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Aulas de pintura, boxe e percussão na ONG Gerando Falcões | fotos: divulgação<br />
“Eu quero conquistar o mundo<br />
e mandar a desigualdade para o<br />
museu. É uma utopia, eu sei, mas<br />
não trabalho por menos que isso”<br />
Lemaestro<br />
Um reencontro que mudaria para sempre<br />
a vida de Lemaestro (e de muitas<br />
pessoas) deu-se por acaso, em 2011.<br />
“Eu estava saindo de uma escola depois<br />
de terminar uma oficina com a garotada<br />
e o Edu [Lyra] estava chegando<br />
para dar uma palestra sobre o livro que<br />
estava lançando [Jovens Falcões]. Estudamos<br />
na mesma escola, nos conhecíamos,<br />
mas não éramos próximos, ele era<br />
do futebol e eu do skate.” Os dois jovens<br />
conversaram e descobriram muitas<br />
afinidades. A amizade se fortaleceu e,<br />
em 2013, eles criaram a ONG Gerando<br />
Falcões, que nasceu para apoiar jovens<br />
da periferia na região em que cresceram<br />
(e conheciam bem), uma área que<br />
compreende o leste de São Paulo e parte<br />
dos municípios contíguos de Poá e<br />
Ferraz de Vasconcelos.<br />
Lemaestro e Edu Lyra | foto: divulgação<br />
Depois que saiu da clínica de recuperação, Lemaestro decidiu<br />
que precisava ajudar outras pessoas a se levantar ou, melhor<br />
ainda, evitar que elas caíssem. Ao lado de um amigo também<br />
skatista, oferecia oficinas de skate a crianças e jovens, atividade<br />
que começava com aula sobre o esporte e finalizava<br />
com um almoço coletivo. Os empregos e bicos eram intermitentes,<br />
mas ele seguia compondo, cantando rap e tentando<br />
conscientizar outros jovens por meio de seu próprio exemplo<br />
de superação. “Não me vejo fora do trabalho de transformação<br />
social. Sem isso, eu provavelmente nem estaria vivo,<br />
muitos amigos e conhecidos da minha geração já morreram<br />
ou estão presos”, diz.<br />
De acordo com as especialistas, a necessidade de ajudar<br />
pessoas próximas é um traço comum entre aqueles que<br />
se dedicam de corpo e alma ao trabalho social. A psicóloga<br />
Mariana Prioli Cordeiro explica que muitas dessas pessoas<br />
desejam “dar um sentido à própria história e às próprias<br />
ações” e, com isso, engajam-se primeiramente em trabalhos<br />
dentro da própria comunidade. Mariana diz que eles “se reconhecem<br />
e são reconhecidos no território onde atuam”, e isso<br />
serve de estímulo pessoal e coletivo. Graça Gonçalves complementa,<br />
afirmando que o impulso inicial é diferente quando<br />
o outro é abstrato e quando ele é conhecido, como vizinhos,<br />
ex-colegas de escola e parentes.<br />
Um dos corais da ONG Gerando Falcões | foto: divulgação<br />
Os Falcões passaram a oferecer projetos<br />
musicais e esportivos às escolas<br />
da região e criaram a Recomeçar, uma<br />
ação para ajudar egressos do sistema<br />
penitenciário no processo de reinserção<br />
na sociedade. Mas o começo não foi<br />
nada fácil. Lemaestro pediu demissão<br />
— era ajudante geral em uma pequena<br />
empresa — para montar a ONG e passou<br />
apertos até que a empreitada se<br />
estabilizasse. “Eu comia resto de arroz<br />
queimado, que era o que tinha, ficava<br />
sem água e luz por falta de pagamento.<br />
Foi mais ou menos um ano assim, no<br />
perrengue”, relembra.<br />
Cinco anos se passaram até que, em<br />
2018, a ONG atraiu a atenção do empresário<br />
e investidor Jorge Paulo Lemann.<br />
Como um toque de Midas, o<br />
apoio de Lemann foi o suficiente para<br />
os Falcões alçarem voo, atraindo o interesse<br />
de empresários de peso. Os Falcões<br />
ganharam envergadura nacional,<br />
estão presentes em mais de 670 favelas<br />
e comunidades pobres em praticamente<br />
todo o território brasileiro,<br />
criaram programas (presenciais e online)<br />
de formação de líderes e cursos de<br />
capacitação para expandir e melhorar<br />
a atuação de centenas de ONGs que auxiliam.<br />
Recentemente, a ONG demonstrou<br />
seu poder mobilizador ao anunciar<br />
que tinha captado, em 40 dias de<br />
campanha, 25 milhões de reais em doações<br />
para combater a fome agravada<br />
pela pandemia.<br />
O músico e empreendedor social Lemaestro<br />
sonha grande. Conta que,<br />
na primeira reunião para criar a ONG<br />
Gerando Falcões, ele, Edu, Mayara e<br />
Amanda já falavam em tornar a iniciativa<br />
global. “Eu quero conquistar o<br />
mundo e mandar a desigualdade para<br />
o museu. É uma utopia, eu sei, mas não<br />
trabalho por menos que isso.”<br />
“Não me vejo fora do trabalho<br />
de transformação social. Sem<br />
isso, eu provavelmente nem<br />
estaria vivo”<br />
Lemaestro<br />
<strong>INVERNO</strong> <strong>2021</strong> | <strong>EDIÇÃO</strong> 4 • PÁG. 31<br />
<strong>INVERNO</strong> <strong>2021</strong> | <strong>EDIÇÃO</strong> 4 • PÁG. 30