UNIVERSIDADE DO PORTO Faculdade de Letras - Repositório ...
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Mas o vale do Lima não é só terra com cheiro <strong>de</strong> maresia. É a terra on<strong>de</strong> as<br />
festas se imbuem <strong>de</strong> profunda religiosida<strong>de</strong> e intenso paganismo, on<strong>de</strong> o cardo e o saco<br />
da invejida<strong>de</strong> ainda afastam as bruxas e o mau-olhado e a Santa Companha ainda vela<br />
as cangostas marginais ao avanço da luz eléctrica 2 . É a região <strong>de</strong> vinhos ver<strong>de</strong>s famosos,<br />
o <strong>de</strong> Ponte e o <strong>de</strong> Perre 3 , das grandiosas feiras <strong>de</strong> Ponte e <strong>de</strong> Viana, dos trajes garridos e<br />
da profusa ourivesaria.<br />
Para o Professor Carlos A. Ferreira <strong>de</strong> Almeida, um dos mais entendidos<br />
investigadores da profunda relação Homem-Espaço do Minho, magistralmente<br />
<strong>de</strong>fendida nessa obra <strong>de</strong> referência chamada Alto Minho (ALMEIDA CAF 1987), a<br />
paisagem minhota tem "uma intrincada espessura humana e uma longa sedimentação<br />
histórica (...) com campos muito velhos e outros mais recentes, com as casas dispersas<br />
entre hortas, arvoredos e ramadas com uma organização espaço-social estruturada em<br />
redor <strong>de</strong> um campanário e <strong>de</strong> uma teia <strong>de</strong> caminhos" (ALMEIDA CAF 1987: 8-9),<br />
termos cuja veracida<strong>de</strong> só é <strong>de</strong>sfeita, do Minho ao Douro, pelas diferenças orográficas<br />
ao nível da altitu<strong>de</strong> que se verificam entre o Alto e o Baixo Minho.<br />
O rio Lima é o ponto <strong>de</strong> confluência <strong>de</strong>stas duas realida<strong>de</strong>s. De um lado perfila-<br />
se o Minho setentrional, <strong>de</strong> topografias mais acentuadas, moldando uma paisagem <strong>de</strong><br />
média altitu<strong>de</strong>, plena das características geográficas típicas das faldas da Barreira <strong>de</strong><br />
Con<strong>de</strong>nsação do Noroeste Peninsular em subida progressiva até ao alto da Serra da<br />
Peneda. O meio-dia minhoto apresenta, por seu turno, um pendor menos acentuado e<br />
mais permeável aos ares marítimos oceânicos, com uma progressão topográfica mais<br />
suave até se começar a <strong>de</strong>senhar a base dos montes do Gerês. Entre estes dois mundos,<br />
afinal próximos, corre o rio espelho <strong>de</strong> água outrora apelidado oblivio (MELA 1989:<br />
83).<br />
A bacia terminal <strong>de</strong>ste curso <strong>de</strong> água <strong>de</strong>senvolve-se num vale alargado, com<br />
inclinação diminuta, próximo do perfil <strong>de</strong> equilíbrio, acompanhado <strong>de</strong> larga planície <strong>de</strong><br />
aluvião que penetra ao longo dos vales afluentes (TEIXEIRA e MEDEIROS 1972: 9),<br />
<strong>de</strong>calcando a falha tectónica, à semelhança do rio Minho (RIBEIRO 1987:14),<br />
2 Sobre a Antropologia Minhota veja-se alguns estudos: ALMEIDA, Carlos Alberto Ferreira <strong>de</strong>, Alto<br />
Minho, Col. Novos Guias <strong>de</strong> Portugal, Ed. Presença, Lisboa, 1987, p. 48-66; I<strong>de</strong>m, 'Território Paroquial<br />
no Entre-Douro-E-Minho. Sua Sacralização', Nova Renascença, Porto, 1981. p. 202-212; I<strong>de</strong>m, 'A<br />
Paroquia e Seu Território', in Minho Terras e Gente, Ca<strong>de</strong>rnos do Noroeste — Socieda<strong>de</strong>, Espaço,<br />
Cultura, Braga, Universida<strong>de</strong> do Minho, 1986, p. 113-130; ARAÚJO, José Rosa, Limiana - Página<br />
Regional <strong>de</strong> Arqueologia Artística e Etnografia, LIMICI, Ponte <strong>de</strong> Lima, 1991; VASCONCELOS, Jorge<br />
Leite <strong>de</strong>, Etnografia Portuguesa, INCM, Vol. V, Lisboa, 1982, p. 407-668<br />
3 Um aforismo da zona <strong>de</strong> Barcelos refere que "Vinho <strong>de</strong> Perre mata a fome e a se<strong>de</strong>" (VASCONCELOS<br />
1983: 393)<br />
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