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S U M Á R I O
SETEMBRO
05
29
37
39
ENTREVISTA
À MESA COM DONA LÚCIA
BOTELHO
CRÓNICA
JOÃO CASTRO
CRÓNICA
RICARDO SILVA
ENTREVISTA
DIONÍSIO FARIA E MAIA
44
24
49
56
62
64
REPORTAGEM
MUSEU DO TABACO DA MAIA
CRÓNICA
ORDEM DOS ENFERMEIROS DOS
AÇORES
REPORTAGEM
MATA JARDIM JOSÉ DO CANTO
ENTREVISTA
BEL CANTUS
DESTAQUE
FRASES DO MÊS
Refidelização dos
mercados de turismo
MOBILIDADE ELÉCTRICA
Boas Práticas de
gestão de Pesca
Nos Açores 14 NOS AÇORES 23 33
nos Açores
E D I T O R I A L
CAMPANHA ELEITORAL,
REDES SOCIAIS E PANDEMIA
As legislativas regionais
realizam-se já no próximo
dia 25 de outubro e não é
novidade que a campanha
eleitoral, que se inicia no
dia 11 de outubro, não vai
ser realizada nos moldes
habituais. A pandemia obriga
a repensar novas formas
de chegar aos eleitores que
se deslocam às urnas para
escolherem aqueles que
querem que os representem
no parlamento açoriano.
Os partidos já tinham
afirmado essa posição
de cautela e precaução
na salvaguarda da saúde
pública. Mais do que nunca,
as redes sociais têm tido
um papel fundamental. Os
jantares comício e eventos
com aglomeração de pessoas
não parecem estar nos planos
de qualquer partido regional,
pelo possível perigo que isso
possa representar para os
açorianos.
Os social democratas
avançaram, numa
conferência de imprensa, que
irão manter as tradicionais
visitas às freguesias e à
sociedade civil com as
devidas precauções. O
partido socialista também
tinha afirmado que esta
seria uma campanha “mais
imaginativa”, com pequenos
eventos e reuniões. Para
possibilitar a interação
com o eleitor, o PS lançou,
inclusive, uma espécie de
sondagem no Facebook para
a escolha dos novos outdoors
de campanha do partido que
vão ser afixados na Região.
Até então, a Autoridade de
Saúde Regional ainda não
formalizou quais deverão
ser os moldes da campanha
eleitoral, facto que tem
incomodado alguns partidos
pela falta de orientações a
menos de um mês e meio das
eleições.
Mas sabe-se, à partida, que
será realizada não de uma
forma tão intimista com
o eleitor, mas os tempos
obrigam a novas formas
de pensar e de interagir – a
tecnologia, redes sociais e
comunicação social, quer
sejam privados ou públicos –
nunca foram tão necessários
como hoje. Emerge,
assim, uma nova forma de
comunicar e de apelar ao
voto dos partidos, apostando
no digital para interação
entre o possível eleito e o
eleitorado.
FICHA TÉCNICA:
ISSN 2183-4768
PROPRIETÁRIO ASSOCIAÇÃO AGENDA DE NOVIDADES
NIF 510570356
SEDE DE REDAÇÃO RUA DA MISERICÓRDIA, 42, 2º ANDAR,
9500-093 PONTA DELGADA
SEDE DO EDITOR RUA DA MISERICÓRDIA, 42, 2º ANDAR,
9500-093 PONTA DELGADA
DIRETOR/EDITOR RUI MANUEL ÁVILA DE SIMAS CP3325A
DIRETORA ADJUNTA CLÁUDIA CARVALHO TPE-288A
REDAÇÃO CHEFE REDAÇÃO RUI SANTOS TPE-288 A,
CLÁUDIA CARVALHO TPE-288 A, SARA BORGES, ANA SOFIA
MASSA, ANA SOFIA CORDEIRO
REVISÃO ANA SOFIA MASSA
PAGINAÇÃO MÁRIO CORRÊA
CAPTAÇÃO E EDIÇÃO DE IMAGEM RODRIGO RAPOSO E
MIGUEL CÂMARA
DEPARTAMENTO DE MARKETING, COMUNICAÇÃO E IMAGEM
CILA SIMAS E RAQUEL AMARAL
PUBLICIDADE RAQUEL AMARAL
MULTIMÉDIA RODRIGO RAPOSO
INFORMÁTICA JOÃO BOTELHO
RELAÇÕES PÚBLICAS CILA SIMAS
Nº REGISTO ERC 126 641
COLABORADORES ANTÓNIO VENTURA, JOÃO CASTRO,
RICARDO SILVA
CONTACTOS MARKETING@AGENDADENOVIDADES.COM
ESTATUTO EDITORIAL:
A NO É UMA REVISTA DE ÂMBITO REGIONAL (NÃO FICANDO
EXCLUÍDOS OS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA E
COMUNIDADES PORTUGUESAS ESPALHADAS PELO MUNDO).
A NO DISPONIBILIZA INFORMAÇÃO INDEPENDENTE E
PLURALISTA RELACIONADA COM A POLÍTICA, CULTURA
E SOCIEDADE NUM CONTEXTO REGIONAL, NACIONAL E
INTERNACIONAL.
A NO É UMA REVISTA AUTÓNOMA, SEM QUALQUER
DEPENDÊNCIA DE NATUREZA POLÍTICA, IDEOLÓGICA E
ECONÓMICA, ORIENTADA POR CRITÉRIOS DE RIGOR, ISENÇÃO,
TRANSPARÊNCIA E HONESTIDADE.
A NO É PRODUZIDA POR UMA EQUIPA QUE SE COMPROMETE
A RESPEITAR OS DIREITOS E DEVERES PREVISTOS NA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA; NA LEI DE
IMPRENSA E NO CÓDIGO DEONTOLÓGICO DOS JORNALISTAS.
A NO VISA COMBATER A ILITERACIA, INCENTIVAR O GOSTO
PELA LEITURA E PELA ESCRITA, MAS ACIMA DE TUDO,
PROMOVER A CIDADANIA E O CONHECIMENTO.
A NO REGE-SE PELO CUMPRIMENTO RIGOROSO DAS NORMAS
ÉTICAS E DEONTOLÓGICAS DO JORNALISMO E PELOS
PRINCÍPIOS DE INDEPENDÊNCIA E PLURALISMO.
04 NOSET20
Dona Lúcia Botelho
proprietária da “Cozinha d’Avó”
NOSET20 05
E N T R E V I S T A
ENTREVISTA EM
VÍDEO NA VERSÃO
DIGITAL
06 NOSET20
E N T R E V I S T A
Seja bem-vindo à nossa rubrica do “À mesa
com” na Associação Agrícola de São Miguel,
mais precisamente, no restaurante da Associação
Agrícola de São Miguel. E eu tenho comigo uma
doceira de mãos cheias, a proprietária da “Cozinha
d’Avó”, a Dona Lúcia Botelho. É ela a nossa
entrevistada de hoje para uma entrevista doce, uma
entrevista cheia de tradição, uma entrevista com
alma e coração.
Dona Lúcia, seja bem-vinda à nossa rubrica do
“À mesa com”. Eu gostava de saber um pouco
sobre Lúcia Botelho. Como é que começou esse
gosto pela cozinha, pelos doces, pelos biscoitos,
por tudo aquilo que é tradicional e que é tão
bom?
Eu desde criança, quando a minha mãe cozia o
seu pão e a seguir fazia os seus biscoitos caseiros
e era eu que com ela os fazia e já sentia aquele
gosto daquilo que estava a fazer, entretanto, muita
vez dizia à minha mãe que um dia gostaria que a
minha vida fosse fazer bolachinhas, fazer biscoitos.
A vida foi evoluindo, a vida foi crescendo, eu fui
crescendo e sempre com essa continuidade da
parte da minha mãe. Entretanto, tive uma situação
que a 1998 fui contactada por uma senhora, uma
assistente social, em que naquela fase havia um
Programa “Valorizar” e fui convidada para eu
dar formação às senhoras que na altura havia o
rendimento social, que é o rendimento mínimo e
ela perguntou se eu queria dar formação a essas
senhoras, eu disse a ela “senhora, eu não tenho
estudo para dar formação” e ela disse-me assim
“não há problema, eu vou-te ajudar” e eu disse
assim, “se me der ajuda então vamos em frente”. E
nós começámos com esse grupo no Centro Social
e Paroquial do Faial da Terra, ela me dava as chas
para eu rever e ler aquelas chas, sublinhar e aquilo
que eu achava que podia transmitir às senhoras,
aquilo era para que elas soubessem reciclar o resto
do produto alimentar, com o produto que sobrava
para elas poderem fazer outra refeição e aproveitar
a mesma comida. Entretanto, fazia a parte em que
eu sublinhava aquilo que tinha de transmitir a
elas, passava num quadro e elas passavam para um
caderno. De vez em quando, passava a assistente
social com uma amiga minha e elas iam vendo
NOSET20
07
E N T R E V I S T A
o ponto da situação. Nessa mesma altura, foi
formada a Cooperativa Celeiro da Terra, que
fazia parte essa assistente social e essa minha
amiga e quando passou da parte da área da
escrita que elas pudessem fazer refeições, nós
fazíamos as refeições, e aquela refeição que
fazíamos nós distribuímos aquelas refeições
pelos idosos da freguesia, quando terminava
aqueles idosos, nós começávamos outra vez do
primeiro, porque tínhamos de dar a nalidade
àquela refeição que era produzida. E entretanto,
eu sugeri nós fazermos lá umas bolachinhas
e comecei lá a fazer os biscoitinhos de nata
e elas chegaram lá provaram e gostaram e
foram levando aos poucos as bolachinhas para
uma amiga, para outra amiga e começaram
a gostar das bolachas, quando veio a abrir a
Cooperativa Celeiro da Terra, elas foram ter
comigo para que eu selecionasse do grupo
x senhoras para que fôssemos nós a abrir as
portas da cozinha da Cooperativa Celeiro
Terra e fomos nós que fomos para lá. Nós
trabalhávamos só duas horas por dia e nessas
duas horas por dia fazíamos as bolachinhas
em que éramos transportadas do Faial da
Terra, vínhamos nós buscar ao Faial da Terra
uma carrinha que era do projeto “Valorizar” e
depois essa mesma carrinha vinha trazer-nos
ao Faial da Terra e tivemos aí uns anos e aquilo
foi evoluindo, foi crescendo, foi criando outras
novidades de bolachinhas, de biscoitos e de
bolinhos e assim sucessivamente. Chegou-se
a uma altura em que disse que agora vou ver
se consigo fazer a minha empresa. Eu comecei
a fazer a minha empresa na minha própria
casa, na minha casa é que eu tinha tudo aquilo
que eu tenho na cozinha da avó: as minhas
máquinas, o meu fogão, os meus fornos, tudo
era na minha casa até que um dia eu pudesse
reconstruir a casa da minha avó, por isso é a
“Cozinha d’Avó”, porque passou a ser a casa da
minha mãe e eu comprei a casa, reconstrui a
casa com apoio, tive apoio para a reconstrução,
apoio para as máquinas e aí comecei a evoluir
mais e mais variedade.
Qual foi o ano em que fundou a sua empresa?
Eu fundei a minha empresa, eu posso dizer, eu
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E N T R E V I S T A
saí da Cooperativa em 2003 e comecei na minha
empresa, diretamente, e fui trabalhar na minha
casa e comecei a trabalhar, diretamente, na minha
empresa em 2007, fevereiro de 2007. Portanto,
encontro-me na “Cozinha d’Avó”, diretamente,
desde de 2007, com uma grande diferença de
produtos, com muito mais variedade. Tenho vindo
a inovar muito mais produtos e a minha vontade
era inovar mais, mas hoje em dia é muito mais
difícil, estamos numa fase um pouco complicada
e acabo por dizer que aquilo que eu hoje tenho e
sei que tenho e é bom, modéstia aparte, mas criei
o bolo lêvedo e criei a massa por aquilo que eu vi a
minha mãe fazer e fui sempre acrescentando mais
alguma coisa para por da minha mão, portanto
a massa que eu hoje tenho não é a massa que a
minha mãe fazia é a massa da Lúcia.
Muitas são as novidades em termos de biscoitos
que faz para além de fazer para si, com a sua
marca, também alimentam uma outra marca
gourmet, portanto são produtos por si só, se
são escolhidos por essa marca gourmet com
excelente qualidade (e eu que os diga que já os
provei), mas fale um pouco das variedades e
como é que chega às variedades dos biscoitos que
também têm aí o seu quê.
As variedades é o seguinte, supúnhamos que eu
tenho uma certa massa e naquela própria massa
eu começo a aumentar, a diminuir, a acrescentar
mais uma outra variedade ou mais manteiga
ou mais margarina ou mais, supúnhamos,
fruta ou acrescentar as pepitas de chocolate.
Eu experimentei a fazer uma massa e pus as
bolachas de chocolate, como eu lhe expliquei as
de aveia. Isso são coisas que eu vou inovando,
experimentando aos poucos e depois aquilo vai
crescendo e hoje tenho o volume que tenho de
muita variedade de bolachas que são as meninas
dos meus olhos. Quando me perguntam “qual é a
bolacha que mais gosta?”, eu digo “senhora, eu não
posso dizer”, eu sou suspeita, para mim todas elas
são boas. Agora quem decide é o consumidor que
NOSET20 09
E N T R E V I S T A
as compra, quem consome é que tem de decidir
qual a melhor bolacha, não sou eu.
A sua marca, hoje em dia, está também
contemplada com a marca “Açores”. Foi um
projeto longo e um projeto com alguns percalços
na sua vida em termos de saúde, mas uma
mulher que para além de ter as mãos cheias tem
um coração cheio e muita fé no futuro. Contenos
um pouco do que foi segurar este projeto
numa época difícil, inspire no fundo aquelas
pessoas que muitas das vezes passando por
diculdades se vão abaixo e a Dona Lúcia é a
prova que para a frente é que é caminho e no
fundo as coisas têm de se ter um pensamento
positivo e enfrentar o negócio, enfrentar a
vida com olhos diferentes. Quais foram olhos
de enfrentar que a Dona Lúcia enfrentou essa
situação?
Isso é assim, eu sempre tive muita esperança no
amanhã, quero viver o hoje, mas tenho sempre
de pensar no amanhã não foi nada fácil, foi muito
difícil, mas eu tinha sempre aquela vontade que o
amanhã ia ser melhor. Na situação que nós todos
estamos a passar, tive um mês de lay-off, não quis
mais, tive apoio, z todo o percurso que tinha
de fazer para ter o apoio do lay-off, correu tudo
bem, recebi tudo o que tinha a receber e depois
z uma candidatura ao apoio do governo. Fiz essa
candidatura para ter essa almofada para quando a
empresa não conseguisse eu ter aquela almofada
para ser o meu socorro. Fechar a empresa, eu não
conseguia fechar. Eu acho que não sei viver sem ter
aquilo ao meu lado e também tenho lá postos de
trabalho que não os quero mandar embora, gosto
muito deles e não consigo, porque é aquilo que eu
gosto desde de criança. Se é fácil? Não é fácil, tem
muitas diculdades nanceiras, no m do mês
é muito complicado, porque nós temos muitos
impostos para pagar e temos de os pagar sem
faltar, depois preocupa-me muito os vencimentos
dos funcionários porque quem trabalha precisa do
seu ordenado e chega a ser altura do mês e eu já
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E N T R E V I S T A
co a pensar de uma outra maneira, com aquela
preocupação ainda não recebi ou vou receber,
agora como tive o apoio aqui estou mais tranquila
porque tenho onde ir buscar, quando vem do
outro lado das vendas que nós fazemos eu vou
repor na parte que foi do apoio que eu tive. Mas a
situação é que eu não consigo fechar a “Cozinha
d’Avó”, tenho energia, gostaria de inovar e inventar
mais, mas assim não é ter medo é a diculdade
que nós todos estamos a enfrentar e faz com que
a gente tenha um certo receio, quem sabe mais
tarde.
Mas a Dona Lúcia é um projeto vivo, eu não
estou a dizer de maneira nenhuma que não
é uma jovem, porque é uma jovem, mas hoje
em dia os jovens têm muito medo de arriscar.
A Dona Lúcia apesar de já não ser tão jovem
arriscou, criou a sua empresa. Uma empresa
que está no Faial da Terra, no Concelho da
Povoação, e que tem um sucesso enorme.
No ano passado esteve, inclusivamente, na
representação dos produtos da marca Açores, no
Colombo, como é que correu?
A minha estadia no Colombo foi uma estadia que
eu nunca vou esquecer em toda a minha vida. Este
ano nós não vamos poder ir perante a situação que
nós estamos, com muita pena minha. Não foi só
aquilo que eu vendi, foi muito bom porque tudo o
que eu vendi, mas foi também a grande amizade
que eu deixei lá como que mais uma família.
Deixei lá grandes amigas de todo o grupo que lá
tomavam conta de nós, hoje em dia, contactamos,
falamos ao telefone para não perder o contacto
delas, para não perder aquelas recordações que
deixámos. Quando chegou a altura de eu vir
embora, a minha despedida foi com lágrimas. Este
ano tenho pena, mas quem sabe para o ano, se
Deus quiser, lá estaremos.
A sua marca já é conhecida em muitos pontos do
globo sendo um deles carismático, conte-nos um
pouco dessa história?
É o seguinte, eu estava com a marca Açores no
NOSET20 11
E N T R E V I S T A
Colombo quando chega junto de mim um senhor
com o seu telemóvel e mostra-me a fotograa
da imagem do meu rótulo, do meu produto e
perguntou-me se eu conhecia aquela imagem e
eu disse “senhor isso é a minha imagem, isso é a
imagem do meu produto e isso é o meu produto”
e ele diz-me “mas a senhora sabe onde é que eu
comi essas bolachinhas, estas bolachinhas eu
comi-as em Roma”. E isso deu-me uma sensação
tão forte dentro de mim que eu nunca mais vou
esquecer, porque eu nunca imaginei que a minha
bolacha fosse para Roma, que chegasse a Roma e
para mim foi uma alegria muito grande. O senhor
também estava muito satisfeito, comprou levou
umas quantas embalagens da bolacha de aveia,
foi a bolacha de aveia que ele comeu em Roma
e isso para mim foi fascinante depois de tudo de
fascinante que eu lá tive, isso também foi uma
coisa que me marcou muito. A seguir apareceume
um senhor como a mesma imagem no saco do
bolo lêvedo e dize-me assim “a senhora conhece?”
e eu disse “conheço sim senhor, essa é a minha
imagem, mas eu já não tenho”, mas uma senhora
ao lado disse “há ali mais ao lado outros bolos” e
ele disse “mas não, eu quero é estes”, isso orgulhame.
Diga-me uma coisa Dona Lúcia, neste momento
onde é que podemos encontrar os produtos da
“Cozinha d’Avó”? Quais são os estabelecimentos?
Primeiro, gostaria de saber quais são os
estabelecimentos para que todos aqueles que
nos estão a ouvir ou ler possam saber onde
encontrar estes deliciosos produtos, depois
como encomendar, se for dos Estado Unidos, do
Canadá, como é que chegam à Dona Lúcia?
Se for dos Estados Unidos, do Canadá eu por
enquanto eu não tenho meios de chegar lá, a
não ser que de lá para cá me contactem pela
imagem do rótulo ou para o meu email se por
acaso conseguirem (luciabotelho.cozinhadaavo@
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E N T R E V I S T A
gmail.pt). Tenho em Lisboa, tenho no mercado
dos Açores, tenho no Porto, no mercadinho dos
Açores, e tenho numa outra loja que vem a ser de
uma marca que é da Ribeira Grande, do licor de
maracujá, elas têm umas quantas lojas lá e também
tenho lá todo o meu produto.
E aqui, nas grandes superfícies, onde é que nós
podemos encontrar, ou nos mercados?
Aqui nas grandes superfícies tem nas lojas
do Solmar, tem nas lojas Continente, tem nos
MeuSuper, também tenho em algumas lojas em
Ponta Delgada, como no Manteiga e tenho nas
Casas Cheias, que têm uma variedade de lojas e
têm lá os meus produtos e sempre que me pedem
eu faço sempre o possível de os servir e co feliz
quando me telefonam a pedir.
Dona Lúcia, foi um gosto tê-la connosco na nossa
entrevista do “À mesa com”. Esperamos voltar
a vê-la em breve, mais não seja nessas feiras
por aí quem sabe no Colombo numa próxima
vez, mas vamos voltar possivelmente muito em
breve in loco, ou seja, na casa onde está o fabrico
todos destas maravilhosas iguarias e doçarias
na “Cozinha d’Avó”. Quanto a nós, é tudo, muito
obrigada por estar desse lado, por nos estar a ver
ou a ouvir ou a ler. Até à próxima.
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NOSET20
13
R E P O R T A G E M
Refidelização do mercado
de turismo nos Açores
SOFIA CORDEIRO
O segundo webinar dinamizado pela Bensaude
Hotels Collection foi dedicado a todos os
prossionais da área hoteleira. Desta forma, o
tema foi a “Redelização dos Mercados Emissores
para os Açores”, sobre o qual se discutiu o
panorama dos mercados emissores dos Açores.
Moderado por Pedro Salazar, Diretor Comercial
da Bensaude Hotels Collection, o webinar
contou com os convidados: Pedro Morgado,
Managing Director da AbreuEvents, Catarina
Cymbron, Managing Director da MeloTravel e
Luís Nunes, Co-Owner e CEO da Inovtravel /
AzoresGetaways.
Este webinar fala sobre os mercados emissores
dos Açores e o que podemos esperar na atual
conjuntura, porque “estamos numa situação
completamente inédita de completa paragem
(…) portanto, também não entram reservas,
também não chegam clientes e, portanto, a ideia
da redelização é porque nós achamos que neste
contexto é bom contar com aqueles que já nos
conhecem, a verdade é essa, e que sabemos de
que gostam de nós e gostam dos Açores e gostam
daquilo que temos para oferecer”.
Numa primeira abordagem, questiona-se se estes
mercados já delizados podem ajudar os Açores
na retoma e se serão os mesmos segmentos assim
como os canais de venda.
O Managing Director da AbreuEvents revela
que acha que “nós temos que contar com todos
os mercados e naturalmente que os mercados
que já conhecem os Açores, (…) mas que
naturalmente que os mercados que são os
mercados tradicionais dos Açores a começar pelo
mercado nacional atualmente, vão ser e terão de
ser os primeiros mercados a reagir. Aquilo que
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R E P O R T A G E M
nós não podemos esquecer é que esta pergunta
que os Açores estão a fazer hoje é a pergunta que
o mundo todo está a fazer, nós não estamos numa
crise de venda para os Açores, não estamos a falar
de uma crise de venda para Portugal, estamos
numa crise de venda para todos os destinos no
mundo, ou seja, todos os destinos no mundo
vão esgrimir nesta fase e muitos já estão a fazer,
todos os argumentos possíveis para atrair clientes,
desde logo, os clientes que se movem no chamado
mercado doméstico e depois naturalmente os
mercados emissores de mais proximidade ao
destino”.
Em relação à questão dos segmentos e em relação
aos grupos (...) “nós perante uma situação das
nossas vidas prossionais que é completamente
nova e que portanto, não há aqui verdades
absolutas é preciso ir percebendo os clientes, é
preciso ir percebendo o que é que temos de fazer,
aquilo que nós sabemos e todos nós estamos
aqui é que as condicionantes a nível de saúde
pública, a nível da imposição que tem que haver
para que esta pandemia se mantenha a nível
controlado, porque o pior que nos pode acontecer
é voltar atrás, é o pior que pode acontecer, neste
momento, a qualquer um de nós, é voltar a trás,
voltar a um connamento e, portanto, aquilo
que nós sabemos é que os mercados de grupos,
de forma geral que não quer dizer que não haja
grupos conrmados ainda este ano de qualquer
destino em Portugal, nomeadamente, para os
Açores, mas aquilo que se passa é atrasar a vida,
ou seja, mudar para 2021 algumas situações para
2022. (…) Eu trabalho na empresa com a maior
rede de distribuição própria em Portugal e aquilo
que eu não tenho dúvida nenhuma é que o agente
de viagens seja o português, seja o espanhol,
enm, o agente ou o consultor de viagens como
hoje em dia nós chamamos vai ter um papel
fundamental nesta fase, porque as pessoas estão
inseguras, as pessoas não sabem bem o que fazer
ou onde ir, querem saber mais das situações nos
vários destinos e seguramente que vão consultar
mais as agências de viagens e que vão depender
mais das agências de viagens. Naturalmente todos
os outros canais vão funcionar: os online, as redes
sociais, enm, tudo vai funcionar, eu acho que
aqui o atendimento presencial ao cliente pode vir
fazer a diferença do ponto de vista de delização
do cliente, orientação de compra a esse cliente”.
Catarina Cymbron diz que os “mercados
delizados e como o Pedro dizia senão forem
aqueles que já trabalham connosco com quem
é que iremos contar para o futuro? Portanto,
todos os mercados que já vendem Açores e
agora falando, principalmente, nos mercados
europeus e internacionais que já trabalham
há muito tempo são esses que vão continuar a
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R E P O R T A G E M
ser os nossos clientes nestes próximos tempos tão
difíceis para todos, porque como sabemos estamos
todos na mesma posição. Toda agente quer turistas
e nós vamos ter de nos agarrar àqueles com quem
já trabalhámos. Portanto, nós temos, em termos de
grupos, em junho está tudo cancelado, a partir de
meados de agosto, setembro e outubro ainda temos
os grupos praticamente ativos, mas sem saber o que
se vai passar, porquê? Porque a maior parte do grupo
de clientes, de público-alvo que vem nos grupos são
pessoas seniores. Os seniores têm uma vantagem,
são pessoas reformadas e não são abrangidos pelas
leis de lay-off como está a população ativa, mas
por outro lado como são um grupo de risco os
governos recomendam a não viajar e, claro que tem
havido bastantes cancelamentos. Um dos pontos
muito importantes e que por colaborador nós não
trabalhamos em cima da hora o segmento de grupos
trabalha sempre muito mais há frente, as pessoas
inscrevem-se, têm os deadlines de cancelamento
de quartos que, neste momento, é uma grande
incógnita e é isso que nos pedem e nós pedimos
aos parceiros é a grande exibilidade para gerirmos
toda a parte de grupos, porque o operador, neste
momento, não está em posição de assumir qualquer
tipo de custo que advenha de cancelamentos tardios
de clientes, porque sabendo que são clientes de
mais idade e por qualquer razão não poder viajar
e, portanto, esta comunicação de demonstrar o
nosso apoio a estes operadores de grupos, nesta
fase, é muito importante. Os hotéis, os fornecedores
que nos ajudarem compreendem a situação deles é
importante para que se possa, eventualmente, um
grupo de 20, vir um grupo de 10 ou de oito nós
dizemos: sim, avançamos com as mesmas condições
e que venham as pessoas, porque é isto que se
pretende. Penso que em 2020 é conseguir salvar o
pouco que ainda temos senão falando de retoma isso
só para 2021. Este é o cenário, os segmentos se serão
os mesmos ou não? é um pouco difícil de prever,
mas sim prevemos que grupos vai haver uma grande
diminuição e os individuais o que temos tido de
pedidos? Nós temos vários operadores que vendem
a longo curso, em princípio, este ano, a longo curso,
os clientes vão car mais perto de casa senão zerem
turismo interno vão para lugares na Europa que não
sejam muito longe e que as acessibilidades não sejam
muito complicadas. Estes operadores estão à procura
16 NOSET20
R E P O R T A G E M
de destinos novos na Europa e nos Açores para
eles aparece como um destino ideal, porque tem
pouca gente, tem uma natureza muito bonita, é
autêntico e tem vindo com pedido de programas
para individuais, em privado, portanto, eles
querem se preparar para clientes que queiram
ir em privado, portanto, nota-se que há procura
para destinos como os Açores em vez de destinos
mais longínquos”.
E quanto aos canais de venda, “devido a esta
crise também muita gente percebeu que fazer
uma reserva através de uma agência de viagens
tradicional já é uma grande segurança, porque
comprando numa agência, se o cliente estiver na
Ásia ou em Marrocos e aparecer uma pandemia
nós vamos fazer de tudo para trazer os clientes
para cá, ninguém deixa clientes lá fora, isto é tudo
a custo do operador. Nós temos o dever de ajudar
e de reembolsar os clientes e para nós pode ser
um argumento importante. Também acho que
isto não vai mudar, a maneira do cliente comprar
vai ser o cliente que está habituado a comprar
numa OTA e fazer as suas próprias férias, ir lá e
comprar irá fazer os outros que estão nas agências
tradicionais comprar nas mesmas, o que pode
acontecer é não irem sicamente à agência. Nós
temos clientes aqui no outgoing dos Açores que
já são nossos clientes há muitos anos, ligam,
perguntam, fazem a reserva e enviamos por email
nem vão à agência. Portanto, a comunicação e o
canal vai ser igual o modo de comprar. Ficamos
com receio de sair de casa e fazemos tudo online,
mas isso também já as agências fazem, por isso o
modo e a distribuição vai se manter”.
Luís Nunes partilha da ideia de que “no caso
dos Estados Unidos e do Canadá as coisas
realmente são bastante diferentes daquilo que
acontece na Europa. Nesta fase de notoriedade
NOSET20 17
R E P O R T A G E M
do destino Açores naqueles dois mercados,
porque são mercados onde eu diria que,
neste caso, infelizmente, em especial nesta
conjuntura, a operação turística ainda não é tão
relevante quanto poderia ser, ou seja, mesmo
no Canadá onde os meios tradicionais têm
bastante importância, ainda não há uma grande
presença de operadores daqueles mercados a
vender os Açores e neste momento signica
que temos menos parceiros naqueles territórios
que nos possam ajudar manter o destino
como um diferencial para as viagens a curto
prazo. Por outro lado, também temos a sorte
de conseguirmos chegar a muito mais pessoas
através da internet, portanto, o nosso negócio
assenta na venda de pacotes de viagem ao cliente
nal e isso também nos dá alguma exibilidade
para a Europa. Também não é tão fácil conseguir
na medida em que estava com os americanos a
um grande nível de conança nas compras online
isto tem a ver com o tamanho e com o grau
de proteção que conferem aos clientes norteamericanos
e a verdade é que, por um lado, sinto
que nós não temos ainda estes dois mercados
como mercados especializados aos Açores. É
verdade que são mercados que têm acrescido
muito nos últimos anos, em especial, os Estados
Unidos e agora o Canadá estavam a começar a
descolar em especial em janeiro e fevereiro deste
ano, já estávamos a registar um aumento muito
signicativo no número de canadianos, mas a
verdade é que são clientes que vêm aos Açores
como podem ir para qualquer outro destino para
mais numa altura que haverá uma concorrência
muito forte de outros destinos, nomeadamente,
ao nível do preço que invariavelmente tenderá a
cair o que para nós é péssimo em todos os níveis,
porque nós não vamos ter nem de perto nem
de longe os volumes que estávamos habituados
vindos do Canadá e agora cada vez mais dos
Estados Unidos, portanto, para ser sincero estou
muito preocupado em relação aos próximos
tempos naquilo que serão as nossas vendas nos
mercados, porque mesmo que exista muita
vontade por parte dos americanos e canadianos a
viajar para os Açores. A verdade é que enquanto a
taxa de contágio naqueles dois países não estiver
controlada na Europa, nós não iremos permitir
18 NOSET20
R E P O R T A G E M
que venham turistas para os Açores, para Portugal
e para o resto da Europa. Portanto, nós temos
de olhar para isso desta forma e decidir que se
calhar não faz sentido nos próximos seis meses
investir muito em comunicação naqueles dois
mercados ou podemos fazer exatamente o oposto
independentemente de sabermos ou não quando
é que as coisas vão reabrir, podemos mudar a
mensagem e garantir que pelo menos as pessoas
vão receber alguma informação sobre o destino
Açores. A verdade é que os Açores acabam por
ser ainda um mercado completamente mínimo,
um destino onde a maior parte das pessoas dos
Estados Unidos e Canadá ainda não conhece o
que signica que se nós quisermos ver isto pelo
copo meio vazio vamos ter de esperar um tempo
para voltar a ter turistas daqueles mercados.
Estamos a falar de um milhão duzentos mil
no país inteiro que contrasta com 56 mil nos
Açores, portanto, há, efetivamente, alguma
notoriedade da marca Portugal que pode ser
usada a favor dos Açores e há também aqui um
conjunto muito grande de turistas americanos
que já foram à Islândia, que teve uma quebra de
três por cento em 2019, e ainda assim teve perto
de meio milhão de americanos e estes clientes
com faixas etárias mais jovens eventualmente
com empregos qualicados que possam não ter
sido muito afetados agora nos lay-offs. Portanto,
há oportunidades, mas acima de tudo aqui a
preocupação é de saber quando é que conseguiu
resolver o seu problema de saúde pública, porque
apesar do Canadá ter uma política muito mais
conservadora do que os Estados Unidos a verdade
é que partilham uma enorme e importantíssima
fronteira terrestre que deverá ser aberta a 21 de
junho. Portanto, do ponto de vista mesmo da
perceção dos açorianos e dos portugueses e dos
europeus poderá haver um receio na abertura
dos voos para o Canadá por via desta parte
da fronteira terrestre com os Estados Unidos
que está como nós sabemos. Portanto, há aqui
muitas incógnitas. Nós não temos variáveis que
controlamos, temos que nos focar naquilo que
nós nalmente conseguimos controlar. Do ponto
de vista da comunicação ao menos há aqui uma
notícia positiva que andamos a fazer aqui alguns
testes, os custos de comunicação nas redes sociais
NOSET20 19
R E P O R T A G E M
no google está muitíssimo mais baixo. Há aqui,
apesar de tudo, esta janela de oportunidade de
gerarmos leads em vez de vendas e gerarmos
ainda mais notoriedade numa altura em que as
pessoas estão mais em casa e que passam mais
tempo online, mas no curto prazo nós todos aqui
nos Açores temos que nos mentalizar que estes
dois mercados, em particular, os Estados Unidos,
mas tudo falta bastante do Canadá, porque esse
mercado é muito mais pesado, mas com enorme
potencial e é um enorme potencial no mercado
nacional. Nós temos um terço dos canadianos em
relação ao número de turistas americanos, mas é
um país com quase dez vezes menos população,
o que signica que há muito mais apetência dos
canadianos, em média, do que dos americanos a
virem a Portugal, portanto, há uma margem para
crescer no Canadá, mas vamos aguardar pelas
decisões das autoridades de saúde nacionais e
europeias para percebermos o que conseguimos
fazer no imediato”.
Numa ótica de oportunidade, como se explora
a ideia de mercados que podem reagir mais
rápido e que tipo de perl terão? Outras questões
serão das esperas nos aeroportos, viajar para
Lisboa e depois vir para os Açores, mas que
pode estragar mercados, como por exemplo, o
mercado francês que tem alguma tradição está
realmente delizado nos Açores. A questão da
sazonalidade “é muito criticada nos Açores” e bate
com a questão das pessoas reformadas que são
aquelas com “mais disponibilidade” para viajar
fora de época e “estamos aqui numa fase que vai
ser realmente difícil recuperar este segmento
de mercado e há formas de contornar isto? mas
conseguimos encontrar aqui oportunidades e os
Açores têm argumentos sucientes para explorar
este segmento de mercado e dar-lhes outra
conança e segurança?”.
Pedro Morgado responde que “os Açores têm de
estar bem servidos de transporte aéreo, pois é a
única forma de as pessoas chegarem aos Açores,
em primeiro lugar. Em segundo lugar, é aquilo
que faz a diferença sobretudo quando estamos
20
NOSET20
R E P O R T A G E M
a falar em alargar a nossa oferta de transporte
aéreo para os Açores é aquilo que se chama a
competitividade do destino”, porque “é crucial que
os Açores trabalhem com as companhias aéreas
no sentido de conseguir fazer com que as pessoas
possam chegar aos Açores e de preferência voos
diretos. Nós temos situações de pessoas que
têm de car em Lisboa ou na ida ou na volta,
porque não conseguem ligação no próprio dia,
isto, do nosso ponto de vista, as pessoas fazem
dois destinos por um, mas sem dúvida é um
fator negativo na venda, porque vai implicar que
uma pessoa do grupo que mais uma noite em
Lisboa e que menos uma noite nos Açores de
forma geral e, portanto, acaba aqui por penalizar
o destino Açores. Os mercados dos Estados
Unidos e do Canadá são mercados estratégicos
para além do mercado Europeu, mas para isso
temos de ter uma malha aérea que sirva não só
a costa leste, mas que a partir da costa leste seja
alimentada com outros voos dos Estados Unidos
como a cidade de Boston ou Nova Iorque seja
usado como UP para chegar aos Açores em voo
direto e sem resolvermos esta situação não há
mercado americano, porque os americanos não
vão num voo para Lisboa para depois voltar para
trás para vir para os Açores e a malha aérea em
ligação a outros pontos da Europa acho que é
absolutamente fundamental”.
Em relação ao mercado sénior, “é o segmento
mais castigado pela pandemia. (...) O destino
Açores serve o segmento de seniores com gente
ativa, gente que gosta de estar na natureza,
gente que gosta de fazer as suas caminhadas,
é um segmento que ajuda e sempre ajudará a
quebrar a sazonalidade, mas este é, sem dúvida,
um segmento a trabalhar. O que eu sinto é que
o segmento que vai responder mais rápido é o
de família, ou seja, todos os mercados estão na
espectativa para ver o que vão fazer, nós sabemos
que os alemães, como fazem parte do seu ADN
estão muito cautelosos, sabemos que os franceses
e os italianos estão ‘muito feridos’ deste período
do ponto de vista da saúde como do nanceiro.
NOSET20 21
R E P O R T A G E M
Os espanhóis estão desesperados e as fronteiras
de Espanha ainda vão estar mais umas semanas
sem reabrir, o mercado inglês que é um mercado
que tem segmento que interessa aos Açores
também será um mercado capaz de reagir mais
rápido. As pessoas não vão querer ir para sítios
com muita gente, não querem ir para sítios onde
há conito de multidão e, portanto, procurarão
um destino de natureza um destino que a família
possa interagir.”
Os mercados que poderão retomar seriam, de
acordo com Catarina, a Alemanha, Holanda,
Escandinávia, França, a Itália e a Espanha,
porque são países com pessoas que já viajam há
muitos anos. Em termos de ameaças para todos
os países, as taxas de desemprego aumentaram,
os lay-off para a população ativa também “não
ajudam” como também não se sabe qual é a
companhia aérea que irá voar e com quantos
aviões e para que destinos. Muitos dos países têm
incentivado a fazer férias no seu interior, no caso
da Escandinávia, não é um mercado com grande
densidade populacional e tendem a fazer férias
no interior do país. Enquanto que na Holanda
e na Bélgica, países com grande densidade
populacional, vão optar por países mais calmos
e com menos multidão, portanto, de acordo com
Managing Director da MeloTravel, estes países
serão os que ajudarão os Açores a retomar a
atividade. Portugal “tem uma boa imagem em
qualquer um destes países, portanto, Portugal foi
bastante proativo em termos de comunicação”. “O
‘clean and safe’ é um fator muito importante e que
o operador concentrar-se-á em destinos nos quais
a higienização e as medidas sanitárias estão a ser
preparadas”. A retoma “tem de ser com uma linha
coerente”, começando pelo selo “Clean and Safe”
que será, de acordo com Catarina Cymbron “um
bom ponto de partida”.
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Mobilidade Elétrica
SARA BORGES
nos Açores
A utilização irradiada de combustível fóssil
no último século possibilitou uma acelerada
industrialização, intimamente articulada a
consumos crescentes de energia. Mas a sua
utilização não é neutra do ponto de vista
ambiental, pois liberta gases de efeito de
estufa (GEE), que estão a alterar o equilíbrio
da atmosfera que existia no período préindustrial.
Assim, através de diversos estudos
cada vez mais credibilizados pela comunidade
cientíca, o poder político começa a perceber as
consequências climáticas implicadas, e por isso
inicia uma ação direcionada para a alteração
da matriz energética com vista a uma redução
progressiva dos GEE.
Foi neste sentido que, no mês de junho, a
Secretaria Regional da Energia, Ambiente
Turismo, através da Direção Regional da Energia, promoveu uma sessão online dos Encontros com a
Eciência Energética dedicada à mobilidade elétrica nos Açores, com o intuito de debater e esclarecer as
questões dos Açorianos nesta matéria, impulsionando a opção por veículos elétricos.
Assim, este Encontro serviu como um espaço para sensibilizar os Açorianos sobre as vantagens do uso destes
veículos, com foco nos impactos positivos, quer a nível económico, quer a nível ambiental, e no papel que
todos podem desempenhar na descarbonização da economia açoriana, sendo também explicados, no âmbito
deste Encontro, os incentivos regionais e nacionais disponíveis para a aquisição de veículos elétricos e pontos
de carregamento.
NOSET20 23
R E P O R T A G E M
Desta forma, Andreia Carreiro inicia a sua
apresentação ilustrando o consumo da energia
nos Açores por setores. Assim, a Região ainda
possui uma dependência elevada em relação
aos combustíveis fósseis e a Diretora Regional
da Energia refere que os setores que estão mais
dependentes são os transportes terrestres e
a produção elétrica, “sendo por isso os mais
merecedores da nossa atenção e sendo uma peça
chave para o desenvolvimento de uma política
energética assente na descarbonização”.
Assim, a “Estratégia Açoriana para a Energia 2030”,
que se encontra na sua fase nal, pretende dotar
os Açores de políticas públicas com capacidade
de resposta às necessidades de uma região insular,
arquipelágica e ultraperiférica, que segundo
Andreia Carreiro, “explore as potencialidades que
são oferecidas pelos nossos recursos naturais e
pelas tecnologias emergentes no setor da energia
e com a implementação dessa estratégia, nós
no fundo pretendemos ter uma energia que
consideramos limpa, ável, competitiva e para
todos”. Em relação ao termo “limpa”, a Diretora
Regional da Energia refere que incide no respeito
pelo ambiente, minimizando efeitos nocivos
como as emissões de gases com efeito de estufa
no combate às alterações climáticas, por outro
lado, espera que seja uma energia “ável”, quer
isto dizer uma energia segura e com qualidade
de abastecimento à população, Andreia Carreiro
arma que este é um tópico especialmente
importante para uma realidade arquipelágica como
a dos Açores que é composta por nove sistemas
isolados de energia sem qualquer interligação entre
si e de gestão “muito desaante”, em relação ao
aspeto competitiva, este refere-se ao facto de poder
ter um custo que permita o ecaz funcionamento
da economia e uma ampla acessibilidade e,
por último, que seja para todos, assegurando o
acesso universal, a coesão territorial, com prática
de preços igualitária e o combate à pobreza
energética.
E decorrente dessa estratégia, tendo em conta os
seus objetivos macro, o Governo encontra-se a
desenvolver planos de ação direcionados a diversos
atores, como por exemplo, a eciência energética e
a mobilidade elétrica.
De acordo com a comunidade cientíca, a
mobilidade elétrica (ME) é o meio mais ecaz
de promover a sustentabilidade no setor
24 NOSET20
R E P O R T A G E M
dos transportes terrestres, sem o recurso a
combustíveis fósseis, auferindo melhorias na
qualidade ambiental, uma vez que as emissões
de gases de efeito de estufa (GEE) dos veículos
elétricos (VE) são praticamente nulas e o ruído é
diminuto quando comparado com os tradicionais
veículos de combustão interna (VCI).
Nestes termos, para o Governo dos Açores, a
aposta na ME é uma opção estratégica da política
ambiental e energética, tendo em consideração
o seu papel na conquista dos objetivos do
desenvolvimento sustentável, bem como na
descarbonização da economia, na redução dos
efeitos das alterações climáticas e na melhoria da
eciência energética.
Segundo Andreia Carreiro, Diretora Regional
da Energia, que falava no Encontro com a
Eciência Energética, “os Açores, sem dúvida,
que já reúnem há muito tempo condições para a
implementação da mobilidade elétrica” e favorece
“o posicionamento da região enquanto um destino
sustentável e um produto de natureza.”. Assim, a
RAA, segundo o Governo Regional, apresenta as
“condições ideais” para a implementação da ME.
Por um lado, a reduzida dimensão das ilhas e dos
trajetos a percorrer colmata os desaos associados
às autonomias que os mais recentes VE oferecem,
por outro, a utilização de recursos endógenos e
renováveis, para a produção de energia, pode ser
otimizada com a utilização massiva do VE.
Por estes motivos, foi elaborado o Plano da Ação
para a Mobilidade Elétrica nos Açores 2018-2024
(PMEA), o qual possui um total de 21 medidas,
constitui-se como um guia para a implementação
da ME no arquipélago e integra os diagnósticos
realizados aos diversos setores de atividade,
contemplando o seu desempenho ambiental e os
padrões de mobilidade de particulares, empresas
e entidades públicas, “procurando antecipar
as evoluções tecnológicas e de mercado, com
vista à denição de um conjunto de medidas
que promovam a utilização intensiva do VE nos
Açores”.
Assim, o PMEA alberga um conjunto de objetivos,
entre os quais, a redução das emissões de GEE;
a descarbonização da economia regional; a
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R E P O R T A G E M
promoção da eciência energética; a utilização
mais eciente do sistema elétrico; a redução de
custos para famílias e organizações e destacando
a RAA no contexto das regiões insulares e
ultraperiféricas europeias, como um “verdadeiro
living lab de soluções para a ME”.
Andreia Carreiro realça uma medida de âmbito
não nanceiro, que considera ser “extramente
importante”, que foi criar uma rede de pontos de
carregamento de acesso público. Sendo assim,
os Açores possuem, atualmente, 26 pontos de
carregamento, distribuídos pelas 9 ilhas do
arquipélago, de modo a satisfazer a necessidade
dos aglomerados populacionais mais afastados
dos centros urbanos, com o intuito de permitir
aos Açorianos uma segurança para que possam
utilizar esses pontos de carregamento sempre
que for necessário. A diretora da energia regional
enaltecendo o facto de os Acores serem a região
do país com um maior número de pontos de
carregamento de acesso público por habitante,
refere ser um dado muito curioso. Refere que
a implementação desses pontos foi realizada
em parceria com os Municípios, “que têm
assumido uma participação imprescindível
na implementação da mobilidade elétrica nos
Açores, através da aplicação e adoção de medidas
de acessibilidade e discriminação positiva aos
utilizadores do veículo, sendo assim, promotores
muito importantes junto à população”.
Em relação aos pontos de carregamento, importa
realçar que existe dois tipos de pontos: um ponto
de carregamento normal (PCN), com uma duração
aproximada de 8 horas, efetuado nos PCN com
base na rede de Baixa Tensão Normal (BTN), está
projetado para uso doméstico, áreas residenciais
e/ou base da frota; e o ponto de carregamento
rápido (PCR) que permite carregar cerca de 80%
da bateria do VE entre 20 a 25 minutos. Estes PCR
são normalmente instalados em locais estratégicos,
correspondendo a uma lógica de elevado tráfego
viário.
Sendo assim, os pontos de carregamento de acesso público encontram-se distribuídos
da seguinte forma pelo arquipélago:
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R E P O R T A G E M
Seguidamente, Andreia Carreiro destaca as
vantagens e desvantagens existentes na aquisição de
um veículo elétrico. Sendo assim, apresenta como
vantagens o facto de emitir zero emissões locais,
ser menos ruidoso, ter um maior conforto, mais
segurança e os custos de operação são reduzidos,
porque têm uma condução mais económica, menos
peças móveis e menos manutenções, contudo a
única desvantagem apresentada refere-se ao custo
inicial do veículo elétrico.
No entanto, acresce também incentivos scais.
Quer isto dizer que os indivíduos que possuem este
tipo de veículos cam isentos de pagamento do
ISV e do IUC e no caso das empresas que adotem
estas forma de mobilidade acresce os benefícios
como por exemplo, a dedução da totalidade do
IVA, a dedução à coleta e a isenção da taxa de
tributação autónoma.
Por outro lado, o Governo Regional dos Açores
atribui incentivos nanceiros, tendo em conta a
tipologia do veículo e o destinatário do mesmo,
como podemos ver na tabela abaixo.
NOSET20 27
R E P O R T A G E M
Assim, espera-se que os Açores, por um lado,
tornar-se-ão progressivamente independentes
da volatilidade de preços dos combustíveis
fósseis, por outro, a materialização do PMEA
irá promover uma redução da fatura energética
para as empresas e famílias. Neste sentido,
é a crença do Governo, que a adoção do VE
é adequada às necessidades da população
açoriana, armando que na maioria das
ilhas é possível realizar um percurso de volta
completa na periferia da ilha, sem recurso
ao carregamento do VE, com exceção de São
Miguel e Pico, onde as simulações preveem ser
necessário um carregamento parcial adicional.
Assim, a evolução tecnológica tem vindo
a permitir que a ME surja como uma
alternativa aos modos de transporte até agora
convencionais, baseados em combustíveis
fósseis, sendo que esta forma de mobilidade,
aliada às condições existentes na RAA,
contribuirá para a descarbonização da
economia açoriana.
28 NOSET20
C R Ó N I C A
Escola do
Mar dos Açores
JOÃO F. CASTRO
PROFESSOR MESTRADO EM GESTÃO PORTUÁRIA
joaocastro@sapo.pt
Foi inaugurada a Escola do Mar dos Açores (EMA),
pelo Governo Regional, no passado dia 30 de julho,
uma estrutura formativa que visa corresponder às
necessidades, de formação prossional, de recursos
humanos, na interpretação de uma estratégia e
vocação natural para o Mar, da Região Autónoma
dos Açores. Um bom exemplo, na reconversão de
instalações com a recuperação da antiga Estação
Rádio Naval da Horta, capacitando o edicado
existente para novas funcionalidades, neste caso
com a curiosidade de ser mantida uma vocação
marítima, ao serviço das pessoas dos Açores e do
País.
Este é um projeto com origens no pioneiro Curso
de Especialização Tecnológica em Operador
Marítimo Turístico (OpMar), que visava uma
resposta formativa eminentemente prática
abrangendo áreas como a náutica de recreio, o
mergulho, a conservação do ambiente marinho e
o empreendedorismo. Permitia que os formandos
pudessem concretizar nos Açores um percurso
formativo relacionado com o Mar adequado às
necessidades prossionais que se faziam sentir
numa resposta ao crescimento das atividades
marítimo turísticas.
Assim, na sequência do OpMar, em setembro de
2012, é celebrado um protocolo de cooperação
para a criação, da então designada, “Escola de
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C R Ó N I C A
Formação de Marítimos”, o primeiro momento
institucional da EMA, entre a Câmara Municipal
da Horta (CMH), o Governo Regional dos
Açores (GRA) através da Direção Regional dos
Transportes Marítimos e Aéreos, a Universidade
dos Açores com o Departamento de Oceanograa
e Pescas (DOP/UA) e a Escola Superior Náutica
Infante Dom Henrique (ENIDH). Estabeleceramse
as bases para uma abordagem formativa
estruturada, na formação de marítimos, de
mestrança e marinhagem, sobretudo para as áreas
da pesca e do comércio.
Em 2013 é anunciado a possibilidade de que a
EMA possa car situada nas antigas instalações
da Estação Radio Naval da Horta, face à sua
desativação. Em 2014 é elaborado o ante-projecto,
considerando as necessidades existentes e futuras,
enquanto centro certicado de formação e
qualicação prossional para o Mar, nas áreas: das
pescas incluindo o processamento de pescado; do
transporte marítimo (mestrança e marinhagem);
da reparação e construção naval; das atividades
marítimo turísticas; do mergulho prossional;
dos portos e infraestruturas portuárias; da
segurança; da limitação de avarias; do ambiente
e ecossistemas marinhos. Em 2015 é nalizado
o projeto de arquitetura para reconversão das
instalações e aprovado em conselho de governo o
concurso público da empreitada, para a primeira
fase, no valor de 4,5 milhões de euros. Em
setembro de 2016 é lançada a primeira pedra, com
a respetiva adjudicação. Em Janeiro de 2018 é
lançado concurso de aquisição de equipamentos.
Em abril de 2019 é criada a Associação para o
Desenvolvimento e Formação do Mar dos Açores
(ADFMA), tendo como uma dos seus principais
objetivos a gestão e implementação da Escola do
30 NOSET20
C R Ó N I C A
Mar dos Açores, tendo como sócios fundadores o
GRA, a ENIDH, o DOP/UA e a CMH.
A 30 de julho de 2020 é inaugurada a EMA
com um investimento efetuado, na ordem
dos 7,2 milhões de euros. O Presidente do
Governo Regional na sua intervenção realçou
três aspetos que deverão ser sublinhados: o
primeiro relacionado com a importância da
componente formativa, na sua relação com as
necessidades locais, mas também pelo potencial
de captação de novos mercados e oportunidades
como a certicação ao abrigo das convenções
internacionais; o segundo relacionado com
investimentos adicionais como o Parque de
Limitação de Avarias que permitirá uma
abordagem inovadoras na área da segurança
marítima, bem como dos quatro blocos
residenciais, num investimento adicional na ordem
de um milhão de euros, que visa apoiar docentes e
formandos que se desloquem para a ilha do Faial;
o terceiro na relação entre um investimento da
natureza da EMA, e o Ordenamento do Espaço
Marítimo, que se encontra na ordem do dia,
com uma mensagem clara sobre o Mar e a sua
importância, que é efectivamente uma realidade
da qual os Açores pretendem, por direito pleno e
merecido, como mais uma vez se demonstra, fazer
parte.
Esta inauguração contou com a presença do
Ministro do Mar, simbolizando, a relevância do
momento em reforço do potencial formativo a
instalar, não só porque esteve envolvido no curso
OpMar, decorrente das funções que desempenhava
em 2008 mas, sobretudo, porque o sucesso da
EMA será também um sucesso para Portugal!
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31
PUB
R E P O R T A G E M
Boas práticas de gestão
de pescas nos Açores
ANA MASSA
No nal do mês de julho, realizou-se um webinar,
organizado pela Sciaena, dedicado à gestão
pesqueira nos Açores, com a presença de Luís
Rodrigues, Diretor Regional das Pescas dos
Açores e moderado por Nicolas, técnico de pescas
e aquacultura na Sciaena. Este é um de vários
webinars que se focam na conservação marinha.
O diretor começou por referir que o mar “é o
principal recurso do planeta Terra” e que a maioria
das pessoas possui uma ideia pré-concebida da
pesca que chega a ser quase um estereótipo “que
é só falar em pescadores e armadores e barcos
de pesca”. Para Luís Rodrigues, a pesca “são
um conjunto de atores enorme que vão desde
investigadores, associações, áreas de competência
na pesca, até à comercialização e ao consumo.
Muitas vezes essa forma enviesada de como se
vê a pesca altera discursos, políticas, projetos e
condiciona muito o desenvolvimento.”
O setor da pesca, tal como qualquer outro
setor, deverá seguir certas linhas de orientação
estratégica de forma a conseguir ser rentável ao
máximo. Em primeiro lugar, o diretor considera
ser fundamental a valorização das pessoas, sendo
que atualmente um dos principais problemas
reside no facto de muitas das regras e muitos
dos projetos orientados para a pesca “parecerem
mais orientados para peixes do que para pessoas”.
Quem opera com as artes de pesca são pessoas,
por mais que uma arte de pesca seja seletiva, se
uma pessoa não tiver uma conduta de respeito
e de sustentabilidade pelo ambiente, essa arte,
por mais seletiva que seja, “terá certamente um
impacto negativo no ecossistema”. Luís Rodrigues
arma que a direção tem desenvolvido iniciativas
para a valorização e capacitação das pessoas, como
por exemplo a operação para a escolarização dos
ativos da pesca, isto é, uma oferta formativa para
curso de alfabetização. “Não consigo compreender
a mudança, se não investirmos na capacitação
das pessoas, de que vale ter um discurso ligado à
economia azul?”. O diretor menciona que há que
começar pelo “empowerment” quer das pessoas
quer das instituições.
Outra linha de orientação fulcral reside na
área da sensibilização, sendo importante levar
esta mensagem dos problemas que o mar e os
ecossistemas enfrentam a todos, “não só aqueles
que trabalham nesta grande família, mas às
escolas, ao poder local, levar este alerta a todos”.
Outro dos pontos que Luís Rodrigues destaca,
dos últimos anos, é a assinatura da convenção
coletiva de trabalho, ou seja, procurar trabalhar
nos direitos dos pescadores, uma vez que ainda
se verica um desajuste na distribuição do
rendimento. É também fundamental investir não
NOSET20 33
R E P O R T A G E M
só nas pessoas, mas também nos produtos de
pesca, isto é, “fazer render o peixe, pescar menos,
criar mais rendimento com aquilo que pescamos”.
A valorização do produto da pesca não se resume
ao pescado, “a própria comunidade piscatória é em
si um produto da pesca que pode ser valorizada
através do turismo, da sua cultura, da sua
paisagem”.
Para o Diretor Regional das Pescas dos Açores,
este setor “é muito mais do que peixe”, sendo
importante criar rendimento, explorar todas essas
virtudes da pesca, diversicar o consumo, valorizar
espécies de baixo valor comercial, entre outros. No
que concerne a este último aspeto, Luís Rodrigues
constata que todos os anos são capturadas cerca de
90 espécies diferentes, no entanto 85% corresponde
apenas a 5 espécies. Isto demonstra um claro
desequilíbrio no mercado, sendo necessário
sensibilizar os consumidores de que há outras
espécies que podem ser aproveitadas. O direto
apela, assim, para uma perspetiva “ecocêntrica”. A
par com a criação de mais rendimento, há também
evidência de recuperação de alguns destes stocks.
Há 3 anos, quando foram identicadas as espécies
mais emblemáticas ao nível do rendimento, da
quantidade de descarga e da performance dessas
pescarias, vericavam-se, por exemplo, o goraz
e foi também identicado o atum. Neste sentido,
foram desenvolvidas iniciativas para a valorização
do atum que se prenderam com formação dos
pescadores, uma capacitação ligada ao setor
associativo, etc. Luís Rodrigues arma que até
então “temos tido uma série de sinais positivos”,
tendo conseguido uma quota para a pesca do
rabilho, uma certicação para mercados de
alto valor no centro da Europa. “A ideia aqui é
pescar menos e valorizar o pouco que se pesca”
e neste sentido existem mais iniciativas, como
pequenos fóruns que levam às comunidades
piscatórias e nos quais se juntam um produto
da pesca, característico da ilha, a investigação, a
produção, a restauração, a gestão. À volta desta
linha, o diretor arma estarem “empenhados em
valorizar o património para promover o turismo
na comunidade piscatória. Não tem de ser turismo
de fora, pode ser os locais. Qualquer cidadão pode
entrar num barco de pesca e aprender a pescar. O
que procuramos é valorizar o que de melhor existe”.
Outra linha de orientação importante consiste
na parceria, na criação de pontes, pois a pesca
“não pode mais estar engavetada, a pesca é
educação, transportes, cultura, emprego, a pesca
é intersectorial e um dos nossos investimentos foi
criar pontes”. Para o diretor, é importante criar
pontes, pois a pesca não pode ser compreendida,
gerida e interpretada, tem que haver uma
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perspetiva “interinstitucional” para todos os que
trabalham no setor.
Outra linha de orientação fundamental é a
recolha de informação, a m de melhorar a
gestão, a decisão e a conservação dos recursos.
“A informação que nos chega da Europa não é a
melhor, dando-nos uma perspetiva nada positiva
relativamente aos recursos marinhos do oceano
Atlântico norte. Os mares da Europa diziam que
88% das espécies estão a ser subexploradas e não
consigo pôr em palavras a gravidade disto”. O
diretor arma ser necessária informação não só
sobre os recursos marinhos, mas também sobre
os recursos humanos. “Nós normalmente quando
falamos sobre investigação em pesca, falamos com
biólogos, mas eu acho que temos que nos perceber
da dimensão social. Quem pesca são as pessoas. A
política e as orientações têm sido feitas sobretudo
para peixes e para restrições a que não me oponho,
mas acho que temos de investir na investigação”.
Por conseguinte, é necessário compreender a
relação que as comunidades têm com o peixe,
saber quantas pessoas estão a explorar o mar, que
tipo de formação possuem, qual a estratégia que
devem ter. Portanto, alguns dos projetos a destacar
devem estar ligados às ciências sociais, nas áreas
da socio-demograa, socio-economia e literacia
dos oceanos, nas quais se estudam comunidades
piscatórias e a ligação das pessoas com o recurso.
Por m, Luís Rodrigues considera que a última
linha de orientação a reter é a reorientação. “A
pesca tem que criar mecanismos que a tornem
resiliente. A pesca tem de saber criar rendimento
para além do peixe, através do turismo”. Há áreas
que podem trazer rendimento à pesca. O pescador
e cada embarcação têm de ser resilientes e têm de
saber criar rendimento alternativo, complementar.
O diretor apela, também, à corresponsabilização
de “todos e cada um de nós” no que diz respeito ao
futuro dos ecossistemas marinhos e dos oceanos.
“O consumidor também deverá questionar-se
sobre o mesmo. A corresponsabilização deve ser
de todos e todos devem se questionar de como
podem participar na sustentabilidade dos recursos.
Todos temos uma consciência ambiental, mais
difícil é passar dela para a prática, para uma prática
coletiva”.
NOSET20 35
C R Ó N I C A
Por Ricardo Silva
Luis Sepúlveda, História de uma Baleia Branca,
Porto Editora, 1ª Edição maio de 2019.
Não podia partir imediatamente para a crónica sobre o
último livro de Luis Sepúlveda sem primeiro confessar que
o li propositadamente como tributo à sua vida, ao enorme
escritor e ao militante político de várias causas. Não deixa
de ser irónico que tenha sido um vírus com origem animal
a por m à vida deste excelente escritor sul-americano! São
as partidas da vida a quem, desde sempre, praticamente,
pôs – se, através da escrita e da luta política, ao lado e
à frente da defesa da Natureza e do Meio Ambiente. E
fê-lo através de livros, entrevistas, redes sociais e ação
no terreno. Em termos pessoais foi com transtorno que
acompanhei a sua curta doença - infeção com Covid 19 –
luta e infelizmente, morte, este ano no início da pandemia,
depois de ter estado em Portugal, na Póvoa de Varzim, na
21ª Edição de Correntes d`Escritas, um festival cultural de
dimensão europeia, onde se reúnem escritores, críticos,
jornalistas e leitores, promovido pela Câmara Municipal
local.
Os seus últimos livros, inclusive esta “História de Uma
Baleia Branca” faz parte da sua luta, como ativista da
palavra, pela sustentabilidade ambiental. Denunciando os
abusos sobre a Natureza, praticados pelo homem e pela sua
ganância, na procura de lucro, Luis Sepúlveda recorreu à
fábula como género literário muito antigo para transmitir
ou melhor, expor os valores em que acreditava e que
defendia convictamente. Foi a quinta fábula que escreveu
em que através da fala e do pensamento dos animais mostra
a violação do bom código relacional com a Natureza que o
homem devia praticar. Socorrendo-se do “grande animal
marinho do Sul do mundo” – um cachalote – é-nos contada
uma história ao contrário daquelas que estamos habituados
a ouvir ou a ler.
36 NOSET20
C R Ó N I C A
A narração parte da voz da baleia e não dos
baleeiros ou dos seus escritores ou historiadores. A
história presta, simultaneamente, homenagem ao
“povo Laenche - Gente do Mar” do Sul do Chile
e do seu relacionamento especial com as baleias e
às lendas que à volta delas cultivaram e cultivam.
Povo que vivendo do mar aprendeu a retirar o seu
alimento, quanto baste, agradecendo a generosidade
deste. Aprendeu a respeitar a vida marinha, a pescar
num equilibrado sustento e a agradecer ao mar toda
a vida que este possui. Mas, nem todos os homens
são como os Laenche! E as empresas baleeiras
com os seus “furiosos baleeiros” pertencem a essa
espécie de homens que em muitas e muitas ocasiões
foram além do necessário.
Ouve-se a voz da “baleia da cor da lua” falando do
seu mundo, do mar, do silêncio que habita nele,
dos vários tipos de baleia que existem e chegando
à conclusão que o ser menos capaz de viver no
mar é o homem! Esta preocupação ambiental de
Sepúlveda, honesta e correta, leva-nos a pensar
no abate indiscriminado de várias espécies,
à poluição tenebrosa do plástico que inunda
os diversos oceanos, à insaciável violação do
equilíbrio da vida marinha com que hoje nos
confrontamos, parecendo – ou mesmo sendo real
- que nem a morte e a destruição visível e sentida
no nosso dia a dia detêm a ambição humana.
Não se poderá ler este livro sem nos lembrarmos
do romance “Moby Dick – A Baleia”, do escritor
estadunidense Herman Melville, publicado em
meados do século XIX e que se ergueu como uma
obra prima da literatura universal.
Não se poderá ler este livro sem estar atento às
maravilhosas ilustrações de Paulo Galindro, artista
português que colaborou com Sepúlveda em
outras fábulas e que consegue dentro de um livro
fazer outro, tão belas são as suas telas e os seus
desenhos que valorizam o livro sobremaneira. É
um regalo ver as páginas de Paulo Galindro pelo
sentido, pela oportunidade da imagem que nos
cativa o olhar e faz parar a leitura.
A beleza deste pequeno livro está na sua
atualidade. Está na sua plasticidade às várias
gerações alertando-nos que o Homem pode fazer
mais pelo Mar, enquanto fonte de vida diversa,
múltipla e bela. A “baleia da cor da lua” através
da sua palavra avisa que está na hora do respeito
mútuo e que me vez de erguermos “mares de
ódio”, tão bem descritos no penúltimo capítulo
do livro, devemos tão simplesmente respeitar a
Natureza para que ela perdure no seu esplendor e
possa ser Vida para muitas e muitas gerações.
A leitura vale a pena!
NOSET20 37
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Dionísio Faria e Maia
Deputado pelo PS/A na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores
CLÁUDIA CARVALHO
A NO sabe que, para além das
funções que desempenha como
deputado no parlamento açoriano,
também exerce Medicina. Porquê
escolher esta área prossional?
Nas palavras, encontramos o sentido
das coisas, nas ações concretizamos as
coisas dando-lhes sentido.
Assim é na política, assim é também no
exercício da prossão que escolhemos
para a vida.
A Medicina tem esta atração e este
sentido único de estarmos ao serviço
do Homem.
A Política tem obviamente um
atrativo e múltiplos sentidos. Faz parte
intrínseca de nós, todos pertencemos
à Pólis e todos queremos ou melhor
devemos querer intervir e fazer parte
das mudanças que a evolução social e
económica exigem.
Escolhi a Medicina como prossão
e missão, e a política esteve sempre
associada à minha posição de cidadão
ativo, inconformado com a nossa
história política recente. Vivi o antes
e o depois de abril. Acompanhei
o evoluir da nossa Autonomia,
com todas as expetativas que um
autonomista deposita nesta forma de
governo próprio, de procura de mais
e maior identidade regional. Assisti à
concretização desta ideia maravilhosa
de uma Europa sem fronteiras, sem
deixar de pensar no caminho árduo
que esta Região Ultraperiférica teria de
percorrer.
O que o fez ingressar pela vida
política? Quais eram as suas
expectativas?
Não ingressei na política, porque
sempre me considerei politicamente
ativo. O que aceitei foi que a minha
intervenção política fosse validada
pelos votos das açorianas e açorianos
que viram em mim a possibilidade de
assumir esta responsabilidade de os
representar na ALRAA.
As minhas expetativas foram a de um
cidadão consciente das diculdades
entre o querer e o poder, na perspetiva
de que tudo o que sei, fruto do
34 NOSET20
NOSET20
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E N T R E V I S T A
conhecimento adquirido e responsabilidades
assumidas, fosse posto ao serviço do bem-comum.
Sou reformista por convicção, o que me dá a
inquietude de que haverá sempre mais e melhor
para fazer.
Desde o início das suas funções como deputado,
qual considera ter sido a intervenção que
destacasse ou a proposta que tenha levado a cabo
que o tenha feito sentir-se orgulhoso enquanto
pessoa e deputado?
É importante que que dito que foi uma honra
ter sido convidado pelo Presidente do PS Açores e
Presidente do Governo Regional Vasco Cordeiro,
para fazer parte da lista de candidatos a deputados
regionais pelo círculo de São Miguel. Vinha de uma
área técnica, muito normativa e interventiva, como
o é a Medicina Intensiva, para um Parlamento
onde a dissertação é a norma e o combate se faz
pelas ideias e muitas vezes pela falta delas.
Combati sempre pelas ideias e factos
fundamentados no conhecimento e na importância
que representam o fazer, sabendo fazer; sem
prejuízo duma realidade, nossa, que deve
nortear todo o discurso e intervenção política
consequentes.
No corolário do meu mandato, com orgulho,
defendi e aprovamos a criação do Comité de Ética
para as Ciências e Novas Tecnologias em Saúde,
organismo que certamente completa uma rede
de apoio às questões antigas e às emergentes nos
cuidados de saúde na RAA.
Porquê representar o PS/A e não outro partido
político?
Quem conhece o meu trajeto e intervenção
política sabe que, como independente, apoiei
sempre o Partido Socialista. Fui inclusive eleito
para a Assembleia Municipal de Ponta Delgada na
primeira vez que o Partido Socialista ganhou as
eleições.
Tendo sido eleito pelo círculo de São Miguel,
acha que o PS/A tem conseguido dar voz aos
cidadãos Micaelenses? Se sim, de que forma?
Uma das características do Grupo Parlamentar do
Partido Socialista na ALRAA foi dar voz a todos
os açorianos, apoiando obviamente o Governo
Regional também nesta tarefa de não deixarmos
ninguém para trás.
São Miguel é duplamente responsável por esta
política. Tem uma maior capacidade de gerar
riqueza, mas também tem esta capacidade de
40 NOSET20
E N T R E V I S T A
aceitar a descentralização. Acho que o Governo
do Partido Socialista tem tido esta sensibilidade
de apoiar todas as iniciativas próprias de cada
ilha no sentido de elas próprias gerarem o seu
desenvolvimento.
A pandemia veio demonstrar que o setor da
Saúde é uma área que deve ser prioritária e cujo
investimento nunca deve ser descurado. Ao nível
da Saúde, nos Açores, sente que ainda há mais e
melhor a fazer?
O Serviço Regional de Saúde (SRS) é uma
conquista e uma grande responsabilidade. Temos
um SRS de que nos podemos orgulhar, pesem
embora todas as variáveis ou condicionantes
internas e externas que possam inuenciar a sua
performance.
Temos um SRS que absorve mais de um terço
do nosso orçamento regional, obviamente com
necessidade de rever o seu orçamento, pese
embora todas as dotações efetuadas nos últimos
orçamentos regionais.
A pandemia, felizmente não veio demonstrar
fragilidades, porque não nos atingiu com a mesma
extensão com que noutras paragens, serviços de
saúde mais robustos fracassaram, mas evidenciou
um facto que tem sido escamoteado e que não o
deve ser. O nosso SRS teve a grande capacidade de
se reorganizar em tempo recorde para o que desse
e viesse.
Os serviços de saúde são extremamente dinâmicos,
logo é óbvio que haverá sempre mais e melhor para
se fazer.
Não obstante a ação preventiva que todos os
açorianos adotaram no combate à pandemia, o
que é que sente que possa ter falhado?
Sou muito crítico da postura da República acerca
do que se passou com as medidas de connamento
adotadas por nós. Os açorianos não falharam.
O Governo Regional dos Açores teve a coragem
e a determinação necessárias para implementar
medidas extraordinárias de segurança. Há uma
questão a resolver com a República. Quem
tem a responsabilidade da Saúde Pública deve
ter possibilidade de controlo efetivo das suas
fronteiras sanitárias.
Quais os assuntos que, na sua opinião, mereciam
maior atenção política durante estes três últimos
meses?
Penso que, neste nal de legislatura, há que não
deixar pendentes assuntos que já estão tratados
nas Comissões. Estamos a dois meses de eleições
e por força da lógica política, as velhas questões,
enroupadas em lirismos de circunstância, farão
parte da ementa da oposição.
NOSET20 41
E N T R E V I S T A
Confesso com o distanciamento que terei da lide
parlamentar que será sempre o mesmo. Muita
parra e pouca uva. Foi o que se passou com a falta
de propostas sérias por parte da oposição para
setores onde o Governo Regional tomou quase
sempre a iniciativa.
A NO sabe que decidiu não se candidatar para
as próximas eleições legislativas regionais que
se aproximam. Qual é o balanço que faz da sua
atividade parlamentar?
Como condição prévia, deixo claro que não sou
defensor intransigente da limitação de mandatos
por uma razão muito simples, podendo haver
outras, é que em democracia os mandatos são
legitimados por votos e devem ser ganhos com a
conança dos eleitores, logo compete a estes limitar
o acesso a quem não concordam que aí permaneça.
Outra questão é não entender esta missão como
uma sequência. No meu caso limitei-me por opção
prévia.
O balanço desta missão/mandato não compete
a mim fazê-lo sob pena de, no limite, cair no
autoelogio.
Mas existem duas questões que quero ressalvar.
Primeiro, como Vice-Presidente da ALRAA, com
muito orgulho representei o Parlamento Açoriano
em substituição da nossa Presidente. Segundo,
senti-me respeitado, apoiado e acarinhado pelo
nosso grupo parlamentar e realço a camaradagem
da maior parte dos restantes Sr.ªs e Srs. Deputados.
Há alguma mensagem que queira deixar aos
nossos leitores?
No fecho desta entrevista, de que agradeço à NO
Revista a oportunidade que me dá de partilhar um
modo e um tempo de atuação diferente na minha
vida, quero deixar uma mensagem que considero
importante.
A nossa Autonomia, consignada há 45 anos, ainda
é muito jovem, pese embora o nosso passado de
luta autonómica e o respeito que, por isso, devemos
prestar aos nossos ilustres autonomistas do século
passado.
Precisamos consolidá-la com o contributo de
todos, apoiados numa liderança forte, apoiada
preferencialmente por uma maioria parlamentar.
Na nossa ainda jovem história políticoadministrativa
autonómica, foram os governos
apoiados por maiorias parlamentares que
motivaram as mudanças necessárias ao nosso
desenvolvimento.
Um governo forte só será possível com um amplo
apoio parlamentar, obviamente cultivando o
diálogo e a concertação necessárias às tomadas de
decisão em democracia.
Para isso todos contam.
42 NOSET20
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Fábrica de Tabacos da Maia
R E P O R T A G E M
Museu do
Tabaco da Maia
CLÁUDIA CARVALHO
a força de uma
comunidade para
A recuperação do
Património
História, Tradição e Conservação
O Museu do Tabaco da Maia (MTM), localizado
no concelho da Ribeira Grande, na freguesia da
Maia, é um organismo cientíco-cultural da Santa
Casa da Misericórdia do Divino Espírito Santo da
Maia (SCMDESM) e surge, através de um projeto
comunitário, como forma de manter a memória da
antiga Fábrica de Tabacos da Maia, no ano de 2009.
A SCMDESM adquire a fábrica no ano de 2004 e
musealiza parte das instalações da fábrica – cinco
anos volvidos, abre ao público, em 2009, o atual
MTM.
Com 11 anos de existência, o MTM está
vocacionado para a investigação, documentação,
conservação, interpretação e divulgação da
agroindústria do tabaco, numa perspetiva de
desenvolvimento social e local. Segundo Susana
Gomes Tiago, Diretora do Museu e Antropóloga,
o MTM é o “único museu da Europa do tabaco
com a missão de divulgar o património e com uma
missão de desenvolvimento local de uma zona
rural periférica”.
44 NOSET20
R E P O R T A G E M
Fábrica de Tabacos da Maia
A Fábrica de Tabacos da Maia, considerada uma
das mais antigas da ilha de São Miguel, laborou
na freguesia entre 1871 e 1988. Foi fundada por
Manuel Bento de Sousa, tendo os seus lhos e
netos dado continuidade à sua obra, por morte
do seu fundador. Em 1900, a fábrica possuía
seis funcionários e, com o decorrer dos anos, foi
evoluindo e “foi-se tornando uma verdadeira
empresa já com algumas máquinas”, revelou a
diretora do MTM. Naquela altura, a Fábrica de
Tabacos da Maia, em conjunto com a Fábrica de
Chá da Gorreana, eram duas grandes empresas
empregadoras da maior parte da mão de obra
que existia na freguesia. Segundo Susana Tiago,
na década de 50, empregava à volta de 70
trabalhadores, número “considerável” para aquela
altura e para a dimensão populacional daquela
freguesia.
A partir dos anos 80, fruto da concorrência por
parte de outras empresas do mesmo setor, bem
como ao fraco investimento que se tinha vindo a
vericar nos últimos anos, a fábrica entra numa fase
de declínio e vê-se obrigada a encerrar no ano de
1988.
De acordo com a Diretora do MTM, existiam, em
Ponta Delgada, duas grandes fábricas (Fábrica de
Tabaco Micaelense e Fábrica de Tabaco Estrela),
que faziam concorrência direta com a Fábrica de
Tabacos da Maia. Quando a Fábrica de Tabacos
da Maia encerra as suas portas, as duas fábricas
sediadas no concelho de Ponta Delgada compram as
máquinas que existiam na Maia, uma vez que “não
compensava estarem a deslocar a fábrica que existia
lá em baixo (Ponta Delgada) para esta freguesia
rural”.
A estrutura dos edifícios dissociou-se das funções
da fábrica, mas isso não impediu que permanecesse
viva a memória dos processos técnicos da produção
agrária e industrial do tabaco.
O tabaco mais popular produzido na fábrica era
o São Luís de rolo, com embalagem feita à mão.
Antigamente, as pessoas compravam o São Luís de
rolo porque era o mais barato.
“A planta foi trazida da América do Sul, no início do
século XIX, para substituir a produção de laranja,
então em declínio devido a uma doença nas árvores.
Deu-se tão bem com o clima e o sol de São Miguel
que rapidamente se expandiu”.
NOSET20 45
E N T R E V I S T A
A preponderância do sexo feminino na produção do tabaco
De acordo com o MTM, a maior parte dos
operários da antiga Fábrica de Tabacos da Maia
eram mulheres. “Eram mulheres solteiras,
porque estamos a falar de uma sociedade muito
conservadora, as mulheres quando estavam
solteiras vinham trabalhar para o dote, para
depois se casarem”. Depois do matrimónio, saíam
da fábrica e regressavam ao lar para cuidar do
marido e dos lhos. Susana Tiago revelou que as
mulheres tinham uma maior “sensibilidade” na
feitura das carteiras de cigarros e dos cigarros. “No
início era tudo feito muito manualmente, por isso
eram as senhoras que, na maior parte das vezes,
trabalhavam nas fábricas”.
Exposição Permanente
De acordo com o MTM, a exposição permanente
está projetada para que os visitantes possam sentir
os espaços da fábrica como se estes estivessem
a laborar. Isto é feito através da transposição
dos diferentes ambientes sonoros e visuais para
o espaço expositivo. Para além dos suportes
audiovisuais que nos mostram os diferentes
sistemas técnicos da Fábrica de Tabacos da
Maia, existem, ainda, os suportes escritos que
acompanham todo o percurso expositivo. Os textos
explicativos estão escritos em português e Inglês.
A exposição permanente pode ser vista ao longo
de quatro espaços: Sala de Pesagem e Prensagem,
Secador de Lume Direto; Secador de Lume Indireto
e Ponte-Báscula.
Há ainda no Museu uma pequena sala de chá,
onde os visitantes poderão provar o licor de
café, degustar o já conhecido chá da Zona ou
simplesmente sentar-se e apreciar. Na receção do
Museu, o visitante poderá adquirir os objetos que
se encontram expostos nas vitrinas.
46 NOSET20
R E P O R T A G E M
Exposições Temporárias
A área de Exposições Temporárias do MTM é palco da realização de variadas exposições, de temáticas
variadas, exposições relacionadas direta ou indiretamente com o seu espólio ou com a história ou
personalidades locais. O museu está também aberto para que outras instituições organizem atividades
dentro do seu espaço, desde que aprovadas em termos de objetivos e temáticas.
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NOSET20
47
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C R Ó N I C A
Ana Rita Tomaz Diogo
Enfermeira Especialista em Enfermagem de
Reabilitação e em Enfermagem Médico- Cirúrgica na
Área de Enfermagem à Pessoa em Situação Paliativa
Presidente do Conselho Fiscal Seção Regional dos
Açores
Cuidados Paliativos: o que
sabem os enfermeiros nos
Açores?
Os Cuidados Paliativos, um direito ainda não acessível a todos
Segundo a denição da Organização Mundial de
Saúde (OMS), os Cuidados Paliativos (CP) são
uma abordagem que melhora a qualidade de vida
dos doentes e suas famílias, quando sofrem de
doença crónica, progressiva e incurável, através
da prevenção e alívio do sofrimento, por meio da
identicação e da avaliação precoce da dor e de
outros problemas físicos, psicossociais e espirituais.
(OMS, 2002)
O Conselho da Europa reconheceu que os CP são
parte integrante do sistema de saúde e o acesso a
estes cuidados um direito inalienável dos cidadãos.
(Council of Europe, 2003)
Contudo, este direito ainda não é acessível a todos.
Segundo a OMS as principais barreiras para o
desenvolvimento dos CP são:
1. Política, sem políticas de saúde de
suporte aos CP o seu desenvolvimento será difícil
2. Educação, a maioria dos prossionais
de saúde de todo o mundo têm pouco ou nenhum
conhecimento dos princípios e práticas de CP. É
assim necessária formação em CP a três níveis:
básica destinada a todos os prossionais de saúde,
intermédia destinada aqueles que diariamente
trabalham com pessoas com doenças incuráveis e
especializada
3. Disponibilidade de medicamentos, em
particular opióides, considerado requisito para a
prestação de CP com qualidade, estima-se que 80%
da população mundial não tem acesso a opióides
para controlo da dor
4. Implementação, internacionalmente o
desenvolvimento de programas de CP tem sido
muito desigual (OMS, 2014)
Assim, para que haja uma efetiva organização de
serviços de CP tem que haver uma política de
NOSET20 09
C R Ó N I C A
saúde integrada que aposte fortemente nos CP:
na formação dos prossionais de saúde nesta
área especíca e na disponibilidade de fármacos
que possibilitem o alívio e controlo de sintomas,
nomeadamente de opióides.
Sendo o objetivo central a prestação de cuidados
paliativos de qualidade, tem que se ter atenção não
só ao número e ao funcionamento de unidades
de saúde, como também aos recursos humanos
necessários e a formação dos mesmos. Uma vez
que, a elevada qualidade destes cuidados requer
uma equipa interdisciplinar, bem coordenada,
bem formada e treinada, com as competências
comunicacionais necessárias e de avaliação e
de tratamento de sintomas físicos e psíquicos
assim como, do controlo dos efeitos secundários
associados com a doença ou tratamentos dos
doentes. (APCP, 2016)
A formação é portanto reconhecida como um
elemento essencial e determinante para a prática
de CP. Apesar disso em Portugal a preparação
dos prossionais de saúde nesta matéria tem sido
errática, não planeada e sem estratégia denida.
(APCP, 2016)
O papel do Enfermeiro nos Cuidados Paliativos
O Código Deontológico enuncia como princípio
estruturante do agir prossional do enfermeiro, no
nº 1 do seu artigo 78º, “a preocupação da defesa da
liberdade e da dignidade da pessoa humana e do
enfermeiro”. (OE, 2009)
O que se correlaciona diretamente com o
enquadramento conceptual e princípios dos CP,
explícitos na Lei de Bases dos CP “Os Cuidados
Paliativos devem respeitar a autonomia, a vontade,
a individualidade, a dignidade da pessoa e a
inviolabilidade da vida humana”; e reiterados pelo
Council of Europe que considera uma obrigação
dos prossionais de saúde o respeito e a proteção
da dignidade do doente terminal. (EAPC, 2004)
No processo de cuidar, o enfermeiro encontrase
numa situação privilegiada relativamente aos
CP, pois acompanha os doentes nas 24 horas do
dia, relaciona-se mais de perto com os familiares,
podendo durante a prestação de cuidados
realizar uma avaliação inicial de pormenor,
desenvolver uma comunicação profunda, planear
e implementar intervenções terapêuticas junto dos
doentes e familiares. Por outro lado, os cuidados
de conforto durante a fase nal da vida, devem
ser considerados como uma habilidade ativa,
necessária, importante e parte integrante dos
cuidados de enfermagem. (International Council
of Nurses, citado por APCP, 2006, p.iv)
Do ponto de vista do enfermeiro o seu papel em
CP assenta na sua disponibilidade e experiência
no cuidar. O enfermeiro considera ainda que a
sua função de coordenação entre os diferentes
50 NOSET20
C R Ó N I C A
prossionais de saúde, doente e família apesar de
proeminente e de contribuir para a qualidade dos
cuidados, nem sempre é valorizado por outros
prossionais de saúde. Este facto prende-se com
a limitação de reconhecimento e legitimidade
sentidas em alguns contextos de prestação de
cuidados. (Sekse et al., 2017)
O enfermeiro identica, entre outros fatores, como
barreiras à prestação de cuidados paliativos de alta
qualidade a formação e competências inadequadas
em cuidados paliativos. (Aslakson et al., 2012)
Exprimindo a necessidade de mais formação
teórica e prática no cuidar de doentes terminais e
comunicação com as famílias. (Sekse et al., 2017)
A capacitação dos enfermeiros através da formação
em CP poderá contribuir para a melhoria da
qualidade de cuidados aos doentes. Contudo,
a educação e o treino dos enfermeiros só será
bem-sucedida se resultarem numa prática e
capacidade de tomada de decisões melhoradas.
Isto signica a identicação atempada dos doentes,
a referenciação atempada para peritos em CP,
a utilização das guidelines e procedimentos de
trabalho adequados, e o conhecimento sobre CP.
A formação e a prática de Cuidados Paliativos nos Açores
Num contexto regional onde existe formação
pré-graduada em CP, com resultados satisfatórios,
e onde se inicia a organização de equipas
comunitárias e unidades de CP, considera-se que
a formação avançada e a aquisição de experiência
prática serão determinantes na qualidade dos
CP prestados. Devendo-se, nesta fase, orientar o
investimento formativo para a formação avançada,
em contexto de prática integrada em equipas e
unidades de CP, e incorporada num modelo de
desenvolvimento prossional reconhecido.
Ainda no contexto de prática integrada de CP,
tendo em conta a realidade arquipelágica, e os
resultados positivos encontrados na literatura
(Levine et al., 2017), é pertinente equacionar
programas formativos regionais, orientados para
o treino de equipas multidisciplinares de CP em
rede, de forma a construir uma rede regional de
apoio duradoura.
Concomitantementemente, e para que o
investimento formativo possa resultar no efetivo
desenvolvimento de equipas que praticam CP
de qualidade, é fundamental implementar uma
política de saúde que cative os enfermeiros para
a prática especializada, e que os mantenha nesta,
atribuindo-lhes o reconhecimento, o tempo de
dedicação e os recursos necessários.
NOSET20 51
Água com sabor a sal
O problema de
intrusão salina
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facebook.com/iroaazores
Paulo Filipe Silva Borges
Licenciado em Geologia
Mestre em Geociências,
ramo do Ambiente e
Ordenamento
Os problemas de água com sabor
salgado ou salobro caem sobre as
captações de água relacionadas com
aquíferos costeiros ou basais. Estando
fortemente inuenciados pela
interação das águas oceânicas com
os aquíferos e/ou com os aerossóis
marinhos.
O aquífero basal corresponde a uma
massa de água doce que sobrenada
a água salgada proveniente de
inltrações do mar, devido às suas
diferenças de densidade. Entre estes
dois corpos hídricos existe uma zona
de transição ou de mistura onde a
água é salobra. Este tipo de aquífero
demonstra a sua dinâmica através
das nascentes submarinas ao longo
da orla costeira, no entanto, está
vulnerável às variações da maré e às
correntes marítimas, inuenciando o
contacto com a água doce.
Todos os aquíferos que interagem
com o oceano têm esta estraticação
de doce- salobra - salgada, podendo
ser visível a olho nu pela turbidez que
gera nos pontos de mistura, à saída das nascentes
submarinas. Esta interação interna do aquífero
pode ser lateral, nas regiões mais perto da costa, ou
vertical, nas regiões mais afastadas da costa.
Mas como esta água salgada circula para o interior
destas ilhas rochosas onde vivemos?
A água circula no interior das rochas nos seus
interstícios, uma forma fácil de entender, será
talvez comparar com outros materiais comuns,
como a madeira, que absorve a água e humidade,
mas no caso dos corpos rochosos a quantidade
de água armazenada e a velocidade em que esta
circula é naturalmente distinta. Nesta situação em
que há alguns quilómetros cúbicos de água doce
no interior da ilha, dentro das rochas, exerce uma
pressão hidrostática (variável pelo tipo de rocha),
que impede o avanço do mar, no entanto o mar
pode “vencer” se esta pressão for insuciente, ou
seja, e respondendo à questão suprajacente:
52 NOSET20
n o | w w w . n o r e v i s t a . p t
Por uma questão de espaço.
Grutas, cavidades, algares, galerias, fraturas e falhas
de movimento distensivo, são tudo situações que
há este espaço (ver Figura 1), onde há uma quebra
da pressão hidrostática, não sendo suciente
para manter o oceano recuado, promovendo o
fenómeno de mistura das águas doce e salgada, à
semelhança do que ocorre à saída das nascentes
submarinas costeiras.
Tendo isto em consideração, ao longo dos anos este
recurso de água doce disponível nestes aquíferos
tem sido explorado e aproveitado. Inicialmente
pela utilização de poços, os chamados “poços de
maré”, e posteriormente até á atualidade por furos.
Tanto um como o outro quando construídos geram
espaço, logo, no interior deste espaço é promovida
a mistura das águas, sendo necessário muito
cuidado na sua execução, nomeadamente a que
profundidade é realizada a perfuração.
Tal como qualquer furo, a exploração de águas
subterrâneas, a bombagem gera por sucção um
“cone de rebaixamento” do nível freático, mas
nos aquíferos basais tambem induz um “cone
de subida” da interface entre água doce- salgada
(Figura 2). Este aquífero quando não têm o
“descanso” necessário para repor o nível anterior,
tende a agravar este fenómeno com o tempo,
degradando a qualidade das águas. Assim, processo
de intrusão salina, por consequência antrópica,
pode estar associado aos seguintes fatores:
- Distância das captações ao mar - distância da
linha de costa;
- Ocorrência de estruturas naturais que favorecem
a circulação de água salgada;
- Problemas Técnicos das captações - alguns dos
furos penetram demasiado no aquífero basal; a
bomba submersível está instalada abaixo do nível
água salobra;
- Ineciente gestão de água subterrânea - elevadas
taxas de bombeamento; tempo excessivo de
exploração.
Figura 2:Esquema de uma captação por furo com o fenómeno da intrusão salina. (1. - Água doce; 2. - Zona de mistura, água
salobra; 3. - Água salgada; 4. - Corpo insular; 5. - Nível do oceano; 6. Nível freático anterior à bombagem; 7. - Interface água
salgada - Água salgada).
O teor excessivo de cloretos na água devido
ao processo de salinização tende a degradar
os equipamentos, designadamente corroendoos,
gerando focos potenciais de contaminação
microbiológica. Este facto explica o elevado
número de problemas nas captações destes
aquíferos, degradação da qualidade microbiológica,
perdas excessivas de água.
O problema da intrusão salina é um problema
que tem adquirido cada vez mais atenção da nossa
sociedade e carece de estudo e novas técnicas de
monitorização. Sabendo que este fenómeno pode
ser reversível e monitorizado, poderá ser evitado
com uma gestão do aquífero adequada, num futuro
poderá ser uma grande conquista para os recursos
hídricos, nomeadamente deste recurso essencial
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n o | w w w . n o r e v i s t a . p t
para a vida - água.
Há quem defenda as centrais dessalinizadoras,
mas para isto é necessário pensar os custos, tanto
energéticos como de infraestruturas, a pegada
ecológica, o ordenamento do território. Além de
que a dessalinizadora retira todos os minerais
da água, sendo necessário voltar a mineralizar a
água para consumo (mais custos). Isto sabendo
que há enormes aquíferos com água doce, em que
apenas precisam ser estudados, monitorizados
e elaborados de planos de gestão ecazes destes
aquíferos.
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A História por detrás da
RUI SANTOS
Mata-Jardim José do Canto
Segundo Margarida Rodrigues, descendente
de José do Canto, o mesmo estava a estudar em
Lisboa quando, nessa altura, os pais chamaram-no
para vir casar com uma senhora que se chamava
Maria Guilhermina e era morgada em São Miguel.
Após o casamento, dedicou-se a tomar conta das
coisas dela, no entanto, “como era uma pessoa
extremamente empreendedora, realmente fez
imensos melhoramentos aqui na terra”.
Um dos seus grandes feitos foi a plantação de
árvores, “plantou milhares e milhares de árvores”,
também foi o fundador do jardim José do Canto
em Ponta Delgada. Nas Furnas, todo o complexo
da mata José do Canto, incluindo as duas casas e o
jardim, foram realizados por arquitetos franceses,
“porque ele nesta altura vivia em França com
a mulher e gostava muito da cultura francesa”,
explicou Margarida Rodrigues, acrescentando que
na altura em que estavam a ser feitos a mata e o
jardim, a mulher cou doente em Paris e José do
Canto fez uma promessa que se ela casse melhor
também faria uma capela.
Nesta altura, trouxe um arquiteto francês, Paul-
Émile Bonnet, e fez a capela no estilo neogótico
romântico francês “que é muito diferente dos
nossos portugueses”. Da sua constituição, as
estátuas de mármore e o ladrilho hidráulico são
italianos e o restante tudo francês.
Além disso, José do Canto foi uma das pessoas que
lutou pelo porto de Ponta Delgada, como também,
“fez a parte do chá, foi ele quem trouxe os chineses
para plantar o chá, teve café, teve laranja, realmente
era uma pessoa que se dedicou e desenvolveu
muito a sua terra”.
Os vitrais da capela são outro elemento de
destaque, “é do melhor que há em Portugal do
século XIX e vieram de França também”. Os
mesmos relatam cenas da vida de Nossa Senhora:
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“Nossa Senhora pequenina com Santana, sua mãe,
depois Nossa Senhora com o menino Jesus, e acaba
com Nossa Senhora a subir aos céus, a ascensão de
Nossa Senhora que se comemora a 15 de Agosto
e todos os anos”, data em que o padre das Furnas
celebra missa na capela, algo que não aconteceu
este ano devido à pandemia. Os vitrais foram todos
restaurados há 10 anos atrás em Portugal, perto de
Leiria, no Atelier de Arquitetos.
Outro dos elementos que se destacam na capela
são as suas estátuas, porém a estátua de Nossa
Senhora das Vitórias, a qual dava o nome à capela,
foi roubada há uns anos, “infelizmente nunca mais
apareceu”.
Atualmente, à direita e esquerda do interior da
capela estão sepultados os corpos de José do Canto
e da sua mulher Maria Guilhermina.
No Jardim José do Canto, “temos o vale dos fetos,
com uma coleção de fetos enorme, que está toda
classicada. O Jardim tem um traçado também
muito bonito, porque tem um traçado do arquiteto
francês e isso foi sempre preservado, nunca se
estragaram o traçado e as ruas que ele desenhou,
estão exatamente como Barillet Deschamps as
desenhou”, salientou.
O complexo conta ainda com uma coleção de
camélias que, de acordo com Margarida Rodrigues,
possui “mais de mil e tal pés de camélias com 300
variedades talvez, que entre fevereiro e maio estão
lindíssimas”, referiu, destacando ainda no fundo do
jardim, no começo da ribeira, o Salto do Rosal “que
tem 40 metros de altura e que corre numa cornija
vulcânica e que depois vem pela ribeira abaixo até
à lagoa”.
Já Henrique Rodrigues, marido de Margarida
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Rodrigues, referiu que José do Canto nasceu em
1820 e morreu em 1898, tendo sido “um homem
que marcou aqui um papel muito importante na
sua geração”.
José do Canto destacou-se na botânica. Durante
15 anos, viveu em Paris, onde, segundo Henrique
Rodrigues “deu-se com gentes da época, com
vários jardins da Europa e de Paris e foi daí que
nasceu-lhe essa paixão pela parte botânica”. Trouxe
plantas de Paris e fez uma aclimatação das mesmas
no seu jardim. Mais tarde, “começou a fazer na
cidade, no Jardim Botânico José do Canto, e depois
foi plantando em toda esta ilha”.
A sua propriedade na freguesia das Furnas foi
comprada “aos bocados a cento e tal pessoas, eram
glebas de terra pequenas excetuando uma maior,
trocou por terras suas que tinha no Pico da Pedra,
e fez aqui uma propriedade com 800 hectares
naquela época”.
Henrique Rodrigues lembrou que o século XIX era
marcado por uma tendência: “as matas em vez de
ser só para interesse económico tinham também
um interesse de fruição”, em que as pessoas
usufruíam desses espaços para piqueniques,
passeios e contemplação. “Portanto havia um
aspeto de fruição que era muito importante no
século XIX e ele trouxe isso para cá, esta grande
propriedade foi isto, plantou as matas e depois
jardinou-as ao longo da lagoa”, acrescentou.
A capela nasceu “pouco tempo depois em princípio
por causa de uma doença que a mulher teve em
Paris, ele (José do Canto) esteve muito preocupado
e resolveu que, se ela melhorasse, fazia a capela
para eles carem aqui os dois, mas enm havia
muito mais, com certeza, do que isso na cabeça
dele, ele próprio era um homem propenso a car
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aqui para o resto da eternidade ao pé das suas
árvores, ao pé da lagoa que ele gostava muito”.
No jardim, destaca-se “uma grande coleção
de camélias pelas suas ruas, são à volta de 100
espécies antigas, aquelas que já eram camélias
antes do século XIX, é um jardim histórico e as
camélias têm uma importância grande para esse
jardim, tanto que a minha mulher plantou aqui
há uns anos uma coisa que se chama o cameleto
que é uma coleção viva de camélias, são 200
espécies que já tem algumas modernas”. Para além
disso, “o jardim tem um interesse muito grande
sobretudo do ponto de vista do seu traçado”, feito
“pelo primeiro arquiteto que trabalho aqui, foi
um arquiteto francês (Bonnet) que foi arquiteto
da Câmara de Paris, também desenhou jardins
franceses, precisamente neste critério da fruição
das matas, e foi ele que fez aqui o traçado principal
do jardim e tinha um estilo próprio que ainda hoje
é conhecido”. De acordo com Henrique Rodrigues,
“muitas vezes aparecem arquitetos franceses que
vêm aqui ver o jardim, porque é conhecido por
eles, o traçado nunca tem uma linha reta, são tudo
linhas mais ou menos redondas”, explicou.
Posteriormente, a continuação da propriedade foi
feita pelos discípulos de Bonnet, que desenharam
as casas, os chalés, e também trabalharam a capela.
Henrique Rodrigues disse que, tanto o jardim
como a capela “nunca foram com intenção de abrir
ao público”. A abertura destes espaços ao público
aconteceu “há seis anos, quando começámos a ter
turistas”, anteriormente “as pessoas é que pediam
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para entrar e toda a gente entrava, mas ao público
propriamente dito foi há seis ou sete anos. As casas
também foram transformadas em casas de campo
dentro do turismo rural”.
Para além disto, José do Canto “fez uma das
maiores coleções particulares de Camões”, das
suas primeiras edições, “mas também tudo o que
havia escrito sobre Camões”, pois “ele andava pelo
mundo inteiro e tinha pessoas amigas colocadas
em lugares estratégicos que lhe mandavam
tudo o que saia sobre Luís de Camões”. Foi um
estudioso de Luís de Camões e fez uma coleção
“muito importante que hoje em dia tem um valor
incalculável e que está na Biblioteca Pública de
Ponta Delgada”.
Henrique Rodrigues contou que José do Canto
era de uma família importante de São Miguel e
entre os seus irmãos “que foram pessoas também
notáveis”, Ernesto do Canto, irmão mais novo do
segundo casamento do pai, e historiador, também
tem um jardim no Vale das Furnas”. Segundo
Henrique Rodrigues, o pai de José do Canto casou
duas vezes e teve 24 lhos.
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grupo musical que cria um conjunto de sonoridades
portuguesas com influências tradicionais folclóricas.
CLÁUDIA CARVALHO
Como é que surgiu a banda? Porquê o
nome ‘Bel Cantus’?
Este grupo surgiu em 2013, ainda numa
forma muito reduzida, interpretando
um tema tradicional, neste caso, “A
Saudade”, no dia de abertura das festas
das Lajes desse mesmo ano, aqui
na Ilha Terceira. Após essa atuação,
surgiu a ideia de formarmos um grupo
musical de uma forma mais regular
e séria e foi então que convidámos
mais dois elementos para completar os
Bel Cantus. O grupo apesar de já ter
sofrido algumas alterações desde a sua
formação inicial em termos individuais,
nunca abdicou do modelo base,
que é: Voz, Guitarra clássica, Flauta
Transversal, Acordeão, Viola Baixo e
Bateria.
O nome surgiu em “emergência”, pelo
simples facto de que tínhamos um
concerto marcado para breve num
festival de fado amador, e não tínhamos
nome, nem fados…
Reunimos e decidimos aparecer numa
versão que não era de todo aquela que
iríamos seguir, mas víamos uma boa
oportunidade de nos lançarmos ao
público com três fados que preparámos
para esta nossa estreia, continuava a
faltar era o nome…
Foi então que decidimos ir ao “Google”
e surgiu o termo Bel Canto, que está
relacionado com a importância da voz
na ópera italiana. Fizemos apenas uma
pequena alteração para que fosse mais
original, e transformando o termo em
Bel Cantus.
Quantos elementos é que compõem a
banda? Qual é o género que dene a
vossa banda?
A banda é composta por 6 elementos
atualmente, Rita Correia na Voz,
Celso Mendonça na Guitarra Clássica,
Rodrigo Lima na Flauta Transversal,
Marolo Silva no Acordeão, Vítor Costa
na Viola Baixo e Luís Costa na Bateria.
Esta é a nossa formação base, mas já
temos alguns temas cantados também
pelo Celso e pelo Luís.
Em termos de género, temos sempre
muita diculdade em encontrar
um termo que o dena, as nossas
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inuências são tradicionais folclóricas, mas a
nossa música não é nem tradicional nem folclore,
costumamos apenas identicar como música
portuguesa. A ideia foi sempre criar um ADN
próprio, que felizmente já surgiu e atualmente
começa a ser consolidado.
Dedicam-se exclusivamente à música
ou desenvolvem outros projetos a nível
prossional?
O único prossional na área da música para
já sou eu, Flautista prossional e professor de
Flauta numa escola. Temos outro elemento que
estuda no Porto Educação Musical e no futuro
também seguirá este caminho, que é o Luís
Costa, o nosso baterista, todos os outros têm
vidas prossionais diferentes, o Vítor Costa neste
momento encontra-se a estudar, o Marolo Silva é
engenheiro, o Celso é funcionário numa empresa
privada e a Rita está a estagiar no ramo que
escolheu, veterinária.
O lançamento do primeiro trabalho
discográco foi adiado graças às circunstâncias
e restrições dos tempos em que vivemos,
mas a NO sabe que é já no próximo dia 12 de
setembro que o “sonho” ganha forma. Como é
que se sentem com o lançamento deste primeiro
CD?
Estamos neste momento com a adrenalina a subir
a cada dia que passa, foi longa a espera, e neste
momento estamos a trabalhar na promoção deste
trabalho que levou quatro anos em estúdio. As
nossas expectativas mantêm-se intactas, porque
quem nos segue, ou quem tem gosto de nos ouvir,
irá estar presente seguramente no próximo dia
12 de Setembro no Centro Cultural de Angra do
Heroísmo e adaptar-se facilmente às condições
atuais, que cada vez mais fazem parte do nosso
dia-a-dia.
O lançamento do primeiro CD é, muitas
vezes, motivo de receio e de preocupação pela
recetividade junto do público. Estão conantes
do feedback que vão ter do vosso público?
Estamos conantes no sentido de que a Ilha
Terceira é um meio relativamente pequeno,
praticamente todos se conhecem e felizmente
o nosso trabalho tem vindo a ser reconhecido
ano após ano com imensos projetos novos que
temos apresentado. Sentimos que as pessoas nos
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E N T R E V I S T A
acarinham, o feedback das Rádios é muito positivo
em relação às nossas produções e é neste sentido
que não estamos preocupados com a recetividade
junto do público, mas sim entusiasmados por
nalmente conseguirmos concretizar este nosso
sonho e estarmos com o público que tanto
gostamos.
Como éque a banda se vê daqui a cinco anos?
Quais são os projetos futuros que têm em mente?
Vamo-nos ver certamente cinco anos mais velhos,
porque a idade não perdoa, mas em relação
a novos projetos, estamos neste momento a
trabalhar num que certamente sairá no próximo
ano, e calmamente iniciando outro que não temos
previsão de quando poderá ser apresentado.
Com esta situação da pandemia, estado de
calamidade, o car em casa, deu-nos para produzir
em vários sentidos, e aproveitar o muito tempo
livre que tínhamos para projetar o grupo Bel
Cantus para o futuro a médio/longo prazo, e neste
momento conseguimos.
Gostaria de aproveitar para especicar que neste
nosso primeiro trabalho intitulado “Alcance”, que
irá ser apresentado no dia 12 de Setembro no
CCAH como já referi anteriormente, terá alguns
convidados especiais:
Ao Piano estará Francisco Rocha, além de pianista,
compositor de dois temas nossos, João Mendes na
Guitarra Elétrica, Filipa Duarte e Catarina Melo
nos Sax Altos, Eric Oliveira no Sax Tenor, Beatriz
Borges e Gualter Silva nos Trompetes e nalmente
Rodrigo Lucas no Trombone.
Agradecer ao Sérgio Caldeira pelo Design do nosso
CD, ao Rui Caria pelo trabalho fotográco, ao João
Mendes pela gravação, edição e masterização.
A todos os autores das letras, Bruno Bettencourt,
José João Silva, Sandra Vieira e Álamo de Oliveira.
Aos nossos patrocinadores, porque sem eles tudo
isto não seria possível, e por m, a todos os nossos
familiares, amigos e ouvintes em geral.
Obrigado por nos terem impulsionado durante
sete anos para este nosso sonho que a cada dia que
passa está cada vez mais perto de se concretizar.
Está não só ao nosso “Alcance” como em breve
estará ao “Alcance” de todos vós…
Obrigado à NO pela oportunidade, em especial à
Cláudia Carvalho.
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“Os jovens açorianos sabem
o que querem para a Região”.
José Manuel Bolieiro, presidente do PSD/A
“O COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
É UM DESAFIO DIÁRIO E PERMANENTE”
JOÃO BRUTO DA COSTA, DEPUTADO DO PSD/A
“Desde que Vasco Cordeiro é Presidente do
Governo, a SATA teve resultados negativos de
260 milhões de euros, o que é motivo de muita
apreensão por parte de todos os açorianos”.
António Vasco Viveiros, deputado do PSD/A
“A política regional de transportes e
de turismo prejudica os terceirenses”
ARTUR LIMA, PRESIDENTE DO GRUPO PARLAMENTAR DO CDS/A
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