma nova tecnologia ou através de um procedimento
novo que não sejam acompanhados e suportados
por um equipamento condizente pode pôr em
risco o investimento nessa tecnologia e o resultado clínico
do doente.
É muito importante que se criem condições para a introdução
de novos modelos de negócio que permitam
aos hospitais optar por modelos de negócio inovadores
em que a partilha de risco com fornecedores e a
transparência sejam denominadores comuns. Também
será necessário aumentar, conforme já foi prometido
em parte pelo Governo, a autonomia da administração
dos hospitais públicos para tornar a gestão mais célere
e executada em tempo devido, correspondendo às
necessidades dos hospitais com sentido mais estratégico
e tático.
Termino voltando ao tema da boa vontade. Todos nós,
enquanto cidadãos, queremos um SNS forte, o que
obriga a mantermos a sustentabilidade dos hospitais
públicos. Mas é muito importante acabarmos com o
mal crónico do desenrascanço que tem muito de boa
vontade. A autonomia financeira dos hospitais deve ser
reposta até porque são eles que têm perante a lei os
prazos dilatados de pagamento que são empurrados
por prazos de recebimento que muitas vezes têm origem
em orçamentos suplementares feitos pelo seu financiador,
o Estado, nós todos. Essa situação condena
em boa parte a capacidade de investimento dos hospitais
e a carência dos equipamentos médicos, vitais para
a sua atividade diária. Para melhorar essa situação, um
setor como os fornecedores de tecnologia médica que
é tão importante para a sustentabilidade do SNS, não
pode ser alvo de taxas que põem em causa a credibilidade
de Portugal perante os fornecedores internacionais
que deixarão de se esforçar tanto por incluir este
país no mapa do mundo desenvolvido relativamente à
inovação tecnológica na saúde. E que em vez de sustentar
o SNS, esses fornecedores serão empurrados para
se afastar do País, iberizando ainda mais as empresas e
afastando profissionais e parcerias tão essenciais à qualidade
da saúde dos Portugueses. Ã
50
GH Telesaúde
Estratégia Nacional
para a Tele Saúde
apresentação do PENTS:
uma festa
Fernando Mota
Vice-Presidente da Associação
Portuguesa de Telemedicina
No final do último ano, mais precisamente
no passado dia 12 de Novem- Potenciar ganhos em saúde e em eficiência, e incre-
-se a estrutura do documento, por onde o PENTS
rar a interoperabilidade e a segurança da informação.
inglês, para merchandising internacional.... Percebeu-
“
bro, a Empresa Pública do Estado - mentar a acessibilidade (e equidade) são temas recorrentes
da intervenção política na gestão da saúde.
a metodologia, a contextualização. Identifica ainda
pretende nortear-se: o alinhamento com o ENESIS 1 ,
vulgo, EPE, dos Serviços Partilhados
PERCEBEU-SE A ESTRUTURA
do Ministério da Saúde, ou mais comumente
dita, a SPMS, efectuou a apresentação do da informação são temas que correspondem a an-
internacionais e a inovação e define linhas estraté-
DO DOCUMENTO, POR ONDE
Já as questões da interoperabilidade e da segurança
os principais desafios e oportunidades, as tendências
PENTS - Plano Estratégico Nacional para a Telessaúde
para o período de 2019-2022.
damente na persistente insistência em garantir a de-
reflexão e análise mais prolongada e aprofundada, a seios expressos por profissionais e cidadãos, nomeagicas
e medidas. Matéria extensa que merece uma
O PENTS PRETENDE NORTEAR-SE:
A sala - um auditório da SPMS, com capacidade para
cerca de cinco dezenas de pessoas, estava cheia. os actos da prestação de cuidados de saúde - sobre-
Mas o anúncio maior foi, sem dúvida, a apresentação
vida atenção a - e interacção com, o utente durante
expor em próximo artigo.
O ALINHAMENTO COM O ENESIS,
Justificava-se: era grande a expectativa criada desde tudo nos cuidados primários, um dos indicadores de
da nova ferramenta de suporte e apoio à prática da
o anúncio da sua elaboração em meados do ano qualidade do SNS! Os segundos, na expectativa da
Telemedicina. Com efeito, o RSE live (continua o mer-
A METODOLOGIA,
transacto, expectativa essa também interna à instituição,
conservação e aprofundamento da relação de proxi-
chandising para inglês ler) foi apresentado como a A CONTEXTUALIZAÇÃO.
patente nas inúmeras presenças da casa!
midade com a saúde, por intermédio do profissional
solução tecnológica inovadora que, segundo a SPMS,
A sessão teve como protagonistas principais o Presidente
que lhe presta os cuidados, e da preservação da con-
ultrapassa (e substitui?) a PDS live! Apesar da escassez IDENTIFICA AINDA OS PRINCIPAIS
da SPMS, Henrique Martins e a Directora do fidencialidade que garanta o sigilo da informação de
(ausência) dos detalhes técnicos fornecidos, imagina-
Centro Nacional de Telessaúde (CNTS), Micaela saúde do cidadão - para além de tudo, uma prática
mos a alegria que vai por esse País fora, dos PIT’s e DESAFIOS E OPORTUNIDADES,
Monteiro. Também a Secretária de Estado da Saúde, saudável do exercício da cidadania! Afinal, assegurar
dos CRT’s - dos Promotores Internos e dos Coordenadores
Regionais de Telesaúde! Ao fim de dez anos
Jamila Madeira, quis marcar presença, assinalando na duas aspirações da vocação da prestação de cuidados
AS TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
de saúde: garantir o sigilo dos dados e cuidar da
de PDS Live chega agora a chave de todas as maleitas
sua intervenção, que “a telessaúde e a telemedicina
são peças estruturantes daquilo que acreditamos ser dimensão humana na prestação desses cuidados.
(a telesaúde é assim: um autêntico meio de diagnóstico!).
E A INOVAÇÃO E DEFINE
uma visão para a saúde do futuroˮ, salientando a sua Foi então o momento da Directora do CNTS, Micaela
Vamos lá ó PIT’s e CRT’s, arregaçar as mangas LINHAS ESTRATÉGICAS.
Monteiro, fazer a apresentação do tão espera-
e toca a voltar a convencer os incrédulos das ARS, das
“importância nas dinâmicas de construir soluções,
”
potenciar ganhos, proporcionar acessibilidade e proximidadeˮ.
Destacou ainda a necessidade de asseguzação
do documento no sítio da SPMS, também em
res, das ULS’s 3 , das virtualidades dos novos recursos: }
do PENTS 2019-2022. Foi (boa) notícia a disponibili-
USF, dos ACeS 2 , dos Hospitais e Centros Hospitala-
52 53
GH Telesaúde
“
FALTA AGORA O TRABALHO
PRINCIPAL: ANALISAR O PENTS
E AVALIAR OS RESULTADOS
CONSEGUIDOS! QUE SÃO
AS TAREFAS QUE SE AVIZINHAM
ÀS QUAIS A ASSOCIAÇÃO
PORTUGUESA DE TELEMEDICINA
(APT) IRÁ DAR A MAIS
CUIDADA ATENÇÃO.
”
é que é desta! É agora! Há dez anos atrás andávamos
todos às apalpadelas. Agora não: agora é que é!
Isto mesmo expressou o PIT que interveio logo a seguir
(Carlos Ribeiro, da ARS do Norte). E da sua intervenção
reteve-se: “Estou com muita esperança que
a nova ferramenta tecnológica ultrapasse as deficiências
da PDS live, (...) que os dados sejam integrados
nos PCE 4 dos doentes (...) que o trabalho seja
em rede e não isolado (...)” 5 . Surpresa! Parece, afinal,
que a APT não anda a pregar no deserto, desde há
13 anos a esta parte!
Foi, contudo - e muito bem, destacada a importância
dos promotores e dos planos locais de implementação:
são pontas de lança imprescindíveis à adopção das
técnicas e práticas da telemedicina. Mas, repetindo o
que o PIT do Norte afirmou, trata-se de um processo
em rede; agir isoladamente é sinónimo de insucesso!
A sessão estava a chegar ao fim, contudo fomos
ainda contemplados com uma teleconsulta ao vivo:
a demonstração que a nova plataforma estava operacional.
A consulta foi sui generis! Se não vejamos:
Patrícia Rodrigues foi a paciente que apareceu no
écran e que a Dr.ª Micaela Monteiro consultou.
Queixou-se que urinava muitas vezes, em pequenas
quantidades, e com sensação de ardência. Logo a
médica consultou o relatório analítico laboratorial e
diagnosticou uma infecção urinária pelo que logo lhe
receitou um antibiótico cuja receita imediatamente
integrou o PCE da Patrícia, bem como o respectivo
resumo clínico que a profissional de saúde imediatamente
inscreveu! 6
O RSE live, portou-se bem: comunicação sem interrupções,
dados de prescrição e de resumo clínico da
consulta a circular e a integrar o PCE do paciente.
Teria sido interessante ver outras tele-funções: tele-
-ecografia, -auscultação, -TA, por exemplo.... Ficamos
sem saber se já estão disponíveis e se se podem usar.
O novo RSE live apresentado foi, pois, uma elementar
teleconferência com interacção com a prescrição
electrónica... soube a pouco, a bastante pouco - uma
simples chamada telefónica teria produzido o mesmo
resultado!
Trata-se de programas informáticos elaborados pela
SPMS na continuidade da linha de actuação que tem
vindo a ser seguida, desde há quase dez anos a esta
parte: não importa o tempo de preparação e elaboração
dos programas, importa sim que não se vá ao
mercado “gastar” dinheiro! Aparentemente a SPMS
está a poupar muito dinheiro!
Porém, a necessária contabilização do tempo despendido
pelos diversos actores envolvidos - profissionais
de saúde (médicos, enfermeiros, assistentes...),
gestores e técnicos de informática, pacientes e utentes,
bem como a avaliação das frustrações devidas à
deficiente qualidade dos programas informáticos ou
dificuldades da rede ou dos computadores locais,
porventura evidenciará uma realidade bem diferente.
Importante seria prover acesso público a esta contabilização
de fonte segura e independente! Seria também
o momento de avaliar a promoção da inovação
(e concorrência?) nos sistemas de informação da saúde,
designadamente, no presente contexto, nos que
viabilizam a prática da telemedicina.
E a agravar esta realidade, importará ainda, avaliar o
impacto do fracasso funcional da PDS Live enquanto
inibidor da adopção das soluções de telemedicina.
No limite, em que situações o acesso a cuidados de
saúde, através da telemedicina, não foi sequer equacionado
por força das disfuncionalidades das plataformas
tecnológicas da SPMS?
Finalmente, encerrou-se a sessão com duas intervenções:
a do convidado, especialista em telemedicina,
oriundo da República Federativa do Brasil, que muito
apreciou o esforço português no desenvolvimento
da telesaúde e a elaboração do Plano Estratégico ora
apresentado, e a do Presidente da SPMS que destacou
as dificuldades de integração perante os legacy
systems 7 , a questão da cibersegurança, o problema
dos computadores nos locais de trabalho, a necessidade
de insistir na abertura de tickets 8 sem desistências
(e os tempos de resposta?), o workpackage
9 que Portugal vai liderar, através da SPMS, em novo
consórcio europeu da UE, na área de patient empowerment
10 , o empenho na transformação digital na
saúde, e finalmente o anúncio que o concurso para a
nova RIS (Rede Informática da Saúde) está prestes
a ver a luz do dia. Portanto, só boas notícias! Sobre
o peso dos sistemas no trabalho dos profissionais, é
que nada foi dito!
A festa chegou ao rubro: o PENTS a ver a luz do dia
e a provocar os elogios dos estados membros Europeus,
pois, segundo a SPMS, nenhum outro país possui
tal instrumento, o RSE Live, a nova RIS que se aproxima,
a celebração do aniversário do CNTS: houve
bolo e cantaram-se os parabéns. Assim se cumpriu
mais uma jornada da SPMS!
Falta agora o trabalho principal: analisar o PENTS e
avaliar os resultados conseguidos! Que são as tarefas
que se avizinham às quais a Associação Portuguesa de
Telemedicina (APT) irá dar a mais cuidada atenção. Ã
1. Estratégia Nacional para o Eco-Sistema de Informação da Saúde.
2. Administrações Regionais de Saúde, Unidades de Saúde Familiar, Agrupamentos
de Centros de Saúde.
3. Unidade Local de Saúde.
4. Processo Clínico Electrónico.
5. Citação de memória, poderá não ser literal.
6. Quaisquer considerações de ordem ética ou procedimentais não serão para
aqui chamadas...
7. Sistemas legados em tradução literal, isto é, o conjunto de aplicações informáticas
herdadas do passado.
8. Designação dada ao registo dos pedidos de suporte no Call Centre (Centro
de Contacto, Centro de Atendimento).
9. Conjunto de tarefas que constituem uma actividade elementar: literalmente,
“Pacote de trabalho”.
10. Empoderamento do paciente: tendência actual para dotar o paciente com
os meios necessários para aumentar a(s) sua(s) autonomia(s), capacidade(s) e
competência(s).
Nota: o autor escreve consciente e intencionalmente em conformidade
com as regras ortográficas da Língua Portuguesa anteriores
ao Novo Acordo Ortográfico.
54 55
GH direito biomédico
QUE FUTURO PARA AS
TÉCNICAS DE TRANSFERÊNCIA
MITOCONDRIAL?
Eduardo António da Silva Figueiredo
Investigador do Centro de Direito Biomédico
Faculdade de Direito-Universidade de Coimbra
O
genoma constitui a “totalidade do
complemento genético de um organismo”
1 . No que respeita ao genoma
humano, este é constituído por
uma componente nuclear - que se
encontra albergada no núcleo da célula - e por uma
componente mitocondrial - na grande maioria dos casos,
de origem exclusivamente materna 2 e localizada
na mitocôndria, que funciona como uma espécie de
“fornalha oxidativa onde a célula queima combustível
para obter energia” crucial ao funcionamento dos vários
órgãos e tecidos 3 .
A importância do ADN mitocondrial tem sido, por vezes,
verdadeiramente subestimada. Não obstante, sabe-se
que a sua transmissão e replicação são “estritamente
reguladas desde estádios prematuros do desenvolvimento
de um ser”, afigurando-se fundamentais
para a viabilidade e boa saúde da descendência 4 .
A existência de “defeitos” no ADN mitocondrial é responsável
pelo desenvolvimento de um conjunto de
doenças graves, das quais podemos destacar a atrofia
ótica de Leber ou a síndrome de Leigh 5 . Estes podem
ser transmitidos hereditariamente ou despoletados
por um conjunto de fatores intrínsecos ou extrínsecos
causadores de deleções ou mutações pontuais 1 .
Assim, o estudo do ADN mitocondrial é fundamental
para a identificação das mutações associadas a este
tipo de doenças e subsequente desenvolvimento de
meios técnicos para a sua prevenção e tratamento,
mas também no âmbito médico-legal, para o esclarecimento
de dúvidas de natureza histórico-genealógica
ou para a caraterização da evolução humana (v.g. no
que tange às diversas variações regionais ou à determinação
das nossas origens ancestrais) 1,4 .
Até há pouco tempo atrás, procurava-se a prevenção
e tratamento das doenças mitocondriais (ou, pelo menos,
a amenização dos seus efeitos) através da prescrição
de suplementos vitamínicos ou de medicamentos,
a maioria deles, administrados no decurso de ensaios
clínicos 6 . Mais recentemente, e graças aos inúmeros
progressos no quadro da genética, têm sido desenvolvidos
um conjunto de mecanismos de predição
e diagnóstico deste tipo de doenças 7 , bem como inúmeras
técnicas de transferência mitocondrial em seres
humanos destinadas à sua prevenção, permitindo
que mulheres afetadas por este tipo de enfermidades
(ou mesmo aquelas que sejam qualificadas como
portadoras assintomáticas) possam ter uma descendência
saudável e com a qual partilham um vínculo
genético 6 . Das várias técnicas disponíveis 7 , destacamos
as seguintes:
• A Maternal Spindle Transfer traduz-se na extração
do núcleo saudável de um óvulo com uma mitocôndria
defeituosa, transferindo-o para outro óvulo, previamente
enucleado e proveniente de uma dadora, o
qual apresenta uma mitocôndria saudável. Após a fertilização
in vitro deste “óvulo híbrido”, o mesmo é
transferido para o útero materno 8 .
• Por outro lado, a Pronuclear Transfer pressupõe a fertilização
de dois ovócitos (um pertencente à futura
mãe, a qual possui um ADN mitocondrial defeituoso,
e outro de uma dadora saudável) com o esperma
do progenitor masculino (ou de um dador). Em seguida,
procede-se à transferência dos pronúcleos do
embrião que contenha a mitocôndria materna para
um embrião previamente enucleado e dotado de
uma mitocôndria saudável 8 .
• Por fim, a Nuclear Transfer parte da extração do núcleo
de um embrião portador de um qualquer defeito
no seu ADN mitocondrial para, posteriormente,
o transferir para um outro embrião previamente enucleado
9 . Esta última técnica ainda não é utilizada em
contexto de experimentação científica ou prática clínica.
Além de todas as técnicas supramencionadas, note-se
que também é possível proceder à correção de defeitos
no ADN mitocondrial através da utilização de
algumas técnicas de edição do genoma humano: é o
caso das chamadas TALENs ou da CRISPR/Cas 6 . Apesar
de estas não terem sido originariamente desenvolvidas
para atuar no quadro do ADN mitocondrial,
a verdade é que as mesmas também podem oferecer
inúmeras potencialidades na correção dos seus
defeitos ou malformações.
Ora, o debate em torno da admissibilidade ético-jurídica
da utilização deste tipo de técnicas não é, de modo
algum, novo 5 . Apesar disso, na arena europeia (e mesmo
mundial), este subiu de tom quando, a 29 de outubro
de 2015, se aprovou uma alteração ao Human
Fertilization and Embryology Act (HFEA) britânico, admitindo-se
a utilização de técnicas de transferência
mitocondrial como parte integrante do procedimento
de fertilização in vitro, quando destinada à prevenção
de um conjunto variado de doenças mitocondriais
graves e causadoras de morte precoce 8 .
Se, por um lado, houve quem tenha aplaudido tal solução
político-legislativa, por tornar possível a um vasto
conjunto de mulheres ter uma descendência saudável,
por outro lado, houve quem questionasse a sua
admissibilidade ético-jurídica com recurso a variadíssimos
argumentos. Vejamos alguns deles:
Dignidade e identidade (genética) do ser humano
Alguns autores consideram que as recentes práticas biotecnológicas,
atuando no quadro da programação interna
do ser, põem em causa a dignidade da pessoa humana
e ousam redefinir a essência da própria humanidade.
Cada vez mais, o ser humano deixa de se vislumbrar como
ser-em-si-mesmo, passando a encarar-se e a ser encarado
como mera criação, fruto de uma espécie de ímpeto
volitivo pessoal heterónimo 10 . Esta crítica - que, de
resto, não é nova - apresenta inúmeras deficiências, principalmente
por a dignidade humana se apresentar como
uma categoria axiológica, ética e jurídica profundamente
complexa e mutável, o que justifica que a mesma
não se possa afirmar como “argumento apto para
produzir um consenso não existente” 11 . Tende-se,
igualmente, a asseverar que a transferência mitocondrial
apresenta um profundo impacto na alteração
da identidade do ser humano, especialmente no que
respeita à sua identidade genética.
Alguns autores rejeitam tais considerações, por entenderem
que a transferêcia mitocondrial é feita numa fa-
“
ALGUNS AUTORES CONSIDERAM
QUE AS RECENTES PRÁTICAS
BIOTECNOLÓGICAS, ATUANDO
NO QUADRO DA PROGRAMAÇÃO
INTERNA DO SER, PÕEM
EM CAUSA A DIGNIDADE
DA PESSOA HUMANA.
”
se tão inicial do processo reprodutivo (antes da fecundação
ou logo após a mesma) que ainda não é possível
falar-se da existência de uma qualquer identidade (mormente
genética) concreta que se possa modificar 9 .
À parte disso, cabe-nos referir que, não obstante a falta
de consenso doutrinal na matéria, tendemos a considerar
que esta prática deve ser qualificada como
um meio de alteração da linha celular germinativa 5 , já
que tem por objeto um conjunto de células germinais
12 e o ADN mitocondrial saudável introduzido
por via da mesma passará a fazer parte do genoma
do novo ser (e será transmitido à geração seguinte,
caso este seja do sexo feminino). Assim sendo,
parece-nos que, à luz do nosso ordenamento jurídico,
a utilização desta prática seria inadmissível, por
constituir uma violação do disposto no art. 13.º da
Convenção sobre os Direitos Humanos e a Biomedicina
13 e de outras disposições de direito interno
que apontam no mesmo sentido 14 .
Crescentes são, porém, as vozes que reclamam um
distinto enquadramento ético-jurídico desta prática
em contraposição, por exemplo, com algumas técnicas
de edição genética. Neste contexto, tende a destacar-se
o facto de o ADN mitocondrial corresponder
apenas a uma ínfima parte do ADN presente numa
célula (aproximadamente 0,1%).
Além disso, costuma também pontuar-se que a sua
principal função é a produção de energia 15 , sendo no
ADN nuclear (o qual não é, por esta via, afetado) }
56 57
GH direito biomédico
“
UMA DAS VARIÁVEIS A CONSIDERAR
SERÁ SEMPRE A DOS “NOVOS RISCOS”
ASSOCIADOS À UTILIZAÇÃO
DAS TÉCNICAS BIOTECNOLÓGICAS,
OS QUAIS TÊM SIDO QUALIFICADOS
DE INCONTROLÁVEIS (...)
”
que se encontram a maioria dos traços genéticos
que influenciam, em diálogo com incontáveis fatores
ambientais, o desenvolvimento de caraterísticas fundamentais
do ser humano 6 .
Por outro lado, há quem alerte para o facto de existir
uma clara diferença entre a edição de específicos
segmentos genéticos (p.e. por via da CRISPR/Cas) e
a transferência mitocondrial, a qual consiste numa
mera substituição do ADN mitocondrial defeituoso
por um outro saudável, sem qualquer intervenção
técnica que, de algum modo, o artificialize 13 . Procurase,
desta forma, afastar a ideia de que a utilização de
tais técnicas poderá abrir a porta à seleção de traços
genéticos, transformando-se numa rampa resvaladiça
que nos faça descambar na prossecução de inaceitáveis
práticas de melhoramento genético humano.
Por fim, tem-se chamado a atenção para o facto de
este procedimento dar origem a um ser humano que
congregará material genético de três pessoas distintas:
do pai, da mãe e da mulher dadora do óvulo portador
de ADN mitocondrial saudável. Neste contexto,
a doutrina tem discutido profundamente a questão
da confidencialidade e do anonimato das dadoras de
gâmetas 6 , a qual, entre nós, assumiu novos contornos
desde março de 2018, quando o Tribunal Constitucional
português, graças à crescente densificação do
direito ao conhecimento das origens genéticas, decidiu
condenar o antigo regime-regra do anonimato.
O(s) risco(s) e as alternativas
No quadro da atual “sociedade mundial do risco”
(U. Beck), uma das variáveis a considerar será sempre
a dos “novos riscos” associados à utilização das
técnicas biotecnológicas, os quais têm sido qualificados
de incontroláveis, inquantificáveis, indetermináveis
e não atribuíveis 16 .
Quanto a esta prática em concreto, várias entidades
(como o Nuffield Council on Bioethics) têm-se pronunciado
no sentido de não existirem evidências científicas
que, de forma sólida, apontem para a falta de segurança
associada à sua utilização em contexto de
experimentação científica ou de prática clínica 5 .
Convém relembrar, porém, que a ausência de certezas
quanto à falta de segurança das técnicas de transferência
mitocondrial não significa, no entanto, a ausência
absoluta de riscos. Situamo-nos no tão propalado domínio
dos “riscos incertos”, os quais poderão manifestar-se
de forma absolutamente gravosa e imprevisível.
Neste contexto, há já algum tempo que nos manifestamos
no sentido de considerarmos que uma resposta
precaucional adequada não exigirá necessariamente
a proibição absoluta do recurso a estas práticas.
Antes, ela pressuporá, por ora, a sua limitação àqueles
casos em que exista um elevado risco de transmissão
de doença mitocondrial grave à descendência,
sempre que não exista alternativa científica, social
ou eticamente mais desejável (como, por exemplo,
o recurso a óvulos doados, ao diagnóstico pré-natal,
ao diagnóstico genético pré-implantação 8 ) e apenas
na medida em que não sejam identificáveis registos
de consequências negativas graves a curto, médio ou
longo prazo decorrentes da utilização das mesmas.
A diligência devida exige, ainda, que esta prática venha
a ser introduzida de forma paulatina, fazendo-se
acompanhar da observância estrita de protocolos
científicos rigorosos e sob a supervisão e controlo
de autoridades oficiais competentes que assegurem,
nomeadamente, a preparação das equipas intervenientes
e o seguimento detalhado dos procedimentos
7 . Por outro lado, garantir que os indivíduos
tenham acesso a informação atualizada e fidedigna
é um requisito absolutamente fundamental, pois só
assim eles poderão tomar a sua decisão de recorrer
(ou não) a este tipo de procedimentos de forma verdadeiramente
esclarecida. No fundo, apelamos ao
respeito e cumprimento pela “diligência devida”,
quer no plano material, quer procedimental 17 .
Clonagem?
Existe quem considere que a transferência mitocondrial,
especialmente quando levada a cabo por via da
chamada Nuclear Transfer, constitui uma forma de
clonagem reprodutiva de seres humanos 9 - prática
que, como bem sabemos, se encontra proibida (e é
criminalmente punível) na grande maioria dos ordenamentos
jurídicos a nível mundial 18 .
Não obstante, segundo alguns autores, tal argumento
não procede, simultaneamente por razões de cariz
prático e de cariz conceitual. Desde logo, refere-se
que a técnica da transferência nuclear ainda não é, na
prática, empregue para a prossecução da transferência
mitocondrial 9 . E mesmo que assim fosse, não é
desejável que se confunda esta técnica com as possíveis
finalidades da mesma. Assim, por exemplo, a utilização
da Nuclear Transfer para a obtenção de linhas
celulares suscetíveis de uso terapêutico não pode ser
equiparada à clonagem 9 , prática que se destina a criar
um “ser humano geneticamente idêntico a outro (...),
vivo ou morto”, o que pressupõe que ambos tenham
em comum o mesmo conjunto de genes nucleares.
Além disso, ao contrário do que ocorre no caso da
Somatic Cell Nuclear Transfer (técnica de clonagem que
deu origem à mítica ovelha Dolly), aqui não se emprega,
em momento algum, qualquer célula somática 9 .
Instrumentalização de gâmetas e embriões humanos?
Outra das linhas de crítica à prática da transferência
mitocondrial prende-se com o facto de haver quem
considere que a aplicação clínica das mesmas exigirá
um elevado número de doações de gâmetas femininos.
É necessário, pois, que exista regulamentação clara
e que assegure pari passu a autonomia e o bem-estar
das dadoras, mormente valorizando o seu devido
esclarecimento e limitando o número de doações que
cada uma poderá levar a cabo, protegendo-as contra
os efeitos negativos associados ao processo de estimulação
ovárica 6 . Só o combate a qualquer tipo de
pressão ou coerção psicológica, social ou económica
poderá evitar, inter alia, a exploração e instrumentalização
de mulheres que se encontrem em situações
de maior vulnerabilidade 15 .
Por outro lado, há quem critique o facto de esta prática,
quando levada a cabo por via da Pronuclear Transfer,
conduzir necessariamente à destruição de óvulos humanos
fecundados que se encontram nas primeiras
fases de desenvolvimento (zigotos), os quais são considerados
‘embriões humanos’ por aqueles que entendem
que a vida humana tem o seu início no momento da fecundação.
A prossecução desta prática implicaria, pois,
a morte deliberada de um ser humano, o que é bastante
problemático do ponto de vista ético 9 .
Por razões sistemáticas, não iremos adentrar nos vários
problemas associados ao estatuto filosófico, ético
e jurídico do embrião humano 12 , deixando apenas
a nota de que será sempre preferível o recurso à Maternal
Spindle Transfer, já que, neste caso, se recorre
a óvulos não fecundados.
Terminamos afirmando que a utilização futura das
técnicas de transferência mitocondrial para prevenir
a transmissão hereditária de um conjunto de doenças
nefastas e para a satisfação dos desejos (senão mesmo,
direitos) procriativos de tantos casais dependerá
do aprofundamento da discussão - hoje claramente
insuficiente - dos desafios éticos e jurídicos que as
mesmas colocam.
As soluções a alcançar terão de ser, invariavelmente,
soluções de compromisso, afastadas de qualquer tipo
de falácias naturalistas ou de preconceitos que tolhem
injustificadamente o progresso da humanidade,
sem que se deixe, porém, de considerar e harmonizar
a pluralidade de direitos e interesses que se entrecruzam
nestes domínios. Só assim se logrará o progresso
humanitário por via de uma ciência cada vez
mais human(izad)a. Ã
1. Regateiro, Fernando J., Manual de genética médica, 2.ª Ed., Coimbra: IUC,
2007.
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Legal Studies, vol. 37, n.º 4, 2017.
14. Santos, Heloísa G./Pereira, André Dias, Genética para todos: a prática, a
ética, as leis e a sociedade, Lisboa: Gradiva, 2019.
15. Cussins, Jessica/Lowthorp, Leah, “Germline modification and policymaking:
the relationship between mitochondrial replacement and gene editing”, in The
New Bioethics, vol. 24, n.º 1, 2018.
16. Sousa, Susana Aires de, “Saúde pública, direito penal e os ‘novos riscos’: um
triângulo com lados desiguais”, in Direito(s) dos riscos tecnológicos (coord. por
Carla Amado Gomes), Lisboa: AAFDL Editora, 2014.
17. Figueiredo, Eduardo, Desagrilhoar Prometeu? Direito(s), genes e doença(s):
Desafios constitucionais na era da engenharia genética, Coimbra: FDUC, 2019.
18. Melo, Helena Pereira de, A clonagem humana reprodutiva no direito internacional
dos direitos humanos, Coimbra: Almedina, 2019.
58 59
GH espaço ensp
7 A EDIÇÃO DA CONFERÊNCIA
DE VALOR DA APAH
GH Prémio Healthcare excellence 2019
ALDEIAS HUMANITAR:
HUMANIZAR E ESTAR
NO INTERIOR DE PORTUGAL
Ana Damas
Aluna 48º CEAH-ENSP
Luís Vales
Aluno 48º CEAH-ENSP
No passado mês de outubro, nos dias
18 e 19, realizou-se mais uma conferência
de valor APAH - a 7ª edição -
na cidade de Braga, com o tema “Modelos
de gestão centrados no cidadão
e na comunidade”. Fruto da parceria entre a Associação
Portuguesa de Administradores Hospitalares
(APAH) e a Escola Nacional de Saúde Pública
(ENSP-NOVA), foram atribuídas inscrições para participação
na conferência a dois alunos do XLVIII Curso
de Especialização em Administração Hospitalar.
Tendo sido os alunos contemplados, sentimo-nos
naturalmente honrados pela distinção e pela possibilidade
de assistir a uma conferência com um painel
de oradores com vasta experiência na gestão de serviços
de saúde.
Os modelos de gestão centrados no cidadão e na
comunidade estão na ordem do dia, e mais uma vez
a APAH responde com grande atualidade a esta
questão, proporcionando uma partilha de conhecimento
e experiências de valor. A participação nesta
conferência de várias associações de doentes trouxe
um significativo input aos temas abordados, levandonos
a pensar efetivamente na perspetiva dos doentes.
De facto, a promoção da participação e a capacitação
das pessoas com ou sem doença, no âmbito dos
processos de tomada de decisão em saúde, a nível
político e institucional, é de vital importância e deve
ser vista como um objetivo primordial para a melhoria
contínua da prestação de cuidados.
Com a intervenção inicial de Usman Khan, diretor
executivo do European Patient Forum, discutiram-se
formas de incorporar as expetativas e a experiência
das pessoas nos serviços de saúde. Várias foram as soluções
apontadas para melhorar a qualidade da prestação
de cuidados aos cidadãos.
A partilha de experiências e de soluções adotadas por
diferentes stakeholders do Sistema de Saúde é, como
se disse inicialmente, uma das grandes vantagens
destas conferências, onde de forma explícita se consegue
perceber que para o mesmo problema haverá
várias soluções, com perspetivas diferentes, mas cada
uma delas com um valor associado. Assim, foram
também importantes os workshops alusivos à partilha
de soluções para aumentar a eficiência centrada nas
pessoas, no âmbito da inteligência de dados.
Mas se existem soluções e novos modelos de gestão
centrados nas pessoas, temos também de pensar em
qual o retorno desse investimento para a sociedade.
Por isso mesmo, foram apresentados os resultados de
um estudo realizado nesse âmbito, seguido de uma
interessante discussão do mesmo por parte de representantes
da administração pública, do sector social
e farmacêutico.
Foi para nós uma honra estar presente na conferência
e poder participar na discussão de tão importante temática.
Saímos mais ricos em termos de conhecimento,
de experiência e mais motivados do que nunca
para dar o nosso contributo e marcar a diferença.
Enquanto alunos do Curso de Especialização em Administração
Hospitalar, foi também importante interagir
com os gestores de saúde que diariamente enfrentam
os desafios presentes e futuros nas organizações
de saúde, permitindo perceber na prática como se
colocam questões abordadas no âmbito académico.
Tendo em conta os desafios permanentes que se colocam
no setor da saúde, foi com grande motivação e
expectativa que participamos nesta conferência.
Um agradecimento à APAH e à sua direção quer pela
qualidade deste evento, que a nosso ver ombreia
ao nível de outros eventos internacionais, quer pela
oportunidade que nos deu de participar no evento. Ã
Domingos Nascimento
Gestor da Saúde e do Social
Helena Norinha
Enfermeira e Gestora
O
Projeto nasce no Douro Sul e teve
a sua ação piloto nos concelhos de
Sernancelhe e Penedono, no distrito
de Viseu.
O Aldeias Humanitar tem uma visão
geográfica mais larga, a correspondente à CIM
Douro, Comunidade Intermunicipal do Douro com
cerca de 200.000 habitantes. Mas, acredita-se ser um
modelo para todo o interior de Portugal.
O Projeto valoriza todo o trabalho já realizado nas
comunidades por todas as instituições, municípios e
juntas de freguesia, mas aborda o problema de forma
diferente e cria um modelo facilmente replicável.
É de Intervenção Humanitária de Saúde e Amparo
Social que falamos quando nos referimos ao Aldeias
Humanitar. Um projeto que pretende contribuir para
a humanização do interior de Portugal.
A nova realidade demográfica fez novo o contexto
da vida em parte significativa do território de Portugal.
Desde as crianças, as poucas, passando pelos
adultos mais jovens, os poucos, até aos mais idosos,
os também já não muitos, todos estão a aprender
novamente a viver em comunidade. É isto, voltar a
aprender a viver.
A estrutura de serviços mais ou menos formais que
sempre deu vida e proteção às pessoas, desestruturou-se
irremediavelmente.
Resta silêncio, paisagens lindíssimas, infraestruturas
Mário Pinto
Médico e Investigador do CINTESIS
de luxo, mas instalou-se um desequilíbrio no ecossistema
que fará perigar a subsistência destes habitats
comunitários. Há uma espécie fundamental nestes
ecossistemas em vias de extinção, os seres humanos.
E, sem eles, tudo será diferente, tudo já é diferente.
O modelo
É nesta realidade que nasce um modelo que procura
contribuir para a preservação da vida Humana no interior.
Com duas componentes: a da intervenção e a
da certificação. O modelo assenta em três pilares, o
da proximidade, o da integração e o da humanização.
A intervenção Humanitar:
A intervenção é feita com equipas Humanitar de cuidados
em casa das pessoas. Equipas multidisciplinares
que avaliam, estabelecem um plano de amparo individual
ou familiar e procuram respostas na família e na
comunidade e, depois de verificada a não existência de
respostas, a equipa Humanitar inicia a sua intervenção.
Ou, em situações urgentes, intervém de imediato.
Essa intervenção é completamente gratuita para os
utentes e durará o tempo necessário, nunca se abandonando
ninguém.
O projeto tem um grande objetivo: deixar de existir.
Significaria que as famílias e a comunidade tinham
respostas pessoalizadas para fazerem face às necessidades
concretas de cada pessoa concreta.
De acordo com o relatório da OCDE “State of }
60 61
GH Prémio Healthcare excellence 2019
“ “
O NÚCLEO DE ESTUDOS
DE GERIATRIA DA SOCIEDADE
DE MEDICINA INTERNA DEFENDE
UMA AVALIAÇÃO GERIÁTRICA
GLOBAL, FÍSICA, MENTAL,
FUNCIONAL E SOCIAL COM
O OBJETIVO DE ESTABELECER
PLANOS DE CUIDADOS,
SERVIÇOS E INTERVENÇÕES.
Health in the EU. Portugal. Perfil de Saúde do País
2019”, as pessoas vivem mais tempo, com a esperança
de vida a chegar aos 81,6 anos (ligeiramente acima
da média europeia que é de 80,9 anos), mas, frequentemente
com doenças crónicas e incapacidades.
Verifica-se um aumento da mortalidade por doença
de Alzheimer, mantendo-se os AVCs e a doença cardíaca
isquémica como as principais causas de morte.
Este documento refere ainda disparidades na esperança
de vida não só entre homens e mulheres, mas
também em função do estatuto socioeconómico:
cerca de 61% dos portugueses no quintil de rendimentos
mais alto consideram estar de boa saúde,
comparativamente a cerca de apenas 39% no quintil
de rendimentos mais baixo, bastante abaixo das
médias da UE (80,4% e 61,2% respetivamente), referindo
algumas barreiras no acesso por parte de
determinados grupos da população, sobretudo nas
áreas rurais.
O Núcleo de Estudos de Geriatria da Sociedade de
Medicina Interna defende uma avaliação geriátrica
global, física, mental, funcional e social com o objetivo
de estabelecer planos de cuidados, serviços e
intervenções, que respondam efetivamente às necessidades
individuais de cada idoso/família.
Esta avaliação deve ser realizada a todos os idosos
com mais de 75 anos, em situações de pluripatologia e
polifarmácia, doenças crónicas, diminuição funcional e
falta de apoio social, por uma equipa multiprofissional.
Recomenda ainda que esta avaliação seja feita com
recurso a instrumentos cientificamente validados, de
utilização universal, permitindo comparar resultados
com outros estudos bem como extrapolar possíveis
ganhos em saúde e orientar a intervenção.
Pinto, M. J. & Coutinho S. N. (2014) referem que a
investigação clínica tem vindo a interessar-se cada vez
mais pela síndrome de fragilidade do idoso, caraterizado
pelo declínio relacionado com a idade, com o aumento
do risco de outcomes adversos, nomeadamente
aumento de dependência, imobilidade, quedas, fraturas,
(…), levando frequentemente à institucionalização.
Estes autores defendem a importância da identificação
precoce da síndrome da fragilidade em idosos, e também
estabelecer os fatores associados, diagnosticar,
prevenir e adequar intervenções individualizadas.
Na literatura científica podemos encontrar diferentes
instrumentos para avaliação deste fenómeno,
que se podem dividir em duas abordagens distintas.
Uma que pressupõe a mensuração da fragilidade
com recurso a variáveis relativas à condição física. A
segunda, cada vez mais reconhecida, abrange o domínio
psicológico e social (Santiago, L. et al, 2012).
Estes autores realizaram uma revisão sistemática da
literatura nas bases de dados MEDLINE, LILACS e
SciELO e concluíram que o instrumento mais adequado
ao construto atual da fragilidade é o Tilburg
Frailty Indicator (TFI).
Mourão, L. (2008) refere um documento editado
pela Generalitat Valenciana - Conselleria de Sanitat
sobre instrumentos de avaliação domiciliária com o
objetivo de identificar as necessidades de saúde e
sociais da população idosa, possibilitando uma intervenção
mais efetiva. Esta autora desenvolveu um
estudo com o objetivo de validar a escala de Gijón
como instrumento que medisse a função social do
idoso de forma constante e válida.
Procurando desenvolver a sua intervenção de forma
científica e tecnicamente fundamentada, o projeto
Aldeias Humanitar integrou no seu modelo de intervenção
uma avaliação multidisciplinar com base nos
instrumentos seguintes:
• Escala de Glasgow
• Escala de Barthel
• Escala de Lowton & Brody
• Avaliação do Estado Mental (MMSE)
• Escala de Avaliação da Situação Sócio-Familiar de Gijón
• Tilburg Frailty Indicator (TFI)
• Escala de Morse
• Escala de Braden
• Escala de Zarit (quando aplicável)
• Escala de Sintomas de Edmonton (quando aplicável)
Em função desta avaliação é elaborado um plano de
amparo e intervenção individual, que engloba intervenções
tão diversas como apoio na gestão do regime
terapêutico, articulação com serviços de saúde
e apoios sociais, disponibilização de equipamentos
de prevenção de úlceras por pressão, estratégias de
prevenção de quedas, promoção de descanso ao
cuidador, capacitação do cuidador, dinâmicas psicomotoras
e cognitivas, entre outras.
Para além desta intervenção do foro individual/familiar
é feita também uma avaliação da adequação e segurança
do habitat familiar e comunitário envolvente.
Desta avaliação emergem necessidades que, em articulação
com os parceiros da comunidade, sobretudo
Municípios e Juntas de Freguesia, o Projeto deligencia
para a sua satisfação.
De facto, a comunidade já tem muitos meios nas
instituições, nos municípios, nas freguesias, sendo
relevante o trabalho que todos desenvolvem pelas
pessoas. O Aldeias Humanitar quer, em primeiro lugar
humanizar, contribuindo para a articulação e integração
das respostas, para que estas sejam mesmo
colocadas à disposição daquela pessoa concreta para
uma necessidade concreta. E, quando necessário, ser
complementar. Uma verdadeira rede integrada de
saúde e amparo social.
Neste contexto, os atuais modelos de apoio às pessoas
não são suficientes. As instituições estão condicionadas
a respostas pré-concebidas que não têm
em conta as especificidades do território e daquela
pessoa ou família em particular.
Por isso, o Aldeias Humanitar também defende a
necessidade urgente da criação da figura do Cuidador
Comunitário. O Cuidador Comunitário está
presente na aldeia, apoia nas atividades da vida diária,
vigia as tomas da medicação, articula com outras
respostas, procura socorro em situações de emergência,
substitui o cuidador informal para este poder
descansar e responder às suas próprias necessidades.
Uma função profissional, com formação adequada,
que além de ser uma nova solução para as pessoas,
seja também uma oportunidade de emprego, permitindo
continuar na aldeia, amparando os mais velhos,
fixando os mais jovens.
A Certificação Humanitar de territórios:
Caminharemos, numa segunda fase, também para a
certificação de comunidades, que é a materialização
de um modelo de avaliação diagnóstica do índice Humanitar
que nos dá uma noção do potencial de satisfação
das necessidades humanas para, mantendo a qualidade
de vida, ser promotora de felicidade humana.
O ALDEIAS HUMANITAR
TAMBÉM DEFENDE
A NECESSIDADE URGENTE
DA CRIAÇÃO DA FIGURA
DO CUIDADOR COMUNITÁRIO,
QUE ESTÁ PRESENTE NA ALDEIA,
APOIA NAS ATIVIDADES
DA VIDA DIÁRIA, VIGIA
AS TOMAS DA MEDICAÇÃO...
” ”
O Aldeias Humanitar, pretende ser a bandeira branca
da humanização do interior de Portugal. Com esta
bandeira estaremos a dar indicações das ações ou estruturas
de respostas de saúde e amparo social e de
habitabilidade familiar e comunitária, positivas. Numa
fase inicial a análise diagnóstica será a pedido das entidades
locais. Numa segunda etapa, será por iniciativa
do projeto. Pretende-se valorizar e depois motivar
para novos comportamentos individuais e coletivos. Ã
Duque, A. et al (s/ data). Avaliação Geriátrica. Núcleo de Estudos de Geriatria
da Sociedade de Medicina Interna. https://www.spmi.pt/wp-content/uploads/
GERMI_36.pdf. Consultado em 29/11/2019.
Mourão, Lúcia (2008) “Aplicação da Escala de Gijón em Rastreio de Risco Soci-al”.
Universidade de Aveiro. https://ria.ua.pt/bitstream/10773/3280/1/20090
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Observatório Europeu dos Sistemas e Políticas de Saúde, Bruxelas.
Pinto, M & Coutinho, S. (2014). Síndrome de Fragilidade. Revista de Psicologia,
n.º 2, Vol. 1, p. 171-176.
Santiago, L. et al (2012). Adaptação transcultural do instrumento Tilburg Frailty
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28(9), p. 1795-1801.
62 63
GH Iniciativa APAH
A Excelência em
diferentes manifestações
Cristina Fiuza Branco
Administradora Hospitalar
Centro Hospitalar
Universitário do Porto, E.P.E.
Luís Pombo
Administrador Hospitalar
Hospital Garcia de Orta, E.P.E.
A
APAH, no âmbito da parceria que
vem desenvolvendo com a AESE
Business School e a AMGEN, proporcionou
a dois dos seus associados,
com quotas em dia e bom
tempo de resposta ao concurso, a oportunidade de
uma visita à nova sede da Clínica da Universidade
de Navarra (CUN) em Madrid, a qual foi alcançada
pelos autores deste artigo, ficando estabelecida como
contrapartida a partilha da experiência com os
demais sócios, mediante publicação de um artigo na
revista mensal.
A iniciativa decorreu no dia 3 de Outubro e o Grupo
de 18 visitantes era representativo do país, já que
reunia participantes do Minho ao Algarve.
Rumámos a Madrid a 2 de Outubro, uns a partir do
Porto, outros com origem em Lisboa, preparados para
uma jornada estimulante e exigente. O dia da visita
rompeu com sol e iniciou-se com uma pequena caminhada
matinal entre o hotel e a CUN. Aí chegados,
fomos recebidos no auditório institucional pela Diretora
Geral da CUN Madrid, Dra. Esperanza Lozano
Guerra, que apresentou a identidade CUN e expôs
ao grupo o seu modelo de organização e prestação de
cuidados. Outras sessões foram conduzidas em sala,
com momentos de apresentação da realidade e projetos
da CUN, alternados com visitas a instalações
dedicadas à atividade clínica e a serviços chave, onde
foi possível um contacto mais direto com a tecnologia,
arquitetura e modelo de gestão de operações.
O que encontrámos na CUN? Um arquétipo de ex-
celência na organização e prestação de cuidados, conforme
vem sendo desenvolvido na CUN Navarra há
52 anos, aproveitando essa experiência vivenciada,
desde o momento da conceção, projeto e construção
da instalação de Madrid, passando pela organização
dos espaços, definição de circuitos, e introdução
de melhorias por força do conhecimento previamente
acumulado em Pamplona.
A CUN Madrid foi estrutural e integralmente pensada
para o doente, com espaços muito amplos, bem
iluminados, para que o doente se sinta confortável, e
os circuitos foram desenhados de forma a minimizar
as suas deslocações durante os processos de prestação
de cuidados.
O ADN da CUN assenta em 5 pilares fundamentais:
(i) trata-se de um Hospital universitário, integrado na
Universidade de Navarra; (ii) sem fins lucrativos; (iii)
onde se ensina e investiga para curar; (iv) com profissionais
em dedicação exclusiva, a trabalhar em equipa
e (v) forte investimento na inovação científica e tecnológica,
num contexto de instalações de excelência
e equipamentos de vanguarda, que garantem a concretização
do propósito de proporcionar precisão no
diagnóstico e efetividade no tratamento.
A CUN está inserida no Campus da Universidade de
Navarra em Madrid - dedicado exclusivamente à formação
pós graduada - e estende-se por 4 edifícios, ligados
por eixos de circulação horizontal, os quais podem
ser fechados, garantindo o isolamento de edifícios
e áreas reservadas durante a noite ou horas de
encerramento dos serviços.
A Clínica encontra-se organizada em seis Departamentos,
altamente especializados nas patologias mais
frequentes e com natureza multidisciplinar:
• O centro oncológico, organizado em áreas por tipologia
de tumor, oferece diagnóstico de precisão
em 48 horas e tratamento integrado aos respetivos
doentes. Dispõe das mais avançadas e modernas tecnologias
no diagnóstico e tratamento da doença oncológica,
baseando a sua atuação na medicina personalizada
e atribuindo grande relevo à imunoterapia.
• O departamento de check-ups e medicina preventiva
dedica-se à organização e realização de estudos
detalhados de avaliação e diagnóstico em 24 horas.
• O departamento da mulher e pediatria presta serviços
de acompanhamento à saúde da mulher ao longo
do seu ciclo de vida, incluindo a medicina reprodutiva
e a vigilância da gravidez, assim como o acompanhamento
e gestão da saúde da criança na sua transição
para a adolescência e idade adulta.
• O departamento de cirurgia avançada disponibiliza
técnicas cirúrgicas minimamente invasivas, sendo de
destacar a cirurgia robótica, que oferece vantagens na
precisão cirúrgica e no tempo de recuperação.
• No departamento cardiovascular destaca-se a realização
de procedimentos minimamente invasivos no
tratamento da doença coronária.
• Por fim, o departamento de traumatologia e medicina
desportiva, para além da medicina curativa, está
vocacionado para a avaliação e acompanhamento de
atletas, amadores e profissionais, tendo por cliente, por
exemplo, a equipa de futebol do Atlético de Madrid.
A Clínica dispõe de 58 quartos individuais de internamento
- 8 dos quais em suite - com possibilidade de
permanência de acompanhante. Na medicina intensiva
tem lotação de 7 postos destinados a adultos e outros
7 na unidade de cuidados intensivos neonatais,
todos em unidades individuais.
O Bloco Operatório é composto por 6 salas de operações
multidisciplinares, uma sala operatória híbrida,
uma área de procedimentos diagnósticos e terapêuticos
dotada de 4 salas de cirurgia de ambulatório e 10
postos individualizados de recobro, e uma unidade de
cuidados pós anestésicos.
O ambulatório oferece consultas em 46 especialidades,
médicas e cirúrgicas, 14 salas de diagnóstico por
imagem, hospital de dia oncológico com 10 postos de
tratamento individualizados, laboratórios de análises
clínicas e de anatomia patológica.
A CUN afirma-se como um Hospital de alta resolução
onde, por força da inovação clínica, concentração
tecnológica e de especialistas altamente diferenciados
e dedicados, é possível encurtar o período atribuído
ao diagnóstico e prosseguir rapidamente para a fase
de tratamento. Mas o investimento em tecnologia
não se circunscreve aos meios de diagnóstico: veja-se
o caso do robot cirúrgico Da Vinci, da sala cirúrgica híbrida,
com radioterapia intraoperatória, e do equipamento
de protonterapia, em fase de calibração e testes,
que será pioneiro 1 em Espanha e fará parte do
Centro Oncológico Integral da CUN. Esta terapia
proporciona máxima precisão, com a mínima agressão,
no menor tempo. Para o lançamento deste tratamento
inovador em 2020 a CUN assegurou já a formação
dos seus profissionais em Rochester.
Qual o fator crítico de sucesso da CUN, que inaugurou
a sua atividade em Janeiro de 2018 e se implantou
em Madrid, num mercado maduro, em concorrência
com 37 Hospitais públicos e 50 Hospitais privados,
que oferecem respetivamente 13.650 e 6.800
camas hospitalares, e onde se encontram 6 dos 10
melhores hospitais de Espanha? Como conquistar
quota de mercado num contexto em que 80% dos
doentes com seguro recorre a hospitais privados já
com grande implantação? Como assegurar um nível
rentável de atividade quando 10 companhias de seguros
garantem 96% dos segurados, dispondo algumas
de Hospitais próprios?
Impunha-se à CUN romper o panorama de estabilidade
e ganhar o seu espaço, criando um novo paradigma.
Como fazê-lo? Oferecendo localização - Madrid
garante uma boa acessibilidade a partir de Espa- }
64 65
GH Iniciativa APAH
nha, Europa, continente Africano e outras áreas do
globo, potenciando o turismo de saúde internacional;
tecnologia de ponta para medicina materno-fetal,
check-ups e medicina preventiva, traumatologia e
medicina desportiva, cirurgia avançada, centro oncológico
integrado…; instalações pensadas para os doentes,
confortáveis, bem equipadas, com espaços amplos,
cheios de luz, circulações inteligentes.
Todos estes aspetos são replicáveis, conquanto se
faça os respetivos investimentos, pelo que se conclui
que a verdadeira nota distintiva está no talento e na
cultura da organização - esses mais difíceis de reproduzir
- que resultam da dedicação exclusiva dos seus
profissionais, do trabalho multidisciplinar, dos processos
integrados, sem subcontratações a terceiros, da
dedicação às pessoas.
Com estes ingredientes é possível atrair novos doentes,
tanto na medicina preventiva como na curativa,
potenciando as especialidades disponíveis e proporcionando
serviços integrados. Ao melhorar a experiência
dos doentes é possível não só fidelizá-los e retê-los,
como fazer deles instrumentos de promoção e
divulgação da reputação da CUN, o que traduz geração
de valor - retorno - para a instituição.
Não houve oportunidade de contactos com doentes,
mas estamos certos da sua satisfação com o modelo
de funcionamento e atendimento da CUN.
Em síntese, preservando o ADN CUN, mantendo a
sua essência e sendo sustentável, assumindo “somos
diferentes” a CUN Madrid escreverá, certamente,
uma história de muito sucesso.
E assim regressámos a casa, encantados com o “novo
mundo”, para nos reencontrarmos com o nosso
já velhinho SNS, cheio de dificuldades e restrições,
de instalações antigas, adaptadas, subdimensionadas,
superpovoadas, tantas vezes maltratadas, onde encontramos
muitos dos profissionais “de fugida”, correndo
para o seu consultório ou o Hospital privado
do outro lado da cidade onde vão completar o seu
rendimento mensal…
Mas por cá também se escrevem casos de sucesso e
a excelência é reconhecida.
Uns dias depois da vista à CUN ouvia à porta do
gabinete pessoas falando inglês. Era certamente uma
visita institucional, pensei. Não era, tratava-se de uma
cidadã americana que, em férias por terras lusas, se
sentiu mal. Tendo um filho médico nos Estados Unidos
pediu-lhe orientação e, depois de uma rápida
pesquisa na internet, o filho indicou-lhe que se dirigisse
a um determinado Hospital privado.
Perante a relutância em ir de ambulância decidiu chamar
um Uber, a cujo motorista pediu que a deixasse no
hospital recomendado. No decurso da viagem o motorista
foi questionando sinais e sintomas e acabou
por decidir: perante o que me diz não vai para onde
pediu - vou levá-la ao melhor Hospital da cidade.
E aqui chegou, com um abdómen agudo - perfuração
do estômago. Foi observada, medicada, intervencionada,
passou por cuidados intensivos, cuidados intermédios,
internamento de cirurgia. Estava agora de
saída, na companhia do filho que entretanto viajou
para Portugal. Estava feliz, estava encantada! Incrédula,
por ter sido tratada sem que lhe tivesse sido exigido
qualquer pagamento, garantia ou caução. Espantada,
porque imaginava uma conta de centenas de milhar
de dólares e ficara a saber que assim não seria. Surpreendida,
porque no país onde vive paga uma mensalidade
de 800 dólares pelo seguro do casal e não
seria tratada assim.
Estava realmente encantada! Tanto que, com jeito de
menina, ganhou coragem para perguntar: “Eu tenho
um problema aqui no joelho, e preciso de fazer uma
prótese, embora o seguro não a aprove por eu ser
ainda muito nova. Poderei vir fazê-la cá?”
Senti orgulho: no SNS, no meu Hospital, nestes profissionais
que tratam os doentes fazendo-os sentir
pessoas, deixando neles não só uma grata recordação,
como a vontade de um dia voltar.
A excelência tem, de facto, várias formas! Ã
1. O equipamento adquirido pela Clínica incorpora como acelerador de partículas
um sincrotrão, o mais moderno disponível atualmente e muito mais
eficiente energeticamente do que o ciclotrão, uma vez que produz muito
menos radiação indesejada.
Considera-se, assim, um acelerador “limpo”, que permite acelerar o feixe de
protões na medida exata da energia requerida para o tumor de cada paciente,
de forma individualizada (…).
(…) Acresce que inclui um sistema que permite o tratamento com protões
dos tumores sujeitos a movimento respiratório, uma solução totalmente integrada
no equipamento. A monitorização em tempo real permite localizar e
quantificar o movimento do tumor, e orientar o instante da irradiação obtendo
um impacto mínimo no tecido são. In www.cun.es, tradução livre.
66
GH Iniciativa APAH | CONFERÊNCIAS de VALOR APAH 2019
Ouvir e envolver
os cidadãos
nas decisões de saúde
tem retorno
para a sociedade
A
participação e a centralidade dos cidadãos
no âmbito do sistema de
saúde estiveram em discussão na 7ª
Conferência de Valor APAH.
A iniciativa que foi presidida por Lino
Mesquita Machado, Administrador Hospitalar e sócio
n.º 104 da APAH, reuniu a 18 a 19 de outubro de
2019 em Braga, mais de 200 gestores e profissionais de
saúde, para analisar e discutir os desafios e as oportunidades
que se colocam atualmente à implementação
de “Modelos de gestão centrados no cidadão e na comunidade“
no Sistema Nacional de Saúde.
Na apresentação das conclusões Lino Mesquita Machado
destacou a importância do envolvimento do cidadão
e a necessidade de repensar a forma como prestamos
cuidados e de como estes devem ser cada vez
mais personalizados, mais integrados e sustentáveis.
Como principais conclusões da iniciativa destacam-se:
1. Importa ouvir os cidadãos
Margarida Santos e Sofia Crisóstomo, em representação
da plataforma Mais Participação, Melhor Saúde, falaram-nos
da necessidade de termos um maior compromisso
com a “Participação pública em saúde”. Falaram-nos
de formas práticas e exequíveis de promover
a participação e de como dentro do enquadramento
legal atual, há margem para melhorar, nomeadamente
com a publicação recente da “Carta para a participação
publica em saúde“. Com as ferramentas que
temos ao nosso dispor (conselhos consultivos ou outros),
temos espaço para envolver mais os doentes.
Foi realçada a importância de valorizar o saber e a experiência
das pessoas com doença, no sentido em que
melhora a qualidade de decisão. Conforme nos disseram:
Mais participação, mais saúde.
Usman Khan, Director executivo do European Patient
Fórum, falou-nos também de como podemos “Incorporar
as expectativas e a experiência das pessoas nos
serviços de saúde” e sobre dar voz ao doentes e a importância
de integrar a visão funcional do doente, de
uma forma compreensiva e sistemática. Para isso temos
de investir em informação, em literacia, sendo
ainda fundamental passar de uma visão paternalista
para uma visão de parceria.
2. Depois de ouvir os cidadãos, é importante alinhar
a organização e os processos de cuidados
Foi disso que nos falou Jordi Varela na sua palestra
“Gestão clínica moderna baseada nas pessoas” i.e. a
importância do valor em saúde, envolvendo os doentes
nos processos. Falou-nos também da importância
de fazer uma avaliação integral do doente (saber como
vive, qual é a situação social, entre outros determinantes)
e de promover as decisões clínicas partilhadas.
Alertou-nos ainda para a importância de medir os
objetivos que realmente importam para os doentes e
de rejeitar as práticas clínicas inadequadas e sem evidência.
Ainda sobre a organização da oferta de cuidados
Carina Dantas, Diretora de inovação da Caritas Diocesana
de Coimbra, reforçou a importância das parcerias
para a reformulação de “Cuidados centrados nas
necessidades das pessoas”. Realçou a importância de
criar pontes entre os diferentes atores no terreno, a
relevância que o terceiro sector pode ter neste âmbito
e a capacidade têm de inovar no apoio aos doentes.
3. A tecnologia pode ter um papel importante para
permitir centrar os cuidados nos cidadãos
Foi nesse sentido que Josep Monterde, Presidente da
Fundação Asserta, falou sobre como pode um sistema
de análise do consumo de medicamentos, que integre
toda a informação do doente, produzir recomendações
de ações de forma fiável e atempada e identifi- }
“
Esta mudança não é possível sem envolver os doentes.
E quando falamos de envolvimento dos doentes,
não podemos apenas continuar a abordar esta questão
ao nível dos inquéritos de satisfação ou das caixas de
sugestões. Os cidadãos, doentes ou não doentes, têm
que participar nas decisões. Em todos os níveis do sistema
de saúde. Ao nível da gestão e do financiamento,
porque são eles que o sustentam com o seu trabalho e
com os seus impostos. Também ao nível da estratégia
de desenvolvimento porque são eles os principais interessados
no seu desenvolvimento e sustentabilidade.
Mas acima de tudo, porque o sistema pode ganhar muito
com essa participação. Um sistema mais participado,
mais inclusivo, mais alinhado com as necessidades das
pessoas, mais preocupado com o seu bem-estar, será
sempre um sistema sustentável, designadamente porque
as pessoas estarão mais dispostas a pagar por ele.
As organizações de saúde, têm que deixar de trabalhar
apenas para dentro, para os seus próprios objetivos ou
para os objetivos dos seus profissionais. Têm que trabalhar
cada vez mais com um objetivo último: o de ir ao encontro
das necessidades dos seus cidadãos. Não podem
existir dúvidas: a organização, o financiamento, os incentivos,
têm que ser alinhados neste sentido. É um avanço
que urge concretizar nos sistemas de saúde, particularmente
no Português.
”
68 69
car o uso inadequado de medicamentos. Ainda no
domínio da tecnologia José Pedro Almeida, do Grupo
Unilabs, contou-nos como é que na sua organização
es-tão a usar a Inteligência de Dados para melhorar a
experiência do doente, prestando um serviço mais rápido,
mais próximo e mais personalizado e deixou como
exemplo o estudo da resistência aos antibióticos
e a forma como essa informação poderia ser disponibilizada
aos Centros de Saúde.
4. Investimento em saúde tem retorno para sociedade
e deve ser uma prioridade
Luís Baltazar da Universidade Nova de Lisboa evidenciou
que o investimento em saúde, não é apenas um
custo e que tem um retorno muito relevante para a
sociedade portuguesa. O estudo da Nova IMS revela
ainda que a qualidade, quer a qualidade técnica, quer
a qualidade percepcionada pelos doentes, é elevada
mas existem áreas onde podemos melhorar, nomeadamente
nos tempos de espera.
A APAH agradece a todos os seus associados e aos
seguintes parceiros e patrocinadores o apoio à organização
do ciclo de Conferência de Valor APAH
2019: Sociedade Portuguesa de Medicina Interna
(SPMI), Associação Portuguesa de Medicina Geral e
Familiar (APMGF), Mais Participação Melhor Saúde,
Grupo Unilabs, Abbvie, Roche, Bayer, Gilead Sciences,
Novartis, Vifor Pharma, Sanofi, Grifols, Medtronic,
Janssen e IQVIA.
À semelhança das edições passadas, fruto das conclusões
destas conferências, a APAH tem vindo a apresentar
diagnósticos de situação e medidas concretas
para a melhoria da organização e gestão dos cuidados
de saúde em Portugal e que integram a agenda do Ministério
da Saúde e de outros parceiros do sistema.
Este é o motivo pelo qual a APAH mantém a aposta
nas Conferências de Valor, na certeza de que são um
valioso contributo para ajudar a que a mudança possa
avançar, e definir os seus moldes. Ã
As Conferências de Valor APAH
regressam em 2020 dando continuidade
ao círculo virtuoso de partilha do conhecimento
e boas práticas, sendo composto por duas
conferências:
• Hospital Verde | Modelos de gestão para
a sustentabilidade
Data a anunciar brevemente
• Os profissionais | Potenciar pessoas
Costa da Caparica, 16 e 17 de outubro de 2020
Pode ver a reportagem fotográfica da Conferência em:
https://justnews.pt/galeria/album/7a-conferencia-de-valor-da-
-apah-braga
70 71
GH Iniciativa APAH | fórum do medicamento 2019
Resultados do "Índex
Nacional do Acesso
ao Medicamento
Hospitalar" em debate
A
11ª edição do Fórum do Medicamento,
uma iniciativa da Associação
Portuguesa de Administradores
Hospitalares (APAH) com o apoio
da AstraZeneca, teve lugar a 15 de
novembro de 2019 subordinada ao tema “Equidade,
Efetividade e Sustentabilidade no acesso à inovação”
voltando a ser presidida por Francisco Ramos, Administrador
Hospitalar e sócio n.º 32 da APAH.
Mais uma vez a iniciativa trouxe até nós o estado
da arte nacional e na Europa apresentando por um
lado os “Contributos para a construção de uma Via
Verde do Pulmão” a cargo de António Araújo, Presidente
do Conselho Regional do Norte da Ordem
dos Médicos, e por outro o exemplo holandês para
“A estandardização, benchmarking e trabalho colaborativo
como promotores da melhoria contínua” por
Wouter van Leeuwen, Partner e Diretor da Boston
Consulting Group.
Na edição deste ano do Fórum do Medicamento
houve igualmente espaço para avaliação da equidade
e efetividade no acesso aos medicamentos inovadores
nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde
(SNS), contando para essa análise com a apresentação
pública dos resultados do estudo “Índex nacional
do acesso ao medicamento hospitalar”. Este
estudo, uma iniciativa da APAH e da Ordem dos
Farmacêuticos com o apoio científico da Faculdade
de Farmácia da Universidade de Lisboa, foi realizado
sob coordenação dos Professores Rogério Gaspar e
Sofia Oliveira Martins e teve como objetivos:
• Analisar o nível de acesso ao medicamento hospitalar
e os correspondentes modelos de gestão, mecanismos
de criação de evidência e sistemas de informação
que lhe estão associados;
• Identificar as barreiras e problemas existentes associados
à gestão do medicamento nas unidades hospitalares
do SNS.
Com uma taxa de resposta de 47%, os resultados
referentes ao ano 2018 revelam que o acesso aos
novos medicamentos nos hospitais do SNS está a
ocorrer em todas as fases de aprovação (pré AIM,
AIM sem financiamento e pós financiamento). A esmagadora
maioria dos hospitais (96%) utiliza procedimentos
prévios à introdução de um novo medicamento,
após a decisão de financiamento pelo INFAR-
MED, e para 83% das instituições a inclusão no Formulário
Nacional do Medicamento é condição fundamental
para o desencadear do processo. O impacto
terapêutico e financeiro de um novo medicamento
é avaliado em 83% e 87% das instituições, respetivamente,
e envolve em média 5 orgãos internos no
processo de decisão.
No que concerne aos mecanismos de monitorização
e criação de evidência, 70% das instituições não monitoriza
os resultados das novas terapêuticas, e os resultados
de efetividade e de segurança são avaliados
em apenas 22% e 26% das instituições, respetivamente.
Ao invés, as monitorizações incidem nos dados relacionados
com o consumo e com o número de doentes
tratados.
Relativamente às barreiras ao acesso a “carga administrativa”
é indicada como principal barreira no processo
de aquisição destes fármacos, mas 61% das
instituições aponta também falta de recursos humanos
nos Serviços Farmacêuticos, em particular de farmacêuticos,
e 52% a falta de recursos humanos nos
Serviços de Aprovisionamento.
Os resultados mostram também que 39,1% dos hospitais
têm roturas no fornecimento de medicamentos
todos os dias; 30,4% das unidades dizem que estas roturas
ocorrem semanalmente; e 30% refere que as
roturas ocorrem todos os meses. O problema é considerado
“grave” pela totalidade dos hospitais, e para
26% das instituições, afeta todos os medicamentos.
No entanto, para 30% das unidades este fenómeno
atinge essencialmente os medicamentos que têm genéricos,
e para 44% o problema está restrito apenas
a alguns medicamentos.
O “Índex Global de Acesso à Inovaçãoˮ, que mediu a
percepção dos inquiridos, foi classificado por 65% das
instituições com um valor de 80 a 100%, numa média
de 77%.
Face aos resultados obtidos no “Índex nacional do
acesso ao medicamento hospitalar” a APAH, em sinergia
e consenso com os restantes stakeholders, recomenda
à tutela as seguintes medidas tendentes a mitigar
as iniquidades identificadas:
• Criação e desenvolvimento de mecanismos de avaliação
dos resultados de efetividade e segurança da utilização
dos medicamentos em meio hospitalar;
• Definição de tempos mínimos de acesso a terapêu-
ticas inovadoras à semelhança dos restantes serviços
de saúde (consultas, cirurgias, MCDTs);
• Necessidade de uniformização/convergência dos
procedimentos internos nos hospitais por forma a reduzir
tempos de acesso e carga burocrática;
• Fortalecimento dos recursos humanos nos Serviços
Farmacêuticos e dos Serviços de Aprovisionamento dos
hospitais e investimento na formação e conhecimento
destes profissionais na medição de resultados. Ã
Pode ver a reportagem fotográfica do Fórum em:
https://justnews.pt/galeria/album/forum-do-medicamento-2019
72 73
GH Iniciativa APAH | Prémio Healthcare Excellence 2019
prémio distinguiu
projetos inovadores
em saúde
Margarida França
Presidente do Júri Prémio Healthcare Excellence
O
Prémio Healthcare Excellence é
uma iniciativa da Associação Portuguesa
de Administradores Hospitalares
(APAH), em parceria com
a biofarmacêutica AbbVie, que visa
distinguir projetos de melhoria da qualidade dos
serviços que tenham produzido uma melhoria do
acesso, da eficiência, da segurança, ou dos resultados
obtidos na prestação de cuidados de saúde. Projetos
que procuram superar limites, que revelam ser verdadeiros
casos de sucesso com ganhos relevantes para
os doentes. São, muitas vezes, ideias aparentemente
simples, fáceis de adaptar, que exigem pouco ou
nenhum investimento financeiro, mas que geram um
elevado retorno quer para a sustentabilidade do Serviço
Nacional de Saúde (SNS), quer para o bem-estar
dos doentes e das suas famílias.
A edição 2019 do Prémio Healthcare Excellence recebeu
um total de 12 candidaturas, provenientes de
norte a sul do país, de entre as quais foram selecionadas
pelo Júri 6 candidaturas para apresentação pública
na Reunião Final do Prémio, que decorreu no
passado dia 18 de outubro de 2019 em Braga. Entre
os finalistas estiveram projetos do Centro Hospitalar
Universitário de Lisboa Central, Centro Hospitalar
Universitário de Lisboa Norte, Centro Hospitalar
Universitário de Coimbra, Hospital de Vila Franca de
Xira e da associação “Aldeias Humanitar”.
A avaliação dos projetos teve como critérios a inovação
e a replicabilidade, e esteve a cargo do Júri presidido
por mim e constituído por Maria José Costeira
(médica neonatologista do Hospital Senhora da Oliveira
Guimarães), Dulce Salzedas (jornalista da SIC) e
Ricardo Mestre (vogal do Conselho Diretivo da Administração
Central do Sistema de Saúde).
O Prémio Healthcare Excellence 2019 foi atribuído
à associação de solidariedade social “Aldeias Humanitar”.
Criada em 2017, a associação “Aldeias Humanitar”
pretende combater o isolamento e abandono
provocado pela desertificação demográfica nas regiões
do interior através da integração de cuidados
de saúde e da prestação de apoio social. Implementado
em Sernancelhe e Penedono, distrito de Viseu,
o projeto tem a ambição de crescer para outras
regiões do interior do país. A atuação das “Aldeias
Humanitar” começa com a identificação das necessidades
das pessoas em situação de carência e com
uma avaliação do seu grau de dependência e do seu
estado de solidão. Numa segunda fase, a organização
desenvolve um plano de intervenção individual
e mobiliza as respostas já existentes na comunidade,
nomeadamente as instituições, o município e o
próprio SNS. Nos casos necessários, são prestados
cuidados ao domicílio, que envolvem, por exemplo,
a gestão do regime terapêutica e da doença crónica,
formação sobre alimentação adequada e estratégias
de prevenção de quedas. O projeto, que pretende
envolver profissionais de saúde e comunidade, sugere
ainda a criação da figura de auxiliar comunitário, que
teria como função apoiar as pessoas sozinhas, mas
também cuidadores.
Devido à elevada qualidade dos trabalhos finalistas da
6.ª edição do Prémio Healthcare Excellence, o Júri decidiu
ainda atribuir duas menções honrosas. A primeira
menção honrosa foi atribuída ao projeto “C-Free
Team na Microeliminação da Hepatite C” do Centro
Hospitalar Universitário de Lisboa Norte. O projeto
desenvolvido por uma equipa multidisciplinar tem
levado o hospital para a comunidade, com o objetivo
de contribuir para a eliminação da hepatite C até
2030, meta da Organização Mundial de Saúde. Além
do trabalho feito com várias organizações de base
comunitária, a “C-Free Team” desenvolveu também
uma parceria com o Estabelecimento Prisional de Lisboa.
Ao levar os cuidados de saúde para a prisão,
o projeto tem permitido poupar nas deslocações ao
hospital, limitar a exposição dos reclusos, combater
o estigma e aumentar a adesão ao tratamento numa
população onde a incidência da hepatite C continua
a ser elevada.
A segunda menção honrosa foi atribuída ao Centro
Hospitalar Universitário de Lisboa Central (Hospital
Dona Estefânia) com o projeto “Huddle Meeting”
implementado no bloco operatório. A ideia é aparentemente
simples: ao longo da semana os profissionais
de saúde registam num quadro os problemas que
afetam o fluxo de trabalho. Numa reunião semanal
são posteriormente selecionados os três problemas
cuja melhoria acarretará maior beneficio e menor dificuldade
de resolução, sendo definidas as ações de
melhoria. Este processo já permitiu melhorar diversos
processos, como a prescrição da anestesia antes da
cirurgia, a limpeza das salas operatórias e o transporte
dos doentes para o bloco operatório.
Por último, cumpre-me realçar a elevada adesão à
iniciativa Healthcare Excellence e a qualidade dos
projetos apresentados, demonstrativos da dinâmica e
da enorme capacidade das instituições de se reinventarem,
procurando soluções alternativas de organização
do trabalho e respostas inovadoras para melhoria
da qualidade dos serviços prestados. Esperamos
que as iniciativas apresentadas sirvam de inspiração e
que motivem outras instituições de saúde a replicar
os projetos premiados. A excelência, a qualidade e a
inovação na gestão da saúde em Portugal existem e
o Prémio Healthcare Excellence tem constituído um
excelente meio de as evidenciar e divulgar. Ã
Pode ver a reportagem fotográfica da Conferência em:
https://justnews.pt/galeria/album/7a-conferencia-de-valor-da-
-apah-braga/18-de-outubro-495/2
Vencedor Prémio
Healthcare Excellence 2019
“Intervenção Humanitária de Saúde
e Amparo Social”
Aldeias Humanitar - Associação de Solidariedade
Social
1.ª Menção Honrosa
“C-Free Team na Microeliminação
da Hepatite C”
Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte
2.ª Menção Honrosa
“Huddle Meeting - A sustentabilidade
da melhoria contínua Hospital
Dona Estefânia”
Centro Hospitalar e Universitário de Lisboa
Central (Hospital Dona Estefânia)
74 75
GH Iniciativa APAH | MEDICINA DE PRECISÃO
APAH e Ordem dos Médicos
apresentam proposta
de "Agenda Estratégica
para o Futuro da Medicina
de Precisão em Portugal"
A
medicina de precisão é um conceito
cada vez mais na ordem do dia,
até porque nunca como agora foi
tão claro que o estado de saúde de
cada individuo depende de várias
variáveis, incluindo fatores genéticos, comportamentais
e ambientais, que tornam a sua doença e prognóstico
diferente e única. Basta para isso olhar para
os resultados de alguns dos atuais tratamentos: mesmo
doenças como a diabetes, amplamente estudadas,
apresentam taxas de ineficiência de tratamento superiores
a 40%, com perdas de qualidade de vida do
doente e aumento dos custos de tratamento daí inerentes.
Outras, como a artrite, revelam uma ineficácia
na ordem dos 50%, percentagem que sobe no caso
dos tratamentos para a oncologia (75%) 1 .
Porque o mesmo tratamento não serve para todos, a
medicina de precisão consiste numa abordagem para
tratamento e prevenção da doença que abrange desde
a saúde pública aos tratamentos mais sofisticados,
que tem sido apontada inexoravelmente como uma
das estratégias a seguir para a evolução do sistema
de saúde. O discurso comum fala da necessidade em
transformar o paradigma de “tratamento da doençaˮ
para uma visão de "prevenção e promoção da saúde”.
Qualquer profissional da área da saúde concorda que
o caminho passa por melhorar os ganhos em saúde e
reduzir o desperdício, seja em custos administrativos,
em diagnósticos inadequados, na sobre-prestação de
cuidados ou na adopção de tratamentos sub-ótimos.
A nível económico, isso significa uma utilização racional
e eficiente dos recursos disponíveis, diminuindo o
desperdício e custos associados a tratamentos ineficazes
e respetivos efeitos secundários. Sendo simples
proclamar vontades, mais difíceis são as suas concretizações.
Para um sistema de saúde centrado nas necessidades
de cada cidadão mas igualmente sustentável,
é necessário um compromisso e investimento
que promova o progresso nesta área da medicina.
Cientes dos desafios a Associação Portuguesa de Administradores
Hospitalares (APAH) e a Ordem dos
Médicos (OM) com o apoio técnico da EY, apresentaram
a 11 de dezembro de 2019, uma proposta de
“Agenda Estratégica para o Futuro da Medicina de Precisão
em Portugalˮ, resultado de um trabalho conjunto
que envolveu mais de 50 personalidades nacionais com
conhecimento relevante na temática e representativas
das entidades reguladoras e financiadores, prestadores
de cuidados de saúde, ordens profissionais e sociedades
científicas, associações de doentes, academia e I&D e indústria
farmacêutica e de dispositivos médicos.
A Agenda Estratégica apresentada propõe 5 objetivos
estratégicos e orientações para a implementação de um
Plano de iniciativas entre 2020 e 2023, prazo no qual se
inclui a realização de dois projetos-piloto, em instituições
hospitalares do SNS: um deles terá como foco a integração
dos dados de saúde (clínicos e genómicos) e
o desenvolvimento de algoritmos de suporte à decisão
clínica; o segundo projeto-piloto terá como objetivo
principal assegurar o acesso dos cidadãos a tratamentos
personalizados e o desenvolvimento de um modelo
de financiamento sustentável.
Nesta agenda são apresentados 5 objetivos e várias
orientações estratégicas:
• Melhorar os resultados clínicos através do acesso
equitativo a cuidados de saúde personalizados, através
da promoção do acesso a diagnósticos e tratamentos
inovadores e capacitar centros para darem resposta
a tratamentos inovadores;
• Guiar a prática clínica através de Real-World Data,
através do estabelecimento de uma política nacional de
dados em saúde, investimento numa plataforma integradora
de dados e ferramentas de apoio à decisão clínica,
e caracterização molecular focada em subgrupos
da população;
• Garantir a sustentabilidade financeira na implementação
de medicina de precisão, através da criação de
uma estratégia de atração de investimento em infra-
-estruturas, e alargamento do pagamento de cuidados
de saúde com base em resultados;
• Aumentar a capacidade de Portugal para desenvolver
inovação na área de medicina de precisão, através
da promoção da inovação e fomento da colaboração
nacional e internacional nesta área;
• Reforçar a participação do cidadão na sua saúde, através
da promoção da literacia em saúde e medicina de
precisão, e desenvolvimento de estratégias para o empoderamento
dos cidadãos como agentes da sua saúde.
À semelhança de outras iniciativas, também nesta matéria
a APAH propõe medidas concretas para a melhoria
da organização e gestão dos cuidados de saúde
em Portugal, tendo como expectativa que o desenvolvimento
da medicina de precisão passe a integrar
a agenda do Ministério da Saúde. Ã
1. Personalized Medicine Coalition, “The Personalized Medicine Report” (2017).
76 77
MARCA A AGENDA
A Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH) promoveu e apoiou as seguintes iniciativas (outubro - dezembro 2019):
Conferência “Investir em saúde - Financiar anos de vida”
| 4.ª Edição
2 de outubro de 2019, Pavilhão do Conhecimento - Lisboa
A APAH deu o seu apoio institucional à 4.ª edição desta Conferência
uma iniciativa da Janssen e Jornal de Negócios.
Jornadas de Medicina Interna da ULSAM | 3.ª Edição
11 e 12 de outubro, Viana do Castelo
A APAH foi representada na ocasião pelo seu Vice-Presidente,
Del-fim Rodrigues, que participou na Mesa Redonda dedicada à
sustentabilidade do SNS.
Congresso Nacional de Urgência | (Re)Pensar a Urgência
nos 40 anos do Sistema Nacional de Saúde
11 a 13 de Outubro, Teatro Municipal de Portimão - Portimão
A APAH, através do seu vogal da Direção Xavier Barreto, participou
na 5ª edição do Congresso Nacional de Urgência, uma iniciativa
do Núcleo de Estudos de Urgência e do Doente Agudo da Sociedade
Portuguesa de Medicina Interna (SPMI).
Congresso Nacional de Executivos da Saúde | CBEXs
15 de outubro, São Paulo - Brasil
Presidente da APAH, Alexandre Lourenço, participou como orador
convidado no Congresso Nacional de Executivos da Saúde, uma
iniciativa do Colégio Brasileiro de Executivos de Saúde (CBEXs).
Prémio Healthcare Excellence | Reunião Final de eleição
do Vencedor 2019
18 de outubro de 2019, Hotel Vila Galé Collection - Braga
A APAH e a AbbVie promoveram a 6.a edição do Prémio Healthcare
Excellence com o objetivo de distinguir a excelência na gestão
de unidades de saúde, reconhecendo as boas práticas no domínio
da melhoria do serviço aos utentes, promovendo a sua partilha e
incentivando a sua consolidação.
7.ª Conferência de VALOR APAH | Modelos de gestão
centrados no cidadão e na comunidade
18 e 19 de outubro de 2019, Hotel Vila Galé Collection - Braga
Inserido no Ciclo de Conferências de Valor APAH 2019 esta foi a 2.ª
de duas conferências que decorrem em 2019.
C-Health Congress 2019 | Singularidade na Saúde
22 de outubro de 2019, Centro Cultural de Belém - Lisboa
A APAH participou no C-Health Congress 2019, uma iniciativa da
IFE by Abilways dedicado à temática Saúde “Singularidade na Saúde”,
tendo sido representada por Teresa Magalhães, Coordenadora
do Grupo de Trabalho para a Gestão da Informação.
Think Tank “O Despertar de um sonho” | “A tecnologia
e a sustentabilidade em Saúde: Transformar a relação
com o cidadão”
29 de outubro de 2019, Microsoft - Parque das Nações, Lisboa
A APAH participou na iniciativa, inserida nos 40 anos do SNS, através
do seu Grupo de Trabalho para a Gestão da Informação em Saúde.
Novos Modelos de Contratação Pública | Que Futuro
para a Gestão Hospitalar?
5 de novembro de 2019, AESE Business School, Lisboa
Este seminário teve o apoio institucional dos SPMS e a parceria da Siemens
Healthineers e deu especial destaque à análise das questões
mais relevantes associadas com a contratação plurianual na saúde
promovendo a discussão e partilha de experiências.
Medicina e Administração de Serviços de Saúde | Conferência
“Informática no hospital”
7 de novembro de 2019, SRNOM - Porto
As Conferências “Medicina e Administração de Serviços de Saúde”
são uma parceria entre a APAH e a Sessão Regional Norte da Ordem
dos Médicos (SRNOM). Nesta edição esteve em discussão a
“Informática no Hospital”. A APAH foi representada por Rita Veloso
do Grupo de Trabalho para a Gestão da Informação em Saúde.
43.º World Hospital Congress | “People at the heart
of health services in peace and crisis”
7 a 9 de novembro de 2019, Muscat - Oman
O 43.º World Hospital Congress, é uma organização da International
Hospital Federation (IHF), que contou com o apoio da APAH e
a participação do seu Presidente, Alexandre Lourenço, em diversas
mesas redondas no decurso do programa.
Convenção Nacional da Saúde I “Saúde: a prioridade
da Legislatura”
12 de novembro de 2019, Reitoria da Universidade NOVA de
Lisboa - Lisboa
APAH participou na Convenção Nacional da Saúde, sendo representada
pelo Presidente da Direção Alexandre Lourenço. Nesta edição
estiveram em debate propostas que permitam reforçar o investimento
público na Saúde. Mais informações em: https://cnsaude.pt
INOFARMA: digital + healthcare | Conferência
14 de novembro de 2019, NOVA SBE - Carcavelos
A APAH participou na 1.ª edição da Conferência INOFARMA tendo
sido representada por Teresa Magalhães, Coordenadora do Grupo
de Trabalho para a Gestão da Informação. Mais informações em:
https://www.inofarma.org/
Fórum Diplomacia da Saúde
14 de novembro, Instituto de Defesa Nacional - Lisboa
A APAH apoiou a 2.ª edição do Fórum Diplomacia da Saúde. Nesta
edição estiveram em análise a saúde como direito, respeito por sensibilidades
culturais e as ameaças à escala internacional.
XI Fórum do Medicamento | Equidade, Efetividade e
Sustentabilidade no Acesso à Inovação
15 de novembro de 2019, Centro Cultural de Belém - Lisboa
O Fórum do Medicamento é uma iniciativa anual da APAH com o
apoio da AstraZeneca que visa contribuir para o conhecimento e partilha
de boas práticas na área da gestão da tecnologia medicamento.
A 11.ª edição o Fórum do Medicamento incluiu a apresentação pública
dos resultados do “Índex Nacional do Acesso ao Medicamento
Hospitalar”. Ver reportagem na presente edição.
IV Jornadas de Saúde de Trás-os-Montes e Alto Douro
21 e 22 de novembro de 2019, Chaves
APAH foi representada pelo seu Vice-Presidente, Dr. Delfim Rodrigues,
que na ocasião reforçou a importância da inovação para o reforço da sustentabilidade
e combate ao isolamento e à interioridade no SNS.
Webinars “Transformação Digital na Saúde” | Liderança
digital ENESIS 20-22
10 de dezembro de 2019
A SPMS e a APAH promovem o Ciclo de Webinars “Transformação
Digital na Saúde“ com o objetivo de promover e disseminar o conhecimento,
destacando as oportunidades decorrentes da transformação
digital na saúde. O webinar inaugural deste ciclo foi dedicado à
“Liderança digital” e teve como orador Henrique Martins, Presidente
da SPMS.
Agenda Estratégica para o Futuro da Medicina de Precisão
em Portugal | Apresentação Pública
11 de dezembro de 2019, Ordem dos Médicos - Lisboa
Iniciativa APAH com o apoio institucional da Ordem dos Médicos
e apoio técnico da EY resultado de um trabalho conjunto que envolveu
mais de 50 personalidades nacionais com conhecimento rele-
vante na temática e representativas das entidades reguladoras e financiadores
(incluindo seguradoras), prestadores de cuidados de saúde
(públicas e privadas), ordens profissionais e sociedades científicas, associações
de doentes, academia e I&D e industria farmacêutica e de
dispositivos médicos. Todos os conteúdos apresentados no âmbito
deste seminário estão disponíveis no “Canal APAH - Gestão em
Saúde” no Youtube.
ACADEMIA
EVENTOS +
Deixamos aqui algumas sugestões de eventos futuros em 2020:
EHMA Executive Workshop | “Reconfiguring and leading
the value-based hospital”
11-12 de dezembro de 2019 - Bruxelas, Bélgica
Uma organização da European Health Management Association
(EHMA) que contou com a participou de uma delegação portuguesa,
composta por 10 gestores em saúde. Mais informações em:
https://ehma.org/executive-workshop/
A Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH) promoveu no âmbito da Academia APAH as seguintes iniciativas formativas (outubro - dezembro 2019):
Pathways | Workshop by EIT - Health
Data: 29 de outubro de 2019
Local: Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, Lisboa
Mais informações em: https://apah.pt/noticia/academia-apah-traz-a-portugal-workshop-pathways-by-eit-health/
Como transformar uma trajetória clínica numa cadeia
de valor - O caso da Insuficiência Cardíaca
Seminário APAH + Sociedade Portuguesa de Medicina Interna
(SPMI) + Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar
(APMGF)
ORGANIZAÇÃO APAH
Barómetro dos Internamentos Sociais | 4.ª edição
Iniciativa anual da APAH com o apoio institucional da Sociedade
Portuguesa de Medicina Interna (SPMI) e o suporte técnico
da EY, tem como objetivo monitorizar de forma regular a problemática
dos internamentos inapropriados fomentando ações
conjuntas que minimizem este impacto.
8.ª Conferência de VALOR APAH | Hospital Verde
- Modelos de gestão para a sustentabilidade
Data a anunciar brevemente
Local: Grande Hotel de Luso, Luso
Mais informações em: https://apah.pt/portfolio/conferenciasde-valor-apah/
Prémio Healthcare Excellence | 7.ª Edição | Abertura
das Candidaturas 2020
Data: 01 de maio a 30 de junho de 2020
Mais informações: ver artigo nesta edição e em https://apah.pt/
portfolio/premio-healthcare-excellence/
9.ª Conferência de VALOR APAH | Os Profissionais
- Potenciar Pessoas
Data: 16 e 17 de outubro de 2020
Local: Hotel Tryp Lisboa Caparica Mar, Costa da Caparica
Mais informações em: https://apah.pt/portfolio/conferenciasde-valor-apah/
XII Fórum do Medicamento
Data: 13 de novembro de 2020
Local: Academia das Ciências, Lisboa
Iniciativa anual da APAH com o apoio da Astra Zeneca que visa
contribuir para o conhecimento e partilha de boas práticas na
área da gestão da tecnologia medicamento. Mais informações
Data: 18 de outubro de 2019
Local: Hotel Vila Galé Collection, Braga
Mais informações em: https://apah.pt/noticia/apah-promove-seminario-criar-valor-na-insuficiencia-cardiaca/
Novos Modelos de Contratação Pública | Workshop prático
com Vera Eiró (Nova Direito)
Data: 5 de novembro de 2019
Local: AESE Business School, Lisboa
Mais informações em: https://apah.pt/pec-events/novos-modelos-decontratacao-publica-que-futuro-para-a-gestao-hospitalar/
em: https://apah.pt/iniciativas-projetos/forum-do- medicamento/
CO-ORGANIZAÇÃO APAH
I Conferência de Integração de Cuidados de Saúde
Organização: NOVAsaúde, APAH e PAfIC
Data a anunciar brevemente
Mais informações em: www.apah.pt
Caminho dos Hospitais | Conferência/debate
Organização: APAH em parceria com Hospitais do
SNS e Serviços Regionais de Saúde
Data: Periodicidade Trimestral
Mais informações em: https://apah.pt/iniciativas-projetos/caminho-dos-hospitais/
Webinars “Transformção Digital na Saúde”
Organização: Parceria APAH + SPMS
Data: Periodicidade mensal
Local: Webconferência
Mais informações em: www.apah.pt
Webinars Luso-Brasileiro “Gestão em Saúde 2020”
Organização: Parceria APAH + CBEXs
Data: Periodicidade Trimestral
Local: Webconferência
Mais informações em: www.apah.pt
Medicina e Administração de Sistemas de Saúde
Ciclo Conferências 2020
Organização: Parceria APAH e Secção Regional Norte da Ordem
dos Médicos (SRNOM)
Mais informações em: https://apah.pt/iniciativas-projetos/medicina-e-
administracao-de-servicos-de-saude/
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