Peter Pan Surdo
Autor: Hélio Alves de Melo Neto Ilustrações: Renata Redmerski Adaptação do livro de J. M. Barrie. www.culturainglesafestival.com.br
Autor: Hélio Alves de Melo Neto
Ilustrações: Renata Redmerski
Adaptação do livro de J. M. Barrie.
www.culturainglesafestival.com.br
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Agradeço a Deus por me fortalecer em cada luta<br />
ao longo da minha trajetória. Ao povo surdo,<br />
minha maior inspiração, com quem construí<br />
cultura e identidade. J.M. Barrie, que me encantou<br />
com sua magia, me deu asas para transformar<br />
esta história, enriquecendo-a com os elementos<br />
culturais vibrantes do meu povo.<br />
Este e-book foi realizado com apoio do 27º Cultura Inglesa Festival.<br />
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PETER PAN SURDO<br />
No ano 1904, 24 anos após o Congresso de Milão recomendar que<br />
o ensino de surdos fosse por meio do oralismo (linha pedagógica que<br />
entendia a fala, a oralização, como caminho de aprendizagem dos surdos)<br />
o que causou profundo entristecimento e indignação nas pessoas surdas.<br />
A casa da família Darling, localizada na cidade de Londres, onde o<br />
Sr. Jorge Darling e a Sra. Mary Darling são os pais e os responsáveis por<br />
três filhos surdos. A filha mais velha chama-se Wendy, uma encantadora<br />
menina de 12 anos, que adora sonhar e contar histórias. O filho do meio<br />
atende pelo nome de João, tem 8 anos, é inteligente e esperto, costuma<br />
usar óculos de lentes e uma cartola, seus acessórios favoritos. O caçula,<br />
Miguel, com 4 anos, é carinhoso e amigável, sempre acompanhado por seu<br />
inseparável companheiro, um urso de pelúcia. Além disso, não podemos<br />
esquecer de mencionar Naná, um membro adorável da família, uma grande<br />
cadela da raça São Bernardo, muito querida por todos os Darling.<br />
Numa noite em Londres, os irmãos João e Miguel brincavam de<br />
incorporar uma luta entre o Capitão Gancho e um indígena em seu quarto,<br />
sempre fazendo bagunça. Enquanto isso, Wendy se ocupava organizando<br />
as coisas para cuidar de seus irmãos como se fosse a mãe. Além disso,<br />
Naná, a cadela da família, permanecia quieta, vigiando os irmãos durante<br />
a brincadeira.<br />
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O Sr. Jorge Darling ficou furioso ao perceber que havia perdido suas<br />
abotoaduras e começou a procurá-las. Enquanto isso, a Sra. Mary Darling<br />
estava se preparando para ir a um baile e vestia um lindo traje.<br />
O pai eventualmente encontrou as abotoaduras, percebendo que<br />
eram consideradas um tesouro na brincadeira dos irmãos. João, então, foi<br />
pedir desculpas a ele.<br />
A mãe, por sua vez, notou que Wendy já se expressava muito bem<br />
oralmente e já estava crescida. Ela a chamou para sentar na cama e<br />
expressou seu orgulho:<br />
- Sinto-me muito orgulhosa de você, pois está se desenvolvendo<br />
bem nas sessões de fala e começando a se tornar uma jovem. Já está na<br />
hora de começar a usar aparelho auditivo para você ouvir.<br />
- Ah, mãe, não posso ser obrigada a ouvir. Já é o suficiente treinar a<br />
fala, não é?<br />
- Está bem, mas é importante praticar a audição e conviver na<br />
sociedade ouvinte para melhorar cada vez mais! E, além disso, deixe de<br />
contar histórias para as crianças e enfrente o desafio de crescer.<br />
- Mãe! Não quero parar de contar histórias, isso me faz bem!<br />
- Está bem, Wendy. Agora, seu pai está pronto, e precisamos ir ao<br />
baile. Desejo que cuide bem de seus irmãos e que durmam cedo - disse a<br />
Sra. Mary Darling.<br />
- Agora, vou colocar Naná no canil lá fora. – disse o Sr Jorge Darling<br />
- Por favor, deixe Naná ficar conosco aqui. - Wendy implorou.<br />
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- Aqui não é o lugar certo para a cadela dormir. - disse o pai.<br />
Assim, Wendy temia o processo de crescer por causa das<br />
expectativas de seus pais, mas mais tarde aprendeu a encarar o futuro com<br />
uma imaginação fértil.<br />
Assim, numa noite silenciosa, como se não houvesse sons<br />
perturbadores durante o sono, os irmãos dormiam tranquilos. Uma luz<br />
brilhante adentrou entre as janelas, percorrendo o quarto dos irmãos. Era<br />
Tinker Bell, uma pequena fada, curiosa para descobrir o que havia naquele<br />
ambiente.<br />
Um misterioso vulto surgiu no quarto, movendo-se com cuidado para<br />
não perturbar o sono dos irmãos adormecidos. Ele voou pelo interior do<br />
quarto, deslizando silenciosamente pela escuridão.<br />
- Encontrei sua sombra escondida na gaveta – sinalizou Tinker Bell.<br />
- Por favor, segure essa sombra para mim – o vulto moveu as mãos.<br />
Aproximou-se da gaveta, tentando abri-la. – Você pode me ajudar a entrar<br />
pelo buraco da gaveta?<br />
- Pode deixar! – A fadinha fez o que o vulto pediu, adentrando a<br />
gaveta para resolver a abertura da tranca. No entanto, a sombra do vulto<br />
escapou. Ao persegui-la, o vulto acabou causando confusão no quarto.<br />
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A confusão resultou em cutucões em Wendy, João e Miguel, que<br />
eram sensíveis ao toque por serem surdos. Wendy acendeu o abajur para<br />
investigar o que estava acontecendo. Um garoto vestindo roupas<br />
inteiramente verdes, algo simples, porém fora do comum para as<br />
vestimentas da época das crianças, surgiu. Seus cabelos eram de um tom<br />
castanho claro, e ele aparentava ter cerca de 12 anos. Ao ser iluminado<br />
pela luz do abajur e da lâmpada, ficou imóvel ao perceber que Wendy<br />
estava acordada.<br />
- <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>? – Wendy falou em voz alta.<br />
Sim, ele era mesmo o <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e estava realmente voando. No<br />
entanto, ao perceber que a garota falou oralmente, ele não compreendeu.<br />
Foi então que Tinker Bell se aproximou de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, entendeu o que<br />
Wendy disse e assumiu o papel de intérprete, interpretando o que Wendy<br />
disse para a LSB (Língua de Sinais Britânica). Essa era a habilidade de<br />
Tinker Bell, ser intérprete e tradutora.<br />
- Ah, sou o <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>. Desculpe, sou surdo. Não sou bom em leitura<br />
labial.<br />
Tinker Bell transmitiu a interpretação para Wendy, que não entendia<br />
a língua de sinais. Infelizmente, ela não conseguiu ler os lábios da fadinha,<br />
pois a boca dela era muito pequena. Mas Wendy conseguiu compreender<br />
as sinalizações do menino.<br />
- Nossa, não acredito que você é o <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> mesmo. Eu contei<br />
sobre você na história aos meus irmãos. – disse Wendy.<br />
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- É mesmo? – disse <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, mas de repente percebeu o<br />
movimento de sua sombra deslizando pelo chão. Ele correu atrás dela,<br />
fazendo várias tentativas até finalmente conseguir pegá-la perto da escada,<br />
fora do quarto.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> tentou juntar os pés de sombra aos seus, sem saber como<br />
fazer. Quando Wendy o seguiu e viu o que ele estava fazendo, entendeu<br />
que ele estava tentando reunir sua sombra. Ela foi buscar uma agulha e<br />
linha, retornou a <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e costurou o pé da sombra ao pé dele.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> ficou admirado com a habilidade de Wendy, e tudo deu<br />
certo, a sombra se juntou ao corpo dele.<br />
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- Obrigado pela ajuda – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> sinalizou a Wendy.<br />
- De nada – respondeu a garota.<br />
Quando as luzes das lâmpadas começaram a piscar e João mexeu<br />
no interruptor, acabou sendo acordado.<br />
- Você... é... o <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>? - Ele falou com dificuldade.<br />
- Sim, sou o <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>! - O rapaz sinalizou, mas o irmão de Wendy<br />
mal conseguia entender o que ele sinalizava.<br />
Miguel também acordou e foi puxando o pijama do irmão tentando<br />
entender o que está acontecendo. Ele olha confuso, tentando identificar o<br />
menino e a pequena criatura apontando para os dois.<br />
Wendy foi na direção dos irmãos e explicou que era ele mesmo o<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> das histórias que contava para eles. Era ele mesmo que lutou<br />
contra os piratas.<br />
Miguel, ainda meio sonolento, piscou os olhos algumas vezes,<br />
processando a informação. "<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>? Piratas? Isso não pode ser real",<br />
murmurou consigo mesmo. Enquanto tentava entender a situação, uma<br />
sensação de empolgação e curiosidade começou a crescer dentro dele,<br />
antecipando a aventura que estava prestes a começar.<br />
- Fico feliz por vocês serem surdos como nós. Vamos conhecer o<br />
mundo dos surdos, a Terra do Nunca Ouve? – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> diz.<br />
- Oba! Estou animada para mergulhar na nossa aventura na Terra<br />
do Nunca Ouve! Quero conhecer os surdos, a língua de sinais e a cultura<br />
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surda! – Ela se virou para os dois irmãos – Vamos nos aventurar na Terra<br />
do Nunca Ouve? – Wendy diz empolgada.<br />
Os dois meninos balançaram a cabeça afirmativamente. <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong><br />
e Tinker Bell se aproximaram da grande janela para voar.<br />
.<br />
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- Mas <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, como nós vamos para a Terra do Nunca Ouve? –<br />
Wendy falou sem saber.<br />
- Ah, verdade! Como eu faço para vocês irem comigo até a ilha dos<br />
surdos? – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> duvidou. Ele pensou por alguns segundos e surgiu a<br />
ideia. Pegou a fadinha e passou para soltar os pós mágicos nos três irmãos.<br />
Aconteceu que eles flutuaram e começaram a voar. Ficaram empolgados<br />
com o voo! Era a primeira vez que voavam! E ficaram voando, circulando<br />
pelo ambiente interno da casa.<br />
- Vamos voar para fora? – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> sinalizou.<br />
- Vamos! – Wendy diz e se virou para os irmãos – Vamos nos<br />
preparar logo!<br />
As crianças e a fadinha voaram para fora de casa. Quando Miguel<br />
percebeu que a cadela Naná estava presa no canil, ele voou até Tinker Bell<br />
e a pegou, soltando pó mágico em Naná, que acabou flutuando do chão.<br />
Infelizmente, ela não podia voar com as crianças, pois estava presa por<br />
uma coleira no canil. Miguel ficou um pouco chateado por Naná não poder<br />
ir com eles. Então, voou na direção das outras crianças no céu noturno.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, Wendy, João, Miguel e Tinker Bell voaram sobre a bela<br />
cidade de Londres, circulando acima do espaço urbano. Sentiram a<br />
tranquilidade do voo enquanto <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> guiava as crianças pelo céu,<br />
avistando os pontos mais famosos de Londres: a Torre de Londres, a Tower<br />
Bridge e a Catedral de São Paulo. Em seguida, direcionaram-se para o<br />
grande relógio do Big Ben. Pousaram no ponteiro do relógio e pararam para<br />
observar a paisagem da cidade, encantados com a vista.<br />
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- Estão prontos para ir para a Terra do Nunca Ouve? – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong><br />
sinalizou.<br />
As três crianças balançaram a cabeça em sinal de sim e pularam do<br />
ponteiro, voando em direção ao céu noturno distante. Aproximaram-se das<br />
nuvens e logo chegaram ao céu da Terra do Nunca Ouve.<br />
A Terra do Nunca Ouve era uma ilha enorme e isolada, repleta de<br />
florestas verdes, cachoeiras e praias, com a presença de alguns animais.<br />
No horizonte, avistaram um grande navio com várias bandeiras marcadas<br />
com o símbolo de "proibição de mãos" em três mastros, navegando pelo<br />
mar.<br />
- Olha, <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> está voltando no céu – disse um pirata com uma<br />
maneira diferente de falar, devido à sua surdez. Ele correu até a porta da<br />
cabine principal e bateu na porta.<br />
- O rato, ratazana, o ratinho, roeram as rútilas roupas e rasgaram...<br />
– o Capitão Gancho estava tentando falar, mas seu discurso foi<br />
interrompido pelo som da batida na porta quando o Sr. Smee, seu fiel<br />
fonoaudiólogo, tratava das falas do seu patrão.<br />
- Por que está me perturbando? – disse o Capitão Gancho.<br />
O Capitão Gancho é um capitão dos piratas, tem cabelo comprido e<br />
preto, um belo e reto bigode, gosta de roupa elegante, como o paletó<br />
vermelho, até uma mão decepada, que foi coberta por um gancho de prata.<br />
Ele é surdo oralizado.<br />
- Olha, <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> está voltando e está voando com outras crianças<br />
no céu! Venha ver<br />
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- Ele está vivo? Ele não deveria cuidar de crianças surdas em terra<br />
firme?<br />
fora.<br />
Capitão Gancho saiu da cabine para ver o que aconteceu do lado de<br />
- Olha, seu inimigo está lá em cima. Veja também outras crianças<br />
próximas dele. – Um dos piratas disse, enquanto todos olhavam para cima.<br />
- Que droga! Vamos atacá-los. Preparem os canhões! – Capitão<br />
Gancho ordenou seus comandados para preparar o ataque contra <strong>Peter</strong><br />
<strong>Pan</strong>, e eles obedeceram. – Já, fogo!<br />
Wendy conseguiu enxergar o símbolo estampado na bandeira e<br />
achou que entendeu. Ela perguntou:<br />
- Aquela figura na bandeira significa que é proibição de movimentos<br />
de mãos, como a proibição de língua de sinais no navio?<br />
- Sim, é isso. O Capitão Gancho não permite que os surdos<br />
sinalizados permaneçam no navio, nem mesmo na ilha! Ele tenta tirar as<br />
crianças surdas sinalizadas da ilha e quer ser o proprietário dela! Acredita?<br />
- Que horror! – Wendy comentou com expressão enojada.<br />
A primeira bola já lançada do canhão para o céu, indo em direção a<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e as crianças. No entanto, eles conseguiram escapar do ataque.<br />
A segunda foi lançada novamente, mas as crianças escaparam novamente,<br />
e a terceira foi na direção delas, mas errou o alvo.<br />
- Por que não sabem mirar no alvo das crianças? – O Capitão<br />
Gancho gritou para seus comandados.<br />
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- Já fizemos tentativas de mirar no alvo – disse o Sr. Smee.<br />
Quando as bolas foram lançadas do canhão para o céu, em um lugar<br />
bem distante, havia os garotos <strong>Surdo</strong>s perdidos circulando na ilha. O<br />
movimento da bola chamou a atenção de um deles, que viu <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> no<br />
céu.<br />
- Olha, <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> lá em cima. Ele está voltando! – Um dos meninos<br />
surdos sinalizou.<br />
céu.<br />
- Onde? Onde? – Outro perguntou, tentando encontrar seu amigo no<br />
- Olha lá! Que alegria, ele está voltando! – disse outro garoto surdo.<br />
- Que novidade! <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> está trazendo mais crianças para cá! Será<br />
que elas são surdas? – Outro sinalizou. Todos pularam e aplaudiram.<br />
- Na mesma embarcação, Capitão Gancho ficou revoltado e<br />
comentou com Sr. Smee:<br />
- Não adianta atacar <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e os novos habitantes; nossa ilha não<br />
precisa deles. Precisamos criar uma estratégia para um novo ataque a<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e elaborar um novo plano. Vamos pensar logo! – O vilão<br />
conversou com seu servo, e juntos começaram a planejar.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e os irmãos Darling pousaram numa enorme pedra que<br />
está no mar para escapar do ataque das bolas de canhão. Aconteceu que<br />
a bola foi lançada na mira das crianças que estavam na pedra e, elas foram<br />
lançadas no mar. Os garotos surdos perdidos viram o que aconteceu e<br />
ficaram assustados e preocupados com o bem-estar das crianças.<br />
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- Vamos lá aonde <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e os amigos caíram. Vamos salvá-los –<br />
Uma indígena surda montou um cavalo e foi tentar ajudar as crianças. Que,<br />
por sua vez, caminharam até a beira da praia.<br />
Wendy estava desmaiada na praia, quando as crianças a<br />
encontraram. Um dos meninos tocou a garota que acordou e viu os<br />
meninos e a indígena.<br />
- Você está bem? – sinalizou a indígena no cavalo e Wendy<br />
conseguir entender.<br />
- Estou bem. – Ela conseguiu expressar em língua de sinais e ficou<br />
um pouco perdida. – Onde está <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>? E meus irmãos, João e Miguel?<br />
- Apenas encontramos você aqui e não sabemos onde estão <strong>Peter</strong><br />
<strong>Pan</strong> e seus irmãos. – Um dos meninos perdidos respondeu.<br />
vilão!<br />
- Ah Meu Deus! Não posso deixar meus irmãos caírem na mão desse<br />
- Não se preocupe. Nós vamos ajudar você a reencontrar seus<br />
irmãos. Primeiramente, deixe me apresentar. Meu nome é Tigrinha e meu<br />
sinal é esse. Esses são meus amigos surdos perdidos. – Tigrinha se<br />
apresentou e também os amigos, mostrou o sinal dela que era os três<br />
dedos na bochecha com movimentos circulatórios. Esses garotos surdos<br />
apresentam uma diversidade: um é surdocego, o outro surdo com<br />
deficiência física e o outro é surdo autista, um é surdo com síndrome de<br />
Down, outro surdo com TDAH, um surdo negro, e surdos gêmeos.<br />
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- Uau, esse grupo surdo é incrivelmente diverso! Muito legal. Muito<br />
prazer em conhecer todos vocês. Podemos procurar <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e meus<br />
irmãos e deixar a conversa para depois? – Se expressou a Wendy.<br />
- Claro que sim! Vamos procurar imediatamente - diz Tigrinha.<br />
- Espera, vou dar uma olhada com meu monóculo, diz um dos<br />
garotos surdos, realizando uma observação à distância da embarcação.<br />
Descobriu que os irmãos Darling foram capturados pelos piratas e estão a<br />
bordo da embarcação do Capitão Gancho.<br />
- Seus irmãos já foram capturados pelo Capitão Gancho, Wendy. É<br />
lamentável. - Avisa um dos garotos.<br />
- Puxa vida! O que vamos fazer para resgatar meus irmãos? - diz<br />
Wendy, mostrando sua preocupação.<br />
- Vamos elaborar um plano para resgatar seus irmãos. Mas primeiro,<br />
precisamos encontrar nosso herói, e então, salvaremos seus irmãos! -<br />
explica Tigrinha, sinalizando com intensidade, enquanto todos fazem o<br />
mesmo, levantando os braços para cima.<br />
No navio, o Capitão Gancho ficou empolgado ao saber que João e<br />
Miguel foram capturados pelos piratas.<br />
- Ei, que ursinho bonito esse seu. Você mesmo que matou? – diz um<br />
dos piratas, exibindo um sorriso maligno.<br />
- Não encosta no meu ursinho! – Miguel respondeu com sinais<br />
caseiros e tentou dar chutes em um dos piratas.<br />
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- Finalmente, os dois moleques foram pegos. E <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>? E aquela<br />
esquisita?<br />
- Não conseguimos pegar esses dois. Respondeu um dos<br />
comandantes.<br />
- Que droga! Vamos elaborar um plano para atrair <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>! Disse<br />
o Capitão Gancho dirigindo-se aos meninos presos com corda no mastro<br />
do navio. - Ei, meninos. Conseguimos capturar vocês! De onde vocês<br />
vieram?<br />
- “Voê” é “muido” mau. Você é “peligozo”! - João xingou o vilão.<br />
- Nossa! Você é surdo como eu e conseguiu falar. Mas é lamentável,<br />
você não fala muito bem e será obrigado a fazer tratamento de fala na<br />
cabine do fonoaudiólogo Smee. Isso é regra neste navio! - Disse o Capitão<br />
Gancho, rindo e virando-se para o Sr. Smee. - Finalmente, Sr. Smee,<br />
chegaram mais dois surdos que precisam de tratamento de fala. É sua<br />
oportunidade de trabalhar com eles.<br />
Então, o Capitão Gancho pelo navio e teve uma ideia. Subiu para a<br />
proa e falou para todos os piratas:<br />
- Já vamos para a caverna usar os dois irmãos como isca para atrair<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>. Estejam preparados!<br />
Wendy e os garotos perdidos entraram na caverna para pensar num<br />
plano para encontrar <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e Tinker Bell, bem como os irmãos Darling.<br />
Eles se esconderam em uma parte da caverna e viram o Capitão Gancho,<br />
os piratas e os irmãos chegando.<br />
- Essa não, Miguel não sabe nadar.<br />
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Os piratas prenderam os meninos Darling e o ursinho com algemas<br />
e correntes penduradas na pedra. O Capitão Gancho esperava que a maré<br />
subisse para afogar suas vítimas. Um outro pirata desconhecido subiu ao<br />
topo da pedra com outros.<br />
- A maré está subindo! - João ainda não tinha entendido o que o<br />
Capitão Gancho disse - Ah, eles são surdos, deixem pra lá. – O vilão virouse<br />
para os piratas. - Não queremos crianças surdas sinalizadas aqui! Regra<br />
44: nada de crianças surdas sinalizadas na Terra do Nunca Ouve!<br />
O Capitão Gancho percebeu um pirata desconhecido no topo da<br />
pedra que nunca tinha visto antes e apontou o dedo na direção dele.<br />
- Você! Qual é seu nome? Há quanto tempo está servindo no meu<br />
navio?<br />
O pirata desconhecido perdeu o controle de voo e os outros piratas<br />
correram atrás dele. Um deles puxou sua roupa e <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> apareceu.<br />
- Que barba falsa! – disse Sr Smee. O Capitão Gancho e os piratas<br />
ficaram surpresos ao vê-lo.<br />
Os piratas se preparavam para atacar com suas espadas, quando<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> saltou para a água. Emergindo da água, ele e Tinker Bell<br />
apareceram.<br />
Wendy e as crianças também ficaram surpresas ao ver que <strong>Peter</strong><br />
<strong>Pan</strong> e Tinker Bell estavam vivos. Eles comemoraram e suas mãos se<br />
levantaram e se movimentaram.<br />
Os garotos perdidos surdos foram até os piratas para atacar. <strong>Peter</strong><br />
<strong>Pan</strong> pegou a espada para golpear as algemas que prendiam João e Miguel,<br />
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liberando os irmãos. No entanto, o crocodilo apareceu para atacá-los. <strong>Peter</strong><br />
<strong>Pan</strong> viu a situação e voou na direção dos irmãos para salvá-los.<br />
- O crocodilo ainda está vivo? – disse o Capitão Gancho.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> deixou os irmãos do outro lado, na pedra, e quando<br />
Wendy correu até João e Miguel, e os abraçou.<br />
Estou aliviada em ver que vocês estão bem, meus irmãos! – Wendy<br />
falou com gestos, olhando para <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>. E disse: – Olhe, o Capitão<br />
Gancho está vindo atrás de você, se prepara!<br />
- Obrigado por alertar – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> sinalizou. Ele virou-se para ver a<br />
batalha que estava acontecendo entre o Capitão Gancho, os piratas e os<br />
garotos surdos perdidos. – Preciso ir. Sinalizou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> voou na direção do Capitão Gancho para lutar.<br />
- Que moleque exibido e desrespeitoso! – disse Capitão Gancho<br />
ofendendo <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>. – Você não deveria estar aqui na Terra do Nunca<br />
Ouve conosco!<br />
- Respeite <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>! Respeite os garotos surdos! Respeite nossa<br />
língua de sinais! Respeite nossa cultura surda. – Wendy revoltou-se em<br />
defesa do povo surdo.<br />
- Quem é você? – Capitão Gancho perguntou.<br />
- Sou Wendy Moira Angela Darling. Você raptou meus irmãos e nos<br />
atacou com a bola de canhão!<br />
- O problema é seu, este lugar não serve para você. Ah, você precisa<br />
melhorar sua fala na língua oral.<br />
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Capitão Gancho ficou paralisado após a luta, mas sentiu algo<br />
estranho, pois o chão onde pisava se movimentou. Percebeu que era a<br />
boca do crocodilo e se assustou. Aconteceu que a boca do crocodilo se<br />
abriu, deixando o Capitão Gancho saltar para cima. Então, ele voltou para<br />
baixo em direção à boca do crocodilo. Ele ficou desesperado para não cair<br />
na boca do réptil, então segurou cada pé na ponta da boca para evitar a<br />
queda. O crocodilo tentou fechar a boca e conseguiu, fazendo o capitão<br />
saltar para a água.<br />
Rendam-se, parem a batalha! – O vilão disse com a voz<br />
desesperada, e ordenou aos piratas que corressem de volta para o navio.<br />
Os comandados obedeceram às ordens do capitão, e o Sr. Smee foi de<br />
barco buscar o Capitão Gancho e levá-lo de volta. Remou o mais rápido<br />
possível para sair da caverna, quando o crocodilo os atacou. Mas<br />
conseguiram escapar da caverna e foram em direção ao navio.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, Tinker Bell, Wendy, João, Miguel e os garotos surdos<br />
perdidos se reuniram, saindo da caverna e comemoraram, exceto Wendy.<br />
- Finalmente, conseguimos enfrentar a batalha! Foi divertido! – <strong>Peter</strong><br />
<strong>Pan</strong> sinalizou. Quando Wendy deu um tapa na face de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>. - Não<br />
era uma aventura tão divertida? Não era isso que você queria?<br />
- Era, mas eu não esperava ser atacada por piratas no céu. – Wendy<br />
comentou.<br />
- Nem ser afogado. – João disse.<br />
- Nem desmembrado, nem perder braços e pernas. – Miguel disse<br />
com os gestos.<br />
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- Foi mal. Peço desculpas. É hora de irmos embora. – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong><br />
disse, abalado com o tapa de Wendy.<br />
- Esqueçam essa briga boba. O que importa é que estamos salvos e<br />
bem. É hora de irmos. – Tigrinha pediu com calma, e os garotos seguiram.<br />
- Assim, os garotos caminharam em direção a um lugar abandonado,<br />
deixando João com dúvidas.<br />
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- Que lugar é esse?<br />
- É nossa casa. Vem. – Um dos garotos sinalizou.<br />
João se surpreendeu e percebeu que não era uma casa comum<br />
instalada na ilha, mas sim muito antiga, feita de pedra e algumas partes de<br />
madeira. Estava em ruínas, com partes de paredes, chão, portas e janelas<br />
faltando, e até coberta por plantas em algumas partes. Mesmo assim, era<br />
um bom abrigo para os garotos surdos perdidos dormirem e comerem.<br />
Assim, Wendy percebeu que Tigrinha se afastou da turma.<br />
- Você não vem? – Wendy perguntou.<br />
- Não. Esse não é meu lar, vivo na tribo indígena surda, que é meu<br />
lar. – Tigrinha respondeu em língua de sinais. – Volte em segurança, a<br />
gente se vê mais tarde. – A indígena surda despediu-se e saiu.<br />
Assim, Wendy entrou na casa em ruínas e admirou de ver como era<br />
o ambiente interno onde as crianças gostavam de viver. Até a lareira estava<br />
acessa e os garotos já se sentaram em volta, à frente da lareira. <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong><br />
era o único que se sentou folgado na cadeira, parecia que as crianças o<br />
obedeciam como se fosse o rei.<br />
- Wendy? Conta uma história de ninar para nós? – Um dos garotos<br />
implorou para a garota mais velha da turma contar uma história.<br />
- É! Conta uma história! – Um dos gêmeos sinalizou.<br />
- É! Conta uma história! – O outro gêmeo sinalizou também.<br />
- Estamos esperando há séculos. – Outro garoto ansioso para<br />
assistir à narrativa.<br />
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- Wendy se aproximou da roda de crianças e olhou todos, e disse:<br />
- Bom, eu posso contar, mas eu queria saber se o <strong>Peter</strong> pode contar<br />
história primeiro, porque percebi que ele é ótimo em incorporar recursos<br />
visuais e sabe fazer diversas características de personagens e de espaço<br />
para contar. – Wendy explicou e preferiu deixar o herói contar primeiro.<br />
- Que história? – <strong>Peter</strong> perguntou, como se não conhecesse novas<br />
histórias.<br />
- Não sei... – Wendy disse, pensativa. - Tenho uma ideia para te<br />
ajudar a construir uma história. Vamos. Como você veio para a Terra do<br />
Nunca Ouve? Como conheceu o Capitão Gancho?<br />
- Ahh, você me ajuda a construir a história, mesmo. É uma história<br />
bem curta e simples, e é mais ou menos assim... – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> tentou<br />
construir e lembrou: - Eu lutei contra o Capitão Gancho em um duelo e<br />
cortei a mão dele. Só isso.<br />
- Sim. Sim. Todo o mundo conhece essa. Mas como se<br />
conheceram? Por que vocês começaram a brigar? – Wendy perguntou.<br />
- Porque ele é um surdo oralizado e não aceitou a língua de sinais,<br />
nem a cultura surda. E eu sou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, sou surdo e tenho orgulho. –<br />
<strong>Peter</strong> respondeu.<br />
- Mas não pode ser tão simples assim. – Wendy comentou.<br />
- Por que não? – <strong>Peter</strong> não entendeu e percebeu que havia algo<br />
errado nele.<br />
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- Porque nada é assim. – Wendy respondeu com sinceridade. – De<br />
onde vocês vieram? Onde estavam a mãe e o pai dele? Onde estavam os<br />
seus? – A garota perguntou.<br />
- Isso é pegadinha. Aqui é Terra do Nunca Ouve, aqui não tem mães<br />
e pais! – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> se revoltou.<br />
- Por quê? – Wendy perguntou, curiosa.<br />
- Porque foram eles que nos obrigaram a falar corretamente e nos<br />
padronizar à sociedade chata. Aqui, todos nós sentimos ter liberdade e a<br />
língua de sinais é nossa! A cultura é nossa!<br />
- Verdade, não temos mães e pais, mas temos liberdade aqui. – Um<br />
dos garotos disse.<br />
- A Wendy pode ser a nossa mãe? – Outro garoto perguntou.<br />
- Não posso, não. – Wendy negou. – Mas todos nós temos uma mãe,<br />
sim. - Em algum lugar por aí... ela sente sua falta. Todas elas amam vocês.<br />
- Eu até queria ver a minha mãe de novo e ela podia aceitar a nossa<br />
língua de sinais. – Um dos garotos disse.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> ficou revoltado por saber da frase do amigo e disse ao<br />
garoto:<br />
- Você não queria, não. – Ele mudou a direção de olhar para todos.<br />
- Se vocês voltarem, vai ser o fim da língua e da cultura! – O rapaz se<br />
levantou da cadeira e voou para cima.<br />
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- Desculpe por ter implorado uma história, Wendy. – Um dos garotos<br />
disse.<br />
- Relaxe, Wendy. A culpa não é sua. Deixe para ele lá. – A fadinha<br />
Tinker Bell pediu com calma.<br />
Wendy preocupou-se um pouco com <strong>Peter</strong>, mas deixou pra lá e foi<br />
sentar-se aproximando-se dos garotos surdos perdidos:<br />
- Que tal... que tal eu continuar contando uma história para ninar? –<br />
Wendy convidou todos a participar e eles balançaram a cabeça como<br />
afirmativa. – Então, contarei uma história. – Wendy continuou até que todos<br />
caíssem no sono.<br />
As horas passaram, Wendy não parou de pensar na reação de <strong>Peter</strong><br />
<strong>Pan</strong> e ainda se sentiu culpada. Então, decidiu subir para ver se tudo estava<br />
bem com <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e subiu a escada, também acompanhada pela Tinker<br />
Bell.<br />
Wendy encontrou a porta do quarto e viu o registro de dois nomes<br />
feito à mão: “Quarto do <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>” e o nome de James no registro, mas<br />
este estava marcado com um X. Wendy não reconheceu o nome James e<br />
perguntou para Tinker Bell.<br />
- Quem é James?<br />
Tinker Bell ficou sem jeito para responder e fez:<br />
- James era o melhor amigo de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>.<br />
- Uai, ele faleceu? Ele saiu da Terra?<br />
- Não, ele se tornou Capitão Gancho. – Tinker Bell respondeu.<br />
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- Ah, não sabia que ele se tornou Capitão Gancho. Posso falar com<br />
<strong>Peter</strong> lá dentro? – Wendy disse. Ela abriu a porta e encontrou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong><br />
sentado à beira do chão, onde uma parte da parede desabou. Estava quase<br />
tudo escuro, mas iluminado pela lua. A garota o chamou:<br />
- <strong>Peter</strong>?<br />
Ele percebeu o movimento da sombra da garota e voou para sair do<br />
buraco na parede, indo para cima. Wendy seguiu na direção do buraco na<br />
parede.<br />
- <strong>Peter</strong>, pare. Não faça isso.<br />
Wendy procurou por ele e encontrou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> lá em cima, não<br />
muito longe.<br />
- Peço desculpas pelo meu comentário sobre as mães das crianças.<br />
Tinker Bell me contou que você e James eram amigos antes dele se tornar<br />
Capitão Gancho. – Wendy disse.<br />
- Ele era meu melhor amigo, sim. Foi o primeiro Menino <strong>Surdo</strong><br />
Perdido. – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> respondeu.<br />
- E o que aconteceu? – Wendy queria saber o motivo.<br />
- A Terra do Nunca Ouve não era suficiente para ele, eu acho. Ele<br />
pegou o barco um dia sem dizer nada e me deixou sozinho. Quando ele<br />
voltou, estava diferente. Ele era cruel e mau. Ele se tornou surdo oralizado<br />
e não aceitava a língua de sinais por vergonha. – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> explicou e se<br />
levantou para voar e desceu até onde Wendy estava.<br />
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- Será mesmo? Ele mudou de ideia por causa de um padrão social<br />
linguístico? – Wendy duvidou.<br />
- Qual é a diferença? Ele não se sentiu orgulhoso de ser surdo? Por<br />
isso, você não pode ir, porque está tentando ser diferente. Imagine como<br />
você vai ficar se for. – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> refletiu e explicou.<br />
- Mas o que vai acontecer se eu ficar?<br />
- Nada. É só ser você. Surda oralizada ou surda sinalizada. Como<br />
eu. Eu pensei que você fosse ser feliz aqui. – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> sinalizou.<br />
- É, eu também pensei. – Wendy respondeu. – <strong>Peter</strong>, isso é muito<br />
mais real. Claro que é real. Só é uma realidade diferente no mundo dos<br />
surdos.<br />
- Uma realidade melhor. Boa noite, Wendy. – <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> se virou para<br />
o outro lado e andou em outra direção. Tinker Bell acompanhou o garoto<br />
surdo. Wendy se sentiu abalada após a pequena briga; ela pensou que<br />
seria melhor deixá-lo em paz. Wendy decidiu descer para ver se estava<br />
tudo bem com os irmãos e os garotos surdos perdidos.<br />
Ao chegar no primeiro andar, ela sentiu algo estranho e viu um<br />
ursinho deixado no chão perto da lareira. Ela foi na direção desse brinquedo<br />
favorito do irmão, o pegou e o observou. Percebeu que o ambiente da sala<br />
estava vazio, não era como antes. Ela sentiu algo atrás dela e se virou para<br />
ver o Sr. Smee e os piratas raptando os irmãos e os garotos perdidos, com<br />
lençóis cobrindo a boca de cada um e as cordas de barbante amarradas<br />
em suas mãos nas costas. Wendy se virou para o outro lado e viu o Capitão<br />
Gancho andando à sua frente. A mão do pirata tapou a boca da garota e<br />
segurou suas mãos.<br />
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- Wendy Moira Angela Darling! A jovem mocinha surda quase<br />
oralizada de Londres, Inglaterra! Suas mãos se movimentaram quando sua<br />
voz se pronunciou, me chamou minha atenção. Obrigado. – O Capitão<br />
Gancho era esperto em elaborar plano para realizar sequestro de crianças<br />
surdas.<br />
O Capitão Gancho sentiu que <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> estava presente no quarto,<br />
subiu a escada até chegar ao segundo andar, e foi na direção da porta<br />
fechada de seu antigo quarto. Ele<br />
viu seu nome marcado com X na porta e a abriu para encontrar <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong><br />
e Tinker Bell. O Capitão Gancho aproveitou que ele não ouvia e apontou<br />
sua espada para as costas de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, que se assustou. Então, o herói<br />
decidiu se virar para o vilão, pegou a espada de seu cinto para dar um golpe<br />
contra seu antigo amigo. Eles lutaram, passaram até perto da escada e do<br />
corredor que ficavam sem corrimão.<br />
O Capitão Gancho conseguiu cortar o peito de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, deixandoo<br />
machucado. Ele passou mal e caiu de costas até o chão do primeiro<br />
andar, desmaiando. Enquanto <strong>Peter</strong> caía, Tinker Bell também correu atrás<br />
de seu companheiro na queda para tentar salvá-lo, mas acabou sendo<br />
capturada em um saco de tecido do pirata. Wendy e as crianças surdas<br />
ficaram surpresas ao ver a situação de queda do herói.<br />
- Não! <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>! – Wendy gritou desesperada. Virou-se para seu<br />
inimigo. – O que você fez?<br />
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O Capitão Gancho ainda estava no piso do quarto e observou a<br />
queda de <strong>Peter</strong>:<br />
- Eu consegui. – Capitão Gancho disse com voz orgulhosa. Eu matei<br />
o <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>. – O vilão comemorou e todos deixaram <strong>Peter</strong> "morto".<br />
Capitão Gancho e os piratas levaram as crianças surdas<br />
embarcando-as no barco para ir ao navio.<br />
Nas ruínas da casa, <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> ficou inconsciente, mas sua sombra<br />
permaneceu ativa e se moveu. A sombra estava viva e conseguiu transmitir<br />
sua mensagem para quem estava procurando: Tigrinha.<br />
Então, a sombra de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> foi até a tribo indígena, circulou pela<br />
região e alertou Tigrinha, fazendo-a perceber que algo terrível havia<br />
acontecido na ruína. Tigrinha entendeu o sinal da sombra, pegou seu<br />
cavalo e correu até a ruína.<br />
No navio, onde as crianças surdas estavam acorrentadas, o local<br />
não era confortável. O Capitão Gancho se aproximou de Wendy e disse:<br />
- Eu quero falar com você, Wendy!<br />
Wendy se levantou e pediu às crianças surdas para se aproximarem<br />
dela, para resolverem a situação juntos.<br />
- Por que vocês nos trouxeram até aqui? – Wendy perguntou.<br />
- Porque este lugar não é para vocês. – Capitão Gancho respondeu.<br />
- Entendi. Sei que você e <strong>Peter</strong> eram amigos. Vi a história. – Wendy<br />
acreditou nas razões do vilão.<br />
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- Você viu?<br />
- Você saiu da Terra do Nunca Ouve. Quando voltou, estava... – A<br />
garota surda disse, mas foi interrompida pelo capitão.<br />
- Mau. Eu segui o caminho de me tornar surdo oralizado.<br />
- Isso. – Wendy respondeu.<br />
- De certa forma, é verdade. Mas ele omitiu a parte mais importante.<br />
Eu não fugi da Terra do Nunca Ouve. – O Capitão Gancho explicou.<br />
- <strong>Peter</strong> te expulsou. – Wendy ficou surpresa.<br />
- Foi ele, sim. Essa é a grande questão. Ele, que foi meu melhor<br />
amigo, me baniu, porque eu sentia saudades da minha mãe, porque... – o<br />
Capitão Gancho parou e refletiu um pouco. Então, continuou: - Porque ela<br />
queria que eu falasse oralmente, como todos na Terra. É tão horrível assim,<br />
eu me tornar surdo oralizado e seguir o desejo da minha mãe? <strong>Peter</strong> não<br />
aceitou que eu me tornasse surdo oralizado...<br />
- Não, claro que não. Porque, se você queria ser surdo oralizado, a<br />
escolha era sua, não de <strong>Peter</strong>, nem de sua mãe, nem de ninguém. Era sua<br />
própria escolha. Eu quero aprender a língua de sinais, porque percebo que<br />
é a língua do meu próprio povo surdo e me sinto incluída nele.<br />
- Diga isso para o seu querido amigo falecido, porque ele pensava o<br />
contrário. Assim, não consegui encontrar minha mãe, fiquei perdido no mar<br />
e fui acolhido pelos piratas surdos oralizados. Por isso, aprendi muito com<br />
eles e me tornei o Capitão Gancho! – Revoltado o Capitão Gancho deu<br />
ordem aos seus comandantes para jogar Wendy para o crocodilo.<br />
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Na casa, Tigrinha cuidou da ferida no peito de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, utilizando<br />
folhas naturais para curá-lo. Isso fez com que o garoto recuperasse a<br />
consciência e se levantasse um pouco, virando a cabeça de um lado para<br />
o outro.<br />
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- Onde estão todos? E Tinker Bell? E os garotos surdos perdidos? E<br />
Wendy, João e Miguel? - <strong>Peter</strong> perguntou enquanto tocava a ferida em seu<br />
peito.<br />
- Foram levados. - Tigrinha sinalizou.<br />
- Pelo Capitão Gancho? - <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> perguntou, revoltado. - Eu<br />
preciso salvá-los. Tenho que ir até o navio. - Ele tentou se levantar e voar,<br />
mas caiu. Machucou-se mais um pouco. Tentou novamente, mas não<br />
conseguiu. - Eu perdi os meus poderes? Está faltando o pó de Tinker Bell!<br />
- Me deixe ajudar. - Tigrinha ofereceu apoio ao seu amigo e o<br />
orientou.<br />
No navio, Wendy estava amarrada com correntes e cadeados, sendo<br />
forçada a caminhar sobre uma prancha que se estendia para fora do navio,<br />
ao lado dos garotos surdos perdidos, dos piratas e do Capitão Gancho.<br />
Tinker Bell estava presa dentro de uma caixa de vidro de luminária, ao lado<br />
do Sr. Smee.<br />
Wendy estava apavorada, avançando pela prancha até a ponta final.<br />
- Adeus, Wendy Moira Angela Darling! - O Capitão Gancho zombou.<br />
A garota surda ficou chateada e pulou da prancha. O Capitão<br />
Gancho ficou satisfeito com o salto de Wendy. Entretanto, ele percebeu<br />
algo errado na situação. Notou que não havia água no chão do navio, nem<br />
jorrando pela borda.<br />
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- Não há água aqui no chão? Nem jorros d'água? - O Capitão<br />
Gancho perguntou. Todos os piratas negaram com a cabeça.<br />
52
Nesse momento, Tinker Bell observou a situação e concebeu um<br />
plano para salvar Wendy. Suas asinhas bateram e fizeram a caixa de vidro<br />
subir. Assim que pararam de bater, a caixa caiu e os cacos se espalharam.<br />
A fadinha conseguiu escapar e espalhou seus pós mágicos na prancha,<br />
fazendo com que Wendy começasse a flutuar para cima, evitando cair no<br />
mar. Wendy levantou-se ao lado de Tinker Bell, surpreendendo o Capitão<br />
Gancho, os piratas e os garotos perdidos.<br />
- Olhem, minha irmã está voando! - João comemorou, sorrindo.<br />
- Você tem a magia do menino! - Capitão Gancho exclamou,<br />
incrédulo ao ver a garota surda.<br />
- Não, essa magia não pertence a nenhum menino. - Wendy<br />
respondeu com firmeza.<br />
- Isso é um absurdo! Estou no comando do meu navio, a autoridade<br />
é minha e não sua. - Capitão Gancho se orgulhou de ser o capitão da<br />
embarcação.<br />
Aconteceu que os pós mágicos se espalharam por todo o navio,<br />
fazendo-o flutuar no ar, deixando os piratas em desespero. Capitão Gancho<br />
gritou:<br />
- Tragam meu navio de volta à água!<br />
O navio flutuou e se aproximou do penhasco. Enquanto isso, à<br />
distância, Tigrinha e <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> montaram em um cavalo branco e<br />
galoparam rapidamente em direção ao navio. <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> recuperou suas<br />
forças e ficou satisfeito ao sentir a melhora. Quando o cavalo se aproximou<br />
53
do navio flutuante no céu, <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> se levantou na sela, empunhou sua<br />
espada e saltou em direção ao navio. Sua espada cortou a vela de cima<br />
para baixo e ele pousou no convés.<br />
54
- Sentiu saudades de mim? - <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> provocou o Capitão Gancho.<br />
- Mais do que você pode imaginar. - Respondeu o vilão.<br />
- É hora do nosso último duelo! - Disse <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, enquanto o<br />
Capitão Gancho se preparava para atacá-lo. A batalha com espadas se<br />
desenrolou em vários locais do navio. <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> cortou as cordas que<br />
prendiam as crianças e elas se libertaram, unindo-se à luta contra os<br />
piratas. Nesse momento, a vela do navio se soltou e caiu sobre os piratas<br />
e as crianças, sendo solta por Wendy de cima.<br />
Os piratas emergiram de debaixo da vela e um deles ordenou:<br />
- Peguem as crianças!<br />
As crianças pegaram espadas e se prepararam para lutar contra os<br />
piratas. Uma delas exclamou:<br />
- Peguem os piratas!<br />
No penhasco, Tigrinha fez seu cavalo correr rapidamente, saltou<br />
para dentro do navio e lutou contra os piratas para apoiar <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>.<br />
- Como nos velhos tempos. - Disse o Capitão Gancho.<br />
- Todos os seus tempos são velhos, capitão. - Comentou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>,<br />
enquanto continuavam a lutar.<br />
Enquanto João lutava contra um dos piratas, percebeu que o navio<br />
flutuante estava se aproximando do penhasco e teve que evitar uma<br />
colisão. Correndo para o leme, ele conseguiu mudar a direção a tempo.<br />
55
Uma parte do navio bateu em uma rocha, fazendo-o tremer e os piratas e<br />
as crianças perderem o equilíbrio.<br />
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- Quase lá. - Disse João. - Por pouco. - Conseguiu mover o navio<br />
para o lado, evitando um desastre iminente.<br />
O pirata que atacava João levantou a mão para chamar a irmã de<br />
João enquanto ela lutava contra outro pirata.<br />
- Me ajuda!<br />
Wendy chegou à proa e segurou o timão, concebendo um plano. Ela<br />
alertou a todos, fazendo sinais, mas os piratas não entenderam.<br />
- Segurem-se em qualquer coisa, vou girar o navio para baixo -<br />
sinalizou ela.<br />
Os garotos surdos perdidos agarraram partes do navio, enquanto<br />
Wendy virava o timão para baixo, fazendo o navio girar e os piratas caírem<br />
no mar.<br />
Enquanto <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> e o Capitão Gancho lutavam dentro da cabine,<br />
o navio girou, fazendo com que ambos perdessem o equilíbrio e lutasse um<br />
contra o outro. O Capitão Gancho acabou caindo na tampa fechada da<br />
cabine, tentando segurar algo, e acabou pegando o pé de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>. Ele,<br />
sendo pesado, caiu na verga, evitando cair no mar, mas se machucou.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> também caiu, segurando a parte da cabine, mas não conseguiu<br />
suportar o peso por muito tempo e caiu.<br />
Wendy voou e salvou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, passando-lhe os pós mágicos para<br />
que ele pudesse voar novamente. Ele ficou animado por ter recuperado<br />
seus poderes.<br />
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<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> voou na direção do Capitão Gancho, permanecendo na<br />
verga, e disse:<br />
- Sabe o que mais dói em ficar velho? - <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> perguntou. Tinker<br />
Bell o acompanhou para fazer a interpretação em língua inglesa para o<br />
capitão.<br />
- Não me importo que tenha me machucado. O que eu quero é ter<br />
habitantes surdos oralizados na Terra do Nunca Ouve - disse o Capitão<br />
Gancho.<br />
- Você que quis ir embora. - comentou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>.<br />
- Eu era um surdo sinalizante. Eu era apenas uma criança. - Afirmou<br />
o Capitão Gancho.<br />
Quando o navio girou novamente lentamente para cima, o gancho<br />
do capitão atacou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, mas o garoto conseguiu escapar e pegou sua<br />
espada para golpeá-lo. Enquanto isso, os garotos surdos perdidos<br />
preparavam o canhão. O gancho do capitão atacou novamente, mas falhou,<br />
e ele acabou caindo na verga. Ele ficou deitado, levantou a cabeça e olhou<br />
para <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, enquanto a espada do garoto apontava para ele.<br />
- Imagine uma Terra do Nunca Ouve sem nós dois. Sem nossas lutas<br />
pelo domínio da língua inglesa ou da língua de sinais. Nossas brigas. Eu<br />
sei que nos separamos, perdemos nossa. Perdemos a união, cada um<br />
seguindo seu próprio caminho. - Explicou o Capitão.<br />
- Ser um verdadeiro surdo? - perguntou o garoto surdo.<br />
- Não. Um verdadeiro surdo oralizaria como todos lá fora, pela língua<br />
oral. - Respondeu o Capitão Gancho.<br />
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- Eu pediria desculpas. - Disse <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> sinceramente.<br />
- Desculpas? Pelo quê? - estranhou o Capitão Gancho.<br />
- Por te magoar. Por ter sido um péssimo amigo. Por ter te excluído<br />
por escolher ser surdo oralizado. Desculpe pelo que eu fiz, capitão. Eu<br />
deveria respeitar sua escolha. Desculpe por te magoar, James - <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong><br />
respondeu e soltou a espada no chão, deixando a ponta marcar o piso.<br />
- Você não pode fazer isso - disse o Capitão. - Não, não é assim que<br />
funciona. Eu quero lutar com você. A luta é divertida, mas vou dominar o<br />
mundo para apenas piratas surdos oralizados - comentou o Capitão<br />
Gancho, e atacou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>, mas foi impedido pela espada de Wendy, que<br />
voou.<br />
Deixe <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> em paz. Deixe os garotos surdos viverem bem na<br />
Terra do Nunca Ouve. Eles escolhem a língua de sinais, a felicidade é deles<br />
e não sua - pediu Wendy ao vilão, para que parasse a batalha contra <strong>Peter</strong><br />
<strong>Pan</strong> e os garotos perdidos.<br />
A bola do canhão soltou-se e bateu no mastro, fazendo o navio<br />
balançar. O movimento fez o Capitão Gancho cair, e <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> segurou<br />
seu gancho para que o antigo amigo não caísse.<br />
- Relaxe, James. Pense em algo bom: o direito linguístico dos surdos<br />
- disse <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>.<br />
A frase chamou a atenção do Capitão Gancho e fez com que ele<br />
percebesse seus erros. Eles ficaram em silêncio por alguns segundos,<br />
refletindo.<br />
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- Estou me arrependendo do que fiz aqui na Terra do Nunca Ouve –<br />
disse o capitão de forma sincera.<br />
Os dois amigos se entreolharam por um momento, e o capitão<br />
decidiu partir. Seu gancho foi solto do pulso e ele caiu no mar, afundando.<br />
- Não, James! - <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> gritou, enquanto Wendy e Tinker Bell se<br />
aproximavam voando.<br />
Eles desceram para o convés do navio e observaram o mar por<br />
alguns segundos. <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> segurou o gancho e pensou sobre seu antigo<br />
amigo. Colocou o gancho no chão lentamente. Tinker Bell se aproximou do<br />
objeto e disse:<br />
- O que houve, <strong>Peter</strong>?<br />
- Ele era meu amigo - <strong>Peter</strong> respondeu simplesmente.<br />
- Nós somos seus amigos também, <strong>Peter</strong>. Você está conosco - disse<br />
um dos garotos surdos perdidos.<br />
Wendy cutucou o garoto surdo e quis perguntar:<br />
- <strong>Peter</strong>, não está na hora de levar os Meninos <strong>Surdo</strong>s Perdidos para<br />
casa?<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> balançou a cabeça afirmativamente lentamente. O navio<br />
voou pelo céu e seguiu o caminho de volta para Terra. Tigrinha já havia<br />
descido do navio. Ao ver a embarcação voando, ela acenou para a turma<br />
de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>.<br />
- Adeus. Nós nos vemos novamente outro dia - Tigrinha sorriu.<br />
62
O navio já havia chegado à cidade de Londres. Na casa da família<br />
Darling, os pais estavam dormindo. A mãe acordou ao ouvir um barulho<br />
vindo de alguma parte da casa e se surpreendeu. Ela se levantou da cama,<br />
segurando uma luminária para facilitar a visibilidade na escuridão. A Sra.<br />
Mary Darling ficou surpresa ao encontrar sua filha no corredor, quando ela<br />
fechou a porta. Elas se entreolharam.<br />
- Ah, minha filha, Wendy! Onde vocês estavam? - Sra. Mary<br />
perguntou preocupada. - Eu me sinto culpada por deixar vocês fugirem de<br />
nossa casa em busca de tratamento de fala e para aprender a pronunciar<br />
corretamente na escola. Eu peço desculpas, Wendy!<br />
Wendy leu os lábios da mãe e entendeu perfeitamente.<br />
- Está desculpada Mamãe! Obrigada por me compreender e apoiar<br />
meu desejo - Wendy ficou feliz com o apoio da mãe. - Eu quero te mostrar<br />
uma coisa.<br />
Wendy mostrou os sinais da Língua Britânica de Sinais para a mãe,<br />
deixando-a surpresa.<br />
- Como você aprendeu essa linguagem de sinais? - Sra. Mary<br />
Darling perguntou.<br />
- Não é correto dizer "linguagem de sinais". O correto é "língua de<br />
sinais" - Wendy explicou. - Eu aprendi essa língua de sinais na Terra do<br />
Nunca Ouve.<br />
- Terra do... Nunca Ouve? Onde é isso? - Sra. Mary Darling<br />
estranhou, pois nunca tinha ouvido falar antes.<br />
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- Ah, é um outro mundo... Deixa pra lá - Wendy ficou sem graça,<br />
percebendo que sua mãe era adulta e talvez tivesse dificuldade em<br />
acreditar em fantasia. Ela mudou de assunto. - Estou pronta...<br />
- Pronta para o quê? - Sra. Mary Darling perguntou curiosa.<br />
- Estou pronta para lutar pelo direito à língua e à educação bilíngue<br />
dos surdos aqui em Londres e para negociar com os políticos - Wendy<br />
expressou desejo das crianças surdas aprenderem por meio da língua de<br />
sinais.<br />
- Wendy? - Sr. Jorge Darling apareceu no corredor e correu até a<br />
mãe e a filha, abraçando-as. - Que barulho é esse? - Jorge perguntou<br />
desconfiado, ouvindo o barulho vindo do quarto das crianças.<br />
Jorge e Mary foram em direção à porta do quarto, abriram e<br />
encontraram as crianças surdas brincando no ambiente: um brincava com<br />
uma casa de bonecas, João e outro garoto jogavam damas, uma garota<br />
brincava de chá com a cadela Naná, e Miguel e outro garoto pulavam na<br />
cama.<br />
- Quem são essas crianças? – Sra. Mary Darling perguntou.<br />
Miguel viu os pais chegando ao quarto e correu na direção da mãe,<br />
abraçando-a.<br />
- Mamãe!<br />
As crianças surdas perceberam a chegada dos pais de Wendy e se<br />
aproximaram deles.<br />
- De onde vocês vieram, crianças? – Sr. Jorge Darling perguntou.<br />
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- Eles vieram da Terra do Nunca Ouve, papai. – João respondeu.<br />
- Terra do quê? – Sr. Jorge Darling não entendeu e achou a<br />
explicação bastante estranha.<br />
No telhado da casa da família Darling, o navio ainda flutuava, preso<br />
por uma corrente amarrada à chaminé. <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> não tinha interesse em<br />
entrar no quarto dos irmãos Darling; em vez disso, preferiu sentar-se no<br />
telhado, acompanhado pela Tinker Bell. Wendy subiu até lá e encontrou<br />
<strong>Peter</strong> sentado, perdido em pensamentos, observando o céu noturno.<br />
Wendy percebeu que <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> estava chorando.<br />
- Por que está chorando? – ela perguntou.<br />
- Lembra quando perguntou de onde eu vim? – o garoto perguntou.<br />
- Lembro – respondeu a garota.<br />
67
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> apontou com o dedo na direção da chaminé, e Tinker Bell<br />
se aproximou para iluminar o nome gravado na face dela: PETER PAN.<br />
Wendy ficou surpresa ao ver o nome gravado ali. Ela virou-se para olhar<br />
para o menino surdo.<br />
- Esta era sua casa? – Wendy perguntou.<br />
68
Foi um dia. Minha mãe brigou comigo uma noite, me obrigou a ir à<br />
sessão de fonoaudiologia para melhorar minha fala e proibiu que eu usasse<br />
a língua de sinais. Em vez disso, eu fugi pela janela, pulei a cerca do jardim<br />
e nunca mais olhei para trás – explicou <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>.<br />
- Mas você olhou, sim. Por isso, você sempre voltou, não é? Porque<br />
sente saudade de casa. É saudade... – Wendy disse, pausando.<br />
- Da minha mãe. Ela nunca reconheceu minha felicidade. Mas ela já<br />
se foi há muito tempo. Eu sou apenas uma história agora. - <strong>Peter</strong> explicou.<br />
- A história que contam para as crianças surdas verem e se<br />
imaginarem no mundo delas. Faz parte da memória das crianças surdas –<br />
explicou Wendy.<br />
- E ela nunca teve fim, até agora. Eu posso até voltar para ver de vez<br />
em quando – disse <strong>Peter</strong>.<br />
- <strong>Peter</strong>, eu te agradeço por me levar à Terra do Nunca Ouve, por me<br />
mostrar o conhecimento do povo surdo, sua diversidade, cultura e, mais<br />
importante, a Língua Britânica de Sinais. Eu aprendi muito e sinto que a<br />
necessidade das crianças surdas é frequentar a Escola Bilíngue de <strong>Surdo</strong>s<br />
aqui em Londres. Muito obrigada, do fundo do meu coração! – Wendy<br />
agradeceu e beijou <strong>Peter</strong> na boca, com carinho. – Você pode ficar aqui<br />
conosco.<br />
- Acho que não estou pronto para ficar aqui. – respondeu <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>,<br />
uma lágrima escapando de seus olhos.<br />
- Pense no que o mundo está perdendo sem você – disse Wendy.<br />
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A corrente que prendia o navio à chaminé se rompeu, fazendo com<br />
que o navio se afastasse ainda mais da casa. <strong>Peter</strong> ficou desesperado,<br />
tentando com todas as suas forças fazê-lo voltar, mas foi em vão. O<br />
momento de partir chegara e não houve tempo para se despedir de Wendy.<br />
Wendy ficou chateada por não conseguir se despedir de <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong>:<br />
- Não vá, <strong>Peter</strong>.<br />
Os pais Darling e as crianças surdas sentiram a casa tremer e se<br />
aproximaram da janela para ver o que estava acontecendo do lado de fora.<br />
- Que mágica é essa? O navio está navegando no céu? – exclamou<br />
o Dr. Jorge Darling, surpreso. – Quem é aquele menino?<br />
- Aquele é <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> – respondeu a Dra. Mary Darling,<br />
reconhecendo o menino que sabia voar.<br />
Tinker Bell precisou ir até o navio. Antes de partir, ela dirigiu-se à<br />
garota surda:<br />
- Tchau, Tinker Bell. Cuide bem de <strong>Peter</strong>. E por favor, não se<br />
esqueça de mim. – Wendy despediu com carinho.<br />
- Que emoção vê-la sinalizando? Wendy, obrigada por confiar em<br />
mim, do fundo do meu coração – Tinker Bell agradeceu, beijando a ponta<br />
do nariz da garota surda, antes de partir para o navio com <strong>Peter</strong>. Wendy se<br />
emocionou com a despedida de seus queridos amigos.<br />
- Tchau, <strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> – disseram João e Miguel, repetindo as palavras<br />
de despedida.<br />
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Wendy permaneceu no telhado, observando o navio desaparecer<br />
entre as nuvens enquanto navegava pelo céu. O navio se foi.<br />
Enquanto isso, no mundo da Terra do Nunca Ouve, o Capitão<br />
Gancho segurava as peças quebradas que sobraram do navio.<br />
- Viu só, capitão? – disse Sr. Smee, também segurando uma parte<br />
quebrada do navio.<br />
- Ainda estou vivo! – exclamou o Capitão Gancho, aliviado.<br />
- Eu não me afoguei! – disse um dos piratas, boiando nas águas.<br />
O Capitão Gancho percebeu uma sombra passando sobre ele e<br />
sentiu algo estranho. Ele olhou para cima e sorriu.<br />
Era o navio.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> permaneceu em pé na borda do navio, suas mãos na<br />
cintura, acompanhado pela fadinha Tinker Bell.<br />
<strong>Peter</strong> <strong>Pan</strong> sorriu.<br />
Era hora da união entre surdos sinalizantes e surdos oralizados.<br />
FIM<br />
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Sobre Autor<br />
Helio Alves é mestre surdo, com duas graduações: Arquitetura e Urbanismo<br />
(PUC Minas) e Licenciatura em Letras-Libras (UFSC/IFMG). Possui<br />
mestrado em Educação Bilíngue (DESU/INES). É professor de Libras nas<br />
escolas municipais de Belo Horizonte e ministra cursos de Libras como L2<br />
para ouvintes. Desde a infância, sempre teve grande interesse em imaginar<br />
histórias, desenhar e explorar as curiosidades do mundo. Além disso, atua<br />
como poeta, contador de histórias, ator, arte-educador em museus, e<br />
tradutor e intérprete de Libras em projetos culturais, áreas que também<br />
inspiram suas pesquisas acadêmicas. O objetivo da publicação deste livro<br />
é ampliar o número de obras na categoria de Literatura Surda e incentivar<br />
crianças e jovens surdos a imaginarem histórias com personagens surdos.<br />
Sobre a Ilustradora<br />
Renata Redmerski é uma ilustradora especializada em livros infantis.<br />
O desenho sempre foi seu meio de expressão, mas foi após se formar em<br />
arquitetura que começou a ilustrar profissionalmente. A partir desse<br />
momento, ingressou no mundo da ilustração, explorando os mais diversos<br />
ramos que essa arte pode oferecer, mas foi a ilustração infantil que se<br />
tornou sua grande paixão. Já ilustrou diversos livros infantis, incluindo<br />
obras de poesia, romances e livros didáticos. Seus desenhos são sempre<br />
muito coloridos, com uma paleta rica e um estilo dinâmico, que evocam um<br />
senso de maravilha e encantamento. Explorando o fantástico e o<br />
extraordinário, suas ilustrações buscam contar histórias e construir pontes<br />
entre o mundano e o mágico.<br />
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