Livro dos afetos
Neste pérfido mundo de hoje, minado pela ganância, pela busca de lucro incessante e pelo desamor, somos presenteados, com afeto, por ideias e palavras que nos tocam a alma e nos fazem refletir sobre as incompletudes e limitações humanas e, dialeticamente, sobre força e coragem, apontando para a necessidade de nos reinventarmos, com coragem, dignidade e generosidade. Diria mesmo, que o amor é o sentimento que perpassa todo o livro: o amor pela poesia, pela escrita, pela liberdade, pelas pessoas, pela natureza, pela vida. VERA MACIEL LOPES
Neste pérfido mundo de hoje, minado pela ganância, pela busca de lucro incessante e pelo desamor,
somos presenteados, com afeto, por ideias e palavras que nos tocam a alma e nos fazem refletir sobre as incompletudes e limitações humanas e, dialeticamente, sobre força e coragem, apontando
para a necessidade de nos reinventarmos, com coragem, dignidade e generosidade. Diria mesmo,
que o amor é o sentimento que perpassa todo o livro: o amor pela poesia, pela escrita, pela liberdade, pelas pessoas, pela natureza, pela vida.
VERA MACIEL LOPES
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livro dos
afetos
sidney lianza
ilustrações
DIANA GONDIM
a potência dos afetos
Neste livro, estamos diante da composição da aventura,
da experiência, na linha que separa e liga as
interações entre o medo e a sensibilidade. Estamos
diante da escrita do risco e da intensidade na poética
da existência. Como foi possível fazer uma composição
em estilo de recordações, poemas e crônicas que
revela mais uma faceta da riqueza existencial desse
velho amigo?
Sidney Lianza, o Sidão, o companheiro de lutas e
ideais, o amigo, o dirigente político, o professor e o
engenheiro do social mais uma vez surpreende, ao se
oferecer para ser lido na transparência de corpo e
alma. O seu extremismo em matéria de generosidade,
que muitos conhecemos, só encontra equivalente no
impacto que gera toda sua abertura para o amor pela
vida, pelo conhecimento, pelo trabalho e pelas
pessoas, escrito em prosa e em verso nestas páginas.
Nesta composição da sinfonia da profundidade do
sentimento, com suas variações melódicas e cores
dramáticas, encontramos as perguntas e as respostas
provisórias de quem tem a ousadia de abrir a alma.
Conhecendo ou não a grandeza do autor, na sua paixão
pela busca da autenticidade, temos diante de nós a força
das palavras sobre o contato amoroso, na sua sonoridade,
na cena bem descrita. Vemos as grandes questões
do medo que atingem quem ousa sempre ir além, nesta
interrogação profunda que ganha força estética,
mostrando a grandeza ética de seu compositor.
Sidão nos lembra a relação com a mortalidade, com a
beleza, buscando o caráter curativo da escrita pela
força do autoexame e da rememoração. Encontra a
importância do silêncio e da solidão para compreender
e refletir sobre o que vale no nosso viver.
Ninguém sairá indiferente aos registros delicados, e
mesmo íntimos, com a carga da grandeza moral da
escrita deste militante pelo direito ao bem viver, que
não esconde o que nos assusta, ao se aprofundar no
que vale resgatar, nesta busca interminável pelos
laços que definem a dignidade do existir. No Livro dos
Afetos temos um grito pela vida na sua complexa e
impossível leveza.
CUNCA BOCAYUVA
· livro dos afetos ·
ilustrações
diana gondim
coordenação editorial
renata melo
livro dos
afetos
sidney lianza
Copyright © Sidney Lianza.
Todos os direitos desta edição reservados
à MV Serviços e Editora Ltda.
revisão
Natalia von Korsh
Marília Gonçalves
cip-brasil. catalogação na publicação
sindicato nacional dos editores de livros, rj
Meri Gleice Rodrigues de Souza – Bibliotecária – crb 7/6439
L661L Lianza, Sidney, 1950
Livro dos afetos / Sidney Lianza; ilustrações Diana
Gondim. – 1. ed. – Rio de Janeiro: Mórula, 2022.
136 p. : il. ; 24 cm.
isbn 978-65-86464-92-4
1. Crônicas brasileiras. I. Gondim, Diana. II. Título.
22-76734 cdd: 869.8
cdu: 82-94(81)
Rua Teotônio Regadas 26 sala 904
20021_360 _ Lapa _ Rio de Janeiro _ RJ
www.morula.com.br _ contato@morula.com.br
/morulaeditorial /morula_editorial
Para Amanda e Eva.
11 prefácio vera de f. maciel lopes
15 nota do autor
18 um dedo de prosa
escrever: ato de sistematizar a vida
23 poesia numa hora dessa?
24 desencontro
27 sentido da vida
28 um túnel interno
29 ruminações
30 explosão na paz
35 dever, paixão e loucura
39 pílulas poéticas
40 o remédio entra pelo ouvido
42 atitude no caos
43 morte no sonho
44 angústia e ansiedade
45 compaixão
46 ponto de exclamação colorido
49 fragmentos de identidade
50 três irmãos e a vocação
53 amor adolescente e eterno
56 vovô leonid
59 dona mila
60 a echarpe
62 dodô, meu pai
64 vila carioca
65 estoy enamorado
67 olha, meio quilo de jiló tá bom
68 o polegar e o rei bebê
70 dondeuvimprondeuvô?
73 moço, me dá seu ovo?
75 estação largo do machado
77 pica pau no mourão
79 do dragão ao ratão
81 tortura e traição
85 campanha eleitoral raiz!
87 um herói no trem de prata
88 legado de cesar
90 fado no chiado
92 diálogo com neta de 4 anos
94 esperançando
95 eu acabei concordando com a minha mãe
97 joan baez e mercedes sosa?
99 uma morada que vou chamar de minha
102 frutas
103 me safei
105 quero minha caixa de brinquedos
106 a calma é líquida
108 arrasto na praia de itaipu
110 casa grande queima rede de pescador
111 um corpo na estrada e o tapete voando
113 sabático em bogotá
115 matutando as coisas
116 agir e agitar!
119 o medo em meio ao pânico
123 eclipse
125 liberdade e cibernética
127 plano de invasão da minha “normandia”
130 futuro, passado e cotidiano
prefácio
vera de f. maciel lopes
usando uma metáfora, podemos dizer que o Livro
dos Afetos emerge e nos toca como ondas, oscilações
eletromagnéticas variáveis, às vezes o impacto das
ideias e das palavras vem com muita intensidade, às
vezes de forma branda. Uma energia que se propaga
e nos afeta, fazendo ressoar no vácuo do tempo as
experiências vividas pelo autor. E, apesar de datadas
— alguns escritos são da década de 1990 —, as reflexões
são profundamente atuais.
Neste pérfido mundo de hoje, minado pela ganância,
pela busca de lucro incessante e pelo desamor, somos
presenteados, com afeto, por ideias e palavras que nos
tocam a alma e nos fazem refletir sobre as incompletudes
e limitações humanas e, dialeticamente, sobre
força e coragem, apontando para a necessidade de nos
reinventarmos, com dignidade e generosidade. Diria,
mesmo, que o amor é o sentimento que perpassa todo
o livro: o amor pela poesia, pela escrita, pela liberdade,
pelas pessoas, pela natureza, pela vida.
Sidney Lianza é assim: um fogo que arde. Fogo que,
como disse Galeano (1995), “incendeia a vida com
tamanha vontade que é impossível olhar para ele sem
pestanejar”; fogo que contagia, que nos envolve, que
nos aquece e aglutina, e como aglutina! Nos anos da
juventude, os amores, os amigos e as aventuras, com
suas calças de tergal e vincos; nos tantos anos de militância
política, a dedicação e o compromisso com a
justiça social, cercado por valiosos companheiros
e pelos trabalhadores; depois, na vida acadêmica,
como professor da UFRJ, são incontáveis as gerações
11
distintas, amigos, pesquisadores, estudantes, trabalhadores
das mais diversas categorias que se aglutinaram
em torno de suas ideias. Sidney Lianza é fogo que nos
faz querer ficar juntos, sempre em grupo, à sua volta.
Fogo de acalanto e de inquietude, que não nos deixa
ficar inertes e indiferentes às injustiças do mundo.
O Livro dos Afetos inicia com uma conversa franca,
“um dedo de prosa” com o autor, que apesar de ter
vivido boa parte da sua existência imerso no mundo
acadêmico, mundo da razão científica, no livro deixou
emergir o que de fato é: poeta, navegante, mas não de
qualquer água, um navegante de mar bravios — “das
águas dos que elegem o compromisso com o conhecimento
e a sabedoria como base para a libertação
individual, social e humana”.
No segundo e no terceiro capítulos somos invadidos
pela poesia: “fogo, paixão, meteorito da vida,
acalanto, no sofrimento do planeta”, nos tornamos
parceiros, tocados por ondas eletrizantes — por vezes
mais intensas, outras muito suaves.
O quarto capítulo é uma explosão de energia, em
“fragmentos da identidade” nos tornamos íntimos, nos
deliciamos, passamos a compartilhar memórias que,
apesar de pessoais, particulares, se generalizam: nas
imagens da cidade, nos “personagens” da vida real, no
doce café preparado pelo avô, na ternura da vivência
familiar. Somos sacudidos pelos relatos da militância,
da prisão, da tortura da cela fria; pelas memórias dos
tempos de chumbo da ditatura civil-militar no Brasil,
uma história dolorida, porém necessária, que precisa
12
ser repassada e denunciada, por tudo de ruim que
representou, pelas tantas vidas interrompidas. Em
meio à dureza dos fatos narrados, somos invadidos
pelo acalanto, pelo carinho com que Sidney fala dos
companheiros da prisão, com uma generosidade imensa,
pleno de amor. Neste capítulo, o resgate da memória
nos propicia uma reflexão sobre a simplicidade e a
complexidade da vida — inquietude, expectativa, riso
e choro. Aqui, o desejo é de “economizar leitura” para
estar mais tempo em contato com tudo que nos é apresentado
pelo autor.
No último capítulo passamos a “matutar” juntos,
partilhamos um momento de introspecção filosófica,
singular, demarcada temporalmente, porém atemporal,
que nos ajuda a pensar sobre o sentido da vida,
principalmente nesse momento histórico, atual, de
isolamento, decorrente da pandemia do coronavírus,
agravado pela situação econômica e política do Brasil,
marcado por profundas desigualdades e injustiças
de um governo neofascista. Mas o recado e o afeto
vêm em forma de sabedoria: “Trabalhar com o equilíbrio
instável parece-me mais próximo da vida, mais
próximo do coração”, como o próprio autor diz, nos
inspirando a seguir na corda bamba da vida.
13
nota do autor
dentre os textos aqui reunidos, muitos não foram
elaborados com a finalidade de compor este livro. Não
por acaso, alguns deles vêm acompanhados das datas
de sua criação. Desde a adolescência, eu uso a escrita
para dialogar comigo e para me entender. Digamos que
eu faço meu inventário costumeiramente. Lembro a
primeira vez: adolescente, recostado numa árvore,
escrevi torrencialmente desde as minhas primeiras
lembranças da vida até aquele momento. Por quê?
Não sabia. Hoje, no máximo, desconfio.
Eu nasci professor, só que não sabia, pois, como
vocês verão, meus pais tramaram que eu seria engenheiro,
e... tchan! Virei engenheiro. Nunca projetei
um prédio, uma ponte, nunca exerci a profissão.
O título foi importante, não posso cuspir no prato em
que comi, porque me deu a régua e o compasso para
ser professor de Matemática, Estatística e Cálculo
durante três décadas, de cursos supletivos a cursos
pré-vestibulares; de ensino fundamental e médio ao
ensino superior — todos particulares, inicialmente.
Com o diploma, me habilitei a cursar o mestrado
e o doutorado em Engenharia e me tornei professor
da Engenharia de Produção da UFRJ. Mas lá nunca
me considerei engenheiro, tanto que as disciplinas
humanistas, socioambientais, os meus colegas sempre
diziam: “esta é pro Sidão” (este é o meu apelido, desde
criança, que virou meu nome. A maioria das pessoas
não sabe que meu nome é Sidney). E não é que esse
povo acabou respeitando o meu jeito de ser?
Finalmente, foi no Centro Acadêmico da Escola de
Engenharia que iniciei a minha militância política.
15
16
Na década de 1990 eu fui atropelado por uma depressão
que não desejo nem pra inimigo. Sabe quando lhe tiram
a vida, mas não lhe dão a morte? Pois é, se não foi isso,
foi quase isso. Eu, então, relancei-me na escrita para
diálogos unários, eu comigo mesmo. Tentava espantar
o medo medonho que colava em mim dia e noite, atormentando-me,
desconcentrando-me, desrealizando-me.
Resolvia o problema? Sozinho, não, mas com uma combinação
de terapias: a psicanálise, a psiquiatria, o Tai chi
chuan, o yoga, a meditação, mas também o cigarro, a
bebida... Foi aí que eu me estrepei, porque remédios
para combater a depressão e bebida alcoólica não são
uma boa mistura, nem um bom conselho. Em lugar de
melhorar, só fiz piorar.
O “perdeu playboy” foi em 2002, foi o fim de linha,
e tive que dar a reviravolta: parei de beber e, logo em
seguida, de fumar, tirei o bode da sala. Comecei a me
tratar de maneira terna e carinhosa como todo ser
humano vivo deveria fazer, posto que somos, cada
um, um templo sagrado do mistério da vida.
Há pouco mais de cinco anos comecei a escrever
coisas sobre a minha vida, infância, família, militância
política, causos da vida profissional, cacos que apareciam.
Começou a se desenhar um gosto de ser lido. Fiz
um blog, escrevia nele e nas redes sociais. Há menos
de dois anos começou a germinar a ideia de publicar
um livro, mas não prosperou.
A pandemia virou os planos de cabeça pra baixo. Foi
de ponta-cabeça que eu comecei a matutar o que faria
da minha vida. Eu ainda não contei, mas me aposentei
da UFRJ em 2018 e hoje moro com minha companheira,
Daisy, num sítio no meio da mata e ao lado de um rio.
Durante esse tempo fiquei com receio de ser só
uma vaidade minha querer publicar o livro, posto
que é uma grande produção. Entretanto, recebi vários
estímulos, de familiares e amigos. Parte de todos os
meus escritos poderia ganhar uma forma a partir da
inspiração em outros tantos livros existentes, alguns
até clássicos, como o Livro dos Abraços, de Eduardo
Galeano. Lembrei de Umberto Eco afirmar no seu
livro Como se faz uma tese, parafraseando-o: se você
for um anão num ramo da vida, suba nas costas de
um gigante. A partir daí emergiu mais facilmente a
convicção de denominar o possível livro de Livro dos
Afetos, inspirado no Livro dos Abraços.
Restava, no entanto, um outro temor. O sentimento
de que o que escrevi seria muito íntimo para exposição
a um público amplo. Foi então que emergiu para mim
um trecho do romance A Pane, do escritor Friedrich
Dürrenmatt, no qual afirma:
Se alguém não quiser narrar sobre si mesmo,
generalizar seu eu de um modo romântico, lírico,
se não sentir obrigação de falar de suas
esperanças e derrotas, com total veracidade,
de falar do seu jeito de deitar-se com mulheres,
(...) mas antes recuar discreto, educadamente
preservando a privacidade (...) então o
ato de escrever torna-se mais difícil e solitário,
mas sem sentido também. (Negrito meu)
Isso pra mim foi definitivo, uma pá de cal em minhas
dúvidas: decidi abrir os porões de minha alma para
visitação pública. E, quem sabe, aos 70 anos iniciar
um outro percurso como escritor. Quem sabe?
17
Este livro foi impresso no Rio de Janeiro e composto com as
fontes Tiempos e Galano. O papel utilizado no miolo é o offset
120g/m². Para a capa foi utilizado o duodesign 250 g/m².
SIDNEY LIANZA nasceu em São Paulo, em 1950.
Filho de Dona Mila, nascida na Romênia, e de seu
Dodô, nascido em São Paulo, descendente de italianos.
Vive no Rio de Janeiro desde 1976, onde nasceu sua
única filha, Amanda. Em 2015 se tornou avô da Eva.
Atuou na luta contra o regime militar como militante
do Movimento pela Emancipação do Proletariado
(MEP), tendo sido preso político em 1977 e, mais tarde,
um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores
(PT). É professor aposentado da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, UFRJ, onde trabalhou no Curso de
Engenharia de Produção da Escola Politécnica.
Pautou o ensino-aprendizagem, a pesquisa e a
extensão de maneira interdisciplinar e pelas metodologias
participativas. Isso propiciou envolver
estudantes em trabalhos acadêmicos junto a metalúrgicos,
moradores de bairros populares e em especial
aos pescadores artesanais. Foi diretor da Rede
Interuniversitária de estudos e pesquisas sobre o
trabalho — UNITRABALHO. Participou da fundação
do Núcleo de Solidariedade Técnica - SOLTEC-UFRJ
e do Núcleo Interdisciplinar para o Desenvolvimento
Social do Centro de Tecnologia-NIDES/UFRJ. É
graduado em Engenharia Civil pelo Instituto Mauá de
Tecnologia, além de mestre e doutor em Engenharia
de Produção pela COPPE — Universidade Federal do
Rio de Janeiro. É autor de quatro livros de teor acadêmico
sobre os temas da economia solidária, tecnologia
social e extensão universitária. Neste livro navega por
caminhos mais literários, reunindo poesias, contos e
causos sobre sua vida, infância, família, militância,
trabalho, amores, viagens, os dias de tortura, de
depressão e de reencontro consigo a partir da escrita.
Neste pérfido mundo de hoje, minado pela ganância,
pela busca de lucro incessante e pelo desamor,
somos presenteados, com afeto, por ideias e palavras
que nos tocam a alma e nos fazem refletir sobre as
incompletudes e limitações humanas e,
dialeticamente, sobre força e coragem, apontando
para a necessidade de nos reinventarmos, com
coragem, dignidade e generosidade. Diria mesmo,
que o amor é o sentimento que perpassa todo o livro:
o amor pela poesia, pela escrita, pela liberdade, pelas
pessoas, pela natureza, pela vida.
VERA MACIEL LOPES
ISBN 978658646492-4
9 78 6 5 8 6 4 6 4 9 2 4