You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
caberia ao juiz, interpretando princípios, o dever de encontrá-la.<br />
Alguns de vocês talvez pensem que essa distinção (entre agir discricionariamente e<br />
interpretar corretamente o Direito) não tem consequência prática; ou melhor, que<br />
dificilmente se saberá, pelos fun<strong>da</strong>mentos de uma decisão judicial, quando o juiz agiu<br />
de uma forma ou de outra. De fato, isso não é algo simples de se fazer. Mas pensem<br />
nisso (no dever de fornecer a resposta correta), como uma obrigação de meio, e não de<br />
resultado. É importante, para o caráter democrático de uma comuni<strong>da</strong>de politica, que o<br />
juiz saiba que não está autorizado a decidir discricionariamente – o que, diga-se, na<strong>da</strong><br />
tem a ver com independência judicial. Tema para outra conversa.<br />
Mas me permitam, aqui, uma nota à margem. Vejam que curioso: como percebem,<br />
<strong>Dworkin</strong> propôs o ingresso dos princípios na prática do direito com o objetivo de conter<br />
os poderes do juiz, não de ampliá-los. Trata-se <strong>da</strong> prova mais eloquente, na minha<br />
opinião, de que sua obra ou bem não foi li<strong>da</strong>, ou bem não foi devi<strong>da</strong>mente assimila<strong>da</strong><br />
pelo establishment jurídico brasileiro. Salvo raríssimas exceções, os princípios<br />
aparecem na argumentação jurídica em geral – e na fun<strong>da</strong>mentação de decisões em<br />
específico – como uma forma de justificar a abertura <strong>da</strong>s possibili<strong>da</strong>des interpretativas<br />
do Direito. Quando, para <strong>Dworkin</strong>, como vimos, é precisamente o contrário. Reparem: a<br />
prática do Direito é, sim, interpretativa. Mas há interpretações melhores do que outras,<br />
mais bem ajusta<strong>da</strong>s à integri<strong>da</strong>de do Direito – e, nesse <strong>sentido</strong>, corretas. E é para<br />
construir essa proposta interpretativa (a melhor, ou a correta) que o juiz tem de se<br />
entender com princípios jurídicos.<br />
Enfim. Não, tenho como, aqui, discutir esse tema, absolutamente complexo, com maior<br />
profundi<strong>da</strong>de. Guardemos, contudo, a mensagem: discricionarie<strong>da</strong>de judicial e<br />
princípios estão, para <strong>Dworkin</strong>, em rota de colisão.<br />
O título do texto<br />
Bem ou mal entendi<strong>da</strong>s, as teses, digamos assim, mais jurídicas de <strong>Dworkin</strong> são<br />
razoavelmente conheci<strong>da</strong>s — do meio acadêmico, ao menos. Há bastante literatura a<br />
respeito. Mas há um lado menos conhecido (ou explorado) desse grande autor. E é sobre<br />
este que vamos conversar agora.<br />
Vocês sabiam que, além de escrever muito sobre Direito e Filosofia, <strong>Dworkin</strong> também<br />
desenvolveu uma teoria sobre como viver bem? É isso mesmo: no seu último livro,<br />
Justice for Hedgehogs (algo como Justiça aos Ouriços),somos apresentados a uma<br />
releitura de uma tese filosófica antiga, denomina<strong>da</strong> de teoria <strong>da</strong> uni<strong>da</strong>de do valor. Na<br />
versão dworkiniana, ela serve para subsidiar a afirmação de que as ver<strong>da</strong>des sobre ―o<br />
que é bom‖, sobre ―como viver bem‖ ou sobre ―como ser bom‖, são não só coerentes,<br />
mas também se apoiam reciprocamente. Haveria, assim, conformi<strong>da</strong>de entre valores<br />
morais e éticos. Mais: haveria ver<strong>da</strong>des objetivas (e não apenas subjetivas, pois) a<br />
respeito do valor.<br />
Deixem que eu explique isso melhor.